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ESTABILIZAÇÃO DE RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO COM CAL PARA EMPREGO EM PAVIMENTAÇÃO Douglas Rutzen; Lucas Delongui; Washington Peres Núñez; Luiz Carlos Pinto da Silva Filho. RESUMO: O atual panorama brasileiro, composto por políticas governamentais de incentivo à habitação, traz consigo a elevada geração de Resíduos de Construção e Demolição – RCD – no setor da construção civil, a qual é ocasionada, muitas vezes, pela utilização mão de obra desqualificada e técnicas construtivas ultrapassadas. Buscando reverter essa situação, e principalmente mitigar os efeitos do descarte irregular desse material, técnicas de reutilização estão sendo aprimoradas para os RCD, dentre elas destaca-se a utilização de agregados reciclados de RCD como camada estrutural de pavimentos. Nesse enfoque, o presente trabalho tem como objetivo verificar o aumento da resistência à compressão simples em misturas de RCD de composição mista com adição 5% de cal hidratada extra, utilizada como agente estabilizante. Almeja-se verificar se o ganho de resistência dessa dosagem é suficiente para o emprego desse agregado estabilizado como bases ou sub-bases de pavimentos. Os experimentos realizados em laboratório consistiram na análise granulométrica do material, compactação, moldagem e rompimento das amostras ao final de 7, 14, 28, 56 e 112 dias de cura, através do ensaio de resistência à compressão simples. Os resultados demonstraram uma significativa elevação na resistência dos agregados, porém os valores de resistência aceitáveis para utilização em camadas de pavimento só são atingidos a partir dos 28 dias de cura, o que não possibilita a abertura do tráfego em um curto espaço de tempo. PALAVRAS-CHAVE: Estabilização de Resíduos, Pavimentação, Resistência à Compressão Simples. ABSTRACT: The current Brazilian panorama, made by government incentive to housing policies, brings high generation of Construction and Demolition Waste – CDW in the construction sector, which is often caused by disqualified labour and outdated building techniques. Seeking to reverse this situation and especially mitigate the effects of irregular disposal of this material, reuse techniques are being improved for the CDW, among which stands out the use of recycled aggregates from CDW as a structural layer of pavement. In this approach, this study aims to determine the increase in the compressive resistance in mixed composition by CDW mixtures with added 5% hydrated lime extra, used as a stabilizing agent. The goal is check if the resistance gain this dosage is enough for the use of this aggregate as stabilized base or sub-base in pavements. Experiments done in laboratory consisted of particle size analysis of the material, compaction, forming and severance of samples at the end of 7, 14, 28, 56 e 112 curing days, by the compressive strength test. Results demonstrated significant increase in aggregate resistance, but the resistance values acceptable for use in pavement layers are only achieved after 28 days of curing, what does not allow the opening of traffic in a short time. KEY WORDS: Stabilization Waste, Pavement, Compression Strength.

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ESTABILIZAÇÃO DE RESÍDUOS DE CONSTRUÇÃO

