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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CEJURPS CURSO DE DIREITO ASPECTOS DESTACADOS DO ALTO-MAR: NOÇÕES HISTÓRICAS, REGULAMENTAÇÃO E RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL SARA CRISTINA CARTURANI Itajaí, junho de 2010.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO

ASPECTOS DESTACADOS DO ALTO-MAR: NOÇÕES

HISTÓRICAS, REGULAMENTAÇÃO E RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL

SARA CRISTINA CARTURANI

Itajaí, junho de 2010.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO

ASPECTOS DESTACADOS DO ALTO-MAR: NOÇÕES

HISTÓRICAS, REGULAMENTAÇÃO E RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL

SARA CRISTINA CARTURANI

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientador: Professora MSc. Márcia Sarubbi Lippmann

Itajaí, junho de 2010.

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AGRADECIMENTO

Gostaria de agradecer primeiramente aos meus pais

e à minha família que dividiram comigo todos os

momentos até a concretização deste com muita

compreensão, apoio e incentivo.

Em segundo lugar, à minha orientadora, que, soube

como me ajudar didaticamente na condução deste.

"Se um homem não sabe a que porto se dirige,

nenhum vento lhe será favorável". (Sêneca).

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais que sempre me

influenciaram na busca pelo conhecimento.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, junho de 2010.

Sara Cristina Carturani Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Sara Cristina Carturani, sob o título

Aspectos destacados do alto-mar: noções históricas, regulamentação e

responsabilidade internacional e foi submetida em 23 de junho de 2010 à banca

examinadora composta pelos seguintes professores: MSc. Márcia Sarubbi Lippmann

(professora orientadora) e MSc. Heloisa Helena Leal Gonçalves (professora

examinadora), e aprovada com a nota [Nota] ([nota Extenso]).

Itajaí, junho de 2010.

Professora MSc. Márcia Sarubbi Lipmann Orientadora e Presidente da Banca

Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CEEA Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar CCom Código Comercial brasileiro CIJ Corte Internacional de Justiça DIP Direito Internacional Público

COLREG Convention on the International Regulations for Preventing Collisions at Sea / Convenção sobre Regulamentos Internacionais para Prevenir Abalroamentos no Mar

CRFB Constituição da República Federativa do Brasil DOU Diário Oficial da União DPC Diretoria de Portos e Costas

IMO International Maritime Organization/ Organização Marítima Internacional

ITLOS Tribunal Internacional do Direito do Mar LESTA Lei de segurança para o tráfego aquaviário OIT Organização Internacional do Trabalho OEA Organização dos Estados Americanos OMC Organização Mundial do Comércio OSC/OMC Órgão de Solução de Controvérsias da OMC ONU Organização das Nações Unidas RIPEAM Regras Internacionais para Evitar Abalroamento no Mar

SOLAS International Convention for the Safety of Life at Sea / Convenção Internacional Para Segurança da Vida no Mar

UNCLOS/ CNUDM United Nations Conference on the Law of the Sea / Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar

UNESCO Organização das Nações Unidas Educacional, Científica e Cultural

ZEE Zona econômica exclusiva

As siglas e abreviaturas não constantes aqui serão

oportunamente destacadas no corpo do texto.

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Águas interiores: 1

Faixa autônoma das águas territoriais, que ocupa as reentrâncias do litoral, baías,

abras, recôncavos, estuários, enseadas, assemelhadas aos lagos e rios.

Alto-mar: 2

Todas as partes do mar não pertencentes ao mar territorial ou as águas interiores de

um Estado.

Direito Internacional: 3

Conjunto de normas jurídicas que regulam as relações mútuas dos Estados e,

subsidiariamente, as das demais pessoas internacionais, como determinadas

organizações, e dos indivíduos.

Direito Marítimo: 4

É o conjunto de normas que regem as relações jurídicas relativas à navegação e ao

comércio marítimo, fluvial, ou lacustre, bem como dos navios a seu serviço e os

direitos e obrigações das pessoas que por ofício se dedicam a essa espécie de

atividade.

Mar territorial: 5

1 RANGEL, Vicente Marotta. Natureza jurídica e delimitação do mar territorial. 2. ed. São Paulo: RT, 1970. p. 24.

2 Primeira conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, Genebra, 1958. Art. 1º.

3 ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 03.

4 NUNES, Pedro. Dicionário de tecnologia jurídica. 12. ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1990. p. 343 apud LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 42.

5 ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 255.

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Faixa de mar que se estende desde a linha de base até uma distância que não deve

exceder 12 milhas marítimas da costa e sobre a qual o Estado exerce a sua

soberania, com algumas limitações determinadas pelo Direito Internacional.

Pessoas Internacionais: 6

Pessoa física ou jurídica a quem a ordem internacional atribui direitos e deveres

sendo destinatários das normas jurídicas internacionais.

Tratado: 7

Acordo regido pelo Direito Internacional. Ato jurídico por meio do qual se manifesta o

acordo de vontades entre duas ou mais pessoas internacionais.

Zona econômica exclusiva: 8

É um espaço marítimo criado pela Terceira Conferência das Nações Unidas para

compensar os Estados que tiveram de diminuir a largura do seu mar territorial. 9

6 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 15. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p.345-346. v.2.

7 ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 23.

8 A zona contígua, que pertencia ao alto-mar, encontra-se atualmente incluída na zona econômica exclusiva, e vai até a largura de 24 milhas, medidas a partir da linha de base do mar territorial. Ela deixou de ser uma zona de alto-mar, como estabelecia a Conferência de 1930. In: MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 08.

9 V. Winston Conrad Extravour, The Exclusive Economic Zone, Leiden, Sijthoff, 1979. apud MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p.7-8.

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SUMÁRIO

RESUMO........................................................................................... XI

INTRODUÇÃO .................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ....................................................................................... 4

NOÇÕES HISTÓRICAS E REGULAMENTAÇÃO DO MAR ............... 4

1.1 ORIGEM, EVOLUÇÃO E FONTES DO DIREITO DO MAR ............................ 4

1.2 LEGISLAÇÃO CODIFICADA VIGENTE ........................................................ 11

1.3 ASPECTOS DESTACADOS ACERCA DOS TRATADOS ............................ 16

1.4 DIREITO COSTUMEIRO ................................................................................ 24

CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 27

O INSTITUTO ALTO-MAR ................................................................ 27

2.1 ASPECTOS FUNDAMENTAIS – CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA ..... 27

2.2 AS MUDANÇAS INTRODUZIDAS PELAS CONVENÇÕES E O NOVO DIREITO DO MAR ............................................................................................................... 29

2.3 DELIMITAÇÃO E DIFERENCIAÇÃO COM OUTROS INSTITUTOS ............ 32

2.4 LIBERDADES E RESTRIÇÕES À LIBERDADE DOS MARES .................... 35

CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 46

RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL ....................................... 46

TIPOS DE RESPONSABILIDADE ....................................................................... 46

3.2 SOLUÇÕES PACÍFICAS DOS CONFLITOS ................................................. 55

3.3 SOLUÇÕES DIPLOMÁTICAS DOS CONFLITOS ......................................... 56

3.4 SOLUÇÕES JURÍDICAS DOS CONFLITOS ................................................. 58

3.5 SOLUÇÕES POLÍTICAS DOS CONFLITOS ................................................. 62

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 68

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x

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................... 70

ANEXOS ........................................................................................... 74

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso será focado em Direito Internacional e Direito do Mar, abordando principalmente o alto-mar, tema escolhido devido à importância histórica do mar, desde as Navegações, às grandes guerras, até o comércio exterior moderno, desta forma influenciando econômica, social e politicamente todas as nações e tem por fim o estudo da responsabilidade internacional dos Estados no mar, as delimitações geográficas dos institutos lá existentes, as disposições regulamentadoras desses espaços, os direitos e deveres no mar e o cumprimento destes ou sua conseqüente sanção, inclusive no tocante à preservação marinha e ambiental, bem como a relevância do aproveitamento dos limites marítimos para a consolidação da soberania. O Brasil tem acolhida neste estudo também, tendo em vista seu interesse na defesa e exploração das suas áreas costeiras e marinhas e dos recursos nelas contidos. O enfoque desta pesquisa se dá justamente em razão do interesse legítimo da soberania dos países em relação às suas costas, tanto para proteção quanto para exploração, o que enfatiza a relevância e atualidade do presente tema. Desta forma, resta caracterizada a relevância social do presente trabalho bem como sua importância para a Ciência Jurídica do presente trabalho.

Palavras-chave: Alto-mar. Delimitação. Estado. Mar. Responsabilidade. Soberania. Solução de conflitos. Território.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto aprofundar o

conhecimento no âmbito do mar, especificamente do alto-mar, suas características e

a responsabilidade internacional dos Estados.

O seu objetivo é produzir Monografia para obtenção do Título

de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

O objetivo da pesquisa seria discorrer sobre o alto-mar,

demonstrar os direitos e deveres no mar, investigar de que modo se dá a

responsabilidade internacional, reunir as legislações pertinentes ao tema, examinar

os institutos abordados no presente trabalho, descobrir quais são as sanções

previstas para delitos ocorridos e de que modo se solucionam e quais órgãos fariam

cumprir as possíveis sanções estabelecidas.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando das fontes do

Direito do Mar, de seu histórico, de sua regulamentação por meio dos Tratados e

Convenções Internacionais pertinentes aos institutos que serão oportunamente

abordados e ainda da legislação vigente acerca do presente tema.

No Capítulo 2, analisa-se especificamente do instituto jurídico

alto-mar, em seus diversos aspectos, tais como sua conceituação, natureza jurídica,

relevância, diferenciação com outros institutos do mar bem como quais os direitos e

os limites da liberdade em alto-mar.

No Capítulo 3, trata-se da responsabilização das pessoas

internacionais em razão de sua participação direta ou indireta para o acontecimento

de evento em alto-mar e quais órgãos fazem cumprir quem descumpre os preceitos,

bem como os modos de solução de conflitos, sejam estes pacíficos ou coercitivos.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,

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seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o alto-

mar.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

1 No âmbito nacional não há legislação específica que englobe

todos os fatos e acontecimentos pertinentes ao alto-mar, sendo que os Estados,

inclusive o Brasil, são signatários de vários tratados e convenções internacionais

que regulamentam o tema no que a legislação interna for omissa ou obscura.

2 O alto-mar pertence a todos da comunidade internacional e lá

vigoram as normas de Direito Internacional, sendo que os Estados têm direito de

exercer sua soberania no mar porém sofrem também limitações no exercício desta.

3 A responsabilidade internacional do Estado pode se dar de

várias formas, por meio de atos ou omissões e em caso de conflitos, estes devem

ser resolvidos diplomaticamente.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação10 foi utilizado o Método Indutivo11, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano12, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

10

“[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.

11 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.

12 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

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3

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

do Referente13, da Categoria14, do Conceito Operacional15 e da Pesquisa

Bibliográfica16.

13

“[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 62.

14 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.

15 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.

16 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD,Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.

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CAPÍTULO 1

NOÇÕES HISTÓRICAS E REGULAMENTAÇÃO DO MAR

1.1 ORIGEM, EVOLUÇÃO E FONTES DO DIREITO DO MAR

Este capítulo introduz os aspectos básicos, mas fundamentais

para o estudo do Direito do Mar, trazendo noções gerais sobre o tema, para

demonstrar sua relevância e influência sobre vários aspectos, sobretudo econômicos

e jurídicos, no panorama dos institutos que envolvem o mar.

Na condição de dependentes do mar para a subsistência desde

tempos muito remotos, de várias maneiras pode-se demonstrar nossa estreita

relação com o mar, pois vários setores da economia mundial e nacional se

encontram interligados e necessitam do mar, como a pesca, o comércio, o turismo, a

extração de petróleo, entre outros, inclusive não podendo deixar de mencionar a

geração de empregos que ocorrem por meio dessa relação.

A principal dificuldade encontrada concernente ao tema é a

diferenciação da nomenclatura que acarreta considerar diferentes institutos jurídicos

que envolvem os ramos do Direito hoje existente.

O Direito do Mar não é Direito da Navegação tampouco é

Direito Marítimo, porém em certos aspectos se encontram bem próximos ou até se

confundem por tratarem muitas vezes dos mesmos institutos, mas de perspectivas

diferentes.

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De acordo com Eliane M. Octaviano Martins o Direito do Mar ou

Law of the sea pode ser considerado um ramo do direito internacional público

marítimo. 17

Segundo a mesma autora esse ramo regulamenta

especificamente18:

“O tráfego internacional em alto-mar e em demais áreas, além de consagrar a soberania e a jurisdição dos Estados e ainda abrange o conjunto das normas legais que visam a reger o uso do mar, ao atuar na prevenção e na solução de conflitos”.

A origem do Direito do Mar, portanto se entrelaça com a do

Direito Marítimo e do Direito da Navegação, pois eles têm em comum a crescente

necessidade de se dar ao mar um regime jurídico devido à disputa dos Estados

pelos territórios marítimos, suas riquezas naturais e recursos vivos e também pelo

comércio marítimo que perdura intensamente até hoje.

Segundo SEITENFUS19 objeto do direito internacional do mar

é:

“O conjunto de água salgada do globo que se encontra em livre e natural comunicação, seu solo, subsolo e o espaço aéreo sobrejacente”.

O avanço das descobertas dos povos tanto em relação à

tecnologia tanto quanto em relação à ciência também contribuiu imensamente para

novos povos se aventurarem cada vez mais no mar, o que antes era atitude

arriscada devido à precariedade dos meios de comunicação e informação e até

mesmo pelo não conhecimento do que iriam encontrar em outros locais. Com o

aumento das viagens no mar, surgiram conflitos e sentiu-se a demanda por

normatizar o uso do mar em caráter internacional.

17

MARTINS, Eliane M. Octaviano. Curso de Direito Marítimo.São Paulo: Manole. 3. ed. rev. e ampl. p. 10. v. 1.

18 MARTINS, Eliane M. Octaviano. Curso de Direito Marítimo. p. 10. v. 1.

19 SEITENFUS, Ricardo. Ventura, Deisy. Introdução ao direito internacional público. 3. ed.rev.e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p.172.

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6

O Direito do Mar remete historicamente à época das Grandes

Navegações, onde as civilizações viviam principalmente do comércio marítimo.

Alguns exemplos seriam os fenícios, egípcios, gregos e posteriormente os

portugueses, espanhóis, entre outros. 20

Até mesmo nesse período grandes povos utilizavam-se da

navegação de forma semelhante à pirataria e desencorajando outros povos com

histórias terríveis sobre as aventuras no mar, para manter o monopólio sobre o

comércio marítimo. Dessa maneira, durante muito tempo, os Estados estavam

requerendo para si grandes partes do alto-mar, exercendo sua jurisdição sobre

esses locais. 21

Com o advento de Roma, acabou a primeira grande época das

navegações, o princípio da liberdade foi afirmado, mas eles não tinham a noção de

mar territorial, fazendo o mar parte do jus gentium, chamavam-no de Mare Nostrum,

e mesmo dando pouca importância à pesca, ainda assim afirmavam sua jurisdição

sobre o Mediterrâneo e reivindicavam a proteção à navegação. 22

Na Idade Média, expandiu-se o interesse sobre o mar, tanto

econômico quanto estratégico, dando origem a regulamentações consuetudinárias e

começou a se considerar uma parte do mar em que pudesse se exercer sua

jurisdição, tentando-se justificar a criação do mar territorial, principalmente pelas

cidades marítimas italianas. 23

20

ANJOS, José Haroldo dos; GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de Direito Marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p. 218 apud CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. Introdução ao Direito Marítimo. Disponível em: <http://www.amc.org.br/novo_site/esmesc/arquivos/IntroducaoAo Direito Maritimo.doc. Acesso em 20 out. 2009.

21 REZEK, José Francisco. Direito internacional público: curso elementar. 9. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 306.

22 VIANNA, Regina Cecere. O Direito do Mar na Idade Média. Apostilas de Direito do Mar. Curso de Direito – Furg. Biblos: Rio Grande-RS, 2007. p. 242-243. Disponível em: <http://www.scribd.com/doc/23741244/O-DIREITO-DO-MAR-NA-IDADE-MEDIA>. Acesso em 19 maio 2010.

23 VIANNA, Regina Cecere.O Direito do Mar na Idade Média. p. 244.

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7

Essas normas seriam: 24

a) Leis de Rodes (Lex Rhodia de Jactu): Seriam datadas

do século III ou II a.C. sendo a máxima autoridade no Mediterrâneo, por seus

princípios de proteção contra os perigos do mar terem sido aceitos e utilizados pelos

gregos e romanos. Foram compiladas durante os séculos VII e IX, vigorando por

bastante tempo no Mediterrâneo, culminando no “Código Navale Rhodorium”;

b) Basilika: Código de direito bizantino, regulava o

comércio de Levante. Dependia da vontade do imperador e não dos comerciantes e

mercadores. Estabelecia princípios gerais que complementavam casos especiais

derivados das Leis de Rodes;

c) Consolato Del Mare (Consulado do Mar): Data do século

XIV, no Mediterrâneo, era uma instituição jurídico-mercantil medieval, quando o

comércio havia revivido após o declínio do Império Romano. Havia grande variedade

de estatutos locais, formada por um Prior e redigidos por vários Cônsules. O primeiro

foi o da cidade de Trani: compiladas por volta de 1603 pelos Cônsules da

Corporação de Navegantes, que eram as pessoas mais instruídas em questões

marítimas de todo o golfo Adriático, se estendendo rapidamente em outras cidades

como Constantinopla, Maiorca, Chipre, Barcelona;

d) A Tábua Amalfitana, do século X, versava sobre os usos

marítimos atinentes à cidade de Amalfi, na Itália;

e) Os assizes de Jerusalém surgiram da necessidade de

códigos adequados aos casos que envolvessem o mar, pois na época criaram-se

tribunais próprios pelos Cruzados para dirimir questões nas costas do Mediterrâneo.

Sua aplicação foi confiada aos Cônsules ou Magistrados marítimos, nomeados em

portos comerciais de grande importância, tais como Gênova, Veneza e Marselha;

24

MOURA, Danieli Veleda. Aspectos relevantes do Direito do Mar: da antiguidade à contemporaneidade. Revista Jus Vigilantibus. Publicado em 14 de julho de 2009. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/40966>. Acesso em 19 de maio de 2010.

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8

f) As leis de Oléron têm origem discutível, aparecendo no

litoral atlântico do Mediterrâneo devido ao contato com as Cruzadas. A teoria mais

aceita é a de que decorrem de sentenças pronunciadas pelo Tribunal Marítimo de

Oléron. Foram observadas no tráfico comercial entre os portos da França, Espanha

e Inglaterra;

g) As leis Wisbuenses ou Leis Marítimas de Gothland eram

uma coleção extraídas de três legislações diferentes (Leis de Oléron, Leis de

Amsterdã e Estatutos da Cidade de Lubeck). No século XI, os comerciantes de

Wisby, ilha da Suécia, dispuseram as suas próprias normas, mais tarde sancionadas

em Copenhague em 1505 como Leis Marítimas de Wisby;

Com o estudo sobre o monopólio dos mares surgiu uma

controvérsia entre Hugo Grotius, holandês, que publicou em 1609, Mare liberum,

que excluía as baías, golfos, estreitos e o mar próximo a terra, e defendia a

liberdade dos mares e o inglês John Selden, que em 1635 em resposta àquele

publicou o Mare clausum, obra que havia sido encomendada por Jacques I da

Inglaterra e sustentava que com base no Direito Romano, a ocupação do mar iria até

onde a vista alcançasse e que os mares pertenciam à Inglaterra, mas era permitida

a navegação por outros Estados. 25

A partir do final do século XIX, foi tido como referencial o

princípio ressaltado na obra de Grotius – liberdade dos mares - até hoje considerada

de grande relevância, apesar desse autor não ter sido o primeiro a discutir o tema. É

importante ressaltar que esse princípio sofre restrições, que serão tratadas

posteriormente em outro capítulo. 26

Com a queda de Constantinopla em 1453, o comércio marítimo

entre o Oriente e o Mediterrâneo foi prejudicado, assim em 1493 o Papa Alejandro

VI, expediu a Bula Inter Coetera, fixando limites entre as possessões espanholas e

portuguesas entre o meridiano que passava perto dos Açores e das Ilhas de Cabo

25

ACIOLLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. 11. ed. 10ª tiragem. rev. pelo Embaixador Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva. São Paulo: Saraiva, 1993. p.197.

26 ACIOLLY, Hildebrando.Manual de direito internacional público. p. 197.

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9

Verde. As terras e mares a oeste pertenciam à Espanha e as situadas a leste seriam

de Portugal. Tal divisão não agradou aos portugueses que elaboraram com os

espanhóis o Tratado de Tordesilhas em 1494. 27

Já no século XVIII surge o mar territorial delimitado pelo tiro de

canhão. Galiani mediu como sendo três milhas que corresponderiam a uma légua. A

pesca ainda era bastante livre, porém começou-se a impor a pescadores

estrangeiros as mesmas condições exigidas dos pescadores nacionais. 28

Em 1945, o presidente americano Harry Truman na

“Proclamação Truman” declarou a soberania dos EUA sobre os recursos naturais

existentes na plataforma continental. 29

No final do século XVIII e início do século XIX é que a liberdade

dos mares foi consagrada globalmente, porém até a 1ª Guerra Mundial só foi

concedida aos Estados com litoral. 30

No século XIX têm-se as noções de zona contígua e de mar

territorial consolidadas internacionalmente pela prática, sendo o último consagrado

no Tratado internacional de Gand, levado em consideração pelos Estados Unidos da

América e pela Inglaterra, fixando em três milhas a distância de pesca exclusiva dos

nacionais. 31

Após isso, contemporaneamente, com o desenvolvimento

tecnológico e com acontecimentos relevantes como a Conferência de paz de Haia,

1907 e a de 1930, bem como os convênios firmados das organizações

internacionais como a ONU, o mar ampliou suas atribuições como, por exemplo, a

27

MOURA, Danieli Veleda. Aspectos relevantes do Direito do Mar: da antiguidade à contemporaneidade. Revista Jus Vigilantibus.

28 MOURA, Danieli Veleda. Aspectos relevantes do Direito do Mar: da antiguidade à contemporaneidade. Revista Jus Vigibulantibus.

