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Artigos OS PLANOS E SEGUROS PRIVADOS DE SAÚDE NO BRASIL: NOTAS SOBRE O OBJETO E PROCEDIMENTOS DE ESTUDO Ligia Bahia' 'Professora Assistente da Faculdade de Medicina e do Núeleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro RESUMO: O presente trabalho resenha parte da literatura brasileira sobre os planos e seguros privados de saúde propondo dois ciclos de estudos, limitado s pela Constituição de 1988, que coincidem com diferentes padrões de intervenção estatal e desenvolvimento de s istemas de proteção social. Objetivando apreender algumas das matrizes teóricas e metodologias utilizadas pelos pesquisadores que se detiveram sobre o tema da privatização dos serviços de saúde, destaca-se dos trabalhos estudados, o contexto institucional, alguns dos conceitos explicativos elaborados, seus procedimentos de estudo e aspectos das teorias em que se apóiam. Procede-se a uma esquematização e análise dessas dimensões para fins de comparação e conformação de um acervo de referências sobre o tema, buscando-se a presença de continuidades entre as políticas de saúde e os estudos sobre a privatização realizados em ambos períodos, sem descuidar de delinear as concepções marcantes de cada ciclo. Conclui-se que a utilização conjugada de aportes teóricos de ambos ciclos elucida aspectos atuais da problemática da privatização da saúde bem como que os estudos referentes aos Estados de bem estar social podem contribuir para referenciar adequadamente o tema. Palavras Chave: Planos e Seguros Saúde; Sistemas de Proteção Social; Empresariamento da Medicina. 105 ABSTRACf: This paper reviews part of the literature on private health plans and services proposing two cyeles of study, both limiled by the 1988 Constitution, that malch distincl pauerns of stale intervenlion and developmenl of social proteclion syslems. Seeking lo aprehend some of lhe theoretical matrixes and melhodologies employed by researchers in the area of private heallh se rvices, one highlights: lhe institucional context, a few of the explanatory concepts more oflen cmployed, their study procedures, and aspecls oflheir supporting Iheories. Each of these dimensions are layed out and analyzed forthe sake of comparison and building of a reference file on lhe theme, in search af continuities between health policies and lhe sludies on privale health services elaboraled in both periods, wilhout neglecting the key concepts of each cyele. II is argued thal the joint use of theoretical approaches of both cyeles elarifies present aspecls of the "health privatization" issue, and that research on welfare slales may become adequate references on the subject. KeyWords: Heallh Plans and lnsurance; Social Sccurily Systems; Heallh Management. Cad. Saúde Coleto 5 (21, /997

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Artigos

OS PLANOS E SEGUROS PRIVADOS DE SAÚDE NO BRASIL: NOTAS SOBRE O OBJETO E PROCEDIMENTOS DE ESTUDO

Ligia Bahia'

'Professora Assistente da Faculdade de Medicina e do Núeleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro

RESUMO: O presente trabalho resenha parte da literatura brasileira sobre os planos e seguros privados de saúde propondo dois ciclos de estudos, limitados pela Constituição de 1988, que coincidem com diferentes padrões de intervenção estatal e desenvolvimento de sistemas de proteção social. Objetivando apreender algumas das matrizes teóricas e metodologias utilizadas pelos pesquisadores que se detiveram sobre o tema da privatização dos serviços de saúde, destaca-se dos trabalhos estudados, o contexto institucional, alguns dos conceitos explicativos elaborados, seus procedimentos de estudo e aspectos das teorias em que se apóiam. Procede-se a uma esquematização e análise dessas dimensões para fins de comparação e conformação de um acervo de referências sobre o tema, buscando-se a presença de continuidades entre as políticas de saúde e os estudos sobre a privatização realizados em ambos períodos, sem descuidar de delinear as concepções marcantes de cada ciclo. Conclui-se que a utilização conjugada de aportes teóricos de ambos ciclos elucida aspectos atuais da problemática da privatização da saúde bem como que os estudos referentes aos Estados de bem estar social podem contribuir para referenciar adequadamente o tema.

Palavras Chave: Planos e Seguros Saúde; Sistemas de Proteção Social; Empresariamento da Medicina.

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ABSTRACf: This paper reviews part of the literature on private health plans and services proposing two cyeles of study, both limiled by the 1988 Constitution, that malch distincl pauerns of stale intervenlion and developmenl of social proteclion syslems. Seeking lo aprehend some of lhe theoretical matrixes and melhodologies employed by researchers in the area of private heallh services, one highlights: lhe institucional context, a few of the explanatory concepts more oflen cmployed, their study procedures, and aspecls oflheir supporting Iheories. Each of these dimensions are layed out and analyzed forthe sake of comparison and building of a reference file on lhe theme, in search af continuities between health policies and lhe sludies on privale health services elaboraled in both periods, wilhout neglecting the key concepts of each cyele. II is argued thal the joint use of theoretical approaches of both cyeles elarifies present aspecls of the "health privatization" issue, and that research on welfare slales may become adequate references on the subject.

KeyWords: Heallh Plans and lnsurance; Social Sccurily Systems; Heallh Management.

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INTRODUÇÃO

Os planos e seguros saúde, instrumentos dos contratos constituídos entre empresas que adquirem cobertura para seus trabalhadores através de contratação/ credenciamento de serviços médico­hospitalares próprios ou comprados de empresas , cooperativas médicas ou seguradoras especializadas na prestação de assistência médica, tornaram-se um importante meio de acesso de parte da população brasileira a determinados serviços de saúde. A explicitação de um padrão de demanda por serviços privados de saúde, especialmente a partir do final da década de 80, proveniente de segmentos de trabalhadores vinculados aos ramos mais dinâmicos da indústria c de serviços. viabilizada por planos e seguros saúde, se dá em um contexto de democratização que estimula proposições de eqüidade e universalidade da atenção e assistência à saúde.

Esse fato, para nós, funcionários públicos, pesquisadores e participantes da formulação do ideário da Reforma Sanitária confi gurou um paradoxo já que aos ideais éticos de igualdade redistributiva contrapunham-se a acumulação de direitos para determinados segmentos da população. A premissa de que os planos e seguros privados se expandiam vertiginosamente representando um obstáculo ou a inviabilização do SUS gerou um conjunto de abordagens teórico explicativas que, resguardadas suas diferenças, apontavam para o surgimento de um novo padrão assistencial no Brasil.

Objetivando apreender algumas das matrizes teóricas e metodologias utilizadas pelos pesquisadores que se detiveram sobre o tema da privatização dos serviços de saúde, busca-se percorrer parte da produção teórica considerando dois ciclos de privatização dos serviços de saúde no Brasil que seriam limitados provisoriamente pela Constituição de 1988.

