as diferenças dialetais e socioeconômicas existentes na ... · um questionário e uma sequência...
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Diferenças Dialetais e Socioeconômicas ... – Barbosa & Oliveira
Revista Diálogos – mar./abr.-2017 – n.° 17 335
As Diferenças Dialetais e Socioeconômicas Existentes na Sala de
Aula: Um Olhar Acerca de uma Turma do Sétimo Ano d.o.i. 10.13115/2236-1499.v1n17p335
Raile Cabral Barbosa1 - UPE
Fernando Augusto de Lima Oliveira2 - UPE
Resumo
Este trabalho está inserido na área da Sociolinguística Educacional e
tem como principal objetivo refletir sobre a grande diversidade
linguística que está presente nas salas de aula. A partir da aplicação de
um questionário e uma sequência didática no ensino fundamental, mais
especificamente no 7° ano, conseguimos mapear aspectos sócio
econômicos de uma classe que tem interferências dialetais de
estudantes oriundos do estado de Pernambuco e Alagoas. Através
desses dados e de observação do uso linguístico dessa turma
entendemos alguns aspectos referentes a linguagem utilizada refletindo
sobre a importância do agir do professor de língua materna pensado
através do reconhecimento das diferenças dialetais dos estudantes.
Palavras-chave: Linguagem. Variação. Uso Linguístico. Ensino.
Abstract
This work is inserted in the area of Educational Sociolinguistics and its
main objective is to reflect on the great linguistic diversity that is
present in classrooms. From the application of a questionnaire and a
didactic sequence in elementary school, specifically in the 7th year, we
were able to map socioeconomic aspects of a class that has dialectal
1 Estudante do Curso de Licenciatura em Letras-UPE Campus Garanhuns. E-mail:
[email protected] 2 Trabalho orientado pelo professor da Universidade de Pernambuco - Campus
Garanhuns, Fernando Augusto de Lima Oliveira. Doutor em Linguística (UFAL) -
perspectiva da Teoria da Variação Linguística.
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interferences of students from the state of Pernambuco and Alagoas.
Through these data and observation of the linguistic use of this class
we understand some aspects referring to the language used reflecting
on the importance of the action of the mother tongue teacher thought
through the recognition of the dialectal differences of the students.
Keywords: Language. Variation. Linguistic Use. Teaching.
1. Língua: determinante de inclusão ou exclusão na escola?
Quando falamos em língua devemos observar as contribuições da
Linguística enquanto ciência que busca o estudo científico da língua e
linguagem humana. Percebemos então, que essa ciência estuda a língua
sob a perspectiva de diversas vertentes o que descaracteriza a difusão
de uma única definição para o termo.
A língua pode então, conforme Martelotta, Cunha e Costa (2011)
ser analisada a partir do aspecto estrutural, gerativo ou funcional. Pode
relacionar-se ainda, com outras áreas do conhecimento como: a
sociologia, que se interessa pela linguagem enquanto interação social;
com a filosofia, que se preocupa com a relação entre a linguagem e a
realidade; ou ainda com a psicologia, que procura entender o
funcionamento da mente humana no que se se refere à habilidade inata
dessa linguagem que é atribuída à capacidade do homem.
Diante disso, a Sociolinguística também apresenta uma definição
específica para o termo língua, uma vez que, considera os aspectos
sociais como significância para o estudo linguístico. Desta forma, “a
língua é uma instituição social, e portanto, não pode ser estudada como
uma estrutura autônoma, independente do contexto situacional, da
cultura e da história das pessoas que a utilizam como meio de
comunicação. ” (Cezario e Votre 2011, pág. 141)
É nesse sentido que se torna imprescindível à análise do contexto
social de todos os falantes envolvidos em uma pesquisa de caráter
científico. Por isso, começaremos por avaliar quais são as
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consequências de um ensino que pode acolher ou rejeitar determinados
usos linguísticos, próprios da comunidade de fala do aluno na escola.
Ao observamos a língua a partir de seu caráter social, não podemos
deixar de perceber a importância e o valor das variantes linguísticas que
representam a pluralidade e diversidade de toda língua observada e
estudada. No entanto, não há como imaginar um trabalho sobre
variação e preconceito linguístico sem antes fazer referência à inclusão
de políticas pedagógicas que desprivatizem a língua padrão e
democratizem o ensino de língua materna.
