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Volume 1, Número 2
ISSN 2527-0532 João Pessoa, 2017
Artigo
VIOLÊNCIA ESCOLAR: CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS
Páginas 133 a 146 133
VIOLÊNCIA ESCOLAR: CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS
SCHOOL VIOLENCE: CAUSES AND CONSEQUENCES
Maria de Lourdes Lopes
RESUMO: O presente artigo trata da violência nas escolas, suas causas e consequências.
Atualmente é visível a manifestação da violência na sociedade em geral e nas escolas em
particular. Frente a essa realidade, torna-se necessária uma análise sobre o tema que
considere não a violência em si, mas os elementos a ela ligados. Assim, há que se verificar
as manifestações da violência na sociedade, seus motivos, seus tipos e as possíveis
consequências no ambiente escolar, considerando o desenvolvimento do educando. Uma
vez realizada tal análise, pretende-se apresentar algumas possibilidades de trabalho que
possam contribuir para amenizar a questão da violência nas escolas. Lembrando que a
escola é o espaço social para a formação de cidadãos autônomos, se faz necessário
repensar seu papel e propor alternativas que amenizem os conflitos vividos no ambiente
escolar.
Palavras Chaves:Violência, Escola, Sociedade.
ABSCRACT: This article deals with violence in schools, its causes and consequences.
The manifestation of violence in society in general and in schools in particular is now
visible. Faced with this reality, it is necessary to analyze the subject that considers not the
violence itself, but the elements linked to it. Thus, it is necessary to verify the
manifestations of violence in society, their motives, their types and the possible
consequences in the school environment, considering the development of the student.
Once this analysis is carried out, it is intended to present some work possibilities that can
contribute to soften the issue of violence in schools. Recalling that school is the social
space for the formation of autonomous citizens, it is necessary to rethink their role and
propose alternatives that ease the conflicts experienced in the school environment.
Keywords: Violence, School, Society.
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INTRODUÇÃO
Este artigo trata sobre a violência escolar que tem se tornado um problema de
grande dimensão que assola a humanidade. As crianças e os adolescentes não estão fora
do espectro do risco da violência. Pesquisadores de todo o mundo na intenção de descobrir
e compreender melhor as causas de violência tem produzido uma lista de fatores causais
quase que infinita, que percorrem as instâncias políticas, econômicas, sociais, culturais,
geográficas, etc. A violência em geral e em particular que acontece no âmbito escolar
envolve crianças e adolescente e também outro fator que se apresenta de forma grave no
nosso país.
Todos os dias nos chegam, através da mídia, notícias dos mais variados tipos de
violências vivenciadas na sociedade brasileira e mesmo um âmbito internacional.
Particularmente observa-se, dentro das escolas, crianças e adolescentes cometendo
infrações que se caracterizam por agressões verbais, físicas, pichações, bullings e frutos,
sem nenhuma causa aparente que justifique tais ações ou comportamentos. Esses tipos de
comportamentos, além de despertar o interesse em compreender o fenômeno da violência
de forma ampla, por parte das autoridades competentes, exigem também, daquele que se
dedicam à esfera educacional, um olhar mais atento e observador, quanto aos
comportamentos estudantis, suas manifestações e consequências no cotidiano escolar.
Vítima da violência, a criança, além de reproduzi-la, pode reagir através de uma
mudança brusca de comportamento. Falta de atenção, baixa auto-estima, variação de
humor e agressividade são alguns sinais aos quais os pais e educadores devem estar
sempre atentos. No entanto, apesar da violência ocorrer dentro das escolas, não é gerado
pela escola em si, mas por fatores externos, como famílias desestruturadas, narcotráfico,
conflitos sociais etc. Dessa forma, se faz necessário identificar os tipos de violência
sofridos pelas crianças, para melhor compreender seus reflexos no ambiente escolar.