A preocupação em ordenar sob ciclos os estudos aqui apresentados supõe a presença de continuidades enlre as políticas de saúde e os estudos sobre a privatização

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realizados em ambos períodos. Porém, a tentativa de indicar permanências nos esquemas explicativos não impede o delineamento de diferenças entre as concepções e conceitos marcantes de cada ciclo. O contexto institucional, alguns dos conceitos explicativos elaborados pelos autores consultados, seus procedimentos de estudo e aspectos das teorias que embalam os trabalhos selecionados são destacados para fins de comparação e conformação de um acervo de referências sobre O tema.

O trabalho se divide em quatro partes. Na primeira, resume-se o processo de transformação do tema privatização da assistência à saúde em objeto de estudos na área de saúde coletiva. Logo depois procura­se relatar e comentar aspectos dos trabal hos da saúde coletiva sobre o empresariamento da assistência médica na década de 70, bem como relacionarcaraclerísticas institucionais e operacionais das atividades de comercialização de planos de saúde. A seguir o mesmo procedimento é realizado através da análise dos trabalhos dos anos 80. Posteriormente, recorre-se a uma apresentação de trabalhos de autores envolvidos diretamente com a pesquisa do welfare state, no sentido de rediscutir a privatização da assistência médica sob as teorias de seguro, contrato e seguridade social.

PRIVATIZAÇÃO DA ASSISTtNCIA À SAÚDE: A CONFORMAÇÃO DE UM OBJETO DE CONHECIMENTO NA SAÚDE COLETIVA

Os objetos, áreas de conhecimento e métodos na saúde coletiva são múltiplos, sendo enfocados por teorias das ciências naturais e sociais e seus contornos delimitados pelas possíveis conotações de coletivo I. Todavia, duas áreas, são apontadas por GARCIA, J. c., (1985) como pontos de convergência para uma busca de especificidade da saúde coletiva: o estudo dos determinantes sociais das doenças, que encontram na epidemiologia seu referencial conceitual e métodos; e as análises sobre os serviços de saúde que partem de ,

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perspectivas tais como as da administração e planejamento conformando o planejamento em saúde e as das articulações políticas e ideológicas das práticas de saúde constituindo as denominadas políticas de saúde.

Os estudos sobre as práticas coleti vas de saúde, embasados nas ciências sociais, são introduzidos, entre nós, nos cursos médicos, na década de 50. As abordagens antropológicas, baseadas no evolucionismo e as sociológicas apoiadas em Talcott Parsons sustentam análises funcionalistas das relações e conOitos entre medicina moderna e tradicional, médicos e pacientes, profissionais médicos e não médicos (NUNES, 1985). Para CANESQUI (1995) as ciências sociais, no âmbito da saúde, sob inspiração dos movimentos de medicina integral e preventiva americana, adotam um enfoque comportamental e culturalista para fundamentar uma visão dualista de mundo que contrapõe: o primitivo e o desenvolvido; o irracional e o racional; o mágico e o científico.

Na década de 70, as crflicas às ciências da conduta por suas limitações quanto à explicação das articulações da medicina com a estrutura econômica e política das sociedades, conjugadas à formulações teóricas, de outras áreas, sobre as articulações entre saúde e desenvolvimento, tornam os serviços de saúde um importante objeto de estudos. DONNANGELO, (1983) atribui às reordenações da organização da prática médica, especialmente as referentes à assistência médica previdenciária, a emergência de novos objetos e tendências da produção de conhecimento em saúde coletiva, exemplificadas pelo deslocamento da ênfase nas análises do processo saúde­doença para os estudos das práticas de saúde.

Os serviços de saúde, definidos como mediações entre as formas de articulação da prática médica com a prática social, são analisados, segundo NUNES (1985), a partir de um enfoque histórico-estrutural que busca evidenciar as vinculações econômicas e políticas das práticas de assistência à saúde na sociedade brasileira. Os estudos que

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tomam por objeto os serviços de saúde predominam na década de 70. No Brasil, inúmeros trabalhos referem-se à Previdência Social' e, em particular, a suas políticas para a assistência médica. No final dos anos 70 e infcio dos anos 80 um conjunto de autores pesquisadores estudam a emergência de formas empresariais de prestação de assistência médica.

AS EMPRESAS MÉDICAS NOS ANOS60E70

A Medicina de Fábrica e os Convênios­Empresa com a Previdência Social.

O regime autoritário unifica os institutos de aposentadorias e pensões (IAP's), criados a partir de 1930. O contexto repressivo, centralizador e estimulador da privatização e do empresariamento de diversas atividades, inclusive as de cunho social é marcado por um conjunto de políticas que a par de incorporarem novos segmentos aos benefícios previdenciários incitam o surgimento de um segmento caracteristicamente capitalista no sistema de saúde brasileiro. Medidas administrativas transformam a Previdência Social no maior comprador de serviços médicos do País. Subordinando a produção de atividades assistenciais à lógica da remuneração por produção a Previdência impulsiona diversas modalidades de privatização da assistência médica, desde o incentivo ao produtor privado isolado (hospitais, laboratórios) até o surgimento de grupos de médicos que criam empresas para a prestação de serviços a outras empresas. Uma expressão das políticas de privatização na área da saúde é o convênio~empresa3, conquista política dos empresários, representantes de interesses minoritários, em uma conjuntura de deslocamento dos trabalhadores do centro de decisão política da Previdência Social.

Entre os estudos comprometidos com o questionamento e a formulação de políticas de saúde pela Previdência Social brasileira destaca~se o de Jaime Oliveira e Sonia Fleury Teixeira (1978). Os autores

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propõem uma gênese comum para o departamento médico das fábricas e a medicina de grupo. A disseminação de serviços médicos das empresas, alternativos à medicina liberal e à estatal, com funções de selecionar, controlar o absenteísmo da força de trabalho e atrair uma mão de obra mais qualificada, acompanha o rápido movimento de constituição do capitalismo industrial no Brasil. O hospital da Companhia Siderúrgica Nacional , entre outros, é típico de um modelo que integra a medicina ao trabalho coletivo. Ou seja ao departamento médico das empresas cumpre a função de mover a produção através da manutenção e recuperação da força de trabalho.

A medicina de grupo, para estes autores, resulta de um processo de moderni zação e desburocratização das grandes empresas que passam a comprar serviços complementares de outras empresas especializadas. Tal como o departamento médico, a empresa de medicina de grupo se identifica com o objetivo de aumentar a produtividade da força de trabalho. No entanto, o fato da própria empresa médica estar inserida no ciclo da reprodução do capital introduz uma ruptura com a prática dos serviços próprios das empresas: a limitação dos custos das atividades médicas passa a ser crucial para contratos que estipulam o pagamento de uma quantia fixa percapita para a cobertura dos trabalhadores de uma empresa. A par dessa importante diferença, a substituição dos serviços próprios das empresas pelas empresas de medicina de grupo é efetivada através dos interesses comuns a ambas (médica e contratante de serviços) na seleção de mão de obra hígida e no controle do absenteísmo. Além d isso, a medicina de grupo permite estratificar o atendimento para os trabalhadores de acordo com a sua qualificação, através da oferta de planos mais ou menos abrangentes e suntuosos quanto às acomodações hospitalares, expressando políticas de pessoal baseadas nas expectativas individuais do trabalhador.

