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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO BERNARDO BASTOS FALCÃO A ESTRUTURA COMPETITIVA DE PORTOS BRASILEIROS: UMA ANÁLISE POR MEIO DE LÓGICA FUZZY E REDES SOCIAIS Rio de Janeiro 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO

BERNARDO BASTOS FALCÃO

A ESTRUTURA COMPETITIVA DE PORTOS BRASILEIROS:

UMA ANÁLISE POR MEIO DE LÓGICA FUZZY E REDES

SOCIAIS

Rio de Janeiro

2016

2

BERNARDO BASTOS FALCÃO

A ESTRUTURA COMPETITIVA DE PORTOS BRASILEIROS:

UMA ANÁLISE POR MEIO DE LÓGICA FUZZY E REDES

SOCIAIS

Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto

COPPEAD de Administração, da Universidade

Federal do Rio de Janeiro, como parte dos

requisitos necessários à obtenção do título de

Mestre em Administração.

ORIENTADOR: Peter Wanke

Rio de Janeiro

2016

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4

BERNARDO BASTOS FALCÃO

A ESTRUTURA COMPETITIVA DE PORTOS BRASILEIROS:

UMA ANÁLISE POR MEIO DE LÓGICA FUZZY E REDES SOCIAIS

Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto

COPPEAD de Administração, da Universidade

Federal do Rio de Janeiro, como parte dos

requisitos necessários à obtenção do título de

Mestre em Administração.

Aprovada por:

__________________________________________

Prof. Peter Wanke, PhD - COPPEAD

__________________________________________

Prof. Antonio Dib, PhD - COPPEAD

__________________________________________

Prof. Carlos Cosenza, PhD - COPPE

Rio de Janeiro

2016

5

RESUMO

Portos são um tema de considerável importância na logística uma vez que a crescente

internacionalização da produção necessitou ser acompanhada por uma alternativa de baixo

custo para o transporte internacional de bens, algo melhor oferecido pela via marítima. O

presente estudo analisou os portos brasileiros em suas atuais relações competitivas através de

redes sociais e propôs um redesenho das capacidades dos terminais portuários nacionais através

de tomadas de decisão por meio de lógica fuzzy. Conclusões sugerem que há uma competição

maior entre cargas conteinerizadas visto sua maior padronização de movimentação; existe a

possibilidade de haver uma classificação entre os segmentos de produtos considerando critérios

de densidade competitiva e número de portos que os movimentam; e tomadores de decisão

avaliam a distância ao porto com maior importância no caso de cargas em contêineres devido a

seu usual maior valor agregado. Implicações quanto a um rearranjo de capacidade dos terminais

portuários brasileiros também são sugeridas.

Palavras chaves: lógica fuzzy, redes sociais, portos, competição, logística

6

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Estruturação de entregáveis do trabalho .................................................................... 23

Figura 2 Disposição geográfica dos portos considerados nas análises ..................................... 24

Figura 3 Sistema de inferência fuzzy ....................................................................................... 30

Figura 4 Funções de pertinência das variáveis entrada do sistema de inferência fuzzy ........... 31

Figura 5 Funções de pertinência da variável saída do sistema de inferência fuzzy ................. 32

Figura 6 Movimentação de contêineres nos portos brasileiros em 2011 .................................. 33

Figura 7 Movimentação de carga geral nos portos brasileiros em 2011 .................................. 34

Figura 8 Histograma da quantidade de produtos distintos por quantidade de portos que os

movimentam ............................................................................................................................. 34

Figura 9 Movimentação de produtos por faixas de peso .......................................................... 35

Figura 10 Rede Social de competição portuária no Brasil ....................................................... 36

Figura 11 Comparação competição contêineres x carga geral ................................................. 36

Figura 12 Rede Social de competição portuária no setor farmacêutico ................................... 37

Figura 13 Gráfico densidade x vértices dos segmentos analisados .......................................... 38

Figura 14 Erro médio ponderado pelo volume de carga em função da importância atribuída à

distância (Contêineres) ............................................................................................................. 40

Figura 15 (a) Modelagem fuzzy da movimentação de contêineres (peso distância = 14) (b)

Variação da capacidade de movimentação de contêineres (peso distância = 14) .................... 40

Figura 16 Erro médio ponderado pelo volume de carga em função da importância atribuída à

distância (Carga Geral) ............................................................................................................. 41

Figura 17 (a) Modelagem fuzzy da movimentação de carga geral (peso distância = 9) (b)

Variação da capacidade de movimentação de carga geral (peso distância = 9) ....................... 42

7

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Resumo dos estudos de fatores de atratividade de portos.......................................... 20

Tabela 2 Portos considerados nas análises ............................................................................... 24

Tabela 3 Estatísticas descritivas da movimentação de contêineres .......................................... 27

Tabela 4 Estatísticas descritivas da movimentação de carga geral .......................................... 28

Tabela 5 Regras do sistema de inferência fuzzy....................................................................... 30

8

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 9

2 CONTEXTO PORTUÁRIO BRASILEIRO ................................................................ 11

3 REFERENCIAL TEÓRICO ......................................................................................... 15

3.1 FATORES DE ATRATIVIDADE PORTUÁRIA .......................................................................... 15

3.2 FUNDAMENTOS DE LÓGICA FUZZY E ANÁLISE DE REDE SOCIAL ..................................... 19

4 METODOLOGIA ........................................................................................................... 23

4.1 VISÃO GERAL ANALÍTICA ................................................................................................... 23

4.2 CRITÉRIOS DE SELEÇÃO .................................................................................................... 26

4.3 ANÁLISE DE REDE SOCIAL .................................................................................................. 28

4.4 SISTEMA DE INFERÊNCIA FUZZY ......................................................................................... 29

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................................... 33

5.1 ANÁLISE DESCRITIVA DOS DADOS ...................................................................................... 33

5.2 ANÁLISE DO AMBIENTE COMPETITIVO POR MEIO DE REDES SOCIAIS ............................... 35

5.3 PROPOSTA DE ADEQUAÇÃO DE CAPACIDADE POR MEIO DE LÓGICA FUZZY ...................... 39

6 CONCLUSÃO ................................................................................................................. 44

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 47

9

1 INTRODUÇÃO

Portos são as principais vias de movimentação de produtos por todo o mundo (Montes et al.,

2012). Somente no Brasil 95% das exportações e 90% das importações ocorreram por terminais

portuários em 2014 (AliceWeb, 2015). Essa predominância do setor marítimo nas operações

internacionais ocorre devido às facilidades logísticas provenientes da navegação de longo curso

(Lugt at al., 2014). Navios com grande capacidade para transporte de grãos, líquidos e

contêineres superam em muito a eficiência em ganhos de escala quando comparados a aviões,

caminhões e trens, onde esses dois últimos ainda são restritos apenas a transportes continentais

(Yeo at al., 2011). Logo, por se tratar de uma via de grande movimentação e com processos

padronizados, como a utilização de contêineres para unitização de cargas e o consequente fácil

carregamento e descarregamento delas nos navios, os portos aparecem como a opção preferida

dos exportadores e importadores que buscam maior eficiência em custos para o transporte de

seus produtos. Nesse cenário de grande volume de movimentações, a competição por cargas

surge como um fenômeno bastante difundido em terminais portuários (Alonso & Soriano, 2009;

Tongzon, 2009; SanJaime et al., 2015).

Essa competição, visualizada por meio de análises de redes sociais, como realizada por

Shanshan et al. (2013) na China, ajuda a melhor compreender o cenário competitivo nacional e

dessa forma a visualizar graficamente os portos com maior poder de atração de produtos

diversificados no país. E em se tratando de um país de dimensões continentais e litoral

abrangente como o Brasil, esse benefício torna-se ainda maior. Mesmo sendo uma técnica

originalmente utilizada para mapear o relacionamento entre indivíduos, a análise de rede social

pode trazer grandes benefícios quando aplicadas também a portos e suas relações de competição

(Ducret & Zaldi, 2011). Uma rede social consiste basicamente em um grafo com linhas que

10

ligam entidades: no contexto de indivíduos, pessoas que estão de alguma forma interligadas; no

contexto portuário, portos que movimentam o mesmo tipo de produto (Scott, 2012).

