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¹Professora de Língua Portuguesa da rede Pública do Estado do Paraná, participante do Programa de

Desenvolvimento Educacional – PDE – 2010.

²Doutora em Letras e professora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras da

Unioeste.

ARTIGO DE OPINIÃO: ESPAÇO DE INSERÇÃO DO PRODUTOR DO TEXTO

Claudia Luiza Perin Turatto¹

Orientadora: Profª. Drª. Aparecida Feola Sella²

Resumo

O presente trabalho pautou-se na análise de artigos de opinião, publicados em

jornais impressos, com o intuito de levar o aluno a perceber marcas linguísticas que

orientam a leitura, especificamente com relação à posição do produtor do texto. A

partir da leitura dos artigos selecionados, foi realizada sondagem dos elementos que

indicam formas de repassar o conteúdo informacional, formas de engajamento do

produtor do enunciado. Para isso, enfocaram-se elementos que orientam processos

de modalização nos níveis epistêmico e deôntico, a serem percebidos por alunos do

2º ano do Ensino Médio. Para tanto, embasaram a pesquisa Koch (2002), Castilho e

Castilho (1996), no que se refere à modalização linguística; quanto ao gêneros

textuais, Bakhtin (1992) serviu de orientação teórica. Constatou-se que o trabalho

com a mídia impressa aproximou os alunos de textos do tipo argumentativo, e que a

interpretação a partir dos modalizadores contribuiu para a construção de um

posicionamento menos ingênuo diante da opinião dos outros e da construção da

própria opinião sobre questões socialmente relevantes.

Palavras-chave: artigo de opinião; argumentação, modalização.

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1 Introdução

O ensino de língua portuguesa, por meio da prática da leitura de textos que

expressam opiniões, pode contribuir para o desenvolvimento de leitores críticos, pois

propicia a sondagem não somente do dizer mas do modo de dizer. O

empreendimento do modo de dizer gera possibilidades de leitura, entre as quais está

a percepção das intenções do produtor do texto. Neste último caso, é de supor que o

leitor que sonda as intenções, avalia fatos socialmente relevantes em termos de

manipulação da linguagem.

Por isso, deve-se considerar que, para ler um texto, é preciso ir além da

decodificação das palavras, é preciso buscar o sentido, compreender, interpretar,

relacionar e reter o que for mais relevante. Essa prática se faz necessária para que o

aluno se sinta mais seguro para demonstrar seu ponto de vista. É imprescindível que

se tenha em mente que cada gênero textual tem uma finalidade: informar, ampliar o

conhecimento, opinar, levar à meditação ou ao entretenimento.

Compreender os diferentes gêneros textuais é um desafio que pode ser

vencido com a mediação de um professor que possibilite o contato com vários

modelos, que estimulem a leitura individual e autônoma.

Este contexto difere daquele em que a informação e o conhecimento eram

privilégio de poucos, o que é um aceno para investimento da escola quanto à

sondagem das formas de produção de um querer dizer, de um querer incutir opinião.

Para promover atividades de leitura e produção textual, é necessário procurar

aliar material disponível na escola com estratégias que sirvam para demonstrar aos

alunos as formas de modalização de textos de opinião, as quais devem ser

concebidas como uma ação dotada de intencionalidade, marcadas no âmbito do

linguístico, a ser percebidas como forma de despertar processos de leitura.

Este artigo tem como objetivo geral relatar procedimentos de análise de textos

do gênero artigo de opinião, publicados em jornais acessíveis à escola, com o intuito

de levar os alunos do 2º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Antonio de

Castro Alves, de Capitão Leônidas Marques – PR, a perceberem marcas

linguísticas que orientam a leitura da posição do produtor do texto. Como objetivos

específicos, projetaram-se os seguintes: estudar questões teóricas relacionadas a

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artigo de opinião e modalização; desenvolver unidade didática que motive o aluno a

lidar com artigos de opinião; levar os alunos a reconhecerem e a recorrerem a

estruturas linguísticas que demarquem argumentação.

A presente proposta de trabalho nasceu inicialmente da necessidade de se

trabalhar com as formas de argumentação presentes em textos que circulam na

mídia impressa. Para isso, buscamos reflexão de como a leitura pode estabelecer-se

no patamar da compreensão e da interpretação. Considerando-se a delimitação

necessária para que a pesquisa fosse desenvolvida, optamos por estudar a forma

como textos de opinião são constituídos por meio de modalizadores. Entendemos

que as marcas explícitas, presentes nos textos de opinião, podem revelar tanto o

engajamento do produtor do texto quanto seu distanciamento. Inclusive a própria

ausência de marcas pode denunciar um produtor que se quer omisso ou apenas

constativo. Tais orientações estão presentes principalmente em Castilho e Castilho

(1992), autores que consideram os modalizadores elos entre o produtor e seu texto,

conforme as próprias palavras dos autores: “São formas de deixar explícita a atitude

do falante com respeito à proposição”. (CASTILHO; CASTILHO, 1992, p. 200).

Além dos autores acima citados, recorremos a outras fontes cujo

norteamento segue esse mesmo princípio, o caso de Koch (2004), que se refere a

intenções, sentimentos e atitudes do produtor do texto com relação ao seu próprio

discurso.

Com relação ao estudo desenvolvido sobre o perfil do artigo de opinião,

Bakhtin (1992) serviu para orientar o entendimento de que a modalização em artigos

de opinião sempre revela atitudes dos interlocutores, e isso revela também

características desse gênero, para além de uma noção mais ampla, pautada nos

modelos correlatos que se definem por aproximação.

Aperceber-se desse movimento basicamente argumentativo gera leitores

investigativos, desconfiados e prontos para lidar com a adesão que o produtor do

texto promove no seu próprio discurso. E se considerarmos que a argumentação

pode se inscrever de diversas formas nos vários tipos de gêneros, podemos aceitar

que em artigos de opinião ela se mostra de forma mais evidente.

Quanto ao conceito de argumentação, seguimos o que dispõe Ducrot (1987),

autor que concebe este termo como estratégia de orientação, de indicação de

conclusões a que se quer chegar por meio de encadeamentos de enunciados. Em

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um enunciado do tipo (1) É bem provável que a manifestação dos operários dure

mais tempo do que o previsto, já se percebe uma forma de opinião demarcada por

certa forma de engajamento do produtor do texto. Embora esse engajamento seja

mais ameno do que (2) É certo que a manifestação dos operários dure mais tempo

do que o previsto, em que se observa a necessidade de o produtor demarcar o grau

de certeza diante da informação repassada, ainda tem-se no enunciado (1) uma

forma de manifestação mais direta do que o apresentado em (3) A manifestação dos

operários irá durar mais tempo do que o previsto.

