as artes entre as letras - 12.10

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suplementoDedicado a mrio Cludio, autor de tIAGo VeIGA, uma biografiaDirectora: Nassalete MiraNDa | 12 outubro De 2011 | N60 | Preo: 2 euros | quiNzeNalMeNte s quartas ISSN: 1647-290XDr

o Z povinho, totem nacional portugusensAIo// // pGs.6 a 8

escritaria alargado ao espao lusfonoem notCIA // festival literrio, a 15 e 16 de outubro, destaca obra e vida de mia Couto. penafiel oferece teatro, arte de rua, dana, cinema e colquios, sempre com a obra literria do escritor moambicano como tema de fundo. // pG.27Dr

A investigao da documentao foraleira,

entreVIstA // pGs.4 e 5

por olinda santana

lusofonIA // pG.9

Viver numa escola em moambique//

lusofonIA // pG.10 e 11

falando portugus na rssia//

Isabel Bruma

Adelto Gonalves

AS ARTES ENTRE AS LETRAS

12 outubro 2011

nassalete mirandadirectora

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entre sentidosQuando lanmos este jornal em Maio de 2009, a Teresa Rosmaninho disse-me: Tens de ir rapidamente para Lisboa, l, quer queiramos quer no, que tudo se decide e quem no anda pelos corredores das ruas da capital no tem visibilidade, logo, no existe. Discordei, mas apenas em parte, e apenas porque, de quando em vez, bom que a razo se sobreponha ao corao! A Teresa morreu a lutar pelo que acreditava a defesa dos direitos das mulheres, sobretudo das vtimas de violncia domstica. Nasceu no Porto, foi para Lisboa, ou, como ela dizia fui a Lisboa e regressou ao Porto, cidade onde criou o primeiro gabinete da Associao Portuguesa de Apoio Vtima, e no mais parou. Teresa, hoje quero dizer-te que valeu a pena o teu trabalho de alerta, de denncia, de apoio. A tua morte no foi manchete dos jornais, (como a minha tambm no ser, e disso falmos em 2009). Os jornais dedicaram-te 200 caracteres de notcia, e os audiovisuais estavam demasiado ocupados com futebis e outras coisas mis. Mas no foi esse o protagonismo que te interessava, se assim fosse serias mais uma passageira da CP semanalmente entre Lisboa e Porto, ou terias por l gasto as pedras da calada fadista. Teresa, agradeo hoje e mais uma vez publicamente todo o teu esforo e empenho como defensora dos direitos das mulheres. No foi em vo. No tiveste oportunidade de ver a manifestao de mulheres indignadas frente ao Tribunal de vora. No aceitaram em silncio a deciso de colocar em liberdade mais um agressor confesso desse crime pblico que a violncia domstica. O teu trabalho deixa sementes que vo continuar a florir, porque enquanto a violncia o refgio das mentes pequenas, a unio do rebanho obriga o leo a deitar-se com fome. Teresa, hoje chegamos ao n. 60 do nosso jornal e no poderia deixar de te dizer obrigada pelas tuas palavras de incentivo e de coragem. Guardo religiosamente o teu ltimo email. Tem a data de poucos dias antes de entrares no hospital. Deram-te poucas horas de vida. Resististe meses! Hoje tenho uma notcia para ti: publicamos uma grande entrevista a Mrio Cludio em suplemento, que s foi possvel com o apoio de outro grande amigo comum a quem tu tambm sempre admiraste. O nosso Miguel. E assim, vivendo na amizade que vamos caminhando pelo sonho at nos encontrarmos todos, de novo, na nossa cidade de sempre. Para ambos, um beijo, para todos boas leituras em artes feitas!

Dr

entre ns

encontro intercultural e solidrioO encontro anual que a Associao frica Solidariedade promove para angariar fundos destinados s bolsas para ajudar estudantes africanos em Portugal ou nos PALOP realiza-se no dia 22 de Outubro, na Fundao Eng. Antnio de Almeida. A Matine Recreativa e Encontro Intercultural, que ter incio s 14 horas, ser preenchida por uma variedade de actividades que pretende envolver vrios aspectos de alguns dos pases em que a associao desenvolve programas de solidariedade. Da msica dana, haver ainda lugar a um desfile de trajes tradicionais e termina com um lanche. A associao, que uma Organizao No Governamental para o Desenvolvimento e cujos elementos dos Corpos Sociais so todos voluntrios, tem, para alm das bolsas de estudo, vrios projectos na frica Lusfona, nomeadamente na rea de construo, de que exemplo o projecto em Moambique Recuperao do Hospital Rural do Songo, em Cahora Bassa. Concretamente em relao ao projecto de atribuio de bolsas, a presidente, Maria Manuela Lopes Cardoso, garantiu ao jornal As Artes entre As Letras que acredita que os nossos bolseiros vo contribuir, de forma efectiva, para as boas polticas dos respectivos pases. A associao vive da solidariedade de todos: NIB 0033.00000000.877937405.notAO jornal As Artes entre As Letras, que ainda no adoptou o novo Acordo Ortogrfico, publica textos de colaboradores que o aplicam, respeitando, assim, o original.

Arnaldo Saraiva | Agustina Bessa-Lus | Antnio Vitorino dAlmeida | Antnio Joaquim Oliveira | Carlos Fiolhais | Francisco Laranjo | Francisco Ribeiro da Silva | Helder Pacheco | Jos Atalaya | Jos Rodrigues | Lemos de Sousa | Ldia Jorge | Luisa Dacosta | Manoel de Oliveira | Mrio Cludio | Miguel Veiga | scar Lopes | Salvato Trigo | Urbano Tavares Rodrigues Adelto Gonalves | Antnio Jos Queiroz | Armando Alves | Cacilda Celso | Carlos Cabral Nunes | Carlos Vaz | Cristino Cortes | Domingos Lobo | Francisco dEullia | Isabel Ponce de Leo | | Joo-Maria Nabais | Jorge Sanglard | Lauro Antnio | Manuel Sobrinho Simes Maria Antnia Jardim | Ramiro Teixeira | Rodolfo AlonsoPARCERIAS APOIOS

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a vida dos livros

Guilherme doliveira martins

educao = exigncia e qualidadeliberdade e poltica pblica de educao ensaio sobre um novo compromisso social pela educao de Joaquim Azevedo (fundao manuel leo, 2011) um conjunto de reflexes sobre a educao e a aprendizagem de algum que conhece bem esse mundo e que nos prope, com seriedade, pistas de ao, para alm dos lugares comuns e das simplificaes que tantas vezes so ouvidas quando se trata destes temas.DIGnIDADe e AutorIA. - Comeo por referir um

amigo comum, que nos deixou no h muito e que Joaquim Azevedo cita no incio deste seu livro falo de Joaquim Pinto Machado. Disse ele, um dia, a dignidade do ser humano ser autor. Esta referncia fundamental e est ligada ideia de autoridade moral. Ao longo da vida, ouvi sempre Joaquim Pinto Machado a falar dos valores ticos enraizados na vida, ligados ao facto de a pessoa humana ter de ser colocada no centro da histria e da sociedade. E quando falamos de educao essa centralidade que tem de ser afirmada. Tenho encontrado, porm, uma grande dificuldade em debater seriamente os temas da educao, h demasiados preconceitos e grandes resistncias a pr na mesa o que realmente est em causa. H muitas pessoas convencidas de que tm solues, mas assentam em pressupostos tantas vezes errados que prejudicam seriamente a apresentao de pistas viveis no sentido de melhorar a educao e a aprendizagem e de as tornar um fator de exigncia e de qualidade. Este livro de Joaquim Azevedo um contributo sereno para o debate.um CAmInHo De proGressos. - Ao falarmos de

(p.55). E o certo que o sistema escolar continua muito ineficaz e ineficiente, sobretudo nas transies entre ciclos de estudo e no ensino secundrio (id.). Impe-se, assim, inscrever a educao no espao pblico. Se o santurio ruiu (porque o saber deixou de ser administrado isoladamente do mundo, acessvel a poucos, passando a apontar-se para uma escola de qualidade para todos) fundamental empenharmo-nos em superar os bloqueamentos perante os quais estamos: a educao no um problema tcnico, mas poltico e de cidadania; exige o apoio s famlias; a diferenciao das aprendizagens; a mobilizao dos professores para as tarefas que lhes cabem; o estabelecimento de um clima de confiana com as escolas, de modo a favorecer a autonomia; o primado da responsabilizao; a superao da dicotomia Estado / mercado; e a recusa do populismo, do cinismo e da demagogia. Em vez da desconfiana e da irresponsabilidade, do que se trata de pr a autonomia como ideia e prtica no centro do funcionamento das escolas.lemBrAr CelestIAno - O velho Celestiano, de

trios dos profissionais. O equilbrio fundamental nem tarde demais nem para alm do desejvel.o serVIo pBlICo De eDuCAo. - Como defendi com Eduardo Maral Grilo, o servio pblico de educao no pode resumir-se iniciativa estatal. Estamos perante a necessria complementaridade de iniciativas, uma rede de escolas com estatutos diferentes, exercendo cada vez mais a sua autonomia, com um objetivo comum. E a verdade que as escolas devem ser mais autnomas e ativas, como lugares de trabalho, de liberdade e de democracia. Eis por que razo concordo com Joaquim Azevedo sobre a necessidade de uma viso antimonopolstica, policntrica, com uma autntica regulao responsabilizadora nas escolas. Assim, a interao entre a pessoa e a comunidade, a vivncia da laicidade (por contraponto ao laicismo), a sociedade providncia e a solidariedade voluntria (ou a importncia crescente da responsabilidade social) tornam a rede escolar como ponto de encontro de diversas iniciativas, que tem de valorizar a aprendizagem. A ideia de compromisso surge, assim, com naturalidade: a partir do empenhamento pessoal e cvico, do exerccio da autonomia, do acordo e da cooperao em nome do bem comum e de uma auto-avaliao praticada por escolas que aprendem. Escolham o que escolherem fazer com a vossa vida, garanto-vos que no ser possvel a no ser que estudem (Obama). Trabalho, disciplina, profissionalismo eis o que tem de estar presente quando falamos de educao de qualidade para todos. No fundo, a educao essa arte de promover o desenvolvimento humano de cada pessoa, que s se des-envolve verdadeiramente na medida em que acolhida pelo outro, que lhe d em si um lugar; o outro des-ocultame solidariamente, convocando toda a comunidade indizvel que me habita (p.124). Jorge de Sena diria: uma pequena luz bruxuleante / brilhando incerta mas brilhando.

