características da linguage oram l eaiizacao em u

125
MARIA LUIZA DE FRANÇA PASZKIEWICZ Características da Linguagem Oral eaiizacao em u Dissertação para obtenção do Grau de Mestre, Área de Concentração: Língua In- glesa/do Curso de Pós-Graduação em Le- tras, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, da Universidade Federal do Paraná. CURITIBA t 9 8 5

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Page 1: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

M A R I A LUIZA DE F R A N Ç A P A S Z K I E W I C Z

Características da Linguagem Oral eaiizacao em u

Disser tação para obtenção do Grau de M e s t r e , Área de Concentração: Língua In-g l e s a / d o Curso de Pós-Graduação e m Le-tras, Setor de Ciências Humanas , Letras e Ar tes , da Univers idade Federal do Paraná.

CURIT IBA t 9 8 5

Page 2: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

AGRADECIMENTOS

Ao Professor Dr. José Erasmo Gruginski, pela sua orien-

tação, amizade e incentivo.

Ao Professor David Shepherd e à Professora Dr. Cecília

Inés Erthal, pela colaboração, amizade e disponibilidade.

Ao Roberto, pela compreensão.

Aos meus pais e irmãos, pelo constante apoio.

Àqueles que permitiram ou facilitaram a coleta de da-

dos, a realização da pesquisa, seja por meio de gravações,

ou por quaisquer outros meios.

Muito obrigada.

Page 3: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

SUMARIO

RESUMO V

SUMMARY ví i

1 INTRODUÇÃO

1.1 JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS 1

1.2 . METODOLOGIA 2

1.2.1 Coleta de dados 2

1.2.2 Análise dos dados 3

1.2.3 Limitações 3

2 REVISÃO DA LITERATURA 5

3 ANÃLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS 21

3.1 A LINGUAGEM ORAL É ESPONTÂNEA, NÃO PLANE-

JADA 21

3.1.1 Hesitações manifestadas por pausas si-

lenciosas 22

3.1.2 Hesitações manifestadas por pausas pre-

enchidas 24

3.1.3 Palavras que atuam como reorganizadoras

do discurso ou permitem que o falante

ganhe tempo na organização subseqüente

do mesmo 26

iii

Page 4: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

3.1.4 A imprecisão da linguagem • 33

3.1.5X Quebras de estrutura 37

3.1.6 Outras construções que fogem às normas

da sintaxe 41

3.2 A LINGUAGEM ORAL TEM O RECEPTOR E O CON-

TEXTO PRESENTES 42

3.2.1 A presença do receptor .. 4 2

3.2.2 A presença do contexto 4 6

3.3 A LINGUAGEM ORAL UTILIZA-SE DE RECURSOS

PROSÓDICOS 47

3.3.1 Recursos prosódicos como forma de suprir

as falhas decorrentes da falta de pla-

nejamento 4 8

3.3.2 Recursos prosódicos como forma de assi-

nalar troca de papéis ou de situações

do dialogo 52

3.3.3 Recursos prosódicos como forma de sina-

lizar um conjunto amplo de significados 53

4 . CONCLUSÃO 58

ANEXO 63

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 116

iv

Page 5: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

RESUMO

O objetivo desta dissertação é verificar, através da

coleta de diálogos representativos de situações reais de fa-

la, como se realizam, no Português, as seguintes caracterís-

ticas gerais da linguagem oral encontradas em levantamento

bibliográfico: a falta de planejamento do discurso, a pre-

sença do contexto situacional e do receptor e a utilização

de elementos prosódicos. Para tal propósito, tomou-se uma

amostra da linguagem de nove pessoas, de ambos os sexos, to-

das de escolaridade superior. Como instrumento de coleta de

dados utilizou-se apenas um gravador, determinando-se para a

duração dos diálogos o tempo aproximado de 15 minutos. Atra-

vés da análise dos dados, não se teve como intuito chegar a

nenhuma conclusão de caráter quantitativo. Buscou-se, por meio

da observação, o registro de fatos sistemáticos, no Portu-

guês, ocorridos, na amostra, com a finalidade de se confirmar

as características acima apontadas, atribuídas como próprias

da linguagem oral. Embora a amostra não seja representativa

da população brasileira em geral, por meio dela foi possível

o alcance de muitos dos objetivos propostos. Verificou-se

que, da falta de planejamento do discurso, surgem hesitações

manifestadas por pausas preenchidas por sons; surge a pre-

sença de certas palavras e expressões, umas indicando a im-

precisão da linguagem, outras usadas para permitir que o fa-

V

Page 6: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

lante ganhe tempo na organização do discurso subseqüente;

surgem ainda constantes quebras de estrutura e outras devia-

ções sintáticas. Percebeu-se que a presença de receptor fa-

cilita o ato comunicativo do falante, dada a chance que tem

de ¿e.e.dback e da ajuda que pode receber na complementação de

seu pensamento. Foi possível ainda o reconhecimento da im-

portância da utilização de recursos prosódicos, na transmis-

são da mensagem, com relação aos seguintes aspectos: como

forma de fazer frente a muitos dos problemas que surgem por

questão de o discurso não ser previamente organizado; também

na passagem da narração ao discurso direto, sem preâmbulos,

e, ainda,o que é muito importante, na sinalização de um con-

junto amplo de significados (atitudes, por exemplo),, como

parte da mensagem total.

vi

Page 7: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

SUMMARY

The aim of this paper is to verify, with the use of

dialogues, representative of authentic speech situations, how

certain characteristics of oral language are realized in Por-

tuguese. The following elements were included in the research

as they were found in the relevant literature: a lack of

discourse planning, the presence of the situational context

and that of the receiver; the use of prosodie elements. To

this end a sample, of language of nine college gratuates, both

male and female, was analyzed. The only instrument used for

the data collection was a tape recorder, and it was decided

to limit the length of dialogues to approximately fifteen

minutes. It was not intended that any type of quantitative

conclusion would be reached by this analysis. The aim was,

thus, to register, by observation, systematically the facts

in Portuguese, according to the sample, and establish the

presence of those aformentioned characteristics, which we

attributed as belonging to oral language. Although the sample

may not be representative of the Brazilian population in gen-

eral, it was possible to achieve a number of these proposed

objectives. It was verified that because of the lack of dis-

course planning a number of hesitation phenomena occurred.

The presence of certain words and expressions was noted,

some of which indicated an imprecision of oral language,

vi i _ J B I B L I O T E C A " C E N T R A L " ! Universidade Federal da Paraná

Page 8: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

others enabling the speaker to gain time for the organization

of the subsequent discourse. In addition, constant breaks in

the discourse structure as well as other syntactic deviations

occurred. It was observed that the presence of the speaker

simplified the communicative act of the speaker, providing

an opportunity for feedback in addition to providing help in

what is considered to be a reasonable completion of the

speaker's thought. It was also possible to recognize the

importance of the use of prosodie resources in the transmis-

sion of the message in the following areas: as a means of

compensating for problems arising in view of the fact that

the discourse was lacking any previous organization; in pass-

ing without a preamble, from narration to direct discourse;

and, finally, which is very important, in the signalling a

wide range of meanings (e.g. attitudes) as part of the total

message.

vi i i

Page 9: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

1 INTRODUÇÃO

1.1 JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS

No português, tanto do ponto de vista teórico como

prático, têm sido poucos os trabalhos apresentados em que se

focalizam as características da linguagem oral.

A presente pesquisa procura fazer um levantamento bi-

bliográfico do que tem sido realizado nesse sentido, como ma-

terial de apoio para o estudo que se pretende: através da co-

leta de diálogos representativos de situações reais de fala,

verificar como as características gerais levantadas com re-

lação ã linguagem oral se realizam no Português.

Do ponto de vista teórico, este estudo poderá desper-

tar a atenção para a necessidade de uma descrição mais rea-

lista da língua, feita a partir de dados reais da fala, pro-

duzidos em situações concretas de diálogo.

Este estudo é importante, acredita-se, no sentido de

levar o professor de Português a perceber que a língua oral

e a escrita têm características próprias; são meios de comu-

nicação diferentes. Com essa conscientização, certamente,

deixará de fazer exigências absurdas sobre como se dz.ve, fa-

lar. Ë importante também no sentido de fazê-lo entender que

as dificuldades encontradas na hora em que se deseja colocar

Page 10: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

as idéias por escrito advêm, em grande parte, do fato de a

pessoa estar mais acostumada com a comunicação por meio da

oral.

Um dos principais objetivos que se têm em mente é que

o exame da amostra coletada e da pesquisa realizada possa

despertar idéias para estudos lingüísticos mais delimitados

e profundos do Português oral.

1.2 METODOLOGIA

1.2.1 Coleta de dados

Com o propósito de se verificar como as característi-

cas gerais da linguagem oral se realizam no Português, tomou-

se uma amostra de pessoas de escolaridade superior, de ambos

os sexos, todas entre 28 e 34 anos (falantes A a I): um en-

genheiro, um médico e o restante professores.

Todas essas pessoas decidiram cooperar, cientes do ob-

jetivo da pesquisa a ser realizada.

A escolha de um número maior de professores entre as

pessoas entrevistadas deu-se pela facilidade de acesso, em

virtude de a pesquisadora exercer a mesma profissão.

Para a coleta de dados utilizou-se como instrumento

apenas um gravador. Duas gravações foram efetuadas pela au-

tora desta pesquisa e as demais pelos próprios interlocuto-

res .

Determinou-se para duração dos diálogos o tempo apro-

ximado de 15 minutos. Todavia, como forma de contribuir pa-

Page 11: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

3

ra a espontaneidade dos diálogos, frisou-se que não preci-

sariam ater-se muito a essa questão de tempo.

Foram, ainda, sugeridos temas, de modo geral ligados

aos seus interesses, sobre os quais pudessem discorrer sem

maiores dificuldades. Nesse caso, com a idéia explícita de

que não haveria problema algum se, porventura, a conversação

tomasse outros rumos.

1.2.2 Análise dos dados

Não se pretende através da análise dos dados chegar a

um estudo quantitativo. Deseja-se registrar fatos sistemáti-

cos no Português, ocorridos na amostra, que possam ser atri-

buídos a determinadas características gerais da linguagem

oral, aponta:das na Revisão da Literatura.

Para essa análise serão utilizados conceitos de uso

muito amplo em Lingüística, ligados ã gramática tradicional.

1.2.3 Limitações

Apesar do grau de intimidade entre os interlocutores,

da preocupação quanto à escolha de tópicos que pudessem con-

tribuir para a descontração da linguagem no discurso, o fato

de estarem conscientes de que sua conversação estava sendo

gravada constituiu uma limitação dentro da metodologia usada

na coleta de dados.

A escassez de tempo para o levantamento e análise de

uma amostra maior trouxe, ainda, várias outras limitações,

como a falta de:

Page 12: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

4

' um estudo quantitativo dos fatos sistemáticos nó Por-

tuguês, atribuídos como características gerais da

linguagem oral;

° uma análise instrumental de um desses fatos — o da

utilização de recursos prosódicos;

0 um estudo de estratificação social de variáveis lin-

güísticas.

Com relação a este último item, todavia, embora o uni-

verso estatístico da amostra não represente o nível de edu-

cação da população em geral, acredita-se que as caracterís-

ticas apontadas na Revisão da Literatura sejam característi-

cas essenciais da linguagem oral e que, portanto, devam apa-

recer na fala de pessoas de outros níveis culturais.

Page 13: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

2 REVISÃO DA LITERATURA

Muitas das características da linguagem oral são des-

critas em estudos que objetivam, na verdade, ressaltar as ca-

racterísticas da escrita.

Tais estudos começaram a surgir, conforme aponta

Michael STUBBS, como reação ao pensamento de muitos lingüis-

tas e, mais notadamente, entre eles Bloomfield para quem a

escrita nada mais era do que uma invenção, um meio de repro-

duzir e difundir a língua falada através de símbolos gráfi-

cos: "Writing is not language, but merely a way of recording

language by means of visible marks". "The art of writing is

"not part of language but rather a comparatively modern in-

vention for recording and broadcasting what is spoken".1

Como parte dessa reação, passam a ser levantados pon-

tos sobre a relação entre a linguagem oral e a escrita, não

com o propósito de querer provar que uma é superior à outra,

mas como ponto de partida para se evidenciar o fato de que

cada uma tem características e funções próprias, são realiza-

ções diferentes e complementares de um mesmo sistema abstra-

to: a linguagem.2

1 STUBBS, M. Language and Literacy; the socioliriguistics of read-ing and writing. London, Routledge & K.Paul, 1980. p.24, 21.

2"We must therefore recognize that speech and writing are d if fer-ent, without one being superior to the other; but also recognize that a language which has both written and spoken forms is a more powerful in-

Page 14: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

6

Entre as características próprias da oral, foi apon-

tada a questão de a linguagem, normalmente, ser espontânea,

não planejada, realizar-se através de processos mentais que,

na maioria das vezes, não estão sob o controle consciente do

falante. Afirma VYGOTSKY: "In speaking, he is hardly con-

scious of the sounds he pronounces and quite unconscious of

the mental operations he performs".3

01DONNEL e TODD salientam que, na linguagem oral, sen-

do espontânea, não hã tempo suficiente para uma melhor es-

truturação do pensamento, para a escolha de palavras e ex-

pressões mais adequadas, o que ocasionará quebras na estru-

tura — frases interrompidas, incompletas, repetições, hesi-

tações manifestadas por "arranques em falso" (false starts

and new beginnings), pausas silenciosas ou preenchidas (os

chamados "fillers"), como as exemplificam, no caso do inglês,

onde são usados os sons convencionais transcritos por 'er,

um', ou expressões como 'you see', 'you know', 'I mean'.

. . . little time can be given to planning or revision, and so speech in operation is characteristically broken up by 'fillers' of various sorts; for example, 'I mean', 'sort of', 'you Know', 'you see'. It is also sometimes marked by syntatic incom-pleteness, by breaks and hesitations, and by a good deal of repetition. All these features may be attributed to

the spontaneous nature of speech, (p.8)

strument of communication than a language with only spoken forms". STTUBS, p.30. "language: abstract system; speech, writing: realizations of lan-guage in different media" (p.34). "If writing was just speech written down, then it would not be very different from speech and would not be as useful as it is." (p.100)

3VYG0TSKY, L. Thought and Language. Cambridge, Mass., MIT Press, 1979. p.99.

Page 15: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

7

Normally pauses, too, are involuntary to a large extent, occurring where the speaker is searching for the right word of expres-sion. Theymaybe either silent of filled.4

CHOMSKY e VANOYE também se referem a essas manifesta-

ções da oralidade. Vejam-se, respectivamente, as suas afir-

mações :

Uma gravaçao da fala natural mostrara nu-merosos arranques era falso, desvios das re-gras, mudanças de intenção a meio caminho e assim por diante. (CHOMSKY)

- Na língua falada é abundante a repetição de palavras; - na língua falada i grande a ocorrência de anacolutos ou rupturas de construção: a frase desvia-se de sua trajetória, o com-plemento nao aparece, a frase parte em ou-tra direção.5 (VANOYE)

- 1

Tais manifestações da oralidade surgem, conforme as

palavras de O'Donnel e Todd acima, como produto de o discur-

so não ser planejado. Ana Silva Nogueira MARTINS, em seu tra-

balho "Algumas características do Português falado", afirma:

Segundo Ochs (1979), o discurso não planejado é aquele que

não foi pensado antes do momento de sua produção, não o en-

volvendo, portanto, nenhuma organização para sua emissão".

Nesse seu trabalho, Nogueira Martins cita, como meios

de fazer frente â falta de planejamento, a presença do aòé-ím

freqüentemente usado na oral como pà-^ínchídon. de. paaia e do

"O'DONNEL, W.R. & TODD, L. Variety in Contemporary English. London, Allen & Unwin, 1980. p.67.

5CH0MSKY, N. Aspectos da Teoria da Sintaxe. Coimbra, A.Amado, 1975. p.84. VANOYE, F. Usos da Linguagem. São Paulo, Martins Fontes, 1982. p.40.

Page 16: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

8

queh. dlZ2.H como reorganizador do discurso, nebpoYibav <¿L poh.

uma mudança eòtsiutu.iat. Menciona, ainda, por exemplo, o em-

p/iego de &xpAe.¿¿0e-ó que. deixam alguna conót¿tuÁ.nte¿> com va-

¿OA ¿ emântZco Indeterminado. Tece certas conclusões que, acre-

dita-se, não se restringem só ao Português. Fala da sintaxe

do discurso não-planejado — "Assim se monta a sintaxe do

discurso não-planejado: rica de elementos facilitadores para

a compreensão das mensagens veiculadas. Deste modo, é evi-

dente que o tensionamento sintático é rompido para permitir

a entrada dos elementos que analisamos".6

SAID ALI, ao definir Anacoluto, Expieò ¿ão Anaco¿útica,

também, se refere a esse problema de falta de planejamento da

linguagem oral. Observem-se suas colocações:

Expressão anacolutica e a oraçao que come-ça de um modo e, em vez de ter o seguimen-to pedido pela sintaxe, termina por uma construção nova. Resulta essa anomalia em geral do fato de nao poder a linguagem acompanhar o pensamento em que as idéias se sucedem rápidas e tumultuarias. Ë a pre-cipitação de começar a dizer alguma cousa sem calcular que pelo rumo escolhido nao se chega diretamente a concluir o pensa-mento. Em meio do caminho da-se pelo des-cuido, faz-se pausa, e, não convindo tor-nar atras, procura-se saída em outra dire-

~ 7 çao.

6MARTINS, A.S.N. Algumas Característivas do Português Falado. In: GRUPO DE ESTUDOS LINGÜISTICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO. Estudos lin-güísticos. Campinas, Pontifícia Universidade Católica, 1982. p.14, 21.

7 SAID ALI, M. Meios de Expressão e Alterações Semânticas. Rio de Janeiro, Fundaçao Getúlio Vargas, 1971. p.22. E continua, "estas, ar-rancadas de linguagem, irrefletidas ou mal ponderadas, que levam o homem a expressar-se contrariamente ãs normas da sintaxe, sao evitadas hoje entre literatos e entre pessoas que se prezam de falar corretamente". (p.23)

Page 17: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

9

Além dessa característica de produção da linguagem

oral, outras são ainda muito apontadas: a usual presença do

receptor e do emissor e o uso de recursos não-verbais.

LYONS menciona estas características ao definir o que

chama de "canonical situation of utterance": a comunicação

que se processa pelo canal vocal-auditivo, onde todos os par-

ticipantes se encontram presentes no mesmo contexto situacio-

cional, assumindo cada um a sua vez de emissor, capazes de

ver um(uns) ao(s) outro(s) e associar às suas palavras os re-

cursos paralingüísticos não-vocais.8

Pelas afirmações de LYONS, bem como de HIRSCH JR. , STUBBS

e VANOYE, verifica-se que, ãs vezes, quando a comunicação não

se situa dentro dessa definição de "canonical situation of

utterance", a linguagem na oral assume certas características

de escrita.9 A esse ponto voltar-se-á, mais tarde, no final

deste capítulo.

Conforme as colocações de.STUBBS, HIRSCH JR. , O'DONNEL

e TODD, Geraldo CINTRA, A.D. WILKINS e VANOYE, a presença do

receptor é muito importante, na oral, por possibilitar o {¡íid-

baak — estando presente, poderá reagir, questionar, caso o

falante não esteja sendo suficientemente claro. 10

^YONS, J. Semantics. Cambridge, Cambridge University Press, 1978. v.2, p.639.

'LYONS, v.l, p.69; HIRSCH JR., E.D. The Philosophy of Composi-tion. Chicago, University of Chicago Press, 1977. p.22-3; STUBBS, p.69; VANOYE, p.169.

10STUBBS, p.117; HIRSCH JR., p.22, 23,_27, 29; O'DONNEL & TODD, p.8. CINTRA, G. Meio e Mensagem na Comunicaçao Oral. In: GRUPO DE ES-TUDOS LINGÜÍSTICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO, p.24; WILKINS, A.D. The Teach-ing of Comprehension. London, ETIC, British Council, 1978. p. 78; VANOYE, p.160, 161.

Page 18: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

10

Segundo todos esses autores, a presença do receptor

faz cora que o falante não precise ser tão explícito. Assegu-

ra, por exemplo, WILKINS, o falante pode transmitir o que

pretende, aos poucos, passo a passo, na medida em que se faz

entender: "When I'm talking to you I can do it in little

bits, and I can find out how much you know as I go along. So

I don't get so complicated. If I say something you think is

rubbish, you'll say rubbish and I'll try and tell you why it

is not rubbish".11

VANOYE afirma que o " e.e.dback favorece a comunicação.

Dissipa as inquietudes, os receios e as tensões no relacio-

namento entre emissor(es)-receptores". Ele apresenta as vá-

rias formas em que o ¿ezdback pode surgir:

- repetição completa e sistemática das in-formações (exemplo: repetição da mensa-gem transmitida pelo telefone);

- verificaçao final — através de uma per-gunta do emissor (exemplo: pergunta do tipo "todo mundo compreendeu?", interro-gações escritas, etc.);

- verificaçao, à med-íãa que a comunicação Vai se processando, por pergunta do emis-sor ("certo?", "vocês estão me seguin-do? ...");

- verificaçao através de perguntas do(s) receptor(es);

."•.'- verificaçao por meio de sinais nao ver-bais do(s) receptor(es), em decorrência dos quais o emissor pode ajustar seu dis-curso.12

"WILKINS, p.68. 12VANOYE, p. 160.

Page 19: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

11

HIRSCH JR., ao falar sobre o contexto do discurso es-

crito ('The Context of Written Speech'), menciona o fato de

o discurso oral normalmente ocorrer numa situação concreta,

fornecedora de muitos elementos necessários à compreensão

do significado pretendido pelo falante.13

Para HIRSCH JR., LITOWITZ e STUBBS a linguagem oral,

estando normalmente ligada ao contexto situacional (context-

tied, context-dependent), nem todas as informações necessi-

tarão ser lexicalizadas. Já a escrita, por ser livre (con-

text-free) , como colocam, deve criar seu próprio contexto

unicamente atrás do verbal.14

Na linguagem oral, como afirmam O'DONNEL e TODD, o

emissor não precisa dar maiores detalhes sobre o que é visto

pelo receptor; a referência a uma pessoa, por exemplo, pode

13 HIRSH JR., p.21. "Oral speech normally takes place in an actual situation that provides abundant non-linguistic clues to the speakers intended meaning."

14 HIRSCH JR., p.25 e 26; LITOWITZ, B.E. Writing from a Develop-mental Perspective. Evanston, 1978. p.23. Mimeografado; STUBBS, p.109. Para LITOWITZ (p.23), o libertar-se, o movimento progressivo voltado pa-ra a criaçao desse contexto próprio seja, talvez, a maior característica que distingue a linguagem escrita da oral. "Brunner has described this progression as the child's movement towards context-free elaboration (1975:70). The subsequent and progressive de-contextualizationof written language is perhaps, the major characteristic differentiating it from oral language." HIRSCH JR. (p.7) assegura que a dificuldade máxima, para um falante nativo de uma língua aprender a escrever bem, esta em aprender a usar a linguagem de uma forma ã qual nao esta acostumado, uma vez que a necessidade de tecer seu próprio contexto é uma particularidade fun-cional da escrita. STUBBS (p.115), afirma, fazer com que os alunos en-tendam, saibam usar as convençoes da escrita i uma tarefa muito difícil. Coloca ainda um outro problema: o fato de a convencionalidade da escrita ter de ir além de seus aspectos formais, por, freqüentemente, nao serem encontrados nos mesmos um equivalente direto na linguagem oral (p.117). Sobre esse aspecto, ver CINTRA, p.24; PRETI, D. Sociolingüística; os níveis da fala. São Paulo, Nacional, 1975. p.47; LYONS, v.l, p.69.

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12

ser feita simplesmente por meio de um pronome pessoal.15

STUBBS, ao mencionara definição do que Bernstein cha-

ma cod¿go ficòtfiito, faz referência ao fato de que na oral nem

tudo necessita ser verbalmente explícito, quando os interlo-

cutores compartilham também de conhecimento sobre o mesmo as-

sunto, quando têm interesse, idéias afins.16

O mesmo ponto é enfocado por 01DONNEL e TODD : "Inti-

mate language is characteristically inexplicit; so that ut-

terances need not be complete sentences and structure will

tend to be simple, vague words such as 'nice' and 'things'

may be used, and pronunciation will tend to be relaxed...".17

As palavras de Geraldo CINTRA, citadas abaixo, apre-

sentam colocação semelhante — nem tudo necessita vir lin-

güísticamente expresso, na oral, em função não só do que é

visto pelos interlocutores no momento do diálogo, mas também

dos acontecimentos por estes compartilhados em situações an-

teriores :

A interaçao oral em presença envolve os interlocutores numa rede de acontecimentos (nao so cotemporais com a situaçao, mas também precedentes e mesmo antecipados) que estabelece um relacionamento característi-co e específico. 0 mero registro do que

15 0'DONNEL & TODD, p.8. "Things apparent in the shared situation may not need to be spelt out; so that reference to a person in full view of both addressor and addressee may be accomplished by means of a personal pronoun, where writing might call for a full description."

16 STUBBS, p.111. "... restricted code has been defined consis-tently as implicit, particularistic and context-bound, because it relies on shared understandings between speakers and shared knowledge about con-texts."

17 0'DONNEL & TODD, p. 75.

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13

foi dito numa tal situaçao nao constitui uma representação fiel da mesma. Assistir a uma aula, por exemplo, e ouvir uma gra-vação dessa mesma aula sao experiências completamente diversas (como muitos jã ti-veram a oportunidade de verificar), a me-nos que a aula tenha sido apresentada sob a forma de conferência; a gravaçao pode chegar a nao ser compreendida por quem nao tenha assistido a exposição original.18

HIRSCH JR. transmite a mesma idéia contida nessas pa-

lavras de Geraldo Cintra. Sustenta que qualquer participante,

de uma conversação que foi gravada, teria dificuldades em en-

tender mesmo o que houvesse dito, quando lesse a transcrição

de suas palavras. Ainda a esse respeito, cita o caso de fi-

tas gravadas pelo governo Nixon. Tais fitas, quando trans-

critas para o papel, não faziam muito sentido. O texto pare-

cia menos comunicativo que a composição de um pior aluno. Sõ

através da audição das fitas, com o ritmo, a entoação usada,

podia-se captar elementos essenciais ã compreensão, que fal-

tavam no discurso transcrito. Todavia, só esses elementos

não se faziam suficientes para uma melhor dilucidação da men-

sagem, afirma, foi importante que se levasse em conta, tam-

bém, a situação histórica dentro da qual a conversação ocor-

reu: "Transcribed oral speech seems puzzling and elliptical

in print because words alone supply insufficient clues to

meaning".19

Nas palavras de LYONS também evidencia-se o mesmo fa-

to de o elemento lingüístico, por si só, na oral, não ser

18 CINTRA, p. 26 e 27. 19 HIRSCH JR., p. 18, 21, 23.

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14

normalmente suficiente para a transmissão da mensagem como

um todo. Menciona os elementos voca¿6 e não-voca-Lò, consi-

derados pan.al-inQÜ.lbtlcob, também, como componentes da comu-

nicação oral. Embora entre era .uma discussão a respeito do

que seja prosódico, paralingüístico, ou não,20 destaca a ques-

tão concreta de, na oral, esses elementos voc.a-ib como a en-

toação, o volume de voz, o ritmo, e nao-vocalb como gestos,

expressões faciais, serem freqüentemente usados para comple-

tar ou alterar o significado lingüístico:

It has frequently been observed that se-mantic information signalled non-verbally in an act of utterance will at times be in conflict or in contradiction with the in-formation transmitted by the verbal compo-nent. (p.63) (...) the pa r a 1 i ngu i s t i c features of an utterance may, on occasion, contradict, rather than supplement, the information contained in the verbal and prosodie components ... (p.65)

Ressalta LYONS que o importante é compreender que os

recursos paralingüísticos, tanto vocais como não vocais, cons-

tituem parte essencial do que chama "comportamento normal da

língua ("normal language-behaviour); ocorrem, simultaneamen-

te, integrando-se ä língua falada e produzindo um sistema

total de comunicação:

It is important to realize (...) that paralinguistic signals, both vocal and non-vocal, are essential part of all normal, language behaviour. As Abercrombie puts it: "We speak with our vocal organs, but

20 LYONS, v.l, p.23. "... linguistis differ as to what(...) should count as prosodie and to what as paralinguistic."

Page 23: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

15

we converse with our entire bodies ... Paralinguistic phenomena . . . occur along-side spoken language, interact with it, and produce together with it a total system of communication ...".21

O'Donnel e Todd também registram o grande papel de-

sempenhado por esses recursos. Ao tecerem esclarecimentos

sobre a abrangência do termo paralingüístico, mencionam o fa-

to de estes poderem vir transmitindo várias formas de signi-

ficado, as quais não vêm lingüísticamente expressas.

