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2012 ARTES CÊNICAS Prof. Jean Carlos Gonçalves Prof. ª Michela Rejane Breda

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2012

Artes CêniCAs

Prof. Jean Carlos GonçalvesProf.ª Michela Rejane Breda

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Copyright © UNIASSELVI 2012

Elaboração:

Prof. Jean Carlos Gonçalves

Prof.ª Michela Rejane Breda

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

790G635a Gonçalves, Jean Carlos Artes cênicas / Jean Carlos Gonçalves e Michela Rejane Breda. Indaial : Uniasselvi, 2012. 203 p. : il ISBN 978-85-7830-555-0

1. Artes cênicas. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título

Impresso por:

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III

ApresentAção

Caro acadêmico!

Apresentamos o Caderno de Estudos em Artes Cênicas. Essa disciplina tem o objetivo de proporcionar conhecimentos referentes à área artística, em um processo que vai desde a relação entre teatro e educação, até a relação entre teatro e visualidade.

As Artes Cênicas têm uma ampla possibilidade de aplicação em sala de aula e outros espaços de educação. Nesse caderno, veremos algumas delas, como conteúdos que abrangem as técnicas de treinamento para a interpretação, a improvisação, o lúdico, a criatividade, o funcionamento do discurso, o jogo teatral, as percepções do espaço cênico e a cenografia.

Os textos estão dispostos em uma ordem que não pretende ser cronológica e nem está distribuída em ordem de importância de temáticas. A ideia é provocar um diálogo, para que ao fim da disciplina você se sinta apto a conversar, teorizar e vivenciar o teatro.

Obviamente a área das Artes Cênicas tem conteúdo, história e metodologias que podem ser estudadas em muito tempo. Lembre-se de que esta disciplina tem um caráter básico e introdutório, cabendo a você buscar informações e se aprofundar nas temáticas que mais lhe chamarem a atenção.

Esperamos que a partir das leituras e atividades propostas, você consiga apreender e aplicar seus novos conhecimentos, aliando-os às necessidades e anseios da sua formação.

Entregue seu ingresso, desligue o aparelho celular! Bem-vindo ao teatro e bom espetáculo!

Prof. Jean Carlos Gonçalves Prof.ª Michela Rejane Breda

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IV

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

NOTA

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

UNI

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VII

UNIDADE 1 – TEATRO E EDUCAÇÃO ............................................................................................. 1

TÓPICO 1 – TEATRO E ESCOLA......................................................................................................... 31 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 32 TEATRO COMO COMPONENTE CURRICULAR ....................................................................... 33 PEDAGOGIA TEATRAL ..................................................................................................................... 6

3.1 JEAN-PIAGET E O ENSINO DO TEATRO .................................................................................. 63.2 MORENO E O PSICODRAMA ...................................................................................................... 73.3 O TEATRO DE BRECHT ................................................................................................................. 83.4 BOAL E O TEATRO DO OPRIMIDO............................................................................................ 10

LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 12RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 14AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 15

TÓPICO 2 – ASPECTOS PEDAGÓGICOS NO TEATRO ............................................................... 171 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 172 A CONDUÇÃO PEDAGÓGICA ....................................................................................................... 17RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 22AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 23

TÓPICO 3 – A DANÇA NO TEATRO ................................................................................................. 251 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 252 O SISTEMA LABAN ............................................................................................................................ 26

2.1 CORPO .............................................................................................................................................. 282.2 ESPAÇO ............................................................................................................................................. 282.3 FORMA ............................................................................................................................................. 282.4 ESFORÇO .......................................................................................................................................... 28

3 PINA BAUSCH E A DANÇA-TEATRO ........................................................................................... 29RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 32AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 33

TÓPICO 4 – DANÇA-TEATRO NA ESCOLA ................................................................................... 351 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 352 CAMINHOS PEDAGÓGICOS PARA A DANÇA - TEATRO .................................................... 353 COMPARTILHANDO IDEIAS .......................................................................................................... 36

3.1 OPOSTOS CORPORAIS ................................................................................................................. 363.1.1 Reconstrução corporal coreográfica ..................................................................................... 37

3.2 DANÇANDO E TEATRALIZANDO COM OS MESTRES DA PINTURA ............................. 373.3 TEMÁTICA MUSICAL NA DANÇA-TEATRO .......................................................................... 413.4 PINTURA E POEMA DRAMÁTICO ............................................................................................ 41

LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 46RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 50AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 51

sumário

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VIII

TÓPICO 5 – TREINAMENTO DO ATOR ........................................................................................531 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................532 STANISLÁVSKI..................................................................................................................................533 GROTOWSKI ......................................................................................................................................564 ANTROPOLOGIA TEATRAL ..........................................................................................................59RESUMO DO TÓPICO 5......................................................................................................................63AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................64

UNIDADE 2 – JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO ...................................................................65

TÓPICO 1 – TEORIAS E TÉCNICAS ................................................................................................671 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................672 TEORIAS E TÉCNICAS ....................................................................................................................67

2.1 O SISTEMA DE VIOLA SPOLIN .................................................................................................692.2 KEITH JOHNSTONE ....................................................................................................................73

2.2.1 Bloqueio criativo ...................................................................................................................752.2.2 Status .......................................................................................................................................762.2.3 Espontaneidade e criatividade ...........................................................................................77

RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................79AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................80

TÓPICO 2 – IMPROVISAÇÃO E DISCURSO ...............................................................................811 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................812 TEORIA DA ENUNCIAÇÃO ...........................................................................................................813 FOUCAULT E AS RELAÇÕES DE PODER ...................................................................................85RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................89AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................90

TÓPICO 3 – PRÁTICAS E VIVÊNCIAS ...........................................................................................911 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................912 PLANOS DE AULA E PROTOCOLOS DE SESSÃO ...................................................................91

2.1 PLANOS DE AULA .......................................................................................................................922.2 PROTOCOLOS DE SESSÃO ........................................................................................................95

3 ALGUNS JOGOS ................................................................................................................................97LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................100RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................102AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................103

TÓPICO 4 – TEXTO E ADAPTAÇÃO TEATRAL NA ESCOLA ..................................................1051 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1052 A ARTE DA ADAPTAÇÃO TEXTUAL .........................................................................................1053 TEXTO TEATRAL ADAPTADO E LEITURA DRAMÁTICA ....................................................1074 COMPARTILHANDO EXPERIÊNCIA ..........................................................................................1085 CONVERSAS SOBRE AVALIAÇÃO NA PRODUÇÃO TEATRAL ESCOLAR .....................110LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................113RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................115AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................116

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IX

UNIDADE 3 – TEATRO E VISUALIDADE ......................................................................................117

TÓPICO 1 – CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM ......................................................................1191 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1192 ASPECTOS HISTÓRICOS................................................................................................................119

2.1 CENOGRAFIA GREGA ................................................................................................................1202.2 CENOGRAFIA ROMANA ...........................................................................................................1222.3 CENOGRAFIA MEDIEVAL .........................................................................................................1242.4 CENOGRAFIA ELISABETANA ..................................................................................................1262.5 CENOGRAFIA RENASCENTISTA .............................................................................................1292.6 O PALCO ITALIANO ....................................................................................................................130

3 REVOLUÇÃO CENOGRÁFICA ......................................................................................................1313.1 ADOLPHE APPIA (1862-1928) ....................................................................................................1313.2 EDWARD GORDON CRAIG (1872 – 1966) ...............................................................................133

RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................135AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................136

TÓPICO 2 – TEORIA DO ESPAÇO CÊNICO ..................................................................................1371 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1372 DIFERENTES ACEPÇÕES DO ESPAÇO CÊNICO .....................................................................137

2.1 ESPAÇO E LUGAR ........................................................................................................................1382.2 ESPAÇO E CORPO ........................................................................................................................1392.3 ESPAÇO E TEXTO .........................................................................................................................1412.4 ESPAÇO E ESPECTADOR ............................................................................................................142

RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................144AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................145

TÓPICO 3 – ELEMENTOS CENOGRÁFICOS ................................................................................1471 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1472 LUZ ........................................................................................................................................................1473 COR .......................................................................................................................................................1494 SOM .......................................................................................................................................................151LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................154RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................158AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................159

TÓPICO 4 – CENOGRAFIA E PRÁTICA NA ESCOLA ................................................................1611 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1612 ESPAÇOS CENOGRÁFICOS ...........................................................................................................1613 COMPARTILHANDO IDEIAS ........................................................................................................162

3.1 CRIANDO CENÁRIOS NOS ESPAÇOS DA ESCOLA ............................................................1623.2 MINICENÁRIOS ............................................................................................................................163

RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................168AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................169

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X

TÓPICO 5 – O TEATRO DE BONECOS ...........................................................................................1711 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1712 ALGUNS DETALHES HISTÓRICOS .............................................................................................1713 TEATRO DE BONECOS E SUAS LINGUAGENS .......................................................................173

3.1 BONECOS ARTICULADOS .........................................................................................................1733.2 BONECOS DE LUVA ....................................................................................................................1743.3 BONECOS DE VARA ....................................................................................................................176

4 TEATRO DE SOMBRAS UMA LINGUAGEM PARTICULAR .................................................1774.1 TEORIA E TÉCNICA ....................................................................................................................177

RESUMO DO TÓPICO 5......................................................................................................................181AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................182

TÓPICO 6 – O TEATRO DE MÁSCARAS........................................................................................1831 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1832 BREVE HISTÓRIA DA MÁSCARA ...............................................................................................1833 O USO DA MÁSCARA E SUA CRIAÇÃO NAS PRODUÇÕES ESCOLARES .....................1864 CRIANDO MÁSCARA PARA TEATRO NA ESCOLA...............................................................187

4.1 MÁSCARA DE CAMADAS: (KRAFT/JORNAL) ......................................................................1884.2 MÁSCARA DE SACO DE PÃO ...................................................................................................1904.3 MÁSCARA DE PAPEL MACHÊ .................................................................................................191

LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................195RESUMO DO TÓPICO 6......................................................................................................................199AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................200

REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................201

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UNIDADE 1

TEATRO E EDUCAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

Ao final dessa unidade, você estará apto a:

• conhecer os processos pedagógicos em Artes Cênicas e suas interfaces com o ambiente escolar;

• relacionar os principais aspectos da relação entre as Artes Cênicas e a edu-cação do corpo;

• identificar teorias de treinamento do ator contemporâneo.

Esta unidade está dividida em cinco tópicos. Ao final de cada um deles, você terá a oportunidade de fixar seus conhecimentos realizando as atividades propostas.

TÓPICO 1 – TEATRO E ESCOLA

TÓPICO 2 – ASPECTOS PEDAGÓGICOS NO TEATRO

TÓPICO 3 – A DANÇA NO TEATRO

TÓPICO 4 – DANÇA - TEATRO NA ESCOLA

TÓPICO 5 – TREINAMENTO DO ATOR

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TÓPICO 1UNIDADE 1

TEATRO E ESCOLA

1 INTRODUÇÃO

Nesse tópico, estudaremos os princípios pedagógicos das Artes Cênicas. Partiremos das relações entre teatro e educação, abordando conceitos que se fazem necessários à compreensão de como as Artes Cênicas ganham espaço no currículo escolar.

Veremos algumas propostas metodológicas para o ensino do teatro e suas possibilidades de aplicação no ambiente escolar.

Ao final do tópico, teremos acesso a um artigo da professora-doutora Ingrid Koudela, principal nome do ensino de teatro brasileiro na atualidade.

Bom estudo a todos! Quem sabe, ao final desse tópico, você não se arrisca a uma aventura teatral com seus colegas!

2 TEATRO COMO COMPONENTE CURRICULAR

As Artes Cênicas na educação escolar brasileira ainda encontram inúmeros obstáculos, quando perguntas que há décadas já deviam ter sido respondidas, insistem em voltar aos centros de formação de professores, universidades, reuniões de pais e planejamentos curriculares: Para que serve o teatro na escola? Qual o objetivo do estudo da cena num ambiente educacional? O que a criança fará com os conhecimentos apreendidos na aula de artes cênicas?

Na Antiguidade Clássica, Aristóteles e Platão já elaboravam escritos que traziam uma dimensão conflituosa da relação entre o teatro e a educação. Porém é só a partir da metade do século XIX que a expressão Teatro-educação começa a ser utilizada em bibliografias especializadas da área.

No Brasil, é a partir do início do século XX, pelo movimento da Escola Nova, fortemente difundido pelo conhecido educador Anísio Teixeira, que começaram as lutas por uma educação ativa, que passa a considerar as artes e as humanidades como fundamentais para o processo educacional do ser.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

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O teatro passou a fazer parte do componente curricular na educação formal durante o processo de educação em massa, advindo da democratização do ensino laico no Ocidente. O final do século XIX e início do XX foram responsáveis por uma ampla discussão no terreno pedagógico, referente à importância da criatividade para o desenvolvimento da tecnologia, das indústrias e dos novos materiais e utensílios que estavam surgindo no mercado.

A psicologia também começava a se firmar como ciência e a ganhar espaço nas frentes de discussão sobre educação. Assim, era postulada, no âmbito de um pensamento educacional liberal progressivista, uma nova proposta de ensino, que pretendia atender aos ideais de “liberdade de expressão” e “livre-iniciativa” do novo cidadão que estava surgindo.

Dessa maneira, a presença da arte e do teatro na escola era justificada como estímulo ao desenvolvimento da criatividade do aluno.

FONTE: Disponível em: <www.divirta-se.correioweb.com.br>. Acesso em: 20 fev. 2010.

FIGURA 1 – ESPETÁCULO – OS TRÊS PORQUINHOS – CIA NÉIA E NANDO

ATENCAO

Não devemos pensar que é só a partir desse momento histórico que o teatro apareceu na educação, pois há registros escritos de dramatizações e leituras de peças teatrais já na Idade Média em escolas e universidades da Europa. No Brasil, ainda existiam os jesuítas na época da colonização, que usavam o teatro como instrumento educacional religioso.

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TÓPICO 1 | TEATRO E ESCOLA

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O desafio a partir da segunda metade do século XX, período em que se fortalecia a ideia de uma educação através da arte, foi o de pensar o ensino de teatro para além de um instrumento, ferramenta ou método para auxiliar no ensino de outras disciplinas. Era muito frequente, nessa época, e ainda hoje temos resquícios disso, a presença do teatro na escola como meio de facilitar o aprendizado de línguas, ou para ajudar o aluno a se expressar na hora de uma leitura de Língua Portuguesa. Até mesmo em aulas de Matemática e Ciências Naturais, o teatro surgia (surge) como projeto de professores, desprovidos de qualquer conhecimento técnico e artístico.

Uma nova perspectiva, chamada de estética ou essencialista, começou a dar ênfase às especificidades da linguagem teatral, trazendo para a escola uma compreensão das artes cênicas como uma forma de expressão artística acessível e disponível para todo ser humano, e não apenas para uma pequena elite que pudesse frequentar teatros, cursos e oficinas que na sua maioria precisam de tempo e dinheiro para sua manutenção.

Surgem assim, novas bases e diretrizes para o ensino de teatro, calcadas na comunicação e expressão do sentimento humano, visto que a principal característica que distingue o ser humano de outras espécies animais é o uso de uma linguagem comunicativa, organizada, capacidade de controle e domínio de comportamento.

O teatro, então, passa a ser concebido e difundido como forma de

conhecimento, necessária a todo sujeito da educação e capaz de elaborar conexões com a visualidade, a música, o jogo e todos os outros mecanismos integrantes de um espetáculo.

Hoje, o ensino do teatro encontra espaço na escola, em instituições governamentais, organizações para o desenvolvimento social, comunidades de todas as faixas etárias e classes econômicas. Sua importância já não deve ser mais questionada, pois a arte justifica-se a si mesma. Inúmeras pesquisas em teatro-educação vêm sendo realizadas com diferentes abordagens: pesquisa de campo, etnográfica, etnocenológica, e de observação. Todas trazem importantes contribuições para o avanço da área e amplas reflexões sobre os caminhos do teatro contemporâneo.

Hoje, principalmente como fortalecimento dos cursos de Licenciatura em Artes Cênicas, que têm como foco a formação de professores na área específica de teatro, a realidade do ensino das artes vai encontrando alguns caminhos de mudança. Uma mudança lenta, sofrida, carente de maior estrutura (tanto física, como intelectual), mas que tem conseguido, mesmo a passos lentos, inserir a cultura teatral na escola.

A seguir, vamos estudar algumas abordagens em pedagogia teatral no Brasil.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

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3 PEDAGOGIA TEATRAL

Como vimos, ainda hoje, o ensino de teatro na escola é pensado como meio de aprendizagem para outros conteúdos e disciplinas curriculares, ou ainda como fator de desenvolvimento criativo. Uma vertente desse modelo instrumental é chamada de play way ou método dramático. (COURTNEY,1980) Esse método é um recurso didático para apreensão de conteúdos trabalhados por diferentes disciplinas do currículo por meio de encenações. Dramatiza-se um fato histórico, uma situação estudada, um evento, e não se tem o mínimo compromisso estético com a cena. O forte desenvolvimento dessa corrente instrumental acabou por gerar discussões acerca de mudanças necessárias no ensino de teatro.

A partir do momento em que o teatro e as artes passam a ser concebidos como linguagens, essa corrente vai perdendo lugar, apesar de ainda existir na atualidade, um novo procedimento chamado essencialista ou estético. Nessa nova abordagem, o objetivo do ensino das artes não é a formação de artistas, e sim, a compreensão estética das formas de expressão humanas.

Essas duas abordagens, instrumentalista e estética, foram concebidas e ocuparam lugar na história em virtude de políticas educacionais. A maioria delas está fundamentada nas teorias psicológicas de Jean-Piaget.

3.1 JEAN-PIAGET E O ENSINO DO TEATRO

Piaget (1896-1980) foi um estudioso dos mecanismos de representação simbólica na criança. Sua teoria do desenvolvimento cognitivo, sobre a qual refletiu em torno de meio século, traz contribuições para a compreensão da função simbólica no desenvolvimento intelectual do ser humano. Sua teoria se baseia basicamente em três etapas: imitação, jogo simbólico e representação cognitiva.

Através da análise de protocolos em que registrava a vida de seus filhos desde os primeiros dias até a adolescência, Piaget teorizou questões como o simbolismo primário (como por exemplo, a facilidade com que uma criança faz de uma tampinha de garrafa uma nave que paira no universo). A esse conceito ele atribui à capacidade de jogo consciente. Já o simbolismo secundário (ou inconsciente) consiste em assimilar conteúdos de acordo com desejos ou impressões (como no caso de uma criança, que ao ser impedida de sair de casa, resolve brincar num jogo imaginário, como se suas bonecas estivessem passeando na rua).

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TÓPICO 1 | TEATRO E ESCOLA

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FONTE: Disponível em: <www.portalsaofrancisco.com.br>. Acesso em: 22 fev. 2010.

FIGURA 2 – JEAN PIAGET

O símbolo, para Piaget, fazia parte dos procedimentos de vivência do sujeito, como meio de assimilação da realidade. Daí vem suas primeiras contribuições para o campo do jogo dramático (faz de conta) na área teatral, indo além, embasando teorias a respeito do uso da linguagem teatral com crianças e do uso da psicoterapia infantil.

As contribuições de Piaget para os estudos teatrais estão expostas de uma forma interessante no livro Jogo, Teatro e Pensamento, de Richard Courtney, publicado em 1980 pela editora Perspectiva.

3.2 MORENO E O PSICODRAMA

Outra importante vertente utilizada no ensino do teatro é o Psicodrama Pedagógico, idealizado por J. L. Moreno (1890-1974). Seus estudos tinham como fundamento um teatro que pudesse ser utilizado em empresas, escolas e outras instituições, com fins extrateatrais.

Ao desenvolver o seu teatro da espontaneidade, Moreno pretendia instigar o público a participar dos espetáculos propostos a partir de uma atuação improvisada, sem roteiros ou textos prévios. Moreno começou a perceber nessa prática teatral possibilidades terapêuticas para a cura de distúrbios comportamentais. Ele criou, então, a terapia psicodramática, que tinha como premissa a utilização de duas aplicações possíveis de suas técnicas: o sociodrama – que investiga as relações de grupo e do contexto social e cultural do paciente; e o psicodrama – que tem seu foco na vida privada e nas relações interpessoais do paciente. Ambas constituem importantes modalidades de teatro improvisacional.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

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FONTE: Disponível em: <www.irpsicodrama.blogspot.com.br>. Acesso em: 23 fev. 2010.

FIGURA 3 – JACOB LEVI MORENO

Moreno aplicou algumas de suas descobertas no ambiente educacional e contribuiu decisivamente para o desenvolvimento do teatro na educação. Entre as principais contribuições estão o trabalho coletivo – premissa de qualquer trabalho teatral, que o teatro só se desenvolve num contexto de grupo; a autoavaliação – que consiste no direito que o sujeito tem de pensar sobre si, de ter posições críticas sobre seu trabalho, e os protocolos de sessão – diários escritos pelos participantes das aulas, que pretendem relatar as situações vivenciadas em cada sessão de ensino. Ambas as contribuições são utilizadas no ensino de teatro de forma exaustiva até hoje.

Resumindo, o trabalho de grupo é fator intrínseco ao processo teatral, a autoavaliação oportuniza ao aluno a autonomia e a reflexão sobre si, tão cara ao contexto escolar na atualidade. Os protocolos de sessão sugerem um registro em que os participantes da atividade teatral possam escrever, desenhar, manifestar suas opiniões e expressar-se sobre os jogos e cenas vivenciadas.

3.3 O TEATRO DE BRECHT

Bertold Brecht (1898-1956), encenador alemão, desenvolveu um teatro avesso ao de J. L. Moreno. Seus ideais tinham como motivação lutas de interesse político-social, especialmente por sua posição marcadamente comunista. De uma maneira utópica, com objetivos de transformação do mundo por meio do teatro, Brecht fundou o teatro épico.

Nesse tipo de encenação, procura-se um não envolvimento do público com a cena, um distanciamento do fenômeno teatral que pudesse possibilitar uma reflexão, uma análise crítica da vida por meio do jogo cênico.

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TÓPICO 1 | TEATRO E ESCOLA

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Brecht acreditava que o público devia refletir conscientemente sobre as histórias, os textos, as personagens e os acontecimentos teatrais dos quais participava. Seu estúdio teatral, o Berliner Ensemble, tinha como proposta realizar encenações que apresentassem ao espectador somente os traços sociais das personagens, sem deixar que o público se envolvesse emocionalmente com as psicologias das situações encenadas.

Uma das preocupações de Brecht em seu teatro épico era conscientizar o público das lutas entre classes sociais no sistema capitalista. Ele escreveu então, as peças didáticas, que consistiam em pequenos espetáculos que eram experimentados publicamente, numa vertente pedagógica. Essas peças didáticas não eram realizadas a partir de ensaios, nem objetivavam uma montagem espetacular. Elas tinham como princípio o fato de proporcionar aos atuantes, uma forma de agir, de falar, de resignificar textos, que pudesse levá-los à reflexão sobre seus conflitos.

Mais informações sobre as peças didáticas de Brecht e sua aplicação no ensino de teatro brasileiro, podem ser lidas nos livros da professora-doutora Ingrid Koudela, estudiosa de Brecht no Brasil: Brecht: Um jogo de aprendizagem, Um vôo brechtiano e Texto e Jogo, ambos publicados pela editora Perspectiva.

NOTA

FONTE: Disponível em: <www.jornalpequeno.com.br>. Acesso em: 23 fev. 2010.

FIGURA 4 – BERTOLD BRECHT

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

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3.4 BOAL E O TEATRO DO OPRIMIDO

Augusto Boal (1931-2009) foi responsável pela fundação da estética teatral brasileira mais difundida ao redor do mundo: o Teatro do Oprimido.

Na década de 60, o encenador, dramaturgo e político, à frente do Teatro de Arena em São Paulo, criou um tipo de teatro que passeava entre o teatro épico de Brecht e os ensinamentos da pedagogia libertadora do educador brasileiro Paulo Freire. O Teatro do Oprimido consiste em uma atuação de base improvisada que pudesse mexer com as estruturas do pensamento capitalista, a partir de discussões e reflexões de cunho político e de conscientização do público através do teatro.

Uma importante contribuição de Augusto Boal para a educação em teatro é a transformação do espectador em ator, a sua crença de que qualquer pessoa pode fazer teatro. Essa ideia rompe com o pensamento de que somente atores podem pisar no palco.

FONTE: Disponível em: <www.es.gov.br>. Acesso em: 21 fev. 2010.

FIGURA 5 – AUGUSTO BOAL

Entre as principais teorias de Boal, é necessário compreender que seus estudos enfocavam:

a) O Conhecimento do Corpo – Série de exercícios que possibilitem ao aluno maior liberdade corporal, conscientizando-o de sua condição limitada e indicando-lhe caminhos de descoberta do uso do corpo na linguagem teatral e na vida;

b) Tornar o corpo expressivo – Exercícios que abusam da livre improvisação para que os alunos possam se expressar a partir de suas intuições e intenções;

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TÓPICO 1 | TEATRO E ESCOLA

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c) Teatro como linguagem – Prática teatral totalmente improvisada. Ela se desenvolve a partir da Dramaturgia Simultânea, em que os atores encenam até que haja um ponto de conflito a ser resolvido na cena por meio de opiniões do espectador; o Teatro-Imagem, onde os espectadores “dominam” o corpo dos atores, compondo imagens-estátuas para representar conflitos resoluções e mecanismos de transformações da cena; e o Teatro-Fórum, que permite que o espectador vá até a área de atuação e resolva os conflitos da cena, atuando, improvisando.

d) Teatro como discurso – Formas de atuação teatral, formuladas por Boal, com fins de atuação reflexiva. Entre elas, as mais conhecidas são o Teatro Jornal, que sugere que matérias jornalísticas sejam levadas para discussão por meio de cenas teatrais; o Teatro Invisível, que é feito em locais públicos, sem que o público saiba que a cena é de cunho teatral; e o Teatro-fotonovela, que acontece por meio de improvisações a partir de roteiros originalmente escritos para a televisão. Após a apresentação, o público é informado que se trata de um texto novelístico, e é instigado a fazer as comparações entre o sentido social da cena original e da cena improvisada, criada pelos atores diante do espectador.

Segundo as expectativas de Augusto Boal para o seu teatro do oprimido, o espectador deveria se converter em espectATOR. Essa nomenclatura seria responsável por libertá-lo da condição social de repressão que lhe foi imposta por séculos de tradição teatral do Ocidente, que coloca o espectador num lugar passivo e de privação da participação na cena.

ESTUDOS FUTUROS

Há ainda uma importante proposta metodológica utilizada no ensino de teatro, desenvolvida pela norte-americana Viola Spolin. Esta proposta será estudada na segunda unidade, quando daremos ênfase especial aos estudos de improvisação.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

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A NOVA PROPOSTA DE ENSINO DO TEATRO

Ingrid Dormien Koudela

A atual legislação educacional brasileira reconhece a importância da arte na formação e desenvolvimento de crianças e jovens, incluindo-a como componente curricular obrigatório da educação básica. No Ensino Fundamental, a Arte passa a vigorar a partir da implantação dos PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) enquanto área de conhecimento no currículo da escola brasileira, através de quatro linguagens artísticas: Artes Visuais, Dança, Música e Teatro.

Os PCN foram elaborados procurando, de um lado, respeitar as diversidades regionais, culturais e políticas existentes no país, considerando de outro a necessidade de construir referências nacionais comuns ao processo educativo em todas as regiões brasileiras. Sem dúvida, o contexto educacional brasileiro é perpassado por questões de diferentes naturezas, entre as quais encontramos os dilemas do desenho curricular a ser proposto na contemporaneidade em um país de proporções continentais e os impasses em vista da escolha dos encaminhamentos metodológicos mais adequados às diferentes regiões do país.

Os documentos apresentados pelos PCN são resultado de um longo trabalho que contou com a participação de muitos educadores brasileiros e têm a marca de seus estudos e de suas experiências. Inicialmente foram elaboradas versões preliminares, analisadas e debatidas por professores e especialistas. As críticas e sugestões apresentadas contribuíram para o processo de concretização deste documento. A versão atual, de acordo com o MEC, deverá ser revista periodicamente, com base no acompanhamento e na avaliação de sua implementação. Os conteúdos de Arte buscam acolher a diversidade do repertório cultural que o aluno traz para a escola e trabalhar os produtos da comunidade em que a escola está inserida. A apreciação e o estudo da Arte devem contribuir tanto para o processo de criação dos alunos como para a experiência estética e conhecimento da arte como cultura.

Os conteúdos de Arte são articulados com vistas ao processo de ensino e aprendizagem na escola e foram explicitados por intermédio de ações em três eixos norteadores: produzir, apreciar e contextualizar.

O Teatro é abordado nos PCN - Arte a partir de sua gênese em rituais de diferentes culturas e tempos e o jogo é conceituado a partir das fases da evolução genética do ser humano e entendido como instrumento de aprendizagem, promovendo o desenvolvimento da criatividade, em direção à educação estética e práxis artística.

Nesse sentido, o jogo teatral é um jogo de construção em que a consciência do “como se” é gradativamente trabalhada, em direção à articulação da linguagem artística do teatro. No processo de construção dessa linguagem, a criança e o jovem estabelecem com seus pares uma relação de trabalho, combinando a imaginação dramática com a prática e a consciência na observação das regras do jogo teatral.

LEITURA COMPLEMENTAR

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TÓPICO 1 | TEATRO E ESCOLA

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Um fator ressaltado no documento sobre a linguagem do Teatro é a tematização de textos poéticos que podem ser objeto de imitação crítica por crianças e jovens. O texto poético pode constituir-se em princípio unificador do processo pedagógico com o jogo teatral, permitindo liberdade e diversidade de construções.

Nessa perspectiva, os Temas Transversais incorporam as questões da Ética, da Pluralidade Cultural, do Meio Ambiente, da Saúde, da Orientação Sexual, do Trabalho e Consumo.

Amplos o bastante para traduzir preocupações da sociedade brasileira de hoje, os Temas Transversais correspondem a questões importantes, urgentes e presentes sob várias formas na vida cotidiana. Os PCN são hoje objeto de ações educacionais em todo o país, promovido através do MEC e das secretarias de educação em vários estados e municípios brasileiros. É preciso ressaltar que para a área de Arte o documento significou um grande avanço, ao incorporar como eixos de aprendizagem a apreciação estética e a contextualização que se somam à expressividade/produção de arte pela criança e pelo jovem. Essa proposta vem promovendo o potencial do Teatro como exercício de cidadania e o crescimento da competência cultural dos alunos.

[...]

Considerando a reflexão brasileira sobre as propostas pedagógicas dos cursos de formação de professores de Teatro, ressalta-se a necessidade de uma composição interdisciplinar envolvendo a formação geral, através de conhecimentos que ultrapassam os domínios da especialidade e uma formação específica, voltada para os conteúdos epistemológicos que dimensionam o saber teatro, a prática teatral e o saber ensinar essa disciplina. Esses conhecimentos devem estar articulados com todas as outras dimensões do ato educativo, desenvolvendo a competência cultural da criança e do jovem.

Do ponto de vista epistemológico, se num primeiro momento os fundamentos do teatro na educação foram construídos a partir de questões dirigidas ou formuladas pela psicologia e educação como áreas capazes de fornecer os indicadores de caminho, hoje o vínculo com a área de formação fornece conteúdos e metodologias norteadoras para a teoria e prática educacional.

Podemos dizer que a situação se inverteu, sendo que especialistas de várias áreas e em vários níveis de ensino (desde a educação infantil) buscam a contribuição única que as linguagens artísticas podem trazer para a educação. Ainda que possa ser considerada em grande parte utópica, diante da miséria da educação brasileira, o caminho afigura-se como talvez uma das últimas possibilidades de resgate do ser humano e de sua historicidade diante do processo social conturbado que atravessamos na contemporaneidade.

FONTE: KOUDELA, I. A nova proposta de ensino do teatro. Disponível em: <www.eca.usp.br/prof/ingrid/site>. Acesso em: 10 fev. 2010.

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Nesse tópico, refletimos sobre:

lTeatro no componente curricular: o desenvolvimento e surgimento do ensino de teatro na escola, estabelecendo diálogos com diferentes períodos, estéticas e perspectivas que contribuíram para a atual configuração educacional em artes no Brasil.

lPedagogia Teatral: algumas abordagens pedagógico-teatrais, por meio do conhecimento de importantes nomes que fizeram diferença na área de teatro-educação, com suas propostas e metodologias.

RESUMO DO TÓPICO 1

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O filme norte-americano Dogville, lançado em 2003 e dirigido por Lars Von Trier, propõe uma estética narrativa muito próxima da proposta brechtinana. Não podemos compará-lo com o teatro de Brecht, pois isso seria um erro. Mas podemos perceber as influências do teatro épico na ausência de cenários, nos diálogos reflexivos e nas artimanhas do diretor para que o público não se esqueça de que está assistindo a uma peça de ficção, por meio da valorização do trabalho dos atores e da narrativa posta em partes separadas, mas que se complementam como se fossem atos teatrais. Vale a pena assistir a ele e tirar suas conclusões! Aproveitem para pesquisar na internet ou em outras fontes, textos sobre o teatro brechtiano e tente relacionar o filme à linguagem teatral que ele apresenta.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 2

ASPECTOS PEDAGÓGICOS NO TEATRO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

O tópico aborda um comparativo sucinto entre os aspectos pedagógicos e os procedimentos teatrais do diretor inglês Peter Brook, fundador do Centro Internacional de Pesquisa Teatral, e do diretor alemão Bertold Brecht, fundador do Berliner Ensemble. Você já leu algo sobre ele no Tópico 1 desta mesma unidade. Seus processos de criação (e sua condução pedagógica) são analisados buscando estabelecer comparativos entre as semelhanças e as diferenças nas abordagens dos encenadores e sua contribuição para os educadores que pretendem adentrar no universo da encenação teatral principalmente na escola. Tomando como exemplo, criações teatrais de Peter Brook e Bertold Brecht você vai perceber que fazer teatro na escola é uma tarefa prazerosa e significativa.

