aspectos moleculares da transformação celular conceitos e implicações

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1 Aspectos moleculares da transformação celular: conceitos e implicações Patrícia C. B. Beltrão-Braga, Verônica Rodrigues Teixeira e Roger Chammas Câncer é um conjunto de doenças caracterizado pelo progressivo acúmulo de mutações no genoma de uma célula. Estas mutações levam a alterações na expressão ou função de genes-chave para a manutenção da homeostasia celular. Essas alterações genéticas podem converter uma célula normal em uma célula transformada, que se caracteriza por não mais responder aos sinais de controle de proliferação, morte e diferenciação que governam a comunidade celular (Figura 1). Estudos epidemiológicos mostram que a idade é um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento do câncer. Ou seja, o câncer é uma doença relacionada com a idade, ocorrendo mais freqüentemente em pessoas idosas. Assim, com o aumento progressivo da expectativa de vida média das pessoas, a incidência de câncer tende a aumentar. Este fato é interpretado como um aumento na probabilidade de mutações acumularem-se no material genético de cada indivíduo devido à exposição acumulada a fatores mutagênicos. Assim, numa situação limite, o aparecimento de uma célula cancerosa seria praticamente inevitável. Entretanto, o câncer é uma doença de múltiplos passos, ou seja, para que o câncer ocorra é necessário acontecer mais de uma lesão diferente no genoma celular para que se complete o processo de transformação. Por exemplo, para células de roedores em cultura adquirirem competência tumorigênica, são necessárias pelo menos duas alterações genéticas. Já para

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Page 1: Aspectos moleculares da transformação celular conceitos e implicações

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Aspectos moleculares da transformação celular: conceitos e implicações

Patrícia C. B. Beltrão-Braga, Verônica Rodrigues Teixeira e Roger Chammas

Câncer é um conjunto de doenças caracterizado pelo progressivo

acúmulo de mutações no genoma de uma célula. Estas mutações levam a

alterações na expressão ou função de genes-chave para a manutenção da

homeostasia celular. Essas alterações genéticas podem converter uma célula

normal em uma célula transformada, que se caracteriza por não mais

responder aos sinais de controle de proliferação, morte e diferenciação que

governam a comunidade celular (Figura 1).

Estudos epidemiológicos mostram que a idade é um dos principais

fatores de risco para o desenvolvimento do câncer. Ou seja, o câncer é uma

doença relacionada com a idade, ocorrendo mais freqüentemente em pessoas

idosas. Assim, com o aumento progressivo da expectativa de vida média das

pessoas, a incidência de câncer tende a aumentar. Este fato é interpretado

como um aumento na probabilidade de mutações acumularem-se no material

genético de cada indivíduo devido à exposição acumulada a fatores

mutagênicos. Assim, numa situação limite, o aparecimento de uma célula

cancerosa seria praticamente inevitável.

Entretanto, o câncer é uma doença de múltiplos passos, ou seja, para

que o câncer ocorra é necessário acontecer mais de uma lesão diferente no

genoma celular para que se complete o processo de transformação. Por

exemplo, para células de roedores em cultura adquirirem competência

tumorigênica, são necessárias pelo menos duas alterações genéticas. Já para

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células humanas nas mesmas condições, esse número sobe para quatro a sete

lesões diferentes. Em adultos, estima-se que o intervalo de tempo entre a

primeira lesão genética e o aparecimento do câncer seja em torno de dez a

vinte anos. Assim, pelo tempo necessário para seu desenvolvimento, alguns

tipos de cânceres seriam potencialmente preveníveis. A compreensão do

processo de carcinogênese tem permitido o desenho de estratégias de

intervenção que visam em última análise prevenir o aparecimento de tumores.

Neste capítulo serão discutidas as bases moleculares do processo de

transformação celular e algumas de suas implicações para a prevenção de

tumores.

Mutações e alterações epigenéticas

Os tipos de alterações físicas no genoma, ou mutações, mais

freqüentemente encontradas em câncer são:

1) mutações pontuais; quando um único par de nucleotídeos encontra-

se alterado. É o que ocorre com o gene ras, que codifica uma proteína

associada à sinalização de vias de proliferação celular. Mutações pontuais em

ras, especificamente nos códons 12, 13 e 61 levam à formação de uma forma

constitutivamente ativada do produto deste gene. Células com esta alteração,

freqüentes em adenocarcinomas de pâncreas por exemplo, proliferam de

maneira desordenada mesmo na ausência de estímulos externos. Mutações

pontuais podem também levar à geração de códons de terminação, que

levariam à produção de proteínas truncadas.