Segundo esses dois autores, seriam considerados para-

lingüísticos os gestos, as expressões faciais, que não vies-

sem apenas acompanhando a linguagem, mas integrando-se a ela,

fazendo parte da mensagem total. Outro aspecto que esclare-

cem, é o da entoação. Salientam que esta é, na maioria das

vezes, um elemento lingüístico: parte essencial do sistema

de sons de uma língua. Em certos casos, porém, quando vem

indicar alguma informação adicional ao conteúdo da mensagem,

passa a representar uma importante função paralingüística.

Explicam melhor essa idéia por meio do exemplo — "Jane came

late", onde há um contorno melódico sistêmico que indica, se

21 LYONS, v.l, p.64. Adam KENDOM, ao falar da linguagem escrita, acaba fazendo referência a essa característica tao importante da lingua-gem oral. Menciona o fato de que, na escrita, dada a impossibilidade de representação concreta de gestos e de expressões faciais, certos aspectos de entoaçao e ênfase, ao escritor só resta recorrer ã descrição para alcan-çar orealismo físico epsicológico de seus personagens. Refere-se ãs difi-culdades encontradas pelo escritor, nesse sentido. Diz que seria bom fos-sem inventadas formas convencionalizadas, que representassem pelo menos alguns dos aspectos extralingüísticos. Kendom reconhece a importância da concretização dessa idéia, a qual poderia ser benéfica principalmente aos dramaturgos, pois facilitaria sua tarefa, além de possibilitar ao leitor perceber, em sincronização com o lingüístico, o comportamento nao-verbal das personagens. {Nonverbal Communication, Interaction and Gesture. The Hague, Mouton, 1981. p.13 e 117.)

Page 24: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

16

este período é uma simples declaração ou pergunta. Muitas ve-

zes, no entanto, esta melodia é realizada em um tom de voz

mais agudo ou mais grave do que o habitual para determinado

indivíduo. Neste caso, a entoação passa a desempenhar função

paralingüística, podendo sugerir surpresa ou emoção, quando

o timbre é mais alto, ou entre outras possibilidades, um tom

áspero ou solene, quando o tom é mais grave. Observam que

esta função passa a ser indicada também pela extensão do mo-

vimento do tom, dentro da melodia da fala. Na palavra tatz,

um alongamento na queda do tom, segundo eles, poderia ser

usada para indicar descontentamento, por exemplo. Neste es-

tudo, chamam atenção para o fato de os recursos paralingüís-

ticos agirem em função de um todo, e não individualmente;

dizem que, por isso, ao se interpretar o conteúdo semântico

da entoação, este princípio deve ser considerado.22

A maioria das características apontadas neste capítu-

lo referem-se diretamente ã situação normal em que ocorre a

comunicação oral. Vários autores, conforme se mencionou aci-

ma, chamam a atenção para os casos em que a linguagem oral as-

sume características de escrita.

22 O'DONNEL & TODD, p.64, 65. Luiz Carlos CAGLIARI, pelas afir-mações que faz em seu trabalho Os Tons do Português Brasi-lei-ro (Campinas, 1979. p.19-20. Mimeografado), parece considerar a entoaçao sempre como elemento lingüístico: "As diferenças de significado carreadas pela en-toaçao fazem parte da gramatica da língua. Essas diferenças de signifi-cado sao da mesma natureza que as diferenças, por exemplo, de tempo, mo-do, aspecto etc. A entoaçao é um dos tantos processos que há na língua de se estabelecer diferenças de significado. Lingüisticamente, os pa-drões entoacionais sao unidades do sistema fonológico, sintático e semân-tico da língua. 0 elemento sonoro do padrao entoacional pertence ao sis-tema fonologico da língua. As atitudes do falante expressas pela entoa-ção devem ser enquadradas nos estudos sintáticos da língua, assim como estão situados nesse campo, modo e aspecto".

Page 25: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

17

Tais casos viriam, de modo geral, como produto da cha-

mada por VANOYE "¿>ituaç.ão de náo--¿ntelcámb¿o", onde, como

ressalta, o feedback nem sempre é possível: "o receptor, ain-

da que presente e próximo, não tem a possibilidade imediata

de responder e de assumir o papel de emissor (aula expositi-

va, discurso, sermão, comunicação teatral). Nestes exemplos,

nota-se que a proximidade dos receptores é menor e que a si-

tuação exige quase sempre a utilização de alto-falantes, mi-

crofones, etc."23.

Sobre o estilo da linguagem oral, na comunicação sem

intercâmbio, diz o seguinte:

A exposição, pelo seu conteúdo, estrutura e natureza de seu preparo, se aproxima da comunicaçao escrita, uma vez que supõe: - uma apresentaçao séria, seletiva e orga-nizada de uma documentação, um plano ela-borado; - o esforço de correção do vocabulario e da sintaxe, supressão de negligências es-tilísticas, e de formas familiares ou vul-gares da língua falada, (p.169)

LYONS, a esse respeito, afirma que muitas conferên-

cias formais, apesar de serem transmitidas oralmente e terem

a estrutura fonológica da linguagem falada, apresentam o vo-

cabulário e a gramática próprios do estilo escrito.24

HIRSCH JR. pensa da mesma forma. 0 discurso oral não

tem os seus traços característicos meramente dependentes do

23 VANOYE, p.160, 161. 24 LYONS, v.l, p.69. "Many formal lectures, for example, though

they are delivered orally and have the phonological structure of the spoken language, are composed, as far as grammar and vocabulary are con-cerned, in the written medium."

Page 26: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

18

fato de realizar-se por meio do canal vocal-auditivo. "The

typical difference between oral and written speech do not re-

side in the difference between the visual and phonic media

themselves". A linguagem oral quando dirigida a todo um gru-

po, afirma, passa a representar um monólogo; em toda a cul-

tura, num monólogo dirigido a um público relativamente hete-

rogêneo, requer-se o uso de convenções e técnicas similares

äs que são encontradas na escrita.

Funcionalmente falando, uma difusão radiofônica, como

sustenta, pode ser considerada um equivalente do discurso es-

crito, apesar de usar o oral como meio de comunicação. Isto

porque a audiência, além de heterogênea, não é vista; suas

reações não são conhecidas. Por isso é que haveria a neces-

sidade, como na escrita, da utilização de uma linguagem mais

elaborada, isto é, de maior clareza lexical e gramatical

(sentenças completas com sujeito e predicado explícitos).

Por outro lado, já um bilhete, considerado nesse sentido, uma

carta informal dirigida a um amigo, afirma, seria linguagem

oral — nem tudo é expresso, a linguagem apresenta-se normal-

mente elíptica quando o outro sabe o que se passa, conhece a

situação.25

25 HIRSCH JR., p.22. "In every culture, the delivery of a mono-logue to a relatively heterogeneous audience requires similar techniques and conventions that are also found in writing. In all public speaking one has to employ a 'code' that partly resembles normal written speech." (p.23-4). "A radio broadcast is an oral equivalent of written discourse. The audience is unseen, its reactions unknown, and hence many requirements for communicative radio discourse are highly similar to the requirements of writing." (p.22). "Written discourse has to make up for its lack of intonation, gesture, facial expression — most of all, for its lack of tacit situational understanding and active feedback between speaker and listeners." (p.22-3).

Page 27: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

19

STUBBS também se refere à idéia de que uma tinguage.m

não pode ser considerada como oh.a¿, pelo simples fato de ser

transmitida pelo meio fónico:

Typically, speech takes place in a partic-ular social situation; and typically, in everyday conversation, speech is only one component of communication, alongside fa-cial expression, gesture, and reference to the physical surroundings. But a piece of writing typically has to stand on its own entirely, without any help from the situa-tion, and therefore has to supply all the necessary contextual information explicit-ly. Mixed varietiesj such as radio talks or discussions (5.6) are typically those which are closest to written language. Thus, normal language is usually heavily context-dependent, whereas written language usually has to be context free as far as possible.26

RESUMO DAS CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DA LINGUAGEM ORAL

Apontou-se que, no discurso oral não planejado, a lin-

guagem é espontânea. 0 pensamento é enunciado do modo que

surge na mente do falante. Normalmente não há tempo para a

reflexão, como acontece na escrita. (Vygotsky.) Por isso,

quando este não consegue encontrar, de imediato, as palavras

e expressões de que necessita, surge a hesitação—traduzida

por repetições, pausas silenciosas ou preenchidas (caso dos

"fillers") — ocorrendo, assim, freqüentes quebras de estru-

tura. (0'Donnel e Todd.)

26 STUBBS, p.109. Sem grifos no original.

Page 28: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

20

A espontaneidade viria, portanto, conferir à lingua-

gem oral características próprias. Grande importância foi'

também dada a outros dois elementos — ã presença do contexto

situacional e a do receptor, os quais têm sido vistos, essen-

cialmente, como fonte de toda a diferença entre a oral e a

escrita. (Lyons, Hirsch Jr., Stubbs.) Conforme se colocou,

a linguagem oral ocorre, normalmente, em uma situação de diá-

logo que tem seu dinamismo próprio. Estando presente, o re-

ceptor poderá reagir caso não esteja entendendo o que o fa-

lante quer dizer, possibilitando-lhe, assim, um feedback

imediato. (Stubbs, Hirsch Jr., Vanoye, Wilkins.) O ato co-

municativo do falante seria ainda favorecido, porque os in-

terlocutores estariam inseridos numa mesma situação concreta,

normalmente, esclarecedora. (Lyons, Hirsch Jr., Litowitz,

Stubbs, Geraldo Cintra, O'Donnel e Todd.)

Na oral não haveria a exigência da lexicalização de

muitas informações, em virtude, por exemplo, da situação tá-

cita existente entre os interlocutores, quando compartilham

das mesmas idéias, conhecimentos e interesses . (Stubbs,

O'Donnel e Todd, Geraldo Cintra); também por poder contar

com os elementos vocais, tais como a altura, o tom da voz, o

ritmo, e com elementos não vocais como os gestos e expressões

faciais, os quais elementos podem carrear um número grande

de significados. (Lyons, Cagliari, O'Donnel e Todd.)

Page 29: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

Na Revisão da Literatura apontaram-se como caracte-

rísticas principais da linguagem oral o fato de ser, normal-

mente, espontânea, não planejada, ter quase sempre o contex-

to e o receptor presentes, e de utilizar-se de recursos pro-

sódicos. Neste capítulo procurar-se-ã demonstrar como essas

características se realizam no Português.

3.1 A LINGUAGEM ORAL Ë ESPONTÂNEA, NÃO PLANEJADA

Conforme se registrou na Revisão da Literatura, no

discurso oral não planejado normalmente não há tempo para a

reflexão, para a organização do pensamento como há na escri-

ta.

Na amostra foram encontradas as seguintes manifesta-

ções do não-planejamento do discurso:

a) keòltaçõ e-ò marcadas por pau¿a¿ Atlenclobaé1 (acom-

panhadas, âs vezes, de repetições, isto é, de reduplicação,

10 termo"pausas silenciosas" e a traduçao do termo ingles silent pauses, utilizado por O'DONNEL, W.K. & TODD, L. Variety in Contemporary English. London, Allen & Unwin, 1970. p.67. Afirmam que a hesitação deve ser considerada de modo distinto do conceito de pausa (p.66). 0 ter-mo hesitação é aqui, todavia, usado em virtude de o falante normalmente proferir de forma alongada a palavra que antecede a pausa.

Page 30: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

22

principalmente de preposições e artigos);

" b) hzòitaçõzò marcadas por paixòaò ptie.ench.ida6 pelos

sons (E) e (Ã) , que representam respectivamente as vogais an-

terior média aberta e central média nasal;

c) palavras que atuam como H.eotiganizadotiaò do di¿cusi¿o

ou permitem que o falante ganhe tempo no planejamento subse-

qüente do mesmo: a¿óim, que.*. dizen., dig am oò, digamos aòt>im,

ne, não t>e.i, ¿ei •£<£;

d) impn.e.c.iéão da tinguagem;

e) co n¿tante.¿ quzbfiaò de. e-òth.txtu.fia. e. outrai de.viaçoe.&

òintãticaò.

Muitas vezes, é bom salientar, mais de uma dessas ma-

nifestações ocorrem juntas.

V.

3.1.1 Hesitações manifestadas por pausas silenciosas

As pausas silenciosas são marcadas no corpus por pa-

rênteses ( ). Essas pausas, freqüentemente, vêm precedidas

por uma duração maior das sílabas anteriores; por isso não

costumam ser longas.

É importante salientar que elas comumente ocorrem fo-ra de fronteira de constituintes2 (exemplos de 1 a 5 abaixo), dentro de unidades sintáticas onde, de forma alguma, na es-

As pausas que ocorrem nessas fronteiras sao representadas no corpus por uma e duas barras, significando respectivamente pausa menor e pausa maior. E importante lembrar que nem todas as pausas sao represen-tadas na escrita por pontuação. Vejam-se, por exemplo, as palavras de SAID ALI: "A vírgula indica a pausa mais fraca, devendo-se, contudo, ob-servar que nem todas as pausas fracas se marcam na escrita". (Gramática Secundária da Língua Portuguesa. Sao Paulo, Melhoramentos, 1969. p.228).

Page 31: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

23

crita poderia ser utilizado qualquer sinal de pontuação in-

dicando pausa.

Usando a terminologia da gramática tradicional, dir-

se-ia que são muito freqüentes entre os termos essenciais

da oração (sujeito e predicado); antes dos termos integran-

tes (complemento nominal e verbal); depois de preposições

e, ainda, por exemplo, depois do que em orações adjetivas e

subordinativas.

Observou-se que algumas vezes essas pausas chegam a

ocorrer antes mesmo que a palavra termine, como no exemplo

( 2 ) .

EXEMPLOS:

(1) Ta // então nos tamos àqui na casa da Margarete/ pra conver-sar alguma coisinha sobre ( ) um assunto de ( ) ... que a gen-te possa discutir / nao e então** / Margarete // (F.A, p.64, l? 1.).***

(2) // mas na realidade / o problema dela é de ( ) instrumental / né // é o ( ) o verbal // e o ( ) é o ( ) ... e não tá habi-li ( ) nao tá habilitada pra ( ) pra ( ) ... nao se acostumou a se expor pra conversar / pra falar // (F.B, p.65, 83 1.)

(3) // mas ele diz que ( ) toda a vez que ele vai escrever / ele ( ) tem assim ( ) uma empolgaçao por aquilo que ele vai es-crever / (F.D, p.81, 1? 1.)

(4) // então é um trabalho assim que eu ( ) eu acho que ( ) é um trabalho maldito / é um trabalho neurotizante / um trabalho ( ) obcedante//às vezes você fica ( ) fissurado naquilo // (F.D, p.81, 24a 1.)

*Nesse exemplo, além dos parênteses, aparecem também as reticen-cias. Sao usadas sempre que se quer indicar que a estrutura ficou inaca-bada.

**Entoação interrogativa (não é então?). ***F.A = Falante A; 1? 1. = primeira linha.

Page 32: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

24

(5) / eu acho que as pessoas têm uma capacidade muito grande em ( ) sm ( ) em (E) se adaptar ou ( ) ou criar afeto por coi-

" sas e ( ) até por objetos // então / como hã essa ( ) essa necessidade do casal / essa lacuna / e as pessoas tem uma ( ) capacidade muito grande em ( ) criar afeto por coisas / (F.E, p.86, 13? 1.)

3.1.2 Hesitações manifestadas por pausas preenchidas

As pausas vim, às vezes, preenchidas pelo alongamento

dos sons (E) e (Ã), sendo pouco mais freqüente o uso do pri-

meiro. Tal como as pausas silenciosas, estas normalmente

ocorrem fora de fronteiras de constituintes (exemplos de 5 a

8 ) .

(6) // que se torne num nível bom / num nível em que você perce-ba certo progresso/ e voce vai ver que ( ) ... (F.D, p.82, 7? 1.)

(7) / e a gente continua (E) dando a ( ) a matéria e ( ) insis-tindo em currículo (E) de forma que a criança precise desse auxílio dos pais // (F.H, p.114, 10? 1.)

(8) // então os pais que adotam um filho / que (E) digamos (Ã) tiverem ao alcance de ( ) de ( ) de evitar que aconteça essa diferença de tratamento / né // (E) então pra que adotar // (F.E, p.90, 23? 1.)

Notou-se que, na amostra, de modo geral, as pausas

preenchidas por esses sons são menos freqüentes do que as

pausas silenciosas.

Para se ter uma idéia dessa diferença de uso, a tabela

abaixo registra a ocorrência numérica individual de hesita-

ção dentro das primeiras 2 00 palavras dos diálogos.

Page 33: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

25

TABELA DE FREQÜÊNCI-A DAS HESITAÇÕES ENTRE OS FALANTES

FALANTES

PAUSAS S I L E N C I O S A S

PAUSAS PREENCHIDAS TOTAL

( ) ( E ) ( A )

A 16 - 1 17

B 15 2 - 17

C 13 3 - 1 6

D 2 - - 2

E 1 k 3 - 17

F 11 2 - 13

G 8 8 - • 16

H 5 1 1 7

1 1 1 - 2

TOTAL 8 5 2 0 2 1 0 7

O'DONNEL e TODD afirmam que, normalmente, as pausas

preenchidas são mais freqüentes, uma vez que as pausas silen-

ciosas tendem a ser ambíguas, pois podem ser interpretadas

pelo ouvinte como um sinal de que o outro lhe está cedendo a

posição de falante. Por outro lado, afirmam que quanto maior

for o grau de conhecimento, intimidade entre os interlocuto-

res menor será o número encontrado de pausas preenchidas

(p.67). Essa observação final talvez venha a explicar essa

somatória de 85 pausas silenciosas contra 22 preenchidas pe-

los sons (E) e (Ã), pois, conforme se observou, entre os fa-

lantes da amostra, ê grande o relacionamento de amizade.

Page 34: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

26

A tabela acima mostra a hesitação bastante freqüente

entre os falantes — dos nove, apenas três hesitam pouco.

0 porquê da maior ou menor hesitação, conseqüentemente

da maior ou menor fluência na linguagem oral, seria tema. para

um estudo â parte. Um dos itens a serem considerados giraria

em torno das questões colocadas neste trabalho, relativas às

maiores ou menores reflexões sobre o assunto do discurso.

Poderia também fixar-se na hipótese de que o maior domínio

da escrita leva a um maior domínio da oral (o falante D, por

exemplo, que utiliza pouca hesitação, ê escritor).

t 3.1.3 Palavras que atuam como reorganizadoras do

discurso ou permitem que o falante ganhe tempo na organização subseqüente do mesmo

As palavras d¿gamoA , d¿gamo¿ a¿&¿m, que.si dlz<tfi,

né, não Ae¿, u í lã, acompanhadas ou não de hesitação (alon-

gamento de suas tônicas), normalmente são usadas na oral com

o objetivo principal de permitir que o falante ganhe tempo na

organização do que pretendem dizer. Muitas dessas palavras "k atuam como reorganizadoras do discurso.

A ~ A maioria dessas palavras e expressões e das que se apresenta-rao a seguir, nao aparece na amostra unicamente como produto do nao pla-nejamento do discurso. De modo independente e ãs vezes ate mesmo parale-lo, essas palavras desempenham também varias outras funções. Por isso, nao se farã qualquer espécie de levantamento quantitativo com relaçao as mesmas.

Page 35: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

27

® Ai¿>¿m

Não se notou na palavra a¿¿tm qualquer significado es-

pecial quando é proferida com ama queda de. tom ba¿ tante. te.n-

ta. Viria funcionando apenas como uma especie de piee.nch.edo-

fia de. pauóa, vindo, nesse caso, normalmente ligada ao verbo

ou ao substantivo que a precede (exemplos 9 a 14). Ja, quan-

do quando proferida num tom que sobe na tônica, quando liga-

da ao adjetivo ou advérbio que comumente a sucede, observou-

se que a palavra aòòim parece vir também modalizando a fala

(exemplos 15 e 16). Sua principal função seria a de se obter

"uma caracterização modal para o que se lhe segue" • Viria

como atenuadora de "força ilocucionária".3

// tem assim ( ) outras ãreas mais ( ) talvez (Ã) técnicas / né / (Ã) biológicas / ou coisa assim / (F.B, p.71, 28? 1.)

(E) por exemplo / foram bem criadas / ali / ne / que você esta-va falando// da criança assim que ( ) ... (F.C, p.88, 26? 1.)

// e nós vemos coisas assim ( ) coisas (E) engraçadas até / (F.F, p.96, 28? 1.)

É / / e a ( ) e o ( ) e assim pra ( ) pra encerrar / assim a mensagem que a gente como obstetra / (F.F, p. 100, 22? 1.)

"MARTINS, A.S.N. Algumas características do Português Falado. In: GRUPO DE ESTUDOS LINGÜÍSTICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO. Estudos lin-güísticos. Campinas, Pontifícia Universidade Católica, 1982. p.18, 19. Ao apresentar exemplos do assim como preenchedor de pausa e como modali-zador, não menciona critérios. Torna-se difícil, em alguns casos, perce-ber a distinção. Examinem-se dois de seus exemplos: "Ficava aquela es-quina, assim como uma meia dúzia de homens olhando um para o outro . . ." "Urrou, assim por meia hora" (p.19). 0 primeiro exemplo ê dado como sen-do modalizador e o segundo como preenchedor de pausa. Acredita-se, no en-tanto, que esse segundo também possa ser classificado como modalizador, considerando que o falante nao quisesse ser categórico, não quisesse pre-cisar o tempo.

(9)

(10)

(11)

(12)

Page 36: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

28

(13) / tudo isso / já é uma coisa assim que ( ) ... (F.H, p.103, • 14? 1.)

(14) 5? serie / tudo / (E) pessoas assim que ( ) (Ã) os pais jã tao pensando em preparar pra faculdade / (F.H, p.106, 23? 1.)

(15) / que nao ( ) não ( ) nao ficam incutidas tanta coisa / né / assim ( ) camufladas / (F.A., p.69, 15? 1.)

(16) Olha / a ( ) a adoçao / era uma palavra que ( ) vivia assim bastante distante da gente / (F.F, p.94, 54 1.)

® VIgamos

0 digam06 é também utilizado freqüentemente na lingua-

gem oral com o objetivo que se tem na escrita — o de esta-

belecer uma suposição. Nesse caso, o tom normalmente sobe na

tônica e o ritmo se acelera (exemplos 20 e 21).

Quando usado mais para permitir ao falante aquele tem-

po necessário, vem caracterizado pela mesma queda lenta de

tom mencionada com referência ao aòòlm (exemplos de 17 a 19).

Nos dois casos o dlgamo¿ vem, ãs vezes, marcando um ponto de

quebra na estrutura, vem indicando a reorganização das idéias.

/ uma ( ) uma mãe (E) digamos / (E) em relação a um filho adotivo / (F.E, p.86, antep.l.)

// então os pais que adotam um filho / que (E) digamos (Ã) tiverem ao alcance de ( ) de ( ) evitar que aconteça essa dife-rença de tratamento / né // (F.E, p.90, 234 1.)

Mas / Ëdson / (E) já é praticamente ( ) ... digamos ( ) den-tro de um contexto social / existe casos / (F.G, p.98, 14? 1.)

/ a respeito de sua boa vontade / da sua ( ) ... (E) digamos do amor que voce ( ) ... da doaçao / que voce tá fazendo / (F.G, p.98, 18? 1.)

Mais tarde / né / quando a criança ... digamos se isso for escondido da criança / mais tarde / a criança vai sentir mes-mo um ( ) digamos* um impacto // (F.E, p.87, ult.l.)

Odigamos parece vir aqui também modalizando a fala.

(17)

(18)

(19)

(20)

(21)

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29

© VigamoA aòòlm

O cUgamoA e o a¿i,im aparecem às vezes formando uma única

expressão. É um recurso para se ganhar mais tempo na organi-

zação do pensamento.

/ e ( ) podia digamos / ate nao preparar o ( ) o ( ) o ( ) digamos assim / o ( )a ( ) a oraçao inteira/ né / (F.B, p.74, 30? 1.)

Bom / resumindo / digamos assim / (E) voce em termos de pa-pai agora / (F.G, p.100, 17? 1.)

® Quen. dize.fi

0 quefi dizun. vem freqüentemente indicando um novo rumo

sintático, marcando uma mudança estrutural. Ê nessa função

considerado como reorganizador do discurso, como elemento ré-

tif icador, aparecendo sempre depois de uma construção frasai

truncada, cujo desenvolvimento foi omitido.

(24) / ( ) mas ( ) depois eu fui (E) ... quer dizer / fiquei lá um ano e meio // (F.B, p.65, 17? 1.)

(25) // então / era ( ) ... quer dizer ( ) era coisa mais especí-fica sobre teatro // (F.B, p.66, 34? 1.)

(26) // eu crio as coisas ... quer dizer / deixo jogado num can-to / (F.D, p.84, 21? 1.)