Se as formas aparentes da violência são de fácil percepção, as formas psicológicas
ocasionadas por ameaças, humilhações, intimidações, rejeição e desrespeito, nem sempre
são percebidas e, muitas vezes, podem ser ainda mais graves. A invisibilidade desse tipo
de agressão contribui para gerar um ambiente de segregação dentro das escolas, com
grupelhos que marcam seu campo, seu espaço pela violência.
Todas essas considerações são analisadas no âmbito desse trabalho, tendo como
foco primordial, analisar especificamente a violência nas escolas, uma vez que a escola é
uma instituição que tem como objetivo socializar e re-socializar os indivíduos, para
viverem e reproduzirem determinadas relações. Dessa forma, é no campo da educação
que se faz imprescindível fazer o levantamento da situação atual e apresentar opções que
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possibilitem solucionar os problemas que afetem negativamente a escola e os meios a ela
relacionados.
Deve-se conscientizar a comunidade escolar e não-escolar sobre as formas da
violência e suas consequências na vida do indivíduo, bem como lhe oferecer condições
de análise quanto à influência dos inúmeros fatores de violência externos que refletem no
comportamento das crianças na vida escolar, fornecendo subsídios para que os
educadores identifiquem e busquem minimizar ou solucionar os mesmos, constituindo
assim, outras pretensões.
O que é violência, como se apresenta na sociedade, sobretudo, nas escolas, qual são
os elementos causadores dessa violência e de que forma educadores e comunidade podem
contribuir para amenizar o problema, constituem o elenco de questionamentos
necessários para realizar as propostas acima relacionadas, sendo, portanto, indispensável
conhecer o que se tem produzido e discutido sobre o tema da violência.
REFERENCIAL TEÓRICO
Violência Escolar
As principais teorias que tentam explicar os fenômenos da violência humana, e,
em especial, da violência entre os adolescentes, são inúmeras. Segundo Trindade (2003),
existem dezenas de teorias que procuram explicar o fenômeno da violência. A mais
conhecida é a chamada teoria biológica, muito antiga, tem a sua origem no trabalho de
um médico italiano chamado CesareLombroso, que, num livro chamado “O homem
Delinquente”, advogada a ideia de que o sujeito nasce delinquente, nasce violento. De
acordo com o italiano a violência não se faz, nasce-se com ela. E nasce-se violento porque
se possuem alguns traços, alguns sinais físicos, que seriam responsáveis por essa referida
violência.
Hoje em dia, no século XXI, ninguém mais adota a teoria biológica clássica tal
como conhecida por Cesare Lombroso, mas no seu lugar, dentro ainda do paradigma
biológico, aparecem versões contemporâneas, entre qual Trindade (2003), cita apenas
duas: aquelas que são provenientes da moderna genética, que nos oferece estudos a partir
do cariótipo humano. Então, dentro do estudo dos mapeamentos cariótipos, poder-se-ia
determinar queestivessem relacionados com a violência, com a agressividade e a
delinquência. A outra versão moderna da teoria biológica é aquela que nos é dada pelos
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hormônios genericamente falando, mais especificamente a partir das investigações com
os neurotransmissores.
É significativamente importante não esquecer que, a partir do significado
relevante desses estudos, trata-se de versões contemporâneas da velha e da antiga teoria
de Cesare Lombroso, biologista, determinista e positivista, bem como ao sabor do final
do século XX.
Segundo Trindade (2003), a segunda grande teoria ou elenco de teorias que
procuram explicar a questão da violência, foi desenvolvido por um discípulo de
Lombroso, o também italiano, jurista Enrico Ferri, tendo divergido de seu mestre, que era
um biologista, Ferri adotou a posição contrária, afirmando que o homem não nasce
delinquente, mas que ele torna-se delinquente ao longo da vida, porque o meio social, o
meio ambiente, os fatores externos, os fatores exógenos, que hoje nós chamaríamos de
mesológicos ou simplesmente ecológicos, convergem no sentido de que essa pessoa
venha a ser violenta. Essa teoria ou esse paradigma teórico recebe o nome de modelo
sociológico.
