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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE CONSTRUÇÃO CIVIL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL ANNELISE NAIRNE SCHAMNE AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DE APLICAÇÃO DOS PRECEITOS DA LOGÍSTICA REVERSA DE RESÍDUOS SÓLIDOS AO SETOR DA CONSTRUÇÃO CIVIL EM CURITIBA, PARANÁ DISSERTAÇÃO CURITIBA 2016

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  • UNIVERSIDADE TECNOLGICA FEDERAL DO PARAN

    DEPARTAMENTO ACADMICO DE CONSTRUO CIVIL

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA CIVIL

    ANNELISE NAIRNE SCHAMNE

    AVALIAO DO POTENCIAL DE APLICAO DOS PRECEITOS DA

    LOGSTICA REVERSA DE RESDUOS SLIDOS AO SETOR DA

    CONSTRUO CIVIL EM CURITIBA, PARAN

    DISSERTAO

    CURITIBA

    2016

  • ANNELISE NAIRNE SCHAMNE

    AVALIAO DO POTENCIAL DE APLICAO DOS PRECEITOS DA

    LOGSTICA REVERSA DE RESDUOS SLIDOS AO SETOR DA

    CONSTRUO CIVIL EM CURITIBA, PARAN

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-

    Graduao em Engenharia Civil da Universidade

    Tecnolgica Federal do Paran, como requisito

    parcial para obteno do grau de Mestre em

    Engenharia Civil. rea de Concentrao: Meio

    Ambiente. Linha de pesquisa: Sustentabilidade.

    Orientador: Prof. Dr. Andr Nagalli

    CURITIBA

    2016

  • RESUMO

    SCHAMNE, Annelise N.. Avaliao do potencial de aplicao dos preceitos da logstica

    reversa de resduos slidos ao setor da construo civil em Curitiba, Paran. 2016. 156 f.

    Dissertao (Mestrado em Engenharia Civil) Programa de Ps-Graduao em Engenharia

    Civil, Universidade Tecnolgica Federal do Paran. Curitiba, 2016.

    Apesar da significativa representatividade do setor da construo civil na economia, o

    gerenciamento dos resduos slidos gerados pelo setor ainda um desafio na maioria dos

    municpios brasileiros. Os resduos da construo civil (RCC) so gerados nas atividades

    relacionadas construo, comrcio e indstria de materiais da construo civil. Estes

    resduos quando no recebem tratamento e destinao adequados alm de causarem impactos

    ambientais, afetam direta ou indiretamente a sade, segurana e o bem estar da populao,

    interferindo nas atividades sociais e econmicas e na qualidade dos recursos ambientais.

    Neste contexto, a logstica reversa vista como alternativa para gesto adequada dos resduos,

    quando bem planejada e executada. A logstica reversa est prevista na Lei no 12.305/2010,

    que trata sobre a Poltica Nacional dos Resduos Slidos (PNRS). No entanto, a implantao

    da logstica reversa ainda um desafio para alguns setores devido s dificuldades inerentes a

    este sistema e a falta de informaes quanto operacionalizao e regulamentao. Tendo em

    vista esta dificuldade, este trabalho tem como objetivo avaliar o potencial de aplicao dos

    preceitos da logstica reversa ao setor da construo civil na cidade de Curitiba e propor um

    modelo conceitual, destacando as responsabilidades dos principais participantes da cadeia

    produtiva da construo civil. Na primeira etapa da pesquisa, profissionais da construo civil

    foram selecionados para responder, com auxlio da tcnica Delphi, um questionrio,

    elaborado com base na reviso da literatura, a fim de selecionar critrios relevantes para

    compor o sistema de logstica reversa no setor da construo civil. Na primeira rodada Delphi

    os profissionais opinaram sobre a relevncia dos critrios escolhidos para compor o sistema

    de logstica reversa e na segunda rodada foi realizada a anlise multicritrio com auxlio do

    Processo de Anlise Hierrquica (AHP) a fim de ponderar e hierarquizar os critrios

    selecionados. Os resultados foram analisados na ferramenta BPMS AHP Excel e exportados

    por meio de grficos. Nesta etapa da pesquisa foi demonstrado que a aplicao do

    questionrio Delphi em conjunto com o AHP auxilia a tomada de deciso dos agentes da

    cadeia produtiva da construo civil. Os resultados apontam a importncia da relao

    colaborativa entre clientes e fornecedores na devoluo materiais e as possveis barreiras que

    podem dificultar a operacionalizao do sistema de logstica reversa no setor da construo

    civil como a falta de apoio do governo, conscientizao da populao e baixo incentivo para

    reutilizao de RCC. Na etapa da idealizao e elaborao do modelo conceitual, com o

    auxlio da ferramenta Free Mind, foi possvel destacar o potencial de aplicao dos preceitos

    da logstica reversa entre os principais agentes da cadeia produtiva da construo civil em

    Curitiba. O modelo proposto auxilia na compreenso do fluxo de materiais no sistema de

    logstica reversa e as responsabilidades de cada prestador de servio, na execuo das

    atividades relacionadas construo civil, incluindo o gerenciamento dos RCC, alm do

    cumprimento da PNRS e minimizao dos impactos ambientais.

    Palavras-chave: Resduos de construo e demolio. Sistema de logstica reversa. Processo

    de anlise hierrquica.

  • ABSTRACT

    SCHAMNE, Annelise N.. Evaluation of the potential application of the precepts of solid

    waste reverse logistics to the civil construction sector in Curitiba, Paran. 2016. 156 f.

    Dissertao (Mestrado em Engenharia Civil) Programa de Ps-Graduao em Engenharia

    Civil, Universidade Tecnolgica Federal do Paran. Curitiba, 2016.

    Despite the significant representativeness of the construction sector in the economy, the

    management of solid waste generated by the sector is still a challenge in most Brazilian

    municipalities. Construction and Demoliton Waste (CDW) is generated in activities related to

    the construction, trade and construction materials industry. The CDW when not properly

    treated and destined besides causing environmental impacts can affect directly or indirectly

    the health, safety and welfare of the population, interfering in social and economic activities

    and the quality of environmental resources. In this context, reverse logistics is seen as one of

    the alternatives for proper waste management, when well planned and executed. Reverse

    logistics is provided for in Law 12.305/2010, which deals with the National Policy on Solid

    Waste (NPSW). However, the implementation of reverse logistics is still a challenge for some

    sectors due to the difficulties inherent in this system and the lack of information regarding

    operationalization and regulation. In view of this difficulty, this paper aims to evaluate the

    potential of applying the reverse logistics precepts to the civil construction sector in the city of

    Curitiba and to propose a conceptual model, highlighting the responsibilities of the main

    participants in the civil construction production chain. In the first stage of the research,

    professionals of construction industry were selected to answer, with the help of the Delphi

    technique, a questionnaire elaborated based on the literature review, in order to select relevant

    criteria to compose a reverse logistics system to the civil construction sector. In the first round

    of Delphi, the participants decided on the relevance of the criteria chosen to compose the

    reverse logistics system and in the second round a multicriteria analysis was carried out with

    the aid of Analytic Hierarchy Process (AHP) in order to weight and hierarchize the criteria

    selected. The results were analyzed in the BPMS AHP Excel tool and exported through

    graphs. In this stage of the research it was demonstrated that the application of Delphi

    questionnaire in conjunction with the AHP helps the decision making of the agents of the civil

    construction productive chain. The results point out the importance of the collaborative

    relationship between customers and suppliers in the return of materials and possible barriers

    that may hinder the operation of the reverse logistics system in the construction sector, such

    as a lack of government support, population awareness and a low incentive to CDW reuse. In

    the stage of idealization and elaboration of the conceptual model, with Free Mind tool, it was

    possible to highlight the potential of applying the reverse logistics precepts among the main

    agents of the civil construction production chain in Curitiba. The proposed model assists in

    understanding the flow of materials in the reverse logistics system and the responsibilities of

    each service provider in the execution of activities related to civil construction, including the

    management of CDW, besides compliance with NPSW and minimization of environmental

    impacts.

    Keywords: Construction and demolition waste. Reverse logistics system. Analytic hierarchy

    process.

  • ANNELISE NAIRNE SCHAMNE

    AVALIAO DO POTENCIAL DE APLICAO DOS PRECEITOS DA

    LOGSTICA REVERSA DE RESDUOS SLIDOS AO SETOR DA

    CONSTRUO CIVIL EM CURITIBA, PARAN

    Dissertao aprovada como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre no Programa

    de Ps-Graduao em Engenharia Civil, Universidade Tecnolgica Federal do Paran

    UTFPR, pela comisso formada pelos professores:

    Orientador:

    _____________________________________________

    Prof. Dr. Andr Nagalli

    Departamento Acadmico de Construo Civil, UTFPR Cmpus Curitiba.

    Banca:

    _____________________________________________

    Prof. Dr. Alfredo Iarosisnki Neto

    Departamento Acadmico de Construo Civil, UTFPR Cmpus Curitiba.

    ________________________________________

    Prof. Dr. Generoso de Angelis Neto

    Departamento de Engenharia Civil, UEM Maring.

    Curitiba

    2016

    O termo de aprovao assinado encontra-se na Coordenao do Curso

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Total de RCC coletados no Brasil e Regies (t/dia) ................................................. 16 Figura 2: Hierarquia do sistema de gerenciamento de resduos ............................................... 17

    Figura 3: Destinao dos RCC gerados pelo pequeno gerador ................................................ 23 Figura 4: Caractersticas de gerao de resduos do grande gerador ........................................ 24 Figura 5: Ciclo do sistema de logstica reversa ........................................................................ 28 Figura 6: Ciclo de vida das edificaes .................................................................................... 40 Figura 7: Evoluo da logstica reversa no setor de embalagens de leos lubrificantes ......... 50

    Figura 8: Sistema de logstica reversa para leos, lubrificantes e suas embalagens ................ 51 Figura 9: Evoluo dos pontos de coleta de pneus inservveis no Brasil ................................. 58 Figura 10: Evoluo do volume de pneus inservveis coletados e destinados pela Reciclanip 59

    Figura 11: Sistema de logstica reversa de pneus ..................................................................... 60 Figura 12: Evoluo da logstica reversa no setor de embalagens de agrotxicos ................... 62 Figura 13: Planejamento de aplicao da tcnica Delphi ......................................................... 86 Figura 14: Estrutura hierrquica de tomada de deciso ............................................................ 87

    Figura 15: Matriz de critrios de deciso AHP ........................................................................ 91 Figura 16: Matriz de critrios de deciso AHP - Questo 5 ..................................................... 92