A instituição escolar tem a capacidade efetiva de trabalhar a
língua/linguagem sob o aspecto científico e democrático que considere,
sobretudo, a necessidade do ensino da língua padrão centrado e
orientado através do respeito à diversidade linguística e cultural.
Sabemos que o primeiro contato aluno-escola é essencialmente
oral, o que promove uma série de julgamentos atribuídos à pessoa que
fala e aos seus interlocutores incluídos no momento da interação verbal.
A acolhida do alunado no ambiente escolar pode, portanto,
tornar-se inclusiva ou excludente, se considerarmos a língua como fator
determinante. A escola aponta suas normas internas, apresenta os
professores e explica seu funcionamento através de uma linguagem
padrão que pode coagir o aluno a não comunicar-se com sua variante,
por medo de ser ridicularizado e exposto publicamente. Esse “medo”
pode então provocar o silenciamento deste aluno.
Diante disso, encontramos um agravante que ocorre quando a
coordenação pedagógica não tem orientação para trabalhar com a
variante (popular) do aluno, o que acaba por contribuir mais ainda com
a disseminação de discriminações no contexto escolar. Diante dessa
situação, na maioria das vezes, o trabalho com linguagem fica
exclusivamente sob responsabilidade do professor de português que
enfrenta uma série de dificuldades, como por exemplo: a falta de apoio
da coordenação, carência de material didático e entre outros.
Na verdade, é extremamente importante a observância do
sentimento de acolhida e respeito promovido pela escola com relação
aos estudantes, para que estes comecem a agir como protagonistas de
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seus saberes. Nesse sentido, os discentes precisam perceber que suas
origens, cultura e linguagem são respeitadas para que se sintam parte
integrante do processo educacional. Na verdade, o que tende a
acontecer, como aponta Magda Soares (1999, p.15) é que:
Os padrões culturais das classes dominadas são
considerados como uma “subcultura” avaliada em
comparação com a cultura dominante, isto é, com
os padrões idealizados de cultura, que constituem
a cultura do grupo social e economicamente
privilegiados. É assim que a diferença se
transforma em deficiência, em privação, em
carência. Trata-se, na verdade, de uma atitude
etnocêntrica, para a qual ser diferente das classes
dominantes é ser inferior.
Percebemos então que a linguagem é considerada a partir da
atribuição de um valor social que privilegia determinada cultura em
detrimento de outra, fazendo com que a linguagem passe a ser vista
como fator determinante de inclusão ou exclusão dentro de um contexto
onde a variante do aluno pode ser respeitada ou estigmatizada,
possibilitando seu desenvolvimento ou coibindo suas ações.
Por isso, é importante que a escola reconheça o pluralismo
linguístico da língua portuguesa, procurando meios de tratar a
diversidade como riqueza linguística, cultural e social e não como
diferença, desigualdade ou privação. Nesse sentido, a escola também
acaba contribuindo para a erradicação de diferenças entre as classes
sociais e entre os diferentes grupos étnicos.
A língua dos diferentes grupos sociais ou das diferentes
comunidades de fala, também deve ser vista, como representação da
cultura, dos costumes e ideologias dessa comunidade linguística.
Discriminar a língua das comunidades de fala é descaracterizar os
parâmetros sociais desses grupos. Por isso, O PCN de Pluralidade
Cultural (1997, p.46) coloca que o trabalho com a diversidade
linguística é muito rico, uma vez que:
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Tratando-se especificamente da temática das
línguas, abrem-se muitas possibilidades de
transversalização com Língua Portuguesa, por
exemplo, pela valorização de diferentes formas de
linguagem oral e escrita, pelo respeito às
manifestações regionais, pela possibilidade de
contato e integração com a diversidade de línguas
e linguagens presentes na vida de crianças e
adolescentes do Brasil.
