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ARTIMANHAS DE MANOEL Conto

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ARTIMANHAS DE MANOEL

Conto

Otto Carlos Koller

ARTIMANHAS DE MANOEL

Conto

Editor responsávelZeca MartinsProjeto gráfico e diagramaçãoClaudio Braghini JuniorCapaRenan Campos

Esta obra é uma publicação da Editora Livronovo Ltda.CNPJ 10.519.6466.0001-33www.editoralivronovo.com.br@ 2014, Águas de São Pedro, SPImpresso no Brasil. Printed in Brazil

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro poderá ser copiada ou reproduzida por qualquer meio impresso, eletrônico ou que venha a ser

criado, sem o prévio e expresso consentimento dos editores.

Ao adquirir um livro você está remunerando o trabalho de escritores, diagramadores, ilustradores, revisores, livreiros e mais uma série de profissionais responsáveis por transformar boas ideias em realidade e trazê-las até você.

Sumário

BONS TEMPOS DE MENINO ...........................................................7

O INTERNATO NO PATRONATO AGRÍCOLA ..................12

O SERVIÇO MILITAR NA BRIGADA ........................................ 25

NAMORO E CASAMENTO...............................................................28

GAUCHADAS NA LOMBA DA TAMANCA .............................35

OTÁRIO REINCIDENTE .................................................................. 38

FUNCIONÁRIO DA ESCOLA DE AGRONOMIA E

VETERINÁRIA .........................................................................................42

PODERIA TER SIDO TRATORISTA ..........................................46

ATIVIDADES NO HOSPITAL DE VETERINÁRIA ...........48

O MOTOR DO JEEP NÃO PEGAVA ............................................. 51

TREINAMENTO PARA DIRIGIR UMA KOMBI ................. 54

TORCENDO PELO INTERNACIONAL ....................................57

PROPRIETÁRIO DE UM AUTOMÓVEL ................................ 63

OCULTO MULHERENGO ...............................................................68

GUARDANDO UTENSÍLIOS PARA ACAMPAMENTO

DE PESCARIA ............................................................................................79

COMPRA DE UM FREEZER .............................................................86

AQUECEDOR PARA CRIAÇÃO DE PINTOS........................92

FACA DE BOM FIO ................................................................................96

TERCEIRA GUERRA MUNDIAL ................................................ 101

OS MELHORES PRESIDENTES DO BRASIL .......................106

CAMINHADAS ARMAZENADAS .............................................. 110

CAMINHAR DESCANSANDO UMA PERNA ......................117

COMPAIXÃO DE UMA JUNTA DE BOIS ..............................123

OCULTANDO A INFLAMAÇÃO NA PROSTATA ............ 130

CUMPRIMENTANDO O PRESIDENTE MENEM ........... 139

OS FINALMENTES ...............................................................................143

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BONS TEMPOS DE MENINO

Numa pequena propriedade agrícola, no Passo do Vigário, mu-nicípio de Viamão, Estado do Rio Grande do Sul Brasil, entre os anos de 1926 e 1930, crescia o menino Manoel Cabral da Silva.

O Manoel era filho de agricultor de poucas posses, “seu” Antonio da Silva, descendente de imigrantes açorianos. Em sua pequena propriedade, o pai cultivava pequenas roças: de milho, mandioca e cana de açúcar, para trato de animais domésticos. Num cercado, próximo de sua modesta moradia, ele tinha alguns suínos, no terreiro ciscavam galinhas e, no potreiro pastavam um cavalo, três vacas de leite e outros tantos terneiros. Os serviços, para ma-nutenção das pequenas lavouras e dos animais, eram realizados em horas vagas e os produtos serviam para ajudar no sustento de sua família, entretanto, a principal atividade de Antonio era de trabalhar no Instituto Experimental de Agricultura, ligado ao Instituto Borges de Medeiros, do Estado do Rio Grande do Sul. Ali, ele exercia ativi-dades, como se costumava dizer, de sol a sol, isto é: desde o nascer até o pôr do sol. Entre outras tarefas, competia a ele, que era dos poucos funcionários letrados, registrar, em fichas e formulários, os dados de uma estação meteorológica.

