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AULA 01 DIREITO PENAL PROF. ROGÉRIO SANCHES 27 de janeiro de 2012 RICARDO S. TORQUES 1 MATÉRIA INTRODUÇÃO Conceito O conceito de direito penal pode ser analisado sob o aspecto formal ou pelo aspecto sociológico. Sob o aspecto formal, Direito Penal é um conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a serem-lhes aplicadas. Sob o aspecto sociológico, Direito Penal é um instrumento do controle social de comportamentos desviados, visando à assegurar a necessária disciplina social. O direito penal é ramo do direito, entretanto, possui a consequência jurídica mais drástica, justificando o princípio da intervenção mínima. Além do conceito de direito penal é importante analisar a missão do direito penal. Na atualidade, a doutrina divide a missão do direito penal em duas: 1. mediata, que subdivide-se em: a. controle social; e b. limitação do poder de punir estatal (para evitar a hipertrofia da punição) – visa o respeito à dignidade da pessoa. Parece paradoxal essas duas alternativas, pois ao mesmo tempo que ele controla a sociedade, o direito penal deve ser pela sociedade controlado. Dito de outra forma, se de um lado o Estado, por meio do direito penal, controla o cidadão, impondo-lhe limites para a vida em sociedade; por outro, é necessário também que a sociedade limite o Poder Estatal de aplicar o direito penal, evitando a punição abusiva. 2. imediata – correntes diversas explicam esta missão: a. 1ª corrente: proteção de bens jurídicos (é o que defende Roxin); e b. 2º corrente: assegurar o ordenamento, a vigência da norma (é o que defende Jakobs). Atualmente, vem sendo mais aceita a corrente de Roxin, pela qual a missão imediata do direito penal é a proteção de bens jurídicos. • conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a serem-lhes aplicadas aspecto formal • um instrumento do controle social de comportamentos desviados, visando à assegurar a necessária disciplina social. aspecto sociológico

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AULA 01 – DIREITO PENAL – PROF. ROGÉRIO SANCHES

27 de janeiro de 2012

RICARDO S. TORQUES 1

MATÉRIA

INTRODUÇÃO

Conceito

O conceito de direito penal pode ser analisado sob o aspecto formal ou pelo aspecto sociológico.

Sob o aspecto formal, Direito Penal é um conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos

como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a serem-lhes aplicadas.

Sob o aspecto sociológico, Direito Penal é um instrumento do controle social de comportamentos desviados,

visando à assegurar a necessária disciplina social.

O direito penal é ramo do direito, entretanto, possui a consequência jurídica mais drástica, justificando o princípio

da intervenção mínima.

Além do conceito de direito penal é importante analisar a missão do direito penal. Na atualidade, a doutrina divide a

missão do direito penal em duas:

1. mediata, que subdivide-se em:

a. controle social; e

b. limitação do poder de punir estatal (para evitar a hipertrofia da punição) – visa o respeito à

dignidade da pessoa.

Parece paradoxal essas duas alternativas, pois ao mesmo tempo que ele controla a sociedade, o direito

penal deve ser pela sociedade controlado. Dito de outra forma, se de um lado o Estado, por meio do direito

penal, controla o cidadão, impondo-lhe limites para a vida em sociedade; por outro, é necessário também

que a sociedade limite o Poder Estatal de aplicar o direito penal, evitando a punição abusiva.

2. imediata – correntes diversas explicam esta missão:

a. 1ª corrente: proteção de bens jurídicos (é o que defende Roxin); e

b. 2º corrente: assegurar o ordenamento, a vigência da norma (é o que defende Jakobs).

Atualmente, vem sendo mais aceita a corrente de Roxin, pela qual a missão imediata do direito penal é a

proteção de bens jurídicos.

• conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a serem-lhes aplicadas

aspecto formal

• um instrumento do controle social de comportamentos desviados, visando à assegurar a necessária disciplina social.

aspecto sociológico

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Há, ainda, outras distinções doutrinárias pelas quais vamos passar rapidamente, em razão da menor exigências

concurso.

Uma delas...

Direito Penal Objetivo: conjunto de leis penais em vigor no país. Por exemplo, a Lei de Drogas, a Lei de

Crimes Hediondos fazem parte do direito penal objetivo.