Essa teoria sociológica que nasce ao alvorecer deste século XX trouxe por sua
vez, traduções modernas. Durkhein é um dos autores que atualizam essas determinadas
versões, e assim o fez ao tratar da questão do suicídio, onde cuidou também do problema
da violência decorre da anomia, insto é, da ausência de normas quando não há limites
estabelecidos, a probabilidade da violência pela falta de coesão social é substancialmente
maior.
A outra versão moderna da teoria sociológica é dada por um americano chamado
Merton, que diz: a sociedade, sobretudo a moderna capitalista, sugere muitas coisas.
Supõe que conseguimos atingir muitos fins, como dinheiro, sucesso, patrimônio,
automóveis, roupas etc. Essa sociedade está constantemente propondo determinadas
metas. Entretanto, ela, não oferece a todas as pessoas os menos meios. Alguns têm mais,
outros têm menos.
Para Merton (2003), afirma que a violência e a delinquência decorrem exatamente
da diversidade de maios que as pessoas têm para alcançar os mesmos fins ou as mesmas
metas. A desigualdade entre meios e metas gera a violência. O espaço existente entre os
meios que a sociedade dá a alguns e as metas ideais que sugere pra todos, é preenchido
pela conduta agressiva, que assim, cumpre o papel de aproximar meios e metas.
Esta é uma forma moderna forma relativamente contemporânea de traduzir a
teoria sociológica clássica, aliás, tão determinista quanto à anterior. Para Trindade (2003),
o problema da agressiva só pode ser compreendido numa perspectiva de disciplina de
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múltipla causalidade. Dentro do modelo psicológico, através das facetas da conduta anti-
social.
Sigmund Freud (apud Trindade, 2003), entre outras coisas, descobriu que existe
um tipo específico de delinquência por sentimento de culpa. Esta culpa é via de
consequência, a violência também pode ser uma violência responsiva à culpa,
dependendo de como a mesma se manifesta.
Inconscientemente, a criança faz determinados atos agressivos, violentos, para
receber castigo por aquele sentimento inadequado que teve na infância. Ao receber o
castigo, a criança ou o adolescente, e mesmo o adulto, expiam, aplaca aquela culpa
inconscientemente.
A teoria freudiana é criticada em inúmeros aspectos, mas continua a ser ainda hoje
o marco referencial teórico mais expressivo da vertente psicológica. Trindade (2003)
enfatiza ainda que a partir da metade do século XX, mais precisamente de 1952, vão
surgir alguns autores, ora franceses, ora ingleses, mostrando que a violência decorre de
um prejuízo nos vínculos e nas relações precoces da criança e que, todos nós, seres
humanos, temos uma tendência inata à vinculação. Quando essa vinculação a que nos
referimos é rompida, vamos preencher essa ruptura, essa fratura, esse espaço vazio,
através de atos violentos.
Trindade (2003) acrescenta também que a contribuição mais importante e ao
mesmo tempo mais atual é a teoria de WilfredBion, Talvez a visão mais revolucionária
inovadora e criativa dos últimos tempos. Por último, é importante sublinhar que todos
esses grandes paradigmas, o biológico, o sociológico e o psicológico, tratam sempre de
sujeito, do individuo. Quer dizer, nós estamos procurando causas dentro da pessoa.
Mesmo quando falamos do meio ambiente, é ele dentro do sujeito, o que se confere
internamente.
Neste sentido, Trindade (2003), faz dias breves referências sobre as teorias da
violência. A primeira, relativamente à passagem evolutiva que o ser humano fez, quando
nos tornamos “homo sapiens’ e posteriormente passamos a nos constituir também como
“homo faber”, como aquele que produz e consome no meio social, parece que nos
esquecemos de uma pequena grande qualidade: esquecemos da capacidade de brincar,
esquecemos também que somos “homo lumens” capazes de sonhar.
