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A PARTICIPAÇÃO DOS CARMELITAS NA FORMAÇÃO SOCIAL PERNAMBUCANA
Maria das Graças Souza Aires de Araújo
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A PARTICIPAÇÃO DOS CARMELITAS NA FORMAÇÃO SOCIAL PERNAMBUCANA
Maria das Graças Souza Aires de Araújo
e-mail :[email protected]
Doutoranda-UFPE
O início da expansão carmelita no Brasil ocorreu a partir da fixação dos religiosos
na vila de Olinda sede da Capitania de Pernambuco. Em fins do século XVI a Ordem Carmeli ta
fundou o seu convento e organizou estratégias de expansão e adaptação de seus membros na nova
terra conquistada pelos europeus. Nesse período, a Igreja Católi ca estava apoiando a vinda das
Ordens Religiosas para a colônia brasileira, pois tinha a intenção de alargar o seu domínio nestas
terras, e para tanto precisava do auxílio dos regulares. Nessa perspectiva, a Igreja apoiou a
fixação dos carmelitas em Pernambuco, onde rapidamente iniciaram a fundação de um templo
religioso.
De acordo com o Concílio de Trento, para os regulares obterem licença de fundar
ou instituir de novo algum mosteiro de religiosos, era necessário que primeiro fosse feita uma
vistoria no sítio em que se queria construir, e depois tomar informações a cerca das rendas e bens
que se pretendiam investir. Além disso, era importante verificar se a fundação era essencial e
proveitosa para a localidade. Para alcançar tal finalidade, os superiores eclesiásticos ouviam
geralmente a opinião dos superiores dos outros mosteiros, caso existisse algum no mesmo local,
sobre o prejuízo que a nova edificação poderia acarretar. Nessa ocasião, qualquer pessoa
interessada no assunto poderia ser consultada1.
Depois de organizada a averiguação e constatada que não haveria prejuízo
considerável, e que as rendas ou esmolas acumuladas poderiam sustentar a obra sem
prejudicar o sustento dos outros mosteiros já fundados na mesma localidade; era concedida
a dita licença, taxando-lhes o número de religiosos. De tudo, dever-se-ia fazer autos onde se
1 VIDE, Sebastião Monteiro da. Constituições do Arcebispado da Bahia. Livro IV.Título:XVIII.
São Paulo: Tipografia 2 de dezembro de Antônio Louzada, 1853.
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guardavam no cartório do Arcebispado e nos respectivos conventos2 .
Em muitas ocasiões, a própria população condenava a fixação de determinadas
ordens religiosas, como foi o caso dos agostinianos. O governador Diogo Botelho, no início do
século XVII, trouxe consigo religiosos jesuítas e da ordem de Santo Agostinho, para fixarem
residência em Pernambuco. Contudo, o povo não consentiu, alegando que o local não tinha
recursos suficientes para sustentar tantos religiosos, portanto recebendo algumas esmolas da
população e do próprio governador tiveram que retornar a Lisboa3.
A população da vila de Olinda festejou a chegada dos carmelitas, pois nessa época
a vida religiosa da colônia era muito precária. Deste modo, a sociedade começou a cobrar do
governo e da Igreja a licença necessária para a construção de um templo carmelitano na
respectiva vila. Cedendo aos pedidos dos olindenses, os religiosos iniciaram a construção de seu
convento em Olinda, a partir de 15884.
A construção do convento do Carmo de Olinda ocorreu na própria localidade que
servia de residência dos padres, junto à capela de Santo Antônio e São Gonçalo, que tinha sido
doada anteriormente pelos moradores aos religiosos carmelitas. A permissão para fundar um
templo naquele local, fora conquistada sob a condição de que as imagens de Santo Antônio e São
Gonçalo ficariam situadas no altar-mor ao lado da imagem de N.S. do Carmo.
Concomitantemente, foi acordado que Santo Antônio seria sempre o orago da casa, e que,
anualmente, os freis celebrariam uma missa cantada ao dito Santo. Por causa desse acordo, o
templo passou a ser chamado de Convento de Santo Antônio,e os seus doadores e respectivos
2 VIDE, Sebastião Monteiro da.Op.cit.Livro IV.Título:XVIII. 3 COSTA.F.A.Pereira da. Anais Pernambucanos. Vol. 2. Recife: Fundarpe. 1983. p.196 4BARATTA, Cônego José do Carmo. História Eclesiástica de PE. Recife:Imprensa Industrial.