2 A CONDUÇÃO PEDAGÓGICA

É bastante comum ao iniciar um trabalho ou mesmo uma experiência teatral na escola nos perguntarmos como começar. Por onde? Com o quê? De que forma? Há sempre uma maneira que não parece estar disponível naquele momento. Esse tipo de situação tem até nome na linguagem teatral. Isso mesmo, aquela ideia sem forma definida, que está presente, intuitivamente viva, e ao mesmo tempo ausente, pois não tomou corpo, forma, volume, de onde muitas vezes nascem grandes descobertas, tem nome, foi chamada de “intuição amorfa”.

O diretor Inglês, de quem vamos falar, tentava seguir uma ideia, sem ao

menos saber por onde começar. Acabou por modificar toda a forma estrutural no que se refere ao início dos ensaios de uma peça teatral e principalmente no que se refere a sua função de diretor. Suas ideias se destacaram por uma razão bastante conhecida, aprendeu pesquisando, tentando, comparando, e principalmente tomando consciência de que: “[...] o espetáculo está no mundo, e todos os presentes sofrem a influência do que é representado” (BROOK, 1944, p. 23) comprovando que para se fazer teatro, quem o faz, deve estar consciente do rumo a seguir com seu trabalho, pois de uma forma ou de outra, está assumindo um compromisso, moral cultural e político, consigo e com o seu trabalho, com seu público, com seus educandos. Alias, é através da escolha de uma peça, conto ou narrativa e do caminho a percorrer com os ensaios, que se define o sentido que se pretende dar ao trabalho. Repare, digo sentido, não estilo, tal equívoco não pode se sobressair.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

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As contribuições deste diretor foram muitas dentro do universo da peça teatral, conseguiu conferir aos seus espetáculos um caráter crítico e polêmico, tirando o público de sua passividade habitual. Inovou no teatro permitindo aos seus atores que fossem ensaiando de forma descontraída, “livres” para criar, trazer sugestões e ideias a serem compartilhadas. Evidentemente que essa metodologia de trabalho não o isentava de tomar decisões, assumir o controle, eliminar o desnecessário, mantendo o sentido das coisas, dos detalhes, saber para onde está rumando. Existe algo nesse modo de trabalho que detém a atenção em relação a compor a personagem, na verdade dentro desta ideia não se constrói uma personagem, muito pelo contrário, é eliminando, “desconstruindo” ações corporais e atitudes, que se conseguem em cena, não repetir, como na vida, detalhes desnecessários, digamos que se consegue assim eliminar os excessos e os supérfluos nas apresentações.

Há também uma tomada de consciência que por mais ou menos elaborado que seja um espetáculo vai existir a necessidade de improvisação, que dependendo da receptividade se é mais ou menos acalorada ou até mesmo da relação que se pretende estabelecer com o público em um “momento único”, ela pode se tornar positiva ou negativa. Pois bem, se o ator ou aluno/ator não possuir em si, de dentro para fora ou de fora para dentro, algo de orgânico em seu personagem o espetáculo perde, o público perde, e ele não se sentirá mais do que um repetidor de ações e frases sem “alma”, correndo o risco de falhar, quando na tentativa de amenizar os enganos, que por ventura possa cometer durante um espetáculo, seja ele de que proporção for.

Peter Brook possui uma trajetória de vida que chama atenção pelo fato de ter estado, no início de sua carreira, voltado para o cinema; em função do fato de não possuir nenhum tipo de experiência no teatro e assumir o cargo de diretor logo de início, e mais por perceber quase imediatamente que o caminho, o rumo que estava tomando não lhe cabia, era insensato. Isso pode ser dito, pois ele descreve seu primeiro trabalho na função de diretor, como sendo voltado para a imagem, para o cenário, para o figurino e não para o ator. Não tardou para perceber que havia algo mais significativo que os cenários complicados, figurinos superelaborados, cores contrastantes e inúmeros refletores. Todos esses elementos juntos não substituem o ator.

Existe algo no trabalho de Brook que não pode ser esquecido, em se tratando dos movimentos, das ações das personagens, ele deixa claro que realizou alguns experimentos envolvendo o não movimento, quero dizer, um ator absolutamente sem fazer nada, e que se ateve ao que isso provocaria no público, ou seja, a intrigante necessidade de se tentar descobrir o efeito que se causa ao realizar movimentos minúsculos, contidos, quase imperceptíveis que se tornaram fonte de inúmeras cenas com resultados satisfatórios. É importante ressaltar que esta minimização e ou contenção do movimento não deve ser confundida com a técnica do Butoh, teatro japonês em forma de dança.

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TÓPICO 2 | ASPECTOS PEDAGÓGICOS NO TEATRO

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FIGURA 6 – PETER BROOK

FONTE: Disponível em: <www.norway.sk>. Acesso em: 3 fev. 2012.

Como você já conhece um pouco de Peter Brook e conheceu um pouco de Bertolt Brecht é importante reconhecer alguns elementos comuns entre eles e sobre o que ambos pensaram sobre teatro. Brook afirma que “na verdade o teatro tem o potencial – inexistente em outras formas de arte, de substituir um ponto de vista único por uma pluralidade de visões diferentes”. (BROOK, 1994, p. 34). Brecht diz algo semelhante, só que em relação ao ator, “o ator deve aprender com todas as artes, pois o teatro invade todas elas”. (BRECHT, 1979, p. 6). Na realidade todas as áreas estão no teatro e o teatro tem possibilidade em todas elas, o ator é um múltiplo, que constrói no seu local de trabalho, toda uma vida, ele pode ser quem quiser, quem desejar ser, como puder, pode realizar os sonhos das pessoas ou simplesmente como propõem os diretores aqui citados, assumir seu compromisso com a verdade social, com a realidade do nosso tempo, tornando as pessoas, cidadãos conscientes.

Quanto a Brecht é importante frisar que trouxe para o teatro inúmeras inovações, teóricas e práticas e que também combateu a redução da capacidade crítica do espectador, ou seja, não aceitava que o teatro conduzisse o espectador a uma ilusão da realidade, valorizava a ideologia do texto e não admitia um teatro sem engajamento político. Em relação ao trabalho atoral, dizia algo que Brook descobriria mais tarde, “na vida real, as pessoas se mexem bem pouco, [...] e conservam seu lugar num grupo até que a situação se modifique. Ora, no teatro não é preciso mais que isso, mas até menos mudanças de posição que na vida real”. (BRECHT, 1979, p. 12) isso reforça a ideia de que a economia de gestos, dá à cena maior significado, pois não é pelo excesso que se transmite a personalidade da personagem, mas pela forma com que trata os movimentos e ações dela.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

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Brecht dava muita atenção aos detalhes de cada cena, como se cada uma delas fosse a peça em seu todo. Talvez por essa razão tenha conseguido, com tanto êxito, o efeito do distanciamento. Como diretor costumava mostrar o caminho para o ator, saía do lugar da plateia, subindo ao palco para melhor exemplificar, porém, não dava nada acabado. Quanto às discussões sobre detalhes das cenas, costumava dizer: “não falem sobre isso, façam”. (BRECHT, 1979, p. 19). Esses talvez sejam também exemplos a serem seguidos pelo professor diretor ao realizar em sala de aula com sua turma atividades envolvendo a linguagem teatral.

Outras sugestões a serem seguidas na hora de realizar uma montagem de peça ou mesmo de cenas para serem apresentadas e buscando evitar insatisfações, comuns nas relações de sala de aula, é se conscientizar de que o aluno/ator não se pode conhecer em uma peça somente seu personagem e seu texto. O que pode ajudar em termos práticos é não determinar papéis antes de permitir através de improvisações que todos os participantes experimentem todas as personagens. Esta é uma boa maneira de descobrir novos talentos e também de permitir que o participante descubra por meio de vivência, múltiplas formas de atuar. E a exemplo do trabalho de Peter Brook fazer uso do gramelô ajuda muito, além de ser muito prazeroso.

Gramelô é uma conversação improvisada sem sentido definido. A técnica teria sido desenvolvida pelos atores italianos por uma questão de necessidade no final do século XVI, quando foram banidos dos teatros parisienses para abrigos estrangeiros. Como os diálogos falados tinham sido proibidos fora do teatro oficial, os atores dell´arte acabaram desenvolvendo pela força da necessidade, o artifício do gramelô.

FONTE: Disponível em: <http://artistaemconstrucao.blogspot.com/2010/05/um-poucomais-sobre-commedia-dellarte.html>. Acesso em: 22 mar. 2012.

UNI

Uma infinidade de outras coisas poderia ser dita sobre Peter Brook e Bertolt Brecht, como proposta de compreensão ou observação mais severa das diferenças e semelhanças entre ambos, porém seriam necessários mais tempo de estudos e pesquisas mais aprofundadas. Por outro lado, o que não se pode deixar de dizer é que, com o trabalho destes homens, o público ganhou espaço no teatro, deixou de ser um mero espectador.

Peter Brook (1925) nasceu 27 anos depois de Brecht e isso não é uma lacuna grandiosa e quando Brecht partiu (1956), ele, Brook, havia iniciado seu trabalho como diretor há apenas seis anos.

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TÓPICO 2 | ASPECTOS PEDAGÓGICOS NO TEATRO

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Estes dois homens magníficos propuseram uma revolução no teatro, entendendo as mudanças de seu tempo, mudanças estas, necessárias para que nós encontremos hoje, no espaço teatral, nos apontaram muitos caminhos, mas o maior deles é o de que a arte teatral deve servir aos interesses do nosso próprio tempo.

ATENCAO

Lembre, por mais simples que seja uma apresentação teatral, ela não deve conter elementos vivenciais do cotidiano, exemplo disso é evitar A utilização do nome real do aluno/ator em atividades de sala de aula, até mesmo nas de improvisações.

DICAS

Um bom recurso quando se trabalha com alunos em sala de aula é fazer com que cada um deles escolha um objeto ou elemento que não seja de uso diário para compor uma personagem. Por exemplo, uma faixa no braço indicando quando estou representando, sem a faixa sou eu mesmo. Esse detalhe no que se refere ao teatro na escola se torna legítimo, pois evita situações de constrangimento e até mesmo bullying. Vale ressaltar que se torna imprescindível nos casos de adoção dos temas transversais em sala, proposta esta cada vez mais presente nas unidades de todo o país.

A exemplo de Bertold Brecht, pequenos cartazes com uma ou duas palavras ou informações podem percorrer o palco de uma ponta a outra em dado momento. Não precisa necessariamente buscar o efeito do distanciamento, mas fazendo uso da ideia para enriquecimento das ações e talvez como recurso para fazer participar aquele aluno mais tímido, que não deseja falar.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Nesse tópico, você viu que:

• A intuição amorfa de Peter Brook impulsionou a modificação da forma estrutural do início dos ensaios de uma peça teatral.

• Quem faz teatro deve estar consciente do rumo que pretende dar ao seu trabalho e que assume um compromisso moral, cultural e político nessa ótica.

• Aquele que dirige uma produção teatral deve tomar decisões e assumir o controle ao mesmo tempo em que deve dar liberdade e abrir espaço para a criação.

• Tanto Peter Brook como Bertold Brecht tinham em mente que o teatro transita pelas demais linguagens das artes ou pode se fazer presente em todas elas.

• Ambos trouxeram ao universo do teatro inovações teóricas e práticas de grande relevância.

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Esta é mais uma proposta de estudos. No Tópico 1 foram apresentados alguns dados sobre a vida e obra de Bertold Brecht, que tal agora conhecer um pouco mais sobre a vida e obra de Peter Brook. Elabore uma pesquisa sobre sua biografia, faça anotações sobre pontos relevantes de sua contribuição para o teatro. Converse com seus colegas e dê sugestões de como introduzir este assunto em uma sala de aula com adolescentes.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 3

A DANÇA NO TEATRO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Esse tópico pretende abrir caminhos para os estudos em dança, por meio de dois importantes nomes da dança no mundo: Rudolf Laban e Pina Bausch.

Atualmente, ensinar teatro implica necessariamente estudar possíveis

usos da linguagem corporal. Não há como propor uma prática teatral sem que os alunos se mexam, saiam de suas cadeiras, experimentem novas possibilidades de comunicação por meio da expressão do corpo. Por isso, o teatro contemporâneo tem encontrado na dança maneiras interessantes de propor a experiência gestual e vivência corporal.

Mas como um professor, que não é dançarino, e, às vezes, nem ator, pode se aventurar nos caminhos da descoberta das disponibilidades do corpo na sala de aula? Esse, certamente, é um desafio. Não traremos aqui uma receita, nem uma solução, mas uma proposta de compreensão de conceitos e práticas, vividas por Rudolf Laban e Pina Bausch, cujas metodologias tinham em comum o fato de pôr em evidência o cotidiano e retirar do dia a dia os motivos para dançar e para se expressar por meio do movimento.

Vamos aos estudos, e não fique tímido se der vontade de dançar a dança mais maluca de todas!

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

FONTE: Disponível em: <www.sortimentos.com>. Acesso em: 25 fev. 2010.

FIGURA 7 – ESPETÁCULO AUTORRETRATO, APRESENTADO NO TEATRO ÁLVARO DE CARVALHO EM FLORIANÓPOLIS, EM 2009

2 O SISTEMA LABAN

Rudolf Laban (1879-1958) foi o dançarino/coreógrafo aclamado como o maior teórico da dança do século XX. Seus estudos empenharam-se numa sistematização da linguagem do movimento em seus diversos aspectos: criação, notação, apreciação e educação. Após estudar arquitetura na Escola de Belas Artes de Paris, onde desenvolveu teorias sobre a relação do movimento com o espaço, começou a dedicar-se integralmente às reflexões sobre a arte do movimento. Em 1915, Laban criou o Instituto coreográfico de Zurique, que teve outras sedes na Itália, na França e na Europa Central.

Um dos seus principais sistemas de notação do movimento foi o Labanotation, que é utilizado até hoje por profissionais da dança, do teatro e de outros ambientes que têm o corpo como instrumento de trabalho. Esse método é um sistema de análise que tenta descrever não somente o que o corpo está fazendo, mas como ele está fazendo, por meio da descrição da estrutura e do significado do movimento. Essa notação foi desenvolvida como se fosse possível um alfabeto, ou uma partitura do movimento do corpo, capaz de transcrever qualquer alteração, mudança, velocidade de ação, hesitações, ênfases e motivações.

Laban chegou a realizar estudos sobre o tempo e a energia que os trabalhadores usavam para realizar as tarefas no ambiente de trabalho das indústrias. Ele tentou desenvolver métodos que pudessem auxiliar os operários a se concentrar nos movimentos construtivos necessários ao trabalho.

Sua luta foi em prol de um tipo de movimento artístico que estivesse mais conectado com a vida cotidiana, empenhando-se por um registro/análise do movimento que pudesse ser realizado por várias pessoas, de diversas origens, contextos e tempos.

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TÓPICO 3 | A DANÇA NO TEATRO

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Até os dias atuais as teorias de Laban são ensinadas no mundo inteiro, em Centros de estudos do corpo e Universidades. As instituições com mais renome e mais conhecidas são o LABAN, em Londres e o Laban/Bartenieff Institute of Movement Studies, em Nova York. Essas instituições constituem centros de excelência no estudo do movimento humano e contribuem para diversas áreas do conhecimento, como arte, educação, psicologia, arquitetura e antropologia.

A perspectiva do movimento sob a ótica das discussões labanianas, possibilitam que o artista e outros profissionais compreendam, desconstruam e transformem a arte do movimento nas suas vertentes coreográficas, de ordem técnica e nas questões de fruição e percepção do corpo. Obviamente, hoje o Sistema Laban é reinventado, recodificado e moldado aos dias atuais, por meio de uma perspectiva contemporânea. Mas os princípios continuam os mesmos, e é sobre eles que vamos refletir um pouco a partir desse momento.

Laban queria que seus atores/dançarinos fossem expostos a exercícios e práticas que unissem interioridade e exterioridade em prol da criação de condições para um “pensar por movimentos” (LABAN, 1978, p. 42). Em seus procedimentos com atores, Laban conscientizava-os do sentido de espaço e tempo, das habilidades de observação e de estarem sensíveis às possibilidades de dinâmica do movimento. A partir de estudos de dança, Laban aplicava metodologias que propunham que os atores usassem no teatro um corpo tridimensional, expressivo em suas potencialidades e que desse ao fenômeno teatral maior plasticidade.

Essas práticas são responsáveis, portanto, por uma transformação na maneira de conceber a criação teatral da personagem, que até então só encontrava caminhos possíveis nas construções de fundo psicológico e emocional. Laban propôs que o corpo seja o ponto de partida para a criação cênica, transpondo para a cena ações psicofísicas ao invés de atitudes emotivas, lançando novos olhares e teorias para a função da interpretação contemporânea.

FONTE: Disponível em: <www.teatrofigurinoecena.com.br>. Acesso em: 27 fev. 2010.

FIGURA 8 – RUDOLF LABAN

A organização do Sistema Laban de Análise do Movimento é dividida em quatro categorias: Corpo, Espaço, Forma e Esforço.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

2.1 CORPO

Todas as notações relacionadas à categoria corpo dizem respeito às ações físicas: andar, torcer, engatinhar, saltar, girar etc.; que estão relacionadas ao próprio movimento e as conexões entre partes do corpo e deste com o espaço; são ações físicas a gestualidade, postura; e o uso da própria tridimensionalidade do corpo; as formas de iniciar os movimentos (onde eles começam e como acabam) e as posturas assumidas no processo de construção de uma personagem.

2.2 ESPAÇO

Quando falamos em espaço, estamos nos referindo ao que no Sistema Laban é conhecido como kinesfera. A kinesfera está relacionada ao espaço individual, em suas três possibilidades de alcance: o que está muito próximo de mim, o que está muito longe a aquilo que me parece intermediário. Também é o estudo da kinesfera que permite a conscientização do ator sobre os planos de movimentação corporal vertical, horizontal, sagital; os níveis espaciais são alto, médio e baixo. Laban também sugere que o corpo explore como referenciais para a criação as formas das figuras geométricas.

2.3 FORMA

Os estudos da forma têm a ver com o modo como o corpo se relaciona com o espaço, como se pudessem desenhar traçados, que ao serem repetidos, cruzados, modificados, servem como impulso para a criação. É como se o corpo pudesse riscar e rabiscar o espaço e aproveitar os rabiscos mais interessantes para a construção de matrizes teatrais.

2.4 ESFORÇO

A categoria esforço está relacionada com o explorar todas as possibilidades de dinâmica do movimento. Diz respeito aos impulsos interiores que levam o corpo a realizar tal ação, e como essa ação se configura em um mecanismo corporal artístico. O estado de espírito de uma pessoa, por exemplo, afeta sua postura corporal, seu peso, sua relação com o espaço e a fluência de seus movimentos. É essa consciência corporal que Laban pretendia que os atores tivessem para desempenhar um bom trabalho teatral.

Laban contribui, assim, significativamente para os estudos de uma educação do corpo nas artes. Ao pensar que o ator contemporâneo é capaz de refletir sobre sua própria corporeidade a favor da cena, ele traz um novo significado para o sentido das ações físicas no processo criativo, principalmente se trouxermos para a discussão as novas noções e conceitos referentes à dramaturgia do corpo.

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TÓPICO 3 | A DANÇA NO TEATRO

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ATENCAO

Quando falamos em ações físicas, devemos compreender esse conceito sempre dentro de seu contexto. Por exemplo, Laban não utiliza esse termo no mesmo sentido que Stanislávski o utiliza em seu método das ações físicas, que estudaremos no próximo tópico. Existe ainda uma corrente teatral chamada Teatro Físico, que nada tem a ver, ou pelo menos muito pouco, com as teorias de Laban. Portanto, fiquemos atentos à contextualização dos termos vistos, pois os estudos teatrais dão muito valor ao uso do termo como conceito específico de determinado autor ou proposta metodológica.

3 PINA BAUSCH E A DANÇA-TEATRO

A alemã Pina Bausch (1940 – 2009) foi coreógrafa, dançarina, pedagoga de dança e diretora de balé. Sua estética propunha o cotidiano, as histórias da vida, por meio da dança, especificamente por meio da dança-teatro. Suas coreografias tinham como base para a construção as experiências de vida dos bailarinos, e eram criadas em conjunto. Várias delas têm relação com cidades ao redor do mundo, pois Pina Bausch via suas turnês como possibilidades de inspiração e criação.

Um espetáculo da companhia de Pina Bausch pode trazer ao público a colaboração entre diferentes formas de arte, numa estética que coloca o cotidiano em foco e presta atenção especial ao jogo das relações humanas. A cenografia de seus espetáculos possui forte impacto visual, assim como seus figurinos e o uso do espaço cênico. O uso do corpo, portanto, é a ferramenta principal do seu trabalho, unindo, num corpo que dança e interpreta, técnicas de balé clássico aos movimentos que presenciamos no dia a dia. A estética bauschiana une num mesmo espaço, dança e teatralidade, técnica corporal e técnica interpretativa.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

FONTE: Disponível em: <www.dospassosdabailarina.wordpress.com>. Acesso em: 20 fev. 2010.

FIGURA 9 – PINA BAUSCH EM CAFÉ MÜLLER

Suas repetições de partituras corporais, colagens e jogos, têm em comum o objetivo de trazer ao palco a representação cênica da vida. No seu repertório de espetáculos, os bailarinos caminham, dançam, conversam entre si e com o público, agem de maneira a quebrar expectativas e surpreender o espectador ao mesmo tempo. Repetir os movimentos é usual na dança teatro de Pina Bausch. Através da repetição de movimentos, ela tenta questionar os fundamentos e a psicologia da própria arte da cena. Tanto movimentos quanto palavras confirmam e alteram os caminhos que no palco surgem como dança-teatro.

Os gestos, repetidos várias vezes no palco, deixam de ser apenas um ato espontâneo, improvisado e passam a ser reconhecidos como um ato estético a ser reiterado, dito e feito como tal. As repetições, portanto, trabalhadas dessa maneira, provocam no ator e na plateia reações adversas e traduzem significados múltiplos. Assim, o sentido do que está sendo dançado e teatralizado é transformado ganhando novas dimensões.

Pina Bausch também instigava o uso das repetições de palavras, que se configuravam e se completavam no corpo dos atores. Por meio da relação corpo-palavra, a dança-teatro possibilitou, assim, novas leituras de mundo e apontou caminhos para novas formas de compreensão da arte.

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TÓPICO 3 | A DANÇA NO TEATRO

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Para maior apreensão da proposta de dança-teatro de Pina Bausch, sugerimos o livro: Pina Bausch e o Wuppertall Dança-Teatro: Repetição e Transformação, da autora Ciane Fernandes, publicado pela editora Hucitec em 2000.

NOTA

Bailarinos que trabalharam com Pina Bausch, como a brasileira Ruth Amarante, que ficou na companhia por 19 anos, contam que o trabalho com a coreógrafa era exaustivo e de busca extrema pela perfeição do movimento. O processo criativo era realizado através de perguntas. Pina falava, por exemplo, ÁGUA, e os bailarinos tinham que responder às perguntas relacionadas ao tema, com seus corpos. Ela fazia inúmeras perguntas, em processos que duravam cerca de uma hora e meia por dia, só para iniciar os trabalhos. Essa metodologia nos permite pensar que Pina trazia para os atores, provocações que os fizessem refletir, e assim, expressar com seus corpos o fruto dessas reflexões em forma de arte.

ATENCAO

As semelhanças entre as nomenclaturas Dança-teatro, Teatro-dança, Dança do Ator, Teatro Físico, Teatro Corporal e outra, são um sinal de que há muitos pesquisadores buscando a essência dos termos e seus significados. Mas o que esses termos têm em comum é o fato de que o corpo é o instrumento de arte mais utilizado na cena contemporânea, como resposta aos anseios por um caminho de uma produção cênica que aconteça nos entremeios do gesto e do pensamento.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Nesse tópico, você viu que:

lRudolf Laban foi um importante coreógrafo com influências em todo o mundo. Sua técnica se caracterizava por acreditar que o estudo do movimento é importante e necessário em todos os lugares: empresas, escolas, institutos de dança, enfim, onde houver gente se movimentando, utilizando o corpo. Sua proposta de análise do movimento humano se fundamenta basicamente em quatro categorias: Corpo, Espaço, Forma e Esforço.

lPina Bausch, dançarina e coreógrafa alemã, trouxe contribuições para as artes cênicas, principalmente ao perceber no cotidiano sua fonte de inspirações para o que seria mostrado e experienciado no palco. Suas criações tinham como pano de fundo situações corriqueiras da vida, e seus bailarinos, em meio a gestos e palavras, se movimentavam por meio da Dança-teatro, linguagem cênica que une elementos da expressividade corporal, aliados à interpretação e à representação de personagens.

lO próximo tópico compreende estudos sobre os mais conhecidos modelos de treinamento do ator.

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Agora que você já compreendeu que na simplicidade e nos pequenos rituais do cotidiano, que muitas vezes passam sem que percebamos, está um rico material expressivo que pode dar em dança, experimente o seguinte exercício:

Tente repetir por várias vezes uma ação, um movimento, como por exemplo, escovar os dentes, tomar uma xícara de café, abrir uma porta. Cada vez que fizer a ação, faça-a com intensidades diferentes, algumas vezes mais lentamente, outras de forma veloz, aplicando força, peso corporal, experimentando o desequilíbrio. Depois, escolha os movimentos que mais lhe agradaram esteticamente, e coloque a música de sua preferência. Aventure-se, dance e perceba a fluência e o ritmo do corpo. Se quiser, repita o exercício no encontro presencial com seus colegas! BONNE DANSE!

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 4

DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Os caminhos de aprendizagem já foram abertos no Tópico 2, portanto, neste novo tópico você vai perceber que a dança na sala de aula pode, sem dúvida, auxiliar no desenvolvimento de um processo criativo através da experimentação dos movimentos corporais, do reconhecimento e identificação das possibilidades, do contato com o imprevisto, o indeterminado.

Vai descobrir ao experimentar com seus alunos, que desafiando as regras impostas pelo equilíbrio das ações corporais cotidianas, estará rompendo pré-concepções. E mais do que tudo, testemunhara que dançar e atuar para uma criança ou adolescente é muito mais do que mostrar virtuosismo e domínio de técnica, significa desenvolver conhecimento de forma espontânea e prazerosa. É encontrar-se livre, para perceber-se dentro de um contexto que não é o seu, mas o da sua própria linguagem é a descoberta e o domínio sobre a expressão e a comunicação.

A dança na escola é parte das experiências artísticas que abrem possibilidades de estabelecimento de relações com conteúdos e saberes das outras áreas; a dança na escola possibilita o trabalho específico da Arte em suas diferentes linguagens.

2 CAMINHOS PEDAGÓGICOS PARA A DANÇA - TEATRO

“A criança humana não vive dentro do corpo como uma lesma em sua concha.

O ser humano vive no mundo com seu corpo.” (Langeveld)

Centrada nos estudos do corpo, a história da dança vem de longa data tentando abrir caminhos para mostrar que não se pode condenar o ser humano à imobilidade. Ele tem o direito nato de se expressar através de gestos, de pulos, de saltos, de movimento. Portanto, dançar na escola significa ir além, se sobrepor, não apenas executar mecanicamente uma série de gestos e movimentos ensaiados exaustivamente. A dança na escola é mais do que isso, é contextualização, é

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

abertura de possibilidades. Portanto, o educador jamais pode esquecer que o ensino da dança na escola vai além das apresentações, deve estar ciente de que é a oportunidade para o autoconhecimento e sua construção. De modo algum deve estabelecer uma relação autoritária, tão pouco utilizar termos como vocês fazem, eu observo. O educador não necessariamente deve ser bailarino, mas deve ao menos se dispor a construir junto.

O que se vai ensinar não deve estar ligado às tradições populares de passos marcados, tão pouco a manifestações expressivas de um conjunto de passos idênticos, onde se repetem mecanicamente as ações, em uma sequência interminável e enfadonha. Lembre-se, a dança deve respeitar as individualidades, valorizar a interpretação pessoal. Em sala de aula, todos podem dançar, não importando o que irão dançar, nem de que maneira, a oportunidade é para todos. O ponto de partida para a dança em sala de aula pode ser dado pela improvisação individualizada e evoluir para uma forma compartilhada que engloba experiências múltiplas enriquecidas de sentido para quem está participando.

3 COMPARTILHANDO IDEIAS

Existem listas intermináveis de ideias, dinâmicas e improvisações para serem aplicadas em sala de aula com alunos. Muitas vezes, o método mais simples torna-se eficaz. Com o passar do tempo e com aprofundamento, você vai descobrir que uma ideia leva a outra e que a pesquisa aliada à prática soma a cada dia como experiência e eleva os resultados.

3.1 OPOSTOS CORPORAIS

Prepare um CD contendo uma série de músicas de ritmos e melodias distintas – vale dizer que as músicas podem ser bem atuais e também antigas, dessas bem conhecidas em tempos idos, distintas da idade deles; afaste a mobília, reúna a turma no espaço disponível e para aquecer, peça que se movimentem, ocupando a maior parte possível do espaço, lembre-os de que devem evitar conversas – é incrível, mas ao mexer o corpo quando estamos na escola e principalmente em sala de aula gera uma necessidade imensa de se falar, isso desaparece com o tempo, conforme a turma vai se habituando aos exercícios – e seguir corporalmente as mudanças que ocorrem nas músicas. Estabeleça planos altos e baixos, movimentos amplos e contidos, trabalhe

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TÓPICO 4 | DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

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3.1.1 Reconstrução corporal coreográfica

Retome a aula do ponto em que ela encerrou, ou seja, solicitando que os alunos observem seus desenhos e reconstruam corporalmente sua descoberta. Divida a turma em duas, um grupo dos que querem um ritmo mais lento e o outro do ritmo mais acelerado. Os grupos devem, a partir dos movimentos individuais, determinar a sequência a ser repetida entre eles, primeiro o aluno A, depois o C, em seguida o G. Feito isso, escolhem a música e realizam repetições de seus movimentos individuais adequando ao ritmo escolhido. A partir daqui é só explorar os detalhes e quem sabe montar uma coreografia.

3.2 DANÇANDO E TEATRALIZANDO COM OS MESTRES DA PINTURA

O objetivo aqui é criar uma personagem, fazendo uso de imagens artísticas, a tarefa dos alunos é dar a ela expressão física tendo como ponto de partida o movimento proposto na imagem. Para isso você pode recorrer a obras de artistas conhecidos da pintura, como Pedro Pablo Rubens, Edgar Dégas, Pierre August Renoir, ambos impressionistas, ou mesmo obras de Joaquín Sorolla, Henri Matisse do Fovismo e de brasileiros como Heitor dos Prazeres - o modo como os artistas desenvolvem o seu trabalho pode servir como fonte de inspiração. Em resumo, o aluno visualiza a obra, imagina a música que está tocando, recria corporalmente a obra e vivencia o andamento da cena. Esse exercício pode ser feito aos pares, individualmente ou mesmo no coletivo. Outra dica é fazer uso de esculturas como as do artista Pedro Dantas (SC) que representa a dança em peças bronze.

com os opostos. Após alguns minutos desta atividade, pare e peça aos alunos que escolham um movimento a ser repetido de forma lenta e outro agitado. Em seguida, cada um individualmente pode apresentar sua escolha pessoal. Como tarefa peça que desenhe seus movimentos fazendo uso do boneco palito articulado e que determine qual deles deve ser realizado de forma lenta e qual deve ser rápido.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

FIGURA 10 – DANÇA DE ALDEANOS (1635) DE PETER PAUL RUBENS

FONTE: Disponível em: <www.telefonica.net/web2/danzacreativa/DanzaPintura.htm>. Acesso em: 5 fev. 2012.

FONTE: Disponível em: <www.telefonica.net/web2/danzacreativa/DanzaPintura.htm>. Acesso em: 5 fev. 2012.

FIGURA 11 – FOYER DE DANÇA DE ÓPERA (1872) DE EDGAR DEGAS

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TÓPICO 4 | DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

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FIGURA 12 – LE MOULIN DE LA GALETTE(1876) DE PIERRE AUGUST RENOIR

FIGURA 13 – O BAILE EM SEVILHA (1914) DE JOAQUIM SOROLLA

FONTE: Disponível em: <www.telefonica.net/web2/danzacreativa/DanzaPintura.htm>. Acesso em: 5 fev. 2012.

FONTE: Disponível em: <www.telefonica.net/web2/danzacreativa/DanzaPintura.htm>. Acesso em: 5 fev. 2012.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

FIGURA 14 – A DANÇA (1910) DE HENRI MATISSE

FIGURA 15 – SAMBA NA NOITE (1957) DE HEITOR DOS PRAZERES

FONTE: Disponível em: <www.telefonica.net/web2/danzacreativa/DanzaPintura.htm>. Acesso em: 5 fev. 2012.

