cavalcante, ludmila oliveira holanda; batista, maria do...

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1 CAVALCANTE, Ludmila Oliveira Holanda; BATISTA, Maria do Socorro Xavier. A produção e a socialização da pesquisa sobre a Educação do Campo a partir dos encontros de pesquisa e pós graduação do Norte e Nordeste (EPENN): período 2007 2011. In: GOMES, Alfredo Macedo; LEAL, Telma Ferraz (orgs.) recife: Editora da UFPE, 2014. A PRODUÇÃO E A SOCIALIZAÇÃO DA PESQUISA SOBRE A EDUCAÇÃO DO CAMPO A PARTIR DOS ENCONTROS DE PESQUISA E PÓS GRADUAÇÃO DO NORTE E NORDESTE (EPENN): período 2007 2011 1 Ludmila Oliveira Holanda Cavalcante (UEFS) 2 Maria do Socorro Xavier Batista (UFPB) 3 1 Introdução O objetivo do presente artigo é mapear e discutir a socialização da produção científica a cerca da Educação do Campo no espaço do EPENN, a partir do convite para a realização de um texto encomendado pela organização do evento, no âmbito do GT 06 Educação Popular. Tal proposta advinha da necessidade de se redimensionar o papel dos encontros de pesquisa de caráter regional e teve como uma das ações articuladoras, mapear a produção científica de cada grupo de trabalho presente na trajetória dos eventos regionais. Assim, os variados GTs tiveram como tarefa a sistematização da produção científica de cada grupo, via o Estado da Arte dos diferentes temas que consolidam os debates e pesquisas no Norte e Nordeste. Com a (não explicada) exclusão do GT da Educação do Campo, a apresentação do seu Estado da Arte, foi relocada para o GT da Educação Popular. Tivemos então neste encontro, a irônica situação onde o GT de Educação Popular ao abrigar a apresentação da sistematização da produção científica do GT da Educação do Campo (este excluído da programação do evento), perdia a chance de conhecer a trajetória de análise do seu próprio campo de estudo. Como resultado, no encontro 1 Texto encomendado e apresentado no GT 6 Educação Popular no XXI Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e Nordeste (EPENN) 2 Professora Titular do Departamento de Educação, pesquisadora da Equipe de Estudos e Educação Ambiental da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e integra o corpo docente do Programa de Pós Graduação em Educação da UEFS; Mestra pelo Institute of Education da Universtity of London, Inglaterra e doutora em Educação pela Faculdade de Educação da Bahia-UFBA. É assessora pedagógica do Curso de Direito do PRONERA/UEFS e desenvolve projetos de pesquisa e extensão na área da educação do campo. 3 Professora Associada da Universidade Federal da Paraíba com atuação no Programa de Pós-Graduação em Educação, do Centro de Educação, na Linha de pesquisa em Educação Popular, desenvolvendo pesquisas sobre Políticas de Educação Superior voltadas para os povos do campo, educação escolar nas escolas do campo e dos assentamentos de reforma agrária em dez municípios paraibanos. Realiza projetos de extensão de formação continuada de educadores do campo e participa do Comitê Estadual de Educação do Campo da Paraíba.

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CAVALCANTE, Ludmila Oliveira Holanda; BATISTA, Maria do Socorro Xavier. A produção e a

socialização da pesquisa sobre a Educação do Campo a partir dos encontros de pesquisa e pós

graduação do Norte e Nordeste (EPENN): período 2007 – 2011. In: GOMES, Alfredo Macedo;

LEAL, Telma Ferraz (orgs.) recife: Editora da UFPE, 2014.

A PRODUÇÃO E A SOCIALIZAÇÃO DA PESQUISA SOBRE A EDUCAÇÃO DO CAMPO

A PARTIR DOS ENCONTROS DE PESQUISA E PÓS GRADUAÇÃO DO NORTE E

NORDESTE (EPENN): período 2007 – 20111

Ludmila Oliveira Holanda Cavalcante (UEFS)2

Maria do Socorro Xavier Batista (UFPB)3

1 – Introdução

O objetivo do presente artigo é mapear e discutir a socialização da produção científica a cerca

da Educação do Campo no espaço do EPENN, a partir do convite para a realização de um texto

encomendado pela organização do evento, no âmbito do GT 06 Educação Popular. Tal proposta

advinha da necessidade de se redimensionar o papel dos encontros de pesquisa de caráter regional e

teve como uma das ações articuladoras, mapear a produção científica de cada grupo de trabalho

presente na trajetória dos eventos regionais. Assim, os variados GTs tiveram como tarefa a

sistematização da produção científica de cada grupo, via o Estado da Arte dos diferentes temas que

consolidam os debates e pesquisas no Norte e Nordeste.

Com a (não explicada) exclusão do GT da Educação do Campo, a apresentação do seu Estado

da Arte, foi relocada para o GT da Educação Popular. Tivemos então neste encontro, a irônica

situação onde o GT de Educação Popular ao abrigar a apresentação da sistematização da produção

científica do GT da Educação do Campo (este excluído da programação do evento), perdia a chance

de conhecer a trajetória de análise do seu próprio campo de estudo. Como resultado, no encontro

1 Texto encomendado e apresentado no GT 6 – Educação Popular no XXI Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e

Nordeste (EPENN) 2 Professora Titular do Departamento de Educação, pesquisadora da Equipe de Estudos e Educação Ambiental da

Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e integra o corpo docente do Programa de Pós Graduação em

Educação da UEFS; Mestra pelo Institute of Education da Universtity of London, Inglaterra e doutora em Educação pela

Faculdade de Educação da Bahia-UFBA. É assessora pedagógica do Curso de Direito do PRONERA/UEFS e desenvolve

projetos de pesquisa e extensão na área da educação do campo. 3 Professora Associada da Universidade Federal da Paraíba com atuação no Programa de Pós-Graduação em Educação,

do Centro de Educação, na Linha de pesquisa em Educação Popular, desenvolvendo pesquisas sobre Políticas de

Educação Superior voltadas para os povos do campo, educação escolar nas escolas do campo e dos assentamentos de

reforma agrária em dez municípios paraibanos. Realiza projetos de extensão de formação continuada de educadores do

campo e participa do Comitê Estadual de Educação do Campo da Paraíba.

2

regional de 2013, a Educação Popular perdeu a oportunidade da sistematização de sua trajetória de

pesquisa ao longo dos EPENNs, a Educação do Campo perdeu o território específico de apresentação

da sua sistematização dentro do próprio evento. Como consequência, ressaltamos a importância da

retomada do nosso Gt, e a necessidade do registro sistemático da tradicional trajetória de pesquisa da

Educação Popular no Epenn.

A discussão deste texto no GT de Educação Popular com a presença de vários participantes

interessados na Educação do Campo proporcionou um debate sobre a produção acadêmica que versa

sobre este tema evidenciando seu avanço em termos de políticas e de experiências que inspiram

pesquisas e ressaltou a necessidade de reinserção de um GT como espaço próprio de socialização do

conhecimento produzido sobre esta temática, o que acabou sendo aprovado na plenária final do

evento.

2. A Educação do Campo: qual o campo de estudo?

A Educação do Campo é a nomenclatura que surge no final dos anos 1990, em meio a um rico

processo de ressignificação conceitual e política em torno das condições educacionais existentes nas

escolas presentes na zona rural do Brasil ao longo da história de descaso para com as suas

populações. Tal agenda política nasce de um engenhoso processo de organização e lutas no campo,

demarcado pelo enfrentamento circunscrito no território da questão agrária brasileira. O debate da

Educação do Campo não tem sua gênese na discussão educacional, mas antes, na disputa pela vez e

voz na arena política permeada pela desigualdade social construída no Brasil desde seus tempos

remotos de colonização. E dentro desta perspectiva, segundo Fernandes (2005, p.1), para “[...]

compreender a origem deste conceito é necessário salientar que a Educação do Campo nasceu das

demandas dos movimentos camponeses na construção de uma política educacional para os

assentamentos de reforma agrária”.