Não podemos permitir jamais que as diferentes linguagens sejam
discriminadas pela escola contemporânea. Também não podemos
impedir que os alunos possam se expressar por meio de suas próprias
articulações linguísticas. A escola deve, portanto, ensinar a linguagem
padrão, como forma de possibilitar o pleno desenvolvimento linguístico
do alunado frente aos diferentes contextos sócio comunicativos,
respeitando também a linguagem já apresentada pelo aluno, enquanto
representação de seu contexto cultural.
2. As diferenças sociais no ensino público brasileiro: quais
impasses encontramos?
É importante salientar a observância de uma realidade plural no
ensino público brasileiro. Ou seja, precisamos reconhecer uma vasta
gama de diferenças econômicas e sociais que permeiam o ensino,
compreendendo a partir disso o quanto a língua está envolta em
questões socioeconômicas que regulamentam o desempenho
linguístico de todas as pessoas que estão envolvidas no âmbito escolar.
Para entendermos como as questões socioeconômicas agem no
desempenho de nossos estudantes, podemos analisar as seguintes
realidades colocadas por Cagliari (2009, p. 19):
Uma criança que viu desde cedo sua casa cheia de livros,
jornais, revistas, que ouviu histórias, que viu as pessoas
gastando muito tempo lendo e escrevendo, que desde cedo
brincou om lápis, papel, borracha e tinta, quando entra na
escola, encontra uma continuação do seu modo de vida e
acha muito natural e lógico o que nela se faz. Uma criança
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que nunca viu um livro em sua casa, nunca viu seus pais
lendo jornal ou revista, que raramente viu alguém
escrevendo, que jamais teve lápis e papel para brincar, ao
entrar para a escola sabe que vai encontrar essas coisas lá,
mas sua atitude em relação a isso é bem diferente da
criança descrita anteriormente.
A partir desses pressupostos notamos que a escola recebe diferentes
classes sociais que segundo Bagno (1999) apresentam linguagens
socialmente prestigiadas ou estigmatizadas. Diante disso, podemos
considerar ainda, a afirmação de Bernstein apud Soares (1999, p.23),
que aponta “a existência de diferentes tipos de linguagem,
determinados pela origem social, e propõe uma relação causal entre a
classe social a que pertence a criança sua linguagem e seu rendimento
escolar. ”
Na verdade, enxergamos uma realidade brasileira que nem
sempre permitiu às camadas populares o acesso a escolarização. Temos
nesse sentido profundas desigualdades sociais arraigadas no nosso
sistema de ensino, e é somente através das legislações federais que nos
asseguramos do acesso à escolaridade e instrução. É por meio de
documentos normativos como a: Constituição Federal de 1998, que
encontramos a garantia de um ensino público e gratuito como direito
de todos e dever do Estado; na LDB (Lei de Diretrizes Básicas) de
1996, que temos a regulamentação das relações do sistema educacional,
e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) de 1990, que nos
asseguramos do direito à educação das crianças e dos adolescentes.
O atual panorama de ensino sofre sérios problemas ou
dificuldades como: a desvalorização do profissional da educação,
modificação das relações familiares, formação continuada,
metodologia de ensino autoritária e centrada no professor, além da falta
de estrutura da maioria das escolas.
Todas essas dificuldades repercutem de uma maneira
avassaladora no aluno, principalmente o aluno das classes populares,
que encontram na escola um meio de ascensão social e de acesso aos
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bens culturais. Essa situação também acaba por gerar o fracasso escolar
que vem sendo amplamente discutido pela educação.
Uma forma de erradicar ou minimizar o fracasso escolar das
classes populares em nosso país encontra-se na exigência de efetivação
das legislações vigentes e no encontro com uma pedagogia de ensino
que considere as antagônicas relações sociais. Amaro (1997 p. 28)
mostra que: Devido à prevalência de casos de evasão e repetência
escolar entre alunos pobres, pode-se deduzir daí que o
fracasso escolar tem sido historicamente uma questão de
classe social, agravada pela falta de uma política
educacional comprometida com os interesses e
necessidades dessas populações.
No que tange ao ensino de língua materna percebemos que as
discussões sobre variação e ensino não vêm recebendo a devida
atenção, o que acaba por configurar uma situação complicada e pouco
esclarecedora a respeito do domínio das classes sociais privilegiadas
exercido sobre a linguagem efetivamente reconhecida (língua padrão).
