artigo - despalatalizacao dos fonemas d e t pc

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III Seminário Linguagem e Identidades: múltiplos olhares 1 A DESPALATALIZAÇÃO DOS FONEMAS /D/ E /T/ NO PORTUGUÊS DA BAIXADA MARANHENSE *Ana Claudia Menezes Araujo RESUMO: O presente trabalho trata de uma pesquisa sociolinguística sobre a despalatalização dos fonemas /t/ e /d/ diante dos contextos fonológicos /i/ e /e/ observada na linguagem de falantes da microrregião Baixada Maranhense, no estado do Maranhão. O mesmo objetivou identificar as realizações deste fenômeno fonético de despalatalização nos contextos determinados a partir da análise do corpus coletado. Para a concretização do mesmo, procedeu-se à realização de entrevistas com moradores das cidades maranhenses Viana, São Bento e Penalva, de ambos os sexos, enquadrados nas faixas etárias 18 a 30 e 50 a 65 anos, com grau de escolaridade variado e totalizando uma amostra de 21 informantes, nascidos e residentes nas respectivas cidades pesquisadas e distribuídos em quantidades iguais em cada localidade. A partir da observação dos corpora coletados por meio de questionário fonético-fonológico, observa-se que os informantes quando pronunciam os fonemas pesquisados, despalatalizam-nos. A análise dos dados registra que os falantes moradores da microrregião Baixada Maranhense realizam os fonemas /t/ e /d/ nos dois contextos pesquisados: antes da vogal “i” e antes da vogal “e”, quando esta apresenta som fechado, como linguodentais, divergindo de outras regiões maranhenses que palatalizam os mesmos e caracterizando, assim, a diversidade do português falado no Maranhão. PALAVRAS-CHAVE: variação linguística, despalatalização, linguística variacionista. ABSTRACT: This work is a sociolinguistic research about the des palatalization of the phonemes / t / and / d / before the

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III Seminrio Linguagem e Identidades: mltiplos olhares

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A DESPALATALIZAO DOS FONEMAS /D/ E /T/ NO PORTUGUS DA BAIXADA MARANHENSE

*Ana Claudia Menezes AraujoRESUMO: O presente trabalho trata de uma pesquisa sociolingustica sobre a despalatalizao dos fonemas /t/ e /d/ diante dos contextos fonolgicos /i/ e /e/ observada na linguagem de falantes da microrregio Baixada Maranhense, no estado do Maranho. O mesmo objetivou identificar as realizaes deste fenmeno fontico de despalatalizao nos contextos determinados a partir da anlise do corpus coletado. Para a concretizao do mesmo, procedeu-se realizao de entrevistas com moradores das cidades maranhenses Viana, So Bento e Penalva, de ambos os sexos, enquadrados nas faixas etrias 18 a 30 e 50 a 65 anos, com grau de escolaridade variado e totalizando uma amostra de 21 informantes, nascidos e residentes nas respectivas cidades pesquisadas e distribudos em quantidades iguais em cada localidade. A partir da observao dos corpora coletados por meio de questionrio fontico-fonolgico, observa-se que os informantes quando pronunciam os fonemas pesquisados, despalatalizam-nos. A anlise dos dados registra que os falantes moradores da microrregio Baixada Maranhense realizam os fonemas /t/ e /d/ nos dois contextos pesquisados: antes da vogal i e antes da vogal e, quando esta apresenta som fechado, como linguodentais, divergindo de outras regies maranhenses que palatalizam os mesmos e caracterizando, assim, a diversidade do portugus falado no Maranho.PALAVRAS-CHAVE: variao lingustica, despalatalizao, lingustica variacionista. ABSTRACT: This work is a sociolinguistic research about the despalatalization of the phonemes / t / and / d / before the phonological contexts / i / and / e / observed in the language of speakers from the micro-region Baixada Maranhense, in the state of Maranhao. It wanted to identify the achievements of this phonetic phenomenon of despalatalization in contexts determined from the analysis of the corpus collected. To carry out the same, it proceeded to conduct interviews with residents of cities Viana, So Bento and Penalva, of both sexes, framed in age from 18 to 30 and 50 to 65 years, with varying degree of education and total a sample of 21 informants, born and living in their cities surveyed and distributed in equal amounts in each location. From the observation of corpora collected through a phonetic-phonological questionnaire, it is observed that the informants when they recite the phonemes surveyed despalatalizate them. The analysis of the data records that the speakers living in the micro-region Baixada Maranhense realize the phonemes / t / and / d / in both two contexts studied: before the vowel "i" and before the vowel "e" when it has a closed sound, as linguodentals, unlike of other regions of Maranho that palatalize the same and featuring, at this way, the diversity of Portuguese spoken in Maranho.