2) rearranjo gênico; quando genes ou fragmentos de genes são

movidos de lugar, por mecanismos como inversão ou translocação, ou

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eventualmente perdidos (deleção). Rearranjos gênicos podem levar ao

truncamento de genes (por exemplo, por alterações da fase de leitura de

genes). Translocações podem levar à geração de genes quiméricos, como por

exemplo na translocação recíproca entre os cromossomos 9 e 22 (gerando

cromossomo Philadelphia), freqüente na leucemia mielóide crônica, que origina

o gene de fusão bcr-abl, com potencial transformante. Translocações também

podem mudar as relações entre genes e elementos reguladores da transcrição

destes genes. É o que acontece na translocação entre os cromossomos 8 e 14

associada a linfomas de Burkitt em algumas regiões da África. O gene myc,

que codifica uma proteína nuclear que está associada ao controle de

transcrição de genes-chave para o controle do ciclo celular, posiciona-se frente

ao promotor dos genes das imunoglobulinas, um promotor forte em linfócitos. A

transcrição desregulada de myc é um dos eventos necessários para a

transformação maligna destes linfócitos.

3) amplificação gênica, quando há aumento no número de cópias de

um alelo. Citogeneticamente, a amplificação gênica está associada à formação

de regiões homogeneamente coradas em cromossomos, ou ainda ao

aparecimento de mini-cromossomos extranumerários. Técnicas de localização

de alelos em cromossomos, baseadas em técnicas de hibridação in situ

atualmente utilizadas na clínica permitem a identificação deste fenômeno, que

ocorre, por exemplo, em adenocarcinomas de mama, onde o gene do receptor

associado a proliferação celular, erbB2, encontra-se amplificado.

Tumores apresentam ainda uma série de alterações epigenéticas,

caracterizadas como alterações na expressão gênica, onde se observam

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diferentes conseqüências fenotípicas, sem haver nenhuma mudança na

seqüência de DNA. Um mecanismo freqüentemente descrito para estas

alterações é a variação no grau de metilação do promotor de genes. De

maneira geral, porém não absoluta, a hipermetilação de regiões do promotor

associa-se ao silenciamento da transcrição de genes; enquanto a

hipometilação pode estar associada à transcrição desordenada destes genes.

Em tumores humanos, por exemplo, o silenciamento do gene regulador do ciclo

celular CDKN2a (Cyclin-Dependent Kinase iNhibitor) que codifica duas

proteínas com funções supressoras do aparecimento de tumores p14 e p19ARF

ocorre por hipermetilação de seu promotor.

Um dos mecanismos associados à flutuação da expressão de genes

devida a variações da metilação é a reorganização da cromatina. Esta

reorganização depende do grau de interação do DNA com proteínas da classe

das histonas. O estado de acetilação das histonas altera a estrutura da

cromatina: a acetilação de histonas afrouxa a interação entre o DNA e estas

proteínas, favorecendo a transcrição gênica; a desacetilação de histonas está

associada ao bloqueio da transcrição de alguns genes. Duas classes de

enzimas podem afetar a acetilação de histonas: histono-acetiltransferases

(HATs), que adicionam um grupo acetil, e histono-deacetilases (HDACs), que

removem um grupo acetil, e dessa forma provoca a repressão transcricional de

genes que estão envolvidos no controle do ciclo celular, diferenciação e/ou

apoptose.

Mutações são eventos mais freqüentes do que geralmente se imagina.

Claramente, uma pequena fração delas leva ao desenvolvimento de cânceres.

Postula-se que as mutações que ocorrem freqüentemente em todos os

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organismos garantem a variabilidade genética, tida como necessária para a

evolução das espécies. De maneira análoga ao que acontece com as espécies,

um processo micro-evolutivo também ocorre em nosso organismo, porém

durante o tempo de vida de um indivíduo.

Vários mecanismos moleculares atuam na manutenção da integridade

dos genomas celulares. Uma vez que uma célula é mutada, mecanismos

operantes ou reparam as lesões no DNA (Figura 2), ou então induzem a morte

da célula mutada. A eficiência deste processo não é, porém, absoluta. Na falha

ou no relaxamento destes mecanismos, as células mutadas não são excluídas

nem reparadas. Mutações que confiram uma vantagem seletiva à célula

mutada (por exemplo, crescimento autônomo ou evasão dos processos de

morte celular) são fixadas na população de células de um organismo. As

vantagens conferidas às células mutadas culminam com a expansão da

população destas células (expansão clonal), dando origem a um eventual

tumor. Assim, os tumores originam-se freqüentemente de uma única célula

(origem monoclonal). Contudo, à medida que as mutações progressivamente

se acumulam, é freqüente observar o aumento da heterogeneidade da massa

tumoral, devido ao aparecimento de subpopulações. Esta heterogeneidade

pode ter uma base genética, com alterações físicas do DNA das células

tumorais, ou ser devida a flutuações no nível de expressão de conjuntos de

genes (base epigenética). A interação entre células de diferentes

subpopulações tumorais pode modular o processo de carcinogênese. Esta

noção vem sendo conhecida como efeito de comunidade, e tem um grande

impacto nas fases mais tardias do processo de carcinogênese.