Regina Maria Gifroni (1981) pesquisou as relações entre serviços médicos nos locais de trabalho e as políticas

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previdenciárias em São Paulo a partir da tensão e complementariedade entre a universalização e O atendimento diferenciado, mais eficiente para determinados contingentes de população. A autora supõe que os serviços médicos criados pelas empresas no início da industrialização e a '"medicina de convênios com empresas" respondam a diferentes momentos de articulação entre o capital e o trabalho. Ou seja, propõe uma correlação entre as associações voluntárias. os grupos de ajuda mútua, as instituições religiosas e as sociedades be neficentes e a fase concorrencial do capitalismo. sua substituição pelos seguros sociais e uma evolução posterior em direção ao empresariamento de serviços e benefícios. Articula em sua análise, portanto, O

desenvolvimento das relações de produção, o caráter do Estado (liberal/ intervencionista) com os padrões de políticas de saúde.

Além de transformar um problema apontado por Oliveira como constitucional da Previdência brasileira - o questionamento da obrigatoriedade da prestação de assistência médica e seus rebatimentos na opção pela compra ou prestação direta de serviços de saúde - em indicador de transição de padrões. a autora atribui aos convênios-empresa intermediados pelo Estado, durante as décadas de 60-70, uma resposta à tendência de estratificação. através da diferenciação de serviços não mais entre calegorias profissionais, mas sim para diferentes qualificações profissionais.

A par do movimento de transferência da assistência médica da órbita das empresas para a do Estado via Previdência Social após o Estado Novo, GIFFONI, (1981) identifica a manutenção de serviços próprios das empresas, especialmente das de grande porte mesmo após a criação do Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários (IAP!) em 1938. Para a autora. o fato do IAPI conter em seus quadros técnicos desfavoráveis à prestação direta de serviços médicos· justifica a persistência e manutenção e em alguns casos a ampliação dos serviços médicos das empresas. E sua refiexão sobre a tensão e complementaridade

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entre a Previdência e os serviços das empresas resulta na observação de duas alternati vas para a cobertura dos trabalhadores: o reparo da força de trabalho nos serviços próprios das grandes empresas e a assistência previdenciária para os trabalhadores de empresas de menor porte (Idem).

Os convênios-empresa seriam uma nova modalidade, uma terceira via, de produção de serviços médicos, na qual a Previdência passa a assumir parte dos custos dos serviços médicos que as empresas haviam financiado por mais de 40 anos (desde o início da industrialização) (Ibidem). A "socialização" dos custos das empresas com a reprodução de sua força de trabalho se viabiliza pelo afastamento da classe trabalhadora da administração dos Institutos de Previdência (Ibidem).

O estudo de uma amostra de 619 empresas com convênios intennediados pela Previdência no Município de São Paulo durante 1977-78 - onde se concentravam mais de 70% do total de convênios realizados no país - evidencia que os mesmos se realizaram de modo predominante nos ramos dinâmicos' , onde se concentra o capital privado estrangeiro e nos quais o desempenho econômico e financeiro das empresas é superior (GlFFONI, 1981). Além disso, interessa reter do percurso desses grandes grupos econômicos, no que tange à assistência médica, um movimento em direção aos convênios nos anos 60 e 70 e posteriormente uma "volta" aos serviços próprios em função das críticas , pós revigoramento do movimento sindical6

, aos convênios e às dificuldades de controle de custos de serviços administrados por terceiros' (Idem).

A Capitalização da Medicina e os Anéis Burocráticos (Previdência-Empresas Médicas)

A pesquisa de Hésio Cordeiro (198\) é a principal referência sobre o tema na área de saúde coletiva. CORDEIRO utiliza como suporte teórico o trabalho de DONNANGELO (1975), que correlaciona

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elementos como: as formas de propriedade dos meios de trabalho; tipos de acesso do con sumidor aos serviços de saúde e a situação de trabalho do produtor de serviços no processo de produção com o surgimento de novas fonnas de organização da prática médica. De acordo com esse referencial, a tendência à concentração de meios de produção em empresas médicas, resulta da combinação da progressiva perda de propriedade e controle dos médicos de seus meios de trabalho. Restrição da autonomia do médico à medida do desenvolvimento de especializaçôcs que passam a exigir um maior volume de tecnologia, levando a formas institucionais que possibilitem o uso coletivo de instrumentos de trabalho, e da renúncia do Estado da função de produtor direto de serviços (CORDEIRO, 1984).

Apoiado nesse patamar conceitual, o autor, analisa as empresas médicas. em diferentes conjunturas da Previdência Social, atribuindo a emergência do complexo médico-empresarial' à unificação aulorilAria da Previdência. Os eventos POlílico­institucionais, planos e normas são relacionados aos interesses e participação! exclusão de classes e fraçôcs de classe no aparelho do Estado. CORDEIRO destaca dois momentos (1967-70 e 1973-79) nos quais articulações mais estreitas, novos canais de acesso aos centros de decisão da Previdência, de setores que interligam segmentos da burocracia previdenciária aos setores médicos empresariais, aceleram o empresariamento da medicina pelas políticas previdenciárias.

E detecta os "anéis burocráticos'~ -entrelaçamentos entre a tecnoburocracia previdenciária, defensora da transferência da assistência médica hospitalar para a responsabilidade de particulares, bases para o estímulo ao empresariamento e reestruturação do aparelho previdenciário (Idem). Tal como DONNANGELO (1975) e CAMPOS (1988) vê o surgimento e desenvolvimento das cooperativas médicas como oposição inicial à comercialização da medicina e a posterior adesão dessas aos convênios-empresa como integração das mesmas ao complexo médico-empresarial. A dinâmica própria de crescimento da

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articulação entre empresas e empresas médicas é comentada pelo autor (Ibidem), que capta o crescimento dos convênios­empresa a despeito da inexistência de supone estatal, no período 1970-74, quando a Previdência opta pelo incentivo aos serviços médicos de sindicatos de trabalhadores urbanos e rurais. Registra um instrumento de estímulo extra previdenciário aos convênios-empresa: a dedução dos gastos com saúde das empresas do imposto de renda, a partir de 1974 (Ibidem). A penetração de capital financeiro internacionalizado é uma tendência prevista

pelo autor ao lado da consolidação e estruturação de uma rede de conexões entre as empresas de pré-pagamento e o setor hospitalar que redirecionaria o nuxo da demanda para internações e exames (Ibidem).