29 A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Disponível em: <http://www.infomar.110mb.com/direitos_do_mar.htm.> Acesso em: 19 maio 2010.

30 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1246. v. 2.

31 MOURA, Danieli Veleda. Aspectos relevantes do Direito do Mar: da antiguidade à contemporaneidade. Revista Jus Vigilantibus.

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exploração de petróleo e o poderio naval, mantendo outras como o comércio

marítimo, a pesca, a soberania das costas, etc.

Quanto às fontes do Direito do Mar, estas se deram no início

em razão do costume, para mais tarde passar a ser regulamentada, quando

houveram tentativas em 1930 e 1939, respectivamente na Comissão de Juristas

para a codificação do Direito Internacional, que não vingou, e na 1ª Reunião de

Consultas dos Ministros das Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, no

Panamá, que resultou na “Declaração do Panamá”, mas só em 1958 na Convenção

de Genebra foi iniciada a codificação.32

As principais fontes do Direito do Mar codificadas e vigentes

até hoje são as Convenções de Genebra de 1958 e a Convenção das Nações

Unidas sobre o Direito do Mar de 1982, em Montego Bay na Jamaica, que

regulamentou amplamente o tema. 33

No âmbito internacional, portanto, temos: Cartas da ONU,

Convenções, Tratados, Acordos, Resoluções, o costume, a doutrina, bem como a

jurisprudência dos Tribunais competentes, como, por exemplo, do Tribunal

Internacional do Direito do Mar, da Corte Internacional de Justiça, entre outros, que

serão especificados no próximo subtítulo.

No Brasil, durante muito tempo, por conta da colonização

portuguesa, seguiram-se os preceitos de outras legislações, principalmente pelas

Ordenações Afonsinas, Manoelinas e Filipinas, sendo esta última o regimento

majoritário do período colonial brasileiro. Com a independência do Brasil em 1822,

manteve-se as leis anteriores até que outras leis nacionais a substituíssem como

ocorreu com o Código Comercial de 1850.

Quanto às fontes no âmbito interno atualmente temos no

ordenamento jurídico pátrio: as Convenções e os Tratados internacionais que foram

internalizadas pelo nosso ordenamento jurídico, bem como a legislação esparsa, a

32

JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. 2. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 514.

33 SEITENFUS, Ricardo. Ventura, Deisy. Introdução ao direito internacional público. p. 173.

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11

doutrina, a jurisprudência, o costume, a equidade, os princípios gerais do Direito

entre outros que serão abordados oportunamente.

1.2 LEGISLAÇÃO CODIFICADA VIGENTE

Tem como objetivo elencar sucintamente as legislações

pertinentes acerca da matéria, demonstrando a codificação atual que rege o tema a

ser estudado.

A regulamentação jurídica internacional do alto-mar, a

resolução dos conflitos internacionais advém da Corte Internacional de Justiça (CIJ)

com sede em Haia, na Holanda, do Tribunal Internacional do Direito do Mar (ITLOS),

sediado em Hamburgo na Alemanha, da Organização Marítima Internacional (OMI),

sediada em Londres e das Convenções Internacionais principalmente a de Genebra

de 1958 e da Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar 34 (UNCLOS I,

II, III).

A CIJ é o principal órgão judicial das Nações Unidas, começou

seus trabalhos em 1946 na Holanda, atualmente a Corte é composta de 15 juízes e

julga casos de divergências conforme a disposição da legislação internacional, entre

os Estados submetidos à essa legislação bem como presta assessoria em lides

encaminhadas por órgãos devidamente autorizados das Nações Unidas e agências

especializadas. A Corte não tem jurisdição para resolver lides entre indivíduos,

organizações não-governamentais, corporações ou qualquer outro ente privado nem

em casos contra autoridades de qualquer Estado. 35

Já o Tribunal Internacional do Direito do Mar é um órgão

judicial independente estabelecido pela Convenção de 1982 de Montego Bay para

34

RIBEIRO, Marilda Rosado de Sá. BEZERRA, Luiz Gustavo Escorcio. Soberania, Direito Internacional do Mar e a exploração de petróleo e gás nas áreas offshore do Brasil. Disponível em:< http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4906>.

Acesso em 25 maio 2010.

35 Corte Internacional de Justiça: perguntas freqüentes. Disponível em: <http://www.icj-cij.org/information/index.php?p1=7&p2=2>. Acesso em 20 maio 2010.

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adjudicar disputas decorrentes da interpretação e aplicação da Convenção. É

composto por 21 membros independentes, eleitos entre pessoas da maior reputação

de justiça e integridade e de reconhecida competência no campo do Direito do Mar.

É dividida em Câmaras: Câmara de Procedimento Sumário, Câmara para Questões

de Pesca, Câmara para Questões de Ambiente Marinho e Câmara para Questões

de Delimitação Marítima. A jurisdição deste órgão abrange todas as disputas

submetidas em conformidade com a Convenção e também se estendem a todas as

questões específicas contanto que esteja em qualquer outro acordo que conceda

jurisdição a este órgão. 36

Finalmente a Organização Marítima Internacional37, antes

chamada de Organização Consultiva Marítima Intergovernamental (que foi alterada

por emenda de 1977) é considerada uma instituição especializada das Nações

Unidas, foi aberta à adesão dos Estados na Convenção de Genebra de 1958 e logo

começou a vigorar, tendo suas funções definidas no artigo 1º do Ato Constitutivo.

Seus membros se dividem entre associados (conforme artigo 72 do Ato Constitutivo

são territórios que manifestam o desejo de participar, mas não tem direito a voto) e

plenos (são membros das Nações Unidas que firmarem a Convenção, os não-

membros que participaram da reunião de 1948 ou qualquer outro Estado que

cumpra o rito de ingresso). O poder decisório se encontra nas mãos das potências

marítimas. 38

No caso das leis, decretos e regulamentos é que provêm

muitas vezes os conceitos dos institutos abordados. Exemplo de lei nesse sentido:

Lei 9.534/97 – Lei de segurança do tráfego aquaviário, que trouxe, por exemplo, o

conceito de navegação em mar aberto no artigo 2º, inciso XI, como: “realizada em

águas marítimas consideradas desabrigadas”.

36

Tribunal Internacional do Direito do Mar. Disponível em:<http://www.itlos.org/start2_en.html>. Acesso em 20 maio 2010.

37 Organização Marítima Internacional. Disponível em: <http://www.imo.org/>. Acesso em 20 maio 2010.

38 SEITENFUS, Ricardo; VENTURA, Deisy. Introdução ao Direito Internacional Público. p. 172-173.

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13

No tocante às normas e Convenções Internacionais dos quais

o Brasil é signatário temos: 39

a) Aviso de 2 de Abril de 1986, torna pública, em texto

único, a Convenção da Organização Marítima Consultiva Intergovernamental,

adotada pela Conferência Marítima das Nações Unidas realizada em Genebra em 6

de Março de 1948 (CEEA);

b) Resolução da Assembléia da República nº. 60-B, de 14

de Outubro, aprova para ratificação a Convenção das Nações Unidas Sobre o

Direito do Mar (Convenção de Montego Bay), de 10 de Dezembro de 1982 (CEEA),

internalizada por meio do Decreto nº. 1.530, de 22 de junho de 199540;

c) Convenção de Direito Internacional Privado (Código de

Bustamante) – A Convenção foi assinada em Havana, em 20 de fevereiro de 1928;

sancionada pelo Decreto 5.647, de 08/01/29; ratificada pelo Brasil em 25 de julho de

1929, e promulgada pelo Decreto nº. 18.871, de 13 de agosto de 1929;

d) Convenção Internacional para Unificação de Certas

Regras Relativas aos Privilégios e Hipotecas Marítimas – Bruxelas, em 14 de abril

de 1928, aprovada pelo Decreto nº. 5.814;

e) Convenção Internacional para Unificação de Certas

Regras Respeitantes às Imunidades dos Navios de Estado – Bruxelas, 14 de abril de

1927, ratificada pelo Brasil em 23/12/30 e promulgada pelo Decreto nº. 1.126/30;

f) Convenção Internacional para Unificação de Certas

Regras em Matéria de Abalroamento, Assistência e Salvamento Marítimo –

Bruxelas, em 23 de setembro de 1910, e promulgada pelo Decreto 10.773, de

18/02/14;

39

Segundo RAPHAEL, Leandro. Direito Marítimo. São Paulo: Aduaneiras, 2003.p. 15-17.

40 PEDRO, Antônio Fernando Pinheiro. Direito do mar e gerenciamento da costa brasileira. Disponível em: <http://www.pinheiropedro.com.br/biblioteca/artigos_publicacoes/temas_ambientais/ 06_direito_do_mar_gerenciamento_costa.php>. Acesso em 19 maio 2010.

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14

g) Convenção Internacional para Unificação de Certas

Regras Relativas à Limitação da Responsabilidade dos Proprietários de Embarcação

Marítima – Bruxelas, em 24 de dezembro de 1924, sendo promulgada pelo Decreto

nº. 350, de 01/10/35;

h) Convenções Internacionais da Organização

Internacional do Trabalho (OIT), referente ao Trabalho Marítimo;

i) Convenções Internacionais da Organização Marítima

Internacional (IMO);

j) Convenção Internacional sobre Regulamento para

Prevenir Colisões no Mar, 1983;

k) Convenção Internacional Sobre a Salvaguarda da Vida

Humana no Mar – Londres, 1929;

l) Convenção Internacional para a Unificação de Certas

Regras de Direito Concernentes aos Conhecimentos Marítimos – Bruxelas, 1924 –

Regras de Haia e alterada pelas Regras de Visby (Conferência do Comitê Marítimo

Internacional, em Estocolmo, em junho de 1963 – Protocolo de Bruxelas, 1968);

m) Convenção Internacional para Unificação de Certas

Regras sobre Arresto de Navios – Bruxelas, 1952;

n) Convenção Internacional para Unificação de Regras

Relativas à Competência Civil em Matéria de Abalroamento e outros Acidentes da

Navegação – Bruxelas, 1952 – Brasil assinou, porém não ratificou;

o) Convenção Internacional para Unificação de Regras

Relativas à Competência Penal em Matéria de Abalroamento e outros Acidentes da

Navegação – Bruxelas, 1952 – O Brasil assinou, mas não ratificou;

p) Convenção Internacional sobre o Limite de

Responsabilidade dos Proprietários de Navios de Alto-Mar – Bruxelas, 1957;

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15

q) Convenção Internacional sobre Limitação de

Responsabilidade em Reclamações Marítima – Londres, 1976;

Merece ser mencionado o Código Internacional de Sinais,

regulamentando o uso de sinais e luzes pelos navios, que não resultou em uma

convenção internacional, mas que é adotado por quase todos Estados marítimos. 41

E quanto à legislação do ordenamento jurídico pátrio sobre o

Direito do Mar temos42:

a) Brasil. Lei 2.180 de 05 de fevereiro de 1954, que dispõe

sobre o Tribunal Marítimo;

b) Brasil. Lei 6.421, de 06 de junho de 1977, que dispõe e

fixa as diretrizes para a proteção à utilização dos faróis, faroletes e demais sinais

visuais de auxílio à navegação na costa brasileira;

c) Brasil. Lei 7.661, de 16 de maio de 1988, que institui o

Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e dá outras providências;

d) Brasil. Lei 8.617 de 04 de janeiro de 1993, que dispõe

sobre o mar territorial, a zona contígua, a zona econômica exclusiva e a plataforma

continental brasileiros, e dá outras providências;

e) Brasil. Lei 9.537, de 11 de dezembro de 1997, que

dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário em águas sob jurisdição nacional e

dá outras providências;

f) Brasil. Lei 9.966, de 28 de abril de 2000, que Dispõe

sobre a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento

de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional

e dá outras providências (Lei do óleo);

41

ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 198.

42 Segundo RAPHAEL, Leandro. Direito Marítimo. p. 15-17.

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g) Decreto 1.530, de 22 de junho de 1995, que declara a

entrada em vigor da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar,

concluída em Montego Bay, Jamaica, em 10 de dezembro de 1982;

h) Decreto 87.648, de 24 de setembro de 1982, que aprova

o Regulamento para o Tráfego Marítimo.

1.3 ASPECTOS DESTACADOS ACERCA DOS TRATADOS

Os tratados são fontes primordiais do Direito Internacional

Público bem como do Direito do Mar, assim sendo merecem destaque no presente

estudo. Os acordos, convenções, protocolos, entre outros, podem ser confundidos,

porém constituem formas de tratados.

Os tratados podem ter várias funções, como criar, alterar e

extinguir direitos e obrigações entre as partes. A sua importância se deve à

crescente necessidade da comunidade internacional de celebrar acordos devido à

intensificação da interdependência e cooperação entre as nações. 43

Os principais textos legais que dispõem sobre os tratados são

a Carta da ONU em seu artigo 63 e as Convenções de Viena sobre o Direito dos

Tratados de 1969 (art.3º) e 1986. 44

Quanto à sua definição na visão de Ricardo Seitenfus45:

“São acordos concluídos entre dois ou mais sujeitos de direito internacional, (...) destinam-se a produzir efeitos jurídicos e são regidos pelo direito internacional. Estão previstos no artigo 2º, I, da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969. „Tratado‟ pode tanto designar o conteúdo do acordo, bem como o instrumento que o formaliza.”

43

MONCADA, Antônio Cabral de. Curso de direito internacional público. 1.ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1998. p.224.

44 MONCADA, Antônio Cabral de. Curso de direito internacional público. p. 227-228.

45 SEITENFUS, Ricardo; VENTURA, Deisy. Introdução ao Direito Internacional Público. p.37.

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Segundo a Convenção de Viena46, tratado seria:

Art. 2º - “O acordo internacional celebrado por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação particular.”

Muitos doutrinadores dão a impressão de que pelas várias

denominações empregadas, as convenções, acordos, entre outros, são diferentes

de tratados. Entretanto, mesmo com denominações diferentes, estes são tipos de

tratados, pois tratado é a expressão genérica e as várias denominações se dão em

razão da forma, conteúdo, objeto ou fim do tratado, sendo importante ressaltar que

denominações distintas não alteram o valor legal do tratado. 47

Assim, brevemente explicitam-se alguns conceitos: 48

Convenção: tratado multilateral de característica legislativa, por

isso muito utilizado para a codificação de normas legais internacionais em várias

áreas do Direito Internacional.

Acordo: é empregado quando o tratado principal é menos

importante e solene do que o próprio tratado ou convenção. Usado quando são

poucas as partes envolvidas, tem forma simples, com característica administrativa e

técnica.

Protocolo: tratado de nível mais baixo e adicional do que a

convenção, geralmente utilizado para dirimir questões adicionais como, por exemplo,

interpretação de um acordo. Usado também para complementar posteriormente

alguns conteúdos do tratado ou acordo feito anteriormente.

Carta, Constituição, Estatuto: utilizados para representar o

tratado constitutivo das entidades internacionais. No caso da ONU utiliza-se a Carta

46

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p. 40.

47 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.29.

48 JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p. 87-88.

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18

e no caso da UNESCO, por exemplo, dentre outras organizações especializadas,

utiliza-se constituição. Quando um tratado contém o tratado constitutivo junto com as

regras operacionais da entidade, que é menos política e mais especializada, como a

CIJ, empregando-se então o termo estatuto.

Dentre as classificações para os tratados, tem-se como: 49

Pelo número de partes contratantes, assim sendo bilaterais

(celebrado entre duas partes) ou multilaterais (quando as partes são numerosas);

Quanto à possibilidade de adesão (por cláusula constante do

tratado) se dividem entre abertos e fechados;

Quanto à natureza jurídica do ato, dividindo-se entre tratados-

contratos (procuram regular interesses recíprocos dos Estados e através dele as

partes realizam uma operação jurídica), tratados-leis (geralmente celebrados entre

muitos Estados para fixar as normas do Direito Internacional, se assemelhando às

leis por imporem as mesmas obrigações e criarem efeitos normativos) e tratados-

normativos (utilizados contemporaneamente para a criação de uniões internacionais

administrativas, como a OMS, por exemplo).

A estrutura de um tratado divide-se em: preâmbulo (enuncia o

rol das partes pactuantes, os motivos, circunstâncias e pressupostos do ato

convencional), o dispositivo (artigos ou cláusulas que resumem o que foi acordado)

e os anexos (parte do teor compromissivo do tratado, sendo que conforme a

natureza do tratado pode consistir numa lista de produtos químicos, de espécies da

fauna marinha, etc.).50

Para que um tratado seja válido, é necessário que este atenda

a certos requisitos, tidos como: capacidade das partes contratantes, habilitação dos

49

REZEK, J.F. Direito internacional público: curso elementar. 9.ed.São Paulo: Saraiva, 2002. p.28.

50 REZEK, J.F. Direito internacional público. p.45-46.

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19

agentes signatários (apresentação de instrumento de plenos poderes),

consentimento mútuo (acordo de vontades) e objeto lícito e possível. 51

O artigo 53 da Convenção de Viena consagrou a obediência ao

jus cogens, ou seja, a necessidade de se observar os princípios gerais de Direito

Internacional e que não podem ser violados na celebração dos tratados. 52

Existe um qualificativo do consentimento que se chama reserva

e se encontra disposto no artigo 2°, §1°, d, da Convenção de Viena e consiste na

declaração unilateral do Estado que consente visando a excluir ou modificar o efeito

jurídico de certas disposições do tratado em relação a esse Estado. 53

O consentimento pode ser “viciado” por erro, dolo, corrupção e

coação, eivando-os de nulidade absoluta ou relativa. Uma vez declarada ou

reconhecida essa nulidade, o tratado é considerado nulo ab initio e, portanto, atos de

execução também são nulos, pois todos os efeitos jurídicos que ocorreram devem

ser eliminados e as coisas devem retornar ao estado primitivo em que se

encontravam. 54

Diz-se que a nulidade relativa só pode ser alegada pelo Estado

vítima do erro, dolo ou corrupção e pode ser sanada por acordo expresso ou

aquiescência posterior da parte interessada, já a nulidade absoluta pode ser alegada

por qualquer Estado interessado e deve ser declarada por um tribunal competente

ou por outro órgão encarregado da aplicação do tratado, mesmo que não tenha sido

invocada pelas partes contratantes, bem como não pode ser sanada. 55

Em casos de normas contraditórias entre dois tratados, se as

partes contratantes forem as mesmas, prevalecem as normas do tratado anterior

51

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.31-32.

52 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.49.

53 REZEK, J.F. Direito internacional público. p.66.

54 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.50.

55 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.51.

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20

não conflitantes com o posterior. Já se as partes forem outras, prevalece o tratado

posterior naquilo que não for contrário ao anterior. 56

Devem as partes também se vincular com base no Direito

Internacional Público, pois se os acordos forem somente políticos, por exemplo, eles

não poderão recorrer ao Tribunal Internacional de Justiça para eventual solução de

litígios. 57

Os efeitos dos tratados estão consagrados na Convenção de

Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 e 1986. Os principais efeitos seriam: 58

a) ex consensu advenit vinculum, ou seja, do consentimento

advém o vínculo;

b) pacta sunt servanda, que afirma que uma vez prestado o

consentimento59 à vinculação, está obrigado ao cumprimento da mesma e com boa-

fé (art. 26 das Convenções de Viena);

c) pacta tertiis nec nocent nec prosunt, diz que os preceitos

concluídos entre Estados ou Organizações que não tenham prestado os respectivos

consentimentos no momento da conclusão ou mais tarde não as vinculam aos

direitos e obrigações constantes na mesma.

Os tratados só produzem seus efeitos após a ratificação,

assim, um Estado participante só pode alegar vício dali em diante, conforme

estabelecido no artigo 28 da Convenção de Viena. 60

56

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.57.

57 MONCADA, Antônio Cabral de. Curso de direito internacional público. p. 229-230.

58 MONCADA, Antônio Cabral de. Curso de direito internacional público. p. 235-237.

59 O consentimento tem várias modalidades, porém deve ser verificado, sendo que as Convenções podem ser revistas e alteradas para manterem o consentimento que as funda ou podem ser denunciadas caso o consentimento não possa ser mantido e ainda autoriza que em certos casos, o consentimento eivado de vício pode fazer com que a convenção venha a ser anulada. In: MONCADA, Antônio Cabral de. Curso de direito internacional público. p. 236.

60 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.56.

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21

Importante ressaltar que em relação a terceiros, conforme o

artigo 34 das Convenções de Viena, um tratado não cria nem obrigações nem

direitos para um terceiro Estado sem o seu consentimento. 61

Porém existem algumas exceções, sendo elas: 62

Um tratado não pode ser fonte de obrigações, mas pode

acarretar consequências nocivas a terceiros. Nesse caso, o Estado lesado pode

protestar e procurar assegurar seus direitos bem como tem o direito de pedir

reparações. Ainda se o tratado não violar direitos, mas for somente prejudicial a

seus interesses, o Estado lesado poderá reclamar diplomaticamente, porém não terá

recurso jurídico.

Pode também do tratado resultar conseqüências favoráveis

para Estados não-participantes ou ainda que os contratantes, por manifestação de

vontade expressa concedam direitos ou privilégios a terceiros. Nesse caso, o

terceiro beneficiado tem direito ao reconhecimento e à exigência da execução da

estipulação que lhe é favorável pelo acordo de vontades.

A prova em juízo da existência de um tratado compete, em

regra, à parte que a invoca. 63 Além disso, a vigência de um tratado é definida pelas

partes (artigo 24 da Convenção de Viena). 64

O rito de um tratado está previsto no artigo 11 da Convenção

sobre o Direito dos Tratados e estipula que a ordem como sendo a de negociação, a

de assinatura, a troca ou depósito dos instrumentos constitutivos do tratado, para

posterior ratificação, registro, publicação65:

61

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 32.

62 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 32-33.