No início dos anos 2000, Damasceno e Beserra, anunciaram um cenário de desinteresse nas

pesquisas educacionais para o tema do “rural” para o qual era atribuída uma conexão entre valores

ideológicos, culturais e inclusive de ordem material financeira (como por exemplo, as dificuldades

para realização de pesquisas e financiamentos para tal). Segundo as autoras, o desinteresse

“generalizado” refletia uma sintonia entre “interesses dominantes do Estado e os interesses

dominantes na Universidade” que demonstravam o complexo efeito dominó entre prioridades de

estudos, anúncios de editais, agências de fomento e as relações circunscritas neste cenário

(DAMASCENO, BESERRA, 2004, p. 78). Sendo assim, “questões marginais aos interesses do

Estado” são normalmente distanciadas ou desestimuladas frentes às condições exequíveis de

realização de pesquisas no país.

3

Mesmo com a histórica e proporcional invisibilidade acadêmica em torno da educação no

rural brasileiro, as pesquisas relacionadas ao tema, tem tido um significativo crescimento ao longo

dos últimos dez anos. Autores como Arroyo, Caldart e Molina (2004), Fernandes (2005), Souza

(2008), Munarin (2008), Antunes-Rocha (2009, 2011) entre outros, vão adentrando no cenário

acadêmico com o anúncio de um rural em movimento, o campo. Entre a história, as lutas, as

regulações e as ações, vão surgindo análises e interpretações sobre os rumos de um paradigma

educacional que se propõe visceral para o anúncio, a busca e o desejo de um outro projeto de

sociedade, dentro do qual o campo é visto sob uma lógica diferenciada.

É nesta perspectiva que a política de Educação do Campo traz para a agenda da academia

outro referencial educacional pensado a partir dos sujeitos de luta e organização, presentes na

dinâmica sócio política e cultural que se consolida na relação (de conexões e distanciamentos) entre

campo e cidade. Nesta dinâmica, o campo é um rural de vida e potencial de rebeldia construído na

labuta das resistências, da organização social e coletiva dos seus sujeitos. E sendo assim, a educação

rural passa a representar uma abordagem educacional que não encontrava eco nesta dinâmica e seus

movimentos.

Ressaltamos que esta trajetória de luta tem longa data e pode ser circunscrita aqui e ali na

história do popular no Brasil (PALUDO, 2001) como um contraponto das relações opressivas,

naturalizadas e consolidadas pela nossa sociedade desigual. A Educação do Campo é originada nas

experiências de educação popular promovidas pelas classes populares desde os anos 1950, e

desenvolvidas com mais pujança pelos movimentos sociais nas lutas por reforma agrária, nos

acampamentos e assentamentos pelo interior do Brasil. Esta perspectiva de educação surge como

práxis e como proposta política e pedagógica demandada ao Estado para que o poder público assuma

sua responsabilidade na garantia do direito à educação dos povos que habitam e trabalham no campo,

aos quais historicamente a educação de qualidade foi negada.

Os estudos ainda sob a nomenclatura de educação rural, já refletiam a necessidade de transformar

o debate educacional em outra lógica de compreensão daquele espaço e sob a perspectiva de seus

povos e culturas. Ainda sob o termo educação rural, Damasceno e Beserra (2004), afirmavam:

é interessante observar que mesmo sem serem guiados pelos mesmos interesses

teórico- metodológicos, a maioria dos estudos produzidos na área apresenta dados que

instigam a discussão de propostas alternativas de educação rural em cujo centro

estejam os interesses dos trabalhadores rurais. (p.82)

Na década de 1990, o conceito ou paradigma de Educação do Campo, foi denominado na I

Conferência Nacional: Por uma Educação Básica do Campo e torna expressão mais evidente no

cenário político educacional e acadêmico após 1997, com a realização do I ENERA - I Encontro

Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária. O ENERA deu o impulso para uma série

4

de encontros, seminários, conferências e uma articulação de diversos movimentos sociais do campo4,

criando um Movimento Nacional de Educação do Campo no Brasil, que inseriu a Educação do

Campo na agenda política do país, tanto dos movimentos sociais quanto do poder público no final

dos anos 90 e início dos anos 2000.

Segundo Fernandes,

[...] atribuímos à Educação do Campo, a política educacional voltada

para o desenvolvimento do território camponês como parte do campo

brasileiro. Este território é um campo especifico e diverso que possui

singularidade na sua organização por meio do trabalho familiar. Portanto, não

estamos falando de um campo genérico, mas sim de um Campo como

território camponês. Daí, a ênfase na contração do Campo. Porque o Campo é

ponto de partida e de chegada de nossas análises. Não é no Campo, porque o

território não é secundário. (FERNANDES, p. 3, 2005)

Com a criação do PRONERA – Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária, em

1998, pelo então Ministério Extraordinário de Política Fundiária (atual Ministério do

Desenvolvimento Agrário) e executado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

(INCRA), a Educação do Campo entra nas universidades públicas, no ensino, na pesquisa e na

extensão, pois esse programa se concretiza a partir de parcerias entre os movimentos sociais,

universidades e o INCRA/PRONERA. Desde então esse programa executou ações educativas que

vão desde a alfabetização de jovens e adultos, escolarização Ensino Fundamental, Ensino Médio,

Superior e de Pós-Graduação Latu senso (Especialização em Residência Agrária), atingindo um

público de 346.629 mil pessoas até 2010 (dados do INCRA, citados por LERRER, 2012, p. 454).

Nos anos 2000, após a II Conferência Nacional de Educação do Campo, em Luziânia, e a

consequente aprovação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo

(BRASIL, 2001) delineou-se um desafiante processo para a efetivação das políticas e a concretização

das lutas dos povos do campo. O desafio entre outras coisas encontrava-se no cuidado em não deixar

que se perdesse o sentido da luta pela educação atrelada à questão agrária, a diversidade dos sujeitos

4 Os movimentos sociais que têm participado do movimento por uma educação do campo: Movimento dos Trabalhadores

Rurais Sem Terra (MST); Movimento de Organização Comunitária (MOC); Confederação Nacional dos Trabalhadores na

Agricultura (CONTAG); Movimento das Mulheres Trabalhadoras Rurais (MMTR); Movimento dos atingidos por

Barragem (MAB); União Nacional de Escolas Famílias do Brasil – UNEFAB; Movimento dos Pequenos Agricultores

(MPA), MMC; Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil – FEAB; SEAP/PR,TEM; Federação dos

Trabalhadores na Agricultura Familiar - FETRAF, Comissão Pastoral da Terra (CPT), União Nacional das Escolas

Familiares Agrícolas - UNEFAB, Conselho Indigenista Missionário (CIMI); Movimento de Educação de Base – MEB;

Pastoral da Juventude Rural (PJR), Rede da Igreja Católica de atuação social - Cáritas; Centro de Estatística Religiosa e

Investigações Sociais - CERIS; Rede de Educação do Semi-árido Brasileiro - RESAB; Serviço de Tecnologia Alternativa,

organização não governamental - SERTA; Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada - IRPAA; Associação

Caatinga, Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – CAATINGA; Associação Regional das Casas Familiares

Rurais – ARCAFAR SUL/NORTE; Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural - ASSESOAR; FÓRUM –

Comunidades Quilombolas (QUILOMBOLA). Com apoio de entidades sindicais e científicas como SINASEFE,

Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES), Confederação Nacional dos

Trabalhadores em Educação (CNTE). Além disso, as seguintes instituições integram e apoiam esse movimento:

Associação dos Geógrafos do Brasil - AGB; Ministério do Meio Ambiente – MMA; Comissão de Educação e Cultura da

Câmara dos Deputados – Frente Parlamentar; Centros Familiares de Formação por Alternância CEFFA´S; Conferência

Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB; UnB, UNICEF, UNESCO, UNDIME, MDA/INCRA/PRONERA – MEC– MinC,

CONSED.

5

e dos movimentos sociais do campo. Desafios estes, que ao longo destes últimos anos, podemos

perceber como grandes questões para debates em torno do “campo”.

Além das Diretrizes (Resolução CNE/CEB nº 1), ao longo de cerca de quinze anos o

movimento por Educação do Campo obteve várias avanços do ponto de vista do ordenamento

jurídico, regulamentando definições de políticas de Educação do Campo 5.

