aspectos neuropsicofisiolÓgicos da hipnose

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ASPECTOS NEUROPSICOFISIOLÓGICOS DA HIPNOSE A Hipnose, com sua vasta indicação terapêutica – dentre elas o alívio da dor em pacientes em fase terminal de câncer(Spiegel & Moore, 1997, apud De Mello, 2000) – é objeto de estudos e investigações sobre a fisiologia dos mecanismos por ela utilizados, responsáveis pelo comportamento consciente e não consciente, através dos quais o indivíduo tem manifestações tais quais anestesia, amnésia, analgesia, alucinação e outros tantos do complexo fenomenológico hipnótico. São tantas as indicações da hipnose que os relatos se perdem em números e conceitos, outras são que esbarram no preconceito e medo do mito que a mesma ainda representa nos mais diversos casos. Aydin et al apud De Mello(2000), afirmaram, que entre tratar disfunção erétil com testosterona, trazodone e hipnose, o único tratamento com resultado superior ao placebo foi o realizado com hipnose; tratamentos de queimaduras, auxílio ao parto sem dor, claustrofobia pra a realização de ressonância magnética, enurese noturna primária, controle de vômito e náusea e mesmo de ansiedade, e até mesmo com o objetivo de reduzir o tempo de calcificação em fraturas ósseas(Ginandes & Rosenthal, apud De Mello, 2000) são mais alguns dos inúmeros exemplos de resultados satisfatórios onde foi utilizada a hipnose. Apesar do advento tecnológico de várias técnicas(ressonância magnética, PET-Scan, Brain Mapping, dentre outras) muito ainda se desconhece da verdadeira natureza fisiológica da hipnose, seu funcionamento, mas sua busca é intensa e antiga, que data desde da época do mesmerismo, no século XVIII, quando Franz Anton Mesmer introduziu esta técnica. No Brasil, ainda que pouco se estuda e se publica a respeito, a Odontologia é a maior representante, com ensaios clínicos voltados à analgesia odontológica e às técnicas de indução, penso eu que em

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ASPECTOS NEUROPSICOFISIOLÓGICOS DA HIPNOSE - Esse texto traz explicações sobre a PNL Avançada

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Page 1: ASPECTOS NEUROPSICOFISIOLÓGICOS DA HIPNOSE

ASPECTOS NEUROPSICOFISIOLÓGICOS DA HIPNOSE

A Hipnose, com sua vasta indicação terapêutica – dentre elas o alívio da dor em pacientes em fase terminal de câncer(Spiegel & Moore, 1997, apud De Mello, 2000) – é objeto de estudos e investigações sobre a fisiologia dos mecanismos por ela utilizados, responsáveis pelo comportamento consciente e não consciente, através dos quais o indivíduo tem manifestações tais quais anestesia, amnésia, analgesia, alucinação e outros tantos do complexo fenomenológico hipnótico.

São tantas as indicações da hipnose que os relatos se perdem em números e conceitos, outras são que esbarram no preconceito e medo do mito que a mesma ainda representa nos mais diversos casos. Aydin et al apud De Mello(2000), afirmaram, que entre tratar disfunção erétil com testosterona, trazodone e hipnose, o único tratamento com resultado superior ao placebo foi o realizado com hipnose; tratamentos de queimaduras, auxílio ao parto sem dor, claustrofobia pra a realização de ressonância magnética, enurese noturna primária, controle de vômito e náusea e mesmo de ansiedade, e até mesmo com o objetivo de reduzir o tempo de calcificação em fraturas ósseas(Ginandes & Rosenthal, apud De Mello, 2000) são mais alguns dos inúmeros exemplos de resultados satisfatórios onde foi utilizada a hipnose.

Apesar do advento tecnológico de várias técnicas(ressonância magnética, PET-Scan, Brain Mapping, dentre outras) muito ainda se desconhece da verdadeira natureza fisiológica da hipnose, seu funcionamento, mas sua busca é intensa e antiga, que data desde da época do mesmerismo, no século XVIII, quando Franz Anton Mesmer introduziu esta técnica. No Brasil, ainda que pouco se estuda e se publica a respeito, a Odontologia é a maior representante, com ensaios clínicos voltados à analgesia odontológica e às técnicas de indução, penso eu que em virtude da grande fobia dos pacientes ao tratamento, requerendo pressa nos mesmos e ainda quanto aos aspectos financeiros envolvidos e sobretudo ao mito correlacionado à hipnose, que também data desde a época de Sigmund Freud, e depois o Dr. Jean Martin Charcot, mestre em Salpetriére-França, relacionando-a a histeria.