Educao temos de comear por dizer que vivemos em Portugal nos ltimos quarenta anos um caminho longo de progressos, mas tambm de perplexidades. Em 1974, havia vinte cinco por cento de analfabetos, que era a taxa mais elevada da Europa. Apesar dos esforos efetivos, sobretudo depois do final dos anos sessenta, a democratizao ocorreu como consequncia direta da nova ordem constitucional iniciada em 1974, consolidada a partir de 1976 e 1982, e que deu lugar Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986. No entanto, houve desde o incio hesitaes e erros com consequncias irreversveis, em especial a prevalncia de uma via nica no ensino secundrio, ao invs da diversidade prevista na reforma no concretizada de Veiga Simo. E importa reconhecer que desde muito cedo o autor deste livro teve a exata compreenso do papel crucial que o ensino secundrio desempenha como resultou da sua ao no mbito das escolas profissionais. De facto, como nos diz Joaquim Azevedo: no podemos oferecer o mesmo tipo de formao a todos, pensando que estamos a oferecer o melhor percurso a cada um

Mia Couto, acusa a facilidade quando diz onde sempre meio-dia, tudo noturno. De facto, a facilidade na escola, a festa e a tentao de deixar tudo pela rama, tem consequncias dramticas. O que distingue o progresso do atraso a capacidade de aprender. No basta investir em Educao, importa traduzir as apostas em qualidade, exigncia, avaliao e prestao de contas (no sentido da responsabilidade cidad). E quando se discute se o objetivo da educao a preparao para o mercado de trabalho temos de contrapor que formamos pessoas, que queremos criar cidados livres e responsveis os bons profissionais viro por acrscimo. Da que a autonomia seja pedagogicamente ativa exerce-se em nome da cidadania responsvel, por contraponto irresponsabilidade. Mas exercer a autonomia, tornando a escola central e no perifrica, obriga ao gradualismo, ao aperfeioamento permanente, e ao exerccio das tarefas cometidas a cada um. O tringulo escola / famlia / comunidade tem de ser levado a srio. Os pais devem participar na escola, mas no confundir o seu papel com o dos professores. Infelizmente, ou chegam tarde demais ou invadem terri-

notA: Texto publicado ao abrigo da parceria estabelecida entre AS ARTES ENTRE AS LETRAS e o Centro Nacional de Cultura

entrevista

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um patrimnio documental sin em portugalCom cerca de 30 livros e 50 artigos cientficos publicados, olinda santana uma das maiores especialistas na rea da investigao da documentao foraleira. professora na universidade de trs-os-montes e Alto Douro (utAD), fala de uma regio com pouco poder de deciso, mas inatingvel a nvel patrimonial e cultural. Alm do trabalho de investigao, dinamizou o Ciclo Cultural da utAD e integra a Associao Internacional de Artistas. pgina de rosto dos forais novos de trs-os-montes o seu ltimo livro, mas novas obras esto j prontas para publicao.Paulo Francisco Carvalhotem muitos trabalhos publicados sobre documentos histricos, principalmente forais. Como que comeou este interesse?

olInDA sAntAnA tem prontAs pArA puBlICAo noVAs oBrAs soBre forAIs

Sim, tenho cerca de 30 livros e captulos de livros publicados, bem como cerca de 50 artigos cientficos em actas de congressos e revistas cientficas. Na verdade, uma grande parte da minha investigao tem versado sobre a documentao medieval e moderna outorgada pela coroa portuguesa s localidades transmontanas e alto durienses e uma outra parte sobre o arquivo pessoal de Antnio Maria Mourinho, o obreiro da oficializao da lngua mirandesa. No incio da minha carreira acadmica, na Universidade de Trs-os-Montes e Alto Douro, comecei por estudar, no mbito das Provas de Aptido Pedaggica e Capacidade Cientfica, os forais de Vila Real, outorgados por D. Afonso III, D. Dinis e D. Manuel actual cidade de Vila Real. Na tese de doutoramento europeu, realizada na UTAD e na Universidade de Toulouse-Le-Mirail, em Frana, ampliei o objecto de estudo. Editei o Liuro de Foraes Nouos da Comarqua de Trallos, composto por 56 forais novos e realizei um estudo histrico, estatstico-lexical do mesmo Liuro, um livro de registos foraleiros exarado na chancelaria manuelina. Depois disso, investiguei e publiquei as Inquiries Manuelinas de Trs-os-Montes, documentao avulsa e indita. Editei e estudei toda a documentao foraleira dionisina outorgada pelo Rei-Poeta aos lugares de Trs-os-Montes (102 documentos). Editei e estudei igualmente o Tombo Filipino da vila e termo de Vila Pouca de Aguiar, entre muitos outros trabalhos.fale-me um pouco sobre o seu ltimo livro publicado, pginas de rosto dos forais novos de trsos-montes?

documentao foraleira, pretendeu fazer passar ao grande pblico a imagem de rei poderoso e opulento. Os forais novos, cdices iluminados em pergaminho, livros de aparato, sumptuosos, funcionaram como uma forma de propaganda, uma vez que o monarca no se deslocava ao interior, aos lugares de fronteira, como os reis medievais. Este soberano quase no saa da sua faustosa corte, mas esse facto no o impediu de divulgar e cultivar uma imagem de um rei poderoso junto dos seus sbditos, no limiar da modernidade. Esta mensagem est gravada nas pginas de rosto dos forais novos ou manuelinos.Que importncia atribui ao estudo dos forais e como se caracteriza a regio de trs-os-montes nesta matria?

Os forais antigos ou medievais foram as cdulas de nascimento dos concelhos na Idade Mdia, a maior parte dos forais antigos foram outorgados at ao reinado de D. Dinis, decorrentes da necessidade de repovoar e colonizar o reino aps a reconquista. Com o decorrer dos tempos, foram perdendo a sua primitiva fora jurdica e poltica, uma vez que os representantes concelhios passaram a pronunciar-se nas cortes e os monarcas comearam a

legislar revogando o contedo dos forais medievos. Foi necessrio fazer uma reforma dos forais antigos, porque estes se encontravam desactualizados na linguagem (latim ou portugus arcaico), nas medidas, nos pesos, na moeda. Coube a D. Manuel I essa grande tarefa. No decurso do seu reinado, foram reformados 537 forais para todo o reino. Trs-os-Montes, como qualquer outra regio do pas, possui os seus forais antigos e novos custodiados nos Arquivos Nacionais da Torre do Tombo, assim como em vrios arquivos, bibliotecas e museus regionais.A investigao nesta rea/regio j est concluda, ou ainda h muito por fazer?

O livro Pgina de Rosto dos Forais Novos de Trs-osMontes divulga a beleza e a originalidade da iluminura das pginas de rosto dos forais novos mandados exarar por D. Manuel I para as localidades de Trs-os-Montes, no decurso da reforma manuelina dos forais (1496 1520). A iluminura das referidas cartas de foral, embora apresente um tratamento rudimentar, constitui uma novidade artstica no contexto europeu do final da Idade Mdia e dealbar da poca Moderna, em virtude da iluminura ilustrar textos administrativo-jurdicos (forais novos), em vez de livro religioso, como acontecia com a iluminura francesa ou flamenga. D. Manuel, atravs da feitura da

Pgina de rosto do foral manuelino de Outeiro de Miranda

A investigao na rea da documentao foraleira manuelina ainda est longe de estar concluda. Encetei a investigao pela edio e estudo histrico-cultural e lingustico da documentao manuelina de Trs-os-Montes e Alto Douro. Neste momento, estou a desenvolver um projecto de investigao intitulado Fontes de uma herana histrico-cultural portuguesa: os registos foraleiros manuelinos com um pequeno grupo de doutorandas. Propus-me fazer uma dupla edio (conservadora e modernizada) dos cinco livros de registos foraleiros manuelinos de todo o reino, custodiados no IAN/TT [Instituto dos Arquivos Nacionais Torre do Tombo], bem como um estudo histrico-cultural e um glossrio de cada livro. Trata-se, na verdade de um patrimnio documental singular em Portugal e inexistente no panorama europeu. Esto prontos a ser publicados, em edio paleogrfica, o Li-

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entrevistaDr

ngular

A utAD promove um conjunto significativo de actividades culturais (exposies, conferncias, teatro, concertos). um papel fundamental na regio

Sim. A UTAD , h vrias dcadas, um plo cientfico e cultural importantssimo na regio. Relativamente s actividades culturais mais recentes, criei em 2008 com um grupo de estudantes um projecto intitulado Ciclo Cultural da UTAD com o objectivo de dinamizar e enriquecer ainda mais as actividades culturais desenvolvidas na universidade. Como sou docente no Departamento de Letras, Artes e Comunicao, considerei que era minha obrigao incentivar e divulgar as letras, as humanidades, as artes e todo o tipo de trabalho cientfico e artstico, convidando, no interior da academia, os estudantes, os docentes, os funcionrios, a divulgarem as suas capacidades artsticas, no esquecendo, contudo, o exterior, a comunidade em geral, chamando igualmente personalidades exteriores universidade a mostrarem os seus trabalhos. Dispomos de um espao-galeria para as exposies e temos um blogue (http://www.cicloculturalutad.blogspot.com/) onde damos conta de todas as nossas actividades. Creio que o Ciclo Cultural da UTAD comea a cativar pblicos dentro e fora da universidade. So cada vez mais as pessoas que me contactam para expor e divulgar os seus trabalhos na UTAD.foi convidada a integrar recentemente a Associao Internacional de Artistas. o que representa e que trabalho pode desenvolver neste mbito?Olinda Santana

vro de Forais Novos do Entre Douro e Minho e o Livro dos Forais Novos da Estremadura. Est a ser ultimada a edio do Livro dos Forais Novos da Beira. Estou a finalizar tambm o Vocabulrio do Livro dos Forais Novos e das Inquiries Manuelinas de Trs-os-Montes. Mas falta concretizar o mesmo tipo de estudo vocabular para as restantes quatro comarcas do reino no perodo manuelino (Entre Douro e Minho, Beira, Estremadura e Entre Tejo e Odiana).H apoios para estes trabalhos de investigao?

Sim, a Fundao para a Cincia e Tecnologia tem financiado os centros de investigao das universidades. Como sou membro do Centro de Estudos em Letras da Universidade de Trs-os-Montes e Alto Douro esse Centro que publica os meus trabalhos desenvolvidos no mbito do projecto acima enunciado.Desenvolve a sua actividade na universidade de trs-os-montes e Alto Douro. sente o peso da interioridade, ou neste caso at uma vantagem dada a riqueza histrica da regio?Pgina de rosto do foral manuelino de Frechas

Fui convidada a integrar a Associao Internacional de Artistas (AIA) [International Association of Artists] na qualidade de autora, pelo presidente da AIA, Jos Duarte Pinto dos Santos, pelas obras j publicadas. Sinto-me uma privilegiada por pertencer a uma associao internacional constituda por pintores, escultores, desenhadores, ceramistas, fotgrafos, escritores, msicos e artesos de todo o mundo. A AIA permite-nos, enquanto membros, promover intercmbios e dilogos com artistas nacionais e internacionais, bem como a divulgao da nossa obra dentro e fora do pas. Esta oportunidade aliciante e enriquecedora para todos os autores. Enquanto coordenadora do Ciclo Cultural da UTAD e presidenta da Delegao da Associao Internacional de Artistas em Vila Real pretendo aliar as actividades do Ciclo Cultural da UTAD s actividades artsticas da AIA e captar sinergias na regio transmontano-duriense para futuros eventos culturais e artsticos da Associao.Que importncia atribui investigao no ensino? Considera-a fundamental para a qualidade?

Sim, sinto o peso da interioridade, porque cada vez mais a litoralizao est frente do interior, neste pequeno pas. O interior tem poucos votantes, porque est desertificado, por isso tambm tem muito pouco poder de deciso. Contudo, a regio de Trs-os-Montes e Alto Douro a nvel patrimonial e cultural inatingvel. Tenho a sorte de trabalhar no campus universitrio mais bonito da Pennsula

Ibrica, o campus da UTAD. Vivo num espao que pertence a um patrimnio nico no mundo O Alto Douro Vinhateiro, coordeno um projecto de investigao num local singular, com uma lngua e uma cultura mpares: Miranda do Douro. Os pontos positivos compensam largamente os negativos.