Em casa, o pequeno Manoel andava quase sempre descalço, “de pé no chão”, ou quando fazia muito frio, no inverno calçava tamancos

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(espécie de chinelo com sola de madeira). Passava a maior parte do tempo brincando com duas irmãs mais novas, ou, praticava desatinos, como de atirar pedras em ninho de marimbondos, para alvorotá-los e fazê-los picar as irmãs, sendo que isso, geralmente, provocava correrias, entreveros e gritos de ansiedade e medo de levar picadas. No final dessa aventura, quando as picadas eram muitas, as irmãs caíam no choro e Manoel levava uma dolorosa surra, que logo era por ele esquecida, porque o prazer da aventura superava a dor da sova que havia sofrido e, logo estava ele pronto para fazer outras traquinagens.

A alimentação não era diversificada nem farta, porém, fome não se passava. No café da manhã e da tarde havia pão com manteiga, banha ou melado e, de vez em quando, se comia mogango (espécie de moranga de casca muito dura) cozido, que era consumido misturado com leite de vaca e um pouco de açúcar mascavo. Nas refeições do meio-dia e da janta, comia-se aipim, arroz cozido, farinha de mandioca, alguma carne de galinha ou de gado bovino e eventualmente, em aniversários, festas de Natal ou Páscoa, eram servidas broas, bolachas e um pedaço de rapadura para adoçar a boca. Chocolate e caramelos eram artigos muito raros, considerados de muito luxo, porque o custo deles era proibitivo.

Em algumas explorações, que Fernando e as irmãs às vezes rea-lizavam nas circunvizinhanças da casa, na periferia de pequenos capões de mato ou de arroios, em determinadas épocas do ano, eles podiam deliciar-se comendo frutas nativas, como pitangas, coquinhos, butiás e, mais raramente, araçás amarelos, cerejas do mato e eventualmente goiabas, quase sempre bichadas.

Apesar dessa vida, de alimentação parca e de poucas opções para diversões, Manoel se sentia relativamente feliz. Não havia motivo para grandes preocupações. De vez em quando tinha de realizar pequenos serviços, tais como buscar água, com baldes ou latas, de uma cacimba, distante uns 70 m, para o consumo da casa. Também havia a tarefa de recolher os ovos postos pelas galinhas e catar gravetos e lenha para queimar no fogão de chapa de ferro. Quando essas tarefas não eram

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prontamente executadas, de castigo, Manoel era castigado com tapas no traseiro e puxões de orelha, que lhe eram aplicados pela sua mãe, que era menos severa do que o pai. Entretanto, quando as desobedi-ências ou as artimanhas excediam os limites, então, entrava em cena o seu Antonio, que às vezes lhe aplicava uma surra, com o rebenque de três tranças de couro cru. Mas, tudo isso era suportável, depois de receber merecidos castigos, estes eram logo esquecidos e a paz voltava a reinar no lar.

Certo domingo, entretanto, aconteceu um fato marcante. Logo depois do almoço ouviu os chamados do seu pai:

– Manoel! Manoeeel! O Manoeeeel!– Que é pai? Já vou... E veio correndo, porque não se podia de-

morar ao receber um chamado do pai.Perto da porta da casa, lá estava o pai, com um grande chapéu

de palha na cabeça e com uma vara de pescar muito longa, de taquara (bambu) grossa e madura (caniço), em cuja ponta estava amarrado um pedaço de cordão de barrigueira de encilhar cavalos. Na extremidade solta o pai estava amarrando um pedaço de arame de cerca, que servia de empate e um anzol bem grande.

– Manoel, falou o pai, pede uma merenda pra tua mãe e apanha um saco de aniagem, que hoje nós vamos pescar umas traíras no arroio.