KEY WORDS: language variation, despalatalization, variational linguistics.1. INTRODUOA identidade linguistica de um pas como o Brasil representada por uma grande quantidade de variedades lingusticas. E at mesmo a uma pessoa no especialista em estudos sociolingusticos perceptvel a variao que a lngua apresenta ao ser utilizada por falantes de diferentes estratos sociais, regionais, etrios e profissionais, entre outros. Dessa forma, todos ns, enquanto falantes, estamos propensos variao, por exemplo, ao mudar de interlocutor numa conversa, de assunto ou situao de comunicao em que nos encontrarmos. Os fatores sociais extralingusticos podem nos auxiliar na identificao de fenmenos de variao lingustica. E essas variaes de origem geogrfica, status socioeconmico, grau de escolarizao, idade e/ou sexo diferentes constituem um multilinguismo nacional, praticado por todos ns falantes brasileiros.A presente pesquisa surgiu a partir de estudos sobre a Lngua Portuguesa e suas variaes fonticas percebidas no estado do Maranho, na tentativa de melhor descrev-las e compreend-las. Tomando como objeto de estudo, o falar de moradores da microrregio Baixada Maranhense, no qual observamos a realizao do fenmeno de despalatalizao dos fonemas /d/ e /t/, procedemos anlise de entrevistas aplicadas aos mesmos nas cidades em que estes residem.Neste trabalho faremos uso da linha de abordagem fundamentada na Sociolingustica, explorando aspectos fonticos da linguagem, focalizando somente o fenmeno fontico de despalatalizao, observado nos corpora coletados. Tomamos como base terica, entre outros, os trabalhos de Bagno(2007), Ilari e Basso(2007) e Thas Cristfaro (2002), que fazem estudos sobre o uso da lngua em contextos sociais variados, e sobre as diferenas nas pronncias dos fonemas.Objetivamos com a realizao desta pesquisa, analisar os dados coletados em campo, mostrando que o dialeto maranhense apresenta variaes, assim como o portugus falado em diversas regies do pas, a partir da descrio dos fonemas d e t, pesquisados neste estudo, em contextos especficos. Pretendemos ainda, mostrar a importncia do estudo das variaes lingusticas, principalmente, aquelas condicionadas pelo fator espao geogrfico, onde as diferenas lingusticas so mais perceptveis.2. A VARIAO DIATPICAO portugus brasileiro (PB) constitui-se de um leque de variedades provenientes de diversos fatores lingusticos e extralingusticos. possvel perceber, principalmente a partir da lngua falada, quo diverso o portugus falado nas diferentes regies e cidades brasileiras. Assim, a lngua varia de um lugar para outro, e essa variao, tambm conhecida como variao diatpica, permite-nos investigar a fala caracterstica de diferentes reas geogrficas dentro de um mesmo estado, etc. Entre esses fatores que propiciam lngua variar est a origem geogrfica do falante. Este fator extralingustico indica que a mesma lngua pode apresentar-se de diferentes formas, a por meio de variedades distintas, cada uma com suas particularidades, fonticas, lexicais, etc. Dessa forma, os falantes do PB, mesmo diante de tantas variedades, estabelecem com seus vizinhos de cidade ou estado, uma comunicao normal, pois a variao no afeta aspectos substanciais do sistema fonolgico e sinttico da lngua, o que permite que o gacho seja compreendido pelo maranhense ou o mato-grossense pelo baiano.Bortoni-Ricardo (2004) trata do assunto dividindo o Brasil em reas lingusticas, isto , em duas grandes reas dialetais: a Norte e a Sul, cada uma delas subdividida em sub-reas, ou diversos falares como: o nordestino , o gacho, o mineiro, etc. Esses estudos fazem parte do campo de trabalho da Sociolingustica, que considera a lngua de carter eminentemente social , pois a lngua e a sociedade so duas realidades que se inter-relacionam de tal modo, que impossvel concebermos a existncia de uma sem a outra.