1978.p.14
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herdeiros5 conquistaram o direito de terem sepulturas na igreja do citado templo.
O Convento de Olinda assemelhava-se estruturalmente ao de Lisboa, onde talvez
tenha sido delineada e aprovada sua planta. Sua construção foi executada por mestres pedreiros
da colônia, sob a direção dos frades carmelitas, sendo construído sob um plano de vastas e
alterosas dimensões. Do velho templo carmelitano resta, apenas, além dos arcos da parte do
claustro e da portaria, alguns vestígios dos seus antigos alicerces, a partir dos quais pode-se
determinar a extensão da grande área que ocupava. O convento já não tem atualmente a sua
feição originária devido às transformações pela qual passou no decorrer dos anos6.
O templo fora erguido com a ajuda financeira da população e dos donatários.
Normalmente as pessoas mais abastadas da sociedade, tornavam-se patronas das capelas que
ladeavam as naves das principais igrejas da vila de Olinda. No tocante às capelas laterais,
erguidas no convento carmeli tano de Olinda, temos notícia de apenas duas: a do Senhor Bom
Jesus dos Passos da Graça e da Senhora da Boa Morte7.
A primeira capela era do padroado particular do colono Antônio Fernandes
Borges, senhor do engenho Garça Torta nas Alagoas, o qual teria vindo a Pernambuco em fins do
século XVI, com sua esposa D. Isabel Peres de Almeida, sendo sepultado no dia 12 de setembro
de 1620, em sua capela do convento do Carmo de Olinda8 .
A capela da Senhora da Boa Morte foi fundada pelo Capitão Luís Pinhão
5 COSTA.F.A. Pereira da. A Ordem Carmeli tana em Pernambuco. Recife: Arquivo Público.
1976.p.91
6 MELLO,José Aylton Coelho;SANTANA, Flávio Dionísio. Berço Carmeli tano no Brasil.
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.1997.
7COSTA.F.A. Pereira da. A Ordem Carmelitana em Pernambuco. Op.cit.p.94 8 Idem,ibidem.p.94
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português, que serviu nas campanhas da Índia, e vindo para Pernambuco casou-se com D. Leonor
Peres Pessoa, filha do dito Antônio Fernandes Pessoa. Havia uma certa flexibilidade em transferir
o padroado da capela para uma outra pessoa, como aconteceu com Arnau de Holanda, que,
casado com D. Brites Mendes de Vasconcelos, assumiu o referido encargo no lugar do Capitão
Luís Pinhão de Matos9.
Normalmente para conseguir construir um templo religioso, tanto as Ordens
Regulares quanto os religiosos seculares necessitavam da ajuda financeira da população.
Comumente, os padres convidavam algum morador para ser patrono das capelas laterais de suas
igrejas, e assim ele responsabili zava-se tanto pela construção quanto pela manutenção do local.
Por isso, no Convento do Carmo de Olinda, os frades permitiram que Antônio Fernandes Borges
e o Capitão Luís Pinhão de Matos fundassem suas respectivas capelas.
Paulatinamente, a vila de Olinda vai se enobrecendo com a fixação de várias
ordens religiosas e a construção dos seus respectivos templos, como o colégio dos padres jesuítas,
a igreja dos beneditinos e a igreja dos capuchos de Santo Antônio. Por intervenção do próprio
donatário, Jorge de Albuquerque, fundaram-se os conventos dos franciscanos e beneditinos10.
A igreja do Carmo de Olinda foi muito rica em alfaias e patrimônio, tendo
recebido generosas doações em dinheiro dos próprios senhores de engenho da vila. Detentor de
grande opulência e prestígio, o referido templo ficou sendo, por muitos anos, casa matriz e berço
da Ordem no Brasil. Dali saíam os missionários para evangelizar e fundar novas missões na
capitania de Pernambuco.
Além da fundação de novos conventos, os frades carmeli tas também construíram
vários Hospícios, servindo de hospedaria para os religiosos que trabalhavam nas missões
9 COSTA.F.A.Pereira da. A Ordem Carmelitana em Pernambuco.Op.cit.p.95 10 COSTA.F.A. Pereira da. Anais Pernambucanos.Vol.I. Op.cit. p.201
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Esses templos funcionavam como locais estratégicos para os carmelitas recomporem suas
forças e prosseguirem suas jornadas. A grande importância da existência desses locais
consistia no caráter temporário dos aldeamentos carmelitas que se distinguiam das missões
jesuíticas, em que os regulares se estabeleciam nas aldeias e construíam verdadeiros núcleos
urbanos, influenciando profundamente na vida religiosa dos aborígines.
