artigo sobre masculinidades e feminismo - benedito medrado e jorge lyra

Upload: jorge-lyra

Post on 31-Oct-2015

97 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

Este artigo tem o objetivo de contribuir para os estudos e pesquisas sobre homens e masculinidades, apresentando um marco conceitual de gênero, a partir de uma matriz que dialoga com produções feministas e se organiza em quatro eixos: 1) o sistema sexo/gênero; 2) a dimensão relacional; 3) as marcações de poder; e 4) a ruptura da tradução do modelo binário de gênero nas esferas da política, das instituições e das organizações sociais.

TRANSCRIPT

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 424, setembro-dezembro/2008 809

    PPPPPor uma matriz feminista deor uma matriz feminista deor uma matriz feminista deor uma matriz feminista deor uma matriz feminista degnero para os estudos sobregnero para os estudos sobregnero para os estudos sobregnero para os estudos sobregnero para os estudos sobre

    homens e masculinidadeshomens e masculinidadeshomens e masculinidadeshomens e masculinidadeshomens e masculinidades

    Copyright 2008 by RevistaEstudos Feministas.1 Conforme Dbora DINIZ e PaulaFOLTRAN, 2004; e Karen GIFFIN,2005.2 Maldito especialmente no senti-do daquele que traz infelicidade,incomoda, aborrece; funesto, de-testvel, infeliz, enfadonho(HOUAISS, 2001).3 Conforme Enrique GOMRIZ,1992; e Margareth ARILHA, SandraUNBEHAUM e Benedito MEDRADO,1998.4 Alguns dos trabalhos produzidosnessa poca: Tim CARRIGAN,

    Benedito MedradoUniversidade Federal de Pernambuco

    Jorge LyraInstituto PAPAI

    1 Situando nossa argumentao1 Situando nossa argumentao1 Situando nossa argumentao1 Situando nossa argumentao1 Situando nossa argumentao

    Nos ltimos 40 anos, em que os estudos de gnero seconsolidaram na produo acadmica ocidental,especialmente no campo das Cincias Humanas e Sociais,foram produzidos trabalhos a maioria por mulheres pesqui-sadoras1 que discutem os homens e o masculino comofaces malditas2 das relaes que produzem desigualdadessociais e subordinam as mulheres.3

    As produes sobre as masculinidades, como objetode estudo propriamente dito, por outro lado, tm incio nofinal da dcada de 1980,4 a partir de trabalhos produzidosde maneira ainda pouco sistemtica, com concentrao

    ResumoResumoResumoResumoResumo: Este artigo tem o objetivo de contribuir para os estudos e pesquisas sobre homens emasculinidades, apresentando um marco conceitual de gnero, a partir de uma matriz quedialoga com produes feministas e se organiza em quatro eixos: 1) o sistema sexo/gnero; 2)a dimenso relacional; 3) as marcaes de poder; e 4) a ruptura da traduo do modelobinrio de gnero nas esferas da poltica, das instituies e das organizaes sociais. Paratanto, dialogamos com produes contemporneas que adotam gnero como categoriaanaltica e se baseiam em referenciais tericos distintos, mas tm em comum (e se autodefinema partir de) uma perspectiva feminista crtica. A partir dessa matriz, traz-se uma anlise dosestudos sobre os homens e masculinidades no campo da sade, sexualidade e reproduo,destacando a necessidade de abrir espao para novas construes tericas que resgatem ocarter plural, polissmico e crtico das leituras feministas.Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chave: homens; masculinidades; teoria feminista; feminismo.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    810 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    em autores especficos e sem necessariamente sedesdobrarem em uma discusso terica, epistemolgica,poltica e tica ampla e consistente sobre o tema.5

    Mais recentemente, especialmente a partir da segun-da metade da dcada de 1990, tem sido produzido umconjunto de obras que buscam sistematizar produesdiversas de modo a possibilitar o aprofundamento almeja-do.6 Buscando produzir uma organizao dessas produes,especialmente aquelas publicadas entre 1995 e 2002,Robert (agora Rayween) Connell,7 Jeff Hearn e MichaelKimmel publicam, em 2005, o Handbook of Studies on Menand Masculinities, no qual abordam o que eles denominamdesenvolvimento do campo de pesquisas sobre masculini-dades, focalizando o modo como os estudos e pesquisastm construdo esse campo: desde um olhar mais amplo eglobal at a expresso mais ntima e pessoal.8 Este, assimdenominado, campo , segundo esses autores, constitudoa partir de produes que apresentam objetos distintos:

    1. a organizao social das masculinidades emsuas inscries e reprodues locais e globais;

    2. a compreenso do modo como os homensentendem e expressam identidades de gnero;

    3. as masculinidades como produtos de interaessociais dos homens com outros homens e commulheres, ou seja, as masculinidades comoexpresses da dimenso relacional de gnero (queapontam expresses, desafios e desigualdades);

    4. a dimenso institucional das masculinidades,ou seja, o modo como as masculinidades soconstrudas em (e por) relaes e dispositivosinstitucionais.

    Os argumentos desenvolvidos neste artigo situam-seentre o terceiro e o quarto nveis de anlises definidos acima,na medida em que consideramos a Sade Pblica comoum campo de relaes interpessoais e institucionais, que seorganizam em dispositivos e relaes de poder e quemarcam posies de sujeito e modos de ser, de saber e defazer, como desenvolvemos mais adiante.

    Nosso objetivo contribuir para as reflexes feministassobre homens e masculinidades, apresentando um marcoconceitual de gnero, no contexto da sade pblica, a partirde uma matriz que se organiza em quatro eixos: 1) o sistemasexo/gnero; 2) a dimenso relacional; 3) as marcaes depoder; e 4) a ruptura da traduo do modelo binrio degnero nas esferas da poltica, das instituies e dasorganizaes sociais. Para tanto, dialogamos comprodues contemporneas que adotam gnero como

    Robert CONNELL e John LEE,1985; KAUFMAN, 1987; MichaelKIMMEL, 1987; entre outros.5 Conforme Benedito MEDRADOe Jorge LYRA, 2002; e JuanGuillermo FIGUEROA-PEREA, 2003.6 Dentro da profcua produonessa rea, citamos R. W.CONNELL, 1995a e 1995b; MiriamGROSSI, 1995; ARILHA, UNBEHAUM,MEDRADO, 1998; PierreBOURDIEU, 1998.7 Robert Connell submeteu-se cirurgia para mudana de sexoe, mais recentemente, vempublicando ou reeditando suasprodues com assinatura deRayween (seu nome atual) ousimplesmente R. W. Connell.8 CONNELL, HEARN e KIMMEL,2005, p. 7.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 811

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    categoria analtica e baseiam-se em referenciais tericosdistintos, mas tm em comum (e se autodefinem a partir de)uma perspectiva feminista crtica.9

    Esta proposta decorre de nossa preocupao tericae poltica com relao produo acadmica e/ou militantee suas repercusses na formulao e implementao depolticas pblicas em sade a partir do enfoque de gnero.10

    Preocupao semelhante orienta as reflexes deEstela Aquino,11 em seu artigo intitulado Gnero e sade:perfil e tendncias da produo cientfica no Brasil. Segun-do essa autora, as reflexes tericas e epistemolgicas sobreas relaes de gnero e sade no campo da Sade Coletivaainda so escassas e a incorporao da abordagem degnero na epidemiologia tem sido lenta e enfrenta dilemastericos que geram obstculos ao uso de gnero comocategoria analtica e no apenas como substituio davarivel sexo. Dificuldade maior apontada por essaautora incorporao de outras categorias sociais, taiscomo raa/etnia e idade. S mais recentemente e, dedistintas formas, segundo a autora, que as intersecesde raa/etnia e idade/gerao so incorporadas ao debatede sade, classe e gnero.

    2 Gnero e sade: distintas formas e2 Gnero e sade: distintas formas e2 Gnero e sade: distintas formas e2 Gnero e sade: distintas formas e2 Gnero e sade: distintas formas eobjetosobjetosobjetosobjetosobjetos

    Quando Aquino destaca as distintas formas, elaest se referindo particularmente interdisciplinaridade nocampo da Sade Coletiva. De todo modo, observa que aadoo da abordagem de gnero como construocultural e recorrendo a estratgias qualitativas depesquisa12 est em maior medida na produo dascincias sociais em sade, embora segundo ela, o principalparadigma e categoria explicativa tem sido ainda omarxismo e as determinaes sociais de classe. No h (ouh muito pouca) interface com os outros determinantessociais da sade.

    Nesse trabalho, Aquino faz um amplo e importantemapeamento do debate brasileiro sobre gnero e sade,no qual os principais temas foram reunidos, por ela, em cincosubgrupos: 1) reproduo e contracepo; 2) violncia degnero, e suas variaes (tais como violncia domstica,familiar, conjugal e sexual); 3) sexualidade e sade (comnfase nas DST/Aids); 4) trabalho e sade (incluindo otrabalho domstico e o trabalho noturno); e 5) outros temasemergentes ou pouco explorados como o envelhecimento ea sade mental. Essa diversidade de temas ganha contornosainda mais diversos quando observamos a pluralidade deenfoques da Sade Pblica em suas distintas formas ou

    9 Entre as obras que deramsustentao a esses argumentos,destacamos especialmenteTeresita BARBIERI, 1992; Mara JessIZQUIERDO 1994 e 2006; JoanSCOTT, 1995; Donna HARAWAY,1995; e Verena STOLCKE, 2004.10 Baseamos esses argumentosespecialmente em produes deMaria Betnia VILA, 2003; eFIGUEROA-PEREA, 2005.11 Estela AQUINO, 2006.

    12 AQUINO, 2006, p. 128.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    812 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    diferentes subreas. A subrea de Planejamento e Polticasde Sade foi, segundo a autora, a que menos incorporou aabordagem de gnero. Aquino ressalta ainda que

    Os temas nobres desta subrea, tais como modelosde ateno, controle social e movimentos sociais,relaes de poder e estrutura de sade, tm tidopouca influncia da perspectiva de gnero. Isso jhavia sido constatado entre as cincias humanas pelamenor penetrao desse enfoque nas cinciaspolticas, comparativamente antropologia, sociologia e histria.13

    O diferencial dessas produes so os estudosrecentes de avaliao em sade, que introduziram gnerocomo categoria analtica, porm, segundo a autora,voltando-se prioritariamente a estudos sobre a sade dasmulheres. Ou seja, estes parecem ainda se orientar pelomodelo binrio masculino-feminino e adotam a substituiode gnero por sexo, privilegiando, muitas vezes de modoexclusivo, as experincias das mulheres.

    Nesse processo, nossa produo situa-se emconsonncia com produes recentes que buscam resgatara importncia das contribuies do feminismo, as quais sevm perdendo ao longo da histria com o usoindiscriminado e despolitizado do conceito de gnero,ou seja, de seus usos e abusos, como define Mara JessIzquierdo.14

    Assim, postulamos a necessidade de sistematizaocrtica desse debate, especialmente no que se refere aotrabalho voltado aos homens e masculinidades no campodos direitos reprodutivos, particularmente no contexto daspolticas pblicas.15 Para tanto, necessrio reconhecer,por um lado, que 1) as teorias de gnero que dialogammais diretamente com o feminismo constituem um campoterico-epistemolgico em constante desenvolvimento ereviso16 e, por outro, que 2) os estudos de gnero, emborapor vezes sejam considerados uma espcie de evoluodo pensamento feminista,17 precisam resgatar os princpioscrticos a partir dos quais foram forjados.