A Lingustica variacionista, a partir dos estudos de William Labov, direciona maior parte de seus estudos para as variantes fonticas, uma vez que as variaes ocorridas nos sons da lngua acontecem com grande frequncia, so mais fceis de serem observadas e descritas. Mas esses fenmenos lingusticos em variao tambm podem ser lexicais, sintticos, morfolgicos etc. (CALVET, 2002)Em seus estudos, Labov aborda as relaes entre um fenmeno lingustico e os traos sociolgicos que podem condicion-lo, como a localizao geogrfica, a idade, o grupo social, a faixa etria, etc. Para ele, os fatores externos lngua que so condicionadores da variao lingustica. (CALVET, 2002) E entre esses fatores externos citados, a origem geogrfica tem grande destaque, pois possvel perceber facilmente as diferenas no portugus falado em todo o Brasil. Suzana Cardoso (1998) enfatiza que as diferenas espaciais ganham destaque em relao s demais porque, na realidade dos fatos, as evidncias de aproximao ou distanciamento dos fenmenos assumem expresso de maior nitidez e de mais fcil percepo nos espaos fsicos, portanto geogrficos.Em meio diversidade lingustica no Brasil, observamos um fenmeno fontico ocorrente no portugus falado no Maranho, especificamente no norte do estado, na Baixada Maranhense, o fenmeno da despalatalizao das oclusivas alveolares d e t, que so pronunciadas em grande parte das regies brasileiras como africadas alveolopalatais.Para que os estudos fonticos, como o abordado neste estudo, sejam possveis, necessria a delimitao de uma rea geogrfica. E, a partir dessa escolha do campo, fazer o trabalho descritivo-analtico dos fenmenos a serem pesquisados, considerando-se tambm que o corpus deve refletir uma realidade mais ou menos coerente (MARTIN, 2003, p.230). Ou seja, a escolha do corpus da pesquisa depende do fato que se quer estudar e deve, por sua vez, ser til para apresentar a lngua do local abordado na anlise.Este trabalho de pesquisa que foca a variao diatpica, em que o fenmeno estudado condicionado pelo fator extralingustico regio geogrfica e, principalmente, quando realizado em diferentes localidades do pas, requer dedicao, disponibilidade de tempo e ateno na coleta e manuseio dos dados. Nas palavras de Caruso (2005, p.380): Esquecemos de dizer, no entanto, que o trabalho de campo esgota o pesquisador. Imaginem a programao de uma semana de trabalho em 6 localidades, fazendo, digamos, apenas duas entrevistas por dia...no fcil, esgotante. A pessoa, por fazer sempre a mesma coisa, semana aps semana, se aborrece, s no estoura porque tem diante de si um Informante que est ali para ajudar e que, ao trmino de sua entrevista com ele, vai lhe dizer, por exemplo, j t viu... A memria t fraca... O sinh mi discurpa... Eu num sab respond tudu e ele foi mais um que nos ajudou, que no pediu nada em troca.

Tais trabalhos, enfocando a variao diatpica, e que muito contribuem para o conhecimento da lngua que falamos, tm sido desenvolvidos pela Dialetologia, esta disciplina que assume a tarefa de identificar, descrever e situar os diferentes usos que a lngua apresenta em contextos espaciais e socioculturais. Cardoso (1998) ressalta que a preocupao diatpica, seja porque os homens se situam, inevitavelmente, nos espaos geofsicos, seja porque as lnguas e as suas variedades, pelas implicaes culturais a que esto sujeitas e que indubitavelmente as refletem, tm um territrio prprio, tem sido uma constante nos estudos dialetais e desde os seus primrdios.