Como j disse noutras entrevistas, sem investigao no h ensino de qualidade. No podemos ensinar de uma forma cativante os assuntos que no dominamos bem. Se estivermos a produzir investigao e a podermos transmitir e debater com os nossos discentes dos vrios nveis de ensino, a investigao tornar-se- mais consistente e fundamentada, e a aprendizagem ser muito mais enriquecedora e diversificada. Logo, considero que a investigao a base sustentadora de um ensino de qualidade, no fundo, investigao e ensino so as duas faces de uma moeda.

ensaioJoo medina

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o Z povinho, totem nacional portugus

S

urgiu o Z Povinho graas ao lpis de Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905), na Lanterna Mgica de 12-VI-1875, sobrevivendo desde essa data at aos nossos dias, o que prova, atravs da sua coricea resistncia simblica de mais de cento e trinta anos, que no se limita a uma criao literria, ou meramente satrica da Gerao de 70, antes carrega consigo a simbologia da personalidade base dos Portugueses, como esteretipo nacional que foi e continua sendo. O Z Povinho merece, assim, ser estudado como uma das mais complexas e ricas criaes culturais lusas, como uma inveno genial do satrico artista do Antnio Maria, dos Pontos nos ii e da Pardia, como uma sinopse da prpria mentalidade do povo que o engendrou e nele, atravs dum (duplo) diminutivo to revelador Jos (Z) e Povo (Povinho) , se tornou nosso smbolo totmico retomado por inmeros cartoonistas ao longo da monarquia constitucional, da I Repblica, e, aps a longa vigncia da Censura ditatorial, ressurrecto em seguida ao 25 de Abril, ainda que nos custe aceitar como nosso retrato verdico essa imagem deprimente e incomodamente labrega que nos espreita do fundo do nosso espelho colectivo, aquele rosto bronco de pasccio rural, de campnio mal vestido, barba rala, colete e chapu preto de rstico, calas de fazenda ruim, mos nos bolsos, riso alvar, espcie de resignado Sancho Pana sem um cavaleiro da Triste Figura que o quixotize e lhe comunique um Ideal superior. Esta criao de um mito nacional algo que valer para sempre a Rafael Bordalo Pinheiro o nosso respeito pelo grande artista que a imaginou com o seu lpis crtico e realista. Este prottipo nacional, criado desde 1875 por um artista satrico, membro da gerao setentista e, nessa medida, praticante (e militante) dum certo realismo por oposio a um outro paradigma, mtico esse, de recorte inteiramente distinto, o Cames do Tricentenrio, proposto pelo sector republicanizante e positivista dos mesmos setentistas , perpetuar-se-ia muito para alm do ambicioso programa palingensico de 1880 e da panteonizao do Bardo da Nao, resistindo a mudanas de regimes e de estatuto social, e, mesmo eclipsado como cartoon numa imprensa vigiada pelo rspido e paranide Lpis Azul salazarista durante quase meio sculo, sobrevivendo a esse longo jejum funcional, refugiado no teatro de revista, na cermica popular e at na lin-

guagem corrente (em expresses como Z pagante e gesto do Z), onde o esteretipo nacional ia cumprindo como podia o seu mester de totem caseiro e de novo Parvo vicentino, xabregas mas manhoso, espcie de Soldado Chveick lusitano ou de Bertoldinho luso, falsamente idiota para melhor escapar aos arbtrios do poder e s bordoadas da polcia, heri da resistncia passiva (disse Jos Leite de Vasconcelos), aquela que um povo sofrido, melanclico e iletrado sabia praticar. O Z Povinho , assim, um ser imaginrio que tem, para alm da sua especial funo satrica ou ldica, um intuito bem conseguido e eficaz de personificar tradicionalmente o Portugus, ou seja, de o representar atravs de um esteretipo nacional, como um smbolo icnico evidente, facilmente reconhecvel pelos leitores dos jornais, e, ao mesmo tempo emblema globalizante, unificador de distintas mentalidades bsicas prprias de estratos sociais diversificados. O Z, figura j mais do que secular, tem mostrado uma persistncia e uma tenaz aptido a resumir de modo praticamente exclusivo a imagem caricatural que os Portugueses fazem de si mesmos, expresso duma virtualidade e duma actualidade que atestam a sua justeza ou a sua adequao a um fundo psicolgico tnico. Muito ao invs do seu quase contemporneo do Tricentenrio, esse outro mito que foi Cames, bardo da grei, o Z nunca se props ento, nem

alguma vez se lembraria depois, ao longo de mais dum sculo de vida, de se oferecer como espelho excelso do Pas. Criao realista e esteretipo satrico desde 1875, estava-se apenas perante um contribuinte pobre que tinha de dar dinheiro para o trono do Santo Antnio da Fazenda e do Governo, sob o olhar atento e suspicaz das autoridades, de chicote, emblemtico na mo. O Z erguer-seia, entretanto, a proporo emblemtica de Vtima nacional de tudo que oprimisse e aviltasse o pas, j como bestinha portadora da Albarda, j como o pobre diabo popular sovado pela polcia e demais tiranos domsticos. Concebido muito sub specie temporis para epitomizar a inrcia, o desconforto atvico e o cepticismo pirrnico dos Portugueses diante do regime constitucional, fontista, esse conjunto de sofismas e fices (A. Fuschini), chamado sistema representativo liberal, o Z Povinho depressa se autonomiza do seu criador para voar com asas prprias, utilizado agora por desenhadores como Leal da Cmara, Celso Hermnio, Valena, Alonso, Stuart de Carvalhais, Hiplito Collomb, Silva e Sousa e tantos outros artistas grficos portugueses posteriores, como, nos nossos dias, Joo Abel Manta, Andr Carrilho ou Antnio Jorge Gonalves, depressa se impondo como aquilo que sempre foi: um smbolo do Portugus, Portugal em pessoa, ou seja, feitogrotesca e ridcula figura

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Biografia- Joo Medina, O Gesto do Z Povinho, da figa ao manguito, Revista da Faculdade de Cincias Sociais e HumanasUNL, Lisboa, 1992-1993, pp.219-230. - O Z Povinho esteretipo nacional: a autocaricatura do Homo lusitanus, in Joo Medina (dir. de). Histria de Portugal dos Tempos pr-histricos aos nossos Dias, Amadora, Ediclube, s.d.(1993, reed, em 1998), vol. XV, pp.49-181 (inclui-se aqui o estudo acima citado, O gesto do Z Povinho da figa ao manguito, pp.115-126, com numerosas fotos de peas de cermica), j publicado na Revista da Faculdade Cincias Humanas e Sociais. -Z Povinho e Cames. Dois plos da prototipia nacional, revista Colquio Letras, n 92, Lisboa, Setembro de 1986, pp.11-21, ilustr. - Z Povinho sem Utopia, Cascais, Cmara Municipal de Cascais, 2004, .ilustr. - Portuguesismo(s), (Acerca da identidade nacional). Ensaio sobre as imagens de marca identitrias, os emblemas, os mitos e outros smbolos nacionais seguido de O Z POVINHO, ESTERETIPO NACIONAL E AUTOCARICATURA DO PORTUGUS DESDE 1875, Lisboa, Centro de Histria da Universidade de Lisboa, 2006, ilustr,. maxime. pp.206-215 e 507-514).-Caricatura em Portugal. Rafael Bordalo Pinheiro, Pai do Z Povinho, Lisboa, Edies Colibri, 2008, ilustr.

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ensaiomais conforme a identificar-se com o governo de cada um dos seus respectivos pases , ou o rural Sancho Pana e o seu alter-ego, o nobre cavaleiro Dom Quixote , o Miguel Alemo (deutscher Michel) espcie de conformado Z Povinho teutnico , o matreiro soldado Chveik um imbecil pico muito mais manhoso do que a sua nativa estupidez deixaria supor, especialmente apto a lidar com ocupantes estrangeiros da ptria checa, fossem eles austracos, alemes ou soviticos Com o Z, criado por Bordalo Pinheiro, tocamos na essncia caricatural do portuguesismo, do Homo Lusitanus, ainda que sob o registo do burlesco e da stira, sintetizando a imensa maioria do pas rural, o sector primrio, cujo peso era esmagador na pirmide do nosso oitocentos, ultrapassando

visvel, escarninha e escarnecida duma etnia. Ele Todo-o-Mundo ou ns todos: o Z, nosso esteretipo tnico, expresso de preferncia por via da caricatura. Seria de esperar que, sobretudo, aos estudiosos da cultura popular competisse explicar a aura de trivialidade e mistrio que rodeia o seu manguito: gesto de esconjuro, obscenidade destinada a quebrara o mau olhado hostil, enorme figa de rstico sem finura nem letras, traduo retrica brutal duma recusa libertria ante governos, poderes, polcias, chicotes. Figura cultural e psquica colectiva, smbolo dum ethos tipicamente luso, o Z pertence histria das mentalidades: ele mito e imaginrio, nossa imaginao, e afectividade, modelo nacional e figura historicamente situada, traduo profunda de sonhos, obsesses, anseios, tropismos, fobias, medos, aspiraes, paixes, rotinas, etc. Homem crdulo e incrdulo, submisso e revoltado, humilde e orgulhoso, ablico e voluntarioso, indiferente e compassivo, egosta e dadivoso, azedo e bonacheiro, o Z opera diversas coincidncias de opostos que nem sempre tm a sua realizao dialctica: uma vez por outra, a Histria solicita-o para alm da sua esfera de rotinas e regularidades anmicas, e vemo-lo ento transviado, excessivo. Advertira-o Ramalho Ortigo: ele deseja, sobretudo, atirar a albarda ao ar, tendo do Estado e do Governo ideias demasiado vagas, embora possa explodir de quando em vez, em certos dias tempestuosos chamados revolues. Num pas de consabidos brandos costumes, este labrego capaz das cleras mais homricas, sempre traduzidas em linguagem gestual, uma vez que ele, como ignaro boal que , no sabe recorrer Palavra. Talvez s assim compreendamos que um povo pacfico, indolente, preguioso, acanhado, rotineiro, tmido e quase que ablico, apegado ao seu torro natal, avesso a aventuras e atrevimentos, receando e voltando at as costas ao mar que o acompanha de norte a sul, pouco propenso a imaginar sistemas e ideias espaos metafsicos, ou parasos perfeitos (no temos, como comunidade cogitante, averso a sumptuosas arquitecturas da Imaginao e da Esttica moral a que chamamos, desde Thomas Morus, utopias no somos um povo que curiosamente nunca produziu nsulas imaginrias, embora as andssemos sacando do mar desde o sc. XV?), talvez s assim, dizamos, compreendamos que esse mesmo povo tivesse realizado a esgotante gesta de quinhentos, dilatando os horizontes fsicos e morais do mundo e, feito nauta intrpido, aventureiro temerrio, explorador, homem de cincia ou missionrio, calcorreasse universos, lanando a gente lusa pelo mundo, como dizia Hermann Von Keyserling autor da Anlise Espectral da Europa, como pelouros de um canho espalhados pelo planeta, outros andarilhos, trotamundos e navegadores. Em suma, um acervo de contradies psicolgicas que esto na base da figura afinal complexa e at enigmtica deste esteretipo que to claramente se distancia de outros mulos em categoria ou funes de estereotipia, o John BulI, o Tio Sam este duo anglo-saxnico

