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154 CAPÍTULO 6 - O Caso Lancaster College O Lancaster College (LC) é um instituto de línguas, fundado em 1984 em Vila Nova de Gaia, por Rui Mitchell em conjunto com um sócio. A segunda escola desta marca surgiu na Covilhã poucos anos depois. A partir desse momento, a rede começou a crescer. Nos anos seguintes, o LC abriu escolas próprias e franqueadas em várias cidades do país. Neste momento, o LC tem 24 escolas, cerca de 200 professores, mais de 6000 alunos ‘internos’ e, ainda, um número muito elevado de alunos ‘externos’. Nesta rede, existem 3 tipos de propriedade das unidades. As escolas franqueadas (UF) que são propriedade dos franqueados da rede, as escolas a que o franqueador chama ‘próprias’ (UP) que são detidas a 100% pela empresa Mitchell & Sousa, Lda. e, finalmente, as escolas que denomina de ‘parcerias’ cujo capital social é detido, no mínimo, em 51% pela empresa franqueadora. As unidades franqueadas situam-se em Amarante, Póvoa de Varzim e Vale de Cambra. As escolas exploradas em ‘parceria’ localizam-se em Anadia, Braga, Bragança, Gondomar, Oliveira do Douro, Seixal, Seixezelo, Senhora da Hora e Valongo. As escolas ‘próprias’ localizam-se em Arcozelo, Covilhã, Espinho, Estarreja, Estoril, Fafe, Lisboa, Maia, Oliveira de Azeméis, Santa Maria da Feira, Vila Nova de Gaia e Vizela. Em termos de actividade, a empresa fornece formação em informática e em várias línguas, sendo a mais importante, em termos de volume de facturação, a língua inglesa. Esta formação pode ser ministrada quer nas suas instalações (próprias ou franqueadas), quer nas instalações do cliente (infantários, escolas primárias, faculdades e empresas, tais como a Salsa, a Ecco, a Gant, o BCP, a PT ou as empresas da Indústria da Cortiça da Vila da Feira). Em parceria com a multinacional EF, o Lancaster College promove também estágios profissionais e cursos de ‘imersão’ ou de Verão, em estabelecimentos de ensino situados em países onde a língua oficial é o inglês. Finalmente, neste momento, a empresa encontra-se ainda a desenvolver um projecto novo de ensino de inglês on-line, em parceria com uma filial do grupo EF, a Englishtown.com. Tendo em vista a realização de um estudo longitudinal, procurou-se dividir a narrativa inicial deste caso em dois períodos. De forma a facilitar a sua compreensão,

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CAPÍTULO 6 - O Caso Lancaster College

O Lancaster College (LC) é um instituto de línguas, fundado em 1984 em Vila

Nova de Gaia, por Rui Mitchell em conjunto com um sócio. A segunda escola desta

marca surgiu na Covilhã poucos anos depois. A partir desse momento, a rede começou a

crescer. Nos anos seguintes, o LC abriu escolas próprias e franqueadas em várias

cidades do país. Neste momento, o LC tem 24 escolas, cerca de 200 professores, mais

de 6000 alunos ‘internos’ e, ainda, um número muito elevado de alunos ‘externos’.

Nesta rede, existem 3 tipos de propriedade das unidades. As escolas franqueadas

(UF) que são propriedade dos franqueados da rede, as escolas a que o franqueador

chama ‘próprias’ (UP) que são detidas a 100% pela empresa Mitchell & Sousa, Lda. e,

finalmente, as escolas que denomina de ‘parcerias’ cujo capital social é detido, no

mínimo, em 51% pela empresa franqueadora. As unidades franqueadas situam-se em

Amarante, Póvoa de Varzim e Vale de Cambra. As escolas exploradas em ‘parceria’

localizam-se em Anadia, Braga, Bragança, Gondomar, Oliveira do Douro, Seixal,

Seixezelo, Senhora da Hora e Valongo. As escolas ‘próprias’ localizam-se em Arcozelo,

Covilhã, Espinho, Estarreja, Estoril, Fafe, Lisboa, Maia, Oliveira de Azeméis, Santa

Maria da Feira, Vila Nova de Gaia e Vizela.

Em termos de actividade, a empresa fornece formação em informática e em

várias línguas, sendo a mais importante, em termos de volume de facturação, a língua

inglesa. Esta formação pode ser ministrada quer nas suas instalações (próprias ou

franqueadas), quer nas instalações do cliente (infantários, escolas primárias, faculdades

e empresas, tais como a Salsa, a Ecco, a Gant, o BCP, a PT ou as empresas da Indústria

da Cortiça da Vila da Feira). Em parceria com a multinacional EF, o Lancaster College

promove também estágios profissionais e cursos de ‘imersão’ ou de Verão, em

estabelecimentos de ensino situados em países onde a língua oficial é o inglês.

Finalmente, neste momento, a empresa encontra-se ainda a desenvolver um projecto

novo de ensino de inglês on-line, em parceria com uma filial do grupo EF, a

Englishtown.com.

Tendo em vista a realização de um estudo longitudinal, procurou-se dividir a

narrativa inicial deste caso em dois períodos. De forma a facilitar a sua compreensão,

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foi também elaborado um quadro (Tabela 5) onde se representam, de forma

cronológica, os principais acontecimentos na vida da empresa. Em seguida, são

descritos alguns aspectos importantes para a caracterização da rede, nomeadamente as

rotinas de replicação das unidades e dos procedimentos, os mecanismos de supervisão e

controlo, a gestão do processo de inovação e da difusão de novo conhecimento dentro

da rede. Finalmente, tendo em conta os objectivos propostos para este trabalho,

apresenta-se uma análise ao caso.

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Tabela nº5 - Periodização do Caso Lancaster College

Período Acontecimentos Relevantes Abertura UP

Abertura UF

Abertura ‘Parcerias’

1984 - Fundação do Lancaster College

V. N. Gaia

I 1985 - Início da formação em empresas (1984 1986 – Mudança para a Avenida de Gaia Covilhã, Estarreja, Fafe,

a 1987 - Início formação em escolas primárias Santa Maria da Feira 1997) 1990 - Alteração da imagem da marca

1991/97 - Crescimento através de UP’s

Estoril, Oeiras*, Porto*

1998 - Início do franchise das unidades Início formação em faculdades

Espinho

Póvoa de Varzim, Arrifana*,

Felgueiras*, Carvalhos*,

1999 - Crescimento através de UF Vizela Lousada*, Penafiel* II 2000 - Início das Parcerias Valongo

(1998 2001 – Crescimento através de UP’s Arcozelo, Lisboa# a

2006) 2003 - Início de reestruturação Crescimento através de parcerias

Amarante Senhora da Hora, Gondomar, Seixezelo, Maia# e Anadia

2004 - Forte crescimento através de parcerias Oliveira de Azeméis Seixal, Braga, Bragança, 2005 - Parceria com EF

Início da certificação de qualidade

Vale de Cambra Oliveira do Douro

2006 - Parceria Englishtown.com

* Fechou; # Convertida em UP

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6.1. Descrição do Caso

6.1.1. Período I - de 1984 a 1997: A Fundação da Empresa

O Instituto Lancaster College foi fundado por dois sócios, em 1984 em Vila

Nova de Gaia. Segundo Rui Mitchell, o único sócio-fundador ainda ligado à empresa, a

opção por Vila Nova de Gaia foi pioneira, na medida em que, nessa altura, esta cidade

era considerada um dormitório do Porto, com pouco potencial para a exploração deste

tipo de negócio. Nessa época, não só ninguém apostava nesta cidade para a abertura

deste tipo de actividade, como foram vários os conselhos recebidos no sentido de os

dissuadir de assumir este risco. No entanto, os dois sócios não desistiram da ideia e

abriram a escola numa artéria secundária de Gaia, a 400 metros da principal avenida da

cidade. Em Dezembro de 1986, o instituto mudou-se para a Praceta 25 de Abril em

frente à Câmara de Gaia e, em Março de 1987, o número de alunos duplicou de 150

para 300. Esta mudança foi um marco importante para a história da empresa pois a

escolha da localização de cada uma das escolas abertas, posteriormente, passou a ser

fundamental. Esta foi, pois, a fase em que a empresa desenvolveu e aperfeiçoou o

modelo de negócio, destacando-se, por exemplo, a imagem, o serviço e grande parte das

rotinas e procedimentos administrativos. A imagem da escola foi evoluindo a partir das

ideias dos fundadores. A marca ‘Lancaster College’ e o símbolo da rosa, escolhidos

pelos sócios, procuravam associar a imagem do Instituto a Inglaterra. Foi também nesta

altura que a empresa começou a sua actividade ‘externa’, quer em empresas, quer em

escolas primárias.

A segunda escola surgiu na Covilhã, em 1986, porque um dos sócios foi viver

para esta cidade por razões pessoais. A partir desse momento, o Lancaster College

começou a crescer. Nos anos seguintes, o Instituto abriu escolas próprias em Estarreja,

Fafe, Santa Maria da Feira, Estoril, Oeiras e Porto. Neste período, a empresa aprendeu a

criar e a manter uma imagem e um serviço uniforme em todas as unidades, a seleccionar

quais os atributos a replicar, a codificar e transferir conhecimento entre as escolas e a

manter as unidades em funcionamento após a replicação. Por exemplo, em 1990, a

empresa contratou um designer para melhorar a imagem da marca. As cores mudaram

para cinza claro, vermelho e azul. A rosa ficou mais estilizada e sobre um fundo que

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sugere a fita e o lacre dos diplomas. A nova imagem foi institucionalizada e todas as

escolas uniformizadas. Na altura, todas as escolas eram próprias. A unidade de Gaia era

já a sede da empresa. Para além desta escola e da localizada na Covilhã, o Lancaster

College tinha ainda unidades em Estarreja, em Fafe e em Santa Maria da Feira. Todas as

escolas que abriram posteriormente adoptaram, imediatamente, a nova imagem.