Para Soares (1999, p.77):
É que o ensino de língua materna, entre nós, vincula-se a
uma pedagogia conservadora, que vê a escola como
instituição independente das condições sociais e
econômicas, espaço de neutralidade, de que estariam
ausentes os antagonismos e as contradições de uma
sociedade dividida em classes.
Para compreender o ensino de língua portuguesa e as relações
que o regulamenta precisamos entender as relações políticas e sociais
presentes em uma sociedade capitalista que interfere
consideravelmente no entendimento e no uso da linguagem. Essas
relações políticas acabam por legitimar uma língua padrão em
detrimento de outra língua não padrão que acaba sendo estigmatizada e
sofrendo discriminações linguísticas e sociais.
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Diante disso, visualizamos a urgente necessidade de políticas
pedagógicas que considerem a realidade cultural do aluno como fator
importante para a elaboração de didáticas que tenham como principal
objetivo o domínio pleno e efetivo dos conhecimentos linguísticos.
Deve-se ainda fazer observância de uma metodologia que consiga
incluir o respeito à linguagem não padrão, trazida pelo aluno,
promovendo também o domínio das normas urbanas de prestígio.
3. A escola e a comunidade de fala em estudo
Esta pesquisa foi desenvolvida na Escola Plácido Firmino de
Oliveira situada no distrito de Lagoa de São José, cidade de Bom
Conselho – PE. Pela lei municipal nº 34, de 29-11-1948, foi instituído
o distrito de Lagoa de São José, que conta com o quantitativo de dez
sítios adjacentes. São eles: Sítio Salgadinho, Sítio Brito, Sítio
Marcelina, Sítio Alto do Frutuoso, Sítio Caetano, Sítio Carneiro, Sítio
Oliveira, Sítio Tabocas e Sítio Serrinha. No entanto, a escola abriga
também a comunidade do distrito de Igreja Nova que inclui os Sítios
Cancelas, Boa Sorte e Monte Alegre, além dos alunos que vêm da Serra
das Pias, cidade do estado de Alagoas, que faz fronteira com o
município. Observe no mapa abaixo a localização do distrito com
relação ao município:
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O município de Bom Conselho tinha a meta projetada de
conseguir o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) no
valor de 3,0 pontos para o ano de 2011. Naquele ano, o IDEB alcançado
foi de 2,9 o que deixou o município abaixo da meta por um décimo. No
entanto, a Escola Plácido Firmino de Oliveira alcançou neste mesmo
ano o IDEB de 3,5, superando a meta que foi estipulada para a escola
que era de 2,9.
O mais novo IDEB de 2013 mostra que a escola diminuiu
consideravelmente seu rendimento, pois a meta para este ano era de 3,2,
com a obtenção de 2,2 pontos somente. A nota padronizada e especifica
de língua portuguesa foi de 3,1 pontos, ficando abaixo da nota de
matemática que foi de 3,4. O rendimento escolar baseado na taxa de
Fonte: Google Maps
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aprovação dos alunos do ensino fundamental da escola para o ano de
2013 foi de 0,68 ficando assim sob o resultado de 2011 que foi de 0,78.
Atualmente, a Escola Plácido Firmino de Oliveira atende a
quantidade de duzentos e quarenta e dois alunos e é responsável pelo
ensino fundamental I e II e pela Educação de Jovens e Adultos (EJA)
no ensino fundamental.
A infraestrutura da escola conta com: quatro salas de aula, sala
de secretaria, da direção, dos professores e de informática que por
enquanto se encontra inutilizada. Tem ainda sala de almoxarifado,
banheiros dentro do prédio, pátio coberto, cozinha e quadra esportiva.
São vinte funcionários que trabalham na escola e a comunidade escolar
dispõe de alimentação, e biblioteca para leitura de livros, revistas e
material didático. A escola também faz uso de equipamentos
audiovisuais (Datashow, caixa de som, aparelho de DVD, televisão e
computadores para uso dos professores e coordenação). Os alunos,
porém, não tem acesso à internet, que fica restrita aos docentes e a
coordenação, nem ao laboratório de informática que se encontra
desativado.
