¹Professora de Língua Portuguesa da rede Pública do Estado do Paraná, participante do Programa de
Desenvolvimento Educacional – PDE – 2010.
²Doutora em Letras e professora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras da
Unioeste.
ARTIGO DE OPINIÃO: ESPAÇO DE INSERÇÃO DO PRODUTOR DO TEXTO
Claudia Luiza Perin Turatto¹
Orientadora: Profª. Drª. Aparecida Feola Sella²
Resumo
O presente trabalho pautou-se na análise de artigos de opinião, publicados em
jornais impressos, com o intuito de levar o aluno a perceber marcas linguísticas que
orientam a leitura, especificamente com relação à posição do produtor do texto. A
partir da leitura dos artigos selecionados, foi realizada sondagem dos elementos que
indicam formas de repassar o conteúdo informacional, formas de engajamento do
produtor do enunciado. Para isso, enfocaram-se elementos que orientam processos
de modalização nos níveis epistêmico e deôntico, a serem percebidos por alunos do
2º ano do Ensino Médio. Para tanto, embasaram a pesquisa Koch (2002), Castilho e
Castilho (1996), no que se refere à modalização linguística; quanto ao gêneros
textuais, Bakhtin (1992) serviu de orientação teórica. Constatou-se que o trabalho
com a mídia impressa aproximou os alunos de textos do tipo argumentativo, e que a
interpretação a partir dos modalizadores contribuiu para a construção de um
posicionamento menos ingênuo diante da opinião dos outros e da construção da
própria opinião sobre questões socialmente relevantes.
Palavras-chave: artigo de opinião; argumentação, modalização.
1 Introdução
O ensino de língua portuguesa, por meio da prática da leitura de textos que
expressam opiniões, pode contribuir para o desenvolvimento de leitores críticos, pois
propicia a sondagem não somente do dizer mas do modo de dizer. O
empreendimento do modo de dizer gera possibilidades de leitura, entre as quais está
a percepção das intenções do produtor do texto. Neste último caso, é de supor que o
leitor que sonda as intenções, avalia fatos socialmente relevantes em termos de
manipulação da linguagem.
Por isso, deve-se considerar que, para ler um texto, é preciso ir além da
decodificação das palavras, é preciso buscar o sentido, compreender, interpretar,
relacionar e reter o que for mais relevante. Essa prática se faz necessária para que o
aluno se sinta mais seguro para demonstrar seu ponto de vista. É imprescindível que
se tenha em mente que cada gênero textual tem uma finalidade: informar, ampliar o
conhecimento, opinar, levar à meditação ou ao entretenimento.
Compreender os diferentes gêneros textuais é um desafio que pode ser
vencido com a mediação de um professor que possibilite o contato com vários
modelos, que estimulem a leitura individual e autônoma.
Este contexto difere daquele em que a informação e o conhecimento eram
privilégio de poucos, o que é um aceno para investimento da escola quanto à
sondagem das formas de produção de um querer dizer, de um querer incutir opinião.
Para promover atividades de leitura e produção textual, é necessário procurar
aliar material disponível na escola com estratégias que sirvam para demonstrar aos
alunos as formas de modalização de textos de opinião, as quais devem ser
concebidas como uma ação dotada de intencionalidade, marcadas no âmbito do
linguístico, a ser percebidas como forma de despertar processos de leitura.
Este artigo tem como objetivo geral relatar procedimentos de análise de textos
do gênero artigo de opinião, publicados em jornais acessíveis à escola, com o intuito
de levar os alunos do 2º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Antonio de
Castro Alves, de Capitão Leônidas Marques – PR, a perceberem marcas
linguísticas que orientam a leitura da posição do produtor do texto. Como objetivos
específicos, projetaram-se os seguintes: estudar questões teóricas relacionadas a
artigo de opinião e modalização; desenvolver unidade didática que motive o aluno a
lidar com artigos de opinião; levar os alunos a reconhecerem e a recorrerem a
estruturas linguísticas que demarquem argumentação.
A presente proposta de trabalho nasceu inicialmente da necessidade de se
trabalhar com as formas de argumentação presentes em textos que circulam na
mídia impressa. Para isso, buscamos reflexão de como a leitura pode estabelecer-se
no patamar da compreensão e da interpretação. Considerando-se a delimitação
necessária para que a pesquisa fosse desenvolvida, optamos por estudar a forma
como textos de opinião são constituídos por meio de modalizadores. Entendemos
que as marcas explícitas, presentes nos textos de opinião, podem revelar tanto o
engajamento do produtor do texto quanto seu distanciamento. Inclusive a própria
ausência de marcas pode denunciar um produtor que se quer omisso ou apenas
constativo. Tais orientações estão presentes principalmente em Castilho e Castilho
(1992), autores que consideram os modalizadores elos entre o produtor e seu texto,
conforme as próprias palavras dos autores: “São formas de deixar explícita a atitude
do falante com respeito à proposição”. (CASTILHO; CASTILHO, 1992, p. 200).
Além dos autores acima citados, recorremos a outras fontes cujo
norteamento segue esse mesmo princípio, o caso de Koch (2004), que se refere a
intenções, sentimentos e atitudes do produtor do texto com relação ao seu próprio
discurso.
Com relação ao estudo desenvolvido sobre o perfil do artigo de opinião,
Bakhtin (1992) serviu para orientar o entendimento de que a modalização em artigos
de opinião sempre revela atitudes dos interlocutores, e isso revela também
características desse gênero, para além de uma noção mais ampla, pautada nos
modelos correlatos que se definem por aproximação.
Aperceber-se desse movimento basicamente argumentativo gera leitores
investigativos, desconfiados e prontos para lidar com a adesão que o produtor do
texto promove no seu próprio discurso. E se considerarmos que a argumentação
pode se inscrever de diversas formas nos vários tipos de gêneros, podemos aceitar
que em artigos de opinião ela se mostra de forma mais evidente.
Quanto ao conceito de argumentação, seguimos o que dispõe Ducrot (1987),
autor que concebe este termo como estratégia de orientação, de indicação de
conclusões a que se quer chegar por meio de encadeamentos de enunciados. Em
um enunciado do tipo (1) É bem provável que a manifestação dos operários dure
mais tempo do que o previsto, já se percebe uma forma de opinião demarcada por
certa forma de engajamento do produtor do texto. Embora esse engajamento seja
mais ameno do que (2) É certo que a manifestação dos operários dure mais tempo
do que o previsto, em que se observa a necessidade de o produtor demarcar o grau
de certeza diante da informação repassada, ainda tem-se no enunciado (1) uma
forma de manifestação mais direta do que o apresentado em (3) A manifestação dos
operários irá durar mais tempo do que o previsto.