    Figura 17: Agentes da cadeia produtiva do setor da construo civil em Curitiba ................ 113 Figura 18: Fluxos diretos e reversos no sistema de logstica reversa do setor da construo

    civil ......................................................................................................................................... 114 Figura 19: Modelo de logstica reversa para o setor da construo civil em Curitiba ........... 116

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1: Classificao dos RCC conforme Resoluo CONAMA no 307/02 ....................... 18

    Quadro 2: Fatores geradores de RCC nos canteiros de obras................................................... 19

    Quadro 3: Iniciativas para auxiliar o gerenciamento dos RCC durante a obra ........................ 20 Quadro 4: Barreiras para aplicao da logstica reversa na Construo Civil .......................... 74 Quadro 5: Escala fundamental do AHP .................................................................................... 89 Quadro 6: Escala Saaty (1987) Segunda rodada Delphi........................................................ 90 Quadro 7: Exemplo de aplicao do AHP na 2 Rodada Delphi .............................................. 91

    Quadro 8: ndice Randmico .................................................................................................... 92 Quadro 9: Critrios excludos da prxima rodada de questionrios ......................................... 97 Quadro 10: Resultado da AHP da Questo 1 ........................................................................... 99

    Quadro 11: Resultado da AHP da Questo 2 ......................................................................... 100 Quadro 12: Resultado da AHP da Questo 3 ......................................................................... 101 Quadro 13: Resultado da AHP da Questo 4 ......................................................................... 102 Quadro 14: Resultado da AHP da Questo 5 ......................................................................... 103

    Quadro 15: Resultado da AHP da Questo 6 ......................................................................... 104 Quadro 16: Resultado da AHP da Questo 7 ......................................................................... 105

    Quadro 17: Resultado da AHP da Questo 8 ......................................................................... 106 Quadro 18: Resultado da AHP da Questo 9 ......................................................................... 107

    Quadro 19: Resultado da AHP da Questo 10 ....................................................................... 108 Quadro 20: Resultado da AHP da Questo 11 ....................................................................... 109 Quadro 21: Resultado da AHP da Questo 12 ....................................................................... 110

    Quadro 22: Resultado da AHP da Questo 13 ....................................................................... 112

  • LISTA DE SIGLAS

    ABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    ACV Anlise do Ciclo de Vida

    AHP Analytic Hierarchy Process - Processo de Anlise Hierrquica

    ANP Agncia Nacional do Petrleo

    ATT rea de Transbordo e Triagem

    CGLR Comit Gestor de Logstica Reversa

    CNI Confederao Nacional da ndustria

    CSCMP Council of Supply Chain Management Professional

    CTF Cadastro Tcnico Federal

    DVD Digital Versatile Disc

    EEE Eletroeletrnicos

    EPI Equipamento de Proteo Individual

    EPR Extended Product Responsability

    ETRMA European Tyre Rubber Manufactures Association

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    LCD Liquid Crystal Display

    LED Light Emitting Diode

    MCDA Multi Criteria Decision Analysis

    MTR Manifesto de Transporte de Resduos

    NBR Norma Brasileira

    NWMS National Waste Management Strategy

    PEAD Polietileno de Alta Desnsidade

    PGRCC Plano de Gerenciamento de Resduos de Construo Civil

    PNEA Politica Nacional de Educao Ambiental

    PNMA Poltica Nacional de Meio Ambiente

    PNRS Poltica Nacional de Resduos Slidos

    RCC Resduos de Construo Civil

    RCD Resduos de Construo e Demolio

    REEE Resduos Eletroeletrnicos

    RSU Resduos Slidos Urbanos

    SMMA Secretaria Municipal de Meio Ambiente

    SMU Secretaria Municipal de Urbanismo

    SPSS Statistical Package for Social Science

    UE Unio Europeia

    UTFPR Universidade Tecnolgica Federal do Paran

    VHS Video Home System

    WEEE Waste Electrical and Eletronic Equipament

    WSTATR Waste Statistic Regulation

  • LISTA DE ACRNIMOS

    ABILUMI Associao Brasileira de Importadores de Produtos de Iluminao

    ABINEE Associao Brasileira da Indstria Eltrica e Eletrnica

    ABRAFATI Associao Brasileira dos Fabricantes de Tintas

    ABRAMAT Associao Brasileira da Indstria de Materiais de Construo

    ABRELPE Associao Brasileira de Empresas de Limpeza Pblica e Resduos

    Especiais

    ANIP Associao Nacional da Indstria de Pneumticos

    CBIC Cmara Brasileira da Indstria da Construo

    CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente

    CREA-PR Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paran

    FIEP Federao das Indstrias do Estado do Paran

    IDHEA Instituto para o Desenvolvimento da Habitao Ecolgica

    INPEV Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias

    IPEA Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

    ISO International Organization for Standardization

    ONU Organizao das Naes Unidas

    PIB Produto Interno Bruto

    PNUMA Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente

    SEMA Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hdricos

    SIG Sistema de Informao Geogrfica

    SINDIRREFINO Sindicato Nacional da Indstria do Rerrefino de leos Minerais

    SINDUSCON-PR Sindicato da Indstria da Construo Civil do Paran

    STEP Solving the E-Waste Problem

    THOR Multicriteria Decision Aiding Hybrid Algorithm

    WRAP Waste and Resource Action Programme

  • SUMRIO

    1 INTRODUO .................................................................................................................. 10

    1.1 OBJETIVO GERAL ........................................................................................................... 12

    1.1.1 Objetivos especficos ...................................................................................................... 12

    1.2 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................... 12

    2 REVISO BIBLIOGRFICA .......................................................................................... 14

    2.1 RESDUOS DA CONSTRUO CIVIL ........................................................................... 15

    2.1.1 Gesto dos resduos da construo civil em Curitiba...................................................... 21

    2.2 LOGSTICA REVERSA .................................................................................................... 26

    2.2.1 Logstica reversa no setor da construo civil ................................................................ 32

    2.2.2 Logstica reversa no setor de eletroeletrnicos (EEE), pilhas e baterias ........................ 44

    2.2.3 Logstica reversa no setor de leos lubrificantes ............................................................ 49

    2.2.4 Logstica reversa no setor de lmpadas ........................................................................... 54

    2.2.5 Logstica reversa no setor de pneus ................................................................................ 56

    2.2.6 Logstica reversa no setor de agrotxicos ....................................................................... 61

    2.3 BARREIRAS NA APLICAO DA LOGSTICA REVERSA ....................................... 63

    2.3.1 Barreiras na aplicao da logstica reversa no setor da construo civil ........................ 67

    2.4 PRECEITOS DA LOGSTICA REVERSA NO SETOR DA CONSTRUO CIVIL ..... 74

    2.5 ANLISE DE TOMADA DE DECISO POR MULTICRITRIO .................................. 80

    3 METODOLOGIA ............................................................................................................... 83

    3.1 CARACTERIZAO DA REA DE ESTUDO ............................................................... 83

    3.2 APLICAO DO QUESTIONRIO DELPHI ................................................................. 84

    3.3 APLICAO DO PROCESSO DE ANLISE HIERRQUICA (AHP) .......................... 87

    3.4 MODELAGEM CONCEITUAL DO SISTEMA DE LOGSTICA REVERSA ................ 93

    4 RESULTADOS E DISCUSSES ..................................................................................... 94

    4.1 QUESTIONRIO DELPHI 1 RODADA .......................................................................... 94

    4.2 QUESTIONRIO DELPHI 2 RODADA ......................................................................... 98

    4.3 MODELO DE LOGSTICA REVERSA PARA O SETOR DA CONSTRUO CIVIL 113

    5 CONSIDERAES FINAIS E RECOMENDAES ................................................ 117

    REFERNCIAS ................................................................................................................... 119

    APNDICE A QUESTIONRIO DELPHI 1 RODADA ............................................. 137

    APNDICE B QUESTIONRIO DELPHI 2 RODADA ............................................. 145

  • 10

    1 INTRODUO

    Segundo a Cmara Brasileira da Indstria da Construo (CBIC), estima-se que o

    valor adicionado pela indstria da construo civil, em 2014, foi de 470,3 bilhes de reais,

    representando 8,5% do Produto Interno Produto (PIB) brasileiro. Deste percentual, o

    segmento da construo, responsvel pela autogesto, autoconstruo e construtoras que

    executam obras ou etapas de obras de engenharia, concentra a maior parcela da renda da

    cadeia produtiva da construo (65,2%), seguida pela indstria de materiais (12,2%) e do

    comrcio de materiais (9,5%). As outras atividades que compem a cadeia correspondem aos

    servios prestados construo civil por outros fornecedores (6,6%), prestao de servios no

    prprio setor (4,8%) e mquinas e equipamentos (1,7%). Os trs segmentos com maior

    percentual de participao na cadeia produtiva da construo civil determinam o ritmo de

    atividade dos demais elos da cadeia da construo e, consequentemente, influenciam no

    desenvolvimento do pas alm de impactar as atividades dos demais setores economia

    (ABRAMAT, 2007; CBIC, 2015).

    Apesar da significativa representatividade do setor da construo civil na economia

    brasileira, o gerenciamento dos resduos slidos gerados pelo setor ainda um desafio nos

    grandes centros urbanos. Segundo Boscov (2008), aproximadamente 67% dos resduos

    slidos urbanos (RSU) gerados no Brasil composto por Resduos da Construo Civil

    (RCC). Esta situao decorre da baixa eficincia do processo de gesto dos RCC o que acaba

    por propiciar tratamento e disposio inadequados dos resduos. Os RCC tambm so

    chamados de Resduos de Construo e Demolio (RCD), sendo esta denominao mais

    usual nas referncias internacionais (BOSCOV, 2008; NAGALLI et al., 2013).

    Boa parte dos resduos do setor da construo civil vem de perdas de materiais de

    construo nos canteiros de obras. Outras fontes geradoras so as demolies e as reformas

    que promovem eliminao de diversos componentes desde a fase de execuo at aps a vida

    til da edificao. Os resduos desta natureza alm de causarem impactos ambientais, tambm

    afetam direta ou indiretamente a sade, segurana e o bem estar da populao, interferindo

    nas atividades sociais e econmicas, na biota e na qualidade dos recursos ambientais

    (NAGALLI, 2014; ADJEI, 2016).

    Desde o surgimento do conceito de desenvolvimento sustentvel e da necessidade de

    garantir a preservao dos recursos naturais para as futuras geraes, iniciativas no mundo

  • 11

    todo comearam a ser estabelecidas, com o objetivo de disciplinar o gerenciamento dos

    resduos, principalmente dos RCC. A importncia do tratamento e destinao correta destes

    tipos de resduos refletida na otimizao da cadeia produtiva e diminuio dos impactos no

    ambiente (LU, YUAN, 2011).