Agentes mutagênicos

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As mutações podem ser causadas por erros durante o processo de

replicação ou por mutagênicos endógenos, como as espécies reativas de

oxigênio, ou induzidas por agentes externos. De maneira didática, os agentes

externos são divididos em três classes:

1) Agentes físicos, como luz ultravioleta e radiações ionizantes;

2) Agentes biológicos, como alguns vírus, que se integram ao genoma

celular interrompendo seqüências gênicas ou promovendo rearranjos gênicos;

3) Agentes químicos, como os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos e

nitrosaminas. Alguns carcinógenos químicos são inativos e se tornam

potencialmente lesivos ao DNA após terem sido modificados para uma forma

mais reativa por processos metabólicos, como por exemplo por enzimas

intracelulares conhecidas como citocromo P-450 oxidases. Essas enzimas

normalmente atuam na conversão de toxinas ingeridas em compostos

inofensivos que são facilmente excretados. Entretanto, sua atividade sob certos

agentes químicos gera produtos que são altamente mutagênicos, como é

observado com uma toxina fúngica, a aflatoxina B1 (vide abaixo). As enzimas

detoxificantes como as citocromo P-450 oxidases apresentam um grande

número de variantes polimórficas nas populações humanas. Diferentes

variantes polimórficas podem ter maior ou menor atividade sobre os vários

agentes pró-carcinogênicos, sugerindo uma possível explicação para as

diferenças quanto à susceptibilidade a diferentes tipos de câncer em

populações humanas definidas.

As etapas da carcinogênese

O processo de carcinogênese é classicamente dividido em quatro fases:

(i) iniciação; (ii) promoção; (iii) manutenção e (iv) progressão tumoral.

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No início do processo de carcinogênese ocorre uma alteração no DNA.

Para gerar-se a doença, é necessário que esta mutação seja herdável, isto é

seja transmitida para as células filhas. Essa alteração inicial recebe o nome de

iniciação. Como já mencionamos anteriormente, somente uma alteração no

DNA não é suficiente para causar o câncer. São necessárias várias mutações

em seqüência, que não sejam letais para a célula. Mutações ocorrem em

qualquer parte do genoma, porém o efeito deletério que provocam só

contribuirá para o desenvolvimento do câncer se ocorrerem em classes de

genes específicas. As mutações responsáveis pelo desenvolvimento do câncer

ocorrem preferencialmente em duas classes de genes: nos genes supressores

de tumores e nos protoncogenes. Mais recentemente alterações em genes

associados ao reparo de DNA têm sido relatadas em diferentes tipos de

câncer, sendo freqüentemente associados às síndromes hereditárias que

cursam com o desenvolvimento de tumores. Alguns exemplos de

protoncogenes e genes supressores de tumor estão listados nas tabelas I e II.

Genes supressores de tumores codificam proteínas com funções

específicas que atuam, por exemplo, impedindo o acumulo de mutações no

genoma da célula, e portando garantindo a integridade do genoma, como o

produto do gene TP53, ou controlando a progressão da célula ao longo das

fases do ciclo celular, como os produtos dos genes Rb e os inibidores de

quinases dependentes de ciclinas, como os produtos dos genes WAFp21 e

CDKN2a (p14). Os produtos destes genes atuam em diferentes níveis de

regulação, como no processo de transcrição e transdução de sinal. Estudos

moleculares permitiram a identificação de vários genes supressores de tumor

(Tabela I).

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O gene supressor de tumor mais bem estudado em tumores humanos é

o TP53. Este gene codifica uma fosfoproteína nuclear (p53) que tem papel

ativo na parada do ciclo celular e indução da expressão de genes de reparo de

DNA lesado. Quando há uma lesão no DNA o nível de p53 na célula aumenta,

e após o reparo o nível diminui. Dependendo da intensidade do agravo, p53

pode induzir a morte das células geneticamente alteradas (via indução do gene

pró-apoptótico bax (Figura 1 e 2).

Protoncogenes são genes celulares normais que participam do controle

das funções celulares vitais como proliferação, diferenciação, migração e morte

celular (apoptose). De maneira geral, os protoncogenes podem ser divididos

em quatro classes de genes que codificam as seguintes proteínas: fatores de

crescimento, receptores para fatores de crescimento, transdutores de sinal e

fatores de transcrição (Tabela II). Quando esse genes se encontram mutados

ou sua expressão descontrolada por alguns dos mecanismos de rearranjo

gênico mencionados acima, diz-se que estão ativados, e passam a receber o

nome de oncogenes.

As mutações em genes supressores mais freqüentes são do tipo

deleção e mutação de ponto. Elas atuam de maneira recessiva, ou seja, ambos

os alelos desses genes devem ser perdidos ou inativados para que sua função

celular seja afetada. Genes supressores de tumores como TP53 e Rb são

alvos da ação de oncoproteínas virais, como os produtos dos genes E6 e E7 de

HPVs de alto risco, respectivamente. A hipermetilação de promotores dos

genes supressores de tumor representa um mecanismo freqüente de

inativação transcricional.