Direito Penal Subjetivo: refere-se ao direito de punir do Estado.

É possível relacionar o direito penal objetivo com o direito penal subjetivo. De que adianta o conjunto de leis penais

sem a possibilidade de o Estado punir. Em razão disso, o direito penal objetivo é expressão do poder punitivo do

Estado. É possível, com isso, configurar a forma de punir do Estado, se ele é maximalista ou minimalista na punição

penal.

Além disso, é importante frisar, que o direito de punir é monopólio do Estado. Diante disso, pergunta-se: existe

hipótese em que o Estado tolera a aplicação de sanção penal por entes não estatais?

Poderíamos pensar na legítima defesa, mas ela não é um exemplo forma de punição, pois não há sanção penal; há

defesa entendida como legítima. O único caso possível está previsto no art. 57, Lei nº 6.001/63 – Estatuto do Índio –,

vejamos:

Art. 57. Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções

penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida

em qualquer caso a pena de morte (destaques nosso).

Adiantando, o Tribunal Penal Internacional – melhor estudado na próxima aula – também não é exceção à aplicação

de sanções penais pelo Estado.

Além disso, antes de prosseguir com as demais classificações, cumpre analisar alguns limites ao direito penal

subjetivo, são eles:

limite temporal: a prescrição, por exemplo;

limite espacial: sujeição ao princípio da territorialidade, nos termos do art. 5º, do CP; e

Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao

crime cometido no território nacional.

missão do direito penal

mediata:

controle social; e

limitação do poder de punir

do Estado.

imediata proteção de bens

jurídicos.

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limite quanto ao modo: sujeição a alguns princípio, como, por exemplo, o da dignidade da pessoa.

Outra classificação...

Direito Penal Substantivo: é sinônimo de Direito Penal Objetivo; e

Direito Penal Adjetivo: corresponde ao Direito Processual Penal.

Esta classificação é ultrapassada, existia na época em que o Processo Penal não era considerado ramo autônomo do

direito. Atualmente, não faz mais sentido.

Mais uma classificação...

Direito Penal de Emergência: utilizado para limitar ou derrogar garantias penais e processuais penais em

busca do controle da alta criminalidade. Por exemplo, Lei nº 8.072/90 – Lei dos Crimes Hediondos. Esse tipo

de direito penal nos passa uma sensação de segurança, por mais que possamos ser afetado algum dia.

Direito Penal Simbólico: não rara vezes, o legislador, pretendendo dar uma resposta rápida aos anseios

sociais, acaba criminalizando condutas sem qualquer fundamento criminológico e de política criminal,

cumprindo apenas uma função simbólica. Por exemplo, Lei das Palmadas; e

Direito Penal Promocional: ocorre quando o Estado utiliza as leis penais para consecução de suas

finalidades políticas, podendo violar o princípio da intervenção mínima. Por exemplo, utilização do Direito

Penal na reforma agrária. Outro exemplo seria a criminalização de condutas relacionadas com a utilização

inadequada de medicamentos, que poderia ser evitada por meio da atuação da Vigilância Sanitária

Direito Penal de Emergência:

limta ou derroga garantias penais processuais em busca do controle da alta

criminalidade (ex. Lei dos Crimes Hediondos);

Direito Penal Simbólico:

o legislador, pretendendo dar uma resposta rápida aos anseios da sociedade,

acaba criminalizando condutas sem qualquer fundamento criminológico e de política criminal, cumprindo apenas um

faunção simbólica (ex. Lei das Palmadas);

Direito Penal Promocional:

utilização de leis penais para a consecução de suas finalidade políticas

(criminalização de condutas relacionadas com a utilização inadequada de

medicamentos, que poderia ser evitada por meio da atuação da Vigilância

Sanitária)

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Fontes do Direito Penal

Fonte indica o lugar de onde vem e como se revela a norma penal. Notemos que o próprio conceito evidencia uma

primeira classificação das fontes:

“lugar de onde vem” indica a fonte material; e

“como se revela” é a fonte formal.

A fonte formal é onde existe a maior revolução do direito penal. Iniciaremos, entretanto, pela fonte material.