FONTE: Disponível em: <www.espacoarte.com.br>. Acesso em: 5 fev. 2012.

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TÓPICO 4 | DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

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3.3 TEMÁTICA MUSICAL NA DANÇA-TEATRO

Uma experiência significativa pode advir da junção da música com a dança e o teatro. A ideia inicial pode partir de uma temática. Para melhor exemplificar farei uso de uma experiência já aplicada. Durante longos anos trabalhei em uma Unidade Escolar que ao final de cada ano realizava uma mostra de arte envolvendo as diferentes linguagens artísticas. Todos os alunos, respeitadas às condições, as habilidades, as afinidades e identificações, participavam. Para que este evento se concretizasse não era necessário que se trabalhasse única e exclusivamente para sua realização. A ideia chave e os objetivos a serem alcançados eram de que seja lá o que fosse apresentado deveria ser o resultado final de um processo prazeroso e significativo de aprendizagem. Portanto, a condição essencial se pautava na aprendizagem por “encantamento” e o que se fazia ao iniciar cada ano letivo era escolher um tema e pôr mãos à obra ao longo do ano, sem a pressão que normalmente acomete professores e alunos quando se sentem na obrigação de apresentar algo que aparentemente está além de seus anseios.

Dentre as temáticas escolhidas, uma delas foi trabalhar com a noção de tempo - tempo vivido e tempo sentido – e tudo o mais que pudesse estar relacionado. Com uma das turmas, a ideia partiu de uma música bastante conhecida do grupo Balão Mágico, Tic-Tac. Ela inicia com um diálogo entre o grupo e o convidado, o personagem Cascatinha. O primeiro passo após a seleção dessa música, entre algumas outras também possíveis, foi apresentar para a letra e melodia. Não demorou para que todos estivessem com ela na ponta da língua e cheios de entusiasmo e ideias para iniciar os ensaios; escolher quem representaria que personagem transcorreu de forma muito natural e lúdica. Formar um grupo coeso para dançar e cantar o refrão e outros elementos individuais para representar o tempo através de movimentos corporais foi fácil. Desse modo, ao escolher esta música como base para atividades envolvendo dança e encenação foi oportunizado para que todos os alunos da turma participassem e pudessem pisar no palco, serem vistos pelos espectadores, seus pais, parentes e amigos, como coautores do que se concretizara ali.

3.4 PINTURA E POEMA DRAMÁTICO

Diferentes versões para uma mesma cena este recurso foi utilizado em uma mostra cuja temática homenageava o artista plástico Candido Portinari em seu centenário. De início, a tarefa não parecia fácil, porém, às vezes, como educadores, precisamos enxergar um pouco além e apostar na intuição. O artista em questão, ao longo de sua vida, pintou uma infinidade de telas e painéis com temáticas variadas. Em uma delas, denominada “Os retirantes”, expressou plasticamente a realidade sofrida de pessoas que nas piores condições possíveis de existência buscavam uma vida melhor longe do lugar em que até então viviam. Uma seleção destas imagens propiciou material suficiente para o ponto de partida. Conhecidas as obras, realizados exercícios de construção corporal das personagens, que permaneciam ainda de forma estática, como uma tela viva, observava-se a falta

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

de algo mais consistente, um texto talvez. Eis que surge a resposta, ela veio da obra de João Cabral de Melo Neto em “Morte e Vida Severina”, um poema dramático, muitas vezes, encenado nos teatros brasileiros, já que retrata a trajetória do migrante nordestino, um tema bastante recorrente nas linguagens artísticas devido a sua relevância. Trechos da obra se mesclavam às imagens das telas e à corporalidade já expressa das personagens criadas pelos alunos. Bastou unir o texto à ideia inicial da imagem, dividir a turma em equipes de acordo com o número de personagens de cada tela e fazer acontecer. O palco foi preenchido por uma série de telas vivas que iniciavam estáticas, preenchendo apenas os espaços disponíveis, em ritmo lento uma a uma iniciavam os movimentos - estes movimentos iam tomando força e ritmo acentuados na medida em que exigiam mais ou menos dramaticidade - as palavras do poema exprimiam sonoridade quase musical, os corpos dançavam sem sair do lugar, focos de luzes acendiam e apagavam conforme avançava o texto e alternava o grupo.

FIGURA 16 – OS RETIRANTES (1944) DE CANDIDO PORTINARI

FONTE: Disponível em: www.portinari.org.br Acesso em: 5 fev. 2012.

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TÓPICO 4 | DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

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FIGURA 17 – CRIANÇA MORTA (1944) DE CANDIDO PORTINARI

FONTE: Disponível em: <www.portinari.org.br>. Acesso em: 5 fev. 2012.

Morte e Vida Severina - João Cabral de Melo Neto

O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI

— O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos,

que é santo de romaria, deram então de me chamar

Severino de Maria como há muitos Severinos

com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria

do finado Zacarias.

Mais isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia,

por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria.

Como então dizer quem falo ora a Vossas Senhorias? Vejamos: é o Severino

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

da Maria do Zacarias, lá da serra da Costela,

limites da Paraíba.Mas isso ainda diz pouco:

se ao menos mais cinco havia com nome de Severino filhos de tantas Marias

mulheres de outros tantos, já finados, Zacarias,

vivendo na mesma serra magra e ossuda em que eu vivia.

Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida:

na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra,

no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas

e iguais também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos iguais em tudo na vida,

morremos de morte igual, mesma morte severina:

que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta,

de emboscada antes dos vinte de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença

é que a morte severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida).Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina:

a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima,

a de tentar despertar terra sempre mais extinta,

a de querer arrancar alguns roçado da cinza.

Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias e melhor possam seguir a história de minha vida,

passo a ser o Severino que em vossa presença emigra.

FONTE: Trecho de Morte e Vida Severina de João Cabral de Melo Neto. Disponível em: <wwwculturabrasil.org>. Acesso em: 5 fev. 2012.

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TÓPICO 4 | DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

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DICAS

Por mais significativa que sejam as experiências escolares, com o passar do tempo elas se tornam pouco claras na memória, ainda mais que vivemos em um mundo que oferece milhares de informações em um curto espaço de tempo. Para evitar esquecimentos e avaliar com sobriedade a prática, ofereça a seus alunos uma alternativa simples, a de fazer uso de uma caderneta ou minidiário onde ele possa a cada encontro/aula fazer suas próprias anotações e relatos, guardar seus textos, colar imagens e transcrever apontamentos. Onde possa expor suas dúvidas e tecer críticas e sugestões. Esse instrumento pode ser bastante útil na hora da avaliação, pois refletir sobre a prática é um dos meios mais eficazes de aprendizagem. Além de propiciar crescimento para o professor e para o educando.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

LEITURA COMPLEMENTAR

A DANÇA NA ESCOLA

Joana Lopes

Inúmeras são as justificativas para a existência da dança e do teatro na escola. Posso pensá-las do ponto de vista da história geral das artes, da pedagogia geral e/ou das disciplinas que abordam o movimento humano: áreas que interferem no crescimento psicofísico com resultados nas áreas de conhecimento técnico-científico.

Considere-se, no entanto, que é a realidade social que deve nortear as decisões artísticas e pedagógicas, sem as quais não sairemos do lugar, tornando-se a dança o lugar-nenhum.

Esse lugar social modifica-se rapidamente no Brasil desde a Lei nº 5692, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que instituiu a educação artística, na década de 1970, no período da ditadura militar do General Médici, até a inclusão atual da dança e de outras artes na grade curricular de ensino.

Contudo, a dança não alcançou ainda o seu lugar na educação, e menos ainda na escola, que teima em não aceitar o corpo para além do pecado ou das necessidades especiais apresentadas por seus alunos.

O corpo na escola

O corpo que dança aponta para a inefável poesia dita pelo movimento minucioso, que mais lembra um junco envergado por ventos andarilhos. Dança, poesia do corpo, é um discurso oculto à espera que o espaço se abra, assim como a boca aberta deixa passar palavras que simbolizam as emoções do poeta.

A escola, lugar privilegiado da educação, a partir das novas diretrizes, tornou-se parceira das artes. Mas pergunto-me: voltou-se para olhar a longa, fastidiosa, rotineira e indispensável tarefa de “ler o mundo” também através do ato da criação sensível?

Essa pergunta tem uma resposta multifacetada e dependente do entorno social, da formação do professor e da disponibilidade política para aceitar uma atividade aparentemente improdutiva que, entretanto, gera uma certeza: de que as artes não necessitam da grandiosidade de materiais, e sim da compreensão das suas materialidades. (OSTROWER, 1987).

Leio o mundo com a razão, os cinco sentidos e mais a imaginação, que ultrapassa os sentidos e cria, inclusive, um mundo sem sentidos. A dança não deixa dúvidas de que é assim.

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TÓPICO 4 | DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

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Mas como fazer dança na escola se o corpo que ela produz pode ser visto em duas figuras, mediadas pelo representante da instituição escolar, como um NÃO-CORPO: um constrito que tenta respirar e outro cuja melhor definição encontro na figura de “O Grito”, de Munch? Saibamos ou não, existe um Corpo-Escola. Podemos vê-lo por meio das chamadas pedagógicas que o orientam como um corpo de ficção.

Cena 1

A professora ou outro representante da instituição diz: – Não olhe para trás. Olhe pra frente e preste atenção! O estudante pensa: – Mas para que serve minha função de rotação e a curiosidade que esta contempla? O inspetor de aluno diz: – Pare de andar em círculos, de um lado para outro, e ande em frente. Você não sabe que a reta é o caminho mais curto entre dois pontos? O estudante pensa: – E se o espaço for curvo? Einstein me perdoaria? O professor diz: – Não esconda as mãos no colo! O estudante pensa: – Mas eu não aguento até o recreio. – Você vai se esborrachar com esta mania de andar de costas! – Andar de costas relaxa a minha coluna estirada no banco duro.

Cena 2

O professor diz: – Pare de balançar as pernas e ficar mexendo os pés! O aluno pensa: – Eles estão formigando de ficar parados e duros.

Quem presenciou e ouviu outras tantas ordens semelhantes pode ampliar essa lista de exemplos, reconhecidos em manual pedagógico e na prática cotidiana das escolas, geralmente gerenciada pelo professor, que ocupa o lugar principal da cena (ator-personagem solista), em um teatro cuja plateia é cativa nos duzentos e tantos dias de presença anual obrigatória na escola.

Nesse sentido, a literatura brasileira, entre alguns magníficos exemplos, apresenta duas obras imperdíveis sobre a infância e o corpo “gerenciado” pela autoridade: “Infância”, de Graciliano Ramos, e “Dona Margarida”, de Roberto Athayde, peça teatral encenada em mais de vinte países com as mais importantes atrizes da cena mundial.

Essas obras literárias também demonstram que a educação corporal assim processada desorienta. Tendo a disciplina institucional como vetor, reafirma um conteúdo que nega a experiência como apoio formativo e o corpo como lugar de múltiplos saberes.

A dança como experiência formativa

A dança no contexto formativo é essencial na criação da “nova cara da escola”, como bem expressa Paulo Freire. Certamente sem incentivar uma maquiagem, mas pretendendo uma nova escultura, ágil e humana, que valorize a experiência na atitude de aprendizado para integrar conhecimentos.

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UNIDADE 1 | TEATRO E EDUCAÇÃO

A dança não é uma atividade aparente: integra conhecimentos. Chego a essa conclusão após diálogos inesquecíveis com o filósofo da educação Paulo Freire, na década de 1980, quando fui chamada para compor o grupo que iria compartilhar a análise crítica da escola pública da cidade de São Paulo, a partir de nossas respectivas disciplinas ministradas nas universidades públicas.

Naquela época defini uma área para minha atuação de docência e pesquisa, denominando-a Artes Cênicas Integradas (teatro-dança-circo-ópera-cinema-TV e outras artes da representação), permanecendo em uma escola pública com um laboratório de arte durante o curto período de um ano e meio.

Quase vinte anos passados, aquilo que criticamos na época continua sendo observado, embora de forma menos agressiva.

No universo das artes cênicas integradas, o ato dançar é um discurso corpóreo sem mediação da palavra, fato esse que, se reconhecido, deixará a dimensão do banal, descartável e apenas recreativo para ocupar um lugar ao lado dos conteúdos voltados para as necessidades.

Para tanto, como em qualquer outra área, a repetição de técnicas substituindo a experiência como apoio formativo abre um abismo entre o pensar e o fazer. Não se trata de falar sobre e não fazer, mas de fazer e valorizar a palavra como expressão de emoções, pensamentos e decisões harmonizados com o movimento essencial do corpo.

Assim, fazer danças é ter no movimento a materialidade do conteúdo que nos interessa conhecer (LOPES, 2007). O corpo da pessoa – criança, adolescente, adulto, idoso – “lê e expressa o mundo” (PAULO FREIRE, 1992) e é lido por ele (o outro), mas, enquanto dança “alguma coisa acontece no meu coração” (Caetano Veloso), criando um corpo outro, corpo do outro, diverso daquele que se mobiliza para o esforço comum da função cotidiana renovada, porque não há tarefa corporal que se dê com o mesmo esforço “day-by-day”.

Quando digo “ler o mundo”, quero implicitamente dizer percebê-lo na sua inteireza, pois será com minha totalidade que vou dançá-lo, embora possa fazer uma dança apenas com as mãos (LOPES, 2007). O meu desejo será sempre sentir que a dança nasce dos pés e se expande em direção à cabeça.

Portanto, o CORPO ESCOLAR necessita – para resolver-se – dos pés, cabeça, tronco e membros, e não apenas de vê-los nos esquemas tratados na biologia ou nos esqueletos de plástico. O adestramento das habilidades corporais para a dança, tendo o movimento como seu conteúdo, implica tecer relações sensíveis e intelectuais entre respirar e andar-dançar, dimensionar o peso em relação à velocidade, verificar o tempo rítmico em função da dimensão espacial: aprender que estamos com o espaço, e não apenas no espaço, ou seja, mover-se com uma determinada qualidade de esforço movimento na vida e na arte.

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TÓPICO 4 | DANÇA-TEATRO NA ESCOLA

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A pedagogia da dança: apontamentos

Desde a década de 1910, a dança é considerada educativa, com Laban oferecendo à pedagogia um sistema de criação e notação, e por isso se tornando o primeiro cientista moderno da dança. A codificação labaniana dá autonomia à dança e aponta para ela como uma referência poética: ela é um desenho rítmico traçado pelo corpo. Por exemplo: quando vejo um dos nossos dançarinos sambar, mesmo que não ouça a música, sinto o ritmo pelo desenho. Por outro lado, vendo Suzanne Link dançar em Bolonha, durante um colóquio sobre dança educativa, sentia com clareza, através do desenho rítmico da bailarina alemã, delicadas sonoridades ou, às vezes, agressivos acordes “beethovenianos” revelados pelos movimentos.

Reconhecemos, então, que a dança, para a educação, passa por duas vertentes pedagógicas apontadas por Freire: revelar, desvelar, aluno versus professor; aquele que não sabe versus aquele que sabe, alternando-se mutuamente para expressar um discurso corporal necessário à aprendizagem.

A dança na formação é, a meu ver, um campo de revelações em que ambos – professor e aluno – caminham surpresos com as descobertas regidas pelas leis gravitacionais. Conhecer essas leis, interessar-se por elas, analisá-las, não exclui o prazer de dançar. Pelo contrário, reforça a criatividade. Os estudos dos movimentos que um mestre-sala e uma porta-bandeira realizam por anos (alguns desde a infância) reafirmam que a dança educativa revela a dança pessoal e pode alterar o tempo-espaço coletivo (o carnaval, por exemplo) para novas concepções de educação e escola.

REFERÊNCIAS

LOPES, Joana. Cordão de Maravilhas. Espetáculo Prá Weildt o Velho. Bienal Internacional da Dança: SESC, 2007.

OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processos de Criação. São Paulo: Vozes, 1987.

FREIRE, Paulo. Entrevista concedida à autora. São Paulo, 1992.

RAMOS, Graciliano. Infância. São Paulo: Record, 1980.

FONTE: Disponível em: <www.metodista.br>. Acesso em: 20 fev. 2012.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Nesse tópico, você viu que:

• A dança na sala de aula auxilia no desenvolvimento dos processos criativos.

• Atividades envolvendo dança-teatro na escola é a oportunidade de participação de todos os educandos e que estabelece relações com outro saberes.

• Dominar uma técnica ou ser bailarino não é pré-requisito para o educador propor atividades envolvendo dança-teatro na escola.

• Dança-teatro é o “casamento” perfeito com temáticas de obras das artes visuais, com música e texto.

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AUTOATIVIDADE

Como autoatividade, neste tópico, a sugestão é que você faça a leitura complementar analisando o que a autora diz a respeito do corpo no espaço e nas relações que se estabelecem a partir do reconhecimento deste corpo. Faça suas anotações e discuta com seus colegas acadêmicos.

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TÓPICO 5

TREINAMENTO DO ATOR

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

O Tópico 3 foi pensado para que você consiga compreender o sentido do treinamento do ator no teatro contemporâneo. Ele está estruturado de uma forma que seja possível conhecer como surgem os primeiros sistemas de metodologias do trabalho do ator, contextualizando essas noções com o panorama atual.

Começamos com Stanislávski, o pai do teatro contemporâneo. Sua influência é nítida até hoje, suas técnicas e procedimentos foram um impulso para os estudos em interpretação no começo do século XX. O conhecimento do sistema stanislavskiano tem um caráter fundamental para todos os interessados em artes cênicas. Não há como estudar teatro sem estudar suas teorias.

Em seguida, apresentamos Grotowski, que contribui para as artes cênicas no que diz respeito aos diálogos possíveis com outras áreas de estudo, e principalmente no que se refere aos estudos da interação entre o ator e o espectador.

Para encerrar o tópico, estudaremos a antropologia teatral, conceito muito difundido e praticado por grupos de teatro hoje em dia. Compreenderemos como o teatro se articula em meio aos tempos pós-modernos, e qual a diferença entre teatro institucional, teatro de pesquisa e teatro de grupo.

Bom estudo e bom treinamento intelectual!

2 STANISLÁVSKI

Constantin Stanislávski (1863-1938), ator e diretor de teatro russo. Ele foi o fundador do Teatro de Arte de Moscou, em 1898. Suas elaborações teóricas foram e são até hoje de muita importância para a arte de interpretação. Numa época em que recursos interpretativos advindos de clichês dominavam a cena, Stanislávski desenvolveu o que hoje chamamos de Sistema Stanislávski, que o descreveu ao longo dos livros Minha vida na arte, A preparação do ator, A construção da personagem e A criação de um papel.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

FONTE: Disponível em: <www.theactorsstudio.org>. Acesso em: 27 fev. 2010.

FIGURA 18 – CONSTANTIN STANISLÁVSKI

O sistema consiste em uma série de procedimentos e técnicas, que o autor apresentou em forma de conjunto de regras, diretrizes e exercícios que pudessem ser uma ferramenta para o trabalho do ator, visando a uma interpretação de qualidade, a partir do total controle sobre as ações físicas. É interessante observarmos que o sistema foi reelaborado muitas vezes, pois a pretensão de Stanislávski era de que seus ensinamentos fossem úteis a diversos tipos de atores e grupos de teatro e pudesse ser aplicado a diferentes tipos de propostas cênicas. Por isso, não há como definir ou delimitar as fronteiras de alcance da influência stanislavskiana, pois ao redor do mundo seus livros são lidos, reinterpretados, reexperimentados e consideram os contextos e as vertentes possíveis dentro da metodologia proposta pelo autor.

Stanislávski foi o primeiro estudioso do teatro que uniu a criação da personagem a um significado psicológico. Ele defendia que o ator precisava saber tudo a respeito de seu personagem, colocar-se no lugar dele para entender o contexto e as situações vividas. Entre suas técnicas, um conhecido treinamento era trabalhar com as possibilidades da personagem, através do “Se”: Se essa personagem fosse muda? Se ela tivesse uma enorme família? Se ela fosse mal atendida em determinado ambiente? Para o sistema stanislavskiano, isso possibilitava maior conhecimento psicológico da personagem, entender o porquê das suas atitudes e sua relação com os outros e com as coisas.

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TÓPICO 5 | TREINAMENTO DO ATOR

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Para compreendermos um pouco melhor no que consistia o sistema stanislavskiano de interpretação, vamos conhecer suas principais características. Porém, não é tão simples essa compreensão, visto que nem Stanislávski defendeu sempre as mesmas ideias, pois ele próprio afirmava que suas teorias estavam em experimento e eram, portanto, passíveis de mudança:

lRelaxamento – Eliminação de qualquer tensão ou pensamento preocupante externo à cena. Voz e corpo do ator precisam estar relaxados e à disposição do espetáculo.

lConcentração – O ator deve estar 100% concentrado na sua personagem, no que a cerca, e no espaço do palco, de modo que isso possibilite, inclusive, que esqueça que o público assista a ele.

lDetalhes – O ator deve encontrar técnicas de interpretação que estejam distantes dos clichês, buscando compreender como cada personagem reagiria, à sua maneira, a diferentes situações.

lVerdade interior – Consiste na representação da vida interior da personagem, como a teatralização de seus pensamentos e reflexões, que até então não tinham espaço nos palcos. Isso auxilia o trabalho do ator, para que construa uma personagem que tenha traços de veracidade, que seja crível por parte do público. É uma abordagem de cunho psicológico, que pretende deixar a personagem mais humanizada.

lAção – Tudo o que é feito no palco deve ser pensado como ação e feito com tal importância. Para auxiliar esse processo Stanislávski sugere que três perguntas devem ser respondidas: O QUÊ? (Ex.: tomar banho), POR QUÊ? (Ex.: para ir ao seu baile de formatura) e COMO? (Ex.: a personagem está nervosa e ansiosa pela importância do momento).

lLógica da personagem – Identificar as linhas de ação da personagem, como se fosse possível textualizá-la, ou descrever suas ações em partituras, chamadas unidades de linha. Qual o objetivo principal da personagem no espetáculo? Quais seus objetivos em cada cena, em cada relação?

lAtuação em grupo – Entender que a personagem não apenas fala. Ela escuta, presta atenção, age e reage ao que está acontecendo, colaborando para a harmonia do conjunto da cena. Stanislávski nos conscientiza de que o ator deve a todo tempo representar, não se distanciando da personagem se ela não está em foco em determinado momento da cena. Isso acontecia com atores que, ao não darem textos, ficavam olhando a plateia, ou preocupados com outras situações que não faziam parte da situação cênica.

lAção psicofísica – A ação é intencional. É dela que provêm as emoções. No corpo, o ator encontra as respostas, o ponto de partida para a representação.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

Clichê, no teatro, tem a ver com o uso de maneiras fáceis e conhecidas de interpretar diferentes situações. Por exemplo: colocar as mãos nas maçãs do rosto e abrir a boca para dar a ideia de espanto, levar as mãos à testa para demonstrar preocupação, fazer duas chiquinhas em uma pessoa adulta que vai representar uma criança. Usar os clichês no teatro significa preguiça de pesquisa, usar aquilo que já está pronto e configurado nas situações corriqueiras do dia a dia. O que Stanislávski propôs é que o ator fugisse dos clichês em detrimento de uma interpretação que pudesse valorizar as particularidades de como cada personagem lida com situações que são suas e carrega traços individuais.

AUTOATIVIDADE

O sistema de Stanislávki influenciou gerações de atores e diretores. Até hoje existem grupos e companhias que pesquisam suas teorias e trabalham nessa linha. Para se ter uma compreensão melhor de seus ensinamentos, é necessário participar de cursos e experimentar as técnicas sugeridas, pois a ênfase do sistema está no trabalho prático sobre a construção de personagens. A seguir conheceremos outro diretor teatral, Jerzi Grotowski, que colaborou para a evolução dos estudos teatrais, principalmente por suas noções de Presença do Ator e Presença do Espectador.

3 GROTOWSKI

Jerzy Grotowski (1933-1999) foi um diretor de teatro polonês, cuja contribuição para o teatro contemporâneo se deve às suas teorias em defesa de um teatro ritual, baseado no trabalho psicofísico do ator, que não necessitasse de um número muito grande de público, nem de figurinos ou cenários muito “espetaculares”. Essas teorias estão descritas num único livro escrito pelo diretor: Em busca de um teatro pobre, publicado no Brasil pela editora Civilização Brasileira, em 1987. Nessa obra de Grotowski, o que vemos é a experimentação do trabalho detalhado do ator, o artesanato da cena e um completo estudo sobre todas as etapas da produção cênica. Grotowski defende que o teatro não deve competir com a espetacularização e com o cinema, pois seu trabalho se fundamenta basicamente na pessoa do ator e na sua relação com o espectador.

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TÓPICO 5 | TREINAMENTO DO ATOR

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FONTE: Disponível em: <www.artsvivants.ca>. Acesso em: 28 fev. 2010.

FIGURA 19 – MONTAGEM GROTOWSKIANA O PRÍNCIPE CONSTANTE, DE 1966.

Utilizando o corpo como única ferramenta para o material criativo, este deve ser treinado de forma a responder aos impulsos psíquicos do ator, sem resistir aos momentos de criação. Grotowski propõe a união, ao mesmo tempo, da espontaneidade e da disciplina, para que o ator tenha como resultado, um trabalho que dê conta dos objetivos teatrais. Segundo Grotowski, o contato com o público é fundamental para que o teatro exista. Cenários, figurinos, iluminação são apenas armadilhas, não sendo necessárias para o símbolo e o significado teatral.

O adjetivo “pobre” refere-se a um teatro que esteja desprovido de qualquer recurso que sirva de auxílio ou “muleta” para a representação do ator. Na Polônia, seus espetáculos eram representados em pequenos espaços, geralmente com paredes pretas e com atores vestidos com roupas simples. Nos ensaios, Grotowski desenvolvia exercícios que visavam ao controle e conhecimento do corpo, que era treinado num espaço que não precisava ser delimitado especificamente para a representação. Isto porque a relação com os espectadores deveria acontecer de maneira quase religiosa, em comunhão, como um rito em que fosse possível a união de todos os tipos de arte.

A proposta no começo dos anos 60 de colocar o ator frente à plateia, sem desnível, num mesmo espaço, foi revolucionária para a época. Ao longo de anos, as principais experiências de Grotowski tinham como fundamento a proximidade e interação como o público e o ato efêmero da performance.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

A partir da premissa de que a essência do teatro é o encontro entre espectador e ator, Grotowski trouxe para o teatro uma reflexão que nos importa enquanto defensores da arte teatral frente às massas populares alcançadas pela televisão e pelo cinema. Assim, urge repensar e divulgar que o teatro é necessário e que se caracteriza pelas presenças que se unem num mesmo espaço a fim de compartilharem a mesma experiência.

O trabalho de Grotowski pode ser compreendido por meio de cinco fases:

lTeatro de espetáculos (1957 a 1959) - Época em que Grotowsky foi a Moscou e estudou as teorias de Stanislávski e realizou os primeiros ensaios, identificados como juvenis. Grotowski começa a pôr em prática algumas características que mais tarde apresentará como o cerne de seu trabalho: um teatro autônomo com relação ao texto, o físico do ator no centro da cena e a interação com o espectador. É nesse período que ele cria o Teatro Laboratório – Instituto de investigação do ator, no qual passa a dedicar mais tempo à investigação cênica, no intuito de encontrar metodologias de treinamento de ator.

lTeatro participativo ou Parateatro (Década de 70) – Grotowski passa a deixar de preparar espetáculos e investe em pesquisas que se interessam pelos lugares da performance, dos rituais e do encontro entre pessoas. Suas experiências são pouco divulgadas, e em sua maioria não são registradas para gerações futuras. Os encontros propostos por Grotowski não eram realizados somente com atores, mas contavam com a participação de músicos, terapeutas, psicólogos, antropólogos, e eram realizados em diferentes espaços: espaços fechados, florestas e montanhas.

lTeatro das Fontes ou Teatro das Origens (Final dos anos 70 e início da década de 80) – Grotowski começa a voltar a pensar em interesses religiosos, históricos e antropológicos que sempre o motivaram, com olhares atento às manifestações corporais do homem. Suas investigações já não encontravam solo fértil somente no teatro, mas eram discussões sobre práticas rituais, como transes, cultos, possessões, orações, a Yoga e o Zen, todas investigadas a partir da corporeidade.

lArtes rituais ou Arte como Veículo (A partir de 1986) - É a etapa final da pesquisa grotowskiana. O trabalho, voltado para quem faz a arte, e não para o espectador, se baseia na exploração de músicas ligadas a práticas rituais afro-caribenhas, como o objetivo de provocações de mudança de energia. Os participantes tentam desafiar o corpo através da criação artística, com um trabalho meticuloso sobre montagens que não tinham a pretensão de ir a público.

Grotowski foi um estudioso de práticas humanas. Justamente por isso, encontrou o teatro e a partir dele tentou investigar o mundo em forma de pesquisas sobre o homem. No Brasil, estuda-se pouco sobre Grotowski e as reflexões que provocara, limitavam-se ao seu conceito de teatro pobre, em virtude das poucas leituras sobre outros temas grotowskianos que chegavam até nós.

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TÓPICO 5 | TREINAMENTO DO ATOR

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Foi realizado em 2009, o Seminário Grotowski, com reuniões em Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul. Veja o site do seminário e descubra um pouco mais sobre Jerzy Grotowski e pesquisadores que se dedicam às suas formulações teóricas e práticas: <www.grotowski2009.com.br>.

AUTOATIVIDADE

4 ANTROPOLOGIA TEATRAL

Não é possível pensar em treinamento do ator sem falar da antropologia teatral. Esse fenômeno consiste numa gama de estudos do comportamento humano, utilizado pelos atores, quando usam sua presença física e mental, numa organização de movimentos e textos diferente daquela utilizada na vida cotidiana.

A antropologia teatral não pretende ter princípios ou ensinamentos únicos, apenas indica caminhos e possibilidades. Entre suas propostas está a busca de uma identidade para o ator, a partir do treino contínuo e do autoconhecimento. (BARBA, 1995). O teatro antropológico dá valor ao sujeito e ao seu grupo, por meio de uma análise e consciência do contexto, da historicidade, do lugar social que ocupa na comunidade em que está inserido.

Portanto, praticar um teatro antropológico é assumir-se aliado de uma reflexão que entrelaça história e cultura. É se autodescobrir, e na prática de grupo, descobrir o outro. A antropologia no teatro está centrada na pessoa do ator. Ele é o centro. Ele é absolutamente necessário. No teatro antropológico, é o estudo do comportamento expressivo do homem, quando está representando, que é o objeto e o foco das pesquisas do ator e do seu grupo.

Ainda como meta dessa prática teatral está o estudo das relações entre a arte cênica e outras ciências. Assim, o aperfeiçoamento da técnica de representação passa pelo sentido de aprender a aprender, num processo contínuo de estudo profundo das personagens a serem postas em cena.

A antropologia teatral, que tem como maior estudioso e divulgador Eugênio Barba, pode ser definida, como ele mesmo sugere, como um conjunto de práticas cênicas a serem desenvolvidas no que seria o terceiro setor. Para Barba, o teatro se constitui em duas vertentes:

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

lO teatro institucional - mais conhecido no Brasil como teatro comercial, que adere à lógica do capitalismo, da indústria do divertimento. Teatro de elenco, com objetivo maior focado em lucros financeiros;

lO teatro de pesquisa - que tenta superar a tradição, por meio de originalidade e de contradição aos moldes do teatro comercial.

O Terceiro Teatro poderia ser entendido então, como uma terceira vertente: um teatro à margem dessas duas vertentes, que vive na periferia, que está distante de grandes centros. O teatro nesse terceiro setor seria uma prática que não se rende às leis de mercado, fugindo do que é o gosto da massa popular, negando, portanto, o comércio. Na luta por um trabalho de grupo contínuo buscaria estabelecer um espaço próprio, sob os alicerces do respeito às diferenças e ao coletivo.

FONTE: Disponível em: <www.opovo.uol.com.br>. Acesso em: 28 fev. 2010.

FIGURA 20 – EUGÊNIO BARBA

A antropologia teatral pode ser definida, assim, como uma nova maneira de conceber o mundo e até mesmo a profissão teatral na contemporaneidade. Esse novo modelo tem como características:

a) espetáculos calcados na reflexão e na revelação dos anseios e identidade do grupo;

b) compreensão do lugar que o teatro e o grupo ocupam na sociedade e na comunidade local;

c) fazer teatro valorizando muito mais o processo de trabalho do que o resultado final.

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TÓPICO 5 | TREINAMENTO DO ATOR

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Esse terceiro teatro tem no Brasil a forte nomenclatura Teatro de Grupo, que atualmente vem sendo muito difundida. É assim definido por articular modelos grupais que se organizam nos moldes sugeridos e praticados pelo grupo dinamarquês Odin Teatret, sob a coordenação de Eugênio Barba. O Odin foi fundado a partir da junção de atores que eram rejeitados nas academias tradicionais. Eles se organizaram de uma forma onde todos trabalhavam em diversas funções durante o dia para poder fazer teatro à noite.

