citações sobre locke e hume

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CE SANTOS DUMONT Filosofia II Prof. Emmanuel Fraga O Empirismo inglês IN: REZENDE, Antonio (org.).Curso de Filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 1996, p. 100- 1. 1. LOCKE (1632-1704) A Ideia é o objeto do pensamento. Todo homem tem consciência de que pensa e de que, quando está pensando, sua mente se ocupa de ideias que tem de si. É indubitável que os homens têm em suas mentes várias ideias, que podem ser expressas pelos termos - brancura, dureza, doçura, pensamento, movimento, homem, elefante, exército, embriaguez, e outros. Deve-se examinar, então, em primeiro lugar, como ele as apreende. Sei que é aceita a doutrina segundo a qual os homens têm ideias inatas e caracteres originais impressos em suas mentes desde o início. Já examinei, em linhas gerais, essa opinião, e suponho que o que já disse no livro anterior será muito mais facilmente admitido quando tiver mostrado como o entendimento obtém todas as ideias que possui, e de que modo e graus elas penetram na mente, e para tal farei apelo a observação e experiência de cada um. Todas as ideias provêm da sensação ou da reflexão. Suponhamos, pois, que a mente é, como dissemos, um papel em branco, vazio de todos caracteres, sem quaisquer ideias. Como vem a ser preenchida? Como lhe vem esse vasto estoque que a ativa e ilimitada fantasia humana pintou nela com uma variedade quase infinita? Como lhe vem todo o material da razão e do conhecimento? A isso respondo com uma palavra: pela experiência. É na experiência que está baseado todo o nosso conhecimento, e é dela que, em última análise, o conhecimento é derivado. Aplicada tanto aos objetos sensíveis externos quanto às operações internas de nossa mente, que são por nós mesmos percebidas e refletidas, nossa observação sempre supre nosso entendimento com todo o material do pensamento. Essas são as duas fontes de nosso conhecimento, das quais jorram todas as ideias que temos ou que podemos naturalmente ter. (John Locke, Ensaio sobre o entendimento humano, Livro II, Cap. 1)

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Texto com citações dos filósofos empiristas

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Page 1: Citações sobre Locke e Hume

CE SANTOS DUMONTFilosofia IIProf. Emmanuel Fraga

O Empirismo inglêsIN: REZENDE, Antonio (org.).Curso de Filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 1996, p. 100-1.

1. LOCKE (1632-1704)

A Ideia é o objeto do pensamento. Todo homem tem consciência de que pensa e de que, quando está pensando, sua mente se ocupa de ideias que tem de si. É indubitável que os homens têm em suas mentes várias ideias, que podem ser expressas pelos termos - brancura, dureza, doçura, pensamento, movimento, homem, elefante, exército, embriaguez, e outros. Deve-se examinar, então, em primeiro lugar, como ele as apreende. Sei que é aceita a doutrina segundo a qual os homens têm ideias inatas e caracteres originais impressos em suas mentes desde o início. Já examinei, em linhas gerais, essa opinião, e suponho que o que já disse no livro anterior será muito mais facilmente admitido quando tiver mostrado como o entendimento obtém todas as ideias que possui, e de que modo e graus elas penetram na mente, e para tal farei apelo a observação e experiência de cada um.

Todas as ideias provêm da sensação ou da reflexão. Suponhamos, pois, que a mente é, como dissemos, um papel em branco, vazio de todos caracteres, sem quaisquer ideias. Como vem a ser preenchida? Como lhe vem esse vasto estoque que a ativa e ilimitada fantasia humana pintou nela com uma variedade quase infinita? Como lhe vem todo o material da razão e do conhecimento? A isso respondo com uma palavra: pela experiência. É na experiência que está baseado todo o nosso conhecimento, e é dela que, em última análise, o conhecimento é derivado. Aplicada tanto aos objetos sensíveis externos quanto às operações internas de nossa mente, que são por nós mesmos percebidas e refletidas, nossa observação sempre supre nosso entendimento com todo o material do pensamento. Essas são as duas fontes de nosso conhecimento, das quais jorram todas as ideias que temos ou que podemos naturalmente ter. (John Locke, Ensaio sobre o entendimento humano, Livro II, Cap. 1)