Como vimos, a fonte material nada mais é do que o órgão encarregado da criação do Direito Penal. Assim,

pergunta-se: qual a fonte material do Direito Penal? A União, conforme o art. 22, I, da CRFB:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho

(grifos nosso);

Todavia, cuidado com o art. 22, § único da CRFB, vejamos:

Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das

matérias relacionadas neste artigo.

Trazendo para nossos estudos: lei complementar poderá autorizar o estado-membro a legislar sobre questões

específicas do direito penal. Seria o exemplo de, em uma determinada região, que possui vegetação ímpar em

extinção, autorização federal por meio de lei complementar para que o estado-membro onde se insere aquela

vegetação legisle sobre direito penal para a proteção daquele ambiente.

A fonte formal é a fonte de conhecimento, de revelação. O importante em relação às fontes formais do direito

penal é o estudo de quais são as fontes formais do direito penal. Subdivide-se em duas:

1. a fonte formal imediata é a lei; e

2. a fonte formal mediata são os costumes e os princípios gerais de direito.

A lei e os princípios gerais de direito estudaremos adiante. Vamos analisar, hoje, os costumes.

Costumes

Pergunta-se: como se utiliza os costumes no direito penal? O costume não cria crime e não comina pena, em razão

do princípio da legalidade, mais precisamente o princípio da reserva legal.

Pergunta-se novamente: existe costume abolicionista, isto é, que revoga infração penal?

Antes de responder à questão, vamos conceituar costumes. Por costumes podemos entender comportamentos

uniformes e constantes pela convicção de sua obrigatoriedade e necessidade jurídica. Não é possível dizer, em

razão disso, que o adultério foi abolido pelo costume, pois senão estaríamos afirmando que o adultério era prática

costumeira na sociedade.

• lugar de provém a norma penal fonte material

• forma de revelação da fonte material fonte formal

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A respeito da revogação pelos costumes, existem três correntes discutindo este assunto:

1ª corrente: admite-se o costume abolicionista, aplicando-se aos casos em que em que a infração penal não

mais contraria o interesse social. Para esta corrente, o Jogo do Bicho não é mais contravenção penal, tendo

sido revogada pelo costume abolicionista.

2ª corrente: não existe costume abolicionista. Quando o fato já não é mais indesejado pela sociedade o juiz

não deve aplicar a lei. Assim, o Jogo do Bicho não foi revogado pelo costume abolicionista, permanecendo

formalmente típico, porém, não aplicável, por lhe faltar eficácia social. A revogação formal da lei compete ao

Poder Legislativo (interessante para defender nos concursos para Defensoria Pública).

3ª corrente: não existe costume abolicionista, enquanto a infração penal não for revogada, a lei possui

eficácia jurídica e social. Assim, o Jogo do Bicho continua tipificado co mo contravenção penal sendo

aplicável ao caso concreto. Esse entendimento está de acordo com o Dec. Lei nº 4.657/42 – Lei de

Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

A última corrente prevalece não apenas pela doutrina, mas também pelos Tribunais Superiores. Por 3 votos a 2, no

STJ, prevaleceu o entendimento de que casa de prostituição permanece crime, não tendo sido abolida pelo costume

abolicionista. O princípio da intervenção mínima exige a aplicação do direito penal a esses estabelecimentos.

Já que costume não comina crime, nem revoga crime, para que serve o costume no direito penal? É possível o uso

do costume segundo a lei, entendido como o costume interpretativo, que serve para aclarar o significado de uma

palavra, de um texto, de uma expressão, sendo bastante utilizado pelos aplicadores do direito.

Por exemplo, vejamos a expressão “mulher honesta” (hoje abolida do Código Penal). Nestes casos, quando da sua

vigência, o termo foi interpretado de acordo com os costumes. Outro exemplo, mais interessante porque ainda

pertencente ao ordenamento penal, está presente no art. 155, §4º, do CP

Furto

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

(...) (destaque nosso)

É óbvio que o que se entende por “repouso noturno” varia de cidade para cidade. Em locais urbanos pode-se

compreender de uma forma, locais rurais mais pacatos o entendimento é outro.

cost

um

es

não cria crime, nem comina penal;

não existe crime abolicionista, razão pela qual, enquanto não revogada a lei esta possui eficácia jurídica e social

admite-se costume interpretativo, segundo a lei.