Os exemplos acima demonstram que o produtor do texto pode selecionar
formas de engajamento com a informação repassada e isso vai depender de suas
intenções, crenças e pontos de vista. Pois bem, há vários tipos de demarcar o
engajamento e um deles é a modalização traçada mediante os objetivos do
interlocutor.
Pensemos que o conteúdo da mensagem possa ser moldado por marcas
linguísticas responsáveis por certos engajamentos e que a ausência dessas marcas
possa ser indício de certo distanciamento do produtor do texto com relação ao seu
próprio discurso. Assim, em (3) A manifestação dos operários irá durar mais tempo
do que o previsto, teríamos certo grau de certeza, mas não tão diretamente
assumido e em (4) Com certeza, a manifestação dos operários irá durar mais tempo
do que o previsto.
Ou seja, marcas como É bem provável, Provavelmente, É certo, Com
certeza, Certamente indicam a disposição do produtor do texto para modalizar a
porção informacional para o conteúdo “A manifestação dos operários irá durar mais
tempo do que o previsto”.
Neste estudo, discutiram-se formas de ensinar ao aluno do ensino médio a
lidar com a modalização: de um lado, tratamos de ensinar-lhe que todo tipo de
conteúdo informacional pode ser modalizado, e, de outro, pretendeu-se levá-lo a
aperceber-se das formas de modalização no texto do outro. Por isso, nossa intenção
de trabalhar com artigos de opinião.
As considerações de Kleiman (2004), Martins (1982) e Bakhtin (1992), por
exemplo, serviram de apoio para reflexões sobre a importância da leitura. A
referência as esses autores é feita na primeira parte, na qual são trazidas à
discussão os principais responsáveis pelo fracasso quanto à formação de leitores,
bem como as inúmeras possibilidades de leitura de diversos gêneros textuais,
ofertadas pela esfera jornalística.
Também se recorreu ao apontamento de algumas características do gênero
artigo de opinião. Essa abordagem é feita na segunda parte e recorreu-se a Brasil
(2010), Rodrigues (2001) e Corbari (2008).
Na terceira parte os modalizadores são apresentados como marcas
linguísticas responsáveis por indicar o quanto o articulista está envolvido na defesa
de seu ponto de vista. Essa discussão busca amparo em Koch (2004), Castilho e
Castilho (1992), entre outros autores.
A descrição do desenvolvimento das atividades realizadas, assim como o
resultados das análises, ocorre na quarta parte.
Para analisar a modalização linguística, selecionamos dois artigos do jornal
impresso O Paraná, com o objetivo de demonstrar ao aluno o funcionamento dos
modalizadores, mais propriamente os de teor epistêmico.
A escolha do jornal O Paraná se justifica pela grande circulação que essa
mídia impressa tem em nossa região, e, por isso, acreditarmos que a apresentação
de fatos e opiniões mais próximas do contexto dos alunos pudesse despertar
interesse e, além disso, trata-se de jornal assinado pelo Colégio Estadual Antonio de
Castro Alves, Ensino Fundamental e Médio, onde se realizou este estudo. Vimos
nisso um facilitador para a realização do nosso trabalho pedagógico.
Acreditamos que a ação de apresentar dois artigos de opinião sobre o
mesmo tema rendeu visibilidade para o trato com conceitos e exemplos,
principalmente em se tratando de modalizadores epistêmicos, cuja caracterização se
rende a gradações que vão de um baixo grau de engajamento a um grau mais alto.
Pensamos em um trabalho comparativo, pois assim os alunos poderiam perceber o
quanto a informação está a serviço da opinião e como esta opinião é apresentada de
formas diferenciadas, dependendo de fatores que regem o posicionamento de cada
interlocutor.
Optamos por utilizar o site Opinião e Notícia como forma de acrescentar
diferentes padrões de artigo de opinião, pelo fato de que este tão importante recurso
midiático deve ser reconhecido pelo aluno nesse momento de expansão de gêneros
midiáticos. Porém, essa iniciativa serviu apenas para ilustração de outras
possibilidades de se lidar com formas de argumentação, as quais devem ser
ampliadas pelo professor a depender de seus objetivos em sala de aula e da série
com a qual está trabalhando. Destacamos para os alunos que o jornal on line é um
dos principais meios de circulação de artigos de opinião do qual podem servir-se,
pois se trata de ferramenta ágil e de atualização constante, e por isso dinâmica, na
busca de informações e opiniões sobre diversos assuntos.
2 Algumas noções de leitura
A leitura caracteriza-se por ser uma atividade interativa. Isso significa dizer
que o leitor deve acionar reflexões variadas num processo que deve ser
prioritariamente ativo. Kleiman (2004, p.17) cita cinco práticas de leitura que a escola
sustenta há muito tempo e que são as principais responsáveis pelo fracasso quanto
à formação de leitores:
1) O texto como conjunto de elementos gramaticais;
2) O texto como repositório de mensagens e informações;
3) A leitura como decodificação;
4) A leitura como avaliação;
5) A integração numa concepção autoritária de leitura
Essas indicações da autora nos levam a questionar práticas e conceitos com
os quais a escola já vem operando tradicionalmente. Importa para o presente
trabalho discutir um pouco mais o tratamento da leitura como decodificação. Talvez
essa prática fique mais evidente nos exercícios de compreensão e interpretação que
se seguem imediatamente à apresentação de textos para leituras, e isso de forma
mais enfática em livros didáticos.
Importa também dizer que o trabalho de interpretação, baseado em perguntas
dirigidas, e, depois de um salto incrível, vir o trabalho de análise linguística
desconectado do processo de leitura, como se fosse apenas uma sondagem de
elementos linguísticos, leva a uma dispersão de objetivos, o que não rende um
resultado satisfatório.
Para Martins (1982), o aprendizado da leitura requer uma noção mais ampla
do que aquela que considera apenas um tipo de texto, o escrito. Para a autora,
aprender “a ler significa também aprender a ler o mundo, dar sentido a ele e a nós
próprios, o que, mal ou bem, fazemos mesmo sem ser ensinados”. O que está em
pauta, portanto, é o papel do professor mediador que precisa “criar condições para o
educando realizar a sua própria aprendizagem, conforme seus próprios interesses,
necessidades, fantasias, segundo as dúvidas e exigências que a realidade lhe
apresenta” (MARTINS, 1982, p. 34).
Na esfera jornalística, há diversos tipos de gêneros do discurso, o que nos
leva também a pensar sobre a necessidade de se lidar com esse tipo de
conhecimento. Segundo Bakhtin, o enunciado materializa condições e finalidades
que demarcam o gênero. Sendo assim, conteúdo e estilo verbal (recursos da língua
– recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais) e principalmente construção
composicional “fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado e todos eles são
marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação” (BAKHTIN, 1992, p.
279).