No que se refere ao município de Bom Conselho contamos com
os seguintes dados em educação (IBGE 2012)3:
i. Docentes por nível: 84 (oitenta e quatro) professores da
pré-escola, 376 (trezentos e setenta e seis) professores
do ensino fundamental e 60 (sessenta) professores de
ensino médio.
ii. Números de escolas por nível: 43 (quarenta e três)
escolas de ensino pré-escolar, 54 (cinquenta e quatro)
escolas de ensino fundamental e 3 (três) escolas de
ensino médio.
iii. Matrículas por nível: 1.375 (mil trezentas e setenta e
cinco) matrículas na pré-escola, 8.664 (oito mil
3Todas as informações descritas nesse trabalho sobreo município de Bom
Conselho foram dispostas pelo último censo do IBGE (2012).
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seiscentos e sessenta e quatro) no ensino fundamental e
1.464 (mil quatrocentos e sessenta e quatro) no ensino
médio.
Através da coleta de dados no site do IBGE (2012), percebemos
que o ensino majoritário do município é o ensino fundamental, que
conta com a maior quantidade de escolas, professores e matrículas.
Diante disso, optamos por fazer um trabalho no 7° ano do ensino
fundamental II da escola supracitada para fins de pesquisa e análise
sobre a variação linguística e sua relação com o processo de ensino-
aprendizagem. 3.1 Os estudantes
Os discentes envolvidos na pesquisa estão matriculados no
sétimo ano do ensino fundamental, são majoritariamente oriundos da
área rural, com idade entre 13 e 16 anos. Em sua maioria, a turma
provém da rede pública de ensino, e não apresenta índice de evasão
escolar, no entanto, alguns repetiram, uma ou de vezes o ano letivo,
conforme a representação nos gráficos abaixo:
33,3%
66,7%
Localização dos alunos
ÁreaUrbana
Área Rural
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Através do exposto acima percebemos que existe uma
percentagem maior daqueles alunos que estão localizados na área rural.
Nenhum aluno reprovou mais de duas vezes o ano letivo e somente
5,5% dos alunos repetiram duas vezes mesmo ano letivo numa série
escolar. No geral, temos uma percentagem de 66,7% de alunos que
nunca reprovaram com relação a taxa de 27,8% de estudantes que
repetiram o ano letivo em algum momento de sua vida estudantil.
A renda mensal familiar desses alunos varia de um a mais de
dois salários mínimos e seus pais apresentam formações variadas que
vão desde o ensino fundamental I até o ensino superior completo. Suas
situações profissionais da mesma maneira variam consideravelmente
segundo a representação gráfica descrita abaixo:
0,0%20,0%40,0%60,0%80,0%
Nenhumavez
Uma vez DuasVezes
Mais deduasvezes
66,7%
27,8%
5,5% 0%
Índice de Reprovação
0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
Menos de umsalário minímo
Mais de umsalário minímo
Mais de doissalarios minímos
44,4%52,8%
2,8%
Renda Mensal Familiar
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No que diz respeito às condições financeiras ou salariais
notamos que apenas 2,8% das famílias recebe mais de dois salario
mínimos e que 44,4% das famílias recebe menos de um salário mínimo
como renda fixa e mensal.
Os dados sobre a escolaridade dos pais mostram uma grande
disparidade ente os dois extremos do gráfico. Diante disso, temos
52,9% de pais com ensino fundamental I incompleto em contrapartida
com 2,9% de pais com ensino superior. No que se refere a profissão
desses pais temos funções variadas indicando a percentagem de: 53%
agricultores, 11% desempregados, 8% autônomos, 7% motorista, 6%
moto táxi, 6% pedreiros, 3% serventes, 3% operadores de produção,
3% caminhoneiro e 3% recepcionistas.