2.1 As variaes fonticas no Maranho O Estado do Maranho, assim como todos os estados brasileiros, apresenta variaes fonticas no falar de sua populao. O projeto Atlas Lingustico do Maranho ALIMA, tem o objetivo de descrever a variedade do portugus falado no Maranho, em diversos aspectos como: fontico-fonologico, morfossinttico, semntico-lexical e outros. Com base nos estudos sociolingusticos, a partir dos registros encontrados por esse projeto, possvel observar essa diversidade de variaes e conhecer melhor a lngua falada no estado. Como afirma Arago (1999, p.14) Os avanados estudos dialetolgicos e sociolingusticos tm mostrado o quanto o conhecimento dessas variaes pode ajudar no maior aprofundamento das anlises lingusticas e no melhor conhecimento das lnguas. Partindo do princpio da heterogeneidade da lngua, segundo o qual a lngua, na concepo dos sociolinguistas, intrinsecamente heterognea, mltipla, varivel, instvel e est sempre em desconstruo e em reconstruo (BAGNO, 2007, p.36), podemos observar que o portugus maranhense apresenta, particularmente, variaes fonticas que distinguem de uma regio para outra do estado. o caso, por exemplo, do fenmeno da despalatalizao de /d/ e /t/ que, na maior parte das regies brasileiras, inclusive no prprio Maranho, so pronunciados como africadas alveolopalatais (d e t), quando seguidos de i e e (com som de i), tanto orais como nasais.(CRISTFARO SILVA, 2002)Tal variao fontica apresenta-se com nfase na microrregio Baixada Maranhense, localizada ao norte do estado do Maranho, como j citado. Essa regio, de acordo com o histrico de povoao, residiou grande quantidade de escravos vindos de Angola, Cacheu e Bissau, que vieram trabalhar nas lavouras de arroz e algodo. E com as fugas de escravos das fazendas escravagistas, formaram-se muitos quilombos nessa regio. Para Assuno (1996, p.436) esses quilombos no Maranho, tornaram-se um fenmeno endmico da sociedade escravista.Dessa forma, na primeira metade do sculo XIX, pequenos grupos de escravos que fugiam de suas fazendas se escondiam nas matas que cercavam essas propriedades. Essas fugas, por sua vez, aconteciam principalmente nos locais que tinham considervel nmero de fazendas e escravos como Alcntara, Viana, Vitria do Mearim, Itapecuru-Mirim, Rosrio, Turiau, entre outros. (ASSUNO, 1996)O fato da povoao da Baixada Maranhense ter sido feita principalmente por africanos propiciou a mistura de seus dialetos com os de outros povoadores desses locais, e isso pode ser uma fonte de explicao de algumas caractersticas fonticas e lexicais do portugus falado no Maranho. Contudo, no esse o objetivo de nossa pesquisa, que de cunho meramente descritivo.Pode-se perceber que as variaes mais notrias apresentadas no PB e, especificamente, no portugus maranhense, so de carter fontico e lexical. E so essas variaes que podem constituir posteriormente, mudanas lingusticas, caracterizando as diferenas dos dialetos em diversos locais do pas. Assim, para Arago (1999, p.150) em todos os processos de variao e consequente mudana lingustica nos aspectos fonticos e lxicos que comeam todos esses processos de variao da lngua que podero se cristalizar numa mudana.3. AS REALIZAES FNICAS DE /D/ E /T/O sistema consonantal brasileiro apresenta muitas consoantes, e algumas destas apresentam alofonia, ou seja, variao na sua pronncia. Para esta pesquisa, optou-se por observar as realizaes dos fonemas consonantais /d/ e /t/ nos contextos fonolgicos determinados: antes de /i/ e /e/ reduzido.Os fonemas /d/ e /t/ so, quanto ao modo de articulao, oclusivos, pois so resultantes do bloqueamento total, mas sempre momentneo da corrente de ar, em alguma parte da boca. E quanto ao ponto de articulao, ambos so classificados como linguodentais ou picodentais, em que h o contato do pice da lngua com os dentes superiores. (LOPES, 2008)No PB, /d/ e /t/, nos contextos especificados, so pronunciados como linguopalatais como em [dia] e [tia] na maior parte do Brasil. possvel observar todavia, que em algumas regies da Paraba, de Pernambuco, do Maranho e do Sul do pas, os falantes pronunciam os respectivos fones /d/ e /t/ como linguodentais. Ilari e Basso (2007) ressaltam que o carter regional das variedades do PB marcado, entre outros traos de pronncia, pela ausncia da palatalizao de /d/ e /t/, onde:A palatizao ( pronunciados [denti], [pratinhu], [disku]) fenmeno generalizado em todo o territrio brasileiro, com exceo do interior de So Paulo e da regio Sul ( pronunciado [lejte kte]; encontrado tambm em regies de Pernambuco, do Cear, do Maranho e do Piau). (ILARI; BASSO, 2007, p.168)O processo de palatalizao, pelo qual passam as consoantes d e t, consiste no levantamento da lngua em direo a parte posterior do palato duro, ou seja, a lngua direciona-se para uma posio anterior, mais para a frente da cavidade bucal do que normalmente ocorre quando se articula um determinado segmento consonantal. (CRISTFARO SILVA, 2002, p.35) E essa palatalizao geralmente acontece com consoantes seguidas de i, e, tanto orais quanto nasais.