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Vamos, agora, passar à análise das fontes formais de acordo com a doutrina tradicional e de acordo com a doutrina

moderna. Vejamos a tabela:

DOUTRINA TRADICIONAL DOUTRINA MODERNA

Fonte formal divide-se em: 1. imediata, que é a lei; e 2. mediata, que compreende:

a. costumes; e b. princípios gerais do direito.

Este entendimento está ultrapassado, pois vejamos: a CF, que revela direito penal, onde este diploma se insere? E os Tratados Internacionais de Direitos Humanos – que revelam o direito penal – onde consta nessa classificação? E os princípios, como reveladores imediatos do direito penal? E as Súmulas Vinculantes? Além disso, a Lei de Drogas exige atos complementares de normas penais em branco que também revelam direito penal, não se encontram insertos nesta classificação. Portanto, são vários os motivos que levam esta classificação a ser considerada ultrapassada.

Fonte formal divide-se em: 1. imediata, que subdivide-se em:

a. lei; b. Constituição Federal; c. Tratados Internacionais de Direitos

Humanos; d. Jurisprudência; e. Princípios Gerais de Direitos Humanos; e f. complemento das normas penais em

branco. 2. mediata:

a. doutrina. Os costumes, para esta classificação, configuram fontes informais de Direito Penal.

Isto posto, passaremos à análise de cada uma dessas fontes, tendo em vista a classificação moderna.

Fontes formais imediatas (de acordo com a doutrina moderna)

(I) LEI

É a única capaz de criar infração penal e cominar sanção penal.

(II) CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Notemos, não cria infração penal, nem comina sanção penal.

Estudamos que a lei é informada e conformada pela Constituição como ela não poder criar crimes? Não se olha a

hierarquia normativa em graus de inferioridade e superioridade, para se afirmar a quem compete criar crimes e

cominar penas. A Constituição não poderá criar infrações penais porque ela é rígida, exige quórum qualificado, não

coadunando com as alterações e modificações sociais que o Direito Penal sofre.

A Constituição Federal fixa alguns patamares, abaixo dos quais a intervenção penal não se pode reduzir, são os

denominados mandados constitucionais de criminalização.

É exemplo de mandado constitucional de criminalização o art. 5º, XLI, da CF:

(...)

XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;

(...)

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A CF manda o legislador, ao cominar penas, que este parâmetro deverá ser observado, como patamar mínimo, do

qual não poderá descurar o legislador.

Vejamos mais um: Art. 5º, XLII, da CF:

(...)

XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos

da lei;

(...)

A CF manda o legislador, para os crimes de racismo, atribuir a inafiançabilidade e a sujeição à pena de reclusão.

Vejamos, ainda, o inciso seguinte:

(...)

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico

ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles

respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

(...)

Diante disso, pergunta-se: existe mandado constitucional de criminalização implícito? Vamos iniciar pelo exemplo:

pode o legislador revogar o crime de homicídio? Sim, pode. Mas o direito à vida não seria um mandado de

constitucionalização implícito ou tácito. Portanto, sustenta a maioria da doutrina que sim, que existe mandado de

constitucional de criminalização implícito, decorrente do nosso sistema jurídico de proteção dos direitos humanos.

(III) TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS

Não criam infrações penais, nem cominam pena PARA O DIREITO INTERNO. Notemos que o Estatuto de Roma criou

o Tribunal Penal Internacional – TPI – e os delitos de sua competência. Essas regras penais valem para o direito

internacional, jamais para o direito interno, razão pela qual, como citamos acima não se pode afirmar que o TPI é

exceção à aplicação do Direito Penal pelo Estado, pois sua aplicação se dá ao nível internacional.

Os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, de acordo com a maioria da doutrina, podendo ostentar dois

status: supralegal ou constitucional.

A Constituição compreende o ápice da pirâmide normativa. Ao seu lado (não abaixo), os Tratados Internacionais de

Direitos Humanos recepcionados com quórum de emenda constitucional a estas se equiparam, sendo, portanto, tais

como as normas constitucionais. Todavia, se os Tratados Internacionais de Direitos Humanos forem aprovados com

quórum infralegal, tais tratados serão inferiores à Constituição (estarão abaixo desta na pirâmide normativa),

entretanto, serão superiores à legislação infraconstitucional, sendo denominado de supralegais.

