as construÇÕes de gÊneros e os jogos infantis · cultura atual dentro da educação formal...

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894 AS CONSTRUÇÕES DE GÊNEROS E OS JOGOS INFANTIS Carla Ramalho – Lapeade – PPGE – UFRJ José Jairo Vieira – Lapeade – PPGE - UFRJ Eixo Temático: Culturas de inclusão/exclusão em educação Categoria: Pôster e-mail: [email protected] 1. INTRODUÇÃO: O presente projeto busca construir um olhar crítico sobre questões consideradas pré- determinadas e determinantes, para desvendar e compreender como os gêneros e a sexualidade são produzidos e reproduzidos nos jogos infantis fortalecendo o androcentrismo. Para conseguir obter este resultado, o trabalho há de se comprometer com pesquisas que visam compreender os processos de produção e naturalização das diferenças de gênero, através dos jogos infantis em ambiente escolar. Podendo embasar políticas públicas que tenham o intuito de minimizar estigmas, o que seria importante dentro de uma sociedade onde pessoas ainda sofrem (moral e fisicamente) por não seguirem as normas sociais desejadas. 2. Referencial teórico Entender qual a importância da cultura na formação do gênero e da sexualidade, e como essas construções podem vir a se espelhar em políticas públicas é de grande valia neste trabalho investigativo. O gênero, segundo Scott (1995), “é uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado.” (p.75), estabelecendo relações sociais e sendo responsável por construções culturais. O gênero cria as identidades, aceitáveis na sociedade, para homens e mulheres, sendo uma forma de organização social estipulada pelo sexo biológico. Então, o gênero

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894

AS CONSTRUÇÕES DE GÊNEROS E OS JOGOS INFANTIS

Carla Ramalho – Lapeade – PPGE – UFRJ José Jairo Vieira – Lapeade – PPGE - UFRJ

Eixo Temático: Culturas de inclusão/exclusão em educação Categoria: Pôster

e-mail: [email protected]

1. INTRODUÇÃO:

O presente projeto busca construir um olhar crítico sobre questões consideradas pré-

determinadas e determinantes, para desvendar e compreender como os gêneros e a

sexualidade são produzidos e reproduzidos nos jogos infantis fortalecendo o

androcentrismo. Para conseguir obter este resultado, o trabalho há de se comprometer com

pesquisas que visam compreender os processos de produção e naturalização das diferenças

de gênero, através dos jogos infantis em ambiente escolar. Podendo embasar políticas

públicas que tenham o intuito de minimizar estigmas, o que seria importante dentro de uma

sociedade onde pessoas ainda sofrem (moral e fisicamente) por não seguirem as normas

sociais desejadas.

2. Referencial teórico

Entender qual a importância da cultura na formação do gênero e da sexualidade, e como

essas construções podem vir a se espelhar em políticas públicas é de grande valia neste

trabalho investigativo.

O gênero, segundo Scott (1995), “é uma categoria social imposta sobre um corpo

sexuado.” (p.75), estabelecendo relações sociais e sendo responsável por construções

culturais. O gênero cria as identidades, aceitáveis na sociedade, para homens e mulheres,

sendo uma forma de organização social estipulada pelo sexo biológico. Então, o gênero

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aponta relações de poderes, concebe significados e “[...] não apenas faz referência ao

significado homem/mulher; ele também o estabelece” (Gagnon, 1995, p.92)

A sexualidade é “a forma cultural pela qual vivemos nossos desejos e prazeres corporais”

(Weeks, 1993, p.96), por isso é habitualmente resumida pela prática sexual, o que traz

consigo uma marca social acentuada, se torna um forte classificador social, dimensionando

e valorizando o que é adequado ou não na expressão da sexualidade, o que é variável

atentando o contexto e o período.