Selecionando e sintetizando desses aportes conceitos, hipóteses e indagações, construímos um quadro sintético que relaciona os autores com partes de seus esquemas analíticos.

O marxismo estruturalista, para o qual o determinante em última instância éo econômico, é para BODSTEIN (1992), a tônica dos trabalhos aqui mencionados e de outras importantes pesquisas produzidas na mesma época no campo da saúde coletiva. O referencial explicativo que toma a medicina como instrumento para a reprodução da força de trabalho utilizando as categorias acumulação e legitimidade se presta à i nterpretação do aparelho de Estado e de suas políticas sociais (Idem) . O abandono dos sujeitos sociais nos processos políticos de representação e articulação de interesses e sua metamorfose em estruturas sociais oculta a existência de várias instâncias intermediárias de conflito e consolidação de direitos . As análises macrosociais acentuam a capacidade de dominação do sistema e não a emergência de novos sujeitos sociais, novos significados, novos direitos (Ibidem). Essas observaçôes referentes à produção em geral da saúde coletiva são em parte aplicáveis aos trabalhos aqui mencionados.

No entanto, escapa a esta crfticalO a importância dessa produção no processo de

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construção de um objeto de estudos e intervenção política, o empresariamento da medicina . Objeto construído pelos pesquisadores da saúde coletiva, através da combinação de teorias e métodos para sua investigação, que transborda dos espaços acadêmicos e é utilizado (e transformado) para a conformação de novos sujeitos sociais (sindicatos médicos e movimentos de bairro) na disputa por projetos de prioridade ao setor público na área da saúde. Ou seja, parece que a despeito das insuficiências interpretativas sobre o papel das instituições e políticas de saúde, foi a concepção de relativa desvinculação das políticas sociais às "leis" da acumulação do capital, presente de forma mais ou menos explícita nos trabalhos dos pesquisadores, que animou o debate e a luta pela universalização dos direitos à saúde.

Outra ordem de problemas referentes ao estruturalismo e à assunção de uma filiação marxista dos trabalhos em torno do empresariamento da medicina da década de 70 é a necessidade de uma qualificação mais detalhada das matrizes teóricas dessa produção e uma separação do joio do trigo. Nesse sentido, observam-se trabalhos que aplicam mais diretamente conceitos extrafdos de teorias econômicas, como o de Giffoni e de outros que esculpem um objeto a partir do recolhimento dos melhores frutos de teorias, como as de Poulantzas ll e elaboram conceitos mais soltos de suas origens como o de Cordeiro. Vale lembrar que o alargamento do campo da saúde coletiva é obtido através de uma reinterpretação de fecundas teorias sobre a realidade brasileira às políticas previdenciárias, tais como as formuladas por: Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Otávio Ianni, Wanderley Guilherme dos Santos.

O mérito desses aportes teóricos quanto à reconstrução das relaçôes entre assistência médica e Previdência Social não os exime de lacunas. A maior parte das pesquisas selecionadas estão voltadas prioritariamente a responder sobre a quantidade de beneficiários que integram essa ou aquela modalidade de proteção social. Perguntas direcionadas a responder

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sobre quem está coberto e o processo de envolvimento de importantes segmentos sociais com modalidades assistenciais extra­previdenciárias não são formuladas. Os trabalhadores de empresas estatais, grandes empresas multinacionais e funcionários públicos de determinados órgãos da esfera federal, estadual e municipal de alguns unidades federativas que erigiram elou mantiveram planos de assistência à parte e/ ou complementares às políticas previdenciárias desde a década de 50 não são estudados. AJ; mudanças na legislação e operacionalização dos acidentes de trabalho, c suas relações mais estreitas entre a mcclicinade fábrica e a previdenciária são secundarizadas e separadas cirurgicamente da disponibilização de assistência médica para trabalhadores urbanos. O "recorte" e estudo do "objeto" previdência social­assistência médica revela a politização da saúde: o deslocamento do estatuto da assistência da fábrica à universalização. Por outro lado, turva a evidenciação das permanências de grupos (sujeitos sociais) em regimes especiais de proteção social.

O primeiro ciclo de expansão do empresariamento dos serviços de saúde no país é impulsionado pela Previdência Social. Obstáculos antepostos a tentativas de uniformização de serviços ofertados através da unificação dos lAP's, também provém de instituições previdenciárias. como é o caso da manutenção do IPASE (servidores federai s), após a criação do INPS. No âmbito não governamental observa-se a opção pela ampliação de serviços próprios das empresas por iniciativa de seus níveis gerenciais elou de entidades de funcionários, principalmente no caso de empresas estatais. A extensão de serviços através do estímulo à iniciativa privada, opção para o atendimento da acelerada inclusão de categorias e setores profissionais não cobertos, favoreceu e consolidou interesses de diferentes elementos do complexo médico industrial. Contudo, a unificação não impediu que pelo menos 3 regimes de proteção social persistissem e de certa maneira ampliassem sua legitimação: o dos funcionários públicos federais, os auto­programas de assistência à saúde de grandes

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empresas estatais, os auto-programas de assistência à saúde de grandes empresas multinacionais. Isso sem considerar que a cobertura para trabalhadores rurais se efetiva, preliminarmenle, por mecanismos de financiamento e contratação de serviços à parte dos disponibilizados para os trabalhadores urbanos.

A PRIVATIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE NA DÉCADA DE 80

Em 1979 o convênio empresa mediado diretamente pela Previdência é extinto. As mudanças na Previdência, em um contexto de abertura política, são desfavoráveis às teses do empresariamento da medicina. Segundo CORDEIRO (1984), sem o apoio da Previdência, sob altas taxas de inflação, políticas salariais mais flexíveis e custos crescentes dos planos, alguns convênios firmados com grupos médicos foram denunciados ou não renovados no Rio de Janeiro e em São Paulo. Porém, existem indícios da permanência de um grande número de convênios de empresas com grupos médicos sem interveniência da Previdência". E a criação de novas empresas como a AMIL, em 1980, demonstra a possibilidade de comercialização autônoma de planos de saúde. Observa-se uma certa latência no que tange ao crescimento da população coberta, na primeira metade da década de 80 (ANDREAZZI, 1991). O segundo ciclo de crescimento mais intenso de cobertura de planos de saúde coincide com a redemocratização, se inicia no final da década de 80 e envolve a modificação de aspectos da legislação no que se refere à participação das seguradoras como ofertantes de planos de seguros saúde.