Atualmente, temos apenas um Tratado Internacional possui status constitucional, que é a Convenção Internacional

sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, internalizado, no Brasil por meio do

Decreto nº 6.949/09. Os demais são considerados supralegais.

Há um caso interessante sobre o assunto, vejamos: o MP denunciou igreja no Brasil por lavagem de dinheiro. Este

crime é acessório porque pressupõe delito anterior, ou seja, lava-se dinheiro de crime antecedente de acordo com a

Lei nº 9.613/98 – Lei dos Crimes Hediondos –, como, por exemplo, o tráfico de drogas, crime contra a Administração

Pública e, inclusive, organização criminosa podem gerar o delito de lavagem de dinheiro.

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O problema é o que vem a ser organização criminosa? O Brasil não define organização criminosa. A definição está

presente na Convenção de Palermo. O MP de São Paulo, diante disso, fez a denúncia com base nesta Convenção,

criando crime no direito interno. Isso não pode! Pois a Convenção de Palermo não pode criar crime para o direito

interno. Deverá nosso legislador criar o crime, não a Convenção de Palermo.

Diante disso, o STF trancou a ação penal, por utilização de Convenção Internacional para criação de infração penal.

No que tange à hierarquia das normas, para melhor esclarecer a posição dos tratados internacionais perante as

demais normas do ordenamento jurídico.

(IV) JURISPRUDÊNCIA

Também não cria infração penal, nem comina pena.

Não podemos esquecer, todavia, das Súmulas Vinculantes.

Vamos iniciar assunto pelo art. 71, do CP:

Crime continuado

Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma

espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes

ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais

grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à

pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do

agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais

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grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código

(destaques nossos).

A jurisprudência reconhece a continuidade delitiva quando superior ao prazo de 30 dias. É a jurisprudência

revelando o direito penal. Em relação às condições de lugar entende-se que devem ser comarcas vizinhas ou

contíguas. Novamente, é a jurisprudência revelando o direito penal.

(V) PRINCÍPIO

Da mesma forma, não criam infrações penais nem cominam pena. Porém, vários são os julgados dos Tribunais ou

Superiores absolvendo reduzindo pena com base em princípios.

(VI) COMPLEMENTO DE NORMA PENAL EM BRANCO HETEROGÊNEA

Veremos esse assunto em aulas futuras.

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JURISPRUDÊNCIA

HABEAS CORPUS. LAVAGEM DE DINHEIRO. INCISO VII DO ART. 1.º DA LEI N.º 9.613/98. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ATO IMPUGNADO NO WRIT: PEDIDO DO JUÍZO PROCESSANTE ENDEREÇADO AO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA PARA EXTRADIÇÃO DOS RÉUS. 1. O despacho do Juízo processante, que deferiu requerimento ministerial no sentido de pedir a extradição dos ora Pacientes, não impõe nenhum constrangimento ilegal contra os Pacientes, na medida em que cabe à autoridade administrativa (Ministério da Justiça e Ministério das Relações Exteriores) examinar os aspectos formais, a pertinência e a conveniência do pleito que, em última análise, terá de ser submetida ainda à avaliação soberana do Estado estrangeiro requisitado. 2. Assim, se porventura alguma ilegalidade houver no pedido de extradição, será ela imputável, em tese, à autoridade administrativa que tiver formulado o pleito ao Estado estrangeiro, e não ao Juízo criminal que se limitou a solicitar tal providência. 3. Habeas corpus denegado.

(HC 76070/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 08/05/2008, DJe 02/06/2008)

DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO. ARROMBAMENTO DE VEÍCULO COM CHAVE FALSA. CONDUTA REPROVÁVEL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. AFASTAMENTO. TIPICIDADE MATERIAL RECONHECIDA. 1. Consoante entendimento jurisprudencial, o "princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentaridade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. (...) Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público." (HC nº 84.412-0/SP, STF, Min. Celso de Mello, DJU 19.11.2004) 2. No caso, foram subtraídos objetos do interior de veículo, estacionado em via pública, arrombado pelo ora paciente com uma chave falsa, características que demonstram reprovabilidade suficiente para a tipicidade material, não havendo como reconhecer o caráter bagatelar do comportamento imputado, pois houve, em tal contexto, afetação do bem jurídico tutelado. 3. Ordem denegada.