Os exemplos acima demonstram que o produtor do texto pode selecionar

formas de engajamento com a informação repassada e isso vai depender de suas

intenções, crenças e pontos de vista. Pois bem, há vários tipos de demarcar o

engajamento e um deles é a modalização traçada mediante os objetivos do

interlocutor.

Pensemos que o conteúdo da mensagem possa ser moldado por marcas

linguísticas responsáveis por certos engajamentos e que a ausência dessas marcas

possa ser indício de certo distanciamento do produtor do texto com relação ao seu

próprio discurso. Assim, em (3) A manifestação dos operários irá durar mais tempo

do que o previsto, teríamos certo grau de certeza, mas não tão diretamente

assumido e em (4) Com certeza, a manifestação dos operários irá durar mais tempo

do que o previsto.

Ou seja, marcas como É bem provável, Provavelmente, É certo, Com

certeza, Certamente indicam a disposição do produtor do texto para modalizar a

porção informacional para o conteúdo “A manifestação dos operários irá durar mais

tempo do que o previsto”.

Neste estudo, discutiram-se formas de ensinar ao aluno do ensino médio a

lidar com a modalização: de um lado, tratamos de ensinar-lhe que todo tipo de

conteúdo informacional pode ser modalizado, e, de outro, pretendeu-se levá-lo a

aperceber-se das formas de modalização no texto do outro. Por isso, nossa intenção

de trabalhar com artigos de opinião.

As considerações de Kleiman (2004), Martins (1982) e Bakhtin (1992), por

exemplo, serviram de apoio para reflexões sobre a importância da leitura. A

referência as esses autores é feita na primeira parte, na qual são trazidas à

discussão os principais responsáveis pelo fracasso quanto à formação de leitores,

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bem como as inúmeras possibilidades de leitura de diversos gêneros textuais,

ofertadas pela esfera jornalística.

Também se recorreu ao apontamento de algumas características do gênero

artigo de opinião. Essa abordagem é feita na segunda parte e recorreu-se a Brasil

(2010), Rodrigues (2001) e Corbari (2008).

Na terceira parte os modalizadores são apresentados como marcas

linguísticas responsáveis por indicar o quanto o articulista está envolvido na defesa

de seu ponto de vista. Essa discussão busca amparo em Koch (2004), Castilho e

Castilho (1992), entre outros autores.

A descrição do desenvolvimento das atividades realizadas, assim como o

resultados das análises, ocorre na quarta parte.

Para analisar a modalização linguística, selecionamos dois artigos do jornal

impresso O Paraná, com o objetivo de demonstrar ao aluno o funcionamento dos

modalizadores, mais propriamente os de teor epistêmico.

A escolha do jornal O Paraná se justifica pela grande circulação que essa

mídia impressa tem em nossa região, e, por isso, acreditarmos que a apresentação

de fatos e opiniões mais próximas do contexto dos alunos pudesse despertar

interesse e, além disso, trata-se de jornal assinado pelo Colégio Estadual Antonio de

Castro Alves, Ensino Fundamental e Médio, onde se realizou este estudo. Vimos

nisso um facilitador para a realização do nosso trabalho pedagógico.

Acreditamos que a ação de apresentar dois artigos de opinião sobre o

mesmo tema rendeu visibilidade para o trato com conceitos e exemplos,

principalmente em se tratando de modalizadores epistêmicos, cuja caracterização se

rende a gradações que vão de um baixo grau de engajamento a um grau mais alto.

Pensamos em um trabalho comparativo, pois assim os alunos poderiam perceber o

quanto a informação está a serviço da opinião e como esta opinião é apresentada de

formas diferenciadas, dependendo de fatores que regem o posicionamento de cada

interlocutor.

Optamos por utilizar o site Opinião e Notícia como forma de acrescentar

diferentes padrões de artigo de opinião, pelo fato de que este tão importante recurso

midiático deve ser reconhecido pelo aluno nesse momento de expansão de gêneros

midiáticos. Porém, essa iniciativa serviu apenas para ilustração de outras

possibilidades de se lidar com formas de argumentação, as quais devem ser

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ampliadas pelo professor a depender de seus objetivos em sala de aula e da série

com a qual está trabalhando. Destacamos para os alunos que o jornal on line é um

dos principais meios de circulação de artigos de opinião do qual podem servir-se,

pois se trata de ferramenta ágil e de atualização constante, e por isso dinâmica, na

busca de informações e opiniões sobre diversos assuntos.

2 Algumas noções de leitura

A leitura caracteriza-se por ser uma atividade interativa. Isso significa dizer

que o leitor deve acionar reflexões variadas num processo que deve ser

prioritariamente ativo. Kleiman (2004, p.17) cita cinco práticas de leitura que a escola

sustenta há muito tempo e que são as principais responsáveis pelo fracasso quanto

à formação de leitores:

1) O texto como conjunto de elementos gramaticais;

2) O texto como repositório de mensagens e informações;

3) A leitura como decodificação;

4) A leitura como avaliação;

5) A integração numa concepção autoritária de leitura

Essas indicações da autora nos levam a questionar práticas e conceitos com

os quais a escola já vem operando tradicionalmente. Importa para o presente

trabalho discutir um pouco mais o tratamento da leitura como decodificação. Talvez

essa prática fique mais evidente nos exercícios de compreensão e interpretação que

se seguem imediatamente à apresentação de textos para leituras, e isso de forma

mais enfática em livros didáticos.

Importa também dizer que o trabalho de interpretação, baseado em perguntas

dirigidas, e, depois de um salto incrível, vir o trabalho de análise linguística

desconectado do processo de leitura, como se fosse apenas uma sondagem de

elementos linguísticos, leva a uma dispersão de objetivos, o que não rende um

resultado satisfatório.

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Para Martins (1982), o aprendizado da leitura requer uma noção mais ampla

do que aquela que considera apenas um tipo de texto, o escrito. Para a autora,

aprender “a ler significa também aprender a ler o mundo, dar sentido a ele e a nós

próprios, o que, mal ou bem, fazemos mesmo sem ser ensinados”. O que está em

pauta, portanto, é o papel do professor mediador que precisa “criar condições para o

educando realizar a sua própria aprendizagem, conforme seus próprios interesses,

necessidades, fantasias, segundo as dúvidas e exigências que a realidade lhe

apresenta” (MARTINS, 1982, p. 34).

Na esfera jornalística, há diversos tipos de gêneros do discurso, o que nos

leva também a pensar sobre a necessidade de se lidar com esse tipo de

conhecimento. Segundo Bakhtin, o enunciado materializa condições e finalidades

que demarcam o gênero. Sendo assim, conteúdo e estilo verbal (recursos da língua

– recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais) e principalmente construção

composicional “fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado e todos eles são

marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação” (BAKHTIN, 1992, p.