É pela entoação que se percebe quando o que.fi di.ze.fi

vem marcando um ponto de quebra, a mudança de rumo do pensa-

mento. Notou-se que sempre que o falante deseja dar a idéia

(22)

(23)

Page 38: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

30

de retlfilcaç.ão4 o tom nessa expressão torna-se dei ce'ndent e

cora uma queda acentuada em relação ao tom que vinha sendo

usado. 0 ritmo coòtuma acelera'i-òe, havendo normalmente a

supressão da vogai l. Além disso, a parte retificada costu-

ma iniciar-se no mesmo tom mais alto anterior a essa expres-

são. Observe-se o gráfico:

^ k d ' \zer

© Vamos dlzo.fi

O vamoó dl zun. aparece ora como elemento retificador, ora

Indicando malò uma ¿upoòlção. No primeiro caso tem a entoa-

ção característica do quer dizer retificador, aparecendo do

mesmo modo em pontos de ruptura sintática (exemplo 27). No

segundo caso, quando ovamoé dizer expressa a Idela de òupoòl-

ção e o que está suposto vem a seguir, o tom ê mais alto na

última sílaba do dizer* (exemplo 28). Examine-se o gráfico

a seguir:

40 quer dizer aparece na amostra, ora introduzindo uma conclusão, ora uma explicaçao. Ao falar do quer dizer como elemento explicativo, MARTINS apresenta-o como tendo o mesmo valor das partículas explicativas ou seja, isto é(p.l6). Essas partículas, todavia, podem ser substituídas pelo quer dizer apresentado nos exemplos (24), (25) e (26) sem que sua função retificadora se altere. Como elemento retificador parece nao ha-ver problemas quanto ao reconhecimento de suas características entoacio-nais. 0 difícil e perceber entoacionalmente a distinção entre essas duas outras funções, pois mesmo semánticamente, em muitos casos, hã dúvidas nesse sentido.

*Observe-se que o assim catafõricoj bem como o digamos e o vamos di-zer, quando estes últimos indicam uma suposição e a coisa suposta vem a seguir, tem uma característica entoacional em comum: o tom sobe na síla-ba tônica final. Parece possível afirmar que o significado sistêmico des-se contorno entoacional e o de introduzir uma informaçao nova que vem a seguir.

Page 39: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

31

(27) // eu sei que a ( ) a situação ( ) ... Vamos dizer ( ) o dia em que a Sheila veio pra nós / a correria que nós tivemos atras de documentos e papéis / (F.F, p.98, 303 1.)

(28) // não importa/ Vamos dizer / se seje da gente / se sejede ou-tro // (F.F, p.98, 29? 1.)

® Wé

A expressão ne, que costuma aparecer com grande inci-

dência na linguagem oral, é mais freqüentemente usada na fun-

ção fática (classificação de Jakobson)5 de testar a opinião

do receptor, saber se o compreendeu bem. Dentro dessa mesma

função, é usada, muitas vezes, no sentido de confirmar-lhe a

atenção, de prolongar a comunicação. Isso quando o contexto

em que aparece "veicula uma mensagem de simplicidade corri-

queira"6 .

Outras vezes, ainda, observou-se que oné vem desempe-

nhando a função de pfieenc.he.don. de. pausa, caso dos exemplos

abaixo.

Verificou-se que, distribucionalmente, a expressão

ne. aparece dentro orações, entre uma oração e outra ou no

final de períodos.

Na posição mediai observou-se o mesmo fenômeno acen-

tuado por MARTINS: "há uma pausa acentuada que quebra o ten-

5JAK0BS0N, citado por GUIRAUD, P. Semiology. London, Routledge & K.Paul, 1975. p.7.

6MARTINS, p.16.

Page 40: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

32

sionamento da organização sintática e ne. deixa de ter a mes-

ma força entoacional que o de sua posição final"7 .

Ao perder a força entoacional, o ne. ê proferido em tom

mais baixo em relação ao das palavras anteriores e, normal-

mente, de forma alongada, demonstrando hesitação (exemplos

29 a 32).

(29) // e ( ) a gente tem visto muito no teatro /ne / que (E) ainda que i uma ãrea onde as pessoas tem que se expor / ne / mais verbalmente // (F.B, p.64, 9? 1.)

(30) / e ( ) e expressarem verbalmente / o seu pensamento / ne / que a nossa ( ) que a escola / tem assim / muita deficiencia nesse aspecto // (F.B, p.64, 7? 1.)

(31) Isso é verdade // e a gente concorda / né / porque a socie-dade em geral / eu acredito / (F.A, p.64, 14? 1.)

(32) Eu vou pegar ... eu ( ) gosto muito de citar as pessoas / nê / os escritores / (F.D, p.79, 53 1.)

* Não ò e.Z, ò<lá. lá.

As expressões não ò e.Ã. e ¿e-c £5, como o d¿gamo¿, o queà.

di.ze.si e o vamoò d-íze.fi, denotam mudança de rumo do pensamento

e ocorrem em pontos de ruptura da construção sintática. Nes-

se caso, não costumam vir seguidas da conjunção integrante ¿e.

e, nas palavras de MARTINS, são "asserções atenuadas que mo-

dalizam o ato de saber"8, além de expressar uma certa angús-

tia, desgosto, crítica por parte do falante. Esse conteúdo é

transmitido nos exemplos transcritos a seguir:

(33) // e então / quando e alguma coisa mais cerrada / eu chego até a ( ) ... não sei. / no final fico (Ã) desnorteada / che-go até a chorar / porque ( ) porque a gente ( ) ... sei lá II você leva ( ) ... (F.A, p.65, 34? 1.)

7MARTINS, p.15. 8MARTINS, p.18.

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33

(34) A gente aprende ./ mas nao ( ) ... não sei / e como se ( ) ... sei la I a. propria escola nao te motivasse a isso // (F.H, p. 104, 13? 1.)

(35) Nao / nao // simplesmente eles ( ) ... sei lá / lêem em al-gum lugar / veem que no outro país e assim // (F.H, p.HO, 7? 1.)

3.1.4 A imprecisão da linguagem

Ainda como decorrência da falta de planejamento do

discurso oral, ê comum o emissor acabar deixando suas idéias

um pouco vagas.

A norma social tolera essa imprecisão maior que cos-

tuma ocorrer, talvez por não dispor o falante, como na lin-

guagem escrita, do mesmo tempo que lhe permite encontrar pa-

lavras adequadas que traduzam o seu pensamento de forma mais

fiel.

Note-se que muitos falantes, ou por sentirem dificul-

dade em se expressar, ou por considerarem certos detalhes

desnecessários, costumam usar de expressões que deixam cons-

tituintes com valor semântico vago.

(36) // meu Deus / eu nao posso ser tola// eu sei falar muito bem / tudo // mas se eu falar dessa maneira / (F.A, p.74, 6? 1.)

(37) // e ( ) tem vocabulario reduzido / pouca leitura / tudo / né / (F.B, p.65, 11? 1.)

(38) /desde o primario / e mesmo 5? série / tudo / (F.H, p.106, .23?

O vocábulo tudo em (36), (37) e (38) tem uma entoação

distinta da que teria nos casos em que é sujeito ou comple-

mento. Nesses exemplos há certas unidades sintáticas idênti-

cas colocadas em seqüência, com ou sem a presença da conjun-

ção coordenativa e, tendo todas elas idêntico. contorno meló-

Page 42: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

34

dico. O -tudo ocupa o lugar de uma dessas unidades sintáticas,

repetindo o contorno melódico das anteriores e apresentando

um conteúdo semântico vago (corresponde mais ou menos ao va-

lor pragmático de etc.).

0 tudo aparece ainda como parte da expressão e tudo

ma¿6, com o mesmo valor semântico e com as mesmas carac-

terísticas entoacionais.

(39) / porque o nascimento e uma coisa assim linda/ mesmo / ne // é aquele momento de felicidade/ aquela espera e tudo mais // (F.F, p.99, 23a 1.)

(AO) / eu que lido com esterilidade feminina e tudo mais / (F.F, p.100, 25a 1.)

(41) / em que os pais têm tempo pra atender / pra cuidar / pra orientar nas lições e tudo mais 11 (F.H, p, 114, 54 1.)

Essa imprecisão da linguagem vem ainda traduzida pe-

las expressões não ¿e-i o que., e i.000 e aquilo, ou lòòo ou

aquilo, e tal, tal e cotia.

Essas expressões, como nos dois casos mencionados aci-

ma, também apresentam o mesmo contorno entoacional de unida-

des sintáticas precedentes, ocupando com valor semântico in-

determinado o lugar de uma dessas unidades.

(42) / os veteranos ficavam tudo assim // pô / mas que pergunta idiota / pô / mas que não sei o quê I! (F.B, p.66, ult.l.)

(43) / exigiu-se uma série de materiais pra poder funcionar um ( ) os cursos profissionalizantes / e isso e aquilo II (F.I, p.105, 74 1.)

(44) // quem ainda nao pensa / quem não tem a necessidade finan-ceira de um emprego / ou isso ou aquilo / nao vai querer fi-car na escola // (F.I, p.108, 244 1.)

(45) // então / e aí / dependendo da educaçao que também foi dada / desenvolvimento da criança/ e tal / né / (F.E, p.88, 64 1.)

(46) /e como se minha mulher tivesse tendo um parto / né // o nervosismo nosso / tal e coisa / e tudo mais / e nenê / (F.F, p.98, 324 1.)

Page 43: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

35

(47) // eu cheguei a procurar terapia / assim achando que eu era uma pessoa doente / não sei o que / e tal / (F.B, p.65,

- 14? 1.)

(48) // procuram terapia / procuram psicólogo/ procuram não sei o que não sei o quê // (F.B, p.65, 6? 1.)

(49) / e ela acompanha as crianças todo dia// o meu nenezinho fez isso I e tal I tal / (F.F, p.99, 34? 1.)

A palavra ¿¿¿o também ê usada com conteúdo semântico

vago. Em (49) e no exemplo (50) abaixo, ela aparece sem an-

tecedente no diálogo. Pela entoação ocupa o lugar de um dos

elementos de uma enumeração.

(50) // então você vê ... você ouve muita musica / você vê isso / você vê mais teatro ou ( ) a ( ) teatro não / mais futebol do que teatro // (F.A, p.69, 35? 1.)

Indicando ainda essa idéia de imprecisão é interessan-

te apontar o uso da expressão tá (que no exemplo abaixo não

deve ser confundida com a forma abreviada do verbo estar, na

3§ pessoa do presente do Indicativo).

A amostra não tem registro dessa expressão com aquela

função de "feedback" com que é comum na oral. Também não é

usada com a função do ne de prolongar a comunicação.

Em (51), o tá apresenta mais ou menos a mesma entoa-

ção dos verbos que a cercam, distinta, portanto,daquela que

teria nas funções acima. Por isso parece vir representando

parte de uma mesma seqüência de ações.

(51) / um menino que escreve / daí ele fez um roteiro / eles de-coraram / tã / e apresentaram // (F.B, p.75, 89 1.)

Page 44: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

36

Essa imprecisão que costuma ocorrer na oral, revela-se

igualmente, pelo uso constante da palavra co-¿4a; ela pode se

referir a tudo que existe ou pode existir no Universo. Por

esse motivo é usada em substituição a palavras que seriam mais

exatas. É um "substantivo coringa"9.

(52) // principalmente / numa ( ) argumentaçao assim / bastante mais ( ) forte / chega num ponto que eu ( ) tipo assim / uma coi-sa que eu ( ) eu chego ati a perder mais ou menos o ( )o con-tato // (F.A, p.65, 32? 1.)

(53) / e com esse medo / com essa ( ) coisa que surgiu / (F.A, (p.69, 9? 1.)

(54) / agora esse do ( ) dos pais assim / eu acho Uma coisa / sei la / eu acho que talvez seja das coisas mais graves que exis-ta // (F.H, p.95, 11? 1.)

Vê-se na amostra ainda o uso de sílabas que se repe-

tem representando possivelmente várias orações:

(55) // tem aquele poder / mas chega lá / bã bã bã II bã bá bã II bã bã bã // (F.A, p.73, 42? 1.)

(56) // e nao é... e ( ) e esse ímpeto ... pode ser que tenha ... a pessoa fale // te te tê 11 te te te /1 mas ela nao tem aque-la capacidade / como diz/ de organizaçao// (F.A, p. 74, 2? 1.)

9 Esse termo ê usado por Diño PRETI. Ao exemplificar o "trunca-mento frãsico" que costuma ocorrer na linguagem oral, observa o seguinte: "Note-se o nível do vocabulário, incluindo um 'substituto coringa' (ne-gocio), de uso abusivo na fala atual, servindo para as mais diversas acepções ..." "- Nao sirvo para isto... estas coisas nao se dao com o meu gênio... Estou a tremer como se fosse o negócio comigo... 229". (Socio-lingüística; os níveis da fala. São Paulo, Nacional, 1975. p.97).

Page 45: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

57

3.1.5 Quebras de estrutura

Constantemente na oral verificam-se quebras de estru-

tura. Neste capítulo, ao se falar nessas quebras, tem-se

em mente chamar-se a atenção para as estruturas interrompi-

das, inacabadas, que ocorrem pela falta de planejamento do

discurso.

Não se quer enquadrar aí os casos de orações que têm

partes implícitas que são recuperáveis em virtude do contex-

to lingüístico. A produção de tais orações advém, como afir-

ma Lyons, da "competência de elipse" do falante. Este deve

ser capaz de se expressar através de frases "gramaticalmente

incompletas", mas significativas, coerentes. Como ilustração

a essa competência que o falante deve ter, cita o caso das

respostas elípticas. Em resposta à pergunta - "When are you

leaving?", dir-se-ia simplesmente - "As soon as I can". Se-

ria desnecessário colocar-se aí o "I am leaving" uma vez que

já se encontra na pergunta.

Lyons fala também dessa competência do falante em re-

lação à presença do contexto situacional. Conforme o que se

viu na Revisão da Literatura, a escrita seria livre de tal

contexto ( context-free ); teria de criar seu próprio con-

texto, através unicamente do verbal, enquanto que na oral, a

linguagem poderia manifestar-se dependente dele (context-

bound, context-tied, context-dependent). Para Lyons, um dos

aspectos que viria manifestando essa dependência seria a

elipse - "One aspect of context- dependence is manifested in

what is traditionally called elipsis". 10

10 LYONS, v.2, p.589.

Page 46: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

38

Não podem ser considerados ainda como quebras de es-

trutura devidas a falta de planejamento, os casos em que o

falante deixa, por exemplo, frases inacabadas por pressupor

que o outro já o tenha compreendido, em virtude deste lhe dar

qualquer tipo de sinal indicando esta compreensão. Entretan-

to, como neste trabalho não foram feitas gravações de vídeo

é difícil dizer quando isso ocorre; pode ter sido o caso,

por exemplo, da oração (57) abaixo:

(57) // é porque também é um problema estrutural / de ( ) de es-trutura de sociedade/ que nos ... né // que nao faz desabro-char // - Mas é que prum governo também interessa ter um povo desor-ganizado // (Falantes A e B, p.70, 11? 1.)

Convém observar que as frases na oral ficam comumente

inacabadas também por interrupção do ouvinte. Há ocasiões em

que o ouvinte interrompe o falante, levado pelo ímpeto de

completar-lhe o pensamento. Jã em outras,o faz para não per-

der determinada idéia que lhe advém no momento. Para roubar

a posição do outro, normalmente, usa de um volume mais alto

de voz.

(58) - Seja em que época ... [E]~ É // seja em que época for //.(Falantes C e E, p.

92, 323 1.)

(59) - Nao / nao // inclusive ele foi até convidado / ele faz sorrir / então ele ...

[B]- Mas é a forma que é colocado // (Falantes A e B, p.73, 9? 1.)

Dadas essas explicitações, já se pode voltar ao que

interessa no momento — às quebras que o falante faz, decor-

rentes da falta de planejamento.

Page 47: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

39

O emissor, na oral, por não dispor daquele tempo ne-

cessário de reflexão, por estar sujeito, conforme aponta

CHOMSKY, "â limitações de memória, distrações, desvios de

atenção e de interesse", normalmente não reflete em seu de-

sempenho todo o conhecimento que tem sobre a língua, a sua

competência lingüística.11

Quando o falante sente dificuldade em completar ade-

quadamente a estrutura já iniciada, ele tenta normalmente

concluir o seu pensamento por outro rumo. O truncamento pare-

ce acontecer também pelo fato de as estruturas que estavam

sendo emitidas virem, ãs vezes, subitamente associar-se a ou-

tras.

Esses pontos observados estão dentro das palavras de

CHOMSKY: "Uma gravação da fala natural mostrará numerosos

arnanqueò em {¡a¿¿o, desvios das regras, mudançai de -intenção

a melo caminho (sem grifos no original) e assim por diante"

(p.84).

Demarcando essas quebras é comum a presença de pala-

vras tais como: pon. exempto, quen. dlzefir digamos (sublinha-

das nos exemplos abaixo).

(60) // mas na realidade / o problema dela é de ( ) instrumental/ n é / / é o ( ) e o verbal / / e o ( ) é o [ ) . . . é não tá habi-li ( ) não tá habilitada pra ( ) ... não se acostumou a se expor pra conversar / pra falar // (F.B, p.65, 84 1.)

(61) — Hum-hm// agora ( ) eu me referi problema / criança proble-ma no sentido que ( ) ... (E) por exemplo / foram bem cria-das / ali / né / que você estava falando // da criança assim

11 CHOMSKY, N. Aspectos da Teoria da Sintaxe. Coimbra, A.Amado, 1975. p.83.

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40

que ( ) ... as vezes há pessoas que acham / que ( ) o ambien-te / por exemplo / assim ( ) (E) ... do problema hereditá-rio / seria uma coisa assim // que a criança já i problema / porque ela já traz traços/ do pai/ da mae / já i rebelde mes-mo sem saber de nada // (F.C, p.88, 24? 1.)

(62) — E ( ) mas ( ) depois eu fui (E) ... quer dizer / fiquei lá um ano e meio // (F.B, p.65, 173 1.)

i

(63) — É // a falta nao é tao grande// e por outro lado nos dois nao somos ... por exemplo / tem mulheres que se nao tiverem um filho / (F.F, p.100, 13 1.)

(64) — Mas / Ëdson / (E) já ê praticamente ( ) ... digamos ( ) dentro de um contexto social / existe casos / em que casais / que às vezes ficaram anos tentando ter filhos / (F.G, p. 98, 143 1.)

(65) e tem outro detalhe ... agora / 5 curioso / porque o teu co-légio é de freira // (F.H, p.106, 183 1.)

(66) // se eZe sa¿e c^e eZe foi ... se ele recebeu todo ( ) o ca-rinho / (F.C,p.90, 13? 1.)

(67) / tenho que me sentar ali na minha mesa/ e pegar uma folha / e escreuer o que eu ( ) ... aquilo que tá germinando na minha cabeça // (F.D, p.80, 4? 1.)

A palavra agola, em (65), assim como o pofi zxempZo,. o

digamos e o quen. d¿zeA, também indica a mudança de rumo do

pensamento, trazendo, como cada uma dessas expressões, uma

conotação própria. Nessa oração não é advérbio de tempo. Po-

de ser tomada como uma conjunção adversativa, ou como um sim-

ples elemento continuativo.

Observou-se que o ponto de truncamento aparece segui-

do de alterações de volume, de ritmo de voz. Através dessas

alterações, o falante informa ao ouvinte que deve ignorar

toda a oração anterior ou parte dela, como no caso dos exem-

plos (62) , (66) e (67) .

Page 49: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

41

3.1.6 Outras construções que fogem às normas da sintaxe

Da pressa com que as idéias são exteriorizadas na oral,

como se viu dos exemplos acima, surgem quebras na estrutura

manifestadas através de frases que não terminam. Esse tipo

de quebra é facilmente percebido pelo ouvinte, em virtude da

mudança de entoação a que se referiu acima.

Mas, ocorrem outros tipos de deviações sintáticas que,

às vezes, só são observadas quando se lê a transcrição do tex-

to, pois o discurso segue um fluxo normal. É o caso de omis-

sões de palavras e troca de uma forma gramatical por outra,

as quais tornam estranha e muitas vezes, até ambígua, a re-

lação sintagmática das orações e períodos.

Ao se mencionar essas construções não se quer enqua-

drar certas ocorrências que, embora condenadas pela norma

culta, são tidas como corretas por certos grupos sociais, por

fazerem parte de sua competência lingüística. Fala-se de

idiossincrasias, de questões resultantes de desempenho, de

falta de planejamento. Observem-se os exemplos abaixo.

Em (68), somente pelo contexto, pelas afirmações an-

teriores é que se percebe, por exemplo, que o sentido da ora-

ção sublinhada é mais ou menos este: "... dessa nova cria-

tura com a qual (com quem) vocês estão no seu lar ...".

Em (69) há um a¿¿im que funciona pragmáticamente como

preenchedor de pausa, indicando hesitação, e há a falta de iam

que (ou de um de.) para formar a locução tem que. [de.) {¡alan.

(68) — Ë // já que a experiência da primeira / que ainda não se concretizou / e que ainda existe muito ( ) muita tarefa ar-dua / muito ( ) muita labuta pra criaçao dessa ( ) dessa no-

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va (E) nova criatura que vocês estão no seu lar/ que não é de vocês / (E) vai ficar só nessa*// (F.G, p.98, 2? 1.)

(69) / mas ele pelo menos fazia um roteiro / pra ele ( ) pra ele ter lógica do que ele tem assim falar // (F.B, p.74, 32? 1.)

3.2 A LINGUAGEM ORAL TEM O RECEPTOR E 0 CONTEXTO PRESENTES

3.2.1 A presença do receptor

Conforme se apontou na Revisão Bibliográfica e se pô-

de constatar analisando-se a amostra, o emissor não se dá o

trabalho de deixar suas idéias muito explícitas quando o re-

ceptor está presente. Isto porque sabe terá a chance de uma

adequação, uma.realimentação imediata da mensagem, uma vez

que o outro poderá reagir através de signos verbais ou não

verbais, caso não o tenha compreendido bem.

É lógico que o emissor não espera passivamente pela

reação do receptor. Verificou-se que, constantemente, ele

procura testar-lhe a compreensão, através, principalmente, da

expressão né (não é) e de outras como as sublinhadas nos exem-

plos abaixo.

Esses elementos são chamados {¡ãtlcos. Além de mani-

festarem esta procura de "feedback" pelo emissor, também têm

como função captar a atenção do receptor e prolongar a comu-

nicação.

*A entoaçao nesse final de período é de interrogação.

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43

(70) se ela entra no 2? ano / por exemplo / porque as outras esco-colas compram / dao um jeitinho/ né // (F.I, p. 105, 16? 1.)

(71) // e então eu acho / que essa uma do teatro se colocar numa posição esquerdista / sabe / (F.B, p.72, 18? 1.)

(72) / ele vai / sendo bem criado / ele vai entender / ele vai re-ceber o impacto / entendeu // ele vai receber // mas vai ser compensado // (F.E, p.88, 11? 1.)

(73) / ela pode / pode reagir de uma maneira (E) (E) prejudicial a ela própria I né it entende o que eu quero dizer // (F.E, p.92, 21? 1.)

(74) / mostrar que ele e um pai adotivo // que ele tem outro pai / certo II pra ate chegar numa ( ) num certo ponto / né / e dar inclusive até opção / de ( ) dessa ( ) dessa pessoa até pro-curar quem sabe o outro pai // sabe como é que é // o pai verdadeiro // sabe como ê II (F.E, p.92, 7? 1.)

(75) // que a lei tirou do professor a liberdade dele / por exem-plo/ decidir o que ele quer dar / como ele quer dar // enten-de / ele é uma pessoa/-assim / que nao participa mais das de-cisões da Escola // (F.H, p.104, 17? 1.)

Na oral, o emissor omite tudo o que julga óbvio para

o receptor. Não há aquela preocupação, como na escrita, em

fazer da linguagem um código universal. Veja-se, por exem-

plo, o trecho do diálogo entre os interlocutores A e B, ã

página 71 do anexo, da 13 â 9? linha. O emissor deixa os

verbos com sentido incompleto. As únicas palavras que apare-

cem ocupando a posição de complemento são di&¿o e -c-i-òo, as

quais apresentam conteúdo semântico vago, pois não têm ante-

cedente no discurso.

-Apesar de muitas informações nesse referido trecho não

terem ficado claramente expressas para quem lê a transcrição,

pôde-se perceber, não houve necessidade de o emissor escolher

alternativas sintáticas mais explicitas, pois o receptor da-

va a todo momento demonstrações lingüísticas claras de que

sabia o que o outro estava pretendendo dizer. Essas demons-

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44

trações de compreensão devem ter sido feitas também por meio

de gestos e expressões faciais.

Conforme se apontou no capítulo 3.1.5, dada a ausên-

cia de gravações de vídeo fica difícil, muitas vezes, saber

quando uma oração foi deixada inacabada por falta de plane-

jamento, ou quando por essa questão de pressuposição do ób-

vio por parte do falante.

Nos casos dos exemplos abaixo, no entanto, embora se

tenha dificuldade em descrever com exatidão a entoação usa-

da, percebeu-se que há um tom ascendente na sílaba tônica da

última palavra da oração interrompida. Isso viria indicar que

a interrupção não foi feita por falta de planejamento, mas em

virtude de o falante considerar de conhecimento do ouvinte o

que ele pretendia dizer. A amostra registra, freqüentemente,

uma manifestação do ouvinte que vem confirmar esse ponto de

vista.

Além disso, note-se que alguns desses exemplos regis-

tram a reação lingüística positiva do ouvinte, mesmo face a

essa imprecisão, o que vem confirmar a questão colocada de que

na linguagem oral o falante não precisa escolher de imediato

alternativas sintáticas tão explícitas. » .

(76) / procurar usar o humor / procurar usar a capacidade nossa / e ir jogando / que o negócio ... tipo uma semeadura / ne /

Ê 1/ ir semeando // (Falantes A e B, p.72, penúlt.1.)

(77) Ë // porque quando há exigência / começa ... — Lógico // (Falantes H e i , p.107, 114 1.)

(78) // e você já tem toda uma infra-estrutura montada/ então ... — Daí vai permanecer // (Falantes H e i , p.108, 154 1.)

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V

45

(79) // mais por questão / assim / de os pais incutirem ãs vezes . na criança // mas por ela mesmo ... — É / os pequenos eu acho que nao// (F.H, F. I, p.109, 4? 1.)

Para // ve Margarete // mas se vem uma parte jã de ( ) de formaçao .. . nao é então // ê difícil pra você desabrochar uma coisa que você quase que ( ) que nunca toca// (F.A, p. 69, 313 1.)

Mas ê que prum governo / também interessa ter um povo desor-ganizado // porque daí / a partir do momento em que as pes-soas começam a se organizar .. . você veja// na escola a gente tá organizando um grêmio // (F.B, p.70, 13? 1.)

// não nasceu / deu ( ) deu as contrações ... tem que escre-ver // escrever ë a mesma coisa // (F.D, p.79, 17? 1.)

// podemos brigar durante quarenta anos em cima de determi-nadas idéias e . . . vamos encontrar o presente escritor / o João Cabral de Mello Neto/ que nao acredita em inspiraçao // (F.D, p.84, últ. linha) A gente aprende / mas nao ( ) ... nao sei / ê como se ( ) ... sei la / a própria escola nao te motivasse a isso //a estru-tura da escola / o sistema da escola // e neste ponto / eu acho / por exemplo que ( ) que existe a ( ) a ( ) uma certa razão quando dizem... aí sim / talvez seja defeito da lei // (F.H, p.104, 13? linha)

Os exemplos subseqüentes (85 a 90) mostram que a pre-

sença do receptor também facilita o ato comunicativo do emis-

sor, tuna vez que, se este estiver hesitante pode ser auxilia-

do pelo receptor na complementação do pensamento.

(85) // então / falta uma estruturação / sei lá // falta uma base / um conhecimento maior / quer dizer / um ( ) ... como diz um ami ...