6.1.2. Período II - de 1998 a 2006: O Franchise

As razões apontadas pelo franqueador para a adopção do regime de franchising

são de diferente natureza. Uma das razões prende-se com a dificuldade no controlo das

unidades mais distantes por falta de infra-estruturas rodoviárias, o que, numa fase

inicial, dificultava as deslocações e condicionava o desejo de expansão. Mitchell refere,

por exemplo, as dificuldades iniciais, sentidas após a abertura da escola da Covilhã,

quando ainda não existia o IP5. O franqueador apresenta ainda como argumento, o facto

de a continuação do crescimento através de unidades próprias exigir o desenvolvimento

de uma estrutura pesada, complexa e pouco flexível, que desumanizaria o serviço

prestado. Neste contexto, o franchising surge como forma de continuar a crescer sem

perda da proximidade com os clientes e com os empregados.

Na verdade, a prestação de um serviço ‘humanizado’ parece fazer parte da

missão da empresa. Segundo Mitchell: “Eu incuto essa filosofia a todos os funcionários

(…). É um negócio, uma actividade, mas tem que haver uma componente humana

permanente. (…) A empresa deve ter um rosto. Deve ter o rosto das pessoas que

trabalham lá. Mas, as empresas ficam desumanizadas, devido à dimensão.”1 Finalmente,

Mitchell refere, ainda, que com a adopção do franchising, “a escola continuou a crescer

e a filosofia foi transmitida aos franqueados (…): ‘Não olhem só para o negócio. É uma

pequena família. Vocês têm que ter o contacto com os colaboradores, com os alunos,

com os pais”2.

O primeiro franqueado do grupo, GV, é um italiano, licenciado em gestão, que

trabalhava no grupo SONAE e que foi despedido por razões de reestruturação do grupo.

Apesar da sua inexperiência no ensino de línguas, GV enviou o seu currículo para várias

1 Rui Mitchell, entrevista em 17/05/2006. 2 Rui Mitchell, entrevista em 17/05/2006.

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escolas, procurando dar aulas de italiano. O Lancaster College chamou-o para uma

entrevista de selecção de professores. Foi durante esta entrevista com Rui Mitchell que

surgiu a ideia do franchising. Mitchell propôs-lhe “explorar o mercado das escolas

primárias” na zona da Póvoa. Simultaneamente, GV sugeriu o “mercado das

faculdades”. Com o início do relacionamento, o franqueado ficou responsável pela

captação e negociação com os clientes, bem como pela prestação do serviço. O

Lancaster College apoiou-o em termos pedagógicos, por exemplo, facultando-lhe os

programas curriculares e ajudando-o a seleccionar professores. O franqueado não abriu,

imediatamente, uma escola. Os cursos eram leccionados na casa do cliente, isto é, em

escolas primárias, faculdades ou empresas. Apenas cerca de um ano mais tarde, e

utilizando os cashflows gerados pelo negócio durante esse período, GV abriu a primeira

escola franqueada da rede.

Com o tempo e o desenvolvimento do relacionamento de franchising, surgiu

entre os gestores da empresa franqueadora e franqueada uma relação de amizade

baseada na admiração mútua pelas características profissionais do outro. No seguimento

dessa amizade, a empresa franqueadora aumentou gradualmente o seu envolvimento

com a empresa franqueada. Dadas as competências demonstradas na gestão da primeira

unidade, o franqueador permitiu que este franqueado explorasse sucessivamente mais

unidades até deter as quatro unidades que actualmente gere.

Depois da abertura da escola da Póvoa, surgiram escolas franqueadas na

Arrifana, Felgueiras, Lousada, Carvalhos e Penafiel. Neste período, abriram também as

escolas próprias de Espinho e Vizela. De acordo com Mitchell, o franchising surgiu de

forma passiva, pois o Lancaster College nunca procurou activamente franqueados

através de qualquer via promocional. Pelo contrário, foi procurado por candidatos a

futuros franqueados. Estes eram pessoas que já conheciam o instituto e que gostavam do

modelo de negócio desenvolvido. Assim, os primeiros franqueados da rede foram os

seus professores, funcionários ou clientes. Por outro lado, segundo o franqueador, o

facto de a rede possuir escolas próprias ajudou a vender os franchises, uma vez que os

candidatos sabiam, previamente, do seu bom desempenho e, portanto, depreendiam que

uma nova escola iria, com certeza, funcionar também bem. Igualmente importante

parece ter sido o papel desempenhado pelo primeiro franqueado da cadeia que o

franqueador considera um modelo de referência ou um exemplo de sucesso. Assim,

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alguns dos potenciais franqueados foram aconselhados a conversar com ele sobre a rede

e sobre o relacionamento com o franqueador. Mitchell acredita também que se a

Lancaster College promovesse a venda do franchise, conseguiria facilmente vender

várias escolas. Como forma de comprovar este argumento, o informante refere a

existência de várias propostas recebidas para abrir escolas franqueadas e que ainda se

encontram em fase de análise pelo franqueador.

Contudo, algum tempo após o início dos relacionamentos, várias escolas

franqueadas deixaram de cumprir os pagamentos e os contratos cessaram após disputas

judiciais, algumas ainda em curso. Adicionalmente, alguns destes antigos franqueados

abriram, posteriormente, as suas próprias escolas, usando marcas diferentes. Esta

situação levou a empresa franqueadora a olhar para os relacionamentos de franchising

com maior desconfiança, tendo rejeitado, posteriormente, várias propostas como, por

exemplo, para a abertura de escolas em Faro ou Évora. Actualmente, face às más

experiências do passado, a primeira característica que o franqueador procura num

potencial franqueado é a honestidade. Apenas quando tem confiança plena no

comprador, considera a hipótese de vender o franchise. Para isso, o potencial

franqueado terá ainda que ser alguém com espírito empreendedor e dinâmico.

Preferencialmente, deverá ainda dedicar-se exclusivamente ao negócio, mesmo que não

possua elevados recursos financeiros.

Face à decepção relativamente ao franchising, a partir de 2000, o Lancaster

College passou a privilegiar uma terceira estratégia de crescimento que denomina de

‘parceria’, onde a empresa Mitchell & Sousa, Lda. detém uma percentagem maioritária

e é proprietária ou aluga o espaço onde se situa a escola. Tal como aconteceu no período

anterior com as unidades franqueadas, as parcerias foram realizadas com funcionários e

professores do Lancaster College. No entanto, a origem dos franchises mais recentes é

diferente das iniciais. Tratam-se de pessoas que procuravam um negócio e tomaram

conhecimento da existência do Lancaster College através do site do instituto na Internet.

Isto, apesar de este site não promover a venda dos franchises, pelo contrário, estar

apenas direccionado para os (potenciais) alunos e clientes. Ainda assim, estes

candidatos a franqueados contactaram a empresa franqueadora e, depois de várias

conversas com a empresa franqueadora, iniciaram o relacionamento de franchising.

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6.1.3. Replicação: Uniformização da Imagem

Tal como em qualquer outra empresa ‘replicadora’ (Winter e Szulanski, 2001),

no Lancaster College, verifica-se uma grande preocupação com a uniformização da

imagem das unidades e dos procedimentos e rotinas subjacentes à prestação do serviço.

Assim sendo, torna-se necessária a existência de ‘rotinas de replicação’ que garantam

essa uniformidade. Por outro lado, tratando-se de uma rede franqueada, o contrato de

franchising assume um papel importante, pois garante o respeito dos franqueados pelas

características identificativas da rede. Nesse sentido, o contrato contempla a obrigação

do franqueado “congregar os seus melhores esforços para o desenvolvimento da rede de

Franchise e para a conservação da identidade comum da rede”.

A preocupação da uniformização da imagem começa no momento da selecção

da localização de uma nova escola, que deverá situar-se em zonas consideradas centrais,

com bons acessos, nomeadamente através de transportes públicos. O processo de

abertura de uma nova unidade não é muito diferente se se tratar de uma unidade

franqueada, em ‘parceria’ ou própria. A diferença reside na intervenção por parte do

franqueado ou ‘parceiro’ e, por vezes, na necessidade de negociar algumas situações de

compromisso que garantam a continuidade do relacionamento.

Aquando da abertura de uma nova unidade, por vezes, é o franqueado, ou o

‘parceiro’ que propõe uma determinada localização, outras vezes, é o franqueador que o

ajuda nessa decisão. No entanto, é sempre necessário que o franqueador avalize a

escolha da localização. Nesta fase, é necessário elaborar um estudo sobre o potencial do

mercado que permita fundamentar a decisão de investimento. Muitas vezes, o

franqueador ajuda o franqueado/parceiro, comparando os indicadores relativos à

população local, à população estudantil, ao rendimento per capita e ao poder de compra

com os indicadores de uma outra escola da rede, situada numa zona idêntica e, dessa

forma, estimando o potencial do mercado na localização pretendida. Com base neste

estudo, o franqueador prevê o número de alunos, a necessidade em termos de espaço, a

facturação, os custos do projecto e, finalmente, a viabilidade económica do

investimento naquele local. Acontece, por vezes, ser necessário procurar localizações

alternativas.