63 MONCADA, Antônio Cabral de. Curso de direito internacional público. p. 232-239.

64 SEITENFUS, Ricardo. VENTURA, Deisy. Introdução ao Direito Internacional Público. p.38-43.

65 Classificação segundo SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p. 58-62.

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22

a) A negociação se dá ou por convite por meio de nota

diplomática (em tratados bilaterais) ou em congressos e conferências internacionais,

onde é discutido o objeto do acordo. Essa fase se encerra com a elaboração final do

tratado, que deverá ser aprovado por no mínimo 2/3 dos presentes no caso das

conferências, segundo o artigo 9° da Convenção de Viena.

b) A assinatura serve atualmente para autenticar o texto

dos tratados e para o início da contagem dos prazos para troca ou depósito dos

instrumentos de ratificação.

c) A ratificação é o ato unilateral e administrativo mediante

o qual o Estado confirma tratado firmado, declarando aceito o que foi

convencionado, geralmente concedida por documento chamado carta de ratificação.

A troca ou o depósito dessa carta de ratificação é o que tornam perfeito e acabado,

válido o tratado. A dispensa da ratificação ocorre se assim o tratado o dispuser.

d) Registro e publicação: De acordo com o artigo 102 da

Carta das Nações Unidas, endossado pelo artigo 80 da Convenção de Viena, diz

que o tratado deve ser registrado no Secretariado e por este publicado.

No Brasil, o rito de incorporação de um tratado pode ser de

várias formas:

a) Por iniciativa, negociação e assinatura do acordo pelo

Presidente da República, que pode delegar e geralmente o faz, as atribuições ao

Ministério das Relações Exteriores, que pode valer-se de instituições federais;

b) Envio de mensagem pelo Presidente da República ao

Congresso Nacional, com exposição de motivos e texto integral do acordo, para dar

início ao processo de aprovação ou não do tratado pelo Poder Legislativo;

c) Apreciação e deliberação da Comissão das Relações

Exteriores da Câmara dos Deputados, onde será formulado um projeto de Decreto

Legislativo, para posterior análise da Comissão de Justiça e outras Comissões da

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Casa, que de acordo com o tema do tratado, apreciam e deliberam em plenário,

enviando o projeto de Decreto ao Senado Federal;

d) Apreciação do projeto pela Comissão das Relações

Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal, seguido, quando necessário,

somente por interposição de recurso para apreciação em plenário para a posterior

promulgação do Decreto pelo Presidente do Senado Federal, com publicação no

DOU e no Diário do Congresso Nacional;

e) Ratificação do Presidente da República, com troca ou

depósito do instrumento de ratificação, com a promulgação do tratado pelo

Executivo através de Decreto, publicado no DOU, devidamente acompanhado do

texto do acordo internacional.

f) A interpretação dos tratados está disposta nos artigos

31 a 33 das Convenções de 1969 e 1986, estipulando a boa-fé como regra geral,

sendo que os tratados devem ser interpretados como um todo. 66

O tratado deve ser aplicado na totalidade do território dos

estados-partes, a menos que no próprio corpo do tratado mencione partes não

atingidas. A solução para casos de não-execução do texto do tratado devem ser

encontrados no próprio tratado, que serve de instrumento para a solução de

controvérsias, ressalte-se que existem várias formas de garantias de execução de

um tratado, tais como materiais e financeiras.67

Existem casos de nulidade, extinção (significa o

desaparecimento do tratado da ordem legal internacional). Pode se dar pelo

consentimento das partes, pelo término do prazo de vigência do tratado, pela

violação do tratado, por mudanças circunstanciais, pela vontade unilateral de uma

parte, pela não vontade das partes – por ter surgido uma nova norma imperativa

conflitante, por eclosão de guerra – ou ainda pelo cumprimento do objetivo do

66

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.38-39.

67 SEINTENFUS, Ricardo; VENTURA, Deisy. Introdução ao Direito Internacional Público. p. 50.

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tratado) e suspensão de aplicação dos tratados (é a interrupção temporária da

aplicação do tratado), que se encontram elencados nos artigos 46 a 72 das

Convenções de Viena. 68

1.4 DIREITO COSTUMEIRO

O costume, considerado fonte primordial e tradicional do Direito

Internacional, abriu espaço para outras fontes de codificação, mas mesmo havendo

mudanças no contexto internacional, não perdeu sua importância, pois nos casos de

tratados internacionais, por exemplo, que ainda não tenham entrado em vigor, o

costume faz jus como prova. 69

“É o conjunto de normas consagradas pelo longo uso e observadas na ordem internacional como obrigatórias. Tem caráter impositivo e obrigatório, pois se não for cumprido acarreta sanção.” 70

Trata-se de uma fonte não convencional do Direito

Internacional Público e existem duas correntes sobre o tema: a primeira,

voluntarista, afirma que o costume baseia-se no acordo tácito entre os Estados.

Segundo SILVA tal teoria peca por não considerar ser o costume uma prática

evolutiva. 71

Já a segunda corrente, a objetiva ou sociológica diz que as

regras provêm de uma manifestação social, que obriga os sujeitos de direito em sua

totalidade e visa atender as suas necessidades. É a teoria que prevalece

atualmente, pois vê o costume como produto da evolução da sociedade. 72

“Dois elementos são indispensáveis à formação de um costume. O elemento material traduz-se pela repetição de atos, comportamentos e opiniões, na administração de suas relações externas ou da

68

JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p.118-125.

69 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.44.

70 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.98.

71 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.102.

72 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p. 103.

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organização interna, pelos sujeitos de direito internacional. [...]. Um segundo elemento, de caráter subjetivo, manifesta-se pela existência, livremente consentida, de uma convicção de parte dos sujeitos, no sentido de que sua aplicação é obrigatória, pois trata-se de um novo direito. Ou seja, está em tela a expressão da opinio juris sive necessitatis73 (a convicção do direito ou da necessidade). Sua obrigatoriedade a distingue das regras de cortesia internacional.” 74

Têm previsão no Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça

em seu artigo 38, I, “b” como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito

e ajuda em grande parte na urgência na solução de problemas. 75

A prova do costume deve ser feita pela parte que dela deseja

beneficiar-se. Busca-se a prova material do costume em atos estatais, não só os

executivos, mas também os diplomáticos, no teor dos tratados quando classificados

em razão da matéria, permitem a dedução de alguns valores consuetudinários em

temas como, por exemplo, a extradição e também nos textos legais, no consenso da

doutrina76 e ainda nas decisões judiciárias - jurisprudência internacional - da CIJ ou

de outros órgãos internacionais que disponham sobre temas de interesse do direito

das gentes. 77

Não existe método preciso de interpretação do costume,

apenas certos princípios que são aceitos, como o que diz que o costume especial

derroga o geral e o posterior derroga o anterior.

Alguns doutrinadores como ACCIOLY78 dizem que a

codificação do costume está longe de ocorrer, porém segundo ROBERTO LUIZ

SILVA: 79

73

A Corte Internacional de Justiça consagrou a opinio juris no Acórdão sobre a Plataforma Continental do Mar do Norte em 1969. In: REZEK, J.F.Direito internacional público. p.101.

74 MONCADA, Antônio Cabral de. Curso de direito internacional público. p. 56.

75 REZEK, J.F. Direito internacional público. p. 113.

76 A doutrina, baseada em decisão da CIJ em 1969, reconhece a importância das convenções multilaterais não-ratificadas como fonte desse instituto. In: SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.45.

77 REZEK, J.F. Direito internacional público. p. 117-118.

78 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.45.

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“Nos últimos anos têm-se manifestado uma tendência para se codificar o costume, como se nota pela conclusão das Convenções de Viena sobre Relações e Imunidades Diplomáticas (1961) [...] do Direito dos Tratados (1969), além da Convenção de Montego Bay sobre o Direito do Mar (1982). São evidentes as vantagens conseguidas pela codificação do Direito Consuetudinário através dos Tratados, à medida que as normas se tornam mais precisas e acessíveis e os novos Estados se mostram mais dispostos a acatar normas de cuja elaboração tenham participado, mas, em contrapartida, a codificação tem o inconveniente de fixar os costumes e de tornar a sua evolução mais difícil.”

Neste capítulo, buscou-se demonstrar a importância do ramo

do Direito Internacional Público, o Direito do Mar, com seu histórico até os dias

atuais, bem como as fontes do Direito do Mar, que provêm principalmente dos

tratados e do costume internacional bem como expôs a legislação vigente

internacional e nacionalmente.

79

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p. 106.

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CAPÍTULO 2

O INSTITUTO ALTO-MAR

2.1 ASPECTOS FUNDAMENTAIS – CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

Neste capítulo aprofunda-se o estudo do tema principal, em

seus diversos aspectos, definindo a trajetória do instituto e buscando explicitar sua

importância jurídica como instituto do Direito do Mar bem como seu desenvolvimento

até os dias atuais.

A importância do tema resta demonstrada pelo que nos rodeia.

A superfície do nosso planeta tem cerca de quinhentos e dez milhões de quilômetros

quadrados, sendo que ¾ são ocupados pelo mar, ou seja, mais de trezentos milhões

de quilômetros quadrados de água. Além de conter mais de trezentas mil espécies

de animais que o povoam, produz cerca de trinta milhões de toneladas de alimentos

pela pesca, sendo que quase 90% do comércio mundial se processam pelo mar. 80

Segundo Mello81 a definição desse instituto é trazida de

maneira uniforme pela doutrina e pelas convenções internacionais. Conforme dispõe

a Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, reunida em

Genebra em 1958, em seu artigo 1º conceitua tal instituto desse modo: “Entende-

se por „alto-mar‟ todas as partes do mar não pertencentes ao mar territorial ou as

águas interiores de um Estado”.

É um conceito excludente, que define o alto-mar pelo que ele

não é. Nesse sentido a Terceira Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do

Mar, reunida de 1973 a 1982, concluiu em 1982 com a assinatura da Convenção de

Montego Bay (Jamaica), em seu artigo 86 o seguinte:

80

LANARI, Flávia de Vasconcelos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 23.

81 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1243. v. 2.

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Art. 86 – Âmbito de aplicação da presente Parte

As disposições da presente Parte aplicam-se a todas as partes do mar não incluídas na zona econômica exclusiva, no mar territorial ou nas águas interiores de um Estado, nem nas águas arquipelágicas de um Estado arquipelágico. O presente artigo não implica limitação alguma das liberdades de que gozam todos os Estados na zona econômica exclusiva de acordo com o art. 58.

A natureza jurídica desse instituto é dividida basicamente entre

o estudo das teorias res nullius e res communis. Monier 82 explica o sentido das

expressões citadas: res comunnis são as coisas que estão subtraídas à propriedade

privada, estando afetadas ao uso comum de todos os homens, já res nullius são

aquelas que não pertencem a qualquer pessoa, bem como as coisas que não

podem pertencer a qualquer indivíduo porque elas estão consagradas aos Deuses

ou afetadas ao uso público.

Segundo a primeira teoria, que é a mais antiga dentre as

relacionadas ao alto-mar, tendo surgido segundo MELLO83 no século XVII, para

defender o alto-mar das reivindicações de soberania dos Estados, o alto-mar não

estaria sujeito a nenhuma regulamentação jurídica, uma vez que não existe direito,

os Estados opõem o seu direito sobre o alto-mar.

De acordo com o autor retro mencionado essa corrente é a

sugerida por alguns autores, que afirmam que o “mar livre não é dominado”, “não

tem proprietário nem soberano” ou ainda que “está fora do comércio”. Segundo ele,

essa teoria é inaceitável, pois se o alto-mar é inapropriável os Estados teriam uma

liberdade sem limitação, principalmente nos casos de guerra.

Já a segunda teoria diz que o alto-mar seria de propriedade da

sociedade internacional, ou seja, de todos os Estados. É a posição de diferentes

fontes do direito romano, como Grotius. 84 Conforme essa teoria, o alto-mar seria

82

R. Monier, Petit Vocabulaire de Droit Romain, Paris, Les Editions Domat-Montchrestien, 1941, 3.ed., p. 250-2 apud MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p.13.

83 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1243. v. 2.

84 GROTIUS, Hugo. De Jure Belli ac Pacis Libri Tres, Classics of International Law, Washington, 1925, p. 209 e 210 apud MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p.15.

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uma espécie de “condomínio”, o que também não pode ser considerado, já que os

co-proprietários em um condomínio tem o direito de polícia em relação aos outros,

por exemplo.

A doutrina da res communis é a que encontra maior número de

seguidores, porém compreendida como no sentido que possuía no Direito Romano,

a de que o alto-mar seria coisa destinada ao uso público, sendo assim, todos tem os

mesmo direitos sobre o alto-mar e de que o mesmo é impassível de apropriação. 85

Este parece ser o entendimento mais correto, pois decorre do

artigo 2° da Convenção de Genebra sobre o alto-mar o seguinte:

“O alto-mar estando aberto a todas as nações, nenhum Estado pode legitimamente pretender submeter uma parte qualquer a sua soberania.”

Modernamente, sabe-se que o alto-mar caracteriza-se pelo

regime de liberdade, inclusive reafirmado no artigo 87 da Convenção de 1982, que

serão abordados oportunamente no presente estudo, e também que o instituto retro

mencionado é bem de uso comum, não tem “dono”, é res publica, ou melhor, é de

domínio público, pois pertence à sociedade internacional. 86

Entretanto, a liberdade do alto-mar sofre uma série de

limitações de origem costumeira. Estas limitações restringem a regra de não

interferência. A finalidade delas é regulamentar de certo modo a utilização do alto-

mar. 87

2.2 AS MUDANÇAS INTRODUZIDAS PELAS CONVENÇÕES E O NOVO DIREITO DO MAR

A Convenção de 1982 além de reafirmar o princípio da

liberdade de navegação para os navios de todos os Estados, tendo eles litoral ou

85

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1244. v. 2.

86 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 528.

87 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1249. v. 2.

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não, estabeleceu regimes jurídicos distintos para o alto-mar e para os fundos

marinhos situados além das jurisdições nacionais. A Convenção preocupou-se de

forma particular com a administração e conservação dos recursos vivos. Sob esse

aspecto, cada Estado tem dupla obrigação: exigir dos navios nacionais que adotem

medidas para restringir a poluição e cooperar entre si com vistas à preservação do

ambiente marinho. 88

A Convenção de 1982 pela primeira vez na história considerou

o solo e o subsolo marinhos como sendo patrimônio comum da humanidade, assim

nenhum Estado poderá reivindicar a soberania sobre qualquer área dos fundos

marinhos. Com isso, firma-se a idéia de que os recursos naturais existentes no

fundo dos mares são inalienáveis, cabendo à autoridade internacional, que seria sua

gestora, deliberar sobre o destino e a utilização das riquezas que venham a ser

exploradas.89

A Convenção referida acima também reconheceu os avanços

tecnológicos e de pesquisa científica que ocorreram nos últimos tempos,

reconhecendo o direito de cada Estado de explorar seu mar territorial e sua

plataforma continental, direito esse limitado pelo dever de preservar o meio

ambiente. Entretanto, a problemática dessa decisão é o abismo entre países

desenvolvidos com condições técnicas e recursos financeiros para a exploração das

riquezas oceânicas dessas áreas.

Para evitar que isso ocorresse, a Convenção favoreceu a

transferência de tecnologia em condições equitativas para os países em

desenvolvimento, por meio de programas bilaterais, regionais e multilaterais que

tenham por objetivo acelerar o desenvolvimento econômico dos Estados menos

desenvolvidos, fazendo as nações desenvolvidas desenvolverem programas de

assistência técnica, científica e educativa aos outros Estados que não tenham todo o

aparato necessário disponível.90

88

AMARAL JUNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas, 2008.p. 351.

89 AMARAL JUNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. p. 351.

90 AMARAL JUNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. p. 353.

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Já a Terceira Conferência das Nações Unidas sobre o Direito

do Mar apesar da demora para alcançar o quórum para aprovação e ratificação, do

ponto de vista material, logrou êxito significativo em relação às Convenções

anteriores, pois a maioria das reivindicações dos países em desenvolvimento foi

acolhida (principalmente no tocante à extensão da plataforma continental, nos

países que tinham extensão acima de 200 milhas marítimas) e reafirmou a liberdade

de navegação por meio do direito da passagem inofensiva. Entretanto, ela deixou a

desejar quando foi vaga acerca da construção de ilhas e portos artificiais.91

A Terceira Conferência da ONU sobre o Direito do Mar

manteve dois tipos de normas, umas auto-aplicáveis, como a garantia da liberdade

da navegação e outras que dependem da aprovação e adoção dos Estados para

vigerem, como as medidas a serem adotadas, as providências necessárias para a

proteção e preservação do meio ambiente.92

O Brasil teve papel significativo no âmbito dessa Convenção,

pois a delegação brasileira endossou a proposta apresentada pelo representante de

Malta perante a Assembléia Geral das Nações Unidas e também lutou pela

ampliação das jurisdições nacionais para a exploração do solo e do subsolo dos

mares. 93

Especificamente quanto ao Brasil, a Convenção de 1982

atendeu às reivindicações pátrias da ampliação do mar territorial para 200 milhas

marítimas, a criação da zona econômica exclusiva garantiu acesso à exploração dos

recursos naturais na extensão do mar territorial no país e além disso, a distinção no

uso militar da área de 200 milhas pelo mar territorial diferentemente do uso na zona

econômica exclusiva.94

Apesar de não dispor explicitamente sobre o assunto, a

Convenção de 1982 em seu artigo 310 permite que o Brasil adote medidas

91

AMARAL JUNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. p. 355.

92 AMARAL JUNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. p. 355.

93 AMARAL JUNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. p. 354-355.

94 AMARAL JUNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. p. 353-354.

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protetivas em relação à sua costa, proibindo a colocação de estruturas e instalações

para fins militares nas áreas de jurisdição nacional.

O desafio do novo Direito do Mar é regular a exploração dos

recursos naturais de modo que haja um equilíbrio entre a gestão dos recursos e o

repasse desse conhecimento e dessa riqueza.

2.3 DELIMITAÇÃO E DIFERENCIAÇÃO COM OUTROS INSTITUTOS

A caracterização do alto-mar bem como a livre navegação

tornou-se mais difícil com a Convenção de Genebra de 1958 e também com a

Convenção de Montego Bay de 1982 que introduziu diversas novas zonas no

domínio marítimo.

Antes da explanação é necessário o esclarecimento de que

existe grande divergência doutrinária em relação à largura do mar territorial e da

zona contígua.

Estes outros institutos seriam95:

a) Mar territorial (art. 2° da Convenção de 1982): inclui as

águas do leito do mar, o subsolo, o espaço aéreo sobrejacente e sua extensão são

de 12 milhas marítimas (art. 3° da Convenção de 1982) contadas a partir da linha de

base da costa (litoral continental e insular) na maré baixa. Nessa faixa existem

direitos soberanos e a única restrição é o direito de passagem inocente, que é

concessão obrigatória do Estado para os navios que trafegam. Quanto aos

submarinos, estes só poderão navegar na superfície do mar nessa área. O mar

territorial brasileiro é de 12 milhas marítimas conforme Lei 8617/9396. Quando há

uma ilha pertencente ao Estado, é necessário fazer uma projeção a partir da ilha

95

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. 2. p. 175.

96 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. 3.ed. São Paulo: LTr, 2000. p.85.

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para contar as doze milhas, não sendo consideradas as ilhas artificiais ou

plataformas construídas pelo Estado mar adentro. 97

b) Zona contígua (Artigo 24 e 33 da Convenção de 1982):

Faixa adjacente ao mar territorial. Esta região não integra o território, mas o Estado

tem a possibilidade de exercer seu poder de polícia nesta área e nela o Estado

exerce a soberania em relação à fiscalização sanitária, alfandegária e de imigração.

Sua principal função é evitar o contrabando. Essa faixa era de limite máximo de

largura de 12 milhas na Convenção de 1958 e foi estendida para 24 milhas

marítimas na Convenção de 1982, contados a partir da linha de base98 do mar

territorial. Serve para a captação de recursos fiscais do Estado costeiro e em relação

à segurança, mas teve sua importância limitada devido à criação de zona de pesca,

da zona econômica exclusiva bem como da plataforma continental.

c) Zona econômica exclusiva (artigo 55 da Convenção de

1982): Importante ressaltar que segundo VARELLA a zona contígua faz parte da

zona econômica exclusiva.99 Se situa além do mar territorial e seria a planície

submarina (faixa de terra e coluna d‟água) que vai gradativamente se aprofundando

até o limite de 200 metros de profundidade. Nessa área o Estado tem direito

soberano exclusivo de exploração dos recursos em sua plataforma continental

(artigo 76). Segundo a Convenção de 1982 existem duas maneiras de fixar o limite

dessa plataforma: I) Se o Estado atingir o limite de 200 metros rapidamente, como é

o caso da Oceania, este será o limite; II) Se o mar se aprofunda lentamente, como

no Brasil, continua sendo de 200 metros, mas a faixa alcançará no máximo 350

milhas de largura.

Na Convenção de 1982 cita que os países costeiros não

podem abusar de seus direitos exclusivos (artigos 62 e 69-71) e caso não consigam

explorar todos os recursos vivos até a totalidade permissível, devem fazer acordos

para compartilhar os excedentes com outros Estados interessados, mediante

97

VARELLA, Marcelo Dias. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009. p.208.

98 A linha de base normal é determinada pela linha de baixa-mar ao longo da costa. In: SILVA, G.E.; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.257.

99 VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Público. p. 208.

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pagamento adequado (artigo 62). Entretanto, gozam de liberdade de navegação,

aeronaves, cabos e dutos submarinos nessa área. (artigo 58).

d) Alto-Mar (artigo 86 da Convenção de 1982):

Compreende espaço, regiões além da zona econômica exclusiva dos Estados100,

considerado a parte total do mar não pertencente a nenhuma jurisdição ou domínio

direto de nenhum Estado (conceito negativo), faz parte do patrimônio comum da

humanidade e cuja preservação é de interesse de todos. Presume-se que nessa

área os navios estejam sob a jurisdição do seu Estado patrial e os navios de guerra

podem exercer autoridade sobre navios mercantes de igual bandeira.