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%52,9%
19,4%
8,3%5,5% 5,5% 5,5%
2,9%
Escolaridade do Pai
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Agricultor 53%
Recepcionista 3%
Autônomo 8%
Caminhoneiro 3%
Motorista 7%
Moto táxi 6%
Servente 3%
Pedreiro6%
Operador de Produção (empresa
de alimentos)3% Desempregado
11%
Profissão do Pai
Autônoma11%
Doméstica 11% Agente
comunitária de saúde
3%Agricultora
17%
Assistente social 5%
Professora 3%
Desempregada (dona do lar)
50%
Profissão da mãe
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Quando analisamos os dados referentes a escolaridade das mães
percebemos também uma diferença de 41,6% de mães com ensino
fundamental I incompleto com relação a 2,9% de mães com ensino
superior concluído. Os valores obtidos através da análise da profissão
das mães conferem a percentagem de: 50% de mães desempregada e
dona do lar, 17% agricultora, 11% doméstica, 11% autônoma, 5%
assistente social, 3% agente comunitária de saúde e 3% professora.
São estudantes que leem e que apresentam pela sua maioria um
gosto mais acentuado pela leitura de gibi ou histórias em quadrinhos.
Através da aplicação do questionário, eles afirmaram gostar mais de
leitura, do que gramática ou produção de texto. O gosto pela leitura dos
alunos dessa turma divide-se basicamente em leituras de: revista (1
aluno), histórias em quadrinhos ou gibis (20 alunos), cordel (1 aluno),
jornal (3 alunos), poesia (4 alunos), livros no geral e histórias de terror
(2 alunos), fábula (1 aluno), romance (1 aluno), livros didáticos de
história (2 alunos) e sites da internet (1 aluno).
0,00%5,00%
10,00%15,00%20,00%25,00%30,00%35,00%40,00%45,00% 41,60%
19,40% 16,60%11,10%
2,90% 5,50% 2,90%
Escolaridade da mãe
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No que se refere ainda ao cuidado ou acompanhamento dos pais
para com rendimento escolar dos discentes percebemos que existe uma
preocupação e um cuidado constante. Abaixo temos a representação
gráfica da situação:
0,0%
100,0% 55,7%16,6%27,7%
Frequência com que você conversa com seus pais
sobre assuntos da escola
Sempre Às Vezes Nunca
0
5
10
15
20
Revis
ta
His
tória e
m…
Cord
el
Jorn
al
Poesia
Liv
ros/H
ist…
Liv
ros/H
ist…
Fá
bula
Rom
ance
Liv
ros d
e…
Sites d
a…
1
20
13 4
1 2 1 1 2 1
O que você gosta de ler?
0,0%
100,0% 52,8% 41,7%5,5%
Frequência com que seus pais vão às reuniões de sua escola
Sempre Às Vezes Nunca
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Ao averiguar a relação pais-alunos-escola observamos uma
frequência de 69,5% de pais que sempre procuram se informar sobre o
resultado de seus filhos com relação a 11% de pais que nunca
procuraram saber. Temos ainda a frequência de 52,8% de pais que se
preocupam com as tarefas escolares, 55,7% de pais que conversam com
seus filhos sobre assuntos da escola e 52,8% de pais que vão às reuniões
escolares. A partir disso, notamos que no geral há um envolvimento
considerável entre pais e escola.
Quando questionados sobre variação linguística, obtemos
resultados bem diversos quanto à afirmação de conhecimento sobre a
temática. No que se refere ao conhecimento da norma padrão, todos os
alunos disseram não conhecer o seu conceito ou significado.
0,0%
100,0% 69,5%
19,4% 11,1%
Frequência com que seus pais procuram se informar sobre os
resultados de sua avaliação
Sempre Às Vezes Nunca
0,0%50,0%
100,0%
Gramática Leitura Produção deTexto
8,3%
69,5%22,2%
Qual o conteúdo de Língua Portuguesa você mais gosta?
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Ao analisarmos o conhecimento sobre variação e preconceito
linguístico dos alunos do sétimo ano constatamos que a maioria não
sabia do que se tratava. É interessante visualizar que apesar de termos
a percentagem de 61,1% de estudantes que não sabiam o que é
preconceito linguístico, obtemos a mesma percentagem com afirmação
de que já sofreu algum tipo de discriminação com relação ao seu jeito
de se comunicar.
40,0%
45,0%
50,0%
55,0%
Sim Não
47,2%
52,8%
Você sabe o que é variação linguística?