    2.1 P2.1 P2.1 P2.1 P2.1 Por uma leitura feminista de gneroor uma leitura feminista de gneroor uma leitura feminista de gneroor uma leitura feminista de gneroor uma leitura feminista de gneroem sadeem sadeem sadeem sadeem sade

    importante reconhecer que, no mbito dosmovimentos sociais que se constituem e se desenvolvem apartir dos anos 1960, os movimentos de mulheres e feministasso considerados relevantes devido ao impacto quegeraram sobre a conformao das instituies.18 Tanto noplano internacional como no plano brasileiro, amovimentao das mulheres em prol de uma sociedade

    15 SABO, 2000.16 Conforme Gayle RUBIN, 1986;HARAWAY, 1995 e 2004; JudithBUTLER, 2003a e 2003b; e RUBINe BUTLER, 2003.17 Enrique Gomriz, por exemplo,em seu artigo publicado em1992, faz uma retrospectivahistrica das produes sobregnero e, de certo modo, acabapor realizar uma leitura quaseevolucionista das produes quepartem dos estudos sobremulheres para os estudos degnero, em que estes ltimosno guardariam nenhumareferncia do contexto histricoem que os primeiros emergem(GOMRIZ, 1992).18 Conforme Anette GOLDBERG,1989; Cynthia SARTI, 2004; AnaAlice COSTA, 2005; e LucilaSCAVONE, 2007.

    14 IZQUIERDO, 1994.

    13 AQUINO, 2006, p. 128.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 813

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    mais justa tem levado a propostas de mudanas nascondies de vida de homens e mulheres. Ao mesmo tempo,essa movimentao vem constituindo novos sujeitos (maiscomplexos) e gerando tambm uma reviso dosfundamentos que tm orientado as cincias, particularmentehumanas e sociais, e cada vez mais as cincias da naturezae da sade.19

    Em artigo publicado nesta revista, intitulado Ofeminismo brasileiro desde os anos 1970: revisitando umatrajetria, Cynthia Sarti20 afirma que, em nosso pas, asprodues tericas e polticas feministas se consolidam nadcada de 1970 a partir de duas tendncias. Uma delastinha como foco o mundo privado ou, nas palavras daautora, o terreno fluido da subjetividade. Essa tendnciacaracterizou-se especialmente pelo interesse em grupos deestudos, de reflexo e de convivncia. A segunda tendncia,que se tornou mais expressiva, voltava-se para a atuaopblica das mulheres, tendo como foco questes relativasao trabalho, ao direito, sade e redistribuio de poderentre homens e mulheres. Esta foi, segundo Sarti, a correnteque posteriormente buscou influenciar as polticas pblicasem nosso pas, empregando canais institucionais criadosdentro do prprio Estado, no perodo da redemocratizaodos anos 1980.

    A partir da dcada de 1980, como abordado emestudo anterior,21 a produo terica e poltica do feminismotem sido mltipla, albergando diferentes tendncias eevidenciando transformaes.22 Porm, assumiu-se no Brasila perspectiva internacional, aparentemente hegemnica,de os estudos feministas no mais discutirem sobre a mulher,mas sobre as relaes de gnero, no obviamente semcontrovrsias, pois, como apontam Snia Corra e AdrianaVianna, na dinmica da militncia feminista ainda existegrande resistncia no que se refere a abrir mo destepatrimnio, ou seja, do capital poltico construdo ao redorda categoria mulher, associada diretamente ao seupotencial de representao.23

    Numa seara conceitual e poltica contempornea,que se coloca inclusive para alm do contexto da pesquisaacadmica, observa-se um grande e profcuo debate sobreo sujeito poltico do feminismo.24 No este o objeto dereflexes deste artigo.25 Porm, podemos listarquestionamentos que emergem em diferentes contextos, tantoacadmicos como na militncia poltica ou em produeshbridas (a grande maioria). Alguns desses questionamentospoderiam ser assim resumidos:

    a legitimidade do sujeito poltico mulher,construda pelos movimentos sociais, corre o risco

    19 Conforme HARAWAY, 1995;STOLCKE, 1998; AQUINO, 2006; eEvelyn FOX KELLER, 2006.20 SARTI, 2004.

    21 LYRA, 1997.

    22 Conforme GOLDBERG, 1989;BARBIERI, 1992; IZQUIERDO, 1994;e SCOTT, 1995.

    23 CORREA e VIANNA, 2006, p. 10.24 Ver, por exemplo, LindaNICHOLSON, 2000; e SilvanaMARIANO, 2005.25 Em sua tese de doutoramento,intitulada No basta ser mulher,tem de ter coragem: uma etno-grafia sobre gnero, poder, ativis-mo feminino popular e o campopoltico feminista de Recife PE,Alinne Bonetti traz contribuiestambm importantes para essedebate (BONETTI, 2007). Vertambm Claudia COSTA, 2002;MARIANO, 2005; e AdrianaPISCITELLI, 2002 e 2004.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    814 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    de se esvaziar a partir da ampla mirada que oconceito de gnero produz?

    no campo dos estudos de gnero, qual deveriaser o foco das investigaes e proposiesdecorrentes deste terreno tencionado?

    no campo da produo terica feminista, quempode, de fato e de direito, exercer, representar ouposicionar-se a partir do feminismo, considerandoque foram as mulheres que se propuseram amodificar sua condio de existncia e que aafirmao do sujeito poltico mulher tambm sefundamenta no protagonismo (de voz e atos)feminino?

    as relaes mais igualitrias e democrticasentre homens e mulheres, para o feminismo, seriam,em ltima instncia, uma utopia?

    Estas so perguntas que nos alimentam e/ou nos socolocadas como desafios e que, de certo modo, ecoam emcada linha deste texto, porm ultrapassam seus limites epotencialidades. Talvez, essas questes ultrapassem osprprios limites do feminismo e sejam um problema cujaresposta deva incluir outros interlocutores.

    No que se refere, particularmente, construo dosujeito poltico mulher, Guacira de Oliveira nos traz umapreocupao importante sobre o risco que a homogenei-zao de um sujeito nico (mulher) produz ao desconsideraras diferentes inseres polticas das mulheres na sociedade.Segundo ela, um grande desafio para o nosso movimento[feminista] transpor os limites do pensamento poltico paraalm das identidades e abarcar a angstia de ser negra,ser indgena, ser lsbica, super-explorada no mercado detrabalho ou excluda dele.26 Em outras palavras, para ela,o feminismo precisa ser submetido a uma anlise de gnero,em sua dimenso relacional do poder.

    Trata-se de realizar operaes que sejam capazes delidar com os nossos conflitos e contradies, dereconhecer os campos de fora, referncias ecapacidades e enfrentar as desigualdades ehierarquias no prprio movimento feminista. A tarefaconsiste em incitar processos de negociao etraduo polticas, desafiando o pensamento asuperar a aritmtica simples da soma entre diferentesforas polticas, para podermos chegar a resultadosmais complexos.27

    Esse desafio do movimento tambm apontado porautoras como Verena Stolcke28, Judith Butler,29 ClaudiaFonseca30 e Nancy Fraser,31 que alertam para o risco de o

    26 OLIVEIRA, 2007, p. 4.

    27 OLIVEIRA, 2007, p. 4.

    28 STOLCKE, 2002 e 2004.29 BUTLER, 2003b.30 FONSECA, 2003.31 FRASER, 2007.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 815

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    emprego da categoria mulher32 incorrer em um retorno aum essencialismo que busca a mulher de verdade, aquelaa partir da qual e para a qual se inscreve o feminismo. Poroutro lado, alerta-se para a fragmentao da prpria lutadas mulheres, decorrente da adeso s polticas identitriasparticulares, com uma defesa forte das diferenas (de sexo,de orientao sexual, de anatomia genital, de raa, degnero e de subjetividade), cada vez mais presente emnossa sociedade, dificultando a demanda por umaredistribuio igualitria de poder e de justia social.

    Assim, sem ter aqui o objetivo de oferecer respostasou modelos ou ainda fazer um amplo balano das correntesepistemolgicas, tericas e polticas que tm definido oconceito de gnero como categoria analtica,destacamos, com base nas reflexes acima, pelo menosquatro componentes do marco conceitual que, em nossaperspectiva, auxiliam na formulao de uma matriz feministapara estudos sobre homens e as masculinidades. Esse marcoconceitual estrutura-se em quatro eixos: 1) o sistema sexo/gnero; 2) a dimenso relacional; 3) as relaes de poder; e4) a ruptura da traduo do modelo binrio de gnero nasesferas da poltica, das instituies e das organizaessociais.

    3 Definindo um marco conceitual3 Definindo um marco conceitual3 Definindo um marco conceitual3 Definindo um marco conceitual3 Definindo um marco conceitual

    Gayle Rubin, antroploga feminista, uma dasprincipais referncias sobre o que se concebe como sistemasexo/gnero. Em seu artigo The Traffic in Women: Notes onthe Political Economy of Sex, publicado originalmente em1975,33 essa autora, referenciada por vrios estudosposteriores, denomina o sistema de sexo/gnero como oconjunto de disposies pelas quais uma sociedadetransforma a sexualidade biolgica em produtos daatividade humana, e pelas quais se satisfazem essasnecessidades humanas transformadas.34

    Assim, o primeiro exerccio para definio de nossomarco conceitual consiste em reafirmar a necessidade dedesnaturalizar as prescries e prticas sociais atribudasa (e incorporadas e naturalizadas por) homens e mulheres,consideradas marcaes masculinas e femininas. Comoobserva Teresita de Barbieri,

    [...] os sistemas de sexo/gnero so os conjuntos deprticas, smbolos, representaes, normas e valoressociais que as sociedades elaboram a partir dadiferena sexual antomo-fisiolgica e que dosentido satisfao dos impulsos sexuais, reproduoda espcie humana e em geral ao relacionamentoentre as pessoas.35

    32 Cito a nota de rodap elabora-da por Teresita de Barbieri parachamar a ateno para o signifi-cado do uso da palavra mulherno singular ou no plural: O empre-go no singular ou plural no teori-camente irrelevante, posto quemulher faz referncia a umaessncia feminina nica (o eternofeminino), a-histrica, fundamen-tada em concepes biolgicase metafsicas. Por outro lado,mulheres expressa a diversidadee historicidade de situaes emque se encontram as mulheres(BARBIERI, 1992, p. 113, nota derodap 5, traduo nossa).

    33 Nesse trabalho, Rubin discutecriticamente referncias fundan-tes da teoria social contempor-nea, especialmente Marx, Engels,Levis-Strauss, Freud e Lacan(RUBIN, 1986).34 RUBIN, 1986, p. 37, traduonossa.