    Neste contexto, a logstica reversa de resduos slidos vista como uma das

    alternativas para o gerenciamento adequado dos resduos, quando bem planejada e executada,

    e surge com o objetivo de agregar valor ao resduo gerado ou ento de disp-lo de forma

    correta.

    Desde que a logstica reversa foi determinada obrigatria, por meio da Lei no 12.305,

    de 02 de agosto de 2010, que instituiu a Poltica Nacional dos Resduos Slidos (PNRS),

    observada dificuldade por parte do setor produtivo em implantar sistemas de logstica reversa

    de qualidade. Concomitantemente no h regulamentao adequada do processo e fiscalizao

    suficiente por parte dos rgos ambientais, o que acarreta em prejuzos competitividade das

    empresas (BRASIL, 2010b; SOMBRIO et al., 2013; SCHAMNE, NAGALLI, 2016).

    No setor da construo civil, as atividades de logstica reversa configuram-se como

    iniciativas isoladas e no possuem grau de organizao necessrio para serem reproduzidas e

    ampliadas. Por esta razo, recomendvel que o setor da construo civil esteja preparado

    para o atendimento da legislao e modelagem dos sistemas de logstica reversa, considerando

    uma abordagem sistmica do fluxo reverso, identificando-se os obstculos e dificuldades a

    serem transpostos para a consecuo e aplicao s obras civis (BEIRIZ, 2010; SOBOTKA,

    CZAJA, 2015).

    Os modelos so estruturas interpretativas capazes de identificar as relaes de critrios

    em nveis diferentes, mostrando a interdependncia individual ou em grupo (GOVINDAN et

    al., 2009). Nos modelos de logstica reversa, especificamente, os critrios e objetivos devem

    estar bem definidos para que o modelo auxilie na tomada de deciso na hora do descarte dos

    materiais. necessrio que o modelo considere as etapas do processo produtivo e as possveis

    alternativas para o fluxo reverso, incluindo desmontagem, reciclagem, reutilizao,

    remanufatura e destinao final. A integrao da cadeia de fornecimento com a cadeia reversa

    permite um planejamento mais eficiente do modelo de logstica reversa, de forma a encontrar

    solues mais sustentveis, teis e rentveis para os participantes da cadeia produtiva do setor

    da construo civil (GOMES et al., 2008; TSENG, CHEN, 2016).

  • 12

    1.1 OBJETIVO GERAL

    O objetivo geral deste trabalho propor um modelo conceitual para aplicao da

    logstica reversa para resduos slidos no setor da construo civil, na cidade de Curitiba.

    1.1.1 Objetivos especficos

    Os objetivos especficos so:

    Obter informaes sobre as prticas de logstica reversa de resduos da construo

    civil utilizadas nos segmentos da construo, indstria e comrcio de materiais da

    construo civil;

    Avaliar o potencial de aplicao dos preceitos da logstica reversa de resduos da

    construo civil nos segmentos da construo, indstria e comrcio de materiais da

    construo civil;

    Selecionar critrios relevantes para o sistema de logstica reversa de resduos da

    construo civil, com base na opinio de especialistas, por meio da aplicao do

    Questionrio Delphi;

    Priorizar os critrios selecionados para compor o sistema de logstica reversa de

    resduos da construo civil a partir da aplicao da metodologia de anlise por

    multicritrios, Processo de Anlise Hierrquica (AHP);

    Estruturar um modelo conceitual de logstica reversa para gesto dos resduos da

    construo civil com base no fluxo de materiais na cadeia produtiva da construo

    e responsabilidades de cada prestador de servio, na execuo das atividades

    relacionadas construo civil.

    1.2 JUSTIFICATIVA

  • 13

    Segundo a PNRS, a responsabilidade compartilhada o conjunto de atribuies

    individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes,

    dos consumidores e dos titulares dos servios pblicos de limpeza urbana e de manejo dos

    resduos slidos para minimizar o volume de resduos gerados (BRASIL, 2010b).

    No setor da construo civil, a funo dos sistemas de logstica reversa estabelecer

    canais de reaproveitamento dos produtos e de RCC, integrando os agentes envolvidos em

    torno da questo da responsabilidade compartilhada por todo o ciclo de vida do produto. A

    implantao da logstica reversa contribui para melhor gerenciamento dos RCC, colaborando

    com o desenvolvimento sustentvel e com a minimizao dos impactos ambientais. A gesto

    adequada contribui para reduo da necessidade de grandes reas para destinao final dos

    resduos alm de conciliar o desenvolvimento econmico, social e ambiental, garantindo a

    preservao dos recursos para geraes futuras, premissa do desenvolvimento sustentvel

    (BEIRIZ, 2010).

    Com o avano das legislaes ambientais e dos estudos sobre gerenciamento de

    resduos slidos, espera-se que o Brasil evolua na aplicao de atividades relacionadas

    logstica reversa, propiciando crescimento do fluxo reverso nas cadeias produtivas e, em

    consequncia, o desenvolvimento de oportunidades empresariais e profissionais (LEITE,

    2009). Segundo Beiriz (2010), o fato de j existirem cadeias produtivas com sistemas de

    logstica reversa consolidada e em operao bem como legislao ambiental vigente, a

    tendncia que as demais cadeias produtivas, incluindo a construo civil, sejam afetadas

    pela preferncia dos clientes por novos requisitos logsticos como a logstica reversa.

    No entanto, apesar da importncia e aplicabilidade da logstica reversa, observa-se

    dificuldade por parte dos geradores de resduos do setor da construo civil em destinar

    corretamente estes resduos ou reutiliz-los em seus prprios processos produtivos, aplicando

    o conceito da logstica reversa. Este fato, aliado com o avano da legislao referente aos

    resduos slidos, deve ser fator preponderante para que sejam desenvolvidas ferramentas que

    auxiliem as empresas a melhorarem os processos de gerenciamento dos resduos na

    construo civil e que, ao mesmo tempo, cumpram com a legislao (LEITE, 2009; BEIRIZ,

    2010; NUNES et al., 2009).

    A utilizao de modelos de logstica reversa, como o modelo proposto nesta pesquisa,

    apoia a tomada de deciso dos gestores quanto destinao dos resduos gerados ao longo da

  • 14

    cadeia produtiva da construo civil alm de identificar as oportunidades de negcio

    disponveis nos canais reversos. Com a implantao de sistemas de logstica reversa, h

    promoo da competitividade entre empresas e da responsabilidade compartilhada pelo

    gerenciamento dos resduos, contribuindo na reduo dos impactos negativos causados

    sade humana e qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos (LEITE,

    2009; NUNES et al., 2009).

    Para os pequenos e grandes geradores de RCC na cidade de Curitiba, o modelo

    conceitual pode auxiliar no entendimento da logstica reversa e no cumprimento da PNRS.

    Para o setor pblico e privado, o modelo coopera no planejamento do sistema de logstica

    reversa na cidade, identificando as responsabilidades dos envolvidos na cadeia produtiva do

    setor da construo civil e oportunidades de atuao em benefcio do fluxo reverso dos

    mateiais. J para a rea acadmica, tanto o modelo quanto o mtodo de anlise de critrios

    contribui no desenvolvimento de pesquisas, produtos, metodologias e processos que otimizem

    o gerenciamento dos RCC e a implantao e operacionalizao da logstica reversa no setor

    da construo civil em Curitiba.

    2 REVISO BIBLIOGRFICA

  • 15

    2.1 RESDUOS DA CONSTRUO CIVIL

    Segundo a Poltica Nacional dos Resduos Slidos (PNRS), os resduos slidos so

    definidos como:

    Todo material, substncia, objeto ou bem descartado resultante de atividades

    humanas, nos estados slido ou semisslido, bem como gases, lquidos cujas

    particularidades tornem invivel o seu lanamento na rede pblica de esgotos e em

    corpos dgua. Os resduos slidos resultam de atividades de origem industrial,

    domstica, hospitalar, comercial, agrcola e servios de varrio (BRASIL, 2010b,

    p.3).

    A PNRS foi concebida tendo por fundamento sua operacionalidade a partir da

    articulao com outros instrumentos de polticas pblicas como a Poltica Nacional de

    Educao Ambiental (PNEA), regulada pela Lei n 9.795/99; Poltica Nacional de Meio

    Ambiente (PNMA), regulada pela Lei n 6.938/81 e a Lei de Crimes Ambientais, regulada

    anteriormente pela Lei 9.605/98. Na PNRS tambm esto dispostos os princpios, objetivos e

    instrumentos bem como as diretrizes relativas gesto integrada e ao gerenciamento dos

    resduos slidos, incluindo os perigosos. A PNRS apenas no se aplica aos rejeitos

    radioativos, que so regulados por legislao especfica (BRASIL, 1981; BRASIL, 1998;

    BRASIL, 1999; BRASIL, 2010b; SANTOS, SANTOS, 2014).

    Segundo dados do ltimo Panorama dos Resduos Slidos no Brasil, divulgado pela

    Associao Brasileira de Empresas de Limpeza Pblica e Resduos Especiais (ABRELPE), o

    total dos RSU gerados no pas em 2015 foi de aproximadamente 79,9 milhes de toneladas, o

    que representa um aumento de 1,7% em relao ao ano anterior. J o ndice de cobertura de

    coleta atingiu 90,8% do total de resduos gerados no Brasil em 2015 (ABRELPE, 2015).

    As alteraes na composio dos RSU so decorrentes da mudana de hbitos de

    consumo da populao, do aumento de produtos industrializados e popularizao de novos

    tipos de produtos. As novas conquistas no campo cientfico e tecnolgico, que por um lado

    favoreceram a populao com praticidade e menor custo, por outro lado aumentaram

    gradativamente o consumo dos mesmos, gerando produtos de difcil degradao e de maior

    toxicidade. Apesar de o Brasil possuir potencial para ganhos econmicos e ambientais com a

    reciclagem, estima-se que o pas perde R$ 8 bilhes por ano quando deixa de reciclar

    materiais reciclveis que so encaminhados para aterros e lixes nas cidades brasileiras

    (IPEA, 2010; BATISTA et al., 2013).

  • 16

    Segundo ABRELPE (2015), os municpios brasileiros geraram cerca de 45 milhes de

    toneladas de RCC em 2015, o que configura um aumento de 1,2% em relao a 2014. Deste

    total de RCC gerado em 2015, 123.721 toneladas de RCC foram coletadas por dia e

    correspondem s obras sobre responsabilidade dos municpios e o lanado em logradouros

    pblicos (Figura 1).

