bandidos e mocinhos

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16 OPINIÃO A GAZETA QUINTA-FEIRA, 15 DE MAIO DE 2014 FOTO: PROJETO ACERVO DIGITAL / WWW.AGENCIAAG.COM.BR AS CAUSAS DO MAL-ESTAR NOSSA OPINIÃO Dilma admite “mal-estar” do país com a inflação. Mas crescimento baixo e rombo nas contas externas também incomodam muito S erá muito bom para o país se for transformada em fato real a ex- pectativa da presidente Dilma Rousseff sobre 2015. Ela disse que “o Brasil não vai explodir, vai é bombar”. Tomara. Mas, se ela não explicar por que o Brasil vai “bombar”, cenário que o mundo econômico não enxerga no momento, o otimismo presi- dencial não terá crédito. Quanto ao termo “ex- plodir” é referência à inflação altíssima. No mesmo discurso, a própria presidente reconhe- ceu o que seria impossível negar: “Não está tu- do bem” (com a inflação); existe “um mal-es- tar” em relação aos preços. Haja “mal-estar”. E não é de hoje. Há quatro anos consecutivos o índice oficial de inflação, o IPCA, está muito acima da meta de 4,5% e, se- gundo expectativa generalizada, continuará assim em 2015, o quinto ano fora do eixo. A indexação e a inércia inflacionária não permi- tem a desaceleração imediata das remarca- ções. E o governo continua a alimentar pres- sões inflacionárias, com excesso de gastos. Fal- ta a presidente anunciar que medidas serão to- madas para recuar o IPCA. Ademais, o “mal-estar” citado pela presidente nãoserestringeàinflaçãoelevadíssima.Émuito mais amplo. Incomodam muito o crescimento encruado do PIB, desde o início do atual gover- no, a condução fiscal do país por meio da ma- quiagem de resultados, o déficit na balança co- mercial e o rombo recorde nas contas externas, US$25bilhõesnotrimestre,agravadoporavan- ços de importações e quedas nas exportações. Apesar de todos esses senões, não é crível que o país vá “explodir”. Afinal, mesmo malcuida- da, como agora, a base macroeconômica ali- cerçada com o Plano Real é sólida. No entanto, independentemente de quem seja o presiden- te, o próximo período de governo terá de es- trear sob ajuste financeiro e fiscal no setor pú- blico, visando a conter o descaminho da eco- nomia. É condição essencial para combater a deterioração da economia e – quem sabe? – o país pensar em bombar. Talvez em 2016. EU DIGO QUE... É necessário ensinar onde, como e com quem usar drogasCarl Hart Neurocientista americano, ex-traficante e usuário de drogas, defendendo a descriminalização das drogas “O meu entendimento, a minha manifestação, foi de que, se há oferta digna de emprego e condição de ressocialização, ele tem direito a trabalho externoRodrigo Janot Procurador-geral da República, defendendo o direito de o ex-ministro José Dirceu de deixar o presídio para trabalhar Bandidos e mocinhos Matheus Albergaria de Magalhães É economista e professor da Fucape Business School E-mail: [email protected] A inflaç ão é importante para os economistas porque acaba refletindo mudanças (muitas vezes negativas) nos padr ões de vida das pessoas Os economistas, quando calculam o custo de vida da população, costumam brincar que alguns bens e serviços po- dem ser vistos como os “bandidos” da cesta básica, ao passo que outros podem ser vistos como os “mocinhos”. Ao fa- zerem esta brincadeira, estão querendo dizer que, enquanto que alguns itens são os principais responsáveis pela alta de preços registrada no período (os chamados “bandidos”), outros são res- ponsáveis pela redução (“mocinhos”). Ainda assim, há bens e serviços que não são vistos necessariamente desta ma- neira, uma vez que seus preços passam por reajustes periódicos, embora pouco frequentes. Em termos gerais, as con- sequências destas variações nos preços é que, uma vez que são utilizados índices correspondentes à média das variações, são observadas maiores ou menores os- cilações em um período, por conta do comportamento de itens específicos. Mas, afinal, por que tamanha preo- cupação com a inflação? Em poucas palavras, a inflação é importante para os economistas porque acaba refletindo mudanças (muitas vezes negativas) nos padrões de vida dos habitantes de uma localidade. Assim, quando o valor men- sal das compras de supermercado de uma família aumenta, sabemos que, caso seus rendimentos sejam mantidos constantes, ela acaba perdendo poder de compra. Ou seja, pequenas variações nos preços podem vir a exercer con- sideráveis efeitos sobre o padrão de vida das famílias. Recentemente, venho tendo a opor- tunidade de trabalhar com um exce- lente grupo de alunos da Fucape Bu- siness School, no Centro de Estudos e Análises Econômicas (Ceae). Basica- mente, o Ceae realiza, todos os meses, uma extensa coleta direta de preços de bens e serviços relacionados ao custo de vida na Grande Vitória. A partir da tabulação e análise dos dados coletados são construídos indicadores relaciona- dos a diferentes cestas de alimentos. Assim, são calculadas quatro cestas dis- tintas, denominadas “padrão”, “vege- tariana”, “light” e “top”, que buscam refletir a diversidade de gostos e pa- drões de vida existentes na sociedade. Mais do que identificar potenciais “bandidos” ou “mocinhos” da cesta bá- sica, a equipe do Ceae busca com- preender a dinâmica subjacente às va- riações de preços ocorridas para bens e serviços específicos, atentando para possíveis maneiras de melhorar as con- dições de vida da população local. No final das contas, independentemente do comportamento dos preços de de- terminados itens, é a inflação que deve ser vista como a grande “vilã” da vida moderna. HÁ 50 ANOS agazeta.com.br Presidente do Conselho de Administração: CARLOS FERNANDO LINDENBERG FILHO Diretor-Geral da Rede Gazeta: CARLOS FERNANDO LINDENBERG NETO | Diretor Executivo de Mídia Impressa: ÁLVARO MOURA | Diretor Comercial de Mídia Impressa: FÁBIO RUSCHI | Diretor de Mercado Leitor e Logística: RANIERI AGUIAR Senador Eurico Rezende condena ato contra o jornal A GAZETA O senador Eurico Rezende não esconde sua estupefação frente ao edital, recentemente baixado pela Comissão Aplicadora do Ato Institucional, pelo qual se intimou o diretor deste jornal a tomar providências no sentido de se apresentar àquele órgão o redator de uma notícia divulgada. Acha o representante capixaba que o primeiro ato da Comissão levado para as colunas dos jornais foi “infeliz e violador da lei”.