Liébeault e Bernheim acreditavam que a sugestão era o ponto central da hipnose. Mas somente a partir do início do século XX, que iniciou-se estudos científicos com o objetivo de entender, através da fisiologia, os mecanismos deste estado alterado de consciência. Embora Freud tenha abandonado a hipnose por sua limitação técnica à época, a psicanálise por ele introduzida utiliza até hoje heranças da hipnose,

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elementos tais como o uso do divã e a associação livre de palavras(De Mello et al., 2000).

Osmard Andrade Faria(1961) ressaltou a importância que Pavlov teve e ainda tem no estudo dos mecanismos fisiológicos da hipnose, através de sua Teoria Reflexológica, onde a hipnose pode ser explicada levando-se em consideração que utiliza-se como estímulo a palavra, elemento mais abstrato do que aqueles utilizados no condicionamento com cães, onde aquela e seu significado geram a imaginação, e seguindo além, a estas segue-se um estado alterado de consciência, a hipnose propriamente dita. Hess, apud De Mello(2000), quem demonstrou a relação do hipotálamo – parte do sistema límbico – com a gênese das emoções.

A teoria reflexológica tentou explicar os mecanismos neurofisiológicos da hipnose, porém com o advento da tecnologia e o melhor conhecimento da fisiologia do Sistema Nervoso Central e periférico observamos maior complexidade nos fenômenos relativos à hipnose e com isso evidenciou-se que existem 2 grupos neuronais responsáveis pela indução fisiológica do sono na porção mais caudal do tronco cerebral na formação reticular(Moruzzi, 1950; Magoun, 1964, apud Mello, 2000). Vale aqui lembrar que a hipnose já foi definida como estado alterado de consciência diferente de vigília e sono fisiológico. O estado de hipnose resulta da inter-relação entre o técnico e o cliente, tendo como instrumento fundamental a palavra, ouvida e compreendida pelo cliente, que apresentará desde o estado hipnoidal até o grau mais profundo, tendo então neste ínterim a participação do VIII par craniano, o par auditivo(Callile Jr., M., 1984), que está colocado no terço médio-posterior do Lobo Temporal, onde se encontra a zona vigil cortical, que mantém a conexão técnico-cliente durante o processo.

Lembrando que o Sistema Nervoso possui células capazes de gerar, conduzir e transmitir eletricidade, essa transmissão se dá pelas mesmas receberem outros tipos de energia, e as transduz em energia elétrica por um processo chamado bioeletrogênese. Esses outros tipos de energia podem ser por exemplo a energia eletromagnética(luz), mecânica(som, tato), e, em hipnose utiliza-se para o desenvolvimento desta a voz, luz, som e tato (Constanzo, 1999; Guyton, 1992; Mello, 2000). Basicamente o SN gera 2 tipos de potenciais elétricos e por meio deles que os circuitos cerebrais geram suas funções, dentre elas, as sensitivas especiais e psíquicas – imaginação – primordial na hipnose.

Primeiramente, para se existir transmissão, se tem a recepção através de células receptoras, como já dito anteriormente. Estes receptores são classificados de acordo com o meio em que se relacionam:

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Interoceptores ( captam estímulos internos – vísceras, artérias...); Proprioceptores ( captam estímulos provenientes do soma –

tendões, músculos...); Exteroceptores (captam estímulos provenientes do meio externo –

retina, pele, ouvido...).

Na indução hipnótica usa-se estímulos exteroceptivos – voz, mímicas – estímulos proprioceptivos – movimento contínuo rítmico, monótono e persistente do corpo ou partes do corpo(algumas danças afro-brasileiras, indígenas) ou mesmo estímulos interoceptivos – batimento cardíaco da mãe ao bebê. Através destes estímulos se pode modificar a sensibilidade profundamente acarretando parestesias, analgesias, anestesias, sensações de peso e/ou relacionados ao SN sensitivo que é o responsável por levar o estímulo da periferia para o SNC.