0,0%
100,0% 52,8%33,3% 13,9%
Frequência com que os pais se preocupam com as tarefas
escolares
Sempre Às Vezes Nunca
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Outro aspecto importante foi a constatação de uma grande
maioria de alunos que acreditavam que deve-se falar do mesmo modo
que escrevemos. Nesse sentido, tivemos a afirmação de 61,1% de
alunos que pensam que fala e escrita devem ser semelhantes. Outra
0,0%
50,0%
100,0%
Sim Não
38,9%
61,1%
Você já ouviu falar sobre preconceito
linguístico?
0,0%
50,0%
100,0%
Sim Não
38,9%61,1%
Você já sofreu algum preconceito decorrente da
discriminação em relação ao seu jeito de se comunicar? Ou
mesmo a sua fala?
0%
20%
40%
60%
80%
100%
Sim Não
0%
100%
Você sabe o que é norma padrão?
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vertente muito dispare foi a percentagem de 100% de alunos que não
sabiam o que era norma padrão. Isto significa dizer que nenhum aluno
já ouviu falar sobre isso na escola ou em práticas cotidianas.
Essa pesquisa se torna interessante a partir do momento em que
abrange alunos de diversas comunidades de fala.
0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
Sim Não
61,1%
38,9%
Você acha que devemos falar do mesmo jeito que escrevemos?
21
21
51
22
111
32
111
0 5 10 15
Sitío Carneiro (comunidade de Lagoa de São José)
Sitío Boa Sorte (comunidade de Lagoa de São José)
Sitío Marcelina (comunidade de Lagoa de São José)
Sitío Brito (comunidade de Lagoa de São José)
Sitío Salgadinho (comunidade de Lagoa de São…
Sitío Olho de Água Velho (comunidade de Lagoa…
Igreja Nova (distrito de Bom Conselho)
Bom Conselho
Local de residência dos alunos
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Percebemos então que a turma do sétimo ano da Escola Plácido
Firmino de Oliveira recebe um discente da sede de Bom Conselho que
migra para o distrito por questões de parentesco e familiaridade, além
disso contamos com alunos do distrito de Igreja Nova que não dispõe
do ensino fundamental II em sua localidade. Sem contar é claro, com
os estudantes da área urbana e rural do distrito de Lagoa de São José,
onde a escola está situada, e com estudantes da cidade de Alagoas que
por proximidade e preferência optam por estudar no distrito de Lagoa
de São José, pertencente ao município circunvizinho (Bom Conselho).
4. Considerações finais
Essa pesquisa nos fez entender que as distinções sócio econômicas
pensadas numa dimensão extralinguística interferem na fala do falante
de uma forma bem particular e significativa. Dessa forma,
consideramos de extrema importância uma abordagem pedagógica
sensível à percepção de diferenças linguísticas no contexto escolar.
Além disso, é preciso considerar a existência de distintas abordagens a
respeito da Língua Portuguesa que precisam ser consideradas para a
construção de um entendimento mais consciente e efetivo da nossa
língua materna. Refletir sobre variação linguística é pois, antes de mais
nada perceber que a língua muda da escrita para a fala mas
principalmente que muda através do uso particular de cada falante dessa
língua mãe que é tão multifacetada e plural.
Por outro lado, pensar em sociolinguística é admitir a influência de
variáveis externas à língua como fatores que dão significado ou
explicação sobre o porquê da ocorrência de mudanças ou variações que
acontecem não só na Língua Portuguesa, mas em outras línguas como
o espanhol, o inglês e o italiano por exemplo.
Essas informações sobre os estudantes do sétimo ano não
representam apenas dados numéricos, mas para além disso a evidência
do perfil de uma turma que pretende avançar no nível de compreensão
da língua vista como objeto de estudo do ensino de português. Dessa
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forma, ressaltamos a importância do reconhecimento do professor para
com seus estudantes nas dimensões social, econômica e educacional.
E por fim, não teríamos como terminar essa reflexão sem pensar na
importância do desenvolvimento de atividades educacionais que tentem
contribuir de alguma forma com o ensino e mais especificamente com
o ensino público brasileiro que deve ser visto como um laboratório de
análise para constantes mudanças e aprimoramento afim de que se
possa contribuir de forma cada vez mais significativa para os estudantes
inseridos em sua rede.
5. Referências
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