Um instituto quase não mencionado nessas convenções seria

as águas interiores, que consistem em portos (artigo 11 da Convenção de 1982),

baías (artigo 10) e ancoradouros (artigo 12). As águas dos portos, estuários101, rios,

lagos e canais devem ser considerados nacionais. São reguladas principalmente

pelo direito consuetudinário. 102

e) Os estreitos ou canais seriam uma linha de água, parte

de mar que liga dois mares ou oceanos diferentes, sendo que os estreitos são

naturais e os canais são artificiais, criados pelo homem, onde os navios e aeronaves

têm “direito de passagem em trânsito”, mesmo de navios militares Disposto na

Convenção de 1982 em seus artigos 34-45. Um exemplo seria o Estreito de

Gibraltar. 103 Se a largura do estreito for superior a 24 milhas, o mar territorial de

cada Estado terá 12 milhas marítimas.

f) A plataforma continental deve ser considerada uma

extensão natural do território e surgiu da crescente reivindicação dos Estados pelos

direitos exclusivos sobre os recursos do leito e subsolo do alto-mar. Cuida-se da

parte do leito do mar adjacente à costa do Estado costeiro, até o limite do talude

continental (região de declive mais acentuada) e nessa área pode explorar os

100

VARELLA, Marcelo Dias. Direito Internacional Público. p.215.

101 Ocorre quando um rio antes de chegar ao oceano perde o aspecto que tinha e se torna uma baía. In: SILVA, G.E.; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 264.

102 JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p. 518.

103 JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p. 523.

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recursos naturais exclusivamente. 104 A sua largura raramente atinge 200 milhas

marítimas, mas é possível que ocorra, sendo que nesse caso o direito de exploração

exclusiva do Estado sobre o leito do mar vai até onde for a plataforma continental,

não ultrapassando 350 milhas marítimas. Importante ressaltar que não há uma

extensão nesse caso da zona econômica exclusiva.

g) A zona dos fundos marinhos oceânicos, também

chamada de “área” deve ser regulada pela Autoridade Internacional dos Fundos

Marinhos e foi fruto de grande expectativa pela exploração dos recursos nele

contidos e por isso a Convenção de 1982 em seu artigo 136 objetivou garantir a

participação no compartilhamento dos benefícios pela atividade comercial nos

fundos marinhos. Fica além dos limites da jurisdição nacional e o princípio que rege

essa área é o da herança comum da humanidade. 105

Existem ainda locais chamados de “domínio público”, onde não

restou definido ainda a quem pertence à jurisdição. Seriam eles: o Pólo Norte, a

Antártida, etc. 106

Algumas regiões do mar são consideradas zonas de paz. Um

exemplo seria o Oceano Índico, aprovado pela Assembléia-geral das Nações Unidas

em 1971. A zona de paz atinge as águas arquipelágicas, a plataforma continental, a

zona econômica exclusiva e a zona contígua. Se o Estado aceita zona de paz, ela

também se estende a seu mar territorial. 107

2.4 LIBERDADES E RESTRIÇÕES À LIBERDADE DOS MARES

Constitui parte fundamental do capítulo, pois o mar por ser

patrimônio comum dos Estados, necessita da observância de algumas normas, que

104

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.1254. v.2.

105 JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p.531.

106 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p. 179-180.

107 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.p.64-65.

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regem as relações que ali se desenvolvem assim como existem direitos

resguardados.

Os Estados possuem soberania, o que significa que ele tem

competência sobre o seu território, as pessoas e coisas que nele se encontram.

Todavia, existem certas pessoas ou coisas, ou até mesmo trechos de seu território

nos quais o Estado não tem uma competência plena, sendo estas restrições aos

seus direitos fundamentais. 108

O Estado tem autonomia dentro de seu território, como visto

anteriormente, entretanto o limite de seu território pode ser fixado de forma natural,

por acidentes geográficos ou rios, lagos, divisores de águas, etc. ou de forma

artificial, por convenções humanas, como a latitude e longitude. Este fato acaba

causando conflitos entre Estados limítrofes pela disputa de território e pela

exploração das riquezas ali contidas.

No decorrer da História, a liberdade dos mares era vista sob

uma ótica negativa, de que o mar não se submetia à jurisdição de nenhum Estado.

Atualmente resta bastante regulamentada e despida desse cunho negativista, como

se vê a seguir.

O sentido de liberdade não foi o mesmo em todas as épocas,

assim inicialmente a liberdade visava evitar os assaltos praticados por piratas, e

depois no sentido de propriedade e de liberdade de navegação, atualmente a

preocupação com questões sócio-econômicas como a conservação da

biodiversidade e dos recursos vivos e o aproveitamento dos minerais. 109

108

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. 14.ed.(ver. e aum.). Rio de Janeiro Renovar, 2002. p. 461.v.1.

109 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 252.

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37

A noção de liberdade dos mares surgiu no início do século

XVII, uma vez que até então o direito feudal se guiava pelo conceito de dominium

maris do direito romano. 110

Agora prevalece a idéia de igualdade de uso do mar, o que

significa que nenhum Estado pode reivindicar para si a utilização dos espaços

marítimos. Os direitos são iguais para todos os Estados, o mar é de uso comum.

A liberdade em alto-mar significa a exclusão do uso arbitrário

ou exclusivo de um Estado e a abertura do seu uso 111.

Para ACIOLLY as restrições à liberdade dos mares derivam ou

da natureza das coisas – no sentido de que a liberdade de cada Estado, no alto-mar

não deve ir até prejudicar a liberdade de qualquer outro – ou provem de acordos ou

convenções internacionais. 112

Tais liberdades, entretanto devem ser exercidas com

observância dos interesses de outros Estados e dos direitos relativos às atividades

nas áreas que são herança comum da humanidade. 113

O alto-mar é regido também pela regra da não-interferência,

em tempo de paz, isto é, o navio de um Estado não pode interferir na navegação de

um navio de outro Estado. A regra da não-interferência sofre limitações com as

restrições na liberdade do alto-mar. 114

Outro princípio seria o da utilização pacífica, que inclusive

encontra respaldo normativo no artigo 88 da Convenção de 1982. Era inicialmente

uma restrição à liberdade dos mares, mas passou a ser um princípio. Devido a isso

110

SILVA, G.E.; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.333.

111 JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p. 529.

112 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 197.

113 JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p. 529.

114 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p.40.

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não é permitida a instalação de estabelecimento militar em alto-mar por um Estado,

desde que seja de domínio público internacional. 115

Existem alguns direitos do Estado em alto-mar, que merecem

destaque: 116

a) Jurisdição do Estado de bandeira sobre navio – o

Estado de bandeira exerce sua jurisdição sobre navios que arvorem sua bandeira

em alto-mar. Previsto no art. 6º da Convenção de 1958 e art. 92 da Convenção de

1982. A Convenção de 1982 no que se refere à nacionalidade dos navios pretende

condenar os chamados “pavilhões facilitários” ou “de complacência”, sendo estes

Libéria, Panamá, Chipre, ao mencionar que deve sempre haver um vínculo entre o

Estado e o navio que arvora sua bandeira. Assim presume-se que em alto-mar todo

navio se encontra sob a jurisdição de seu Estado patrial. O navio de guerra exerce

autoridade sobre navios mercantes de mesma bandeira.

b) Direito de revista117 e aproximação em alto-mar –

utilizado para verificação de documentos, e quando estes não forem suficientes,

pode-se proceder a bordo do navio. O direito de aproximação visa à identificação do

navio e o direito de revista é exercido após a identificação se as suspeitas

persistirem. Alguns casos elencados no artigo 22 da Convenção de Genebra de

1958 e no artigo 110 da Convenção de 1982 apontam motivos razoáveis que

ensejam tal prática, tais como: I) pirataria; II) tráfico de escravos; III) transmissões

não autorizadas; IV) falta de nacionalidade; V) uso de bandeira falsa. A visita deve

ser fundamentada senão o navio visitado deverá ser indenizado por perdas e danos

que tenha sofrido. É considerado restrição à navegação;

c) Direito de perseguição em alto-mar - consiste em

perseguir um navio estrangeiro em alto-mar que tenha violado os direitos do Estado

costeiro, desde que o navio perseguido se encontre nas águas interiores, mar

115

JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 528.

116 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 529.

117 A nomenclatura pode variar de acordo com o entendimento do autor, sendo que a Convenção de Genebra utiliza-se da expressão “direito de revista” e a Convenção de Montego-Bay de 1982 adota a expressão “direito de visita”. In: MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1250. v. 2.

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territorial ou zona contígua do Estado costeiro. A perseguição precisa ser imediata e

ininterrupta e só pode ser exercida por navios de guerra ou aeronaves militares

sendo que somente podem ser objeto de perseguição os navios de comércio, uma

vez que os navios públicos gozam de imunidade completa de jurisdição. Previsto no

artigo 23 da Convenção de Genebra de 1958 e no artigo 111 da Convenção de

1982;

d) Direito à autodefesa em alto-mar – variam conforme o

local e baseia-se no direito de um Estado reclamar o direito de interferir em navios

comerciais estrangeiros com base nesse princípio;

e) Direito de passagem inocente – é originariamente direito

costumeiro e se refere à navegação de navio estrangeiro pelo mar territorial de um

outro Estado de forma contínua e rápida “que não é prejudicial à paz, ao bem ou à

segurança do Estado costeiro”, a não ser por incidente da navegação ou por força

maior, sem adentrar as águas interiores ou se o fizer que aja sem prejuízo à paz, à

boa ordem ou à segurança do Estado costeiro. Não existe direito de passagem

inocente nas águas internas do Estado. No caso dos submarinos devem navegar na

superfície e com suas bandeiras visíveis. Encontra-se esse direito reconhecido pelo

costume internacional e está regulado nos artigos 17 a 32 da Convenção de 1982.118

Deixa de ser inocente, quando há (Art. 18 e ss da Convenção

de Montego Bay): qualquer ameaça ou uso de força contra a soberania, integridade

territorial ou independência política do Estado costeiro, exercício ou manobras com

armas de qualquer tipo, quando praticado ato destinado a obter informações

prejudiciais ao Estado costeiro, qualquer ato de propaganda destinado a atentar

contra a defesa ou segurança do Estado costeiro, o lançamento, pouso ou

recebimento de qualquer aeronave ou dispositivo militar, embarque ou desembarque

de qualquer produto ou pessoa com violação das leis e regulamentos aduaneiros,

fiscais, de imigração ou sanitários do Estado costeiro, qualquer ato intencional e

grave de poluição, qualquer atividade de pesca, qualquer ato destinado a perturbar

118

JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. p. 521.

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quaisquer sistemas de comunicação, serviços ou instalações do Estado costeiro ou

que não esteja diretamente relacionada com a passagem.119

f) Direito de jurisdição do Estado ribeirinho, em matéria

civil e penal – ocorre no mar territorial do próprio Estado e decorre do direito de

soberania. É limitado pelo direito de passagem inocente (no caso de navios

estrangeiros). Para navios nacionais, estes se submetem à jurisdição. Os navios de

guerra estão isentos da jurisdição local, apesar de ter que respeitar algumas leis e

regulamentos feitos pelo Estado ribeirinho para assegurar sua segurança. 120

No artigo 2º da Convenção de Genebra de 1958 encontram-se

dispostas mais algumas liberdades (limitadas, claro) em alto-mar, tais como:

g) Liberdade de navegação – entendida como

conseqüência da liberdade dos mares e disposta principalmente no artigo 90 e 131

da Convenção de 1982, sendo que os Estados sem litoral têm direito de acesso ao

mar, decidido em Convenção em 1965 sob o comando da ONU, e ao livre trânsito

entre os Estados próximos ao litoral para poder a este ascender, bem como o

Estado sem litoral tem direito a transporte de suas mercadorias sem pagar direitos

aduaneiros no território do Estado que se coloca entre ele e o mar. Modernamente o

direito da navegação vem sendo exercido pelas organizações internacionais como,

por exemplo, no transporte de tropas pela ONU; 121

h) Liberdade de pesca – é reconhecido a todos os

Estados, inclusive os sem litoral e o controle da pesca pelos Estados aplicável aos

pesqueiros é para os que arvoram o seu pavilhão. Encontra-se previsto no artigo

116 da Convenção de 1982; 122

i) Direito de colocar cabos e oleodutos submarinos – faz

parte do interesse mundial pela rapidez das comunicações e se encontra previsto no

119

VARELLA, Marcelo Dias. Direito internacional público. p. 213.

120 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.259.

121 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p. 44.

122 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 336.

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artigo 26 da Convenção de Genebra de 1958 e no artigo 112 da Convenção de

Montego Bay de 1982, sendo que no artigo 113 e 114 a ruptura ou danificação dos

mesmos ensejam sanções por prejudicar as comunicações telegráficas ou

telefônicas. Poderão ser destruídos ou apreendidos em caso de guerra ou

excepcionalmente em caso de grande necessidade. O Estado que assim o fizer

deverá repô-los ou reconstruí-los tão logo se conclua a paz, ficando sujeito ao

pagamento das indenizações fixadas. A matéria encontra-se regulada pela

Convenção de Paris, firmada em 1884 por 26 países signatários inclusive o Brasil;123

j) Liberdade de sobrevôo – o espaço aéreo tem o mesmo

regime jurídico da superfície. Assim, no Brasil encontra-se disposto no artigo 11 do

Código Brasileiro de Aeronáutica124 e considera-se o espaço aéreo como submetido

à soberania estatal. 125

O artigo 87 da Convenção de 1982 aumentou as

possibilidades, acrescentando-se126:

k) A liberdade de construir ilhas artificiais e outras

instalações permitidas pelo direito internacional – situa-se em alto-mar, gerando em

torno de si um território marítimo e uma zona contígua de mar livre. A superfície

aquática que entre eles medeia será sujeita ao controle do Estado. Assim ocorre

com Fernando de Noronha, que se localiza a 350 km da costa brasileira. Podem ter

uma zona de segurança de 500 metros de largura, devendo ter sinais de

identificação e não serão colocadas em rotas de navegação; 127

l) Liberdade de investigação científica – estabelece que

todo Estado está autorizado, porém deve ser feito para fins pacíficos, com métodos

123

MATTOS, José Dalmo Fairbanks Belforde. Manual de direito internacional público. São Paulo: Saraiva: EDUC, 1979. p. 84.

124 BRASIL.Lei nº 7565, de 19 de dezembro de 1986, dispõe sobre o Código Brasileiro de Aeronáutica, Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, data publicação 20 dez. 1986.Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7565.htm>. Acesso em: 19 maio 2010.

125 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p.87-88.

126 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 334.

127 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.1256. v.2.

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42

e meios específicos, o responsável deve justificar os objetivos do projeto, bem como

é responsável se ocorrer poluição e as pesquisas não justificam a reivindicação

sobre o meio marinho128;

m) Prática de manobras navais – é permitido não somente

no alto-mar, mas também na zona econômica exclusiva e decorre também da

proteção da soberania do Estado costeiro. 129

Entre os deveres a serem observados pelos Estados

estariam130:

a) Colaborar na conservação dos recursos vivos do alto-

mar – trata principalmente da regulação da pesca, mamíferos marinhos, espécies

migratórias, etc. e com base em pesquisas científicas permite a troca de informação

bem como uma possibilidade de tomar medidas mais eficazes na conservação.

Mesmo com a norma afirmando que nenhum Estado costeiro possui qualquer direito

além das 200 milhas a Convenção de Genebra de 1958 admite “posição especial”

para medidas de conservação além desse espaço, pelo artigo 7°, desde que seja

com caráter urgente e for fundamentada em estudos científicos. Alguns locais

também têm a pesca proibida em certas épocas devido à reprodução de espécies

marinhas em extinção. Previsto no artigo 119 da Convenção de Montego Bay131. A

preocupação com o meio-ambiente, a poluição e a manutenção da biodiversidade

presente na vida marinha se reflete no Direito do Mar, daí advém a preocupação

com a pesca excessiva ou de espécies ameaçadas, por exemplo. 132

128

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.1255. v.2.

129 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p. 64.

130 REZEK, J.F. Direito internacional público. p.307.

131 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p. 71-72.

132 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 335-336.

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b) Prevenção à poluição133 – cabe ao Estado onde o navio

está refugiado aplicar as sanções, lembrando que ocorrem muitos vazamentos de

petróleo no mar e este apresenta perigo de incêndio e causa danos à flora e fauna;

c) Repressão ao tráfico de escravos – Se encontra no

artigo 13 da Convenção de Genebra e no artigo 99 da Convenção de Montego Bay

que proíbe o tráfico de escravos. No Congresso de Viena em 1815 e também nos

Tratados de Paris de 1814 e 1815, que previram medidas acerca do tema, bem

como a Declaração Universal dos Direitos do Homem em 1948 prevê no artigo 23

que todo homem tem direito à livre escolha de emprego, repetida em 1950 na

Convenção Européia de Direitos Humanos no artigo 4º, sendo que no Brasil durante

muito tempo fazia parte da cultura o comércio de escravos, mas com a pressão da

Inglaterra após a Independência em 1822, assina em 1826 uma convenção com os

ingleses e em 1831 uma lei é promulgada proibindo o tráfico;

d) Repressão ao trânsito e comércio ilícito de drogas – Tem

mobilização internacional pelo mal causado à saúde do ser humano. Regulada no

artigo 108 da Convenção de 1982, sendo que o órgão internacionalmente

competente para a matéria é o Conselho Econômico e Social (interno das

Organizações das Nações Unidas), que tem uma comissão especializada sobre o

assunto, sendo que em 1961 a ONU criou uma convenção e um órgão chamado de

Órgão Internacional para o Controle de Estupefacientes. A sanção é o embargo, ou

seja, a proibição da importação e exportação; 134

133

Várias foram as tentativas de criar normas em relação à poluição no meio ambiente, porém as de maior repercussão e coerção internacional em matéria de Direito do Mar foram em 29 de abril de 1958, uma versando sobre a poluição no mar por hidrocarbonetos e detritos radioativos e outra versando sobre a pesca e a conservação dos recursos biológicos do alto-mar. In: CYSNE, Maurício; AMADOR, Teresa Eds. Direito do ambiente e redação normativa: teoria e prática nos países lusófonos. Centro de Direito Ambiental da UICN, Alemanha, p. 12. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?id=y1gnr_8mZOYC&pg=PA12&lpg=PA12&dq=conven%C3%A7%C3%A3o+de+londres+de+1962&source=bl&ots=ihh_8y1lL&sig=pFoqSOi7hu1huio4yr2cbtjBCZ0&hl=ptBR&ei=DTQNTJ6VKsWMuAe1n_GVCw&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=3&ved=0CB8Q6AEwAg#v=onepage&q=conven%C3%A7%C3%A3o%20de%20londres%20de%201962&f=false>. Acesso em 19 maio 2010.

134 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p.143.

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e) Repressão a transmissões não autorizadas135 –

Encontra-se previsto no artigo 109 da Convenção de 1982 e refere-se

principalmente ao domínio das telecomunicações e do problema das “rádios piratas”,

situadas em navios em alto-mar ou em instalações colocadas na plataforma. A

Convenção de Genebra de 1958 não se refere à matéria, já a Convenção de

Genebra de 1959 sobre radiocomunicação já proibia o estabelecimento de estações

fora dos limites territoriais do Estado; 136

f) Repressão à pirataria – o conceito de pirataria advém do

artigo 101137 da Convenção de 1982, é uma das mais antigas restrições à liberdade

e na Convenção de 1958 definem-se os atos considerados de pirataria no artigo 15,

sendo como atos ilícitos, de violência, entre outros, sendo que quem pode praticar a

pirataria são navios ou aeronaves privadas, tendo em vista sua intenção de lucro. Se

os navios agem em nome do Estado, a responsabilidade será deste; 138

g) Salvaguardar a vida humana139 - regulamentada na

Convenção de Montego Bay no artigo 98 como o dever de prestar assistência em

casos de desaparecimento, perigo, abalroamento140 de embarcação bem como

busca e salvamento;

h) Proteger os objetos de aspecto arqueológico e histórico

(previsto no artigo 303 da Convenção de 1982).

Ainda importante ressaltar que os navios de guerra em alto-mar

possuem imunidade, previsto no artigo 95 da Convenção de Montego Bay.

135

Transmissão não autorizada é a geração de programas radiofônicos e televisivos dirigidos, do alto-mar, ao público em geral, sem que Estado algum tenha a emissora sob registro e receba de seus exploradores algum tributo. In: REZEK, J.F. Direito internacional público. p. 316.

136 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p.147.

137 a) Todo ato ilegal de violência, de detenção ou toda depredação cometida para fins pessoais pela tripulação ou passageiros de um navio privado ou de uma aeronave privada, e dirigidos:

i) no alto-mar, contra outro navio ou aeronave, ou contra pessoas e bens a seu bordo.

138 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p. 117-124.

139 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.1254.v.2.

140 Previsto nas Regras Internacionais para Evitar Abalroamento no Mar (RIPEAM), consagradas na Convenção de Londres de 1972. In: MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p.179.

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Um problema ainda não resolvido definitivamente é o de

despejo de dejetos radioativos no mar. A Convenção de 1958 em seu artigo 25 já

estabelecia norma que dizia que os Estados devem tomar medidas para evitar a

poluição dos mares por esses dejetos, já a Convenção de 1982 não possui nenhum

dispositivo específico sobre o tema. 141

Existe também o Tratado de Moscou concluído em 1963 que

interdita os ensaios de armas nucleares na atmosfera, no espaço exterior e sob a

água. O fundo dos mares e seu subsolo foram desmilitarizados em 1971, em um

tratado concluído sobre os auspícios da ONU, sendo considerado o único tratado de

aspecto amplo sobre o assunto. 142

Neste capítulo tratou-se de demonstrar a relevância do alto-

mar como instituto fonte de riquezas, mas também de disputas, de conflitos, com

sua conceituação, aspectos gerais, delimitação em detrimento de outros institutos

existentes no mar bem como os direitos e deveres que devem ser observados pelos

países internacionalmente.

141

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p. 151.

142 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Alto-mar. p. 152-154.

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CAPÍTULO 3

RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL

TIPOS DE RESPONSABILIDADE

Este capítulo trata da responsabilidade internacional do Estado,

também abordando a responsabilidade em alto-mar, porém exclui algumas

responsabilidades que embora conectadas ao tema, fogem do alcance do mesmo

por serem abordados por outros ramos.