A cultura do Odin foi sempre alicerçada no trabalho do ator e na consciência de grupo. A estrutura coletiva está a favor desse treinamento atoral. Treinamento, para o Odin, significa disciplina, principalmente no que se refere à continuidade e disponibilidade dos seus participantes ao aprendizado constante. É nesse aprendizado que se fundamenta a garantia de continuidade do grupo e de sua sustentabilidade.

No grupo não existem tarefas únicas. Todos trabalham em prol do coletivo, se realocando em diversas funções. São os participantes do grupo, os responsáveis pela organização do tempo, individual e coletivo, e pelas demais necessidades organizativas nas quais é preciso trabalhar e se entender. Isso garante que o trabalho permaneça vivo e constante, seguindo com projetos que encontram abrigo nas afinidades de cada ator e nos anseios de pesquisa pessoal.

FONTE: Disponível em: <www.movimentodeteatrodegrupo.blogspot.com>. Acesso em: 1 mar. 2010.

FIGURA 21 – CIA. SENHAS DE CURITIBA

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

O teatro de grupo, como o Odin, carrega fortes traços de coletividade, próprios dos lugares periféricos, entendidos como lugares distantes de eixos comerciais, como o eixo Rio de Janeiro-São Paulo. Essa corrente teatral não abarca somente um modelo de grupo, até porque incentiva que cada grupo busque a melhor maneira de se organizar, de se inserir na comunidade, de direcionar sua estética ou linguagem teatral. O que os difere na sociedade é o fato de serem, em sua maioria, grupos formados por seres humanos inquietos com algum preconceito, seja de ordem pessoal, cultural, profissional, econômica ou política. O Teatro de Grupo, que utiliza os métodos da antropologia teatral, é defendido, então, como um teatro ideológico, estreitamente relacionado e adaptado aos tempos pós-modernos.

Eugênio Barba difundiu suas teorias, especialmente sobre a antropologia teatral, em vários lugares do mundo, destacando suas preocupações com a formação de atores e com a criação de metodologias sobre o trabalho cênico de grupo na atualidade.

DICAS

Para melhor compreensão do que vem a ser o Teatro de Grupo, pesquise na sua cidade ou na sua região, quais os grupos de teatro que se organizam nesse modelo. Não é difícil. Tente identificar traços de treinamento do ator nesses grupos, e como eles se inserem na comunidade em que fazem parte. Se possível, converse com atores ou pessoas da sua região, ligadas ao teatro local. Sua compreensão de como o grupo se organiza, como se autossustenta, permitirá que você identifique ou não, características desse terceiro setor nas artes cênicas.

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RESUMO DO TÓPICO 5

Nesse tópico, você viu que:

lStanislávski foi o precursor de uma noção de treinamento do ator. Suas teorias são divulgadas e praticadas até hoje. Assim, como os ensinamentos de Grotowski, apareceu outro grande nome reconhecido pelas importantes contribuições teóricas no que diz respeito à interação do ator com o espectador.

lA antropologia teatral fundamenta-se em um processo contínuo de treinamento que tem como foco o trabalho sobre o ator. Os estudos de Eugênio Barba, e sua prática no Odin Teatret, são importante referencial para as práticas do que no Brasil chamamos de Teatro de Grupo, modelo que se baseia na busca de uma identidade estética e social e que se apresenta como tendência para fazê-lo teatral em tempos de pós-modernidade.

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Tente articular os conceitos de treinamento do ator vistos nesse tópico, fazendo o seguinte exercício: pegue uma folha em branco e escreva várias palavras que você eventualmente lembre, ou que vieram à sua mente enquanto lia o texto. Em seguida, forme frases com essas palavras, que adquiram um sentido e tenham relação com o treinamento de ator e com o trabalho de grupo. Escolha as que mais lhe chamaram atenção e tente preparar uma aula sobre esta temática. Isso o ajudará na fixação dos conhecimentos e na melhora de sua compreensão sobre o assunto.

AUTOATIVIDADE

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UNIDADE 2

JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

Ao final dessa unidade você deve estar apto a:

• conhecer teorias e técnicas relacionadas à improvisação teatral como pro-cesso pedagógico em artes cênicas;

• estabelecer diálogos entre a improvisação e o funcionamento discursivo na criação teatral;

• identificar práticas, vivências e jogos teatrais e suas possibilidades de apli-cação no ensino de teatro.

Esta unidade está dividida em quatro tópicos. Ao final de cada um deles, você terá a oportunidade de fixar seus conhecimentos realizando as ativida-des propostas.

TÓPICO 1 – TEORIAS E TÉCNICAS

TÓPICO 2 – IMPROVISAÇÃO E DISCURSO

TÓPICO 3 – PRÁTICAS E VIVÊNCIAS

TÓPICO 4 – TEXTO E ADAPTAÇÃO TEATRAL NA ESCOLA

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TÓPICO 1

TEORIAS E TÉCNICAS

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Nesse tópico, estudaremos algumas teorias a respeito da improvisação teatral.

Primeiramente, veremos como a norte-americana Viola Spolin descreveu seus processos pedagógicos no ensino de improvisação. Alguns princípios norteadores do trabalho de Spolin serão apontados de forma a propiciar o conhecimento de seu método.

Depois, estabeleceremos um diálogo com os estudos de Keith Jonhstone, buscando compreender como a improvisação faz parte do treinamento dos atores com os quais trabalha. Conceitos como bloqueio criativo, status e espontaneidade serão discutidos e postos para reflexão.

Bom estudo a todos!

2 TEORIAS E TÉCNICAS

A improvisação teatral é uma técnica de treinamento utilizada no âmbito da arte cênica, tanto como processo de construção de espetáculos, quanto na pedagogia teatral, com fins de aprendizagem. Para compreender melhor como se dá o funcionamento da improvisação partiremos da história do teatro.

Richard Courtney (2001), ao discutir a história do teatro, fala da necessidade do homem primitivo de criar cenas a partir dos acontecimentos da vida cotidiana, em que ele pudesse exteriorizar seus pensamentos com uma liberdade própria do lugar cênico. É na mimese (simples imitação da vida real) que ele começa a utilizar máscaras e peles em seus ritos mágicos para se expressar. A partir dos ritos o homem mantém contato com o mundo, com os animais e com a natureza e com todo o poder que isso significa.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

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Na ação dramática, o homem personifica tanto a si próprio como aos animais em situação de caça, em uma mistura de movimentos corporais e dança. A evolução do selvagem para o homem primitivo contribui para o desenvolvimento do rito em ritual transformando a mimese em mímica (uma representação mais elaborada, com ligações religiosas). Do ritual, surge o mito que oportuniza o relato de histórias. Assim, as tramas se desenvolvem e surge a formação do templo (distribuição de lugares na formação palco/plateia, ator/público).

Surgem, então, as representações eclesiásticas, os mimos ambulantes e, mais tarde, os improvisadores que começam a se apresentar em público. A base estrutural da improvisação tem na vida seu elemento inspirador e, aos poucos, práticas espetaculares como a pantomima, as apresentações acrobáticas e cortejos carnavalescos mascarados vão tomando conta dos palcos. Já no período medieval, o teatro de igreja passa a fazer parte da religiosidade do povo, a partir de encenações de histórias bíblicas e narrações dramatizadas que, aos poucos, vão sendo representadas fora do ambiente da igreja, para alcançar o público externo aos templos.

Composta por jogos de improviso e buscando fazer uma sátira dos lugares que as pessoas ocupavam nas classes sociais, surge, no século XVI, na Itália, a commedia dell’arte, um tipo de espetáculo feito totalmente a partir de cenas improvisadas, onde só havia um roteiro que os atores consultavam minutos antes de entrar no palco. A improvisação teatral passa, então, a ser reconhecida como forma de representação artística:

Baseada na arte da improvisação e na fixação das personagens-tipo (máscaras), a commedia dell´arte surgiu em oposição ao teatro literário ou erudito. Os cômicos dell´arte afirmavam que o autor de teatro é o ator. [...] Não se tratava de atores improvisados, mas sim de atores que exercitavam a sua arte all’limproviso, em cada espetáculo, em cena e diante do público. (CHACRA, 1991, p. 30-31).

A commedia dell’arte tem personagens fixos como Zanni, Arlequim, Pantalone, Dottore e Capitano, por isso os atores se comprometem a atuar juntos por um determinado período de tempo, organizando direitos e deveres e pensando, coletivamente, as regras que precisam ser seguidas. Esse gênero teatral sobrevive na Europa por cerca de duzentos anos, porém, no século XVIII, com o advento das montagens luxuosas, cenários deslumbrantes, cantos e danças esplendorosas, a commedia dell’arte perde seu vigor. (CHACRA, 1991).

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TÓPICO 1 | TEORIAS E TÉCNICAS

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FONTE: Disponível em: <www.poinatopointb.org>. Acesso em: 01 mar. 2010.

FIGURA 22 – 18th-CENTURY ENGRAVING OF COMMEDIA DELL’ARTE ACTORS ON STAGE. CORBIS. 2006

Isso não impede que a improvisação continue a se manter no decorrer do século XIX, em espetáculos marcadamente populares como a pantomima, o circo, o teatro de variedades (music-hall, cabarés) ou em representações cômicas. É no século XX que a improvisação teatral é retomada na busca de novas e modernas linguagens cênicas, adquirindo importância fundamental no treinamento do ator no âmbito dos grupos e companhias, e como disciplina integrante dos cursos superiores em Teatro.

A atuação tem na improvisação uma de suas ferramentas fundamentais. Nos PCNs de Arte (2001), o ensino de teatro por meio da improvisação é uma sugestão de trabalho para professores de arte e teatro, por valorizar, principalmente, o processo de aprendizado dos alunos.

2.1 O SISTEMA DE VIOLA SPOLIN

A improvisação com foco no processo de trabalho é apresentada por Viola Spolin (2000) como estratégia eficaz para a apreensão de conhecimentos sobre a arte do ator tanto em grupos de atores profissionais como em escolas de teatro e escolas formais.

O jogo é uma atividade lúdica com regras específicas. Por isso Spolin usa esse termo para designar sua metodologia de improvisação para o teatro. É nos jogos com regras que os alunos podem aprender princípios básicos de cooperação e o significado da colaboração na coletividade. Como toda atividade lúdica é voluntária, a participação nos jogos teatrais deve acontecer de forma natural e espontânea. Ou seja, é importante que os sujeitos joguem, atuem, por livre e espontânea vontade, sem se sentirem obrigados a realizarem os exercícios propostos.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

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Para que todos se sintam à vontade nessa metodologia, o professor precisa deixar claro que os jogos nada têm a ver com talento, dom ou capacidades maiores de um ou de outro, mas com uma experiência coletiva pelas quais todos podem brincar se divertir e aprender.

Essa metodologia parte do princípio da fisicalização. A fisicalização consiste em dar corpo, expressar-se, e resignificar objetos e usos habituais cotidianos. Por exemplo: no jogo, que tem por si só um caráter simbólico, um livro pode significar uma janela, desde que seja remetido para outro contexto. Ou o aluno pode fisicalizar uma janela sem que ela esteja presente na cena, fisicamente, mas sendo fisicalizada pelas atitudes do jogador. Fisicalizar, portanto, tem a ver com a capacidade que o sujeito desenvolve de mostrar uma situação em seu contexto cênico, lúdico, que pode ser totalmente distante de um contexto cotidiano. Implica imaginação, símbolo, criatividade.

O trabalho a partir da fisicalização pode ser desenvolvido com qualquer grupo, escolar ou não, mesmo que tenha carências materiais e financeiras. É um mito o fato de que teatro só pode ser trabalhado onde exista um palco, cenários e figurinos. Na fisicalização, sugere-se e incentiva-se a economia de recursos cenográficos, pois a ênfase está na expressividade corporal dos jogadores. Incentiva-se também a representação não-verbal, isto é, nem tudo está no texto, na fala, pois o próprio corpo fala. Essa metodologia possibilita que os jogadores tenham novas percepções e experimentações sobre o fenômeno teatral, fazendo com que os sujeitos se lancem numa aventura teatral que lhes permita descobrir as inúmeras possibilidades de uso da expressividade do corpo para a criação cênica.

FONTE: Disponível em: <www.arthur-arnaldo.zip.net>. Acesso em: 6 mar. 2010.

FIGURA 23 – CENAS TEATRAIS

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TÓPICO 1 | TEORIAS E TÉCNICAS

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Entre suas principais considerações, podemos identificar três requisitos básicos. O ator ou o aluno precisam se conscientizar de que eles existem numa ação cênica. Podem ser assim expressas:

lONDE: o local onde se passa a ação. Os atores são responsáveis por criar e tornar visível ao público o espaço onde acontece a cena.

lQUEM: o personagem. Os atores mostram quem são seus personagens através do comportamento e do relacionamento entre eles.

lO QUÊ: a ação. Os atores encenam com um objetivo, uma razão pela qual tais personagens estão em tais lugares e agem de tal forma. Segundo a autora, sem objetivos não há ação, e sem ação não há interação.

Para Spolin (2000, p. 13), “O mundo fornece o material para o teatro, e o crescimento artístico desenvolve-se par e passo com o nosso reconhecimento e percepção do mundo e de nós mesmos dentro dele”. A arte só existe porque fala sobre a vida, sobre os fatos que acontecem no dia a dia. A arte discute temas que fazem parte da história da humanidade e de sua evolução. Assim, não teria sentido a existência de um fazer artístico alienado da realidade e da sociedade que não gerasse uma reflexão, que fosse desprovido de uma função social.

FONTE: Disponível em: <www.oglobo.globo.com>. Acesso em: 5 mar. 2010.

FIGURA 24 – EXERCÍCIO CORPORAL – CIA DÉBORA COLKER

Parafraseando Spolin (2000), o mundo do teatro produz, simultaneamente, um reconhecimento e um contato com o mundo exterior. Dessa forma, quando o aluno/ator vê as pessoas ao seu redor, a maneira como se comportam, ouvem os sons produzidos em uma interação, ele adquire uma visão mais ampla de como acontecem as relações em seu mundo pessoal e seu desenvolvimento como ator é acelerado, pois a observação é um constante treinamento atoral.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

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Viola Spolin (2000) tece importantes considerações sobre a importância de se pensar o teatro como jogo, e o jogar como possibilidade de desenvolvimento da capacidade de expressão do ser humano. Suas principais teorias a respeito do jogo baseiam-se num sistema de jogos com regras, que consistem em:

lPOC – Ponto de Concentração – Para a autora é necessário que os jogadores (atores/alunos) saibam o objetivo de suas ações em cena. Ao improvisar, o professor precisa estabelecer qual o foco da situação, para que os alunos mantenham o ponto de concentração na solução de um problema cênico. É necessário que o professor reafirme o foco para que a cena seja feita por meio do corpo, da fisicalização, e não de uma maneira somente intelectual e verbal.

lInstruções de jogo – Os desafios cênicos devem ser apresentados. Durante sua execução, o professor é responsável por trazer sugestões, direcionar e estabelecer diálogos com os jogadores. Nesses momentos, os jogadores devem estar atentos e não desviarem a atenção do jogo e nem pararem de jogar. É importante que se ouçam as instruções de jogo paralelamente ao jogo que continua a acontecer.

lRevezamento de equipes – Há um espaço que deve ser delimitado como área de jogo. Nesse espaço, acontecem as cenas sem ensaios prévios e sem leituras antecipadas de texto. No mesmo espaço, devem revezar-se as equipes de jogo, os atuadores que precisam solucionar os problemas cênicos propostos pelo professor. A área de jogo pode ser qualquer espaço que for delimitado exclusivamente para isso. Não precisa ser necessariamente um palco, ou um lugar mais alto que a plateia. Quando uma equipe está atuando numa área de jogo, a outra parte da turma deve observá-la, acompanhando a solução de problemas apresentada. O revezamento de equipes é importante para que seja possível trabalhar com todos os alunos, principalmente em grupos com grande número de alunos.

lAvaliação imediata – Após as apresentações das soluções de problemas, o coordenador ou o professor devem realizar a avaliação da cena apresentada em conjunto com o grupo. É um momento quando deve ser estimulada a autoavaliação, a avaliação em grupo e a avaliação do professor. Solicita-se primeiramente que os participantes do grupo-plateia, que observaram a cena realizada, teçam considerações a respeito do que viram, tendo como critério principal para a avaliação, o foco proposto no início do jogo. Em seguida, o grupo que jogou, que atuou, deve falar sobre seu desenvolvimento no jogo a partir das considerações realizadas pela plateia. Esse procedimento é importante para que os participantes do jogo estejam em contato com a apreciação estética, podendo se manifestar sobre suas criações e as criações cênicas de seus companheiros.

lFazer, apreciar, contextualizar – Apesar de não utilizar essas três palavras de maneira direta em sua metodologia, o sistema de Viola Spolin (2000) permite que esses três pilares da educação em arte na contemporaneidade estejam presentes no ensino de teatro, pois implica estabelecer relações. A apreciação e a contextualização na estética teatral por meio de jogos de improvisação constituem ponto de partida para o aprofundamento de outras questões de cunho histórico e teórico nas artes cênicas.

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FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 7 mar. 2010.

FIGURA 25 – ATIVIDADES COM CRIANÇAS

O sistema de jogos teatrais de Viola Spolin permite uma iniciação à alfabetização estética em teatro. É uma escolha de o professor trabalhar com essa metodologia. Ele mesmo vai encaminhar outras possibilidades durante o processo, pois o sistema, segunda a própria autora, não é fechado, mas se adapta a diferentes situações e contextos.

2.2 KEITH JOHNSTONE

Nascido em 1933, na Inglaterra, Keith Johnstone foi esboçando seu método de treinamento de atores por meio da improvisação, através de uma inversão de tudo o que havia aprendido na escola. Em sua busca por uma construção dramatúrgica improvisada da cena teatral, com a existência de um conflito e de uma possível unidade de ação, Johnstone começa a realizar experimentações cênicas frente a seu grupo The Machine nos anos sessenta na Inglaterra.

Esta prática consiste em criar histórias e encená-las diante de um público a partir de premissas técnicas e sem a presença de elementos verbais ou corporais pré-estabelecidos. A partir de suas experiências criou o Theatre Sports, uma forma híbrida entre teatro e esporte na realização de histórias frente ao público a partir de desafios que um time lança ao seu adversário. A boa ou má execução do desafio é determinada pelo juiz a partir das premissas técnicas desenvolvidas por Johnstone.

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O Theatre Sports começa a ser praticado em vários países até chegar ao Canadá onde dá origem, nos anos setenta, ao Match de Improvisação, jogo de improvisação em que dois times se enfrentam através de regras específicas arbitradas por um juiz e cujo resultado final é decidido pelo público através de votação. O Match de Improvisação ganha projeção internacional e, juntamente com ele, vão surgindo vários outros formatos de espetáculos improvisados esportivos, ou seja, centrados na competição.

FONTE: Disponível em: <www.jogandonoquintal.com.br>. Acesso em: 10 mar. 2010.

FIGURA 26 – GRUPO DE TEATRO JOGANDO NO QUINTAL

O método criado por Johnstone fundamenta-se em três princípios: aceitação versus bloqueio; status alto/baixo (princípio da gangorra); e espontaneidade/criatividade. O objetivo desse método é que o ator consiga alcançar o máximo de sua espontaneidade, aceitando suas próprias ideias. Para tanto, Johnstone recorre à improvisação como instrumento técnico para a atuação. Para o encenador, o ator precisa aprender a lidar com suas ideias, pois geralmente as primeiras ideias que vêm à mente, são obscenas, psicóticas e/ou consideradas fora de regra. Por isso, os atores não as descartam até encontrar alguma ideia que seja “boa o bastante” para expô-la.

A sugestão de Johnstone é que o ator aceite a primeira ideia que lhe vem à mente e improvise a partir dela. Para ele, os sentimentos proibidos e os impulsos inconscientes desafiam o ator a confiar nos seus primeiros pensamentos.

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2.2.1 Bloqueio criativo

É das relações habituais do ator, de sua vida cotidiana, que surgem os primeiros impulsos para a criação cênica. A partir do momento que o ator tem essa consciência, ele terá capacidade de conhecer como funciona o seu pensamento, pois ao analisar suas ações para resolver um problema da vida real cotidiana, conseguirá identificar o mecanismo do seu próprio raciocínio.

Se o ator identifica que sua maneira de agir é sempre planejada ele terá, provavelmente, muita dificuldade de lidar com a primeira ideia que lhe surge, pois seu procedimento mental o levará a pensar na cena de forma acabada de modo que esteja pronta a ser observada e julgada pelo espectador. Se a maneira como o ator procede no cotidiano já estiver relacionada com ações imediatas e impulsivas, ele possivelmente já possui uma aptidão maior para o ato improvisado, o que não significa que umas dessas vertentes seja melhor ou pior que a outra.

Essas reflexões são importantes para que percebamos como o ator age diante do bloqueio criativo. Muitas vezes, o bloqueio de um ator acaba influenciando os seus pares, aqueles que estão em cena, paralisando a ação. A principal dificuldade ao improvisar é aceitar o material criativo que nasce de si, através da improvisação, no sentido de desenvolvê-lo até extinguir as possibilidades, num jogo de ideias que vão surgindo, mas não abandonando as que já se encontram em cena. Para Jonhstone, um dos problemas decorrentes da dificuldade da aceitação da primeira ideia está ligado ao processo de escolarização do sujeito. Quando se aceita a primeira ideia, está se aceitando a espontaneidade como fator criativo, indo de encontro à estrutura educacional, que não valoriza nem o espontâneo nem o criativo. Por meio do processo educacional, a criança vê na figura do professor um ser maior e superior, a quem deve respeito e dedicação. E para obter a atenção e o afeto do professor, a criança que é avaliada e comparada constantemente, precisa dar provas de sua inteligência, e isso implica abandonar primeiras ideias e instintos.

Outra dificuldade para a qual Johnstone nos chama a atenção é o fato de aceitar a ideia do outro e complementá-la. Para que a cena obtenha êxito, a relação e a aceitação entre os atores são imprescindíveis, pois quando um ator completa a ação do outro ele está enriquecendo um contexto maior de interação, que se apresenta diante do público. Acrescentando um “E”, e assim enriquecendo a cena.

No teatro, é importante que se perceba que a interação é uma contracena, onde pessoas trocam experiências interagindo entre si, por isso é necessário e fundamental perceber o outro e a si mesmo, estabelecendo diálogos com as intenções e objetivos da cena criada. Para que o jogo aconteça, precisa haver satisfação e confiança mútua entre os participantes, tanto do palco como da plateia.

Para que isso ocorra, o ator deve estar consciente de que o outro, seu par, não consegue ler seus pensamentos, por isso a comunicação precisa acontecer a partir da expressividade, seja ela verbal, gestual ou corporal. Vale observar que se um ator não compartilha a sua ideia, não há como o outro ator ou o público descobrirem suas reais intenções.

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2.2.2 Status

Uma das preocupações de Keith Johnstone era a dificuldade dos atores em reproduzir suas ações e conversas da forma natural com elas acontecem na vida cotidiana. Talvez essa dificuldade estivesse relacionada à preparação anterior como fonte de segurança para os atores, e como estes não tinham tal possibilidade ficavam bloqueados em sua criação espontânea. Johnstone então começou a incentivar seus atores a improvisar sem querer impressionar, usando as primeiras ideias que lhes aparecessem.

Um dos primeiros exercícios propostos por ele consistia em que o ator pusesse seu status um pouco acima ou abaixo do status de seu companheiro de cena, sendo que a diferença entre um e outro deveria ser a menor possível. Dessa maneira, as cenas ganhavam veracidade na medida em que os atores iam compreendendo o dinamismo que provinha do jogo de status.

Jonhstone descobriu o princípio da gangorra: quando um ator aumenta seu status o outro o diminui. Essas relações vão se alterando durante as cenas, dando vida às cenas. O princípio da gangorra tem a ver com as relações de poder contidas nos diferentes níveis de relacionamento humano. O status, para Johnstone não é a condição social do sujeito, mas a postura que ele assume na cena, um poder de alguém num determinado momento. Esse poder pode ser alterado conforme a necessidade da cena. Os status um, dois, três, quatro e cinco podem jogar entre si com uma gama de possibilidades que enriquecem a cena.

O trabalho com o status é uma rica possibilidade de construção de personagens, pois coloca em foco as relações como base da interação entre os sujeitos.

FONTE: Disponível em: <www.portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 10 mar. 2010.

FIGURA 27 – JOGO DO STATUS.

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ATENCAO

O ator precisa estar atento. O status alto não significa arrogância, desrespeito e altivez, da mesma maneira como o status baixo não quer dizer humildade, meiguice e delicadeza.

Como exemplo, podemos imaginar um prefeito, que tem um status social alto, porém, joga com os outros personagens utilizando um status baixo em relação aos outros. Seus auxiliares podem ter um status mais baixo socialmente, mas podem jogar com um status alto na relação de poder para conseguirem o que querem do prefeito.

2.2.3 Espontaneidade e criatividade

Para Jonhstone, a espontaneidade e criatividade são ferramentas indispensáveis ao trabalho do ator. Acontece que a escola é uma instituição responsável por bloquear a imaginação e o lúdico, deixando marcas nos adultos que provêm do sistema educacional. O senso comum prega a inspiração e o talento, mas Jonhstone fala da técnica adquirida por meio da aceitação das ideias. Assim, poderíamos afirmar que a espontaneidade acontece quando se aceita a primeira ideia, e a criatividade é a capacidade de transformar e trabalhar com essa ideia.

Keith Johnstone reafirma, assim, seu apreço pelo banal, frívolo e anódino, isto é, aquelas coisas que são óbvias e simples são um grande material criativo para o ator improvisador. Ser espontâneo e criativo é perceber que há várias possibilidades de trabalhar com coisas simples. Porém, a sociedade é acostumada com regras e com julgamentos que fazem com que o ator sinta-se “obrigado” a atingir objetivos e superar expectativas. O processo de civilização, mais especificamente a educação, faz com que prestigiemos mais a inteligência e o que chamamos de cultura, do que a criatividade instantânea.

Desse modo, aprendemos a não ser criativos e desaprendemos a ser espontâneos. Aí está a causa da existência de tantos seres “travados” e sistemáticos em seus modos de agir e também de improvisar. O ator, ao improvisar, não consegue desprezar suas origens e sua criação, e por certo tenderá a bloquear o fluxo de espontaneidade, tentando encontrar ideias mais originais do que a primeira que lhe surgir. Por isso Jonhstone sugere um exercício de inversão, para que o ator não tente arrumar a cena, mas deixe surgir o que tem que surgir e aprenda a lidar com as situações que aparecerem, sem titubear.

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Para treinar seus atores, Jonhstone desenvolveu um sistema em que um ator serve de escada para o outro, fazendo com que a cena seja responsabilidade de um grupo e não de apenas um sujeito. Um dos jogos que caminham nesse sentido é o intitulado história de uma palavra por vez. O jogo acontece com os atores dispostos em círculo. A partir de um título, eles têm que contar uma história, porém cada pessoa pode utilizar somente uma palavra. O objetivo é construir uma história lógica e coerente, que se constrói no coletivo.

O trabalho teatral a partir do que é óbvio e simples não é tão fácil, mas é a alternativa de Johnstone para uma criação espontânea e criativa.

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RESUMO DO TÓPICO 1

Nesse tópico, você viu que:

lSão muitas as metodologias de ensino do teatro por meio da improvisação, mas os estudos de Viola Spolin se destacam pelo caráter de jogo e interação entre os sujeitos.

lKeith Jonhstone contribui para a improvisação com suas elaborações a respeito da espontaneidade, criatividade, bloqueio criativo, aceitação e status.

lTrabalhar com a improvisação na escola é oportunizar que os alunos tenham vivências práticas e lúdicas no ambiente educacional, por meio de técnicas teatrais.

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AUTOATIVIDADE

Os jogos teatrais, ao serem adaptados para o contexto brasileiro, foram aproximados dos conhecidos jogos populares e brincadeiras infantis. Tente recordar e descreva um jogo popular vivido por você na infância, como, por exemplo, pega-pega, esconde-esconde, cirandas de roda e outros, incluindo quais as sensações vividas ao brincar. Leve o texto para o encontro presencial e compartilhe com seus colegas. Alguns jogos podem coincidir, aproveite estes, mais conhecidos de todos e proponha uma brincadeira de adultos. Perceba que em meio à diversão há aprendizado e construção de conhecimento.

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TÓPICO 2

IMPROVISAÇÃO E DISCURSO

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Nesse tópico, veremos o funcionamento discursivo na improvisação. Questões como a autoria, a interação, a interlocução e a enunciação serão postas para reflexão.

A importância desse tópico está relacionada aos mecanismos de linguagem presentes no teatro. Os sujeitos que fazem teatro se relacionam e, num contexto que, por si só, é de grupo, realizam trocas sociais discursivas.

Esse é o objeto do tópico, que pretende discutir teatro, linguagem e educação, por meio de uma abordagem dialógica ancorada nos estudos da linguagem.

Bons estudos e boas conversas!

2 TEORIA DA ENUNCIAÇÃO

Quando trabalhamos com a improvisação, os exercícios podem gerar enunciados muito parecidos com os discursos da vida real, cotidiana. É importante para o professor saber analisar e observar o funcionamento discursivo da improvisação. Os exercícios de improvisação teatral são utilizados em formato de jogos cênicos, nos quais se prioriza o processo de criação espontânea do aluno e a sua relação com os outros atores e com a plateia.

No teatro, a interação mais espontânea e próxima das relações humanas acontece através do improviso. A improvisação está presente na formação do ator tanto no teatro formal, em que a interpretação parte do texto escrito e o improviso do processo de criação, como no teatro totalmente improvisado, em que a improvisação é a proposta de criação, o autor dos textos é o próprio ator no momento que improvisa. Os elementos necessários à existência da improvisação no teatro e da própria existência da arte cênica são: o ator, o texto e o público (SPOLIN, 2000).

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Esse trinômio só é possível com a presença de enunciados:

Na comunicação mais imediata, um ator fala a outro ator [...]. Por trás das personagens encontra-se o verdadeiro emissor de todas essas falas, o autor, que se dirige a um público. O público tem, portanto, a importância de destinatário indireto, pois é a ele, em última instância, que todos os discursos são dirigidos. (RYNGAERT, 1996, p. 109).

Há, portanto, no teatro, uma dupla enunciação. Em cada enunciado estão presentes no mínimo duas vozes: a voz da personagem (comunicando-se com outras personagens ou consigo mesma) e a voz do autor do texto da personagem (comunicando sentidos ao público). No contexto da improvisação, o autor do texto teatral é o próprio sujeito que enuncia ao improvisar. Podemos afirmar, então, que nos enunciados das personagens é possível encontrarmos as vozes dos alunos de teatro, apontando para os sentidos que eles atribuem à temática da cena criada. Isso é possível, pois ao materializarem seus enunciados enquanto personagens de uma cena teatral, os sujeitos vão exteriorizando, como se estivessem escrevendo um texto teatral, o que pensam sobre as relações humanas e sociais, exercendo ao mesmo tempo, a função de autores dos discursos das personagens e de atores representando as personagens criadas por eles.

Uma importante teoria para pensarmos o discurso é a teoria da enunciação, proposta pelos estudos do Círculo de Bakhtin. Os estudos do Círculo de Bakhtin, referenciados historicamente a partir de 1920, reúnem teorias de um grupo de intelectuais de diversas formações, multidisciplinar, que se dedicava ao estudo de temas referentes à linguagem. Entre eles, Bakhtin, Medvedev e Voloshinov, produziram um arsenal de textos reflexivos que cada vez mais adentram o ambiente acadêmico por suas colaborações na compreensão de diversos campos do conhecimento.

Em uma situação de enunciação, ao materializar um texto, o sujeito provoca no seu interlocutor uma atitude responsiva, que leva em consideração o ambiente em que a interação acontece, e as pessoas que estão interagindo. Segundo a teoria da enunciação somos constituídos pela interação com os outros. Nessa interação, os sujeitos mostram-se, percebem suas diferenças, atribuem sentidos ao discurso alheio e permitem que o outro também atribua sentidos ao seu discurso. Nesse viés teórico, a palavra orienta-se em função do interlocutor e, por esse motivo, não pertence totalmente ao seu locutor, pois sua materialização é dirigida a alguém.

No teatro, da mesma forma que o interlocutor de uma personagem é outra personagem, o interlocutor do autor do texto é o público. É com o público que o autor do texto se comunica, se identifica, conversa. Os sujeitos da fala estão inseridos em um ambiente de inter-relação social dentro de um determinado contexto. É esse contexto que vai definir a situação enunciativa:

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[...] a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados. [...] A palavra dirige-se a um interlocutor: ela é a função da pessoa desse interlocutor: variará ao se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido etc.) [...] O mundo interior e a reflexão de cada indivíduo têm um auditório social próprio bem estabelecido, em cuja atmosfera se constroem suas deduções interiores, suas motivações, apreciações etc. (BAKHTIN, 2004, p. 112-113).

No teatro, o contexto, em que uma personagem está inserida, é responsável pela exteriorização dos seus enunciados e o contexto, em que o autor do texto está inserido, interfere nos sentidos que atribui à construção de uma cena. Assim, uma personagem é constituída pela outra, e uma cena é construída a partir das vozes que constituem o seu autor.