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Na fase seguinte, o franqueador recorre aos serviços de um engenheiro que

elabora o projecto civil da escola, bem como prepara todos os elementos a entregar no

Ministério da Educação. Trabalhando com uma planta facultada pelo proprietário do

espaço, o engenheiro civil faz um esboço das salas e das divisórias a construir. Este

fornecedor da Lancaster College conhece todas as exigências do Ministério da

Educação relativas a pormenores técnicos, como por exemplo a dimensão das salas ou o

número e localização de extintores e detectores de incêndios. Ele conhece também todos

os requisitos relativos à imagem da marca do Lancaster College, tais como materiais e

cores.

Em seguida, uma empresa de serralharia, bem como os fornecedores de

mobiliário e outro tipo de equipamento administrativo, são contactados. Estes

fornecedores conhecem as exigências de pormenor na elaboração dos espaços e,

portanto, são a opção preferencial do Lancaster College, nomeadamente no caso das

escolas próprias ou parcerias. No caso das escolas franqueadas, estas entidades

preparam um orçamento que é facultado ao futuro franqueado. Contudo, este pode

seleccionar outros fornecedores, nomeadamente se a sua localização geográfica assim o

justificar, desde que respeite as exigências do projecto arquitectónico. Nesse sentido, é-

lhe facultado um dossier com as referências das cores e dos materiais, bem como o

projecto elaborado pelo engenheiro civil e todas as directrizes do Ministério da

Educação.

Independentemente de se tratar de uma escola própria, franqueada ou em

parceria, as fases de construção, abertura e primeiro ano de funcionamento são

acompanhadas de perto pelos funcionários da sede, que procuram manter as

características identificativas da rede. Segundo Mitchell, numa escola própria, parceria

ou franchise, “… em relação à decoração, como devem estar as mesas, as cadeiras e

tudo o resto, vão responsáveis nossos e ajudam, e, também, o nosso engenheiro, que

trabalha connosco, e que sabe como são as salas, a biblioteca. Ele sabe. Só é preciso ir

lá e dizer: ‘Olhe, há uma escola para montar’, e ele já sabe tudo”3. Durante o primeiro

ano, o acompanhamento dado pelo franqueador à escola franqueada é muito grande.

3 Rui Mitchell, entrevista em 17/05/2006.

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“Estamos muito envolvidos. Damos formação. Fazemos tal como se fosse uma escola

nossa. Dedicamo-nos inteiramente. No segundo ano, fica mais solto”4.

Mas, a uniformidade da imagem não se resume à abertura e manutenção de

escolas com a mesma apresentação em termos visuais. É, também, necessário definir e

implementar uma estratégia de marketing, respeitada por todas as unidades da rede.

Nesse sentido, a sede do Lancaster College determina, centralmente, os serviços

oferecidos (por exemplo, que cursos de formação são ministrados), os preços praticados

(que podem variar entre as escolas, tendo em consideração a concorrência e o poder de

compra local), os canais de distribuição (a formação pode ser realizada nas instalações

do Lancaster College, nas instalações do cliente ou através da Internet) e as formas de

promover o serviço (publicidade, desenvolvimento do site na Internet, contratos com

outras entidades, como por exemplo o protocolo com o BANIF5). As escolas

franqueadas têm maior autonomia a este nível, podendo promover ou publicitar os seus

serviços e fixar os seus preços, ainda que, muitas vezes, peçam apoio à sede para o

fazer.

6.1.4. Replicação: Uniformização do Serviço

A uniformização do serviço prestado, em cada uma das escolas, é também uma

preocupação da gestão. Tal como em todas as redes de franchising, o objectivo é que os

clientes não sintam a diferença por obter o serviço em qualquer uma das unidades da

rede. Nesse sentido, existe intercâmbio de professores. Na verdade, vários professores

leccionam em mais do que uma escola da rede. Por outro lado, verifica-se, também, que

no caso das empresas-cliente que possuem várias unidades dispersas pelo país, como

por exemplo as redes de retalho, a formação dada a cada unidade é ministrada pela

escola do Lancaster College que se situa geograficamente mais perto.

A uniformização do serviço é obtida através de vários procedimentos. Em

primeiro lugar, a sede decide o calendário escolar (início e fim de cada período, férias,

época de avaliação), os objectivos a ser atingidos, os conteúdos programáticos, os

4 Rui Mitchell, entrevista em 17/05/2006. 5 Os alunos de qualquer escola Lancaster College, que domiciliem o pagamento da mensalidade no BANIF, têm uma redução de 50% no pagamento das propinas.

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manuais escolares, os exames de avaliação e a introdução de novos cursos. Neste

processo, as outras escolas podem ser consultadas, mas a sede mantém-se detentora da

palavra final. Todas as escolas são tratadas de forma relativamente idêntica, todas

utilizando os mesmos procedimentos, como por exemplo as mesmas fichas de inscrição

e de avaliação. Os franqueados, parceiros e directores de escolas próprias realizam a

gestão operacional das escolas de acordo com o definido pela sede. Às unidades locais

competem, ainda, as funções de captar novos negócios e de prestar o serviço.

A respeito da uniformização do serviço, o Departamento Pedagógico da sede

tem um lugar de relevo, em particular a sua responsável e os Directores Nacionais de

cada Língua. De forma a assegurar a uniformização do serviço prestado, no início e

cada ano lectivo, o Director Nacional de cada Língua elabora um Teacher’s Pack. Neste

dossier constam o calendário escolar, os objectivos a atingir em cada trimestre, os

conteúdos programáticos, os manuais escolares a serem utilizados por cada nível (que

são, normalmente, compostos pelos teacher’s book e o student’s book) e toda a

informação necessária para que cada professor prepare as suas aulas. Todo este trabalho

é supervisionado pelo responsável do Departamento Pedagógico da sede. Cada escola,

independentemente do tipo de propriedade, tem um Director Pedagógico que recebe

estes dossiers e os entrega a cada professor, de acordo com a língua e nível que

lecciona. As escolas seguem as directrizes deste Teacher’s Pack. Se, eventualmente,

existir a necessidade de fazer algumas alterações a estas orientações, por exemplo,

alterar a data de um teste devido a um feriado local, a escola contacta a Direcção

Pedagógica da sede e, em conjunto, decidem uma solução alternativa.

Apesar do seu contributo importante, a elaboração deste dossier não é, no

entanto, o único procedimento organizacional do Lancaster College que visa garantir a

uniformidade do serviço prestado. Além deste dossier, que se assemelha a um ‘manual

de procedimentos’ revisto anualmente, existem também reuniões regulares com os

Directores Pedagógicos de todas as escolas. Estas reuniões têm lugar, no mínimo, três

vezes por ano, uma no início de cada trimestre. Estão presentes os responsáveis de todo

o grupo, onde se incluem os responsáveis das unidades franqueadas, das parcerias e das

escolas próprias. Nestas reuniões, realiza-se um balanço do trimestre anterior, por

exemplo, analisando e avaliando os manuais, os testes e as notas dos alunos. O trimestre

seguinte é também discutido, isto é, os novos manuais, os novos impressos e todo o tipo

165

de novos procedimentos a serem implementados. Nestas reuniões, todos participam nos

debates e dão sugestões. Segundo o franqueador, o Lancaster College é uma rede onde

todos os participantes têm uma voz activa e uma participação muito forte. O

franqueador exerce uma liderança participativa, pedindo a contribuição de todos para a

tomada de decisão, ainda que detenha o poder para tomar a decisão final.

Além das referidas reuniões, no dia-a-dia, a comunicação entre a sede e as

diferentes unidades realiza-se através de visitas dos funcionários da sede às unidades e

dos responsáveis locais à sede. A comunicação acontece ainda através de telefonemas,

de e-mails e de correio interno. Muitas vezes, são os próprios professores a servir de

correio interno, transportando os documentos que se destinam a uma determinada

escola, e que se encontram numa pasta destinada a esse efeito.

Uma outra forma importante de garantir a uniformidade do serviço prestado é

através da selecção e formação dos recursos humanos. Assim, quando uma escola

própria ou em parceria necessita de um novo professor, pede à sede que lhe indique

alguém. A sede selecciona entre a sua carteira de professores ou, caso seja necessário,

recruta-o externamente. Os novos professores são, normalmente, entrevistados pelo

Director Nacional da Língua que vai ser leccionada e pela Directora Pedagógica da

sede. Em casos muito pontuais, pode ser pedido às Directores Pedagógicas Locais para

realizarem esta tarefa. No caso das escolas franqueadas, são normalmente os Directores

Pedagógicos da escola que fazem o recrutamento mas, se necessitarem, podem também

pedir ajuda à sede.

A formação contínua dos colaboradores de todas as unidades do Lancaster

College é também um aspecto valorizado pelo franqueador. Pelo menos uma vez em

cada período escolar, há uma acção de formação, dada pela sede aos responsáveis

pedagógicos, aos professores e aos funcionários administrativos. As acções de formação

são realizadas quer por entidades internas, quer por entidades externas. Por exemplo,

alguns professores do grupo são especialistas em áreas como a gramática ou a fonética e

dão formação interna aos restantes professores. Por outro lado, há também formação

dada por formadores externos. Um dos casos mais frequentes é a formação dada pelos

editores dos manuais escolares adoptados. A sede da Lancaster College funciona como

uma ‘central de compras’ que, antes do início do ano lectivo, e de acordo com as

estimativas realizadas relativamente ao número de alunos por língua e nível,

166

encomenda, recebe, envia e factura os manuais às escolas. A centralização desta função

tem várias vantagens. Além de garantir a uniformidade do serviço, permite obter

descontos de quantidade e ainda outro tipo de benefícios. Regularmente, as empresas

que fornecem os livros à rede enviam formadores nativos, por exemplo vindos de

Inglaterra, com o duplo objectivo de formar os professores e promover os manuais.