279).

Para o autor, todo enunciado está vinculado à determinada “esfera de

utilização da língua”, o que indica “tipos relativamente estáveis de enunciados”. Esse

processo é denominado gêneros do discurso (BAKHTIN, 1992, p. 279). Cada gênero

textual tem uma finalidade: informar, ampliar o conhecimento, opinar, levar à

meditação ou ao entretenimento. Compreender os diferentes gêneros textuais é um

desafio que pode ser vencido com a nossa mediação, como professores que

possibilitam o contato com vários modelos, que estimulam a leitura individual e

autônoma. A nossa contribuição paira no artigo de opinião, por isso na sequência

vamos discutir mais de perto esse gênero, tão importante para a formação de

nossos alunos.

3 Artigo de opinião: perfil interativo e engajamento do produtor do texto

Sobre a autoria dos artigos de opinião, Brasil (2010), contribui com a

elaboração dessa proposta didática, afirmando que o artigo de opinião é uma

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matéria autoral, já que é de responsabilidade do produtor do texto, jornalista

profissional ou não, geralmente uma autoridade no assunto que opina, discute,

comenta e avalia fatos ocorridos ou questões polêmicas. Seu autor pode ser

contínuo, eventual ou por ser reconhecido tanto pelo jornal, quanto pelos leitores

como alguém que tem uma importante contribuição para o debate, convidado pelo

jornal para se pronunciar sobre o que pensa a respeito de questões debatidas

publicamente e que interessam a muitos.

É por esse motivo que ele assina o artigo de opinião, responsabilizando-se

pelo que expõe. Juntamente com sua assinatura, devem constar informações sobre

o autor. Conforme Rodrigues (2001), os gêneros agrupados em torno da categoria

jornalismo opinativo, têm em comum a presença de uma valoração explícita quanto

aos acontecimentos (o que se colocou anteriormente como domínio discursivo que

se situa em torno do fazer-crer, efeito ideológico construído pela situação de

interação). No entanto, eles assumem feições particulares a partir da autoria e da

angulagem espacial e temporal.

O perfil dos leitores previstos de artigo de opinião geralmente coincide com o

perfil do leitor de jornais e revistas e, para Rodrigues (2001), o autor tem uma

projeção, um conhecimento “virtual” dos seus leitores, pelas enquetes

socioeconômicas feitas pelas empresas jornalísticas, que definem o “perfil” do

público leitor.

Ainda conforme Rodrigues, embora seja consenso que

o jornalista "escreve para todos os tipos de leitor, os jornais têm uma determinada concepção de destinatário. As grandes empresas jornalísticas publicam jornais diferenciados, destinados ao consumo de diferentes tipos de destinatários, normalmente estabelecendo como critério a classe socioeconômica. A projeção do interlocutor e do seu fundo aperceptivo (os seus valores, posições etc.) orienta o autor, influi naquilo que é dito e como é dito, pois todo enunciado se encontra orientado para o interlocutor. Nessa perspectiva, também se deve incluir a instituição jornalística como um leitor privilegiado, constitutivo do artigo, uma vez que a publicação do artigo passa pela leitura e aprovação prévia da instituição. (RODRIGUES, 2001, p.135).

Entendemos, assim, que o produtor do texto deve realmente ter conhecimento

dos seus leitores, pois, dessa forma, pode fazer escolhas de temas e estratégias

discursivas de acordo com seus interlocutores. No que diz respeito à forma dos

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artigos de opinião, buscamos em Corbari (2008) a informação de que esse gênero

textual não apresenta uma estrutura fixa:

Com relação à forma, há uma especificidade, que é a não-delimitação da extensão do texto. Embora os artigos publicados nos jornais/revistas impressos não tenham um limite explicitamente definido, eles acabam tendo uma extensão mais ou menos delimitada, de acordo com o espaço reservado para a sua publicação na página do jornal. (CORBARI, 2008, p. 53).

Assim como a autora, acreditamos na impossibilidade de uma estrutura

estável, já que a extensão dos artigos de opinião dependerá também, da

disponibilidade de espaço previsto no meio de circulação onde são publicados.

O grau de formalidade da linguagem do artigo de opinião deve ser mantido

conforme o seu contexto de circulação e o perfil de seus leitores.

A respeito do uso da primeira pessoa do plural, Rodrigues afirma:

A presença da primeira pessoa do plural pode, em um mesmo artigo, marcar-se como um caso de plural de modéstia, inclusão ou exclusão do leitor e ainda como uma marca de um locutor dentro de um gênero intercalado. Também pode se manifestar de uma maneira mais ostensiva ou discreta no artigo. Os artigos podem usar a primeira pessoa como uma "forma de expressão", mas que "convém evitar, a todo custo, o recurso expressivo ao eu, que dá uma desagradável sensação de narcisismo. Editorialistas, articulistas e autores costumam usar o nós plural de modéstia em lugar do eu. (RODRIGUES, 2001, p.135).

De qualquer forma, é bom utilizar uma linguagem acessível a pessoas com

diferentes níveis de leitura, expor o assunto de forma direta e concisa, evitando

comentários muito informais. Entendemos que a opinião é uma resposta à

informação apresentada em outros gêneros, principalmente na notícia.

Para Corbari,

Devido às características próprias do jornal, como seu horizonte temático e a finalidade da interação proposta, observa-se que essa interação com textos anteriores é muito acentuada. Nesse sentido, para interagir de maneira plena com o produtor do texto, o leitor precisa estar inteirado dos acontecimentos que permeiam a esfera jornalística, bem como acompanhar

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as discussões acerca deles, de forma a garantir que o conhecimento seja partilhado entre os participantes da interação comunicativa. (CORBARI, 2008, p. 53).

É impossível escrever sobre o que não se conhece, assim como é impossível

um leitor se pronunciar a respeito de uma questão sobre a qual ele não tem

conhecimento para fazer relações de sentido e atribuir significados. Dessa forma,

entendemos que o leitor de artigos de opinião deve buscar nas informações,

conhecimentos que lhe auxiliem interagir com o produtor do texto sobre a questão

polêmica apresentada no artigo de opinião.

3.1 Os modalizadores como característica de Artigos de Opinião

Sem as questões polêmicas, não existe o gênero artigo de opinião. Elas

geram discussões porque há diferentes pontos de vista circulando sobre os assuntos

que as envolvem. Alguns gêneros textuais apresentam a argumentação de forma

oculta e outros, como é o caso do artigo de opinião, de forma explícita.