[ B]— Um instrumental maior / né // A — Um instrumental // é // e esse daí / como diz também um

amigo meu / (p. 65, ult.l.)

(86) A — /eu chego até a ( ) ... não sei / no final / fico (Ã) desnorteada / chego até a chorar / porque a gente ( ) ... sei lá // você leva ( ) ...

[B]- Falta argumentaçao // A — Falta argumentaçao // ou as vezes / você fica num ponco

de desespero /' que você nao consegue dizer aquilo que você tá sentindo / direito / (p. 65, 34? 1.)

(80)

(81)

( 82 )

(83)

(84)

Page 54: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

46

(87) E — // então vai / já vai educando a criança / já procuran-do entender que ( ) ...

C — Pesar a situaçao // E — É / pesar a situaçao // se bem que e ( ) é ( ) é peri-

goso / porque esta criança nao tem ainda aquela perso-nalidade formada / né // (p. 92, 123 1.)

(88) F — // porque a gente vê / às vezes / pais tão bons com fi-lhos legítimos tao ruins / né // pais tão ruins / com filhos tão ( ) ...

G — Tão excelentes // F — Né // (p. 96, antep.l.)

(89) F — / tem mulheres que se não tiverem um filho / elas ( ) elas ( ) ...

A — Enlouquecem // F — Enlouquecem / né // (p.100, 24 1.)

(90) F — // então de uma certa forma / a gente tá um pouco em contato / e isso tira um pouco daquele ( ) ...

G — Encantamento // F — Encan ( ) encantamento da gente / né // (p.100, 343 1.)

3.2.2 A presença do contexto

Frisou-se que muitas informações, as que viessem na-

turalmente esclarecidas pelo ambiente, não necessitariam ser

verbalizadas pelo emissor; a referência a determinados ob-

jetos ou pessoas, por exemplo, poderia logicamente ser feita

através de simples pronomes (com a colaboração de um gesto,

um olhar), o que traria a incompreensibilidade ao texto oral

quando transcrito. A amostra, no entanto, não evidenciou mui-

to esse aspecto, talvez, dada a pobreza do cenário (as gra-

vações foram feitas só entre quatro paredes) ou, principal-

mente, pelo fato de o assunto sobre o qual estavam falando

não se referir ao ambiente, ser mais abstrato.

Page 55: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

47

Mesmo assim, em um dos diálogos aparece nesse sentido

um exemplo interessante. O falante H (p.104) vinha tecendo

considerações claras sobre a Lei 5692. Porém, subitamente,

as proposições lançadas passam a não se coadunar com as an-

teriores; parecem não fazer mais sentido. É que, sem preâm-

bulos, motivado pela presença do gravador, certamente por

meio de um simples olhar, ele muda o tópico do discurso e

passa fazer referência ao fato de a conversa estar sendo gra-

vada .

3.3 A LINGUAGEM ORAL UTILIZA-SE DE RECURSOS PROSÓDICOS

Nos itens antecedentes, analisando-se a amostra, pro-

curou-se demonstrar o que advém no Português falado do fato

de o discurso não ser planejado antes do momento de sua pro-

dução e de contar com a presença do receptor e do contexto.

O mesmo pretende-se aqui, em relação ao fato de a linguagem

oral utilizar-se do meio fónico.

Utilizando-se de sons, através dos recursos prosódi-

cos (o tom, volume, ritmo), conforme se verá pelos exemplos

abaixo, o falante consegue:

1) transmitir sua mensagem, mesmo através de todos

aqueles problemas que surgem por questão de o discurso não

ser previamente organizado;

2) passar, sem preâmbulos,da narração ao discurso di-

reto, vivendo situações diferentes de diálogo;

3) sinalizar um conjunto amplo de significados.

Page 56: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

48

3.3.1 Recursos prosódicos como forma de suprir as falhas decorrentes da falta de planejamento

Ao escrever, ao registrar marcas no papel, o emissor

por meio do canal visual, de um modo ou de outro, tem contro-

le da forma com que suas idéias estão sendo colocadas. Tem

a chance de apagar, riscar, modificar a seqüência, a concor-

dância das palavras, caso perceba estarem estas incompatíveis

com as regras exigidas pela sintaxe. Na oral não há essa pos-

bilidade. 0 falante acaba, muitas vezes, esquecendo a dispo-

sição das palavras que proferiu, por exemplo, há alguns se-

gundos. Além do mais, conforme se mencionou, e se pôde ve-

rificar pelas ilustrações, não há tempo para a r e f l e x ã o — a s

idéias têm de ser lançadas como surgem na mente.

A seqüência normal do discurso, em virtude dessa fal-

ta de planejamento, é freqüentemente interrompida. Nos pon-

tos de ruptura há a inserção constante de elementos caracte-

rísticos da oralidade, tais como os citados: por exemplo, o

aòòim modalizador da fala, o preenchedor de pausa, usado com

o propósito de o falante ganhar tempo na organização de seu

discuso subseqüente; o qu.Q.fi dlze.fi no papel de reorganizador

do discurso, etc. Esses elementos colaboram com o ouvinte na

montagem do discurso.

Para essa montagem, no entanto, pelo que se pôde

observar, mais importante ainda seria o auxílio prestado

pelos recursos prosódicos. Verificou-se na amostra, por exem-

plo, que a palavra aòòlm apresenta-se com um tom mais eleva-

do na segunda sílaba, sempre que o falante tem o propósito

de dirigir a atenção do ouvinte para suas palavras subseqüen-

Page 57: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

49

tes (função catafórica). Quando, porém, usado com intenção

oposta (função anafórica) o tom nessa mesma sílaba costuma

descer. Veja-se ainda o caso do que.fi dize.fi. Como elemento

retificador, reorganizador do discurso, apresenta um contor-

no melódico descendente, com uma característica muito signi-

ficativa (pelo menos na amostra): a profundidade que há na

queda da sílaba z <¿fi.

Observou-se que sempre que o falante, de alguma forma,

interrompe a seqüência normal de seu discurso, para que o ou-

vinte vã estabelecendo a ligação entre as idéias, ele altera

o tom que vinha usando, o ritmo, ou ambos, jogando também com

o volume. Desta forma, o ouvinte é levado a perceber que o

falante deixou a estrutura inacabada para tentar expressar-

se melhor através de outro rumo, para intercalar alguma outra

idéia, ou ainda, por exemplo, para retificar uma afirmação

anterior. Se esses pontos não fossem assinalados prosódica-

mente, o ouvinte não conseguiria entender com clareza a men-

sagem pretendida. Tome-se por base a leitura (sem a audição

das respectivas fitas) de muitos trechos transcritos no ane-

xo, em que se evidencia esse problema de falta de planeja-

mento .

Os exemplos (91) e (92) vim ilustrar o caso de elemen-

tos que, embora contíguos, não fazem parte do mesmo consti-

tuinte imediato:

(91) Mas e a forma que e colocado // porque ele tã numa posição já ( ) de ( ) / em termos assim ( ) digamos / de força / ou po-der / ou qualquer ooisa semelhante // (F.B, p.73, 113 1.)

Page 58: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

50

Nesse exemplo, o falante está comparando o Chico Aní-

sio ao Presidente da República.

Ouvindo-se a fita, percebe-se que a palavra semeZhante

não vem complementando a expressão quaZquer coisa, isso,

acredita-se, pela elevação de tom que ocorre na palavra col-

¿a (diagrama abaixo) e pelo seu ritmo breve.

Acompanhando-se o raciocínio do falante, pelo contex-

to geral, vê-se que s zme.Zha.nte., embora deslocada, vem quali-

ficar a palavra posição, apesar da presença do advérbio jã e

da preposição de. Idéia que pode ser confirmada pela reação

do receptor, ao dizer imediatamente, referindo-se ao Chico

Anísio, a seguinte frase: "Semelhante // ele galgou isso //

(ver Anexo) .

Observe-se ainda, o exemplo abaixo:

(92) — Teve ( ) teve um ( ) um alemao ai / que veio para uma firma aí / pra ( ) técnico assim / né / e eu sei que ( ) ... que tã fa-zendo um curso / ne / que meu marido tã fazendo / e daí / sei que ( ) diz de um dia pra outro / diz que o técnico foi embo-ra // (F.B, p.77, 31? 1.)

Note-se que em (92) a oração sublinhada pode parecer

um complemento da anterior — uma Subordinada Substantiva.

Porém, através do seu destaque, pela referida contraposição

de tom, de ritmo, de volume, percebe-se tratar-se de uma ora-

ção Varentetlca, uma Adjetiva Explicativa. 0 ritmo torna-se

mais acelerado, o tom e o volume mais altos:

Page 59: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

51

ritmo mais acelerado, volume mais alto

^ que ta fazendo um

~~ ^ x so / ' i TOM MÉDIO e eu sei que M •. • e !

Nesses dois exemplos, como se viu, os recursos prosó-

dicos ajudaram a indicar a verdadeira relação sintática en-

tre as palavras do discurso. Em (93) e (94) vêm assinalando

a idéia de fiztt^icação:

(93) e ele foi fazer uma ( ) (TS) uma reportagem // uma reporta-gem // é / foi dar uma ( ) palestra lá na ( ) Universidade // (F.A, p. 66, 10? 1.)

(94) acha que todo o mundo e bebezinho / porque ele conseguiu um ( ) um lugar ao sol I! ao sol / né // que sol // (F.A, p.70, antep.l.)

Para indicar a correção, o falante repete o que dese-

ja corrigir num tom mais baixo e descendente.* Usa também de

um contraste de ritmo. Em (93) como vinha falando em ritmo

mais lento, repete a unidade sintática uma n. up o fita g em em rit-

mo acelerado. Em (94) dá-se o contrário: quando ao ¿ole. re-

petida, o ritmo torna-se mais lento.

*Em um trecho do diálogo do falante E, que nao consta do anexo, há um exemplo em que o uso de recursos prosódicos também assinala a idéia de retificação, só que de forma diferente: Você dá / dá// dá brinquedo pra ela / dá brinquedo / né / dá brinquedo / dá uma mesada // uma mesa-da //. A palavra brinquedo nao é proferida pela última vez em tom mais baixo e descendente. 0 que há é o seu aceleramento de ritmo: através da supressão da vogai o, há a sua junção com a oraçao dá uma mesada. Essa mudança rápida de ritmo, somada ã. ênfase que se verifica pelo maior vo-lume e alongamento colocados a vogai tônica de mesada, é que dariam a idéia de retificação, uma preferencia pela mesada. Para reforçar a idéia de retificaçao, a unidade considerada correta vem ainda repetida num tom mais elevado, mais agudo.

dá br in uma me TOM MÉDIO-» I que __ dá br in Çâs uma \ sada //

L do / né . / IquedJ Ime sada //

Page 60: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

52

TOM MÉDIO

ritmo mais acelerado

uma repor \ta \ g e m //

ritmo mais lento

3.3.2 Recursos prosódicos como forma de assinalar troca de papéis ou de situações do diálogo

Os falantes costumam interromper a narração e inter-

calar, sem preliminares, o discuro direto. Colocam-se no

lugar das pessoas da citação. Falam por elas (95).*

Observou-se que nem sempre a vivência de situações

diferentes de diálogo, na oral, dá-se por essa troca de pa-

péis. Muitas vezes, o falante transporta-se para uma situa-

ção de diálogo de que ele mesmo participou no passado. De

repente, passa a falar como se dirigisse ao interlocutor da-

quele momento (96).

Na amostra, esses dois tipos de representação, é im-

portante assinalar, são expressos através da elevação do tom,

do volume de voz e do aceleramento do ritmo.

*Vejara-se nesse sentido mais dois exemplos da falante E, que nao constam no anexo: - / ela teria outra ... ah / pera a% / opa // nao vou largar / ter esse filho / nao // aí pelo menos ... nao e //— mas mesmo com essa atençao / aí surge aque ... opa II tã faltando alguma coisa // o que ë // é o filho //

Page 61: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

53

(95) — Então ela vai ter aquele impacto natural de saber / põ / este não é meu pai // pô / pensava que era meu pai // tenho outro // vem o impacto / tenho outro II aquele ê meu pai // este não é II então o choque / de saber que este nao é o pai dele H (F.E, p.90, 33? 1.)

(96) e que as ve ( ) as ( ) / sabe // poxa / mas eu to falando de coração / voce tã falando de cabeça / como é que a gente ... não tem condiçoes de se entender// (F.B, p.76, 35? 1.)

3.3.3 Recursos prosódicos como forma de sinalizar um conjunto amplo de significados

Procurar-se-á, aqui, demonstrar o que ficou expresso

na Revisão da Literatura, de que além da presença do recep-

tor e do contexto situacional (ilustrados no Capítulo 3.2),

nem tudo precisa vir lexicalizado na oral, também em virtude

das idéias que se consegue transmitir jogando-se com o tom,

com o volume, com o ritmo de voz,etc.

Luiz Carlos CAGLIARI, em seu trabalho Oò Tonò do Voh.-

tuguí-i, Bla.¿¿¿&¿fio, afirma, por exemplo, que:

A escolha do tom relaciona-se com a noção de modo (tipos de oraçoes declarativas, in-terrogativas), com a noção de modalidade (asserçao de possibilidade, validade, re-levancia ... do que se esta dizendo) e com as atitudes do falante, seu comportamento protocolar lingüístico, como: • polidez, in-diferença, etc. 12

12CAGLIARI, p.13 (Campinas, 1979. Mimeografado). Esse autor afir-ma ainda que um enunciado pode adquirir sentidos diferentes na medida em que se lhe altera a entoaçao (p.27-8). Apresenta vários exemplos inte-ressantes nesse sentido; o enunciado Apague a luz, aparece com 14 va-riações, entre as quais se encontram as seguintes:

//:1+ „ A/pague J /lut // {iMittincía) .

//5 - . V p a g u e t /luz //

WaciU£0)

/A „ A/pague . /lui II {iãplOM) jj M //l-̂A/pagu. » Huz II li

— {lUou u. p^tveiúnií ...) ||—

Page 62: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

54

Nas gravações da amostra, em relação a essas at¿tude¿

expressas pelos recursos prosódicos, observaram-se enuncia-

dos revelando, por exemplo, cnXtLca, exa6 peiação, evitu6i.a6mo.

® ClZtica

Em (97) mesmo que o ouvinte não entenda bem o signi-

ficado da expressão quel vei ba¿x.ah.o òanto, acredita-se que,

com o auxílio dos recursos prosódicos, ele tenha condições de

captar o que o falante deseja transmitir — a idéia de que

brasileiro é dn6pie.ocupa.do.

O falante assume uma atitude recriminatoria. Critica

a indolência, a falta de iniciativa do brasileiro.

Essa atitude fica clara pelo ritmo lento do enun-

ciado, pelo enorme alongamento na palavra ¿ a t ó e pela mudan-

ça de tom que aí ocorre — há uma elevação na tônica dessa

palavra e uma volta na pós-tônica ao tom normal que o falan-

te vinha usando na expressão.

(97) o brasileiro é mais / assim / tipo baixar santo / né // quer ver baixar o santo II (F.A, p.77, 25? 1.)

TOM MÉDIO quer v e r í ^ v E . 0 ^ \ .ba ixar o /

Acredita-se que o contorno melódico do enunciado aci-

ma possa conservar semelhante idéia de de6preocupação quando

aplicado também a outras orações afirmativas. Como diz CA-

GLIARI, no entanto, "é difícil fazer generalizações a respei-

to dos significados dos padrões entoacionais" (p.13).

Page 63: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

55

Os significados desses padrões parecera estar freqüen-

temente ligados ao seu contexto lingüístico. A expressão

quando ve tá velho, do trecho abaixo (98), é proferida da

mesma forma que a expressão em (97) e traduz um significado

outro lado, conserva-se a indolência; fala-se da pessoa ido-

sa como tendo falta de energia.

• Exasperação

Os enunciados sublinhados nos trechos abaixo traduzem

uma certa exasperação, irritabilidade por parte do falante.

Dada a ausência de mais exemplos semelhantes a esses

e a impossibilidade de uma análise instrumental, fica difí-

cil afirmar o que exatamente viria sinalizando essa idéia.

O que chamou atenção nesses enunciados, principalmente no

exemplo (98), foi um tom muito agudo, fora do normal, usado

pelo falante.

(98) Meu Deus do céu / a pessoa vive ali / quando vê tá velho / já se sente inútil / (F.A, p.68, 103 1.)

vim pouco diferente. Não há a idéia de despreocupação. Por

M e u a pessoa v i v e / \ ¿ i / ^VDeus ilo

X céu / v e

TOM MEDIO

(99) Meu Deus II mas veja as provas das universidades II as re-dações que os alunos ... (F.A, p.68, antep.l.)

Meu Deus // lyc . )3 AS ^ provas

TOM MEDIO

Page 64: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

56

© Entusiasmo

No exemplo abaixo, observou-se que como em (98) e (99),

o falante passa a falar em iam tom bem mais agudo; só que aqui,

demonstra o oposto: entusiasmo na voz. Para uma distinção,

quem sabe seja pertinente iam estudo instrumental sobre a dis-

tância relativa entre os vários tons.

Por hora, tentou-se, através de uma observação mais

atenta, ver qual a variação de recurso prosódico que poderia

ser, talvez, responsável por essa diferença. Notou-se que ao

demonstrar entusiasmo, o ritmo era outro; mais acelerado,

com as sílabas tônicas destacadas.

(100) eles decoraram / tá / e apresentaram // mas ficou em aima / o público ficou assim // sabe // e então isso daí / (F.B, p.75, 8? 1.)

mas sim // I f i c o u em c ima / o púb l i c o f i c o u as/

ta sa

Il \be II TOM MÉDIO"» e apresen) 1 Iram

Não houve necessidade de o falante deixar verbalmente

expressa a reação do público. Pela maneira vibrante, por

exemplo, com que a palavra assim foi proferida já se sabe que

a peça fez sucesso.

Somente através de um estudo mais aprofundado, pode-

riam se descrever detalhes significativos de variações de

tom, volume, ritmo, as quais dariam uma idéia mais precisa do

que exatamente viria sinalizando essas atitudes, esses sig-

nificados implícitos.

Esse estudo, porém, fugiria aos objetivos mais amplos

dessa pesquisa. O que se deseja, neste capítulo é frisar,

Page 65: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

57

chamar a atenção para a importância dos recursos prosódicos

na comunicação oral. É demonstrar que o papel dos recursos

prosódicos é muito maior do que a parte gramatical de indi-

car, por exemplo, se uma oração é interrogativa ou afirmati-

va. Esses recursos vêm suprir as falhas decorrentes da fal-

ta de planejamento — indicam a ligação entre frases inter-

rompidas, palavras sintaticamente deslocadas, o fato de que

o falante mudou o rumo de seu pensamento, de que não preten-

de terminar uma oração, ou de que resolveu retificar uma

idéia. Viu-se também que jogando-se com o tom, volume e rit-

mo consegue-se passar repentinamente para situações dife-

rentes de diálogo e, como disseram Vygotsky e Litowitz, ob-

tém-se, ainda, a expressão de muitos significados, os quais,

para serem transmitidos, na escrita, exigiriam uma semântica

deliberada, uma diferenciação sintática, uma lexicalização

maior.

Page 66: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

4 CONCLUSÃO

No capítulo da Revisão da Literatura foram apresenta-

das características da linguagem oral. Para se ressaltar es-

sas características, muitas vezes, fez-se uso de comparações

com a escrita.

Observou-se como características principais, o fato

de a linguagem oral s er espontânea, não planejada, ter quase

¿empre o contexto e o receptor près entes, e de utilizar-s e de

recursos prosódicos.

Com referência ao Português falado, as conseqüências

do fato de a linguagem oral ser não-planejada se manifestam

especialmente na ocorrência de pausas silenciosas e preenchi-

das por certos sons e expressões (os chamados "fillers" em

inglês) que são utilizados com o propósito de o falante ga-

nhar tempo na organização de seu discurso subseqüente.

Representando as pausas preenchidas surgiram os sons

(E) e (Ã) e palavras tais como: assim, digamos, digamos as-

sim, quer dizer, ne, não sel, sei lã.

Verificou-se, através da observação da amostra, que

essas palavras aparecem, dependendo do contexto lingüístico,

desempenhando várias funções diferentes, e até mesmo parale-

las, trazendo cada uma o seu conteúdo pragmático específico;

e que o uso e o significado dessas palavras são, na lingua-

gem oral, na maioria das vezes, muito diferentes do que quan-

Page 67: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

59

do na escrita, Marcam, por exemplo, uma quebra de estrutura,

um novo inicio, colaborando com o ouvinte na montagem do dis-

curso.

Chegou-se à conclusão do importante papel representa-

do pelos recursos prosódicos na distinção entre os valores

pragmáticos desempenhados por essas palavras. Por exemplo, a

entoação do assim, como preenchedor de pausa, como elemento

anafórico e como modalizador, é em todos os casos diferente.

Pela amostra percebeu-se também que, muitas vezes, os

falantes, por não encontrarem, de imediato, expressões ade-

quadas que traduzam o seu pensamento de forma mais fiel, cos-

tumam usar.de expressões de valor semântico vago, tais como:

tudo, e tudo, e tudo mais, e tat, e tat tat, não sei o quê.,

e isso £ aquilo, etc., resultando numa freqüente imprecisão

da linguagem.

Apontou-se ainda como produto dessa falta de planeja-

mento a probabilidade de orações inacabadas e de construções

que fogem âs regras da sintaxe. Os vários exemplos encontra-

dos indicam uma confirmação das palavras de CHOMSKY de que

"uma gravação da fala mostrará numerosos arranques em falso,

desvios das regras, mudanças de intenção a meio caminho e

assim por diante", (p.84)

Todas essas manifestações decorrentes do não-planeja-

mento do discurso — as hesitações manifestadas por pausas

silenciosas e preenchidas, a imprecisão da linguagem, as que-

bras de estrutura e outras deviações sintáticas—mostram-se,

de modo geral, bastante freqüentes na amostra, que, como foi

observado no início, é constituída de pessoas que têm curso

superior e que supostamente teriam melhor fluência de lin-

Page 68: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

60

guagem. Pode-se pressupor que essas características apareçam

também, e talvez em maior grau, na fala de pessoas menos cul-

tas. Uma pesquisa posterior seria interessante no sentido de

se verificar que fatores influenciam a maior ou menor fluen-

cia dos falantes.

Como uma segunda característica importante da lingua-

gem oral também responsável pela diferença que mantém com a

escrita, mencionou-se o fato de ter quase sempre presentes o

contexto situacional e o receptor.

Viu-se que o emissor, constantemente, procura testar

a compreensão do receptor através da expressão né e de ou-

tras, tais-como, entendem, ¿abe, certo, etc. É a chance que

tem de realimentar a mensagem, se necessário for. Por isso e

baseado, possivelmente, ainda, nos conhecimentos que sabe com

o outro compartilha, costuma deixar muitas de suas idéias um

tanto vagas, na oral, expressando-se, às vezes, até mesmo por

meio de orações inacabadas.

No caso de orações inacabadas, muitas vezes, foi di-

fícil saber-se, ao certo, terem ocorrido por essa questão de

pressuposição por parte do emissor, ou se por falta de pla-

nejamento. Sentiu-se que paralelamente às gravações, uma »

filmagem teria sido de grande valia, pois, poderia ter reve-

lado certas atitudes não-verbais dos interlocutores, neces-

sárias a uma certeza nesse sentido.

Constatou-se que a presença do receptor facilita o

ato comunicativo do emissor, não só porque lhe possibilita a

realimentação da mensagem, mas também porque, vendo o emis-

sor hesitar, poderá ajudá-lo na complementação do pensamento.

Page 69: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

61

Quanto ã presença do contexto situacional, frisou-se,

na Revisão da Literatura, que aquelas informações, que vies-

sem nele contidas de modo claro, não precisariam ser expres-

sas por palavras. Mas, a linguagem da amostra, infelizmente,

não apresentou evidências nesse sentido, como, por exemplo,

não fez alusão a objetos ou pessoas por meio de pronomes

pessoais, cujos referentes estariam no ambiente físico pró-

ximo. A linguagem da amostra revelou-se livre do contexto

("context-free"), talvez pelo fato apontado da abstração do

assunto dos diálogos e pela pobreza do cenário em que se de-

ram as gravações.

Além da falta de planejamento e da presença do con-

texto e do receptor, mencionou-se como uma terceira caracte-

rística o fato de a linguagem oral utilizar-se de recursos

prosódicos.

Tomou-se ciência da grande importância desses recur-

sos, pois, conforme se observou, por meio deles o ouvinte é

levado a perceber as quebras de estrutura, as mudanças de

rumo de pensamento que surgem por questão de o discurso não

ser previamente organizado. Muito mais do que isso, contando

com a ajuda dos mesmos, o ouvinte consegue estabelecer a

ligação sintática entre as partes que surgem deslocadas de

sua posição no discurso.

Esses recursos são importantes, também, porque permi-

tem ao emissor passar repentinamente da narração ao discurso

direto, sem que as quebras por isso ocasionadas prejudiquem

o conteúdo a ser transmitido.

Constatou-se ainda o grande papel dos recursos prosó-

dicos no que se refere â sinalização de um conjunto muito am-

Page 70: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

62

pio de significados. Percebeu-se que seria necessário uma

lexicalização maior, na escrita, para a transmissão desses

mesmos significados.

Da análise dos dados depreendeu-se que o estar acos-

tumado ao uso desses recursos, a não se planejar um texto e

freqüentemente a contar com a ajuda do contexto situacional

e do receptor na comunicação oral é que seriam as causas de

certas dificuldades encontradas, quando se vai transmitir as

idéias por meio da linguagem escrita.

Espera-se que o estudo realizado possa trazer benefí-

cios práticos ao ensino do Português, pois, acredita-se que

o professor, com respaldo na análise feita e nas conclusões

apresentadas, possa se sentir impelido a buscar, a encontrar

caminhos que o venham auxiliar na superação dessas dificul-

dades encontradas na passagem de uma forma de produção para

a outra, da oral para a escrita.

Page 71: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

ANEXO

Diálogo I 64

Diálogo II 79

Diálogo III 86

Dialogo IV ' 94

Diálogo V 102

Page 72: Características da Linguage Oram l eaiizacao em u

64

DIÁLOGO I

FALANTE A

Profissão: professora de inglês Idade: 32 anos Sexo: Feminino

FALANTE B

Profissão: professora Idade: 3D anos Sexo: Feminino

A — Tá // então nos tamos aqui na casa da Margarete/ pra conversar al-guma coisinha sobre ( ) um assunto de ( ) que a gente possa dis-cutir / não e então / Margarete //

B — Ë // A — E então / esse assunto / seria mais ou menos qual // B — A gente tava discutindo / achava assim que seria bom falar sobre a

( ) a problemática das pessoas se organizarem mentalmente / e ( ) e expressarem verbalmente / o seu pensamento / ne / que a nossa () que a escola tem assim / muita deficiência neste aspecto // e ( ) a gente tem visto muito no teatro / nê / que (E) ainda que i uma área onde as pessoas têm que se expor / ni / mais verbalmente // mas o ( ) o problema de organizaçao ( ) do pensamento / tá bem / tã bastante falho / né //

A — Isso e verdade // e a gente concorda / nê / porque a sociedade em geral / eu acredito / na minha opinião / ela ê muito castrante/ nê //quase que ( ) de uma maneira quase que geral / a gente vê / né // então / a gente principalmente que é mulher / também / a gente sente essa necessidade de uma exposição maior //mas a gente vê que é um problema geral de ( ) de maneira de expressão / né / porque ( ) ... então / eu acredito queeum assunto que a gente pode dis-cuti bem / né // então ( ) ...