Finalmente, qualquer tipo de iniciativa que surja a nível local será sempre

avalizada e acompanhada pela sede. Por exemplo, quando uma escola pretende iniciar

um curso novo, direccionado a alguma empresa ou outra entidade, consulta a sede que,

tendo em conta os objectivos, a duração e os participantes do curso, elabora o programa,

planifica as aulas, selecciona os manuais e, no caso das unidades próprias e parcerias,

determina o valor a cobrar pelo curso.

Tendo em vista uma maior uniformização dos procedimentos na rede, neste

momento, o Lancaster College está a trabalhar no processo de certificação dos serviços

da empresa pelo ISO 9001. Segundo o franqueador, este processo além de permitir gerir

melhor a qualidade do serviço prestado, também melhorará certas áreas que necessitam

de maior uniformização, tanto na parte administrativa como na pedagógica.

Em conclusão, a autonomia deixada a nível local é muito restrita, em particular

nas escolas próprias e nas parcerias. A Direcção Pedagógica dessas escolas tem

autonomia para elaborar os horários (respeitando a carga horária semanal, trimestral e

anual), planear a ocupação das salas de aula, distribuir o serviço docente pelos

professores afectos à escola, falar com os pais dos alunos e resolver pequenos

problemas. As unidades franqueadas têm maior autonomia, podendo ainda seleccionar e

contratar os seus professores, fixar os preços, celebrar contratos com terceiros e

promover as suas escolas.

6.1.5. Sistemas de Informação e Supervisão

Os mecanismos de supervisão e controlo de todas as unidades têm um papel

importante nas empresas ‘replicadoras’. Este controlo tem duas vertentes, por um lado,

o controlo da qualidade do serviço prestado, por outro, o controlo financeiro.

No Lancaster College, existem dois responsáveis pedagógicos que

supervisionam o serviço prestado pelas escolas da rede. A este nível, o controlo das

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várias unidades não é muito diferente. A supervisão é realizada através de visitas,

regulares e inesperadas, do responsável pedagógico às diferentes escolas, com objectivo

de observar o decorrer das aulas e elaborar um relatório que será entregue à Direcção

Pedagógica. Exactamente prevendo este tipo de supervisão, existe uma cláusula no

contrato de franchising que autoriza estas visitas inesperadas de um funcionário da sede

responsável pela supervisão. Se, no decorrer destas visitas, for detectado algum

problema, por exemplo numa aula, este será resolvido, conversando com o professor em

causa e com o responsável pedagógico da escola.

Além deste controlo directo, a supervisão também passa por, no início do ano,

estipular o número de horas lectivas do ano escolar e dividir esse número por cada

período escolar. Sendo o calendário e o manual escolar os mesmos em todas as escolas,

um determinado número de unidades desse manual é definido como o objectivo a ser

atingido, em cada período escolar. No fim do período, tendo em conta os objectivos

definidos, são realizadas as avaliações dos alunos, na mesma semana e com os mesmos

testes. Posteriormente, as escolas informam a sede dos resultados das avaliações, cuja

análise permite apreciar o seu desempenho.

O controlo administrativo e financeiro das escolas próprias e parcerias é feito

através de um sistema informático que permite um controlo à distância, 24 horas por

dia, tal como se o franqueador se encontrasse in loco. Os franqueados estão a ser

incentivados a adquirir o mesmo programa informático, tendo em vista ajudá-los a

controlar melhor as suas próprias escolas. O franqueador, em princípio, não terá acesso

a estes programas, quer por respeito à autonomia dos franqueados, quer por razões de

natureza legal. Relativamente às escolas próprias e parcerias, a contabilidade é feita

internamente na sede em Gaia, por um Técnico Oficial de Contas que realiza também o

controlo de gestão.

De acordo com os contratos celebrados nos últimos 5 anos, o franqueado da

Lancaster College paga um direito de entrada de 20.000 euros e, durante a vida do

contrato, 7% de royalties sobre a facturação6. Durante os primeiros 3 anos, os contratos

são renováveis anualmente, e, ao fim desse período, passam a ser de 3 em 3 anos. Por

outro lado, de acordo com o contrato, “o Franchisador reserva-se o direito de não

renovar o contrato, desde que se verifiquem anomalias no uso e obrigações da parte do

6 Nos contratos anteriores a 2001, o franchise fee era de 300.000$00 e a taxa de royalties era de 5%.

168

Franchisado”. Existe ainda uma cláusula que impede o franqueado de “divulgar a

terceiros o saber-fazer transmitido pelo Franchisador, durante ou após a cessação do

contrato”. Assim, o contrato funciona, de certa forma, como um mecanismo

‘desincentivador’ da prevaricação do franqueado, uma vez que, nesse caso, perderá o

direito a continuar a explorar a marca e também não poderá explorar, de forma

independente, o know-how obtido junto do franqueador.

Em termos de controlo financeiro, tendo como objectivo o cálculo dos royalties,

os franqueados são obrigados a enviar, mensalmente, uma listagem com a facturação do

mês. O próprio contrato prevê que o franqueado forneça “ao Franchisador os dados de

funcionamento verificáveis a fim de facilitar a determinação da performance e dos

rácios financeiros indispensáveis a um eficaz controlo de gestão”, e ainda que permita

“ao Franchisador e/ou aos seus representantes o acesso em qualquer momento, ou ao

seu estabelecimento ou escritórios e à sua contabilidade”. Contudo, Mitchell considera

que este controlo pode não estar a funcionar muito bem, ainda que acredite que as

pessoas “são sinceras até prova em contrário”. No entanto, todas as escolas do grupo

vão adoptar um novo programa de facturação, desenvolvido em especial para o

Lancaster College. Com este programa, o franqueador espera que o controlo passe a ser

mais rigoroso. No entanto, a prevaricação continuará a ser possível, nomeadamente se o

franqueado não introduzir um aluno no sistema.

6.1.6. Gestão da Inovação: Criação e Difusão de Conhecimento

De acordo com a literatura, um dos principais problemas enfrentados pelas

empresas ‘replicadoras’ é contrabalançar a necessidade de manter a uniformidade e

identidade da rede com a indispensabilidade de, por um lado, realizar algumas

adaptações à realidade local e, por outro, desenvolver o conceito franqueado, quer em

termos de imagem, quer de produto ou serviço prestado. No entanto, no Lancaster

College, aparentemente, a criação e difusão do conhecimento na rede não se apresenta

como um problema complexo ou paradoxal, mas, pelo contrário, e nas palavras do

próprio franqueador, como um processo ‘pacífico’.

Nesta rede, desde 1990, não se verificam grandes modificações em termos da

imagem da marca. A este nível, as alterações que têm surgido são de pormenor, como

169

por exemplo, a introdução recente de um novo slogan, a modificação do site do

instituto, ou a inserção de um relógio de parede com o símbolo da marca. Dada a

simplicidade das modificações referidas, a sua implementação foi relativamente

simples. Por exemplo, no último caso referido, e segundo o descrito pelos entrevistados,

Mitchell mandou fazer os relógios e entregou-os, pessoalmente, em quase todas as

escolas.

Esta questão é bastante diferente no que respeita o desenvolvimento do serviço.

Na opinião da responsável pelo Departamento Pedagógico da Lancaster College, LS, a

maior parte das ‘inovações’ a nível do serviço tem origem na sede. Exemplo de uma

alteração recente, ainda em curso de implementação, é a introdução do novo serviço de

ensino de inglês on-line. No entanto, LS considera que existe também um forte

contributo de todos os responsáveis das escolas próprias, franqueadas ou parcerias, para

a melhoria do serviço prestado pelo Lancaster College. Alguns exemplos dessa

participação são apresentados mais à frente neste trabalho (ver Tabela 6 e 7). De acordo

com a responsável pedagógica do Lancaster College, essas contribuições são sempre

bem-vindas pela sede, onde são analisadas. Posteriormente, caso sejam consideradas

interessantes para implementação, e tal como acontece com as ‘inovações’ que têm

origem na própria sede, estas são apresentadas e discutidas em reuniões onde se

encontram todos os directores pedagógicos.

Tabela 6 - A Inovação no Lancaster College: Exemplo 1

EXEMPLO 1 Recentemente, a Directora Pedagógica da escola da Senhora da Hora, introduziu uma modificação na folha de avaliação, para que a assiduidade dos alunos passasse a constar na referida folha e os encarregados de educação pudessem controlar melhor o trabalho dos seus educandos. Tendo sentido esta necessidade, falou com a Directora Pedagógica da sede, LS, que aprovou a referida alteração e a difundiu pela rede. LS recorda o sucedido da seguinte forma: “Tínhamos uma folha de avaliação e ela mostrou-me o que achava que seria uma boa ideia. Eu também achei e trouxe e mostrei aos meus colaboradores cá. E todos acharam que era importante incluir. Tivemos uma reunião com todos os directores pedagógicos no final do período e apresentei a folha e todos acharam uma boa ideia e passamos a usar. A ideia foi difundida pela rede, mas algumas escolas só vão começar agora no início do novo ano lectivo” 7.