Uma das formas de explicitar adesões, opiniões, sentimentos é recorrer aos

modalizadores. Trata-se de marcas linguísticas responsáveis por demarcar

argumentação, demarcar a posição que o produtor do texto defende sua opinião. Os

modalizadores, conforme Koch (2004), são indicadores de intenções, sentimentos e

atitudes do produtor, seja com relação ao conteúdo da mensagem, seja com relação

ao interlocutor.

Conforme Koch,

modalizar um discurso é uma estratégia que permite ao falante assumir vários posicionamentos perante o enunciado, determinando seu grau de engajamento com relação ao dito, como também determinar o grau de tensão que se estabelece entre os locutores, além de deixar pistas de intenções do locutor para seu interlocutor. (KOCH, 2004, p.86).

É o que ocorre nos exemplos como:

(1) Evidentemente, Ana foi bem na prova. (certeza)

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(2) Talvez Ana precise repetir a avaliação. (dúvida)

(3) Possivelmente, Ana atingirá bons resultados. (hipótese)

(4) Obrigatoriamente, Ana deverá estudar mais para a prova de física.

(5) Terminantemente, proibida a visita ao museu.

Nos exemplos (1), (2) e (3), parte-se de convicções sobre a realidade, no

entanto, não se garante a verdade da afirmativa que é apresentada de forma

atenuada, reduzindo seu grau de comprometimento e/ou engajamento.

Já em (4) e (5), os advérbios modalizadores obrigatoriamente e

terminantemente, representam principalmente, obrigatoriedade e necessidade,

porque paira a intenção de levar o interlocutor a concordar com os argumentos do

enunciado de forma autoritária e incisiva.

Na literatura que lida com a modalização, é possível perceber a importância

dada às expressões que de um lado, marcam (a) atitude do produtor do texto em

relação ao (b) conteúdo, e de outro, com relação ao processo de imposição com

relação ao outro. Respectivamente, teremos:

(a1) Certamente, ela virá nesta madrugada.

(a2) Provavelmente, ela virá nesta madrugada.

(a3) É evidente que virá nesta madrugada.

(b1) Fique quieto.

(b2) Você deve ficar em casa.

Advérbios e expressões modalizadoras formam um conjunto de termos que

indicam os posicionamentos e intenções do produtor do texto como forma de

convencer o leitor sobre o argumento defendido. Segundo Corbari,

o artigo de opinião se apresenta como um espaço propício para o aparecimento da modalização, uma vez que se configura como um gênero explicitamente marcado como argumentativo, tendo uma das suas categorias definidoras a defesa de um ponto de vista sobre temas da atualidade. (CORBARI, 2008, p. 57).

Aprender a ler o gênero artigo de opinião na escola favorece o

desenvolvimento da prática de argumentar e estimula a busca de informações que

sustentam a opinião. Vemos nessa prática uma contribuição significativa na

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formação de muitos alunos conscientes, que hoje, apesar de estarem em contato

constante com inúmeras informações veiculadas em diversos meios, ainda

apresentam dificuldades na leitura e exposição do próprio ponto de vista.

Essa exposição pode ser explorada de diversas formas. A observação atenta

dos elementos linguísticos que demarcam a posição do produtor do texto pode levar

o aluno a ler intenções, as quais estão visivelmente atreladas a marcas adverbiais

que sinalizam o grau de certeza e de engajamento do produtor do texto.

Castillho e Castilho (1992 p. 206) entendem essas marcas denominadas

modalizadores epistêmicos como uma forma de expressar avaliação sobre a

informação repassada, de veicular modalidade epistêmica com teor ora

asseverativos, quase-asseverativos e delimitadores. Os primeiros indicam certa

consideração com relação ao conteúdo da informação repassada (os autores usam

o termo conteúdo proposicional, relativo a uma dada afirmação ou negação) que não

dá margem a dúvidas, constituindo-se uma necessidade epistêmica. Um exemplo

seria Com certeza, o remédio foi entregue nessa semana. Neste caso, não fica

dúvida com relação ao que se afirma e se expressa o grau de comprometimento do

produtor do texto.

Castilho e Castilho (1992) explicam que os quase-asseverativos indicam que

o falante considera o conteúdo da informação próximo à verdade. Não se trata de

uma certa exatidão, como ocorre no enunciado acima, pois o que se informa paira

no patamar da hipótese, dependente, portanto, de confirmação. Num enunciado

como É provável que a Maria chegue hoje, não há um comprometimento explícito

com a verdade ou exatidão da informação. Trata-se de um dispositivo para demarcar

o distanciamento do produtor do enunciado e isso o exime de certas obrigações com

relação às consequências do que é dito.

Os delimitadores, conforme Castilho e Castilho (1992), assinalam que uma

dada tese é absolutamente verdadeira ou falsa, ou seja, são expressões que têm

poder de realizar uma ação com um enunciado linguístico maior que os

asseverativos e os quase-asseverativos, pois se estabelece uma negociação entre

os interlocutores para que haja a manutenção da afirmativa. São exemplos de

delimitadores: quase, um tipo de, uma espécie de, em princípio, geograficamente,

biologicamente, basicamente e praticamente.

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Conforme Neves (1996, p.187), a modalidade deôntica se situa no domínio do

dever (obrigação e permissão) e se liga à volição e à ordem. Obrigação e permissão

podem corresponder, pois, a atos diretivos da fala, ligando-se ao imperativo, que é

característico de interações espontâneas, nas quais se pode esperar que um

interlocutor leve outro a fazer algo. Nos exemplos: Obrigatoriamente você deverá

estudar mais para a prova de física, e, Terminantemente proibida a visita ao museu,

observamos o controle expresso claramente pelo falante.

Corbari (2008), ao analisar as expressões formadas por “e+adjetivo”,

comenta que o engajamento do interlocutor pode ser maximizado à medida que o

produtor do texto toma o fato exposto como certo, corriqueiro e, portanto, de

conhecimento da comunidade linguística à qual se destina o texto. A autora observa

que a seguinte escala que vai do maior ao menor grau de certeza, perceptível nas

expressões é sempre difícil, é impossível, é praticamente, impossível revelam

intenções postas como reflexos da decisão de aproximar o ponto de vista da

informação repassada. No outro pólo estão marcas de atenuam esse engajamentos,

tais como é provável, é possível, eu acho, reveladores de um certo distanciamento

com o teor de verdade ou de exatidão com relação ao que é expressado na

informação.

Assim, a modalização permite explicitar as posições do falante na construção

de seu enunciado de forma a revelar um maior ou menor comprometimento em

relação ao conteúdo do que enuncia.