    Figura 1: Total de RCC coletados no Brasil e Regies (t/dia)

    Fonte: ABRELPE (2015)

    A partir da Figura 1, verifica-se que houve aumento na coleta de RCC em todas as

    regies do Brasil. Especificamente na regio Sul, em que 1.191 municpios foram avaliados,

    somando, aproximadamente, 30 milhes de habitantes, o total de RCC coletado em 2015 foi

    de 16.662 toneladas por dia, equivalente a 0,6 quilogramas de RCC coletado por habitante por

    dia (ABRELPE, 2015).

    As diretrizes, critrios e procedimentos para gesto dos resduos da construo civil

    esto estabeleicidas na Resoluo CONAMA no

    307, de 05 de Julho de 2002, posteriormente

    alterada pelas Resolues CONAMA no

    348/04; CONAMA no

    431/11; CONAMA no

    448/12

    e CONAMA no

    469/15. Segundo Art 2 da Resoluo CONAMA no

    307/02, os resduos da

    construo civil so aqueles:

  • 17

    Provenientes de construes, reformas, reparos e demolies de obras de construo

    civil, e os resultantes da preparao e da escavao de terrenos, tais como: tijolos,

    blocos cermicos, concreto em geral, solos, rochas, metais, resinas, colas, tintas,

    madeiras e compensados, forros, argamassa, gesso, telhas, pavimento asfltico,

    vidros, plsticos, tubulaes, fiao eltrica etc., comumente chamados de entulhos

    de obras, calia ou metralha (CONAMA, 2002, p.95).

    Na Resoluo CONAMA no

    307/02 ainda prescrito que os geradores devero ter

    como objetivo prioritrio a no gerao de resduos seguida pela reduo, reutilizao,

    reciclagem, tratamento dos resduos slidos e disposio final ambientalmente adequada dos

    rejeitos, como ilustrado na Figura 2 (CONAMA, 2002; CONAMA, 2004; CONAMA 2011;

    CONAMA, 2012a; CONAMA, 2015).

    Figura 2: Hierarquia do sistema de gerenciamento de resduos

    Fonte: Adaptado de Nagalli (2014)

    Devido diversidade de resduos gerados na construo civil, na Resoluo

    CONAMA no

    307/02 tambm est prescrita a classificao e as recomendaes para

    destinao adequada dos RCC, conforme apresentado no Quadro 1.

    Classificao dos RCC

    Classe Conceito Destinao

  • 18

    A

    Construo, demolio, reformas e reparos de

    pavimentao e de outras obras de infraestrutura,

    inclusive solos provenientes de terraplanagem; Reutilizao ou reciclagem

    na forma de agregados;

    Aterro de resduos Classe A.

    Construo, demolio, reformas e reparos de edificaes:

    componentes cermicos (tijolos, blocos, telhas, placas de

    revestimento etc.), argamassa e concreto;

    Processo de fabricao e/ou demolio de peas pr-

    moldadas em concreto (blocos, tubos, meios-fios etc.)

    produzidas nos canteiros de obras.

    B

    Resduos reciclveis para outras destinaes:

    Reutilizao, reciclagem;

    Armazenamento em reas

    temporrias para uso futuro.

    Plsticos, papel, papelo;

    Metais, vidros, madeiras;

    Gesso;

    Embalagens vazias de tintas imobilirias.

    C Resduos para os quais no foram desenvolvidas

    tecnologias ou aplicaes economicamente viveis que

    permitam sua reciclagem ou recuperao.

    Armazenamento, transporte,

    destinao em conformidade

    com as normas tcnicas

    especficas.

    D

    Resduos perigosos;

    Armazenamento, transporte,

    destinao em conformidade

    com as normas tcnicas

    especficas.

    Tintas, solventes, leos;

    Materiais contaminados ou prejudiciais sade, oriundos

    de demolies, reformas e reparos de clnicas

    radiolgicas, instalaes industriais, bem como telhas e

    demais objetos e materiais que contenham amianto ou

    outros produtos nocivos sade.

    Quadro 1: Classificao dos RCC conforme Resoluo CONAMA no 307/02

    Fonte: CONAMA (2002); CONAMA (2004); CONAMA (2011); CONAMA (2012a); CONAMA (2015).

    No Brasil, boa parte dos processos construtivos essencialmente manual e a execuo

    se d praticamente no canteiro de obras, onde gerada a maioria dos RCC que, alm de terem

    potencial de degradar o ambiente, tambm ocasionam problemas logsticos e prejuzos

    financeiros (NAGALLI, 2014). Por esta razo, Pucci (2006) recomenda que, medida que as

    etapas da obra sejam cumpridas, importante dispor de um local adequado para classificao

    dos RCC e separao dos materiais pertencentes prpria classe, contribuindo para que o

    gerenciamento dos RCC no canteiro de obras seja mais dinmico.

    Grande parte dos resduos da indstria da construo civil vem de perdas de materiais

    de construo nos canteiros de obras, durante a execuo dos projetos, demolies ou

    reformas, e posteriormente durante a utilizao ou aps o trmino da vida til da edificao

    (NAGALLI, 2014).

  • 19

    Nikmehr et al. (2015) identificaram que as principais causas de gerao de resduos de

    construo civil na capital do Ir, Teer, que possui, aproximadamente 10 milhes de

    habitantes e gera por ano em torno de 23 milhes de toneladas de RCC, esto associadas

    falta de conhecimento, conscincia e percepes equivocadas sobre o conceito de resduos e o

    valor dos materiais de construo. Os autores acreditam que o poder pblico pode contribuir

    diretamente na conscientizao e fiscalizao da indstria da construo civil, por meio da

    incluso de programas de treinamento de sustentabilidade em cursos obrigatrios para

    determinadas atividades dos profissionais, e para os demais agentes da cadeia produtiva,

    contribuindo no gerenciamento dos RCC.

    Para Ling e Nguyen (2013), apesar dos diferentes mtodos construtivos utilizados ao

    redor do mundo, estudos relacionados gerao de RCC mostram que alguns fatores

    geradores no mudam de um local para outro, principalmente entre pases emergentes. No

    Quadro 2, esto relacionados os principais fatores de gerao de RCC encontrados na

    literatura.

    Fatores geradores de RCC nos canteiros de obras

    Fator de gerao de RCC Autores

    Falta de habilidade e experincia dos

    trabalhadores da construo civil Ling e Nguyen (2013), Saez et al. (2013)

    Desperdcio de materiais resultante de erros de

    compra ou devido falta de planejamento da

    utilizao dos materiais durante a obra

    Osman et al. (2016), Ajayi et al. (2016), Fadiya

    et al. (2014)

    Transporte e armazenamento inadequados dos

    materiais de construo

    Najafpoor et al. (2014), Kourmpanis et al.

    (2008), Fadiya et al. (2014)

    Demolies frequentes resultante de retrabalhos e

    alteraes de projeto

    Sobotka e Czaja (2015), Ajayi et al. (2016),

    Fadiya et al. (2014), Ameh e Itodo (2013)

    Prevalncia de mtodos tradicionais de construo

    e demolio

    Lu et al. (2011), Saez et al. (2013), Zhang e

    Xiao (2015), Kourmpanis et al. (2008)

    Embalagem inadequada de materiais e

    componentes de construo

    Najafpoor et al. (2014), Saez et al. (2013),

    Fadiya et al. (2014)

    Falta de cultura para reaproveitamento de RCC ou

    utilizao de materiais reciclados Ajayi et al. (2016), Zhang e Xiao (2015)

    Baixa qualidade dos materiais e componentes

    utilizados

    Najafpoor et al. (2014), Fadiya et al. (2014),

    Ameh e Itodo (2013)

    Quadro 2: Fatores geradores de RCC nos canteiros de obras

  • 20

    Com base nos fatores de gerao de RCC apresentados no Quadro 2, possvel

    relacionar algumas iniciativas que podem ser adotadas durante a obra com o objetivo de

    auxiliar no gerenciamento dos RCC (Quadro 3).

    Iniciativas para auxiliar o gerenciamento dos RCC durante a obra

    Iniciativas para gerenciamento dos RCC Autores

    Dimensionar possveis alteraes de projeto Yuan (2013), Ajayi et al. (2015)

    Promover aes preventivas para reduo da

    gerao de RCC durante a obra

    Beldek et al.(2016), Saez et al. (2013), Ajayi et al.

    (2015), Zhang e Xiao (2015)

    Investir em tecnologias/metodologias para

    gesto dos RCC

    Wahi et al. (2016), Lu e Yuan (2012), Dahlbo et

    al. (2015), Ajayi et al. (2016), Ajayi et al. (2015)

    Criar regras para gesto dos RCC no

    canteiro

    Sobotka e Czaja (2015), Ajayi et al. (2015)

    Adoo de tecnologias de construo com

    baixa gerao de RCC

    Najafpoor et al. (2014)

    Dimensionar impactos para minimizao da

    gerao de RCC

    Tam e Tam (2006), Saidu e Shakantu (2016),

    Begum et al. (2006)

    Incentivar a reutilizao e reciclagem de

    materiais para manter a cultura de gesto dos

    RCC na organizao

    Tam (2008), Lu et al. (2011), Ajayi et al. (2015),

    Ajayi et al. (2016), Begum et al. (2006), Oyedele

    et al. (2014)

    Estabelecer pontos de coleta de RCC

    prximos aos locais de reaproveitamento

    Penteado et al. (2015)

    Capacitar os trabalhadores para

    gerenciamento dos RCC

    Lu et al. (2011), Saez et al. (2013)

    Quadro 3: Iniciativas para auxiliar o gerenciamento dos RCC durante a obra

    Ameh e Itodo (2013) identificaram que a falta de otimizao na utilizao dos

    materiais e gesto ineficiente dos RCC gerados no canteiro de obras pode elevar os gastos

    com a obra. Segundo os autores, a gesto dos RCC pode representar de 21 a 30% do custo

    total da obra. No Reino Unido, este valor pode representar, aproximadamente, 15% do custo

    total da obra, em Hong Kong at 11% e na Holanda, este valor pode chegar a 30% (LU et al.,

    2011; AMEH, ITODO, 2013).

    Nesta perspectiva, o incentivo otimizao da utilizao dos recursos e o

    gerenciamento adequado dos RCC contribui para reduo do custo da obra e melhora a

    imagem da empresa perante a preservao do meio ambiente. Segundo Begun et al. (2006), o

    valor economizado pode ser investido na promoo da poltica ambiental na empresa e na

  • 21

    conscientizao e treinamento dos empregados, a fim de promover prticas mais sustentveis

    no canteiro de obras e prevenir impactos negativos ao ambiente (BEGUN et al., 2006).

    Para Yuan (2013), os investimentos realizados durante o projeto auxiliam na

    promoo da gesto dos RCC entre os trabalhadores e contribui para melhores resultados no

    gerenciamento final da obra, seja no aspecto ambiental, social ou econmico.