No que concerne à experiência da política de Educação do Campo junto à academia, podemos

chamar atenção para algumas ações importantes como os programas de Educação do Campo que vão

surgindo e inserindo o debate do campo nas universidades mediante editais e estratégias de diálogo

entre academia, movimentos sociais e INCRA. Foram criados programas como Saberes (2005),

Projovem campo – saberes da Terra e o Programa de Apoio à formação superior em Licenciaturas em

Educação do Campo, o Procampo, criado em 2008, o qual foi desenvolvido inicialmente como

projeto piloto pelas universidades federais de Minas Gerais (UFMG), Sergipe (UFS), Bahia (UFBA)

e Universidade de Brasília (UNB). Ressalta-se também, a inserção das disciplinas obrigatórias e ou

optativas no currículo de cursos regulares de formação docente na academia, como por exemplo, os

cursos de Licenciatura em Pedagogia (CAVALCANTE, 2013).

Ressaltamos que, até 2010 a Licenciatura em Educação do Campo foi desenvolvida por cerca

de 30 universidades, com aproximadamente 2.200 estudantes nos cursos de Licenciatura em

Educação do Campo (ANTUNES-ROCHA, 2011, p. 142). Em 2012 com o Edital de Chamada

Pública nº 2, de 31/08/2012, foi aprovada a criação de 45 cursos permanentes em torno do tema, o

que certamente contribuirá para consolidar o campo da Educação do Campo como área de ensino,

pesquisa e extensão nas universidades.

A realização dos cursos de Educação do Campo e a presença dos camponeses na dinâmica

universitária foram aspectos importantes para a introdução das temáticas do campo. Ressaltamos

também aspectos como o incentivo à criação de vários grupos de estudos envolvendo professores e

estudantes interessados e ou comprometidos com o tema, o fomento à produção de várias pesquisas

nos níveis de graduação e de pós-graduação, e o crescente número de projetos financiados por

agências de fomento tais como CNPq e CAPES. Importante destacarmos as pesquisas aprovadas pelo

Programa Observatório da Educação, da CAPES: A educação superior no Brasil (2000-2006): uma

análise interdisciplinar das políticas para o desenvolvimento do campo brasileiro, aprovado pelo

Edital 01/2006 INEP/CAPES, iniciado em 2007, tendo à frente três Universidades: Universidade de

Brasília, a Universidade Federal do Rio Grande Norte e a Universidade Federal de Sergipe, sob a

coordenação das professoras Dra. Mônica Castagna Molina; Dra. Irene Alves de Paiva e Dra. Sônia

5 Citamos como por exemplos a Resolução CNE/CEB nº 2, de 28/04/2008, que estabelece diretrizes complementares,

normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do Campo, Parecer

CNE/CEB Nº:1/2006. Trata de Dias letivos para a aplicação da Pedagogia de Alternância nos Centros Familiares de

Formação por Alternância (CEFFA), Decreto nº 7.352, de 4/11/2010 – Dispõe sobre a política de educação do campo e o

Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA, Resolução CNE/CEB 4/2010, que reconhece, na

Seção IV, a Educação Básica do Campo como uma modalidade e com a criação de diversos programas.

6

Meire Santos Azevedo de Jesus e “A educação superior no Brasil (2000-2008): uma análise

interdisciplinar das políticas para o desenvolvimento do campo brasileiro”, do Observatório da

Educação financiado pelo edital no 001/2008 – CAPES/INEP/SECAD são elas a Universidade

Federal da Paraíba (UFPB), a Universidade Federal do Pará (UFPA), a Universidade Federal de

Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Federal do Ceará (UFC).

O significativo volume de produção de conhecimentos passou ser apresentado em diversos

eventos acadêmicos já consolidados na área de educação6, como nas reuniões anuais da Associação

Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), Encontro Nacional de Didática e

Práticas de Ensino (ENDIPE)7, VI Simpósio Internacional de Geografia Agrária e do VII Simpósio

Nacional de Geografia Agrária8.

Além disso, ao longo desta década, vários foram os eventos9 específicos de Educação do

Campo vem sendo realizados por diversas universidades brasileiras, entre os quais destacamos:

Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG: I e II Encontro Mineiro de Educação do

Campo.

Universidade Federal da Paraíba (UFPB): I Encontro de Pesquisas e Práticas em Educação do

Campo da Paraíba, 2011; II Encontro de Pesquisas e Práticas em Educação do Campo da

Paraíba, 2013; I Seminário de Pesquisas e Práticas do Curso de Pedagogia – Educação do

Campo, 2012.

Universidade de Brasília (UNB): I, II e III Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do

Campo, III Seminário sobre Educação Superior e as Políticas para o Desenvolvimento do

Campo Brasileiro e I Encontro Internacional de Educação do Campo (2010).

Universidade Federal do Pará (UFPA): I, II, III Encontro de Pesquisa em Educação do Campo

do Estado do Pará e I Seminário de Licenciatura em Educação do Campo do Pará e Amapá.

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC): I e II Seminário de Pesquisa em Educação

do Campo.

Universidade Federal de São Carlos (UFSCar): I e II Seminário Nacional de Estudos e

Pesquisas em Educação do Campo e IV Jornada de Educação Especial no campo. Educação

do Campo: conteúdo e Método.

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB): I Seminário Internacional de

Educação do Campo Da UFRB / II Seminário Estadual de Educação do Campo (Bahia) / II

Seminário de Educação do Campo do Recôncavo e Vale do Jiquiriçá e IV Encontro de

Educação do Campo de Amargosa.

6 No decorrer da elaboração do texto fizemos um breve levantamento de eventos de divulgação científica da pesquisa em

Educação do campo em outros espaços de divulgação científica como os encontros específicos de Educação do Campo e

no diretório de grupos de pesquisa da plataforma lattes. 7 No XV ENDIPE – Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino: convergências e tensões no campo da formação e

do trabalho docente: políticas e práticas educacionais, realizado em 2010, em Belo Horizonte, o Subtema Sub Tema 10 –

Educação do Campo foi organizado em simpósios, painéis e pôsteres. Foram submetidos (07) sete painéis e (37) trinta e

sete pôsteres. Os pareceristas aprovaram todos os painéis e 29 (vinte e nove) pôsteres. Deste evento resultou a publicação

do livro: SOARES, Leôncio [et al.] (organização). Convergências e tensões no campo da formação e do trabalho

docente. Belo Horizonte : Autêntica, 2010.771p. A Organização da Parte III do livro - Educação do Campo:

convergências e tensões no campo da formação e do trabalho docente foi de Maria Isabel Antunes Rocha. Este livro está

disponível em: http://www.fae.ufmg.br/endipe/livros/Livro_2.PDF. 8 Ocorrido em setembro de 2013, em João Pessoa, com a inscrição de 72 trabalhos no GT de Educação do Campo.

9 O levantamento foi feito em sites da internet, pelos descritores encontros de educação do campo e seminários sobre

educação do campo.

7

Universidade Estadual da Bahia (UNEB) – Campus I: I, II e III Seminário de Educação do

Campo e Contemporaneidade: Educação do Campo e Contemporaneidade: políticas e

itinerâncias.

Universidade Federal de Alagoas (UFAL): I Encontro de Pesquisa em Educação do Campo.

Universidade Federal de Pelotas (UFPel): I Seminário Internacional e o I Fórum de Educação

do Campo da Região Sul do RS: campo e cidade em busca de caminhos comuns.

Universidade do Estado do Pará (UNEP): Seminário: „Educação do Campo‟ na Amazônia:

desafios teóricos e práticos.

Autarquia de Ensino Superior de Arco Verde (AESA): II Seminário Nacional de Educação do

Campo e Diversidade Cultural.

Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR-Campus Paranavaí-PR): I Seminário de

Educação do Campo e políticas públicas: território e territorialização da Educação do Campo:

a escola do campo na educação pública.

Tais eventos apresentam experiências, estudos e pesquisas em Educação do Campo com uma

vasta produção e diversidade de temáticas que denotam a pujança desse tema nas pesquisas das

universidades brasileiras.

Destaca-se também a criação de Mestrado Profissional de Educação do Campo na Universidade

Federal do Recôncavo da Bahia, a inserção de Linhas de Pesquisa em Educação do Campo em vários

Programas de pós-graduação em Educação (UFSC, UNB, UFMG) e a criação e oferta de disciplinas

em vários cursos de pós-graduação.