4 Elaboração e aplicação do material didático

O Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) foi claro sobre a

necessidade de se organizar um material didático enquanto estratégia e metodologia

que servisse aos propósitos do projeto de intervenção pedagógica. Deveria ser

levada em conta a viabilidade da implementação, bem como a execução das

atividades propostas, os meios para sua operacionalização, os recursos necessários

para sua produção, o período de execuções propostas e principalmente,

corresponder com clareza ao público a que se destinava, de modo a auxiliar na

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compreensão da realidade objetiva e contribuir para sua formação.

Optou-se pelo instrumento pedagógico Unidade Didática em que as

atividades disponibilizadas foram relacionadas aos estudos dos advérbios

modalizadores, com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento da capacidade

dos alunos em perceber o quanto os produtores de artigos de opinião estão

envolvidos com a exposição de suas opiniões.

Para a elaboração da Unidade Didática foi selecionado um corpus de 03

textos, sendo 02 artigos de opinião retirados do jornal impresso e 01 artigo de

opinião do site Opinião e Notícia (em anexo). Para fins de complementação das

atividades, trabalhou-se em sala com uma notícia do jornal O Paraná.

Além de se proporcionar o estudo dos elementos constitutivos dos textos

acima citados, por meio de atividades orais e escritas, individuais e em grupos,

debates e pesquisas, o contato constante com os jornais impressos disponibilizados

na escola motivou o acesso a vários gêneros textuais presentes neste importante

veículo de comunicação.

Essa ação deu início à aplicação do projeto de implementação em outubro de

2011 e serviu para implementar não somente a análise dos gêneros disponibilizados

quanto a sua estrutura e linguagem, mas também quanto à apresentação da página,

aspectos gerais de produção, autoria e importância para a sociedade.

O trabalho específico sobre artigo de opinião partiu da definição do que é um

artigo de opinião, quais seus contextos de circulação e perfil de seus leitores. Para

analisar suas características estruturais, utilizou-se o artigo de opinião “O Triste

Descrédito da Justiça”, adaptado para que se analisasse a modalização presente

em cada parágrafo apresentado.

Os modalizadores adverbiais foram destacados no texto e contribuíram para

que os alunos entendessem que se trata de formas de imposição do produtor do

texto diante do conteúdo, de marcar seu ponto de vista. Assim, tem-se a garantia da

decisão de compartilhar explicitamente suas intenções.

Após o primeiro contato dos alunos com os modalizadores adverbiais,

tencionamos intensificar mais os estudos e, para isso, retomamos o estudo

tradicional dos advérbios, com o objetivo de demonstrar que são expressões

modificadoras que denotam circunstâncias de lugar, tempo, intensidade, condição

etc.

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Apresentamos aos alunos uma tabela com as principais circunstâncias

expressas por advérbios e locuções adverbiais, explicando-lhes que

tradicionalmente, os advérbios são assim apresentados, mas que a partir disso,

iríamos focalizar o uso dos advérbios na argumentação, considerando-se a

modalização.

Além disso, disponibilizamos e analisamos um quadro adaptado onde

constavam elementos articuladores, que são expressões que podem servir para

demarcar as orientações argumentativas, Brasil (2010). Tais elementos são usados

para tomar posição, indicar certeza, probabilidade, causa e/ou consequência e

restrição, acrescentar e organizar argumentos e preparar a conclusão. Entendemos

que ensinar os alunos a lidar com esses mecanismos linguísticos rende um

processo interessante de reflexão sobre como as intenções podem ser medidas no

plano linguístico.

À medida que os alunos foram entendendo que modalização é a maneira com

que o autor de um texto expõe seu ponto de vista, quais suas intenções e de que

maneira se posiciona em seu discurso, percebeu-se certo interesse com relação ao

funcionamento dessa estratégia de imposição do produtor de texto.

Frases como A educação vai transformar o país e A educação, certamente,

vai transformar o país, foram analisadas para que os alunos observassem a função

que o termo certamente pode assumir: revela a forma como o produtor do texto

concebe a informação que está sendo repassada e que diferentemente da anterior,

há uma informação a mais, que tributa o sentido de aquele que enuncia também se

revela detentor de um grau de certeza sobre o teor da informação.

A definição de modalizadores epistêmicos e deônticos foi repassada na

sequência e fez-se necessária a utilização de mais exemplos para que não

restassem dúvidas por parte dos alunos com relação à importância do estudo dos

modalizadores e a relação entre eles e o artigo de opinião.

O trabalho teve continuidade com a verificação da linguagem que

basicamente caracteriza o artigo de opinião, análise da estratégia argumentativa e

questão polêmica.

O segundo texto utilizado foi “Brasil fica entre piores em ranking, apesar

de melhorar a sua média”. Esta escolha se deu porque acreditamos que além de

reconhecermos características do artigo de opinião, precisamos entender que a

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informação, que é um texto de caráter expositivo, não desaparece do texto de

opinião. Ao contrário, ela é até indispensável: a opinião é sempre sobre um assunto

ou sobre um acontecimento, ou seja, a informação serve a opinião. Além disso, o

aluno precisa saber diferenciar uma notícia de um artigo de opinião, perceber a

função de cada um desses gêneros, observando também a linguagem e o

posicionamento dos autores dos textos.

Após a leitura, instigamos os alunos a falar sobre a notícia:

- Qual é a finalidade específica deste texto?

- Qual é o assunto apresentado?

- Podemos considerar que o autor forneceu informações suficientes para que

se possa identificar: O quê? Quem? Quando? Como? Por quê?

- Podemos afirmar que as informações expostas no primeiro parágrafo têm as

mesmas funções que as apresentadas nos parágrafos seguintes? Sim ou não? Por

quê?

- O autor da notícia manifesta sua opinião sobre os resultados do PISA ou

apenas relata os fatos?

- É possível identificar modalizadores adverbiais nesta notícia?

- Esses advérbios revelam a inclusão de argumentação do produtor do texto?

- A supressão desses modalizadores alteraria o sentido da notícia?

A partir disso, procedemos a análises de artigos de opinião com objetivo de

sondar como os modalizadores epistêmicos demarcam a posição do produtor do

texto. Os textos selecionados apresentaram a mesma temática que a notícia

estudada anteriormente para que se verificasse o quanto a opinião depende da

informação.

O artigo de opinião Avaliação mostra o que o Brasil faz com Educação:

PISA, é um texto on line e com isso, a confirmação de que este gênero textual não

está disponibilizado somente na mídia impressa, mas também em revistas e internet.

Após uma leitura dinâmica, os alunos foram questionados sobre o que segue:

- O título dá alguma dica sobre o assunto abordado?

- O que conhecem sobre esse assunto?

- Onde leram a respeito?

- Qual é a sua relevância?

- Que posição o autor provavelmente defenderá em seu artigo?