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Nos protoncogenes as mutações mais freqüentes são por substituição

(mutação pontual) ou amplificação, e essas mutações atuam de maneira

dominante, onde apenas um alelo precisa estar mutado para a ativação do

gene. Em relação ao promotor, postula-se que a hipometilação do promotor

está associada à transcrição descontrolada de oncogenes.

A etapa seguinte do processo de carcinogênese é a promoção, onde as

células geneticamente alteradas, ou seja, iniciadas, sofrem o efeito de agentes

que não são mutagênicos, porem que promovem a expansão da população

celular que carrega uma mutação inicial. Lesões causadas por infecções com

alguns parasitas, bactérias e vírus podem atuar como promotores de câncer.

Por exemplo, infecção do estômago com a bactéria Helicobacter pylori,

associada à gastrite , parece ser a principal causa do câncer de estômago. Já o

câncer de bexiga parece estar associado com a infecção com um platelminto, o

Schistosoma haematobium . A hepatite causada pelo vírus da hepatite B (VHB),

tem sido bastante associada ao desenvolvimento de câncer hepático quando

se manifesta a forma crônica da doença. De maneira semelhante, a

persistência da infecção pelo vírus da hepatite C é um importante fator de risco

para o desenvolvimento de câncer hepático. A persistência da infecção levaria

a uma exposição descontrolada a fatores que regulam a transcrição de genes

associados à proliferação celular, como é o caso do fator de transcrição Stat 3,

cujo acúmulo na forma fosforilada está associado ao desenvolvimento de

hepatocarcinomas.

O câncer só ocorrerá se as células forem expostas primeiramente a um

iniciador e seqüencialmente a um agente promotor. Essa ordem deve ser

respeitada, caso contrário não há a desenvolvimento de câncer. Se a

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exposição ao promotor não ocorrer imediatamente após a exposição ao

iniciador, ainda assim pode haver o desenvolvimento do câncer. Alguns

agentes mutagênicos podem eventualmente também desencadear a promoção

tumoral; estes agentes são chamados de carcinógenos completos.

É importante notar que nem todo agente carcinogênico é

necessariamente um agente mutagênico, isto é, causa um dano no mater ial

genético (genotóxico). Estes agentes atuam por diversos mecanismos, dentre

os quais dois são os principais: (1) promovem a proliferação celular

desregulada, quer diretamente por causar um dano tecidual persistente,

associado à criação de microambiente pró-inflamatório que estimule a

proliferação celular; (2) induzem o estresse oxidativo, que leva ao acúmulo de

espécies reativas de oxigênio com potencial genotóxico.

Após a iniciação e a promoção, há a fase de manutenção, onde as

células geneticamente alteradas são mantidas na população. Isto só ocorrerá:

1) se as mutações não forem excessivas. Mutações excessivas são deletérias;

de fato, células com grande instabilidade genética são selecionadas

negativamente; 2) se as alterações genéticas estiverem associadas a maior

capacidade de proliferar em relação às células normais; 3) se as mutações

levarem ao escape do processo de morte celular induzida.

Como mencionado acima, nossas células têm um mecanismo de reparo

do DNA. Só não desenvolvemos câncer rapidamente porque nossos

mecanismos de reparo são em geral eficientes. Dessa forma, podemos dizer

que a manutenção da célula alterada significa que a mesma escapou dos

mecanismos homeostáticos intracelulares, que as levariam a apoptose. Esses

mecanismos ainda não estão completamente conhecidos, porém garantem a

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integridade do genoma celular. Se os mecanismos homeostáticos

intracelulares não foram capazes de eliminar a célula tumoral, essas mutações

serão fixadas na população celular e sua freqüência irá aumentar à medida que

as células se duplicam. Se os mecanismos de integridade do genoma

estiverem comprometidos (por exemplo, houver mutações em TP53 ou em

genes de reparo), aumentará a probabilidade de mutações se acumularem. A

progressão do tumor se manifestará em função do acúmulo destas mutações.