A responsabilidade decorre do descumprimento de uma

obrigação imposta por um sistema jurídico. No direito interno, a responsabilidade se

divide em civil e penal, sendo a civil subdividida em contratual e extracontratual,

baseada na ocorrência ou não da culpa. Essas normas de direito interno foram

incorporadas pelo Direito Internacional por serem reconhecidas pela maioria das

nações. 143

Já no direito externo, no Direito Internacional, o Estado

responsável pela prática de um ato ilícito deve ao Estado a que tal ato tenha

causado dano uma reparação adequada. 144

A responsabilidade de um Estado decorre da ação ou omissão

de indivíduos que induzem à responsabilização do Estado, considerando também

que os Estados, internacionalmente, gozam de igualdade entre si. 145

Conforme Luis Ivani Amorim de Araújo146:

143

JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 437.

144 REZEK, J.F. Direito internacional público. p. 261.

145 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 438.

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“As relações entre os Estados se alicerçam nas bases das obrigações recíprocas e dos direitos mútuos. Toda vez que um Estado viola os seus deveres, motivando um prejuízo a outro Estado ou a um nacional deste, ele se torna responsável perante a sociedade internacional.”

As características da responsabilidade internacional são

distintas da responsabilidade do direito interno e tem finalidade reparatória. As

regras sobre a responsabilidade internacional foram formadas a partir da segunda

metade do século XIX, principalmente pelas jurisprudências de arbitragem

internacional. Ainda hoje essa área rege-se pelas regras costumeiras. 147

No início, a responsabilidade do Estado concentrava-se na

proteção de estrangeiros. Porém, agora engloba principalmente as atividades das

entidades públicas e privadas. Além disso, a responsabilidade pode advir de atos ou

lacunas do próprio Estado, quando deixa de cumprir o dever de manter a ordem ou é

negligente, sendo que a vítima pode ser tanto o Estado (quando, por exemplo, sua

soberania é ofendida) ou um indivíduo (que necessita de proteção diplomática). 148

Como ainda não está codificada, essa área é regulada em sua

maioria pelos Tratados, sendo alguns exemplos a Convenção de Haia IV, de 1907,

sobre a responsabilidade dos militares; a Convenção de Bruxelas de 1962 sobre

atividades nucleares; a Convenção de 1971 sobre o lançamento de satélites; a

Convenção de Bruxelas de 1969 sobre a contaminação do mar por materiais

advindos do petróleo; a Convenção da Europa de 1976 sobre a exploração dos

recursos do fundo do mar, entre outras. 149

Segundo Mello houve tentativas de se codificar essa matéria,

principalmente na Conferência de Haia de 1930, mas não se obteve sucesso com tal

iniciativa. 150

146

ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim, p. 143 apud JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 438.

147 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 438.

148 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p.438.

149 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p 442.

150 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.505. v.1.

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A responsabilidade é direta quando deriva de atos do próprio

governo ou de seus agentes ou são movidos contra o governo de um Estado, seus

órgãos e funcionários. A indireta é quando é movida contra uma coletividade que se

encontra sob a responsabilidade desse Estado ou quando resulta de atos praticados

por simples particulares, mas maneira que possa ser imputável ao governo. 151

Existem ainda duas correntes sobre a natureza da

responsabilidade, que seriam: 152

a) A subjetiva ou teoria da culpa, já existente no Direito

Romano, desenvolvida por Hugo Grotius e afirma que um Estado, para ser

responsável, necessita não apenas violar uma norma internacional, mas também

deve violá-la com culpa (entretanto é grande a discussão doutrinária acerca do

alcance dessa culpa);

b) A objetiva ou teoria do risco, que é relativamente recente

e defende que o Estado é responsável porque violou uma norma internacional,

surgindo a responsabilidade sempre que existir um nexo de causalidade entre o

ilícito e o Estado.

Uma terceira teoria elaborada por Triepel e Strupp chamada

mista não teve maior consagração. Segundo Mello a teoria do risco é a melhor

delas, pois traz maior segurança ao Estado porque o ilícito é sempre reparado e já

foi adotada em inúmeras decisões e foi consagrada em diversos tratados, tais como

no Tratado sobre a exploração do espaço da ONU em 1967 e na Convenção sobre

responsabilidade civil por danos nucleares em Viena em 1963, entretanto o mesmo

autor salienta que a jurisprudência internacional consagra ainda predominantemente

a teoria da culpa, que protege mais o Estado. 153

151

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.287-288.

152 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.509-510. v.1.

153 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.510-511. v.1.

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A Comissão de Direito Internacional da ONU afirma a

existência de um elemento objetivo, que é a violação de uma norma internacional, e

de um elemento subjetivo, que é a atribuição dessa violação a um Estado. 154

As características da responsabilidade internacional são: o ato

ilícito, a imputabilidade e o dano. 155

De acordo com REZEK o ato ilícito deve representar uma

afronta ao direito das gentes, ou seja, um princípio geral, uma regra costumeira, um

dispositivo de tratado em vigor, etc. 156

O ato ilícito é a violação dos deveres ou obrigações

internacionais do Estado, quer se trate de uma ação ou de uma omissão. Tais

obrigações não resultam apenas de tratados ou convenções, mas também podem

decorrer do costume ou dos princípios gerais do Direito. É o elemento essencial da

responsabilidade, o prejuízo causado. 157

Já no tocante à imputabilidade essa seria o nexo que conecta o

autor do ilícito ao fato, sendo que este nem sempre é diretamente responsável

perante a ordem internacional. Esta exige certo nexo jurídico entre o agente do dano

e o Estado, é preciso que o agente tenha praticado o ato na qualidade oficial de

órgão do Estado ou com meios de que dispõe em virtude de tal qualidade. 158

O dano, sendo este tanto moral quanto material e seria o

elemento essencial gerador da responsabilidade, o prejuízo sofrido, o direito lesado.

159

A imputabilidade do sujeito do Direito Internacional divide-se160:

154

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.287.

155 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 440.

156 REZEK, J.F. Direito internacional público. p. 263.

157 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 441.

158 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.149-150.

159 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 441.

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50

a) Atos de órgãos governamentais: qualquer ato do órgão

governamental feito em nome do Estado/governo é considerado como ato do

Estado, não importando o cargo do funcionário. Também pouco importa a área, se

legislativa, executiva ou judiciária (responsabilidade direta).

b) Atos de órgãos governamentais sem poder: se um órgão

governamental praticou ato fora de sua competência ou contrário à instrução

referente à sua atividade, esse ato deve ser considerado como ato do Estado do

Direito Internacional (responsabilidade direta).

c) Atos de particulares: atos de particulares não constituem

atos do Estado. Entretanto, nesses casos, o ato do particular pode imputar

responsabilidade ao Estado, como nos casos em que o Estado não toma medidas

para evitar, prevenir ou minimizar o prejuízo (responsabilidade indireta).

Existem casos em que, determinadas circunstâncias fazem

com que nem sempre o ato violador constitua um ato internacionalmente ilícito ou

então ainda que possam excluir a responsabilidade do Estado, como nos casos em

que: 161

a) Quando o ato perde o caráter ilícito, transformando-se

no exercício de um direito reconhecido;

b) Aqueles em que o ato determinante da

responsabilidade, apesar de ilícito em si mesmo, não pode acarretar as

conseqüências naturais dos fatos ilícitos;

c) Em caso de decurso do tempo também extingue a

responsabilidade;

d) Aqueles que representam a conseqüência direta do

comportamento inconveniente e censurável do indivíduo lesado.

160

JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p. 446-447.

161 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.166-167.

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51

Como exemplo dos tipos de exclusão supracitado tem-se: 162

a) A legítima defesa se encaixa no primeiro caso (ataque

ilícito com proporcional e adequada reação de defesa pelo agredido);

b) O segundo caso é o das represálias (atos que em si

mesmos seriam ilícitos, mas que se “justificam” como único meio de combate a

outros atos igualmente ilícitos);

c) O terceiro caso é o da prescrição liberatória (quando o

lesado silencia e transcorre um lapso temporal, fica-se impossibilitado de entrar com

a ação de responsabilidade internacional, sendo que a jurisprudência arbitral já

determinou que a dita prescrição só deverá ser aplicada quando invocada e quando

houver fortes argumentos para aceitá-la, sendo a apreciação desta da competência

discricionária do juiz ou árbitro internacional);

d) O quarto caso é a culpa pelo comportamento do próprio

indivíduo, considerando que este agiu de tal modo que se pode dizer ter sido a

própria causa do fato gerador do dano ou ter fortemente contribuído para que este

ocorresse.

Existem ainda duas outras situações mencionadas pelos

doutrinadores como possíveis para a exclusão da responsabilidade, que seriam:

e) O caso fortuito, a força maior ou o estado de

necessidade: quando um Estado se vê ameaçado em seus interesses vitais, no

obstáculo ao seu progresso e desenvolvimento, pode defendê-los ainda que lesione

interesses legítimos de outros Estados. Quando há conflito no interesse entre

Estados. 163

f) Cláusula Calvo: decorre da doutrina do argentino Carlos

Calvo e seria a renúncia decorrente de quando um indivíduo, em contato particular

162

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.167.

163 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.293.

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com um governo estrangeiro, se compromete a não recorrer à proteção

diplomática164 de seu próprio governo em qualquer questão relacionada com as

disposições do referido contrato. É comum em contratos de concessões entre

governos e sociedades latino-americanos ou indivíduos estrangeiros. Esta cláusula

se encontra em desuso. 165

A principal conseqüência jurídica da responsabilidade

internacional seria a obrigação de reparar o dano causado. Na reparação

geralmente encontra-se implícito o dano material e o dever de restabelecer as coisas

ao estado anterior. 166

Reparação difere de sanção, pois esta contém característica

penal e crítica moral e visa manter a ordem da sociedade. A reparação é civil e tem

aspecto político no sentido de evitar o uso da força ou a guerra. Existem diferentes

modos de reparação, tais como: 167

a) Restituição integral, direta ou restitutio in integrum -

quando o Estado responsável é chamado a restabelecer a situação existente antes

do ato ilícito cometido;

b) Compensação/ indenização – é a forma mais comum,

cabível quando não é possível a restituição integral, sendo um problema para a

jurisprudência internacional a obtenção da base de cálculo da compensação, sendo

que a indenização não é uniforme, varia conforme o caso, o dano, etc., mas é

pacífico que abrange os danos diretos (dano emergente e lucro cessante);

c) Satisfação - utilizada para reparar o dano moral, aceitos

como formas de pedido de desculpas, danos morais ou ainda qualquer outro ato que

demonstre o pesar pelo ato cometido e o respeito pelo Estado bem como a

164

Somente pode reclamar para si, em caso de não-cumprimento do contrato a proteção de seu país nas hipóteses de denegação da justiça ou de injustiça manifesta. In: SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 168.

165 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.168.

166 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p.449.

167 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p.450.

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53

desaprovação de atos contrários à honra e à dignidade do Estado, devendo ser

públicas. A medida dessa satisfação deve-se buscar na natureza e gravidade das

ofensas.

d) E ainda as garantias e/ou promessas de não-repetição,

que podem ser reclamadas isoladamente ou em combinação.

A maioria dos casos demonstrados acima seria em questões

de litígios de Estado para Estado. Acontece, entretanto, que no caso de pessoas

físicas e jurídicas ou funcionários de organizações internacionais, no caso de haver

prejuízo causado por ato ilícito do Estado contra aqueles, ocorre a proteção

diplomática ou funcional.

Existe a proteção diplomática formada a partir da jurisprudência

e do costume e se traduz na possibilidade de os particulares terem acesso aos

tribunais internacionais, que ocorreria através de seu Estado, pois dele é a

prerrogativa do exercício desse direito (poder discricionário). Assim, o Estado

endossa reclamação de um indivíduo ou de uma sociedade, tornando-a sua (teoria

do endosso). Algumas condições para essa proteção ocorrer seriam: a

nacionalidade do autor da reclamação deve ser a do Estado, o esgotamento dos

recursos internos pela legislação interna do Estado que cometeu o ato lesivo, o autor

da reclamação deve ter conduta ilibada. 168

Existe ainda a proteção funcional, que é concedida por

organizações internacionais aos seus agentes que sofrem qualquer restrição à

prática de seus serviços. Essa proteção é diferente da diplomática, pois quem

exerce o direito é a organização internacional, com base em sua função e não com

base na nacionalidade do funcionário. 169

De acordo com Mello atualmente se sustenta que o Estado não

é responsável pelos atos de particulares, sejam nacionais ou estrangeiros,

cometidos no seu território. A responsabilidade não é automática, deriva da atitude

168

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.288-289.

169 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.290.

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do Estado, pois este tem a obrigação de cumprir com seus deveres: prevenir o ilícito

e o de reprimi-lo, pois é responsável por manter a ordem pública. 170

A responsabilidade internacional dos Estados no tocante ao

alto-mar se dá igualmente em relação aos atos ilícitos ou não proibidos e omissões,

praticados por particulares, funcionários públicos ou de organizações internacionais

ou ainda o próprio Estado. Exemplos destes casos seriam a pirataria, o ataque a

tropas ou a grupos nacionais ou ainda um Chefe de Estado, fazer propaganda

injuriosa, no caso de particulares, já no tocante aos atos de Estados, seriam atos ou

fatos praticados ou que não foram praticados, de efeito danoso, contra uma norma

aceita pela comunidade internacional como norma de Direito Internacional, ou contra

um outro Estado ou a súditos deste. Em relação a atos de funcionários públicos

No caso de navios, uma abordagem rápida, por se tratar de

responsabilidade civil, matéria de Direito Internacional Privado, no caso de colisão,

em águas territoriais vale a lei do lugar da colisão, já em alto-mar se submete a

diversos critérios de conexão, como a lei do pavilhão, por exemplo, sempre com as

limitações de ordem pública. Em muitos casos também se aplica, principalmente em

alto-mar a lei do foro ou a lex loci celebrationis (lei do lugar de celebração, no caso

de contratos) e as normas a serem aplicadas dependem das circunstâncias do caso

concreto que devem ser analisadas cuidadosamente. A responsabilidade do capitão

e do armador é ilimitada, de acordo com o Código Comercial de 1850 (art. 494). 171

No caso de derramamento de petróleo, causada por navios, a IMO é responsável

pela prevenção (inclusive com várias Convenções que tratam do assunto, como a de

Convenção Internacional de Nairóbi para Remoção de Ruínas, de 2007) e o país de

bandeira do navio é responsável pelo dano e sua reparação.172

A responsabilização decorrente de dano ambiental, é disposta

em alto-mar, na Convenção sobre Direito do Mar, no Anexo III, artigo 22 e na Seção

IX, em seu artigo 235, estabelecendo que os Estados devem zelar pelo cumprimento

170

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.517. v.1.

171 STRENGER, Irineu. Responsabilidade civil no direito interno e internacional. 2.ed. São Paulo: LTr, 2000. p. 291-293.

172 Organização Marítima Internacional. Disponível em: <http://www.imo.org/>. Acesso em 20 maio 2010.

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das suas obrigações internacionais relativas à proteção e preservação do meio

marinho. Estes devem assegurar, através do direito interno, meios e recursos que

permitam obter uma reparação adequada de danos sofridos em áreas sob sua

jurisdição, podendo ser até uma indenização. Assim sendo, qualquer Estado que

faça parte da referida Convenção pode pedir a uma Organização Internacional que

informe o responsável pelo dano e o alcance dessa responsabilidade. 173

3.2 SOLUÇÕES PACÍFICAS DOS CONFLITOS

Os Estados podem tentar solucionar suas controvérsias antes

mesmo que as mesmas ponham em perigo a paz e a segurança da comunidade

internacional e sem a necessidade de apelar para a guerra. Existem diversos

processos, sejam pacíficos ou coercitivos, que podem resolver as diferenças entre

os litigantes e existem organizações internacionais ou de caráter regional que

estabelecem que os desentendimentos que por acaso surgirem devem ser

solucionados por meios pacíficos, sendo estes diplomáticos ou jurídicos. 174

As controvérsias internacionais podem ter diversas causas,

mas as jurídicas principalmente decorrem da violação de tratados ou convenções,

do desconhecimento por um Estado dos direitos do outro, da ofensa a princípios de

Direito Internacional e as políticas resultam de choque de interesses políticos ou

econômicos ou de ofensa à honra ou à dignidade de um Estado. 175

A Carta das Nações Unidas impõe em seu artigo 33 a

obrigação dos Estados de recorrerem à solução pacífica dos litígios. Se caso não

ocorra um acordo entre as partes litigantes, o próprio Conselho de Segurança da

173

PEREIRA, Luis César Ramos. Ensaio sobre a responsabilidade internacional do Estado e suas consequências no direito internacional: (a saga da responsabilidade internacional do Estado). São Paulo: LTr, 2000.p. 138-139.

174 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p.315.

175 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 428.

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ONU ex officio tomará as medidas cabíveis para que as partes em litígio o

resolvam.176

Antes, porém de se chegar à ONU, deve-se tentar resolver

internamente o litígio ou ainda por meio de entidades regionais, conforme artigo 52-2

da Carta da ONU. 177

Os modos pacíficos de solução dos conflitos, como

conseqüência da proibição do uso e ameaça do uso da força nas relações

internacionais tida como jus cogens, podem ser classificadas entre jurisdicionais e

não jurisdicionais.178

O conceito de conflito internacional é: 179

Todo desacordo, oposição ou divergência sobre certo ponto de direito ou de fato entre os sujeitos do direito internacional. Exprime-se pela existência de uma oposição de interesses entre as partes envolvidas e pela vontade das mesmas de solucionar, de qualquer maneira, o conflito.

3.3 SOLUÇÕES DIPLOMÁTICAS DOS CONFLITOS

Os modos diplomáticos de solução dos conflitos são: as

negociações diplomáticas, os bons ofícios, a mediação, o sistema consultivo, os

congressos e conferências.

A negociação, principalmente a feita diretamente entre as

partes é o meio usual e de melhores resultados na solução de divergências. Essas

negociações variam segundo a gravidade do problema, sendo que nos casos de

menos importância basta um entendimento verbal entre a missão diplomática e o

Ministério das Relações Exteriores local. As partes apresentam seu ponto de vista e

176

ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p.315.

177 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. p.182.

178 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.404.

179 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p.553.

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assim ou desistem de sua pretensão total ou parcialmente, ou a vêem reconhecida

ou ainda há a possibilidade de as partes concordarem com concessões

recíprocas180.

Já nos mais graves a solução deverá ser alcançada mediante

entendimento entre os altos funcionários dos dois governos, que podem ser os

próprios Ministros das Relações Exteriores. 181

Os bons ofícios seriam um meio de solução de controvérsia de

maneira amistosa de uma terceira potência, ou de várias potências, no sentido de

levar os litigantes a um acordo. O(s) Estado(s) que aceitarem a oferta ou se

oferecerem os bons ofícios não tomam parte direta nas negociações, nem no acordo

a que possam chegar os litigantes. A recusa dos bons ofícios não constitui ato

inamistoso. Um exemplo de organismo que já atuou nesse sentido seria a Comissão

Interamericana de Paz, criada em Havana em 1940 por ocasião da 2ª Reunião de

Consulta. 182

A mediação consiste na interposição amistosa de um ou mais

Estados, entre outros Estados, para a solução pacífica de um litígio e é regulada

pelas Convenções de Haia (1899 e 1907). O mediatário não é juiz, não prolata

sentença, somente sugere opções que possam levar ao entendimento entre as

partes. 183 Na prática é difícil distingui-la dos bons ofícios, mas se limita a superar a

ruptura das relações internacionais entre os Estados litigantes. 184

A consulta pode ser definida como uma troca de opiniões entre

dois ou mais governos interessados direta ou indiretamente num litígio internacional,

no intuito de alcançarem uma conciliação para o caso. Primeiramente visava à

manutenção da paz no continente, porém após algumas ampliações adotadas na

180

ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p.317.

181 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 439-440.

182 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.440-441.

183 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p.318.

184 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.442.

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Conferência de Lima, se aplica a qualquer questão que justifique esse processo e

em cujo exame os Estados tenham interesse comum. Também proclamada na

ocasião da Conferência como processo de coordenação das vontades soberanas

das repúblicas americanas, para tornar efetiva a sua solidariedade. 185

Os congressos e conferências ocorrem quando a matéria em

litígio interessa a diversos Estados, daí a resolverem o assunto em conjunto, ou

quando se tem em vista a solução de inúmeras questões sobre as quais existem

divergências. Tendem atualmente a ser resolvidas na Assembléia Geral das Nações

Unidas, no Conselho Geral da ONU ou no caso de questões latino-americanas, na

Organização dos Estados Americanos, a OEA. 186

3.4 SOLUÇÕES JURÍDICAS DOS CONFLITOS

Decorre da necessidade de resolução de conflitos quando não

há acordo e as soluções seriam a arbitragem, as comissões de inquérito, a solução

judiciária, que seria a sujeição aos órgãos superiores na hierarquia da comunidade

internacional que agem nesse sentido, tal como a ONU com seu Conselho de

Segurança.

Segundo Mello a arbitragem pode ser definida como sendo: 187

“Aquele modo pacífico de solução de litígios internacionais por meio de juízes escolhidos pelas partes litigantes.”

A arbitragem de Direito Internacional Público, que é o objeto

deste subtítulo, se diferencia da arbitragem de Direito Internacional Privado, portanto

vamos nos limitar à primeira categoria.

185

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.444.

186 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p.440.

187 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.1441. v. 2.

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59

O Ato de Genebra (1928) revisto pela Assembléia Geral da

ONU (1949) admite que qualquer litígio seja resolvido pela arbitragem, exceto

quando a cláusula do documento expressamente dispuser o contrário e nomear

algum órgão para o julgamento, tal como a CIJ.

A arbitragem é um dos institutos mais antigos, de origem

consuetudinária. Na Grécia já é encontrado em 3100 a.C. no tratado entre Eanatum

e os homens de Umma. 188

Charles Rousseau identificou através da análise histórica da

arbitragem, três tipos distintos:

a) A realizada por chefes de Estado – Comum no período

medieval, desapareceu com a Reforma. Porém essa modalidade continuou a ser

utilizada e os árbitros são os chefes de Estado, sem que haja um superior (“árbitro

natural”);

b) A realizada por comissões mistas – Iniciou-se no fim do

século XVIII. Era formada por dois membros, sendo um indicado pelas partes

litigantes. Depois é substituída por uma “comissão mista arbitral”, que era composta

por comissionários de número ímpar, com árbitro para desempate, geralmente

escolhido entre os nacionais de terceiro Estado.

c) A realizada por um Tribunal, que proveio do caso

Alabama (INGLATERRA x ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA). A maioria dos juízes

não é nacional das partes contratantes.