Toda esta constatação em torno da inserção do tema da Educação do Campo nas dinâmicas

acadêmicas em seus formatos de ensino, pesquisa e extensão, tem trazido para o debate um amplo

cenário de pesquisas e estudos que vão delineando uma diversa perspectiva de trabalhar com o tema

e/ou percebê-lo como foco analítico e conceitual de importância. A implantação da política pública

em Educação do Campo e a vasta possibilidade de atuação sejam, via órgãos governamentais,

organizações da sociedade civil, movimentos sociais, espaços escolares e não escolares, fazem do

tema um cenário de perspectivas múltiplas muitas vezes até distanciado de sua gênese política no

debate da questão agrária.

A chamada para uma análise do perfil da produção científica na área da EC, pode nos ajudar a

acender este debate e compreendê-lo nos potenciais e riscos dentro das pesquisas educacionais, este é

um exercício por si só desafiador e sempre inconclusivo.

3 - Definindo o itinerário da pesquisa sobre Educação do Campo no Norte e Nordeste

Com a proposta inicial de realizar o Estado da Arte da Educação do Campo nas regiões do

Norte e do Nordeste, consideramos que o mais viável para o contexto do trabalho, seria uma busca

pelo percurso do tema dentro dos Encontros de Pesquisa em Educação do Norte e Nordeste

(EPENN). Tal opção, embora não suficientemente consistente para que tenhamos a demarcação

regional das pesquisas no tema, é um ponto de partida para lançarmos mão de um recurso de debate

acadêmico que nos ajude a compreender o cenário das pesquisas sobre o campo e suas derivações

8

político pedagógicas nos contextos universitários do Norte e do Nordeste brasileiros que são

socializados nos fóruns acadêmicos de reconhecida importância.

Segundo Ferreira,

As pesquisas em “estado da arte” são reconhecidas por realizarem uma

metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e científica

sobre o tema que busca investigar, à luz de categorias e facetas que se caracterizam

enquanto tais em cada trabalho e no conjunto deles, sob os quais o fenômeno passa a

ser analisado (FERREIRA, 2002, p. 258).

Temos ciência de que a proposta deste artigo dificilmente esgota as demandas pela

compreensão ampla e qualificada no campo de estudo da Educação do Campo, no entanto,

percebemos esta como uma importante estratégia de amadurecimento das nuances de análise que

subjazem neste debate.

Sendo assim, as categorias e facetas (FERREIRA, 2002) neste estudo da Educação do Campo,

se encontram na pertinência que o debate toma nos fóruns específicos de discussão nos EPENNs seja

por conta de uma perspectiva de debates acadêmicos nos quais a temática encontra afinidades (como

por exemplo, junto aos movimentos sociais, experiências da educação popular e educação de jovens e

adultos), seja na perspectiva da interface do tema Educação do Campo, junto a outros temas de

importância, como por exemplo, o debate da formação de professores, a perspectiva das políticas

educacionais, a história da educação, entre outras. O desafio é observar como as trajetórias de análise

de um fenômeno podem ser vistas sob prismas diferenciados ao tempo que conectados em interfaces

temáticas, como pressupõe o trabalho junto às pesquisas qualitativas (MOREIRA, 2003).

O EPENN é um encontro regional de pesquisa em educação mais antigo do Brasil e tem por

objetivo “socializar a produção teórica prática no campo educacional e fortalecer os programas de

pós-graduação em educação do Norte e Nordeste” 10

. Mapear o percurso do tema da Educação do

Campo no EPENN, portanto pode trazer subsídios importantes para uma compreensão de como o

objeto de estudo tem se inserido na academia em âmbito regional.

O Encontro tem sua organização bianual capitaneada por programas de pós-graduação das

duas regiões brasileiras sob a articulação do Fórum Nacional de Coordenadores de Programas de

Pós-Graduação em Educação (FORPRED - Norte e Nordeste). Ao sediar o evento em seu estado, o

Programa de Pós graduação local passa a assumir junto ao FORPRED a maior parte da dinâmica

organizacional do Encontro. Apesar de vinculada à Associação Nacional de Pesquisa e Pós

Graduação em Educação (ANPED), o EPENN assume em sua regionalidade as questões relativas à

própria configuração e execução do evento com o apoio do conjunto de programas das duas regiões.

Nesta perspectiva, o acervo das produções científicas dos EPENNs fica sob a responsabilidade das

instituições locais que o sediam por um período específico entre a organização e a execução do

10

Site do XX EPENN . Disponível em: <http://faced.ufam.edu.br/portal/index.php?option=com content

&view=article&id=55&catid=44&Itemid=68> . Acessado em 20/10/2013

9

evento. Nesta lógica organizacional, não há um site específico do EPENN como fórum de discussão,

apenas sites pontuais correspondentes a cada edição acontecida.

Dito isto, é importante ressaltar que o EPENN, diferente das reuniões anuais da ANPED,

apresenta condições de organização e configuração bem diferentes da versão nacional apesar da

pretensa articulação entre os fóruns. Pesquisar a produção científica via os encontros regionais é,

portanto um desafio no sentido de que existe uma trajetória incerta no que concernem os formatos de

sua organização e inclusive nos processos de edição, sistematização, registros e configuração dos

seus grupos de trabalho.

Como procedimento metodológico, além do recorte temporal dos encontros de 2007, 2009,

2011 foram identificados os grupos de trabalhos que na nossa perspectiva, poderiam apresentar mais

sintonia com o tema da Educação do Campo, foram eles: GT 03 Educação e Movimentos Sociais; GT

06 Educação Popular; GT 18 Educação de Jovens e Adultos; GT 23 Gênero, Sexualidade; Educação

Rural e Educação Indígena11

. Ainda assim, ao longo desta pesquisa, percebemos que o tema surgia

em demais fóruns de discussão e outros grupos de trabalho traziam, ainda de que forma tangencial, o

debate do “campo” em suas discussões. E sendo assim, optamos por descrever quantitativamente

estas incidências evidenciadas ao longo dos registros dos Anais.

O olhar sobre esta produção baseou-se nas orientações de Bardin quando nos apresenta o

potencial de investigação mediante estratégias de Análise de Conteúdo. Segundo a autora, Análise de

Conteúdo é

Um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando a obter, por

procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das

mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de

conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens

(BARDIN, 1979:42).

Nesta perspectiva, de posse da mídia digital dos Encontros, foram mapeados os trabalhos em

formato de Pôster e Comunicação Oral que tivessem em seu escopo de análise os temas envolvendo

as palavras chaves tais como: educação do campo, educação rural, escola rural, sujeitos do campo,

educação indígena, PRONERA, educação contextualizada, classes multisseriadas, movimentos

sociais do campo, educação quilombola, Pedagogia da Alternância, escolas famílias agrícolas,

Movimentos dos Trabalhadores Sem Terra, entre outras. Com tais palavras chaves foram

investigados os resumos dos trabalhos com a esperança de se obter uma visão das discussões

apresentadas no fórum de pesquisas em educação de caráter regional.

Estamos cientes de que os resumos dos Anais nem sempre apresentam a perspectiva teórico

metodológica das pesquisas apresentadas, o que dificulta sobremaneira uma melhor avaliação da

consistência e perspectiva analítica presente nos textos, ainda assim, os conteúdos apresentados nos

11

Tais nomenclaturas ao longo dos últimos encontros vão sofrendo alterações, principalmente no que concerne o GT em

que se encontra o tema “educação rural”.

10

resumos anunciam brevemente os interesses dos pesquisadores em torno da temática do campo e um

possível cenário das “mensagens” através deles.

4 Mapeando a Educação do Campo no EPENN

Tentando compreender melhor a trajetória da educação do campo no EPENN, realizamos um

mapeamento12

da temática nos eventos de 200713

, 200914

e 201115

destacando a incidência nos GTs

com trabalhos envolvendo questões relativas à educação no meio rural e movimentos sociais do

campo. Ressaltamos que tais questões sempre estiveram presentes em diversos GTs, mas, com maior

incidência nos GTs que abordavam os temas: Educação Rural, Educação Indígena; Educação e

Movimentos Sociais e Educação Popular.