B — Nao / porque em primeiro lugar / por exemplo / a Filosofia jã foi tirada das escolas / ne / pra nao permitir que as pessoas possam

[A]*- Ë verdade //

*0s colchetes usados indicam que o interlocutor, que ocupava a po-sição de ouvinte, passa, ao mesmo tempo que o outro, ã posição de falan-te. As palavras do interruptor estão localizadas exatamente abaixo da-quelas onde se deu a interrupção.

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(E) desenvolver o raciocínio // e ( ) eu ate tava estudando um li-Certo //

vro lã de Oratória e Retórica / né / e eles colocam esse problema Hum // Hum

educacional // então as pessoas âs vezes acham que elas são os pro-blemas // procuram terapia / procuram psicólogo / procuram não sei

t u '

o que nao sei o quê // mas na realidade / o problema dela ê de ( ) de instrumental / né // ê o ( ) o verbal // ê o ( ) i o ( ) ... é nao tã habili ( ) nao tã habilitada pra ( ) pra ( ) ... não se acostumou a se expor pra conversar / pra falar // e ( ) tem um vo-cabulário reduzido / pouca leitura / tudo / né // e acha daí que

Ë // que ê um problema mental //eu cheguei a procurar terapia / assim achando que eu era uma pessoa doente / não sei o quê / e tal // Incrível / né // E ( ) mas ( ) depois eu fui (E) ... quer dizer / fiquei lã um ano e meio // nao resolvi porcaria nenhuma/ porque na realidade eu ... a ( ) a minha ( ) a dificuldade que eu achava / é que eu não sabia falar // mas eu escrevia // então pensei // não / mas se eu sei es-

E // crever / então / eu tenho que saber falar // mas como resolver is-so / sabe // então / não // então / (E) mas a psicóloga / o psicõ-

Isso ê verdade // logo / que me atendeu / não soube talvez me entender / ne // e tal-

Puxa // vez seja a dificuldade de muitas pessoas // então nao sabia nem me expressar //e( ) foi quando eu fui pro teatro / começaram abrir horizontes / assim /pra mim // É verdade// isso ê maravilhoso // eu também tive a minha experiên-cia // mas eu ainda / também/ sinto / grande dificuldade nesta par-te // principalmente / numa ( ) argumentação assim / bastante mais ( ) forte / chega num ponto que eu ( ) tipo assim / uma coisa que eu ( ) chego até a perder mais ou menos o ( ) o contato // e então / quando é alguma coisa mais cerrada / eu chego até a ( ) ... não sei / no final / fico (Ã) desnorteada / chego até a chorar / porque ( ) porque a gente ( )... sei lã // você leva ( ) ...

Falta argumentaçao // Falta argumentaçao // ou ãs vezes / você fica num ponto de deses-pero que voce nao consegue dizer aquilo que você tá sentindo / di-reito / e então vem um ( ) ... fica um amontoado / ne // então

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/ falta uma estruturação / sei la // falta uma base / um conheci-mento maior / quer dizer ( ) um ( ) ... como diz um ami ...

Um instrumental maior / ne // Um instrumental // é // e esse daí / como diz também um amigo meu / que era (E) ... dos tempos que eu lecionava lá em Agudos do Sul // o ( ) o Oscar // e ele diz / então / que ( ) uma vez o ( ) o Ferreri ( ) o ( ) o Ferreirinha / não // aquele ( ) (TS)* // aquele que diz lá ( ) ... o ( ) da vida // o ( ) o Gonzaguinha // ele veio aqui já há algum tempo em Curitiba / e ele foi fazer uma ( ) (TS) uma reportagem // uma reportagem // é / foi dar uma ( ) palestra lã na ( ) na Universidade // então ele ( ) ele respondia as perguntas que os alunos universitários faziam pra ele // e os alunos faziam

Ham ham // perguntas mas tão idiotas / mas tão idiotas / assim a nível / por exemplo / eram todos formandos já // que ele chegava / assim ( ) Hum-hm // / a ( ) ficar abismado / da ( ) da maneira como ( ) como que eles

Hum hm nao se organizavam// nao sabiam falar // nao sabiam perguntar // e

Hum-hm // esse meu amigo / que fez filosofia / ele fez / e ele então / ele se sentia envergonhado dos colegas // claro / eram colegas de curso de ( ) de matemática / de ( ) de outros cursos / de engenharia // mas eles nao tinham ... eles nao sabiam ... eles podiam ser éti-mos no campo / mas como pessoas ( ) como pessoas pra perguntar / como pessoas pra falar / eles eram / meu Deus / piores que criança// Mas a escola inibe / inibe // se um faz uma pergunta / assim / o pessoal cai no pêlo/ri//

Então / gente // Ë verdade II Nos tivemos uma palestra agora / né / também / no início das au-

Ë H las / ali no teatro//então / era ( ) ...quer dizer ( ) era coisa (E) mais específica sobre teatro // mas envolvia um pouco de tele-

Sei II

visão / cinema / tal // e então / o que que acontecia // o pessoal que se arrojava a perguntar / ainda era o pessoal de primeiro ano / que nao conhece ainda / por exemplo / as manhas da Escola em si /

É// se arrojava // os veteranos ficavam tudo assim // pÔ / mas que per-

*TS = Consoante inspiratoria. DUBOIS, J. Dicionário de Lingüis-São Paulo, Cultrix, 1973. p.347.

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gunta idiota / pô / mas que não sei o quê // mas eles nao eram capa-zes de fazer perguntas / sabe //

[A]— Nada / gente // A — Ë verdade // Ë // B — Então / quer dizer / ê uma coisa assim / que as pessoas ridiculari-

zam as próprias deficiências / que na realidade elas tao ( ) tao se vendo que elas iriam talvez fazer pior / do que aquilo lã / sabe //

[A] — Ë // pior // nao tem nem . . . Ë// então nem se sacam ainda / que o dela ë mais deficiente / do que

[A]— Émais de-aquele ainda //

A — ficiente // ë verdade // e precisa / a gente precisa ter ... como diz // a escola ë um fator de ( ) de fundamental importância pra ( ) abrir os horizontes // como eu disse lã pros meus alunos //

[ B] — Ë // a gente tem essa deficiência // porque eu acredito que a educaçao ë uma formaçao de hábitos/ também //a gente tem que ( ) por exem-plo/ pegar um ( ) uma criança/ e formar // formar um hábito de lei-tura /e principalmente o hábito de pesquisa / de conhecimento pró-prio/ do próprio ser //de ver as deficiências // não é só chegar /

[B]- Ê // chegar e botar na cabeça da pessoa / matemática / história / geo-grafia / e ciencias / daí a pouco ela esquece daquilo / ela não ( ) não tã estruturada // e o próprio comportamento dela / ela fica alheia // ela nao sabe // ela nao sabe ver um ( ) um hábito de pes-

[B]- Hum-hm quisa / de ( ) auto-análise // principalmente de auto-anãlise //

í B] Hum-hm e isso e um fator incrível / porque a gente vê os próprios profes-sores / como eles não gostam de se analisar // eles se acham // co-

[B]- Nao gostam // tnò / como eu sou o professor / e como nós somos professores / Deus o livre / de alguëm ( ) chegar e falar / ou / então ( ) ... nem se tocam de que precisam reformular / e de que precisam reivindicar uma melhora nessa escola //

B - É // A — Não ë então // porque a escola do jeito que tã / (E) depois ainda

da ( ) da revolução que ( ) que nós tivemos / ela se tornou bastan-te castrante //quer dizer / tudo / tudo que ( ) que de melhor que podia influenciar a pessoa / que nem as artes cênicas / que são ma-ravilhosas / que elas abrem um horizonte enorme //a própria musi-

[B] - Hum-hm ca // os ditadores odeiam as músicas / a música / porque a música

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sintoniza a pessoa / faz a pessoa abrir .. • une as mentes / e faz [B]- Ë //

com que ( ) a ( ) a turma desperte/ pra um problema / que fica es-quecido/ no meio de tantas coisas que eles ( ) ... que existem pra ( ) pra nos anestesiar // televisão / carnaval / futebol //

[B]— Hum-hm A — Ne // então a pessoa vive numa roda viva // inclusive sexo / né // [ B]— Ë//

as revistas / a mulher nua // então / in ( ) inclusive a influência estrangeira / de música / de coca-cola / e tanta coisa // meu Deus do céu / a pessoa vive ali / quando vê tã velho / jã ( ) se sente inutil / nao é então // e nao se organiza / quer dizer / nao sabe /

[B]- Ë // nao sabe falar nada //

[B]— Mas é uma dificuldade das pessoas // eu tava conversando cuns me-B ninos lã do teatro / até que escrevem / e tudo // e ( ) e daí / de [A]- Hum //

repente / assim ( ) ... (E) que ë uma busca /por exemplo / que eu [A]— Hum //

tenho / faz horas / porque eu sei que ë uma dificuldade // então / fui começar a descobrir alguma coisa / através / justamente / es-tudando livro de Oratória e Retórica // ele começou a mostrar / fa-lando até de teatro ali dentro / falando do verbal / do escrito / de tudo / e como desenvolver isso / né // e conversando com ele /

[A]— Que maravilha // daí / então ele ( ) ele me disse que ( ) ... sabe quando de repen-

[A]- Ham // te voce começa ... parece que acende uma luz na cabeça da pessoa // ela diz assim // meu Deus /mas então você é uma pessoa que pode me ajudar / porque eu / se eu tenho dificuldade ... então/ de repente / a gente começou ver que as dificuldades sao ( ) recíprocas //

A — Recíprocas // ë // ë verdade // ë // B — Então / ë uma coisa assim / mas que nao se conversa // então um

pensa cada um pensa / que ele que é o errado // A — Ë um problema // como eu disse / ë um problema próprio // ë um pro-[B]- t u

blema grupai // B — Grupai / mesmo // A — Meu Deus / mas veja as provas das universidades // as redações que

os alunos ... pe ( ) pela própria escola / também / que não dã mais chance / do aluno escrever / do aluno redigir / do aluno botar as

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suas idéias em pauta // devido aquela ( ) talvez àquela censura que Ë //

criou em nós // quer dizer / isso é um problema que vem se apro-fundando a partir de ( ) de ( ) de vinte anos ( ) prã ca // desde

Hum-hm 64 / né / que tornou mais grave// porque antes a. ( ) a pessoa ain-

Ham-hm // da ( ) ela era ( ) a ( ) até mais incentivada / a participar / a botar as idéias né // e com esse medo / com essa ( ) coisa que sur-

Ham-hm // giu / então / todo mundo fica se restringindo// será que eu tô fa-lando certo / será que isto daqui nao tem uma influencia / e ( ) e no entanto / eu acredito que a pessoa expondo seu "eu" / expondo o que ela sente / é maravilhoso / inclusive pra própria pessoa / e pra própria ( ) sociedade / que nao ( ) nao ( ) nao ficam incu-

Hum-hm tidas tanta coisa / né / assim ( ) camufladas / lá dentro e ( ) e nao desabrocham // nao desabrocham talentos / nao desabrocham es-critores / nao desabrocham líderes / né / porque ...

Ë // é uma coisa um pouco de censura interior / também / né // Também // e que é uma decorrência // Porque a maior censura é essa / nê / quer di-

Ë // nossa// zer / voce nao se tolhendo / você vai escrevendo / porque um dia a porque se é extra-oficial / quer dizer ... censura cai // Um dia pode // é verdade // Então o que acontece//ver que a coisa é censurada interiormente / a pessoa para mesmo // Para // vê Margarete // mas se vem uma parte já de ( ) de forma-çao ••• nao é então// é difícil pra você desabrochar uma coisa que você quase que ( ) que nunca toca // Que num*... é // Ë // então voce ve ... voce ouve muita música / você vê isso / voce ve mais teatro o u ( ) a ( ) a ( ) teatro não / mais futebol do que teatro // então a pessoa / (E) quer dizer ( ) ela nem ( ) ela nem quase que tem noção daquilo // ela tã num ( ) num emaranhado / en-tão / e por isso que a gente precisa pessoas que têm cabeça // a nossa geração mais assim ( ) de ( ) de mais / de quase 30 assim /

Hum-hm // já viveu uma realidade maior //já viveu uma filoso ( ) uma escola

Hum-hm //

* "Que nun(ca)...".

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em que tinha filosofia // voce já via cursos clássicos / onde exis-tia filosofia / a ( ) ... os cursos de ( ) de ( ) de filosofia // então / isso dal / nao ë filosofar por filosofar // ë aumentar a escola / ë aumentar o campo da pessoa // e se você nunca vê /ne//

Ham-hm você acha que // olha / tá muito bem assim / tá numa õtima / legal / aquele nhenhenhe do pessoal / në // e a gente / a gente fica deses-

Hum-hm perado Margarete / nao ë então // a gente fica // meu Deus / mas será que eles tao su ( ) cegos / será que eles nao têm noção disso// ë porque tambëm ë um problema estrutural / de ( ) de estrutura de sociedade / que nós ... në // que nao faz desabrochar // Mas ë que prum governo / tambëm interessa ter um povo desorganiza-Ë // do // porque daí / a partir do momento em que as pessoas começam a

É verdade / Margarete // se organizar ... você veja // na escola a gente tá organizando um

Ë // gremio // a escola tã apavorada / a direção tã apavorada//porque/

Meu Deus // de repente a gente tã começando a se tornar uma força / e isso eles Claro // Uma força // nao querem // E então // ë isso / ë isso que ë ( ) que ë ( ) que ë castrado // ë isso que ( ) que e colocado // e qualquer coisinha que se faz / então / num ( ) num sistema castrador / todo mundo acha maravilho-so // nao tem poder de análise / nao ( ) nao tem nem condiçoes / co-mo diz / nao tem nem organizaçao pra ( ) pra ver aquilo// pra ( ) imagine pra se organizar e botar pra fora // porque também/ quando voce se organiza e bota / você ( ) você ë ... você ( ) você recebe tambëm a parte ( ) negativa / daquilo / nao ê então // porque você

Hum-hm tem a tua idëia // então voce vai ter que botar em confronto com a

Hum-hm // do outro / në // e ( ) e claro que ( ) do ( ) do diálogo nasce a

Hum-hm luz mas muita gente já tá tão acostumada numa situação / numa si-tuaçao tipo esta que nós tamo vivendo / que nao quer nem saber /

Hum-hm // Hum-hm nao e então // acha que todo mundo ë bebezinho / porque ele conse-guiu um ( ) um lugar ao sol //ao sol / ne // que sol // e então /

Hum-hm / /

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ele acha que ( ) que aquilo lã ë ótimo // e ( ) o ( ) resto que se ... que fique na deles / que fique... ne // e a gente precisa dis-so // então e uma necessidade que a gente sente/ nê / / a gente sen-

[ B] — Hum-hm // Hum-hm // te // então / meu Deus / como ë bom / como ( ) como ë necessário / ne // e como a gente deve / nê // nao só nós / como todo mundo / nê /

[B]— Hum-hm Hum-hm.// como todos // então/ como fazer isso / né // vamos lutar bastante / lutar sempre / pra que a gente consiga / né / Margarete //

B — É // ë uma coisa assim // mas ( ) (E) acho que ë uma coisa que vai sendo vencida / porque em vários pontos / existem pessoas cons-

ÍA]- É // cientes disso / e tentando resolver / né // então / eu acho que ë

[A]— i Ë verdade // uma coisa assim ( ) que ( ) a ( ) a longo prazo deve vir algum re-sultado //

A — Deve vir // B — Porque ( ) (E) ... claro / uma coisa de massa nao vai acontecer /

mas pelo menos de grupos / né / que vao ... e ( ) claro / supoe-se que / por exemplo / a área teatral / ë uma área assim de transfor-maçao // não sei se realmente ë / até que ponto / né //

[A]— É verdade // A — É // mas ë / sim // B — (E) Quer dizer // supoe-se que seja transformador social / né // se

[A]- t H isso for uma verdade / pode ser que aconteça alguma coisa//mas até agora eu nao tenho visto muito esse elemento //as vezes pessoas de outras áreas sao muito mais abertas / né // tem assim ( ) outras areas mais ( ) talvez (Ã) técnicas / né / (Ã) biológicas / ou coisa

IA]- tli

assim / ãs vezes até são pessoas até/mais assim/ com visão maior / né // nao sei se porque eu ( ) a ( ) a escola já está ainda num

[A]— Ham // período de estruturação / não esta assim ( ) com uma moral ainda ... né // toda essa coisa //

A — É // mas eu acredito que isso vã surgir / Margarete //vá mesmo // in ( ) inclusive autores / pessoas que se estruturem / e não ... e partam pra ( ) pra ( ) pra criação // pra ( ) ... né // pra escri-ta / pra ( ) autores // que ( ) que ë maravilhoso // meu Deus// quantas obras / meu Deus // você vê Shakespeare lã na época dele /

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o que ele nos ( ) nao trouxe //o "to be or not to be" / quer dizer [ B] — . Ham-lim //

que é uma pergunta constante // ser / voce tem que ser / voce tem [ B]— Ham-hm //

que assumir / e assumir tudo / também / né // assumir a ( ) as de-ficiências / assumir a ( ) as verdades // e principalmente no tea-tro ele rasga / ele faz isso // e nós tamo precisando de pessoas ...

[ B] — Ham-hm // Sim / mas só veja uma coisa / por exemplo / o Shakespeare / ele ( ) ele escrevia

[A]- Ham // criticando / até pessoas da corte / coisas assim / mas ele era uma

[A]— Então // pessoa da corte / era uma pessoa aliada praticamente// então quan-

[A]- Ë // do ele escrevia/ nao era visto com olhos de quem .. .de uma oposição//

A — Ele era quase que ( ) ... B — Sabe // então ele / praticamente estava dentro / criticando .dentro //

e então eu acho / que essa uma do teatro se colocar numa posição es-querdista / sabe / e simplesmente malhar / eu acho que isso aí ê

[A]- Ham // malhar em ferro frio // tem mais ê que se aliar com quem tem o po-

[ A]— Nao / nao // eu acho ... der / com quem tã forte / pra que você possa / realmente fazer alguma

[A]- e ... coisa / sabe //

[A]— É verdade // se nao você vai ficar ( ) (Ã) (Ã) de lado / você tem que usar muito / muito a inteligência também // nao ( ) não po-de realmente ... que nem eu ( ) teria ( ) tinha muito essa capaci-dade de ( ) de ( ) pau / pau // pedra / pedra //a gente tem que ser racional / a gente tem que procurar estruturar uma coisa dentro do sistema / pra poder transformã-lo // isso /isso // isso é um princí-

lB]— Exato // pio / eu acho / né // você tã ali dentro / e você começa ... não que voce teja se ( ) se violentando / nao porque a minha opinião é totalmente fora // nao / de tudo existe uma parte positiva / nao é então / Margarete //

B — Claro // A — Nao é então // chegar lã e começar a dar murro em ponta de faca /

e porque voce jã vai se indispor / e ( ) e vai ( ) ficar magoado / machucado / e nao vai conseguir muita coisa // mas é ( ) partindo de uma estrutura / ver o que que tã / e procurar jogar // procurar usar o humor / procurar usar a capacidade nossa. / e ir jogando /

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ir jogando / que o negocio ... tipo uma semeadura / né / ir se-[ B]- É // O Chico Aní-

meando // B sio / por exemplo // ele esta numa posição hoje / que ele ( ) que ÍA]- Ë //

ele satiriza até o Presidente da Republica / e nem por isso / pelo [A]- Ë //

que se sabe / ele é ( ) ... (Ã) tem problemas neste sentido // [A]— Não / não // inclusive

ele foi até convidado / ele faz sorrir / então ele ... [ B] — Mas é a forma que é colo-

cado // porque ele tã numa posição jã ( ) de ( ) em termos assim [A]- É //

( ) digamos de força / ou poder / ou qualquer coisa semelhante // A — Semelhante // ele ( ) ele galgou isso // [ B] — Então você primeiro precisa se ligar / pra você brigar [A]- É

com os fortes //agora você / fraco / brigar com os fortes / de que Iß]— verdade // Maravilhoso // >

jeito // Ó você querer pedir pra te matar / mesmo // [A]- Não dã // é difícil // A — Ë verdade // ê o que acontece // é o que acontece // B — É que as pessoas / as que se metem ãs vezes a ( ) a discutir por

[A]- Ë // exemplo política / ou a criticar política / sem ter realmente co-nhecimento de base // eu nao me meto / totalmente a ... eu nao co-

[A]— Conhecimento e ... Ë // nheço o suficiente // vou falar o que // eu posso malhar a Educaçao /

[A] — Não / riao // e fica ali de ( ) por exemplo / que é uma coisa que eu conheço mais / nê / em termos

[A]- de ( ) ... Tudo // * Ë // críticos ou coisa assim // ou alguma ãrea especial / assim / mas a

[A]— Ë // do que aparece //do que a gente pode política . ..

[A]— palpar // A — Ë // nao dã // é uma coisa muito mais complexa / meu Deus do céu //

e ( ) a gente tem que realmente / usar o bom senso / / e ( ) t u ( ) e realmente como diz / se organizar // a gente se organizando tam-bém / até do pensamento / a gente vai descobrindo / fórmulas / que realmente dao resultados / nê / Margarete // né / porque tem gente que tem um poder de retórica incrível / mas usa de maneira tola / nao ê então // tem aquele poder / mas chega lã / bã bã bã//bã bã

[ B] — É // Mas bã // bã bã bã //__

[B]— tem que ter conteúdo / nê //

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A — Nao tem conteúdo / e nao tem estruturação / porque e uma coisa'vazia / ë uma coisa de ímpeto / nao ë então // e nao ë • - . e ( ) e esse ímpe-

[B]— Hum-hm // peto/pode ser que tenha ...a pessoa fale // tê tê tê // tê tê tê// mas ela nao tem aquela capacidade / como diz / de organizaçao // porque se voce se organiza / voce sabe // meu Deus / eu nao posso ser tola // eu sei falar muito bem / tudo // mas se eu falar dessa maneira / eu ( ) eu to sendo meio idiota / në //

B — Jogando fora . .. në // A — Jogando fora um ( ) valor meu / que se eu falasse dessa maneira / eu

iria atingir melhor ... në // ë verdade // mas / porque a gente na [B]— Hum-hm //

verdade / desestruturados como somos / porque eu me reconheço / en-tão a gente lança aquela coisa / në / / pã pã pi // rebate em cima //

[ B] — Ë//mas tem B — uma coisa / tambëm / Sueli // eu acho que uma das coisas que ( ) [A]- t II

que ( ) ... nao sei se ë uma questão do brasileiro / vai na base da [ a]- t // ë //

improvisação//não / porque eu sei / numa boa / tã / eu vou impro-[A]- Ah ë // Isso //

visar // na realidade / um bom orador / um ( ) ele ( ) ele tem que [A]- Ê //

planejar o que ele vai falar / ou pelo menos / então / inclusive / [A]— Planejar / Margarete //

assim / eu tenho lido / menciona fulano / fulano // só que eu em [A]- t U Ham //

temos de ( ) ... mas dizer assim / por exemplo / fulano que foi [A]— Ë // ë // nao / nao // não lembra // lógico

um grande orador / fulano / cicrano / e ( ) podia digamos / atë nao preparar o ( ) o ( ) o ( ) digamos assim / o ( ) a ( ) a oração in-teira ./ në / o discurso inteiro / mas ele pelo menos fazia um rcr-

[A]- Hum // teiro / pra ele ( ) pra ele ter lógica /do que ele tem assim falar

[A]— Expor // Claro // Il e a nossa mentalidade nao ë essa.// na hora que pinta //na hora

[A]— Lógico // pinta //

A — Pinta / pinta // e a turma te leva no outro ponto /'/ [B]— E no teatro ë a mesma coisa // a [A]- LÓ-

improvisação pinta // então / agora nos vamos desenvolver / acho que [A]- gico // Ë //

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B — eu nao comentei com você / teatro de ( ) de feira // [A]— Que maravi ( ) // é // foi // você me fa-

lou // B — É // então comentei / ne // então ( ) então por exemplo / na nossa

passeata / os meninos jãleva( )* os meninos já apresentaram // eu conversei / já tinha conversado com eles // vamos fazer isso / mas tem que ensaiar / nao sei o que // então dai um grupo pegou e fez / um menino que escreve / daí ele fez um roteiro / eles decoraram /

[A] — Ham // tá / e apresentaram // e ( ) mas ficou em cima / o público assim sabe // então isso daí / a gente vai levar agora // então / talvez

[A]— coisa linda // Isso // depois / daqui a um ano / e de tanto a gente fazer o teatro de im-proviso / mas preparado um pouco também / a gente ganhe cancha pra

[A] — Preparado // poder de repente des lanchar sem precisar preparar muita coisa //só simplesmente saber o tema / e desenvolver o tema //

[A]— Lógico // e nao se dei-[ B] — Mas pra . A xar levar / Margarete // porque a gente se deixa // porque se está [b]— Ë // nao se deixar levar //

num ponto assim / vem outro e joga pra ( ) pra lã / você quase que infantilmente / você parte pra outro ponto // tudo bem // partiu pra lá / mas voce tem que saber retornar naquele ponto / porque ê essa a estrutura // e ê o que a gente realmente le( )** (Ã) vai

[B]- Hum-hm // levar / começa a se empolgar / e ãs vezes sai numa discussão / num bate boca quase que inútil / e ( ) e tá aí //

B — É // mas uma coisa que eu aprendi / por exemplo // o Assai diz as-sim // que voce nunca deve discutir com pessoa que ( ) nao conheça o tema que você vai discutir / porque você está perdendo tempo //

ÍA)— Per-entao voce tem que se retirar / pense o que pensarem / porque você

[A]— dendo tempo // Nao/nao / nao// ( ) você não vai chegar a nada //

[a]— e a gente ...

* "os meninos já leva(ram)". ** "e ê o que a gente realmente le(va)".