7 Lucy Soares, entrevista em 26/06/2006.

170

Tabela 7 - A Inovação no Lancaster College: Exemplo 2

EXEMPLO 2 No ano passado, a Directora Pedagógica da escola de Santa Maria da Feira, sentiu a necessidade de oferecer um nível intermédio de ensino do inglês, entre os níveis destinados às crianças e os níveis destinados aos adultos, já oferecidos pela Lancaster College. Muitas crianças atingiam o último nível destinado à sua faixa etária e passavam para uma turma de adultos. Contudo, a sua falta de maturidade ainda não lhes permitia ‘encaixar bem no grupo’. Assim, falou com a Directora Pedagógica da sede, LS, com quem desenvolveu o novo nível KE. No seguimento desta decisão, foi necessário desenvolver um novo programa e escolher os manuais. Estas tarefas foram realizadas, em conjunto, pelas duas directoras Pedagógicas. A ideia não foi difundida de imediato, para as outras escolas, no entanto, este ano, algumas escolas também leccionaram esse novo nível. Segundo LS, neste caso, não se tratando de níveis oficiais, isto é, não sendo obrigatórios e, portanto, estando dependentes da aprovação dos pais, cada escola estudou o seu caso concreto, e optou por oferecer, ou não, este novo nível aos seus alunos.

Nestas reuniões, os Directores Pedagógicos Locais têm oportunidade de avaliar a

compatibilidade destas alterações, relativamente à realidade da sua unidade. Depois de

avaliadas e discutidas, estas alterações são difundidas pela rede, ficando a cargo dos

Directores Pedagógicos Locais a implementação das alterações nas suas escolas.

Dependendo do caso concreto em análise, e como resultado dos argumentos

apresentados pelos responsáveis locais, estas alterações poderão não ser aplicadas em

todas as unidades (ver Tabela 7).

Na difusão das alterações ao formato ou ao serviço que é prestado, e

contrariamente ao descrito na literatura, no Lancaster College não existe qualquer

dificuldade decorrente de algumas escolas não serem próprias. Segundo o franqueador,

a reacção dos franqueados é sempre positiva, por duas razões. Primeiro, como a maioria

das escolas pertence ao franqueador, depois destas implementarem as modificações, os

franqueados sentem-se compelidos a segui-las, podendo, apenas, demorar mais algum

tempo por questões orçamentais. Por outro lado, e talvez mais importante, no

relacionamento com os franqueados e os parceiros, todos têm oportunidade de participar

com ideias e sugestões. Sempre que há alguma alteração, estes são consultados e, de

alguma forma, envolvidos no processo. Assim, a mudança não surge como algo que

lhes é imposto de cima, mas como algo em que eles próprios participaram e decidiram.

Mitchell exemplifica o seu ponto de vista através da recente introdução do novo slogan

“Building the Future”. Durante uma viagem aos EUA, Mitchell reuniu 20 alternativas

possíveis para um futuro slogan que desejava introduzir. De regresso a Portugal,

171

consultou vários responsáveis da rede, que o ajudaram na selecção, e só depois a

apresentou oficialmente ao grupo, aproveitando uma sessão de trabalho, sobre o novo

negócio de e-learning.

172

6.2. Análise do Caso

A gestão da rede distingue 3 tipos de unidade: as escolas próprias, propriedade

da empresa franqueadora Mitchell & Sousa, Lda., as escolas em ‘parcerias’, cujo

maioria do capital social é detido por essa mesma empresa e, por último, as escolas

franqueadas que são propriedade do franqueado. Em primeiro lugar, uma nota quanto à

terminologia utilizada: as escolas que são denominadas pela gestão da empresa como

sendo ‘parcerias’ são, na verdade, empresas filiais da empresa franqueadora que detém a

maioria do seu capital e o controlo das suas decisões de gestão. Coloca-se a questão se

se poderá, ou deverá, apenas considerar dois tipos de propriedade: as unidades próprias

versus as franqueadas. Isto porque, em princípio, as escolas denominadas ‘parcerias’

são escolas próprias, exploradas por empresas filais da empresa que detém a

propriedade da marca. No entanto, consideramos que a manutenção da distinção entre

os três tipos de unidades poderá ser interessante, na medida em que nos poderá fornecer

informação adicional sobre a heterogeneidade existente dentro da rede.

Neste contexto, a trajectória do Lancaster College, ao longo do tempo, evidencia

alguns aspectos que se pretendem analisar.

6.2.1. O Papel das Competências no Relacionamento Seguindo a linha de raciocínio de Richardson (1972), esperava-se que as

actividades realizadas pelos franqueados fossem dissimilares, mas muito

complementares das desempenhadas pelo franqueador. Tal como o previsto, as

actividades realizadas pelo franqueador e pelos franqueados são ‘muito

complementares’. O franqueador é responsável pela realização de actividades

relacionadas com a gestão estratégica da rede. Nestas actividades, incluem-se, por

exemplo, a determinação do calendário escolar, a selecção dos cursos a leccionar, a

definição dos respectivos objectivos e conteúdos programáticos, a escolha dos manuais

escolares e a determinação das estratégias de marketing. Por seu lado, os franqueados

são responsáveis pela gestão operacional da sua escola. Em concreto, as actividades

realizadas pelos franqueados incluem o relacionamento directo com o cliente através

173

quer da prestação do serviço, quer da captação não só de novos alunos para os cursos

leccionados nas suas instalações, mas, também, e principalmente, de novos negócios

com instituições como escolas ou empresas.

Todavia, não se pode considerar que as actividades do franqueador e

franqueados sejam completamente ‘dissimilares’, na medida em que o franqueador

detém escolas próprias e, portanto, nessas unidades, desempenha as mesmas actividades

que os franqueados. No entanto, sendo estas actividades desenvolvidas em contextos

heterogéneos, poderá justificar-se a necessidade de competências locais específicas (por

exemplo, tal como Minkler (1990) refere, o conhecimento sobre determinado mercado

local) e, consequentemente, de cooperação inter-organizacional.

De facto, constata-se que o Lancaster College é uma rede de empresas

heterogéneas que acedem aos recursos e às competências das contrapartes, com quem se

relacionam na rede (Axelsson e Easton, 1992). Cada empresa franqueada ou ‘parceira’,

nesta rede, acede aos recursos e competências do franqueador, tais como o acesso à

marca e ao know-how relativo à prestação do serviço. Mas, os franqueados e ‘parceiros’

acedem também às competências de terceiros externos à rede, com quem o franqueador

se relaciona, o que seria impossível, caso não pertencessem à rede. Vários exemplos

podem ser dados a este respeito, destacando-se a possibilidade dos professores das

escolas franqueadas e ‘parcerias’ receberem formação ministrada pelas editoras dos

manuais escolares ou a possibilidade dessas unidades venderem os cursos fornecidos

pelas multinacionais EF e Englishtown. Na verdade, tal como nos foi confirmado, os

contratos celebrados com a multinacionais EF e Englishtown só foram possíveis, dada a

dimensão da rede, o que significa que o próprio franqueador poderia não ter conseguido

aceder às competências destas empresas, caso não estivesse inserido na rede, e apenas

tivesse as suas unidades próprias. Estes exemplos ilustram, claramente, que os

relacionamentos existentes entre franqueador e franqueados, nesta rede, alteram a

percepção do exterior relativamente à identidade de ambos, condicionando a sua

possibilidade de acção (Hakansson e Snehota, 1995).

Conjuntamente, o franqueador acede ainda às competências do franqueado.

Entre estas, destacam-se o know-how relativo à gestão da unidade local e o know-how

que lhe permite combinar o seu conhecimento idiossincrático com o conhecimento que

lhe é fornecido pelo franqueador. Na verdade, o caso em análise parece clarificar o

174

papel da necessidade de aceder aos recursos e competências dos franqueados e das

vantagens decorrentes da combinação das competências dos dois lados do

relacionamento, como factores motivadores da sua emergência. Várias evidências

apontam nessa direcção.

O franchise da Póvoa é um bom exemplo da importância das competências do

franqueado e da sua combinação com as competências do franqueador, como factor

determinante do início do relacionamento. Em primeiro lugar, a análise deste

relacionamento evidencia, de forma clara, que nem a falta de recursos financeiros

(Caves e Murphy, 1976), nem a distância até à sede (Brickley e Dark, 1987),

influenciaram a decisão do franqueador. Por um lado, o franqueado da Póvoa diz ter

aberto a sua escola com os cashflows gerados pelo negócio, por outro lado, a Póvoa de

Varzim fica muito mais próxima da sede em Gaia, do que as escolas próprias da

Covilhã, Oeiras ou Lisboa.

Na verdade, as competências do franqueado, que o franqueador percepcionou

como dinâmico, empreendedor e com espírito de iniciativa, parecem ter sido

fundamentais para o início do relacionamento. Analisando, em pormenor, a forma como

surgiu o relacionamento entre o franqueador e o primeiro franqueado da rede,

concluímos que, por um lado, o franqueador estava interessado no know-how de gestão

do franqueado e, mais concretamente, pretendia utilizar as suas competências de

negociação ou de captação de negócios. Assim o demonstra o facto do franqueador ter

proposto ao franqueado que “começasse por explorar o mercado das escolas primárias”

na zona da Póvoa. Adicionalmente, o franqueador estava também interessado nas

competências de empreendorismo que o franqueado demonstrou possuir, ao sugerir o

alargamento do projecto às faculdades. Por outro lado, o franqueado não tinha

experiência prévia na área da leccionação de línguas, apenas na área da gestão. Assim,

constata-se também que o franqueador não estava preocupado com as competências

pedagógicas do franqueado, pois a empresa já detinha as competências relativas ao

ensino de que necessitava.