Inicialmente vale ressaltar que, desde 2005, a temática da Educação do campo tem estado

presente nos grupos de trabalho do EPENN. Neste Encontro, ocorrido nos dias 14 a 27 de junho, em

Belém do Pará, observou-se que a temática da Educação do campo, embora não tivesse essa

denominação, surge expressiva no GT 24 de Educação Rural e Educação Indígena com 14 trabalhos

apresentados. Nos GTs de Gênero, Sexualidade com 01, no GT 04 - Educação e Movimentos Sociais

foram 04 trabalhos, no GT 08 Formação de Professores teve 01 trabalho, no GT 12 Currículo foram

apresentados 02 trabalhos, perfazendo ao todo vinte e três (23) trabalhos neste evento.

No XVIII EPENN, ocorrido em 2007, haviam 23 grupos de trabalho, sendo que o GT 23

sediava os debates de Gênero, Sexualidade; Educação Rural e Educação Indígena. Observando a

tabela a seguir, podemos inferir que o tema da Educação do Campo teve uma quantidade significativa

de trabalhos durante o evento, principalmente nos GTs 3 e 23.

Quadro 1 - Textos no tema da Educação do Campo no XVIII EPENN- 2007

Formato

GT 03

Educação e

Mov.

Sociais

GT 06

Educação

Popular

GT 18

EJA

GT 23 Gênero,

Sexualidade;

Educação

Rural e

Educação

Indígena

Total

Comunicação oral 13 01 05 17 36

Pôsteres 8 01 02 7 18

Sub Total 21 02 07 22 54

12

Para o levantamento dos textos nos CDs dos eventos contamos com o trabalho de estudantes: Ana Clara da Silva

Nascimento e Silvia Karla Batista de Macena Martins dos Santos, do Curso de Pedagogia – Educação do Campo da

UFPB, assim como Eliziane Santana dos Santos e Taílla Caroline Souza Menezes bolsistas de Iniciação Científica da

Licenciatura em Pedagogia da UEFS.

13 XVIII EPENN, com o tema “POLÍTICA DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA E FORMAÇÃO DO PESQUISADOR EM

EDUCAÇÃO”, realizado em Maceió-AL. ISBN: 978-85-7177-330-1 14

XIX EPENN com o tema “EDUCAÇÃO, DIREITOS HUMANOS E INCLUSÃO SOCIAL”, realizado em João

Pessoa, PB. ISBN 978-85-7745-382-5 15

XX EPENN, com o tema “EDUCAÇÃO, CULTURAS E DIVERSIDADE”, realizado em Manaus, AM. ISSN 978-85-

7745382-5.

11

Outros GTs 22

Total 76

No Gt 03, os temas apresentados em forma de pôsteres e comunicação oral, versaram sobre o

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento de Atingidos por Barragens

(MAB), políticas públicas da Educação do Campo, Educação contextualizada, PRONERA, Formação

docente no/do campo. Textos sobre o MST tiveram predominância neste fórum. No Gt 06, de

Educação Popular, houve apenas um texto em formato de comunicação oral, com o tema da

Educação do Campo atrelado à categoria da Educação de Jovens e Adultos. No Gt 18, de Educação

de Jovens e Adultos, foram identificados discussões sobre o PRONERA e EJA no campo, com um

total de 6 textos em formatos de pôsteres e comunicação oral. No Gt 23 surgem as temáticas em torno

da cultura e educação indígena, MST, identidade, formação docente, infância, trabalho e escola,

memórias e narrativas, juventude rural, políticas de Educação do Campo, Pedagogia da Alternância,

questões de gênero (mulheres) do rural.

Em outros Gts, a Educação do Campo surge em interface com variados temas, tais como:

Formação Docente (6 textos); Práticas Pedagógicas com (1 texto); Educação e trabalho (com 1

texto); Políticas (3 textos); Currículo (2 textos); Classes multisseriadas (1 texto).

Neste evento, no conjunto dos textos podemos observar uma forte incidência de trabalhos que

em suas análises usam uma abordagem marxista como referência teórica, e outros tantos que não

chegam a demarcar o referencial teórico metodológico, mas uma predominância de reflexões que se

referem à produção teórica que vem sendo feita pelos estudiosos da Educação do campo, que alguns

autores classificam como “um novo paradigma de educação” (FERNANDES e MOLINA, 2004;

JESUS, 2004).

Devido a um levantamento realizado no EPENN de 200516

(com o já expressivo volume de

produções em torno da temática da Educação do Campo), foi organizado um Colóquio com

pesquisadores interessados no debate que estavam presentes no encontro Norte e Nordeste de 2007,

em Maceió, Alagoas. Neste Colóquio, após um amplo cenário de debates, foi elaborado um

documento dirigido ao fórum de coordenadores com a solicitação para a organização de um Grupo de

Trabalho específico para o tema da Educação do Campo a ser realizado no encontro de 2009. A

proposição foi encaminhada e aprovada na plenária final do EPENN, ficando definida a mudança da

estrutura dos grupos de trabalho apresentados em 2007, principalmente no que concerne os rumos do

GT 23.

16

Mapeamento realizado pela Profa. Maria do Socorro Xavier Batista (2005)

12

No ano de 2009, no 19º Encontro de Pesquisa em Educação do Norte e Nordeste, ocorrido em

João Pessoa na Paraíba, funcionou então o GT23 – Gênero, Sexualidade e Educação; o GT24 –

Educação e Arte e o GT 25 - Educação do Campo. O tema concernente à Educação do Campo esteve

presente em 13 GTs do encontro de 2009, com um total de 120 textos em formato de pôster e

apresentação oral. No que concerne o aspecto quantitativo dos textos, podemos perceber pelo quadro

2, como foram distribuídos ao longo dos grupos de trabalhos.

Quadro 2 Textos no tema da Educação do Campo no XIX EPENN- 2009

FORMATO GT 03

Educação

e Mov.

Sociais

GT 06

Educação

Popular

GT 18

Educação

de

Jovens e

Adultos

GT 25

Educação do

Campo

TOTAL

Comunicação oral 15 04 04 54 77

Pôsteres 02 02 01 10 15

Sub total 17 06 05 64 92

Outros GTs17

28

Total 120

A temática da Educação do Campo esteve presente em mais nove GTs comparecendo com 25

textos em formato de Comunicação Oral, e 03 textos em formato de pôster18

. Computando todos os

trabalhos apresentados nos GTs do EPENN de 2009, obtém-se o resultado de 120 trabalhos relatando

resultados de pesquisas, demonstrando a pujança desse tema na pós-graduação nas regiões Norte e

Nordeste.

Dos 15 trabalhos inscritos no GT 3 – Educação e Movimentos sociais, observou-se uma maior

incidência de textos enfocando a educação e os processos educativos no Movimento dos

Trabalhadores Rurais (MST), com 08 textos. Os objetos de estudos envolviam o caráter educativo e

pedagógico das experiências educacionais, que ocorrem durante a luta pela terra e nos processos

produtivos identificando neles uma educação para cooperação e autogestão. Também foi abordada a

concepção de educação desse movimento.

Outros movimentos são objetos de estudos em alguns textos, destacando-se o movimento

sindical, Movimento dos Atingidos por Barragens, Movimento de Mulheres Trabalhadoras,

movimento socioambientalista no Brasil. Foram também percebidos textos sobre processos

pedagógicos presentes em organizações não governamentais e entidades sociais do campo. A

participação dos movimentos na luta por políticas educacionais do campo e pela defesa da escola

17

Trabalhos completos (25) e pôsteres (03) GT10 Alfabetização, Leitura e Escrita=01, GT19 Educação Matemática=02 18

GT 02 - História da Educação com 06; GT 8 Formação de Professores com 08 GT 09 - Trabalho e Educação 02; GT 10

- Alfabetização Leitura e Escrita com 01;GT 12 – Currículo com 02; GT 15 - Educação Especial com 01; GT 19

Educação Matemática com 02; GT 21 - Educação e Relações Étnico-Raciais com 02; GT 22 - Educação Ambiental com

01;

13

pública são enfatizadas em vários textos, demarcando uma predominância na temática. No âmbito

global é destacado o movimento social “ecosocialist international network (ein)”, que estabelece uma

relação entre educação e ecologia.