Remetendo-nos a realidade da violência existente significativamente no cotidiano
escolar, pode-se afirmar que devido a sua complexidade e multiplicidade de facetas, a
compreensão do fenômeno das violências nas escolas impõe o desafio multidimensional
e pluricausal que envolve a todos aqueles que estão inseridos no âmbito escolar bem como
a, sociedade, a família e a própria escola. Neste sentido, compreender, e identificar a
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violência em sua forma de origem só trarão grandes contribuições para toda a comunidade
(ABRAMOVAY e RUA, 2003, p.27)
De acordo com o pensamento de alguns autores, Debarbieux (apud
ABRAMOVAY e RUA, 2003), simplifica afirmando que a escola está mais vulnerável a
fatores e problemas externos (tais como as questões econômicas, o desemprego e a
precariedade da vida das famílias nos bairros mais pobres).
Os referidos autores mencionam também que a educação sofreu o impacto da
massificação do acesso à escola (a política do direito universal do acesso à educação para
todos, que surgiu no Brasil após a Constituição Federal de 1988), a qual passa a receber
jovens negativamente afetados por experiências de exclusão (existentes na família, na
comunidade onde vivem) e pertencimento e gangues, o que implicam necessariamente
em consequências para todos os membros da comunidade escolar: alunos, professores,
pais e/ou responsáveis.
Portanto, esses fatores externos de vulnerabilidade à violência se somam àqueles
fatores decorrentes do aumento das condutas delinquentes e de incivilidades que ocorrem
no âmbito escolar e são decorrentes das relações sociais existentes na família e
vivenciadas no seio da sociedade. Acarretando necessariamente dessa forma problemas
que afetará o funcionamento da instituição escolar, dificultando seguramente o processo
de ensino e aprendizagem dos educandos e o trabalho de todos aqueles que integram e
que estão envolvidos na instituição escolar.
As Causas das Violências
Esse é um tema vasto e abrangente, portanto, não se pode tratá-lo a partir de uma
única causa, pois essas violências podem estar relacionadas a vários motivos. Diante de
um quadro cotidiano de violência, sua extensão ao campo escolar suscita discussões, seja
na família ou na comunidade, uma vez que a escola não é a única responsável pela solução
do problema, mas toda a sociedade, incluindo autoridades responsáveis. Por isso diversos
especialistas têm abordado o tema com a finalidade de conhecer as suas causas, de forma
ampla e não de forma fragmentada.
Partindo do princípio colocado por Viana (2002) de que entender a violência exige
conhecimento de suas causas, torna-se imprescindível, no campo da educação, fazer o
levantamento da situação atual de forma a contribuir com o corpo gestor escolar, em
particular, e com a sociedade em geral, na verificação dos problemas relacionados com a
violência e na viabilidade de possíveis soluções.
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Dos muitos fatores que envolvem esta questão, possuem dois sentidos, pois se por
um lado às ações praticadas pelo aluno, no espaço escolar, ultrapassam o que se considera
socialmente aceitável, por outro lado, compreende-se que estas atitudes têm suas origens
na própria realidade vivenciada pelo indivíduo, como uma resposta, em alguns casos às
muitas opressões e violências vividas por ele.
De forma geral, observa-se que as agressividades reproduzidas por alunos, podem
estar relacionadas ao que eles presenciam ou vivem dentro do convívio doméstico,
familiar ou social, mesmo não sendo comportamentos aceitáveis socialmente. O
indivíduo que possui comportamentos agressivos na escola, muitas vezes sofre ou
presencia atos de violência, pois geralmente está cercado por instrumentos e situações
que remetem à violência.
A mídia, por exemplo, é um instrumento que pode contribuir para que crianças e
adolescentes reproduzam atos violentos; isso acontece quando se vê na televisão cenas de
criminalidade, (inclusive em novelas), de forma empolgante, com distorções
significativas da realidade ou nos jogos de vídeo-game, violências e lutas. Percebe-se,
portanto, que os meios de comunicações têm colaborado para que a violência seja vista
de forma natural.