Com o início do relacionamento, o franqueado ficou encarregue da negociação

com escolas e faculdades e da prestação do serviço, utilizando a marca e know-how

pedagógico do franqueador. O Lancaster College deu-lhe todo o apoio, em termos do

know-how relativo ao ensino, por exemplo, elaborando os programas dos cursos,

175

seleccionando os professores e ajudando-o a recrutar um director pedagógico. Este

exemplo poderá, primeiro, corroborar a hipótese de o franchising ter surgido, nesta

organização, como forma de a empresa franqueadora obter as competências que

necessitava para explorar a ‘actividade externa’ e, segundo, exibir a forma como as

competências do franqueador e do franqueado se combinaram com o relacionamento.

De facto, este caso poderá ilustrar a importância atribuída por este franqueador

às competências do franqueado relativamente à captação de novos negócios. De acordo

com o Director Financeiro e Responsável pelo Controlo de Gestão do Lancaster

College, nesta rede, os gestores-empregados são, normalmente, mais passivos na

captação de clientes, do que os gestores- proprietários. Sendo de reforçar o facto desta

observação não parecer estar relacionada com problemas de incentivos, pois o esquema

de remuneração dos gestores-empregados inclui uma componente variável indexada ao

desempenho da unidade que dirigem.

Esta conclusão é ainda mais importante se considerarmos que, por vezes, a

captação de um novo negócio se difunde na rede, significando novos clientes para

várias escolas da rede, independentemente da sua forma de propriedade. Por exemplo,

recentemente, a gestora da escola da Senhora da Hora, em Matosinhos, celebrou um

contrato de formação com a Gant, a nível nacional. Assim, os empregados de cada uma

das lojas da Gant recebem formação da escola da Lancaster College que se encontra

geograficamente mais perto. Ou seja, neste caso, a escola da Senhora da Hora, que

captou o negócio, apenas fornece o serviço à loja da Gant do Norteshopping, em

Matosinhos. Este exemplo demonstra ainda que, nesta rede, os franqueados podem

aceder não só as competências do franqueador mas, também, às dos outros franqueados

e ‘parceiros’. Mais ainda, este caso demonstra que, tal como referem Hakansson e

Snehota (1995), os relacionamentos dentro da rede estão interrelacionados e,

consequentemente, o que acontece num relacionamento pode afectar os restantes.

A conclusão de que as competências dos franqueados contribuem para a

emergência do relacionamento é, ainda, reforçada pelos motivos apontados pelo

franqueador como determinantes para a sua opção de franquear. De acordo com o

informante, essa decisão terá sido influenciada pelo facto de o crescimento, através de

unidades próprias, exigir o desenvolvimento de uma estrutura pesada, pouco flexível,

que ‘desumanizaria’ o serviço prestado e a própria organização. Esta questão parece ser

176

bastante preponderante, na medida em que o informante reforça, várias vezes, a ideia de

que a prestação de um serviço ‘humanizado’ faz parte da missão da empresa e que esta

filosofia é transmitida a todos os colaboradores, incluindo os franqueados. Este ponto

parece reforçar a importância das competências dos franqueados na emergência e

manutenção do relacionamento. No fundo, trata-se do know-how dos franqueados que

lhes permite transmitir aos alunos a sensação de estar numa pequena escola, num

ambiente acolhedor e familiar, mas permitindo-lhes, simultaneamente, retirar as

vantagens inerentes a pertencer a uma rede, em termos de acesso a livros, eventos ou

programas.

Finalmente, outra razão apresentada pelo franqueador relaciona-se com a

dificuldade no controlo das unidades mais distantes, o que se assemelha ao previsto pela

Teoria da Agência do Franchising (Brickley e Dark, 1987). Contudo, as observações

empíricas não corroboram a possibilidade de, nesta rede, o franchising ter sido utilizado

para contornar dificuldades de monitorização das unidades mais distantes ou

geograficamente menos acessíveis. Por exemplo, em 1998, o Lancaster College

franqueou uma escola na Arrifana, e, portanto, muito próxima da escola própria da

Feira. Em 1999, abriu a escola franqueada dos Carvalhos, bastante mais próxima da

sede em Gaia, do que a escola própria de Espinho. Estas observações são consistentes

com as críticas formuladas à Teoria da Agência do Franchising (Minkler, 1990).

Conclui-se portanto que, nesta rede, o franqueador parece procurar obter nos

franqueados as competências relativas à captação dos clientes e ‘humanização’ do

serviço. No entanto, esta observação, por si só, não permite compreender por que razão

surgiu o relacionamento de franchising, ou seja, o motivo por que essas competências

não foram integradas na empresa. A resposta poderá residir nos ‘custos de transacção

dinâmicos’ associados à obtenção das competências em questão. Se, de acordo com o

debatido previamente, se ampliar o conceito de ‘custos de transacção dinâmicos’,

apresentado por Langlois e Robertson (1995), de forma a incluir não só a decisão

‘empresa vs. mercado’, mas também os relacionamentos inter-organizacionais,

poderemos analisar a emergência dos relacionamentos de franchising como resultando

de custos de transacção dinâmicos inferiores. Isto é, o custo de negociar, coordenar e

ensinar os franqueados poderá ser inferior ao custo de integrar essas competências.

Porém, não nos é possível determinar se esta é, de facto, a opção que apresenta menores

177

custos de transacção dinâmicos. É possível, no entanto, encontrar, neste caso, algumas

evidências que poderão apontar nesse sentido.

Em primeiro lugar, note-se que é natural que a maioria dos candidatos a

franqueados se enquadre mais facilmente num perfil de ‘empreendedores dinâmicos’ do

que a maioria dos indivíduos que procura trabalho por conta de outrem. Segundo, o

Lancaster College não tem uma atitude activa na venda do franchise, uma vez que não

faz publicidade em revistas ou feiras da especialidade, o que significa que não tem que

suportar os custos inerentes a essas actividades. Terceiro, a estrutura organizacional que

dá apoio às unidades franqueadas é a mesma que suporta as unidades próprias.

Finalmente, quando começou a franquear, o Lancaster College já detinha as

competências de replicação e gestão de rede, pois já operava em oito escolas próprias.

Todos estes factores poderão significar que os custos de transacção dinâmicos do

franchising são inferiores aos custos da integração dessas competências na empresa.

Foi já, anteriormente, argumentado que sendo as competências indirectas

(Loasby, 1998) do franqueador, aquelas que lhe permitem aceder às competências dos

franqueados, então essas poderão influenciar a emergência do relacionamento de

franchising, bem como a sua manutenção. Estas competências manifestam-se, portanto,

no conhecimento necessário para captar e manter franqueados e aceder às suas

competências. Mais concretamente, traduzem-se no know-how que permite criar e

manter um conceito atractivo, criar e manter uma boa reputação no mercado, replicar as

unidades, codificar e difundir conhecimento na rede e supervisionar as unidades

franqueadas. Observam-se todas estas competências no Lancaster College.

Em primeiro lugar, a análise do caso parece comprovar a importância na

captação de franqueados, das competências do franqueador relativas à criação e

manutenção de um conceito de negócio apelativo e de uma boa reputação no mercado.

O Lancaster College não faz publicidade, não está presente nas feiras da especialidade e

nos guias de oportunidade. No entanto, os candidatos a franqueados autopropõem-se,

isto é, candidatam-se à aquisição do franchise, o que parece validar a importância, quer

da atractividade, quer da reputação do conceito, na captação de franqueados. Por um

lado, os franqueados da rede referem que o seu agrado pelo conceito foi um dos factores

que os aliciou a iniciar o relacionamento. Por outro lado, o franqueador considera que as

178

escolas próprias da rede ajudaram a vender os franchises, pois os candidatos conheciam,

antecipadamente, o seu desempenho. Finalmente, existe uma lista de espera para

adquirir franchises do Lancaster College e, inclusivamente, alguns pedidos foram

recusados. Esta constatação é consistente com o previsto por Mathewson e Winter

(1987), para situações em que a marca explorada pela rede goza de muito boa reputação.

Este exemplo é também demonstrativo da existência de uma dependência do percurso,

como se verá no ponto seguinte desta secção.

O caso parece ainda evidenciar a importância das competências indirectas do

franqueador, que se traduzem no know-how respeitante à replicação das unidades, à

codificação e difusão de conhecimento na rede e à supervisão das unidades franqueadas.

Estas competências dependem do seu know-how respeitante à criação e manutenção da

uniformidade da imagem e do serviço prestado e, ainda, do know-how relativo ao

controlo financeiro e ao controlo da qualidade do serviço das unidades franqueadas. Em

seguida, enumeram-se alguns dos procedimentos utilizados pelo Lancaster College, já

anteriormente descritos, e que exemplificam esse know-how do franqueador:

1) Exemplo de procedimentos que garantem a uniformização da imagem:

� Aprovação da localização das novas unidades;

� Acompanhamento da construção, abertura e 1º ano de funcionamento das novas escolas;

� Estratégia de marketing definida centralmente.