E DEMOLIÇÃO COM CAL PARA EMPREGO EM

PAVIMENTAÇÃO

Douglas Rutzen; Lucas Delongui; Washington Peres Núñez; Luiz Carlos Pinto da Silva Filho. RESUMO: O atual panorama brasileiro, composto por políticas governamentais de incentivo à habitação, traz consigo a elevada geração de Resíduos de Construção e Demolição – RCD – no setor da construção civil, a qual é ocasionada, muitas vezes, pela utilização mão de obra desqualificada e técnicas construtivas ultrapassadas. Buscando reverter essa situação, e principalmente mitigar os efeitos do descarte irregular desse material, técnicas de reutilização estão sendo aprimoradas para os RCD, dentre elas destaca-se a utilização de agregados reciclados de RCD como camada estrutural de pavimentos. Nesse enfoque, o presente trabalho tem como objetivo verificar o aumento da resistência à compressão simples em misturas de RCD de composição mista com adição 5% de cal hidratada extra, utilizada como agente estabilizante. Almeja-se verificar se o ganho de resistência dessa dosagem é suficiente para o emprego desse agregado estabilizado como bases ou sub-bases de pavimentos. Os experimentos realizados em laboratório consistiram na análise granulométrica do material, compactação, moldagem e rompimento das amostras ao final de 7, 14, 28, 56 e 112 dias de cura, através do ensaio de resistência à compressão simples. Os resultados demonstraram uma significativa elevação na resistência dos agregados, porém os valores de resistência aceitáveis para utilização em camadas de pavimento só são atingidos a partir dos 28 dias de cura, o que não possibilita a abertura do tráfego em um curto espaço de tempo. PALAVRAS-CHAVE: Estabilização de Resíduos, Pavimentação, Resistência à Compressão Simples. ABSTRACT: The current Brazilian panorama, made by government incentive to housing policies, brings high generation of Construction and Demolition Waste – CDW in the construction sector, which is often caused by disqualified labour and outdated building techniques. Seeking to reverse this situation and especially mitigate the effects of irregular disposal of this material, reuse techniques are being improved for the CDW, among which stands out the use of recycled aggregates from CDW as a structural layer of pavement. In this approach, this study aims to determine the increase in the compressive resistance in mixed composition by CDW mixtures with added 5% hydrated lime extra, used as a stabilizing agent. The goal is check if the resistance gain this dosage is enough for the use of this aggregate as stabilized base or sub-base in pavements. Experiments done in laboratory consisted of particle size analysis of the material, compaction, forming and severance of samples at the end of 7, 14, 28, 56 e 112 curing days, by the compressive strength test. Results demonstrated significant increase in aggregate resistance, but the resistance values acceptable for use in pavement layers are only achieved after 28 days of curing, what does not allow the opening of traffic in a short time. KEY WORDS: Stabilization Waste, Pavement, Compression Strength.

INTRODUÇÃO Caracterizado como um dos pilares da economia, o setor da construção civil consome inúmeras quantidades de matérias-primas em todo seu ciclo produtivo. Entretanto, desde a extração até a consolidação da obra, ocorrem inúmeras perdas no processo, ocasionando a geração de grandes quantidades de resíduos. Muitas vezes os resíduos são abandonados clandestinamente em terrenos baldios, às margens de arroios e em áreas periféricas, contaminando o solo e obstruindo os sistemas de drenagem. Para Pinto (1999), os resíduos de construção e demolição - RCD também impactam indiretamente a saúde pública, pois como são gerados em volumes muito grandes, quando não recebem destinação adequada acabam por contribuir negativamente com problemas relacionados ao saneamento das áreas urbanas, constituindo um local propício para a proliferação de vetores de doenças. O problema do volume excessivo também contribui para a diminuição de espaço nos aterros licenciados, além de gerar elevados gastos de limpeza e remoção por parte dos municípios. Para que esse material seja adequadamente reinserido no ciclo produtivo, ele deve ser manipulado de forma a garantir um desempenho satisfatório de acordo com a finalidade que lhe seja atribuída. Dessa forma, a presente pesquisa visa caracterizar RCD de composição mista, bem como analisar suas propriedades mecânicas quando adicionadas porcentagens de cal, de modo a observar possíveis melhoras no comportamento, em comparação às demais sem aglomerantes. Almeja-se que os resultados apresentados contribuam para inserir os agregados reciclados de RCD com insumo alternativo aos materiais tradicionais utilizados em pavimentação, bem como contribuir para mitigação dos impactos ambientais causados pela disposição final dos resíduos. MATERIAIS Resíduos de Construção e Demolição Em função da grande variabilidade do material descartado nos canteiros de obras e nas demolições de estruturas obsoletas, o RCD utilizado na pesquisa foi devidamente classificado de acordo com a legislação pertinente. Conforme a Lei 12.305/2010 (BRASIL, 2010), são “[...] resíduos da construção civil: os gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis.”. De forma mais detalhada, a Resolução Conama n. 307 classifica como Resíduos de Classe A aqueles provenientes de obras de construção, de demolição, de reformas e de reparos, tanto de edificações como de pavimentos e de outras modificações de infraestrutura, inclusive reparos em solos provenientes de terraplenagem (CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE, 2002). A classificação dos resíduos de acordo com a NBR 10.004 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 2004) está expressa na figura 1. Os agregados que contêm as características necessárias para o estudo são provenientes dos resíduos da Classe II B, denominados como Inertes, que aqueles submetidos aos ensaios específicos através de contato dinâmico e estático com água destilada ou desionizada, à temperatura ambiente, e não tiverem nenhum de seus componentes solubilizados a concentrações superiores aos padrões de potabilidade da água, exceto os aspectos como cor, turbidez, dureza e sabor.