    Um dos desafios da construo civil a informalidade caracterstica das atividades, o

    que dificulta a previso e o gerenciamento dos RCC, principalmente, em relao ao controle

    das deposies ilegais e das destinaes incorretas. No mbito social, o baixo grau de

    capacitao da mo de obra e do nvel tcnico-gerencial nas empresas construtoras outra

    caracterstica que pode contribuir para significativa gerao de RCC (BEIRIZ, 2010).

    Portanto, aes motivadoras que valorizem o servio realizado pelos trabalhadores e

    que contribuam para a formao profissional, como a aquisio de equipamentos,

    desenvolvimento e implementao de planos de gesto de resduos, treinamentos, contratao

    de servios de coleta e classificao dos resduos na prpria so vlidos e, consequentemente

    reduziro a quantidade de resduos gerados (YUAN, 2013).

    2.1.1 Gesto dos resduos da construo civil em Curitiba

    Na dcada de 1990, Curitiba recebeu da Organizao das Naes Unidas (ONU), o

    ttulo de capital ecolgica. Entre os programas de gesto de resduos slidos implantados, o

    Lixo que no lixo foi o programa de coleta seletiva que mais se destacou na poca e ainda

    est vigente na capital. O programa tem como base a coleta de resduos reciclveis e a

    promoo de campanhas educativas para a seleo dos resduos domsticos. Atualmente a

    cidade conta com servios de coleta pblica de resduos domiciliares, coleta de reciclveis

    alm de servios para coleta de resduos txicos, vegetais, produtos inservvel de madeira e

    entulhos (MIRANDA et al., 2014).

    Uma das ferramentas utilizadas no gerenciamento dos resduos o programa ou plano

    de gerenciamento de resduos slidos que abrange contedos relacionados ao planejamento,

    delimitao e delegao de responsabilidades, prticas, procedimentos, recomendaes

  • 22

    operacionais e recursos necessrios para a gesto dos resduos slidos em um

    empreendimento ou atividade (NAGALLI, 2014).

    Na construo civil, um dos instrumentos para implementao da gesto dos RCC o

    Plano Municipal de Gesto de Resduos da Construo Civil, que deve ser elaborado pelos

    Municpios e pelo Distrito Federal, em consonncia com o Plano Municipal de Gesto

    Integrada de Resduos Slidos (CONAMA, 2002).

    Em Curitiba, o Plano Integrado de Gerenciamento de Resduos da Construo Civil

    regulamentado pelo Decreto no 1.068/04 e tem por objetivo disciplinar o manuseio e

    disposio dos resduos produzidos nos canteiros de obras com a participao de toda cadeia

    produtiva, incluindo transportadores e reas de destinao final. Este plano integrado

    composto pelo Programa de Gerenciamento de Resduos da Construo Civil, direcionado aos

    pequenos geradores e pelo Projeto de Gerenciamento de Resduos da Construo Civil,

    direcionado aos grandes geradores de resduos (CURITIBA, 2004).

    O Programa de Gerenciamento de Resduos da Construo Civil elaborado e

    implementado pelo Municpio e nele esto estabelecidas diretrizes tcnicas e procedimentos

    para exerccio das responsabilidades dos pequenos geradores. Neste programa, so

    considerados pequenos geradores aqueles que produzem at 0,5 m de resduos, em perodo

    no inferior a dois meses, que devem ser separados em Classe A e C e dispostos no passeio,

    em frente ao local da obra. A coleta e o destino destes materiais so de responsabilidade da

    Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMMA). Caso a opo seja pela contratao de

    empresa de transporte de resduos, deve-se providenciar o Manifesto de Transporte de

    Resduos (MTR) (CURITIBA, 2004).

    Os geradores que geram quantidade mxima de 2,5 m de RCC, em intervalo no

    inferior a 2 meses, tambm devem separar os resduos em Classe A e C e encaminh-los aos

    locais de recebimento ou transbordo designados pelo municpio (Figura 3).

  • 23

    Figura 3: Destinao dos RCC gerados pelo pequeno gerador

    Fonte: Curitiba (2004)

    O municpio de Curitiba tambm responsvel pela coleta dos resduos da Classe B na

    quantidade de 0,6 m por semana. J os resduos da Classe D, considerados perigosos, so

    encaminhados coleta especial de resduos txicos do prprio municpio (CURITIBA, 2004).

    Os Projetos de Gerenciamento de Resduos da Construo Civil so de

    responsabilidade dos prprios geradores e tem como objetivo estabelecer os procedimentos

    necessrios para o manejo e destinao ambientalmente adequada dos resduos (Figura 4).

  • 24

    Figura 4: Caractersticas de gerao de resduos do grande gerador

    Fonte: Curitiba (2004)

    Conforme ilustrado na Figura 4, em obras menores que 70 m, com gerao acima de

    0,5 m de RCC, o gerador precisa assinar MTR emitido pelo transportador ou no caso de

    transporte prprio, os resduos devero ser previamente separados e encaminhados para reas

    devidamente licenciadas.

    Os geradores cujas obras possuam rea construda superior a 70 m e inferior a 600 m

    ou remoo de solo acima de 50 m preenchem um formulrio especfico na Secretaria

    Municipal de Urbanismo (SMU) ou na Secretaria Municipal Meio Ambiente (SMMA), na

    ocasio da obteno do alvar de construo, reforma, ampliao e demolio ou do

    licenciamento ambiental. Por fim, nas obras que excedam 600 m de rea construda ou

    demolio acima de 100 m, deve-se apresentar o Projeto de Gerenciamento de Resduos da

    Construo Civil (PGRCC) para ser aprovado. Ficam isentos da apresentao deste projeto os

    geradores cujas obras sejam inferiores a 600 m de rea construda ou inferiores a 100 m no

    caso de demolio (CURITIBA, 2004).

    Os incentivos para utilizao de RCC na cidade de Curitiba iniciaram com Decreto n

    852/07, em que foi estabelecida obrigatoriedade na utilizao de agregados reciclados

    oriundos de resduos slidos da construo civil classe A, em obras e servios de

  • 25

    pavimentao das vias pblicas contratadas pelo municpio. Posteriormente, por meio da

    Portaria n 008/12 da Secretaria Municipal de Meio Ambiente foram estabelecidos critrios

    de implantao de reas de transbordo e triagem (ATT) no municpio (CURITIBA, 2007;

    CURITIBA, 2012).

    Segundo Miranda et al. (2014), a gesto dos RCC em Curitiba se caracteriza pela

    gesto corretiva e pouco inovadora. Embora o poder pblico tenha investido na implantao

    do Plano Integrado de Gerenciamento de Resduos da Construo Civil, por exemplo, no

    houve investimento em projetos de equipamentos urbanos para recebimento de materiais

    provenientes dos pequenos geradores, que correspondem parcela significativa dos RCC

    gerados no municpio.

    O atual modelo de gesto de resduos de Curitiba ineficiente na medida em que no

    contempla a gesto preventiva com relao aos pequenos geradores e ainda apresenta diversos

    pontos de despejo irregular de RCC, principalmente nos bairros mais afastados e perifricos

    ao centro da cidade, o que dificulta a fiscalizao e o gerenciamento dos RCC (MIRANDA et

    al., 2014).

    Mann (2015) elaborou uma lista de verificao com base nas normas vigentes e

    modelos de certificaes ambientais com objetivo de investigar a conformidade tcnica e

    legal dos sistemas de gerenciamento de resduos de construo civil em Curitiba. A lista de

    verificao foi aplicada a 24 obras e os resultados indicam que, mesmo a gesto de resduos

    sendo obrigatria e imprescindvel para obteno do certificado de concluso de obra, a

    maioria dos sistemas de gesto adotados falha. Alm da falta de conscientizao e

    dificuldade no gerenciamento dos RCC, resultante do baixo ndice de treinamentos (17% das

    obras visitadas no realizam qualquer treinamento sobre gerenciamento dos resduos), as

    normas vigentes relacionadas gesto dos resduos so pouco conhecidas. No que diz respeito

    reutilizao e reciclagem de materiais no canteiro de obras nota-se que ainda so

    insuficientes, uma vez que pouco se reutiliza ou se recicla (MANN, 2015).

    Assim como a maioria dos municpios brasileiros o gerenciamento dos RCC em

    Curitiba ainda um desafio, porm a logstica reversa vem sendo estudada como ferramenta

    no gerenciamento dos resduos slidos. Portanto, nos prximos captulos ser explorado

    conceito, aplicaes, barreiras e preceitos da logstica reversa em diversos setores da

    economia, inclusive no setor da construo civil, com objetivo de melhorar o gerenciamento

    dos RCC.

  • 26

    2.2 LOGSTICA REVERSA

    Segundo Council of Supply Chain Management Professionals (CSCMP), a logstica

    faz parte do gerenciamento da cadeia de abastecimento com o objetivo de planejar, programar

    e controlar de maneira eficiente e eficaz o fluxo e o armazenamento de produtos, servios e

    informaes entre o ponto de origem e o ponto de consumo. A logstica vista como

    ferramenta capaz de aumentar a eficincia organizacional por meio da reduo dos custos

    operacionais, viabilizando os processos em toda cadeia de abastecimento. A logstica reversa,

    por sua vez, um segmento especializado da logstica voltado para retorno dos materiais ao

    ciclo produtivo aps venda e consumo. o caminho inverso da logstica (CSCMP, 2013).

    Para Rogers e Tibben-Lembke (1999) e Pucci (2006), a logstica reversa definida

    como processo de planejamento, implementao e controle eficiente e eficaz do fluxo de

    matria-prima, gerao do produto e embalagens, estoque at produtos acabados, ou

    informaes relacionadas desde o ponto de consumo at o ponto de origem com propsito de

    recuperar valor ou disp-lo de maneira correta.

    Para Leite (2009), a logstica reversa parte do processo da cadeia de suprimentos que

    planeja, implementa e controla de forma eficiente e eficaz o fluxo direto e reverso e o estoque

    de bens, servios e informaes entre o ponto de origem e o ponto de consumo com o

    propsito de atender aos requisitos dos clientes. Na logstica reversa valorizado o retorno

    dos produtos da destinao final para o ciclo de negcios, ou para disposio final adequada.

    J no Art 3 da PNRS, a logstica reversa definida como:

    Instrumento de desenvolvimento econmico e social caracterizado por um conjunto

    de aes, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituio dos

    resduos slidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em

    outros ciclos produtivos, ou outra destinao final ambientalmente adequada

    varrio (BRASIL, 2010b, p.3).

    Segundo Art. 33 da PNRS ficam obrigados a estruturar e implementar sistemas de

    logsitca reversa os participantes da cadeia produtiva dos agrotxicos, pilhas e baterias, pneus,

    leos lubrificantes e embalagens, lmpadas fluorescentes, produtos eletroeletrnicos e seus

    componentes, dentre outros (BRASIL, 2010b).