Podemos didaticamente dividir o sistema sensitivo em leminiscal e extra-leminiscal. Pelo sistema extra-leminiscal seguem fibras originadas na substância reticular, nos tratos espinotalâmicos anterior e lateral e em vias trigeminais. Vão para o hipotálamo(centro neurovegetativo superior), para os núcleos inespecíficos do tálamo(núcleo reticular e intra-laminares), e para o sistema límbico. Recebe influência do tálamo e projeta seus impulsos para todo o córtex cerebral de associação. Portanto, tem uma ação pouco específica, responsável pela sensação de desconforto provocada pela dor, por vezes pelo tato, responsável pelo sentimento associado a sensibilidade (ex.: dor e depressão, carinho e calma...). Vê-se claramente, portanto, a relação entre sensibilidade e emoção(Mello, 2000). Segue-se então o raciocínio de que por meio da hipnose seja possível ativar e/ou desativar tais mecanismos e deste modo modificar o resultado final; a sensibilidade com todos os seus elementos, seja a nocicepção, sejam os epifenômenos a ela associados.

Para alterações motoras observadas na hipnose, estes também são produtos da manipulação da fisiologia do SNC e não do SN Periférico Motor, sabendo-se que para um movimento ser realizado deve haver uma transmissão da informação que tem origem em áreas heteromodais(de associação); e daí para áreas motoras específicas e então para a periferia. Percebe-se aí a intensa relação circuitual entre áreas heteromodais corticais(associativas) e o SNPM (onde age a hipnose provocando relaxamentos intensos, sensações de torpor, enrijecimento de músculos...)

Basicamente, segundo Price apud Carvalho, M.M.M.J., 1997, existem duas teorias que tentam explicar os mecanismos gerais pelos quais a dor sensorial pode ser reduzida ou abolida pela hipnose:

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1. A teoria da neodissociação: Essa teoria propõe que durante a analgesia hipnótica existe uma redução da percepção consciente da dor, o que ocorre quando a informação nociceptiva alcança os centros superiores. A dor estaria registrada no corpo, mas é mascarada pela barreira tipo amnésia que ocorre entre "correntes de consciência" (streams of conscionsness) dissociadas. Essa interpretação da analgesia hipnótica ocorrendo como dissociação na consciência oferece uma explicação para o paradoxo dos índices de estresse fisiológico permanecerem presentes durante o processo hipnótico, embora o indivíduo relate não sentir dor, em experimentos controlados de laboratório;(vide caso Melissa Macedo)

2. A teoria segundo a qual a sugestão hipnótica pode reduzir a dor pela ativação de um sistema endógeno inibidor de dor, que desce pela medula espinhal, prevenindo a transmissão da informação da dor para o cérebro, através de mecanismos de controle descendente do cérebro para a medula que não envolvam opiáceos.

Devido ao processo ainda não estar totalmente esclarecido, ainda que contemos com os mais diversos tipos de tecnologias e exames modernos, há necessidade de mais pesquisas que busquem esclarecimentos e informações sobre pontos desconhecidos para eliminação de controvérsias.

Pequena introdução à fisiologia da indução hipnótica

Por meio da "Escala de Profundidade Hipnótica" de Torres Norry e Moraes Passos(Passos & Marcondes, apud Mello, 2000), o técnico evidencia os passos obtidos através de sugestões durante a indução e segue testando o nível de "aprofundamento" de seu paciente durante o processo e vai conquistando a cada passo novas possibilidades terapêuticas e até a possibilidade de introduzir um sinal(chamado hipnogênico ou signo-sinal) que o conduzirá a um nível tão profundo quanto ao da última sessão rapidamente, todas as vezes em que este sinal for efetuado, situação utilizada nas mais variadas técnicas existentes, dentre elas principalmente a Ericksoniana, por abordar terapias diferenciadas e não somente evidenciar as manifestações fenomenológicas.

Conforme já visto, são através de estímulos que a hipnose é obtida e estes por sua vez podem ser vários, que desencadearão transes positivos ou negativos, classificados assim de maneira didática para melhor compreensão do processo. Partindo do princípio da dedução que o cérebro executa para criação de imagens, os transes negativos são causados pelo estímulo das emoções negativas, tal qual o medo, a fobia

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ao "motorzinho", à agulha da anestesia, e os transes positivos são aqueles resultantes da estimulação das emoções do tipo estabilizador, tipo acalento, o ninar.

O transe negativo é obtido com a estimulação súbita do sistema nervoso autônomo simpático ao contrário do transe positivo, que estimula o sistema nervoso autônomo parassimpático, por estímulos repetitivos e em baixa freqüência.