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A — E äs vezes você pensa por que você vai / que você vai convencer aque-la pessoa // nao / de jeito nenhum //

[ B]— Nao // se tiver opinioes divergentes / por exemplo / re-ligião / que ë uma coisa que nao se discute / uma questão de fé / uma coisa assim / é besteira discutir / né // então / coisas assim /

[A]- É // Nao // ë verdade // que sejam ( ) ... por exemplo / nao adianta voce estar discutindo emocionalmente // nunca vai-se chegar a nada // e ë o problema por

, 3 -í? exemplo de um casamento // geralmente o homem tã de cabeça / e a [A]- Nos( )* // ë verdade //

mulher tã de coraçao// então ãs vezes nao se entendem / nos papos / [A]- Nada // e fi-

né // [A]— ca uma tristeza // B — AÍ fica difícil de chegar a um ... [A]— Passam a vida inteira / e nao chegam a um acordo // [B]— A vida inteira se arrancando // A — cada um querendo o seu ponto e o outro nao // ' B — Querendo que o outro entenda // mas quer dizer / se o teu problema

ë emocional / o teu marido / no caso / se for o ( ) o ( ) a situação contraria / o companheiro nao vai entender porque ( ) porque ë uma

[A]— Ë // O contrãrio // situaçao emocional / e o problema ... e ele ( ) ele não estã no nível do ( ) do emocional //ou então ele coloca a coisa de cabeça / ou você como está envolvida só de coração / você não vai entender o ponto de vista dele //

A — Ë verdade // ë incrível // nossa // [Bi- Ë aquela ( ) aquela ( ) aquela dificuldade // no nosso lA]- Fica//

relacionamento / a gente já discutiu já muito isso / até que a gen-[A]— Ham // Ham //

te chegou ã conclusão / quando a gente nao se entendia .. . ë que ãs [A]— Ë // ë ver-

ve( )** as ( )***/sabe// poxa / mas eu to falando de coração / você tá [A]- dade //

falando de cabeça / como e que a gente ... nao tem condiçoes de se [A]- 111

entender // então / daí a gente parava a discussão ali / porque a [A]- Ë // e verdade //

* "Nos(sa)". ** "ve(zes)".

*** "as(sim)".

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gente nao ia chegar a nada // ate que depois / tivesse mais frio / [A]— A ponto nenhum //

tá / podia daí realmente discutir mais a frio / ou qualquer coisa [A]— Ë verdade //puxa vida//

assim / né // [A] — por que então ( ) .. . B — Então você tem que discutir com alguém que entenda o mesmo assun-

to // A ~ 0 mesmo assunto // B — AÍ ele tem condições de crescer // A — Lógico //ou então / ou então / você ( ) sei lã / use outra técnica /

use outra coisa /mas ali no bate-boca / ou então no ( ) (Ã) malhando em ferro frio ...

B — E tem que ser com base racional / né / porque com base emocional fi-[ A] — Ë verdade //

ca na achologia / lembra / que até era o Amauri que falava as-[A]— Nossa //

sim // achologia //eu acho / porque eu acho / eu acho // [A]— Eu acho / acho / nao / nao / um

quer achar mais que o outro / e no fim nenhum / nao se acha nada // [ B] — Não dá / /

é uma loucura // mas é fato/ viu / Margarete // olha / e realmente a ( )a gente precisa crescer nisso//principalmente a gente que é... a gente / nós brasileiros / nê / que realmente vivemos num país mais assim tipo improviso / como diz / né //o brasileiro êmais / assim / tipo baixar santo / nê // quer ver baixar o santo // nao ( ) nao ( )

[B]- Ë nao tem / nao tem na sua base ja e ( ) esse espírito de pesquisa / de organizaçao / né.// vê como ê que nós estamos / a nossa situaçao né //

B — Teve ( ) teve um ( ) um alemão aí / que veio pra uma firma aí / [A] — Hum /

pra ( ) técnico assim/ nê / / e eu sei que ( ) ... que tã fazendo um curso / né / que meu marido tava fazendo / e daí / sei que ( ) diz que de um dia pra outro / diz que o técnico foi embora / deixou uma carta / nao sei o que / um um problema familiar / disse que ele ia embora // mas na realidade / ele nao aguentou adesorganizaçao/ porque a ( )a Alemanha principalmente / sabe*// trabalham com téc-

*Entoaçao de período afirmativo.

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nica / com organizaçao / sabe tu ( ) // sabe onde eles têm que ir / sabe onde o que você vai fazer / sabe o que você vai atingir // entao / ele nao agüentou // na realidade / que ele nao agüentou a bagunça e foi embora //

A — E é como diz// ele ia malhar em ferro frio// ele ia fazer o que // E B] — Gas-

todo o conhecimento dele / ele nao ia poder começar do nada // [B]— tar o tempo dele //

nao ê entao // e ê uma realidade/ gente //então a gente precisa // B — Entao voce imagina como e que sao os nossos governantes / ne / que

[A] Ë // sao fruto / né / de ( ) de toda essa coisa de base aí //

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79

DIÁLOGO I I

FALANTE D

Profissão: professor e escritor Idade: 39 anos Sexo: Masculino

FALANTE C

Profissão: professora Idade: 31 anos Sexo: feminino

C — A capacidade / a facilidade de comunicaçao e expressão do artista no caso o escritor / seria uma capacidade natural / um dom / ou o escritor encontra também dificuldades em expressar / em concreti-zar o seu pensamento //

D — Eu vou pegar ... eu ( ) eu gosto muito de citar as pessoas / ne / os escritores / porque eu acho que / sempre dá assim maior respaldo intelectualista // mas o Jorge Amado / ele falou que escrever / exige 90% de trabalho e 10% de talento // claro / eu acho que pra escrever voce tem que ter pendores / tem que ter pelo menos/' senão pendores / pelo menos um gosto pela coisa // mas escrever / como qualquer atividade artística / ë essencialmente trabalho mesmo // e simplesmente pegar o boi pelo chifre e ir ate o fim // ésimples-mente pegar e escrever todo o dia // i um saco // ë dificílimo / ne // escrever / por exemplo / eu escrevo / ê uma das piores coisas que eu posso fazer na vida / porque eu sou obrigado a fazer prati-camente todo dia // escrever e um aborto// escrever ë igual ao fi-lho que tá pra nascer / e demora // não nasceu / deu ( ) deu as contraçoes . . . tem que escrever // escrever ë a mesma coisa //eu acho que voce só pode escrever / se voce realmente sentir necessi-dade de escrever // se voce realmente perceber que (palavra incom-preensível) ... se alguëm falou isso ... se voce perceber que vo-ce pode viver sem escrever / você nao deve escrever // eu sou uma pessoa que nao posso viver sem escrever // e não é que eu tô fa-zendo texto literário / ou poesia / simplesmente // escrevendo o que vem na cabeça // que ë realmente a contraçao ultima do parto / ne // o filho tá nascendo / você tem que jogar pra fora senão você

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vai morrer //evitar que a coisa venha nao pode // e escrever é a mesma coisa //eu / então / todo dia / ou praticamente todo dia / né / quase todo dia / chega lã pelas nove e meia / dez horas / eu tenho que largar tudo na vida / tenho que me sentar ali na minha mesa / e pegar uma folha / e escrever o que eu ( ) ... aquilo que tã germinando na cabeça // claro / nem ( ) talvez 80% disto nao e apro-veitável / 80% disso eu nao faço com fins ( ) literários / com fins ( ) ... nada disso // é só escrever // jogar / pra aliviar a cabe-ça // porque ë uma neurose / ë uma tensão / ë uma maldiçao escre-Hum-hm // ver Ileo que o Tennessee / o Tennessee Williams falava atë / exor-cizar os demonios / në // ë uma angustia dentro da gente // ë uma coisa difícil / porque ( ) ... claro que a gente tem dificuldade // tem momentos ... nao ë só uma dificuldade/ por exemplo / uma difi-culdade de ( ) nao encontrar a palavra determinada que voce quer / aquela palavra que você precisa / porque pra isso já existe mais ou menos dicionário analógico // quer dizer / que tem uma idéia e vai procurar a analogia da idéia / e vai encontrar a palavra x // mas o problema principal ë você de repente perceber que você nao ta conseguindo criar um texto // você tã simplesmente amontoando

palavras // ë diferente / né // escrever ëum trabalho doloroso por Hum-hm

por isso // porque de repente você começa perceber também / que vo-ce tã apenas imitando a si mesma // você tã fazendo aquilo que vo-ce já fez mil / mil e uma vez // e escrever i fazer a cada dia algo de novo // de repente voce começa ... pelo menos uma coisa que eu percebo nos meus trabalhos // que de repente eu tô usando mais ou menos os mesmos recursos sempre // eu tô ... eu tenho mais ... ë como se eu tivesse criado um sulco na terra e tivesse neste sulco // e eu nao quero isso //' eu quero cada vez / eu quero um sulco di-ferente // cada vez eu ( )eu quero criar uma maneira diferente /

Hum-hm uma ( ) uma ( ) uma linguagem diferente // então / ë um trabalho ( ) assim doloroso / um trabalho difícil / um trabalho angustiante / né / um trabalho que me faz suar / um trabalho que não me satis-faz // e aí eu vou citar outra vez um outro escritor// Jorge Luís

Ham-hm Borges / ni // ele ( ) ele diz o seguinte // que ( ) toda vez que ele quer escrever / ele ( ) ... a idéia e mais ou menos a seguinte

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II nao vou citar ipsis litteris porque eu nao me lembro // mas ele diz que ( ) toda a vez que ele vai escrever / ele ( ) tem assim ( ) uma empolgação por aquilo que ele vai escrever / pensando que vai ser uma coisa maravilhosa // entao ele se satisfaz com aquela idéia // e aí quando ele escreve / quando vai 1er o que escreveu / se de-cepciona amargamente / porque nao é exatamente aquilo que ele que-ria escrever // e e exatamente o que acontece comigo // de repente pinta uma idéia na ( ) na cabeça / né // e é uma idéia de um poema / uma idéia de um conto / de um texto / uma crônica / uma coisa in-definida / pã // é isso aí // voce começa a escrever / realmente / nao / nao bate // o texto realizado com o texto planejado // e é Hum-hm uma coisa muito comum muitas vezes sonhar que eu to lendo // então eu sonho que tô lendo um texto maravilhoso / e sempre neste sonho eu penso o seguinte // eu seria o cara mais feliz do mundo / se eu tivesse sido o autor deste texto // e aí de repente eu acordo / e

Hum-então percebo que eu é que estou elaborando aquele texto // aí eu hm // quero captar // nunca consegui captar / né//aí eu perco realmente o sono // eu vou pro banheiro / eu vou pra cozinha / eu vou pro li-

Ham-hm // xo / eu quero ( ) descobrir novamente aquela idéia pra colocar aque-la idéia no papel // mas / nao vem mais / né // entao e um trabalho assim que eu ( ) eu acho que ( ) ê um trabalho maldito l e um tra-balho neurotizante / um trabalho ( ) obcedante//ãs vezes voce fi-ca ( ) fissurado naquilo II seria muito mais interessante / talvez/ até / jogar uma partida de futebol / né // mas é uma necessidade que voce tem // aí / eu acho que nao ( ) não depende apenas de dom

É II

II claro/ tem que ter uma certa ( ) ... tem que ter um certo condi-cionamento/ um certo gosto / um certo interesse / mas vai depender muito do trabalho/ de voce se organizar // por exemplo / e um velho problema meu // agora acho que maior parte do pessoal que tem aqui nesse país / nesta cidade / tem problema de organizaçao// organizaçao de tempo / organizaçao de cabeça / organizaçao de ( ) de conhecimentos/ organizaçao tudo isto // mas a( )a( )a( ) ... entao eu acho que es-te escrever ele e produto de um certo gosto que você tem // dizem alguns que ( ) a arte ela é meramente uma sublimaçao pura / né// que você não conseguiu realizar certas coisas na vida / entao você su-

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blima a arte// então' seria uma compensação/ nao sei / seria mais uma linguagem psicanalítica / ne//mas eu coloco a coisa mais assim pra esse campo assim // é um ( ) um exercício que você vai fazer diário / um ( ) um costume que voce vai pegar / uma arte que voce vai rea-lizar / so que voce tem que realizar com consciência / pra que este ato nao seja meramente passivo // mas se torne uma coisa realmente artística/ nê // que se torne num nível bom/ num nível em que você perceba um certo progresso / (E) algo de tempo / analógico / que saiu hã muito tempo / e voce vai quer que ( ) . . . e dentro desta histo-ria da tua vida você vai perceber realmente se tem ou nao talento / se ( ) se tem condiçoes ou nao condiçoes de um artista /né // deve ser uma opção como outras tantas / nao sei // duvido muito desta historia de dizer que ê professor porque escolheu / é médico porque escolheu / é jogador porque escolheu / é um ator porque ... eu acho que sao circunstancias // porque de repente eu ( ) eu quando

tu 1

era adolescente / a ( ) a maior paixão da minha vida era ser dese-nhista / era ser pintor // tanto que os primeiros empregos que eu tive na vida foram empregos de trabalhar como desenhista // hoje em dia / desenho pra mim é alguma coisa que ( ) significa alguma coisa mas ... agora / professor / nao me entra ser professor // me lembro que comecei a pensar em ser professor no científico / tal-vez / né // mas a minha grande paixao sempre foi ter um ( ) um po-rão onde morar / e aí escrever minhas poesias // então sei lã se realmente existem opçoes na vida / se ( ) se o sistema em que mo-ramos / que nos vivemos / ê possível alguém ... eu tenho meu garotao aqui / quer ser jogador de futebol // se as circunstâncias lhe fo-rem favorãvies // eu quero que ele seja // ele quer ser // mas se-ra que vai ser possível // então / numa dessa / amanha ou depois / ele vai tã trabalhando como ( ) técnico em enfermagem / ou então / ele vai tã trabalhando como oceanógrafo / que é outra opção que ele tem / ou ( ) ou como piloto de aviao / sei lã // sabe que a opção

Hum-hm ... sabe que a gente é levado // estas coisas não tão muito claras // eu acho que a gente tem que ter um objetivo de vida // desde adolescente a gente tem que ter um objetivo pra batalhar pra aqui-lo // se a gente vai-se tornar aquilo / ou não / nao sei // a li-teratura pintou na minha vida quando ( ) quando eu era muito jo-vem // isso eu digo agora/ olhando pra trãs //talvez eu nãc tivesse

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consciência naquela época // mas eu lembro / assim/ que o primeiro poema que eu escrevi eu devia ter uns dez / onze anos // mas já an-tes / quando eu era garotinho / assim de primário / eu me lembro que eu já escrevia historieta // história do gato e do rato / do gatinho que ia beber leite no pires / essas coisas // então tã // entao é uma coisa natural // nao sei se é natural / se as circuns-tâncias me favoreceram ou nao / ne// pode// e natural que voce sin-ta por exemplo o gosto / claro / tem que ter um pouco / sei lã / que voce tem que aprimorar ao longo da vida / né / se nao ... sei lã // Pode ser que pelas circunstâncias você tenha sido estimulado / um pouco // também poderia / né // Ë / estímulo eu acho meio difícil porque eu sou filho de operário / né // Ah // Nao sei se operário vai estimular alguém ã vida intelectual / né // Ãs vezes na escola / alguma coisa / né // Nao sei // a escola é castradora // a escola / o objetivo é castrar o trabalho dos alunos // nao e ( ) nao sei / eu acho que sao ques-tões mais de ordem filosófica / né / sao considerações acerca de // voce nunca vai realmente localizar // acho que também / pra cada autor é diferente / acho que ninguém pode dizer que determinados autores escreveram por vocação // Monteiro Lobato duvido que es-creveu por vocaçao // Monteiro Lobato escreveu por acaso//ele es-creveu uma ( ) uma carta pro jornal / um dia / falando sobre deter-minadas coisas e ele começou a perceber que ele era um talento / começou a escrever // uma ( ) uma circunstância // Foi por acaso / agora / quer dizer / ele percebeu / ele percebeu

Ele percebeu que tinha aquela ( ) capacidade / sei lã // que tinha talento / nao sei// Mas quem é que nao tem capacidade pra escrever// todo munto tem // aí nós vamo pegar aquele ( ) aquele elemento de Chomsky // todo mundo tem competencia / nem todo mundo tem desempenho // Performance // competence and performance // Todo mundo tem a ( ) a competência / mas a performance ... é uma coisa difícil // é a escola / o trabalho / aquela coisa toda //eu por exemplo/ eu agora to sem performance / porque eu tenho que vir pro hospital / tenho poucas horas / chego / me angustia a situação dele // chego em casa / nao tenho ânimo pra chegar e escrever / ni /

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mas mesmo assim ... Talvez pudesse escrever sobre .../ne/ talvez também porque ( ) ... Sobre // mas escrever sobre / ë muito difícil porque voce tã muito envolvido // V-r Em c ima / / ë / / Muito em cima da coisa // sabe o que ë // isso tudoëmuito compli-cado // Então / voce teria dificuldade também / nao só em expressar / colocar

É difícil // o teu pensamento no papel / como também encontrar formas // Formas // Formas diferentes // originalidade

Ser original // ser diferente // ë muito fácil escrever se ë pra ser comum / né // se fosse pra criar historieta / aí'/do dia-a-dia // João ama a Maria / mas a Maria gosta de José // destes te-mas voce criaria 49,9 por dia // isso nao interessa // eu quero escrever o que ë de novo //eu trabalho mais a nível de ( ) de poe-sia / né // conto assim / eu nao me ligo muito // e ( ) tem uma no-veleta que eu to escrevendo hã algum tempo / que eu parei também/ por uma série de circunstâncias / to deixando amadurecer / porque isso aí também faz parte do meu método // eu crio as coisas ... quer dizer / deixo jogado num canto / pra amadurecer durante um bocado de tempo // agora tudo isto ë difícil // porque eu / ãs vezes / por exemplo / tem momentos em que eu escrevo poemas que eu acho mara-vilhosos / quando eu vou reler ë um lixo // quer dizer // eu nao consigo encontrar um ( ) uma outra maneira pra melhorar aquilo / né / e ( ) então deixo a coisa // eu datilografo / geralmente dei-xo no arquivo / e depois de um tempo / se for possível melhorar / melhoro // mas daí jã me entra outra questão // um pintor quando pinta um quadro / ele dificilmente retoca este quadro// por que eu vou retocar um texto // eu acho que ( ) a coisa ( ) ... eu tenho que retocar no processo que ele tã sendo criado / né//uma / duas /

Hum-hm // tres semanas / um mês / sei lã // mas depois que eu jã dou ele por pronto / acho que deriva um pouco // quer dizer / tudo isso são coisas que eu to pensando agora / também // eu nunca pensei // acho que existem muitas questões e vãrias respostas / né // acho que pode variar pra cada escritor / pra cada cabeça // cada um vai achar uma coisa diferente // podemos brigar durante quarenta anos

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em cima de determinadas idéias e ( ) . .. vamos encontrar o presente escritor / o João Cabral / o João Cabral de Mello Neto / que não

[ C] - É //

acredita em inspiraçao // C — Eu até queria lembrar aquela vez // comecei lã // não a forma en-

contrada / como é que é // sabe aquela ( ) poesia / que ele escre-veu // só lembro o começo // como uma concha / o novelo / que o novelo desenrola / aranha / nao sei o que // ele aí ele fala sobre isto // que a ( ) que a poesia / né / não pode ser uma ( ) ... nao é encontrada naquela forma pronta// ele fala sobre isso // sobre

[d]— Hum // Eu acho que C — a . .. [d]— vai depender da história de vida de cada um // sabe / ë uma coisa

muito complicada // nao hã respostas adequadas pra tudo isso // a gente pode dar assim uma ( ) uma pincelada sobre isso / aquele as-sunto / mas dizer / a resposta ë esta / a coisa ë assim / nao // ë tudo muito relativo // escrever ë uma coisa muito ligada ã nossa condição humana / e a condição humana / ela ( ) ela ( ) ela se alte-tera / de ( ) de homem pra homem / se altera de escritor pra escri-tor / de poeta pra poeta / de artista pra artista // e como nao existe sapato que serve pra todo mundo / né // não existe uma ( ) uma resposta que ( ) que ( ) exemplifique o que ë o trabalho lite-rario //

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DIALOGO I I I

FALANTE E

Profissão: engenheiro Idade: 28 anos Sexo: masculino

FALANTE C

(ver diálogo II)

C — 0 que você acha da idéia de adoçao // E — Sobre adotar uma criança // C — Ë // sobre adoçao // E — Sobre adoçao de uma criança // adotar uma criança // bom//digamos

que ( ) que a gente nao pudesse ter uma criança / e tivesse vonta-de de ter uma criança // e entao / como que eu vejo isso // o que eu acho sobre a idéia de adoçao de uma criança // é // eu acho que a idéia da adoçao de uma criança / eu acho que ( ) i uma necessi-dade // pro casal hã / hã a necessidade da ( ) da existência dos fi-lhos // então / quando nao hã essa ( ) não hã possibilidade / di-gamos / de ( ) existir esses filhos / ou filho / cria um vãcuo // cria um vãcuo que tem que ( ) de uma maneira ser preenchido // é um vazio // entao / eu acho que as pessoas têm uma capacidade mui-to grande em ( ) em ( ) em (E) se adaptar ou ( ) ou criar afeto por coisas e ( ) ate por objetos // então / como hã essa ( ) essa necessidade do casal / essa lacuna / e as pessoas têm uma ( ) ca-pacidade muito grande em ( ) em criar afeto por coisas / entao eu posso citar inclusive exemplos de crianças / que (E) nasce um afeto enorme da criança em relaçao a um animal / a um bichinho de esti-maçao / e ela aprende a gostar / muitas ve ( ) (E) na maioria das vezes / mais do que ate uma própria pessoa // entao / eu acho que ( ) dentro dessa capacidade de ( ) de ( ) de crescer afeto dentro das pessoas / né / e dentro da ( ) daquela ( ) daquela lacuna que surge / daquela ( ) daquele vazio (E) na vida de um casal / uma. ( ) uma mae (E) digamos / (E) em relaçao a um filho adotivo / um pai em relaçao a esse filho / (E) tem a ( ) a possibilidade / tran-

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quilamente de criar um afeto / na medida em que o tempo vai passan-do / em relação ã criança adotiva / igual / ou ate maior do que uma ( ) um filho ( ) um filho ( ) ... Como se fosse ... nem ... acho que talvez no final / a pessoa jã nem sente ( ) ... esquece // jã nem lembra mais //

nem ... nao / não sente diferença // não distingue / não lembra // passa a gostar // aquela ( ) aquela figurazinha / (E) aquela criança // esse pai / essa mae / naturalmente que vai pro-curar uma ( ) uma criança / ne que tenha assim algumas caracterís-ticas (E) dela ou do pai / né // que se assemelhe / talvez fisica-mente / né // ãs vezes o pai tem olho claro / então / procura ( )

Ë// uma criança que tenha um olho (Ã) claro / azul / então / que tenha alguns caracteres físicos / e ( ) isso aí faz com ( ) com que nasça

Hum-hm // essa ( ) essa ( ) assimilaçao entre o casal e aquela criança // vai passando o tempo / aquela figura de criança vai ficando cada vez mais ( ) mais ( ) como é que eu vou dizer (E) mais ligada ã ima-gem dos pais / né // como vai se ligando cada vez mais vai criando aquele amor / aquele afeto / e aquela ( ) aquele início / aquela base / nao é nao // foi ( ) adotada a criança // (E) aquilo se apa-ga // aquilo se apaga e e substituído pelo amor / que vai cada vez aumentando / né // por esse motivo / eu acho que (E) talvez os pais no começo / né / eles ( ) eles vivam aquela situaçao de adoçao // no início / mas depois / devido esse afeto / esse amor que vai cres-cendo / essa situaçao de adoçao apaga / e nasça a ( )asituaçao do filho // Tã certo // é difícil no começo / né // mesmo que você tenha a

É // idéia ... voce queira ... voce sempre fica com aquela ( ) ... É // sem ( ) aquela ( ) aquela idéia de que ( ) existe adoção // porque o ( ) digamos o amor nao / ainda não existe / de uma maneira integral // quer dizer / aquele amor / ainda nao aconteceu / aque-la ( ) aquele laço //

E ( ) e o que voce acha do problema . .. por exemplo / ãs vezes o Roberto pensa assim // que ( ) (E) a criança / a crian-ça adotada / ê uma criança problema // Uma criança problema // é // 0 que você acha // Hais tarde / ne / quando a criança . . . digamos se isso for escondi-

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do da criança / mais tarde / a criança vai sentir mesmo um ( ) diga-mos um impacto // porque tudo que se sabe (E) de repente / causa impacto // mas eu acho que e momentâneo // eu / eu acredito que e momentâneo // eu acredito / que ë momentâneo / na proporção em que ( ) em que ele recebeu / toda aquela atençao / todo aquele ( ) aque-le apoio / durante todo aquele tempo // entao / e aí / dependendo da educação que também foi dada / desenvolvimento da criança / e tal / né / no caminho bom / entao essa ( ) essa criança / ou ( ) tal-

[ C] — Hum-hm // vez esse adulto quando souber / ou esse adolescente quando souber / ele vai / sendo bem criado / ele vai entender / ele vai receber o impacto / entendeu //ele vai receber //mas vai ser compensado //

I C]- Ham-hm // ele ( ) ele não vai ( ) ... talvez haja algum ( ) algum fiozinho do problema // acho que pode haver // Mas é melhor // ele vai en-tender que é melhor a situaçao atual // do que descobrir/ que ( ) que ( ) esses nao sao os verdadeiros pais /mas que ele recebeu to-do esse apoio / do que estar naquela situação de uma casa de ( ) de correção / (E) aquela ( ) como é que ë / aquelas escolas de crianças (E) órfãs / orfanato / né // entao ë melhor a situaçao atual / de

[C]— Orfanato // estar com ( ) com bons pais / que deram todo apoio e afeto / do que estar numa escola daquela abandonada //

C — Hum-hm // agora ( ) eu me referi problema / criança problema / no [E]— A razao mostra isso pra ela / pra criança //

sentido que ( ) ... (E) por exemplo / foram bem criadas / ali / né / que voce estava falando //da criança assim ( ) que ( ) ... ãs

[E]- Ë // vezes hã pessoas que acham / que ( ) o ambiente / por exemplo / assim ( ) (E) ... do problema hereditario / que seria uma coisa as-sim // que a criança jã ë problema / porque ela jã traz traços / do pai / da mae / já ë rebelde / mesmo sem saber de nada // que toda criança e ( ) ë revoltada / ë uma pessoa / uma criança / uma pessoa revoltada // o que você acha / disso //

E — Revoltada // bom / depende // isso ë ( ) depende de cada indiví-duo // quer dizer / eu acho que ( ) isso pode acontecer / inclusive em relaçao a um filho / a um filho próprio do casal // digamos eu /

[C]- ^ t ü isso aí // eu sou pai / mas eu posso ter / ter alguma coisa de revoltado tam-bém / e transmitir alguma coisa desse tipo a um filho meu/mesmo//

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então / é um problema que pode surgir / (E) em qualquer situaçao / filho adotivo ou nao // quer dizer // e um problema comum a qual-

[ C] - Lógico // quer pessoa / nao tem a ver com o fato de estar sendo adotado //

[ C] — Cada um tem um ( ) ... tem o problema de( ) da individualidade / mesmo //

[ E] — É individual / de cada um // nao tem nada / nada [ C] — Por exemplo / no caso

a ver com o fato de ter sido adotado // ( ) no caso da Angelica e do Romulo // jã ( ) hã uma diferença /

[ E]— É Indivi-na personalidade / um jã i mais teimosinho / o outro ... ne // mas

[ E]— dual // Exata-nao e um problema de ...