O crescimento da cobertura por seguros e planos privados de saúde será explicado através de um conjunto de causas e eFeitos que articulam relações do mercado segurador com elementos no interior do setor saúde, mais especificamente com o declínio de qualidade da assistência médico­hospitalar pública. São aludidas ainda a resistência à noção de universalização da

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saúde por parte de empresanos e trabalhadores embasada em uma visão tradicionalista das políticas sociais no Brasil. Um círculo vicioso teria sido instaurado: a escolha de planos privados por segmentos com maior poder de reivindicação, a par de conferir proteção aos trabalhadores qualificad'ls e segmentos de classe média contra o desfinanciamento do setor público, reitera a ineficiência e outras mazelas da assistência estatal. Vários autores invocam a auto-expulsão de segmentos mais bem aquinhoados como uma das causas da deslegitimação do SUS (MEDICI, 1991 , MENDES , 1993, FLEURY, 1994, RIBEIRO, 1996). Os traços rixos nos esquemas explicativos delineados são a referência à gênese privatista da assistência à saúde na Previdência brasileira, tendo como conseqüências a confonnação de um sistema de proteção social de molde meritocrático, obedecendo a uma lógica eminentemente econômica, que se sobrepõe à dimensão de política social , e que inviabiliza a implementação de políticas redistributivas, na medida da concenação de grupos especiais de interesses de trabalhadores com empresários.

O pioneiro e principal formuladordo "novo" modelo de privatização foi André Medici, que, a par de descrever e divulgar uma categorização das modalidades assistenciais que comercializam planos e seguros, ressaltou o surgimento de um novo modelo assislencial- designando-o "liberal privatista".

O modelo de atenção à saúde no Brasil nasceu e se desenvolveu, até os anos 70, nos marcos do "previdencialismo alemão". O movimento da Reforma Sanitária tem lutado por mudanças para que o modelo assistencial brasileiro venha a se inspirar no universalismo inglês, canadense ou quiçá cubano. Mas a realidade faz com que esse sistema seja cada vez mais americano, onde a grande maioria da população paga por formas privadas de atenção médica ... enquanto que segmentos pauperizados são atendidos através de programas como o Medicare (MEDICI, 1989).

Uma marca fundadora do "novo" modelo refere-se ao linanciamentode planos

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e seguros independente de intermediação governamental. "O novo modelo que vem se gestando tem sido, do lado do INAMPS, estatal universalizante, e do lado do setor privado, liberal privatista, caracterizado pela presença de formas de organi zação da atenção médica autônomas em relação ao setor público (Idem)".

Homologamente Favaret e Oliveira propõem que o sistema de saúde brasileiro apresente uma estrutura mais próxima à do caso americano com predomínio do setor privado e ação estatal compensatória. Os planos e seguros saúde são elementos que " .. .indicam uma crescente autonomia do setor privado vis-à-vis o Estado na década de 1980, em função de novos mecanismos de financiamento capazes de viabilizar o acesso ao sistema privado de saúde por parte de camadas médias à margem da intervenção da política oficial (FAVARET e OLIVEIRA, 1990)".

No mesmo trabalho criam um conceito que explica o transcurso das políticas de universalização com a emergência de um modelo liberal privatista "a universalização excludente". "Assim a universalização no caso brasileiro, dadas as suas especi ficidades , parece estar assumindo a função de não incluir efetivamente todos os segmentos sociais na alçada do atendimento público de saúde, mas de garantir O atendimento aos setores mais carentes e resistentes aos mecanismos de racionamento (Idem).

Mesmo assim atribuem um valor positivo à universalização à brasileira.

A "universalização excludente" pode alcançar, na prática, a sua função redistributiva ' a medida que a resistência que os grupos "de cima" poderiam opor à atenuação das barreiras à entrada no sistema foram sendo contornadas pela viabilização do acesso desses segmentos ao subsistema privado de saúde. Tais segmentos foram reduzindo cada vez mais suas expectativas quanto ao atendimento público, passando a ter como referencial efetivo o subsistema privado. É neste momento que o sistema finalmente se acomoda: a expulsão provocada pelo racionamento no subsistema público é compensada pela absorção

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1 __________ _

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daqueles segmentos no subsistema privado (Idem).

Esses autores foram divulgados especialmente por Mendes, que divisa a presença de dois projetos polftico-sanitários no campo setorial. A reforma sanitária (projeto contra-hegemônico) e o projeto neo-liberal, representando novos sujeitos sociais que emergem do deslocamento da hegemonia do sub-sistema privado contratado pelo INAMPS para o subsistema que comercializa seguros e planos de saúde. Nos anos 80 parte dos produtores de serviços de saúde se modernizam inaugurando relações autonomizadas entre o público e o privado. O rompimento com padrão anterior de Estado-dependência dos produtores modernos destina ao Sistema Único de Saúde somente os segmentos tradicionais e pouco qualificados dos serviços privados (MENDES, 1993).

A par e aditivamente às interpretações que contextualizam a comercialização de planos e seguros saúde em modelos assistenciais tfpicos, encontram-se as explicações para aumento dos segmentos cobcnos por planos de saúde por falhas na condução do processo das refoffil3s setoriais. A comercialização de planos e seguros saúde teria sido estimulada pela manutenção das relações de intermediação entre Estado e sociedade caracterizadas pelo c1ientelismo e pelo corporativismo no âmbito setoria1. Os "reformistas" teriam se equivocado ao pretender uma democratização na ausência de convocação de atores fundamentais. Os rebatimentos da "reforma por cima" no âmbito do setor saúde teriam se efetivado através das tentativas "mudancistas" de técnicos das universidades e burocratas governamentais que elegem corno principais interlocutores os ocupantes de cargos executivos e de partidos políticos.

Foram os técnicos envolvidos com o estudo, a administração e o planejamento da atenção médico­sanitária os principais artífices e divulgadores dessa política, a maioria deles pertencentes à burocracia governamental ou às

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universidades, os que elegeram como· principais interlocutores os ocupantes de cargos no poder executivo ou nos esquemas partidários dominantes . ... aqui o principal agente das transformações teria sido o "partido sanitário" encastelado no aparelho estatal e apoiado, evidentemente, por autoridades constituídas (SOUZA CAMPOS, 1988 Apud COSTA, /996).

Ou teriam errado em conseqüência da defasagem entre conhecimento teórico e a dinâmica da ação político-administrativa.

O SUDS apesar lÚJS avanços, seja no plano estratégico, seja no operacional, apresentou, como resultado lÚJS políticas que elaborou e executou, um conjunto de "eleitos inesperados" e alguns erros estratégicos, dentre os quais a superestimação do valor político do setor privado contratado, a forte aliança com o sub-sistema de alta tecnologia, a excessiva estadualização lÚJ desconcentração que determinou uma ação clientelística de municipalização seletiva e a pouca valorização, na prática, da implantação de distrilos sanitários como forma de modificar o modelo assistencial vigente (MENDES, /993).