    35 BARBIERI, 1992, p. 114, traduonossa.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    816 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    Mara Jess Izquierdo adota tambm o conceito degnero como categoria analtica para compreender desi-gualdades sociais. Essa autora considera que a desigual-dade fundamental entre homens e mulheres reside nasformas como os seres humanos se relacionam na produoda sua existncia, ou seja,

    [...] a sociedade se acha estruturada em dois gneros,o que produz e reproduz a vida humana, e o queproduz e administra riquezas mediante a utilizao dafora vital dos seres humanos. Vemos que o setorprodutivo da vida humana se organiza em condiesde dependncia com relao ao setor dedicado produo da riqueza e administrao.36

    Essa autora diferencia sexo e gnero, bem comodesigualdades de gnero distribuio desigual de poderem funo do plo produo/reproduo da vida e pro-duo/administrao de riquezas e desigualdades desexo decorrentes do fato de essas atividades seremexecutadas por homens ou mulheres (machos y hembras,no original) , desigualdades essas que podem, ou no,coincidir:

    [...] em nossa sociedade o que se apresenta comoespecfico do gnero feminino o fato de que suacontribuio para a produo da existncia aproduo da prpria vida humana como tal emcontraponto as atividades e posies sociais atribudasaos homens de ter um trabalho assalariado e participarna vida poltica [...].37

    As experincias reprodutivas e o cuidado para comos filhos so atividades relacionadas produo ereproduo da existncia humana e, portanto, de gnerofeminino, sendo, alm disso, desenvolvidas basicamentepor mulheres. Durante sculos, seja no espao daintimidade,38 seja no espao da expresso pblica,39 essaassociao entre gnero feminino e vida reprodutiva foinaturalizada: a maternidade e o amor criana pequenaseria da natureza dos instintos nas mulheres.

    Nesse mesmo artigo, Izquierdo apresenta uma rica einteressante sistematizao dos usos do termo e do conceitode gnero,40 os quais podem incorrer em abusos dediferentes tipos, pela impreciso de suas abordagens, entreeles:

    no se usa nem o termo e nem o conceito estudos que adotam termos como homem,mulher, macho, fmea, masculino, femi-nino para caracterizar a ordem social que consi-dera a masculinidade e a feminilidade como partesdos atributos sexuais, naturais e que condicionam

    40 [...] termo uma unidade lin-gstica enquanto o conceito aunidade do pensamento; no um dado que procede da expe-rincia, e sim da busca de explica-es que requer a anlise [...](Mario BUNGE, 1989, apudIZQUIERDO, 1994, p. 33, traduonossa).

    38 Ver Elisabeth BADINTER, 1985.39 Ver Barbara BEATTY, 1989.

    37 IZQUIERDO, 1994, p. 49,traduo nossa.

    36 IZQUIERDO, 1994, p. 49,traduo nossa.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 817

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    as capacidades das pessoas para realizarqualquer atividade ou ocupar qualquer posiosocial. Por exemplo, as mulheres tm instintomaternal, os homens instinto agressivo (p. 25);

    usa-se o termo e no o conceito estudos quesubstituem mecanicamente o termo sexo pelotermo gnero, estratgia comum em pesquisasde natureza quantitativa (notadamente em quadrose tabelas, quando referem os informantes homenscomo gnero masculino e as mulheres como gnerofeminino), mas tambm presente em estudosqualitativos quando focalizam as diferenas, semcompreend-las como desigualdades.

    Para alm da complexidade que tm assumido os(ab)usos do conceito de gnero nas Cincias Humanas eSociais, a distino que coloca de um lado sexo-biologia edo outro gnero-cultura tem sido tambm questionada. Aprpria diferenciao sexual (macho e fmea) tem sidocolocada em suspeio, no sendo considerada como algodefinitivo, a-histrico e determinado exclusivamente pelosconhecimentos e verdades oriundas das medidas einstrumentos produzidos pelas cincias da natureza. Comopodemos observar em Barbieri,

    Na espcie humana se distinguem vrios nveis dadiferena sexual: o sexo cromossmico, o sexogonadal, o hormonal, o anatmico e o fisiolgico.Porm, este conhecimento muito recente na histriahumana, pelo que se pode supor que os sistemas degneros se tm constitudo a partir da observaodas diferenas anatmicas e fisiolgicas para a qualno tem sido necessrio o uso de microscpioseletrnicos para se fazerem evidentes.41

    Assim, tambm os usos do conceito de sexo tmsido alvo de questionamentos. O historiador Thomas Laqueur,em seu livro Inventando o sexo: corpo e gnero dos gregosa Freud, investigou inmeros conceitos relacionados construo das diferenas sexuais.42 Ele relata minuciosa-mente as observaes que afirmavam, desde a filosofiagrega, um modelo de sexo nico. A mulher era o homeminvertido. Os estudos de anatomia buscavam correspondn-cias nos corpos. Como descreve Jurandir Freire Costa, a partirdas idias de Laqueur,

    A noo de sexo estava subordinada idia daperfeio metafsica do corpo masculino. A hierarquiasexual ia da mulher ao homem. Sexo tinha comoreferente, exclusivamente, os rgos reprodutores dohomem. A natureza havia feito com que a mulher notivesse o mesmo calor vital do homem, a fim de que

    42 LAQUEUR, 2001.

    41 BARBIERI, 1992, p. 114, traduonossa da nota de rodap 6.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    818 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    pudesse abrigar o esperma e os vulos fecundadossem destru-los. A frieza da mulher era necessria reproduo. Se a mulher fosse to quente quanto ohomem, o embrio poderia ser dissolvido.43

    Contudo, a partir do sculo XVIII, a caracterizaodo corpo no se fazia mais com o objetivo de buscarsemelhanas, mas diferenas. Procuraram-se evidncias deque o orgasmo feminino no necessrio concepo, eesse argumento vai ser essencial ao modelo de sexos opostosincomensurveis. Lacquer mostra como os dois modelos sexo nico e sexos opostos coexistem, sendo empregadosconforme o contexto de disputas dos significados sociais.

    Uma das explicaes plausveis fornecidas por Costapara a atual oposio binria entre os corpos masculino efeminino que essa diferenciao, embora aparentementenatural, teria um fundamento poltico, localizado nosinteresses da sociedade burguesa:

    [...] os ideais igualitrios da revoluo democrtico-burguesa tinham que justificar a desigualdade entrehomens e mulheres, com fundamento numadesigualdade natural [...]. Para que as mulheres, assimcomo os negros e os povos colonizados, nopudessem ter os mesmos direitos de cidados homens,brancos e metropolitanos, foi necessrio comear ainventar algo que, na natureza, justificasseracionalmente as desigualdades exigidas pela polticae pela economia da ordem burguesa dominante.44

    Verena Stolcke oferece uma contribuio valiosa paradiscutir as relaes sociais generificadas, a partir da anlisehistrica da constituio da sociedade colonial ibero-americana no artigo O enigma das intersees: classe,raa, sexo, sexualidade a formao dos imprios transa-tlnticos do sculo XVI ao XIX, em cuja argumentao,defende a autora,

    A experincia colonial ibrica permite assimtranscender as justaposies e aliteraesconvencionais dos critrios de identificao de classe,raa e gnero. O gnero no trata de mulheres comotais. Refere-se aos conceitos que prevalecem em umasociedade sobre o que so as mulheres em relaoaos homens enquanto seres humanos sexualmenteidentificados [...] Torna-se exemplo tambm dasconseqncias que a moralidade sexual e osesteretipos de gnero prevalentes tiveram para todasas esferas da vida das mulheres.45

    Em sntese, importante reconhecer que a leiturasobre o sistema sexo/gnero aqui adotada no reifica adicotomia natureza-cultura, mas busca compreender os usos

    43 COSTA, 1995, p. 6.

    44 COSTA, 1995, p, 7.

    45 STOLCKE, 2006, p. 16-17.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 819

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    e efeitos que prticas sociais, inclusive as cientficas,produzem a partir do exerccio constante de oposio oude busca de similitude entre os dois sexos. Apostamos, aocontrrio, na complexa teia que define as relaes degnero, que nos aponta mais para a diversidade do quepara a diferena, como resposta dicotomia e desigualdade.

    Partimos, assim, para o segundo componente domarco conceitual aqui proposto: a dimenso relacional queo conceito de gnero trouxe para nosso vocabulrioanaltico.46 O gnero no pode ser pensado como entidadeem si, mas como construes interdependentes. Nessaperspectiva, Barbieri defende que

    no se pode apenas estudar as mulheres, pois o objetodos estudos de gnero mais amplo, e, sendo assim,faz-se necessria uma anlise em todos os nveis,mbitos e tempos, das relaes mulher-homem,mulher-mulher, homem-homem para se alcanaremmaiores resultados.47

    Porm, necessrio considerar que relacional noimplica complementaridade, mas assimetria de poder. preciso, portanto, submeter o conceito de gnero a umaleitura feminista. Ou seja, deve-se adotar a perspectiva degnero, buscando compreender como diferenas seconstituem em desigualdades, indo alm dos sexos comodeterminantes biolgicos e da di-viso sexual do mundo.Com efeito, como defende Sarti, em artigo anteriormentereferido,48 preciso a adoo de uma perspectiva querompa com a viso feminista dicotmica que adota a noode dominao, desconsiderando o jogo relacional depoder entre o eu e o outro:

    Pressupondo a dominao, o outro necessariamenteo dominador, portanto o conhecimento sobre amulher exclui o outro [o homem]. A prtica antropo-lgica, ao contrrio, volta-se para o reconhecimentodo outro, preservando a distncia entre eu e o outro,no havendo qualquer oposio predeterminada. Oproblema , ento, como estabelecer os termos dacomunicao possvel, tendo em vista que sepretende a relao com o outro.49

    A partir dessa provocao, a autora destaca, fazendoreferncia a Marilyn Strathern,50 que o Outro que est sobataque no necessariamente o no-eu. Ao contrrio, aparte do eu que corporificada na tradio da qual somos,homens e mulheres, herdeiros.

    A anlise sobre essa tradio nos remete, assim, necessidade de reflexes sobre a construo de masculini-dades e feminilidades que vo alm da vitimizao de

    50 STRATHERN, 1987.

    49 SARTI, 2004, p. 47.

    48 SARTI, 2004.

    47 BARBIERI, 1992, p. 114, traduonossa.

    46 SCOTT, 1995.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    820 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    alguns (mulheres) e da culpabilizao de outros (homens).Afinal, reconhecer a dimenso relacional do gnero possibi-lita desconstruir principalmente os argumentos culpabilizan-tes sobre os homens que demarcam o discurso de parte domovimento feminista e que ainda se faz presente, direta ouindiretamente, nas produes acadmicas contemporne-as. Como destaca Medrado, ao invs de procurar osculpados, necessrio identificar como se institucionalizame como se atualizam as relaes de gnero, possibilitandoefetivamente transformaes no mbito das relaes sociaisgenerificadas, ou seja, orientadas pelas desigualdadesde gnero.51

    Isso no implica processo de desresponsabilizaoindividual, mas reconhecer que as anlises que agregama dimenso relacional do conceito de gnero permitemcompreender ou interpretar uma dinmica social quehierarquiza as relaes entre o masculino e o feminino eno apenas entre homens e mulheres, mas nos homens enas mulheres.

    , ento, quando as teorias feministas forjam oconceito de gnero nessa dimenso relacional que osestudos sobre homens e masculinidades como objeto deanlises ganham maior nfase,52 porm no isenta decrticas, as quais iremos apresentar no prximo tpico.53

    J est claro que o exerccio analtico proposto nesteestudo busca (embora reconhea que nem sempre fcilnadar contra a mar!) fugir das lgicas binrias e polariza-das das relaes de gnero entre masculino e feminino aoincluir um olhar para as interseces com outros marcadoressociais.54 Faz-se necessrio considerar, por exemplo, ascategorias de raa/etnia, idade, sexualidade econdio scio-econmica.