ensaioos 60% da populao activa em 1890, quando a Inglaterra nos desfechava a clavina do Ultimato, sob a inrcia duma vida produtiva feita de frustraes e revolues industriais falhadas, duma certa menoridade cultural e cvica, um ser duplamente diminudo no seu irnico (ou carinhoso) rebaixamento onomstico: um Jos Povo que deu em Z Povinho, um ridicularizado pseudodetentor da Soberania, sendo esta suposta residir nesse mesmo Povo soberano desde que os vintistas importaram para esta desolada Baratria os vistosos ideais da Revoluo Francesa e a sua panplia europeia de Direitos, Liberdades e Garantias. Deste modo, o Z era, de facto, um homem rural, espessamente iletrado, um emblema do sector primrio esmagadoramente dominante nas actividades econmicas da populao activa, o que se iria perpetuar por mais algumas dcadas, ao longo dos dois regimes polticos seguintes, a I Repblica e a Ditadura: o sector primrio situar-se-ia nos 49,1% da populao em 1950, contra 24,6 no secundrio e 26,3% no tercirio, evoluindo muito lentamente nas dcadas seguintes, com 43,9% (1960), sendo preciso esperar pelo ano de 1981 aps o 25 de Abril, portanto , para que o primrio impedisse a hegemonia do sector activo mais numeroso da populao, pois nesse ano a sua percentagem desceria para 16%, contra 38,3% no secundrio e 54,5% no tercirio. Por outras palavras, s nesse ano o Z seria finalmente arredado da cspide da pirmide para que o sector activo dominante fosse, doravante, o tercirio, com o qual comea, de modo cada vez mais notrio, a imparvel terciarizao da sociedade lusa: 54,5% em 1991 e 62,8% em 2001. Dito de outra forma, o Z deixou de ser rural s desde 1981, ano em que, pela primeira vez, deixa de representar a hegemonia como sector de agente predominante da actividade econmica1. Antes de mais, o Z Povinho , desde a primeira vez que apareceu numa ilustrao da Lanterna Mgica, um produto directo do Fisco tido como expresso evidente do esbulho, do arbtrio e da violncia sobre o cidado inerme e im-

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O soberano!

O Z - Eu sempre quero vr como que o sr. doutor tapa esses buracos...

pecunioso, todos esses pobres pulhas que somos e adversrio neurastnico e permanente de todos os que governam, ainda que seja incapaz de teorizar sobre a estrutura da Polis ou imaginar sequer, como labrego iletrado que (em 2001, ainda tnhamos, c dentro, 9% de ignaros totais), uma forma de a melhorar ou substituir. O Z um esteretipo satrico concebido para epitomizar a nossa inrcia, o desconforto atvico e o cepticismo pirrnico dos Portugueses diante do regime constitucional, republicano ou socialista, isto , um smbolo do Portugus tal e qual, grotesca e ridcula figura visvel, escarninha e escarnecida, respondendo com o seu brutal e irado gesto obsceno ao malocchio das inmeras e constantes vicissitudes e misrias que vai sofrendo, atravs do Fisco ou doutras formas de ser albardado pelas mos do Estado e pelas interminveis formas que resultam dos desmandos de quem o desgoverna, desse usurpador que se intitula Soberano. Deixando aos demais as tarefas intelectuais de formular uma estratgia superior de rplica poltica ou cultural aos abusos de que vtima inerme, o Z contenta-se, assim, em resistir pela forma tradicional e peculiar da resistncia passiva e, nas ocasies mais abrasivas ou intolerveis, pela exploso gestual, pelo Manguito que resume toda a sua tica, Poltica e Metafsica. E se ainda o estudamos, porque nele se continua a manifestar algo que no envelhece o Portugus tal e qual, o seu psiquismo invarivel. De qualquer modo, mau grado a sua lenta perda de contedo sociolgico notemos que a nica tentativa icnica e onomstica de lhe alterar o apelido e o estatuto social foi praticada pelo cartoonista Hiplito Collomb ao chamar-

lhe Povo (nas pginas do Sculo Cmico) e ao dar-lhe um vesturio de acordo com o esse aburguesamento ou upgrade social, o Z manteria at aos nossos dias, com ligeiras adaptaes darwinianas, um ar inconfundvel de labrego, de rstico analfabeto e rude, j como Z Pagante, Z da Espiga ou o Z da Albarda que viera do campo para a cidade dos polticos para ser assaltado pelo Fisco, sovado pela polcia e cavalgado por mandes e tiranetes das mais desvairadas espcies. O seu contedo simblico manter-se-ia, todavia, central e invarivel, como totem do modo-de-ser nacional, do nosso psiquismo e comportamento. Em termos psicofsicos ou morfolgicos, a o temos de chapu bragus, camisa rude desabotoada, calas de pano com rasges, colete de campnio e botas velhas. No fsico e na indumentria, o Z seria sempre o rural que desce Cidade, de sorriso amarelo e triste, de mos nos bolsos, ligeiramente inclinado para o lado, cabelo desgrenhado, barba rala por fazer, pele curtida e morfologia pesada, de esqueleto forte, musculado, entroncado. Psico-somaticamente, portanto, um pcnico ciclotmico, oscilando entre a alegria e a tristeza, extrovertido e melanclico, eufrico e agitado ou ensonado2. Em suma, o Z, no obstante as suas metamorfoses aparentes ao longo de vrios regimes histricos, manter-se-ia de algum modo inaltervel como um smbolo teimoso que, para alm de uma abundante produo em cermica popular e annima (mas que nunca mereceu o estudo de algum) solicita ainda e sempre a sua presena como esteretipo nacional atravs do qual uma gerao incessantemente renovada de cartoonistas o vai utilizando como porta-voz e emblema duma coricea resistncia sempre passiva, raras vezes explosivamente colrica atravs do gesto desabrido do Manguito, o tal gesto do Z.

notA: 1 Ao criar o Z Povinho no derradeiro quarto de sculo de oitocentos, Rafael teve a intuio notvel ou a perspiccia de lhe dar, desde logo, um estatuto sociolgico que fazia dele a expresso patente e claramente identificvel do sector rural portugus, dominante na pirmide social portuguesa de ento, uma vez que o sector primrio ( a agricultura) ocupava, em 1890, no sector da a populao economicamente activa, 61%, contra 18,4% no secundrio (indstria) e 20,6% no tercirio (servios), situao que era acompanhada, desde 1878, por uma estarrecedora percentagem, 79,2% - de analfabetismo geral dos quatro milhes e meio de portugueses desse perodo, evoluindo com atroz lentido nos anos seguintes: 74.1% (1900), 69,1% (1911), 66,2%(1920), 66,3% (1930), 48,8% (1940), 41,5% (1950), 31,3% (1960), 25,6% (1970), 11,2% (1991) e 9% (2001). 2 Hiplito Collomb, numa srie de postais coloridos, sem data, dos Sete Pecados mortais (os principais polticos da I Repblica), um Z Povinho dormindo representaria a Preguia, sendo o sono esse velho vcio pelo qual h muito Rafael Bordalo Pinheiro simbolizava a sua apatia e alheamento em relao ao espectculo da poltica e do desgoverno nacionais.

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Isabel Brumaescritora

Viver numa escola em moambiquenze semanas na escola de Ontupaia, repartidas por duas pocas, permite-nos ter uma viso bastante clara do meio escolar no Norte de Moambique e das problemticas que lhe so afins. A escola de Ontupaia fica nos arredores da cidade de Nacala, grande porto, mas cidade pobre. Dizem-me que o maior porto da frica Austral, com guas profundssimas que permitem a atracagem de navios de grande calado. Alm disso um porto natural muito bonito, baa extensssima recortada na linha do horizonte por montes de variada altura. Dentro da grande baa uma mais pequena onde os pescadores tm o seu porto. Porque a pesca uma actividade importante nesta cidade. Por isso pode-se comer bom peixe. Porque carne s mesmo frango e porco. Isto quando h dinheiro para a comprar. De facto, a gente aqui tem muitas carncias alimentares e h mesmo fome. Matabichaste? perguntava eu aos alunos. No senhora. E ontem noite, comeste alguma coisa? Tambm no. Por isso muitas crianas mais pequenas adormeciam na aula. Deixo-as dormir porque tm fome explicava-me uma professora. Muitas tinham tinha e embora tivssemos feito diligncias junto da AMI e da UNICEF para conseguir o medicamento, no tivemos resposta positiva, ou porque no seguimos os melhores canais, ou porque somos simples voluntrias sem voz no meio dessas organizaes ou pura e simplesmente porque a distribuio desse remdio no esteja no mbito dos objectivos das mesmas. E assim aquelas cabecinhas iro ficando mais sem cabelo e com mais feridas. O cabelo que faz o orgulho das africanas que o penteiam de mil maneiras, com uma imaginao espantosa. A escola de Ontupaia uma escola bsica com alunos desde a primeira at stima classe e tem agregada a si onze escolinhas para os mais pequeninos, a maioria a funcionar debaixo dos cajueiros. Para quem no conhece o cajueiro uma rvore lindssima, grande e muito frondosa que d a castanha de caju. So mais de mil alunos distribudos por dois perodos horrios: das sete ao meio-dia e da meia hora s cinco e meia da tarde. Mas o problema, o grande problema o fraqussimo aproveitamento. E ns que trabalhamos nas turmas e com os professores pudemos perceber o porqu de tal situao. Para alm de haver poucos professores para o nmero de alunos (60 alunos por turma, no mnimo), numa escola desta dimenso no h um nico professor licenciado. Alguns tm apenas o dcimo ano e os que procuram desenvolver os seus conhecimentos tm de se deslocar de chapa (nenhum

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Dr

professor tem automvel. Deslocam-se para a escola em bicicleta ou em motoreta) cerca de 200 quilmetros para ter dois dias intensos de aulas e regressarem em seguida a casa sem meios de estudo. No h biblioteca na universidade? perguntei eu. H, mas o tempo que l estamos todo passado em aulas e depois temos de regressar. J tentaram a internet? perguntei, como se no conhecesse a resposta. De facto o acesso internet restrito e caro. Alis nenhum professor tem computador. Vrios deles vieram ter comigo queixando-se da falta deste instrumento de trabalho. No temos dinheiro. Fui informar-me. Um vencimento mximo de 6000 meticais para um computador de 32000 meticais no mnimo! De facto! Mas h outros problemas mais graves ainda. A falta de sade um deles. impressionante as pessoas que adoecem, seja com malria, seja porque so doentes crnicos de Sida (um autntico flagelo nestas paragens.) Di-me a cabea; di-me a barriga so queixas permanentes que escutamos a cada momento seja das crianas seja dos adultos. A morte ronda sempre por perto e chega a ser deprimente a sensao da sua presena. Vim de l h trs meses e j morreram neste perodo vrios alunos com malria e outros, assim como professores, estiveram internados! Com progressos to fulgurantes no campo da medicina, como que se no investe na procura da cura deste flagelo africano, e no s? mais uma vez o dinheiro a comandar as prioridades dos homens. Fosse a malria a afligir os

europeus ou os americanos e a cura estaria j vista. Um terceiro problema muito grave o Portugus. Lngua obrigatria na escola, um muito deficiente meio de comunicao e de trabalho porque as crianas chegam escola sem saber portugus e em casa s falam macua porque os pais no falam a lngua oficial. Assim temos alunos que chegam quinta classe sem literalmente saber ler. Fiz vrias experincias em turmas diferentes, contando s crianas histrias elementares como, por exemplo, Os Trs Porquinhos, ou outras ainda mais simples inventadas por mim e com uma linguagem expressamente bsica e aconteceu que muitas vezes tive de recorrer traduo em macua para que eles percebessem, nomeadamente nas primeiras classes. E poderia continuar por aqui fora no muro das lamentaes. Mas s para concluir, h um facto que me faz doer a minha conscincia de portuguesa. que estivemos l tantos anos, gabvamo-nos na altura de sermos civilizadores e afinal acho que fizemos muito pouco. Chegada quela zona de frica senti-me andar para trs cinquenta, sessenta anos, quando as pessoas eram analfabetas numa grande maioria e mantidas num estado de minoridade mental. Foi isso que eu senti em frica. Ter de passar pelo menos uma gerao para que aquelas pessoas estejam ao nvel do desenvolvimento actual da Europa e aptos absorver um conhecimento que, sem anular a cultura prpria, os abra para uma cultura universal.