Outro ângulo de análise ex.plora a contradição entre a universalização da assistência à saúde e a opção de empresários e sindicatos de trabalhadores pelos planos e seguros privados. Essa "escolha" de planos pri vados é explicada através ordenamentos de causas e efeitos que a justificam. São evocados como instrumentos de estfmulo da demanda aos planos privados de saúde: a piora da assistência médico-hospitalar pública e urna resistência à universalização por empresários e trabalhadores.

Considera-se que a ex.pansão das empresas que comercializam planos e

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seguros na década de 70 foi obstaculizada pela efetividade dos serviços públicos. ..... a dificuldade de expandir este mercado (nos anos 70), especialmente no meio dos serviços médicos de empresas, dado que os departamentos de recursos humanos destas podiam contar com a atenção médica do INAMPS que era de boa qualidade" (MED[CI, 199 [). Enquanto que os mecanismos de racionamento dos anos 80 (queda na qualidade do atendimento e filas) possibilitam a instauração de um círculo vicioso, em que a insatisfação com os serviços públicos expulsaria cada vez mais os setores com poder reivindicatório pela melhoria dos serviços (FAVARET e OLIVEIRA, 1990). LUZ ([991) adverte para a retomada da visão tradicional dos sindicatos e empresários brasileiros de associar direitos ao trabalho. Segundo essa última concepção o acesso a determinados serviços de saúde entre outros direitos sociais é facultado pela condição de exercfcio do trabalho, especialmente para trabalhadores urbanos.

Costa se posiciona quanto à necessidade de reinterpretar a força do movimento sindical como propulsora de políticas redistributivas em conjunturas de redemocratização pelo alto. A compreensão das relações entre o movimento sindical e o setor saúde deve levar em conta as novas modalidades de organização e negociação de interesses que surgem na década de 80. A negociação direta entre sindicato e empresário, a competição entre centrais sindicais e um hiato ideológico entre lideranças e liderados de base limitaram a capacidade dos sindicatos para transcender a lógica fragmentada e instrumental da ação coletiva. As demandas (opção ativa) por atendimento diferenciado de organizações intermediárias contribuem para a consolidação do mercado de planos e seguros no Brasil (Idem).

No quadro (pg. 112) sistematiza-se as características da maior parte dos trabalhos assinalados.

A busca de novos marcos conceituais para ampliaro potencial explicativo de teorias sobre as reformas sociais bem como seu alcance operacional é uma preocupação de

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estudiosos da saúde coleti va. As consagradas teorias vincadas pelo marxismo (um dos paradigmas em crise - excessivamente generalizantes e reducionicistas ao traduzirem complexos arranjos de interesses em um único conflito: Estado versus classes populares) não seriam potentes o suficiente para interpretar a emergência de práticas democráticas. À democracia, os conflitos seriam inerentes e processuais. As práticas democráticas recriariam continuamente novos direitos e instituiriam polfticas ininterruptamente (BODSTEIN, 1992). Os autores que explicam o "surgimento de um sub-sistema privado" pari passu ao SUS concordam que o aumento de cobertura através de planos e seguros é um dos [imites (talvez o mais visível) para a delimitação do projeto democratizante e universalizante da Reforma Sanitária.

Contudo, a maioria dos trabalhos voltados mais especificamente para a i nterpretação do "surgimento"'cresci mento de demandas às empresas privadas que comercializam planos e seguros saúde pós SUS não está referida, ou mais precisamente não tem a intenção de elaborar repertórios teóricos a partir do objeto empresariamento da prática médica. Ao contrário, essa produção é marcada pela pressa: as pesquisas "correm atrás" de um fenômeno que revela equívocos na concepção da reforma setorial. Importa desvelar, alertar, sobre a existência de um fenômeno oculto aos reformistas. O "fato social" - adesão de segmentos de classe média e trabalhadores qualificados aos planos privados de saúde­que se caracteriza por sua exterioridade, por vezes anterioridade ao indivíduo e sobre ele exerce uma coação irresistível integra, por exemplo, o painel de recursos interpretativos de autores que o utilizam para demonstrar uma relação de causalidade entre o SUS e o aumento de cobertura dos planos privados. Como fazem , por exemplo, (FAVARET e OLlVE[RA, 1990): "Consensualmente, tende-se a indicar a insatisfatória qualidade dos serviços públicos de saúde, bem como a eficiente ação estratégica das empresas [que comercializam planos] envolvidas como responsáveis por este surto expansivo".

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A estrutura de estratificação da sociedade brasileira derrota as utopias redistributivas. O "sistema" se acomoda e se previne contra arranjos jurídico-Iegais formais que prometem a universalização. Fato social e sistema são categorias sobre as quais se constróem os trabalhos de Medici, Favaret e Oliveira e Mendes. Os atores sociais: sindicatos de trabalhadores, quando evocados, "falam" pela voz dos próprios autores que "não resistiram aos mecanismos de racionamento impostos pela queda de qualidade dos serviços públicos".

Os mesmos autores desenham o sistema de saúde apartado das suas vinculaç6es à Previdência Social, subtraindo a história de inserção da saúde no escopo de seus beneffcios. A Previdência Social aparece apenas como fonte pagadora de serviços de saúde a terceiros. Talvez por isso. utilizem o conceito de seguridade social apenas na sua dimensão valorati va e passem a qualificar pela saúde a totalidade do modelo de proteção social brasileiro. A natureza e contradições do conjunto - o plano de beneffcios e serviços - de direitos sociais não é analisada sob um enfoque pragmático. O encolhimento, deslocamento, do espaço institucional da previdência para a saúde retrai o alcance dos esquemas explicativos e não lhes confere maior intensidade na análise exclusivamente setorial "- A análise das mudanças setoriais via relações do "trabalho médico" tampouco é considerada. Sem Previdência e sem transformações nas formas de produção (relações de produção) da medicina, o empresariamento da assistência à saúde reduz-se ao estudo das empresas que comercialjzam planos e seguros.

A opção por analisar um objeto já construído l

", pelas próprias empresas médicas e seguradoras, teve o inquestionável mérito de provocar e talvez ampliar e redirecionar o debate sobre as relações público/privado no setor saúde. A difusão dos conceitos elaborados sob essa matriz é uma evidência inquestionável não s6 da relevância do tema como também da aceitação dos esquemas explicativos de Medici , Favaret e Oliveira e Mendes. Porém, o índice de ideologização" dessas

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interpretações é elevado, a ponto de tomar

como "verídicas" informações sobre o número de pessoas cobertas que as próprias empresas rejeitam 16 e absorver a concepção de auto-expulsão, migração de clientelas do setor público para o privado invertendo a realidade da acumulação de direitos de segmentos da população que longe da expulsão e da migração passam a desfrutar de um cardápio mais ampliado de serviços de saúde.