    Flvia Rosemberg,55 em suas pesquisas sobreeducao infantil, trabalha as dimenses gnero, raae idade com vistas a construir um modelo terico que noassocie essas trs dimenses da sociedade como adjetivasou associativas. Ela tem usado o conceito de heterocronia,ou de no-sincronia dessas dimenses, alm de conceb-las como relaes de hierarquia, de subordinao. Gnero,raa e idade, do ponto de vista da histria social, e doponto de vista do ciclo de vida, da trajetria pessoal, noatuam no mesmo momento e na mesma direo na vidadas pessoas, sendo fundamental complexificar esse olhar.

    Essa complexidade exigida ao adotarmos adimenso relacional de gnero, evitando-se, assim, umaleitura marcada pela dicotomia e permitindo inclusive aemergncia de outros objetos de pesquisa, a partir daabordagem de gnero, dentro de uma perspectiva feminista,que tem o poder como dimenso central de anlise.

    51 MEDRADO, 1996.

    52 GOMRIZ, 1992.53 Ver Pedro OLIVEIRA, 2000; RoselyCOSTA, 2002; e FIGUEROA-PEREA,2003.

    54 Ver Flvia ROSEMBERG, 1997; eSTOLCKE, 1992 e 2006.

    55 ROSEMBERG, 1997, 2001 e2002.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 821

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    Chegamos, assim, ao terceiro componente de nosso marcoconceitual: as relaes de poder.

    Joan Scott prope uma definio de gnero a partirda conexo integral entre duas proposies: (1) o gnero um elemento constitutivo de relaes sociais baseadas nasdiferenas percebidas entre os sexos e (2) o gnero umaforma primria de dar significado s relaes de poder.56

    Ou, mais precisamente, o gnero um campo primeiro nointerior do qual, ou por meio do qual, o poder articulado.57

    Ela prope que precisamos adotar a perspectivafoucaultiana de poder, entendido como jogos desiguaisinscritos em prticas discursivas que constituem camposde foras sociais.58

    Em sua obra, Michel Foucault busca dar conta dosinmeros mecanismos e efeitos de poder que atravessamtoda a sociedade.59 No possvel trazer aqui a contribuiosubstancial desse autor ao debate sobre poder, masbuscaremos, em algumas de suas produes, argumentose conceitos que nos parecem teis para configurao dasrelaes de poder, que junto com os demais elementosconstituem o marco conceitual ora proposto.

    Nas contribuies desse autor, consideramosrelevante o enfoque dado por ele aos dispositivos deexerccio do poder, ou seja, a tecnologia por meio da qualse obtm a sujeio, mecanismos de poder que controlamo corpo minuciosamente (gestos, atitudes, discursos), redesde dispositivos de poder qual no se escapa. Essesdispositivos so

    [...] um conjunto decididamente heterogneo queengloba discursos, instituies, organizaes arquitet-nicas, decises regulamentares, leis, medidas adminis-trativas, enunciados cientficos, proposies filosficas,morais, filantrpicas. Em suma, o dito e o no-dito soos elementos do dispositivo. O dispositivo a redeque se pode estabelecer entre estes elementos.60

    o exerccio de micropoderes em redes mais oumenos hierrquicas, onde cada um centro de transmissode poder. Na sua concepo, no existe poder fora de seuexerccio, no se possui poder, exerce-se poder.61 Assim, comodestaca Medrado, raras vezes Foucault emprega o termopoder de modo isolado, como um substantivo simples.62

    Quando se fala em poder, em geral as pessoasimediatamente associam a idias j estabelecidas: pensamem estruturas de poder poltico, em governos, em classesdominantes, em naes imperialistas, em chefes emrelao aos empregados, em senhores e escravos. Mas no apenas a esse tipo de substantivao ou materialidadedos jogos de poder a que se refere Foucault. Relaes de

    62 MEDRADO, 2002.

    61 FOUCAULT, 1982.

    60 FOUCAULT, 1996, p. 244.

    59 FOUCAULT, 1982, 1990 e 1996.

    58 SCOTT, 1995, p .86.

    57 SCOTT, 1995, p. 88.

    56 SCOTT, 1995, p. 86.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    822 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    poder so quaisquer relaes humanas institucionais,econmicas, amorosas, interaes verbais. So relaes todiversas quanto possveis, que podemos encontrar emdiferentes situaes e contextos, sob diferentes e (mais oumenos) complexas formas.

    Na perspectiva foucaltiana, liberdade e poder noso elementos mutuamente excludentes, na medida em queas relaes de poder s se processam quando existe algumgrau de liberdade e resistncia entre as pessoas envolvidas.A idia de que onde h relaes de poder no h liberdade, para ele, completamente falsa. Se existem relaes depoder exatamente porque existem possibilidades deliberdade por todas as partes. Ou seja, a resistncia umelemento constitutivo da relao de poder. Nas relaes depoder existem necessariamente possibilidades deresistncia, na medida em que, se no existe possibilidadede resistncia fuga, reao violenta, subterfgios,estratgias para inverter a situao , no existem relaesde poder.

    Vale destacar que existem diferenas significativasentre relaes de poder e estados de dominao. Um estadode dominao o total bloqueio de um campo de relaesde poder, tornando essas relaes imveis e fixas,dessimtricas, com limitada margem de liberdade,impedindo qualquer reversibilidade. Como destacaMedrado, importante atentar que, quando fala de poder,Foucault usa propositalmente o termo relaes ao contrriode quando trata de dominao, em que ele emprega otermo estados, marcando exatamente o potencial demobilidade do primeiro.63

    Portanto, o debate sobre as relaes de poder queinscrevem masculinidades e feminilidades em nossa cultura fundamental. Como destaca Miguel Vale de Almeida,masculinidade e feminilidade so metforas de poder e decapacidade de ao que orientam valores e prticas sociaisde homens e mulheres.64

    Esse ncleo compartilhado, a despeito dediferenas de nuance, pela grande parte dos/as autores/ascontemporneos/as que vem estudando os homens e asmasculinidades.65 Mas o aporte instigante de Scott suaexplicao dos componentes embutidos na primeira partede sua conceituao, na qual gnero definido como umelemento constitutivo das relaes sociais baseadas nasdiferenas percebidas, o gnero implica quatro elementosinter-relacionados.66 A inter-relao entre os quatroelementos (apresentados adiante) significa, para essaautora, que nenhum dentre eles pode operar sem os outros,e que no operam simultaneamente, como se um fossereflexo do outro. Nesse sentido, a autora no estabelece

    66 SCOTT, 1995, p. 86.

    65 VALE DE ALMEIDA, 1996;MEDRADO, 1997; e FIGUEROA-PEREA, 2005.

    64 VALE DE ALMEIDA, 1996.

    63 MEDRADO, 2002.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 823

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    hierarquias ou anterioridades entre elementos determinantese determinados.

    O primeiro elemento destacado por ela so [...] ossmbolos culturalmente disponveis que evocamrepresentaes simblicas (e com frequncia contraditrias Eva e Maria como smbolos da mulher, por exemplo, natradio crist ocidental mas tambm mitos de luz eescurido, purificao e poluio, inocncia e corrupo.67

    Em segundo lugar, Scott destaca os conceitosnormativos que expressam interpretaes dos significadosdos smbolos, que tentam limitar e conter suas possibilidadesmetafricas.68 So os conceitos prescritivos, que afirmam omasculino e o feminino de forma binria inequvoca pormeio de doutrinas religiosas, educativas, cientficas, polticasou jurdicas. Esses campos doutrinrios, prescritivos, soalgumas vezes abertamente contestados, porm a histriaposterior escrita como se essas posies normativas fossemo produto do consenso social e no do conflito.69 Isso traz,evidentemente, uma conotao de fixidez prescrio.

    O terceiro elemento proposto por Scott a identidadesubjetiva, a atualizao concreta, por homens e mulheres,de suas identidades de gnero: [...] os homens e as mulheresreais no cumprem sempre, nem cumprem literalmente, ostermos das prescries de suas sociedades ou de nossascategorias analticas.70 Scott destaca, como o fizeratambm Izquierdo,71 a centralidade da reproduo: [...] osocilogo francs Pierre Bourdieu tem escrito sobre como adi-viso do mundo, baseada em referncia s diferenasbiolgicas, e, notadamente, quelas que se referem diviso do trabalho de procriao e de reproduo, operamcomo a mais fundada das iluses coletivas.72

    Assim, o suposto destino biolgico da mulher maternidade tem sido construdo por meio de smbolos, deprescries religiosas, jurdicas, educacionais, dasorganizaes sociais e das identidades subjetivas. Emcontrapartida, o masculino, ao ser associado produoe administrao da riqueza, afastado do reino dareproduo a no ser pelo smen fecundante. Inter-subjetividades de mulheres e de homens escapam sprescries, bem como sua organizao social emmovimentos polticos.

    O quarto aspecto das relaes de gnero destacadopor Scott constitui tambm nosso quarto e ltimo elementodo marco conceitual aqui proposto: a traduo do modelobinrio e fixo de homem e de mulher no nvel da poltica,das instituies e organizaes sociais. Segundo a autora,o gnero constri-se no de forma binria, mas na multiplici-dade de instituies, que envolve no apenas a famlia ouas relaes de parentesco: ele construdo igualmente na

    70 SCOTT, 1995, p. 88.71 IZQUIERDO, 1994.

    72 SCOTT, 1995, p. 88.

    69 SCOTT, 1995, p. 86.

    68 SCOTT, 1995, p. 86.

    67 SCOTT, 1995, p. 86.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    824 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    economia e na organizao poltica, que, pelo menos emnossa sociedade, operam atualmente de maneiraamplamente independente do parentesco.73 Assim, areflexo que queremos propor aqui tem o desafio de rompercom tais modelos binrios, propondo uma leitura sobregnero no a partir de sua dimenso binria, mas simrelacional.

    4 Homens, masculinidades e poder:4 Homens, masculinidades e poder:4 Homens, masculinidades e poder:4 Homens, masculinidades e poder:4 Homens, masculinidades e poder:outros olhares feministasoutros olhares feministasoutros olhares feministasoutros olhares feministasoutros olhares feministas

    Na literatura analisada com vistas a formular o marcoreferencial acima, recortamos os estudos que adotam umaconcepo feminista de gnero: construo social queengendra e legitima o poder masculino.74 O ponto de partidade nossas reflexes sobre homens e masculinidades,baseadas nesse marco conceitual, que no existe umanica masculinidade e que tampouco possvel falar emformas binrias que supem a di-viso entre formashegemnicas e subordinadas. Tais formas dicotmicasbaseiam-se nas posies de poder social dos homens, masso assumidas de modo complexo por homens particulares,que tambm desenvolvem relaes diversas com outrasmasculinidades.

    Destacamos o emprego das conceituaes feministase de gnero, com vistas a explicitar em que lugar situamosnossa argumentao e em que fundamentos se baseia aorigem de nossas reflexes, alm de incorporar as crticasque se fazem ao campo de estudos sobre masculinidade.