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Durante a leitura silenciosa os alunos deveriam observar de que forma o

articulista organizou seus argumentos, para, em seguida, responder ao que segue:

- Identifique qual é a questão polêmica que deu origem a este artigo de

opinião.

- Que fatos conduziram o autor a escrevê-lo?

- Que tese o artigo de opinião defende?

- Os argumentos apresentados são convincentes? Que dados, exemplos ou

citações o produtor do texto utiliza e com que intenção?

- Que argumentos o autor utiliza para fortificar seu ponto de vista? De que

forma são apresentados e desenvolvidos?

- Volte ao quadro dos Elementos Articuladores e identifique se há ocorrência

de tais elementos neste artigo de opinião.

Na sequência, reapresentamos o texto: Avaliação mostra o que o Brasil faz

com educação: PISA, modalizado. Esta ação rendeu uma análise interessante, pois

os alunos perceberam que o texto ficou diferente depois da carga de modalização

inserida na versão apresentada anteriormente. Além disso, serviu de exemplo para

que os alunos modalizassem o texto que foi apresentado a seguir.

O artigo de opinião: Mais uma vez, pontuamos mal em matemática, assim

como o anterior, foi bem aceito pelos alunos por apresentar uma temática que

conhecem bem: educação.

Por meio deste texto, foi analisada a estrutura, linguagem, questão polêmica,

estratégia argumentativa e, principalmente, a modalização feita pelos alunos.

Temos a compreensão de que a análise de cada texto poderia ser melhor

aprofundada e exemplificada, mas devido ao tempo limitado, iniciamos a preparação

para a produção do artigo de opinião realizada pelos alunos.

Como optamos pelo tema “educação”, realizou-se a pesquisa da temática e

cada grupo de alunos ficou responsável por um subtema sobre o qual realizaram

exposição oral para os demais alunos. Vemos nesta atividade uma oportunidade de

estabelecer contato com várias informações sobre a temática proposta para a partir

daí, a formulação da opinião própria de cada aluno envolvido.

Uma vez que o estudo apontou para os modalizadores adverbiais, ficamos na

expectativa de que os alunos interiorizassem esses conhecimentos na produção

textual.

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Realizada a produção do artigo de opinião, a tomamos como base para a

análise que revelasse se os alunos conseguiram, de fato, atender as exigências de

produção desse gênero textual e se fizeram uso dos modalizadores adverbiais.

Dessa forma, procuramos descrever, na sequência, um diagnóstico desses

textos, destacando os aspectos que consideramos mais importantes como resultado

desse estudo:

4.1 Quanto ao gênero artigo de opinião

Os alunos atenderam a proposta de produção de artigo de opinião, com

respeito às características do gênero textual apresentado. Isto é, a partir da questão

polêmica, organizaram os argumentos para a defesa de seu ponto de vista. Alguns

alunos, em alguns momentos, demonstraram maior dificuldade em lidar com a

linguagem objetiva, pois fizeram uso de uma linguagem muito próxima da oralidade,

porém, ao serem levados a observar isso, reescreveram trechos e reorganizaram o

texto no sentido de eliminar também repetições de ideias. Dessa forma, garantiram,

mesmo que razoavelmente, a linguagem que o gênero artigo de opinião requer. Em

relação à temática, podemos afirmar categoricamente que foram coerentes, já que

não houve fuga do tema em questão e apresentaram o conteúdo com sequenciação

lógica. Entendemos que o formato do gênero tenha sido garantido em todas as

situações de escrita dos alunos.

4.2 Quanto ao uso dos modalizadores adverbiais

Nos textos analisados, os modalizadores adverbiais apresentados foram

exclusivamente epistêmicos. A partir disso, fomos levados a perceber que os alunos

expressaram suas opiniões por meio de argumentos que consideram verdadeiros,

porém menos incisivos que os modalizadores adverbiais deônticos. Essa escolha

preferencial pelos modalizadores epistêmicos também demonstra a intenção de

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levar o leitor a aceitar sua opinião como certa, de certeza em relação ao que

expõem.

Consideramos satisfatório o número de modalizadores utilizados pelos

alunos. Para isso, julgamos as condições de produção não tão favoráveis, já que

foram determinadas pela escassez de tempo.

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5 Considerações Finais

O propósito inicial deste trabalho consistia no estudo dos modalizadores

adverbiais no sentido de promover atividades que possibilitassem ao aluno perceber

essas marcas linguísticas que indicam o posicionamento do produtor do texto do

gênero artigos de opinião.

A nossa experiência ensina que o professor deve pensar com muita

antecedência no gênero textual que irá utilizar e explorar ao máximo as

possibilidades de reconhecimento das características desse gênero. Em se tratando

da nossa pesquisa, acreditamos que a leitura de textos que expressam opiniões,

pode contribuir para o desenvolvimento de leitores críticos, pois propicia a sondagem

não somente do dizer, mas do modo de dizer. O empreendimento do modo de dizer

gera possibilidades de leitura, entre as quais está a percepção das intenções do

produtor do texto.

Por meio da mídia impressa disponível na escola, possibilitamos aos alunos

contato com artigos de opinião em que analisaram os diferentes pontos de vista e a

capacidade dos autores em defender suas ideias. A partir disso, iniciamos a

mostragem dos processos de modalização presentes nos artigos de opinião

previamente selecionados e analisados. Com esta atividade, pretendeu-se levar o

aluno a verificar como a modalização revela posições assumidas pelo produtor do

texto, para posteriormente, ser capaz de avaliar textos em termos de marcas de

engajamento.

A leitura conduzida gerou a curiosidade dos alunos na sondagem de como os

advérbios geram encaminhamentos com relação às informações explícitas ou

mesmo implícitas. Assim, a modalização se tornou um dos focos da leitura pois se

trata de uma forma de pista que revela o posicionamento do autor do texto.

Como acreditamos que o contato com opiniões diferentes, proporcionado por

leituras reflexivas e críticas, contribui para a formação de opiniões, criamos espaço

para a produção de textos, em que o aluno teve a oportunidade de fazer uso dos

modalizadores estudados e analisados nos textos de outros autores.

Entendemos que modalização é um recurso de grande importância na

produção textual, por isso nos empenhamos em ensinar aos alunos a importância de

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se utilizar este recurso para a formulação de uma boa argumentação.

Acreditamos que as atividades propostas poderiam ser estudadas mais a

fundo, porém, mesmo dentro das limitações estipuladas pelo tempo, percebeu-se

que os alunos identificaram aspectos de artigos de opinião e recursos linguísticos

que asseguram o posicionamento do articulista, além de promover a interlocução

com seus leitores.