Mas analisando esse cenário pela visão do usuário, a decisão se torna complexa. Fatores que

são levados em consideração para a escolha por determinado porto em detrimento de outro

passam por distância terrestre até o porto e distância marítima até o destino (Malchow &

Kanafani, 2004), custos de movimentação no terminal, infraestrutura, serviço (Lirn et al., 2006),

eficiência de movimentação, frequência de armadores (Ugboma et al., 2006), condições

terrestres, disponibilidade, conveniência, centralidade regional e conectividade (Yeo et al.,

2011). Todos esses critérios tornam o ambiente de decisão do usuário nebuloso e de difícil

mensuração. A utilização da lógica fuzzy nessas condições de dificuldade de tomada de decisão

é algo plausível já que é uma técnica que ajuda a lidar com as imprecisões do mundo real,

modelando cada critério com valores qualitativos através de um sistema de inferência e

retornando o melhor resultado entre as alternativas possíveis segundo determinada regras

(McNeill & Thro, 1994).

Apesar da vasta utilização dessas duas técnicas de forma isolada seja comum no contexto da

logística (Ducruet & Zaidi, 2012; Montes et al., 2012; He et al., 2012; Yeo et al., 2011), a

utilização conjunta de técnicas de análise de rede social e tomada de decisão por meio de lógica

fuzzy para seleção de portos é algo pioneiro, sendo esse o foco do estudo em questão. Além de

agregar duas ferramentas de grande utilização em estudos quantitativos, o pioneirismo desse

trabalho também está presente na geração de um mapeamento completo da competição

portuária brasileira, sendo de grande importância para usuários, autoridades portuárias,

armadores, operadores de terminais e freightforwarders.

Além da geração do mapa da competição portuário nacional, esse estudo também pretende

definir as necessidades de aumento ou diminuição de capacidade dos terminais portuários dado

a tomada de decisão do usuário, modelada através da lógica fuzzy. Na apresentação desses

11

resultados será levada em conta a importância relativa na perspectiva do usuário quanto a

variável distância, aquela a qual normalmente é atribuída maior importância na escolha do

porto. Esses resultados são de importância considerável para as autoridades portuárias

brasileiras, dado que os principais portos nacionais são públicos e atualmente estão em um

estágio de operação próximo ou além do limite de suas capacidades (Wanke et al., 2011;

Wanke, 2013; Wanke & Barros, 2015).

Diante disso, a estrutura a ser seguida nos próximos capítulos é a seguinte: no capítulo 2 será

apresentada uma visão geral sobre o sistema portuário brasileiro; no capítulo 3 será realizada

uma revisão da literatura geral sobre o tema, abordando a situação atual do setor portuário

global, principais utilizações de análises de redes social e tomadas de decisão por meio de lógica

fuzzy; no capítulo 4 será introduzido o método de análise, sendo detalhadas todas as fontes de

dados e técnicas para seu tratamento, bem como os softwares utilizados para os cálculos de

cada etapa; no capítulo 5 será realizada a análise e discussão dos resultados, com a

apresentações dos gráficos e tabelas gerados em cada etapa e as principais informações que eles

revelam; e por fim, no capítulo 6 esse trabalho será concluído com um consolidado dos

principais achados do estudo, sua importância e suas limitações.

12

2 CONTEXTO PORTUÁRIO BRASILEIRO

A estrutura logística portuária no Brasil é menos estudada na literatura acadêmica quando

comparada com a de outros pólos logísticos, como o Leste asiático, a Europa e os Estados

Unidos.

Citando alguns trabalhos importantes, Wanke (2006) analisou a percepção de qualidade da

infraestrutura logística brasileira do ponto de vista dos exportadores. Seus resultados apontam

para uma segmentação dessa percepção: de um lado exportadores que se utilizam de contêineres

em suas movimentações apontam a falta de disponibilidade de linhas de armadores como a

principal deficiência logística do país; já os exportadores de grãos e carga não-conteinerizada

apontam o escoamento de sua produção e o acesso aos portos como a falha mais evidente desse

cenário. As saídas mais frequentes utilizadas por esses exportadores é a utilização de Estações

Aduaneiras de Interior (EADIs), ou portos secos, e a contratação de operadores logísticos para

o gerenciamento mais eficaz de suas operações de comércio exterior.

A eficiência dos portos brasileiros também foi estudada por Wanke et al. (2011), que utilizaram

a técnica de Data Envelopmente Analysis (DEA) para realizar suas análises. Seus resultados

apontaram para uma melhoria na eficiência das operações da maioria dos portos brasileiros

durante o período analisado. Esse resultado pode ter como causa o aumento recente em seus

volumes de movimentação e a falta de investimento em capacidade extra, o que força o porto a

operar de forma mais produtiva. Também foi percebido por esse estudo que terminais privados

operam em um nível de eficiência ligeiramente maior que os terminais públicos, ratificando as

conclusões de Feng et al. (2012) para o caso brasileiro. Além disso as análises de segmentação

de dados revelaram que terminais de carga geral são mais eficientes que terminais de

contêineres, provavelmente devido a uma causa histórica de grandes volumes de exportações

de commodities agrícolas e minerais movimentados no país. Também dentro do escopo de

eficiência de portos, Rios & Maçada (2006) analisaram terminais de contêineres do Mercosul,

13

incluindo os brasileiros. Suas conclusões revelaram que o número total de portos eficientes caiu

no período analisado de 70% para 65%, e ainda 2 portos brasileiros foram considerados

benchmarking em ineficiência em movimentação de contêineres, o porto de Itajaí e o de

Cubatão. Ainda estudando eficiência, Barros et al. (2012) analisaram a produtividade de portos

brasileiros de 2004 a 2010, também concluindo que em média essa eficiência diminuiu no

período. O principal motivo apontado pelos autores foi a ausência de assimilação de novas

tecnologias às operações portuárias. Posteriormente, resultados de Wanke & Barros (2016)

também corroboraram com esse cenário.

Outra contribuição para melhor entendimento do cenário portuário nacional foi Wanke (2013),

que estudou a infraestrutura física e a consolidação de cargas para embarque em portos

brasileiros. Seus resultados mostraram que os portos são ligeiramente mais eficientes em sua

infraestrutura física do que na consolidação de cargas para embarque, o que aponta para o fato

de que há maior eficiência na atração de armadores do que propriamente no embarque de cargas.

Isso indica que o gargalo da logística brasileira pode não estar na capacidade dos portos em si,

mas na capacidade de recebimento de cargas para expedição. A solução sugerida para esse

desbalanceamento é a criação de um corredor logístico ligando os principais portos à sua área

de influência.

Como solução para as ineficiências sugeridas pelos estudos citados, Wanke & Barros (2015)

estudaram o impacto de parcerias público-privadas na operação de portos públicos no país.

Resultados sugerem um aumento na eficiência portuária nesse tipo de arranjo devido a melhoria

de processos de coordenação, tecnologias de informação mais adequadas e maior conectividade

com outros modais de transporte.

Os estudos citados acima foram importantes no mapeamento da situação portuária nacional,

mas pouco agregaram na proposição de uma solução para os problemas identificados. Além de

analisar a estrutura competitiva dos portos brasileiros, algo não estudado nesses trabalhos

14

anteriores, o foco principal desse estudo foi propor um redesenho das capacidades de

movimentação de carga em cada terminal portuário do país, levando em consideração critérios

relevantes aos exportadores/importadores nacionais. Pretendeu-se dessa forma fazer uma ponte

entre as ineficiências identificadas pelos estudos anteriores e uma solução prática e específica

para esses problemas.