2) Exemplo de procedimentos que garantem a uniformização do serviço:

� Intercâmbio de professores e alunos;

� Definição de um calendário escolar, objectivos, conteúdos programáticos e exames

idênticos, em todas as escolas, para cada língua e nível;

� Utilização dos mesmos procedimentos administrativos, em todas as escolas;

� Elaboração anual de um Teacher’s Pack;

� Reuniões trimestrais relativas à actividade do trimestre anterior e do próximo;

� Selecção e formação dos recursos humanos realizada pela sede.

3) Exemplo de procedimentos de controlo financeiro das escolas franqueadas:

� Envio obrigatório dos franqueados ao franqueador, de uma listagem com a facturação

do mês anterior;

� Acesso permitido pelo franqueado ao franqueador, à sua contabilidade, em qualquer

momento.

179

4) Exemplo de procedimentos de controlo da qualidade do serviço:

� Visitas regulares e inesperadas, do responsável pedagógico, às diferentes escolas;

� Análise comparativa dos resultados das avaliações dos alunos, em cada escola.

Mais ainda, conclui-se também que, nesta rede, a competência do franqueador

relativa à gestão do paradoxo da ‘exploração’ pode, também, ser vista como uma

importante competência indirecta, que lhe permite aceder às competências dinâmicas

dos seus parceiros. De acordo com a literatura, o paradoxo da ‘exploração’ (March,

1991) é um dos problemas mais importantes defrontados pelo franqueador. Por um lado,

é fundamental inovar, de forma a garantir o desenvolvimento do conceito e a sua

sobrevivência. Mas, por outro lado, é também necessário manter a uniformidade da

rede. Assim, como necessita da cooperação dos seus franqueados na implementação

dessas modificações, o franqueador pode enfrentar algumas dificuldades na difusão da

referida inovação (e.g. Cliquet e Ngoc, 2003). Como resultado, a competência do

franqueador relativa a gestão do paradoxo da ‘exploração’ poderá assumir um carácter

preponderante no relacionamento.

De facto, na Lancaster College, essa competência parece ser importante e estar

intimamente relacionada com a importância da existência de diversidade na rede de

franchising (e.g. Cliquet e Ngoc, 2003). De acordo com o franqueador, o envolvimento

de todos os elementos no processo de desenvolvimento da marca torna mais simples a

gestão do paradoxo da ‘exploração’, pois todos se sentem envolvidos na mudança e,

portanto, aceitam-na. Tal como já foi referido, o caso ilustra a preferência deste

franqueador por franqueados com um perfil empreendedor e dinâmico. Mas, o caso

demonstra também o envolvimento de todos os participantes na rede, no processo de

inovação. De facto, nesta rede, encontram-se melhoramentos do serviço prestado com

origem na sede, nas escolas próprias, franqueadas e parcerias, o que parece comprovar a

importância da diversidade no que diz respeito à criação de conhecimento na rede

(Hakansson e Snehota, 1995).

Por outro lado, a difusão desses melhoramentos é discutida por todos, e, por

vezes, se assim se justificar, pode não ser aplicada a todas as unidades da rede, sendo,

contudo, a decisão final sempre do franqueador. Constata-se, portanto, que, dada a

variedade no sistema, as características do modelo de negócio não são replicadas de

forma acrítica. Esta verificação parece comprovar a necessidade de o franqueador

180

identificar quais as características a replicar (Winter e Szulanski, 2000) e quais manter

apenas a nível local. O papel dos gestores das unidades (sejam ou não franqueados) é

fundamental a este nível. Tal como se referiu na descrição do caso, antes da introdução

de uma inovação, esta é discutida com todos os representantes locais, sendo a sua

difusão contingencial.

O caso demonstra ainda que a competência deste franqueador relativa à gestão

do paradoxo da ‘exploração’ pode, simultaneamente, ser vista como uma competência

indirecta, pois permite-lhe aceder às competências dinâmicas dos seus parceiros. Não se

constatou, contudo, neste caso, que as competências dinâmicas da rede, a nível local,

fossem superiores nas unidades franqueada do que nas restantes.

Neste caso, parece ainda importante referir o relacionamento de amizade que se

desenvolveu entre os gestores da empresa franqueadora e da primeira empresa

franqueada da rede. Apesar de, à data do início do relacionamento de franchising, os

dois gestores ainda não se conhecerem, com a continuidade desse relacionamento,

surgiu uma relação de amizade entre ambos que parece ter contribuído para o

desenvolvimento do relacionamento inter-organizacional. O exemplo do fortalecimento

desse relacionamento pode ser encontrado no facto desse franqueado ser proprietário de

quatro escolas da rede. Aparentemente, o franqueador terá optado por atribuir mais do

que uma unidade a este franqueado por duas razões. Primeiro, devido às competências

demonstradas pelo franqueado na gestão da primeira unidade. Segundo, é natural que o

franqueador tenha percepcionado o custo de transacção dinâmico associado à utilização

das competências desse franqueado na gestão das novas unidades como sendo inferior

ao de outras alternativas possíveis.

Adicionalmente, é possível que esta relação extra-profissional influencie as

competências indirectas do franqueador, ajudando-o a captar novos franqueados. Por

vezes, o franqueador apresenta este franqueado aos candidatos à abertura de uma nova

unidade franqueada. É possível que o franqueador tenha a expectativa que, dada a sua

diferente identidade (isto é, tratando-se de um franqueado), os candidatos atribuam uma

credibilidade diferente (possivelmente superior) às suas afirmações. Finalmente, não é

de excluir a possibilidade de, através do seu contacto directo com os candidatos, este

franqueado poder também ajudá-lo a replicar conhecimento tácito, e portanto não

codificável, servindo como um template para essa replicação.

181

6.2.2. A Dependência do Percurso e a Dinâmica do mix UP/UF

A trajectória da empresa, ao longo do tempo, evidencia a existência de uma

dependência do percurso passado, que condiciona a sua actuação e, consequentemente,

determina as suas competências e os seus relacionamentos actuais, tal como se irá

demonstrar.

Após o início da actividade, em 1984, a empresa dedicou-se ao desenvolvimento

das suas competências nucleares (Langlois e Robertson, 1993, 1995), subjacentes à

realização da actividade. O modelo de negócio foi aperfeiçoado, destacando-se, por

exemplo, a imagem, o método de ensino e todas as rotinas e procedimentos

administrativos. Em 1986, o Lancaster College iniciou a replicação das unidades com a

abertura da escola da Covilhã. Nos anos seguintes, a empresa cresceu através da

replicação de unidades próprias. Neste período, o franqueador desenvolveu e

aperfeiçoou as competências de replicação e de gestão de rede, de onde se destaca o

know-how relativo à criação e manutenção de uma imagem e de um serviço uniforme

em todas as unidades. Estas competências envolvem, ainda, o know-how relativo à

selecção do conjunto de atributos a replicar nas várias unidades (Winter e Szulanski,

2000), à rotinização da transferência e difusão de conhecimento na rede e à manutenção

e ao controlo da unidade em funcionamento após a replicação. Estas competências

foram sendo desenvolvidas em conjunto com as competências nucleares e o

aperfeiçoamento do modelo de negócio. Por exemplo, nesta fase, o Lancaster College

introduziu uma alteração significativa na imagem da marca. Apesar dessa imagem não

voltar a sofrer alterações substanciais, o desenvolvimento do serviço é um processo

contínuo que se manterá nas fases seguintes.

Por volta de 1998, o Lancaster College começou a sentir dificuldades inerentes

ao crescimento através de unidades próprias. Por essa altura, o franqueador já tinha

aperfeiçoado o conjunto de competências que lhe permitiria a replicação de unidades

franqueadas. Após a abertura de 8 escolas próprias, e do amadurecimento do know-how

relativo à realização da actividade, à replicação das unidades e à gestão da rede, o

Lancaster College abriu a primeira escola franqueada, tirando partido do know-how

entretanto adquirido. Nos anos seguintes, a rede continuou o seu crescimento através da

abertura de escolas próprias e franqueadas. Nesta fase, o Lancaster College

182

transformou-se numa rede de empresas heterogéneas, que acedem aos recursos e

competências umas das outras (Hakansson e Snehota, 1995). As competências

indirectas (Loasby, 1998) do franqueador foram sendo aperfeiçoadas, ao longo do

tempo. Estas são determinantes na captação e manutenção dos franqueados e no acesso

às competências destes. Estas competências traduzem-se no know-how para criar e

manter um conceito atractivo, para criar e manter boa reputação no mercado, quer em

termos da marca, quer da organização, para replicar unidades, para codificar e difundir

conhecimento na rede, para controlar a unidade após a replicação e, finalmente, para

gerir o paradoxo de exploração.

No entanto, como resultado do não pagamento dos fees e royalties ao

franqueador, a maioria das unidades franqueadas entre 1998 e 1999 encerrou

posteriormente. Apesar disso, alguns destes franqueados permaneceram em actividade,

utilizando marcas diferentes. Da mesma forma que o franqueador não conseguiu

garantir o recebimento dos pagamentos que lhe eram devidos, não conseguiu também

impedir que uma parte substancial do know-how transmitido ao franqueado

prevaricador, fosse usado por este, após o fim do contrato. Confrontado com a

necessidade de continuar a crescer, e dados os problemas encontrados no crescimento

através de unidades próprias e através de unidades franqueadas, em 2000, o Lancaster

College iniciou a estratégia da abertura de filiais, a que chama ‘parcerias’. Estas

unidades são controladas financeiramente pela sede, mas mantêm as vantagens das

unidades franqueadas, em termos da captação de novos negócios e da prestação de um

serviço ‘humanizado’ ao cliente.