Uma característica essencial da célula transformada é sua capacidade

de replicação sustentada, muitas vezes chamada de capacidade de replicação

infinita, um conceito ligado a características de linhagens estabelecidas em

cultura. Células normais tendem a dividir um número finito de vezes. A cada

divisão, há um progressivo encurtamento das extremidades dos cromossomos

(os telômeros). O tamanho destes telômeros funcionaria assim como um

relógio biológico, este encurtamento se dá até um tamanho limite. Quando

atingido este limite de encurtamento a célula sofre apoptose. Células

embrionárias, células progenitoras dos diferentes tecidos (stem cells ) e células

tumorais apresentam mecanismos de reposição destas extremidades

cromossômicas, mantendo sua capacidade de replicação indefinidamente. A

manutenção de características de replicação são geralmente associadas de

maneira inversa com o grau de diferenciação celular. Por exemplo, em um

epitélio, as células que apresentam as características mais diferenciadas não

proliferam; de fato, muitas vezes o processo de diferenciação celular em alguns

tecidos culmina em morte celular. Os modelos de carcinogênese mais aceitos

no momento propõem que a célula transformada mantém algumas das

características de células progenitoras, abortando os processos de

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diferenciação celular normal. Não ocorre, assim, uma "desdiferenciação"

celular. Alguns dos traços de diferenciação podem ainda ser observados em

células ao longo da progressão tumoral; contudo, o processo de diferenciação

em tumores é incompleto e disfuncional. Esta noção tem importância clínica em

alguns modelos, onde a base da transformação está associada a resposta

incompleta a agentes diferenciadores. A identificação dos mecanismos desta

resposta incompleta e o uso de drogas que compensem estas vias defectivas

são áreas promissoras de estudo, apresentando alguns resultados positivos,

embora incompletos, no controle da progressão tumoral.

Até aqui descrevemos o processo de carcinogênese centrado na célula

tumoral. Atualmente, muitas evidências indicam que as diferentes etapas da

carcinogênese são moduladas pela interação entre as células geneticamente

alteradas (células tumorais propriamente ditas) e elementos do microambiente

tecidual destas células. De fato, a aquisição da capacidade de invasão tecidual,

a indução de formação de vasos sanguíneos ou linfáticos e a capacidade de

metastatização, todas estas características associadas ao comportamento das

células cancerosas, são claramente dependentes de células não tumorais

presentes ou recrutadas para o microambiente tumoral. Estas características

da transformação celular que caracterizam as fases finais da progressão

tumoral serão discutidas em outros capítulos deste livro.

Quimioprevenção

Por se tratar de uma doença na maioria das vezes de difícil tratamento,

a idéia de prevenir o aparecimento do câncer atrai diversos pesquisadores para

a área da quimioprevenção. Quimioprevenção pode ser definida como o uso de

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compostos sintéticos e naturais (encontrados em alimentos) para intervir

precocemente em estágios pré-cancerosos da carcinogênese, inibindo,

retardando ou revertendo a carcinogênese, assim, um agente quimiopreventivo

deve atuar em alvos moleculares e celulares específicos, como nos processos

de inflamação, vias de transdução de sinal e nos processos de metilação e

acetilação de histonas.

Diversos protocolos têm sido avaliados na tentativa de se reduzir os

riscos de desenvolvimento do câncer, usando-se agentes quimiopreventivos.

Esses estudos são baseados em experiências anteriores com animais em

laboratório, que resultaram na determinação do efeito protetor de diversas

substâncias no desenvolvimento de câncer experimental.

Agentes quimiopreventivos devem ser não tóxicos e relativamente livres

de efeitos colaterais, pois eles têm de ser administrados em pessoas saudáveis

por longos períodos. Desta forma devem ser preferencialmente administrados

oralmente, como pílulas, alimentos ou bebidas modificadas. Os alimentos são

uma fonte das mais promissoras contendo componentes que podem ser

usados na quimioprevenção. Vegetais e frutas podem diminuir o risco de

desenvolvimento do câncer. Entretanto, a identificação e isolamento das

substâncias ativas como agentes quimiopreventivos não é necessariamente

simples.

Uma grande variedade de agentes quimiopreventivos vem sendo

estudada desde 1990. Aproximadamente 2000 compostos naturais e sintéticos

têm demonstrado, em modelos experimentais, atividade quimiopreventiva.

Entre estes compostos encontram-se inibidores hormonais (anti-estrogênios),

anti-inflamatórios, antioxidantes e outros componentes derivados da dieta. A

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seguir comentaremos sobre alguns agentes quimiopreventivos que já possuem

resultados em ensaios clínicos com humanos e seu modo de ação. A maior

parte dos estudos visa a prevenção secundária, isto é, acaba recaindo sobre

pacientes que já tem o diagnóstico de câncer. Aí analise-se o impacto destes

agentes na sobrevida livre de doença na vigência dos tratamentos

convencionalmente preconizados. Em menor proporção, há também os

estudos de prevenção primária, que avalia populações sadias com risco

aumentado de desenvolvimento de tumores de maneira comparativa a grupos

controle.

Iniciação como alvo para quimioprevenção: o caso da aflatoxina

Aflatoxinas são substâncias produzidas por fungos que são

freqüentemente encontradas como contaminantes de alimentos como o milho,

amendoim, molhos de soja e grãos de soja fermentados. A aflatoxina B1

(AFB1) por exemplo, após sofrer modificação por ação do citocromo P450 é

ativada, formando adutos com o DNA (aflatoxina N7-guanina). A formação

destes adutos está associada a mutações do tipo transversão, onde há a

substituição de G (guanina) para T(timina) no DNA. A presença de aflatoxina

N7-guanina na urina é um indicador de exposição a aflatoxina e está associada

a um risco relativo de 2 a 3 vezes maior para o desenvolvimento do carcinoma

hepatocelular (HCC).