De acordo com Edward Lopes (2008, p.134):[...] ora, tanto /i/ quanto o e chamado reduzido (pronunciado como i, em late, por exemplo, [lati], so fonemas palatais e por isso palatalizam as consoantes /d/ e /t/, emprestando-lhes uma articulao africada e no oclusiva, sendo esta ltima o modo normal de articulao desses fonemas em nossa lngua.Nos contextos especificados, todavia, ocorre com d e t o processo de dentalizao, a partir do qual algumas consoantes so articuladas como dentais ou alveolares. Por exemplo, a pronncia de t em [tia] e d em [dia], assemelham-se s pronncias dos mesmos fonemas em [tapa] e [data], onde a ponta da lngua pode tocar os dentes (sendo consoantes dentais) ou os alvolos (sendo consoantes alveolares).4. METODOLOGIA Este estudo compreendeu uma pesquisa de abordagem qualitativa e quantitativa, pautada em pesquisa bibliogrfica e considerando as ocorrncias dos fenmenos em estudo na fala dos entrevistados, respectivamente.A pesquisa dividiu-se em trs partes, sendo a primeira, o estudo bibliogrfico que serviu de embasamento terico para a mesma. A segunda compreendeu a aplicao de questionrios para realizao de entrevistas, com o intuito de observar o fenmeno fontico tomado para anlise, a saber, a despalatalizao dos fonemas /d/ e /t/ ocorrido na fala dos informantes. E por ltimo, a anlise dos dados coletados para verificao do fenmeno em questo.O campo de pesquisa compreendeu trs cidades maranhenses, Viana, So Bento e Penalva, localizadas na mesorregio do norte maranhense e agrupadas na microrregio Baixada Maranhense. Os informantes selecionados para pesquisa totalizaram 21, sendo 07 de Viana, 07 de So Bento e 07 de Penalva, todos nascidos e residentes nas respectivas cidades-campo e enquadrados nas faixas etrias determinadas pelo Projeto Alib 18 a 30 e 50 a 65 . Os dados foram produzidos a partir de um questionrio fontico-fonolgico que segue o modelo usado pelo Atlas Lingustico do Brasil e os mesmos foram analisados segundo as ocorrncias dos fonemas /d/ e /t/ antes de /i/ e /e/ reduzido.5. O FENMENO DA DESPALATALIZAO DOS FONEMAS /D/ E /T/ ANTES DE /I/ E /E/ REDUZIDO5.1 Anlise dos corporaPara a anlise dos contextos extrados das entrevistas realizadas com os informantes utilizou-se basicamente a anlise quantiqualitativa, pautada em pesquisa bibliogrfica e seguindo as orientaes da Sociolingustica. Observou-se, ento, a realizao dos fonemas /d/ e /t/ nos contextos outrora determinados, a seguir.

5.1.1 Despalatalizao do fonema /d/ diante de /i/ e /e/ reduzido.

A anlise do corpus demonstra que os 21 inquiridos, correspondente a 100% dos informantes pesquisados, ao pronunciarem as palavras dia, perdida, direita e dinheiro, realizaram o fenmeno da despalatalizao do fonema /d/, como podemos ver nos exemplos que seguem:

Dia [dia]Perdida [pdida]Direita [dieita]Dinheiro [dieiru]A realizao deste fenmeno na regio da Baixada Maranhense, nos municpios pesquisados, constitui uma diferenciao da maioria dos estados brasileiros, e de outras regies do mesmo estado, que palatalizam a consoante /d/, assemelhando-se pronncia do falar do Estado de Pernambuco e do sul do pas. (ILARI; BASSO, 2007) O fonema /d/ igualmente pronunciado diante de /e/ com som fechado, em posies de slabas tonas, ou seja, todos os falantes entrevistados pronunciaram o fonema em questo como um som linguodental, como nos exemplos: Tarde [tadi]Hspede [spdi]Rede [Xedi]Como afirma Bagno (2007, p.41) aqui estamos diante de um fenmeno de variao que no condicionada apenas linguisticamente, mas tambm extralinguisticamente, isto , condicionada por algum fator de ordem social neste caso, a origem geogrfica do falante. E no Brasil, diversas reas geogrficas apresentam o fonema /d/, nos contextos especificados como linguodentais e no como africadas alveolopalatais.5.1.2 Despalatalizao do fonema /t/ diante de /i/ e /e/ reduzido.