Para o autor, todo enunciado está vinculado à determinada “esfera de
utilização da língua”, o que indica “tipos relativamente estáveis de enunciados”. Esse
processo é denominado gêneros do discurso (BAKHTIN, 1992, p. 279). Cada gênero
textual tem uma finalidade: informar, ampliar o conhecimento, opinar, levar à
meditação ou ao entretenimento. Compreender os diferentes gêneros textuais é um
desafio que pode ser vencido com a nossa mediação, como professores que
possibilitam o contato com vários modelos, que estimulam a leitura individual e
autônoma. A nossa contribuição paira no artigo de opinião, por isso na sequência
vamos discutir mais de perto esse gênero, tão importante para a formação de
nossos alunos.
3 Artigo de opinião: perfil interativo e engajamento do produtor do texto
Sobre a autoria dos artigos de opinião, Brasil (2010), contribui com a
elaboração dessa proposta didática, afirmando que o artigo de opinião é uma
matéria autoral, já que é de responsabilidade do produtor do texto, jornalista
profissional ou não, geralmente uma autoridade no assunto que opina, discute,
comenta e avalia fatos ocorridos ou questões polêmicas. Seu autor pode ser
contínuo, eventual ou por ser reconhecido tanto pelo jornal, quanto pelos leitores
como alguém que tem uma importante contribuição para o debate, convidado pelo
jornal para se pronunciar sobre o que pensa a respeito de questões debatidas
publicamente e que interessam a muitos.
É por esse motivo que ele assina o artigo de opinião, responsabilizando-se
pelo que expõe. Juntamente com sua assinatura, devem constar informações sobre
o autor. Conforme Rodrigues (2001), os gêneros agrupados em torno da categoria
jornalismo opinativo, têm em comum a presença de uma valoração explícita quanto
aos acontecimentos (o que se colocou anteriormente como domínio discursivo que
se situa em torno do fazer-crer, efeito ideológico construído pela situação de
interação). No entanto, eles assumem feições particulares a partir da autoria e da
angulagem espacial e temporal.
O perfil dos leitores previstos de artigo de opinião geralmente coincide com o
perfil do leitor de jornais e revistas e, para Rodrigues (2001), o autor tem uma
projeção, um conhecimento “virtual” dos seus leitores, pelas enquetes
socioeconômicas feitas pelas empresas jornalísticas, que definem o “perfil” do
público leitor.
Ainda conforme Rodrigues, embora seja consenso que
o jornalista "escreve para todos os tipos de leitor, os jornais têm uma determinada concepção de destinatário. As grandes empresas jornalísticas publicam jornais diferenciados, destinados ao consumo de diferentes tipos de destinatários, normalmente estabelecendo como critério a classe socioeconômica. A projeção do interlocutor e do seu fundo aperceptivo (os seus valores, posições etc.) orienta o autor, influi naquilo que é dito e como é dito, pois todo enunciado se encontra orientado para o interlocutor. Nessa perspectiva, também se deve incluir a instituição jornalística como um leitor privilegiado, constitutivo do artigo, uma vez que a publicação do artigo passa pela leitura e aprovação prévia da instituição. (RODRIGUES, 2001, p.135).
Entendemos, assim, que o produtor do texto deve realmente ter conhecimento
dos seus leitores, pois, dessa forma, pode fazer escolhas de temas e estratégias
discursivas de acordo com seus interlocutores. No que diz respeito à forma dos
artigos de opinião, buscamos em Corbari (2008) a informação de que esse gênero
textual não apresenta uma estrutura fixa:
Com relação à forma, há uma especificidade, que é a não-delimitação da extensão do texto. Embora os artigos publicados nos jornais/revistas impressos não tenham um limite explicitamente definido, eles acabam tendo uma extensão mais ou menos delimitada, de acordo com o espaço reservado para a sua publicação na página do jornal. (CORBARI, 2008, p. 53).
Assim como a autora, acreditamos na impossibilidade de uma estrutura
estável, já que a extensão dos artigos de opinião dependerá também, da
disponibilidade de espaço previsto no meio de circulação onde são publicados.
O grau de formalidade da linguagem do artigo de opinião deve ser mantido
conforme o seu contexto de circulação e o perfil de seus leitores.
A respeito do uso da primeira pessoa do plural, Rodrigues afirma:
A presença da primeira pessoa do plural pode, em um mesmo artigo, marcar-se como um caso de plural de modéstia, inclusão ou exclusão do leitor e ainda como uma marca de um locutor dentro de um gênero intercalado. Também pode se manifestar de uma maneira mais ostensiva ou discreta no artigo. Os artigos podem usar a primeira pessoa como uma "forma de expressão", mas que "convém evitar, a todo custo, o recurso expressivo ao eu, que dá uma desagradável sensação de narcisismo. Editorialistas, articulistas e autores costumam usar o nós plural de modéstia em lugar do eu. (RODRIGUES, 2001, p.135).
De qualquer forma, é bom utilizar uma linguagem acessível a pessoas com
diferentes níveis de leitura, expor o assunto de forma direta e concisa, evitando
comentários muito informais. Entendemos que a opinião é uma resposta à
informação apresentada em outros gêneros, principalmente na notícia.
Para Corbari,
Devido às características próprias do jornal, como seu horizonte temático e a finalidade da interação proposta, observa-se que essa interação com textos anteriores é muito acentuada. Nesse sentido, para interagir de maneira plena com o produtor do texto, o leitor precisa estar inteirado dos acontecimentos que permeiam a esfera jornalística, bem como acompanhar
as discussões acerca deles, de forma a garantir que o conhecimento seja partilhado entre os participantes da interação comunicativa. (CORBARI, 2008, p. 53).
É impossível escrever sobre o que não se conhece, assim como é impossível
um leitor se pronunciar a respeito de uma questão sobre a qual ele não tem
conhecimento para fazer relações de sentido e atribuir significados. Dessa forma,
entendemos que o leitor de artigos de opinião deve buscar nas informações,
conhecimentos que lhe auxiliem interagir com o produtor do texto sobre a questão
polêmica apresentada no artigo de opinião.
3.1 Os modalizadores como característica de Artigos de Opinião
Sem as questões polêmicas, não existe o gênero artigo de opinião. Elas
geram discussões porque há diferentes pontos de vista circulando sobre os assuntos
que as envolvem. Alguns gêneros textuais apresentam a argumentação de forma
oculta e outros, como é o caso do artigo de opinião, de forma explícita.
Uma das formas de explicitar adesões, opiniões, sentimentos é recorrer aos
modalizadores. Trata-se de marcas linguísticas responsáveis por demarcar
argumentação, demarcar a posição que o produtor do texto defende sua opinião. Os
modalizadores, conforme Koch (2004), são indicadores de intenções, sentimentos e
atitudes do produtor, seja com relação ao conteúdo da mensagem, seja com relação
ao interlocutor.