  • 27

    No Decreto n 7.404/10, no qual regulamentada a PNRS, esto definidos os

    ministrios e secretarias do governo envolvidas na aplicao da PNRS que devero compor o

    Comit Interministerial da Poltica Nacional de Resduos Slidos e o Comit Orientador

    (BRASIL, 2010a).

    Segundo Leite (2011), o Comit Interministerial (Art. 3) responder pela

    implementao da logstica reversa e o Comit Orientador (Art. 33) ter papel consultor na

    definio de metodologias, critrios e avaliao dos sistemas de logstica reversa

    apresentados. Ambos os comits tero a possibilidade de convidar representantes da

    sociedade empresarial e de entidades afins para discutir questes e criar corpos tcnicos

    especficos. Desta forma, as empresas alm de cumprirem a lei devem manter registros de

    todas as prticas ambientais realizadas, de forma a prestarem contas de suas aes ao poder

    pblico e sociedade.

    No referido Decreto n 7.404/10 explicitada a preocupao em definir com preciso

    os diversos sistemas de implantao e operacionalizao da logstica reversa que podero ser

    adotados no pas nos prximos anos pelas cadeias produtivas dos setores empresariais.

    Distinguem-se, portanto, no Art. 15, os seguintes instrumentos: os Acordos Setoriais,

    Regulamentos Expedidos pelo Poder Pblico e Termos de Compromisso (BRASIL,

    2010a; LEITE, 2011).

    O Acordo Setorial um ato contratual entre a cadeia produtiva (fabricantes,

    importadores, distribuidores ou comerciantes dos produtos e embalagens) que visa

    implementao da logstica reversa, sendo a iniciativa da prpria cadeia produtiva ou do

    Poder Pblico. Os acordos setoriais so considerados arranjos mais amplos que englobam

    uma gama maior de atores e setores da economia. O sistema Regulamento Expedido por

    Decreto do Poder Pblico uma iniciativa do governo e os Termos de Compromisso so

    acordos especficos que podem ser considerados casos de excees de acordos setoriais

    (LEITE, 2011; SANTOS, SANTOS, 2014).

    A incluso da logstica reversa na PNRS demonstra a importncia dada

    operacionalizao e equacionamento logstico deste retorno, revelando sua complexidade e

    tornando-a integrante dos diversos planos de resduos a serem editados pela federao,

    estados, municpios e pelas empresas envolvidas na gerao destes resduos (LEITE, 2009).

    Segundo Abdulrahman et al. (2014) e Pokharel e Mutha (2009), a logstica reversa vem

    se destacando devido ao aumento dos custos dos materiais, a escassez dos recursos naturais e

  • 28

    a percepo das consequncias das alteraes climticas, que levam a uma maior conscincia

    global sobre a preservao dos recursos. As empresas que almejam alcanar a sustentabilidade

    nos seus negcios passam a investir em prticas de logstica reversa como a reciclagem,

    reutilizao e adotam estratgias de gesto dos resduos a fim de ganhar vantagem

    competitiva e atender crescentes demandas locais nacionais e internacionais de proteo

    ambiental.

    O processo de logstica reversa revela-se como oportunidade de desenvolver a

    sistematizao dos fluxos de resduos, bens e produtos descartados, seja pelo fim da vida til,

    seja por obsolescncia tecnolgica, e reaproveitamento dentro ou fora da cadeia produtiva de

    origem. O ciclo do sistema de logstica reversa, conforme apresentado na Figura 5, viabiliza

    tcnica e economicamente a promoo da sustentabilidade na cadeia produtiva, minimizando

    os impactos ambientais e reduzindo a explorao dos recursos naturais (GUARNIERI et al.,

    2013).

    Figura 5: Ciclo do sistema de logstica reversa

    Fonte: Embalagem sustentvel (2010)

  • 29

    Segundo Leite (2009), para reduzir os custos no processo produtivo necessrio

    entender que a vida til do produto comea a ser contabilizada desde a extrao da matria-

    prima e fabricao do material at o descarte pelo consumidor. Entretanto, a vida til pode ser

    prolongada quando existe possibilidade de aumentar o tempo de utilizao do produto ou

    material, seja por meio da reinsero no processo produtivo ou na cadeia de consumo.

    Os meios pelos quais os materiais retornam ao ciclo produtivo ou de negcio,

    readquirindo valor econmico e ambiental so chamados de canais de distribuio reversos ou

    canais reversos, e esto inseridos na cadeia logstica da qual fazem parte fabricantes,

    atacadistas, distribuidores, varejistas e consumidores. Os canais reversos auxiliam na

    disponibilizao de produtos com rapidez, facilidade no fluxo de informaes e materiais,

    fortalecimento do potencial de vendas e na cooperao entre os participantes da cadeia de

    suprimentos, reduzindo os custos de forma integrada (GUINDANI, 2014).

    Para Leite (2009) e Guindani (2014), a maioria dos retornos dos materiais no sistema

    de logstica reversa ocorre aps o consumo ou aps a venda do produto, sendo que:

    Logstica Reversa Ps-Consumo

    Segundo Cavallazzi e Valente (2010), a logstica reversa de ps-consumo equaciona e

    operacionaliza o fluxo fsico e as informaes correspondentes de bens de consumo

    descartados pela sociedade, podendo retornar ao ciclo produtivo por meio de canais de

    distribuio reversos especficos. O objetivo de negcio desta rea da logstica agregar valor

    a um bem, produto ou material que, mesmo sem interesse de uso pelo proprietrio original,

    ainda possua condies de utilizao.

    O retorno dos materiais ps-consumo exige dos fabricantes e participantes da cadeia

    produtiva o comprometimento contnuo com a responsabilidade estendida dos produtos,

    conhecida como Extended Product Responsability (EPR). Na EPR as empresas fabricantes de

    produtos que agridem o ambiente so responsveis por seu descarte (LEITE, 2009).

    Segundo Guindani (2014), na logstica ps-consumo os bens, produtos ou materiais

    podem ser classificados, conforme a vida til, em trs categorias:

    a) Durveis: produtos com vida til, variando de alguns anos a algumas dcadas,

    como por exemplo, automveis, eletrodomsticos, eletroeletrnicos, mquinas e

    equipamentos industriais, edifcios de diversas naturezas, aeronaves, construes

    civis, barcos, entre outros.

  • 30

    b) Semidurveis: produtos com vida mdia, variando de alguns meses e raramente

    superior a dois anos, como baterias de automveis, leos lubrificantes, baterias

    de celulares, computadores, notebooks, tablets, entre outros.

    c) Descartveis: produtos de curta durao, variando de algumas semanas a seis

    meses, como por exemplo, embalagens, materiais para escritrio, suprimentos

    para informtica, artigos cirrgicos, pilhas e baterias de equipamentos

    eletrnicos, fraldas, jornais e revistas, entre outros.

    A maioria dos bens durveis e semidurveis utilizam o canal reverso de desmontagem

    e reciclagem industrial, sendo desmontados na etapa de desmanche e seus componentes

    reaproveitados ou remanufaturados, retornando ao mercado secundrio ou prpria indstria,

    sendo uma parte destinada reciclagem. No caso de descartveis, os produtos retornam por

    meio do canal reverso de reciclagem industrial, onde so reaproveitados e se transformam em

    matria-prima secundria, voltando ao ciclo produtivo, ou seguem para disposio final em

    aterros sanitrios, lixes ou incinerao e recuperao energtica (CAVALLAZZI,

    VALENTE, 2010).

    A revalorizao dos materiais ps-consumo operacionalizada pela logstica reversa

    contribui para soluo do problema da destinao de resduos, garantindo o retorno ao ciclo

    produtivo e de negcios, otimizando a utilizao dos recursos e a promoo do

    desenvolvimento sustentvel e da competitividade nas empresas (LEITE, 2009).

    Logstica Reversa de Ps-Venda

    Os bens, produtos ou materiais de ps-venda so aqueles que tiveram pouco ou

    nenhum uso e que o retorno se d por meio da prpria cadeia de distribuio. O objetivo do

    negcio nesta rea agregar valor a um produto que devolvido por razes comerciais, erro

    no processamento dos pedidos, garantia pelo fabricante, defeitos ou falhas de funcionamento,

    avarias no transporte, alcance da data de validade, estoques excessivos, devoluo de

    consignao, baixa qualidade ou defeitos. Estes ltimos muito comuns na comercializao de

    produtos pela internet, onde a taxa de devoluo de produtos, seja por algum defeito ou por

    insatisfao do cliente, caracteriza o retorno do produto cadeia de logstica reversa de ps-

    venda (LEITE, 2009; CAVALLAZZI, VALENTE, 2010).

    Uma caracterstica da logstica reversa de ps-venda equacionar as diversas

    possibilidades de coleta destes produtos que, dependendo do canal de distribuio original,

  • 31

    podero retornar dos consumidores finais para o varejista ou para o fornecedor; do varejista

    para o fabricante ou para o distribuidor atacadista; ou da empresa cliente para a empresa

    fornecedora, nos casos de canais de distribuio empresariais. Por mais que estes produtos

    retornem empresa fabricante de origem, o ideal que eles possam ser destinados a mercados

    secundrios de reformas, reciclagem de produtos e dos materiais constituintes, ou mesmo

    disposio final adequada (LEITE, 2009; GUINDANI, 2014).

    Segundo Leite (2009) e Cavallazzi e Valente (2010), o retorno dos bens, produtos ou

    materiais ps-venda pode ocorrer em trs situaes:

    a) Retornos comerciais por questes no contratuais: ocorrem, geralmente, por erro

    do fornecedor nas vendas diretas, vendas por meio de catlogos de produtos,

    comrcio eletrnico e erros na expedio na empresa.

    b) Retornos comerciais por questes contratuais: ocorrem quando h acordo prvio

    entre as empresas, especificamente relacionado aos prazos, quantidades

    negociadas, condies de armazenagem e estocagem, excesso de estoque no

    canal de distribuio, mercadorias em consignao, dentre outros.

    c) Retornos por garantia/qualidade: ocorrem devido falhas de funcionamento,

    defeitos gerais de fabricao e/ou montagem e avarias em embalagens ou mesmo

    aqueles que retornam devido ao trmino de validade do produto.

    Segundo Guarnieri (2013), entre as vantagens econmicas e financeiras da logstica

    reversa ps-consumo e ps-venda destacam-se o ganho obtido por meio da venda dos

    materiais descartados ao mercado secundrio e reduo dos custos com destinao, economia

    obtida com reutilizao e recondicionamento dos produtos. As vantagens ecolgicas esto

    relacionadas reduo do passivo ambiental e consequentemente, dos impactos gerados no

    ambiente alm da utilizao responsvel dos recursos, evitando-se desperdcios.