Manoel, rápido e faceiro, cumpriu as ordens do pai e em seguida estava junto dele, com o tal saco de aniagem e um pedaço de pão enro-lado num pano. De imediato, lá se foram os dois, várzea fora, no rumo do arroio do Passo do Vigário, distante uns dois quilômetros. Antonio, a passos largos, seguia na frente e Manoel troteava atrás, num ritmo acelerado, para, com suas perninhas curtas, manter-se relativamente próximo do pai.

– Já estás cansado? – perguntava o pai, de vez em quando, voltando-se para trás – anda molenga, caminha mais ligeiro!

Manoel, quase sem fôlego, nem conseguia responder, mas, sem queixar-se, continuava seguindo o pai, até que, depois de meia hora

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de caminhada, chegaram no tal de arroio, que fazia muitas curvas. Em alguns lugares o arroio era raso, com menos de meio metro de fundura, contudo, em outros pontos a água corria mais lenta e podia atingir pro-fundidades de mais de dois metros. Lugares como estes eram os preferidos de Antonio, que caminhou ao longo do riacho, até encontrar um, numa curva, onde, entre algumas árvores havia espaço limpo, livre de galhos, dentro d’água, nos quais pudesse enroscar o anzol. Na barranca do arroio também não deviam existir árvores com galhos baixos, que pudessem atrapalhar as manobras com o longo caniço, no momento da fisgada de uma traíra ou de um jundiá.

No local escolhido, onde a margem gramada do arroio formava uma barranca de aproximadamente um metro, até o nível da água, o pai sentava e, na terra macia da parede da barranca, cravava a base do caniço, em posição horizontal, de modos que o anzol, iscado com uma rã ou lambari, mergulhava uns 50 a 60 cm na água do arroio.

Esses detalhes da primeira pescaria impressionaram tanto a mente jovem de Manoel que, muitos anos mais tarde, ele costumava contá-los e até a repeti-los várias vezes, em conversas com seu genro Carlos Kobber e outros amigos, falando assim:

– Pois olha, quando meu pai me levava para pescar, quando eu ainda era guri, ele sentava na barranca do arroio, cravava o caniço e, com a ponta do pé apoiada sobre o caniço, fazia-o oscilar, para cima e para baixo, movimentando a linha e o anzol com a isca, para “provocar” as traíras. Aí então, quando uma traíra puxava, vergando o caniço até a ponta entrar na água, meu pai se inclinava para frente, baixava os braços, agarrava o caniço com as duas mãos e dava um enorme puxão, arrancando a traíra para fora da água, fazendo ela voar, até que a linha se esticava, o anzol rebentava o queixo da traíra e esta voava campo fora, fazendo um zumbido assim: zuuuuuumm e, depois se ouvia um barulho: buuuuuft, quando a traíra caía no chão, entre as macegas. Em seguida o pai gritava:

– Manoel! Vai lá buscar a traíra!... E, lá ia eu, caminhando uns 20 metros, pelo campo, tropeçando em vassouras e outros arbustos, à

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procura da traíra, para colocá-la no saco de aniagem e trazê-la para junto do meu pai. Mal e mal eu chegava de volta e já meu pai puxava outra traíra, que eu tinha de buscar.

– Vocês nem sabem, eu ainda era pequeno e sofria muito... A minha canseira era grande. Só pelas quatro horas da tarde, quando meu pai já havia pescado quase meio saco de peixes, então, recolhia o caniço, agarrava o saco com os peixes e começava a longa e cansativa caminhada de volta para casa. Lá chegando, a mãe e o pai escamavam e destripavam as traíras, umas quatro das quais eram cortadas em postas, temperadas e fritadas para a janta. As demais eram entalhadas, salgadas e postas num varal, para secar ao sol.

Manoel completava contando, que o cansaço sofrido na pri-meira pescaria teria sido compensado pela aventura e pela novidade, mas, nas vezes seguintes, gradativamente, as pescarias tornaram-se um trabalho, mesclando satisfação com sacrifício, devido ao cansaço das caminhadas, de ida e volta ao pesqueiro, somadas ao vai-e-vem do recolhimento de traíras fisgadas pelo pai e, por ele, lançadas bem longe, pelo golpe do caniço.