lusofoniaAdelto Gonalvesescritor

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falando portugus na rssiatrabalho do Centro lusfono Cames, de so petersburgo, muito importante na difuso da lngua portuguesaque leva um jovem russo a procurar aprender o idioma portugus? Para Diana Shpilevskaya, 22 anos, tudo comeou em 2005, quando foi a Inglaterra aperfeioar o seu ingls. Estudei numa cidade pequena chamada Exeter e meu curso durou duas semanas num grupo de 12 pessoas, das quais oito eram do Brasil, diz. L, pela primeira vez, ouvi a lngua portuguesa na vida real e a achei to bonita que, ao voltar para a Rssia, comecei a estud-la sozinha, conta. Assim, aqueles oito estudantes brasileiros mudaram a minha vida sem que soubessem disso, acrescenta Diana, que graduada pela Faculdade de Letras Estrangeiras da Universidade Estatal Pedaggica Hertzen, de So Petersburgo, e sonha fazer mestrado na Universidade de So Paulo. Para Vitaly Violino, 24 anos, foi o interesse pela arte da capoeira, que conheceu h cerca de cinco anos por meio da Internet, a razo que o levou a procurar aprender portugus. Precisava aprender uma tcnica de defesa pessoal, justifica. Depois de ter passado cinco semanas em Salvador, aprendeu todos os passos dessa arte e, hoje, em So Petersburgo, d aulas para cerca de 50 alunos. Com freqncia, participa de encontros com capoeiristas brasileiros na Europa. Por isso, falo um portugus abaianado, diz Vitaly, que costuma cantarolar canes do compositor baiano Dorival Caymmi (1914-2008). J Maria Rybakova, 21 anos, primeiro aprendeu o idioma espanhol e, em razo da proximidade entre as duas lnguas, quis conhecer melhor o portugus. Estudo portugus porque gosto de Portugal e do Brasil, diz, lembrando que o portugus, por ser uma lngua romnica e rara, sempre a atraiu. Alm disso, o Brasil se tornou importante na Rssia por causa do Bric [Brasil, Rssia, ndia e China], observa. Sem contar que gosto muito dos professores do Centro Cames, acrescenta. Por sua vez, Gleb Poltorak, 22 anos, igualmente graduado, o intelectual do grupo, entendeu que saber falar portugus o faria discutir com mais conhecimento de causa as questes polticas e econmicas da Amrica Latina e do mundo. Formado pela Universidade Estatal Pedaggica Hertzen, Gleb, por enquanto, s pode dar aulas em colgios. Para dar aula em faculdade, preciso ter pelo menos mestrado (stepen magistra), observa, reclamando do fato de o professor hoje na Rssia no ser muito valorizado nem respeitado. Os salrios so baixos e o professor para sobreviver precisa dar aulas em quatro ou cinco instituies, queixa-se, demonstrando preocupao com seu futuro.

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Dr

Director do Centro Lusfono, Vadim Kopyl ( esquerda), e o escritor Adelto Gonalves

O fato que une esses jovens que todos so formados em Lngua Portuguesa pelo Centro Lusfono Cames da Universidade Estatal Pedaggica Hertzen. No raro, renem-se, ao final da tarde, num restaurante da rua Naberezhnaya Kanala Griboedova, margem do canal Griboedova, perto do imponente Templo da Ressurreio de Cristo, mais conhecido como Salvador Sobre Sangue, que est construdo no lugar em que morreu o czar Alexandre II (1818-1881), vtima de um atentado a bomba. E qual o objetivo da reunio? Ora, conversar em portugus e exercitar o idioma que aprenderam alguns com sotaque luso e outros com o falar mais adocicado dos brasileiros. Fundado em 1999, o Centro Lusfono Cames comea o ano, em mdia, com 15 estudantes russos de portugus. Os estudantes entram no nvel zero, passam para o nvel mdio, chegando ao nvel superior. Em mdia, formamse de sete a oito alunos por ano. Mas a tendncia que esse nmero cresa. Por iniciativa do Centro, uma escola secundria de So Petersburgo j manteve em sua grade o portugus como lngua facultativa, mas acabou por voltar atrs. A esperana, porm, que a sua direo reconsidere a ideia, j que isso significaria um potencial alargamento da lista dos freqentadores do Centro em futuro prximo. Todo esse esforo para a difuso do idioma portugus na Rssia tem um nome: Vadim Kopyl, doutor em Filologia Romnica, diretor do Centro Lusfono Cames. O Centro, inaugurado a 16 de junho de 1999, em ato prestigiado pelo

embaixador de Portugal, Jos Lus Gomes, e pela embaixadora do Brasil, Teresa Maria Machado Quintella, funciona dentro do campus da Universidade Estatal Pedaggica Hertzen que formado por vrios palcios adaptados s necessidades de ensino, no centro histrico de So Petersburgo, cidade que mais um museu a cu aberto, tambm conhecida como a Veneza do Norte. Pouco depois de sua fundao, o Centro produziu uma edio eletrnica dos Sonetos de Cames, que teve prefcio da professora Maria Raquel de Andrade e contou com o apoio dos professores Jos Manuel Matias, Zlia Madeira, Rogrio Nunes, Alexandra Pinho e Madalena Arroja, do Instituto Cames, de Lisboa. Desde ento, publicou vrios livros impressos, como o Guia de Conversao Russo-Portuguesa Contempornea, Poesia Portuguesa Contempornea (2004), que rene poemas de 26 poetas portugueses traduzidos com participao de Helena Golubeva (como tradutora-tutora), e Vou-me embora de mim (2007), do poeta portugus Joaquim Pessoa, todos em edio russo-portuguesa. O Centro tem ainda preparado espera de apoio financeiro para publicao um livro de contos do escritor portugus Gonalo Tavares, que contou com a participao do prprio autor. Alm do Instituto Cames, o Ministrio da Cultura, o Instituto Portugus do Livro e das Bibliotecas, o Colgio Universitrio Pio XII, a Universidade Clssica de Lisboa, a Universidade Internacional de Lisboa, a Universidade Lusfona e a Universidade de Aveiro so algumas

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lusofoniaDr

das instituies culturais portuguesas que tm cooperado com o trabalho dos lusistas russos. O Centro funciona numa pequena sala atulhada de livros, cartazes e fotos. No centro da sala, fica uma grande mesa em volta da qual se acomodam os alunos, sentados em no mais que quinze cadeiras daquelas tradicionais. Na parede, h ainda uma pequena lousa, ao lado de trs armrios envidraados que guardam livros portugueses, na maioria. Perto da janela, h uma pequena mesa decorada com livros, jornais e revistas em memria de Drio Moreira de Castro Alves (1927-2010), embaixador do Brasil em Portugal de 1979 a 1983, scio-honorrio da instituio.A AlmA Do Centro

Aos 70 anos de idade, o professor Kopyl poderia passar o resto de sua vida descansando em Ukraine, mas isso s o faz em julho e agosto, meses de vero intenso e de noites brancas em So Petersburgo. No resto do ano, dedica-se ao Centro: ele mesmo quem d as aulas, dividindo-as com um intrprete-sincronista, Vladimir Ivanov. At h pouco tempo, tinha tambm a colaborao de Helena Golubeva, que o auxiliava no ensino de portugus e dava aulas de traduo. As comunicaes dos estudantes dedicadas aos contatos culturais entre a Rssia e os pases do mundo lusfono so lidas em portugus durante as aulas e, em russo, em alguns atos realizados nas bibliotecas municipais ou na casa-museu de Anna Akhmatova (1899-1966), uma das mais importantes poetas russas do sculo XX. Alm da aprendizagem de portugus, os estudantes recebem conhecimentos bsicos de traduo literria, conta Kopyl, lembrando que mestres de traduo do russo para o portugus, como Helena Golubeva, Alexandra Koss, Andrei Rodossky, e tambm a poeta e tradutora Veronica Kapustina, laureada com o prmio Anna Akhmatova, a etngrafa Elena Soboleva e o perito em artes e poliglota Mark Netchaev, j estiveram em contato com os alunos do Centro. inesquecvel a aula simultaneamente de lngua, arte e filosofia que Mark Netchaev costuma dar aos nossos alunos nas salas do Museu Hermitage, garante. Neste ano, o Centro contar com o apoio da leitora Maria Joana Albuquerque, do Instituto Cames. Nos ltimos tempos, recebeu grande contribuio de Joo Santos e Joo Carlos Mendona, tambm leitores do Instituto Cames. Com Joo Santos, o professor Kopyl preparou uma espcie de manual de portugus falado em dilogos, que se tem mostrado muito til na aprendizagem do idioma. A aproximao do professor Kopyl com o idioma portugus deu-se muito cedo, mas depois que j aprendera o espanhol e fora requisitado, ainda estudante, para trabalhar em Cuba como intrprete em 1962. Naquele tempo da Guerra Fria, poucas pessoas falavam espanhol na Rssia, lembra. Quando estvamos no hotel em Havana e olhvamos para o Mar do Caribe, no tnhamos ainda noo dos riscos que a Humanidade corria naqueles dias, observa, referindo-se implicitamente crise dos msseis entre Estados Unidos e Unio Sovitica. Ao voltar para a Universidade, comeou a estudar portugus como autodidata, mas com grande ajuda de um jovem professor, Anatolio Gakh, nascido no Brasil, com quem mantm amizade at hoje. O tema de sua tese de mestrado j foi em portugus Lngua e estilo de Ea de Queiroz , bem como o tema de sua tese de doutoramento, trs anos depois Lngua e estilo de Fernando Namora.