E — tamente // esse filho que estã sendo / que seria adotado / ele pode ter as raízes num pai ( ) nervoso / neurasténico / e pode ser tam-bém / que ele seja (E) filho / né / natural / de um pai ( ) inte-

[ C] — , Então / ligente / de um pai equilibrado //

C — voce acha que o que influi mais ê o ambiente // E — Inf lui // tranqüilamente // ë o ambiente em que ele estã sendo cria-

do // se ele estã sendo bem criado/ como eu disse / nê / no ambien-te]- Hum-hm //

te / nê / bem educado ... eu acho que a base ë a educaçao da crian-ça / entende //bem educada / ela vai ser conduzida por um ( ) por um bom caminho // agora // tem a ressalva do indivíduo // cada in-divíduo vai reagir de uma certa maneira ãquele ( ) aquele estímulo da criaçao / tanto que numa família / (E) existe o que ... o bom fi-lhinho / e o mau filho // sobre a educação dos mesmos pais / nê // existe o ( ) a ovelha negra / e o garoto que gosta de estudar //

[C]- É // lógico // depende do ( ) do indivíduo /ne // mas de qualquer maneira / uma i boa educaçao / vai conduzir esses indivíduos / a um / a um melhor ponto possível /que ele pode atingir // então esse problema pode

[C]— , Hum-hm // nao interessa se acontecer (Ã) (E) com um próprio filho mesmo //

EC]— ë adotado ou nao ë / que isso ë um problema ... C — Lógico // E - Né // C — E o que que voce acha do problema de' ( ) por exemplo / de repente

sofrer um impacto/ né // a criança não sabe que ë adotada // então voce acha que ( ) como deveria ser isso //que os pais deveriam es-conder / ou deveriam contar // e de que forma / por exemplo // como //

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E — Ë // eu.acho que ( ) ... você vê que ( ) eu coloquei como único problema dessa situaçao do filho adotivo / é o impacto//e o impac-

[C]— Ë // você jã viu / você to / o único problema seria o impacto/certo // porque ao ...mesmo

C — jã pensou nisso / logo // Hum-hm// assim / depois de ter o impacto / ele pesaria / estando bem orien-tado / ele pesaria / e chegaria ã conclusão / de que ele estã me-

[C]- Ë // lhor do que estaria sem aqueles pais //

C — Depende / depende da maneira como você falou ali / que ele foi cria-do // porque se ele ê amado / ou nao ê amado / se ele ( ) ele vai ter aquela reaçao assim//por exemplo// quando ele sabe / no final ele tem mais e que agradecer // se ele sabe que ele foi ... se ele recebeu todo ( ) carinho / todo amor / mesmo que ele tenha digamos outro irmão jã // ãs vezes a pessoa / o casal nao tem um filho // de repente aí / adota um / e depois vai ter / né // mas aí entao / na medida em que ele compara / por exemplo / se ( ) ele tem 'outro ir-

[E]- Certo // mao / e aí fica sabendo que o outro ë o irmão verdadeiro / que ë o filho verdadeiro // aí se ele ( ) ë tratado mal / ele começa per-ceber que hã uma / hã uma distinção / e nao sabe por quê //

[ E]— Isso sim poderá causar o proble-E — ma // entao os pais que adotam um filho / que (E) digamos (Ã) tive-

[ C]— Ë // ele nao sabe por quê // entao neste caso ... rem ao alcance de ( ) de ( ) evitar que aconteça essa diferença de tratamento / né // (E) entao pra que adotar //se ele adotou / en-

[ c] - tu

tao / ele tem que adotar / tratar igual // entao não adote / entao / entao tem que... não pode haver diferença de tratamento// então es-sa criança / depois vai ver que nao hã diferença de tratamento en-tre os dois / e só tem a agradecer //

C — tu

E — Então ela vai ter aquele impacto natural de saber / pô / este não ë meu pai // ih ( ) nao ë meu pai // po / pensava que era meu pai // tenho outro // vem o impacto / tenho outro // aquele ë meu

[ q - tu pai // este nao ë // então o choque / de saber que este não ë o pai

[ C] - Ham-hm // dele //

C — Ë // no momento sempre / de qualquer forma / acho que o impacto existe / në //

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E — Ha o impacto // C — Agora o negocio de ( ) de se revoltar ou nao depois / isso i um ou-

[ E]— Nao / aï depende daque-tro problema // depende do ...

[E] le outro lado que a gente falou / do indivíduo // um poderá reagir [ C] — reagir E de um modo / outro de outro //de qualquer maneira sempre hã (Ã) . . . [C]— de um modo / outro ... depende ...

depois desse impacto / independente do indivíduo / eu acho que ara-zao (E) vai conduzir o elemento a comparar //a situaçao dele / com aquele pai adotivo / ni / que o adotou / que o tratou bem / e que

[c]- t II

ele estã em ambiente bom / em relaçao àquele ambiente em que ele estaria se nao tivesse sido adotado // a razao sempre vai conduzir ele a esse ponto //

C - t //

E — E no fim / ele vai sempre agradecer // [C]— É / ele vai ter que agradecer // E — Vai ter que agradecer // uma pessoa normal // eu to me referindo [C]— Lógico //

a uma crian ( ) um adolescente/ sei lã / a um indivíduo normal // [c]- / tu

com reações diferentes ao ( ) diante do impacto // mas a razao vai conduzir ele sempre / a fazer essa comparaçao / ni // e ele vai ... no início / após o impacto / poderã ele ( ) ele nem agradecer // depende da reaçao do indivíduo // mas / depois de algum tempo / ele vai / tranqüilamente / voltar / e vai agradecer // eu ( ) eu imagi-no que aconteça isso//existe a razao // considerando pessoas nor-

[ C] — Ë / isso com pessoas nor ... mais//

C — Normais / claro // E — Normais // i claro // existe aquele que ( ) que nao i normal //

então que vai sair ( ) louco / (E) vai sair matando//esse nao i ... [C]— Ë / fica ( ) transtornado /

essa jã Í uma situaçao que ( ) dã pra colocar ã parte // C - Ë // E — Ã parte // mas daí voce perguntou (E) se eu acho que ( ) (E) (E) ... [ cl— t u

como i que você perguntou // C — Da idiia / o que você achava da idiia // [E]— Nao / se ( ) deve contar ou nao // C — Ah / sim //

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E — Deve contar ou nao // entao como eu falei / o maior problema seria o impacto // entao acho que ( ) pra evitar esse único problema / que seria o impacto / que poderia trazer reações como essas que nos falamos / entao (E) acho que ( ) poderia jã / enquanto a criança es-

[ C]— Hum-hm // tã sendo educada / né / jã ir (E) procurando fazer entender ... / mostrar que ele e um pai adotivo // que ele tem outro pai/ certo// pra até chegar numa ( ) num certo ponto / né / e dar inclusive até opção / de ( ) dessa ( ) dessa pessoa até procurar quem sabe o ou-tro pai // sabe como é que é // o pai verdadeiro // sabe como é //

[ C] — Ham-hm // entao vai / jã vai educando a criança jã procurando entender que ( ) ...

C — Pesar a situaçao // E — É / pesar a situação // se bem que é ( ) e ( ) é perigoso / porque

esta criança que nao tem ainda aquela personalidade formada / né // [C]- Ë // C — ela fica ( ) totalmente sem ... I El — Ela nao tem o caráter / a personalidade ainda / tã tudo em [C]- Ë I/

formaçao / ela pode / pode reagir de uma maneira (E) (E) prejudi-cial a ela propria / né // entende o que eu quero dizer //

C — Sei // é porque ... [El — Entao / é perigoso // quer dizer / é um problema // (E) o pai

tem que lidar com muito tato // tem que ter tato // C — Ë que ela nao tem aquela capacidade de ( ) de discernir melhor as

coisas / e de ver qual é o melhor caminho / nao / de ponderar / de analisar / de ver / de compreender a situaçao / e de optar pelo me-lhor pra ela //

E — Em qualquer momento / eu acho assim // em qualquer momento que se conte / que se conte / vai gerar o impacto //

C — Seja em que época ... [ e] — É // seja em que época for // então / você veja a idéia [C]— Agora / mas

que eu tô querendo dizer // [C]— deve existir uma época melhor // E — É // isso // querendo dizer/ querendo dizer / que deve ser contado

tanto que ... [Cj — 0 ( ) problema é esse / saber o momento melhor // E — Saber o momento certo // é muito perigoso // tem que saber o momen-

to certo // o momento / e tem ... e eu acho que tem que ser falado

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/ de uma maneira gradativa / e nao / que cause aquele impacto / que gere uma reação inesperada / né // Então teria que ( ) que ser na infância / ja / assim // não na ado-lescência // jã ser quando a criança ••• quando ë pequeno ainda //

Ë// de uma forma ... tem que jã ir aos poucos / ir preparando // Ë difícil / né // é uma coisa que ( ) que eu nao saberia como / por

Ë uma coisa difícil // ê um pro-exemplo / no caso / como / como falar / em que época / em que hora blema // certa / né / pra falar // Isso mesmo // por exemplo / tem pessoas / que adotam a idéia / diga-mos / a linha de ação de não contar // simplesmente / nao conta //

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DIÁLOGO IV

FALANTE F

Profissão: médico Idade: 34 anos Sexo: masculino

FALANTE G

Profissão: professor Idade: 31 anos Sexo: masculino

FALANTE A

(ver diálogo I)

A — Nós tamos aqui na casa do Édson / fazendo uma visita a ele / e co-mo eie ( ) recém adotou uma criança / nos gostaríamos de perguntar a ele / alguma coisa sobre adoção / Édson //voce poderia dizer al-guma coisa pra gente //

F — Olha / a ( ) adoçao / era uma palavra que ( ) vivia assim bastan-te distante da gente / até a gente casar / e nao ter filhos / né // a partir do momento / em que ( ) nao se conseguiu a gravidez dese-jada /no ( ) na época certa "/ a adoçao passou a ser pra gente / uma palavra de estudo / mais ( ) de perto da gente // e também por ( ) devido ao que a gente / a profissão que a gente exerce / né / na parte de obstetrícia f e a minha esposa na parte de pediatria / nós estamos todos os dias muito ligados a pessoas que estão dando ne-ném / pessoas que estão tendo neném // entao esse ( ) mundo de ado-çao com a ( ) o ( ) com o exercimento da nossa profissão / e com a situaçao nossa / passou a ser assim / um mundo muito comum / e nos pudemos trocar muitas idéias (E) a respeito da mesma // particular-mente nós (E) jã tínhamos uma idéia formada / uma vez que na nos-sa família / jã que eu tenho trinta e nove sobrinhos / oito deles

[A]- Nossa // sao adotados // minha mae criou onze filhos / adotou quatro //

A — Meu Deus // incrível // [F]— E então ( ) e entao / isso pra ( ) na minha família era F — muito comum / né //a gente encarava a adoçao como uma coisa perfei-

tamente normal // não importando a idade / nao importando se a criança sabia ou nao sabia / nao tinha problema // agora / por par-te da minha esposa / as preocupações eram maiores / porque ( ) nun-

[A]— Hum //

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ca tinha tido assim um caso na família // mas / pela necessidade nossa de termos uma criança / e a vontade nossa de termos uma crian-ça em casa / nós passamos / ou melhor / minha esposa passou por ci-

Hum I I . ma desse problema / e com estímulo de amigos também medicos / aca-bamos (E) acabamos adotando a Sheila / ne / que chegou hã dois meses e meio / e nós só nos ( ) nós só sentimos / ou só nos agradecemos de não termos esperado muito tempo mais / ni / uma vez que espera-

Que maravilha // mos apenas três anos /ni // estamos com três anos de casado // e

ËII se nós tivéssemos esperado dez anos / como muitos casais esperam / nove anos / oito anos / nós sem dúvida nenhuma estaríamos lastiman-do agora / porque ( ) desde a hora que a Sheila veio / mudou total-mente a nossa vida / ne / tem uma visão total / pra nós // Isso II então a gente podia perguntar pra você / se tem influência no comportamento posterior da criança / a época em que se dirã a ela que foi adotada / ou / se no caso / naa se deve dizer // como i que voce acha // Ë // nós cremos que existem duas correntes // existem aqueles ( ) ... aquelas corrente mais antiga / em que os pais não dizem / nao gostariam de dizer aos filhos que eles eram adotados // então / nor-malmente se criava uma cadeia enorme em torno da criança / pra se evitar que alguim dissesse ã criança // então ãs vezes os pais se mudavam de lugar / pegavam uma ... a mae fingia uma gravidez / coi-sas desse tipo / pra adotar uma criança numa outra cidade / pra que

É verdade // achassem que ( ) que fosse filho dela // uma criança nessas condi-çoes / realmente 7 que venha a saber que ela e adotada / por vol-ta dos seus dezoito / dezenove / vinte anos / pode-se criar / nela uma das reações mais diversas possíveis / e normalmente de nocivi-dade ao pai e ã mae // agora atualmente / a Psicologia nos diz / que a melhor ipoca de se dizer pra criança que ( ) que ela i uma criança adotada / i entre os três aos cinco anos lia gente jã ir preparando o espírito da criança / quando a criança aceita melhor as coisas / e dizendo lentamente pra ela / que ela não i filha le-

Hum // gítima // parece que nesta ipoca / hã uma aceitação melhor // eu creio que o mais (E) o mais nocivo que a gente vê / ê quando a criança recebe a notícia por terceiros / nao i // então o choque i

Ë //

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grande / e a personalidade da criança / ãs vezes conforme a idade era que ela esta / pode ( ) mudar totalmente / pode ficar agressiva/

Ë// pode assim ter a ( ) as mais diversas formas de reações / ne // Ëdson / entao / vamos fazer uma pergunta aqui / um pouquinho mais complexa // entao a criança adotada / então ve / devido ãs condi-çoe;s em que se desenvolveu a gravidez materna / e devido mesmo a uma possível hereditäriedade paterna / ela nao teria assim ( ) diga-mos / uma grande possibilidade de ser uma criança problema / devido a esses fatores // Ë // o ( ) o meio ambiente uterino / veja bem / o mundo que a criança vive / no ( ) no utero da mãe / e uma criança que estã em contato com o meio ambiente // e evidente / que numa gravidez sobre ten-são-/ uma gravidez com susto / com tristezas / alegrias / dificul-dades / essa criança vai ter algumas dificuldades / ãs vezes / ser uma criança mais nervosa / mais irritadiça / que chore mais facil-mente // pode acontecer alguma coisa desse tipo / porque a criança no utero materno / jã estã em contato completo com o meio ambiente// agora / a criança depois que nasce / ela é todo um mundo aberto / Hum // onde voce pode colocar ali tudo que voce quiser // entao e um cam-

Hum-hm // po ( ) um campo preparado para o plantio / e para a ( ) o cultivo dessa criança // entao cabe ao pai e ã mãe / (E) todõ esse trabalho de meio ambiente / colocar na cabeça da criança tudo que eles acham importante / para que essa criança se adapte ao meio ambiente //

Ë// e nós vemos coisas assim ( ) coisas (E) engraçadas ate / vamos di-zer / que a criança acaba se parecendo com o pai / com a mãe // É / isso i verdade // Nao que ela mudaria tanto / a maneira de ser /mas ela acaba ãs ve-zes / a fisionomia parecendo / nl // E as vezes / um filho próprio do pai / talvez nao seja tão pareci-do / quanto o adotivo //

Tao parecido // Ë verdade // isso ë uma coisa muito comum mesmo / e muito bonita // Exatamente // e a questão da hereditariedade / nós cremos que não funciona pra esse modo // porque a gente vê / ãs vezes / pais tão bons com filhos legítimos tao ruins / ne // pais tão ruins / com filhos Ë / isso e // tao ( ) . . .

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Tão excelentes // Ne // eu tenho a ( ) o exemplo dentro da minha casa // meu pai / minha mae / fumam barbaridade até hoje // de onze filhos / nao tem nenhum que fuma / que goste de cigarros // então / onde que tã a a ( )a hereditariedade // então / coisas assim / incríveis / né //

A hereditariedade // então se fosse assim / os filhos do Einstein seria oito gênios

Gênios // então ax (E) entram outros fatores / que ( ) a ciência nao expli-e no entanto nao acontece // ca totalmente / né // Ë // ê verdade // então / mais ou menos pra encerrar / Ëdson / en-tão / ( ) vamos dizer / você que adotou uma criança / então vamos fazer tipo um final aqui // o que o levou a isso / nê // voce jã quase que falou / e como você se sente agora / então / depois // É // o que levou nós a adotarmos uma criança / é que depois de um período de a gente estar casado / a gente ve que a vida começa a virar uma rotina / em termos profissionais / viagens // (E) parece que ( ) falta uma coisa na vida da gente // e esta alguma coisa / sem dúvida nenhuma / ê uma criança // e como nós jã dissemos nós (E) só não ficaríamos / nós só ficaríamos arrependidos / de espe-rarmos / vamos dizer / oito / nove anos / nê // nós estamos assim felicíssimos / de termos ( ) ... de ter vindo a nossa criança na hora certa // seje nossa ou nao seje nossa // agora a questão de amor a essa criança / a- questão de estima / eu creio que é uma ques-tão / que principalmente nós / dois / tamos com todas as chances de dar tudo que ela precisa / né / em termos de amor / como fosse uma criança nossa / sentindo como se fosse nossa filha // como ela vai ( ) como ela vai ( ) encarar isso depois que souber que nao é nos-sa filha / isso mais tarde / isso ê um outro problema / que nós nao podemos pensar agora // se ela vai (E) ... trouxe algum problema de desenvolvimento materno / algumas frustrações / algum problema que pode ter influído / também nós nao podemos analogar / porque se à gente pensar também muito / a gente não faz nada / né // Ë verdade // Mas / o importante é que nós precisávamos da ( ) da nenê / conse-guimos / e eu acho que ela precisa também muito de nós / né / e nós vamos dar tudo que for necessário e / que Deus nos ajude // Ah / puxa vida // Ëdson / então / muito obrigada // Espera aí que eu tenho uma perguntinha a mais pra fazer //

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Ah / mais uma / que o Jorge tem // . É // jã que a experiencia da primeira / que ainda nao se concreti-zou e que ainda existe muito ( ) muita tarefa ãrdua / muito ( ) muita labuta pra criação dessa ( ) dessa nova (E) nova criatura que voces estão no seu lar / que nao i de vocês / (E) vai ficar so nes-sa // Não // o nosso plano / o plano da minha mulher / i a partir de maio /.daqui a um ano /nos partirmos para um guri // Ah / que maravilha // Se nao der um guri / partimos para mais uma menina // Que coisa linda // 0 nosso plano i ficarmos entre dois a tres / entre duas ou três crianças / ni // Mas / Édson / (E) jã ê praticamente ( ) ... digamos ( ) dentro de um contexto social / existe casos / em que casais que ãs vezes ficaram anos tentando ter filhos / nao conseguiram / e depois que adotaram um ou dois / tiveram um seu proprio // talvez ati por um premio divino / a respeito de sua boa vontade / da sua ( ) ... (E) digamos do amor que voce ( ) . . . da doaçao / que voce estã fazendo / como i

Da doaçao // que voce encararia depois / Édson // como i que você se sentiria / (E) depois de um ou dois / ou três adotados / tivesse um filho teu // Veja bem/Jorge//a gente que crê que somos todos filhos de Deus / somos todos irmãos / nao e mesmo // toda a criança / puxa vida // toda a criança ê uma coisa linda / nê // não ( ) não ( ) não quer

Incrível // saber se i da gente/ se i do outro // toda criança tem alguma coi-sa assim de ( ) de Divino numa criança / de bonito de ( ) de ( ) ... que mexe com o sentimento da gente //não impor ta / vamos dizer / se seje da gente / se seje de outro // eu sei que a ( ) a situaçao ( ) vamos dizer ( ) o dia / o dia em que a Sheila veio pra nos / a correria que nos tivemos atrãs de documentos e papiis / i como se a minha mulher tivesse tendo um parto / ni // o nervosismo nosso / tal e coisa / e tudo mais / e nenê // então / eu acho que ( ) não vai mudar praticamente nada //vai ser assim // vai ser uma criança mais pra nós / um filho nosso / vai ser ( ) vai ser um outro ado-tado / ni // (E) em termos de sentimento / não tenham a menor dú-vida / vai ser a mesma coisa / nao deve mudar nada / de maneira nenhuma //

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G — Esse ( ) a Sheila / por exemplo / você acompanhou a gravidez, da ge-[F]- Nao //

raçao da Sheila // F - Não // G — (E) Bom / ' eu como jã / jã sou pai / o filho foi gerado pela minha

esposa / e que eu acompanhei toda a gravidez dela / në / e também fiquei grãvido / né / com ela / junto / (E) digamos / existe uma emo-ção muito grande no acompanhamento da gestaçao do ( ) do ( ) da ge-ra çao do seu filho / né / na ( ) na sua esposa (E) mesmo como pro-fissional /você como médico jã tã acostumado acompanhar gestações / acho que de umas centenas / né // (E) é uma pergunta que eu sempre gostaria de fazer // como é que voce se sentiria acompanhando / como profissional / (E) e como pai da propria gestaçao / do seu próprio filho //

F — Olha / Jorge / não sei // mas e ( ) é ( ) uma ( ) é realmente uma situaçao ... porque a gravidez ê uma coisa que mexe demais com a ( ) conosco /nó // eu me ligo assim nas pacientes / pra você ter uma idéia / eu jã cancelei viagens minhas de prazer / por causa de um parto que ia / devia ter naqueles dias // (E) se uma paciente

. perde o neném / eu choro com a paciente / porque / puxa / aquilo também tã dentro de mim/ aquele negócio //a paciente quando ganha um neném / eu choro de alegria junto com a paciente / e ( ) faze-a maior festa dentro da sala / aquele rolo / sabe / porque o nas-cimento é uma coisa assim linda / mesmo / né / e aquele momento de felicidade / aquela espera / e tudo mais // eu creio que ser assim um ( ) ... aumentar um pouco mais a felicidade da gente / ni // esticar um pouco mais essa espera / porque o ( ) o gostoso / ni / de tudo e aquela espera // fazer ali / as roupinhas pra nenim // i ver o bercinho / (E) o nenenzinho se mexeu hoje / ni //

A — Ë // aquela coisa // F — Entao / eu talvez nao sinta tanto / nem minha mulher sinta tanto

porque nós temos (E) um pouquinho de remidió / porque (E) eu acom-panho as gestantes / e ela acompanha as crianças todo dia // o meu nenezinho fez isso / e tal / tal // entao de uma certa forma / a

[A]- Ë // gente ta um pouco em contato / e isso tira um pouco daquele ( ) ...

G — Encantamento // F — Encan ( ) encantamento da gente / ni // A — Nao hã talvez aquela falta / ni //

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É // a falta nao é tao grande / né // nao é tao grande // e por outro lado nos dois nao somos .. . por exemplo / tem mulheres que se nao tiverem um filho / elas ( ) elas ( ) . . . Enlouquecem // Enlouquecem / ne // É verdade // (E) Tem homem que se não tiverem um filho/ ele larga /.ali da gen-te / e vai pra outro // Ë // e vai querer outro // ë // Não era bem o nosso caso //o nosso caso / era nós dois / as crian-

Não // ça seria uma coisa futura / ne // Uma continuidade // Uma continuidade // se nao viessem crianças / nós ( ) nós ( ) nós viveríamos normalmente //a criança i assim um complemento de tudo pra nós / né // Bom / resumindo / digamos assim / (E) você em termos de papai ago-ra / (E) praticamente passado em cartório / mas antes disso daí / tanto voce quanto a lide / vocês eram papais adotivos de tantas crianças / e você pai de tantas maes grãvidas // Ë verdade // isso é muito bom // Ë / / e a ( ) e o ( ) e assim pra ( ) pra encerrar / assim a mensa-gem que a gente como obstetra / a esposa como pediatra / e a gente como ter adotado uma criança / a mensagem que a gente daria a uma pessoa que nao tivesse filhos / né / eu que lido com esterilidade feminina / e tudo mais / e vejo os ( ) os problemas psicológicos que as mulheres passam / em busca dos exames que sao feitos para se buscar um diagnóstico da esterilidade da ( ) das mulheres / e ( ) a minha mensagem assim / seria fazer uma doação // Pegue uma // tem tantas criancinhas nascendo aí sem condiçoes // pegue / que a pessoa jamais vai se arrepender / jamais mesmo // sabe / tenho certeza que nao vai se arrepender // mesmo que a criança seje re-belde / seje boa / seje agradecida / ou seje aquilo // a experiên-cia de cuidar de uma criança / dar mamadeira pra uma criança / tro-car a criança / dar banho na criança / esse acompanhamento / nao hã nada que pague isso depois / pra gente / nê // Puxa / é maravilhoso // então Olha / Ëdson / muito obrigada pra voce / toda a felicidade do mundo pra lide / pra Sheila / e pra você / tã //

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F — Eu que agradeço // -A — Tchauzão //

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DIÁLOGO V

FALANTE H

Profissão: Idade: 32 anos Sexo: Feminino

FALANTE I

Profissão: professora Idade: 33 anos Sexo: feminino

FALANTE C

(ver diálogo II)

C — Quando eu lecionava no Pedro Macedo / em 76 / eu sentia que ( ) muitos alunos / nao só comigo / nao tinham (E) nao demonstravam muito interesse // você se matava de explicar / e eles nao tavam nem ali / porque sabiam que iam ter uma nova chance // ora / se não aprendessem agora / nao iam reprovar de ano // então / essa questão de muitas recuperações / recuperaçao terapêutica / eu con-sidero uma falha da Lei 5692 // eu gostaria de saber entao / como vocês veem o ensino / concretamente falando / apÓs a implantaçao da Lei 5692 // seus pontos positivos e negativos //

• H — Essa Lei 5692 / em primeiro lugar / que nunca lecionei / sem ser com a Lei 5692 / né //

I — Eu também nao // H — Quando eu comecei a dar aula / em 73 / ela jã tava em funcionamen-

to // nao assim ... (E) me lembro que eu dava Geografia // entao / ainda tava dividido em Geografia / História / etc. // mas ( ) Estu-dos Sociais ainda nao tinha sido incorporado / mas ( ) jã tinha / entrava recuperaçao / a recuperaçao terapéutica / tudo aquilo / ta-va em vigor // e acho que um ano ou dois / depois / começou a en-trar (Ã) Estudos Sociais mesmo / daí a lei funcionava normalmente//

[I]- Fazia parte do I — Núcleo Comum que a lei propunha // H — É / daí sim // quer dizer / antes tinha / Estudos Sociais / mas só #

que era um professor que dava Geografia / outro História / e outro Organizaçao Social e Política // e a gente quando fazia a avalia-çao / cada um dava sua nota / se somava / tirava a média / e tinha uma média de Estudos Sociais //

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I — Entao / quer dizer / que com a lei / acabou / justamente / não existe mais aula de História / nem de Geografia/ nem de 0.S.P.B.// existe uma coisa em comum //

H — Daí / sim / acho que uns dois anos depois / começou a vir Estudos Sociais com um professor só // daí a gente / cada um / nê / assumia as suas aulas sozinho e ( ) e ( ) foi quando a lei começou a fun-cionar normalmente / como deveria ter funcionado // agora / pelo que eu tô ouvindo tã voltando / de novo //

I - É // H — Separar // pelo menos na minha ãrea // separarem novamente //pro-

fessor de História dando História / de Geografia dando Geografia / e ( ) ... agora em relaçao ao aproveitamento / eu não sei se a lei tem culpa disso // eu acho que ( ) esse riegõcio assim de nao refletir / de o aluno ter preguiça mental / tudo isso / jã ë uma coisa assim que ( ) ... porque a Escola nunca estimulou mesmo // voce tã fazendo assim / descobertas / ou você tã ( ) . . . você nunca estimula o aluno a pensar / nê // normalmente a Escola / de um modo geral/não // ë aquilo prontinho / a resposta certa / o livro vem até / assim ( ) com uma resposta praticamente feita / quase / jã pro aluno // entao acho que isso nao ( ) ë /propriamente culpa da lei //

- I — Pois ë // entao voce vê / dentro da minha ãrea / que seria Ciên-cias / në / atribui-se justamente a ciencias / a grande responsa-bilidade em parte de levar o aluno a refletir / nao ë //

H — É / Matemática também // I — Entao / depois que foi colocada a lei / que foi implantada / tudo

direitinho / o pessoal da Secretaria / por exemplo / começou a criar cursos / nao ë / pra fazer com que as professoras pudessem se adaptar dentro do que era pedido //

H — Ë // as reciclagens // I — Ë // as reciclagens / në // e mesmo depois das reciclagens / em ( )

em currículo mesmo// eu até cheguei a dar esses cursos em currícu-lo / em Ciencias // onde justamente se insistia nisso //em que a criança deveria aprender pensar por ela mesma / processar a mensa-gem / entao te dar respostas / né / a partir do que ela tinha en-tendido / e nao a partir do conteúdo // que a professora deveria entao (E) aproveitando assim / ao receber uma avaliação da criança / por exemplo / ter que considerar só as questões em que a criança

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mesma desse a informaçao / segundo as palavras dela / segundo o que ela tinha entendido // quer dizer / obrigando a criança de uma certa forma a pensar // então (E) realizando experiências / nao e / com materiais comuns / práticos / tudo isto / porque eles acreditavam / justamente / a proposta era essa / que a partir disso / (Ã) a crian-ça poderia / quando chegasse a fazer uma interpretação em Português/ ou a fazer uma leitura / na ( ) tua ãrea de Estudos Sociais / ela jã tivesse condiçoes de refletir / jã teria desenvolvido o racio-

[H]— Já teria desenvolvido o raciocínio // cínio // mas (E) ...