Figura 1. Classificação dos resíduos segundo a NBR 10.004

Cal como agente estabilizador Nos EUA, um dos pioneiros na estabilização de solos com cal, o Texas Highway Department foi o responsável pelos primeiros estudos, nos anos seguintes a segunda guerra mundial, tendo esse método sido avaliado e utilizado em diversos países desde então. Pode se configurar como uma vantagem a utilização da cal hidratada na estabilização de solos, ou RCD neste caso, comparando-se com o uso de outros materiais nobres para a pavimentação que podem assumir um custo mais elevado ou encontrar-se a grandes distâncias de transporte. A cal utilizada nesta pesquisa foi processada no Município de Caçapava do Sul, um dos maiores exploradores de jazidas calcárias no Rio Grande do Sul. De acordo com Taborda (2012), essas jazidas economicamente exploráveis estão normalmente associadas tanto a rochas Pré-Cambrianas como Paleozoicas e constituem os calcários metamórficos. Petrograficamente classificam-se na sua maior parte como mármores. Do ponto de vista químico, os calcários metamórficos são predominantemente dolomíticos-calcíticos e dolomitos. O autor ainda afirma que os calcários do Rio Grande do Sul são predominantemente dolomitos-calcitos e dolomitos, portanto as cales são ricas em Óxido de Magnésio (MgO). As poucas ocorrências de calcários puros existentes, se dão principalmente nos municípios de Pedro Osório, Arroio Grande e São Gabriel, são absorvidas pelas fábricas de cimento. O caráter dolomítico da cal (tipo extra) utilizada neste estudo foi constatada através do certificado de análise emitido pela empresa Mineração Monego Ltda, o qual demonstra os teores de Óxido de Cálcio (CaO) e de Óxido de Magnésio (MgO) na ordem de 45,96% e 26,08 %, respectivamente. A cal virgem ou cal ordinária é um produto composto predominantemente por óxido de cálcio e óxido de magnésio é resultante da calcinação (queima), em temperatura próxima aquela de fusão de calcários, calcários magnesianos e dolomitos, variando em torno de 900 a 1200 °C. Através de processos de imersão ou suspensão em água da cal virgem, obtém-se a cal hidratada (Ca(OH)2). Essa reação de hidratação da cal viva é exotérmica, com grande liberação de calor, motivo pelo qual não é utilizada em campo devido aos riscos que os trabalhadores ficam expostos. Existem alguns fatores que podem alterar os resultados da estabilização dos solos ou agregados. Segundo Pinto (1971), as principais considerações no trabalho sobre o comportamento dos materiais submetidos a processos de estabilização se referem ao tipo da cal utilizada, tipo do solo, as proporções de cal, as relações entre umidade, densidade e resistência, efeitos da energia de compactação, da temperatura de cura, da demora da compactação após umedecimento da mistura, da adição de aditivos químicos