Tais reflexões nos auxiliaram no esforço para promover o amadurecimento

dos alunos em relação à habilidade de lidar com o reconhecimento das intenções,

seja como leitores ou produtores de textos do tipo argumentativo.

Não temos a intenção de esgotar a discussão, de considerar encerrado o

estudo da modalização presente em textos. Pelo contrário, consideramos um estudo

aberto a críticas, complementações e revisões, na intenção de acrescentar ao

trabalho de leitura condições para que o aluno assuma o papel de leitor investigativo

e consciente.

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Referências

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DUCROT, O. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.

KLEIMAN, Angela. Oficina de leitura. Campinas: Pontes, 2004.

KOCH, Ingedore Villaça. Argumentação e linguagem. São Paulo: Cortez, 2004.

______. Aspectos da interação em língua portuguesa. São Paulo, 1981. (Tese de doutorado)

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Cortez, 1982.

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RODRIGUES, Rosângela Hammes. A constituição e o funcionamento do gênero jornalístico artigo: cronotopo e dialogismo. São Paulo, 2001. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Disponível em: http://www.pucsp.br/pos/lael/lael-inf/def_teses.html. Acesso em 10/06/2011.

VENTURI, Jacir J. Mais uma vez, pontuamos mal em matemática. Cascavel: Jornal O Paraná, 08/12/2010.

ZIMMERMAN, Walter. O triste descrédito da Justiça. Cascavel: Jornal O Paraná, 08/12/2011.

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ANEXOS

TEXTOS SELECIONADOS PARA A COMPOSIÇÃO DO CORPUS

TEXTO 1

O TRISTE DESCRÉDITO DA JUSTIÇA

Walter Zimermann

Ao ler no jornal a informação de que a maioria do povo brasileiro não

acredita na Justiça do país, não vi nenhuma surpresa. Afinal,

conversamos todos os dias com inúmeras pessoas e, quando o tema

versa sobre a situação de descrédito no qual nossas instituições

públicas estão mergulhadas, a opinião da maioria é de desânimo,

principalmente em relação à impunidade.

Imaginem que entre 2.770 pessoas ouvidas em todos os Estados e

Distrito Federal, numa escala de zero a dez, a nota obtida em favor

da Justiça chegou a magros 4,55%. E pior: no quesito rapidez para

decisão dos casos, míseros 1,18% concordaram com o trabalho de

nossos operadores da Justiça. Mais ainda: no item honestidade, ela

contou com tão somente 1,7% dos entrevistados.

Foi-se o tempo em que os cidadãos, pelo menos os mais simples,

tinham respeito até pelo inspetor de quarteirão, pelo delegado de

polícia, mesmo que fosse um “calça curta” qualquer. Policial fardado,

vereador, prefeito, deputado ou senador era tudo “gente fina”. Na

frente do governador tremia-se de emoção e tinha gente capaz de

desmaiar vendo de perto o presidente. Do Lula, ainda hoje.

A coisa foi, aos poucos, se degringolando. Por culpa, senão de todos,

mas de uma esmagadora maioria, da corrupção que corrói nossas

instituições já há algum tempo. Não apenas os responsáveis pelos

Poderes Executivo e Legislativo foram caindo no descrédito da

população carente de trabalho sério. A corrupção e a falta de caráter

se infiltraram até em nossas Forças Armadas. E, pior ainda, em

nossa Justiça. A começar por certos advogados, passando por

escrivães e outros servidores, chegando até a juízes e promotores.

Talvez por falta de investimentos por parte do governo, chegou-se a

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um tal anacronismo e a uma flagrante desídia e desapego às

obrigações de nossos homens da lei. Criminosos comuns ou

bandidos de toda espécie são capazes de fazer inveja à classe

política, que se tornou, de todas, a menos confiável, e apostou na

impunidade como sua grande proteção.

Sobre a classe política, li, bem recentemente, a seguinte declaração

do analista judiciário do TRT, 17ª Região: “a arte de lidar com o poder

deve ser usada em favor de quem lhe deu tal prerrogativa. O ato do

político que ocupa cargo estatal só é legítimo se atende tal requisito”.

Fácil de ser traduzido, não? Basta a clássica frase de Mazenildo

Feliciano Pereira: “o poder emana do povo para o povo”. (Jornal, O

Paraná, 08/12/2010)

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TEXTO 2

Avaliação mostra o que o Brasil faz com Educação: PISA

Claudio Carneiro

Pelo atual desempenho de nossos jovens, teremos, no futuro, uma

geração não muito brilhante de executivos, professores, pesquisadores ou

profissionais liberais.

Muito simbólico que o Alagoas dos Collor e o Maranhão dos Sarney

tenham ficado nas últimas posições do ranking brasileiro do Programa

Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa). Famílias ricas se elegem e se

reelegem às custas de estados cada vez mais miseráveis e ignorantes. E o

Brasil vai perdendo gerações inteiras, com fraquíssimo desempenho

escolar.

O país alcançou a 53ª posição (401 pontos) entre os 64 países

avaliados, atrás de Chile (439), México (420), Trinidad e Tobago (414) e

Montenegro (404) mas à frente do Azerbaijão (389) e Quirguistão (325) – o

lanterninha da lista. Os estudantes chineses de Xangai (com 577 pontos)

conquistaram o campeonato do Pisa e a Finlândia (543) ficou em segundo.

O Pisa - coordenado pela Organização para Cooperação e

Desenvolvimento Econômico (OCDE) - comparou o desempenho de

nossos jovens na faixa de 15 anos para produzir indicadores sobre a

efetividade de nossos sistemas educacionais e deve ter concluído que as

milionárias famílias nordestinas não fizeram seu dever de casa ao longo de

tantos anos no comando do Executivo em seus estados. Ao demonstrarem

sua incapacidade para refletir e analisar, nossos jovens dão os sinais de

que não serão capazes de enfrentar os desafios do futuro, não somente no

aspecto intelectual, visto que este será um grave problema econômico.

Para o professor e pesquisador da Escola Nacional de Ciências

Estatísticas (ENCE), do IBGE, José Eustáquio Diniz Alves, o Brasil terá

uma janela de oportunidades entre os próximos dez e vinte anos – criada

pela demografia para o desenvolvimento econômico. Em outras palavras,

isso quer dizer o seguinte: findo esse prazo, nossa população vai parar de

crescer e, por conseguinte, nossa boa e farta mão de obra começará a

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envelhecer vertiginosamente. Pelo atual desempenho de nossos jovens,

teremos, no futuro, uma geração não muito brilhante de executivos,

professores, pesquisadores ou profissionais liberais. Nossa

competitividade irá para o ralo e seremos obrigados a importar executivos

que virão aqui para gerir e mandar.