A última modalidade é a mais utilizada, e segundo MELLO a

mais desenvolvida. 189

A arbitragem não é obrigatória, sendo fundada na vontade das

partes. O processo arbitral é consagrado no compromisso arbitral, que nada mais é

que o acordo entre os litigantes. Da validade deste tratado depende a validade de 188

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p.1442. v. 2.

189 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1444. v. 2.

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60

toda a arbitragem. Apresenta as seguintes características: a) as partes fixam o

objeto do litígio; b) os árbitros são escolhidos; c) a decisão é obrigatória. 190

É um tratado internacional e está sujeito a todas as condições

de validade deste. O compromisso arbitral é uma cláusula que contém o que foi

acordado entre as partes (os requisitos que devem constar no compromisso estão

dispostos no artigo 52 da Convenção de Haia) 191 nas quais os juízes se

fundamentam para julgar, no caso de divergência na interpretação ou execução,

mas no silêncio deste prevalece o disposto no artigo 38 do Estatuto do CIJ ou as

regras previstas nas Convenções de Haia.

A decisão arbitral é passível de anulação, que deve ser

invocada pelas partes, mas ocorre somente no caso de violação de um princípio

fundamental do processo, erro na sentença ou corrupção de membro do tribunal. 192

A Corte Permanente de Arbitragem foi criada na 1ª Conferência

de Haia, na Holanda, em 1899, e revista na 2ª Conferência, em 1907 e sua

finalidade era tornar a arbitragem um tipo judicial. 193

Atualmente, predomina a arbitragem por tribunal, em que existe

pelo menos um membro estranho às partes litigantes. As comissões mistas

deixaram de ser utilizadas neste século, segundo ACCIOLY, pois eram formas

primitivas de arbitragem e sua esfera de atuação envolvia geralmente questões de

fronteiras ou reclamações de particulares sobre danos em seus bens. Não se devem

confundir estas comissões mistas, que são de execução de serviços de interesse

mútuo com as comissões mistas incumbidas de resolver controvérsias

internacionais194.

190

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.408.

191 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 328.

192 SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. p.409-410.

193 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. p. 1451. v. 2.

194 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 442.

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61

A partir de 1960, quando o Conselho Administrativo da Corte

Permanente de Arbitragem decidiu encorajar o uso das facilidades da Corte para

arbitragens entre Estados e sociedades comerciais, vêm-se falando em arbitragem

comercial, que foi regulamentada pela Convenção de 1958, na ONU, em Nova

Iorque, em 1961.

Na jurisdição internacional se distinguem vários órgãos, alguns

tidos como tribunais internacionais permanentes, tais como: a Corte Permanente de

Justiça Internacional (criada em 1919 como órgão autônomo da Liga das Nações e

encerrou suas atividades em 1940, prolatando nesse interstício 32 sentenças e

respondendo a 27 consultas) 195, a Corte Internacional de Justiça, também chamada

de “Corte Mundial”, atualmente considerado o principal órgão judiciário das Nações

Unidas (art. 92 da Carta da ONU) e funciona de acordo com um Estatuto

considerado parte da Carta da ONU, o Tribunal Criminal Internacional, a

Organização Mundial do Comércio (OMC) com seu órgão de Solução de

Controvérsias196, na jurisdição regional da Europa tem-se a Corte de Justiça da

União Européia, a Corte Européia de Direitos Humanos, a Corte da América Central

de Justiça, o Tribunal Internacional para o Direito do Mar, dentre outros.197

Nos artigos 33 e 36-2 do Estatuto da Carta das Nações Unidas,

faz-se mister evidenciar que esta dispõe que em qualquer fase o Conselho de

Segurança pode fazer recomendações para solucionar o conflito e as controvérsias

de caráter jurídico (aquela que visa a interpretar tratados, questões de Direito

Internacional, violações de compromissos internacionais, etc.) devem ser

submetidas à CIJ.198

As comissões de inquérito e conciliação seriam criadas para

facilitar soluções de litígios no caso de fatos controvertidos, por meio de uma

investigação imparcial e criteriosa. A criação dessas comissões se deu na Primeira

Conferência de Paz em Haia na Holanda e foi incluída na Convenção para a

195

ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 322.

196 VARELLA, Marcelo Dias. Direito internacional público. p. 370.

197 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p.569.

198 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. p.185.

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Solução Pacífica dos Conflitos Internacionais em 1899. São quase sempre

compostas por cinco membros, dos quais cada parte indica dois deles e o quinto é

escolhido de comum acordo pelas partes litigantes. A função precípua dessas

comissões é investigar os fatos sobre os quais versa o litígio e apresentar conselhos

ou sugestões que permitam a conciliação nos pontos divergentes. Seu papel é

meramente consultivo e o método utilizado é o da persuasão. 199

3.5 SOLUÇÕES POLÍTICAS DOS CONFLITOS

Seriam as dadas pelas organizações internacionais, que no

exercício de suas funções podem ajudar a solucionar os conflitos. Os meios de

solução que podem ser aplicados seriam pacíficos ou coercitivos (pois estas

medidas forçam o adversário a solucionar o desacordo existente entre ambos)

políticos ou judiciários, visando eliminar a ameaça à paz e recuperá-la. A ONU, com

seu Conselho de Segurança bem como com a Assembléia Geral podem intervir nos

conflitos entre os Estados. O meio político seria através do Secretário-geral da ONU

e a solução pacífica seria feita pela Assembléia Geral por meio de bons ofícios ou

mediação em vários casos. 200

As formas coercitivas de solução seriam: retorsão, represálias,

embargo, bloqueio pacífico, boicotagem e rompimento das relações diplomáticas.

A retorsão é201:

“A medida de um Estado com o intuito de revidar de maneira idêntica a violência ou o prejuízo sofrido por outro Estado. As medidas são legítimas, pois decorrem do exercício da soberania do Estado, embora causem prejuízo aos demais e estes adotem processo idêntico para fazer retornar ao status quo ante.”

199

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 450-452.

200 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p.568.

201 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 333.

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Um exemplo dessa forma de coerção seria quando um Estado

resolve elevar excessivamente as tarifas alfandegárias referentes a mercadorias

provenientes de determinado Estado ou ainda quando impede a entrada de navio

estrangeiro em seu território sem justificativa plausível. Um caso internacional que

ilustra essa situação seria o da antiga URSS que proibiu que suas instalações

militares fossem visitadas pelas forças armadas norte-americanas sediadas na

capital soviética fazendo com que os Estados Unidos adotassem medida idêntica em

relação não só aos militares soviéticos, mas também estendeu tal proibição aos

nacionais dos países dos Estados da chamada “cortina de ferro”. 202

A represália ocorre quando um Estado revida as ofensas ou

violências recebidas por outro Estado com medidas contrárias ao Direito das

Gentes, que devem ser proporcionais às ofensas recebidas e contra somente ao

Estado e não aos seus cidadãos. Seu conceito segundo o autor seria 203:

“São medidas coercitivas, derrogatórias das regras ordinárias do direito das gentes, tomadas por um Estado, em conseqüência de atos ilícitos praticados, em seu prejuízo, por outro Estado e destinadas a impor a este, por meio de um dano, o respeito do direito”.

Alguns requisitos devem ocorrer para se justificar o emprego

de tal medida, sendo eles: a) existência de um ato anterior contrário ao Direito

Internacional; b) impossibilidade ou esgotamento de emprego de outros meios de

solução; c) proporcionalidade entre a ação sofrida e a ação empregada; d) tentativa

anterior de obter satisfação, reparação para o Estado violador. 204

Um exemplo seria romper relações diplomáticas, reter os

navios do Estado que se encontram ancorados em seus portos, etc. As represálias

podem ser negativas (quando um Estado se nega a cumprir uma obrigação ou

202

ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 333.

203 GADELHA, Paulo. Teoria jurídica dos conflitos internacionais. In: Revista Eletrônica da Escola de Magistratura Federal da 5ª Região – ESMAFE. n. 4. Recife, 2002. p. 46. Disponível em: <http://www.trf5.jus.br/documento/?arquivo=Teoria+juridica.pdf&tipo=p11>. Acesso em 20 maio 2010.

204 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. p.187.

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executa atos que lhe são proibidos) ou positivas (quando um Estado se apodera de

pessoas e bens do Estado com quem está em discordância). 205

A principal diferença entre represália e retorsão é que a

primeira é mais grave por decorrer de ato ilícito do Estado, já a segunda é motivada

por um ato que o Direito não proíbe ao Estado estrangeiro. 206

Na prática internacional, existem ainda as contramedidas que

seriam atos de retaliação, ou represália, feitos pelo Estado ofendido que deixou de

obedecer às obrigações para com o Estado responsável pelo ato ilícito cometido, a

fim de induzi-lo a obedecer a suas obrigações. São proibidas algumas práticas

nesse sentido, que seriam: a ameaça ou o uso de força, a coerção econômica ou de

política externa que arrisquem a integridade territorial ou a independência política do

Estado infrator, qualquer conduta que infrinja a inviolabilidade de agentes

diplomáticos ou consulares, premissas, arquivos e documentos, bem como qualquer

outra conduta considerada contravenção em Direito Internacional. 207

O embargo consiste na imobilização de navios de comércio

estrangeiro para fazer pressão sobre o Estado. Um exemplo seria em tempos de faz,

o Estado efetuar o seqüestro de navios mercantes de um Estado estrangeiro

ancorados em seus portos ou em suas águas territoriais com o objetivo de protestar

contra um ato nocivo ao direito e que foi praticado por aquele Estado. 208

Não se deve confundir este embargo com o “embargo do

príncipe” (proibição por questões sanitárias, judiciais ou de polícia da saída de

navios fundeados em um porto do Estado que adota a referida medida) nem com o

direito de angária (que seria a requisição por parte de um Estado dos navios

mercantes estrangeiros baseados em seus portos para que transportem soldados,

armas ou munições, mediante pagamento, sendo que em tempos de guerra os

205

ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 333-334.

206 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 334.

207 JO, Hee Moon. Introdução ao direito internacional. p.452-453.

208 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 335.

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neutros podem se utilizar desse direito sobre os navios mercantes dos beligerantes

que se encontrarem em seu território). 209

O bloqueio pacífico seria o impedimento em tempos de paz,

por meio de belonaves (navios de guerra), que um Estado mantenha suas

comunicações com os demais Estados. Segundo o autor é bastante controvertida a

legitimidade dessa ação perante os juristas, pois a ONU proíbe o uso de força nas

relações internacionais. Um exemplo desse caso ocorreu no Brasil entre 1862 a

1863 quando navios britânicos bloquearam o porto do Rio de Janeiro e aprisionaram

navios mercantes visando obter reparação contra supostos ilícitos que o nosso

governo teria praticado quando do naufrágio do navio “Prince of Wales”. 210

A boicotagem é a suspensão, interrupção ou até a proibição de

serem adquiridas mercadorias ou serem mantidas relações comerciais de um Estado

que violou as regras de Direito Internacional ou que causou prejuízos aos interesses

de um Estado ou de seus nacionais. 211

Encontra-se previsto no artigo 16 do Pacto da Liga das Nações

e no artigo 41 da Carta das Nações Unidas como medida coercitiva legítima. Este

recurso, a boicotagem, pode ser feito por ato oficial do governo ou obra de meros

particulares. Geralmente diz-se que neste caso de atos de particulares não acarreta

responsabilidade ao Estado, mas há uma discussão entre alguns autores de que se

forem atos em que participarem direta ou indiretamente funcionários ou agentes do

Estado, este pode vir a ser responsabilizado ou que os atos de particulares se

dividem entre boicotagem voluntária (ato legítimo, não acarretando

responsabilização do Estado) e compulsória (ato ilegítimo pelo qual o Estado pode

responder). 212

A ruptura das relações diplomáticas é uma cessação

temporária das relações oficiais entre dois Estados resultante da violação dos

209

ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 335.

210 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 336.

211 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 336.

212 SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 458.

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direitos de um dos Estados ocasionado pelo outro Estado. É um meio de pressão a

fim de modificar atitude ou chegar a um acordo e se encontra no artigo 41 da Carta

das Nações Unidas. 213

O rompimento de relações diplomáticas acontece quando se

atinge um ponto extremo entre os Estados litigantes, podendo ocorrer com a entrega

de passaportes, a retirada dos diplomatas e da missão do Estado culpado. 214

As relações deixam de existir quando deixar de ter o elemento

consentimento mútuo disposto no artigo 2º da Convenção de Viena. Um exemplo

seria o rompimento dos EUA com Cuba, encarregando a Suíça de resolver seus

interesses em Havana. 215

Caso os meios supracitados não sejam suficientes para

solucionar os problemas criados na sociedade internacional, o Conselho de

Segurança da ONU é o responsável pela solução, que pode ser inclusive militar,

conforme artigo 44 da Carta da ONU. 216

Se todas as alternativas anteriores de resolução de conflitos

não surtirem efeitos positivos que caminhem em direção a um acordo as

divergências são levadas a uma última possibilidade, a guerra.

Neste capítulo foram abordados os tipos de responsabilidade,

bem como suas características, seus agentes e suas conseqüências. Também foi

exposta a solução dos conflitos internacionais, sejam eles diplomáticos, jurídicos ou

políticos, com o objetivo de fazer respeitar seus direitos e cumprir os deveres nas

relações internacionais. A conexão deste capítulo com o tema escolhido advém da

necessidade de se explicitar como se resolveriam os conflitos ocorridos no mar, que

seriam pelos meios acima elencados caso a controvérsia seja passível de acordo ou

213

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de direito internacional público. p. 459.

214 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional público. p. 336.

215 SEINTENFUS, Ricardo; VENTURA, Deisy. Introdução ao Direito Internacional Público. p. 136.

216 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional público. p.188-189.

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ainda pelo Tribunal Internacional do Mar no caso de necessidade de intervenção no

litígio.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os objetivos do presente estudo foram cumpridos,

principalmente o objetivo institucional que seria a produção de monografia para

obtenção do título de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI.

Foram igualmente cumpridos os objetivos investigatórios, que

seriam investigar o alto-mar em seus aspectos gerais e específicos, demonstrar os

direitos e deveres dos Estados pelo estudo da liberdade dos mares, examinar a

responsabilidade internacional do Estado, reunir a legislação e dos Tratados

Internacionais acerca do tema bem como desvendar os métodos de solução dos

conflitos de âmbito internacional.

O tema foi escolhido pela curiosidade em relação ao mar, sua

delimitação e natureza jurídica e a responsabilidade dos Estados em alto-mar e

também pelo interesse na área de Direito Internacional Público.

A primeira hipótese foi confirmada, pois há grande quantidade

de tratados e convenções internacionais reguladores de vários temas de Direito

Internacional, tanto em relação ao mar territorial, à zona de pesca, à zona

econômica exclusiva, quanto especificamente em relação ao alto-mar, que seriam as

Convenções de Genebra de 1958 e a de Montego Bay de 1982 e o Brasil é

signatário de várias Convenções que regulam temas como o alto-mar onde a

legislação é omissa ou insuficiente.

A segunda hipótese também foi confirmada, pois o alto-mar é

regulado pelas normas de Direito Internacional e os Estados têm direitos e deveres

no mar, por exemplo, o direito de passagem pelo litoral de outro Estado, mas que

deve ser feita de forma pacífica e contínua, de modo a não interferir no exercício da

soberania do Estado litorâneo.

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A terceira hipótese foi confirmada, devido à responsabilização

dos Estados decorrentes de atos de particulares ou de pessoas em exercício da

função ou até mesmo por demora na resposta do próprio Estado em agir, e em

casos de conflitos internacionais, a busca pela solução deve se dar de modo

pacífico, diplomático, para evitar reprimendas maiores e prejudiciais ou até guerras.

O presente estudo demonstra a grandiosidade dos interesses

no mar, a variedade dos institutos que nele se encontram bem como os diversos

órgãos reguladores dos acontecimentos no mar. Importante ressaltar que cada vez

mais o mar será cobiçado, tanto pelas riquezas quanto pelas oportunidades que

proporciona pela navegação, pela exploração, pela troca entre os países, sendo

assim o Direito do Mar tende a ser cada vez mais valorizado.

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ANEXOS

DECRETO Nº 1.530, DE 22 DE JUNHO DE 1995

Declara a entrada em vigor da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito

do Mar, concluída em Montego Bay, Jamaica, em 10 de dezembro de 1982.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art.

84, inciso VIII, da Constituição, e

Considerando que o Congresso Nacional aprovou, por meio do Decreto

Legislativo nº 5, de 9 de novembro de 1987, a Convenção das Nações Unidas sobre

o Direito do Mar, concluída em Montego Bay, Jamaica, em 10 de dezembro de 1982;

Considerando que o Governo brasileiro ratificou a referida Convenção em 22

de dezembro de 1988;

DECRETA:

Art. 1º Fica declarado que a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do

Mar, concluída em Montego Bay, Jamaica, em 10 de dezembro de 1982, entrou em

vigor internacional e para o Brasil em 16 de novembro de 1994, de conformidade

com o seu art. 308, parágrafo 1.

Art. 2º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 22 de junho de 1995; 174º da Independência e 107º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Luiz Felipe Lampreia

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CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE O DIREITO DO MAR

Os Estados Partes nesta Convenção:

Animados do desejo de solucionar, num espírito de compreensão e cooperação

mútuas, todas as questões relativas ao direito do mar e conscientes do significado

histórico desta Convenção como importante contribuição para a manutenção da paz,

da justiça e do progresso de todos os povos do mundo;

Verificando que os fatos ocorridos desde as Conferências das Nações Unidas sobre

o Direito do Mar, realizadas em Genebra em 1958 e 1960, acentuaram a

necessidade de uma nova convenção sobre o direito do mar de aceitação geral;

Conscientes de que os problemas do espaço oceânico estão estreitamente inter-

relacionados e devem ser considerados como um todo;

Reconhecendo a conveniência de estabelecer por meio desta Convenção, com a

devida consideração pela soberania de todos os Estados, uma ordem jurídica para

os mares e oceanos que facilite as comunicações internacionais e promova os usos

pacíficos dos mares e oceanos, a utilização equitativa e eficiente dos seus recursos,

a conservação dos recursos vivos e o estudo, a proteção e a preservação do meio

marinho;

Tendo presente que a consecução destes objetivos contribuirá para o

estabelecimento de uma ordem econômica internacional justa e equitativa que tenha

em conta os interesses e as necessidades da humanidade, em geral, e, em

particular, os interesses e as necessidades especiais dos países em

desenvolvimento, quer costeiros quer sem litoral;

Desejando desenvolver pela presente Convenção os princípios consagrados na

Resolução n.º 2749 (XXV), de 17 de Dezembro de 1970, na qual a Assembléia Geral

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das Nações Unidas declarou solenemente, inter alia, que os fundos marinhos e

oceânicos e o seu subsolo para além dos limites da jurisdição nacional, bem como

os respectivos recursos, são patrimônio comum da humanidade e que a exploração

e o aproveitamento dos mesmos fundos serão feitos em benefício da humanidade

em geral, independentemente da situação geográfica dos Estados;

Convencidos de que a codificação e o desenvolvimento progressivo do direito do

mar alcançados na presente Convenção contribuirão para o fortalecimento da paz,

da segurança, da cooperação e das relações de amizade entre todas as nações, de

conformidade com os princípios de justiça e igualdade de direitos, e promoverão o

progresso econômico e social de todos os povos do mundo, de acordo com os

propósitos e princípios das Nações Unidas, tais como enunciados na Carta;

Afirmando que as matérias não reguladas pela presente Convenção continuarão a

ser regidas pelas normas e princípios do direito internacional geral;

Acordam o seguinte:

PARTE I Introdução

Artigo 1.º Termos utilizados e âmbito de aplicação 1 - Para efeitos da presente Convenção:

1) «Área» significa o leito do mar, os fundos marinhos e o seu subsolo além dos

limites da jurisdição nacional;

2) «Autoridade» significa a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos;

3) «Atividade na área» significa todas as atividades de exploração e aproveitamento

dos recursos na área;

4) «Poluição do meio marinho» significa a introdução pelo homem, direta ou

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indiretamente, de substâncias ou de energia no meio marinho, incluindo os

estuários, sempre que a mesma provoque ou possa vir a provocar efeitos nocivos,

tais como danos aos recursos vivos e à vida marinha, riscos à saúde do homem,

entrave às atividades marítimas, incluindo a pesca e as outras utilizações legítimas

do mar, alteração da qualidade da água do mar, no que se refere à sua utilização e

deterioração dos locais de recreio;

5) «Estados Partes» significa os Estados que tenham consentido em ficar obrigados

pela Convenção e em relação aos quais a Convenção esteja em vigor.

6) A Convenção aplica-se mutatis mutandis às entidades mencionadas nas alíneas

b), c), d), e) e f) do n.º 1 do artigo 305.º que se tenham tornado Partes na presente

Convenção de conformidade com as condições relativas a cada uma delas e, nessa

medida, a expressão «Estados Partes» compreende essas entidades.

PARTE II

Mar territorial e zona contígua

SECÇÃO 1

Disposições gerais Artigo 2.º

Regime jurídico do mar territorial, seu espaço aéreo sobrejacente, leito e subsolo.

1 - A soberania do Estado costeiro estende-se além do seu território e das suas

águas interiores e, no caso de Estado arquipélago, das suas águas arquipelágicas, a

uma zona de mar adjacente designada pelo nome de mar territorial.

2 - Esta soberania estende-se ao espaço aéreo sobrejacente ao mar territorial, bem

como ao leito e ao subsolo deste mar.

3 - A soberania sobre o mar territorial é exercida de conformidade com a presente

Convenção e as demais normas de direito internacional.

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SECÇÃO 2

Limites do mar territorial Artigo 3.º Largura do mar territorial

Todo o Estado tem o direito de fixar a largura do seu mar territorial até um limite que

não ultrapasse 12 milhas marítimas, medidas a partir de linhas de base

determinadas de conformidade com a presente Convenção.