A dificuldade encontrada pelo franqueador no crescimento através de unidades

franqueadas foi, em primeiro lugar, um problema de competências. Por um lado, o

franqueado adquiriu as competências que lhe foram transmitidas pelo franqueador, o

que tornou desinteressante a manutenção do relacionamento, na sua perspectiva

(Oxenfeldt e Kelly, 1969; Hakansson e Snehota, 1995). Por outro lado, o fim do

relacionamento também traduz a existência de problemas nas competências indirectas

do franqueador que, tal como já foi referido, dizem respeito ao know-how referente à

manutenção do relacionamento. Na verdade, o franqueador reconhece que tinha alguma

dificuldade em exercer o controlo financeiro das unidades franqueadas.

183

Em segundo lugar, esta situação também foi resultante dos constrangimentos que

afectam o sistema jurídico-legal português, que dificultaram a defesa em tribunal das

condições contratuais acordadas. Este problema, contudo, poderia ter sido mitigado se o

franqueador exigisse do franqueado, o desenvolvimento ou o controlo de recursos e

competências especificamente destinados ao relacionamento (Hakansson e Johanson,

1992). Nesse caso, a existência desse tipo de recursos e competências poderia reforçar a

manutenção do relacionamento. No entanto, no caso do Lancaster College,

principalmente nos primeiros anos, o investimento realizado nesse tipo de recursos e

competências, por parte do franqueado, era muito reduzido, tornando o franqueador

mais susceptível a este tipo de situação.

O caso parece evidenciar também que o percurso da empresa influencia a

evolução do mix de unidades próprias / unidades franqueadas. Nesta rede, ao contrário

do proposto pelas teorias tradicionais, a evolução da forma plural não parece ser o

resultado de um trade-off de custos de agência (Brickley e Dark, 1987), nem parece

existir um ciclo de vida do franchising (Caves e Murphy, 1976). Na verdade, a

combinação das competências do franqueador e do franqueado parece explicar a

emergência do franchising, não só ao nível do negócio, mas também ao nível da

unidade. Tal como foi já argumentado, o franchise da Póvoa exemplifica a forma como

a decisão entre deter ou franquear uma determinada unidade poderá depender das

competências necessárias para gerir essa unidade, das vantagens decorrentes da

combinação dessas competências com as outras existentes na rede e, possivelmente, dos

custos de transacção dinâmicos associados à obtenção dessas competências. Note-se,

contudo, que o critério de decisão associado à rendibilidade da localização (Oxenfeldt e

Kelly, 1969) não é de excluir totalmente.

Neste enquadramento, a evolução do mix de unidades franqueadas e unidades

próprias no Lancaster College parece ter sido influenciada pelo desenvolvimento das

competências directas e indirectas (Loasby, 1998) do franqueador e dos franqueados,

que resultaram das experiências partilhadas na rede (Mota e de Castro, 2004), e que

modificaram as vantagens decorrentes da combinação dessas competências e,

eventualmente, os custos de transacção dinâmicos (Langlois e Robertson, 1995) de as

obter. Mais ainda, podemos considerar que as competências, os relacionamentos e a

184

dinâmica do sistema são todos influenciados por uma dependência do percurso

(Hakansson e Snehota, 1995).

Tal como já foi referido, os problemas com as unidades franqueadas surgiram no

seguimento do desenvolvimento das competências directas dos franqueados, o que

tornou desinteressante a manutenção do relacionamento na sua perspectiva (Hakansson

e Snehota, 1995). Por outro lado, como resultado dos problemas encontrados, o

franqueador desenvolveu as competências de supervisão das unidades próprias

(nomeadamente através da introdução de um novo sistema informático) e o know-how

relativo à captação de franqueados (tornando-se mais exigente na selecção e exigindo o

pagamento de direitos de ingresso superiores que, no fundo, são recursos

especificamente direccionados para o relacionamento) e passou a privilegiar uma nova

forma de crescimento. Assim, o desenvolvimento das competências directas e indirectas

do franqueador e dos franqueados, ao longo do tempo, parece ter influenciado a

dinâmica do mix de unidades franqueadas e unidades próprias, quer pela alteração das

vantagens decorrentes da sua combinação, quer, possivelmente, pela alteração

provocada nos custos de transacção dinâmicos associados a cada alternativa.

Finalmente, não é de excluir a importância que a modificação das percepções

dos actores (Loasby, 2001) tem na dinâmica do sistema. Um bom exemplo dessa

importância encontra-se nas próprias palavras de Rui Mitchell, quando se refere à sua

reacção ao incumprimento dos pagamentos por parte de alguns franqueados. “Fiquei

muito céptico e optamos por ter menos ‘franchisings’ e por mais ‘parcerias’. (…) Agora

se calhar é diferente, mas, há uns anos atrás, era um conceito novo e penso que muitas

pessoas olhavam o franchising como uma oportunidade de ter um negócio, e fazê-lo

com pouca seriedade. (…) Nós temos muitas propostas de franchising, mas temos

recusado (…). São pessoas que não nos inspiram confiança (…). Optamos, então, por

abrandar o crescimento em franchising”8.

8 Rui Mitchell, entrevista em 29/03/2006.

185

6.3. Conclusões

As actividades realizadas pelo franqueador e pelos franqueados desta rede são

muito complementares, mas não totalmente dissimilares (Richardson, 1972). No

entanto, se considerarmos que essas actividades são realizadas em contextos

heterogéneos, podemos justificar a necessidade da cooperação inter-organizacional. Na

realidade, constata-se que, através da rede, o franqueador e os franqueados acedem aos

recursos e competências do outro. Mais ainda, a rede também lhes permite utilizar

recursos e competências de terceiros, fora da rede de franchising, a que não teriam

acesso, caso operassem isoladamente, comprovando que os relacionamentos existentes

dentro da rede condicionam a possibilidade de acção dos actores envolvidos, por

alterarem a percepção do exterior relativamente à sua identidade. Este caso demonstrou

também que, como os principais relacionamentos de uma empresa franqueadora estão

interrelacionados, o que acontece num deles pode afectar os restantes (Hakansson e

Snehota, 1995).

O franchise da Póvoa ilustra a importância das competências do franqueado,

demonstrando que o franqueador procurava, no franqueado, as competências de gestão,

de empreendorismo, de negociação e captação de clientes. Por outro lado, comprovou-

se também que o franqueador não foi influenciado pela limitação de recursos

financeiros (Caves e Murphy, 1976), nem por questões relacionadas com a dificuldade

de monitorização da unidade (Brickley e Dark, 1987). Este exemplo ilustra, também, as

vantagens decorrentes da combinação das competências do franqueador e do

franqueado. O caso demonstra ainda que o franqueador pode procurar, no franqueado,

competências de relacionamento que permitam ‘humanizar’ o serviço prestado. Foi

ainda levantada a possibilidade de a opção pelo franchising ser influenciada por custos

dinâmicos de transacção inferiores aos da opção de integrar as competências em causa

na empresa.

Finalmente, identificaram-se, no Lancaster College, as competências indirectas

(Loasby, 1998) do franqueador, que lhe permitem aceder às competências dos

franqueados, e que parecem influenciar a emergência e manutenção do relacionamento

de franchising. Estas competências traduzem-se no know-how necessário para criar um

conceito atractivo, para criar e manter uma boa reputação no mercado, para replicar

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rotinas, para codificar e difundir conhecimento, para supervisionar as unidades

franqueadas e gerir o paradoxo da exploração.

Conclui-se também que nesta rede, a competência relativa à gestão do paradoxo

da exploração demonstra-se uma importante competência indirecta, na medida em que

permite ao franqueador aceder às competências dinâmicas das suas contrapartes na rede.

Esta questão encontra-se muito próxima do tema da importância da diversidade na rede

de franchising, no que diz respeito a criação de conhecimento (e.g. Cliquet e Ngoc,

2003). Na verdade, constata-se que, nesta rede, as inovações têm origem quer na sede,

quer escolas próprias, franqueadas ou parcerias. Por outro lado, o envolvimento de

todos os gestores de unidade no processo de inovação, ajuda a gerir o paradoxo da

‘exploração’, facilitando a difusão das inovações e permitindo a sua aplicação

contingencial, isto é, tendo em conta as características das diferentes unidades (Winter e

Szulanski, 2000).

O caso demonstra também a importância da relação de amizade (ver por

exemplo Hakansson e Snehota, 1995) entre os gestores da empresa franqueadora e da

primeira empresa franqueada no desenvolvimento do relacionamento de franchising

entre elas. É ainda possível que este relacionamento extra-profissional influencie as

competências indirectas do franqueador, em particular através da sua influência na

reputação deste.

Por último, o caso ilustra o desenvolvimento das competências directas e

indirectas da empresa, ao longo do tempo. Na trajectória da empresa, encontra-se uma

dependência de percurso, de que resulta o desenvolvimento das suas competências e dos

seus relacionamentos (Mota e de Castro, 2004). A evolução do mix de unidades próprias

e unidades franqueadas é influenciado pelo desenvolvimento das competências directas

e indirectas do franqueador e franqueados, que altera as vantagens que resultam da sua

combinação e, possivelmente, os custos de transacção dinâmicos associados à opção de

franquear. Não se exclui, no entanto, a possibilidade da evolução este mix ser também

influenciado pela modificação das percepções (Loasby, 2001) do franqueador quanto às

vantagens e custos associados a esta forma organizacional.