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Matheus Albergaria de Magalhães - A Gazeta (Seção Opinião), p.16, 15 de Maio de 2014.

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Page 1: Bandidos e Mocinhos

16 OPINIÃOA GAZETA QUINTA-FEIRA, 15 DE MAIO DE 2014

FOTO: PROJETO ACERVO DIGITAL / WWW.AGENCIAAG.COM.BR

AS CAUSAS DOMAL-ESTAR

NOSSA OPINIÃODilma admite “mal-estar” do país

com a inflação. Mas crescimentobaixo e rombo nas contas externastambém incomodam muito

Será muito bom para o país se fortransformada em fato real a ex-pectativa da presidente DilmaRousseffsobre2015.Eladisseque“o Brasil não vai explodir, vai ébombar”. Tomara.

Mas, se ela não explicar por que o Brasil vai“bombar”, cenário que o mundo econômiconão enxerga no momento, o otimismo presi-dencial não terá crédito. Quanto ao termo “ex-plodir” é referência à inflação altíssima. Nomesmodiscurso,aprópriapresidentereconhe-ceu o que seria impossível negar: “Não está tu-do bem” (com a inflação); existe “um mal-es-tar” em relação aos preços.

Haja “mal-estar”. E não é de hoje. Há quatroanosconsecutivosoíndiceoficialdeinflação,oIPCA, está muito acima da meta de 4,5% e, se-gundo expectativa generalizada, continuaráassim em 2015, o quinto ano fora do eixo. Aindexação e a inércia inflacionária não permi-tem a desaceleração imediata das remarca-ções. E o governo continua a alimentar pres-sões inflacionárias, com excesso de gastos. Fal-ta a presidente anunciar que medidas serão to-madas para recuar o IPCA.

Ademais, o “mal-estar” citado pela presidentenãoserestringeàinflaçãoelevadíssima.Émuitomais amplo. Incomodam muito o crescimentoencruado do PIB, desde o início do atual gover-no, a condução fiscal do país por meio da ma-quiagem de resultados, o déficit na balança co-mercial e o rombo recorde nas contas externas,US$25bilhõesnotrimestre,agravadoporavan-ços de importações e quedas nas exportações.