Alunos do Centro Lusfono e cadetes e oficiais do navio-escola Brasil

Mais tarde, Kopyl manteve relaes pessoais com o padre Joaquim Antnio de Aguiar (1914-2004), fundador e diretor do Colgio Universitrio Pio XII, de Lisboa, e presidente da Academia Internacional da Cultura Portuguesa, que acabaram por aproxim-lo da cultura lusa. Para a fundao do Centro Lusfono Cames, grande foi o apoio daquela instituio. Alunos do tradicional colgio lisboeta e do Centro Lusfono participaram de fruns realizados no Brasil, Portugal e Macau. Por sua parte, o Centro ajudou a Comisso da Cultura Europeia do Colgio Universitrio Pio XII a organizar dois fruns estudantis em So Petersburgo. Por intermdio do padre Aguiar, Kopyl acabou por conhecer Drio Moreira de Castro Alves, que poca j estava empenhado em traduzir para o portugus o romance em versos Eugnio Oneguin, de Alexandr S. Pushkin (17941837), que seria, finalmente, publicado em 2008 pelo Grupo Editorial Azbooka-Atticus, de Moscou, em edio russo-portuguesa, e no Brasil em 2010 pela Editora Record, do Rio de Janeiro. Das consultas e dvidas sobre os dois idiomas, nasceu uma amizade que se solidificou com os anos. Fosse como fosse, as ligaes de Kopyl sempre foram maiores com Portugal como denuncia o seu sotaque lusitano. Conheo do Brasil s aquilo que li e ouvi a respeito, mas gostaria imenso de conhec-lo de perto, diz. Em Portugal, Kopyl esteve vrias vezes, mantendo contatos com intelectuais como Antnio Ramos Rosa, Gasto Cruz, Casimiro de Brito, Fernando Guimares e Fernando Echevarria, entre outros, a propsito da preparao de uma antologia de poetas portugueses. Foi a partir das ligaes com Drio Moreira de Castro Alves que, nos ltimos tempos, o Centro Lusfono Cames passou a registrar maior presena da cultura brasileira. Com o apoio do Ministrio das Relaes Exteriores do Brasil e da Embaixada brasileira em Moscou, o Centro pde publicar os livros Contos, em 2006, e Contos Escolhidos, em 2007, ambos de Machado de Assis (1839-1908), em edies bilnges. At ento, da obra de Machado de Assis s os romances Memrias pstumas de Brs Cubas e Dom Casmurro haviam sido traduzidos para o russo. Por enquanto, h outros projetos de lanamentos em edio bilnge espera de apoios financeiros de entidades culturais tanto de Portugal quanto do Brasil. Gos-

taramos que essa cooperao se ampliasse com outras instituies culturais brasileiras, no se limitando ao apoio da Embaixada brasileira em Moscou, acrescenta.portuGueses em so petersBurGo

Kopyl lembra que seus estudantes j localizaram a participao destacada de dois portugueses na histria de So Petersburgo, preparando informes sobre essas personalidades. Um deles foi Antnio Ribeiro Sanches (16991783), clnico de renome em Londres, que foi contratado como mdico do Senado e da cidade de Moscou em 1731, mas que depois manteve residncia em So Petersburgo, servindo ao Imprio Russo at 1747. Outro foi Antnio Manuel de Vieira, ou Antn Devier (1682?-1745), que no s foi o primeiro chefe de polcia de So Petersburgo ( poca, o termo polcia englobava tambm a administrao pblica das cidades, no se restringindo atuao repressiva policial, como se conhece hoje) como participou de obras nos canais do norte da Rssia e dirigiu a construo de dois importantes portos martimos o de Revel (agora Tallin) e o de Okhotsk, durante o reinado do czar Pedro I (1672-1725), alcunhado Pedro o Grande, que, em 1703, mandou edificar So Petersburgo, a nova capital da Rssia. Segundo Kopyl, ao analisar as propostas de Ribeiro Sanches, os alunos do Centro puderam concluir que, com certeza, houve participao daquele estrangeirado luso na prpria fundao da Universidade Estatal Pedaggica Hertzen, em 1797. Como se sabe, a nossa universidade surgiu daquilo que primeiro era um asilo, organizado para crianas rfs, tal como a Casa Pia, de Lisboa, criada pelo intendente-geral de polcia Diogo Incio de Pina Manique (1733-1805), diz, lembrando que a necessidade de se criar asilos para crianas rfs foi argumentada por Ribeiro Sanches numa carta que supostamente era dirigida a Ivan Betskoi (1704-1795), organizador do asilo em So Petersburgo. Alm disso, no sculo XVIII, lembra Kopyl, importante destacar a presena da cantora lrica portuguesa Lusa Todi, natural de Setbal, que, a partir de 1784, esteve por quatro anos na corte de Catarina, a Grande, em So Petersbugo. Em sua estada na Rssia, Lusa Todi escreveu com o marido, o violinista Francesco Todi, a pera Pollinia, como expresso de agradecimento pelas atenes recebidas da czarina, ressalta.

latinIdadesAntnio fournierescritor

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Viajando a bordo da fragata palladaPara Alberto Taddeivan sorveu profundamente o fumo do charuto, depois expirou-o fazendo um barulho com a boca como um peixe que acaba de produzir uma bolha de ar. Est sentado mesa de madeira, de perfil contra a janela em forma de vigia. Vejo o fumo subir, formar uma pequena nuvem, como um pensamento indefinido que fica a pairar sobre a sua cabea, antes de volatizar-se. Depois do almoo, um bom charuto e um copo de vinho Madeira, o ambiente fica ameno e sonolento. Sorvemos o vinho e falamos do carcter dos ingleses (Goncharov no tinha uma grande opinio sobre eles, mas invejava-lhes secretamente o esprito de iniciativa que faltava aos russos). um tempo morto, mas higinico: ele suspende o trabalho de escrita, levanta-se e espreguia-se, d alguns passos a madeira geme debaixo dos seus ps pesados sai para a varanda e desaparece. s vezes vou tambm eu fora e ficamos a contemplar o horizonte ou a comentar o voo das aves de arribao que tm estado a chegar neste princpio de Outono ao Parque de San Rossore. Descomprimimos um pouco, gracejamos, aproveitamos para apanhar moscas. assim que o meu interlocutor baptizou os intervalos: Moscovo em italiano diz-se Mosca. Estamos numa casa de pescadores mesmo na foz do Arno. uma palafita em madeira, apoiada sobre estacas cravadas numa exgua fileira de rochas baixas mesmo entrada do rio. De cada lado da casa h duas imensas redes suspensas que ao baixarem, capturam o peixe. Os pescadores chegam muito cedo, antes do amanhecer so dois: um homem velho, robusto e si-

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lencioso que parece o av (av como se chama afectuosamente qualquer pessoa mais velha em russo), e o mais novo que expedito e tagarela, e tem sempre um sorriso florentino nos lbios (e aqui diria que faz lembrar o excntrico Tichmenev, o oficial encarregado da despensa de bordo). Vemo-los da janela a iarem as redes, e ouvimo-los comentar o fervilhar prateado que roubam todos os dias s guas. Mesmo sem ver o peixe, sabemos distinguir se a faina foi profcua ou no, a partir das suas vozes. O mais velho lacnico e responde invariavelmente com uma imprecao ou uma blasfmia. Acordamos com eles, so o nosso galo, e bastante divertido despertar ao som do dialecto pisano. Alugmos a casa para os prximos seis meses o tempo de acabarmos a traduo mas no sei se conseguiremos passar aqui os meses de inverno, no deve ser fcil resistir ao frio. E depois, apesar de as estacas de madeira me parecerem suficientemente altas, no sei at que ponto resistiro a uma tempestade. Ontem mesmo, ao anoitecer o mar levantou-se e acordei vrias vezes sobressaltado. Ao mnimo rangido, imaginava a casa a avanar na escurido como uma jangada deriva. Em todo o caso, julgo que estas sensaes o medo que se insinua lentamente, a viso apaziguadora do crepsculo, o rulho constante do mar e a vaga sensao de enjoo so teis, para recriar de algum modo as condies de vida no interior de um navio. Esta casa foi o mais prximo que conseguimos arranjar de uma fragata. As duas imensas redes do palafita um aspecto potico de veleiro, misto de casa, barco e

ave. Curiosamente, em italiano, usa-se a mesma palavra albero para designar quer a rvore quer um mastro de um navio. A casa tem dois mastros que suportam de cada lado o peso das redes e bem se poderia dizer que so o mastaru da gvea e o gurups do nosso navio. No deixa de ser engraado que, em russo, para dizer os pssaros voam, se diga os pssaros nadam no cu. Ivan volta a entrar no nosso cubculo, e ao sentar-se na mesa desengonada, graceja: Aqui os mveis no os come o caruncho, mas sim as enguias! Voltamos ao trabalho. Como se pode traduzir sordo frastuono em portugus? pergunta. No conheo a expresso e ele cita-me um verso de Leopardi: E come il vento / Odo stormir tra queste piante, io quello / infinito silenzio a questa voce / Vo comparando). Tambm ns no vemos o Infinito que se esconde por detrs da sebe densa de palavras. Mas pelo menos, temos um termo de comparao: esta casa suspensa sobre estacas na foz de um rio, longe da terra firme, diante do mar aberto, como metfora coerente da condio de semi-exlio das nossas respectivas lnguas. Ele, o meu interlocutor italiano, traduz do russo para o portugus, com passagem pelo italiano, e eu, o seu fiel servo Fadaeev, tenho como tarefa ajud-lo a aclimatar a traduo minha lngua. Tambm ns baixamos todos os dias a rede e ficamos espera dos peixes trazidos noite com a mar. No muitos, o suficiente para uma rao diria de trabalho. Trabalho penoso, de arte e pacincia, o que nos espera. Temos uma longa viagem pela frente. Comemos a 7 de Outubro (tambm aqui tentmos respeitar as simetrias: o dia em que a fragata partiu de Kronstadt). J atravessmos o Bltico e o mar do Norte e fizemos uma longa escala em Portsmouth o tempo necessrio para que a fragata fosse preparada para a longa travessia transocenica. Estamos agora a sair do canal da Mancha. Finalmente viajamos a srio. A silhueta lisa, branca e esguia do farol de Eddyngton ergue-se ao longe. No Atlas das estradas da Europa, percorremos a costa inglesa. L est o farol. Estamos finalmente a entrar no grande oceano.notA: Em Outubro de 1952, o escritor russo Ivan Alexandrovich Goncharov, talvez movido pelo desejo de desafiar o destino e demonstrar a si mesmo e aos outros que era capaz de actos de coragem, aceitou o cargo de cronista da primeira expedio russa ao Japo. Ele que nunca tinha viajado por mar, que para mais era autor desse heri imortal da preguia que Oblomov, viu-se de um momento para o outro catapultado para bordo de uma fragata onde iria viver os prximos trs anos, atravessando trs oceanos. O autor deu-nos conta dessa viagem num magnfico livro intitulado A fragata Pallada. Nele, h dois captulos dedicados respectivamente Madeira (onde o escritor saboreia pela primeira vez uma banana) e a Cabo Verde (onde entra por engano numa casa em Porto Praia e tem um curioso dilogo com uma jovem portuguesa que o impressiona). relao ao espectculo da poltica e do desgoverno nacionais.