Números são para Manipular

Outra preocupação é que essa cada vez menor massa de

trabalhadores sustentará um número cada vez maior de aposentados. É

conta que não fecha e que os constantes adiamentos de reforma de

Previdência que FHC e Lula empurraram com suas barrigas sobre as

pernas de Dona Dilma.

Num bem-humorado comercial de TV da Topper - de belíssimo

texto - comentam-se os pífios números estatísticos do desempenho do

Brasil no rugby e manipulam-se os dados sempre a nosso favor. Tão logo

saíram os dados do PISA, o ministro Fernando Haddad – aquele das

trapalhadas do Enem e que parece sempre cair de paraquedas nas

situações de crise – apressou-se em manipular nossos péssimos números

para destacar a melhoria da qualidade do ensino e afirmar que estamos no

caminho certo para recuperar o atraso e o descaso de mais de meio

século. O ministro falou em avanço dos investimentos para atingir 469

pontos no PISA 2021(!) e disse que a pontuação neste ranking foi muito

melhor que a anterior. Sempre haverá números para apontar avanços, mas

faltarão palavras para explicar porque estamos atrás da Bulgária, Romênia

e Montenegro.

No Programa “A Voz do Brasil”, a serviço do Governo - e agora,

cada vez mais, escravo do PT - Haddad comemorava o resultado do PISA

como um “gritante avanço”. Nascido em 1963, ele deve ter estudado em

escola particular ou era ainda muito criança para perceber que - até o início

dos anos 1970 – as escolas públicas brasileiras proviam ensino de

qualidade - do jardim de infância à faculdade. A coisa degringolou com a

organização e o ganho de força das escolas particulares como instituição,

isso graças, é claro, ao descaso do governo com a educação. Muito

parecido, aliás, com a decadência de nossos serviços médicos e gratuitos

e, este sim, “gritante avanço” dos planos de saúde.

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No Brasil, o PISA é coordenado pelo Instituto Nacional de Estudos

e Pesquisas Educacionais “Anísio Teixeira” (INEP), também responsável

pela aplicação do Enem. Instituto, aliás, que boa parte do país e quase a

unanimidade dos estudantes percebe como “inepto”. Não deverá ir muito

longe com essa sigla. Site Opinião e Notícia, 14/12/2010.

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TEXTO 3

Mais uma vez, pontuamos mal em matemática

Jacir J. Venturi

O Brasil obteve a 53ª colocação em Matemática entre os 65 países

pesquisados na avaliação aplicada em 2009 pelo Pisa, programa

subordinado à ONU e cujos resultados foram divulgados nesta semana.

Naturalmente, não se pode debitar ao acaso o fato de os países que

apresentaram elevado grau de desenvolvimento nas últimas décadas

estarem no rol dos mais bem classificados no ranking: 1º China (Shangai);

2º Hong Kong; 3º Finlândia; 4º Singapura; 5º Coréia do Sul; 6º Japão; 7º

Canadá; 8º Nova Zelândia; 9º Taiwan; 10º Austrália.

A Coréia do Sul nos anos 79 resignava-se com indicadores econômicos

e educacionais até um pouco piores que os nossos. Trabalho persistente,

cultura de valorização e elevados investimentos na educação fizeram

daquele tigre asiático uma das mais bem-sucedidas nações emergentes.

Hoje cerca de 40% dos jovens sul-coreanos, entre os 18 e 24 anos, estão

nas universidades. Aqui, apenas 12%. Se no Brasil a ênfase são as

ciências humanas, lá são as pesquisas e o ensino em ciências exatas.

Lamenta - se, o posicionamento do Brasil de um lado, mas comemora-

se de outro pois está entre os três países que mais evoluíram desde 2000,

quando participamos pela primeira vez, saltando de 334 pontos para 368

3m 2009, quando a China fez 600 pontos. Sem dúvida, ir bem ou mal em

testes internacionais de Matemática tem elevado significado, pois nas

oportunas palavras do pensador francês Jacques Chapellon, “existe

paralelismo fiel entre o progresso e a atividade matemática; os países

socialmente atrasados são aqueles em que a atividade matemática é nula

ou quase nula”.

Inegavelmente, foram os antigos gregos que fizeram soar o gongo da

nossa civilização porque dedicavam-se à Matemática como um desafio

intelectual ou pelo simples prazer de pensar. Para eles, a Matemática

exerce o nobilíssimo papel de serva e, ao mesmo tempo, rainha.

Como é uma atividade solitária, o aluno brasileiro não é atraído, pois

culturalmente é pouco valorizada, quando não é motivo de pilhérias ou

bullying. “Não menospreze os nerds da sua escola. Você ainda irá

trabalhar com um deles” – aconselha Bill Gates, que juntamente com Steve

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Jobs (da Apple) foram proeminentes nas disciplinas de ciências exatas.

Temos uma geração que tem preguiça de pensar. Entretanto, nunca se

valorizou tanto a pessoa ou profissional com boa capacidade de raciocínio,

enfim, o resolvedor de problemas. Hoje o jovem aprende rápido e esquece

rápido, não mergulha fundo e, assim, o aprendizado é fugaz ou fruto de um

clique. Este é um enorme desafio para pais e educadores. É uma luta

permanente competir com as seduções do mundo digital: site de

relacionamentos, games, Internet, celulares etc. ademais, o excesso de

contextualização e superficialidade que permeia asa questões de

Matemática nas apostilas, livros, provas, vestibulares, no ENEM,

compromete o desenvolvimento do raciocínio. O maior legado da

Matemática é o incremento da têmpera racional da mente. Mesmo

profissionais que aparentemente passam ao largo dos algarismos, como os

advogados – embora sejam ótimos no cálculo dos honorários – é preciso

lembrar que uma boa demanda jurídica tem por fulcro um excelente

encadeamento lógico.

Em síntese, só se desenvolve o pensamento lógico com o cérebro e

com as nádegas. Sim - blague à parte – é preciso organização pessoal,

disciplina, uma mesa, uma cadeira, um ambiente de silêncio e a disposição

para o aperfeiçoamento.

Um texto ou exercício mais complexo é um desafio e faz bem aos

neurônios. Há muito mais sinapses em 10 minutos dedicados a um

problema difícil, mesmo não resolvido, do que na solução de três outros

exercícios bastante acessíveis.

Certamente, raciocinar exige esforço. “Pensar dói” – declamava Brecht.

Quando o rei Ptolomeu folheava os pergaminhos e Os Elementos,

recheados de axiomas, teoremas e postulados, perguntou

esperançosamente a Euclides:

-- Não existe uma forma mais fácil de prender essas demonstrações?

-- Não, majestade, não há estrada real para a Geometria – teria

respondido o autor.