congelamento e degelo. Dessa forma, todos os procedimentos realizados neste estudo seguiram o mesmo padrão, procurando avaliar apenas os efeitos que a cal exerce nos corpos de prova. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL Coleta dos agregados O material estudado é proveniente de uma ONG situada na Zona Sul de Porto Alegre. Em parceria com a Prefeitura Municipal, a ONG recebe material recolhido na cidade pelo Departamento Municipal de Limpeza Urbana. O material, constituído por resíduos de construção e demolição de composição mista, é recebido e estocado, até ser levado a uma esteira onde é feita a remoção de contaminantes, como madeira, gesso, vidro e materiais orgânicos. Em uma etapa posterior, o material é levado até um britador de mandíbulas, onde é feita a redução do seu tamanho. Após a britagem, o material é separado por peneiras, em função de seu diâmetro, e então estocado até ser utilizado como agregado na confecção de artefatos de concreto para pavimentação (blocos intertravados e meio-fio) e construção civil (blocos de vedação). Para este estudo, foram utilizados os materiais que passavam na malha de 50mm. Quarteamento Na preparação das amostras deve-se levar em consideração uma série de fatores que influenciam a credibilidade dos resultados obtidos. A representatividade da amostra é um dos parâmetros a ser controlado, ou seja, a amostra que será utilizada para análise deverá conter todos elementos contidos na amostra principal. Para isso, há necessidade de uma boa homogeneização e de alguns cuidados na etapa de amostragem. Para materiais como o RCD, em função da variabilidade de elementos que geralmente estão presentes, o processo de quarteamento é necessário para minimizar a as diferenças de composição do material. Além disso, esse processo procura reduzir a amostra a pequenas porções representativas da amostra inicial. Para a realização desta etapa foi utilizado um quarteador tipo Jones, constituído por uma série de calhas inclinadas, ora para um lado, ora para o outro. O princípio é de que um quarto da amostra deve ser representativo do total, então a amostra é separada em quatro unidades, sendo que duas são usadas e as outras duas descartadas. As duas unidades restantes são misturadas e reduzidas ainda mais da mesma forma, até obter-se um quarto da amostra. Secagem em estufa O processo de secagem na estufa se faz necessário para a retirada, por evaporação, da água retida fisicamente e que não faz parte da composição química do material. Essa água encontra-se adsorvida nos poros, interstícios, capilares e/ou aprisionada no material na forma de umidade. A secagem do RCD foi realizada no Laboratório de Pavimentação – LAPAV / UFRGS, obedecendo aos requisitos da Norma Rodoviária DNER-ME 083/98, que estabelece em (110 ±5) oC a temperatura da estufa. O período de atuação da estufa foi de 24 horas.

Peneiramento Essa etapa é realizada posteriormente à secagem na estufa e esfriamento à temperatura ambiente do RCD, consistindo em condicionar o material seco sobre o peneirador vibratório, para classificação granulométrica. Foram utilizadas as peneiras 1”, 3/4”, 3/8”, n. 4, n. 10, n. 40, n. 200 e o fundo, que coleta o restante do material passante. O peneirador utilizado atende aos requisitos da Norma Rodoviária DNER-ME 083/98, que descreve os procedimentos para determinação da curva granulométrica de agregados graúdos. As frações resultantes podem ser observadas na Figura 3.

Figura 3. Granulometria do RCD

Dosagem Ensaios de granulometria do material foram realizados por Matuella (2014), resultando na curva granulométrica do RCD, que então foi comparada com as condições

específicas para a Faixa B de composição granulométrica constantes na Norma DNIT 141/2010 – Pavimentação – Base estabilizada granulometricamente – Especificação de serviço, considerando um número N de tráfego maior que 5x106. O resultado da composição é demonstrado pela Figura 4. Faixas granulométricas.

Figura 4. Composição Granulométrica dos RCD entre os limites da Faixa B

da Norma DNIT 141/2010. Compactação e moldagem Para realização do ensaio de compactação, utilizou-se os preceitos da norma rodoviária DNIT 164/2013 – ME. Adotou-se a energia intermediária como energia de compactação, visto que é a recomendada para a utilização em camadas de base e sub-base, segundo a NBR 15116 (ABNT, 2004). Após o ensaio de compactação utilizou-se um cilindro tripartido metálico (Figura 6) para moldagem das amostras na respectiva umidade ótima e peso específico aparente seco máximo. Para isso, utilizou-se a moldagem por densidade, onde as amostras são divididas em 5 camadas e o número de golpes por camada varia até se atingir a densidade desejada.