Entrementes, à medida que o tempo avançava e Manoel se apro-ximava dos 7 anos de idade, os pais começaram a preocupar-se com a educação do filho primogênito, pois ele não deveria crescer sem estudo.

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O INTERNATO NO PATRONATO AGRÍCOLA

No dia em que Fernando completou sete anos de idade houve bastante alegria, todos o abraçaram e lhe deram os parabéns, a mãe havia feito bolachas, broas e outros quitutes. Até meia dúzia de balas “quebra--queixo”, compradas numa venda da cidade de Viamão, o pai lhe dera de presente. Crianças amigas, filhos de vizinhos o visitaram, todos juntos, participaram de muitas brincadeiras: de pega-pega, esconde-esconde, pular corda e outras mais. Este foi um dia diferente dos demais, sendo lembrado muito tempo depois.

A alegria, entretanto, não durou muito. A vida rotineira continuou no Passo do Vigário, até que um dia a mãe lhe falou:

– Manoel, meu filho, tu já tá crescidinho e precisa receber boa educação, para aprender a ler e escrever... Nós, teus pais, não queremos que cresças e que, mais tarde, te tornes um homem burro, sem educação. Por isso, amanhã bem cedo teu pai vai te levar, para seres educado numa boa escola, que fica longe, entre as cidades de Viamão e Porto Alegre.

Surpreso e aturdido, sem entender muito bem do que realmente sua mãe falava, Fernando perguntou:

– Mãe? tenho mesmo ir pra essa tal de escola? Eu não quero ir. Du-rante quanto tempo terei de ficar lá? Terei de comer e dormir lá também?

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- Sim meu filho, tu vais ter de ficar lá por alguns tempos, não sei bem quanto. Acho que vais sentir saudades daqui, dos teus pais e de tuas irmãs e de teu irmão, mas isso vai ser para o teu bem, porque tu vais aprender a ler escrever e a fazer contas, também vais aprender a criar animais, plantar e cultivar lavouras. Tu vais receber roupa pra vestir, comida, e cama, tudo de graça, dado pelo governo. Isso tudo não vai custar nada para nós, que temos poucas posses. Lá na escola nem tudo será triste, pois, tu vais conhecer muitos outros alunos e alguns deles ficarão teus amigos, com eles poderás conversar, brincar e jogar nas horas de recreio.

– Mas, eu não quero e não quero sair daqui, não vou gostar daquela escola, nem sei o que é esse tal de recreio.

– Isso quem decide não é tu, mas sim teu pai e eu. Até já foi decidido e tua vaga está reservada.

E, se eu não gostar, vou ter de ir assim mesmo? Se eu não gostar de lá, posso voltar pra minha casa?

– Não insiste comigo meu filho, pro teu bem, tu deves de ficar lá até terminar teus estudos, depois de aprenderes bastante, mais tarde, quando fores grande, serás um homem feliz, letrado, rico e respeitado por todos. Tu vais ser um orgulho pro teu pai e tua mãe.

Manoel então chorou muito continuou muito confuso e embur-rado o dia todo, porém, pouco ou nada adiantava ficar questionando sua mãe. Ele sabia muito bem que devia obediência aos pais, portanto, não tinha escolha. Entre o medo do desconhecido, a tristeza de ter de sair de sua casa, deixar os pais, as irmãs e alguns poucos guris amigos, filhos de vizinhos, sobrava a ansiedade e expectativa de ver coisas novas, como, por exemplo, passar pela cidade de Viamão, da qual já ouvira falar que era bem grande, com muitas casas, ruas, vendas, armazéns e uma grande igreja.

No dia seguinte, bem cedo, o sol ainda não tinha nascido, foi chamado pela mãe, que lhe deu para vestir a melhor roupa que tinha e mandou-o lavar as mãos e o rosto, para depois tomar o café da manhã, à luz de um candeeiro.