O indivíduo, quando ocupa os espaços na sociedade, chega com informações e
comportamentos adquiridos, os quais foram internalizados, de acordo com suas vivências.
É a partir desse quadro que se deve analisar o fenômeno, sobretudo, no espaço escolar.
Dentre as possíveis categorias de análise pode-se recorrer à privação, uma vez que
interfere na construção do código de valores do indivíduo.
De acordo com Mangini (2008, p. 106) sérias privações podem diminuir a
capacidade de administrar os próprios impulsos, os quais podem manifestar-se
livremente, prejudicando as relações sociais ou serem reprimidos por um superego
severo. Assim, é possível, no âmbito da escola, encontrar estudantes que banalizam a vida
e a ordem, praticando atos de violência e vandalismo.
Nesse sentido, a privação pode ocorrer em todas as esferas da vida. Uma criança,
por exemplo, pode ser privada desde o afeto, até os bens necessários ao seu pleno
desenvolvimento. As crianças que sofrem privações afetivas crescem sem família, sem
parâmetros, sem uma direção que age como um facilitador, mostrando a realidade e
propiciando a sua compreensão com princípios éticos e morais. Não possuindo um
referencial familiar e doméstico, um sentimento de segurança, o indivíduo busca isso fora
de casa, na escola, nas drogas e nos mais diversos caminhos.
A privação afetiva que algumas crianças sofrem, prejudica a formação de sua
personalidade, de seu caráter. Segundo Silva (2004) alguns fatores como carência afetiva,
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falta de cidadania e modelos positivos, podem contribuir para que crianças e adolescentes
cometam violência e se transformem em criminosos. Devido à ausência de afeto, as
crianças podem recorrer à violência como forma de chamar atenção para receber afeto.
Da mesma forma, uma criança que não é educada para respeitar os outros, a partir
das noções de valores e cidadania, busca satisfazer suas vontades e, quando isso não
acontece, ela se torna violenta, por possuir a violência como valor principal em sua
personalidade, como forma de resolver seus conflitos pessoais. Assim, crianças e
adolescentes se espelham em tipos e modelos e a sociedade atual, através da imprensa
escrita, falada e televisada, além da internet, têm mostrado muitos casos de assassinatos,
roubos, sequestros e tráficos de drogas.
Deste modo, faltam modelos humanamente adequados, ou seja, não-violentos,
para que os jovens possam segui-los como modelos positivos e dignos. A falta de afeto e
de valores está relacionada com a frequente ausência dos pais, que, em busca da
sobrevivência diária para a família, deixam seus filhos com irmãos mais velhos ou babás,
o que reduz cada vez mais o tempo de convívio familiar entre pais e filhos. Essa mudança
nas relações familiares tem várias implicações. O abandono pode decorrer tanto da
necessidade de trabalho dos pais, quanto do total despreparo por parte dos mesmos no
trato com a criança, e ainda pela inversão de valores com relação ao papel da escola.
É comum, a prática de terceirização da educação por parte dos pais. Atualmente,
as famílias têm transferido a responsabilidade da educação dos seus filhos para a escola,
distorcendo e descaracterizando a função da mesma. As perdas ou inversões dos valores
afetivos e morais essenciais à educação da criança a vitimou, pois não há mais referencial
baseado em afeto, cuidado, respeito mútuo entre crianças e adolescentes, que já não
sabem como se comportar na sociedade. As regras que prevalecem parecem ser: o
desrespeito, a agressão para com os espaços e com os outros.
O Professor e o Enfrentamento da Violência no Âmbito Escolar
Nas duas últimas décadas, temos verificado um significativo avanço da violência
no contexto internacional e brasileiro, desvelando um cenário que, se manifesta em
diferentes espaços e épocas. A violência tem se revelado de maneira ostensiva nos
relacionamentos humanos no contexto da sociedade, e esta, tem reproduzido nos diversos
circuitos e com múltiplas características.