Normalmente, os missionários caminhavam até as aldeias, onde catequizavam e
instruíam os sil vícolas. É interessante observar que os próprios frades, no intuito de melhorar a
comunicação com os aborígines, começaram a aprender a língua indígena em cursos ministrados
no próprio convento do Carmo de Olinda11.
Entretanto, a partir do ano de 1630 com a invasão dos holandeses na Capitania de
Pernambuco, os religiosos do Carmo tiveram que fugir e abandonar o templo carmelitano de
Olinda, e se transferiram para o convento da Bahia, que passou a ser a casa capitular do próspero
Carmelo brasileiro. Os invasores praticavam o protestantismo e por isso depredaram vários
templos católicos chegando, inclusive, a provocar um incêndio, no ano de 1631, na vila de
Olinda. Quando fugiram, os religiosos carmeli tas enterraram algumas imagens e levaram vários
objetos, pois tinham receio de perder todo o seu patrimônio12.
A igreja do Carmo de Olinda, devido ao incêndio ocorrido em 16 de fevereiro de
1631, foi reduzida a um terço de sua estrutura. Nesse período, algumas construções católicas
foram transformadas em estrebarias, como aconteceu com a igreja de São Salvador. Ao
mesmo tempo em que os invasores depredavam os edifícios em Olinda, também começaram a
retirar material de construção dos prédios, para edificar vários casarios na vila do Recife: pois
nessa época havia uma grande preocupação do governo em reaproveitar os materiais de
11MELLO,José Aylton Coelho;SANTANA, Flávio Dionísio. Op.cit. 12 COSTA.F.A.Pereira da. A Ordem Carmelitana em Pernambuco.Op.cit.p.153.
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construção, haja vista a dificuldade de se produzir esses materiais e de encontrar pessoas
especializadas nessa categoria de produção na colônia13.
Todos os religiosos que permaneceram em Olinda e Recife foram proibidos de
celebrar missa ou quaisquer atos da cristandade. No ano de 1639, o administrador holandês que
governava Pernambuco era Maurício de Nassau, e descobrindo que os regulares franciscanos,
jesuítas e beneditinos estavam incitando a população contra os holandeses, ordenou que os
religiosos fossem recolhidos durante o período de um mês, na Ilha de Itamaracá. Foi apenas
depois do processo de expulsão dos invasores, em 1654, que ocorreu a restauração do Carmelo
Pernambucano. Gradativamente, os templos religiosos e os casarios foram sendo reconstruídos e
a comunidade portuguesa pôde comemorar o retorno dos lusitanos ao poder da Capitania.
O convento do Carmo de Olinda, depois da invasão dos holandeses, não teve mais
o poder que usufruía anteriormente, pois gradualmente estava perdendo espaço para o convento
da Bahia. Mesmo assim, ainda possuía grande influência na sociedade colonial
pernambucana, pois as famílias mais abastadas, constantemente, doavam parte de seus
bens aos irmãos carmeli tas, para que estes celebrassem missas cotidianas pelas suas almas e de
seus familiares.
Deste modo, temos o caso do Capitão Francisco Cardoso que, no ano de 1664,
concedeu o valor de sete ou oito mil cruzados em dinheiro aos religiosos carmelitas de Olinda,
para que estes realizassem missas cotidianas em favor de sua alma. Os frades investiram o
dinheiro na construção do engenho Camassari, do qual passaram a receber uma grande
quantidade de frutos que serviam para o sustento e alimentação dos ditos regulares. As terras para
a fundação do respectivo engenho tinham sido doadas em 1615 por Francisco Mendes Leão, e, a
partir deste fato, os irmãos passaram a acumular rendimentos para investir na obra14.
13 MELLO,José Aylton Coelho;SANTANA, Flávio Dionísio. Op.cit. 14 Arquivo do Convento do Carmo do Recife. Pap.av.
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Em algumas ocasiões, o próprio doador escolhia o local de celebração das missas
que poderiam ser realizadas nas capelas de seus engenhos, se o mesmo fosse proprietário de
algum ou, como ocorria na maioria das vezes, nas igrejas dos próprios conventos.