15

3 REFERENCIAL TEÓRICO

A revisão da literatura foi dividida em duas seções que se seguem. A primeira explora estudos

internacionais sobre atratividade portuária, destacando fatores de desempenho (Serebrisky et

al., 2016), bem como visto no contexto nacional pelo capítulo anterior, e critérios de decisão

(Yang & Chen, 2016) utilizados pelos usuários. Já a segunda seção explora as técnicas

utilizadas nesse trabalho, análise de redes social e lógica fuzzy, e suas aplicações na área de

logística.

3.1 Fatores de atratividade portuária

O papel dos portos é um tema bastante estudado na literatura de logística, transportes e comércio

internacional (Lindstad et al., 2016; Meng et al., 2016; Bell et al., 2013; Matsushima &

Takauchi, 2014; Shan et al., 2014; Mitroussi & Arghyrou, 2016; Park & Seo, 2016). Van der

Lugt et al. (2014) realizaram um estudo do alinhamento da estratégia de atuação de autoridades

portuárias, que predominantemente atuam conforme os interesses do governo local e são de

fato os proprietários do porto, e operadores de portos, que possuem a concessão para utilização

do terminal e normalmente focam no relacionamento com armadores. Analisando os portos de

Rotterdam e Barcelona foi possível perceber que a autoridade portuária está restrita a atuação

naquela área específica (Juda, 2007), enquanto que o operador no geral é uma grande

corporação internacional, com interesses ditados pela matriz situada em outra localidade e não

limitado oficialmente àquela área de operação, mas limitado economicamente devido aos custos

afundados investidos no terminal (Feng et al., 2012). Apesar disso, os autores perceberam que

há um esforço conjunto para promover a interconectividade logística com outros modais,

normalmente o ferroviário. Já Caris et al. (2011) realizaram um estudo para simular possíveis

meios de portos melhorarem sua integração com sua área de influência por interconectividade

fluvial. O porto em questão estudado foi o da Antuérpia, localizado não diretamente na costa

16

da Bélgica, mas em um posto fluvial interno. Após a análise dos cenários levantados, foi

possível perceber que essa estratégia melhoraria a performance do porto em razão da

diminuição do tempo de espera para entrada de cargas no terminal provenientes de outros

modais, comumente o rodoviário. Corti & Laxi (2009) viram que esse movimento de transporte

de carga saindo das rodovias e ferrovias e partindo para modais aquáticos tem também razões

sustentáveis, como a diminuição na emissão de CO2, gás com emissão consideravelmente

menor em navios e barcaças. Como resultado disso, a concentração de cargas em hubs

portuários tende a ser cada vez mais alta. Mas barreiras como a falta de conexões entre portos,

rios e ferrovias freiam esse movimento, como visto em seus resultados de que a concentração

de cargas se manteve estável nos últimos anos. Juda (2007) também estudou impactos

ecológicos ligados ao ambiente marítimo europeu. Em seu trabalho foi possível perceber

esforços nesse sentido vêm sendo realizados por países individualmente, mas muitas vezes de

forma divergente e não integrada, o que não garante resultados ótimos do ponto de vista

econômico e ambiental. Reuniões em um nível mais abrangente ocorreram nos últimos anos

entre os países membros da União Europeia, mas ainda sem muitos resultados práticos.

Ainda sobre performance portuária, muitos autores estudaram os fatores que tornam o

desempenho de um porto mais atrativo a seus clientes. Ho (1992) desenvolveu um trabalho em

que apontava oportunidades de marketing para o porto de Manila, nas Filipinas. Sua visão ainda

era a clássica de que os clientes dos portos eram apenas os armadores, negligenciando o

segmento de exportadores e importadores da região. Seus resultados mostraram que

disponibilidade do berço, eficiência operacional e custos de atracação e movimentação eram os

principais chamarizes para os armadores enxergarem o porto como um ponto de transbordo

atrativo. Murphy et al. (1989) realizou um estudo semelhante comparando a opinião de

operadores portuários e armadores nos EUA com o resto do mundo. Seu estudo concentrou-se

em duas frentes: fatores que levam um porto a ser considerado eficiente e questões de comércio

17

internacional que influenciam as operações portuárias. Com relação ao primeiro ponto não

houve discordância significativa entre os entrevistados, onde as principais respostas referiram-

se à disponibilidade de equipamentos, registros de perdas e avarias e horários convenientes de

entrega e retirada de mercadorias. Por outro lado, houve discordância no segundo ponto.

Entrevistados americanos viram a valorização do dólar como uma questão nociva as operações

portuárias americanas, uma vez que as exportações ficavam ameaçadas. Além disso houve uma

diferença na avaliação entre armadores e operadores portuários com relação ao tempo de espera

para atracação, onde os armadores o viam como excessivo, diferentemente dos operadores.

Feng et al. (2012) avaliou a performance portuária de portos da Europa ocidental e Ásia oriental,

com o intuito de apontar iniciativas de boas práticas. Seu estudo revelou que privatizações

tornam o porto mais eficiente e muitas vezes até mais barato. Por outro lado, excessos de

investimentos podem levar a altos custos logísticos, principalmente no tangente a operação de

equipamentos.

Tendo já revisto a literatura da conjuntura portuária nacional e internacional é preciso também

analisar a decisão de utilização do ponto de vista dos principais usuários dos portos. De Langen

(2007) estudou o caso da Áustria, um país sem saída para o mar, geograficamente localizado

em uma posição sob área de influência de Alemanha e Itália. Suas conclusões mostram que a

maior parte das decisões para movimentação de cargas via marítima já foram tomadas com base

histórica e cultural, e mudanças dificilmente ocorrem por incorrerem em custos significativos.

Além disso, pode-se perceber que os exportadores/importadores austríacos são

consideravelmente menos sensíveis a custos portuários do que freightforwarders, operadores

logísticos focados em consolidação de cargas. Malchow & Kanafani (2004) analisou os critérios

de decisão de todos os envolvidos, armadores e exportadores/importadores, na seleção de portos

para movimentação de cargas. Sua pesquisa indiciou que o tempo total da operação de envio e

recebimento da mercadoria é um fator crítico, mas de difícil precisão, indicado apenas por

18

estimativas com grandes margens de erro. Diante disso, as distâncias terrestres e marítimas

totais da origem até o destino passando pelos portos de embarque e desembarque são mais

utilizadas por serem de mais fácil obtenção. Jafari et al. (2013) realizaram um ranqueamento

de portos iranianos baseados em Método Delphi para definição de critérios e na técnica de

decisão multi-critério ORESTE para a tomada final de decisão. Por meio de 15 critérios

levantados, o porto de Shahid Rajaiee foi considerado o porto mais atraente para os

exportadores/importadores iranianos. Chang et al. (2008) estudaram os critérios de seleção de

portos do ponto de vista dos armadores. Seus resultados mostram uma segmentação dos

principais critérios para essa tomada de decisão. Armadores de longo curso possuem como

critérios mais relevantes a estrutura, a conveniência e os custos de atracação, enquanto que os

de curtas distâncias utilizam critérios de marketing e de possível integração com outras linhas

de armadores nessa mesma decisão. Já Song & Yeo (2004) realizam uma análise para a situação

portuária chinesa através da técnica de Processo Hierárquico Analítico (AHP) do ponto de

vistas de vários envolvidos no processo: embarcadores, armadores, freighforwarders,

operadores de terminais e acadêmicos da área de cadeia de suprimentos. Após a definição dos

principais critérios como volume de movimentação, estrutura, localização e serviço, bem como

seus pesos relativos, os portos de Hong Kong e Xangai apareceram como os principais portos

do país, respectivamente. Também utilizando a técnica de AHP, Lirn et al. (2004) analisou a

decisão de portos de grande porte em volume (portos hub) para transbordo do ponto de visto de

armadores. Seus principais achados foram que os custos para atracação são o principal critério

para seleção, seguido por posição geográfica, infraestrutura e administração. A tomada de

decisão por parte de embarcadores e freightforwarders nigerianos foi estudada por Ugboma et

al. (2006). Após análise AHP os principais critérios levantados foram eficiência do terminal,

frequência de armadores, infraestrutura, localização e custos de movimentação,

respectivamente. O porto de Lagos foi então considerado o principal porto nigeriano sob essa