    Essa busca de clareza nos argumentos no frutoapenas de um exerccio retrico, mas principalmente poracreditarmos e defendermos que as discusses sobre oshomens e as masculinidades, de forma crtica, so resultadosdos desafios e avanos dos debates cientficos e polticosoriginalmente produzidos pelo movimento feminista e pelomovimento em defesa da diversidade sexual.75 Quando sepretende (re)fazer perguntas ao campo da produo deconhecimento, ainda fortemente sexista e androcntrico,tanto como (re)significar relaes sociais de poder edesconstruir o machismo institucionalizado, que se expressacotidianamente em nossa sociedade, necessrio adotaressa matriz analtica e de compreenso tico-conceitual.

    nesse sentido que as questes, aparentementebvias, que Rodrigo Parrini, antroplogo chileno, apresentaem seu texto intitulado Existe la masculinidad? Sobre undispositivo de saber/poder76 so muito interessantes, poisquestionam os princpios que norteiam o prprio campo. Oelemento principal dessas consideraes propostas peloautor trazer baila uma forte crtica aos estudos autnomos

    73 SCOTT, 1995, p. 87.

    74 Para a construo dessa matriz,tomamos por base especialmenteas produes de VALE DE ALMEIDA,1995 e 1996; LYRA, 1997;MEDRADO, 1997; FIGUEROA-PEREA, 1998 e 2003; ARILHA,UNBEHAUM e MEDRADO, 1998;ARILHA, 1999 e 2005; e BeneditoMEDRADO, Jorge LYRA, KarlaGALVO e Pedro NASCIMENTO,2000.

    75 Sobre esse aspecto, recomen-damos a leitura de BADINTER,1993; CONNELL, 1995a; RichardPARKER e John GAGNON, 1995;Carole VANCE, 1995; MEDRADO,1997; Carlos CCERES, 2000; eDaniel WELZER-LANG, 2001.

    76 PARRINI, 2006.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 825

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    da masculinidade. No seu entender, e de acordo com oque aqui defendemos, esse campo de estudos autnomossobre masculinidades um espao atrasado e em muitossentidos reacionrio quando comparados aos estudos degnero, feminismo e teorias queer, principalmente em funoda definio do seu objeto de estudo,77 e tambm comvago aprofundamento terico e com pouca solidez nareviso histrica.

    Segundo esse autor, considerar a masculinidade eos homens objetos especficos dos estudos da masculini-dade acarreta conseqncias tericas e polticas srias.Politicamente, refora o binarismo que tem sido fortementecriticado atualmente pelas teorias feministas e, mais recente-mente, pelas teorias queer. Teoricamente, ao trabalhar apartir de uma diviso ingnua entre masculinidade e femini-lidade, no incorpora as severas crticas das polticas deidentidade, a complexificao do estudo da subjetividadee a centralidade das reflexes sobre as relaes de poderque configuram os objetos que se relacionam diretamentea sexo, a gnero ou a ambos.78

    Juan Guillermo Figueroa-Perea,79 uma das principaisreferncias no debate sobre os homens no campo dos direitosreprodutivos na Amrica Latina, tem desenvolvido na ltimadcada uma profunda sistematizao e reflexo crticasobre esse tema. Outros autores brasileiros, entre eles PedroPaulo Oliveira80 e Rosely Costa,81 tambm tm arroladocrticas sobre os estudos da masculinidade.

    Na abertura do II Seminrio Internacional Homens,Sexualidade e Reproduo, organizado pelo Instituto PAPAI,Ncleo Fages, Grupo Pegapacap e NEPO-UNICAMP, emRecife (em 2003), Figueroa-Perea fez uma conferncia intitu-lada La representacin social de los varones en estudiossobre masculinidad y reproduccin: un muestrario dereflexiones.82 Nessa conferncia, ele explicita suasreferncias analticas e compartilha quais so as dimensesque ele sugere trabalhar para repensar criticamente o quese nomeia estudos sobre masculinidade, que o prprioautor prefere chamar de Estudos sobre os homens e asrelaes de poder entre os gneros.83

    A rica contribuio de Figueroa-Perea,84 descrita maisdetalhadamente a seguir, auxilia a compreender como osdiscursos das polticas produzem concepes demasculinidades e de homens e definem posies a seremocupadas pelos sujeitos. Nesse sentido, investigar sobremasculinidades significa no apenas apreender e analisaros signos e significados culturais disponveis sobre omasculino, mas tambm discutir preconceitos e esteretipose repensar a possibilidade de construir outras verses esentidos. Situa-se, portanto, nos usos e efeitos que orientam

    83 Vale salientar que no assumi-mos aqui gnero a partir darelao entre dois. A dimensode poder entre gneros sobre aqual fala FIGUEROA-PEREA, 2003,ultrapassa uma leitura binria.84 FIGUEROA, 2003-PEREA.

    82 FIGUEROA-PEREA, 2003. O textofoi publicado no livro Homens:tempos, prticas e vozes (BeneditoMEDRADO, Mnica FRANCH,Jorge LYRA e Mara BRITO, 2004).

    80 OLIVEIRA, 2000.81 Rosely COSTA, 2002.

    78 PARRINI, 2006.79 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    77 PARRINI, 2006, p. 1.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    826 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    os jogos de discursos e prticas, ou mais precisamenteprticas discursivas, que tendem a transformar diversidadeem desigualdade.

    Por certo, ao longo da histria, as mulheres tm sidoalvo de injustias sociais de ordens variadas e, por maisconquistas que tenham alcanado, ainda est distantepoder-se falar sobre uma efetiva igualdade de gnero. Poroutro lado, muitos homens em condies sociais (a)diversastambm enfrentam, cotidianamente, a impossibilidade/obrigao de responder ao modelo hegemnico demasculinidade.

    Poder-se-ia ler a afirmativa acima como umposicionamento vitimrio. Porm, a resistncia em perceberas relaes de poder como jogos, e no como estados,pode, por outro lado, inviabilizar a percepo de caminhosde transformao, mantendo conseqentemente os lugaresde mulher-vtima e homem-algoz como estveis e imutveis.85

    A dominao dos homens sobre as mulheres e sobre ofeminino no possui autoria nica, mas uma constelaode autores, que inclui, alm dos homens, a mdia, aeducao, a religio, as mulheres e as prprias polticaspblicas. Em outras palavras, partimos da perspectiva deque o poder coletivo dos homens no construdo apenasnas formas como os homens interiorizam, individualizam e oreforam, mas tambm nas instituies sociais.

    Na seqncia, sintetizamos alguns pontos queconsideramos importantes para caracterizar esse campo deinvestigao em constante ebulio, tambm produtor dediscursos, de modos de saber e de fazer e de sujeitos.

    Refletindo sobre os estudos sobre homens e masculini-dades no campo da Sade e Direitos Sexuais e Reprodutivos,Figueroa-Perea prope as seguintes questes:86

    1. Que temas tm sido objeto de pesquisas?

    2. Como se investigam os difere ntes temas?

    3. Qual o ponto de vista que se adota naformulao do conhecimento?

    4. Que concepes de homem orientam estesestudos?

    5. Quais so as sugestes de temas para futuraspesquisas?

    6. Que novos discursos, novas palavras esto sendoinventadas pelo campo?

    7. O que se quer com estes estudos sobremasculinidades?

    8. Que categorias analticas so usadas?

    9. H desconfianas do conhecimento produzidosobre os homens?

    85 Maria Filomena GREGORI, 2003.

    86 FIGUEROA-PEREA, 2003.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 827

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    A partir da pergunta Que temas tm sido objeto depesquisa no decorrer do tempo?, Figueroa-Perea87 identificaos temas que tm sido trabalhados exaustivamente e outrosque surgiram apenas mais recentemente e, mesmo assim,com dificuldades. Problematiza, tambm, por que algunstemas no so trabalhados. Segundo o autor, h nessecampo um maior foco nos estudos sobre sexualidade, sadee violncia em detrimento de discusses sobre a reproduo,gerando uma produo ainda incipente do ponto de vistado aprofundamente terico-metodolgico e epistemolgico.Uma possvel justificativa trazida por esse autor o interesseem fazer intervenes em situaes diversas, contando comrecursos disponveis, mas que, em busca de resultadosrpidos, no h um acmulo e aprofundamento dascompreenses sobre os fenmenos.88 Essa questo dosrecursos tambm apontada por Rosely Costa89 quandoafirma que os estudos sobre masculinidades emergiram apartir do incentivo de agncias financiadoras nacionais einternacionais, que, devido s preocupaes com o controlede natalidade nos pases em desenvolvimento, visavam aum maior conhecimento dos homens.

    Ao refletir sobre Como se investigam os diferentestemas?, Figueroa-Perea90 ressalta que necessrio noapenas atentar para os temas emergentes no campo, masque devemos observar especialmente como tm sido feitasessas investigaes. Em suas anlises, ele destaca quealgumas pesquisas sobre masculinidades tomam os homenscomo nicos informantes, sem fazer nenhuma aluso aosargumentos, depoimentos ou narrativas de mulheres.Algumas at fazem referncias a homens e mulheres, massuas anlises muitas vezes se baseiam, nica eexclusivamente, em diferenas comportamentais (genticas,hormonais, etc.), tomadas a partir de uma abordagemtipificadora. Em outros estudos, considera-se que aspesquisas que tm mulheres como informantes jcontemplam muitas informaes sobre os homens e que,portanto, essas informaes podem ser analisadas semnecessariamente gerar a necessidade de incluir anlises apartir de depoimentos dos homens.

    Embora o autor, propositalmente, no cite diretamentemuitos autores ou obras, preferindo falar em tendncias emovimentos, possvel perceber claramente essa dinmica,que no parece constituir necessariamente grupos emdisputa, mas procedimentos comuns nas obras inclusive demesmos autores ou autoras. Observam-se nesses exemplos,trazidos por Figueroa-Perea,91 alguns problemas naproduo de conhecimento desse campo. Em linhas gerais,percebe-se a presena de sexismos, to criticados pelofeminismo, expressos a partir da postura binria e da no-

    90 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    88 Nelson MINELLO, 2002.89 Rosely COSTA, 2002.

    87 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    91 FIGUEROA-PEREA, 2003.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    828 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    adoo da perspectiva relacional; naturalizam-se asdiferenas sexuais, a partir da mera tipificao decomportamentos tidos como masculinos e femininos;apresentam-se tenses entre visibilidade/invisibilidade dossujeitos e revelam-se anlises fundamentadas eminformaes indiretas.

    Continuando esse processo de caracterizao eanlise do campo, alm de mapear que procedimentosmetodolgicos tm sido empregados nos estudos demasculinidades, Figueroa-Perea92 chama a atenotambm para entendermos Quais as concepes dehomens orientam estes estudos?. Ele organizou essasconcepes em pelo menos cinco perspectivas: 1)satanizao dos homens; 2) homens como vtimas;93 3)auto-flagelao; 4) desigualdades de gneropatriarcais; e 5) uma leitura que contextualiza as normas.Mais adiante, traremos um maior detalhamento formuladopelo autor.

    Outra importante pergunta oriunda do debate sobreo fazer cientfico apresentado por Figueroa-Perea94 refere-sea como devemos abordar o tema das masculinidades (eoutros objetos de pesquisas em gnero): de forma indutivaou dedutiva? Ou seja, qual o ponto de vista que se adotana formulao do conhecimento? Parte-se do que oshomens fazem e buscam-se certas diferenas (esemelhanas) com as mulheres (e com os prprios homens)e tenta-se entender a origem e o significado dessas diferen-as e semelhanas ou, a partir de uma determinadaconcepo terica de masculinidade, vai-se a campobuscando comprov-la dedutivamente na prtica? Nacompreenso de Figueroa-Perea,95 a qual compartilhamos, fundamental explicitar de que lugar e como se interpretaa masculinidade, se uma condio, uma essncia, umacaracterstica ou um privilgio?