O gênero e a sexualidade se entrelaçam no momento das expectativas sociais, como por

exemplo: uma pessoa do sexo feminino deve ter trejeitos suaves e delicados e se relacionar

sexualmente com uma pessoa do sexo masculino. Essas representações são reforçadas em

vários ambientes e de várias formas, um olhar panóptico (Foucault, 2007) serve como

árbitro desse jogo social. O corpo, o gênero e a sexualidade são observados, classificados e

após, essas características, indicam uma posição destes indivíduos dentro do padrão de

uma determinada sociedade. Assim, temos em questão um dos mais influentes campos de

poder, a sexualidade e o gênero.

Pela relação existente entre controle social, poder, sexualidade e gênero, a forma de

compreensão destas, é alvo de disputa entre diversos atores. A racionalidade médica e

biológica produziu e produz grande parte da “explicação” sobre a sexualidade e o gênero.

Destaca-se a pesquisa realizada pelo biólogo Alfred Kinsey (1948), o referido autor

procurou apontar as diversas possibilidades da sexualidade que poderiam caber ao longo da

vida. Essas reflexões inspiram novas questões dentro da dinâmica dos jogos: - se há várias

formas de expressão da sexualidade (como mostra Kinsey), qual o espaço para elas nos

jogos infantis? Como são classificadas na escala de valores sociais? São incorporadas e/ou

adaptadas?

A relação lúdica que os jogos proporcionam auxilia a incorporar nos indivíduos

determinadas formas de convívios sociais. Os roteiros de gênero e sexualidade são

vislumbrados, as relações de poder são estabelecidas e continuamente são cobradas as

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performances adequadas para cada personagem, ajudando a modelar identidades

masculinas ou femininas e heterossexuais.

A ideia de roteiros sexuais foi formulada originalmente por Gagnon e Simon (1973), e

após refinada por Gagnon (2006), servindo de explicação para alguns processos de

construções sociais das identidades sexuais e de gênero. Os roteiros evidenciam o

aprendizado constante das práticas e significados sexuais exercidas na sociedade,

apontando para a forma distinta que é trabalhada com cada gênero, são esquemas

cognitivos organizados que sinalizam desempenhos relacionados à sexualidade e ao

gênero. O que pode ser analisado durante as atividades recreativas das crianças, como:

quais brincadeiras são escolhidas por cada gênero e as maneiras de expressão do corpo no

jogo.

Buscando relacionar as teorias já citadas com o ambiente escolar formal, temos os textos

de Guacira Louro. A autora busca questionar as expressões de gêneros e sexualidade

impostas, mesmo de forma subjetiva, pelas escolas. “É indispensável que reconheçamos

que a escola não apenas reproduz ou reflete as concepções de gênero e sexualidade que

circulam a sociedade, mas que ela própria a produz.” (Louro, 2011, p.84)

Uma forma efetiva de trazer para a discussão social sobre o gênero e a sexualidade é

através das políticas públicas, que é definida “[...] como um curso de ação do Estado,

orientado por objetivos, refletindo ou traduzindo um jogo de interesses.” (Farah, 2004,

p.47). Este interesse do Estado dentro da escola é direcionado como políticas públicas

educacionais e podem transparecer as desigualdades da sociedade como também fomentar

sua redução, auxiliando assim uma cultura a favor da equidade, mas, no entanto ainda falta

muito a trilhar para chegar a tal ponto.

Como ferramenta importante de análise do gênero e da sexualidade no contexto da escola,

o jogo na interpretação de Huizinga (2010), sendo encarado como influente instrumento

socializante, pois é uma expressão cultural, e por si só já é significativo. “Todo jogo

significa alguma coisa.” (Huizinga, 2010, p.5). Como o objetivo é interpretar as atividades

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culturais, nada é mais adequado do que utilizar uma atividade lúdica, que deixe extravasar

concepções enraizadas em seus praticantes para análise da observadora. O jogo, dessa

forma, é um bom laboratório de observação para as ações que se quer questionar.

3. Objetivos

Objetivo Geral

Analisar como as construções de gêneros estão presentes nas instituições educacionais

através dos jogos infantis realizados no tempo livre da educação formal.

Objetivos específicos

* Observar a dinâmica de gênero nos jogos, como quais são os jogos mais

requisitados, de livre escolha, por crianças entre 6 e 7 anos, na cidade do Rio de Janeiro, na

hora do recreio nas escolas selecionadas.