Conforme Koch,
modalizar um discurso é uma estratégia que permite ao falante assumir vários posicionamentos perante o enunciado, determinando seu grau de engajamento com relação ao dito, como também determinar o grau de tensão que se estabelece entre os locutores, além de deixar pistas de intenções do locutor para seu interlocutor. (KOCH, 2004, p.86).
É o que ocorre nos exemplos como:
(1) Evidentemente, Ana foi bem na prova. (certeza)
(2) Talvez Ana precise repetir a avaliação. (dúvida)
(3) Possivelmente, Ana atingirá bons resultados. (hipótese)
(4) Obrigatoriamente, Ana deverá estudar mais para a prova de física.
(5) Terminantemente, proibida a visita ao museu.
Nos exemplos (1), (2) e (3), parte-se de convicções sobre a realidade, no
entanto, não se garante a verdade da afirmativa que é apresentada de forma
atenuada, reduzindo seu grau de comprometimento e/ou engajamento.
Já em (4) e (5), os advérbios modalizadores obrigatoriamente e
terminantemente, representam principalmente, obrigatoriedade e necessidade,
porque paira a intenção de levar o interlocutor a concordar com os argumentos do
enunciado de forma autoritária e incisiva.
Na literatura que lida com a modalização, é possível perceber a importância
dada às expressões que de um lado, marcam (a) atitude do produtor do texto em
relação ao (b) conteúdo, e de outro, com relação ao processo de imposição com
relação ao outro. Respectivamente, teremos:
(a1) Certamente, ela virá nesta madrugada.
(a2) Provavelmente, ela virá nesta madrugada.
(a3) É evidente que virá nesta madrugada.
(b1) Fique quieto.
(b2) Você deve ficar em casa.
Advérbios e expressões modalizadoras formam um conjunto de termos que
indicam os posicionamentos e intenções do produtor do texto como forma de
convencer o leitor sobre o argumento defendido. Segundo Corbari,
o artigo de opinião se apresenta como um espaço propício para o aparecimento da modalização, uma vez que se configura como um gênero explicitamente marcado como argumentativo, tendo uma das suas categorias definidoras a defesa de um ponto de vista sobre temas da atualidade. (CORBARI, 2008, p. 57).
Aprender a ler o gênero artigo de opinião na escola favorece o
desenvolvimento da prática de argumentar e estimula a busca de informações que
sustentam a opinião. Vemos nessa prática uma contribuição significativa na
formação de muitos alunos conscientes, que hoje, apesar de estarem em contato
constante com inúmeras informações veiculadas em diversos meios, ainda
apresentam dificuldades na leitura e exposição do próprio ponto de vista.
Essa exposição pode ser explorada de diversas formas. A observação atenta
dos elementos linguísticos que demarcam a posição do produtor do texto pode levar
o aluno a ler intenções, as quais estão visivelmente atreladas a marcas adverbiais
que sinalizam o grau de certeza e de engajamento do produtor do texto.
Castillho e Castilho (1992 p. 206) entendem essas marcas denominadas
modalizadores epistêmicos como uma forma de expressar avaliação sobre a
informação repassada, de veicular modalidade epistêmica com teor ora
asseverativos, quase-asseverativos e delimitadores. Os primeiros indicam certa
consideração com relação ao conteúdo da informação repassada (os autores usam
o termo conteúdo proposicional, relativo a uma dada afirmação ou negação) que não
dá margem a dúvidas, constituindo-se uma necessidade epistêmica. Um exemplo
seria Com certeza, o remédio foi entregue nessa semana. Neste caso, não fica
dúvida com relação ao que se afirma e se expressa o grau de comprometimento do
produtor do texto.
Castilho e Castilho (1992) explicam que os quase-asseverativos indicam que
o falante considera o conteúdo da informação próximo à verdade. Não se trata de
uma certa exatidão, como ocorre no enunciado acima, pois o que se informa paira
no patamar da hipótese, dependente, portanto, de confirmação. Num enunciado
como É provável que a Maria chegue hoje, não há um comprometimento explícito
com a verdade ou exatidão da informação. Trata-se de um dispositivo para demarcar
o distanciamento do produtor do enunciado e isso o exime de certas obrigações com
relação às consequências do que é dito.
Os delimitadores, conforme Castilho e Castilho (1992), assinalam que uma
dada tese é absolutamente verdadeira ou falsa, ou seja, são expressões que têm
poder de realizar uma ação com um enunciado linguístico maior que os
asseverativos e os quase-asseverativos, pois se estabelece uma negociação entre
os interlocutores para que haja a manutenção da afirmativa. São exemplos de
delimitadores: quase, um tipo de, uma espécie de, em princípio, geograficamente,
biologicamente, basicamente e praticamente.
Conforme Neves (1996, p.187), a modalidade deôntica se situa no domínio do
dever (obrigação e permissão) e se liga à volição e à ordem. Obrigação e permissão
podem corresponder, pois, a atos diretivos da fala, ligando-se ao imperativo, que é
característico de interações espontâneas, nas quais se pode esperar que um
interlocutor leve outro a fazer algo. Nos exemplos: Obrigatoriamente você deverá
estudar mais para a prova de física, e, Terminantemente proibida a visita ao museu,
observamos o controle expresso claramente pelo falante.
Corbari (2008), ao analisar as expressões formadas por “e+adjetivo”,
comenta que o engajamento do interlocutor pode ser maximizado à medida que o
produtor do texto toma o fato exposto como certo, corriqueiro e, portanto, de
conhecimento da comunidade linguística à qual se destina o texto. A autora observa
que a seguinte escala que vai do maior ao menor grau de certeza, perceptível nas
expressões é sempre difícil, é impossível, é praticamente, impossível revelam
intenções postas como reflexos da decisão de aproximar o ponto de vista da
informação repassada. No outro pólo estão marcas de atenuam esse engajamentos,
tais como é provável, é possível, eu acho, reveladores de um certo distanciamento
com o teor de verdade ou de exatidão com relação ao que é expressado na
informação.
Assim, a modalização permite explicitar as posições do falante na construção
de seu enunciado de forma a revelar um maior ou menor comprometimento em
relação ao conteúdo do que enuncia.
4 Elaboração e aplicação do material didático
O Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) foi claro sobre a
necessidade de se organizar um material didático enquanto estratégia e metodologia
que servisse aos propósitos do projeto de intervenção pedagógica. Deveria ser
levada em conta a viabilidade da implementação, bem como a execução das
atividades propostas, os meios para sua operacionalização, os recursos necessários
para sua produção, o período de execuções propostas e principalmente,
corresponder com clareza ao público a que se destinava, de modo a auxiliar na
compreensão da realidade objetiva e contribuir para sua formação.
Optou-se pelo instrumento pedagógico Unidade Didática em que as
atividades disponibilizadas foram relacionadas aos estudos dos advérbios
modalizadores, com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento da capacidade
dos alunos em perceber o quanto os produtores de artigos de opinião estão
envolvidos com a exposição de suas opiniões.