A violência se manifesta por meio da tirania, da opressão e do abuso da força.
Ocorre do constrangimento exercido sobre alguma pessoa para obrigá-la a fazer ou deixar
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de fazer um ato qualquer. Existem diversas formas de violência, tais como as guerras,
conflitos étnico-religiosos e banditismo.
A violência, em seus mais variados contornos, é um fenômeno histórico na
constituição da sociedade brasileira. A escravidão (primeiro com os índios e depois, e
especialmente, com a mão de obra africana), a colonização mercantilista, o coronelismo,
as oligarquias antes e depois da independência, somados a um Estado caracterizado pelo
autoritarismo burocrático, contribuíram enormemente para o aumento da violência que
atravessa a história do Brasil.
Diversos fatores colaboram para aumentar a violência, tais como a urbanização
acelerada, que traz um grande fluxo de pessoas para as áreas urbanas e assim contribui
para um crescimento desordenado e desorganizado das cidades. Colaboram também para
o aumento da violência as fortes aspirações de consumo, em parte frustradas pelas
dificuldades de inserção no mercado de trabalho.
Por outro lado, o poder público, especialmente no Brasil, tem se mostrado incapaz
de enfrentar essa calamidade social. Pior que tudo isso é constatar que a violência existe
com a conivência de grupos das polícias, representantes do Legislativo de todos os níveis
e, inclusive, de autoridades do poder judiciário. A corrupção, uma das piores chagas
brasileiras, está associada à violência, uma aumentando a outra, faces da mesma moeda.
A solução para a questão da violência no Brasil envolve os mais diversos setores
da sociedade, não só a segurança pública e um judiciário eficiente, mas também demanda
com urgência, profundidade e extensão a melhoria do sistema educacional, saúde,
habitacional, oportunidades de emprego, dentre outros fatores. Requer principalmente
uma grande mudança nas políticas públicas e uma participação maior da sociedade nas
discussões e soluções desse problema de abrangência nacional.
As Manifestações da Violência na Escola
A violência é, na atualidade, mais um componente do espaço escolar e contribui
efetivamente para a configuração de uma "paisagem" marcada por sentimentos de
insegurança e desconfiança no outro. De "apêndice da casa", essa instituição, cuja
constituição está intimamente ligada à modernidade e à sua construção, aparece hoje, na
opinião de alguns, como local perigoso.
A imagem -- já quase idílica -- da instituição escolar como espaço social
caracterizado pelo prazer e pelo encanto de aprender e de ensinar parece que vem sendo
substituída pela desconfiança e medo: desconfiança quanto às possibilidades do diálogo
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na resolução dos conflitos e medo de que a palavra seja substituída pela força, o que
constitui o princípio da violência (Arendt, 1997; Aquino, 1998).
A relação entre escola e violência não é um fato novo para os pesquisadores da
área educacional; no entanto, durante muito tempo, a violência no interior da escola era
analisada, basicamente, como a violência da escola, como uma ação exercida pelo
professor e demais representantes da instituição, que, consciente ou inconscientemente,
mas de forma arbitrária, inculcavam nos alunos uma determinada "visão" de mundo.
Quando vinda do corpo discente, era considerada como reação a um rígido sistema
hierárquico, a uma escola com características militares. É este o teor das críticas
elaboradas por autores denominados de critica reprodutivistas (2) (Saviani, 1999), em
cujo aporte teórico se fundamentou durante a década de 1970 e início da década de 1980,
outros autores, os quais denunciaram a escola como reprodutora das desigualdades
sociais, instrumento essencial do poder dominante em seu intento de manutenção e
perpetuação do status quo.