    No entanto, grande parte dos empreendedores d maior importncia produtividade e

    ao lucro e negligenciam o gerenciamento dos recursos naturais utilizados como matria-prima

    nos processos industriais, como tambm o gerenciamento dos resduos produzidos por eles.

    Por esta razo, preciso sensibilizar a populao a repensar as atuais atitudes e incentivar

    prticas de reciclagem e reutilizao para amenizar a problemtica dos resduos slidos. As

    empresas tambm devem aperfeioar seus processos, com oportunidades de reaproveitamento

    e reutilizao de insumos ou dos materiais descartados, a fim de reduzir os impactos

    ambientais, diminuindo os custos operacionais. Por mais que o objetivo de obter lucro

  • 32

    prevalea nas empresas, percebe-se que atitudes sustentveis, quando bem elaboradas, podem

    ser um diferencial competitivo (LEITE, 2002).

    Desta forma, espera-se que com a legislao vigente, os responsveis pela gerao e

    gesto dos resduos slidos percebam a importncia e a urgncia na implantao da logstica

    reversa em seus processos e promovam a responsabilidade compartilhada entre todos

    envolvidos na cadeia produtiva (GUARNIERI et al., 2013).

    No Brasil, os setores que esto mais avanados com relao aos sistemas de logstica

    reversa so os setores de pneumticos, leos lubrificantes e suas embalagens, e o setor de

    agrotxicos. Estes setores possuem acordos setoriais e termos de compromissos firmados e

    recebem apoio de entidades que facilitam a operao da logstica reversa no pas.

    Nos prximos captulos ser apresentado o panorama da logstica reversa no setor da

    construo civil e em outros setores da economia a fim de identificar quais aes vm sendo

    realizadas e possveis barreiras que podem dificultar o planejamento, implantao e

    operacionalizao dos sistemas de logstica reversa. A anlise do panorama e das barreiras

    para aplicao da logstica reversa ir auxiliar na seleo de critrios para compor o

    questionrio sobre sistema de logstica reversa na construo civil e na elaborao do modelo

    conceitual para gesto dos RCC em Curitiba.

    2.2.1 Logstica reversa no setor da construo civil

    Quando se fala em logstica reversa no setor da construo civil constata-se que no

    basta ter foco apenas nas construtoras. Os impactos do setor comeam antes mesmo da

    produo de qualquer material e se estendem durante e aps a vida til do empreendimento.

    Segundo o Guia CBIC de Boas Prticas em Sustentabilidade na Indstria da

    Construo, CBIC (2012), a cadeia produtiva da construo composta por:

    Construtoras, incorporadoras e prestadoras de servios auxiliares da construo,

    que realizam obras e edificaes;

    Segmentos da indstria que produzem materiais de construo;

    Segmentos do comrcio varejista e atacadista;

  • 33

    Atividades de prestao de servios, tais como servios tcnico-profissionais,

    financeiros e seguros.

    Portanto, antes de planejar o sistema de logstica reversa para o setor da construo

    civil necessrio analisar todos os participantes da cadeia produtiva. No modelo de logstica

    reversa, proposto por Sobotka e Czaja (2015), por exemplo, foram destacadas quais iniciativas

    poderiam contribuir para o desenvolvimento da logstica reversa no setor da construo e

    quais participantes da cadeia produtiva tem mais perfil para investir na iniciativa sugerida.

    Para os projetistas, por exemplo, os investimentos recomendados foram: seleo mtodos de

    demolio otimizados; utilizao de materiais que possam ser reaproveitados e projetos que

    facilitem a desmontagem. J o mestre de obras deve investir em metodologias que contribuam

    para estimativa qualitativa e quantitativa da gerao de RCC.

    A pesquisa indica os possveis investimentos necessrios para execuo de cada tarefa

    e o que deve ser contabilizado, de maneira a auxiliar o investidor participante na escolha da

    ao que seja mais benfica do ponto de vista social, econmico e ambiental (SOBOTKA,

    CZAJA, 2015).

    Beiriz (2010) props um modelo conceitual aplicado logstica reversa no setor da

    construo civil, considerando o ciclo de vida til de materiais e insumos alm de indicadores

    financeiros para estimar os custos de implantao de usinas de reciclagem e reas de

    transbordo e triagem. O modelo contribui para enfrentar os desafios ambientais associados ao

    crescimento exponencial da quantidade de resduos gerados pela indstria da construo,

    atualmente gerida com mtodos precrios de descarte e gesto.

    Yuan (2014), por sua vez, mostra algumas solues que vm sendo adotadas para

    melhorar o gerenciamento dos resduos de construo e demolio na cidade de Chongqing,

    na China. A pesquisa foi realizada com base em investigao in loco em seis empresas de

    construo civil da cidade para verificar o que vem sendo feito e quando aplicvel, introduzir

    os conceitos de logstica reversa e dos canais de distribuio reversa. De acordo com o autor,

    as indstrias investigadas apresentam as seguintes caractersticas:

    Dentro dos canais de distribuio direta, os fluxos de matria-prima envolvem

    grandes quantidades de areia, brita, cimento, peas de cermica, ao e outros

    materiais;

  • 34

    A maioria das reas de extrao da matria-prima esto distantes dos canteiros de

    obras, e como resultado, os custos de transporte de material influenciam

    significativamente os custos finais de construo;

    Nos canais de distribuio reversos, os maiores fluxos de materiais secundrios so

    os resduos de gesso, concreto, tijolo e cermica.

    Segundo Fu e Teng (2014), a China produziu cerca de 8 bilhes de toneladas de RSU

    em 2013, sendo 35% deste total resduos da construo civil, equivalente a 5,5 quilos de RCC

    gerado por habitante por dia. J na cidade de Chongqing, que tem aproximadamente 18

    milhes de habitantes, dos 6 milhes de toneladas de RCC gerados por ano, a maioria

    recolhida pelas autoridades pblicas e descartada em lixes ou aterros sanitrios (WU et al.,

    2016).

    Para minimizar a quantidade de RCC destinada para aterros e lixes Yuan (2014)

    recomenda que os centros de reciclagem em Chongqing estejam localizados prximos dos

    canteiros de obras e do mercado consumidor dos materiais processados, para que os custos

    com transporte sejam reduzidos. Por outro lado, a maioria das reas centrais so geralmente

    prximas de regies densamente povoadas, o que pode dificultar a construo de instalaes

    de reciclagem (YUAN, 2014).

    Segundo o estudo, as empresas de maior porte, com maior nmero de projetos, e que

    operam seu prprio centro de reciclagem, esto mais sujeitas fiscalizao devido grande

    quantidade de resduos gerados, porm a eficcia do processo de logstica reversa melhor. J

    nas empresas menores, o ndice de reciclagem menor pois a reciclagem dos resduos

    terceirizada. Esta opo pouco atrativa para os pequenos geradores, pois a maioria dos

    centros de reciclagem de resduos so afastados, exigindo gastos com transporte que no

    compensam, pelo pequeno volume gerado (YUAN, 2014).

    importante frisar que o sucesso dos centros de reciclagem dependem de alguns

    fatores como viabilidade destes centros para as autoridades pblicas, o que

    depende da continuidade e de volume de produo perto de capacidade planejada de

    operao. Deve-se atentar tambm, que a implantao e operao dos centros de reciclagem

    de RCC que recebem investimento da iniciativa privada podem no ser viveis, devido

    reduo do retorno sobre os investimentos. Como o uso de matria-prima reciclada ainda no

    generalizado em Chongqing, os investimentos em centros de reciclagem em larga escala

  • 35

    devem ser controlados e os gestores municipais devem investir mais em centros de reciclagem

    pblicos (FU, TENG, 2014).

    A fim de tornar os canais de distribuio reversos viveis e otimizar a reutilizao e

    reciclagem dos fluxos e atividades, deve-se definir os objetivos da rede inversa, ajustar o nvel

    de integrao ao tipo de rede que se deseja, caracterizar os tipos de RCC e definir o mercado

    final para o produto processado, localizar os centros de consolidao, desmontagem e

    manufatura e utilizar sistemas de medio e de informao para operaes de canais reversos

    (KAYNAK et al., 2014).

    O planejamento da rede reversa dos RCC pode ser motivado por aspectos econmicos,

    ecolgicos e/ou legais. Os aspectos econmicos incluem a possvel reduo no custo total da

    obra quando h planejamento na utilizao dos recursos, insero de matria-prima

    secundria e gerenciamento adequado dos resduos, otimizando gastos com coleta, transporte

    e destinao dos RCC. Os aspectos ecolgicos so compostos principalmente pela reduo

    dos impactos ambientais da extrao, transporte e processamento de recursos naturais alm da

    extenso da vida til dos aterros sanitrios. Para os aspectos legais, o mais importante o

    cumprimento da legislao e aprimoramento do sistema regulatrio (FU, TENG, 2014;

    OYEDELE et al., 2014; SOBOTKA, CZAJA, 2015).

    No entanto, os autores ainda afirmam que uma das dificuldades para atingir os

    benefcios da logstica reversa aplicada reciclagem dos RCC garantir a homogeneidade da

    composio e pureza dos materiais, o que no acontece na maioria das vezes. Como

    conseqncia, a reciclagem dos RCC geralmente limitada a reas como obras de

    pavimentao, obras de drenagem e de estabilizao de taludes ou margens de rios (FU,

    TENG, 2014; OYEDELE et al., 2014).

    No estudo de Ding e Xiao (2014) o fluxo de materiais foi utilizado para estimar a

    quantidade e composio dos RCC na cidade de Xangai, na China, a fim de avaliar o

    potencial de reciclagem dos resduos nesta regio. O mtodo para caracterizar os RSU

    utilizado desde a dcada de 1960 nos Estados Unidos e se baseia no clculo da quantidade de

    materiais necessrios execuo da atividade, construo de um edifcio, por exemplo, e prev

    o montante de RCC na sada. Para isto, no mtodo considerado o tipo de estrutura utilizada

    e quais materiais podem vir a gerar RCC durante a construo.

    Segundo Ding e Xiao (2014), aproximadamente 13,7 milhes de toneladas de RCC

    foram gerados em Xangai em 2012, uma mdia de 2 quilos de RCC gerados por habitante por

  • 36

    dia, sendo que mais de 80% deste total so resduos de concreto, tijolos e blocos. Do total,

    apenas 10% reciclado e o restante disposto em aterros. No estudo revelado que, com as

    novas polticas de urbanizao e mudanas nos mtodos construtivos, a maioria das fontes de

    gerao de resduos na cidade resultante das atividades de demolio. Entre os obstculos

    identificados para a reciclagem de RCC est a falta de conhecimento e confiana dos

    empreiteiros e gerentes de construo sobre os produtos reciclados, altos custos de transporte

    e baixa taxa de remoo dos resduos na cidade (DING, XIAO, 2014).