19

metodologia. Gui & Urli (2006) analisaram a decisão de armadores para a seleção dos portos

de New York e Montreal. Sob critérios de infraestrutura, serviço, custo e localização geográfica,

os autores avaliaram os dois portos por meio do software Decision Lab e concluíram que o

porto de New York deve ser o preferido pelos armadores. Para Montreal ser melhor considerado

nessa decisão, ele deverá principalmente abranger uma área de influência maior, além de

oferecer melhorias em custo e serviço aos clientes. O caso espanhol foi estudado por Alonso &

Soriano (2009) sob a visão apenas dos embarcadores, mas com um foco não no que era

declarado, mas em dados reais dessas movimentações. A principal conclusão do trabalho é a de

que a distância da cidade até o porto é a mais relevante nessa tomada de decisão, ou seja,

independente das condições do porto, a carga escolhe o caminho mais rápido para chegar ao

mar. E por fim, Tongzon (2009) analisou essa decisão pela ótica apenas dos freightforwarders

operando no sudeste asiático. Sua pesquisa levou a conclusão de que os principais critérios de

avaliação são eficiência, frequência de armadores, infraestrutura, localização, custos, rapidez

de resposta às necessidades e reputação, respectivamente.

O que se pode concluir a respeito dos fatores de atratividade portuária é que alguns critérios de

decisão para utilização de um porto são comuns a quaisquer usuários. A tabela 1 resume os

achados dos estudos analisados em termos desses critérios de decisão. Os critérios de distância,

infraestrutura do porto e custos foram os mais frequentemente vistos nessa revisão de literatura.

3.2 Fundamentos de lógica Fuzzy e Análise de Rede Social

A tomada de decisão sob incertezas, como essa de seleção de portos, é uma ação muito comum

no meio empresarial (Abdullah, 2013). Uma técnica disponível para suportar esse processo é a

lógica fuzzy, que tem como principal característica a utilização de critérios qualitativos em seu

algoritmo de cálculo de outputs (McNeill & Thro, 1994), o que é bastante comum em ambientes

reais cercados de incertezas. Abdullah (2013) faz uma extensiva revisão de literatura sobre a

20

cronologia de utilização dessa técnica como suporte a tomada de decisão. Beheshti & Lollar

(2008) também fazem uma revisão da literatura de tomada de decisão por lógica fuzzy, além de

propor um modelo genérico de aplicação para avaliação de funcionários. A mesma aplicação é

proposta por Sultana et al. (2013), que detalha toda a rotina de modelagem através do software

MATLAB. Há também alguns exemplos de aplicação da técnica na área de logística, como em

He et al. (2012), que propõe um método de otimização de transbordos logísticos unindo a

técnica AHP com princípios da lógica fuzzy. Yeo et al. (2011) trazem ainda a discussão para o

setor portuária do extremo oriente. Sua proposta é a de medir a competitividade de portos de

contêineres por meio da lógica fuzzy e para isso utilizou inputs de pesquisadores, clientes e

fornecedores relativos a 7 portos orientais. Após a avaliação dos portos sob critérios de serviço,

condições terrestres, disponibilidade, conveniência, custo, centralidade regional e

conectividade, os portos de Hong Kong e Xangai obtiveram as melhores médias. E o último

exemplo de aplicação da lógica fuzzy nas operações logísticas é dado por Kunadhamraks &

Tab. 1 – Resumo dos estudos de fatores de atratividade de portos

21

Hanaoka (2008) para o caso tailandês. Sua proposta é a de avaliar a performance logística de

transportes intermodais de cargas sob critérios de custos, qualidades do serviço, confiabilidade

e segurança. Seus resultados apontaram para uma melhor eficiência geral da logística

rodoviária, frente a marítima e a ferroviária.

A análise de redes sociais também pode ser muito útil para a visão do quadro geral de

relacionamentos entre portos (Shanshan et al., 2013). Originalmente utilizada para se observar

relações pessoais (Moody, 2004), como em Martins et al. (2012), que estudaram a rede social

de pesquisadores que haviam publicado artigos científicos conjuntos, ou Madireddy et al.

(2015), que estudaram como o relacionamento pessoal pode ser usado em benefício de uma

melhor evacuação em casos de desastres naturais, a técnica também pode ser muito útil ao ser

aplicada em entidades não humanas, como os portos em suas relações comerciais. Montes et al.

(2012) analisaram a distribuição do comércio exterior mundial e a influência da crise de 2008.

Utilizando dados de transações internacionais, os autores desenvolvem gráficos de redes sociais

com os principais portos de todo o mundo nos períodos pré e pós crise. Suas conclusões seguem

a linha de que a rede de carga geral é mais forte e resistente a crises quando comparada a de

contêineres. Além disso, a movimentação de contêineres concentra-se nas rotas Ásia oriental –

Europa e Ásia oriental – costa oeste dos EUA, enquanto que a de carga geral é mais difusa. E

por fim há uma certa polarização nessas movimentações, onde as principais rotas de carga geral

envolvem países emergentes enquanto que as de contêineres são mais utilizadas por países

desenvolvidos, seguindo a lógica de que commodities são de maior dificuldade de

conteinerização do que produtos manufaturados. Ducruet & Zaidi (2012) analisaram também

as conexões entre portos durante um período de 10 anos, de 1996 à 2006. Com filtros relativos

à força das conexões, que eram associados ao volume total movimentado entre dois portos, e

relativos à categoria de produtos, os autores traçaram mapas bem detalhados das transações

econômicas mundiais. Grande parte da conclusão desse estudo adota padrões de

22

comportamentos históricos ou econômicos para explicar as principais conexões mundiais de

portos. Entrando mais explicitamente no tema de competição entre portos, Shanshan et al.

(2013) mapearam todos os relacionamentos competitivos entre os portos chineses. Os autores

propõem a partir daí uma nova distribuição de exportações e importações do país, como forma

de haver uma co-opetição sadia entre os portos chineses.

Diante dessa extensa abordagem da literatura sobre o tema, este presente trabalho tem como

objetivo abordar a questão do atual cenário de competição entre portos brasileiros, bem como

propor um redesenho da movimentação de comércio exterior realizada por via marítima no país.

Para tal, serão realizadas análises baseadas em redes sociais e tomadas de decisão baseadas em

lógica fuzzy, conforme explorado nas seções a seguir.

23

4 METODOLOGIA

O capítulo de metodologia foi dividido em 4 seções. A primeira descreve como a análise dos

dados foi organizada, mostrando o objetivo de cada etapa do estudo, bem como suas estruturas

de cálculo. A segunda seção apresenta a origem dos dados coletados para os critérios bases

definidos para a tomada de decisão por meio de lógica fuzzy, a terceira etapa do estudo. A

terceira seção mostra um apanhado geral de análises de rede social, com suas principais

fórmulas e descrições. E por fim a quarta seção mostra analogamente uma descrição geral da

lógica fuzzy, já com os gráficos das funções de pertinência utilizadas nesse estudo.

4.1 Visão geral analítica

O estudo foi desenvolvido em três etapas, conforme figura 1.