Artigo 4.º Limite exterior do mar territorial

O limite exterior do mar territorial é definido por uma linha em que cada um dos

pontos fica a uma distância do ponto mais próximo da linha de base igual à largura

do mar territorial.

Artigo 5.º Linha de base normal

Salvo disposição em contrário da presente Convenção, a linha de base normal para

medir a largura do mar territorial é a linha da baixa-mar ao longo da costa, tal como

indicada nas cartas marítimas de grande escala, reconhecidas oficialmente pelo

Estado costeiro.

Artigo 6.º Recifes

No caso de ilhas situadas em atóis ou de ilhas que têm cadeias de recifes, a linha de

base para medir a largura do mar territorial é a linha de baixa-mar do recife que se

encontra do lado do mar, tal como indicada por símbolo apropriado nas cartas

reconhecidas oficialmente pelo Estado costeiro.

Artigo 7.º Linhas de base retas

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1 - Nos locais em que a costa apresente recortes profundos e reentrâncias ou em

que exista uma franja de ilhas ao longo da costa na sua proximidade imediata, pode

ser adotado o método das linhas de base retas que unam os pontos apropriados

para traçar a linha de base a partir da qual se mede a largura do mar territorial.

2 - Nos locais em que, devido à existência de um delta e de outros acidentes

naturais, a linha da costa seja muito instável, os pontos apropriados podem ser

escolhidos ao longo da linha de baixa-mar mais avançada em direção ao mar e,

mesmo que a linha de baixa-mar retroceda posteriormente, essas linhas de base

retas continuarão em vigor até que o Estado costeiro as modifique de conformidade

com a presente Convenção.

3 - O traçado dessas linhas de base retas não deve afastar-se consideravelmente da

direção geral da costa e as zonas de mar situadas dentro dessas linhas devem estar

suficientemente vinculadas ao domínio terrestre para ficarem submetidas ao regime

das águas interiores.

4 - As linhas de base retas não serão traçadas em direção aos baixios que emergem

na baixa-mar, nem a partir deles, a não ser que sobre os mesmos se tenham

construído faróis ou instalações análogas que estejam permanentemente acima do

nível do mar, ou a não ser que o traçado de tais linhas de base retas até àqueles

baixios ou a partir destes tenha sido objeto de reconhecimento internacional geral.

5 - Nos casos em que o método das linhas de base ritos for aplicável, nos termos do

parágrafo 1, poder-se-á ter em conta, ao traçar determinadas linhas de base, os

interesses econômicos próprios da região de que se trate, cuja realidade e

importância estejam claramente demonstradas por uso prolongado.

6 - O sistema de linhas de base retas não poderá ser aplicado por um Estado de

modo a separar o mar territorial de outro Estado do alto mar ou de uma zona

econômica exclusiva.

Artigo 8.º

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Águas interiores

1 - Excetuando o disposto na parte IV, as águas situadas no interior da linha de base

do mar territorial fazem parte das águas interiores do Estado.

2 - Quando o traçado de uma linha de base reta, de conformidade com o método

estabelecido no artigo 7.º, encerrar, como águas interiores, águas que anteriormente

não eram consideradas como tais, aplicar-se-á a essas águas o direito de passagem

inofensiva, de acordo com o estabelecido na presente Convenção.

Artigo 12.º Ancoradouros

Os ancoradouros utilizados habitualmente para carga, descarga e fundeio de navios,

os quais estariam normalmente situados, inteira ou parcialmente, fora do traçado

geral do limite exterior do mar territorial, são considerados como fazendo parte do

mar territorial.

Artigo 14.º

Combinação de métodos para determinar as linhas de base

O Estado costeiro poderá, segundo as circunstâncias, determinar as linhas de base

por meio de qualquer dos métodos estabelecidos nos artigos precedentes.

Artigo 15.º

Delimitação do mar territorial entre Estados com costas adjacentes ou situadas

frente a frente

Quando as costas de dois Estados são adjacentes ou se encontram situadas frente

a frente, nenhum desses Estados tem o direito, salvo acordo de ambos em contrário,

de estender o seu mar territorial além da linha mediana cujos pontos são

equidistantes dos pontos mais próximos das linhas de base, a partir das quais se

mede a largura do mar territorial de cada um desses Estados. Contudo, este artigo

não se aplica quando, por motivo da existência de títulos históricos ou de outras

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circunstâncias especiais, for necessário delimitar o mar territorial dos dois Estados

de forma diferente.

SECÇÃO 3

Passagem inofensiva pelo mar territorial

SUBSECÇÃO A

Normas aplicáveis a todos os navios

Artigo 17.º Direito de passagem inofensiva

Salvo disposição em contrário da presente Convenção, os navios de qualquer

Estado, costeiro ou sem litoral, gozarão do direito de passagem inofensiva pelo mar

territorial.

Artigo 18.º Significado de passagem

1 - «Passagem» significa a navegação pelo mar territorial com o fim de:

a) Atravessar esse mar sem penetrar nas águas interiores nem fazer escala num

ancoradouro ou instalação portuária situada fora das águas interiores;

b) Dirigir-se para as águas interiores ou delas sair ou fazer escala num desses

ancoradouros ou instalações portuárias.

2 - A passagem deverá ser contínua e rápida. No entanto, a passagem compreende

o parar e o fundear, mas apenas na medida em que os mesmos constituam

incidentes comuns de navegação ou sejam impostos por motivos de força maior ou

por dificuldade grave ou tenham por fim prestar auxílio a pessoas, navios ou

aeronaves em perigo ou em dificuldade grave.

Artigo 19.º

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Significado de passagem inofensiva

1 - A passagem é inofensiva desde que não seja prejudicial à paz, à boa ordem ou à

segurança do Estado costeiro. A passagem deve efetuar-se de conformidade com a

presente Convenção e demais normas de direito internacional.

2 - A passagem de um navio estrangeiro será considerada prejudicial à paz, à boa

ordem ou à segurança do Estado costeiro, se esse navio realizar, no mar territorial,

alguma das seguintes atividades:

a) Qualquer ameaça ou uso da força contra a soberania, a integridade territorial ou a

independência política do Estado costeiro ou qualquer outra ação em violação dos

princípios de direito internacional enunciados na Carta das Nações Unidas;

b) Qualquer exercício ou manobra com armas de qualquer tipo;

c) Qualquer ato destinado a obter informações em prejuízo da defesa ou da

segurança do Estado costeiro;

d) Qualquer ato de propaganda destinado a atentar contra a defesa ou a segurança

do Estado costeiro;

e) O lançamento, pouso ou recebimento a bordo de qualquer aeronave;

f) O lançamento, pouso ou recebimento a bordo de qualquer dispositivo militar;

g) O embarque ou desembarque de qualquer produto, moeda ou pessoa com

violação das leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários do

Estado costeiro;

h) Qualquer ato intencional e grave de poluição contrário à presente Convenção;

i) Qualquer atividade de pesca;

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j) A realização de atividades de investigação ou de levantamentos hidrográficos;

k) Qualquer ato destinado a perturbar quaisquer sistemas de comunicação ou

quaisquer outros serviços ou instalações do Estado costeiro;

l) Qualquer outra atividade que não esteja diretamente relacionada com a

passagem.

Artigo 20.º Submarinos e outros veículos submersíveis

No mar territorial, os submarinos e quaisquer outros veículos submersíveis devem

navegar à superfície e arvorar a sua bandeira.

Artigo 21.º Leis e regulamentos do Estado costeiro relativos à passagem inofensiva

1 - O Estado costeiro pode adotar leis e regulamentos, de conformidade com as

disposições da presente Convenção e demais normas de direito internacional,

relativos à passagem inofensiva pelo mar territorial sobre todas ou alguma das

seguintes matérias:

a) Segurança da navegação e regulamentação do tráfego marítimo;

b) Proteção das instalações e dos sistemas de auxílio à navegação e de outros

serviços ou instalações;

c) Proteção de cabos e ductos;

d) Conservação dos recursos vivos do mar;

e) Prevenção de infrações às leis e regulamentos sobre pesca do Estado costeiro;

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f) Preservação do meio ambiente do Estado costeiro e prevenção, redução e

controle da sua poluição;

g) Investigação científica marinha e levantamentos hidrográficos;

h) Prevenção das infrações às leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração

ou sanitários do Estado costeiro.

2 - Tais leis e regulamentos não serão aplicados ao projeto, construção, tripulação

ou equipamentos de navios estrangeiros, a não ser que se destinem a aplicação de

regras ou normas internacionais geralmente aceites.

3 - O Estado costeiro dará a devida publicidade a todas estas leis e regulamentos.

4 - Os navios estrangeiros que exerçam o direito de passagem inofensiva pelo mar

territorial deverão observar todas essas leis e regulamentos, bem como todas as

normas internacionais geralmente aceitos em relação das com a prevenção de

abalroamentos no mar.

Artigo 22.º Rotas marítimas e sistemas de separação de tráfego no mar territorial

1 - O Estado costeiro pode, quando for necessário à segurança da navegação, exigir

que os navios estrangeiros que exerçam o direito de passagem inofensiva pelo seu

mar territorial utilizem as rotas marítimas e os sistemas de separação de tráfego que

esse Estado tenha designado ou prescrito para a regulação da passagem de navios.

2 - Em particular, pode ser exigido que os navios-tanques, os navios de propulsão

nuclear e outros navios que transportem substâncias ou materiais radioativos ou

outros produtos intrinsecamente perigosos ou nocivos utilizem unicamente essas

rotas marítimas.

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3 - Ao designar as rotas marítimas e ao prescrever sistemas de separação de

tráfego, nos termos do presente artigo, o Estado costeiro terá em conta:

a) As recomendações da organização internacional competente;

b) Quaisquer canais que se utilizem habitualmente para a navegação internacional;

c) As características especiais de determinados navios e canais;

d) A densidade de tráfego.

4 - O Estado costeiro indicará claramente tais rotas marítimas e sistemas de

separação de tráfego em cartas marítimas a que dará a devida publicidade.

Artigo 24.º Deveres do Estado costeiro

1 - O Estado costeiro não deve pôr dificuldades à passagem inofensiva de navios

estrangeiros pelo mar territorial, a não ser de conformidade com a presente

Convenção. Em especial, na aplicação da presente Convenção ou de quaisquer leis

e regulamentos adotados de conformidade com a presente Convenção, o Estado

costeiro não deve:

a) Impor aos navios estrangeiros obrigações que tenham na prática o efeito de negar

ou dificultar o direito de passagem inofensiva; ou

b) Fazer discriminação de direito ou de fato contra navios de determinado Estado ou

contra navios que transportem cargas provenientes de determinado Estado ou a ele

destinadas ou por conta de determinado Estado.

2 - O Estado costeiro dará a devida publicidade a qualquer perigo de que tenha

conhecimento e que ameace a navegação no seu mar territorial.

Artigo 25.º

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Direitos de proteção do Estado costeiro

1 - O Estado costeiro pode tomar, no seu mar territorial, as medidas necessárias

para impedir toda a passagem que não seja inofensiva.

2 - No caso de navios que se dirijam a águas interiores ou a escala numa instalação

portuária situada fora das águas interiores, o Estado costeiro tem igualmente o

direito de adotar as medidas necessárias para impedir qualquer violação das

condições a que está sujeita a admissão desse navios nessas águas interiores ou

nessa instalação portuária.

3 - O Estado costeiro pode, sem fazer discriminação de direito ou de fato entre

navios estrangeiros, suspender temporariamente em determinadas áreas do seu

mar territorial o exercício do direito de passagem inofensiva dos navios estrangeiros,

se esta medida for indispensável para proteger a sua segurança, entre outras, para

lhe permitir proceder a exercícios com armas. Tal suspensão só produzirá efeito

depois de ter sido devidamente tornada pública.

Artigo 28.º Jurisdição civil em relação a navios estrangeiros

1 - O Estado costeiro não deve parar nem desviar da sua rota um navio estrangeiro

que passe pelo mar territorial, a fim de exercer a sua jurisdição civil em relação a

uma pessoa que se encontre a bordo.

2 - O Estado costeiro não pode tomar contra esse navio medidas executórias ou

medidas cautelares em matéria civil, a não ser que essas medidas sejam tomadas

por força de obrigações assumidas pelo navio ou de responsabilidades em que o

mesmo haja incorrido durante a navegação ou devido a esta quando da sua

passagem pelas águas do Estado costeiro.

3 - O parágrafo precedente não prejudica o direito do Estado costeiro de tomar, em

relação a um navio estrangeiro que se detenha no mar territorial ou por ele passe

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procedente das águas interiores, medidas executórias ou medidas cautelares em

matéria civil conforme o seu direito interno.

SUBSECÇÃO C

Normas aplicáveis a navios de guerra e a outros navios de Estado utilizados para

fins não comerciais

Artigo 29. Definição de navios de guerra

Para efeitos da presente Convenção, «navio de guerra» significa qualquer navio

pertencente às forças armadas de um Estado, que ostente sinais exteriores próprios

de navios de guerra da sua nacionalidade, sob o comando de um oficial

devidamente designado pelo Estado cujo nome figure na correspondente lista de

oficiais ou seu equivalente e cuja tripulação esteja submetida às regras da disciplina

militar.

Artigo 30.º

Não cumprimento das leis e regulamentos do Estado costeiro pelos navios de guerra

Se um navio de guerra não cumprir as leis e regulamentos do Estado costeiro

relativos à passagem pelo mar territorial e não acatar o pedido que lhe for feito para

o seu cumprimento, o Estado costeiro pode exigir-lhe que saia imediatamente do

mar territorial.

Artigo 31.º

Responsabilidade do Estado de bandeira por danos causados por navio de guerra

ou outro navio de Estado utilizado para fins não comerciais.

Caberá ao Estado de bandeira a responsabilidade internacional por qualquer perda

ou dano causado ao Estado costeiro resultante do não cumprimento por um navio de

guerra ou outro navio de Estado utilizado para fins não comerciais das leis e

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regulamentos do Estado costeiro relativos à passagem pelo mar territorial ou das

disposições da presente Convenção ou demais normas de direito internacional.

Artigo 32.º

Imunidades dos navios de guerra e de outros navios de Estado utilizados para fins

não comerciais

Com as exceções previstas na subsecção A e nos artigos 30.º e 31.º, nenhuma

disposição da presente Convenção afetará as imunidades dos navios de guerra e

outros navios de Estado utilizados para fins não comerciais.

SECÇÃO 4

Zona contígua Artigo 33.º Zona contígua

1 - Numa zona contígua ao seu mar territorial, denominada «zona contígua», o

Estado costeiro pode tomar as medidas de fiscalização necessárias a:

a) Evitar as infrações às leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou

sanitários no seu território ou no seu mar territorial;

b) Reprimir as infrações às leis e regulamentos no seu território ou no seu mar

territorial.

2 - A zona contígua não pode estender-se além de 24 milhas marítimas, contadas a

partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar territorial.

PARTE III

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Estreitos utilizados para a navegação internacional

SECÇÃO 1

Disposições gerais

Artigo 34.º

Regime jurídico das águas que formam os estreitos utilizados para a navegação

internacional

1 - O regime de passagem pelos estreitos utilizados para a navegação internacional

estabelecido na presente parte não afetará, noutros aspectos, o regime jurídico das

águas que formam esses estreitos, nem o exercício, pelos Estados ribeirinhos do

estreito, da sua soberania ou da sua jurisdição sobre essas águas, seu espaço

aéreo sobrejacente, leito e subsolo.

2 - A soberania ou a jurisdição dos Estados ribeirinhos do estreito é exercida de

conformidade com a presente parte e as demais normas de direito internacional.

Artigo 35.º Âmbito de aplicação da presente parte Nenhuma das disposições da presente parte afeta:

a) Qualquer área das águas interiores situadas num estreito, exceto quando o

traçado de uma linha de base reta, de conformidade com o método estabelecido no

artigo 7.º, tiver o efeito de englobar nas águas interiores áreas que anteriormente

não eram consideradas como tais;

b) O regime jurídico das águas situadas além do mar territorial dos Estados

ribeirinhos de um estreito como zonas econômicas exclusivas ou do alto mar; ou

c) O regime jurídico dos estreitos em que a passagem esteja regulamentada, total ou

parcialmente, por convenções internacionais de longa data em vigor que a eles se

refiram especificamente.

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Artigo 36.º

Rotas de alto mar ou rotas que atravessem uma zona econômica exclusiva através

de estreitos utilizados para a navegação internacional.

A presente parte não se aplica a um estreito utilizado para a navegação

internacional se por esse estreito passar uma rota de alto mar ou uma rota que

atravesse uma zona econômica exclusiva, igualmente convenientes pelas suas

características hidrográficas e de navegação; em tais rotas aplicam-se as outras

partes pertinentes da Convenção, incluindo as disposições relativas à liberdade de

navegação e sobrevôo.

SECÇÃO 2

Passagem em trânsito Artigo 37.º Âmbito de aplicação da presente secção

A presente secção aplica-se a estreitos utilizados para a navegação internacional

entre uma parte do alto mar ou uma zona econômica exclusiva e uma outra parte do

alto mar ou uma zona econômica exclusiva.

Artigo 38.º Direito de passagem em trânsito

1 - Nos estreitos a que se refere o artigo 37.º, todos os navios e aeronaves gozam

do direito de passagem em trânsito que não será impedido a não ser que o estreito

seja formado por uma ilha de um Estado ribeirinho desse estreito e o seu território

continental e do outro lado da ilha exista uma rota de alto mar ou uma rota que

passe por uma zona econômica exclusiva, igualmente convenientes pelas suas

características hidrográficas e de navegação.

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2 - «Passagem em trânsito» significa o exercício, de conformidade com a presente

parte, da liberdade de navegação e sobrevôo exclusivamente para fins de trânsito

contínuo e rápido pelo estreito entre uma parte do alto mar ou de uma zona

econômica exclusiva e uma outra parte do alto mar ou uma zona econômica

exclusiva. Contudo, a exigência de trânsito contínuo e rápido não impede a

passagem pelo estreito para entrar no território do Estado ribeirinho ou dele sair ou a

ele regressar sujeito às condições que regem a entrada no território desse Estado.

3 - Qualquer atividade que não constitua um exercício do direito de passagem em

trânsito por um estreito fica sujeita às demais disposições aplicáveis da presente

Convenção.

Artigo 39.º Deveres dos navios e aeronaves durante a passagem em trânsito

1 - Ao exercer o direito de passagem em trânsito, os navios e aeronaves devem:

a) Atravessar ou sobrevoar o estreito sem demora;

b) Abster-se de qualquer ameaça ou uso de força contra a soberania, a

integridade territorial ou a independência política dos Estados ribeirinhos do

estreito ou de qualquer outra ação contrária aos princípios de direito

internacional enunciados na Carta das Nações Unidas;

c) Abster-se de qualquer atividade que não esteja relacionada com as

modalidades normais de trânsito contínuo e rápido, salvo em caso de força

maior ou de dificuldade grave;

d) Cumprir as demais disposições pertinentes da presente parte.

2 - Os navios de passagem em trânsito devem:

a) Cumprir os regulamentos, procedimentos e práticas internacionais de

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segurança no mar geralmente aceites, inclusive as Regras Internacionais para a

Prevenção de Abalroamentos no Mar;

b) Cumprir os regulamentos, procedimentos e práticas internacionais geralmente

aceites para a prevenção, a redução e a controlo da poluição proveniente de

navios.

3 - As aeronaves de passagem em trânsito devem:

a) Observar as Normas de Trânsito Aéreo estabelecidas pela Organização da

Aviação Civil Internacional aplicáveis às aeronaves civis; as aeronaves do Estado

cumprirão normalmente essas medidas de segurança e agirão sempre tendo em

conta a segurança da navegação;

b) Manter sempre sintonizada a radiofrequência atribuída pela autoridade

competente de controlo de tráfego áereo designada internacionalmente ou a

correspondente radiofrequência internacional de socorro.

Artigo 40.º Atividades de investigação e levantamentos hidrográficos

Durante a passagem em trânsito pelos estreitos, os navios estrangeiros,

incluindo navios de investigação científica marinha e navios hidrográficos, não

podem efetuar quaisquer atividades de investigação ou de levantamentos

hidrográficos sem autorização prévia dos Estados ribeirinhos dos estreitos.

Artigo 41.º

Rotas marítimas e sistemas de separação de tráfego em estreitos utilizados para

a navegação internacional

1 - Os Estados ribeirinhos de estreitos podem, de conformidade com a

disposição da presente parte, designar rotas marítimas e estabelecer sistemas

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de separação de tráfego para a navegação pelos estreitos, sempre que a

segurança da passagem dos navios o exija.

2 - Tais Estados podem, quando as circunstâncias o exijam e após terem dado a

devida publicidade a esta medida, substituir por outras rotas marítimas ou sistemas

de separação de tráfego quaisquer rotas marítimas ou sistemas de separação de

tráfego por eles anteriormente designados ou prescritos.

3 - Tais rotas marítimas e sistemas de separação de tráfego devem ajustar-se à

regulamentação internacional geralmente aceite.

4 - Antes de designar ou substituir rotas marítimas ou de estabelecer ou substituir

sistemas de separação de tráfego, os Estados ribeirinhos de estreitos devem

submeter as suas propostas à organização internacional competente para sua

adoção. A organização só pode adotar as rotas marítimas e os sistemas de

separação de tráfego que tenham sido acordados com os Estados ribeirinhos dos

estreitos, após o que estes Estados poderão designar, estabelecer ou substituir as

rotas marítimas ou os sistemas de separação de tráfego.

5 - No caso de um estreito, em que se proponham a criação de rotas marítimas ou

sistemas de separação de tráfego que atravessem as águas de dois ou mais

Estados ribeirinhos do estreito, os Estados interessados cooperarão na formulação

de propostas em consulta com a organização internacional competente.

6 - Os Estados ribeirinhos de estreitos indicarão claramente todas as rotas marítimas

e sistemas de separação de tráfego por eles designados ou prescritos em cartas de

navegação, às quais darão a devida publicidade.

7 - Os navios de passagem em trânsito respeitarão as rotas marítimas e sistemas de

separação de tráfego aplicáveis, estabelecidos de conformidade com as disposições

do presente artigo.

