bakhtin conceitos-chave introducao

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  • 7/31/2019 Bakhtin Conceitos-chave Introducao

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    IntroduoAlguns pilares

    da arquitetura bakhtinianaBeth Brait

    O livro, isto , o ato de fala imp resso, constitui igualmente um elemen to

    da comunicao verbal. Ele objeto de discusses ativas sob a forma de

    dilogo e, alm disso, feito para ser apreendido de maneira ativa, para

    ser estudado a fund o, comentado e criticado no quadro do discurso

    interior, sem contar as reaes impressas, institucionalizadas, que se

    encontram nas diferentes esferas da comunicao verbal (crticas,

    resenhas, que exercem influncia sobre os trabalhos posteriores etc.).

    Alm disso, o ato de fala sob a forma de livro sempre orientado em

    funo das intervenes anteriores na mesma esfera de atividade, tanto asdo prprio autor como as de outros autores: ele decorre portan to da

    situao particular de um problema cientfico ou d e um estilo de

    produo literria. Assim, o discurso escrito de certa maneira parte

    integrante de uma discusso ideolgica em grande escala: ele responde a

    alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e objees

    potenciais, procura apoio etc.

    Bak hti n /Voloshinov

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    BAKHTIN conceitos-chave

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    Bakht in e seu C rculo tm m erecido, nos ltim os anos, grande ateno

    por parte de diferentes reas do conhecimento. Esse fato pode ser constatado

    nas in meras tradues, nos incontveis ensaios int erpretat ivos e, especial-mente, na circulao de noes, categorias, conceitos advindos diretamente

    do pensamento bakht iniano, com ele aparentados ou, ainda, por ele motiva-

    dos. Esse arcabouo terico-reflexivo aparece, portanto, n o enfrentamento

    da linguagem, no apenas em reas destin adas a essa finalidade, caso dos es-

    tudos lingsticos e literrios, m as na transdisciplinaridade de campos como

    a educao, a pesquisa, a histria, a antropologia, a psicologia etc.

    Mesmo diante de tan tos trabalhos, de tantas pub licaes especializadas,

    ou justamente pela existncia delas, pareceu necessrio, a partir de um de-terminado momento, organizar uma publicao que, tendo um carter

    pon tual e indicativo, pudesse respon der a insistentes e constantes questes

    que dizem respeito maneira como conceitos, categorias e noes foram

    ganhando especificidade no conjunto dos trabalhos do Crculo e, ao mes-

    mo tempo, em que esse conjunto se aproxima ou se distancia de outras

    importantes abordagens da linguagem. Alm disso, uma obra desse teor

    deveria sugerir formas de como essa perspectiva poderia contribuir paraanlises e teorias que tenham nos textos e nos discursos, independente-

    mente de sua natureza verbal ou n o, um pon to de reflexo.

    A primeira idia creio que mais de uma vez sugerida por colegas e alun os e

    cobrada ao longo de cursos, palestras, simpsios , foi organizar um glossrio,

    um a espcie de dicionrio dos principais termos que sustentam a arejada e com-

    plexa arquitetura bakhtin iana. Aceito o desafio e assum ida a certeza de que a

    empreitada no poderia ser levada a cabo sem um consistente e aprofundado

    dilogo com as obras do Crculo e com assduos e reconhecidos leitores, lanceimo, inicialmente, de uma abertura acadmica existente no Programa de Ps-

    Graduao em Lingstica Aplicada e Estudos da Linguagem da PU C-SP que a

    existncia do Seminrio de Pesquisas. D urante vrios semestres (para no dizer

    alguns anos...) eu, meus orientandos, tanto da PU C-SP quando da U SP ,

    orientandos de outros professores e alguns convidados, realizamos discusses

    sistemticas e aprofundadas das obras de Bakhtin e seu Crculo, procurando, a

    part ir da, definir o que seria o glossrio, que termos o integrariam, em que or-dem apareceriam. D o grande grupo, alguns participantes constam deste volu-

    me: Adail Sobral, Paulo Rogrio Stella, Rosineide de Melo e W illiam Cereja.

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    Alm desses Seminrios de Pesquisa, tambm cursos e encon tros cient -

    ficos serviram para ampliar as discusses, na medida em que m ais pesquisa-

    dores foram sendo envolvidos. A presena de importantes pesquisadores daobra do C rculo, caso de Carlos Alberto Faraco, Irene M achado, Paulo Be-

    zerra e Valdemir M iotello, deve-se justamente a esses encontros.

    Com o passar do tempo, entretanto, a idia de um glossrio tradicional,

    constitu do por verbetes, foi descartada. Isso porque, por um lado, o mapa

    comeava a alcanar a dim enso do espao mapeado: um a infinidade de ter-

    mos, apontando uns para os outros, atraindo-se sem aceitar a condio de

    identidade exclusiva. H averia um verbete para signo ideolgico, outro para

    palavra? E para enunciado e enu nciao: um ou dois verbetes? A simplifica-o por m eio de textos curtos, precisos, impond o aos termos o estado de

    dicionrio acabou descaracterizada pela prpria natu reza de um pensamen-

    to aberto, afastado das amarras dos manuais, como o bakht iniano.

    Q ue fazer ento com uma idia to boa, com tanta pesquisa organiza-

    da, com tan tos ensaios esboados? A resposta este livro: um a coletn ea em

    que alguns termos essenciais compreenso da arqu itetura bakht iniana fo-

    ram trabalhados, funcionando como uma amostra dos pilares do edifcio.Assim, o que se organizou aqui foram ensaios, que embora apaream

    numa suposta ordem alfabtica, dada pelos termos que funcionam como

    ttulos, na verdade foram imaginados para constituir uma espcie de pri-

    meira viso de conjunto, respondendo, de certa forma, s perguntas que

    mais so feitas em relao s noes bakht inianas.

    N este conjunto, como se ver, esto contempladas concepes que atra-

    vessam as obras do Crculo e permitem compreender com maior proprie-

    dade, ou menor ingenuidade, alguns posicionam entos essenciais diante dalinguagem, da vida e dos sujeitos que a se insinu am e se constituem. C on-

    ceitos como ato, ativ idade, evento, autor, autoria, tica e estilo apontam para

    alguns lugares tericos ainda muito pou co estudados, mas que so impres-

    cindveis compreenso do todo. O utros, aparentemente simples por se-

    rem mais freqentemente lembrados e utilizados, como o caso depoli fon ia,

    palavra, tema, significao e mesmo enunciao, enunciado e gneros discursivos

    ganham, de alguma forma, uma dimenso que visa a, ao mesmo tempo,surpreend-los em suas especificidades e projet-los num mundo da verifi-

    cao analtica e interpretativa.

    Introduo BETH BRAIT

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    BAKHTIN conceitos-chave

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    Tambm foram escolhidos termos altamente problemticos, como o

    caso de fi losofias (e fi losofia) e ideologia. Sem um mergulho nessas guas

    profundas, diante das quais a maioria dos leitores recua mesmo sabendoque a reside um dos pilares mais fortes do pensamento bakhtiniano, essa

    obra n o teria sentido. Ao menos o sentido de poder in iciar leitores e, ain-

    da e especialmente, estimular o dilogo com conhecedores.

    Bak htin: conceitos-chave, pelas suas caractersticas de coletnea de ver-

    betes que se libertaram de amarras, se expandiram e possibilitam ver alm

    do que o ttulo anuncia, deve ganhar o mundo com uma abertura para o

    dilogo que pode ser sintetizada n a citao do trecho deM arxism o e fi loso-

    fia da linguagem que inicia esta in trod uo.