A primeira etapa consiste na análise descritiva de dados brutos, obtidos com a aquisição da base

Datamar, através do site http://www.datamar.com.br/. Essa base contém toda a movimentação

de comércio exterior realizadas em portos brasileiros durante o ano de 2011 e serviu como

principal input para esse trabalho. Por meio dessa análise pretendeu-se obter uma visão geral

da movimentação portuária brasileira, com um entendimento de volumes tanto de contêineres

quanto de carga geral, além da variedade de produtos em cada porto. Essa base considera tanto

movimentações de exportação quanto de importação em 46 portos sob diversas possíveis

Fig. 1 – Estruturação de entregáveis do trabalho

24

categorias de análise: tipo de produto, porto, tipo de movimentação, origem/destino nacional

das cargas, entre outras.

A tabela 2 mostra os portos considerados dos dois tipos de carga observados e a figura 2 sua

disposição geográfica.

A segunda etapa é a análise do ambiente competitivo de movimentações portuárias do Brasil

por meio de redes sociais. Para isso é realizado, também obtendo como base os dados do

Tab. 2 – Portos considerados nas análises

Fig. 2 – Disposição geográfica dos portos considerados nas análises

25

Datamar de 2011, uma compilação de todos os produtos que são movimentados em mais de um

porto no país, caracterizando uma competição. Essa compilação é então processada por meio

do software estatístico R (Crawley, 2013; Farnsworth, 2008; Heiberg & Neuwirth, 2009),

através do pacote igraph, gerando por fim uma rede social de competição de portos brasileiros

(McFarland et al., 2010; Scott, 2012). Esse processo é ainda realizado para algumas categorias

de produtos da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), gerando assim uma rede social

para cada macro categoria. Essa visão proporciona um melhor entendimento da situação de

competição nos segmento de produtos. Mais detalhes sobre análises de redes sociais podem ser

vistos na seção 4.3.

Por fim, a terceira etapa é a proposta de adequação de capacidade de movimentação dos portos

brasileiros sob a ótica do exportador/importador, realizada através de uma tomada de decisão

em ambiente fuzzy, também através do software estatístico R, dessa vez utilizando-se do pacote

FuzzyToolKitUoN. Primeiramente é gerada uma listagem com a combinação de cada

movimentação produto-cidade origem ou destino nacional e o volume total dessa

movimentação de acordo com a base Datamar de 2011. Essa lista é gerada dividindo-se as

cargas movimentadas em contêineres sob a unidade de TEUs e as cargas movimentadas de

forma não-conteinerizadas sob a unidade de toneladas. A partir daí essas cargas serão julgadas

em um ambiente fuzzy sob alguns critérios selecionados. Os critérios para essa tomada de

decisão são definidos baseados numa extensa literatura sobre o tema, conforme a tabela

apresentada ao final da seção 3.1, e em sua disponibilidade, sendo eles: distância ao porto,

tempo de fila, custo de movimentação da carga e frequência do armador. Além desses quatro

critérios, também foi incluído um critério de centralidade do porto (eq. 3, seção 4.3), originado

da análise de rede social (Montes et al.; 2012).

Como a decisão real dos exportadores ou importadores muitas vezes leva mais em conta o

critério de distância aos portos do que os outros critérios definidos nesse estudo (Malchow &

26

Kanafani, 2004), é realizado então uma análise de sensibilidade. Nessa análise dá-se um peso

crescente ao critério de distância para se gerar diferentes cenários de portos mais apropriados

para cada combinação produto-cidade origem ou destino. O cenário em que o erro médio

ponderado relativo a movimentação real é menor revela o peso em que intuitivamente os

exportadores/importadores atribuem à variável distância em suas tomadas de decisão para

escolha de portos. Por meio desse cenário podem ser comparados os valores reais

movimentados e os modelados, e consequentemente também gráficos de necessidade de

aumento ou diminuição de capacidade para cada porto analisado. Mais detalhes sobre lógica

fuzzy nesse contexto de tomada de decisão podem ser vistos na seção 4.4.

4.2 Critérios de Seleção

O critério distância ao porto é calculado tendo como ponto de partida a cidade origem/fim

nacional do produto, seguindo até o porto por meio de coordenadas geográficas (IBGE, 2015).

6371 ∗ 𝐶𝑜𝑠−1(𝐶𝑜𝑠 (𝜋 ∗90−𝐿𝑎𝑡𝑑

180) ∗ 𝐶𝑜𝑠 ((90 − 𝐿𝑎𝑡𝑜) ∗

𝜋

180) + 𝑆𝑒𝑛 ((90 − 𝐿𝑎𝑡𝑑) ∗

𝜋

180) ∗

𝑆𝑒𝑛 ((90 − 𝐿𝑎𝑡𝑜) ∗𝜋

180) ∗ 𝐶𝑜𝑠 ((𝐿𝑜𝑛𝑔𝑑 − 𝐿𝑜𝑛𝑔𝑜) ∗

𝜋

180)) (1)

A distância entre duas coordenadas é então definida pela equação 1 (Jurgense et al., 2000), onde

Latd equivale a latitude do destino, Lato a latitude da origem, Longd a longitude do destino e

Longo a longitude da origem. O resultado é então mostrado em quilômetros, uma vez que o

fator 6371 representa o raio da Terra na mesma unidade.

O critério de tempo de fila representa o tempo de espera médio em horas dos navios cargueiros

até a atracação nos portos e é um bom indicador do estado de utilização da capacidade das

operações do porto. Exportadores/importadores são afetados por esse tempo de fila através do

atraso no envio ou recebimento de seus produtos. A Agência Nacional de Transportes

27

Aquaviários (ANTAQ, 2015) disponibiliza os tempos médios de espera para atracação de todos

os portos públicos do país e, portanto, foi utilizado como input para os valores desse critério.

O critério de custo de movimentação representa o custo diretamente envolvido para o

exportador ou importador na movimentação de sua carga no terminal marítimo. Esses valores,

tanto para contêineres quanto para carga geral, estão presentes também no site da ANTAQ para

todos os portos públicos brasileiros. Para contêineres a medida utilizada foi o R$/TEU e para

carga geral R$/ton.

O critério de frequência do armador remete ao tempo de espera da carga para ser embarcada na

exportação ou de ser recebida na importação devido à escassez de rotas de armadores que

passam por determinado porto. Esse critério torna-se importante para o cliente do porto uma

vez que seria indesejado utilizar uma via de saída ou entrada com baixa frequência de armadores

que a utilizassem. Essa mensuração de frequência foi utilizada tendo como base os dados do

Datamar de 2011 e seu resultado é expressado em atracações de navios no ano.

E finalmente o último critério de centralidade foi determinado como a centralidade de grau, que

mede em termos de rede social quantos vértices o arco possui, ou seja, com quantos outros

portos determinado porto compete. Esse critério foi escolhido, dentre os atributos de redes

sociais, por representar a característica de versatilidade de um porto ao lidar com diferentes

tipos de cargas de diferentes localidades, uma vez que cada arco representa produtos idênticos

movimentados por mais de um porto.

As tabelas 3 e 4 mostram algumas estatísticas descritivas desses dados.

Tab. 3 – Estatísticas descritivas da movimentação de contêineres

28

4.3 Análise de rede social

A realização da segunda etapa do estudo utilizará análises de rede social para gerar grafos de

competição entre os portos, bem como estatísticas descritivas de cada categoria de produtos

presente na base de dados. Dentre os atributos de análises de rede social, consideramos os

descritos a seguir nesse estudo (Scott, 2012). Os vétices (V) representam o total do número de

entidades presentes na rede social, no caso portos. Os arcos (A) representam o total do número

de ligações entre as entidades, no caso competições. A densidade (D) representa o número de

arcos presentes na rede social divididos pelo total máximo, e pode ser calculado através da

equação 2. Basicamente a densidade representa o percentual de competições presentes dado o

máximo possível. A centralidade de grau (CG) representa um atributo de centralidade que mede

quantos arcos determinado vértice possui, e pode ser visto pela equação 3. No caso desse estudo,

a centralidade de grau mede quantas competições cada porto tem. A centralidade de

intermediação (CI) representa um atributo de centralidade que mede sob quantas combinações

de menores caminhos entre dois vértices, determinado vértice está presente, e pode ser

calculado pela equação 4. Na fórmula st representa o menor caminho entre os vértices s e t. E

por fim, a centralidade de proximidade (CP) representa um atributo de centralidade que mede o

inverso do afastamento, que é a soma da distância de um vértice a todos os outros da rede social,

ou seja, esse atributo mede a centralidade em relação ao posicionamento do vértice. Descrito

pela equação 5, d(x,v) representa a distância em vértices do menor caminho entre x e v.