Do ponto de vista epistemológico, observa-se que nos referenciais teóricos que embasam as

análises destacam-se conceitos como práxis, autonomia, esperança, resistência, hegemonia e contra

hegemonia. Tais conceitos circunscrevem o paradigma crítico identificado com o corpo conceitual

marxista e freireano, anunciados de forma frequente nos contextos dos resumos. Foi encontrado

também a teoria das representações sociais, embora com menor frequência no aparato teórico e

metodológico das pesquisas apresentadas.

Outros conceitos e temáticas que permeiam a discussão da Educação do Campo envolvem o

desenvolvimento local sustentável, sustentabilidade, relações de gênero, cidadania. Tais temáticas

demonstram uma abrangência nos interesses de pesquisas outras que estabelecem interfaces com o

debate do campo.

O destaque do Encontro de 2009 foi o funcionamento pela primeira vez do GT 25 Educação

do Campo. Com um fórum específico ao debate, o GT contou com a inscrição de 54 textos

envolvendo uma rica diversidade de questões e temas, como por exemplo: a relação entre

movimentos sociais e a Educação do Campo, os saberes e espaços educativos no campo, a resistência

e luta pelo direito à educação em áreas rurais quilombolas, as condições de funcionamento de escolas

do campo, ou escolas rurais, o contexto pedagógico das Escolas Famílias (EFAs), a Pedagogia da

Alternância (PA), a gestão participativa nas EFAs, a formação de educadores do campo, os cursos do

PRONERA, a proposta educacional de apoio ao desenvolvimento sustentável (PEADs), a experiência

da pedagogia do MAB.

Tendo em vista que este foi o primeiro EPENN com um fórum específico para o debate da

Educação do Campo (GT 25) e que aconteceu após cinco anos da realização da IIº Conferência da

Educação do Campo em Goiás, e sete anos após a promulgação das Diretrizes Operacionais, é visível

o incremento da produção científica em torno da temática. Os sujeitos do campo, como anunciado

nas Diretrizes, surgem em sua diversidade cultural, social, regional e pedagógica; os contextos de

estudo foram se diversificando e demonstrando a abrangência do termo; as relações entre a educação

e o mundo da vida e das culturas organizacionais vão ganhando território analítico na academia. Um

importante elemento a ser observado é que, mesmo com o tema espalhando-se pelos diversos grupos

de trabalho durante o evento, no GT 25, encontravam-se as pesquisas que percebem o “campo” como

o elemento preponderante para a discussão, trazendo suas interfaces analíticas para o território de

referência. Aqui o campo não surge como um adendo nos trabalhos, mas antes, como um aspecto

central para compreensão da própria dinâmica a ser investigada.

14

Em 2011, no XX EPENN em Manaus, os pesquisadores foram surpreendidos com a mudança

de nome e de numeração, passando o GT 25 a sediar o tema da Educação Indígena e o GT 26

sediando o tema “Educação e Ruralidades” 19

com 43 trabalhos.

Quadro 3 - Textos sobre Educação do Campo no XX EPENN 2011

FORMATO Gt 03

Educação

e Mov.

Sociais

Gt 06

Educação

Popular

Gt 18

Educação de

Jovens e

Adultos

Gt 26

Educação

e

Ruralidades

TOTAL

COMUNICAÇÃO

ORAL

20 06 06 43 75

PÔSTERES 14 07 6 - 27

SUBTOTAL 34 13 12 43 102

OUTROS 31

TOTAL 133

Em outros 12 Gts Educação do Campo esteve presente com 31 trabalhos completos20

. A temática

também esteve presente com 67 trabalhos em vários Gts no formato pôster21

, perfazendo um total de

133 textos.

Segundo Cavalcante (2013), podemos identificar quatro principais “eixos de predominância

temática” nas pesquisas em Educação do Campo, são eles:

Análises de Caráter Emancipatório – Estudos da Educação do Campo enquanto

história, lutas e organização social;

Análises de Caráter Regulatório – Estudos da Educação do Campo enquanto política

pública e legislação educacional;

Análises de Caráter Pedagógico – Estudos da Educação do Campo enquanto propostas

educacionais com nuances socioculturais e socioambientais voltadas para o eixo

educativo/pedagógico e/ou de caráter científico e interdisciplinar;

Análises de Caráter Analítico - Educação do Campo enquanto tema de

estudo/pesquisa, contradições, proposições e interfaces temáticas e epistemológicas.

A percepção da interseção entre os temas (políticas, lutas sociais, práticas pedagógicas...)

anuncia a perspectiva de construção histórica da Educação do Campo e propõe todo um

19

Disponíveis em:

<http://www.ce.ufpb.br/ppge/epenn/index.php?option=com_content&view=article&id=44&Itemid=2>

<http://chapapelosestudantes.wordpress.com/2011/03/11/xxepenn/ > . Acessados em 21/10/2013 20

GT 02 - História da Educação 02 trabalhos ; GT 04 - Didática 02 trabalhos; GT 05 - Estado e Politica Educacional

03 trabalhos; GT 07 - Educação da criança de 0 a 6 anos 01 trabalhos; GT 08 - Formação de Professores 10 trabalhos;

GT 09 - Trabalho e Educação 04 trabalhos; GT 10 - Alfabetização Leitura e Escrita 01 trabalho; GT 12 – Currículo 02

trabalhos; GT 15 - Educação Especial 02 trabalhos; GT 21 - Educação e Relações Étnico-Raciais 01 trabalho; GT 22 -

Educação Ambiental 02 trabalhos; GT 23 - Gêneros, Sexualidade e Educação 01

21 GT-2 História da Educação 02 textos; GT3- Movimentos Sociais, Sujeitos e Processos Educativos 14 textos; GT 4

Didática 02 textos; GT 5 Estado e Política Educacional 02 textos; GT 6 Educação Popular 07 textos; GT 8 Formação de

Professores 09 textos; GT 9 Trabalho e Educação 03 textos; GT12 Currículo03 textos; GT-15 Educação Especial 01

textos; GT-18 Educação de Pessoas Jovens e Adultas 06 textos; GT-21 Educação e Relações Étnico-Raciais 13 textos;

GT-22 Educação Ambiental 03 textos; GT-23 Gênero, Sexualidade e Educação 02 textos.

15

(re)significado de relevância para a compreensão do seu “paradigma” enquanto território de luta e

projeto em disputa. Nesta perspectiva, o contexto socioambiental apresenta diversidades coletivas e

identitárias que no debate do “campo” precisam se unificar no projeto de sociedade da classe

trabalhadora que diverge do projeto capitalista e seu paradigma de educação para o rural

(FERNANDES, 2005).

Se nem todos estes contextos socioculturais estão formalmente vinculados aos movimentos

sociais, precisariam todos estar diante do desafio de enfrentamento do capitalismo no campo, o que

traz para os estudos acadêmicos o desafio de perceber esta complexidade, colaborando com a luta dos

seus sujeitos.

5 Perspectivas e temáticas da Educação do Campo

A Educação do Campo defendida e desenvolvida pelos movimentos é apontada como uma

perspectiva contra hegemônica, posto que se origina dos embates da luta de classes, em que se

enfrentam projetos distintos de sociedade, de campo e de educação. Numa arena de lutas em que se

enfrentam de um lado o projeto dominante capitalista, que no campo tem como seu maior

representante o agronegócio, caracterizado pelo latifúndio, a monocultura de comodities para

exportação, pela exploração do trabalho, cujo maior objetivo é acumulação de capital, e de outro, os

camponeses com um projeto de agricultura camponesa caracterizada pela diversidade de produção,

policultura, pela produção de alimentos, pelo trabalho familiar, e que é responsável pela produção de

cerca de 70% da alimentação consumida no país.

Nesse embate de projetos a educação também entra na disputa. A Educação rural como

projeto de educação que ao longo da história vem sendo oferecido aos camponeses pelo estado

oligárquico hegemonizado pelos interesses do latifúndio, o qual tem se caracterizado pela negação ao

direito de estudar, pela precariedade, pela desvalorização da cultura, da produção do modo camponês

de viver e produzir. A Educação do Campo por sua vez como prática social, como prática educativa,

afirma-se como projeto de educação dos camponeses e de suas organizações que almejam a

emancipação dos povos do campo.