Durante o processo hipnótico o paciente desenvolve uma postura de abandono, não apenas das funções motoras esqueléticas ou sensitivas, mas também das funções psíquicas. Tal fenômeno gera uma concentração exacerbada na voz e nas palavras do profissional indutor, o que aumenta a importância do conteúdo falado pelo hipnoindutor, e isto só é possível se um bom "rapport" for estabelecido(Mello, 2000).

A progressão do transe hipnótico pode ocorrer por dissociação da consciência em duas ou mais consciências distintas – a Teoria neodissociativa. Esta teoria classifica as sugestões em 3 tipos básicos(Kirsch & Lynn, 1998, apud Mello, 2000):

1. Sugestões ideomotoras: São sugestões que envolvem ações particulares, tal qual elevação de um membro no ar conhecida como levitação do braço;

2. Desafios: São realizados com o intuito de testar o controle sobre o sistema motor volitivo(esquelético) do paciente(ex: não conseguir elevar as pálpebras, ou o braço);

3. Sugestões cognitivas: São todas aquelas que envolvem atividade mental cognitiva tais quais amnésia, anestesia, alucinação...

O hipnólogo seja qual for sua área, odontologia, medicina ou psicologia, deverá lembrar sempre das três leis de Coué para que obtenham o resultado esperado da sugestão empregada:

Lei da atenção concentrada: se quer obter algo concentre sua atenção no objeto desejado;

Lei do esforço contrário: se crê que não poderá conseguir o que deseja, nem tente pois se o fizer poderá ficar mais distante do seu intento, portanto antes de tentar certifique-se se realmente crê que é possível;

Lei do sentimento dominante: se o movimento que executa em direção ao seu objetivo for realizado mobilizado por uma emoção, estará aumentando consideravelmente a possibilidade de sucesso.

Para explicar como funciona parte dos mecanismos da sugestão hipnótica, utiliza-se da Teoria Reflexológica, onde se classificam os reflexos em Reflexo Incondicionado(próprio da espécie, inato e necessário) e Reflexo Condicionado(adquirido, temporário, uma

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evolução do incondicionado frente às mudanças do ambiente, característico do indivíduo, não da espécie). Na hipnose, por meio da sugestão, verbal ou gestos, conseguimos ligar um estímulo condicionante a um reflexo incondicionado, ou fazer um condicionamento "em cima" de outro reflexo condicionado que por sua vez foi o condicionante "sobre" um reflexo incondicionado, e assim por diante; podemos fazer deste laço algo teoricamente infinito. Através da técnica, podemos acessar os circuitos que geram comportamentos não conscientes(circuitos do tronco cerebral, límbicos, hipotalâmicos e subcorticais), e com a "permissão" dos circuitos que geram comportamentos conscientes(medo da dor ao tratamento dentário) sugerimos o condicionamento do reflexo, dizendo por exemplo que ao ouvir o ruído do equipamento do dentista seus dentes permanecerão anestesiados.

Mello(2000) afirma que, parece que por um pensamento dedutivo prevalente durante a hipnose, o cérebro chegaria às conclusões sem questioná-las. Os achados fisiológicos parecem apoiar este fato, pois Goel, Gold, Kapur e Houle(1997), concluíram que durante o pensamento indutivo existe uma ativação do giro frontal superior esquerdo(GFE), o que já não ocorre no pensamento dedutivo. Diz também, neste mesmo trabalho, que mesmo durante a hipnose, enquanto o pensamento indutivo é figura, temos uma ativação maior no GFE, mas quando o pensamento dedutivo transforma-se em figura(no decorrer da hipnose), o GFE é funcionalmente desativado(inibido), e o paciente então está apto a receber as sugestões do hipnoindutor, pois com o incremento da capacidade de pensamento dedutivo, faz o cérebro do indivíduo crer que a mensagem sugerida é real, respondendo à ela através de sua conduta psicossocial e orgânica. Isto se concretiza por meio da ativação de diversos circuitos que envolvem áreas de memória, áreas heteromodais – de associação – o giro anterior do cíngulo à direita, formação reticular, e até a medula (mecanismo de analgesia por hipnose) entre outras áreas. Esta capacidade talvez seja o responsável pela ativação de mensageiros químicos chamados Iegs – immediates early genes – que desencadearão a transcrição do DNA que resultará em uma resposta fisiológica que pode envolver o SNA, Sistema Endócrino, Sistema Imunológico, Neuromoduladores, e enfim determinar como os circuitos neurais serão ativados para uma determinada função, por exemplo, a sensação de bem estar, a confiança ou mesmo a analgesia.