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A natureza como um santurio de inspiraoIsabel Fernandes

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dois anos que Lusa Prior vem desenvolvendo um projecto fazendo com que interrompesse o seu hbito de realizar uma exposio de novas obras por ano que lhe foi imposto de fora: um desafio que a prpria natureza me lanou. E por isso, no obstante a natureza estar muito presente nos seus trabalhos anteriores, Lusa Prior dedica agora um vasto conjunto de obras s natureza. E pela primeira vez a artista plstica apresenta uma mostra temtica, onde o objecto foi vivido em todos os quadros mistura do urbanismo, para que este e a natureza se envolvessem. O projecto foi desenvolvido na vertente das quatro estaes e dos quatro elementos [gua, Ar, Terra e Fogo] e mais um: o prprio universo que os engloba. As diferenas no representam uma ruptura no percurso artstico de Lusa Prior, ser apenas mais um passo num caminho que tem vindo a construir patamar a patamar e sempre com grande presena das cores. O que se mantm neste conjunto de obras: A paleta praticamente a mesma, pois a natureza d-nos tudo. o meu santurio de inspirao. Basta observar, que sempre o seu ponto de partida. Numa juno de alguns desejos, O Universo e o Tempo, inaugura no prximo dia 22 de Outubro, pelas 15h30, na Casa-Museu Teixeira Lopes, em Vila Nova de Gaia, e que estar patente at ao dia 30 de NoFogo da paixo vembro. Sero 20 quadros, onde

Cidade de fogo

Auto-retrato

se inclui um auto-retrato em grafite sido ao longo do meu trabalho a minha exprese sangunea. Sero apresentadas so. Lusa Prior hoje uma pintora respeitada duas peas em acrlico sobre pelo pblico e pelos seus pares, o que a deixa papel, uma aguarela e os resfeliz, com a certeza de ter realizado o seu sonho tantes em acrlico sobre tela. de sempre foi sempre um sonho estar nas arTodos realizados com esptes, adiado, mas que tem ido muito alm do que tula, que gosta de usar pelos imaginava e reitera ainda estar na arte por pormenores que lhe permite amor arte e para contribuir para a cultura do elaborar. um trabalho de meu pas. Esta mulher que tardou a dedicar-se cor, alma e paixo. Adorei fazer sua arte e que no revela qualquer nostalgia este trabalho, para mostrar ao ppelo tempo ainda assinala as horas que dedica blico que a natureza pode ser visao seu trabalho e explica que quando se inicia ta de vrias formas e que no deiuma obra e se est inspirada tem que se dar xa de ser bela. Ela sempre bela mesmo quando continuidade durante horas. No com a intennos transmite medo, mesmo quando se zanga, o de o acabar, pois partilha da ideia que uma atravs de exploses e tempestades. obra nunca termina, o artista tem que se forar E como que nasce a obra? Quando a abandon-lo e h um truque: virse est muito envolvida, quanlo. Quando falou ao jornal As do deixamos de estar com Artes entre As Letras, cerca os ps na terra Quando de duas semanas antes da pinto no vivo o preseninaugurao da mostra, te, desenvolvo a minha Lusa Prior j deixava pintura que o futuro. adivinhar que est com Parece simples mas muitos outros projecto pouco o quando tos e, mesmo no quetenta explicar o nascirendo deixar escapar mento de cada obra, que qualquer ideia para o resulta como uma parte futuro, revelou que a esde si prpria: No h porcultura est nos seus plaqus no surgimento da obra, nos, pois trabalhar metais diz categoricamente, acrescenoutro dos seus gostos e das suas Universo tando que pintar e desenhar tem aptides.

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um homem singular na pluralidade das artesGuido Arturo palomba, um dos especialistas cujo nome nos remete para os grandes mestres em psiquiatria criminal, entre imensas e prestigiadas funes, membro emrito da Academia de medicina de so paulo. Com mais de trs dcadas de experincia e auxiliando a Justia de so paulo, este mdico brasileiro autor de quase dez mil pareceres psiquitricos, bem como escritor de nvel superior e com registo de autoridade, sobre a mente criminosa. Guido paloma toma posse dia 22 de outubro, como diretor cultural da Associao paulista de medicina, em cerimnia que acontecer no teatro municipal de s. paulo.

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uido Arturo Palomba, uma referncia para juzes, advogados e at para a prpria imprensa. O seu percurso profissional absolutamente invejvel, sendo o que lhe confere mais orgulho o seu Tratado de Psiquiatria Forense, Civil e Penal (Atheneu, 2003), o primeiro em lngua portuguesa e um dos poucos no mundo. Palomba tambm co-autor de 450 Anos de Histria da Medicina Paulistana, editado pela Associao Paulista de Medicina e publicado em 2004. Guido Arturo Palomba, tambm um artista no sentido da criao e da sua paixo pela expresso artstica. Isto , a sua sensibilidade para as artes plsticas de tal modo mpar que enquanto curador da Pinacoteca da APM, apostou na seleco dos grandes mestres contemporneos como Inos Corradin, Ivald Granato, Maria Bonomi, Aldir Mendes de Souza, Antnio Maia, Antonio Peticov, Claudio Tozzi, Arcangelo Ianelli, Gustavo Rosa, Gustavo Von Ha, Alex Flemming, entre outros, para expor e participar do projecto de ampliao do acervo. Tambm o Mestre Adelino ngelo no lhe foi indiferente, pelo contrrio, sobre o Louco (obra que pertence ao acervo do mestre A.A.), quem melhor que Guido Arturo Palomba para explicar to denso texto pictrico. () Grassa no pensamento de muitas pessoas que quanto mais louco for o artista mais talento ter. No bem assim. () Ora, perguntar o leitor: Vincent Van Gogh, Francisco de Goya, Robert Schumann e Emanuel Schikaneder, para citar apenas dois pintores e dois msicos, no tiveram as suas loucuras e no esto entre os maiores gnios, quer da pintura quer da msica, de todos os tempos? Portanto, concluir o leitor, loucura

Pintura a leo de Guido Arturo Palomba pelo Mestre Adelino ngelo

e genialidade associam-se sim senhor. ( ) Com todo o respeito, essa afirmao contm um equvoco, pois, um fato absolutamente certo: quando o artista est no perodo agudo da doena mental no produz nada, somente o faz ao sair ou j livre da psicopatologia flrida. E mais, dependendo da doena mental de que padece, se for alguma daquelas que ao remitir o surto deixam defeito, como a esquizofrenia paranoide, provavelmente no mais haver desempenho artstico de qualidade, se o tinha antes de adoecer, seja na msica, seja nas ar-

tes plsticas ou em qualquer outra modalidade em que o sentimento, a intuio e a sensopercepo, muitas vezes tambm o pensamento, tm que estar no seu mais refinado nvel para produzir com qualidade. Isso porque a criao artstica ocorre no momento em que se equilibram e se harmonizam as esferas psquicas interiores. nesse passo que nasce a obra de arte, como expresso e materializao do psiquismo do gnio, que fora fecundado pelas musas (e pelos demnios), que lhe deixaram a mente abaanada, em estado de vesnia. Porm, prenhe. Interessante notar que a loucura, s vezes, como se fosse a normalidade mental vista com lente de aumento desfocada. Muitos sinais e sintomas clnicos so exacerbaes do comportamento normal. Assim, alienados mentais serviram, e ainda servem, de modelo aos grandes mestres da pintura, que deles extraram e extraem a essncia trgica da natureza humana. Na atualidade, no mundo ocidental, quem melhor retrata essas figuras da misria o grande Mestre Adelino ngelo, portugus de Vieira do Minho, verdadeira reencarnao de Goya, de El Greco, o herdeiro da luz de Sorolla. Ilustra este artigo O louco, de sua autoria, de grande fora expressiva. Guido Arturo Palomba que sublinha os institntos como parte integrante do Homem, como nenhum outro o conseguiu, a sua sapincia exige-lhe a fundamentao de to profunda observao. E de forma magistral consegue dissertar sobre arte, sem exerccios de erudio oca, mas to s pela profundidade e saber que as suas lies so capazes de transmitir. Guido Arturo Palomba, um clnico pensador que encontra na Arte a janela do sublime.

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A cada passo um desafio a cada desafio uma vitriaA Cmara municipal de so paulo concede, no prximo 18 de outubro, Dia do mdico, a medalha Anchieta e o Diploma de Gratido da Cidade de so paulo ao actual presidente da Associao mdica Brasileira e futuro presidente da Associao mdica mundial para o ano 2011/2012. A tomada de posse ser no uruguai em montevideu. pela primeira vez a lngua lusfona estar representada em to prestigiada instituio, que equiparada organizao mundial de sade.tuio. A cerimnia de posse ocorrer este ms em Montevideu (Uruguai). No campo das atividades culturais: promoveu a reestruturao do suplemento literrio; incentivou a reforma e ampliao das instalaes da Pinacoteca da APM, que uma das maiores colees privadas do pas. As artes plsticas so tambm uma sua paixo, e v no Mestre Adelino ngelo uma genealidade tocante. Na esfera musical, auxiliou o desenvolvimento de programas que funcionam at hoje como: Msica em Pauta, Msica ao Meio-Dia, Clube do Jazz, Msica Popular Paulista, Msica nos Hospitais e Festival Mdico Msico. Participa do programa Agita So Paulo e Agita Mundo. No mbito internacional, teve parte na fundao e desenvolvimento da Comunidade Mdica de Lngua Portuguesa, da qual presidente at agosto de 2011. Participa ativamente da Confederao Mdica Latino-Americana e Caribe e do Foro Iberoamericano de Entidades Mdicas, buscando a integrao entre os mdicos latinoamericanos e os da Pennsula Ibrica. Auxiliou na organizao do Congresso Mdico do Centenrio Brasil-Japo que teve como objetivo reconhecer a contribuio da imigrao japonesa para a Medicina brasileira. Atualmente, alm das aes de solidariedade como a misso AMB-SOS Haiti, articulao com o Ministrio da Defesa e com os Servios de Sade das Foras Armadas para integr-las sociedade mdica civil, trabalha em projetos de segurana no trnsito e de combate ao abuso de lcool e outras drogas.

Pintura a leo de Jos Luiz Gomes do Amaral por Mestre Adelino ngelo

os Luiz Gomes do Amaral nasceu em So Paulo a 24 de fevereiro de 1950, mas possui dupla nacionalidade (brasileira/portuguesa). Graduado e ps-graduado pela Escola Paulista de Medicina/ Universidade Federal de So Paulo (EPM/ Unifesp), especializou-se em Anestesiologia e Medicina Intensiva com ttulo de especialista reconhecido pela Associao Mdica Brasileira, Associao de Medicina Intensiva Brasileira e Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Entre 1983 e 1984, fez especializao em Terapia Intensiva na Faculdade de Medicina da Universidade Louis Pasteur, Strasbourg (Frana). Tem ttulo de doutor em Medicina reconhecido pela Faculdade de Medicina de Lisboa. Entre o seu vasto percurso acadmico e profissional, recebeu 14 prmios e multiplas homenagens; orientou nove teses de mestrado e oito de doutorado. Iniciou a carreira docente em 1980 na EPM. Atualmente, professor titular da disciplina de

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Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva. Tambm professor livre docente da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista desde 1990. Faz parte de um amplo nmero de instituies, tais como a Associao Mdica Brasileira, Associao Paulista de Medicina, Sociedade Brasileira de Anestesiologia, Associao de Medicina Intensiva Brasileira, Sociedade de Anestesiologia do Estado de So Paulo, Sociedade Paulista de

Terapia Intensiva, Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos, Academia de Medicina de So Paulo, etc. Foi conselheiro do CRM-SP, presidiu a Associao Paulista de Medicina por duas vezes (1999-2002 e 2002-2005) e, atualmente, est na segunda gesto na presidncia da AMB. Faz parte do Conselho da Associao Mdica Mundial e presidiu por trs anos ao Comit de Assuntos Mdicos e Sociais. Em 2010, foi eleito para presidir a insti-

medalha Anchieta e Diploma de Gratido da Cidade de so pauloA Medalha Anchieta foi instituda setembro de 1969. Assim como o Diploma de Gratido entregue a personalidades que tenham conquistado a admirao e o respeito do povo paulistano. Vrias personalidades j a receberam, entre elas, o Papa Joo Paulo II.

O Mestre Adelino ngelo e sua mulher, La-Slett Magalhes, associam-se com muita amizade e admirao quele ato de grande significado e de reconhecimento mundial pelo trabalho de Jos Luiz Gomes do Amaral na defesa universal dos direitos humanos, concretamente atravs do seu empenho, de dcadas, na defesa da sade do ser humano.