O sistema de saúde idealizado por Medici e divulgado por Mendes é representado graficamente como uma pirâmide, na qual a base se relaciona aos segmentos de menor poder aquisitivo cobertos pelo SUS e a seguir menores áreas para clientelas mais bem aquinhoadas, sob uma concepção funcionalista l1

, onde a interdependência entre os elementos do sistema é essencial para a sua adaptabi lidade. Tal acepção não convém sequer a uma descrição aproximada da realidade do sistema de saúde brasileiro, onde as sobreposições da oferta para o atendimento de clientes cobertos por planos privados não são a realidade da maior parte dos serviços de saúde. Sobreposição que condiz com a acumulação de direitos e não com a separação de elementos de um sistema que estabelece pautas de consumo exclusivas para cada segmento coberto.

MEDICI, FAVARETe OLIVEIRA, MENDES não obedecem às recomendações de (BODSTEIN, 1992). Ao adotarem um método generalizante. caracteristico do positivismo. que busca no princípio de exclusão/acomodação das clientelas uma causa para o crescimento da cobertura através de planos pri vados de saúde, abandonam o nível analítico (especificidade do fenômeno e sua singularidade como realização da vontade humana) tal como postula Weber, e privilegiam uma descrição que enfatiza a exterioridade dos fenômenos humanos em relação aos que a constróem como realidade objeti va.

Costa contribui com a introdução da análise de características do movimento sindical urbano. Mais do que fixar-se no estudo das relações sindicais com determinados padrões de proteção avança

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para articular a sinergia entre a ação de sujeitos sociais que ocupam cargos e oplam pelas alianças por cima com as de sindicatos que na impossibilidade (limite) de organizar interesses redistributivos optam pelo atendimento de demandas imediatas. Parece clara a intenção do autor de ultrapassar as descrições e impressionismos acerca da (re)conformação de estratificações para o consumo de serviços de saúde, através da "convocação" à cena do ator fundamental. Procura , como pretende a sociologia compreensiva. as experiências e os sentidos das ações de atores concretos.

Mas os exemplos. as evidências, da opção pelos convênios privados encontradas por COSTA (1996) nas pautas de negociação de sindicatos de São Paulo, da Petrobrás e de vários sindicatos de bancários, no final da década de 80, antes de demonstrarem a lese parecem, senão contrariá-Ia, não adequados a comprová-Ia. Pois estes dados devem ser examinados como prováveis reivindicações da manutenção/renovação/ampliação de cobertura de planos já existentes anteriormente.

É claro que outros dados empíricos, inclusive mais contundentes, podem ser buscados para "provar" a hipótese de Costa, tais como o surgimento de entidades de previdência fechada em várias empresas de natureza pública, inclusive as de funcionários municipais, e privada e a reivindicação de prolongamento da cobertura dos planos de saúde nos acordos de demissão coletiva. A imprecisão da informação. porém. não atesta uma opção ativa movida por uma estrutural e genéticacuitura pela diferenciação inerente ao associativismo brasileiro. Por outro lado, o movimento sindical (embora a CUT e Força Sindical não tenham defendido as mesmas posições) explicitou diretrizes e demonstrou força contra a reforma da Previdência e a (re)privatização dos acidentes de trabalho. Portanto, talvez o paradoxo deva ser procurado antes na concepção de proteção social dos sindicalistas, que parecem compreender a Previdência como seguro e não como seguridade social, do que na estrutura e fragilidade da organização sindical.

117

A produção sobre o empresariamento da medicina do segundo ciclo de crescimento da cobertura através de formas empresariais privadas de ofertai reembolso de serviços de saúde lrilha diferentes caminhos teóricos. Com Costa, principalmente . a procura de uma compreensão da ação de atores sociais (movimento sindical e dirigentes governamentais do setor saúde) e suas relações com a configuração das instituições e de suas polfticas. Nos demais autores predomina a ulilização de uma abordagem funcionalista que tem como suporte tipologias dos sistemas de saúde e das empresas que comercializam planos pri vados. Ambas concepções evidenciam suas hipóteses nas mesmas fontes de dados secundários: as próprias empresas médicas e seguradoras.

Ainda assim, a relevância dos trabalhos mais recentes sobre as relações entre público e privado e suas instâncias de mediação bem como das indicações de atores sociais integrantes das agendas das políticas de saúde é indiscutível. O patamar alcançado pelos investigadores do tema possibilita e instiga a produção de novos trabalhos referenciados em outros ângulos de análise. As causas para a expansão dos mecanismos privados ou semi-privados para a obtenção de assistência médica se complementam com as do primeiro ciclo.

Dessa maneira, afigura-se mais interessante avançar o conhecimento do tema não através da discussão sobre a validade teórica de tal ou qual interpretação, mas sim pelo estudo empírico da oferta e demanda dos planos privados de saúde. Isso requer a busca de interpretações plausfveis para o movimento de privatização da saúde a nível da produção de valores e ideologias. A "securitização" dos direitos sociais seria apenas uma reintrodução da lógica liberal ou contém uma nova racionalidade? Por que volta tão fortemente a idéia de seguro no Brasil?

Os estudos sobre os Estados de bem estar social são extremamente fecundos e possibilitam traçar um campo para o estudo do tema. Será como afirma OFFE (1989) que a expansão dos seguros sociais no século

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-, o aetor privado preUdor di HrVÇoa 00 BrMit ~. ",na,", e lnnciarrelW. Ao medclna de ~ no BlNiI IncerfiYoll goYemamerUl, .o aetor pri'llldo l 19$9. 1 ~1

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Emp_ noa snoa 8Oat.mo ... m IIII.11Ç1o rMlr1l •• 11Ud1 OC\4*IoNJ em prol dllINI gettncla di benll'lclol CentrllII ~ II ....... .. ~ arrlllgildldt ll'llre o dIIano a .jrilU lIOCiIII PTodulorw de a..v~ di ..... .. cIIIvlroJllm d --E.a.do no\IO modo di ~ IfIIfI EIIIóo • lOCiedade c .... M ·n.nol IntllVlflClonIIrro IInI!lOI MCIoNIIIrno

Novo ~ papel ~gw Im" pilrII lrIIncendlf I lógicl di IÇIo lretrunerUI I Ir1I~l'III<II. OI ~lcIIIoe. IN'- torte. (cb "0r1III oIi!RJOlUdol) conqu~ rraIoreI NI6rioI I blneticlOl ndiretOI .ti CUllII di um preçolnllldonado cb ba,. proclJJidOI A l6gica di aoidIriIddI só preYIlIce cpindo calegcDs com ptrfiIlÓCio .... 'iOo'ôco priYiIIs;Itdo _ defi,.." a lwor di poftQS r«lllrblliv .. ~do SIIors.u.s. prtv~ml Intarbcu;:kl co ~ poIIkxII dc:n*wlI ..