A linguagem, segundo Bakhtin (2004), é concebida a partir de um ponto de vista histórico, social e cultural, que inclui a comunicação entre os sujeitos produtores do discurso. A enunciação é um componente da realidade e sua estrutura é organizada socioideologicamente. A situação e o meio social determinam por completo a forma e o estilo da enunciação. Os sujeitos, socialmente organizados, interagem através de seus dizeres e produzem sentidos por meio deles. No teatro, os atores participantes da enunciação também deixam marcas do lugar histórico e social de onde falam, de sua posição discursiva, dão pistas ao seu interlocutor e este vai produzindo também os sentidos que serão responsáveis pela construção dos seus dizeres, dando vazão ao fenômeno teatral.

Na teoria da enunciação, o processo da fala é ininterrupto, não possui um começo e um fim determinados, pois sua elaboração se dá a partir de uma atividade de linguagem tanto exterior quanto interior. A enunciação emerge de um discurso que cada indivíduo realiza por meio de uma expressão exterior definida (no caso do teatro, definida pelo seu autor). O mundo interior do sujeito se adapta às possibilidades dessa expressão. A forma e a dimensão da exteriorização dependerão da situação enunciativa e de seu auditório.

É importante destacar a noção de auditório social, proposta por Bakhtin (2004), que consiste em uma atmosfera onde se constroem as deduções interiores, motivações e apreciações, que cada indivíduo possui em seu mundo interior, em sua reflexão. Esse auditório se molda de acordo com o contexto e o meio social, interferindo na exteriorização do discurso. Isto é, quem fala, fala para alguém, para atingi-lo, confrontá-lo ou concordar com seu interlocutor. O importante é que o discurso é sempre dirigido ao outro.

Refletindo sobre a exteriorização do discurso em uma situação de improvisação teatral, vale considerar que os sujeitos falam como personagens de uma cena enunciativa, e como autores diretos de suas criações. A autoria, na improvisação, é uma tarefa de grupo, em que cada sujeito é autor imediato do discurso da personagem que interpreta. Lembremos que Viola Spolin incentiva a autoria do sujeito, quando ela sugere que não sejam levados textos ou outros materiais de apoio,

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mas que os atores criem a partir de suas vivências, da mesma maneira que Keith Jonhstone defende o impulso criativo como estopim para a criação.

A enunciação só é possível se houver um eu que fala a outro, e este, a partir do enunciado anterior pode enunciar sua resposta: Não há linguagem sem o diálogo, é necessário haver pessoas que falam e pessoas que respondem. Falar é falar a outros que também falam e que, portanto, respondem-se mutuamente. A resposta do outro indica o acabamento de um enunciado que é dado pela possibilidade de alteridade, quando outro locutor pode também enunciar. Essa compreensão parece difícil na prática, mas é muito simples. É só pensarmos na maneira como nossas relações acontecem, e em como somos afetados e alterados pelas nossas conversas com outras pessoas.

É importante falarmos sobre o conceito de alteridade. O outro, em situação de alteridade, é o interlocutor, aquele a quem o enunciado é dirigido. Esse outro, quando enuncia, também apresenta em seu discurso interferências do que foi dito antes de sua fala. As fronteiras de um enunciado são definidas pela alternância dos sujeitos participantes da interação; assim, podemos afirmar que em uma situação de enunciação, a voz do sujeito que fala é constituída a partir da voz de outros sujeitos e sua fala se constituirá a partir da enunciação do outro.

Imagine uma situação improvisada, onde os sujeitos devem representar uma situação que acontece dentro de uma escola.

FONTE: Disponível em: <www.3.bp.blogspot.com>. Acesso em: 15 mar. 2010.

FIGURA 28 – ESPETÁCULO AURORA DA MINHA VIDA. OFICINA PAULO DE MORAES. 2007.

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Alguns já tomarão para si personagens que representam alunos e outros se “vestirão” de professores, diretores e integrantes de equipes de organização administrativas. O processo de fala se dará a partir dos lugares ocupados por cada personagem na cadeia enunciativa, e o processo de alteridade dos sujeitos, isto é, como eles vão alterando seu discurso, sua postura e sua maneira de comunicação, dependerá da situação cênica, que pode ser pacífica, conflituosa, harmoniosa ou de ânimos efervescentes.

Uma das marcas fundamentais de alteridade no discurso é a heteroglossia. Não se assuste com esse nome. Esse conceito consiste na presença de outro discurso no interior de um discurso, de vozes que permeiam a voz que enuncia. Se os discursos são produzidos a partir de um dizer anterior, e influenciados pela situação social e contexto nos quais estão inseridos os sujeitos da enunciação. Esses sujeitos não são os produtores reais do discurso, não são os verdadeiros autores de sua fala. Existe uma situação de enunciação, em que cada sujeito, marcado pela alternância ou alteridade, é levado a produzir um enunciado que possuem em sua essência as vozes de outros sujeitos participantes da enunciação:

A heteroglossia permite que cada enunciado seja único, mesmo que permeado pelas vozes dos outros sujeitos. Por isso não é possível o vivenciar o jogo e a improvisação sem considerar a existência da alteridade e da heteroglossia dialogizada nas situações de enunciação, pois o enunciado de uma personagem é permeado pelas vozes das outras personagens, e também é constituído pelos sentidos atribuídos no discurso pelo seu autor, o próprio aluno enquanto improvisa, causando o efeito da dupla enunciação.

A oralidade das encenações teatrais improvisadas possui essa alternância na fala dos sujeitos e nas vozes que permeiam os seus dizeres. Nos discursos produzidos, deve-se perceber o contexto social e histórico das personagens, bem como o lugar de onde falam e a forma como seus enunciados vão se moldando no decorrer dos exercícios cênicos.

O próximo item desse tópico pretende auxiliar você a compreender o funcionamento discursivo na ótica da teoria do discurso proposta por Michel Foucault, para quem o discurso acontece em meio às relações de poder. Para a análise do teatro, é muito interessante perceber essas distinções na forma de se produzir textualidades contemporâneas.

3 FOUCAULT E AS RELAÇÕES DE PODER

A constituição de um discurso se dá, conforme Bakhtin, por meio da interação verbal entre sujeitos heterogêneos, que produzem seus enunciados a partir de dizeres anteriores aos seus. Esses enunciados, portanto, são constituídos ou permeados pelas vozes de outros sujeitos. Ao concordarmos que a interlocução acontece quando indivíduos diferentes entre si se comunicam, aceitamos que cada um desses indivíduos fala de um determinado lugar social, dirigindo-

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se aos outros a partir da visão que tem de si mesmo e dos seus interlocutores. Nessa perspectiva, existe uma possibilidade de aproximação entre a teoria da enunciação (BAKHTIN, 2004) e a discussão em torno das relações de poder e dos mecanismos de controle (FOUCAULT, 1998). Sobre essa aproximação, vale a pena nos debruçarmos.

FONTE: Disponível em: <www.1.bp.blogspot.com>. Acesso em: 12 mar. 2010.

FIGURA 29 – "VALOR DE TROCA" - EXPERIMENTO CÊNICO DO GRUPO OFICINA DE TEATRO DO OPRIMIDO (TEATRO-JORNAL)

Para Bakhtin (2004), cada sujeito possui em seu interior um auditório social estabelecido, no qual são construídas suas deduções interiores e as motivações que o levam a produzir seus enunciados. Segundo o autor, esse auditório é responsável por orientar a palavra em função do interlocutor, e a estrutura da enunciação é completamente determinada pelo contexto social em que acontece. Essa concepção de linguagem, antes de constituir um arcabouço teórico, é uma postura científico-filosófica, que compreende o discurso em sua forma aberta, histórica e falante, repleto de vozes que permeiam a situação comunicativa, a fim de que os vários sentidos, distribuídos entre essas vozes, possam emergir.

Para Bakhtin (2004), o sujeito é visto como agente envolvido em uma rede múltipla e intrincada, constituído pelos dizeres do outro, mas autônomo, capaz de produzir enunciados irrepetíveis. E Foucault compreende o discurso como um conjunto complexo e difuso de enunciados que modelam os dizeres, a representação de mundo e a vida social do sujeito. Basta considerar que na ótica foucaultiana os discursos não possuem uma unidade ou uma homogeneidade interna (tenta-se estabelecer esta homogeneidade nas relações de poder); os

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discursos são heterogêneos, tais como as vozes sociais das quais fala Bakhtin (2004). O sujeito do discurso é, para os dois autores, uma dispersão de vozes. Dispersão essa que também se encontra no fazer teatral.

Assim, podemos considerar que a teoria de Foucault reforça a compreensão dos enunciados criados na improvisação, justamente trata o discurso como espaço de conflito e jogos de poder, onde os sujeitos posicionam-se a partir de lugares e status estabelecidos socialmente.

Assim como para Bakhtin (2004) os enunciados exteriorizados pelos sujeitos dependem do contexto social, para Foucault (1998) os discursos do sujeito são controlados por mecanismos de poder:

[...] em toda sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que têm por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade. [...] Sabe-se que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa. (FOUCAULT, 1998, p. 8-9).

O controle dos discursos proposto por Foucault acontece pelo controle do seu surgimento, portanto, quanto maior for o controle sobre as interações, maior o controle dos discursos e da produção dos seus sentidos. Os mecanismos de controle de discursos apontados por Foucault (1998) estão divididos em três conjuntos.

O primeiro compreende o conjunto de mecanismos externos de controle. Ele se subdivide em três outros mecanismos. O mais evidente deles é o da proibição: sugere que os discursos podem ou não ser proferidos em determinadas circunstâncias. O segundo é a distinção entre razão e loucura: o discurso que é considerado como “não-normal”, passa a ser ignorado, como se não existisse. O terceiro mecanismo é a oposição do verdadeiro e do falso: recusa-se o discurso que vai contra a verdade. Mesmo que a verdade não exista ou não seja a mesma para todos, adota-se uma ideia como verdade, e não se podem proferir discursos contra ela. Na improvisação, essa teoria pode ter fortes relações com as noções de status, que estudamos anteriormente nessa unidade.

O segundo conjunto compreende os mecanismos internos de controle. Eles são exercidos do interior dos próprios discursos do sujeito, um controlando o outro. O primeiro deles é o comentário ou interpretação, nos quais cada sujeito se autocontrola ao expressar opiniões ou ideias referentes a outros discursos. A autoria também é outro mecanismo de controle interno do sujeito, pois do autor se espera que ele seja coerente com seus próprios dizeres, em textos diferentes, escritos em épocas diferentes. Do ator-autor, espera-se como resultado uma cena coerente. A disciplina é o procedimento que estabelece regras para os discursos. Um sujeito sabe quando seu discurso é ou não aceito em determinada situação comunicativa. Para o jogo teatral, essa compreensão é necessária, pois jogo implica aceitação. Quando não aceitamos o discurso do outro, há uma ruptura, uma quebra na cadeia discursiva.

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Foucault ainda aponta para um último grupo em que se encontram os mecanismos de controle dos sujeitos. O primeiro deles é a apropriação dos discursos do outro. Cada sociedade de discurso constrói e interfere na apropriação dos discursos pelos sujeitos que dela fazem parte, autorizando ou não um sujeito a proferir determinado tipo de discurso. O segundo é a doutrina, que agrupa os indivíduos por aceitarem determinados enunciados, ou excluindo-os por recusarem uma corrente de pensamento. Para a improvisação, essa teoria contribui principalmente para os jogos em grandes grupos.

A perspectiva de Foucault (1998), ao aliar discurso e poder, encontra afinidade com o conflito de vozes sociais de que fala Bakhtin (2004). O poder só é exercido porque os sujeitos interagem, se comunicam e enunciam de um lugar determinado socialmente. Por isso, assim como Bakhtin, Foucault não determina o poder como propriedade de alguém, e sim como um exercício temporário, circulante, em constante transformação, uma prática social constituída historicamente. Para ambos, os participantes da situação comunicativa, enunciam seguindo as regras sociais do contexto discursivo, em que o alvo é o outro a quem se pode exaltar, elogiar, criticar, oprimir. Tanto para Bakhtin (2004), como para Foucault (1998) a noção de sujeito se faz nesse processo de interação e conflito de vozes.

Perceber a relação de poder como um conflito permanente entre os sujeitos nos faz pensar em uma relação dialógica (BAKHTIN, 2004), em que a interação só é possível se o outro estiver envolvido no processo de construção de sentidos. Na teoria da enunciação, o diálogo deve ser entendido como campo de luta entre vozes sociais. Nesse embate, atuam forças centrípetas (que buscam impor uma centralização do poder) e forças centrífugas (que resistem às tendências centralizadoras). Isto justifica a coerência de uma aproximação entre as teorias da enunciação e as relações de poder discutidas por Foucault, como também justifica um fazer teatral com tal consciência.

A interlocução entre o discurso e a improvisação não se esgota com esse breve estudo. Essas são teorias que se complementam na prática.

ESTUDOS FUTUROS

No próximo tópico, teremos oportunidade de conhecer algumas práticas teatrais, a partir das quais é possível aplicar as teorias estudadas acima. Relacionaremos algumas metodologias do ensino de teatro por meio de jogos, para que possam ser utilizadas em sala de aula e em grupos diversos.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Nesse tópico, você viu que:

lA teoria da enunciação proposta pelo Círculo de Bakhtin contribui para os estudos teatrais no sentido de possibilitar aos atores/estudantes uma melhor compreensão dos mecanismos discursivos que acontecem tanto na vida cotidiana quanto na cena teatral.

lOs estudos do discurso de Foucault nos levam a pensar nas relações de poder que existem nas interações humanas. O teatro, ao tomar emprestado da comunicação humana o material criativo para a cena, encontra nas teorias da linguagem embasamento para que a improvisação se aprimore enquanto prática pedagógica e prática relacional entre sujeitos.

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AUTOATIVIDADE

Pesquise na internet um texto teatral, de preferência de autoria brasileira e identifique os conceitos estudados nesse tópico. Tente perceber a alteridade, como as personagens alteram seus discursos a partir dos discursos das outras e a heteroglossia, que é o conjunto de múltiplos sentidos e significados que uma fala, um texto pode conter. Sinalize e sublinhe também aquelas partes do texto em que você percebe que há uma relação de poder e classifique-as segundo a teoria dos mecanismos de controle dos discursos proposta por Foucault. Para auxiliar seus estudos, use canetas de cores diferentes para identificar distintas partes do texto e crie uma legenda, para facilitar sua análise. Esse tipo de análise pode ser feito com discursos advindos de uma cena teatral improvisada, em atividades que você pode desenvolver com seus alunos. Transcreva as cenas criadas e incentive-os a fazer as análises!

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TÓPICO 3

PRÁTICAS E VIVÊNCIAS

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Esse tópico pretende ser um pequeno esboço de atividades possíveis a serem desenvolvidas no ambiente escolar ou outros grupos onde esteja acontecendo o fenômeno do teatro-educação.

Começamos com algumas considerações sobre os objetivos dos planos de aula que versam sobre improvisação e jogos. Em seguida, falaremos da importância do registro das atividades na forma de protocolos de sessão.

Por último, trazemos experiências e sugestões e esperamos que você possa vivenciar com seus futuros alunos algumas práticas aqui propostas.

Há ainda uma leitura complementar, onde a autora dialoga com os conceitos de teatro, educação e cultura na atualidade.

Boas leituras, práticas e vivências!

2 PLANOS DE AULA E PROTOCOLOS DE SESSÃO

Caro acadêmico! Neste item, você estudará os planos de aula e os protocolos de sessão.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

2.1 PLANOS DE AULA

Um dos fatores mais importantes a serem considerados em uma aula de improvisação, é que ela de fato será improvisada. Isto é, ela acontece por meio de um fio temporal e tensional que faz com que nem o professor tenha domínio sobre as atividades que proporá, pois elas dependem do curso das situações que acontecerão.

Em outras disciplinas ou conteúdos também é assim, porém em um encontro onde a improvisação é o fator central, o professor não pode apressar o andamento das cenas nem desprezar materiais criativos que surgem ao acaso e que estejam de alguma maneira fora do seu planejamento.

Nesse texto, chamaremos as aulas de improvisação de sessões. Essa nomenclatura é bastante utilizada por Ricardo Japiassu em seu livro Metodologia do Ensino do Teatro, publicado pela Papirus Editora em 2001.

Voltando à questão dos planejamentos, nem sempre o que é planejado pelo professor acontece durante a sessão. É necessário que o professor tenha certo “jogo de cintura” para lidar com imprevistos, e para que esteja atento às características de cada turma, seu ritmo, sua disponibilidade para o jogo, sua interação.

Principalmente, o fator tempo deve ser respeitado, pois às vezes uma cena, ou solução de problemas cênicos, leva mais tempo para ser realizado do que o esperado pelo docente. O contrário também pode acontecer, quando o professor prevê que as situações se desenvolveram com um tempo maior, e tudo se resolve em poucos minutos, e nesse momento é preciso ter “cartas na manga” para a continuação da aula.

O que estamos falando aqui não é peculiaridade do campo teatral, mas é necessário que estejamos cientes da realidade da sala de aula como um todo, pois uma aula de teatro, nos moldes da improvisação e dos jogos, não acontece por meio de conteúdos previamente calculados, que serão escritos, lidos ou resolvidos como numa solução matemática. A subjetividade impera em detrimento da objetividade de outras disciplinas. Nestes casos, o professor precisa saber argumentar frente à escola e à comunidade escolar ao propor uma aula de teatro.

Ainda com relação ao tempo, Japiassu (2001) ressalta que é importante que o professor sempre se lembre de realizar a avaliação coletiva, que consiste numa conversa no grande grupo, sobre cada apresentação realizada. Portanto, esse tempo precisa ser calculado e estipulado de forma a possibilitar o diálogo entre os alunos, pelas razões explicitadas no primeiro tópico dessa unidade. É preferível que a aula termine com poucas atividades práticas e muita discussão e reflexão a respeito, do que a frustração dos alunos por levarem para casa opiniões que queriam que fossem expostas ao grupo. Assim, é interessante que o professor se desprenda de ter que “cumprir o programa” só para estar de acordo com normas e papéis. Sua justificativa será a oportunidade propiciada ao aluno da interlocução com sua prática e de seus pares.

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TÓPICO 3 | PRÁTICAS E VIVÊNCIAS

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Não significa, porém, que o que rege a aula de teatro é a falta de rigor com prazos e procedimentos. Mas é fundamental respeitar o tempo-ritmo dos alunos e seu aprendizado.

Outro importante fato que se presencia no ambiente escolar é a expectativa sobreposta à aula de teatro de que o término, ou o gran-finale das experiências cênicas seja uma montagem teatral. É também responsabilidade do professor conscientizar a comunidade acadêmica de que seu trabalho teatral não tem como fim específico a apresentação de uma peça teatral. Não que isso não seja possível e possa estar nos planejamentos do professor. Porém, uma montagem cênica leva tempo e exige preparação intensa dos alunos e da plateia que irá recebê-la.

Pelas experiências teatrais oriundas da maioria das escolas, o que acontece é uma leva de apresentações de natureza teatral, que não se constituem enquanto espetáculos cênicos, pela ausência de tempo para as preparações. O trabalho com jogos e improvisações tem como princípio propiciar aos educandos vivências e experiências lúdicas, que como já dito nessa unidade, não necessitam de justificativas além das intrínsecas ao fenômeno teatral. Cabe ao professor conscientizar inclusive seus alunos (que também têm a expectativa de se apresentarem em público), de que os jogos e improvisações não têm tal fim, embora nada impeça de que sejam realizadas mostras do trabalho e seu desenvolvimento, mas sem a expectativa espetacular.

FONTE: Disponível em: <www.redeastecas.org>. Acesso em: 16 mar. 2010.

FIGURA 30 – AULA DE TEATRO – REDE ASTECAS

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

O objetivo do ensino de teatro na escola não é a preparação de atores mirins para peças escolares, nem a formação de atores que venham a atuar em espetáculos teatrais profissionais, televisão e outros meios cênicos. A finalidade dos exercícios e jogos é o crescimento pessoal dos alunos por meio da linguagem teatral, para que estejam aptos a uma leitura crítica do mundo e tenham o direito à alfabetização estética.

As atividades, no sistema de jogos que estamos propondo aqui, pressupõem o jogo a partir de apresentações que sejam realizadas sempre para uma plateia, sempre composta dos integrantes da turma. O revezamento entre os atores é condição para que todos possam jogar e para que todos possam apreciar seus colegas.

Também é importante que o professor mantenha um diálogo aberto com a escola ou comunidade onde estiver, propondo o trabalho com jogos, no intuito de não ser mal interpretado ou compreendido. Alguns fatores acabam acontecendo e ficam visíveis aos olhos da comunidade escolar, como por exemplo:

• Barulho: em virtude dos trabalhos coletivos, o barulho não representa desordem, sendo em alguns jogos necessários para o andamento das propostas;

• Exclusão/Inclusão de alunos: Geralmente, pais e professores de outras disciplinas acabam transformando a aula de teatro numa espécie de prêmio, de que só é digno o aluno “comportado”, ou numa sessão terapêutica, para a qual são enviados aqueles alunos ditos “problemáticos”, na espera que o teatro os liberte, os desenvolva, os aquiete, enfim, vários são os objetivos inventados. O professor não pode permitir que isso aconteça, pois os jogos e improvisações recebem a todos, sem preferências e premiações;

• Datas comemorativas: Não é raro o professor que trabalha com teatro em instituições de qualquer natureza ser requisitado a prepara apresentações com seus alunos para datas comemorativas. Nesse caso, é necessário um diálogo bem argumentado com a comunidade em que ele está inserido, para que essas datas não sejam prejudiciais ao andamento e continuidade do trabalho com os jogos;

• Espaço: Não são todas as escolas ou instituições que possuem local adequado para o trabalho com jogos e improvisações. Cabe ao professor organizar a sala conforme lhe convém. Mesmo numa sala de aula convencional, com cadeiras e carteiras, é possível trabalhar com os alunos no sentido de afastá-las no início das aulas e colocá-las no lugar ao fim do encontro. Obviamente isso implica tempo e predisposição, tanto por parte dos participantes, quanto dos professores que lecionam em aulas anteriores ou seguintes. No caso de locomoção dos alunos para espaços mais adaptados ao trabalho cênico, o tempo também estará presente, pois essa é uma relação em que uma coisa depende da outra;

• Saídas de campo: muitas das atividades com jogos são realizadas fora do ambiente da sala de aula, ao ar livre e/ou em espaços não convencionais. A escola ou instituição precisa estar ciente desses “passeios” que ora ou outra podem acontecer, principalmente quando o professor propõe trabalhar com estéticas de interferência e performance urbana.

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TÓPICO 3 | PRÁTICAS E VIVÊNCIAS

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Em seguida, trazemos uma sugestão de planejamento de aula, no sistema de jogos e improvisações. Partimos do modelo proposto por Japiassu (2001), com algumas alterações que julgamos pertinentes:

Plano de ensinoDados da escola:Identificação:Endereço:Fone:Coordenador Pedagógico:Diretor Escolar:Outros dados administrativos:Dados operacionais:Séries-alvo:Características da turma:Faixa etária dos alunos:Total de sessões de trabalho com jogos teatrais:Duração de cada sessão:Período de realização do projeto:Frequência das sessões (semanal, mensal, diária):Dia da semana em que se realizam as sessões:Horário das sessões:Local de realização das sessões:Cronograma e relações de conteúdos trabalhados:Sessão1 (data) (conteúdo):Sessão 2 (data) (conteúdo):

2.2 PROTOCOLOS DE SESSÃO

Os protocolos são as coisas que os alunos querem dizer sobre suas vivências nas aulas de teatro. A metodologia da protocolização, como vimos anteriormente, começou a aparecer nos escritos de J. L. Moreno na tentativa de registro de suas sessões de Psicodrama. Hoje em dia, com a evolução dessa metodologia e usos em diferentes contextos, várias são as maneiras de incentivar os alunos a protocolarem as aulas.

O registro pode acontecer por diferentes manifestações, como desenhos, gravações, textos, poesias e músicas. É importante que o professor incentive os alunos a se manifestarem da maneira que mais lhes agrada, para que o processo de realizar o protocolo não seja um peso, ou uma tarefa como as outras atividades escolares.

Também é aconselhável o uso de um rodízio para essa atividade. Dependendo do tamanho da turma, o professor pode fazer uma escala, na qual, diariamente, um ou dois alunos fiquem responsáveis pelo protocolo da aula. Assim, evita-se que o protocolo se constitua numa rotina cansativa e repetitiva.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

Ao chegar aos encontros, o primeiro momento deve ser a apreciação dos protocolos realizados pelos alunos responsáveis pela aula anterior. Após as apresentações dos protocolos, o professor pode abrir espaços para discussões, que visam avaliar o encontro anterior e começar a organizar o que está por vir.

Os alunos responsáveis por protocolar um encontro, não ficam observando o que acontece, mas participam inteiramente da aula. Por isso, os registros podem conter impressões pessoais, sentimentos, olhares individuais e experiências únicas, que são vivenciadas por aquele sujeito, de forma irrepetível.

Oportunizar aos participantes de uma sessão de trabalho teatral com jogos e improvisação, que falem sobre suas experiências de forma a se expressarem diante do grupo, é dar ao sujeito possibilidades de integração e aceitação. Mesmo os que aparentemente se mostram mais tímidos, acabam demonstrando, nos protocolos, sua capacidade de interação e envolvimento com os jogos.

FONTE: Disponível em: <www.voluntariado.fb.org.br>. Acesso em: 18 mar. 2010.

FIGURA 31 – VOLUNTARIADO

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TÓPICO 3 | PRÁTICAS E VIVÊNCIAS

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3 ALGUNS JOGOS

A partir de agora, veremos um resumo de alguns jogos propostos por Viola Spolin.

DICAS

Para compreender melhor a metodologia proposta por Viola Spolin, é indispensável o contato com sua obra JOGOS TEATRAIS - O fichário de Viola Spolin foi publicado no Brasil pela Editora Perspectiva, em 2008. Trata-se de uma seleção especial de jogos teatrais, dispostos em fichas separadas em uma caixa, específicos para o trabalho em sala de aula. Nesse material, a autora instrumentaliza o professor de uma maneira bem didática, com o objetivo de tornar clara e aplicável a metodologia dos jogos no ensino de teatro.

FONTE: CAPA DO FICHÁRIO DE VIOLA SPOLIN. Disponível em: <www.editoraperspectiva.com.br>. Acesso em: 17 mar. 2010.

A seleção trazida para este Caderno de Artes Cênicas tem como objetivo apresentar de forma introdutória o funcionamento de cinco jogos teatrais, que podem ser praticados por alunos de qualquer faixa etária, em salas de aula ou outros ambientes de aprendizagem.

Os jogos selecionados são:

lcabo de guerra;lrelatar um incidente acrescentando colorido;lconstruindo uma história;lblablação;ldiálogo cantado.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

a) Cabo de guerra

DESCRIÇÃO – Fazer o jogo de cabo de guerra, com uma equipe puxando de cada lado, só que a corda (o cabo) é invisível.

FOCO – Manter a corda no espaço.

INSTRUÇÃO – Veja a corda! Utilize todo o corpo para puxar a corda! Vamos puxar!

AVALIAÇÃO – Perguntar aos participantes que assistiram ao jogo sobre a reação de cada time ao puxar a corda. A corda, mesmo invisível, podia ser vista de alguma forma pelos jogadores? Era possível crer que ela estava ali? Fazer as mesmas perguntas aos jogadores.

b) Relatar um incidente acrescentando colorido

DESCRIÇÃO – Um jogador (A) conta para o outro (B) uma história simples (um incidente com cinco ou seis frases). O jogador B deve contar a mesma história acrescentando o maior número de cores que conseguir.

A) narrando: Eu estava no meu quarto jogando meu vídeo-game e começou a chover.

B) recontando: Eu estava no meu quarto azul, jogando meu vídeo-game cinza e começou a chover amarelo.

FOCO – Ver um incidente e suas cores ao ser contado.

INSTRUÇÃO – Veja seu parceiro! Não pense nas cores! Veja-as. Fale diretamente ao seu parceiro. Compartilhe sua voz!

AVALIAÇÃO – Os jogadores acrescentaram realmente o máximo de colorido possível às histórias? Alguém modificou a história?

c) Construindo uma história

DESCRIÇÃO – O grupo está sentado em círculo. O instrutor (professor) indica um aluno para começar a contar uma história (que pode ser criada ou recontada), e o seu companheiro do lado deve continuar a história, sem mudá-la drasticamente. Ex: A: Um menino estava caminhando na praça...B: o vento começou a soprar...C: O menino ficou com medo...Os jogadores não devem repetir a última palavra enunciada pelo jogador anterior.

FOCO – Atenção física à palavra.

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TÓPICO 3 | PRÁTICAS E VIVÊNCIAS

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INSTRUÇÃO – Mantenha a história em andamento! Não planeje com antecedência! Mantenha as palavras no espaço!

AVALIAÇÃO – Os jogadores perceberam o desenrolar da história? Tivemos uma história contada a uma voz? A história se manteve ou as mudanças não permitiram a construção de um enredo?

SUGESTÃO – O professor pode solicitar que os alunos encenem a história contada, jogando e acrescentando detalhes às situações enunciadas.

c) Blablação

DESCRIÇÃO – Os jogadores conversam em uma língua desconhecida, de modo a fazer com que a conversa tenha sentido. Evitar ao máximo palavras e expressões que se aproximem da língua portuguesa.

FOCO – Falar em Blablação

INSTRUÇÃO – Use variedade de sons! Exagere os movimentos da boca! Variem o tom! Deixem fluir a conversa!

AVALIAÇÃO – Havia variedade na Blablação? A Blablação aconteceu de forma fluente?

e) Diálogo Cantado

DESCRIÇÃO – Dois ou mais jogadores entram em acordo sobre Onde estão, Quem são e O Que estão fazendo. Todo o diálogo deve ser cantado.

FOCO – Cantar todo o diálogo.

INSTRUÇÃO – Cantem suas palavras! Cantem com intensidade e com todo o corpo!

AVALIAÇÃO – Os jogadores exploraram todas as possibilidades da música, da interação e da corporeidade?

Os cinco jogos expostos acima constituem um resumo do que pode ser encontrado na metodologia de Viola Spolin. Para maior apreensão dos recursos e procedimentos ao se trabalhar com os jogos no ensino de teatro, é interessante consultar diferentes autores e pesquisadores que vêm trabalhando nessa perspectiva.

A seguir, trazemos ainda uma leitura complementar sobre a relação entre teatro e educação, por meio de uma abordagem cultural-contemporânea.

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LEITURA COMPLEMENTAR

TEATRO E CULTURA

Carminda Mendes André

Na atualidade uma das motivações para educadores no trabalho com a arte tem-se baseado na realidade da desagregação social que nos afeta diariamente. Desagregados não mais nos identificamos com uma identidade tal como, por exemplo, a de nação; não mais nos sentimos inseridos em uma comunidade – a família se resume cada vez mais aos pais e irmãos. Tal situação nos torna cada vez mais indiferentes aos outros que, por sua vez, se tornam estranhos. Tais sentimentos (ou ausência deles) ajudam a enfraquecer a solidariedade. É o que chamamos individualismo. No entanto, o princípio que afirma ser o homem um ser social, que afirma que o homem sozinho adoece, ainda parece ter sentido entre nós. Afirmamos isso porque estamos permanentemente em busca de maneiras de aproximações, sofremos esta fragmentação social – que o estilo contemporâneo de vida nos impõe.

É neste sentido que muitos de nós, educadores, valorizamos o exercício do teatro que, ao ser realizado em grupo, exige dos participantes a tolerância e o sentimento de comunhão, de modo a reviver, mesmo que como jogo, a experiência de pertencer a uma pequena comunidade: o grupo de trabalho. Outras vantagens que se têm atribuído ao teatro é a necessária interdisciplinaridade e integração social que surge em uma atuação coletiva. Dizemos que para se fazer teatro é necessário alcançar uma “alma grupo”. E para se atingir tal meta tanto os artistas como os educadores têm adotado processos criativos que objetivam despertar a consciência do eu, a consciência do outro e a consciência do entorno. Nesse sentido, pode-se dizer que a ação do fazer teatral é uma atitude de intervenção nas práticas da ética, da política e da construção do saber. Poderíamos dizer que, metaforicamente, para a convivência artística de um grupo de teatro é necessário criar regras para o convívio, é uma espécie de pequena sociedade fundada e por isso pode se dizer que cada grupo cria sua própria cultura; no embate das diferenças individuais, é preciso que os integrantes inventem ou adotem comportamentos para descobrir seus próprios fins.

Nesse processo de criação cultural dos comportamentos, tudo o que é produzido é expressão desse pequeno coletivo. Esse fato poderia explicar os diferentes processos para a criação, as diferentes maneiras de se organizar tal produção, bem como as diferentes vertentes estéticas encontradas no contexto cultural. Atualmente é a diversidade dessa produção simbólica que possibilita ao pesquisador elaborar um panorama da cultura teatral de uma localidade. Hoje a cultura é plural, é diversidade, apesar de podermos encontrar elementos de semelhanças entre elas, algo que indique certa identidade coletiva, não é possível negar o intercâmbio cultural promovido pelos meios de comunicação e pela ideologia da globalização. Por mais fechado que um grupo seja, ele será afetado pela cultura de massa e pela cultura de outros grupos. O que importa esse fato para a ação educativa proposta pelo teatro na escola?