    Reconhecendo que exerccio da anlise daproduo terica sobre um tema fundamental paraidentificar equvocos, revisar caminhos e tambm perceberos avanos, Figueroa-Perea96 questiona essa literatura apartir da pergunta: Quais so as sugestes de temas parafuturas pesquisas? Uma das caractersticas que se apontamem vrios estudos a dimenso do poder em suas diferentesmodalidades, no apenas com vistas a identific-lo, o quena sua acepo seria uma leitura eminentente dedutiva,mas questionar como os indivduos concretos processam oexerccio do poder, como o reproduzem e tambm como otransgridem, ou seja, questionam-no e transformam-no emrelaes mais democrticas.

    Figueroa-Perea97 prope, ento, que se criem, seinventem palavras para que novas/outras realidades passem

    97 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    96 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    95 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    94 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    93 Essa caracterstica de conside-rar os homens como vtimastambm foi discutida e criticadapor Pedro OLIVEIRA, 2000, eRosely COSTA, 2002.

    92 FIGUEROA-PEREA, 2003.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 829

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    a existir. Com esse esprito, ele segue sua leitura panormicadas produes sobre masculinidades questionando: Quenovos discursos, novas palavras esto sendo inventadas pelocampo? Aqui ele faz referncia ao uso recorrente empesquisas do conceito de masculinidade hegemnica,que tem como anttese as masculinidades subordinadasou subalternas. O uso da expresso masculinidadehegemnica tornou-se quase lugar-comum nas pesquisassobre homens e masculinidades, entretanto Figueroa-Pereaquestiona o carter a-histrico e universal dessa construo.

    De fato, ao se empregar a expresso masculinidadehegemnica, nessa leitura acaba-se materializando (ousubstantivando) um jogo ou processo de poder, produzindoleituras binrias, sem reconhecer a dimenso relacional degnero.

    Nesse contexto, outras expresses que emergem nombito dos estudos sobre masculinidades so postas emxeque. Por exemplo, na literatura, especialmente aquelaproduzida no contexto da psicologia clnica, que toma porbase informaes obtidas com homens atendidos emconsultrios privados,98 utiliza-se comumente a expressocrise da masculinidade, mas se observa que poucoshomens se reconheam nessa situao. Coloca-se, assim,a pergunta feita por Pedro Paulo Oliveira: que homens estoem crise?99 E acrescentamos: seria a crise da masculinidadeou to-somente alguns homens em crise?

    O que se quer com estes estudos sobre masculinida-des? outra intrigante pergunta que Figueroa-Perea100 faz aesse campo de estudos e pesquisas. Tendo em vista que asperguntas de pesquisas orientam as perspectivas analticasno desenvolvimento de estudos sobre a populaomasculina, o autor destaca que as pesquisas nesse campovo desde propostas unilaterais de interveno emodificao de atitudes at processos mais sistemticos,que buscam historiar comportamentos e mapear mltiplascausas de suas modalidades, adotando uma perspectivamais construcionista.

    Esse segundo movimento pode ser levado a cabotendo como ponto de partida a perspectiva de gnero, mastambm pode adotar uma leitura parcial, seja a partir deum olhar voltado aos homens, seja exclusivamente smulheres. De acordo com a anlise desse autor, essadeciso passa pela delimitao de como se entende oprprio campo: 1) estudos sobre masculinidade; 2) estudossobre homens e relaes de gnero; ou 3) estudos de gnerosobre os homens.101

    Para dar conta de analisar o desigual exerccio depoder entre homens e mulheres, assim como a duplamoralidade a partir da qual se nomeiam e se produzem as

    98 Scrates NOLASCO, 1993, 1995e 2001; e Luiz CUSCHINIR, 2002,por exemplo.

    99 OLIVEIRA, 2000.

    100 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    101 FIGUEROA-PEREA, 2003.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    830 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    prticas de uns e de outras, precisamos perguntar quecategorias analticas so usadas? Esta , assim, mais umapergunta de Figueroa-Perea:102 que tipo de categoria adotado na construo do objeto de estudo? O autoridentifica quatro categorias privilgios, necessidades,direitos e malestares analisando-as a partir de suasdiversas concepes, usos e crticas.

    A constatao dos privilgios dos homens numasociedade orientada pela ordem de gnero tem, segundoFigueroa-Perea,103 gerado importantes contribuies analti-cas. Porm, tomada de forma acrtica, a categoria analticaprivilgios impede o reconhecimento de que o exerccio dopoder pelos homens pode trazer efeitos negativos associados(ou desvantagens) como conseqncia.

    Outra categoria aponta para as necessidades doshomens, baseando-se no necessariamente em demandas,mas em anlises de condies de produo e vetores de(im)possibilidades trazidos pela di-viso sexual do mundo.A esse respeito, Margareth Arilha, em sua tese de doutorado,questiona por que no se constri socialmente uma realescuta para as vulnerabilidades e necessidades doshomens, quando se fala de gnero? E vai alm: O que que gnero est tematizando, quando fala das mulheres,e o que est tematizando quando fala dos homens?.104

    Para alm das necessidades, Figueroa-Perea trazdireitos como outra categoria analtica que vem se legiti-mando, embora de forma ainda muito tmida. Direito podeser entendido como condio humana, mas preciso incluirnessa anlise as condies de diferenas e desigualdadesde gnero, para tornar mais complexo o seu entendimento.Na sociedade em que vivemos, direito pode ser entendidocomo algo inerente condio masculina: os homens jso os sujeitos dos direitos e, portanto, falar nos homens seriainvariavelmente falar em posio de direito. S a partir deuma anlise crtica dessa noo genrica possvelqualificar seu uso com capacidade de transformao.

    Arilha105 ressalta iniciativas que, na ltima dcada,comearam a ganhar visibilidade e que apontam paracampos de direito (especialmente o campo dos direitosreprodutivos) em que os homens (ou, pelo menos, uma partedeles) parecem no ocupar posies definitivas de direito.Porm, como alerta a autora, tem-se observado que oprocesso de insero dos homens no debate sobre direitosreprodutivos tem sido feito de maneira ainda muito tmida;incipiente quando comparvel ao que ocorreu com asmulheres, h pelo menos trs dcadas, no campo dasexualidade, reproduo, sade sexual e reprodutiva e dosdireitos das mulheres de forma mais ampla.

    102 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    103 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    104 ARILHA, 2005, p. 13.

    105 ARILHA, 2005.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 831

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    Figueroa-Perea reconhece que h uma confusoentre direito e privilgio na medida em que se defende quese as mulheres tivessem os mesmos privilgios dos homens,se avanaria na busca pela igualdade ou ao menos sediminuiria a desigualdade.106 Todavia, segundo esse autor,esquece-se que muitos privilgios de gnero foramlegitimados privando-se os direitos as mulheres, sendonecessrio, a seu ver, democratizar os espaos denegociao mais do que buscar se igualar em privilgios.

    De todo modo, como contraponto do direito, aexpresso mais recorrente no campo da sade reprodutiva,especialmente (mas no exclusivamente) nos (e a partir dos)documentos resultantes de conferncias internacionais,quando se faz referncia aos homens responsabilidade,conceito especialmente trabalhado por Arilha em suadissertao de mestrado, posteriormente analisado em suatese, como no trecho a seguir:

    O eixo central do trabalho desenvolvido naquelemomento [referindo-se dissertao de mestrado]foi justamente uma crtica noo de responsabili-dade usada pelo texto da Conferncia do Cairo,mostrando sua essncia normativa, operando comuma viso cristalizada [...], contribuindo para sedimen-tar o esteretipo de que homens em geral [...] soirresponsveis, devendo ser capturados por polticasespeciais e educados para se tornarem responsveis.Se, por um lado, o trabalho era inovador e ousado namedida em que apontava para uma viso crtica daabordagem do masculino na Conferncia, no foipossvel, naquele momento, seguir adiante eaprofundar um eixo que parece promissor [...].107

    Baseada, ento, em Joan Scott,108 Arilha ratifica que,em sua perspectiva, gnero uma das primeiras maneirasde dar significado s relaes de poder, ou que gnero um primeiro campo por meio do qual o poder articulado.Para Arilha, no se tem dado ateno especial a essasegunda parte da definio de Scott. Para ela, se gnero tambm uma forma de estar no mundo, como conceitoorientador de anlises, seria necessrio investigar melhorsuas possibilidades de problematizar o mal-estarmasculino.109

    Nessa mesma direo, Figueroa-Perea introduz sualtima categoria, o mal-estar (ou, como o autor prefere, noplural: malestares, em castelhano). Para esse autor, preciso ter cuidado para no cairmos numa perspectivamaniquesta a partir de um olhar unidirecional. fundamen-tal complexificar nossas anlises, investigando em quemedida os sujeitos considerados vitimizadores (agressores,detentores do poder) lidam com as situaes nas quais eles

    107 ARILHA, 2005, p. 14.

    106 FIGUEROA-PEREA, 2003, p. 20.

    108 SCOTT, 1995.

    109 ARILHA, 2005, p. 14.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    832 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    exercem o poder, ou lhes permitido ou promovido esseexerccio e, mais alm, se a conscientizao desses homens,ou sua responsabilizao sobre esse processo, capaz deressignificar seu posicionamento nas relaes de poder.

    A ltima pergunta apresentada por Figueroa-Pereaem seu exerccio de reviso panormica (por el momento,como ele mesmo chamou ateno) refere-se s dvidas eincertezas que existem no campo de estudos sobre oshomens. H desconfianas do conhecimento produzidosobre os homens? Como esse campo de estudos, de modogeral, tem se desenvolvido com vistas a discutir certezas everdades que se atribuem quase metade da populao,colocar em suspeio os prprios cnones at entoexistentes leva a uma postura, a princpio, de negao e deressalva.

    [...] histrias pessoais e sociais definem e condicionamexpectativas, pr-conceitos e pressupostos carrega-dos de valor que nem sempre se est atento sobre oque fazer, inclusive h fatos que resistem a isto levandoa que se duvide da informao obtida com a popula-o de estudo, em particular quando esta no coinci-de com os pressupostos e os marcos interpretativosde que se baseia [...].110

    A origem dessas desconfianas pode ser atribudas cinco concepes sobre homens, anteriormentemencionadas (e agora mais bem exploxadas), queFigueroa-Perea111 condensou a partir da sistematizao daanlise da literatura latino-americana referente temtica:1) satanizao dos homens; 2) vitimizao; 3) autoflage-lao; 4) leitura patriarcal; e 5) leitura contextualizada denormas. O autor chama a ateno para uma posturamaniquesta nas trs primeiras vertentes em virtude dopressuposto de uma busca em definir e encontrar quem soas boas e os maus, mantendo polaridades que poucocontribuem ou avanam na compreenso da complexidadedas propostas tericas e polticas das relaes de gnerobalizadas no feminismo.