* Examinar as personagens montadas, baseadas nos gêneros, durante as atividades

lúdicas, comparando as personagens e escolhas lúdicas entre os meninos e as meninas.

4. Metodologia

Esta pesquisa será embasada pela etnografia pois, buscará analisar alguns significados da

cultura atual dentro da educação formal (Spradley, 1979), as questões norteadoras serão

como as distinções de gênero e sexualidade ocorrem e são reforçadas no convívio social

infantil. Será realizada a técnica da observação participante pela compreensão de que o

pesquisador e os pesquisados sempre são expostos a uma influência recíproca (André,

1995).

Serão observadas e analisadas crianças entre 6 e 7 anos de ambos os sexos que estejam

devidamente matriculadas na educação formal a ser pesquisada.

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Os locais de observação serão três escolas que tenham perfis socioeconômicos diferentes.

Uma será voltada para discente de baixa renda, a outra escola terá a característica de

possuir um público bastante heterogêneo (em relação à renda familiar) e por fim uma

escola privada que tenha como público alvo crianças com um alto nível financeiro. Tendo

o intuito de entrelaçar como as questões de gênero e sexualidade podem ou não ser

interferidas pela classe social das crianças.

Cada escola receberá visita da observadora durante duas vezes por semana no período de

dois meses. A observação ocorrerá na hora do recreio das instituições e pretende-se realizá-

la da seguinte forma: no início do recreio a observadora já se encontrará localizado em um

ponto de observação que facilite a visualização geral da área e dos(as) educandos(as) em

tempo livre, o intuito desta prática é analisar os jogos que serão escolhidos e a forma de

aplicação das atividades, se atentando para atividades que a observadora relacione com as

questões de gênero e sexualidade. Se ocorrer alguma dúvida pertinente a observadora, de

forma participativa, poderá interagir com as crianças em questão. Tudo que for julgado

importante será redigido no diário de campo.

Após, os dados encontrados serão interpretados à luz do referencial teórico discutido no

capítulo da fundamentação teórica e também a partir de outros autores que se fizerem

necessários considerando a imprevisibilidade das observações no trabalho de campo. E,

também serão analisados os conteúdos apreendidos nas observações, identificando os

termos, as expressões captadas pela pesquisadora.

5. Considerações

Serão feitas as considerações e sugestões finais do trabalho na busca de trazer e reforçar

possibilidades sociais em direção à equidade dentro das instituições escolares, trazendo

como alternativa a aplicação de algumas políticas públicas.

Para além disto, tem-se como expectativa demonstrar como a educação diferenciada

vivenciada por meninos e meninas e como estas formas diferenciadas de socialização vão

transformar e diferenciar estas práticas lúdica durante o “recreio”.

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Outro aspecto a ser apontado é a possibilidade de uma ressignificação dos valores de

gênero, no momento em que as crianças passam a brincar juntas (meninos e meninas), e

mesmo com esta aparente atividade conjunta, teríamos os papéis e representações de

meninos e meninas caminhando para a diferença, desigualdade, classificação e submissão,

persistindo assim através de uma nova roupagem a subordinação feminina.

7. Referências bibliográficas.

ANDRÉ, Marli Eliza D. A.. A etnografia da prática escolar. 16ª ed. Campinas: Papirus, 1995. BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. 10ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011 FARAH, Marta Ferreira Santo. Gênero e políticas públicas. Estudos Feministas, pp. 47-71, 2004. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 34ª.ed. Petrópolis: Vozes, 2007. HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2010. LOURO, Guacira. (Org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. ______. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis: Vozes, 2011.

SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, pp.71-99, 1995.

VANCE, Carole S. A antropologia redescobre a sexualidade: um comentário teórico. Physis, vol.5, n.1, pp. 7-32,1995.

VIANNA, Cláudia Pereira. UNBEHAUM, Sandra. O gênero nas políticas públicas de Educação no Brasil: 1988-2002. Cadernos de Pesquisas, vol.34, n. 121, pp. 77-104, 2004.