Para a elaboração da Unidade Didática foi selecionado um corpus de 03
textos, sendo 02 artigos de opinião retirados do jornal impresso e 01 artigo de
opinião do site Opinião e Notícia (em anexo). Para fins de complementação das
atividades, trabalhou-se em sala com uma notícia do jornal O Paraná.
Além de se proporcionar o estudo dos elementos constitutivos dos textos
acima citados, por meio de atividades orais e escritas, individuais e em grupos,
debates e pesquisas, o contato constante com os jornais impressos disponibilizados
na escola motivou o acesso a vários gêneros textuais presentes neste importante
veículo de comunicação.
Essa ação deu início à aplicação do projeto de implementação em outubro de
2011 e serviu para implementar não somente a análise dos gêneros disponibilizados
quanto a sua estrutura e linguagem, mas também quanto à apresentação da página,
aspectos gerais de produção, autoria e importância para a sociedade.
O trabalho específico sobre artigo de opinião partiu da definição do que é um
artigo de opinião, quais seus contextos de circulação e perfil de seus leitores. Para
analisar suas características estruturais, utilizou-se o artigo de opinião “O Triste
Descrédito da Justiça”, adaptado para que se analisasse a modalização presente
em cada parágrafo apresentado.
Os modalizadores adverbiais foram destacados no texto e contribuíram para
que os alunos entendessem que se trata de formas de imposição do produtor do
texto diante do conteúdo, de marcar seu ponto de vista. Assim, tem-se a garantia da
decisão de compartilhar explicitamente suas intenções.
Após o primeiro contato dos alunos com os modalizadores adverbiais,
tencionamos intensificar mais os estudos e, para isso, retomamos o estudo
tradicional dos advérbios, com o objetivo de demonstrar que são expressões
modificadoras que denotam circunstâncias de lugar, tempo, intensidade, condição
etc.
Apresentamos aos alunos uma tabela com as principais circunstâncias
expressas por advérbios e locuções adverbiais, explicando-lhes que
tradicionalmente, os advérbios são assim apresentados, mas que a partir disso,
iríamos focalizar o uso dos advérbios na argumentação, considerando-se a
modalização.
Além disso, disponibilizamos e analisamos um quadro adaptado onde
constavam elementos articuladores, que são expressões que podem servir para
demarcar as orientações argumentativas, Brasil (2010). Tais elementos são usados
para tomar posição, indicar certeza, probabilidade, causa e/ou consequência e
restrição, acrescentar e organizar argumentos e preparar a conclusão. Entendemos
que ensinar os alunos a lidar com esses mecanismos linguísticos rende um
processo interessante de reflexão sobre como as intenções podem ser medidas no
plano linguístico.
À medida que os alunos foram entendendo que modalização é a maneira com
que o autor de um texto expõe seu ponto de vista, quais suas intenções e de que
maneira se posiciona em seu discurso, percebeu-se certo interesse com relação ao
funcionamento dessa estratégia de imposição do produtor de texto.
Frases como A educação vai transformar o país e A educação, certamente,
vai transformar o país, foram analisadas para que os alunos observassem a função
que o termo certamente pode assumir: revela a forma como o produtor do texto
concebe a informação que está sendo repassada e que diferentemente da anterior,
há uma informação a mais, que tributa o sentido de aquele que enuncia também se
revela detentor de um grau de certeza sobre o teor da informação.
A definição de modalizadores epistêmicos e deônticos foi repassada na
sequência e fez-se necessária a utilização de mais exemplos para que não
restassem dúvidas por parte dos alunos com relação à importância do estudo dos
modalizadores e a relação entre eles e o artigo de opinião.
O trabalho teve continuidade com a verificação da linguagem que
basicamente caracteriza o artigo de opinião, análise da estratégia argumentativa e
questão polêmica.
O segundo texto utilizado foi “Brasil fica entre piores em ranking, apesar
de melhorar a sua média”. Esta escolha se deu porque acreditamos que além de
reconhecermos características do artigo de opinião, precisamos entender que a
informação, que é um texto de caráter expositivo, não desaparece do texto de
opinião. Ao contrário, ela é até indispensável: a opinião é sempre sobre um assunto
ou sobre um acontecimento, ou seja, a informação serve a opinião. Além disso, o
aluno precisa saber diferenciar uma notícia de um artigo de opinião, perceber a
função de cada um desses gêneros, observando também a linguagem e o
posicionamento dos autores dos textos.
Após a leitura, instigamos os alunos a falar sobre a notícia:
- Qual é a finalidade específica deste texto?
- Qual é o assunto apresentado?
- Podemos considerar que o autor forneceu informações suficientes para que
se possa identificar: O quê? Quem? Quando? Como? Por quê?
- Podemos afirmar que as informações expostas no primeiro parágrafo têm as
mesmas funções que as apresentadas nos parágrafos seguintes? Sim ou não? Por
quê?
- O autor da notícia manifesta sua opinião sobre os resultados do PISA ou
apenas relata os fatos?
- É possível identificar modalizadores adverbiais nesta notícia?
- Esses advérbios revelam a inclusão de argumentação do produtor do texto?
- A supressão desses modalizadores alteraria o sentido da notícia?
A partir disso, procedemos a análises de artigos de opinião com objetivo de
sondar como os modalizadores epistêmicos demarcam a posição do produtor do
texto. Os textos selecionados apresentaram a mesma temática que a notícia
estudada anteriormente para que se verificasse o quanto a opinião depende da
informação.
O artigo de opinião Avaliação mostra o que o Brasil faz com Educação:
PISA, é um texto on line e com isso, a confirmação de que este gênero textual não
está disponibilizado somente na mídia impressa, mas também em revistas e internet.
Após uma leitura dinâmica, os alunos foram questionados sobre o que segue:
- O título dá alguma dica sobre o assunto abordado?
- O que conhecem sobre esse assunto?
- Onde leram a respeito?
- Qual é a sua relevância?
- Que posição o autor provavelmente defenderá em seu artigo?
Durante a leitura silenciosa os alunos deveriam observar de que forma o
articulista organizou seus argumentos, para, em seguida, responder ao que segue:
- Identifique qual é a questão polêmica que deu origem a este artigo de
opinião.
- Que fatos conduziram o autor a escrevê-lo?
- Que tese o artigo de opinião defende?
- Os argumentos apresentados são convincentes? Que dados, exemplos ou
citações o produtor do texto utiliza e com que intenção?
- Que argumentos o autor utiliza para fortificar seu ponto de vista? De que
forma são apresentados e desenvolvidos?
- Volte ao quadro dos Elementos Articuladores e identifique se há ocorrência
de tais elementos neste artigo de opinião.