Tab. 4 – Estatísticas descritivas da movimentação de carga geral

29

𝐷 =2𝐴

𝑉(𝑉−1) (2)

𝐶𝑔(𝑣) = grau(𝑣) (3)

𝐶𝑖(𝑣) = ∑𝜎𝑠𝑡(𝑣)

𝜎𝑠𝑡𝑠≠𝑡≠𝑣 (4)

𝐶𝑝(𝑣) =1

∑ 𝑑(𝑥,𝑣)𝑥 (5)

Todos os atributos de centralidade revelam alguma informação a respeito da rede social. Mas

no caso específico do escopo desse trabalho, a centralidade de uma rede social de competição

em portos medida em centralidade de intermediação e em centralidade de proximidade carece

de maiores significados, sendo mais aplicáveis em redes sociais entre indivíduos, como em

Martins et al. (2012), ou até em ligações comerciais entre portos, como em Ducruet & Zaidi

(2012). Por outro lado, a centralidade de grau informa quantas competições determinado porto

possui, um indicador de que quanto maior esse atributo, mais importadores/exportadores

utilizam esse porto para movimentar produtos de variadas categorias. Assim, ele aparece como

um porto versátil em lidar com diferentes tipos de produtos. Dessa forma, a centralidade de

grau foi escolhida como a medida de centralidade para integrar os critérios de tomada de decisão

por meio de lógica fuzzy na terceira etapa do estudo.

4.4 Sistema de inferência fuzzy

A terceira etapa do trabalha baseia-se na tomada de decisão fuzzy com base nos critérios

considerados na seção 4.1 para melhor adequação de cargas em portos brasileiros. Um sistema

de inferência fuzzy é composto por 5 blocos funcionais (McNeill & Thro, 1994) conforme visto

na figura 3. Nesse estudo utilizou-se o sistema Mamdani de inferência. O bloco de regras

contém as lógicas se-então do modelo. O bloco de base de dados define as funções de

pertinência do sistema de inferência fuzzy. O bloco de tomada de decisão realiza as operações

baseado nas regras definidas. O bloco de fuzzificação transforma as variáveis numéricas em

30

graus que correspondem aos valores linguísticos qualitativos. E finalmente, o bloco de

defuzzificação transforma os resultados fuzzy em resultados numéricos.

Para o caso desse estudo, todas as variáveis de entrada, ou seja, os critérios de avaliação

(distância, fila, custo, frequência e centralidade) recebem duas funções de pertinências para

representarem valores altos e baixos. Todas as funções de pertinências foram definidas como

triangulares, como em Sultana et.al (2013) e Kunadhamraks & Hanaoka (2008). As funções

representantes da medida de grandeza fuzzy baixa têm o valor da esquerda e central como zero

e o valor da direita igual ao terceiro quartil, enquanto que as funções representantes da medida

de grandeza fuzzy alta têm o valor da esquerda igual ao primeiro quartil e o central e da direita

como o quarto quartil, ou seja, o valor máximo. A figura 4 mostra as funções de pertinências

das variáveis de entrada.

A variável de saída criada é a conformidade do porto, com valores possíveis de zero a dez e

também duas funções de pertinências, baixa e alta. Respeitando os mesmos critérios das

variáveis de entrada, a função de baixa conformidade é triangular com valor baixo e central

Fig. 3 – Sistema de inferência fuzzy

Tab. 5 – Regras do sistema de inferência fuzzy

31

definido como zero e valor mais alto como 6,6 e a função de alta conformidade tem valor mais

baixo como 3,3 e valor central e mais alto como dez. A figura 5 mostra as funções de

pertinências da variável de saída.

Após a definição das variáveis e funções da modelagem fuzzy, faz-se necessário a definição das

regras, conforme tabela 5. Intuitivamente define-se que distâncias curtas, filas pequenas, custos

baixos, frequências altas e centralidades altas levam a uma conformidade do porto alta.

Analogamente, distâncias longas, filas grandes, custos altos, frequências baixas e centralidades

baixas levam a uma conformidade do porto baixa.

Já com as variáveis, funções e regras modeladas, o ranqueamento dos portos de cada

combinação produto-cidade origem ou destino pode ser realizado. Cada porto recebe uma

pontuação para cada combinação, dado suas características de distância à cidade, fila para

atracação de navios, custos de movimentação, frequência de armadores e centralidade. O porto

Fig. 4 – Funções de pertinência das variáveis entrada do sistema de inferência fuzzy

32

que receber a maior pontuação é então considerado o mais apropriado para movimentar aquela

determinada carga.

Fig. 5 – Funções de pertinência da variável saída do sistema de inferência fuzzy

33

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise de resultados nesse estudo é dividida em 3 seções conforme exposto no capítulo de

metodologia. A primeira seção faz uma análise dos dados brutos da base Datamar de 2011,

extraindo informações importantes a respeito da movimentação portuária de comércio exterior

no país. A segunda seção explora a competição por cargas nos portos nacionais a partir da

mesma base utilizando-se da técnica de análise de redes sociais. E por fim, a terceira seção

propõe um redesenho das capacidades de movimentações dos terminais brasileiros dado a

tomada de decisão por meio de lógica fuzzy dos exportadores/importadores locais.

5.1 Análise descritiva dos dados

A análise dos dados brutos revela algumas características peculiares da movimentação portuária

brasileira. A figura 6 mostra a movimentação de contêineres pelos portos analisados durante o

ano de 2011.

Há uma clara preferência dos importadores/exportadores pelo porto de Santos, que é

responsável por quase 43% de toda movimentação de comércio exterior nacional por via

marítima. Outros 23 portos dividem os 57% restante das cargas conteinerizadas.

Uma configuração diferente pode ser observada quando analisamos os dados de movimentação

de carga geral, conforme figura 7.

Fig. 6 – Movimentação de contêineres nos portos brasileiros em 2011

34

Os portos de Tubarão e Itaguaí são mais relevantes no cenário de carga geral uma vez que

movimentam em sua essência cargas pesadas, no caso a exportação de minérios e produtos

siderúrgicos respectivamente. Paranaguá aparece logo em seguida destacando-se pela

exportação de produtos originados no agribusiness, principalmente de grãos.

Essa possível preferência dos exportadores de certos produtos por determinado porto pode ser

vista na figura 8.

Esse histograma revela que 2600 produtos de entrada única na nomenclatura NCM, ou quase

26% do total, são movimentados por um único porto. Para os outros 74% acontece alguma

competição de pelo menos 2 portos movimentando o mesmo produto.

A figura 9 mostra a quantidade de produtos únicos por faixa de peso movimentado.

Fig. 7 – Movimentação de carga geral nos portos brasileiros em 2011

Fig. 8 – Histograma da quantidade de produtos distintos por quantidade de

portos que os movimentam

35

Pode-se perceber que os produtos em sua maioria se concentram nas faixas mais intermediárias,

com 3007, ou quase 30%, sendo movimentados entre 100 e 1000 toneladas anualmente. Com

movimentações de até 1 tonelada concentram-se produtos de origem farmacêutica e higiene e

beleza, enquanto que em mais de 1 milhão de toneladas encontram-se produtos do setor de

minérios e siderúrgicos em sua maioria.