H — Não ( ) não se faz / nê // I — Nao / não // H — A gente aprende / mas nao ( ) ... nao sei / ë como se ( ) ... sei lã /

a propria escola não te motivasse a isso // a estrutura da escola o sistema da escola /e neste ponto / eu acho / por exemplo que ( ) que existe a ( ) a ( ) uma certa razao quando dizem ... aí sim / talvez seja um defeito da lei // que a lei tirou do professor a liberdade dele / por exemplo / decidir o que que ele quer dar / como ele quer dar // entende// ele ê uma pessoa / assim / que nao

- participa mais das decisões da Escola // geralmente tem uma coor-denação / ou um ( ) mesmo uma supervisão / que tã encarregada de ( ) de se preocupar com esta parte / e o plano jã vem prontinho//

[ X] — Ë // I — Até as avaliações / em muitas escolas / a gente sabe que funciona

assim // ë serviço da coordenadora / nê // [H]- tu H — E o ( ) e o professor simplesmente virou um mero ( ) um ( ) uma

máquina que aplica aquilo / um instrumento // uma máquina que apli-ca aquilo que jã veio programado por outra pessoa // então separa-

[I]- t u • ram o pensar pra uns / eoagir pra outros // e isso talvez fosse real-mente / uma conseqüência da lei // eu acho engraçado / porque dã impressão atê que voce tem uma testemunha // eu acho horrível // lembra que ( ) num trabalho de Antropologia a gente nota ãs vezes / que todo mundo começa a ... alguns se inibem / tem gente que nao fala / eu nao sei se pra você / pra mim / eu tenho impressão que

[I]- Ê/tem tem uma testemunha / testemunha oculta /ê bom ate nao olhar muito //

[i]— pessoa // I — Mas eu nao sei / agora eu ( ) o que eu peguei direito mesmo / tra-

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balhando com 29 grau / foi a questão do profissionalizante- / que veio com a lei // Ë / e // isso jã nao / quer dizer / tive porque eu trabalhava com o 2? grau / mas minha materia nao interferia // Pois i // entao o que a gente sentia foi isso // (E) eu trabalho em escola particular / nao e // entao quando se implantou a lei / exigiu-se uma série de materiais pra poder funcionar um ( ) os cur-sos profissionalizantes / e isso e aquilo // entao o pessoal da escola se ( ) se empenhou / comprou / montou laboratorio / montou isso / montou aquilo / organizou estagio / os alunos fazem até hoje / porque continuam mantendo evao manter o profissionalizante // (E) as meninas fazem estãgio por exemplo na parte de saúde/ em hos-pitais / na TECPAR / tudo / sabe // e o que mais te desanima / é

Ham-hm // você ver que ãs vezes você recebe uma menina de fora / vem / dentro da lei / e que nao fez nada / nada daquilo que ... se ela entra no 29 ano por exemplo / porque as outras escolas compram / dao um j ei-

Ham-hm // tinho / né // Se vem de escola / principalmente escola publica / nao tem ...

É / nao tem nada // mas mesmo as escolas particulares / por exemplo / tipo cursinhos / né / eles nao aplicam a lei / do jeito que ê pedido //

Mesmo curso tipo Positivo // Nada / nada / nada / nada // eles sõ dizem que tem as matérias / e mandam o aluno fazer uma carga horaria mínima // nada do que é exigido / sabe // Porque na nossa / por exemplo / tinha / mas era so ... eles tinham aquilo de que realmente a escola tinha condiçoes //

Escola particular / né / e colégio de freira // Nao / pública // Pública // Pública // mas era assim // (E) mecanografía / porque conseguiram /

Ah // Ham-hm // sabe Deus onde / umas máquinas de escrever / e tinha também / acho Ham-hm //

que análises químicas / mas sinceramente / acho que tinha um la-boratório muito pobre na escola / e nao posso imaginar que fosse Pois é // fazer alguma coisa mesmo de ( ) ...mesmo a ( ) a parte de mecano-

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grafia / eles aprendiam realmente a bater ã maquina / e parava aí // [I]- Ham-hm //

era auxiliar de administraçao / nao era nem mecanografía // [I]— Ham-hm // I — Pois ë /mas você ve / a questão do particular ou não / também isso /

quer dizer / implica // lá ë particular / mas (E) não sei se por questão de ser de freira / que elas têm / que elas acham que tem que cumprir tudo direitinho / que cumpriam / porque lã ... porque outros particulares que pudessem muito mais / poderiam muito mais / por exemplo / esses grandes cursinhos que nao têm 29 grau / dentro da lei / e que nao mantém isso //

H — E que teriam realmente condiçoes // I — Muito melhores do que lá // porque o cursinho / nao / o cursinho

[H]- Ë // ë fábrica de vestibulando / në //

H — Ë // ele tã interessado em ver que as pessoas sejam aprovadas ou [I]- Claro //

nao no vestibular // o resto ... e tem outro detalhe ... agora ë curioso / porque o teu ë colégio de freira // porque quem vai pra cursinho / jã vai pensando em faculdade // então o compromisso do

[ I ] - t u

cursinho / ë com a faculdade // quem entra inclusive no Positivo / desde / desde pequenininho / desde o primãrio / e mesmo 5? série / tudo / (E) pessoas assim que ( ) (Ã) os pais já tao pensando em preparar pra faculdade/ pra um curso / pra uma coisa assim // e ( ) então / eles nem têm ... o compromisso deles com os pais é em re-laçao mais a ( ) ...

I — Pois é // agora o que teria de vantagem dentro da lei / se fosse [ H] — Ë a vestibular //

aplicada realmente / como ( ) como se sonhou /, pode-se dizer / o [H]- 0

profissionalizante / principalmente / pra esse pessoal de escola [H]— profissionalizante //

pública / que deseja trabalhar / que ... não ë que deseje só / por-que tem que trabalhar / não ë / e que teria ...

[ H] — Porque tem que ter realmente uma pro-fissão / uma coisa assim //

[i]— Exatamente // que teria uma iniciação // H — Uma especializaçao / né // e depois se falava muito também na ne-[I]- tu

cessidade técnica / logo que começou a se implantar // I — Ë / e isso mesmo // e depois morreu isso //

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H — Morreu // nao/ nao // nao ficou em nada // agora /é curioso / por-que a Escola Técnica / sempre foi profissionalizante / sempre con-seguiu dar o 29 grau //

I — Com uma concorrencia incrível / né // tem até vestibular pra en-trar //

H — Pois e // e funciona / né // por que que o resto vai mal // I — Mas / justamente // é o que eu te digo // pelo fato // a lei abriu /

essa possibilidade / mas ao mesmo tempo abriu a possibilidade de que os outros enganassem // entao uns cumprem / outros não // é claro / por exemplo / houve evasao / do nosso 29 grau em relaçao a

[H]- Ê // porque cursinhos //

[H]— quando hã exigencia / começa ... I — Lógico // entao tem que cumprir X horas de estãgio / (A) no caso

eram só ( ) sao só meninas em 29 grau / por enquanto / infelizmente ainda // mas no caso / entao / elas / se têm possibilidade/ se nao têm tanta necessidade do curso profissionalizante / elas pulam pra lã / porque justamente em função de cursinho / elas terão mais tem-po / né / por questão do vestibular / que fogem //

[ H] — Ë // É // também / o publico / a I - t II H — clientela que é atendida pe ( ) pela escola / é uma escola também [il- t u

preocupada com / uma clientela preocupada com o vestibular // I — Pois é // H — Eu nao sei // eu vejo também ... depois é aquele negócio / né /

caiu / recaiu / abriram uma quantidade / abriu-se uma quantidade / diminuiu-se a qualidade // e ( ) ficou realmente ( ) por uma preo-

[i]— A qualidade // cupaçao / eu acho ( ) que em geral / da ( ) da ( ) nao seria espe-cífica da lei // a lei abriu pruma maior quantidade / isso deveria ser o ideal / mas não ( ) não / não viu que não havia condições/ na propria sociedade / dentro dos estabelecimentos que estavam fun-cionando / de poderem atender aquelas reivindicações //

I — Pois é // voce vê numa escola de interior / por exemplo / vai montar um curso profissionalizante // que condiçoes tem //

H — E depois mesmo em relação a mercado / né / porque daí eles hao tem . . . eles ( ) a única coisa que eles conseguem é auxiliar de

[I]- De escritorio / essas coisas assim que ( ) requer menos material //

[i]— escritório //

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I — Então/ por exemplo / assim na ãrea de saúde que seria assim neces-sidade premente / né / nao tem condiçoes porque nao pode montar //

H — Ë // o material é muito caro / e nao dá // I — Tanto é que aqui se dá bolsa em nivel de 29 grau / só pra curso

de saúde // por exemplo / Administração / (E) Secretariado / já não tao dando mais / justamente porque / tem muitos / né / e que den-

[ H] — Um monte de tro da área de saúde tem muito pouca gente // e então elas esta-

[ H]— gente // e // riam incentivando / agora / a área de Saúde // mas mesmo assim ...

H — Ë // eu acho que ... e depois / agora eu nao sei / porque agora caiu o profissionalizante de novo / né //

I — A vontade // pode permanecer // pode permanecer / justamente por interesse de atender a clientela que precisa depois //

[ H] — Ham-hm // e você jã tem H — toda uma infra-estrutura montada / então ... I — Daí vai permanecer // H — Até nem sei como ê que você foi ... [I]— Eu vejo como uma faca de dois gumes / isso pra I — nós // porque justamente /aí / aí pode ocorrer uma evasao maior

ainda // H — Ficam só aque ... [ i] — Claro / porque daí ê preferível // quem não ( ) não ( ) ' I — nessa idade talvez ainda nao estejam assim pensando / nê // quem

ainda nao pensa / quem não tem a necessidade financeira de um em-prego / ou isso ou aquilo / nao vai querer ficar na escola // por-

[H]— É // que vai preferir um lugar / então / onde nao tenha //

H — E a clientela de vocês lã / acho que a maioria nao precisa / né // I — Pois agora tã modificado // II - Ah / é // I — Ë // inverteu-se // H — Então deve tã havendo um problema enorme / nê // I — Ë // tem menos número jã de gente que nao ( ) que nao precisaria //

então / acho que essas vao acabar saindo mesmo // H — E como ê que ( ) com essa diferença assim de pessoa / (E) de pes-

soa de renda menor (E) e de pessoal que você tradicionalmente ti-nha / e que era de uma renda mais alta / como é que se dã o entro-samento / o ( ) ....

I — Entre as alunas / principalmente entre os pequenos / não hã proble-[H]- Ë

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ma / de aluno pra aluno / tanto quanto hã de pais /em relação / aos alunos carentes / por exemplo // de nao querer que a filhinha

[ H] — Ah / é / é / / se misture / ou isso ou aquilo / sabe // mais por questão / assim / de os pais incutirem ãs vezes na criança // mas por ela mesmo,...

H — Ë / os pequenos eu acho que nao // [i]— Ninguém nem sabe quem i quem dentro da sala // H — É // mas adolescentes / eu acho que jã é mais problemático // I — Existe uniforme / justamente pra ( ) pra impedir assim / os altos

desfiles / né / se fosse o caso / ou coisa assim // mas elas nao ( ) não / nao se hostilizam assim / em comportamento / assim / por-que sao turmas muito pequenas / ate dez alunas / quinze alunas /

[ H] — Ham-hm // entao / nao ( ) nao tem ainda / nao chega ao problema // mas essa questão que ela abordava da recuperaçao / isso eu acho / assim uma ( ) uma judiaçao o que se faz com as essas recuperações //

H — Ë // essa recuperaçao é uma coisa ridícula / né // tã ali na lei e diz que realmente ( ) ... mas nao funciona / de maneira nenhuma //

-I — Como é que você vai recuperar um bimestre / nao é / numa aula de [ h ] - tu

90 minutos // H — til recuperaçao deveria ser aquela recuperaçao paralela I que você

vai fazendo / â medida que voce vai dando novos assuntos / você jã vai revisando sempre os ( ) os anteriores / e como pré-requisitos

[I]- Pois é // pra voce entender o que vem a seguir // mas recuperaçao mesmo ... o que eu acho que seria ideal / nao seria propriamente / reprova-ção II sou contra //achar que infelizmente / se a criança vai mal em Matemática / vai mal numa disciplina / ela deva perder o ano in-teiro / mas que . . . dizer o que eu acho também ê um negócio meio utópico / que seria necessário também ter ...

[ i] — Sistema de dependência // H — Ë / sistema de dependência / funcionando assim em horários ... a

criança normalmente vem pra aula ã tarde// ela não conseguiu acom-panhar o programa de Matemática daquele ano / entao ela passa pro ano seguinte / mas ela vem fazer recuperação / daquela que ela con-tinua tendo / continua normalmente / nê / o currículo dela conti-nua seguindo / mas ela vem fazer recuperação de Matemática pela manha //mas isso demandaria mais sala de aula / mais professores //

I - Claro //

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H — Então também nao seria uma coisa aplicável â nossa realidade // o grande defeito da lei / eu acho que aquele ( ) aquele velho de-feito de tudo ser feito no Brasil / um grupinho de pessoas decide //

I — De cadeira // H — Hum-hm // I — Diga-se pois / porque nao ë da prática nao / que eles tiram isso // H — Não/ não// simplesmente eles ( ) ... sei lã / lêem em algum lugar /

vêem que no outro país e assim / ou qualquer coisa assim / resol-vem / em vez de reformar / ou de pelo menos tentar adaptar o que jã tã funcionando / corrigir apenas o que tã indo mau / então se destrõi tudo que jã foi feito até aqui / e se implanta uma coisa nova / vinda de fora / sem a menor chance / assim / sem a menor consulta / pra quem / pros verdadeiros interessados opinarem so-bre / né //

I — É // e se surgir / no caso / uma contra-reforma / né / como dizem que viria por aí / também nao vai ser a partir de escutar o profes-sor/as dificuldades / a propria criança / nê // o adolescente //

[H]— Não // H — Os pais // I — Nada disso / vai ser a partir / H — Dos pais /

. I — Ë // vai ser a partir ... [H]— Vai ser de novo / I — De novo / de cima pra baixo / né //

[ H] — Mais uma coisa de cima pra baixo // I — Vertical / né // H — Vertical // eu me lembro até que quando (E) quando eu comecei a

lecionar / a lei jã tinha sido implantada / mas quando eu estava na faculdade / ela ainda estava em vias / quer dizer / ela jã tinha sido áprovada / mas estava ... nao antes até de aprovarem / antes de aprovarem que jã se sabia que Geografia / Organizaçao Social / Historia /iam ser uma disciplina sõ // entao houve movimentos de

, professores de História//movimentos de professores de Geografia / prevendo assim bateladas de cartas / indo até / tentando audiên-cias com ministros / e uma série de coisas // publicando artigos em revistas especializadas / tudo / pra mostrar o que de fato ia acontecer / mas nao adiantou nada //nós inclusive que ( ) acho que andamos encaminhando abaixo assinado / tudo/ na faculdade / tentando ver que nao ( ) nao se fizesse dessa forma / mas acho que foram

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Ill

engavetados / ninguém nem sequer deu uma satisfaçao / se tinha lido ou nao / e ficou por isso mesmo //

I — Eu acho que outro problema que se criou / é que o proprio profes-sor atuante na época / ele nao recebeu instruções antes da lei ser aplicada // nao houve preparo / né / pra esse professor //

H — E ele nem se sentiu ... [ i]— As reciclagens foram depois da coisa estar praticamente I — pronta // H — Claro // e na medida que era uma coisa de cima pra baixo / que ele

se sentiu que ele não tinha participado das decisões da lei // que [ I] — Exa-

ele nao tinha opinado / e que o que ele tinha opinado não tinha [i]— tamente //

sido ouvido / ele também nao se sentiu responsável pela aplicaçao da lei // enfao fazia pro-forma / porque tinha que fazer / era

I X] — É // assim mas ( ) ele ... era um negocio assim / no qual ele realmente tomava uma parte ( ) meramente formal / ele achava que ...

[i]— E acredito que isso em 19 I — grau seja mais problemático ainda do que em 29 grau / quando é um

professor / né / que se tem consciência / ele vai / né / estudar a [H]- Lógico //

lei vai tentar aplicar / né / segundo ( ) adaptando a matéria dele tudo // mas no Núcleo Comum / como é que isso fica //

[H]— Pois é // H — Bom // que mais nós teríamos pra dizer sobre a lei // tá //.em re-

laçao / por exemplo / ã proporção do espaço físico / que a lei ... uma das coisas que eu acho importante é que ela é ... (TS) aquela norma da lei / de que os colégios poderiam ser agrupados em com-plexos / e ( ) em termos de sala de aula / poderia uma unidade me-nor aproveitado um colégio maior / mais aperfeiçoado //

I — Ë o que faz o Colégio Estadual // H — Eu acho que sim / né // I — Ë o que eles tentaram fazer / né // acho que foi o único que ten-

[H]- Ê // tou aplicar seguindo isso nao foi //

H — Ë // os outros eu nao sei se chegou / e também nao sei se chegou á ser feito realmente / efetivamente / né / como deveria ser fei-to // mas eu achava que era um ponto importante / (E) pelo fato de que ( ) na nossa realidade / não se tem muita biblioteca / não se tem muito ... os colégios nao sao muito equipados //

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I — Laboratorios / tudo / né // H — Isso '// então / um colégio ãs vezes pequeno / que nao tem condi-

çoes de ter um laboratório / uma biblioteca / poderia usar depen-dências de um colégio maior //

I — Hum-hm / / H — Isso eu achava que era ura ponto positivo / e que se fosse bem ( )

(E) organizado / realmente teria surtido efeito // I — E ( ) ainda existe um outro problema aï / que seria rivalidade /

ãs vezes que existe entre uma escola e outra / né // por um lado poderia ... sempre se tem isso / né / que se ouve de um pro outro /

[h]— Ham-hm // tal / poderia sanar //

H — Entre os alunos / nê // I — Um problema assim / né / entre os próprios alunos com maior inte-

gração / né / / H — É/ entre os alunos isso ê muito freqüente // entre professores nem

tanto / mas entre alunos / eles têm realmente um espírito muito [I]- t u

competitivo / né // isso também é ... sobre esse aspecto também melhoraria bastante // eu vejo ... só que nao sei / me parece que nao foi muito bem encaminhado //

I — Outra coisa assim que a gente sente / é que não foi feito nada / assim pra avaliar o que estivesse sendo feito da aplicaçao da lei / nê //

H — Exato // e ela foi aplicada e não ... [I]- Feedback assim em cima disso nao houve / né // H — Nao houve / nao // eu pelo menos nao tenho notícia de nada // I — Nem eu // H — A nao ser / eu acho que alguma deve ter aí. / em algumas teses na

e biblioteca que tem / mas só sobre uns setores / né / sobre ...

[i]— É uma pessoa I — também e nao uma equipe // H — E uma pessoa / e não uma equipe e nao ... mesmo do ministério que

seria o caso / nê // I — t U outro problema também que gerou / ãs vezes / foi a questão

das transferencias / né / de um local pra outro / no fato dos cur-[H]- Ah / foi o fato do ...

sos profissionalizantes / ainda / por exemplo / principalmente / né //

H — Os currículos não coincidiram //

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HZ

I — Ê // então aí você teria que fazer aquelas famosas adaptações que que sao previstas / nê // então / então veja você / pòr exemplo / num 19 ano de 29 grau / onde ( ) (E) aluna vinda de fora / dum cur-so na área de saúde / mas nao / por exemplo / Básico de Saúde / ou Enfermagem Auxiliar / sabe //

H — Isso // I — Então ela chegava e tinha ( ) ela nunca tinha tido Anatomia //che-

gava pro 39 ano // Anatomia aqui e dada no 19 // então ela fazia / faz ainda / uma avaliaçao ou duas / dependendo dá quantidade de

[ H] — Ham-hm // matéria // se é demais / pra voce nao judiar demais do aluno/ por-que ele vai ter que estudar sozinho / ou se dá lá um conteúdo de um livro todo / quer dizer / ele vai ter que estudar tudo aquilo so-zinho // se ele entendeu / entendeu // se nao entendeu / vai ter que se virar por conta dele mesmo / pra adaptar / nê //

H — Mas isso jã havia antes mesmo com a outra lei / nao em relaçao a profissionalizante // eu lembro por exemplo / que quando eu fazia o 29 grau / eu fiz um ano de normal e desisti / e resolvi fazer o

[ l]— - Hum-hm // científico e ( ) então eu teria passado / eu passei pro 29 normal / mas quando eu fui me matricular / eu teria que fazer as adapta-ções no científico / e as disciplinas que eu nao tinha cursado no normal // e como eram muitas disciplinas / eu achei que era muito melhor/ eu fazer a matrícula no 19 ano do científico / e fazer o ( ) científico normalmente //

I — Pois é // mas e aí ( ) (A) o que eu acho pior é no caso do curso profissionalizante / quando o aluno teria que ter uma parte prãti-ca //

H — Ah bom / daí ë bem mais complicado // , [i]— Que isso fica / nê / fica por conta da ava-[H]— t U I — liaçao teõ ( ) da parte teórica //

[ H] — Que fica com a parte teórica // jã conside-H — ra a parte prática // ë / isso ë uma coisa assim meio absurda / não [i]- Hum-hm //

faz sentido mesmo // I - t // H — E ( ) em relaçao / por exemplo / uma coisa que talvez também nao te-

nha muito a ver com a lei / embora a lei pudesse ter pensado nesse aspecto mas / nao ( ) nao me parece que ela fez qualquer referên-

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cia a isso / ou qualquer especificidade em relaçao a isso / ao fato do tipo da criança que a gente tá recebendo na escola / é uma crian-ça diferente da criança que normalmente se recebia ate há pouco tem-po na ( ) nas escolas // porque a escola foi preparada / por exem-plo / pra ter crianças apenas de classe média / em que os pais têm tempo pra atender / pra cuidar / pra orientar nas lições / e tudo mais // e a criança que a gente tá recebendo agora / ë uma criança muitas vezes que vem de ( ) de ( ) de locais humildes / nê / de uma família humilde / com mae / pai que nao dispõe de tempo / e nem condiçoes / mesmo pra ( ) de conhecimento pra poder atender / e a gente continua (E) dando a ( ) a matéria e ( ) insistindo em cur-rículo (E) de forma que a criança precise desse auxílio dos pais//

i - t u .

H — A maior parte que a gente vê / principalmente / em ( ) em escola primária / de 1? a 4? série / a criança que nao tem colaboraçao do pai / que não tem um pai orientando pra fazer as lições / que nao tem ... ela acompanha muito mau //

I — Com maior dificuldade // H — Muito mau // ãs vezes / inclusive / ate reprova / porque ela nao

tem ( ) ... e os pais nao têm condiçoes // eu sei por exemplo de mae / que me falou / que até o 29 ano / a criança ia bem /

[i]— Porque ela I 111 — Por-I — sabia ... H — que ela sabia o conteúdo // exatamente // [i]- tu H — Ela sabia / por exemplo / dividir por um número / que eram as con-ti]— Hum-hm //

tinhas (E) do 29 ano / ela conseguia // quando chegava / que che-gou no 39 ano / que as contas ficaram mais complexas / e com divi-são por 3 números / ela nao sabia fazer / e a criança tava acompa-nhando muito mal //

I — Ham // , H — Entao / nisso eu acho assim / que a lei nao se preocupou com esse

aspecto / aquele negocio / o ensino é livre / ê pra todos / é obrigatorio pra todos / mas tem que ver que a forma como ele ê dado / muitas vezes / não ( ) faz com que esse pra todos / na realidade nao seja pra todos / né // seja apenas pra uma minoria /

[I]- Ë // que dispõe de condiçoes de assistência paralela â escola / maior

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informação / e tudo // I — E pelo que se sabe / também / o problema da evasao nao diminuiu

com a aplicaçao da lei // H — Nao // eu acho que pelo contrãrio pudesse até aumentar / não que [i]— Pois é // pelo contrãrio / né //

isso também tenha a ver diretamente com a lei / mas tem a ver com [ X] — Com a lei //

todo o processo de ensino / né // toda maneira como ele tã sendo [I]- tu'

dado / como ele ta sendo conduzido // eu sei que tem vãrios aspec-tos assim / que a gente vai aos poucos lembrando / agora esse do ( ) dos pais assim / eu acho uma coisa / sei lã / eu acho que tal-vez seja das coisas mais graves que exista //

I - Ë // H — Porque a gente pensa / nos que a gente conhece / (E) pais que têm

crianças ( ) pequenas / na realidade eles estão constantemente atendendo //

I - Claro // H — E quando nao atendem / mesmo os pais de classe média / nê / que po-

dem / que dã assistência / quando eles param de dar por algum moti-vo / as crianças entram em recuperaçao / entram então me parece que ê uma falha da escola / que a escola tã transferindo uma res-ponsabilidade / que é dela / pros pais / pra família //

[i]— Pros pais // E depois a criança jã vem I — pra escola tao habituada a ter tudo pronto que ela é incapaz de por

ela mesma querer fazer as coisas / mesmo na hora da prova / quando ela lê uma ( ) uma questão / durante a avaliaçao / ela lê / ou estã ali bem certinho o que é // dizendo o que é pedido / ela pergunta // tia / né // o que isso quer dizer // éincapaz de pensar por ela //

[H]— Ham-hm // o que é isso // o chega na hora da prova dã ( ) pânico //

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