Na sequência, reapresentamos o texto: Avaliação mostra o que o Brasil faz
com educação: PISA, modalizado. Esta ação rendeu uma análise interessante, pois
os alunos perceberam que o texto ficou diferente depois da carga de modalização
inserida na versão apresentada anteriormente. Além disso, serviu de exemplo para
que os alunos modalizassem o texto que foi apresentado a seguir.
O artigo de opinião: Mais uma vez, pontuamos mal em matemática, assim
como o anterior, foi bem aceito pelos alunos por apresentar uma temática que
conhecem bem: educação.
Por meio deste texto, foi analisada a estrutura, linguagem, questão polêmica,
estratégia argumentativa e, principalmente, a modalização feita pelos alunos.
Temos a compreensão de que a análise de cada texto poderia ser melhor
aprofundada e exemplificada, mas devido ao tempo limitado, iniciamos a preparação
para a produção do artigo de opinião realizada pelos alunos.
Como optamos pelo tema “educação”, realizou-se a pesquisa da temática e
cada grupo de alunos ficou responsável por um subtema sobre o qual realizaram
exposição oral para os demais alunos. Vemos nesta atividade uma oportunidade de
estabelecer contato com várias informações sobre a temática proposta para a partir
daí, a formulação da opinião própria de cada aluno envolvido.
Uma vez que o estudo apontou para os modalizadores adverbiais, ficamos na
expectativa de que os alunos interiorizassem esses conhecimentos na produção
textual.
Realizada a produção do artigo de opinião, a tomamos como base para a
análise que revelasse se os alunos conseguiram, de fato, atender as exigências de
produção desse gênero textual e se fizeram uso dos modalizadores adverbiais.
Dessa forma, procuramos descrever, na sequência, um diagnóstico desses
textos, destacando os aspectos que consideramos mais importantes como resultado
desse estudo:
4.1 Quanto ao gênero artigo de opinião
Os alunos atenderam a proposta de produção de artigo de opinião, com
respeito às características do gênero textual apresentado. Isto é, a partir da questão
polêmica, organizaram os argumentos para a defesa de seu ponto de vista. Alguns
alunos, em alguns momentos, demonstraram maior dificuldade em lidar com a
linguagem objetiva, pois fizeram uso de uma linguagem muito próxima da oralidade,
porém, ao serem levados a observar isso, reescreveram trechos e reorganizaram o
texto no sentido de eliminar também repetições de ideias. Dessa forma, garantiram,
mesmo que razoavelmente, a linguagem que o gênero artigo de opinião requer. Em
relação à temática, podemos afirmar categoricamente que foram coerentes, já que
não houve fuga do tema em questão e apresentaram o conteúdo com sequenciação
lógica. Entendemos que o formato do gênero tenha sido garantido em todas as
situações de escrita dos alunos.
4.2 Quanto ao uso dos modalizadores adverbiais
Nos textos analisados, os modalizadores adverbiais apresentados foram
exclusivamente epistêmicos. A partir disso, fomos levados a perceber que os alunos
expressaram suas opiniões por meio de argumentos que consideram verdadeiros,
porém menos incisivos que os modalizadores adverbiais deônticos. Essa escolha
preferencial pelos modalizadores epistêmicos também demonstra a intenção de
levar o leitor a aceitar sua opinião como certa, de certeza em relação ao que
expõem.
Consideramos satisfatório o número de modalizadores utilizados pelos
alunos. Para isso, julgamos as condições de produção não tão favoráveis, já que
foram determinadas pela escassez de tempo.
5 Considerações Finais
O propósito inicial deste trabalho consistia no estudo dos modalizadores
adverbiais no sentido de promover atividades que possibilitassem ao aluno perceber
essas marcas linguísticas que indicam o posicionamento do produtor do texto do
gênero artigos de opinião.
A nossa experiência ensina que o professor deve pensar com muita
antecedência no gênero textual que irá utilizar e explorar ao máximo as
possibilidades de reconhecimento das características desse gênero. Em se tratando
da nossa pesquisa, acreditamos que a leitura de textos que expressam opiniões,
pode contribuir para o desenvolvimento de leitores críticos, pois propicia a sondagem
não somente do dizer, mas do modo de dizer. O empreendimento do modo de dizer
gera possibilidades de leitura, entre as quais está a percepção das intenções do
produtor do texto.
Por meio da mídia impressa disponível na escola, possibilitamos aos alunos
contato com artigos de opinião em que analisaram os diferentes pontos de vista e a
capacidade dos autores em defender suas ideias. A partir disso, iniciamos a
mostragem dos processos de modalização presentes nos artigos de opinião
previamente selecionados e analisados. Com esta atividade, pretendeu-se levar o
aluno a verificar como a modalização revela posições assumidas pelo produtor do
texto, para posteriormente, ser capaz de avaliar textos em termos de marcas de
engajamento.
A leitura conduzida gerou a curiosidade dos alunos na sondagem de como os
advérbios geram encaminhamentos com relação às informações explícitas ou
mesmo implícitas. Assim, a modalização se tornou um dos focos da leitura pois se
trata de uma forma de pista que revela o posicionamento do autor do texto.
Como acreditamos que o contato com opiniões diferentes, proporcionado por
leituras reflexivas e críticas, contribui para a formação de opiniões, criamos espaço
para a produção de textos, em que o aluno teve a oportunidade de fazer uso dos
modalizadores estudados e analisados nos textos de outros autores.
Entendemos que modalização é um recurso de grande importância na
produção textual, por isso nos empenhamos em ensinar aos alunos a importância de
se utilizar este recurso para a formulação de uma boa argumentação.
Acreditamos que as atividades propostas poderiam ser estudadas mais a
fundo, porém, mesmo dentro das limitações estipuladas pelo tempo, percebeu-se
que os alunos identificaram aspectos de artigos de opinião e recursos linguísticos
que asseguram o posicionamento do articulista, além de promover a interlocução
com seus leitores.
Tais reflexões nos auxiliaram no esforço para promover o amadurecimento
dos alunos em relação à habilidade de lidar com o reconhecimento das intenções,
seja como leitores ou produtores de textos do tipo argumentativo.
Não temos a intenção de esgotar a discussão, de considerar encerrado o
estudo da modalização presente em textos. Pelo contrário, consideramos um estudo
aberto a críticas, complementações e revisões, na intenção de acrescentar ao
trabalho de leitura condições para que o aluno assuma o papel de leitor investigativo
e consciente.
Referências
ABAURRE, Maria Luiza. Português: Contexto, Interlocução e Sentido - Volume 1. Ensino Médio. Maria Luiza Abaurre, Marcela Nogueira Pontara, Tatiana Fadel. São Paulo: Moderna, 2010.
BAKHTIN, M. (Volochinov). Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007.
BOMFIM, Eneida. Advérbios. São Paulo: Ática, 1988.
BRASIL. Pontos de Vista. Caderno do professor: orientação para produção de textos. Coleção da Olimpíada de Língua Portuguesa: Escrevendo o Futuro. São Paulo. Cenpec, 2010.