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XX vincula-se à expansão do trabalho assalariado? E por conseqüência a crise dos modelos universalistas é decorrente do desemprego estrutural , da "cidadania industrial"? Ou será como quer ESPING-

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ANDERSON (1991) que a lógica da universalização dos direitos sociais. levada a cabo pela social-democracia européia é a da desmercantilização do trabalho?

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I Para Cecnia Donnangelo (1983: 27) a noção de coletivo possui uma ampla variação que vai desde: o coletivo em relação a um determinado meio comum; o coletivo como conjunto de indivíduos; o coletivo como resultante da interaçào de elementos componentes de um sistema; o coletivo como conjunto de efeitos ou conseqüências da vida social e O coletivo como social - campo específico e estruturado de práticas. 2 Por exemplo: Donnangelo, M.C.F. Medicina e Sociedade. São Paulo: Pioneira. 1975. Cohn, A. Previdência Social e Populismo. Dissertação de Doutorado, USP, 1979, Possas. C. A. Medicina e Trabalho Braga, J. C. S e Paula, S. G. Saúde e Previdência São Paulo: Hucitec, 1986. ) Os convênio-empresa sào articulados pela Previdência Social com grupos médicos para a prestação de assistência a trabalhadores urbanos, em geral de empresas de grande porte situadas nas regiões sudeste e sul e em especial no Estado de São Paulo. O INPS se desobrigava ao atendimento dos empregados das empresas com convênios não sendo permitida a opção do beneficiário por uma ou outra modalidade de prestação de serviços. Para tanto dispensava a empresa convenente de parte da contribuição devida à

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Previdência. " Foi s6 a panir de 1945 com o advento no pós-guerra, das idéias "beveridgeanas" a respeito de uma previdência sociaJ ampla. assistencial, pública, que as idéias (principalmente dos técnicos do IAPI de que a Previdência Social deveria tratar só de aposentadorias e pensões) a respeito do seguro social, restritivo, contratuaJ, atuarial seriam parcialmente suplantadas (Cordeiro, 1984: 29). 3 Os ramos dinâmicos da economia comprendem as indústrias e serviços de: artefatos de borracha; urbanas; qufmicas; farmacêuticas e medicinais; papel e papelão; metalurgia; materiaJ elétrico; mecânica; material de transporte (Giffoni , 1981 p.44). 6 Criticas/Reivindicações dos trabalhadores:

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1"unIe: Gilfum, R. O. (198 1,121·122)

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1 Cf Anais do Congresso dos Serviços Médicos Assistenciais Próprios das Empresas realizado em 1980 em São Paulo onde vários debatedores defendem com veemência as vantagens dos serviços próprios no que tange a economia de despesas da empresa e satisfação dos trabalhadores (apud Giffoni, 1989: 73). SO complexo médico-empresarial é uma conseqüência do processo de subordinação das relações sociais de prestação de cuidados à saúde às relações capitalistas de produção que se concretiza na ampliação do número de hospitais privados. mudança do caráter filantrópico de instituições civis para lucrativo e na consolidação de grupos médicos possuidores de uma base empresarial sólida que atuam através da modalidade medicina de grupo. As relações entre as empresas médicas com hospitais e estabelecimentos para realização de exames complementares e tratamentos especializados conformam uma rede de conexões do complexo médico-empresarial (Cordeiro, 1984: 30, 57 e 104). "Cordeiro cita como exemplo médicos que possuem destacado papel enquanto técnicoslburocratas da Previdência na elaboração de políticas favoráveis às empresas médicas, entre os quais o Dr. Thomaz Raposo, e são idealizadores/proprietários de grupos de empresários médicos. 10 Inclusive por não ter sido a intenção de Bodstein realçar nuances entre os trabalhos e muito menos detalhar e assinalar a importância de aspectos isolados dos mesmos. 11 A influência de Poulantzas se faz notável em todos os trabalhos mencionados especialmente na compreensão da materialidade "ossatura"do Estado. Da relação do Estado com as relações de produção e adivisão social do trabalho. Ou seja das lutas que oconstr6em e que o deslocam de limites não estabelecidos entre o público e o privado. É a usurpação pelo Estado de relações privadas e simuhaneamente a separação público-privada por ele instituída que lhe confere perspectivas ilimitadas de poder (1985: 63; 77-81). 12 Segundo a Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge) cerca de 40% da população coberta por planos-empresa em 1973 pertencia a empresas que realizavam convênios com grupos médicos sem intermediação do INPS. Em 1979, no município do Rio de Janeiro, a proJX)rçãode convênios homologados com a Previdência para os "direto empresa-empresa" era de I: I (Cordeiro, 1984: 88). llA afirmação da americanização do sistema no Brasil, por exemplo não contribui para a caracterização ou delinear tendências das políticas sociais no Brasil. Na verdade os autores ao pretenderem formular paradoxo - refonna inglesa/sistema americano - a partir do sistema de saúde cometem no mínimo uma inversão de proporções,já que então terfamos um sistema residual (ação estatal) para 80% da população. Isso para não mencionar os subsídios estatais aos planos privados nos EUA e a intervenção em outros setores sociais como a educação. 14 Os argumentos desenvolvidos por MEDICI, FAVA RET e OLIVEIRA, MENDES são, resguardadas as diferenças de intenções e envoltórios teóricos, semelhantes aos expressos pelo Dr. Flávio Heleno Poppe Figueiredo da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (ABRAMGE) que também põe em relevo a relação entre o SUS e os planos privados de saúde.

"O grande markeling de venda dos planos privadosfoi e conlinua sendo afalência da medicina estalai. As siglas criadas pela interminável inventiva dos burocralas da saúde - PREVSA ÚDE, P/ASS, CONASP, SUDS - sucederam-se num perverso ciclo social de/racassos. Da polêmica Constituição de 88 para cá lemos o SUS. É o novo campeão de vendas! (Jornal do Brasil 28/0//9/ )".

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ISToma_se de empréstimo a acepção de Poulantzas para ideologia. "O termo ideologia s6 faz sentido se admitir que os procedimentos ideológicos comportam uma estrutura de ocultação-inversão (1985:36). 16Um exemplo é a dúvida de Júlio Bierrembach, Vice Presidente de Seguros da Sul América. no V Fórum Jurfdico do Seguro Privado em 1995, sobre a informação relativa ao número de pessoas cobertas por planos de saúde. "Ouve-se falarem 32 milhões de brasileiros segurados na área de saúde há mais de cinco anos". 17 Para Weber toda construção conceitual funcional (que parte de um "todo") somente cumpre uma tarefa prévia para a verdadeira pesquisa sociológica. A interpretação "de maneira individualista", isto é a partir da ação dos indivíduos permite opor formas sociais a organismos ...... a sociologia pode "compreender" o comportamento dos indivíduos que participam neste todo, ao passo que, contrariamente, não podemos "compreender" o comportamento, por exemplo, das células, mas apenas apreendê-lo funcionalmente ... (1992: 409)"

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