A partir dos corpora estudados, observou-se na fala dos informantes, que o fonema /t/ pronunciado, da mesma forma que ocorre com /d/, ou seja, como linguodental e no como palatal, tanto diante de /i/ como antes de /e/ tono, cuja pronncia fechada. Vejamos os exemplos:Tia [tia]Mentira [mtia]Time [timi]Tinta [tta]Com as palavras time e tinta, observamos que parte dos inquiridos, o correspondente a 28,5%, pronunciou a variante africada /t/, mais comum no portugus brasileiro e no prprio estado do Maranho, no qual esto localizados os municpios pesquisados. De acordo com Bagno (2007) o contexto fontico, ou seja, a influncia de um fonema sobre o outro, que vai explicar, neste caso, a variao. o que podemos ver nos exemplos:

Time [timi]Tinta [tta]Para Cristfaro Silva (2002:57) o que condiciona a ocorrncia do segmento africado [t] nos dialetos que apresentam a palatalizao de oclusivas alveolares o fato da vogal imediatamente seguinte ser [i]. Assim, embora essa ocorrncia tenha ocorrido em pequena quantidade na fala dos inquiridos, justifica-se pelo contexto fonolgico mencionado por Thas Cristfaro Silva (2002).Com o fonema /t/ diante de /e/ reduzido, ocorre tambm a permanncia do fenmeno de despalatalizao, uma vez que o fonema /e/ pronunciado com som de /i/ em contextos fonolgicos finais de palavras, em posio tona, como nos exemplos a seguir:

Noite [noiti]Inocente [incti]Dente [dti]Presente [pzti]Tapete [tapeti]Tomate [tmati]Elefante [lfti]Leite [leiti]6. CONCLUSOCom a anlise feita aqui, pudemos observar primeiro, que o portugus falado no Maranho apresenta variaes fonticas, levando-se em considerao o fator extralingustico espao geogrfico, em que vivem seus falantes. E segundo, que esses falantes realizam o fenmeno da despalatalizao dos fonemas d e t, diante de i e e reduzido, como buscava descrever e identificar a pesquisa a que nos propomos.A partir deste exame, observamos ainda, que apenas uma pequena quantidade dos entrevistados, o correspondente a 28,5%, realizou a pronncia dos fonemas em questo como africadas alveolopalatais, atravs das palavras time [timi] e tinta [tta], cuja pronncia assemelha-se da maior parte do Brasil, e tambm de outras regies do estado do Maranho.Podemos perceber, portanto, que tais variaes fonticas no afetam a comunicao entre os falantes da Lngua Portuguesa, no respectivo estado onde fora feito este estudo, caracterizando-se assim, como um fato lingustico comum no uso do PB, e refletindo, por sua vez, a heterogeneidade social de seus usurios. Como afirma Bagno (2007) a lngua uma atividade social, um trabalho coletivo, empreendido por todos os seus falantes, cada vez que eles se pem a interagir por meio da fala.Conclumos, por fim, que os estudos variacionistas do portugus podem contribuir imensamente para o conhecimento da lngua e das particularidades de cada falar, permitindo aos pesquisadores e estudantes de linguagem conhecer a identidade lingustica de nosso pas e desvencilhar preconceitos incutidos na sociedade.REFERNCIASARAGO, Maria do Socorro Silva. A variao fontico-lexical em Atlas Lingusticos do Nordeste. Revista do Gelne. Natal, RN, v. 1, n. 2, p. 14-20, 1999.ASSUNO, Matthias Rhring. A guerra dos bem-te-vis: a Balaiada na memria oral. So Lus: SIOGE, 1988.

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*Especialista em Lngua Portuguesa. Universidade Estadual do Maranho - UEMA