(Des) Construes de margarida AntnioEgo, de Margarida Antnio, inaugura amanh (13 de Outubro), pelas 18h30, no Palcio das Artes, no Porto. A mostra ser fundamentada nas linhas harmnicas da Piet, com a particularidade de a obra estar inacabada. Sero expostas bases da Piet e cada dia, durante as (cerca de) duas semanas de durao da mostra, a artista plstica trabalhar sobre um quadro,construindo e/ou desconstruindo a prpria dinmica da base. Explicando que a construo ser feita por adio, colagem, grafismo e at pincelada, garante que no final teremos um novo espectculo visual, com a Piet a ser encontrada com outros valores plsticos. Assim, no ltimo dia, 26 de Outubro, haver nova vernissage para que as obras possam ser apreciadas j completas, no obstante Margarida Antnio afirmar que a obra nunca est acabada. A venda dos trabalhos reverter a favor da Comunidade de Insero Eng. Paulo Vallada, um equipamento social da Fundao da Juventude que visa contribuir para a progressiva insero social de jovens mes.

arte

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Graa morais na rvoreA Caminhada do Medo, de Graa Morais que ser a homenageada deste ano do Prmio de Artes do Casino da Pvoa de Varzim inaugurada no prximo dia 20, pelas 18h30, na Cooperativa rvore, Porto. A exposio de desenho e pintura fica patente at ao dia 12 de Novembro. As peas de menor dimenso, as colagens, do a chave para os grandes desenhos e o modo como so compostos. A se percebe a importncia do registo fotogrfico, dos apontamentos escritos em folhas de dirio e a sua recuperao posterior, escreve Laura Castro no catlogo da exposio. Graa Morais ser a.

Inauguraes no CpfA exposio A Rota do Vinho do Porto, de Jos Miguel Ferreira, inaugurada no prximo dia 15 de Outubro. A mostra pode ser visitada at 4 de Dezembro no Centro Portugus de Fotografia, Porto. No mesmo dia tambm inaugurada a exposio Marn Fotografias 1908-1940, patente at 18 de Dezembro.

BLACK SOLSTICE 2010

trabalhos de Jos rodrigues em BraganaDe 15 de Outubro de 2011 a 8 de Janeiro de 2012, a exposio de escultura e desenho JOS RODRIGUES - Travessias do Desenho e da Escultura vai estar patente no Centro de Arte Contempornea Graa Morais, em Bragana. A mostra organizada pela rvore e promovida pela Cmara Municipal de Bragana.

selvas, de rik linaEst ainda patente no Frum de Arte e Cultura de Espinho at ao dia 23 a exposio Selvas do pintor holands radicado na Figueira da Foz Rik Lina. Artista surrealista tem a Amrica Latina como fonte de inspirao: A minha paleta tropical, toda a minha pintura denota uma profunda ligao com a floresta tropical e as selvas coralirias. Embora os objectos e motivos do meu trabalho sejam inspirados pela natureza, no apenas a realidade do mundo exterior que me inspira. A Natureza o meu nico Mestre, mas os seus irmos gmeos: sonho e imaginao esto tambm presentes no meu trabalho.

Jos Miguel Ferreira

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crnica

Joaquim dos santos marinholicenciado em economia pela uporto

os caminhos de santiago

desde o sculo IX que os peregrinos caminham para Santiago de Compostela. Peregrinos, em latim, escreve-se Per Argos e so aqueles que atravessam campos. Tm como seu como seu smbolo uma concha, normalmente uma vieira designada localmente por venera, costume que j vinha do tempo em que os povos ancestrais peregrinavam a Finisterra. Os caminhos espalhavam-se para toda a Europa e vo todos entroncar aos caminhos franceses que posteriormente se legam aos espanhis, com excepo das vrias vias do Caminho Portugus, que tm origem a Sul, e do Caminho Ingls que vinha do Norte.

tantes idos de Portugal, do Sul de Espanha que atravessava a cidade portuguesa de Chaves, e do Oeste e Norte da Europa por via martima. O Caminho de Santiago atingiu o mximo esplendor nos sculos XI e XII e, depois, aps a contra reforma no incio do sculo XVII por Portugal. Nas ltimas dcadas voltou a ganhar protagonismo, sendo convertido num itinerrio espiritual e cultural de primeira ordem. Foi declarado o Primeiro Itinerrio Cultural Europeu (1987) e Patrimnio da Humanidade na Espanha (1993) e Frana (1998).CAmInHos eXIstentes

HIstrIA

O Caminho de Santiago entrou na histria h 12 sculos, quando foram encontrados os restos mortais do apstolo Tiago, ou Santiago, na que hoje a cidade de Santiago de Compostela. Esta rota une diversas zonas da Europa e Compostela vem sendo seguida por milhes de pessoas das mais variadas procedncias. O itinerrio mais famoso o chamado Caminho Francs, que absorve a maioria dos caminhos vindos do continente europeu e se dirige a Santiago atravessando o Nordeste de Espanha. Existiram outros percursos no menos impor-

Os caminhos, geralmente, encontram-se sinalizados por setas de cor amarela, no cho, muros, pedras, postes, rvores, estradas, marcos de granito ou concreto, e outros. Como regra, passou sempre em frente Igreja mais importante da cidade. Entre as vrias rotas, delineadas desde a Idade Mdia, destacam-se: Caminho Francs a partir de Saint-Jean-Pied-de-Port, entra na Espanha por Roncesvalles, no sop dos Pirinus e de l segue cerca de 800 quilmetros at Compostela. A este liga-se o Caminho Aragons (Tranco Aragons). Com sada em Somport, com cerca de 900 quilmetros. - Caminho de Prata (Via de la Plata) comDr

sada em Sevilha (Espanha) passando por Chaves e Ourense, o mais longo e segue uma antiga estrada romana a que os rabes chamaram algo que, foneticamente, soava a plata e assim ficou o nome. - Caminho Primitivo com sada em Castroverde, estendendo-se por, aproximadamente, 140 quilmetros. - Caminho do Norte sai de Ribadeo e segue por cerca de 220 quilmetros. - Caminho Portugus com vrias alternativas. A maior parte dos caminhos portugueses entroncavam em Valena do Minho, onde se fazia (e faz) a travessia da fronteira para Tui e, da, estender-se por cerca de 130 kms. Do lado portugus os percursos mais frequentados so a partir de Ftima, do Porto ou Braga. Nos ltimos anos tem ganho relevo o percurso Porto-Rates-Barcelos-Ponte de Lima-Valena, como principal caminho portugus. - Caminho da Ria Arousa - Caminho ingls parte de Ferrol ou de Caminha, estendendo-se, aproximadamente, 120 Km.. Surgiu a partir dos peregrinos das ilhas britnicas que, devido Guerra dos Cem Anos, no podiam atravessar a Frana com segurana e, assim, viajavam de barco at Galiza e, da, a p, at Compostela. - Caminho de Finisterra um prolongamento francs pata os peregrinos que vinham de longe terem a ideia que tinham chegado ao fim da terra (finis terrae), embora o ponto mais ocidental da Europa seja, na verdade, o Cabo da Roca, em Portugal. Apenas os caminhos Ingls, Francs e Portugus chegam a Santiago de Compostela; os outros vo-se juntando a estes trs durante o percurso. O Caminho Finisterra une Santiago de Compostela e o Cabo Finisterra. Os ltimos 20 kms. do Caminho de Santiago de Compostela palco de um desafio que ser registado. A partir da enorme presso das redes sociais para o relanamento dos trilhos Ferrorama existentes na dcada de 1980, a Estrela compromete-se a relanar o produto no mercado caso os fs consigam fazer percorrer os ltimos 20 km. Do caminho com apenas 110 m. de trilhos. Para isso os desafiadores tero que criar uma logstica de modo a retirar o caminho em que o comboio j passou a recoloc-los na parte dianteira da linha frrea. Todavia no se sabia se os desafiadores poderiam receber apoio da populao de Santiago de Compostela.

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portugal deve unir educao, cincia e tecnologiaeducao: o futuro de portugal o prximo tema a ser abordado, dia 13 de outubro, nos Grandes Debates do regime, na Biblioteca Almeida Garrett, porto, s 21h15. Artur santos silva, Carlos fiolhais e lurdes rodrigues so os convidados da iniciativa, promovida pela Cmara do porto. Ao jornal As Artes entre As letras, o professor de fsica da universidade de Coimbra Carlos fiolhais antecipou a sua perspectiva sobre a educao em portugal.Paulo Francisco CarvalhoComo v o estado da educao em portugal? Assente neste modelo educativo, que futuro v para o pas?

O sistema educativo portugus cresceu bastante em quantidade nos ltimos tempos, mas, apesar de alguns bons indicadores sectoriais, no cresceu em qualidade de forma que nos possa satisfazer. facto que havia um grande atraso estrutural visvel nos baixos nveis de qualificao da populao activa e essa situao, por mais esforos que se faam, demora a colmatar. Mas basta olhar para comparaes internacionais para vermos que estamos longe das metas fixadas pelo clube de pases a que pertencemos. Em Abril de 2011 foi publicado um relatrio da Unio Europeia sobre educao e no que se refere ao nosso pas, as notcias so boas e ms, nalguns casos muito boas e noutros muito ms. So boas no que respeita ao aumento da frequncia do ensino pr-escolar, bastante boas no que respeita diminuio do nmero de alunos com 15 anos com fraco desempenho em leitura, matemtica e cincias, e muito boas quanto ao aumento do nmero de licenciados nas reas de cincia e tecnologia, em resultado do investimento na cincia. Mas, apesar dos visveis progressos, so muito ms quanto ao abandono escolar precoce (um verdadeiro flagelo nacional), quanto ao nvel de educao atingido pela populao jovem e quanto ao nmero de pessoas que termina o ensino superior, e ms ainda quanto aprendizagem ao longo da vida. Esta deficincia de resultados tem lugar apesar de o investimento pblico em educao em 2007 (5,3% do PIB) ter sido acima da mdia da UE (5,0%). Portanto, o nosso investimento na rea educativa est longe de ser eficaz. O desafio agora fazer mais com menos, o que, convenhamos, no fcil.

A Europa, com a colaborao do FMI, que nos est neste momento a ajudar para ultrapassarmos a crise econmico-financeira. Acredito que o nosso futuro est na Europa, na sociedade do conhecimento que a Europa quer ou devia querer construir em conjunto. Para esse futuro na casa europeia comum, ter de haver convergncia no s a nvel econmico-financeiro, mas tambm ao nvel educativo. As duas reasDr

porm, de assegurar que a escola fornea uma boa preparao. E temos todos que nos empenhar na escola. uma questo de melhoria da organizao, mas sobretudo uma questo de mudana de mentalidades. Queremos trabalhar mais e melhor na escola para amanh sermos mais ricos?o que considera urgente mudar?

esto alis ligadas intimamente: quanto melhor for a nossa qualificao, melhor ser o nosso desempenho econmico. Quanto mais soubermos, mais seremos capazes de fazer. Basta olhar para os pases mais ricos, que so aqueles que tm sistemas educativos mais eficientes. Sem ser irrealista, quero ser optimista. Poder demorar o seu tempo, porque em educao no h ilusionismos nem magias (no se aprende instantaneamente!), mas estou convencido de que no somos inferiores aos outros povos europeus. Temos,

Em Junho passado houve uma mudana de governo e est a haver, na educao, um choque governativo. Unir a educao com a cincia e tecnologia poder ser bom para todos, at porque na cincia os nossos progressos tm sido visveis e pode haver um efeito de contaminao na educao. Havia algumas mudanas na educao que se impunham e esto a ser feitas e outras que ainda se impem. Estou a pensar na diminuio e desburocratizao do pesadssimo ministrio, na autonomia das escolas, na paz com os professores (base do sistema educativo, mas