2. HUME (1711-1776)

(...) quando analisamos nossos pensamentos ou ideias, por mais complexos e sublimes que sejam, sempre descobrimos que se resolvem em ideias simples que são cópias de uma sensação ou sentimento anterior. Mesmo as idéias que, à primeira vista, parecem mais afastadas dessa origem mostram, a um exame mais atento, ser derivadas dela. A ideia de Deus, correspondendo a um Ser infinitamente inteligente, sábio e bom, surge das reflexões que fazemos sobre as operações de nossa própria mente, aumentando sem limites essas qualidades de bondade e sabedoria. Podemos prosseguir esse exame tanto quanto desejarmos, e sempre descobriremos que todas as ideias que examinamos são copiadas de uma impressão semelhante. Aqueles que afirmam que essa posição não é universalmente verdadeira nem sem exceções têm apenas um único e bastante fácil método de refutá-la: apresentar uma ideia que em sua opinião não seja derivada dessa fonte. Caberá então a nós, se quisermos sustentar nossa doutrina, indicar a impressão ou percepção viva que lhe corresponda.

Page 2: Citações sobre Locke e Hume

(...) se ocorre que, por um defeito de um órgão, um homem não é suscetível de determinada espécie de sensação, sempre descobrimos que é igualmente incapaz de ter as ideias correspondentes. Um cego não pode ter idéia de cores, nem um surdo de sons. Se restituirmos a cada um deles o sentido que lhes falta, abrindo caminho à entrada dessas sensações, abre-se igualmente caminho às ideias, e ele não terá dificuldade em conceber esses objetos. O mesmo acontece quando o objeto adequado para provocar uma determinada sensação nunca foi aplicado ao órgão correspondente. Um lapão ou um negro não tem nenhuma noção do gosto do vinho. E, embora sejam raros ou ine¬xistentes os casos de uma deficiência desse gênero na mente, casos de pessoas que nunca experimentaram ou que sejam incapazes de experimentar um senti¬mento ou paixão próprios à sua espécie, apesar disso encontramos a mesma observação em grau mais atenuado. Um homem de comportamento tímido não pode fazer ideia de um inveterado espírito de vingança ou crueldade; nem um coração egoísta pode facilmente conceber os extremos da amizade e da generosidade. Admite-se facilmente que outros seres possam ser dotados de muitos sentidos que sequer imaginamos, porque as ideias de tais coisas nunca foram introduzidas em nós da única maneira pela qual uma ideia pode ter acesso à mente, isto é, pela sensação efetivamente presente. (David Hume, Investigação sobre o entendimento humano, sec. II, 14 e 15)

(. . .) se há alguma relação entre objetos que nos importa conhecer perfeitamente é a de causa e efeito. Sobre ela se fundamentam todos nossos raciocínios sobre questões de fato e de existência. (...) A única utilidade imediata de todas as ciências é nos ensinar a regular e controlar os eventos futuros através de suas causas. Nossos pensamentos e nossas investigações sempre se dirigem, portanto, a essa relação. Contudo, tão imperfeitas são as ideias que formamos a esse respeito que é impossível dar uma definição correta de causa; exceto o que tiramos do que lhe é estranho e exterior. Objetos- semelhantes sempre se encontram em conexão com objetos semelhantes. Disso temos experiência. De acordo com essa experiência, podemos definir uma causa como um objeto seguido de outro de tal forma que todos os objetos semelhantes ao primeiro são seguidos de objetos semelhantes ao segundo. Ou, em outros termos, tal que, se o primeiro objeto não existisse, o segundo também não existiria. O aparecimento de uma causa sempre traz à mente, por uma transição costumeira, a ideia de efeito. Disso também temos experiência. Podemos, assim, conforme essa experiência, formular uma outra definição de causa que chamaríamos de um objeto seguido de outro, e cuja aparição sempre conduz o pensamento à ideia desse outro objeto. (. ..) Ouso assim afirmar como uma proposição geral que não admite exceção que o conhecimento dessa relação não se obtém em nenhum caso pelo raciocínio a priori, mas que ela nasce intei¬ramente da experiência quando descobrimos que objetos particulares estão em conjunção uns com os outros. (David Hume, Investigação sobre o entendimento humano, séc. VII)