(HC 145.397/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2011, DJe 19/12/2011)

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QUESTÕES

QUESTÃO 01 – (CESPE - 2009 - PC-RN - Delegado de Polícia) Cabe ao legislador, na sua propícia função, proteger os mais diferentes tipos de bens jurídicos, cominando as respectivas sanções, de acordo com a importância para a sociedade. Assim, haverá o ilícito administrativo, o civil, o penal etc. Este último é o que interessa ao direito penal, justamente por proteger os bens jurídicos mais importantes (vida, liberdade, patrimônio, liberdade sexual, administração pública etc.). O direito penal a) tem natureza fragmentária, ou seja, somente protege os bens jurídicos mais importantes, pois os demais são protegidos pelos outros ramos do direito. b) tem natureza minimalista, pois se ocupa, inclusive, dos bens jurídicos de valor irrisório. c) tem natureza burguesa, pois se volta, exclusivamente, para a proteção daqueles que gerenciam o poder produtivo e a economia estatal. d) é ramo do direito público e privado, pois protege bens que pertencem ao Estado, assim como aqueles de propriedade individualizada. e) admite a perquirição estatal por crimes não previstos estritamente em lei, assim como a retroação da lex gravior. QUESTÃO 02 – (CESPE - 2009 - DETRAN-DF - Analista – Advocacia) Acerca do direito penal, julgue os itens que se seguem. O Estado é a única fonte de produção do direito penal, já que compete privativamente à União legislar sobre normas gerais em matéria penal. QUESTÃO 03 – (PC -2010 – ESCRIVÃO DE POLÍCIA-SP) A dignidade da pessoa humana é: a) uma garantia da República Federativa do Brasil. b) um princípio da República Federativa do Brasil. c) um dos objetivos da República Federativa do Brasil. d) um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. e) um poder da República Federativa do Brasil. Gabarito

QUESTÃO 01 – A QUESTÃO 02 – CORRETO QUESTÃO 03 - D

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QUADROS

Conceito de Direito Penal

Missão do Direito Penal

Outras classificações do Direito Penal

• conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a serem-lhes aplicadas

aspecto formal

• um instrumento do controle social de comportamentos desviados, visando à assegurar a necessária disciplina social.

aspecto sociológico

missão do direito penal

mediata:

controle social; e

limitação do poder de punir

do Estado.

imediata proteção de bens

jurídicos.

Direito Penal Objetivo:

conjunto de leis penais;

Direito Penal Subjetivo:

direito de punir.

Direito Penal Substantivo:

sinônimo de Direito Penal

Objetivo

Direito Penal Adjetivo:

Direito Processual Penal.

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RICARDO S. TORQUES 13

Fontes do Direito Penal

Costumes no Direito Penal

Direito Penal de Emergência:

limta ou derroga garantias penais processuais em busca do controle da alta

criminalidade (ex. Lei dos Crimes Hediondos);

Direito Penal Simbólico:

o legislador, pretendendo dar uma resposta rápida aos anseios da sociedade,

acaba criminalizando condutas sem qualquer fundamento criminológico e de política criminal, cumprindo apenas um

faunção simbólica (ex. Lei das Palmadas);

Direito Penal Promocional:

utilização de leis penais para a consecução de suas finalidade políticas

(criminalização de condutas relacionadas com a utilização inadequada de

medicamentos, que poderia ser evitada por meio da atuação da Vigilância

Sanitária)

• lugar de provém a norma penal fonte material

• forma de revelação da fonte material fonte formal

cost

um

es

não cria crime, nem comina penal;

não existe crime abolicionista, razão pela qual, enquanto não revogada a lei esta possui eficácia jurídica e social

admite-se costume interpretativo, segundo a lei.

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RICARDO S. TORQUES 14

Doutrina Moderna

Fonte formal divide-se em: 1. imediata, que subdivide-se em:

a. lei; b. Constituição Federal; c. Tratados Internacionais de Direitos Humanos; d. Jurisprudência; e. Princípios Gerais de Direitos Humanos; e f. complemento das normas penais em branco.

2. mediata: a. doutrina.

Os costumes, para esta classificação, configuram fontes informais de Direito Penal.