Figura 6. Cilindro metálico tripartido montado.

0102030405060708090

100

0,01 0,1 1 10 100

% P

assa

nte

Diâmetro dos agregados (mm)

Cura úmida Devido aos elevados tempos de cura, procurou-se garantir condições específicas como a temperatura (23 ±2) oC e umidade do ar (>95%), as quais todos os corpos de prova estivessem sujeitos. Dessa forma, após a moldagem, todos os corpos de prova foram imediatamente armazenados na Câmara Úmida, que atende os critérios da NBR 9.479/2006 (Figura 7). Ensaio de Compressão Simples Buscando avaliar se a adição de cal aos RCD proporcionou um ganho de resistência ao longo do tempo, os corpos de prova foram submetidos ao ensaio de compressão simples conforme a NBR 12025 (ABNT, 2012). Para este estudo, foi utilizada a velocidade de 0,14 MPa/s na aplicação do carregamento (Figura 8). Até a idade de ensaio, os corpos-de-prova foram mantidos em processo de cura úmida, nas condições preconizadas. O tempo de cura foi contado a partir do momento em que a cal foi posta em contato com a água de mistura. Segundo é recomendado pela NBR 12025 (ABNT, 2012), os corpos de prova devem ser ensaiados nas mesmas condições de sazonamento em que encontravam na câmara úmida. Assim sendo, o ensaio foi realizado imediatamente após a remoção do corpo de prova do seu local de cura.

Figura 8. Equipamento para Ensaio de resistência a compressão simples

RESULTADOS E DISCUSSÃO Compactação Fundamentado na pesquisa de Matuella (2014), que utilizou o mesmo material com a adição de outro tipo de composto aglomerante, o teor de umidade arbitrado para o ensaio de compactação ficou entre 14% e 19%. Dentro desse intervalo, e com o aglomerante utilizado nessa pesquisa, também foram possíveis identificar a umidade ótima (ωo) e peso específico aparente seco máximo (γd). Entretanto, durante o ensaio constatou-se que os valores de γd sofreram pequena variação com a faixa de umidade

trabalhada, pois percebeu-se que com o acréscimo umidade, os corpos de prova sofriam exsudação, conforme demonstra a Figura 9. Ressalta-se que a análise da absorção de água no RCD está sendo realizado, como prescreve a norma DNER-ME 195/97, pois essa avaliação servirá para entender o comportamento dos RCD e para auxiliar nos estudos de dosagem. No entanto, para essa etapa a mesma não foi observada, e será utilizada para, futuramente, comparar e avaliar as implicações da absorção para processo de compactação, seja com o agregado pré-umedecido ou com o umedecimento do agregado seco, caso abordado nesse estudo. A Figura 10 demonstra a curva de compactação do RCD com a adição de 5% de cal. A partir dela, verificou-se que o peso específico aparente seco máximo (γd) é de 1,74 g/cm3, e a respectiva umidade ótima (ωo) é de 16,2%.

Figura 9. Início da exsudação no ensaio de compactação

Figura 10. Curva de compactação RCD com adição de 5% de cal.

1,4

1,5

1,6

1,7

1,8

1,9

2,0

14 15 16 17 18 19

γd(g

/cm

3)

Umidade (%)