    Frequentemente as reas utilizadas para descarte ilegal esto localizadas prximo de

    reas sob a responsabilidade das autoridades pblicas. Uma estratgia, ento, seria utilizar

    estas reas ilegais como depsitos intermedirios de RCC, at que o material seja transportado

    para reas maiores, onde possa ser estabelecido um centro de reciclagem ou um aterro de

    inertes (DING, XIAO, 2014; FU, TENG, 2014).

    Segundo Hradil (2014), na Europa as atividades de construo e demolio

    representam por 40 a 50% do total de RSU gerados. A quantidade de RCC estimada em 460

    milhes de toneladas por ano, ou seja, 3 quilos por habitante por dia, excluindo os resduos de

    escavaes. Consequentemente, a demanda de energia para suprir as necessidades do setor

    alta, sendo que a maior parte dela consumida nos trs primeiros estgios do processo de

    produo: gerao de recursos, extrao de recursos e fabricao de produtos.

    Em 2008, o Parlamento Europeu publicou a verso revisada da diretiva sobre os

    resduos, que estabelece medidas para evitar os efeitos negativos da gerao de resduos e

    regras gerais para sua gesto. Na diretiva tambm estabelecido que no mnimo 70% dos

    RCC (em peso) devem ser preparados para reutilizao, reciclagem ou valorizao at 2020

    (HRADIL, 2014).

    A situao dos RCC na Unio Europeia (UE) retratada por Cabao (2009) e Schneider

    e Philippi Jr. (2004), mostra que h diferenas na gesto dos resduos nos pases em que a

    reciclagem de RCC uma prtica comum e em outros onde estas prticas esto no incio ou

    so praticamente inexistentes. Na Holanda, Blgica e Dinamarca, por exemplo, a taxa de

    reciclagem de RCC chega a 90% para resduos de concreto, cermicas, telhas e tijolos e a

    100% para resduos de asfalto. Os fatores que contribuem para promoo da reciclagem

    nestes pases so escassez de matria-prima, dificuldade em encontrar terrenos para aterros,

    medidas legais e econmicas, como cobranas elevadas para disposio em aterros.

  • 37

    Na Holanda, desde meados da dcada de 1980 so realizados testes e pesquisas para

    proceder aprovao e controle da utilizao do concreto e alvenaria reciclados como

    agregados. A partir de 1999, novos padres para a quantidade mxima de substncias

    perigosas contidas em materiais de construo foram determinados, com objetivo de

    minimizar os impactos ambientais causados pela lixiviao, seja na utilizao do material ou

    na reciclagem. As pesquisas no ramo da construo civil contriburam para alteraes na

    legislao holandesa ao longo dos anos, em benefcio da gesto adequada dos RCC.

    Atualmente, o agregado de concreto, que o constituinte principal dos RCC, deve representar

    mais de 95% do total do material e o agregado de alvenaria deve representar mais de 65% do

    total do material utilizado (SCHNEIDER, PHILIPPI JR, 2004; CABAO, 2009).

    A taxao da matria-prima oriunda das atividades de minerao tambm uma forma

    de estimular o uso de materiais provenientes dos RCC. Na Dinamarca a taxa sobre recursos

    naturais imposta s pedreiras; na Inglaterra so taxadas areia, cascalho e pedras e na Sucia

    as taxas so impostas desde a explorao dos bens minerais por escavao. Ainda na Sucia, o

    plano de gesto de resduos deve acompanhar a documentao para demolio da edificao,

    o qual deve ser aprovado pelas autoridades e estar descrita a destinao de cada um dos

    materiais resultantes (SCHNEIDER, PHILIPPI JR, 2004).

    Segundo dados divulgados pela Waste Statistic Regulation (WSTATR), a Blgica

    gerou no ano de 2012, aproximadamente, 7 milhes de toneladas de RCC, o equivalente 1,7

    quilos por habitante por dia, sendo que 90% dos RCC gerados foram reciclados (EUROPEAN

    COMMISSION, 2016). Cabao (2009) ainda destaca que na Blgica foi desenvolvida uma

    certificao voluntria para agregados reciclados, baseada em especificaes tcnicas

    estabelecidas pelas autoridades, o que contribui para o aumento de RCC reciclados.

    Na Dinamarca, a quantidade de RCC gerada por ano estimada em 8 milhes, cerca

    de 4 quilos de RCC por habitante por dia. Devido falta de inertes naturais e cobrana de

    preos exorbitantes para deposio dos RCC nos poucos aterros em operao na Dinamarca, a

    indstria da reciclagem teve que se desenvolver, aumentando o percentual de reciclagem e

    alcanando ndices prximos a 90% (CABAO, 2009; EUROPEAN COMMISSION, 2016).

    Na Finlndia, a quantidade estimada de RCC de 16 milhes de toneladas por ano,

    cerca de 8 quilos por habitante por dia. Na ustria, o total de RCC em 2013 chegou a 8,5

    milhes de toneladas, aproximadamente, 3 quilos por habitante por dia. A maioria dos RCC

    gerados nestes pases composta por fraes de concreto, cermica e telhas, sendo que,

  • 38

    aproximadamente, 77% so recuperados e 26% reaproveitados (HRADIL, 2014;

    EUROPEAN COMMISSION, 2016).

    Irlanda e a Itlia, que produzem, aproximadamente, 2 quilos de RCC por habitante por

    dia, possuem baixa taxa de reciclagem de RCC, com 6 e 9%, respectivamente. No entanto,

    com avano da legislao e a necessidade de diminuir a produo de resduos e de aumentar a

    utilizao de agregados reciclados, a tendncia que a taxa de reciclagem alcance maiores

    valores ao longo dos anos (CABAO, 2009; EUROPEAN COMMISSION, 2016).

    Na Espanha, em que a quantidade de RCC gerada por ano estimada em 27 milhes

    de toneladas, aproximadamente, 1,5 quilo por habitante por dia, a porcentagem de resduos

    reutilizados e reciclados no pas j chega a 43% (GANGOLELLS et al., 2014; EUROPEAN

    COMMISSION, 2016).

    No Reino Unido, a quantidade de RCC gerada por ano estimada em 110 milhes de

    toneladas, resultante de construes, demolies e excavaes, o que representa,

    aproximadamente, 60% do total de resduos gerados no Reino Unido, cerca de 5 quilos de

    RCC por habitante por dia (PAINE, DHIR, 2010; ADJEI, 2016; EUROPEAN

    COMMISSION, 2016).

    O crescimento da reciclagem dos RCC nos pases europeus foi possvel devido ao

    avano da legislao e de polticas de gesto de resduos. As iniciativas para adequao do

    gerenciamento dos RCC incluem a triagem obrigatria dos RCC e entrega em unidades de

    reciclagem, demolio controlada, taxao da matria-prima oriunda das atividades de

    minerao como forma de estimular o uso de materiais provenientes dos RCC, como tambm

    a oferta de subsdios financeiros para as unidades de tratamento (OYEDELE et al., 2014;

    ADJEI, 2016).

    Oyedele et al. (2014) verificaram que o desafio de incentivar a aplicao de materiais

    reciclveis nas atividades da construo cicil nem sempre fcil e que muitos fatores

    influenciam nesta tomada de deciso. Por mais que haja incentivos reciclagem de RCC em

    alguns pases, observa-se pouca preferncia por parte dos projetistas e empreiteiros em aplicar

    estes materiais reciclados na prpria obra (PAINE, DHIR, 2010; ADJEI, 2016).

    Segundo Ismam e Ismail (2014), uma das solues adotadas pelo governo do Reino

    Unido para melhorar as prticas na gesto de resduos foi a criao, em 2000, do Waste and

    Resources Action Programme , conhecido como WRAP. Neste modelo foram elencadas oito

    reas-chave que representam processos ou stakeholders importantes para compor um sistema

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    de gerenciamento de resduos. Em cada uma das reas-chave foram identificadas estratgias

    ou iniciativas que poderiam ser adotadas para otimizar a utilizao dos recursos e melhorar a

    eficincia da gesto dos resduos, independente do local de aplicao.

    Ismam e Ismail (2014) adaptaram o WRAP para o gerenciamento dos RCC e

    identificaram quatro medidas que o governo poderia adotar para incentivar e orientar os

    stakeholders no gerenciamento dos resduos: regulao, poltica, tecnologia e diretriz.

    Segundo os autores, as medidas estabelecidas contribuem para gesto estratgica dos RCC e

    atuam como mecanismos de fortalecimento do desempenho do governo no planejamento da

    gesto dos resduos.

    Com relao s embalagens na Europa, a base para reciclagem de resduos de

    embalagem est na diretiva 94/62/EC do Parlamento Europeu e no Conselho Europeu para

    Embalagens e Resduos de Embalagem, que regulamenta o uso de embalagens principalmente

    no setor agrcola e industrial (PERICOT et al., 2014).

    No entanto, Paneque et al. (2008) afirmam que a segregao e recuperao de

    embalagens para o setor da construo civil um processo um pouco mais complicado pelo

    fato de estarem misturados com outras categorias de RCC. Apesar disso, Llatas (2011) estima

    as seguintes categorias e porcentagens de resduos de embalagens que so encontradas nas

    construes: 70% de embalagens em madeira, 11% de embalagens de plstico, 5% de

    papelo, 5% de metlicas e 1% misturadas.

    Pericot et al. (2014) realizaram um estudo na regio do Mediterrneo, em

    aproximadamente 1.173 habitaes em construo, ocupando uma rea de 193.150 m2, com o

    objetivo de avaliar o padro da gerao de resduos de embalagem predominante nos canteiros

    de obras e os principais materiais responsveis pela gerao destas embalagens.

    Os resultados indicam que os resduos de madeira predominam nas etapas iniciais da

    construo, os resduos de plstico so constantes durante toda obra, e os resduos de papelo

    predominam no fim da construo, devido utilizao, em grande quantidade, de

    interruptores e tomadas que vem em embalagens de papelo.

    Inicialmente, os autores notaram que as medidas de incentivo implementadas pela

    empresa de construo para melhoramento da triagem dos resduos no prprio local, como

    treinamento em gesto de RCC, no foram satisfatrias e com baixos ndices de segregao.

    No entanto, aps a pesquisa, os autores acreditam que compreender o padro de produo de

    resduos benfico para adaptar as estratgias de gesto e para entender a natureza especfica

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    dos resduos de embalagem em cada estgio da obra, diminuindo desperdcios no canteiro e