Apesar de todos esses senões, não é crível queo país vá “explodir”. Afinal, mesmo malcuida-da, como agora, a base macroeconômica ali-cerçada com o Plano Real é sólida. No entanto,independentemente de quem seja o presiden-te, o próximo período de governo terá de es-trear sob ajuste financeiro e fiscal no setor pú-blico, visando a conter o descaminho da eco-nomia. É condição essencial para combater adeterioração da economia e – quem sabe? – opaís pensar em bombar. Talvez em 2016.

EU DIGO QUE...

“É necessárioensinar onde,como e comquem usardrogas”—Carl HartNeurocientistaamericano,ex-traficante e usuáriode drogas, defendendoa descriminalizaçãodas drogas

“O meuentendimento,a minhamanifestação, foide que, se háoferta digna deemprego econdição deressocialização,ele tem direito atrabalho externo”—Rodrigo JanotProcurador-geral daRepública, defendendo odireito de o ex-ministroJosé Dirceu de deixar opresídio para trabalhar

Bandidos

e mocinhos

Matheus Albergaria de MagalhãesÉ economista e professor da Fucape Business SchoolE-mail: [email protected]

A inflação é importante para os economistasporque acaba refletindo mudanças (muitas vezesnegativas) nos padrões de vida das pessoas

Os economistas, quando calculam ocusto de vida da população, costumambrincar que alguns bens e serviços po-dem ser vistos como os “bandidos” dacesta básica, ao passo que outros podemser vistos como os “mocinhos”. Ao fa-zerem esta brincadeira, estão querendodizer que, enquanto que alguns itenssão os principais responsáveis pela altade preços registrada no período (oschamados “bandidos”), outros são res-ponsáveis pela redução (“mocinhos”).

Ainda assim, há bens e serviços que nãosão vistos necessariamente desta ma-neira, uma vez que seus preços passampor reajustes periódicos, embora poucofrequentes. Em termos gerais, as con-sequências destas variações nos preços éque, uma vez que são utilizados índicescorrespondentes à média das variações,são observadas maiores ou menores os-cilações em um período, por conta docomportamento de itens específicos.

Mas, afinal, por que tamanha preo-cupação com a inflação? Em poucaspalavras, a inflação é importante paraos economistas porque acaba refletindomudanças (muitas vezes negativas) nospadrões de vida dos habitantes de umalocalidade. Assim, quando o valor men-

sal das compras de supermercado deuma família aumenta, sabemos que,caso seus rendimentos sejam mantidosconstantes, ela acaba perdendo poderde compra. Ou seja, pequenas variaçõesnos preços podem vir a exercer con-sideráveis efeitos sobre o padrão devida das famílias.

Recentemente, venho tendo a opor-tunidade de trabalhar com um exce-lente grupo de alunos da Fucape Bu-siness School, no Centro de Estudos eAnálises Econômicas (Ceae). Basica-mente, o Ceae realiza, todos os meses,uma extensa coleta direta de preços debens e serviços relacionados ao custo devida na Grande Vitória. A partir databulação e análise dos dados coletadossão construídos indicadores relaciona-dos a diferentes cestas de alimentos.Assim, são calculadas quatro cestas dis-tintas, denominadas “padrão”, “vege-tariana”, “light” e “top”, que buscamrefletir a diversidade de gostos e pa-drões de vida existentes na sociedade.

Mais do que identificar potenciais“bandidos” ou “mocinhos” da cesta bá-sica, a equipe do Ceae busca com-preender a dinâmica subjacente às va-riações de preços ocorridas para bens eserviços específicos, atentando parapossíveis maneiras de melhorar as con-dições de vida da população local. Nofinal das contas, independentementedo comportamento dos preços de de-terminados itens, é a inflação que deveser vista como a grande “vilã” da vidamoderna.

HÁ 50 ANOS

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Presidente do Conselho de Administração: CARLOS FERNANDO LINDENBERG FILHO Diretor-Geral da Rede Gazeta: CARLOS FERNANDOLINDENBERG NETO | Diretor Executivo deMídia Impressa: ÁLVAROMOURA | Diretor Comercial deMídia Impressa: FÁBIO RUSCHI | Diretor deMercado Leitor e Logística: RANIERI AGUIAR

Senador EuricoRezende condenaato contra ojornal A GAZETA

O senador EuricoRezende não esconde suaestupefação frente aoedital, recentementebaixado pela ComissãoAplicadora do AtoInstitucional, pelo qual seintimou o diretor destejornal a tomarprovidências no sentidode se apresentar àqueleórgão o redator de umanotícia divulgada. Acha orepresentante capixabaque o primeiro ato daComissão levado para ascolunas dos jornais foi“infeliz e violador da lei”.