Comumente, o próprio doador especificava em seu testamento que os seus
herdeiros teriam a obrigação de pagar anualmente uma certa quantia, vinculada à receita dos bens
patrimoniais que deixava, para que os religiosos celebrassem missas a seu favor. Foi o caso do
governador e restaurador de Pernambuco, João Fernandes Vieira que, no ano de 1668, vinculou
ao engenho de Inhobim, situado na Paraíba, o pagamento de cem mil réis anuais aos carmelitas
do convento de Olinda, em troca da realização de missas cotidianas pela sua alma15.
Além do pagamento feito em dinheiro, o testador poderia conceder ao beneficiário
receber outros tipos de legados. Exemplificando temos o caso de Francisco Ferreira
Barreto, que doou ao convento uma cadeira de ouro e, rapidamente, foi vendida por quatrocentos
mil réis. Parte dessa quantia foi util izada na sustentação dos religiosos e a outra metade foi
utilizada na compra de gado para as terras do engenho Ubú. Geralmente, os religiosos usavam o
dinheiro das doações para construírem capelas e conventos da Ordem, além de garantir o próprio
sustento.
De uma maneira geral, a Igreja também regulava a elaboração e o cumprimento
das resoluções estabelecidas nos testamentos. Segundo as Constituições do
Arcebispado da Bahia16, os testamentos que se faziam para causas pias, como aqueles em que
fosse instituído por herdeiro algum mosteiro, igreja, hospital ou casa da misericórdia, ou outro
local pio deveria ser reali zado com menos solenidade e número de testemunhas, do que por
direito civil e lei do Reino que se requerem os profanos. Deste modo, era necessário que no ato
da preparação do testamento que tinha os religiosos como beneficiários, estivessem presentes
duas ou três testemunhas que deveriam garantir o cumprimento do estabelecido, assim
15 Arquivo do Convento do Carmo do Recife. Pap.av. 16 VIDE, Sebastião Monteiro da. Op.cit.,Livro : IV. Título:XL
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como se guardaria os legados pios, como são as missas, sufrágios, ofertas e esmolas que se
ofertava aos pobres17.
Se porventura alguma pessoa descumprisse a resolução tomada através de algum
testamento, incorria na pena de excomunhão e deveria pagar a quantia de cinqüenta cruzados
aplicados ao acusador e despesas com a justiça. Caso os testamenteiros não cumprissem o que era
determinado nos testamentos, e as almas dos testadores não fossem socorridas com os sufrágios e
esmolas que se mandavam fazer para as suas almas, já que comumente havia uma certa
desorganização em relação ao cumprimento desses assuntos, a Igreja determinava a todos os
executores dos testamentos que, a partir do dia em que o defunto falecesse a um ano e um mês,
cumprissem-se tudo o que fosse ordenado pelo testador. Assim sendo, se o testamenteiro não
cumprisse o combinado era privado de qualquer legado, salário, prêmio, ou interesse que lhes for
deixado pelos defuntos para exercerem tal função18.
Ainda relatando os ganhos recebidos pelos regulares do Carmo de Olinda, através de
doações reali zadas em testamentos, temos o caso de Antônio Cardoso, que concedeu aos ditos
religiosos seis mil cruzados, dos quais dois mil se consumiram na sustentação dos frades e os
outros quatro mil cruzados foram investidos na construção do Engenho de Lagoa Grande19.
Segundo Pereira da Costa, as terras da Lagoa-Grande do sargento-mor Manuel Rodrigues
Campelo, teriam sido compradas pelos religiosos, por dois mil cruzados, sendo levantado depois
um engenho de açúcar, em cuja construção despenderam mais de doze mil cruzados. Segundo
consta, o engenho já estava fundado no ano de 1755, possibil itando uma renda de duzentos mil
réis anuais. A construção e a fundação de engenhos pelos respectivos regulares demonstrava a
preocupação que os mesmos tinham com o seu sustento e com o investimento de suas rendas.
Depois de edificado, o engenho rendia um certo lucro na venda do açúcar, que possibilitava um
aumento no patrimônio dos frades.