Moldagem e ensaio de compressão simples Para execução dos ensaios de resistência à compressão simples (RCS), foram moldados 15 corpos de prova, descritos na Tabela 1. No momento da moldagem foram aferidos os pesos líquidos dos corpos de prova como controle de qualidade, para posterior verificação dos pesos específicos individuais, dada a heterogeneidade do RCD. A média, em massa de material, dos corpos de prova moldados foi de 3.171,9 gramas, com desvio padrão de 18,11 gramas. Em função da variabilidade de materiais presentes no RCD, que pode ser composto de pedaços de concreto até fragmentos de solo (pesos específicos diferentes), considerou-se como aceitável essas diferenças percebidas. Consequentemente, as diferenças no peso específico natural (γn) também são percebidas. Importante salientar que os procedimentos para moldagem de todos os corpos de prova foram executados da mesma forma, minimizando efeitos externos ao material em si. Uma vez que o material foi seco em estufa, a quantidade de água é somente aquela adicionada no processo de moldagem, considerada como a umidade ótima no valor de 16,2%. Mais uma vez, constata-se a variabilidade dos corpos de prova através da Equação 1, calculando-se novamente o γd do material

γd = γn/(1+ ωo) (Equação 1)

Em função da heterogeneidade do RCD e das dimensões dos corpos de prova (10x 20cm), a variação do o γd, é da ordem de 0,25%, aceitável para o presente estudo.

Corpo de

Prova

Massa de Material

(g)

γn (g/cm3)

γd (gf/cm3)

Data Moldagem

Data Ensaio

Cura (dias)

Resultado (Mpa)

Média (Mpa)

CP28 3.195,50 2,03 1,75 04/02/15 11/02/15 7 1,35 1,25 CP29 3.177,50 2,02 1,74 04/02/15 11/02/15 7 1,18

CP31 3.166,50 2,02 1,74 04/02/15 11/02/15 7 1,21 CP20 3.178,00 2,02 1,74 29/01/15 12/02/15 14 1,92

1,90 CP22 3.203,00 2,04 1,76 29/01/15 12/02/15 14 1,87 CP26 3.195,00 2,03 1,75 29/01/15 12/02/15 14 1,90 CP12 3.160,00 2,01 1,73 07/01/15 04/02/15 28 2,31

2,21 CP15 3.184,00 2,03 1,75 07/01/15 04/02/15 28 2,07 CP16 3.179,00 2,02 1,74 07/01/15 04/02/15 28 2,24 CP04 3.174,50 2,02 1,74 19/12/14 13/02/15 56 2,76

2,52 CP05 3.147,00 2,00 1,72 19/12/14 13/02/15 56 2,25 CP09 3.168,00 2,02 1,74 19/12/14 13/02/15 56 2,56 CP06 3.153,00 2,01 1,73 19/12/14 10/04/15 112 2,81

2,81 CP03 3.152,50 2,01 1,73 19/12/14 10/04/15 112 2,74 CP07 3.145,00 2,00 1,72 19/12/14 10/04/15 112 2,88

Tabela 1. Corpos de prova Após decorrido o tempo de cura, os corpos de prova foram ensaiados seguindo os procedimentos já descritos, e os resultados podem ser observados na figura 12.

Figura 11. Corpo de Prova – Antes e após o rompimento

Figura 12. Evolução da resistência à compressão simples do RCD com cal.

CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES A utilização de materiais com baixa resistência mecânica pode levar o pavimento a sofrer rupturas por cisalhamento, bem como deformações acentuadas. A cimentação das partículas pelos carbonatos, que se precipitam em torno dos pontos de contato, contribui para a coesão do RCD e aumento da capacidade de suporte.

0,00

0,50

1,00

1,50

2,00

2,50

3,00

0 20 40 60 80 100 120

RC

S (M

Pa)