    A primeira, ele define como a que sataniza oshomens. Os homens so o motivo, origem e causa, respons-veis e executores das desigualdades de gnero; so vistoscomo vitimizadores.112 Uma outra vertente, oposta, a quereconhece os homens como vtimas, entendendo que elestambm sofrem as conseqncias dos condicionantes degnero e, portanto, no so totalmente responsveis peloque fazem, e sim resultado das influncias de gnero. Emseguida, o autor nomeia o processo de autoflagelao,no qual os homens se consideram culpados dos problemasenfrentados pelas mulheres pela sua prpria condio de

    110 FIGUEROA-PEREA, 2003, p. 20.

    111 FIGUEROA-PEREA, 2003.

    112 Tom DIGBY, 1998, citado porFIGUEROA-PEREA, 2003, comoobra que adota essa perspectiva.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 833

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    homem.113 No seu entender, muitas vezes usam discursospoliticamente corretos e renegam qualquer possibilidadede ter direitos.114

    O autor observa caractersticas da perspectiva degnero nas duas ltimas concepes, contudo, com aportesdiferentes de anlise. Na quarta, os homens so entendidosa partir da perspectiva das desigualdades de gneroinscritas pelo patriarcado, que fundamentam os processosde desigualdades de gnero de forma global. Essaabordagem constata formalmente que o sistema patriarcal multidimensional e, por fim, tem formas de controle e dereproduo to complexas que termina por paralisarqualquer possibilidade e intento de transformao.115

    A quinta noo adota uma leitura que historiciza asnormas e prope-se a definir, problematizar e desconstruiras influncias sociais em contextos especficos.116 Parte-seda idia de que, se os homens tomarem conscincia dasrelaes de poder, torna-se possvel transform-las ereconstru-las. Figueroa-Perea filia-se mais a esta ltimavertente na medida em ela possibilita, a partir de um olharde gnero, decodificar e desconstruir normas.

    Em ltima anlise, na viso de Figueroa-Perea, astrs primeiras concepes de homens produzidas nessecampo so marcadas por um discurso descritivo-maniquesta que busca, com suas interpretaes, umadiviso das pessoas em boas e ms, para ser mais precisoem boas e maus.117 O segundo grupo emprega leiturasanaltico-reflexivas, mas se diferenciam nos modelosexplicativos: uma est fundamentada na teoria dopatriarcado, formulando explicaes mais globais, e a outraenfoca suas anlises em contextos especficos. SegundoFigueroa-Perea, o problema dessas concepes apriorsticas que elas podem enviesar as anlises dos resultados,gerando a reafirmao constante de conceitos e do prpriomodelo explicativo, restringindo a criatividade analtica ea anlise sobre mudanas.

    Diante dessa anlise crtica sobre o estado da artede estudos e pesquisas sobre homens e masculinidades,especialmente no contexto da sexualidade e reproduo,ratificamos que preciso romper com modelos explicativosque, via de regra, reafirmam a diferena e que nos permitemsomente explicar como ou por que as coisas assim so, masque no apontam contradies, fissuras, rupturas, brechas,frestas... que nos permitam visualizar caminhos detransformao progressiva e efetiva. Apostamos nanecessidade de abrirmos espao para novas construestericas que resgatem o carter plural, polissmico e crticodas leituras feministas.

    117 FIGUEROA-PEREA, 2003, p. 17.

    113 Entre essas obras, FIGUEROA-PEREA, 2003, cita Maria ColetaOLIVEIRA, Elizabete BILAC eMalvina MUSZKAT, 2000.114 FIGUEROA-PEREA, 2003, fazreferncia aqui ao trabalho deMichael FLOOD, 1997.

    115 Nesse conjunto, FIGUEROA-PEREA, 2003, identifica os traba-lhos de Juan Carlos HERNNDEZ,1995; e Teresa VALDS e JosOLAVARRA, 1998.116 Aqui, FIGUEROA-PEREA, 2003,faz referncia ao trabalho dePARKER, 1998.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    834 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    Referncias bibliogrficasReferncias bibliogrficasReferncias bibliogrficasReferncias bibliogrficasReferncias bibliogrficas

    AQUINO, Estela M L. Gnero e sade: perfil e tendncias daproduo cientfica no Brasil. Revista de Sade Pblica,n. 40 (nmero especial), p. 121-132, 2006.

    ARILHA, Margareth. Masculinidades e gnero: discursossobre responsabilidade na reproduo. 1999. Disserta-o (Mestrado em Psicologia Social) PontifciaUniversidade Catlica de So Paulo.

    ______. O masculino em Conferncias e Programas dasNaes Unidas: para uma crtica do discurso de gnero.2005. Tese (Doutorado em Sade Pblica) Faculdadede Sade Pblica da Universidade de So Paulo.

    ARILHA, Margareth; UNBEHAUM, Sandra; MEDRADO, Benedito(Orgs.). Homens e masculinidades: outras palavras. SoPaulo: ECOS/Ed. 34, 1998.

    VILA, Maria Betnia. Direitos sexuais e reprodutivos: desafiospara as polticas de sade. Cadernos de Sade Pblica,n. 19, suplemento 2, p. 465-469, 2003.

    BADINTER, Elisabeth. Um amor conquistado: o mito do amormaterno. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

    ______. XY. Sobre a identidade masculina. Rio de Janeiro:Nova Fronteira, 1993.

    BARBIERI, Teresita. Sobre la categora gnero. Unaintroduccin terico-metodolgica. In: RODRGUES,Regina (Ed.). Fin de siglo: genero y cambio civilizatorio.Santiago: Isis Internacional, 1992. p. 111-128. (Edicionesde las Mujeres, n. 17).

    BEATTY, Barbara. A Vocation from on High: Kindergartning asan Occupation for American Women. In: WARREN, Donald(ed.). American Teachers: Histories of a Profession at Work.New York: Mac Millan, 1989. p. 65-97.

    BONETTI, Alinne de L. No basta ser mulher, tem de tercoragem: uma etnografia sobre gnero, poder, ativismofeminino popular e o campo poltico feminista de Recife PE. 2007. Tese (Doutorado em Cincias Sociais) Institutode Filosofia e Cincias Humanas, Universidade Estadualde Campinas.

    BOURDIEU, Pierre. La domination masculine. Paris: Seuil, 1998.BUNGE, Mario. La investigacin cientfica. Barcelona: Ariel,

    1989.BUTLER, Judith. O parentesco sempre tido como

    heterossexual? Cadernos Pagu, n. 21, p. 219-260,2003a.

    ______. Problemas de gnero: feminismo e subverso daidentidade. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2003b.

    CCERES, Carlos. Afterword: The Production of Knowledgeon Sexuality in the Aids Era: Some Issues, Opportunitiesand Challenges. In: PARKER, Richard, BARBOSA, Regina

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 835

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    M., and AGGLETON, Peter (eds.). Framing the SexualSubject: The Politics of Gender, Sexuality, and Power.Berkeley: University of California Press, 2000. p. 241-260.

    CARRIGAN, Tim, CONNELL Robert, and JOHN, Lee. Hard andHeavy: Toward a New Sociology of Masculinity. In:KAUFMAN, Michael (ed.). Beyond Patriarchy: Essays byMen on Pleasure, Power, and Change. Toronto and NovaYork: Oxford University Press, 1985. p. 139-192.

    CONNELL, R. W. Masculinities. Berkeley: University of CaliforniaPress, 1995a.

    ______. Polticas da masculinidade. Educao e Realidade,v. 2, n. 20, p. 185-206, 1995b.

    CONNELL, R. W., HEARN, Jeff, and KIMMEL, Michael. Intro-duction. In: KIMMEL, Michael, HEARN, Jeff, and CONNELL,R. W. (eds.). Handbook of Studies on Men and Mascu-linities. California: Sage Publications, 2005. p. 1-12.

    CORRA, Sonia; VIANNA, Adriana. Teoria e prxis em gneroe sexualidade: trnsitos, avanos, dramas e pontoscegos. In: BONETTI, Alinne; FLEISCHER, Soraya (Orgs.).Dossi Entre pesquisar e militar: contribuies e limitesdos trnsitos entre pesquisa e militncia feministas.Braslia: Centro Feminista de Estudos e Assessoria, 2007.p. 5-21.

    COSTA, Ana Alice A. O movimento feminista no Brasil:dinmicas de uma interveno poltica. Gnero, v. 5, n.2, p. 9-35, 2005.

    COSTA, Claudia de L. O sujeito no feminismo: revisitando osdebates. Cadernos Pagu, n. 19, p. 59-90, 2002.

    COSTA, Jurandir F. A construo cultural da diferena dossexos. Sexualidade, gnero e sociedade, n. 3, p. 1-6,1995.

    COSTA, Rosely G. Mediando oposies: sobre as crticasaos estudos de masculinidades. In: ALMEIDA, Heloisa B.;COSTA, Rosely G.; RAMIREZ, Martha C.; SOUZA, rica R.(Orgs.). Gnero em matizes. Bragana Paulista, SP: Ed.da Universidade So Francisco, 2002. p. 213-241.

    CUSCHNIR, Luiz. Homens sem mscaras: paixes e segredosdos homens. . . . . Rio de Janeiro: Campus, 2002.

    DINIZ, Debora; FOLTRAN, Paula. Gnero e feminismo no Brasil:uma anlise da Revista Estudos Feministas. Revista Estu-dos Feministas, v. 12, nmero especial, p. 245-253, 2004.

    DIGBY, Tom (ed.). Men Doing Feminism. Routledge: Londres,1998.

    FIGUEROA-PEREA. Juan Guillermo. Algunos elementos parainterpretar la presencia de los varones en los procesosde salud reproductiva. Cadernos de Sade Pblica, v.14, suplemento 1, p. 87-96, 1998.

    ______. La representacin social de los varones en estudiossobre masculinidad y reproduccin: : : : : un muestrario de

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    836 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    reflexiones. In: I Seminrio Internacional/II SeminrioNorte-Nordeste sobre Homens, Sexualidade e Reprodu-co: Tempos, Prticas e Vozes, 17-20 junho 2003, Recife.Mimeo.

    ______. Algunos dilemas ticos y polticos al tratar de definirlos derechos reproductivos en la experiencia de losvarones. Perspectivas Bioticas, Buenos Aires, FacultadLatinoamericana de Ciencias Sociales, v. 10, n. 18, p.53-75, 2005.

    FLOOD, Michael. Frequently Asked Questions about Pro-Feminist Men and Pro-Feminist Mens Politics. AustralianNational University, 1997. Mimeo.

    FONSECA, Claudia. Poltica, gnero e sujeito: afinidadescom conseqncias. Cadernos Pagu, n. 21, p. 317-325, 2003.

    FOUCAULT, Michel. Microfsica do poder. Rio de Janeiro: Graal,1982.

    ______. Un dialogo sobre el poder y otras conversaciones:alianzas materiales. Buenos Aires: Alianza, 1990.

    ______. A ordem do discurso. So Paulo: Loyola, 1996.FOX KELLER, Evelyn. Qual foi o impacto do feminismo na

    cincia? Cadernos Pagu, n. 27, p. 13-34, 2006.FRASER, Nancy. Mapeando a imaginao feminista: da

    redistribuio ao reconhecimento e representao.Revista Estudos Feministas, v. 15, n. 2, p. 291-308, 2007.

    GIFFIN, Karen. A insero dos homens nos estudos de gnero:contribuies de um sujeito histrico. Cincia e SadeColetiva, v. 10, n. 1, p. 47-57, 2005.

    GOLDBERG, Anette. Feminismo no Brasil contemporneo: opercurso intelectual de um iderio poltico. BIB BoletimInformativo e Bibliogrfico de Cincias Sociais, n. 28, p.42-70, 1989.

    GOMRIZ, Enrique. Los estudios de gnero y sus fuentesepistemolgicas: periodizacin y perspectivas. In:RODRGUES, Regina (Ed.). Fin de siglo: genero y cambiocivilizatorio. Santiago: Isis International, 1992. p. 83-110.(Ediciones de las Mujeres, n. 17).

    GREGORI, Maria Filomena. Relaes de violncia eerotismo. Cadernos Pagu, n. 20, p. 87-120, 2003.