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TÓPICO 3 | PRÁTICAS E VIVÊNCIAS

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Se a produção cultural for entendida como multiplicidade, não é possível pensar-se em ensinar estéticas ou gêneros teatrais ou qualquer outro tipo de resultado alcançado pelos grupos profissionais, sem enfatizar sua natureza inacabada, transitória, histórica; ou seja, sem compreendê-la como uma perspectiva, posição que se coloca em contraponto ao entendimento desta como representação da verdade. Insistir no ensino das formas dramáticas ou mesmo vanguardistas como totalidades, se torna uma atitude passadista, na contramão do que mostra a produção simbólica artístico-teatral da atualidade. O que ensinar? E o que fazer com o conhecimento acumulado pela história da arte? Ninguém cria do nada. Os grupos e indivíduos agem a partir do que conhecem, do que adquiriram. Se há produção teatral hoje, é porque há uma história do teatro na qual a atualidade se apoia. O que se questiona é a causalidade e o sentido de origem embutido nessa perspectiva de análise; ou seja, é difícil nos caracterizarmos como se fossemos “fruto” do passado. O presente não mais se caracteriza como produto originado desse passado. Entre a produção do passado e a que se processa no presente acontecem desvios, acasos, acidentes, afetações antes insuspeitadas, tudo contribuindo para mudar paradigmas provocando mudanças.

Tais mudanças não são necessariamente o surgimento de um “novo” perturbador, uma ruptura. Hoje a arte não oferece essa possibilidade (pelo menos por enquanto), é como se tudo já estivesse sido criado restando-nos recriar o recriado. O hibridismo que observamos na produção artística é composto por afetações mínimas. Dessa maneira, temos a sensação de que os objetos simbólicos são repetitivos como se vivêssemos uma crise da imaginação. É preciso, no entanto, perceber que o fenômeno da globalização, o contato estreito com outras culturas e a cultura de massa acaba por nos fazer aparentemente iguais. Isso é bom quando podemos nos sensibilizar com grupos que estão longe, isso é ruim quando acreditamos na identidade de massa como absoluta. Diante de tal situação, o que diferencia um grupo de outro?

Os modos com que cada grupo é afetado e, ao mesmo tempo, que se apropria das coisas e das ideias, é o que os pode diferenciar. São modos de produção do objeto simbólico e não o símbolo ou o objeto em si o que talvez, hoje, poderia manter ativos, criativos e produtivos os grupos de teatro. Ter consciência dos modos com que nos afetamos e nos apropriamos daquilo que nos chega é tomar consciência dos modos que exercemos a ética, a política e o saber.

[...]

FONTE: ANDRÉ, Carminda Mendes. Teatro e Cultura. Disponível em: <www.portalabrace.org/ivreuniao/pedagogia.htm>. Acesso em: 20 mar. 2010.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Nesse tópico, você viu que:

• O plano de aula do professor que trabalha na metodologia dos jogos teatrais e improvisação deve ser realizado de modo a prever o imprevisto.

• A avaliação coletiva faz parte do processo, e o foco das aulas está justamente no processo e não no resultado e no produto.

• Protocolar as sessões de trabalho e dar oportunidade ao aluno para que ele se expresse e seja compreendido diante dos seus colegas.

• A ligação entre o teatro e a cultura na sociedade contemporânea, como visto na leitura complementar, é a possibilidade de um ensino de teatro que esteja inserido na comunidade e cumpra sua função social.

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Como proposta de autoatividade desse tópico, nada mais interessante do que praticar os jogos teatrais. Para isso, reúna algumas pessoas, que podem ser crianças ou não, de uma escola ou não. Seja um instrutor de jogo. Comece pelo Cabo de Guerra e vá até o Diálogo Cantado. Peça aos participantes que façam anotações e protocolem o encontro. Fica a sugestão, para que esse encontro seja realizado no formato de oficina de jogos, a ser ministrado numa escola ou outra instituição para a qual o ensino de teatro seja relevante. Como auxílio para as atividades, consulte, se possível, o Fichário de Viola Spolin, sugerido anteriormente. Boas práticas e boas vivências!

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 4

TEXTO E ADAPTAÇÃO TEATRAL NA ESCOLA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Falar sobre a arte da adaptação, propor ideias de leitura dramática e elencar alguns cuidados que devemos ter ao propor uma adaptação de obra é a tarefa que nos cabe neste tópico.

Iniciamos com algumas considerações que tratarão do texto e adaptação e principalmente das possibilidades que se abrem no universo escolar para a realização de leitura dramática.

Cabe observar que ao conseguirmos nos apoderar de uma técnica, de sua forma e reconhecer seus elementos, crescemos e desenvolvemos nossa capacidade de inovar.

Será fácil perceber que o teatro em si pode conter uma síntese da literatura, mas o ator é capaz de transformar essa literatura em vida quando a transforma em leitura dramática.

E por fim, compartilhar experiências e tratar de questões práticas, através da leitura complementar, sobre os direitos autorais.

2 A ARTE DA ADAPTAÇÃO TEXTUAL

Adaptar um texto, conto ou narrativa, resulta da transposição de uma obra e sua adequação dentro do que se pretende, através da modificação do original e da manutenção de uma ideia inicial.

É uma tarefa que requer muitos cuidados e se faz necessário que a pessoa que toma para si a adaptação de uma peça teatral, por exemplo, tenha conhecimento da obra e compreenda suas implicações.

Adaptar uma peça teatral corresponde a reescrever seu roteiro, reconhecer os atos que constituem a sequência de cenas interligadas e suas subdivisões. É estar preparado para realizar alterações que podem ir desde o número de personagens até a quantidade de falas e ações; é propor-se a modificar elementos vitais e indispensáveis para a concretização do entendimento e trazer novas orientações para atores e toda a equipe técnica sobre cada cena a ser representada.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

Adaptar um texto para teatro é uma grande responsabilidade e exige envolvimento, conhecimento e domínio sobre o que se está propondo.

Em sala de aula esta tarefa é difícil, mas não impossível, ela exige um pouco mais de empenho que o habitual e envolvimento para sua realização, dispensando tempo para estudar as possibilidades e traçar objetivos claros antes de efetivá-la.

Para isso você pode seguir algumas sugestões e caminhos.

Primeiramente escolha o texto a ser adaptado, não é necessário que seja dramático - se o grupo já conhece a estrutura de um texto dramático as coisas ficam bem mais fáceis, se o contrário, então, a indicação é de que antes de tudo passe a conhecer – proponha algo pouco complexo, isso facilita a aprendizagem e evita a sensação inicial de que não se vai dar conta; Em seguida, solicite que trechos do texto sejam lidos em voz alta, aproveite este momento, faça observações e perguntas sobre o significado do título da obra, do que ela trata, se conhecem o autor, em que época e contexto se passa a história, em que lugar, quantas personagens existem e como se relacionam. Na continuidade, divida a turma em equipes e proponha como tarefa coletiva passar o texto para a forma dramática. Para isso os alunos/adaptadores deverão elaborar diálogos, redigir rubricas com indicações de movimentos, ações e até de entonações de voz, propor cenário e figurinos.

Vale lembrar que para facilitar a tarefa, eles podem fazer uso de uma linguagem mais atualizada, menos formal, para melhor compreensão do sentido e facilidade de criação.

Neste caso, a adaptação de pequenos contos funciona muito bem, razão pela qual segue a seguir um exemplo da obra de Walter Benjamin. Ela permite a adaptação dentro de uma linguagem de fácil compreensão em diferentes faixas etárias.

O Rei e a Omelete

Era uma vez um rei que tinha todos os poderes e tesouros da Terra, mas apesar disso não se sentia feliz e a cada ano

ficava mais melancólico. Um dia ele chamou o seu cozinheiro preferido e disse:

"Você tem cozinhado muito bem para mim e tem trazido para a minha mesa as melhores iguarias, de modo que eu lhe sou agradecido.

Agora, porém, quero que você me dê uma última prova de sua arte.Você deve me preparar uma omelete de

amoras iguais àquelas que eu comi há cinquenta anos, na infância. Naquele tempo, meu pai tinha perdido a guerra contra o reino

vizinho e nós precisamos fugir: viajamos dia e noite através da floresta,onde afinal acabamos nos perdendo.

Estávamos famintos e cansadíssimos, quando chegamos a uma cabana onde morava uma velhinha que nos acolheu generosamente.

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TÓPICO 4 | TEXTO E ADAPTAÇÃO TEATRAL NA ESCOLA

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Ela preparou para nós uma omelete de amoras,quando a comi, fiquei maravilhado: a omelete era deliciosa e me trouxe novas esperanças

ao coração. Na época eu era criança, não dei importância à coisa. Mais tarde, já no trono, vasculhei todo o reino, porém não foi

possível localizá-la. Agora quero que você me atenda esse desejo: faça uma omelete de amoras igual à dela. Se você conseguir, eu lhe darei ouro e o designarei meu herdeiro, meu sucessor no trono. Se você não

conseguir, entretanto, mandarei matá-lo". Então, o cozinheiro falou:"Senhor, pode chamar imediatamente o

carrasco. É claro que eu conheço todo o segredo da preparação de uma omelete de amoras, sei empregar todos os temperos.

Conheço as palavras mágicas que devem pronunciadas enquanto os ovos são batidos e a melhor técnica para batê-los. Mas isso não me impedirá

de ser executado, porque a minha omelete jamais será igual à da velhinha. Ela não terá o sabor picante do perigo,

a emoção da fuga, não será comida com a sentido alerta do perseguido, não terá a doçura inesperada da hospitalidade calorosa e do ansiado repouso, enfim conseguido. Não terá o sabor do presente estranho

e do futuro incerto". Assim falou o cozinheiro. O Rei ficou calado, durante algum tempo.

Não muito mais tarde, consta que lhe deu muitos presentes, tornou-o um homem rico e despediu-o do serviço real.

(Walter Benjamin)

FONTE: RANGEL, Alexandre. As Mais Belas Parábolas De Todos Os Tempos. Vol. 2, Belo Horizonte, MG: Editora Leitura, 2004.

3 TEXTO TEATRAL ADAPTADO E LEITURA DRAMÁTICA

Depois de propiciar a seus alunos a possibilidade de adaptar um conto e transformá-lo em texto dramático é hora de compartilhar esta conquista propondo aos grupos uma leitura dramática da peça adaptada.

O texto dramático de uma maneira bem simples pode ser reconhecido como aquele em que se apresenta o diálogo pela própria personagem, não sendo apresentado por um narrador. sua fundamentação se dá com certa dose de tensão ou conflito concentrado que se intensifica gerando expectativas para o seu desenlace.

É um texto para plateia, para ser compartilhado, portanto, de maneira alguma o educador deve deixar “guardadas” as produções de seus alunos. É importante manter a objetividade com o que foi produzido não medindo esforços para que se possa propiciar a leitura dramática dos textos desenvolvidos, mesmo que para um público pequeno. E em diferentes momentos e espaços escolares.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

Ao possibilitar a realização da leitura dramática, principalmente, quando seu criador ou criadores têm a oportunidade de vivenciar a experiência. Exercer a real função de educador é fazer com que o educando se sinta valorizado, é aumentar sua autoestima e esse é um caminho eficaz para o bom desempenho escolar.

É importante ressaltar que a leitura dramática vai propiciar uma incansável exploração do texto dramático na integra, não somente em relação ao conteúdo, mas também em seus aspectos formais, vai possibilitar a consolidação dos sentidos possíveis que se deu à obra e a seus personagens, através de trabalho expressivo, além de ser um momento prazeroso.

Para que a leitura dramática se efetive é preciso, mesmo ciente de que estará com o texto à mão, treinar bastante a leitura, manter as intenções marcadas nas rubricas, controlar inflexões vocais, expressões e gestos, comedida será a movimentação em cena. Lembre-se, mesmo se tratando de leitura dramática, não dispense objetos cenográficos, nem adereços, nem figurinos. Na verdade esta é uma decisão que pode ser tomada em conjunto, mas que já vem com a certeza de que o grupo vai pedir por ela, pois esses elementos facilitam a construção da personagem e determinam a “atmosfera” da apresentação.

DICAS

Uma boa ideia é realizar uma parceria com professores de Literatura ou Línguas, História e Sociologia. Eles possuem informações bem precisas sobre gêneros literários, sobre textos teatrais, sobre períodos históricos e movimentos sociais em diferentes épocas. Podem indicar contos para serem adaptados e auxiliarem os grupos nas interpretações e aprofundamento dos conhecimentos referentes aos períodos históricos dos textos em questão.

4 COMPARTILHANDO EXPERIÊNCIA

Agora que você já sabe que a leitura dramática oferece inúmeras possibilidades de tornar a aprendizagem significativa, é momento para compartilhar algumas experiências. Ao propor uma leitura dramática sempre é importante observar com mais atenção em que grupo se vai propor a atividade, isso por um motivo bem óbvio é quase impossível para um educador, que em geral trabalha com inúmeras turmas, planejar e executar esta tarefa com mais de uma turma ao mesmo tempo, ele precisa intercalar, para facilitar seu trabalho ou mesmo para não esgotar possibilidades logo no primeiro momento, tornando esta uma proposta corriqueira. Lembre sempre, alunos precisam de desafios, de estímulo e, muitas vezes, um trabalho de sucesso com um grupo pode ser o elemento necessário para desencadear ou impulsionar novas propostas.

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TÓPICO 4 | TEXTO E ADAPTAÇÃO TEATRAL NA ESCOLA

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Quando da conclusão da Licenciatura em Artes Cênicas, nos foi proposta a montagem da peça de William Shakespeare “Sonho de uma noite de verão”, a aceitação foi imediata e a ideia do professor/diretor era de que fosse ambientada de maneira contemporânea, mais especificamente entre o fim dos anos de 1960 e início de 1970. Para concretizar fazia-se necessário iniciar uma pesquisa sobre moda, sobre tendências de tecidos e acessórios, sobre movimentos sociais e seus reflexos, sobre música e tudo o mais que pudesse servir como base para efetivação da ideia. Além do mais, após buscar todas essas informações era preciso sondar até que ponto o grupo se sentia identificado com o que estava sendo proposto, em resumo, ver se havia empatia com a ideia. Essa parte na verdade foi a mais fácil, pois o período foi marcado pelo grande sucesso dos The Beatles, no mundo da moda eram os cabelos Black Power, a minissaia e outros elementos do movimento hippie, isso foi mais que suficiente para começar.

O elenco era composto por um grupo bastante grande, inúmeras personagens, muitas tiveram que ser acrescidas, algumas falas foram divididas, outras suprimidas, mas, enfim, foi um processo de recriação intenso e uma experiência inesquecível.

Algum tempo depois, a mesma peça foi montada em uma escola com um grupo de alunos, bem menos numeroso, porém, desejoso de que se mantivessem costumes de época, como figurinos e fala mais rebuscada. Assim, houve a necessidade de nova adaptação.

Quanto ao que se refere à adaptação textual para montagem de uma peça teatral é importante que o adaptador e/ou adaptadores observem detalhes nos diálogos ou comentários das personagens. No exemplo que segue foram substituídas algumas comparações, objetivando o estabelecimento de relações significativas para o público. O exemplo toma como base o diálogo entre as personagens durante a apresentação da peça de teatro “Píramo e sua amada, a bela Tisbe” nos festejos de casamento no ato final da adaptação de Sonhos de uma Noite de Verão de William Shakespeare, encenada no verão de 2003 pelos formandos do curso de Artes Cênicas da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC).

Antes:

Píramo – Dá-me um beijo através deste vil muro.Tisbe – Não te beijei; beijei o barro duro.Píramo – Ao sepulcro de Nino vais agora?Tisbe – Ou viva ou morta, estarei lá numa hora.

FONTE: Disponível em: <http://pt.wikisource.org/wiki/Sonho_de_uma_Noite_de_Ver%C3%A3o/V>. Acesso em: 10 abr. 2012.

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

Depois:

Píramo – Me beije através deste muro bandido.Tisbe – Não te beijei; beijei o barro duro.Píramo – Ao túmulo de Elvis Presley vais agora?Tisbe – Ou viva ou morta lá estarei.

(Comentários das personagens/público da peça dentro da peça, durante a apresentação).

Antes:

Teseu – Se não pensarmos mais mal deles do que eles próprios pensam, poderão passar por excelentes pessoas. Eis que chegam a lua e o leão.

(voltam a lua e o leão)Leão – Senhoras que tremem de medo, quando vem um simples ratinho;

o que fariam se ouvissem, entre as árvores, rugir o leão raivoso? Fiquem sabendo que sou Marioca Snug; nem leão, nem leoa, homem de verdade.

Teseu – Aí está um animal verdadeiramente educado e de boa consciência.Demétrio – É o melhor animal que já vi em toda minha vida.Lisandro – Quanto ao valor, é raposa legítima.

Depois:

Leão – Senhoras que tremem de medo, quando veem um simples ratinho; o que fariam se ouvissem, entre as árvores, rugir o leão raivoso? Fiquem sabendo que sou Marioca Snug; nem leão, nem leoa, homem de verdade.

Teseu – Aí está um animal verdadeiramente educado e de boa consciência.Demétrio – É o melhor animal que já vi em toda minha vida.Lisandro – Quanto ao valor, é gato, persa legítimo.

Estas pequenas alterações além de propiciarem um melhor entendimento para o público facilitam os trabalhos de adaptação, pois a linguagem se torna mais acessível até mesmo para o adaptador. Por outro lado, observe que aumentam as responsabilidades, o adaptador precisa estar atento a detalhes.

5 CONVERSAS SOBRE AVALIAÇÃO NA PRODUÇÃO TEATRAL ESCOLAR

Na maioria das vezes em que o educador decide por um trabalho em sala de aula fazendo uso do teatro como recurso, a questão que lhe vem à mente está diretamente ligada ao como avaliar. A avaliação é um elemento que vem sendo discutido em todas as áreas da educação incansavelmente, avançando por vezes a passos lentos. Os mecanismos vão se tornando cada vez mais diversificados, buscando melhorias essenciais que facilitem esta tarefa tão importante do trabalho do educador. Na prática teatral na escola, os mecanismos comumente utilizados

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TÓPICO 4 | TEXTO E ADAPTAÇÃO TEATRAL NA ESCOLA

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oferecem certa dose de dificuldades decorrentes, muitas vezes, de conceitos equivocados e ultrapassados ou que servem aos propósitos de disciplinas bem específicas.

A ideia que se tem sobre avaliação nas diferentes disciplinas escolares deve ser substituída quando o assunto forem as produções teatrais na escola. Isso porque avaliar em teatro pressupõe considerar a avaliação como elemento motivador à atuação, como uma possibilidade de revelação do eu pessoal, como mudança de postura, de atitude, de comportamento e de desenvolvimento de habilidades de maneira processual.

Durante todo o tempo em sala de aula devemos avaliar, para isso

precisamos conhecer o aluno, estar atento as suas ações e também propor mecanismos de autoavaliação. Não há receita pronta para isso, porém, fazer uso de tabelas como nos exemplos a seguir pode ser uma alternativa.

AVALIAÇÃOCRITÉRIOS PARA AVALIAÇÃO DE ATIVIDADES

TEATRAIS NA ESCOLA___ANO/SÉRIE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

___ BIMESTRE/ ANO

NOME DO ALUNO:

CRITÉRIOS A SEREMAVALIADOS

Peso PROPOSTA PRODUÇÃO ATUAÇÃO

Responsabilidade e cooperação Planeja/Investiga/ compartilha

2.0

Empenho nas tentativasExperimenta/Viabiliza

2.0

3. ParticipaçãoContribui/opina

1.0

4. Desenvolvimento da propostaIniciativa/Produção (processo)/Coerência

3.0

5. Aplicação do conteúdo teórico na práticaDesenvolve/Apresenta

2.0

Nota Final 10.0

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

AUTOAVALIAÇÃOCRITÉRIOS PARA AUTOAVALIAÇÃO DE ATIVIDADES TEATRAIS NA ESCOLA

___ANO/SÉRIE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO___ BIMESTRE/ ANO

NOME DO ALUNO:TÍTULO DO TRABALHO:

Conteúdo Temático Se identificou com a produção. Nota

CriatividadePesquisou e utilizou materiais e recursos diversificados na execução das tarefas.

Nota

Produção A proposta esteve de acordo com o tema e legibilidade da obra. Nota

Envolvimento e responsabilidade

Trouxe materiais, se envolveu do começo ao fim. Nota

Conceito geral Desenvolveu habilidades, se apropriou de conceitos, ressignificou.

Nota final

ATENCAO

Antes de propor uma determinada obra literária para adaptação é importante certificar-se de uma coisa e ao realizar a adaptação, de outra; a primeira delas é verificar se a obra já é de domínio público, ou seja, se já pode ser utilizada livremente, caso contrário, existem taxas e autorizações a serem solicitadas legalmente, a partir do momento em que delas faremos uso para divulgação; a segunda é que mesmo não sendo mais propriedade exclusiva de seu titular, mas por questões éticas e morais é importante conferir os créditos a seu criador.

Como você pode ver, é possível organizar a avaliação, porém existem outras alternativas ou mecanismos bastante valiosos. Um deles é o diário de registros, onde cada educando pode expor, passo a passo, tudo o que acontece, fazendo uso de uma linguagem bem pessoal e particular. Este diário pode conter além de comentários, fotos, desenhos, listagens e tudo o mais que se desejar, pode ser também em forma de álbum. Outro recurso possível é propor o desenvolvimento de um slide que o grupo organiza e apresenta, expondo suas opiniões e conclusões. Rodas de conversas são imprescindíveis, por isso, a cada encontro estabeleça um tempo para que sejam discutidas as ações, compartilhadas as ideias, identificados os conceitos, empregados os termos. Lembre sempre que teatro é vivência, mas também é conhecimento histórico e possui uma linguagem bem própria. Não se pode fazer teatro sem o pensar sobre teatro.

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TÓPICO 4 | TEXTO E ADAPTAÇÃO TEATRAL NA ESCOLA

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LEITURA COMPLEMENTAR

OBRAS LITERÁRIAS E ARTÍSTICAS

Museu Paraense Emílio Goeldi

A lei que versa sobre direitos do autor no caso da proteção de obras literárias e artísticas é a nº 9610, de 19 de fevereiro de 1998. A instituição responsável pelo registro é a Biblioteca Nacional, definida na Lei nº 5988, de 14 de dezembro de 1973. Outras instituições nos estados podem, mediante convênio com a Biblioteca Nacional, se credenciar como escritórios de representação. Contudo, é importante esclarecer que de forma diferente do que acontece com a patente ou outros instrumentos de propriedade industrial, a proteção aos direitos que trata a lei independe de registro, sendo facultado ao autor registrar a sua obra em órgão descrito por lei (art. 18 e 19).

São obras intelectuais protegidas (art. 7) as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:

• textos de obras literárias, artísticas ou científicas;

• conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza;

• obras dramáticas e dramático-musicais;

• obras coreográficas e pantomímicas, cuja execução cênica se fixa por escrito ou por outra qualquer forma;

• composições musicais, tenham ou não letra;

• obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive as cinematográficas;

• obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia;

• obras de desenho, pintura, gravura, escultura, litografia e arte cinética;

• ilustrações, cartas geográficas e outras obras da mesma natureza;

• projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência;

• adaptações, traduções e outras transformações de obras originais, apresentadas como criação intelectual nova;

• os programas de computador (os programas de computador são objeto de legislação específica, observadas as disposições desta lei que lhes sejam aplicáveis);

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UNIDADE 2 | JOGO TEATRAL E IMPROVISAÇÃO

• as coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual.

Não são objeto de proteção segundo a lei de direitos autorais (art. 8)

• ideias, procedimentos normativos, sistemas, métodos, projetos ou conceitos matemáticos como tais;

• esquemas, planos ou regras para realizar atos mentais, jogos ou negócios;

• formulários em branco para serem preenchidos por qualquer tipo de informação científica ou não, e suas instruções;

• textos de tratados ou convenções, leis, decretos, regulamentos, decisões judiciais e demais atos oficiais;

• informações de uso comum tais como calendários, agendas, cadastro ou legendas;

• nomes e títulos isolados;

• aproveitamento industrial ou comercial das ideias contidas nas obras.

Da validade das proteções e do domínio público

• Validade da proteção autoral: inicia-se a partir da criação da obra e perdura por 70 anos contados de 1º de janeiro do ano subsequente ao falecimento do autor (art. 42). No caso de coautoria, esse período é de 70 anos seguinte à morte do último coautor sobrevivente;

• Validade para obras anônimas ou pseudônimas: 70 anos contados de 1º de janeiro do ano imediatamente posterior ao da primeira publicação (art. 43);

• Validade para obras audiovisuais e fotográficas: 70 anos, a contar de 1º de janeiro do ano subsequente ao de sua divulgação (art. 44);

• Domínio Público: além das obras em relação às quais decorreu o prazo de proteção aos direitos patrimoniais, pertencem ao domínio público as obras de autores falecidos que não tenham deixado sucessores e as de autor desconhecido, ressalvada a proteção legal aos conhecimentos étnicos e tradicionais (art. 45).

FONTE: Site do Museu Paraense Emílio Goeldi. Disponível em: <www.museu-goeldi.br>. Acesso em: 22 fev. 2012.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Nesse tópico, você viu que:

• A adaptação de um texto teatral é possível na sala de aula e que pode ser um instrumento valioso para formar parcerias com as demais disciplinas do currículo escolar.

• Depois de desenvolvidas as atividades referentes à adaptação de um texto teatral, a realização de leitura dramática é prática imprescindível, pois é ela que vai dar sentido e significado ao trabalho.

• Ao se comprometer com o trabalho de adaptador é indispensável conhecer o texto em seus pequeníssimos detalhes e buscar dar a ele significação condizente com o universo do público para o qual pretende apresentá-lo.

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Nenhuma sugestão de atividade parece ser mais óbvia do que esta, então mãos à obra, ou melhor, ideias no papel Faça sua adaptação textual para uma breve leitura dramática, compartilhe suas ideias com seus colegas acadêmicos, façam a leitura e improvisem. Para isso, selecione um pequeno conto conhecido. Nada impede que utilize a sugestão de “O rei e a omelete”, dê a ele nova roupagem e não se esqueça das significações ou relações que se possa atribuir a elementos conhecidos.

AUTOATIVIDADE

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UNIDADE 3

TEATRO E VISUALIDADE

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

Ao final dessa unidade, você deve estar apto a:

• compreender o funcionamento da linguagem cenográfica como compo-nente da criação teatral contemporânea;

• estabelecer diálogos com as diferentes acepções do espaço cênico, a partir do estudo de conceitos, temáticas, linguagens e procedimentos cenográfi-cos de uso do espaço para a cena;

• identificar os elementos cenográficos constituintes de uma montagem tea-tral em diferentes linguagens.

Esta unidade está dividida em seis tópicos. Ao final de cada um deles, você terá a oportunidade de fixar seus conhecimentos realizando as atividades propostas.

TÓPICO 1 – CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

TÓPICO 2 – TEORIA DO ESPAÇO CÊNICO

TÓPICO 3 – ELEMENTOS CENOGRÁFICOS

TÓPICO 4 – CENOGRAFIA E PRÁTICA NA ESCOLA

TÓPICO 5 – O TEATRO DE BONECOS

TÓPICO 6 – O TEATRO DE MÁSCARAS

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TÓPICO 1

CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Nesse tópico, estudaremos a relação entre teatro e visualidade, por meio dos aspectos históricos que permeiam os estudos cenográficos. Elementos como a evolução do espaço cênico ao longo da história, estarão compondo um diálogo com os estudos da cenografia contemporânea.

Também conheceremos dois ícones em cenografia, Adolphe Appia e Edward Gordon Craig, que foram responsáveis por uma verdadeira revolução na cena contemporânea.

Boas leituras, visualizações, estudos e projetos!

2 ASPECTOS HISTÓRICOS

A palavra cenografia vem do grego skenographia. Tem relações diretas com o ato de projetar a cena. Todo o processo de criação e construção da imagem cênica, suas etapas, os materiais utilizados, a proposta estética, tudo isso é cenografia.

Cores, linhas, formas e volumes são utilizados pelos cenógrafos para dar vida ao espetáculo, como ajuste às necessidades e exigências do texto, do grupo, do dramaturgo.

Hoje, a cenografia está além do teatro. Podemos perceber sua presença em exposições, no cinema, na televisão e em eventos artísticos. Ela está aliada a diversos campos do conhecimento: artes cênicas, artes plásticas, arquitetura, design, o que amplia os horizontes de atuação do cenógrafo na contemporaneidade.

O cenógrafo, hoje, é um especialista na criação de elementos visuais, utilizando tecnologia e construções criativas em prol da arte, por meio de projetos que envolvam espaço e tempo, e estejam de acordo com a proposta do trabalho, seja uma montagem cênica ou um cenário performático.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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2.1 CENOGRAFIA GREGA

O teatro ocidental tem sua origem na Grécia, entre os séculos VII e VI a.C. As manifestações aconteciam em forma de festas, danças, desfiles e homenagens às estações do ano, às colheitas e aos deuses.

FONTE: Disponível em: <www.marscosalves.arteblog.com.br>. Acesso em: 20 abr. 2010.

FIGURA 32 – ESPAÇO GREGO

Altar

Camarins (quartos de

vestir)

Entrada da orquestra

Assentos dos

sacerdotes e juízes

Terraço do proskenion

Os atores principais se apresentavam no terraço do

proskenion, usando máscaras e sapatos com plataforma, para que pudessem ser vistos pelas últimas fileiras do topo. O coro

cantava e dançava na orquestra.

Entrada da orquestra

Orquestra de terra batida (local das danças)

O espaço cênico grego é composto pelo theatron, a orchestra e a skéne.

O theatron (o lugar de onde se vê) é constituído por degraus em semicírculo. Ele estava instalado nos aclives das colinas, por isso tinha ótima acústica natural e assim abarcava públicos com mais de 10 mil espectadores por sessão.

A orchestra era o lugar de atuação do coro, um espaço circular em areia. No centro havia um altar de pedra, o thymele.

A skené (cena) era o lugar onde atores guardavam e trocavam seus figurinos. Ali também eram armazenados os aparatos cenográficos.

Até o século V, os teatros gregos eram construídos em madeira e a cenografia era composta pelas próprias fachadas dos palácios, templos e tendas.

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TÓPICO 1 | CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

121

Depois de algum tempo, a skéne passou a servir também de cenário. Dela surgiam os “degraus de caronte”, uma escadaria subterrânea que desembocava na orchestra e servia para alguns “efeitos especiais”.

FONTE: Disponível em: <www.ufpel.br>. Acesso em: 21 abr. 2010.

FIGURA 33 – PLANTA BAIXA – ESPAÇO GREGO

Já os efeitos como barulhos de trovões, tumultos e sons de terremotos e rolar de pedras, eram produzidos por tambores de metal e madeira, pelos técnicos, chamados de mechanopoioi.

Em relação às cenas de violência, morte e esquartejamentos, próprias das tragédias, entrava em cena o ekiclema, plataforma rolante que carregava um cenário especial pelas portas de um palácio ou casa.

As únicas referências estéticas a partir das quais podemos compreender o teatro grego são pinturas em cerâmica, que retratavam personagens e cenários da época.

A pintura, aliás, foi ganhando espaço no teatro grego por meio de painéis pintados como cenário entre as colunas dos edifícios teatrais. Aí vemos uma primeira e importante aproximação entre as artes visuais e o teatro.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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2.2 CENOGRAFIA ROMANA

Entre os séculos III e II a.C. surgem os ludi romani – festas religiosas de caráter oficial, e os ludi scanenici – jogos cênicos, peças históricas e comédias que tinham como objetivo apresentar ao povo a literatura dramática romana. Durante dois séculos, o palco era uma estrutura temporária, abrigada sobre um tablado de madeira onde atuavam atores ambulantes da farsa popular.

O camarim dos atores era um galpão de madeira, no mesmo lugar em que antes ficava a cortina de fundo.

O mote político penem et circenses (pão e circo) deu uma característica especial ao teatro romano, embora as características da estrutura espacial tivessem sido herdadas do teatro grego.

ATENCAO

Pão e circo significava diversão: dar ao povo comida e entretenimento, como forma de fazê-los esquecer seus problemas. O teatro, portanto, não tinha compromisso reflexivo, pelo contrário, era muito mais um evento social, uma reunião de pessoas, que tinham como último interesse apreciar a cena.

O edifício teatral romano se diferenciava do grego também por ter suas construções sobre bases planas, e ser construído com materiais de alvenaria e pedra. A plateia simulava a mesma inclinação do teatro grego, com degraus em forma de arquibancada. Essas arquibancadas eram ocupadas de uma maneira hierarquizada. À frente, bem próximo aos atores, ficavam os homens governantes, poderosos. Em escala de diminuição de poder, depois vinham os homens livres, as mulheres e por fim os servos.

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TÓPICO 1 | CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

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FIGURA 34 – O ESPAÇO CÊNICO ROMANO

FONTE: Disponível em: <www.historiadoteatroufpel.blogspot.com>. Acesso em: 21 abr. 2010.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

124

A orchestra, agora, tinha o formato de semicírculo.

O fundo de cena era ornamentado, esculpido e arquitetônico.

O período de auge da arquitetura teatral romana aconteceu entre o século I e II d.C.

O desenvolvimento do espaço cênico e sua evolução do grego para o romano formalizou o edifício teatral. A skéne foi transformada em edifício e a orchestra em proscênio (o lugar da ação), o que faz toda a diferença para que compreendamos a arquitetura teatral contemporânea.