A partir de meados da década de 1980, paralelamente à redemocratização da
sociedade brasileira, pode ser identificada uma segunda abordagem, que, modificando o
foco, analisava a violência manifestada na escola como um fato cuja origem era exterior
à instituição, ou seja, tratava-se da violência contra a escola. Nesse contexto, procurava-
se mostrar a escola como vítima da invasão de minorias constituídas por excluídos, ou
como assediada sistematicamente pelo narcotráfico, em que professores e alunos,
formando um mesmo bloco, apresentava-se como vítimas de um estado de coisas que
exigia intervenção mais severa da parte do Estado. Nesse sentido, os agentes da violência
estariam fora dos muros da escola, portanto a questão deveria ser tratada como um
problema de segurança (Guimarães, 1998; Fukui, 1992).
A violência que se manifestava na escola era analisada como modalidade ou
subcategoria da violência urbana. Era a violência urbana "batendo às portas" da escola.
Não obstante, nos anos finais do século XX, a intensificação dos conflitos
escolares "intramuros", representada pelo expressivo aumento de ocorrências
relacionadas a agressões físicas e verbais dos alunos entre si e com professores, associada
à percepção de que o vandalismo contra os prédios públicos era praticado também pelos
próprios frequentadores das escolas, levou os estudiosos a analisarem o tema a fim de
captar as especificidades de sua manifestação na escola, a violência na escola.
Nesta terceira abordagem, o foco de análise é, nas palavras de Sposito (1998,), "a
violência escolar stricto sensu, aquela que nasce do interior da escola ou como
modalidade de relação direta com o estabelecimento de ensino" (grifo da autora).
Buscasse, assim, incorporar às análises os aspectos ligados à dinâmica da instituição
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escolar, ou seja, o olhar investigativo volta-se para o interior da escola, para as relações
que nesse espaço se travam. Gradativamente, as análises passam a considerar a violência
como um fenômeno interno à escola. Não sendo a escola uma ilha e estando, destarte,
condicionada ao meio social no qual está inserida, a violência urbana nela penetra, mas
seu padrão geral não é definido.
A instituição escolar, como escreve Guimarães (1996), não pode ser vista apenas
como reprodutora das experiências de opressão, de violência, de conflitos, advindos do
plano macroestrutural. A escola onde depositamos muitas das nossas esperanças de
formação de um cidadão capaz de um agir ético tem sido o espaço da expressão da
violência, fator antagônico a ética e que se opõe a concretização do objetivo maior da
educação para a cidadania.
Para Laterman (2003) as escolas tem sido espaço de várias expressões da
violência, “que desorganizam a rotina idealizada por professores e alunos: agressões
verbais e físicas, brincadeiras muito agressivas, humilhações, ameaças, depredações,
indisciplina excessiva, desrespeito” até a ação de grupos que se situam no entorno da
escola, agressões entre alunos e adultos.
Assim a violência no meio escolar, se constitui como um fenômeno complexo,
que segundo Luzardi (2003) tem preocupado a comunidade escolar, pois “toda a violência
inibe o potencial de desenvolvimento do ser humano e impossibilita o exercício da sua
plena cidadania” e não pode ser negligenciada.Também Ohsako e Charlot apontam a sua
preocupação com as manifestações da violência na escola, pois “ela coloca em risco a
função social da escola de socialização das novas gerações...”
(Charlot e Ohsako apud Santos, 2001) Assim a violência tem afrontado a
educação, ao lado de tantos outros desafios que a educação deve se confrontar como: o
analfabetismo, a evasão escolar, a educação de jovens e adultos, abriu-se, como cita
Guimarães, “uma nova pauta obrigatória da agenda pública educacional”, a questão da
violência em meio escolar.
Fante nos apresenta um quadro para a abordagem do tema em questão. Ela sugere
uma classificação para o estudo do fenômeno da violência no meio escolar, que
sinteticamente se apresenta assim: quanto ao grau (violência simples ou complexa);
quanto à forma (direta, indireta, explícita, implícita); quanto ao tipo (física e sexual,
verbal, psicológica, fatal); quanto ao nível (discente, docente, funcionários, pais,
instituição); quanto às dimensões (no interior da escola, no entorno da escola, da escola),
quanto às determinantes (biológicos, pessoais, familiares, sociais, cognitivos,
ambientais).