    GROSSI, Miriam Pillar. Masculinidades: uma reviso terica.Antropologia em Primeira Mo, v. 75, p. 1-37, 1995.Disponvel em: http://www.antropologia.ufsc.br. Acessoem: 25 maio 2008.

    HARAWAY, Donna. Saberes localizados: a questo da cinciapara o feminismo e o privilgio da perspectiva parcial.Cadernos Pagu, n. 5, p. 7-41, 1995.

    ______. Gnero para um dicionrio marxista: a polticasexual de uma palavra. Cadernos Pagu, n. 22, p. 201-246, 2004.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 837

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    HERNNDEZ, Juan Carlos. Sexualidad masculina y reproduc-cin Qu va decir pap? In: Coloquio Latinoamericanosobre Varones, Sexualidad y Reproduccin, 1995,Zacatecas, Mxico. Mimeo.

    HOUAISS, Antnio. Dicionrio Eletrnico Houaiss da LnguaPortuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

    IZQUIERDO, Mara Jess. Uso y abuso del concepto degnero. In: VILANOVA, Mercedes (Org.). Pensar lasdiferencias. Barcelona: Promociones y PublicacionesUniversitarias, 1994. p. 31-53.

    ______. Los costos ocultos de la masculinidad. . . . . LaManzana. Revista Internacional de Estudios sobreMasculinidades, Puebla, Mxico: Benemrita UniversidadAutnoma de Puebla, v. I, n. 2, 2006. Disponvel em:www.estudiosmasculinidades.buap.mx. Acesso em: 16mar. 2008.

    KAUFMAN, Michael. Beyond Patriarchy: Essays by Men onPleasure, Power and Patriarchy. Toronto: Oxford UniversityPress, 1987.

    KIMMEL, Michael S. (ed.). Changing Men: New Directions inResearch on Men and Masculinity. Newbury Park(California), London and New Delhi: Sage Publications,1987.

    LAQUEUR, Thomas W. Inventando o sexo: corpo e gnero dosgregos a Freud. Rio de Janeiro: Relume Dumar, 2001.

    LYRA, Jorge. Paternidade adolescente: uma proposta deinterveno. 1997. Dissertao (Mestrado em PsicologiaSocial) Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo.

    MARIANO, Silvana A. O sujeito do feminismo e o ps-estruturalismo. Revista Estudos Feministas, n. 13, v. 3, p.483-505, 2005.

    MEDRADO, Benedito. A masculinidade na propagandatelevisiva brasileira. 1996. Texto apresentado para examede qualificao (Mestrado em Psicologia Social) Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo.

    ______. O masculino na mdia. 1997. Dissertao (Mestradoem Psicologia Social) Pontifcia Universidade Catlicade So Paulo.

    MEDRADO, Benedito; LYRA, Jorge. Produzindo sentidos sobreo masculino: da hegemonia tica da diversidade. In:ADELMAN, Mirian; SILVESTRIN, Celsi (Orgs.). ColetneaGnero Plural. Curitiba: UFPR, 2002. p. 63-76.

    MEDRADO, Benedito; LYRA, Jorge; Galvo, Karla; NASCIMENTO,Pedro. Homens por que? Uma leitura da masculinidadea partir de um enfoque de gnero. Perspectivas emSade e Direitos Reprodutivos, v. 3, p. 12-16, 2000.

    MEDRADO, Benedito; FRANCH, Mnica; LYRA, Jorge; BRITO,Mara (Orgs.). Homens, tempos, prticas e vozes. Recife:Fages/Papai/Nepo-Unicamp, 2004.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    838 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    MINELLO, Nelson. Masculinidad/es: un concepto enconstruccin. Nueva Antropologa, n. 61, p. 11-30, 2002.

    NICHOLSON, Linda. Interpretando o gnero. Revista EstudosFeministas, v. 8, n. 2, p. 9- 41, 2000.

    NOLASCO, Scrates. O mito da masculinidade. Rio deJaneiro: Rocco, 1993.

    ______. A desconstruo do masculino. Rio de Janeiro:Rocco, 1995.

    ______. De Tarzan a Homer Simpson: banalizao e violnciamasculina em sociedades contemporneas ocidentais.Rio de Janeiro: Rocco, 2001.

    OLIVEIRA, Guacira Csar de. O desafio de transformar omundo enquanto nos transformamos. Palestra proferidana abertura da terceira edio dos Dilogos Feministas,em janeiro de 2007, s vsperas do VII Frum SocialMundial, em Nairbi, Qunia, 2007. Disponvel em:www.mujeresdelsur.org.uy/df/df07_guacira.htm. Acessoem: 25 maio 2008.

    OLIVEIRA, Maria Coleta; BILAC, Elizabete; MUSZKAT, Malvina.Its Not My Fault I Wast Born a Woman: Contraceptionamong Middle-Class Brazilian Men. 2000. Mimeo.

    OLIVEIRA, Pedro P. Crises, valores e vivncias da masculini-dade. Novos Estudos CEBRAP, n. 56, p. 89-110, 2000.

    PARKER, Richard. Sexualidades masculinas. Confernciano Simposio Latinoamericano sobre ParticipacinMasculina en la Salud Sexual y Reproductiva, 1998,Oaxaca, Mxico. Mimeo.

    PARKER, Richard G., and GAGNON, John H. ConceivingSexuality: Approaches to Sex Research in a PostmodernWorld. New York and London: Routledge, 1995.

    PARRINI, Rodrigo. Existe la masculinidad? Sobre un dispositivode saber/poder. Mxico: Colgio do Mxico, 2006.Disponvel em: http://generomexico.colmex.mx/Parrini.jsp.Acesso em: 9 mar. 2008.

    PISCITELLI, Adriana. Re-criando a (categoria) mulher. In:ALGRANTI, Leila M. (Org.). A prtica feminista e o conceitode gnero. Campinas: IFCH-Unicamp, 2002. p. 7-42.(Textos Didticos, v. 48).

    ______. Reflexes em torno do gnero e feminismo. In: COSTA,Claudia L.; SCHIMIDT, Simone P. Poticas e polticasfeministas. Florianpolis: Mulheres, 2004. p. 43-66.

    ROSEMBERG, Flvia. Teorias de gnero e subordinao deidade: um ensaio. Pro-Posies, v. 7, n. 3, p. 17-23, 1997.

    ______. A avaliao de programas, indicadores e projetosem educao infantil. Revista Brasileira de Educao,n. 16, p. 19-26, 2001.

    ______. Organizaes multilaterais, estado e polticas deeducao infantil. Cadernos de Pesquisa, n. 115, p.25-63, 2002.

  • Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008 839

    POR UMA MATRIZ FEMINISTA DE GNERO PARA OS ESTUDOS SOBRE HOMENS E MASCULINIDADES

    RUBIN, Gayle. El trfico de mujeres: notas sobre la economapoltica del sexo. Nueva Antropologa, Mxico D.F., v. VII,n. 30, p. 157-209, 1986.

    RUBIN, Gayle; BUTLER, Judith. Trfico sexual: entrevista.Cadernos Pagu, n. 21, p. 157-209, 2003.

    SABO, Don. Comprender la salud de los hombres: un enfoquerelational y sensible al gnero. Boston: OPAS; OMS; HarvardCenter for Population and Development Studies, 2000.(Publicacion ocasional: gnero, equidad, salud, n. 4).

    SARTI, Cynthia Andersen. O feminismo brasileiro desde osanos 1970: revisitando uma trajetria. Revista EstudosFeministas, v. 12, n. 2, p. 35-50, 2004.

    SCAVONE, Lucila. Estudos de gnero e feministas: um campocientfico? In: XXXI Encontro Anual da ANPOCS, 2007,Caxambu, So Paulo. Disponvel em: http://201.48.149.89/anpocs/arquivos/17_10_2007_15_21_39.pdf. Acesso em:25 maio 2008.

    SCOTT, Joan W. Gnero: uma categoria til para anlisehistrica. Educao & Realidade, v. 20, n. 2, p. 71-99,1995.

    STOLCKE, Verena. El sexo es para el gnero como la razaes para la etnicidad? Mientras Tanto, Barcelona, n. 48,p. 87-111, 1992.

    ______. El sexo de la biotecnologa. In: DURN, Alicia;RIECHMANN, Jorge (Coords.). Genes en el laboratorio yen la fbrica. Madrid: Editorial Trotta, 1998. p. 99-118.

    ______. Psfacio: o negcio das diferenas. In: ALMEIDA,Heloisa B.; COSTA, Rosely G.; RAMIREZ, Martha C.; SOUZA,rica R. (Orgs.). Gnero em matizes. Bragana Paulista:Ed. da Universidade So Francisco, 2002. p. 399-407.

    ______. La mujer es puro cuento: la cultura del gnero.Revista Estudos Feministas, v. 12, n. 2, p. 77-105, 2004.

    ______. O enigma das intersees: classe, raa, sexo,sexualidade: a formao dos imprios transatlnticosdo sculo XVI ao XIX. Revista Estudos Feministas, n. 14,v. 1, p. 15-42, 2006.

    STRATHERN, Marilyn. An Awkward Relationship: The Case ofFeminism and Anthropology. SIGNS, v. 12, n. 2, p. 276-292, 1987.

    VALDS, Teresa; OLAVARRA, Jos (Orgs.). Masculinidades yequidad de gnero en Amrica Latina. Santiago, Chile:FLACSO/UNFPA, 1998. p. 12-36.

    VALE DE ALMEIDA, Miguel. Introduo. In: VALE DE ALMEIDA,Miguel. Senhores de si: uma interpretao antropolgicada masculinidade. Lisboa: Fim de Sculo, 1995. p. 13-20.

    ______. Gnero, masculinidade e poder: revendo um casodo Sul de Portugal. Anurio Antropolgico/95, p. 161-189, 1996.

  • BENEDITO MEDRADO E JORGE LYRA

    840 Estudos Feministas, Florianpolis, 16(3): 809-840, setembro-dezembro/2008

    VANCE, Carole S. A antropologia redescobre a sexualidade:um comentrio terico. Physis Revista de SadeColetiva, v. 5, n. 1, p. 7-31, 1995.

    WELZER-LANG, Daniel. A construo do masculino: domina-o das mulheres e homofobia. Revista EstudosFeministas, v. 9, n. 2, p. 460-482, 2001.

    [Recebido em maio de 2008e aceito para publicao em junho de 2008]

    Men and Masculinity Studies: A Feminist FrameworkMen and Masculinity Studies: A Feminist FrameworkMen and Masculinity Studies: A Feminist FrameworkMen and Masculinity Studies: A Feminist FrameworkMen and Masculinity Studies: A Feminist FrameworkAbstractAbstractAbstractAbstractAbstract: This article aims at contributing to the studies and researches on men and theirmasculinity, disclosing a gender conceptual mark, from a matrix that dialogues with feministproductions and is organized on 4 axes: 1. Sex/gender system; 2. Relational dimension; Powertraits and 4. Rupture of the binary model translation on political, institutional and socialorganizational spheres. In order to do that, we have dialogued with contemporary productionswhich are based on different theoretical references and where gender is adopted as an analyticalcategory, but which have in common (and are defined from) a critical feminist perspective.Based on this matrix, a study analysis on men and their masculinity as far as health, sexuality andreproduction field is concerned was carried out, emphasizing the need to make space for newtheoretical constructions that recover the plural, polysemic and critical character of feministreadings.Key WordsKey WordsKey WordsKey WordsKey Words: Men; Masculinity; Feminist Theory; Feminism.