Diversas análises mutacionais no gene supressor de tumor TP53 em

indivíduos com HCC em populações da China e África que foram expostas a

aflatoxina mostraram altas freqüências de transversões de G para T,

especialmente no códon 249. Esta mutação ocorre no domínio de ligação de

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TP53 ao DNA, interferindo com a função normal deste gene supressor de

tumor.

Como a contaminação de aflatoxina na comida é um problema difícil de

ser completamente eliminado, programas de prevenção secundária

(quimioprevenção) são altamente desejáveis. Ditioltionas, encontrados em

vegetais crucíferos com brócoles, couve-flor e repolho, são potentes inibidores

do citocromo P-450. Assim, seu uso bloquearia a ativação da aflatoxina,

bloqueando a etapa de iniciação (Figura 3). Um derivado sintético de ditioltiona

(Oltipraz) inibe o desenvolvimento de tumores em animais e atualmente está

sendo estudado em humanos. Entretanto, enquanto a avaliação da eficácia de

Oltipraz está em andamento, outros agentes quimiopreventivos também têm

sido alvo de estudos, como é o caso da clorofilina.

A clorofilina, encontrado em vegetais de coloração verde, é uma mistura

de sais de sódio e cobre da clorofila, utilizada como corante de alimentos. Ela

atua diminuindo a biodisponibilidade de AFB1 e seus metabólitos, por diminuir

sua absorção e aumentando sua excreção, assim como inibindo a formação

de adutos derivados de AFB1. Recentemente, foi feito um ensaio clínico em

uma população na China, exposta a aflatoxinas em sua dieta e com alto risco

de desenvolvimento subseqüente de HCC. Nesse estudo, esses indivíduos

ingeriram clorofilina e foi constatada uma redução de 55% de aflatoxina N7-

guanina na urina, sugerindo que a clorofilina poderia ser usada contra os

efeitos da AFB1.

Promoção como alvo para prevenção

Muitos alimentos possuem grandes quantidades de flavonóides, como a

genisteína por exemplo. Estas substâncias têm sido estudadas como potentes

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inibidores de tirosino-quinases, enzimas associadas a resposta proliferativa.

Alterações na função destas enzimas são frequentes na fase de promoção.

Além de modular a resposta proliferativa, há evidências de que genisteína

também induza o processo de morte celular (apoptose), por interferir com o

grau de fosforilação de proteínas que atuam no controle da mitose (Figura 4).

Ainda,genisteína inibe a ativação do fator de transcrição nuclear, NF-kB e a via

de sinalização Akt, ambos envolvidos na manutenção de um balanceamento

entre a sobrevivência celular e a morte celular programada (Figura 1). O fator

de transcrição nuclear NFkB desempenha um papel importante no processo

inflamatório. Produtos naturais (como curcumin e resveratrol), possuem

atividade antiinflamatória e anticarcinogênica, pois bloqueiam a atividade

transcricional de NF-kB.

Vitaminas e anti-oxidantes como agentes quimiopreventivos

Câncer de próstata é o tumor mais comumente diagnosticado e o

segundo relacionado com tumores que levam ao óbito de homens em paises

desenvolvidos. Dados epidemiológicos mostram que variações étnicas e

geográficas na incidência e mortalidade do câncer de próstata podem estar

relacionadas ao consumo de substâncias na dieta, em especial anti-oxidantes.

Essas substâncias incluem vitamina D e E, soja, licopene e selênio. Entretanto,

a ingestão de grandes quantidades de vitamina D é prejudicial a saúde,

causando hipercalcemia. Já análogos sintéticos de vitaminas D (deltanóides)

que têm ação antiproliferativa e baixo risco de provocar hipercalcemia são

eficientes na diminuição do risco de desenvolvimento de câncer coloretal em

humanos.

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Estudos clínicos para determinar o valor preventivo de vitaminas A e E

para câncer de pulmão em jovens fumantes foram um dos primeiros ensaios

clínicos de quimioprevenção. Nesse estudo utilizaram-se altas doses de

vitamina E (alfa-tocoferol) associado com beta-caroteno ou vitamina A (retinol).

Embora o estudo tenha falhado em indicar qualquer grau de proteção contra o

câncer de pulmão; o grupo de indivíduos que recebeu vitamina E (sozinha ou

associada com beta-caroteno) apresentou uma diminuição de 34% no risco

para desenvolvimento de câncer de próstata, e de 16% para câncer de

intestino (coloretal).