Artigo 42º

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Leis e regulamentos dos Estados ribeirinhos de estreitos relativos à passagem em

trânsito

1 - Nos termos das disposições da presente secção, os Estados ribeirinhos de

estreitos podem adotar leis e regulamentos relativos à passagem em trânsito pelos

estreitos no que respeita a todos ou a alguns dos seguintes pontos:

a) A segurança da navegação e a regulamentação do tráfego marítimo, de

conformidade com as disposições do artigo 41.º;

b) A prevenção, redução e controlo da poluição em cumprimento das

regulamentações internacionais aplicáveis relativas a descarga no estreito de

hidrocarbonetos, de resíduos de petróleo e de outras substâncias nocivas;

c) No caso de embarcações de pesca, a proibição de pesca, incluindo o

acondicionamento dos aparelhos de pesca;

d) O embarque ou desembarque de produto, moeda ou pessoa em contravenção

das leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários dos Estados

ribeirinhos de estreitos.

2 - Tais leis e regulamentos não farão discriminação de direito ou de fato entre os

navios estrangeiros, nem a sua aplicação terá, na prática, o efeito de negar, dificultar

ou impedir o direito de passagem em trânsito tal como definido na presente secção.

3 - Os Estados ribeirinhos de estreitos darão a devida publicidade a todas essas leis

e regulamentos.

4 - Os navios estrangeiros que exerçam o direito de passagem em trânsito cumprirão

essas leis e regulamentos.

5 - O Estado de bandeira de um navio ou o Estado de registro de uma aeronave que

goze de imunidade soberana e atue de forma contrária a essas leis e regulamentos

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ou a outras disposições da presente parte incorrerá em responsabilidade

internacional por qualquer perda ou dano causado aos Estados ribeirinhos de

estreitos.

Artigo 43.º

Instalações de segurança e de auxílio à navegação e outros dispositivos.

Prevenção, redução e controlo da poluição

Os Estados usuários e os Estados ribeirinhos de um estreito deveriam cooperar

mediante acordos para:

a) O estabelecimento e manutenção, no estreito, das instalações de segurança e

auxílio necessárias à navegação ou de outros dispositivos destinados a facilitar a

navegação internacional; e

b) A prevenção, redução e controlo da poluição proveniente de navios.

Artigo 44.º Deveres dos Estados ribeirinhos de estreitos

Os Estados ribeirinhos de um estreito não impedirão a passagem em trânsito e

darão a devida publicidade a qualquer perigo de que tenham conhecimento e que

ameace a navegação no estreito ou o sobrevôo do mesmo. Não haverá nenhuma

suspensão da passagem em trânsito.

SECÇÃO 3

Passagem inofensiva

Artigo 45.º Passagem inofensiva

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1 - O regime de passagem inofensiva, de conformidade com a secção 3 da parte II,

aplicar-se-á a estreitos utilizados para a navegação internacional:

a) Excluídos da aplicação do regime de passagem em trânsito, em virtude do n.º 1

do artigo 38.º; ou

b) Situados entre uma parte de alto mar ou uma zona econômica exclusiva e o mar

territorial de um Estado estrangeiro.

2 - Não haverá nenhuma suspensão da passagem inofensiva por tais estreitos.

PARTE IV

Estados arquipélagos

Artigo 46.º Expressões utilizadas Para efeitos da presente Convenção:

a) «Estado arquipélago» significa um Estado constituído totalmente por um ou vários

arquipélagos, podendo incluir outras ilhas;

b) «Arquipélago» significa um grupo de ilhas, incluindo partes de ilhas, as águas

circunjacentes e outros elementos naturais, que estejam tão estreitamente

relacionados entre si que essas ilhas, águas e outros elementos naturais formem

intrinsecamente uma entidade geográfica, econômica e política ou que

historicamente tenham sido considerados como tal.

Artigo 47.º Linhas de base arquipelágicas

1 - O Estado arquipélago pode traçar linhas de base arquipelágicas retas que unam

os pontos extremos das ilhas mais exteriores e dos recifes emergentes do

arquipélago, com a condição de que dentro dessas linhas de base estejam

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compreendidas as principais ilhas e uma zona em que a razão entre a superfície

marítima e a superfície terrestre, incluindo os atóis, se situe entre um para um e

nove para um.

2 - O comprimento destas linhas de base não deve exceder 100 milhas marítimas,

admitindo-se, no entanto, que até 3% do número total das linhas de base que

encerram qualquer arquipélago possam exceder esse comprimento, até um máximo

de 125 milhas marítimas.

3 - O traçado de tais linhas de base não se deve desviar consideravelmente da

configuração geral do arquipélago.

4 - Tais linhas de base não serão traçadas em direção aos baixios a descoberto,

nem a partir deles, a não ser que sobre os mesmos se tenham construído faróis ou

instalações análogas, que estejam permanentemente acima do nível do mar ou

quando um baixio a descoberto esteja total ou parcialmente situado a uma distância

da ilha mais próxima que não exceda a largura do mar territorial.

5 - O sistema de tais linhas de base não pode ser aplicado por um Estado

arquipélago de modo a separar do alto mar ou de uma zona econômica exclusiva o

mar territorial de outro Estado.

6 - Se uma parte das águas arquipelágicas de um Estado arquipélago estiver situada

entre duas partes de um Estado vizinho imediatamente adjacente, os direitos

existentes e quaisquer outros interesses legítimos que este Estado tenha exercido

tradicionalmente em tais águas e todos os direitos estipulados em acordos

concluídos entre os dois Estados continuarão em vigor e serão respeitados.

7 - Para fins de cálculo da razão entre a superfície marítima e a superfície terrestre,

a que se refere o n.º 1, as superfícies podem incluir águas situadas no interior das

cadeias de recifes de ilhas e atóis, incluindo a parte de uma plataforma oceânica

com face lateral abrupta que se encontre encerrada, ou quase, por uma cadeia de

ilhas calcárias e de recifes emergentes situados no perímetro da plataforma.

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8 - As linhas de base traçadas de conformidade com o presente artigo devem ser

apresentadas em cartas de escala ou escalas adequadas para a determinação da

sua posição. Tais cartas podem ser substituídas por listas de coordenadas

geográficas de pontos em que conste especificamente a origem geodésica.

9 - O Estado arquipélago deve dar a devida publicidade a tais cartas ou listas de

coordenadas geográficas e deve depositar um exemplar de cada carta ou lista junto

do Secretário-Geral das Nações Unidas.

Artigo 48.º

Medição da largura do mar territorial, da zona contígua, da zona econômica

exclusiva e da plataforma continental

A largura do mar territorial, da zona contígua, da zona econômica exclusiva e da

plataforma continental é medida a partir das linhas de base arquipelágicas traçadas

de conformidade com o artigo 47.º.

Artigo 49.º

Regime jurídico das águas arquipelágicas, do espaço aéreo sobre águas

arquipelágicas e do leito e subsolo dessas águas arquipelágicas

1 - A soberania de um Estado arquipélago estende-se às águas encerradas pelas

linhas de base arquipelágicas, traçadas de conformidade com o artigo 47.º,

denominadas «águas arquipelágicas», independentemente da sua profundidade ou

da sua distância da costa.

2 - Esta soberania estende-se ao espaço aéreo situado sobre as águas

arquipelágicas e ao seu leito e subsolo, bem como aos recursos neles existentes.

3 - Esta soberania é exercida de conformidade com as disposições da presente

parte.

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4 - O regime de passagem pelas rotas marítimas arquipelágicas, estabelecido na

presente parte, não afeta em outros aspectos o regime jurídico das águas

arquipelágicas, inclusive o das rotas marítimas, nem o exercício pelo Estado

arquipelágico da sua soberania sobre essas águas, seu espaço aéreo sobrejacente

e seu leito e subsolo, bem como sobre os recursos neles existentes.

Artigo 50.º Delimitação das águas interiores

Dentro das suas águas arquipelágicas, o Estado arquipélago pode traçar linhas de

fecho para a delimitação das águas interiores, de conformidade com os artigos 9.º,

10.º e 11.º

Artigo 51.º Acordos existentes, direitos de pesca tradicionais e cabos submarinos existentes

1 - Sem prejuízo das disposições do artigo 49.º, os Estados arquipélagos respeitarão

os acordos existentes com outros Estados e reconhecerão os direitos de pesca

tradicionais e outras atividades legítimas dos Estados vizinhos imediatamente

adjacentes em certas áreas situadas nas águas arquipelágicas. As modalidades e

condições para o exercício de tais direitos e atividades, incluindo a natureza, o

alcance e as áreas em que se aplicam, serão, a pedido de qualquer dos Estados

interessados, reguladas por acordos bilaterais entre eles. Tais direitos não poderão

ser transferidos a terceiros Estados ou a seus nacionais, nem por eles

compartilhados.

2 - Os Estados arquipélagos respeitarão os cabos submarinos existentes que

tenham sido colocados por outros Estados e que passem pelas suas águas sem

tocar terra. Os Estados arquipélagos permitirão a conservação e a substituição de

tais cabos, uma vez recebida a devida notificação da sua localização e da intenção

de os reparar ou substituir.

Artigo 52.º

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Direito de passagem inofensiva

1 - Nos termos do artigo 53.º e sem prejuízo do disposto no artigo 50.º, os navios de

todos os Estados gozam do direito de passagem inofensiva pelas águas

arquipelágicas, de conformidade com a secção 3 da parte II.

2 - O Estado arquipélago pode, sem discriminação de direito ou de fato entre navios

estrangeiros, suspender temporariamente, e em determinadas áreas das suas águas

arquipelágicas, a passagem inofensiva de navios estrangeiros, se tal suspensão for

indispensável para a proteção da sua segurança. A suspensão só produzirá efeito

depois de ter sido devidamente publicada.

Os artigos 39.º, 40.º, 42.º e 44.º aplicam-se, mutatis mutandis, à passagem pelas

rotas marítimas arquipelágicas.

PARTE V

Zona econômica exclusiva

Artigo 55.º Regime jurídico específico da zona econômica exclusiva

A zona econômica exclusiva é uma zona situada além do mar territorial e a este

adjacente, sujeita ao regime jurídico específico estabelecido na presente parte,

segundo o qual os direitos e a jurisdição do Estado costeiro e os direitos e

liberdades dos demais Estados são regidos pelas disposições pertinentes da

presente Convenção.

Artigo 56.º

Direitos, jurisdição e deveres do Estado costeiro na zona econômica exclusiva

1 - Na zona econômica exclusiva, o Estado costeiro tem:

a) Direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e

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gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos, das águas sobrejacentes ao leito

do mar, do leito do mar e seu subsolo e no que se refere a outras atividades com

vista à exploração e aproveitamento da zona para fins econômicos, como a

produção de energia a partir da água, das correntes e dos ventos;

b) Jurisdição, de conformidade com as disposições pertinentes da presente

Convenção, no que se refere a:

i) Colocação e utilização de ilhas artificiais, instalações e estruturas;

ii) Investigação científica marinha;

iii) Proteção e preservação do meio marinho;

c) Outros direitos e deveres previstos na presente Convenção

.

2 - No exercício dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres na zona

econômica exclusiva nos termos da presente Convenção, o Estado costeiro terá em

devida conta os direitos e deveres dos outros Estados e agirá de forma compatível

com as disposições da presente Convenção.

3 - Os direitos enunciados no presente artigo referentes ao leito do mar e ao seu

subsolo devem ser exercidos de conformidade com a parte VI da presente

Convenção.

Artigo 57.º Largura da zona econômica exclusiva

A zona econômica exclusiva não se estenderá além de 200 milhas marítimas das

linhas de base a partir das quais se mede a largura do mar territorial.

Artigo 58.º Direitos e deveres de outros Estados na zona econômica exclusiva

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1 - Na zona econômica exclusiva, todos os Estados, quer costeiros quer em litoral,

gozam, nos termos das disposições da presente Convenção, das liberdades de

navegação e sobrevôo e de colocação de cabos e ductos submarinos, a que se

refere o artigo 87.º, bem como de outros usos do mar internacionalmente lícitos,

relacionados com as referidas liberdades, tais como os ligados à operação de

navios, aeronaves, cabos e ductos submarinos e compatíveis com as demais

disposições da presente Convenção.

2 - Os artigos 88.º a 115.º e demais normas pertinentes de direito internacional

aplicam-se à zona econômica exclusiva na medida em que não sejam incompatíveis

com a presente parte.

3 - No exercício dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres na zona

econômica exclusiva, nos termos da presente Convenção, os Estados terão em

devida conta os direitos e deveres do Estado costeiro e cumprirão as leis e

regulamentos por ele adotados de conformidade com as disposições da presente

Convenção e demais normas de direito internacional, na medida em que não sejam

incompatíveis com a presente parte.

Artigo 59.º

Base para a solução de conflitos relativos à atribuição de direitos e jurisdição na

zona econômica exclusiva

Nos casos em que a presente Convenção não atribua direitos ou jurisdição ao

Estado costeiro ou a outros Estados na zona econômica exclusiva e surja um

conflito entre os interesses do Estado costeiro e os de qualquer outro Estado ou

Estados, o conflito deveria ser solucionado numa base de equidade e à luz de todas

as circunstâncias pertinentes, tendo em conta a importância respectiva dos

interesses em causa para as partes e para o conjunto da comunidade internacional.

Artigo 60.º Ilhas artificiais, instalações e estruturas na zona econômica exclusiva

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1 - Na zona econômica exclusiva, o Estado costeiro tem o direito exclusivo de

construir e de autorizar e regulamentar a construção, operação e utilização de:

a) Ilhas artificiais;

b) Instalações e estruturas para os fins previstos no artigo 56.º e para outras

finalidades econômicas;

c) Instalações e estruturas que possam interferir com o exercício dos direitos do

Estado costeiro na zona.

2 - O Estado costeiro tem jurisdição exclusiva sobre essas ilhas artificiais,

instalações e estruturas, incluindo jurisdição em matéria de leis e regulamentos

aduaneiros, fiscais, de imigração, sanitários e de segurança.

3 - A construção dessas ilhas artificiais, instalações ou estruturas deve ser

devidamente notificada e devem ser mantidos meios permanentes para assinalar a

sua presença. As instalações ou estruturas abandonadas ou inutilizadas devem ser

retiradas, a fim de garantir a segurança da navegação, tendo em conta as normas

internacionais geralmente aceites que tenham sido estabelecidas sobre o assunto

pela organização internacional competente. Para efeitos da remoção, devem ter-se

em conta a pesca, a proteção do meio marinho e os direitos e obrigações de outros

Estados. Deve dar-se a devida publicidade da localização, dimensão e profundidade

das instalações ou estruturas que não tenham sido completamente removidas.

4 - O Estado costeiro pode, se necessário, criar em volta dessas ilhas artificiais,

instalações e estruturas zonas de segurança de largura razoável, nas quais pode

tomar medidas adequadas para garantir tanto a segurança da navegação como a

das ilhas artificiais, instalações e estruturas.

5 - O Estado costeiro determinará a largura das zonas de segurança, tendo em

conta as normas internacionais aplicáveis. Essas zonas de segurança devem ser

concebidas de modo a responderem razoavelmente à natureza e às funções das

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ilhas artificiais, instalações ou estruturas, e não excederão uma distância de 500 m

em volta das ilhas artificiais, instalações ou estruturas, distância essa medida a partir

de cada ponto do seu bordo exterior, a menos que o autorizem as normas

internacionais geralmente aceites ou o recomende a organização internacional

competente. A extensão das zonas de segurança será devidamente notificada.

6 - Todos os navios devem respeitar essas zonas de segurança e cumprir as normas

internacionais geralmente aceites relativas à navegação nas proximidades das ilhas

artificiais, instalações, estruturas e zonas de segurança.

7 - Não podem ser estabelecidas ilhas artificiais, instalações e estruturas nem zonas

de segurança à sua volta, quando interfiram na utilização das rotas marítimas

reconhecidas essenciais para a navegação internacional.

8 - As ilhas artificiais, instalações e estruturas não têm o estatuto jurídico de ilhas.

Não têm mar territorial próprio e a sua presença não afeta a delimitação do mar

territorial, da zona econômica exclusiva ou da plataforma continental.

Artigo 61.º Conservação dos recursos vivos

1 - O Estado costeiro fixará as capturas permissíveis dos recursos vivos na sua zona

econômica exclusiva.

2 - O Estado costeiro, tendo em conta os melhores dados científicos de que

disponha, assegurará, por meio de medidas apropriadas de conservação e gestão,

que a preservação dos recursos vivos da sua zona econômica exclusiva não seja

ameaçada por um excesso de captura. O Estado costeiro e as organizações

competentes sub-regionais, regionais ou mundiais cooperarão, conforme o caso,

para tal fim.

3 - Tais medidas devem ter também a finalidade de preservar ou estabelecer as

populações das espécies capturadas a níveis que possam produzir o máximo

rendimento constante, determinado a partir de fatores ecológicos e econômicos

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pertinentes, incluindo as necessidades econômicas das comunidades costeiras que

vivem da pesca e as necessidades especiais dos Estados em desenvolvimento, e

tendo em conta os métodos de pesca, a interdependência das populações e

quaisquer outras normas mínimas internacionais geralmente recomendadas, sejam

elas sub-regionais, regionais ou mundiais.

4 - Ao tomar tais medidas, o Estado costeiro deve ter em conta os seus efeitos sobre

espécies associadas às espécies capturadas, ou delas dependentes, a fim de

preservar ou restabelecer as populações de tais espécies associadas ou

dependentes acima de níveis em que a sua reprodução possa ficar seriamente

ameaçada.

5 - Periodicamente devem ser comunicadas ou trocadas informações científicas

disponíveis, estatísticas de captura e de esforço de pesca e outros dados

pertinentes para a conservação das populações de peixes, por intermédio das

organizações internacionais competentes, sejam elas sub-regionais, regionais ou

mundiais, quando apropriado, e com a participação de todos os Estados

interessados, incluindo aqueles cujos nacionais estejam autorizados a pescar na

zona econômica exclusiva.

Artigo 62.º Utilização dos recursos vivos

1 - O Estado costeiro deve ter por objetivo promover a utilização ótima dos recursos

vivos na zona econômica exclusiva, sem prejuízo do artigo 61.º

2 - O Estado costeiro deve determinar a sua capacidade de capturar os recursos

vivos da zona econômica exclusiva. Quando o Estado costeiro não tiver capacidade

para efetuar a totalidade da captura permissível, deve dar a outros Estados acesso

ao excedente desta captura, mediante acordos ou outros ajustes e de conformidade

com as modalidades, condições e leis e regulamentos mencionados no n.º 4, tendo

particularmente em conta as disposições dos artigos 69.º e 70.º, principalmente no

que se refere aos Estados em desenvolvimento neles mencionados.

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3 - Ao dar a outros Estados acesso à sua zona exclusiva nos termos do presente

artigo, o Estado costeiro deve ter em conta todos os fatores pertinentes, incluindo,

inter alia, a importância dos recursos vivos da zona para a economia do Estado

costeiro correspondente e para os seus outros interesses nacionais, as disposições

dos artigos 69.º e 70.º, as necessidades dos países em desenvolvimento da sub-

região ou região no que se refere à captura de parte dos excedentes e a

necessidade de reduzir ao mínimo a perturbação da economia dos Estados cujos

nacionais venham habitualmente pescando na zona ou venham fazendo esforços

substanciais na investigação e identificação de populações.

4 - Os nacionais de outros Estados que pesquem na zona econômica exclusiva

devem cumprir as medidas de conservação e as outras modalidades e condições

estabelecidas nas leis e regulamentos do Estado costeiro. Tais leis e regulamentos

devem estar de conformidade com a presente Convenção e podem referir-se, inter

alia, às seguintes questões:

a) Concessão de licenças a pescadores, embarcações e equipamento de pesca,

incluindo o pagamento de taxas e outros encargos que, no caso dos Estados

costeiros em desenvolvimento, podem consistir numa compensação adequada em

matéria de financiamento, equipamento e tecnologia da indústria da pesca;

b) Determinação das espécies que podem ser capturadas e fixação das quotas de

captura, que podem referir-se, seja a determinadas populações ou a grupos de

populações, seja à captura por embarcação durante um período de tempo, seja à

captura por nacionais de um Estado durante um período determinado;

c) Regulamentação das épocas e zonas de pesca, do tipo, tamanho e número de

aparelhos, bem como do tipo, tamanho e número de embarcações de pesca que

podem ser utilizados;

d) Fixação da idade e do tamanho dos peixes e de outras espécies que podem ser

capturados;

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e) Indicação das informações que devem ser fornecidas pelas embarcações de

pesca, incluindo estatísticas das capturas e do esforço de pesca e informações

sobre a posição das embarcações;

f) Execução, sob a autorização e controlo do Estado costeiro, de determinados

programas de investigação no âmbito das pescas e regulamentação da realização

de tal investigação, incluindo a amostragem de capturas, destino das amostras e

comunicação dos dados científicos conexos;

g) Embarque, pelo Estado costeiro, de observadores ou de estagiários a bordo de

tais embarcações;

h) Descarga por tais embarcações da totalidade das capturas ou de parte delas nos

portos do Estado costeiro;

i) Termos e condições relativos às empresas conjuntas ou a outros ajustes de

cooperação;

j) Requisitos em matéria de formação de pessoal e de transferência de tecnologia de

pesca, incluindo o reforço da capacidade do Estado costeiro para empreender

investigação de pesca;

k) Medidas de execução.

5 - Os Estados costeiros devem dar o devido conhecimento das leis e regulamentos

em matéria de conservação e gestão.

Artigo 64.º Espécies altamente migratórias

1 - O Estado costeiro e os demais Estados cujos nacionais pesquem, na região, as

espécies altamente migratórias enumeradas no anexo I devem cooperar, quer

diretamente, quer por intermédio das organizações internacionais apropriadas, com

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vista a assegurar a conservação e promover o objetivo da utilização ótima de tais

espécies em toda a região, tanto dentro como fora da zona econômica exclusiva.

Nas regiões em que não exista organização internacional apropriada, o Estado

costeiro e os demais Estados cujos nacionais capturem essas espécies na região

devem cooperar para criar uma organização deste tipo e devem participar nos seus

trabalhos.

2 - As disposições do n.º 1 aplicam-se conjuntamente com as demais disposições da

presente parte.