5.2 Análise do ambiente competitivo por meio de redes sociais

A análise do ambiente competitivo é realizada levando-se em conta os segmentos de produtos,

segundo a nomenclatura NCM presente na base de dados Datamar. É importante salientar que

o critério básico para se definir que há uma competição é a movimentação de um produto com

mesmo código, o que como visto na seção 5.1, ocorre com cerca de 74% dos produtos.

A rede social de toda a competição do sistema portuário brasileiro pode ser observada pela

figura 10.

Dos 46 portos analisados, todos eles de alguma forma competem por pelo menos 1 produto. No

total há 721 competições ocorrendo no sistema portuário brasileiro, o que representa algo em

torno de 70% do total de competições possíveis, como identificado pela densidade de 0,70 na

rede social. Os critérios de centralidade foram mostrados através da média geral da rede social,

Fig. 9 – Movimentação de produtos por faixas de peso

36

uma vez que são características de cada vértice. O atributo centralidade de grau mostra que, em

média, cada porto tem 31,35 competições.

A figura 11 mostra um comparativo entre as movimentações efetuadas em contêineres e carga

geral.

Fig. 10 – Rede Social de competição portuária no Brasil

Fig. 11 – Comparação competição contêineres x carga geral

37

A densidade da rede social de contêineres é bastante representativa com o valor de 0,99, ou

seja, com 99% das conexões de competição possível entre os 23 portos analisados (somente o

porto de Angra dos Reis não possui competições por cargas conteinerizadas). Esse valor revela

que, no geral, cargas conteinerizadas são movimentadas por vários portos independentes de seu

conteúdo, uma vez que os equipamentos operacionais para sua movimentação nos terminais

são padronizados. Por outro lado, produtos não conteinerizados possuem uma certa

especificidade em suas necessidades de movimentação, e por consequência geram menores

níveis de competição, como revelado pela densidade de 0,64 da rede social.

Algumas características peculiares podem ser percebidas em determinados segmentos de

produtos, conforme visto na figura 12 para o setor farmacêutico.

O setor de fármacos representa o menor volume de movimentação entre todos os setores

analisados, sendo quase que totalmente movimentados por contêineres em sua maioria sendo

importados do exterior. Trata-se, no geral, de uma carga de alto valor agregado destinada a

poucos grandes laboratórios farmacêuticos localizados principalmente no eixo RJ-SP. Diante

disso, percebe-se uma rede social mais enxuta com poucos portos competindo por esse tipo de

carga, uma vez que um volume baixo de importações requer poucos contêineres que devem ser

descarregados diretamente em um único porto.

Fig. 12 – Rede Social de competição portuária no setor farmacêutico

38

Um comparativo geral entre todos os setores pode ser visto pela figura 13.

Considerando nos eixos os principais determinantes da competição de um setor, sua densidade

e a quantidade de portos que competem, a figura revela aspectos importantes da competição

por cargas no país. A técnica k-means foi utiliada na tentativa de obter agrupamentos de

segmentos dado sua localização nos eixos do gráfico. A entrada k, que indica o número de

agrupamentos requeridos para classificação dos segmentos, recebeu o valor 4, ou seja, houve

uma tentativa de obter 4 agrupamentos distintos para os segmentos. O primeiro agrupamento,

analisando a figura da esquerda para a direita, representa setores com cadeias produtivas

conectadas. Os setores de vidros, cerâmicas, fármacos e higiene têm características de produção

semelhantes, sendo localizadas em poucos pólos espalhados pelo território nacional e portanto

sendo movimentadas por poucos portos próximos a essas localidades. Em seguida, um segundo

agrupamento representa setores de baixa especialização e/ou alto volume de movimentação.

São setores movimentados por um alto número de portos e ao mesmo tempo a intensidade dessa

competição também é alta. Isso pode se dar devido ao fato de que não há capacidade de

Fig. 13 – Gráfico densidade x vértices dos segmentos analisados

39

movimentação suficiente nos principais terminais portuários utilizados para movimentar esses

segmentos, como por exemplo produtos advindos do agribusiness. Ao mesmo tempo essas

cargas podem ser de fácil movimentação por serem padronizadas, utilizando majoritariamente

contêineres para sua unitização, como no caso de eletroeletrônicos. Já os setores de alimentos

e oil & gas representam por si só um agrupamento. Nesse ponto do gráfico os setores tendem a

ter suas cadeias de produção mais desconectadas, utilizando um número de portos maior para

sua movimentação. O setor de oil & gas por exemplo possui diversas operações tanto onshore

principalmente na região nordeste, quanto offshore por toda costa brasileira.

5.3 Proposta de adequação de capacidade por meio de lógica fuzzy

Através da metodologia descrita na seção 4.4, foi realizada uma alocação de cargas pelos portos

analisados, seguindo critérios de distância à origem/destino nacional, tempo de espera da

embarcação no porto, custo, frequência de armadores e centralidade. Intuitivamente o critério

de distância ao porto possui um peso maior na tomada de decisão do importador/exportador

quando comparados aos outros. Dessa forma, foi realizada uma análise de sensibilidade do peso

dado à variável distância pelos tomadores de decisão tanto no caso de contêineres quanto em

cargas gerais. Os valores obtidos pela modelagem podem ser comparados com os dados reais

através do erro médio percentual ponderado desse desvio. Essa ponderação foi realizada pelos

valores reais de movimentação de cada porto. Os resultados dessa análise para as cargas

conteinerizadas podem ser analisados através da figura 14.

O gráfico mostra que houve erros médios de até quase 180% quando a modelagem considerava

peso 2 da variável distância, ou seja, a modelagem errava em média quase 1,8 vezes o valor

movimentado de TEUs em cada porto. Mas quando esse peso foi de 14, o erro médio da

modelagem foi de apenas 27%, sendo portanto o cenário que mais se aproximou da realidade

no caso de contêineres.

40

Esse cenário pode ser analisado mais detalhadamente pela figura 15.

Fig. 14 – Erro médio ponderado pelo volume de carga em função da importância

atribuída à distância (Contêineres)

Fig. 15 – (a) Modelagem fuzzy da movimentação de contêineres (peso distância = 14)

(b) Variação da capacidade de movimentação de contêineres (peso distância = 14)

(a)

(b)

41

A figura 15 (a) demonstra que a modelagem muito se aproximou da realidade, mas de certa

forma com alguns desvios consideráveis. O porto de Santos foi o mais impactado em termos

absolutos, recebendo algo em torno de 300 TEUs anualmente a mais do que movimenta hoje.

Outro porto bastante impactado foi o de Itajaí – SC. Devido a sua localização na margem oposta

ao porto de Navegantes e a alta importância da distância da origem/destino nacional das cargas,

ele torna-se um porto menos atrativo e portanto não utilizado.

A figura 15 (b) mostra a variação necessária na capacidade de movimentação de contêineres

sugerida pela modelagem. Os principais portos impactados pela modelagem são os portos de

Santos, Navegantes e Itajaí. Grande parte das cargas originalmente movimentadas no porto do

Rio de Janeiro, passam a ser capturadas pelo porto de Santos. O mesmo acontece com as cargas

de Itajaí, que passam a ser movimentadas pelo porto de Navegantes. É importante salientar que

a modelagem sugere apenas uma realocação de capacidade dado as características principais de

tomada de decisão dos importadores/exportadores, ou seja a soma das variações é zero.

A mesma análise pode ser realizada para as cargas não-conteinerizadas, conforme figura 16.

O peso 9 da variável distância revelou o menor erro médio da modelagem quando comparada

com a realidade. Em média houve uma variação de 45% na quantidade de toneladas

Fig. 16 – Erro médio ponderado pelo volume de carga em função da importância

atribuída à distância (Carga Geral)

42

movimentada pelos portos analisados. Esse menor peso atribuído a distância ao porto no caso

de cargas gerais quando comparado com cargas conteinerizadas pode ser explicado pelo fato

de que contêineres normalmente carregam cargas de maior valor agregado, sendo importante

um menor valor de estoque em trânsito para as empresas que estão importanto/exportando a

mercadoria (Wanke & Zinn, 2004). Enquanto isso, cargas não-conteinerizadas procuram por

portos com equipamentos específicos para sua movimentação, importando menos onde estão

localizados.