Outro alvo potencial para quimioprevenção são os receptores de

hormônios esteróides, como o receptor de estrógeno. Desenvolvido

originalmente como um anti-estrogênico, o tamoxifeno vem sendo utilizado em

protocolos de quimioprevenção com resultados bastante promissores. Esta

droga é um modulador seletivo do receptor de estrogênio (SERM) que tem

atividade antiestrogênio em um órgão, como mama, e pró-estrogênio em outro,

como osso e útero. A atividade antiestrogênio em mama é desejável, pois o

estrogênio aumenta o crescimento de quase todas as células de câncer de

mama durante os estágios iniciais da carcinogênese. Por outro lado, a

exposição do epitélio uterino a tamoxifeno pode levar ao desenvolvimento de

carcinoma endometrial. Novas drogas como o raloxifeno apresentam menos

efeitos adversos sobre o útero e sua utilização é alvo de estudos clínicos.

Outro grupo de agentes quimiopreventivos que parece promissor são os

rexinóides. Estas moléculas se ligam seletivamente a receptores retinóides X,

apresentando grande capacidade de modular a ação de muitos fatores de

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transcrição. Em modelos animais esta droga tem demonstrado ação preventiva

contra câncer de mama.

Modificadores da estrutura da cromatina

Diferentemente das alterações genéticas, as mudanças epigenéticas

(metilação e desacetilação) são potencialmente reversíveis. Dessa forma, há a

possibilidade de reativar genes que estão silenciados epigeneticamente. A

estrutura da cromatina pode ser modificada com o uso de drogas que

aumentem a acetilação de histonas (inibidores de histono-deacetilases) ou

promovam a desmetilação de resíduos de citidina no DNA. Alguns genes

silenciados por metilação podem ser re-expressos usando agentes

desmetilantes como 5-azacitidina e 5-aza-2-deoxiacitidina. Estes compostos e

seus derivados têm sido usados como agentes quimiopreventivos em ensaios

clínicos e vêm mostrando alguns resultados terapêuticos, principalmente em

tumores hematopoiéticos. No entanto, as doses dessas drogas usadas

atualmente são bastante tóxicas. Essas dosagens podem ser reduzidas se

forem administradas em conjunto com agentes inibidores de histono-

deacetilases como o fenilbutirato.

Vários inibidores de histono-deacetilases têm demonstrado capacidade

de inibir o crescimento do tumor in vitro e in vivo a quantidades que são pouco

ou não tóxicas. Algumas dessas drogas já estão sendo testadas em protocolos

clínicos. Estes compostos atuam de maneira seletiva alterando a transcrição de

cerca de 2% dos genes expressos. Os inibidores de histono-deacetilases

incluem aminoácidos de cadeia curta como o 4-fenilbutirato e o acido valpróico;

ácidos hidroxâmicos como SAHA e tricostatina-A (TSA), entre outros;

tetrapeptideos cíclicos como trapoxin, apidicin e FK-228; e benzamidas como

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MS-275. Ácidos hidroxâmicos apresentam a capacidade de interagir com o sítio

catalílico de histono-deacetilases. Inibidores de histono-deacetilases causam

parada de ciclo celular em G1 e/ou G2, apoptose e/ou diferenciação de células

transformadas em cultura. Os efeitos de inibição de crescimento têm sido

documentados em quase todos tipos de células transformadas, incluindo

linhagens de células que surgem de tumores hematológicos (leucemias,

linfomas e mielomas) e epitelial (câncer de mama, bexiga, ovário, próstata e

pulmão).

Os inibidores de HDACs butirato, TSA, oxamflatin, MS-275 e SAHA

induzem a expressão do gene CDKN1A, que codifica um inibidor da quinase

dependente de ciclina, WAF1 (p21, Figura 2). WAF1 inibe a progressão do ciclo

celular, bloqueando a atividade da quinase dependente de ciclina e,

conseqüentemente provocando a parada do ciclo em G1.

Genes que são induzidos por inibidores de HDACs em células

transformadas são os seguintes: CDKN2A, que codifica INK4A também

conhecido como p16, e os genes para ciclina E, todos reguladores do ciclo

celular. Uma grande variedade de inibidores de HDACs demonstraram

capacidade de inibir o crescimento de tumor em modelos animais. O análogo

do butirato, fenilbutirato tem demonstrado capacidade de inibir o crescimento

de tumor in vivo. Muitos estudos com derivados do butirato mostraram que são

necessárias doses muito altas desses compostos. Inibidores de HDACs como

TSA, CHAP1, CHAP31, SAHA, piroxiamida e oxamflatin administrados

intravenosamente e intraperitonialmente, inibiram o crescimento de tumores de

mama, próstata, pulmão e estômago em modelos animais. Além disso, esses

compostos também foram capazes de inibir a progressão de neuroblastomas e

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leucemias com pouca toxicidade. SAHA e MS-275 administrados oralmente

foram eficientes na supressão do crescimento de tumores em ratos ou

camundongos. Inibidores de HDACs provocam uma acumulação de histonas

acetiladas no tumor e tecidos normais. O aumento de histonas acetiladas

funciona como um marcador biológico da atividade de HDACs, e tem sido

usado em estudos clínicos em pacientes com câncer.