Tempo de cura (dias)RCD Com Cal RCD Sem Cal

Dentre os aspectos mais relevantes, o comportamento da curva de compactação requer atenção, pois a mesma apresentou uma tendência bastante horizontal, onde a umidade ótima foi determinada como sendo uma pequena elevação no peso específico aparente seco. Tal observação corrobora com a pesquisa de Matuella (2014), que utilizou cimento como composto aglomerante. No seu estudo a curva apresentou o mesmo comportamento e a umidade ótima foi determinada como sendo a máxima umidade atingida, contanto que não resultasse em exsudação da água presente no material compactado. Esse procedimento vale ser observado, pois em alguns casos, com o aumento da umidade, γd não varia muito entre si, e uma maior quantidade de água poderá auxiliar na lubrificação das partículas quando estas são compactadas. Conforme a Norma NBR 12.253, os corpos de prova devem apresentar resistência mínima admissível de 2,1 MPa aos 28 dias de cura para que possam ser utilizados como camada de pavimento. Os ensaios realizados demonstraram que a mistura de RCD com cal hidratada atinge valores superiores aos 2,1 MPa, embora esse valor seja atingido somente aos 28 dias de cura. Portanto, a utilização em pavimentos de camadas de RCD estabilizadas quimicamente com cal incorre no problema do tempo necessário para a liberação do tráfego, uma vez que as reações pozolânicas desenvolvem-se por períodos mais prolongados, consequentemente a liberação ao tráfego pode levar mais tempo comparando-se com camadas estabilizadas com cimento de alta resistência inicial. REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9.479: Argamassa e concreto – Câmaras úmidas e tanques para cura de corpos-de-prova. Rio de Janeiro, 2006. _____. NBR 10.004: Resíduos sólidos – Classificação. Rio de Janeiro, 2004. _____. NBR 12.023: Solo-cimento – Ensaio de compactação. Rio de Janeiro, 2012. _____. NBR 12025: Solo-cimento — Ensaio de compressão simples de corpos de prova cilíndricos — Método de ensaio. Rio de Janeiro, 2012. _____. NBR 12.253: Solo-cimento – Dosagem para emprego como camada de pavimento. Rio de Janeiro, 1992. BRASIL. Presidência da República. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n. 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional dos Resíduos Sólidos. Brasília, DF, 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso em: 29 de out. 2014. CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. Resolução Conama n. 307: Estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil. Brasília, DF, 2002. Disponível em: < http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res02/res30702.html>. Acesso em: 29 out. 2014.

DELONGUI, L. Caracterização e adequação dos resíduos da construção civil produzidos no município de Santa Maria-RS para aplicação em pavimentação. 2012. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil e Ambiental, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria-RS, 2012. DEPARTAMENTO NACIONAL DE ESTRADAS DE RODAGEM. DNER-ME 083/98: agregados – análise granulométrica. Rio de Janeiro, 1998. Disponível em: <http://ipr.dnit.gov.br/normas/DNER-ME083-98.pdf>. Acesso em: 30 out. 2014. DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES. DNIT 141/2010 – ME: pavimentação – base estabilizada granulometricamente - especificação de serviço. Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: <http://ipr.dnit.gov.br/normas/DNIT141_2010-ES.pdf>. Acesso em 30 out. 2014. _____. DNIT 164/2013 – ME: solos – compactação utilizando amostras não trabalhadas – método de ensaio. Rio de Janeiro, 2013. Disponível em: <http://ipr.dnit.gov.br/normas/DNIT164_2013-ME.pdf>. Acesso em 30 out. 2014. DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES. Manual de Pavimentação. 3. ed. Rio de Janeiro, RJ, 2006. Disponível em: <http://www1.dnit.gov.br/arquivos_internet/ipr/ipr_new/manuais/Manual_de_Pavimentacao_Versao_Final.pdf>. Acesso em: 15 set. 2014 MATUELLA, M. F. Resíduos de construção e demolição melhorados com cimento portland: contribuições para a aplicação em camadas inferiores de pavimentos. 2014. 88 f. Trabalho de Diplomação (Graduação em Engenharia Civil) – Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014. PINTO, S. Estabilização de areia com adição de cal e cinza volante. 1971. Dissertação (Mestrado em Engenharia) – COPPE, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro-RJ, 1971. PINTO, T. de P. Metodologia para a gestão diferenciada de resíduos sólidos da construção urbana. 1999. Tese (Doutorado em Engenharia) – Departamento de Engenharia da Construção Civil, Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, São Paulo-SP, 1999. TABORDA, L. F. Análise de um pavimento semirrígido com base em solo, cal e cinza volante. 2012. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) – Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre-RS, 2012.