CARNEIRO, Claudio. Avaliação mostra o que o Brasil faz com a educação: PISA. Disponível em: www.opiniaoenoticia.com.br. Acesso em 05/06/2011.
CASTILHO, Ataliba; CASTILHO, Célia. Considerações sobre a posição dos advérbios. In: ILARI, Rodolfo. (Org.) Gramática do português falado. Campinas: Ed. Unicamp/Fapesp, 1996, v. 1.
CORBARI, Alcione T. Um estudo sobre os processos de modalização estabelecidos pelo par “é + adjetivo” em artigo de opinião publicados no jornal observatório da imprensa. Cascavel, 2008. Dissertação de mestrado em Funcionamento dos Mecanismos Linguísticos
DUCROT, O. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.
KLEIMAN, Angela. Oficina de leitura. Campinas: Pontes, 2004.
KOCH, Ingedore Villaça. Argumentação e linguagem. São Paulo: Cortez, 2004.
______. Aspectos da interação em língua portuguesa. São Paulo, 1981. (Tese de doutorado)
MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Cortez, 1982.
NEVES, M.H.M. A modalidade: In: KOCH, Ingedore Villaça (Org).Gramática do português falado. v.6. São Paulo: Unicamp/FAPESP, 1996. p 163-195.
RODRIGUES, Rosângela Hammes. A constituição e o funcionamento do gênero jornalístico artigo: cronotopo e dialogismo. São Paulo, 2001. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Disponível em: http://www.pucsp.br/pos/lael/lael-inf/def_teses.html. Acesso em 10/06/2011.
VENTURI, Jacir J. Mais uma vez, pontuamos mal em matemática. Cascavel: Jornal O Paraná, 08/12/2010.
ZIMMERMAN, Walter. O triste descrédito da Justiça. Cascavel: Jornal O Paraná, 08/12/2011.
ANEXOS
TEXTOS SELECIONADOS PARA A COMPOSIÇÃO DO CORPUS
TEXTO 1
O TRISTE DESCRÉDITO DA JUSTIÇA
Walter Zimermann
Ao ler no jornal a informação de que a maioria do povo brasileiro não
acredita na Justiça do país, não vi nenhuma surpresa. Afinal,
conversamos todos os dias com inúmeras pessoas e, quando o tema
versa sobre a situação de descrédito no qual nossas instituições
públicas estão mergulhadas, a opinião da maioria é de desânimo,
principalmente em relação à impunidade.
Imaginem que entre 2.770 pessoas ouvidas em todos os Estados e
Distrito Federal, numa escala de zero a dez, a nota obtida em favor
da Justiça chegou a magros 4,55%. E pior: no quesito rapidez para
decisão dos casos, míseros 1,18% concordaram com o trabalho de
nossos operadores da Justiça. Mais ainda: no item honestidade, ela
contou com tão somente 1,7% dos entrevistados.
Foi-se o tempo em que os cidadãos, pelo menos os mais simples,
tinham respeito até pelo inspetor de quarteirão, pelo delegado de
polícia, mesmo que fosse um “calça curta” qualquer. Policial fardado,
vereador, prefeito, deputado ou senador era tudo “gente fina”. Na
frente do governador tremia-se de emoção e tinha gente capaz de
desmaiar vendo de perto o presidente. Do Lula, ainda hoje.
A coisa foi, aos poucos, se degringolando. Por culpa, senão de todos,
mas de uma esmagadora maioria, da corrupção que corrói nossas
instituições já há algum tempo. Não apenas os responsáveis pelos
Poderes Executivo e Legislativo foram caindo no descrédito da
população carente de trabalho sério. A corrupção e a falta de caráter
se infiltraram até em nossas Forças Armadas. E, pior ainda, em
nossa Justiça. A começar por certos advogados, passando por
escrivães e outros servidores, chegando até a juízes e promotores.
Talvez por falta de investimentos por parte do governo, chegou-se a
um tal anacronismo e a uma flagrante desídia e desapego às
obrigações de nossos homens da lei. Criminosos comuns ou
bandidos de toda espécie são capazes de fazer inveja à classe
política, que se tornou, de todas, a menos confiável, e apostou na
impunidade como sua grande proteção.
Sobre a classe política, li, bem recentemente, a seguinte declaração
do analista judiciário do TRT, 17ª Região: “a arte de lidar com o poder
deve ser usada em favor de quem lhe deu tal prerrogativa. O ato do
político que ocupa cargo estatal só é legítimo se atende tal requisito”.
Fácil de ser traduzido, não? Basta a clássica frase de Mazenildo
Feliciano Pereira: “o poder emana do povo para o povo”. (Jornal, O
Paraná, 08/12/2010)
TEXTO 2
Avaliação mostra o que o Brasil faz com Educação: PISA
Claudio Carneiro
Pelo atual desempenho de nossos jovens, teremos, no futuro, uma
geração não muito brilhante de executivos, professores, pesquisadores ou
profissionais liberais.
Muito simbólico que o Alagoas dos Collor e o Maranhão dos Sarney
tenham ficado nas últimas posições do ranking brasileiro do Programa
Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa). Famílias ricas se elegem e se
reelegem às custas de estados cada vez mais miseráveis e ignorantes. E o
Brasil vai perdendo gerações inteiras, com fraquíssimo desempenho
escolar.
O país alcançou a 53ª posição (401 pontos) entre os 64 países
avaliados, atrás de Chile (439), México (420), Trinidad e Tobago (414) e
Montenegro (404) mas à frente do Azerbaijão (389) e Quirguistão (325) – o
lanterninha da lista. Os estudantes chineses de Xangai (com 577 pontos)
conquistaram o campeonato do Pisa e a Finlândia (543) ficou em segundo.
O Pisa - coordenado pela Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) - comparou o desempenho de
nossos jovens na faixa de 15 anos para produzir indicadores sobre a
efetividade de nossos sistemas educacionais e deve ter concluído que as
milionárias famílias nordestinas não fizeram seu dever de casa ao longo de
tantos anos no comando do Executivo em seus estados. Ao demonstrarem
sua incapacidade para refletir e analisar, nossos jovens dão os sinais de
que não serão capazes de enfrentar os desafios do futuro, não somente no
aspecto intelectual, visto que este será um grave problema econômico.
Para o professor e pesquisador da Escola Nacional de Ciências
Estatísticas (ENCE), do IBGE, José Eustáquio Diniz Alves, o Brasil terá
uma janela de oportunidades entre os próximos dez e vinte anos – criada
pela demografia para o desenvolvimento econômico. Em outras palavras,
isso quer dizer o seguinte: findo esse prazo, nossa população vai parar de
crescer e, por conseguinte, nossa boa e farta mão de obra começará a
envelhecer vertiginosamente. Pelo atual desempenho de nossos jovens,
teremos, no futuro, uma geração não muito brilhante de executivos,
professores, pesquisadores ou profissionais liberais. Nossa
competitividade irá para o ralo e seremos obrigados a importar executivos
que virão aqui para gerir e mandar.