A emancipação, conceito que foi discutido por Karl Marx em sua obra, é vista mais na sua

dimensão material, política e econômica, sendo possível mediante a libertação da propriedade

privada e da opressão de classe. Porém a educação pode contribuir como coadjuvante no processo de

construção da emancipação do campo, quando pensada aliada a de um projeto da agricultura familiar

camponesa.

A Educação do Campo numa perspectiva emancipadora precisa estar vinculada a um projeto

de transformação social sob o domínio das classes populares, pois é importante proporcionar

16

conhecimentos e reflexões que municiem os camponeses a construir alternativas de uma outra

sociabilidade, como salienta Batista (2009, p. 223).

As perspectivas de emancipação, a libertação dos trabalhadores requer o

domínio do conhecimento, o desmantelamento da propriedade privada e da

determinação de classe. É nessa perspectiva que credito à educação o papel de

promover uma reflexão sobre os processos e artimanhas da opressão e da dominação

aliando-se às lutas dos oprimidos pela sua libertação.

Na perspectiva dos movimentos sociais do campo na luta pela construção de uma

sustentabilidade da agricultura camponesa faz-se necessário que as proposições da Educação do

Campo se coadunem com as demandas das comunidades que vivem no e do campo. O documento da

II Conferência Nacional Por Uma Educação do Campo faz essa referência.

(...) é fundamental entender que a Educação do Campo é semente de uma nova

realidade para agricultura familiar e camponesa, é luta por universalização de

direitos, resgate histórico, mas deve estar sempre vinculada à discussão da produção,

à sustentabilidade produtiva dos assentamentos e comunidades de pequenos

agricultores, como também, à formação dos técnicos, discussões tecnológicas e

econômicas.

Tendo como fim a formação humana em todas suas dimensões, como porvir emancipatório, a

educação do campo em suas práticas demanda a construção de processos educativos que contribuam

para valorizar novas formas de relações sociais, ambientais e culturais, capazes de criar vínculos com

formas alternativas de produção e de relações de trabalho associado e livre, com valores de

solidariedade, de cooperação, de incentivar nova relação de convivência e cuidados com a natureza e

respeito com os seres humanos.

A Educação do campo se configura como prática, como política e como categoria de análise,

como afirma Caldart (2012, p. 257).

Como conceito em construção, a Educação do Campo, sem se descolar do

movimento específico da realidade que a produziu, já pode configurar-se como uma

categoria de análise da situação ou de práticas e políticas de educação dos

trabalhadores do campo, mesmo as que se desenvolvem em outros lugares e com

outras denominações. E, como análise, é também compreensão da realidade por vir,

a partir de possibilidades ainda não desenvolvidas historicamente, mas indicadas por

seus sujeitos ou pelas transformações em curso em algumas práticas educativas

concretas e na forma de construir políticas de educação.

No mapeamento realizado, constatamos que em muitos textos os movimentos sociais

aparecem como denunciadores da exclusão educacional que incide sobre as populações do campo,

como demandantes na luta pelo direito à educação, reivindicando políticas de Educação do campo,

reivindicando a construção de escolas no campo. Contudo, os movimentos não se limitam à denúncia

e à reivindicação, eles também são propositores de políticas públicas específicas para o campo, na

defesa por uma educação que valorize, que problematize a realidade, a cultura, os saberes e as

experiências dos diversos povos do campo: agricultores/as familiares, assalariados/as, assentados/as,

17

ribeirinhos, caiçaras, extrativistas, pescadores, indígenas, remanescentes de quilombos, enfim, todos

os povos do campo brasileiro, portanto, uma educação que seja no campo e do campo. Essas

proposições resultam das experiências vivenciadas no tempo da luta pela terra, nos acampamentos e,

no tempo de construção de novos territórios, nos assentamentos da reforma agrária.

Assim, os movimentos sociais também são evidenciados como protagonistas das ações

educativas nos acampamentos e assentamentos da reforma agrária e nos projetos educativos

desenvolvidos em parceria com as universidades, possibilitando um diálogo entre as universidades e

as organizações do campo onde a troca de saberes populares e os conhecimentos científicos tanto no

ensino, na pesquisa e na extensão possam contribuir com a produção de novos conhecimentos

socialmente referenciados.

Os anúncios dos textos nos Encontros de Pesquisa trazem à tona problemáticas e experiências

de educação em comunidades quilombolas, em áreas ribeirinhas, em assentamentos, em povoados

rurais, refletindo a diversidade de sujeitos que vivem no campo e trazendo para o cenário da

agricultura familiar (a que difere do agronegócio), aspectos de pertinência no que concerne

expressões culturais e de relação com o ambiente. Tais abordagens se coadunam com as proposições

dos movimentos no Texto Base da II Conferência Nacional Por uma Educação do Campo 22

.

Essa educação envolve saberes, métodos, tempos de aprendizagem e espaços físicos

diferenciados (a educação indígena, dos quilombolas, dos agricultores familiares,

dos ribeirinhos, dos camponeses...), realizam-se nas comunidades e nos seus

territórios trazendo narrativas e símbolos culturais que mantém a unidade e a

pertença de cada grupo.

No tocante à análise da educação escolar no meio rural as escolas são tratadas numa certa

ambivalência, ora como escolas rurais, posto que persistem numa precária educação rural, ora são

chamadas de escolas do campo, quando autores adotam a nova nomenclatura, mas não a

compreendem na perspectiva de um paradigma diferenciado do anterior. A luta dos movimentos por

escola no campo, as condições de funcionamento dessas, e as labutas da população do campo em

torno do debate educacional, também são objetos de análise de várias pesquisas.

A Educação do Campo, do ponto de vista do movimento Por uma Educação do Campo, é

vista como importante instrumento para impulsionar um novo modelo de desenvolvimento

sustentável do campo baseado na agricultura familiar. Esta ideia foi incorporada no currículo dos

programas, especialmente no PRONERA e Programa Saberes da Terra e Projovem Campo Saberes

da Terra e propostas advindas das organizações não governamentais como o SERTA23

. Tais

22

II CONFERÊNCIA NACIONAL POR UMA EDUCAÇÃO DO CAMPO. “Por uma Política Pública de Educação do

Campo”. Texto-Base. Luziânia, GO, 2 a 6 de agosto de 2004. 23 “Serviço de Tecnologia Alternativa – é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) que tem

como missão formar jovens, educadores/as e produtores/as familiares, para atuarem na transformação das circunstâncias

econômicas, sociais, ambientais, culturais e políticas, na promoção do desenvolvimento sustentável do campo. A

18

programas vêm desenvolvendo projetos educativos junto a várias escolas públicas em municípios de

Pernambuco e nas escolas técnicas de formação profissional – Centro Tecnológico da Agricultura

Familiar – reconhecendo-se a formação dos ADL – Agentes de Desenvolvimento Local – na

categoria de curso profissional de Nível Médio Técnico em Agroecologia. Essas experiências

motivaram vários pesquisadores a se debruçarem sobre a temática do desenvolvimento sustentável a

partir da agricultura familiar sendo refletida em muitos dos textos24

.

As Escolas Famílias Agrícolas (EFAS) e a Pedagogia da Alternância também surgem como

subtemas importantes neste cenário de produção sobre o “campo”. Com reconhecida trajetória no

debate da educação na zona rural brasileira desde o final dos anos 60, a Pedagogia da Alternância

está presente em um número considerável de instituições de formação por Alternância pela zona rural

do Brasil (BRASIL, 2006) muitas delas concentradas nas regiões do Norte e Nordeste. Constituem-se

a partir da iniciativa de associação de famílias, pessoas e instituições para promover uma educação

que atenda às necessidades dos camponeses, tendo como base pedagógica e metodológica a

Pedagogia da Alternância, organizada em tempo educativos na escola e na comunidade. Tal

experiência formativa pautada em princípios da educação popular e perspectiva comunitária no rural

foi também fonte de inspiração nos rumos do paradigma da Educação do Campo na década de 90.