2.3 CENOGRAFIA MEDIEVAL

A Idade Média foi marcada pelo império religioso e o teocentrismo como premissa. Para o teatro, essa característica já é fundamental e determinante, ao transportar para o interior das igrejas o lugar cênico.

A força dos dramas litúrgicos, escritos e encenados em latim, tinha como atores os integrantes do clero. As encenações aconteciam por vários dias, versando sobre temas cíclicos da Bíblia como o Natal, a Páscoa, a Paixão, os Mistérios.

A representação dos dramas religiosos confundia-se com a própria liturgia. Os fiéis também participavam, às vezes, como figurantes e, às vezes, como atores. No princípio, as encenações eram realizadas somente no interior das igrejas, depois foram tomando conta dos pátios e dos lugares externos em frente às igrejas, nas ruas e nas praças.

Nessa etapa histórica, começava a aparecer um vínculo entre o sentido do texto e a cenografia. Um cenário simultâneo que continha indicações simples de lugar, espaço e tempo, sobre um carro-palco. Suas possibilidades de locomoção proporcionavam aos espectadores que se movimentassem de um local para o outro, para assistir à sequência da cena de acordo com o decorrer da ação. As próprias cenas, montadas nos cenários sobre os carros, foram levadas pelas ruas, em paradas onde havia público.

Os cenários, na Idade Média, como eram montados de acordo com as necessidades literárias, eram também um instrumento de informação em meio ao alto índice de população analfabeta.

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TÓPICO 1 | CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

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FONTE: Disponível em: <www.historiadoteatroufpel.blogspot.com>. Acesso em: 21 abr. 2010.

FIGURA 35 – O ESPAÇO CÊNICO MEDIEVAL

Porém, ao se distanciar espacialmente da igreja, os temas teatrais também começaram a se afastar das premissas religiosas. Por meio da disseminação de uma linguagem mais vulgar, o teatro começou a se popularizar e a tomar conta das comunidades e interiores. Histórias e personagens mais próximos do cotidiano começaram a aparecer, como: palhaços, bufões, comediantes e domadores de animais. Eles tomaram conta dos palcos. O improviso marcou essas novas encenações. A quase ausência de cenário facilitava as turnês e a chegada das trupes a diferentes vilarejos. Na Itália, esse movimento deu início a uma comédia de roteiro e improviso: a Commédia dell’arte.

FONTE: Disponível em: <www.cvrperformingarts.com>. Acesso em: 21 abr. 2010.

FIGURA 36 – A COMMEDIA DELL’ARTE

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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2.4 CENOGRAFIA ELISABETANA

A cena elisabetana contava com espaços cênicos construídos em madeira, que tinham até três níveis para a plateia. A hierarquização também estava presente, assim como no teatro romano. As galerias superiores eram destinadas aos mais ricos e as demais e o centro do edifício ao público popular.

O teatro elisabetano tinha as seguintes características:

• o palco ficava a um metro e meio do público popular central. Móveis e objetos eram utilizados como cenário;

• o Período é associado à Rainha Elisabeth I (1558-1603), por sua admiração pela arte e a luta por proteger seu país;

• o contexto é o ápice da renascença inglesa, “Era Dourada” onde se viu florecer a literatura e a poesia do país;

• há intensa fertilidade artística;• as construções arquitetônicas eram direcionadas a diversos públicos, isto é, os

edifícios não serviam só ao teatro;• esse período é marcado pela ascensão do capitalismo e sua divisão em classes.

Os edifícios teatrais elisabetanos eram categorizados em três distintos modelos:

a) Os Inn-Yards - pátios dos albergues, cunho comercial, público pagante, grande quantidade de espectadores por ser um espaço público;

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TÓPICO 1 | CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

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FONTE: Disponível em: <www.globe-theatre.org.uk>. Acesso em: 22 abr. 2010.

FIGURA 37 – INN YARD

b) Indoor Play houses – teatros pequenos e cobertos, público pagante, porém melhor selecionado;

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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FONTE: Disponível em: <www.globe-theatre.org.uk>. Acesso em: 22 abr. 2010.

FIGURA 38 – INDOOR PLAYHOUSE

c) Open Air Anphitheaters – anfiteatros, teatros elisabetanos por excelência, grande estrutura, desprovida de teto, com capacidade para muita gente.

FONTE: Disponível em: <www.globe-theatre.org.uk>. Acesso em: 22 abr. 2010.

FIGURA 39 – GLOBE THEATRE

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TÓPICO 1 | CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

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2.5 CENOGRAFIA RENASCENTISTA

A principal contribuição do renascimento para a visualidade no teatro é o surgimento da perspectiva.

Os pintores do renascimento representavam suas imagens numa maneira perspectivada, proporcionando um novo olhar sobre a tela. Ao mesmo tempo em que a ciência é, assim, introduzida na pintura, ela também estabelece um modelo de representação do espaço cartesiano em planos bidimensionais.

Esse fato fez toda a diferença para a arte de projetar o cenário, pois a cena pôde ser ampliada ilusioriamente, através de uma arquitetura do espaço cênico, possibilitada pelos desenhos de projeto. Resolvia-se assim, os problemas dos palcos pequenos, pois havia a oportunidade de ampliar o espaço por meio de um jogo de linhas convergentes a um determinado ponto: o ponto de fuga.

O cenário, desenhado, podia transportar o espectador para diversos lugares, que contivessem edifícios, bosques, campos e diferentes paisagens, de acordo com as necessidades da cena.

FONTE: Disponível em: <www.artcyclopedia.com>. Acesso em: 22 abr. 2010.

FIGURA 40 – JOHN HENRY FUSELI: LADY MACBETH, 1784

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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A ilusão ótica transformou, então, a cena, proporcionando ambientes e planos que traziam ao cenário a terceira dimensão.

2.6 O PALCO ITALIANO

A sala do teatro italiano é a mais conhecida. É aquela que fica dentro de um edifício retangular, que tem duas partes distintas – o lugar da cena (área de representação) e o lugar da plateia (destinado ao público).

O palco italiano surgiu de forma a fazer da boca de cena um quadro vivo, pronto para ser observado, contemplado, como se fosse uma pintura. Essa divisão, mais tarde recebeu de Antoine a nomenclatura de Teoria da Quarta Parede, que consistia numa parede de cena, transparente ao espectador, com a intenção de fazê-lo acreditar na verdade da cena, como se os atores fossem realmente as personagens, e como se ação fosse também parte do real.

FONTE: Disponível em: <www.desvendandoteatro.com>. Acesso em: 22 abr. 2010.

FIGURA 41 – ESPAÇO CÊNICO ITALIANO

É no teatro italiano que aconteceu o resgate da cortina, que no teatro grego era de fundo. A cortina passou a ser a divisão entre os espectadores e o espetáculo. Quem nunca ouviu a expressão “Abrem-se as cortinas”!?

Atrás dessas cortinas, todo um maquinário começou a ser feito e foi evoluindo, com contribuições das engenharias, principalmente a naval, para que a cena pudesse contar com apoios técnicos auxiliares do processo de encenação.

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TÓPICO 1 | CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

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Foram criados recursos cênicos das mais variadas espécies, painéis pintados deslizando sobre roldanas, trilhos, luzes, recursos sonoros, que deixavam os espetáculos deslumbrantes aos olhos do público.

Desse tipo de teatro, herdamos a espetacularização cenográfica como fator intrínseco ao teatro. A ideia de que o teatro precisa de cenários ricos e cheios de efeitos especiais traz para a cena uma desvalorização da necessidade de reflexão sobre o fazer cênico. Essas discussões ainda permeiam o ambiente de pesquisa em cenografia contemporânea. São discussões em torno do espaço cênico, que vêm possibilitando diferentes acepções do uso dos espaços (edifícios, casas, espaços urbanos) e das configurações (lugar da cena, do público, interação, participação) cênicas na atualidade.

3 REVOLUÇÃO CENOGRÁFICA

A cenografia contemporânea é fruto de todo o contexto histórico que estudamos até aqui. Obviamente, cada região do mundo foi desenvolvendo suas próprias linguagens e suas maneiras de pensar a visualidade no teatro. O contemporâneo, porém, não pode ser estudado sem antes conhecermos duas importantes personalidades para o cenário teatral dos estudos cenográficos: Adolphe Appia e Eward Gordon Craig. Seus estudos renovaram a cena e as concepções de cenografia, dando início a diferentes revoluções que contribuíram para a realidade que estudaremos mais adiante.

ESTUDOS FUTUROS

No próximo tópico, estudaremos a cenografia contemporânea por meio de uma possível teoria do espaço cênico, tal como ele é discutido e utilizado hoje, por diretores e cenógrafos. Mas por enquanto, é importante que você perceba que as revoluções acontecem por momentos de ruptura com o que vinha sendo feito. É o caso de Adolphe Appia e Edward Gordon Craig, que atuaram na cena teatral trazendo novas concepções e propostas que perduram até os dias atuais.

3.1 ADOLPHE APPIA (1862-1928)

Adolphe Appia, suíço, foi o responsável por transformar o espaço cênico num laboratório de possibilidades, embora a maioria de seus projetos nunca tenha sido executada. Suas obras fundamentais encontram-se nos escritos A encenação do drama Wagneriano (1895), A música e a Encenação (1899) e A obra de Arte Viva (1921).

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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Em seus esboços e maquetes ele começou a dar nova função à luz, enfatizando as sombras e criando espaços com maior profundidade. Com a evolução da luz elétrica, as pinturas, painéis e desenhos em perspectiva mostraram-se ultrapassados para as exigências da época.

A representação teatral é renovada em seu sentido, necessitando do ator, do texto dramático, da luz e da arquitetura cênica, como componentes indispensáveis à cena.

Para Appia, o ator devia compor a encenação, em um movimento simbolista, repleto de significados, junto aos recursos visuais disponibilizados para tal fim. Seus projetos propunham novas relações entre o intérprete e o espaço, pois ele percebia que havia uma distância muito grande entre a bidimensionalidade do cenário e a tridimensionalidade do corpo do ator. Aí temos uma revolução que modificou o evento teatral: o corpo do ator também é cênico, podendo compor o cenário, ou ser o próprio cenário, pois este corpo é a pura realidade, e sendo realidade é cenográfico por natureza.

Appia ficou conhecido por seus espaços rítmicos, compostos por volumes horizontais e verticais nas escadas e planos inclinados. Seus projetos continham espaços e superfícies estilizados, que foram chamados de cena interior, pois proporcionavam uma intensa ligação entre o ator e o espaço, dando novas formas à representação.

FONTE: Disponível em <www.artsalive.ca>. Acesso em: 23 abr. 2010

FIGURA 42 – ESPAÇOS RÍTMICOS DE ADOLPHE APPIA PARA ÓPERA WAGNERIANA

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TÓPICO 1 | CENOGRAFIA COMO LINGUAGEM

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Estes novos conceitos trouxeram para o teatro a reflexão sobre a construção de significados na criação de um espetáculo cênico, levando os cenógrafos a se preocuparem com o símbolo como componente da obra teatral.

As ideias de Appia influenciaram principalmente os movimentos do construtivismo e do expressionismo na cena teatral, contribuindo para o pensamento de que a cenografia deveria ir além do real, penetrando na alma humana e nas emoções dos espectadores.

3.2 EDWARD GORDON CRAIG (1872 – 1966)

Esta nova cena proposta por Appia também dialogava com os estudos de Craig. Nascido na Inglaterra, sua concepção teatral foi caracterizada pelo antinaturalismo e pureza cenográfica, que promoveu notável renovação aos palcos europeus no século XX. Começou a carreira no Teatro como ator (1889), na companhia de Henry Irving, do Lyceum Theatre de Londres. Tornou-se intérprete do repertório de Shakespeare e, ao iniciar a carreira de cenógrafo e decorador, obteve grande prestígio graças a seu trabalho em Hamlet e Romeu e Julieta.

Entre suas principais propostas, destaca-se o Teatro do Futuro, baseado na arte do espaço e do movimento, e não na arte do ator ou do autor do texto. Seus projetos punham em equilíbrio a luz e a arquitetura do espaço, enfatizando, assim como Appia, a plástica do corpo humano e seus movimentos em relação à bidimensionalidade do cenário.

Seu conceito de Über-marionette, ou Supermarionete, consistia em dar ao ator a função de atuar de acordo com o projeto cenográfico, isto é, o corpo deveria obedecer às partituras do cenógrafo, pois cada ação, cada movimento era expresso como elemento gráfico e sintético.

FIGURA 43 – ESBOÇOS DE CRAIG

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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FONTE: Disponível em: <www.artnet.com>. Acesso em: 24 abr. 2010.

No período de Craig, a cenografia ficou mais próxima de concepções arquitetônicas, em virtude das possibilidades de uso da luz elétrica e das múltiplas cores para criar efeitos, ilusões e novas visualidades.

A diferença é que havia material tecnológico para que fossem realizados projetos cenográficos livres das limitações impostas pelos materiais que eram utilizados até então. Esses fatores contribuíram para uma verdadeira revolução cênica e cenográfica, que oportunizara rupturas e mudanças na forma de se conceber o espaço e o teatro.

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Nesse tópico, você viu que:

• A evolução do espaço cênico e da cenografia está interligada à própria história do teatro, originada no teatro greco-romano.

• Cada período histórico tem suas peculiaridades, de acordo com os contextos regionais e temporais, o que caracteriza um fazer cenográfico que evoluía de acordo com as necessidades de cada época e povo.

• A revolução causada pelo surgimento da iluminação elétrica fez aparecer a figura do cenógrafo e do projetista. Duas importantes personalidades responsáveis por reconfigurar a cena teatral foram: Adolphe Appia e Edward Gordon Craig.

RESUMO DO TÓPICO 1

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Volte às páginas lidas até aqui, mas preste bastante atenção às figuras, veja os espaços, os detalhes, a evolução da cena e do próprio sentido do cenário no teatro. Escolha um dos períodos históricos vistos no item 2. “Aspectos Históricos” e tente desenhar um projeto cenográfico para uma das correntes estudadas: teatro grego, romano, medieval, elisabetano, renascentista ou para o palco italiano. Não é necessário se basear em um espetáculo ou peça escrita na época escolhida. Basta fazer um desenho contendo objetos cênicos, móveis e utensílios, de uma maneira que possam estar dispostos a atender aos anseios da configuração proporcionada pelo espaço onde acontece a cena.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 2

TEORIA DO ESPAÇO CÊNICO

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Nesse tópico, estudaremos algumas acepções do espaço cênico. Diferentes maneiras de conceber e compreender as formas espaciais existentes e suas relações com o teatro.

Os aspectos abordados serão: corpo, texto, espectador e lugar. Por meio do estudo, veremos que cenografia e espaço são indissociáveis. Uma melhor compreensão das maneiras de se conceber o sentido de espaço na atualidade é indispensável a todos os artistas que têm interesse em trabalhos com a visualidade.

No final do tópico, a autoatividade pretende incentivá-lo a desenhar um mesmo espaço com diferentes acepções.

Bom estudo do espaço no espaço de estudo do nosso diálogo!

2 DIFERENTES ACEPÇÕES DO ESPAÇO CÊNICO

Para que o cenógrafo coloque em prática suas concepções e seus projetos, é necessário que ele consiga estabelecer diálogos entre as diferentes maneiras de se compreender o espaço e suas relações com a cena.

Há, na contemporaneidade, inúmeras tentativas de definições para os termos “espaço” e “espaço cênico”, esta última em sua relação direta com as artes da cena.

Nesse item de estudo, não nos ateremos a definições e preceitos que possam delimitar um conceito fechado, mas teremos como foco a interação do espaço com outros instrumentais cênicos como o lugar, o corpo, o texto e o espectador.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

2.1 ESPAÇO E LUGAR

Estudar o espaço significa conhecer os planos e ambientes e seus usos para fins diferentes. Os espaços do teatro, da mídia, o espaço urbano, as cidades e espaços feitos para exposições são hoje materiais de estudo nos cursos de arquitetura, desenho, publicidade e artes.

O espaço cênico pode ser definido, segundo Urssi (2006), como a “qualidade cênica da superfície e ambiente disponíveis no espetáculo”. Dessa forma, o autor sugere que compreendamos esse conceito a partir de duas vertentes:

a) Espaço geométrico

Nele estão inseridas a disposição dos objetos, suas distâncias e proximidades existentes ou possíveis. Ainda compreende a análise da extensão abstrata e do significado subjetivo, em uma, duas ou três dimensões.

b) Espaço temporal

Período ou intervalo de tempo ou duração. Define o espetáculo enquanto realização de dimensão física e temporal, explorando as características cênicas do ato de uma forma completa, em todas as suas possibilidades. Nesse modo de concepção do espaço, analisa-se a ordem sequencial do espetáculo, por meio da trajetória de uma ação, narrativa ou dramaturgia.

Já o conceito de lugar consiste num conjunto de elementos que coexistem dentro de certa ordem, que pode estar relacionada a um caráter identificador de âmbito relacional ou de caráter histórico. A definição de lugar contrapõe-se ao conceito de não-lugar. Não-lugar é um ambiente destituído de significado histórico e identidade. Esse conceito é fruto da pós-modernidade, período em que se extrapolam os diferentes tipos de espaços e seus fins. Estes espaços ditos não-lugar são desprovidos de referências culturais.

Como exemplos, podemos citar os shoppings, aeroportos e estações. Estes são lugares de passagem, que em qualquer lugar do mundo são muito parecidos, que não possuem identidades e as pessoas que os frequentam estão ali de forma individual e com objetivos também muito parecidos.

Compreender a relação entre espaço e lugar nos ajuda a entender os significados que vão além do ambiente, que se traduzem em sentidos para as coisas, os objetos, as disposições, as medidas, as cores e todas as outras formas de se conceber um cenário.

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TÓPICO 2 | TEORIA DO ESPAÇO CÊNICO

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FONTE: Disponível em: <www.ensaiosobreteatro.blogspot.com>. Acesso em: 25 abr. 2010.

FIGURA 44 – VILA MARIA ZÉLIA COMO ESPAÇO CÊNICO DO GRUPO XIX DE TEATRO – SP

2.2 ESPAÇO E CORPO

Na antiguidade, o homem primitivo começou a resignificar o espaço a partir do momento em que passou a realizar o ato da representação. Por meio das primeiras manifestações teatrais, o homem tinha ao seu dispor os signos verbais, táteis e sonoros.

O primeiro elemento da representação é o corpo do ator. Ele não se separa da ação, e, portanto, do espaço. É impossível pensar no espaço cênico sem se dar conta da presença do ator. E o ator só pode se apresentar em cena, por meio do seu corpo.

ATENCAO

Quando falamos em corpo do ator, estamos nos referindo a todas as possibilidades de uso do corpo no espaço. Um exemplo importante é o teatro de formas animadas, onde a personagem não é o ator, mas um boneco, um objeto manipulado, ou um efeito de luz e sombra. Como então, nesse caso, o corpo do ator é indispensável? É indispensável, pois quem manipula, quem dá vida ao objeto, ao boneco e a tantas outras formas animadas é o ator, e para possibilitar a animação, ele utiliza o seu corpo.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

Não é possível a existência da cenografia teatral como um trabalho autônomo. Sempre caberá à presença do ator a função de completar o espaço.

Diretor e cenógrafo, juntos, trabalham para conceber um espaço que possa ser apresentado ao espectador de forma a comunicar os sentidos e signos propostos pela peça cênica. Para isso, o trabalho deve estar completo e unificado num mesmo objetivo e o ator é também parte deste todo esperado pelo espectador no momento em que o espetáculo entra em cena.

FONTE: Disponível em: <www.teatromicaelense.pt>. Acesso em: 26 abr. 2010.

FIGURA 45 – ESPETÁCULO “O TEU CORPO COMEÇA”, ALPENDRE GRUPO DE TEATRO, PORTUGAL, 2006

Para que o espectador seja imerso em uma poética de realidade, ocasionada pelo espetáculo, o ator precisa interagir com as informações físicas e simbólicas que compõem a cena. Por isso, o ator precisa estar interligado ao projeto cenográfico e visual do espetáculo, pois em cena, ele é a própria história teatral viva. Portanto, todos os elementos visuais relacionados ao ator devem ser previamente estipulados e estudados em minúscias: maquiagem, figurino, movimentação cênica e/ou coreográfica, uso dos objetos cênicos e relações com os materiais utilizados e dispostos em cena.

ESTUDOS FUTUROS

No próximo tópico dessa unidade, estudaremos alguns dos aspectos visuais que compõem o espetáculo: maquiagem, figurino, som e luz. É importante lembrarmos que todo aspecto visual é sempre cenográfico, pois ajuda a compor o espaço, esteja ele no corpo do ator ou em qualquer lugar do espaço onde acontece a cena.

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TÓPICO 2 | TEORIA DO ESPAÇO CÊNICO

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A ciência que estuda a significação dos gestos, das expressões faciais, do sentido motor e das posições corporais é a cinestésica. Já a paralinguística estuda as inflexões e entonações da voz e os diversos significados de um acento, como: um sussurro, um bocejo ou um soluço. Todos estes elementos são artifícios disponíveis para uso do ator em seu próprio corpo.

Entender a complexa relação do corpo do ator com o espaço possibilita ao cenógrafo a realização de um projeto completo, que não desconsidera a presença do ser como fator fundante e intrínseco ao fazer teatral.

2.3 ESPAÇO E TEXTO

O espaço cênico só pode ter um caráter realmente cênico se em seu contexto existir um texto. Lembre-se que texto, no sentido que trazemos para essa reflexão, consiste num conjunto de todos os tipos de textualidade contemporânea, que estejam interrelacionadas com a cena. As palavras, ou mesmo a ausência delas, compreendem essas textualidades, que têm funções diversas dentro da gama de espetáculos contemporâneos.

O texto, enquanto conteúdo e expressão teatral, tem tudo a ver com a ambientação e caracterização do espaço, pois é no espaço que ele acontece e pode ser realizado. A dramaturgia de um espetáculo é realizada levando-se em consideração o texto que será posto em cena.

Se pensarmos em um texto teatral tradicional, aquele que o autor escreve especificamente para fins de montagem cênica, veremos que as didascálias contêm indicações de como deve ser o espaço cênico, sua composição, a disposição da mobília, a luz e outros dados que possibilitarão ao cenógrafo o desenvolvimento do projeto visual do espetáculo.

Tudo o que no texto dramático não é escrito para ser dito pelas personagens e que, na representação cênica, desaparece enquanto discurso e surge diante dos espectadores como ação ou presença física (objetos, guarda-roupa, cenário) encontra-se escrito nas didascálias. Elas são a voz direta do dramaturgo e por isso diferenciam-se visualmente do resto do texto por estarem escritas entre parênteses ou por estarem impressas em itálico. As indicações nelas expostas situam o diálogo e a ação, num contexto imaginário. Também fornecem instruções àqueles que transformam o texto em espectáculo (encenadores, atores, cenógrafo etc.).

IMPORTANTE

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

Um dos objetivos da cenografia é enriquecer a teatralidade da cena. E isso acontece quando o responsável por essa arte está em sintonia com as significações do texto. Essas significações estão presentes nas pistas linguísticas e nos sinais de comunicação que devem ser identificados por meio de um uso consciente dos signos e convenções que o texto apresenta.

Para que exista interação entre o texto e a concepção do espaço, é imprescindível que o texto seja analisado e interpretado por meio de um rigoroso olhar do cenógrafo. A intertextualidade é a marca fundamental de uma boa análise. É ela quem permite que os sentidos do texto sejam desvelados, possibilitando um olhar simbólico sobre cada personagem, suas interações e as necessidades espaciais para que a cena ocorra conforme o esperado pelo autor e pelo diretor.

Lembre-se que neste caderno pedagógico, na Unidade 2, existem importantes estudos sobre o discurso e seu funcionamento na arte do teatro, que podem ser utilizados por qualquer pessoa que tenha interesse na análise do texto teatral.

2.4 ESPAÇO E ESPECTADOR

Para que o teatro aconteça é necessário o encontro entre a arte e o espectador. Não existe teatro sem a presença do público. Você já deve ter visto algum espetáculo por meio de um vídeo, uma gravação, e deve ter percebido que a sensação não é mesma de assistir a um espetáculo ao vivo e a cores. Esta sensação não é a mesma por inúmeros motivos. Um deles é o fato de o teatro, desde seus primórdios, ser uma arte que só acontece num momento único e irrepetível. Por mais que a história contada seja a mesma, ela nunca estará em cena da mesma maneira, com as mesmas intenções e emoções.

Um ator está sempre sujeito ao imprevisto, ao que não se sabe que pode acontecer, e essa imprevisibilidade é dividida com o espectador, que vai ao teatro para ver um ato único, o ato cênico. O espetáculo acontece num ambiente propício para o ato cênico, que conta com a participação de atores e público, numa cadeia de significação e percepções.

O espectador possui um repertório cultural que faz com que ele assista ao espetáculo de uma forma única, e que esse evento seja por ele assimilado com características peculiares de suas vivências sociais.

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TÓPICO 2 | TEORIA DO ESPAÇO CÊNICO

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FONTE: Disponível em: <www.confissoesdecomputeiro.blogspot.com>. Acesso em: 26 abr. 2010.

FIGURA 46 – ESPETÁCULO “O PONTO IMAGINÁRIO” DA OBRAGEM TEATRO E CIA. – CURITIBA, 2007

A troca entre espetáculo e espectador é o produto da ação cênica. É o momento em que todos os elementos cênicos que compõem o espetáculo se misturam e geram uma obra artística. Por isso, essa relação é indissociável. O cenógrafo, ou o artista visual da cena, deve considerar, portanto, a presença do espectador como um importante meio de comunicação e de produção de sentidos em meio ao espaço cênico.

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Nesse tópico, você viu que:

• Para compreender o espaço cênico é necessário estudar as relações do espaço com os elementos que dele fazem parte.

• Espaço e lugar são conceitos distintos, assim como o conceito pós-moderno de não-lugar. Texto, corpo e espectador compõem o espaço cênico e travam com ele relações complexas.

RESUMO DO TÓPICO 2

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AUTOATIVIDADE

Escolha um espaço familiar a você. Um espaço onde você trabalha, estuda, mora ou frequenta. Tente rememorar todas as características desse espaço (cor das paredes, posicionamento de janelas e portas, disposição dos móveis e objetos que o integram, feixes de luz e a sua própria interação com este ambiente). Faça um primeiro esboço, desenhando o espaço como você o vê. Já no segundo esboço, desenhe o mesmo espaço, porém com outra forma de disposição de móveis e objetos, tentando mudar completamente a visualidade. Para o terceiro esboço, imagine de que maneira esse espaço poderia receber um espetáculo teatral, e registre suas impressões de forma a aliar desenhos e indicações textuais, que tratem da posição do público (há inúmeras maneiras e possibilidade de posicionar o público para assistir a um espetáculo – não se prenda ao espaço da sala italiana, estudado anteriormente), do lugar de atuação e da disposição dos móveis e objetos (os mesmos que constam nos esboços anteriores, só que dispostos para facilitar a interação e a atuação).

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TÓPICO 3

ELEMENTOS CENOGRÁFICOS

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Nesse tópico, estudaremos os elementos cenográficos que compõem um espaço cênico: a luz, a cor e o som. Veremos como esses elementos integrados são responsáveis por toda a concepção de linguagem cênica que vai ao palco.

A compreensão dos aspectos visuais de um espetáculo teatral pode ser compartilhada por diretores, atores, professores, cenógrafos, artistas visuais e todos os demais interessados pela temática, pois todos eles acabam, de uma forma ou de outra, contribuindo para a visualidade no teatro.

Ao final da unidade, há uma leitura complementar, sobre o teatro de sombras.

Bons estudos!

2 LUZ

A iluminação é um dos elementos mais importantes em um projeto cenográfico. Você já imaginou ir a um espetáculo teatral e ficar o tempo todo no escuro? Isso seria muito mais uma experiência de rádio-teatro, onde só se ouve as personagens, mas não se vê suas ações e interações em cena.

A visibilidade é o maior princípio da iluminação. Hoje, com a iluminação elétrica e com as novas tecnologias, existe a possibilidade de usos inovadores da iluminação e efeitos visuais (vivenciais e perceptivos).

A atmosfera de um espetáculo, seu sentido, o espírito do que acontece em cena são proporcionados pelo uso da luz e do som. Por isso, um projeto de iluminação deve ser pensado de forma a abarcar cada detalhe visual.

As características estruturais de cada espaço cênico, suas texturas, disposição de mobílias e objetos, seu tamanho, tudo deve ser pensado para que a iluminação consiga os efeitos esperados tanto pela produção do espetáculo quanto pelo espectador.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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A tecnologia da iluminação cênica precisa considerar os seguintes aspectos:

a) Direção/foco – Onde/Quem se quer iluminar? Qual objeto/ambiente/pessoa se quer que esteja em foco?

b) Duração – Por quanto tempo essa luz deve permanecer do jeito que está ou ser alterada? O tempo de duração de determinado tipo de luz está de acordo com a dramaturgia cênica?

c) Intensidade – Fraco/forte/intermediário – A intensidade da luz é a intensidade que se pede em cena?

e) Ritmo – As mudanças de luz (cores, intensidades, direções) estão adaptadas às mudanças de ritmo do texto e do próprio espetáculo?

f) Movimento luminoso – As movimentações provocadas pela luz de cena são compatíveis com as marcações e procedimentos cênicos dos atores?

Não temos, nesse Caderno de Estudos, o objetivo de formar iluminadores, por isso não nos atemos a detalhes técnicos. Para usos na educação, vale ressaltar que existem inúmeras possibilidades de se trabalhar com a iluminação cênica no ambiente escolar, sem que seja necessário todo um aparato de mesas de iluminação, globos, gelatinas e filtros.

O simples fato de o professor pedir aos alunos para trazer lanternas para as aulas, e explorar com eles os diversos usos desse material, proporciona aos educandos trabalhos como: iluminação de determinadas partes do corpo, iluminação de pequenos ambientes, iluminação da sala de aula somente com luzes de lanterna, iluminação e efeitos de cor (ao se trabalhar com papel celofane) etc.

ESTUDOS FUTUROS

Na leitura complementar que você verá ao fim dessa unidade, há um texto reflexivo sobre a prática do teatro de sombras na escola, que é uma possibilidade de trabalho com a luz no espaço escolar.

Alguns teatrólogos, como Bertold Brecht, defendiam que a iluminação no teatro não precisava ser ilusionista. Sua defesa ia de encontro a uma luz totalmente branca, para que o espectador não se sentisse iludido e seduzido pelos efeitos do espetáculo, pois este tinha um cunho e caráter de reflexão sobre as realidades do mundo.

Já no cinema e na televisão, a luz tem justamente um efeito ilusório, capaz de levar o espectador a ter impressões distorcidas sobre as imagens dos atores e dos demais componentes cênicos.

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TÓPICO 3 | ELEMENTOS CENOGRÁFICOS

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Hoje, no Brasil, temos poucos profissionais que trabalham especificamente com a iluminação teatral. Os poucos que existem estão instalados no eixo Rio-São Paulo, e por isso se enquadram em uma esfera mais comercial. No teatro de grupo e nos lugares distantes desses grandes centros, os responsáveis pela iluminação são profissionais do teatro que dividem tarefas, atores e integrantes dos próprios grupos, que eventualmente fazem a iluminação de cena.

AUTOATIVIDADE

A Associação Brasileira de Iluminação Cênica (ABRIC) disponibiliza em seu site relevantes informações sobre as práticas em iluminação existentes no país, destacando eventos e oficinas para interessados em aprofundar seus conhecimentos na área. Seja curioso. Faça uma visita ao site, navegue, tire suas dúvidas e inteire-se do assunto. <www.abric.org.br>.

3 COR

As cores estão impregnadas de informações que agregam significados associativos e simbólicos, a partir de três dimensões que podem ser definidas e medidas:

• Matiz – o nome próprio da cor.• Saturação – a quantidade cromática.• Valor – Luminosidade.

A cor expressa e intensifica a informação visual. As concepções cênicas utilizam os significados das cores para expressar épocas, culturas, e manifestações das personagens e dos ambientes vistos em cena. A cor tem importante papel sobre as emoções humanas por estar relacionada a memórias e afetos.

No teatro, o trabalho com as cores tem um caráter totalmente simbólico, pois todo objeto, figurino, maquiagem, luz ou qualquer outro tipo de material utilizado em cena, necessariamente possui uma cor, e ela não pode ser posta em cena por acaso. Precisa ser muito bem pensada, pois a maneira como for posta em cena provocará no espectador diferentes relações e percepções.

O uso das cores vai além da sua aplicação no teatro, variando desde estudos sobre seu significado em logotipos, uso em cartazes e até na decoração da casa. Mas falar de cores é muito mais complexo do que parece. Existem várias teorias, estudos e conceitos que divergem. O tema “cores” é um tema interdisciplinar, por sua diversidade de estudos.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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Algumas associações possíveis no uso da cor são:

• associação psicológica;• associação fisiológica;• associação sinestésica;• associação afetiva;• associação com a matéria.

Também poderíamos analisar e aplicar as cores levando em conta os estudos da psicodinâmica e da cromoterapia; os estudos matemáticos, os esotéricos e os astrológicos, baseados na tradição celta, indígena ou no nosso folclore; sem esquecer a história de cada sociedade.