Números são para Manipular
Outra preocupação é que essa cada vez menor massa de
trabalhadores sustentará um número cada vez maior de aposentados. É
conta que não fecha e que os constantes adiamentos de reforma de
Previdência que FHC e Lula empurraram com suas barrigas sobre as
pernas de Dona Dilma.
Num bem-humorado comercial de TV da Topper - de belíssimo
texto - comentam-se os pífios números estatísticos do desempenho do
Brasil no rugby e manipulam-se os dados sempre a nosso favor. Tão logo
saíram os dados do PISA, o ministro Fernando Haddad – aquele das
trapalhadas do Enem e que parece sempre cair de paraquedas nas
situações de crise – apressou-se em manipular nossos péssimos números
para destacar a melhoria da qualidade do ensino e afirmar que estamos no
caminho certo para recuperar o atraso e o descaso de mais de meio
século. O ministro falou em avanço dos investimentos para atingir 469
pontos no PISA 2021(!) e disse que a pontuação neste ranking foi muito
melhor que a anterior. Sempre haverá números para apontar avanços, mas
faltarão palavras para explicar porque estamos atrás da Bulgária, Romênia
e Montenegro.
No Programa “A Voz do Brasil”, a serviço do Governo - e agora,
cada vez mais, escravo do PT - Haddad comemorava o resultado do PISA
como um “gritante avanço”. Nascido em 1963, ele deve ter estudado em
escola particular ou era ainda muito criança para perceber que - até o início
dos anos 1970 – as escolas públicas brasileiras proviam ensino de
qualidade - do jardim de infância à faculdade. A coisa degringolou com a
organização e o ganho de força das escolas particulares como instituição,
isso graças, é claro, ao descaso do governo com a educação. Muito
parecido, aliás, com a decadência de nossos serviços médicos e gratuitos
e, este sim, “gritante avanço” dos planos de saúde.
No Brasil, o PISA é coordenado pelo Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais “Anísio Teixeira” (INEP), também responsável
pela aplicação do Enem. Instituto, aliás, que boa parte do país e quase a
unanimidade dos estudantes percebe como “inepto”. Não deverá ir muito
longe com essa sigla. Site Opinião e Notícia, 14/12/2010.
TEXTO 3
Mais uma vez, pontuamos mal em matemática
Jacir J. Venturi
O Brasil obteve a 53ª colocação em Matemática entre os 65 países
pesquisados na avaliação aplicada em 2009 pelo Pisa, programa
subordinado à ONU e cujos resultados foram divulgados nesta semana.
Naturalmente, não se pode debitar ao acaso o fato de os países que
apresentaram elevado grau de desenvolvimento nas últimas décadas
estarem no rol dos mais bem classificados no ranking: 1º China (Shangai);
2º Hong Kong; 3º Finlândia; 4º Singapura; 5º Coréia do Sul; 6º Japão; 7º
Canadá; 8º Nova Zelândia; 9º Taiwan; 10º Austrália.
A Coréia do Sul nos anos 79 resignava-se com indicadores econômicos
e educacionais até um pouco piores que os nossos. Trabalho persistente,
cultura de valorização e elevados investimentos na educação fizeram
daquele tigre asiático uma das mais bem-sucedidas nações emergentes.
Hoje cerca de 40% dos jovens sul-coreanos, entre os 18 e 24 anos, estão
nas universidades. Aqui, apenas 12%. Se no Brasil a ênfase são as
ciências humanas, lá são as pesquisas e o ensino em ciências exatas.
Lamenta - se, o posicionamento do Brasil de um lado, mas comemora-
se de outro pois está entre os três países que mais evoluíram desde 2000,
quando participamos pela primeira vez, saltando de 334 pontos para 368
3m 2009, quando a China fez 600 pontos. Sem dúvida, ir bem ou mal em
testes internacionais de Matemática tem elevado significado, pois nas
oportunas palavras do pensador francês Jacques Chapellon, “existe
paralelismo fiel entre o progresso e a atividade matemática; os países
socialmente atrasados são aqueles em que a atividade matemática é nula
ou quase nula”.
Inegavelmente, foram os antigos gregos que fizeram soar o gongo da
nossa civilização porque dedicavam-se à Matemática como um desafio
intelectual ou pelo simples prazer de pensar. Para eles, a Matemática
exerce o nobilíssimo papel de serva e, ao mesmo tempo, rainha.
Como é uma atividade solitária, o aluno brasileiro não é atraído, pois
culturalmente é pouco valorizada, quando não é motivo de pilhérias ou
bullying. “Não menospreze os nerds da sua escola. Você ainda irá
trabalhar com um deles” – aconselha Bill Gates, que juntamente com Steve
Jobs (da Apple) foram proeminentes nas disciplinas de ciências exatas.
Temos uma geração que tem preguiça de pensar. Entretanto, nunca se
valorizou tanto a pessoa ou profissional com boa capacidade de raciocínio,
enfim, o resolvedor de problemas. Hoje o jovem aprende rápido e esquece
rápido, não mergulha fundo e, assim, o aprendizado é fugaz ou fruto de um
clique. Este é um enorme desafio para pais e educadores. É uma luta
permanente competir com as seduções do mundo digital: site de
relacionamentos, games, Internet, celulares etc. ademais, o excesso de
contextualização e superficialidade que permeia asa questões de
Matemática nas apostilas, livros, provas, vestibulares, no ENEM,
compromete o desenvolvimento do raciocínio. O maior legado da
Matemática é o incremento da têmpera racional da mente. Mesmo
profissionais que aparentemente passam ao largo dos algarismos, como os
advogados – embora sejam ótimos no cálculo dos honorários – é preciso
lembrar que uma boa demanda jurídica tem por fulcro um excelente
encadeamento lógico.
Em síntese, só se desenvolve o pensamento lógico com o cérebro e
com as nádegas. Sim - blague à parte – é preciso organização pessoal,
disciplina, uma mesa, uma cadeira, um ambiente de silêncio e a disposição
para o aperfeiçoamento.
Um texto ou exercício mais complexo é um desafio e faz bem aos
neurônios. Há muito mais sinapses em 10 minutos dedicados a um
problema difícil, mesmo não resolvido, do que na solução de três outros
exercícios bastante acessíveis.
Certamente, raciocinar exige esforço. “Pensar dói” – declamava Brecht.
Quando o rei Ptolomeu folheava os pergaminhos e Os Elementos,
recheados de axiomas, teoremas e postulados, perguntou
esperançosamente a Euclides:
-- Não existe uma forma mais fácil de prender essas demonstrações?
-- Não, majestade, não há estrada real para a Geometria – teria
respondido o autor.