Há um longo caminho a se percorrer até a consolidação de estratégias

quimiopreventivas para o câncer. Como as bases biológicas da carcinogênese

continuam sendo elucidadas, diferentes estratégias para quimioprevenção

certamente surgirão. O relativo sucesso dos protocolos clínicos iniciais,

destinados a prevenir câncer em indivíduos com alto risco desta doença sugere

que quimioprevenção seja uma estratégia possível e sensata. Investimentos

serão necessários para a formação de recursos humanos na área de pesquisa

clínica, nutricional e em educação para prevenção, para assim explorar as

perspectivas abertas pela melhor compreensão das etapas da carcinogênese.

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Page 23: Aspectos moleculares da transformação celular conceitos e implicações

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Legendas das Figuras Figura 1. A manutenção do número de células em qualquer tecido normal depende do equilíbrio entre proliferação e morte celular. Diversos mecanismos homeostáticos determinam este equilíbrio. Fatores de crescimento e fatores de sobrevivência favorecem o aumento do número de células em um tecido; enquanto fatores pró-apoptóticos, isto é que promovem a morte celular, e fatores anti-proliferativos favorecem a diminuição deste número de células. No equilíbrio, o número de células em uma população tende a ser mantido: fatores de crescimento se contrapõe a fatores anti-proliferativos, assim como fatores pró-apoptóticos se contrapõe a fatores de sobrevivência. Genes-chave da homeostasia celular, como por exemplo o gene supressor de tumores TP53 atuam interferindo de maneira controlada sobre este balanço. Em tumores, o aumento do número de células é o resultado líquido do desbalanço entre proliferação e morte (proliferação >> morte), que poderia ser obtido pela resposta descontrolada a fatores de proliferação; diminuição da sensibilidade (ou evasão) aos mecanismos pró-apoptóticos; diminuição da sensibilidade a fatores anti-proliferativos e até mesmo resposta descontrolada a fatores de sobrevivênc ia. Figura 2. Respostas celulares a agentes mutagênicos. A exposição das células a agentes mutagênicos endógenos e exógenos é bastante freqüente. As lesões causadas no DNA por estes agentes, no entanto, geralmente não se propagam. Diversos mecanismos de reparo de DNA atuam em células que sofreram agravos genotóxicos revertendo a célula mutada ao seu estado normal. Dependendo da intensidade do agravo, as células alteradas são excluídas da população de células do organismo. O gene supressor de tumor TP53 atua no controle do processo de reparo. Quando a função de TP53 está preservada, em resposta ao agravo genotóxico, há indução de expressão de genes como p21WAF, um inibidor universal de quinases dependentes de ciclinas, que leva às células a uma parada no cic lo celular; genes de reparo são também induzidos. Em consequência disto, as células mutadas são reparadas e revertem ao estado normal. Alternativamente, p53 pode também induzir a transcrição de bax, por exemplo, que atua induzindo o processo de morte celular (apoptose). Quando o gene TP53 está mutado, estes mecanismos não estão operantes, favorecendo a manutenção da célula mutada na população. Se houver condições, a célula mutada sofre expansão clonal gerando um tumor. Figura 3. Iniciação como alvo para quimioprevenção. A aflatoxina B1 (AFB1), presente em alimentos contaminados com o fungo Aspergillus fumigatus é um pró-carcinógeno, que após metabolizada por isoformas de citocromo P450 pode dar origem a um agente mutagênico, associado à iniciação de hepatócitos no desenvolvimento do carcinoma hepatocelular. Infeccão persistente pelo vírus da Hepatite B, associado ao desenvolvimento da hepatite crônica ativa, atua como fator promotor para o desenvolvimento do tumor. Inibidores de citocromo P450, como ditioltionas (Oltipraz) inibem a ativação do carcinógeno. Substâncias como clorofilina ligam-se a aflatoxinas e

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derivados, diminuindo a biodisponibilidade do pró-carcinógeno e competindo com a ligação do carcinógeno ao DNA. Figura 4. A fase de promoção como alvo para quimioprevenção. Flavonóides como a genisteína atuam de diversas maneiras favorecendo a morte celular de células em proliferação. Genisteína atua como um inibidor de tirosino-quinases, enzimas envolvidas na transdução de sinais proliferativos, como, por exemplo, aqueles associados à ativação de receptores da família de EGF (epidermal growth factor), como erbB2, frequentemente ativado em tumores de mama e próstata. Ensaios pré-clínicos são promissores. Indutores de diferenciação celular também podem ser usados nesta fase. A tentativa seria a de reprogramar a célula iniciada a executar um programa de diferenciação, que culminaria com o processo de morte celular.