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Terminada a rápida refeição, seguiu-se dolorosa despedida, em que Manoel foi fortemente abraçado e beijado pela mãe, que, em silên-cio começou a soluçar, não conseguindo conter o pranto. Surpreendido com o choro da mãe, que só havia visto chorar em velórios e enterros, Manoel, entre atônito e emocionado, também entrou em prantos, até que o pai, que o aguardava, em silêncio, junto da porta da casa, com uma sacola contendo utensílios e merendas, preparadas pela esposa, chamou:

– Manoel! Já é hora, chega de choro, vamos embora... No pátio da casa já havia uma carroça, previamente atrelada com

um cavalo bem tratado. Nela se acomodaram, no assento, o pai e o filho e, ao nascer do sol, lá se foram os dois, pela estrada de chão, na direção da cidade de Viamão. Enquanto, isso, Manoel, aos poucos parava de soluçar e enxugava as últimas lágrimas.

Depois de uma hora e meia de viagem, sem muita conversa, chegaram à cidade de Viamão. À medida que prosseguiam, Manoel ficava cada vez mais admirado com as lindas casas, próximas umas das outras, que margeavam a estrada. De certo ponto em diante, as ruas passaram a ser calçadas com pedras regulares, de granito, sobre as quais os cascos ferrados do cavalo, em sua marcha agora mais lenta, faziam um ruído característico e cadenciado de: tipi-tape, tipe-tape, tipe-tape... Logo chegaram a uma praça quadrada, onde havia canteiros de grama, algumas flores e árvores, sendo que, no tronco de algumas delas havia cavalos de outras pessoas, amarrados pelas rédeas.

Por demais impressionante era uma enorme igreja, alta e com grossas paredes de alvenaria, pintadas de branco, que ficava do lado mais elevado da praça. Manoel nunca tinha visto uma construção tão grande, com duas torres, uma de cada lado, no alto de cada qual havia um grande buraco, com o teto em arco, que abrigava enormes sinos.

A praça era circundada por uma rua, toda calçada de pedras e muitos prédios de alvenaria, com sobrado, portas e janelas de formato retangular, pintadas de verde, ou azul. Essas casas estavam quase sem-

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pre emendadas umas nas outras, sem espaço entre elas, parecendo um prédio único.

Destacava-se dos demais uma edificação antiga, mas, bem vistosa e imponente, com sobrado, no qual em algumas janelas menores do que as demais, localizadas na parte inferior, podia-se enxergar grossas grades. O pai apontou para esse casarão e disse:

– Manoel aquele ali é o Império, onde mora o Intendente do Município e onde, na parte de baixo também existem cadeias, nas quais são presos os ladrões e bandidos. Um calafrio percorreu pela espinha de Manoel, pois, já tinha ouvido falar que existia gente ruim, que roubava e até matava outras pessoas, mas elas eram capturadas e castigadas pela polícia.

Tudo era novidade. Manoel estava tomado por uma curiosidade imensa, tanto que ficava de olhos arregalados, diante de tudo e tanta gente, se movimentando de um lado para outro, entrando e saindo de lojas e armazéns, onde faziam compras.

Apesar disso tudo, em lampejos, a mente de Manoel o torturava, frente ao desconhecido, tendo sempre a intuição e o temor de que, o tal colégio, para onde estavam indo e onde o pai o deixaria sozinho, não po-deria ser um lugar bom para ele. Certamente, lá o esperavam sofrimentos, pois, ali só haveria gente estranha... Não sabia como seriam os outros guris, com os quais teria de conviver. Dentre eles deveria haver alguns maus e prepotentes, que tentariam escarnecer e bater nele, ou provocá-lo para brigas. Também, já tinha ouvido outros meninos mais velhos, que já estiveram em escolas, falarem que existiam professores bravos, que costumavam castigar alunos, dando-lhes palmadas ou colocando-os de joelhos, por diversos motivos. Também o atormentava a ideia de ficar longe dos pais e das irmãs, sem qualquer carinho, nem apoio familiar.

Assim foi que atravessaram a cidade de Viamão e saíram pela es-trada que vai a Porto Alegre. Era um caminho longo e cansativo, durante o qual pararam de vez em quando, à sombra da copa de árvores, para descansar, se alimentar e, também fazer xixi.