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Outro ponto que caracteriza o fenômeno da violência escolar, é o de ser um
fenômeno que não se limita aos países periféricos. Vale, contudo citar a observação de
Grams, secretário do Congresso Ibero Americano sobre Violência nas Escolas feita em
uma entrevista: ”a violência não é uma exclusividade das unidades escolares localizadas
em áreas de pobreza.”
O Professor Frente às Demandas da Violência na Escola
De acordo com Milani (2004) a disparidade econômica acarreta injustas
consequências sobre a qualidade de vida da população sobre vários aspectos,
notadamente, nas áreas da saúde, educação, moradia, segurança, entre outros, gerando
por assim dizer, a violência vertical. No momento em que as necessidades básicas não
estão sendo atendidas, aliadas aoutros problemas como o não desenvolvimento de
valores, a aproximação com as drogas e o narcotráfico, a facilidade para ingressar no
mundo dos crimes e a impunidade, podem ser considerados como facilitadores para o
avanço da violência social.
Ao voltarmos à atenção para a escola, seus alunos, professores, perguntamos sobre
a relação entre a violência social e àquela presente no ambiente escolar. Esta realidade,
esta vivência em meio a atos violentos, não estaria gerando na consciência de nossa
sociedade, de nossos jovens estudantes, a ideia de que este comportamento acontece, e
que deve ser considerado natural? Será que ao chegar à escola o aluno transfere a
realidade violenta e violentada para o interior da mesma? Assim, entre os variados
lugares em que a violência é exercida, temos o contexto escolar, no qual vem tomando
proporção alarmante, com recorrência cada vez mais banalizada, seja na mídia ou no
cotidiano da maioria dos brasileiros.
O papel do educador vem passando por um intenso processo de modificação nas
últimas décadas, reflexo também de constantes mudanças na sociedade, gerando novos
desafios e demandas e, entre estes se encontra a violência no contexto da escola.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo permitiu observar o fenômeno da violência como algo presente
entre as pessoas em todos os lugares e que atinge todas as classes sociais. A violência está
de tal modo enraizado no homem moderno, que não se pode deixar de reconhecer que é
fenômeno típico de nossa época, sempre presente e com as mais variadas faces. Seu
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ISSN 2527-0532 João Pessoa, 2017
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VIOLÊNCIA ESCOLAR: CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS
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crescimento se dá na mesma proporção que diminui as oportunidades de qualidade e de
vida, incluindo as condições básicas.
No âmbito escolar, aqui abordado com veemência, a manifestação da violência se
torna cada vez mais frequente entre os jovens. Tal fenômeno, no âmbito desse trabalho,
foi considerado como associado ao ambiente extraescolar, o qual promove
transformações e influência de maneira negativa, nas relações intraescolares, pois nesse
espaço, se manifestam os conflitos, os quais são reflexos dos problemas que acontecem
no seio da sociedade, inclusive na família, pois muitos jovens violentos advêm de famílias
desestruturadas, se considerarmos que a família é a base da sociedade.
Dessa forma, as abordagens em torno do tema foram orientadas no sentido de
contribuir para uma tomada de consciência, de reflexão, sobre o que pode ser feito sobre
a complexidade que o fenômeno constitui, bem como para amenizar a violência escolar,
promovendo o conhecimento de fatos até então desconhecidos. Nessa perspectiva
constatou-se a necessidade de se trabalhar com a comunidade, a família, e escola de forma
sintonizada, interagir forças, acreditando na possibilidade de oferecer a todos os
educandos, a oportunidade de desenvolverem as suas potencialidades de maneira
tranquila e saudável, para o bem de todos.
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