17 VIDE, Sebastião Monteiro da. Op.cit.,Livro : IV. Título:XL 18 VIDE, Sebastião Monteiro da. Op.cit.,Livro : IV. Título:XL 19 Arquivo do Convento do Carmo do Recife. Pap.av.
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Por vezes, acontecia de algumas pessoas doarem ao convento dinheiro para a
ornamentação de determinados lugares pios. No ano de 1676 o capitão-mor Fernão Soares e
Diogo Soarez concederam aos carmelitas de Olinda uma esmola de duzentos réis em troca de
missas pelas suas almas. Esta quantia estava vinculada ao engenho Muribara e os seus
possuidores deveriam pagar anualmente a quantia de vinte e cinco mil réis, sendo vinte
pelas missas e cinco para ornato do altar de N.S.da Piedade, que era o local da celebração20.
Em algumas ocasiões, os herdeiros dos doadores não cumpriam a promessa de
pagar aos religiosos, situação que causava grande constrangimento aos beneficiários. Nesta
situação temos o caso da família de D. Ignes de Gois, que ao morrer encomendou missas pela sua
alma, e em troca os seus herdeiros pagariam dez mil réis anuais ao Carmo de Olinda. Entretanto,
o combinado não foi cumprido e a família já estava devendo cerca de quinhentos mil réis no ano
de 1607. O próprio Prior do convento advertiu várias vezes ao testamenteiro, mas não obteve
nenhum sucesso.
O curioso é que em alguns casos as missas encomendadas pelas almas dos
cristãos, amiúde, já não tinham mais capital, pois os religiosos haviam gastado. Nesta situação
podemos mencionar o caso de Gonçalo Perez que doou ao convento do carmo de Olinda a
quantia de seis mil cruzados, e em troca os religiosos celebrariam uma missa cotidiana por ele e
por sua mulher. Contudo, os frades colocaram o citado dinheiro a juros, assim como investiram
na manutenção do templo ocasionando no gasto da quantia.
Ao que tudo indica, os religiosos, além de participarem da elaboração e
cumprimento dos testamentos, também exercia a função de procuradores na Capitania de
Pernambuco: talvez porque, nessa época, existissem poucas autoridades de confiança do
Governo Português na colônia. Percebe-se claramente como era forte a influência dos religiosos
nos assuntos alusivos à sociedade pernambucana, na medida em que eles eram constantemente
consultados, em vários momentos, pela própria população.
20 COSTA.F.A.Pereira da. A Ordem Carmelitana em Pernambuco.Op.cit.p.107
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Deste modo, o parecer de El-rei foi favorável ao pedido feito pelo Provedor da
Fazenda de Pernambuco, e mandou que este cobrasse os dízimos das terras e engenhos dos
respectivos religiosos, da mesma forma como acontecia na Bahia e no Rio de Janeiro: pois não
era permitido que a terra antes dizimeira deixasse de ser, por passar a pertencer aos religiosos,
afinal estes tomam posse assumindo a responsabilidade tanto pelos encargos como pelas pensões
do respectivo imóvel.
De acordo com a documentação existente no Arquivo do Carmo do Recife,
observa-se a insatisfação dos carmelitas concernente ao aumento de obrigações religiosas e a
diminuição do número de frades, a partir de meados do século XVII. A preocupação dos
religiosos era tal que foi necessário controlar a aceitação de determinados encargos pios,
solicitados pela população ao convento, pois era considerada pecaminosa a ação de receber
qualquer doação para celebrar missas pela alma do doador e, no final, os religiosos não
reali zarem os encargos encomendados. E mesmo quando se gastasse o valor da missa, os irmãos
deveriam suprir esta falta e não simplesmente dizer que não se podia satisfazer o pedido do
testador.
Toda essa preocupação com o aumento do trabalho acontecia devido a escassez de
regulares, pois nesse período, o convento do Carmo de Olinda estava passando por uma fase de
dificuldade, devido à invasão dos holandeses e à construção da casa conventual do Recife, que
tinha uma localização mais privilegiada, com acesso ao porto e à casa da Alfândega. Nesse
período, a maioria da população que trabalhava com negócios procurava viver naquela região por
ser mais voltada ao comércio, motivos estes que contribuíram para a saída de alguns carmelitas
de Olinda. Nessa perspectiva, para entender o processo de decadência sofrido pelo Carmo
Olindense, precisamos entender como ocorreu a fundação do templo carmelitano do Recife.
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