As práticas docentes, o trabalho docente e a formação de educadores do campo são temas

recorrentes nos três eventos pesquisados. Foram 08 textos completos no XIX EPENN e 09 trabalhos

completos e 09 pôsteres no XX EPENN. As problemáticas envolvem a formação inicial e continuada,

a profissionalização docente, o trabalho docente na zona rural, a ação docente em classes

multisseriadas em “escolas rurais”.

Ressalta-se nas análises apresentadas que a Educação do Campo enquanto concepção tem-se

materializado com mais evidência nos diversos processos educativos nas áreas rurais sob a influência

dos movimentos sociais do campo nos assentamentos, nas Escolas Famílias Agrícolas, nos projetos

do PRONERA em parceria com as universidades. Enquanto política de Educação do Campo definida

nas Diretrizes Operacionais da Educação Básica nas escolas do campo e no Decreto nº 7.352, de

4/11/2010 que dispõe sobre a política de educação do campo e o Programa Nacional de Educação na

Reforma Agrária – PRONERA, as pesquisas mostram uma distância entre o que preconiza o

ordenamento jurídico e a presença de fato nos projetos pedagógicos e nas práticas pedagógicas das

escolas do campo.

Entre as perspectivas metodológicas e de análise predominam as pesquisas qualitativas. Como

referenciais teóricos predominantes na relação campo e políticas, encontramos o Materialismo

organização foi fundada em 1989 a partir de um grupo de agricultores, técnicos e educadores que desenvolviam em

comunidades rurais uma metodologia própria para a promoção do meio ambiente, a melhoria da propriedade e da renda e

o uso de tecnologias apropriadas. Desde sua origem, teve como foco o desenvolvimento e reconhecimento da importância

da agricultura familiar” (http://www.serta.org.br/o-serta/historico/). 24 Proposta educacional de apoio ao desenvolvimento sustentável PEADs: um estudo da proposta de educação do campo

no município de Lagoa do Itaenga-PE.

19

Histórico, o paradigma da Educação do Campo e a Educação Popular. Há também a incidência de

trabalhos sob a perspectiva dos Estudos Culturais, da Teoria das Representações Sociais, Histórias de

vida, Identidade, buscando identificar a representação social do campo entre seus sujeitos.

Tais diferentes perspectivas de análise em torno do tema, evidenciam a diversidade de

concepção de educação que subjaz no debate. Para muitos a mudança da nomenclatura pode apenas

significar um novo momento para o debate educacional frente o cotidiano das escolas na zona rural.

Para outros, a mudança de nomenclatura está vinculada a um projeto de educação ampliado rumo às

mudanças nas relações de poder da sociedade. Muitos dos estudos em torno dos Movimentos Sociais

defendem uma educação do campo como universo de disputa dentro desta tensão na sociedade

capitalista. Outros estudos em torno das culturas e práticas pedagógicas locais pouco demarcam o

campo enquanto espaço de conflitos e os seus desafios em torno da questão agrária. Como

consequência, há um risco neste debate, de supervalorização da discussão pedagógica dissociada do

arcabouço sociopolítico presente na gênese do debate da EC dos anos 90.

Como podemos perceber a Educação do Campo sob a égide de política pública abraça um

contexto múltiplo e diverso de percepções sobre o próprio tema e neste aspecto o discurso acadêmico

envereda por leituras e interpretações múltiplas que se espalham em diferentes lógicas e interesses

teórico metodológicos e discursivos.

Os riscos deste cenário de múltiplas leituras teórico e metodológicas, no entanto, residem na

naturalização das políticas sem a devida problematização histórica em torno das lutas que as

antecedem, assim como na excessiva “pedagogização” do debate, que tira da gênese da organização

social e política do campo a merecida atenção e desloca para o território das expressões didáticas

toda a ênfase do tema. A nomenclatura “do campo” é carregada de sentido e dentro desta lógica, as

lutas, os movimentos e as tensões precisam de significado histórico e sentidos políticos. Sendo assim,

a premissa básica do território campo como pano de fundo para análises em torno de temas no tema,

precisa ser recapturada.

6. Considerações Finais

Ao final deste trabalho, podemos afirmar que o mapeamento dessas produções é um exercício

inconcluso e despretensioso que precisa ser analisado dentro das próprias limitações de pesquisa.

Podemos inferir que após mais de uma década de lutas, de investimentos conceituais e políticos

no debate da Educação do Campo, ocorreram avanços nas definições de políticas, na criação de

programas, no compromisso das universidades com as populações do campo que resultaram em

atividades de ensino, pesquisa e extensão que fecundaram uma produção científica que vem se

destacando no cenário das várias áreas de conhecimento e com mais ênfase nas ciências humanas e

sociais.

20

No que concerne a produção presente nos encontros regionais é visível o interesse pelo tema, que

se interconecta com tantos outros e muitas vezes ancora-se em uma leitura de pouca especificidade

política e territorial. A descontinuidade do próprio percurso do GT, colabora com a inconstância na

demarcação política do nosso debate acadêmico.

Embora seja realçado o protagonismo dos movimentos sociais nos trabalhos apresentados,

observa-se que o debate sobre a “escolarização do campo” muitas vezes se desloca do importante

debate da questão agrária e as relações de poder vivenciadas no capitalismo agrário (cada vez mais

impactante e agressivo), são muitas vezes invisibilizadas.

Neste encontro do EPENN de 2013, houve uma reorganização em torno dos focos dos grupos

de trabalho e mais uma vez, o grupo de trabalho Educação do Campo foi afetado. O EPENN

apresentou um total de 24 grupos de trabalho. Foram eles: GT02 História da Educação, GT03

Movimentos sociais, sujeitos e processos educativos, GT04 Didática, GT05 Estado e Política

Educacional, GT06 Educação Popular, GT07 Educação de Crianças de 0 a 6 anos, GT08 Formação

de Professores, GT09 Trabalho e Educação, GT10 Alfabetização, Leitura e Escrita, GT11 Política de

Educação Superior, GT12 Currículo, GT13 Educação Fundamental, GT14 Sociologia da Educação,

GT15 Educação Especial, GT16 Educação e Comunicação, GT17 Filosofia da Educação, GT18

Educação de Pessoas Jovens e Adultas, GT19 Educação Matemática, GT20 Psicologia da Educação,

GT21 Educação e Relações Étnico-Raciais, GT22 Educação Ambiental, GT23 Gênero, Sexualidade e

Educação, GT24 Educação e Arte, GT25 Educação e Ensino de Ciências. O GT 25 passando a ser o

fórum Educação e Ensino de Ciências, não havia mais GT para a Educação Indígena

especificamente, nem para o tema da Educação do Campo e/ou “ruralidades”.25

.

Consideramos, portanto, que a oportunidade do registro via trabalho encomendado “Estado da

arte em Educação do Campo Norte e Nordeste”, apresentado no EPENN de 2013, contribuiu

sobremaneira para que a discussão em torno do lugar e do perfil e da especificidade da Educação do

Campo, enquanto campo de estudo que se apresenta nos contextos do EPENN, tenha sido retomada

de forma democrática e participativa. Conseguimos, durante o evento, elaborar e distribuir uma

moção reivindicando o retorno do Gt em nome da sua trajetória política e territorial na pesquisa

educacional.

Em que pese todas as instabilidades em torno espaço de discussão conquistado, alterado e

extinguido neste processo, o presente texto tem como proposta a possibilidade de compreendermos

como o tema da Educação do Campo tem sido abordado neste breve percurso entre os três últimos

encontros de Pesquisa em Educação do Norte e Nordeste. Seus temas e sub temas, suas perspectivas

e suas variações de discussão no universo de diversidade que a Educação do Campo se encontra, é

anunciada e se pronuncia.

25

Disponível em <http://www.epenn2013.com.br/grupo_trabalho.html> Acessado em em 21/10/2013

21

Por fim, agradecemos a oportunidade da sistematização deste texto, salientando para a

necessidade de repensarmos a qualidade dos registros e publicização perene da produção científica do

EPENN, no intuito de garantir a fonte de pesquisa em torno dos nossos percursos acadêmicos nos

encontros do norte e nordeste.

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