Esse cenário pode ser avaliado com mais detalhes através da figura 17.

Através da figura 17 (a) percebe-se mais uma vez o porto de Santos aparece como um dos mais

atrativos segundo a modelagem. Além dele, o porto de São Francisco do Sul – SC aparece

Fig. 17 – (a) Modelagem fuzzy da movimentação de carga geral (peso distância = 9)

(b) Variação da capacidade de movimentação de carga geral (peso distância = 9)

(a)

(b)

43

tomando uma quantidade considerável de cargas do porto de Paranaguá. Isso ocorre

principalmente devido ao alto tempo de fila para atracação de navios no porto de Paranaguá,

sendo o dobro quando comparado ao porto de São Francisco do Sul e 7 vezes maior quando

comparado ao porto de Santos. Dessa forma sua área de influência acaba por diminuir, perdendo

considerável quantidade de cargas para esses portos relativamente próximos a ele.

Por fim a figura 17 (b) mostra a variação de capacidade necessária nos terminais de carga geral

para satisfazer essa modelagem. Os principais portos afetados por esse redesenho da capacidade

de movimentação de cargas gerais são os portos de Santos, Paranaguá e São Francisco do Sul.

Um aumento de capacidade de cerca de 20MM toneladas anual se faz necessário nos portos de

Santos e São Francisco do Sul, enquanto a modelagem sugere uma redução de quase 30MM

toneladas anual no porto de Paranaguá.

Essas readequações de capacidades nos terminais podem trazer grande impacto positivo não só

para a infraestrutura logística mas também para a economia do país, visto o alto número de

empresas multinacionais que desistem de operar no Brasil devido a dificuldades no escoamento

de sua produção. Mas colocar essas iniciativas na prática requer certo grau de investimento e

comprometimento público. Programas governamentais de investimentos devem primariamente

identificar prioridades na alocação dos recursos, como os terminais que hoje mais se distanciam

das capacidades modeladas. Outro ponto importante são as consequências que um aumento de

capacidade pode trazer no tráfego de caminhões no entorno do porto e no aumento na

competição por janelas de entrega de carga. As capacidades de acesso aos portos também

devem estar presentes nesse plano de investimentos.

Outro agente importante nesse cenário são os armadores. Parcerias com as principais empresas

do setor podem se fazer necessárias nesse modelo de readequação de capacidades, visto que o

poder de influência dos armadores é alto no processo de escolha de portos para escoamento ou

recebimento de cargas pelos usuários.

44

6 CONCLUSÃO

Portos são a mais importante via de movimentação internacional de produtos. Importadores e

exportadores em busca de uma logística eficiente têm a clara preferência pelo modal marítimo

para suas movimentações de comércio exterior como forma de redução de custos dada a grande

economia de escala característica das embarcações quando comparadas a trens, caminhões e

aviões.

A decisão por qual porto utilizar passa por uma série de critérios, conforme analisado por esse

estudo, dentre eles o de maior influência, a distância da planta de recebimento ou expedição do

produto ao porto. Estudos anteriores identificaram quais critérios eram usualmente utilizados

para a tomada de decisão dos diversos usuários de portos, mas não modelaram essa decisão de

forma a obter valores de utilização de terminais, como realizado nesse trabalho. A modelagem

dessa decisão por meio de lógica fuzzy revelou que os usuários dos portos dão uma importância

relativa 14 vezes maior ao critério distância no caso de movimentação de contêineres e 9 vezes

maior nas movimentações de carga geral, quando comparadas aos outros critérios definidos:

tempo de fila nos terminais, frequência de armadores, custo e centralidade do porto. Essa maior

importância da distância para cargas conteinerizadas pode ser explicada pelo usual maior valor

agregado desse tipo de carga. A tentativa de minimização dos custos de estoque em trânsito

atingem mais as cargas em contêineres, o que por consequência revela a maior importância

relativa da distância ao porto de embarque/desembarque das produtos.

Uma derivação desse achado é a realocação das cargas portuárias dada sua origem/destino

nacional, o que impacta na necessidade de aumento ou diminuição de capacidade nos terminais

portuários. O estudo revelou que o porto de Santos por exemplo possui grande preferência pelos

usuários tanto de contêineres quanto de carga geral dado os critérios de decisão. Um aumento

de capacidade de 300 TEUs para movimentação de contêineres e 20MM de toneladas para carga

geral ao ano se faz necessária para satisfazer decisões ótimas dos usuários. Por outro lado,

45

alguns portos estão sendo utilizados excessivamente, com boa margem para uma redução em

sua capacidade de movimentação anual. É o caso do porto de Itajaí, que poderia sofrer uma

redução de 250 TEUs anual para operações de contêineres e do porto de Paranaguá para o caso

de carga geral em 20MM de toneladas ao ano. Essas conclusões são de importância

considerável para autoridades portuárias brasileiras, uma vez que a maior parte dos portos

analisados são públicos e recebem investimentos governamentais para suas expansões.

Outro achado importante desse estudo é a respeito da competição portuária nacional. No âmbito

geral, os 46 portos analisados formam uma rede de competição com densidade 0,70, ou seja,

com 70% de ligações competitivas entre elas considerando o total possível, onde cada porto

compete em média com outros 31 portos. Estudos futuros podem avaliar uma possível forma

de redução desse cenário competitivo, onde determinados portos fiquem responsáveis pela

movimentação de determinada categoria de produtos em detrimento de outras.

Ainda a respeito do cenário competitivo, uma conclusão desse estudo sugere que a competição

por cargas conteinerizadas é maior que a por cargas não-conteinerizadas já que há uma maior

padronização de equipamentos de movimentação nos terminais para o caso de contêineres.

Apesar de haver um menor número de terminais que movimentam contêineres quando

comparados aos de carga geral, a densidade dessa competição de cargas conteinerizadas é

consideravelmente elevada comparando-se às de cargas gerais. Todavia, uma análise do setor

de fármacos sugere que segmentos de produtos de alto valor agregado e baixo volumes, mesmo

que movimentados em contêineres, tendem a ter níveis de competição menores.

Essa análise setorial sugere ainda a existência de diferentes classificações de segmentos

considerando atributos de densidade competitiva e número de portos. O agrupamento dos

setores através da técnica k-means revelou 2 grandes grupos de segmentos com características

similares de operação. De um lado setores, que são movimentados por poucos portos mas que

sofrem uma intensa competição por cargas, como vidros e cerâmicas, possuem sua cadeia de

46

produção mais conectada e concentrada, não fazendo sentido a utilização de portos mais

distantes. De outro lado, setores que são movimentados por um número maior de portos e ainda

com uma intensa competição entre eles, como agribusiness e eletroeletrônicos, possuem

normalmente um maior volume e/ou uma especificidade baixa de requisitos de movimentação,

usualmente com alto percentual de utilização de contêineres.

Duas limitações do estudo devem ser apontadas. Primeiro, os dados são restritos a todas as

movimentações portuárias apenas do ano de 2011, não se podendo determinar caso tenha sido

um ano atípico ou não de movimentações portuárias no país. E segundo, outros critérios

identificados em outros estudos (Malchow & Kanafani, 2004; Lirn et al., 2006; Ugboma et al.,

2006; Yeo et al., 2011) como influentes na decisão de utilização de portos pelos usuários não

foram utilizados por falta de acesso a dados.

De toda a forma o pioneirismo do trabalho deve ser ressaltado. A união de técnicas de análise

de redes sociais e lógica fuzzy para retratar a situação atual e ainda propor melhorias ao sistema

portuário brasileiro é algo inovador e de grande importância para autoridades portuárias,

usuários, armadores, operadores de terminais e freightforwarders.

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