Todos estes estudos têm razão de existir e abrangem pessoas com diferentes interesses, mas o importante é que estejam baseados em conceitos e pesquisas sólidas. Todas as possibilidades acima possuem uma relação correta sobre a escolha, uso e aplicação de cores.

Há que se considerar, ainda, a relação pessoal que cada ser humano possui com as cores. E nesse ponto, é fundamental que a escolha delas que compõem um espetáculo, ou uma cena, ou uma parte de determinado cenário, estejam aliadas a uma rígida análise de personagem, pois é a história das personagens que será contada no palco.

As diferenças entre o que cada cor causa em cada um dos seus métodos de uso são grandes, por isso não devemos criar uma regra única para o uso das cores no teatro. As cores podem causar impressões e sensações boas ou ruins, dependendo do contexto e das diferentes associações. No projeto de um espetáculo, deve-se definir qual o tipo de associação e de pesquisa cromática que é o mais adequado para a cena.

O amarelo, por exemplo, pode ser uma cor positiva dentro da psicologia cromática, mas é negativa na relação fisiológica, e essa relação ainda dependerá da superfície em que a cor é aplicada. Será papel ou vídeo? Vidro ou outro material? Sua variação estará na intensidade de luz (não esqueça que cor é luz). E essa variação pode ser muito grande se percebermos como uma mesma cor pode refletir diferente (cor é luz refletida) em um papel, uma parede, um tecido e, principalmente, como difere em uma superfície que já reflete luz, como no caso de uma tela de vídeo.

A relação entre cor e luz é, portanto, inegável. A luz que temos em um ambiente influencia diretamente no modo como vemos cada cor. A iluminação criada para cada cena, cada ato, sempre interferirá diretamente na cor absorvida pelo espectador. Por isso, não existe conceito único, regra única quando falamos de cor.

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TÓPICO 3 | ELEMENTOS CENOGRÁFICOS

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Há, porém, no teatro, os usos sinestésicos e simbólicos da cor, que consistem nas sensações que elas podem causar a priori. Exemplos:

Preto = Morte.Branco = Paz.Vermelho = Paixão, desejo.Verde = Esperança.Amarelo = Prosperidade.Azul = Calma, Tranquilidade.

Mas é necessário ter cuidado com essas associações, pois elas dependem das pessoas em questão. Os significados são únicos para cada pessoa e estão relacionados com suas histórias de vida, seus medos, seus traumas, suas alegrias e suas conquistas. Voltamos a destacar, assim, a importância de relacionar a simbologia das cores a um estudo profundo do texto teatral a ser encenado.

4 SOM

Não há como conceber um espaço teatral sem pensar nas sonoridades possíveis e que estarão à disposição do espetáculo. Entremos num primeiro acordo: inclusive o silêncio é um efeito sonoro.

O som está no teatro por meio de diversas possibilidades:

• o corpo do ator produz sons;• a voz do ator produz sons;• a interação do ator com os objetos de cena produz sons;• a trilha sonora é som;• efeitos sonoros contribuem para o encaminhamento do espetáculo (vento,

chuva, brisa, sons externos ao que acontece na cena).

Os sons e a música de um espetáculo têm a mesma responsabilidade de outros elementos cenográficos, pois podem motivar as ações e remeter o espectador para eventos que estão fora da cena. Além de localizar a ação em determinado lugar, tempo e espaço, proporcionar informações sobre as personagens e construir transições entre cenas e ambientes e tempos históricos. Tudo isso para compor a atmosfera do trabalho cênico a ser apresentado.

Vários profissionais precisam estar afinados com o som que acontecerá no espetáculo: cenógrafo, diretor, sonoplasta, iluminador, design sonoro, compositor. Todos devem estar em sintonia para que o espetáculo seja harmonioso e produza os sentidos descritos no projeto.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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O som é um componente das artes visuais do espetáculo por estar relacionado a uma importante nomenclatura e profissão: o desenho sonoro e o designer de som. Essa profissão vem originalmente do cinema, com o surgimento do Sound Design, que tem como função o desenvolvimento de uma escrita, uma partitura de todo efeito sonoro e musicalidade que vai para a cena. No teatro, importantes estudos vêm sendo desenvolvidos na área, em vista da necessidade de formação de profissionais que estejam aptos a realizar o desenho sonoro de um espetáculo.

IMPORTANTE

Existem cinco propriedades do som, responsáveis pela criação de um ambiente sonoro:

• TOM – A frequência do som.• VOLUME• QUALIDADE – Frequência e volume combinados. • DIREÇÃO – Localização e deslocamento do som no espaço.• DURAÇÃO – Comprimento do som no espaço.

Na produção de um espetáculo, cria-se uma planilha com indicações para cada cena, individualizando cada efeito sonoro. Um projeto sonoro deve estar inteiramente relacionado com tudo o que acontece no espetáculo.

A engenharia de sistemas de som para teatro requer aplicações únicas de reforço de som, amplificação e tecnologias de processamento de áudio. O responsável pela sonoridade de um espetáculo deve considerar os requisitos específicos da peça, seja ela um drama, um musical, comédia ou outro, requerendo a atenção cuidada sobre o texto, a sua dramaturgia e sobre os ensaios, bem como a engenharia de som, as medições electroacústicas e a afinação metódica adequada ao espaço onde acontece o trabalho cênico.

No trabalho conjunto com o encenador, os efeitos sonoros são providenciados por meio de leituras prévias do texto e participação no processo criativo, para que o sentido dramatúrgico da encenação não seja desprezado. Esse estudo é uma ponte entre a concepção de som e sua materialização no espaço cênico e sua constituição, representada pelo auditório, o palco e o cenário, o texto e a oralidade, a movimentação e os objetos, de forma a manter a imagem sonora coerente com a imagem produzida no palco.

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TÓPICO 3 | ELEMENTOS CENOGRÁFICOS

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O estudo sobre as aproximações entre as artes visuais e o teatro não se esgota por aqui. A editora UNESP em parceria com a FUNARTE publicou em 2008, o livro “Do lugar de onde se vê: aproximações entre as artes plásticas e o teatro”, de Carlos Avelino de Arruda Camargo. Trata-se de uma importante contribuição para os estudos na área, que cada vez mais tendem a aparecer de forma imbricada, pois tanto o teatro tem conhecimento a oferecer para as artes visuais, como as artes visuais também estão totalmente relacionadas com as artes do palco.

NOTA

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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LEITURA COMPLEMENTAR

EXPERIMENTANDO TEATRO DE SOMBRAS NA SALA DE AULA

Giuseppe Carlos Cicale

O projeto intitulado “Experimentando teatro de sombras na sala de aula” que consiste em uma experiência de produção teatral dos educandos utilizando a linguagem das sombras, uma arte milenar do Oriente, surgiu em 2007 (meu último ano de Licenciatura de Educação Artística/Artes Visuais na Universidade Cruzeiro do Sul), ocasião em que deveria apresentar o trabalho de conclusão de curso aplicando um projeto de aprendizagem e construção de conhecimento na área de artes.

Para este projeto optei por utilizar o teatro, uma vez que ele permite envolver variadas linguagens artísticas e diferentes áreas de conhecimento, o que fortalece o seu caráter interdisciplinar, para se contar uma história, passar uma informação, etc, possuir a capacidade de envolver os participantes em um processo de criação, socialização e cooperação em grupo, promover interação intra e extrapessoal dos alunos. E desenvolvendo um teatro não convencional, uma linguagem ainda estranha a nossa cultura, a das sombras (pois para alguns ele facilita o envolvimento já que não existe uma exposição direta da imagem de quem o faz) objetivei proporcionar aos alunos um espaço para criar e apresentar para toda a sala de aula em forma de espetáculo teatral a transmissão de uma mensagem de conscientização da cidadania e preservação do meio ambiente.

E a fim de suprir a estranheza da linguagem, saber se esta seria uma boa ferramenta pedagógica para desenvolver o aprendizado, e expandir o conhecimento dos alunos para outras modalidades teatrais procurei investigar e verificar o envolvimento dos educandos com atividades experimentais com técnicas específicas do teatro de sombras.

Atrelada ao objetivo do Projeto Político Pedagógico da escola: formação de indivíduos participativos e integrados a sociedade e consolidação da boa educação para preservação do meio ambiente e estímulo de ações construtivas estruturadas em respeito mútuo entre todos os integrantes de uma comunidade, a intenção de estimular processos de criação, encenação de uma dramaturgia baseada em situações reais e o cotidiano dos alunos; e quanto à aprendizagem, explorar a coordenação motora, o hábito da leitura, a criatividade, a memória, além da arte e da língua portuguesa, estruturou o projeto nas seguintes etapas: teoria do tema teatro de sombras; aulas expositivas com imagens, vídeos e conteúdos teóricos da sua historia e técnicas utilizadas por grupos teatrais estrangeiros e nacionais que

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TÓPICO 3 | ELEMENTOS CENOGRÁFICOS

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trabalham com o gênero; encenação de um conto realizada pelo professor utilizando a linguagem teatro de sombras; apresentação aos alunos da proposta: encenação de uma história utilizando a linguagem teatro de sombras; discussão entre os alunos e professor com base em assuntos da realidade atual como: preservação do meio ambiente, cidadania, globalização e outros sugeridos pela classe, relacionados com o mundo e o cotidiano das pessoas, para escolha dos temas das histórias; apresentação do tema que cada grupo de alunos/sombristas escolheu; elaboração das histórias; planejamento dos cenários e personagens, iluminação e sonoplastia; produção da peça teatral; ensaios; apresentações finais; análise das etapas de produção dos alunos; avaliação do projeto: ele atingiu seus objetivos.

Os alunos tiveram espaço livre para a criação e com o conhecimento e habilidades já incorporados neles, conduziram as atividades de modo que elas não se desviassem demais da realidade de cada um deles. Eles também analisaram e trocaram informações e opiniões a respeito das atividades desenvolvidas no projeto. E através desse espaço pude avaliar e verificar se as experiências do meu projeto foram bem sucedidas e aceitas na sala de aula.

O material reunido no projeto estruturou-se em estudos de pesquisadores e educadores brasileiros da área de artes cênicas como Ana Maria Amaral e Valmor Beltrame, entre outros, contando experiências práticas, que ajudaram a difundir o teatro de sombras na área pedagógica; aspectos históricos interpretados a partir de uma publicação de autoria de Margot Berthold; opiniões de grupos teatrais contemporâneos que trabalham o teatro de sombras, como o diretor teatral Jean Pierre Lescot (França), o Grupo Teatral Gioco Vita, (Itália), a Cia Luzes e Lendas de São Paulo-SP, a Cia Karagöz K de Curitiba-PR e a Cia de Teatro Lumbra de Porto Alegre-RS e apresentação das técnicas do teatro de sombras utilizadas no cinema de animação, com a arte de Lotte Reiniger e do grupo Gargântua Produções de São Paulo que faz sonorização dos filmes da cineasta.

Avaliação e autoavaliação

O objetivo do projeto não foi somente mostrar a linguagem teatro de sombras, mas tentar, sempre valorizando a individualidade de cada um, aproximar os alunos de temas vigentes importantes para a sociedade e desenvolver a capacidade de construírem seu próprio conhecimento. Os alunos desenvolveram em seu espaço um exercício de comunicação em que precisaram se expressar e encontrar meios de se fazer entender. Experimentaram todas as funções necessárias da produção teatral que exigia conhecimento de diferentes áreas: Português, História, Arte, etc, temas transdisciplinares, verificando que existe uma relação de dependência entre elas. Tornaram-se mais especialistas em teatro de sombras, através de aprendizagens especificas da linguagem que exige dedicação e sensibilidade artística e tiveram seu momento de artesão oriental: construir bonecos e projetar suas sombras para tentar transmitir a sentimentalidade e delicadeza do ator-manipulador.

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A avaliação do projeto ocorreu durante a execução de cada uma de suas etapas, através da observação continuada. Procurei averiguar passo a passo o desenvolvimento dos alunos durante as aulas: interesse, curiosidade, dedicação, e seus trabalhos extras de sala de aula: as pesquisas, e notei que a socialização de alunos de personalidades diferentes incentivou mais a concentração e o empenho nas produções teatrais que saíram bem elaboradas. Alguns resultados refletiram em casa: pais me relataram que seus filhos ficavam num quarto escuro com uma luz para brincar com as projeções de sombras das mãos, objetos, figuras recortadas.

Acredito que meu desempenho foi bem sucedido, os alunos demonstraram através das produções teatrais que aproveitaram todos os conteúdos estudados e que os objetivos estabelecidos no projeto foram atingidos. Percebi que os alunos sentiram-se envolvidos nos processos de aprendizagens: socialização, criatividade, coordenação motora, memorização, vocabulário, pensamento crítico, comunicação verbal e escrita e desenhos, entre outras, benéficas para a formação de uma pessoa, e descobriram que não existe o certo ou errado, o importante é estimular a curiosidade, a vontade de fazer sem medo de errar, incorporar a experiência como uma brincadeira que diverte.

Assim, espero que o teatro de sombras, pouco conhecido pelos profissionais da educação e estudantes do Ensino Fundamental e Médio, venha despertar curiosidade e estimulo ao seu conhecimento. E que a diversidade dos seus recursos, possibilite o seu emprego em outras disciplinas do conhecimento, trabalhando conjuntamente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

AMARAL, Ana Maria. Teatro de animação - Da teoria à prática. São Paulo: Ateliê Editorial, 1997.

AMARAL, Ana Maria. Teatro de formas animadas – Máscaras, bonecos e objetos. 3. Ed. São Paulo: Editora USP, 1996.

BELTRAME, Valmor. Teatro de Sombras: técnica e linguagem – Florianópolis: UDESC, 2005.

BERTHOLD, Margot. História mundial do teatro. [tradução Maria Paula V. Zurawski, J. J. Guinsburg, Sérgio Coelho e Clóvis Garcia] – São Paulo: Perspectiva, 2001.

BRASIL/MEC - PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS – ARTE (3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental). Brasília, 1998.

LADEIRA , Idalina; CALDAS, Sarah; Fantoche & Cia. 2. Ed. São Paulo: Editora Scipione, 1993.

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TÓPICO 3 | ELEMENTOS CENOGRÁFICOS

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REINIGER, Lotte. Filme/Películas. Insituto Goethe. Editora Mayr – Miesbach. Munich, 1999.

VIANNA, Tiche; STRAZZACAPA Márcia. O teatro na sala de aula. In: S. Ferreira (org). O ensino das artes: - construindo caminhos, p.115-139. Papirus 4ª. Edição (coleção Ágere) Campinas – SP: 2001.

FONTE: CICALE, G. Experimentando Teatro de Sombras na Sala de Aula. Disponível em: <www.artenaescola.org.br>. Acesso em: 20 abr. 2010.

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Nesse tópico, você viu que:

• A história do teatro é também a história do espaço cênico. Conhecer a sua evolução nos auxilia a compreender o teatro ao longo dos tempos, e as maneiras como atores, público e profissionais da cena se relacionam e relacionavam com os aspectos visuais da cena.

• O espaço está interligado com instrumentais teatrais como lugar, ambiente, texto, espectador, corpo e outras questões a serem discutidas. O estudo dessas relações aproxima o teatro dos estudos de arquitetura do espaço, constituindo-se em um amplo leque de possibilidades na área.

• Os elementos cenográficos que compõem a cena teatral, como luz, cor e som, são indispensáveis para a harmonia da cena, e precisam estar afinados uns com os outros, por meio do trabalho de cenógrafos, sonoplastas, designers sonoros, artistas visuais e diretores teatrais.

RESUMO DO TÓPICO 3

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AUTOATIVIDADE

Para encerrar esta unidade, a autoatividade deve ser realizada de preferência de forma coletiva. Leve para o encontro presencial objetos e materiais diversos de cores diferentes. Ao reunir os seus materiais com os dos seus colegas, separe-os por cores. Deve-se dividir a turma em grupos. Cada grupo fica com os materiais de uma cor. Comece a montar um ambiente cênico somente com materiais de uma determinada cor. Em seguida, apresente o cenário montado para a turma, e aproveite para conversar sobre as sensações e percepções que cada ambiente criado provoca nos espectadores, a partir de sua cor. Se não for possível realizar a autoatividade no grupo de colegas, realize essa experiência em casa, com a família, na escola ou no local de trabalho.

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TÓPICO 4

CENOGRAFIA E PRÁTICA NA ESCOLA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Este tópico tem por objetivo complementar de maneira didática o entendimento dos diferentes espaços cenográficos existentes, incluindo aqueles citados no Tópico 1 desta unidade.

Ao se referir à complementação didática é importante deixar claro que o que se propõe são apenas algumas sugestões de como explorar de maneira lúdica este tipo de conhecimento ao mesmo tempo em que se busca a assimilação e o reconhecimento de conceitos.

2 ESPAÇOS CENOGRÁFICOS

A cenografia nasceu com o teatro, diferentes conceitos foram sendo reconhecidos ao longo do tempo, respeitadas as particularidades até a obtenção de uma linguagem específica. Resumidamente a cenografia foi desenvolvendo técnicas e utilizando diferentes espaços e materiais, na medida em que aumentavam ou escasseavam os recursos de cada período histórico. Hora se tornava complexa e dotada de inúmeros recursos e aparatos, por outra, simples e direta colocando em prática a minimização de informações.

Você pode observar que existe uma série de espaços cenográficos e que cada um deles serve a seu propósito, dentre estes espaços previamente e arquitetonicamente bem construídos existem outros de formas muito simples que podem coexistir sem que nos demos conta de sua existência. Estou falando daqueles espaços que estão muitas vezes diante de nossos olhos e passamos a perceber sua existência quando estamos buscando ou quando nos vêm por acaso, a partir de uma ideia de mudança ou caracterização. Um bom exemplo é quando pegamos um pedaço de giz e traçamos um círculo no chão, para um adulto esta ideia pode parecer muito simples, mas, em geral para as crianças, dotadas de uma imaginação privilegiada, este pode ser um verdadeiro espaço teatral, desses com toda pompa e circunstância.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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3 COMPARTILHANDO IDEIAS

Muitas vezes, o teatro na escola é deixado de lado com a desculpa de que não se dispõe de espaço adequado. Nos tempos atuais ressignificar um espaço na escola e o transformar em local para desenvolvimento de uma peça teatral, esquete ou leitura dramática não é tarefa difícil. Você precisa apenas localizar e em seguida pensar sobre as alterações que serão feitas, se forem evidentemente necessárias, às vezes o espaço por si só, já está de acordo com a proposta. Um exemplo a ser dado, foi na montagem de fragmentos da peça de William Shakespeare, “Sonhos de uma noite de verão”, as cenas descritas na peça acontecem em uma floresta. Para concretizar a atividade na escola, foi escolhido um espaço do jardim, onde além de grama e flores, havia pequenos arbustos que ultrapassavam a altura dos alunos/atores. O público ficava na calçada de onde tinha a visão de todo o espaço a ser utilizado na apresentação. Essas e outras ideias podem ser levadas à frente mediante um estudo dos espaços disponíveis e que, às vezes, estão lá obsoletos. Outro exemplo são os corredores. Em muitas unidades escolares, o final deles é em nada utilizado, estão vazios e não frequentados, o mesmo acontecendo na parte de baixo de escadas, estes, podem ser locais perfeitos de apresentações para pequenos públicos. Eles também, devido ao pouco uso, incluem a possibilidade de que o cenário continue montado por vários dias.

3.1 CRIANDO CENÁRIOS NOS ESPAÇOS DA ESCOLA

A criação do cenário depende única e exclusivamente da proposta a ser desenvolvida pelo educador com seu grupo. Para isso ele precisa ter em mente primeiramente o que vai encenar. É importante compartilhar ideias e acatar as sugestões feitas pelos educandos. Um bom caminho para isso é pedir ao grupo que desenhem, coloquem no papel suas ideias e que façam uma listagem do material a ser utilizado. De forma bem democrática, reúna o grupo e permita que cada um defenda seu ponto de vista. Selecione a ideia viável de ser aplicada e coloque mãos à obra, ou seja, o grupo à obra.

Dependendo da escolha vale a pena não somente por questões econômicas, mas por questões que permeiam a aprendizagem e a significação, confeccionar ou mesmo reformar alguns itens com o próprio grupo, dentro das possibilidades. Algumas experiências em particular desenvolvem outra linguagem da Arte como, por exemplo, a plasticidade nas artes visuais. Portanto, pintar painéis, criar esculturas, ressignificar objetos são parte importante do fazer artístico e que remetem à transposição das linguagens.

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TÓPICO 4 | CENOGRAFIA E PRÁTICA NA ESCOLA

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FIGURA 47 – CENÁRIO DE RETALHOS DA VENDA TEATRO

FONTE: Disponível em: <www.vendateatro.blogspot.com>. Acesso em: 19 fev. 2012.

Quando o assunto é cenografia, vale buscar maiores informações sobre o Teatro de Arena no Brasil, você vai perceber que o primeiro teatro em forma de arena surge em 1953 e que além da proposta espacial ser diferenciada, o trabalho desenvolvido também possui estética própria. Para maior entendimento dessa proposta sugerimos o livro: Um Palco Brasileiro: o Arena de São Paulo, escrito por Sábato Magaldi, publicado pela editora Brasiliense em 1984.

NOTA

3.2 MINICENÁRIOS

A criação e construção de minicenários para e de teatro é um recurso a mais a ser utilizado em sala de aula quando o assunto é cenografia. Na prática é um bom método para iniciar o reconhecimento dos espaços cênicos e para a consequente ocupação do espaço de cena real, ao mesmo tempo em que propicia a materialização e o reconhecimento dos espaços cênicos já estudados, como por exemplo, aqueles citados na Unidade 3, Tópico1, deste Caderno de Estudos.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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Outro detalhe é que este recurso pode ser também utilizado quando se pretende trazer para o universo da realidade, cenários descritos nos textos teatrais, mesmo que a peça não venha a ser encenada. Um bom exemplo aparece na criação da Escola de Teatro Catarse que propôs a construção da casa de Romeu e Julieta.

Outra maneira de estabelecer novas relações e romper conceitos tradicionais de espaços cênicos é oportunizar ao aluno/artista/criador, a oportunidade de miniaturizar cenários que posteriormente serão construídos ou montados, esta também é uma excelente maneira de transpor a barreira entre o imaginário e o concreto. O aluno aprende criar, projetar e desenvolver na prática a ideia que a princípio era parte do seu universo imagético e nada mais. Também pode ser uma alternativa para abertura de discussões sobre o pensar, o fazer e o acontecer.

Outro fator relevante é que os minicenários desenvolvidos por equipes formadas dentro do grande grupo abrem um leque de possibilidades de aplicação, como a de fazer uso destes para a montagem de uma peça de teatro de bonecos ou mesmo para atividades envolvendo a improvisação.

DICAS

Quando os minicenários estiverem prontos, você pode propor aos alunos que criem personagens a partir de imagens de obras de arte, por exemplo, os pintados nas telas de Tarsila do Amaral como a Cuca, o Abaporu, ou das telas de contemporâneos como Luciano Martins e Gustavo Rosa. Essa ideia pode render boas peças quando personagens saídos das telas são personificados no teatro de bonecos. E quando um minicenário passa a ser uma caixa de fazer acontecer teatro.

A utilização do termo minicenário remete a um espaço cênico que embora miniaturizado, serve ao propósito da encenação, enquanto que a palavra maquete representa um espaço proporcional que pode servir apenas para ser visualizado tridimensionalmente.

IMPORTANTE

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TÓPICO 4 | CENOGRAFIA E PRÁTICA NA ESCOLA

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FIGURA 48 – MINICENÁRIO: A CASA DE ROMEU E JULIETA

FIGURA 49 – MINICENÁRIO PARA RECONHECIMENTO DE ESPAÇO CÊNICO

FONTE: Disponível em: <www.escoladeteatrocatarse.wordpress.com>. Acesso em: 19 fev. 2012.

FONTE: Disponível em: <www.institutosergiomagnani.org.br>. Acesso em: 19 fev. 2012.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

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FIGURA 50 – MAQUETE CENOGRÁFICA DO TEATRO INGLÊS “THE GLOBE THEATER”

FONTE: Disponível em: < www.claudiafigueiredojf.blogspot.com>. Acesso em: 20 fev. 2012.

FIGURA 51 – MAQUETE CENOGRÁFICA EM ISOPOR DO TEATRO ROMANO FEITO POR MÁRCIA FALABELLA

FONTE: Disponível em: <www.ufjf.br>. Acesso em: 20 fev. 2012.

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TÓPICO 4 | CENOGRAFIA E PRÁTICA NA ESCOLA

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DICAS

Uma maneira de conhecer ou mesmo reconhecer um espaço cenográfico do século XVI, por exemplo, é assistindo ao filme Shakespeare Apaixonado, mesmo não possuindo uma relação real com a biografia do dramaturgo inglês, a obra possui seu valor. O cenário é rico e nos dá uma ideia bastante precisa dessa construção específica.FILME Shakespeare Apaixonado (EUA, Reino Unido, 1998).Comédia Romântica. Cor. 123 min.Direção: John Madden. Elenco: Gwyneth Paltrow, Joseph Fiennes, Judi Dench, Imelda Staunton, Colin Firth, Bem Affleck.

FONTE: CAPA DO FILME SHAKESPEARE APAIXONADO. Disponível em: <www.cineaprendizagem.blogspot.com>. Acesso em: 20 feV. 2012.

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Nesse tópico, você viu que:

• Propostas que visam envolver os alunos em atividades práticas colocando-os em situações onde tenham que expor suas ideias, opiniões, gostos e reflexões, além de significativas são instrumentos pedagógicos valiosos.

• Refletir e sugerir situações que possibilitem a ampliação e aprofundamento dos conhecimentos da linguagem teatral, aliadas à criação plástica, são uma prática viável de ser aplicada em todas as escolas.

RESUMO DO TÓPICO 4

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AUTOATIVIDADE

Este é um bom momento para colocar em prática ao menos uma das sugestões elencadas neste tópico. Por essa razão, a proposta é que você escolha um texto teatral e crie um minicenário para ele. Traga seu trabalho para a sala de aula e apresente-o a seus colegas acadêmicos. Aproveite para trocar ideias referentes ao tipo de material utilizado e sobre a viabilidade de aplicação desta modalidade de atividade em sala de aula com alunos do ensino regular.

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TÓPICO 5

O TEATRO DE BONECOS

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Este tópico foi elaborado pensando em alguns detalhes históricos no que se refere ao teatro de bonecos. Ele tem o objetivo de mostrar o início do caminho da pesquisa, que tenho certeza virá, também foi concebido como forma de sugestão para prática em sala de aula visando a diferentes possibilidades de criação.

Você vai perceber que no universo do teatro de bonecos várias linguagens

podem ser desenvolvidas e que cada uma delas possui o encantamento necessário para existir por si mesma e ser única.

2 ALGUNS DETALHES HISTÓRICOS

O teatro de bonecos é uma arte milenar que se iniciou, pelo menos é no que se acredita, logo após o surgimento do teatro de sombras. Isso se deve à necessidade do ser humano de descobrir novas possibilidades. Foi confeccionando bonecos de barro muito semelhantes à imagem humana, embora não articulados, que tudo começou.

O boneco embora inanimado, ganha vida pelas mãos de seu manipulador, ele constrói mundos e os reinventa o tempo todo, sendo capaz de contrariar todos os princípios da lógica, contrariando todas as leis da Física, adentrando por universos mágicos e inimagináveis, rompendo tempo e lugar. Algumas vezes, a plateia esquece que se trata apenas de bonecos manipulados por pessoas, tal a fantasia que suscitam.

Levando esses aspectos em consideração pode se dizer que esta linguagem teatral oferece um múltiplo de possibilidades para um educador, além de que comprovadamente é um método eficaz de aprendizagem e descobertas de maneira lúdica, prazerosa, pois oferece o encanto necessário à aprendizagem.

Existem várias tipos de teatro de bonecos pelo mundo. Alguns deles muito antigos, porém vivos e significativos como o Petruchka, na Rússia; o Vidouchaka, na Índia; o Karagós, na Turquia; o Punch, na Inglaterra; o Guignol, na França; o Fantoccini, na Itália; o Mamulengo, no Brasil e o Bunraku, no Japão.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

É importante dizer que o teatro de bonecos existe na Ásia desde há muito e que no Japão, comprovadamente desde o século VIII. O mais conhecido deles é o Bunraku, uma tradição milenar de bonecos de madeiras manipulados por pelo menos três pessoas cujo aperfeiçoamento da arte perdura por décadas, respeitando uma hierarquia de aprendizagem. Há relatos também de que entre 794 e 1185 d.C., no período Heian, o teatro de bonecos percorria todo o país, atendendo a muitos ou mesmo poucos espectadores, contava com bonecos rústicos, vestidos com trapos e esculpidos a mão. As apresentações aconteciam dentro de uma caixa de formato retangular com abertura frontal, carregada atada ao pescoço do titereiro – existente ainda hoje nas regiões mais remotas do país. Não tardou muito para que este teatro de bonecos andante fosse se desenvolvendo e se tornando cada vez mais sofisticado, ascendendo a figurinos mais suntuosos, de tecidos finos e caros, bonecos esculpidos de maneira mais elaborada, adquirindo maiores possibilidades de movimentos, como abrir e fechar de olhos, mover a boca. Essa melhoria significativa foi evidentemente acompanhada pela notável destreza desenvolvida pelos manipuladores que proporcionavam movimentos sutis na dança, na caminhada e no gestual do boneco (títere).

FIGURA 52 – APRESENTAÇÃO DO BUNRAKU

FONTE: Disponível em: <http://whatculture.com>. Acesso em: 1 fev. 2012.

Há muitos tipos de teatro de bonecos no ocidente em que são necessários mais do que um manipulador.

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TÓPICO 5 | O TEATRO DE BONECOS

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FIGURA 53 – PEÇA "LIVRES E IGUAIS" - GRUPO CATARINENSE “TEATRO SIM. POR QUE NÃO!?”

FONTE: Disponível em: <www.emvideira.com.br> Acesso em: 1 fev. 2012.

O fato é que para se fazer teatro de bonecos se necessita da história a ser contada, de manipulador, de boneco ou bonecos e do público é claro, sem este não há teatro. Existem vários tipos de bonecos como você vai poder observar logo a seguir.

3 TEATRO DE BONECOS E SUAS LINGUAGENS

3.1 BONECOS ARTICULADOS

Conhecido também como marionete, todo seu corpo é articulado e manipulado através de fios. Aquele que dá (“vida”) movimento ao boneco é chamado de bonequeiro.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

FIGURA 54 – PERSONAGEM DO TEATRO DE MARIONETES DE PRAGA

FONTE: Disponível em: <www.pragaturismo.com>. Acesso em: 1 fev. 2012.

3.2 BONECOS DE LUVA

São vestidos pelo manipulador quase que do mesmo modo em que se põe uma luva nas mãos que cobrem o braço. Muito utilizados no teatro que se faz com e para crianças, principalmente nas escolas.

No Brasil, os bonecos de luva são popularmente conhecidos como fantoches ou mamulengos, oriundos do Nordeste brasileiro. Em sua palavra de origem “mão molenga”, assim denominado em função da flexibilidade. Os mamulengos brasileiros podem ser de vários tamanhos, além dos pequenos que apenas cabem no braço, há aqueles com formas gigantes, literalmente vestidos pelo manipulador, porém sem a utilização de varas, confeccionados a mão e que ganham diferentes formas. Em Olinda, no estado de Pernambuco, durante o carnaval, ocorre o desfile de bonecos gigantes, uma tradição que percorre as ruas da cidade seguida por milhares de pessoas.

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TÓPICO 5 | O TEATRO DE BONECOS

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FIGURA 55 – PERSONAGEM DO TEATRO DE MAMULENGOS

FIGURA 56 – BONECOS GIGANTES DE OLINDA

FONTE: Disponível em: <http://articulacaocultural.blogspot.com>. Acesso em: 31 jan. 2012.

FONTE: Disponível em: <http://babeldasartes.wordpress.com>. Acesso em: 1 fev. 2012.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

ATENCAO

Existe uma infinidade de materiais e técnicas da confecção de bonecos para teatro. Elas vão desde a espuma, o EVA, o tecido ou mesmo o papel machê e o feltro. Você encontra inúmeras sugestões passo a passo visitando o <www.yuotube.com.br> e pesquisando vídeos sobre a confecção de bonecos para teatro.

3.3 BONECOS DE VARA

Manipulados por varetas coladas em diferentes pontos de articulação, esses bonecos em geral, são utilizados no teatro de sombras, o que não impede que sejam utilizados também de outra maneira. Um detalhe importante é que existem alguns tipos de bonecos de tamanhos distintos, articuláveis, que são igualmente controlados por varas ou varetas, não pertencentes ao teatro de sombras.

FIGURA 57 – BONECOS MANIPULADOS COM VARA

FONTE: Disponível em: <http://alrocha-antenacultural.blogvspot.com>. Acesso em: 5 fev. 2012.

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TÓPICO 5 | O TEATRO DE BONECOS

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4 TEATRO DE SOMBRAS UMA LINGUAGEM PARTICULAR

O teatro de sombras possui um valor simbólico tão expressivo que mesmo não sendo o mais utilizado na escola é, sem sombra de dúvidas, o que proporciona uma atmosfera de mistério e magia. Estes elementos exercem um fascínio especial em crianças, jovens e adultos, além de possuir uma história antiga e significativa.

Isso parece mais do que suficiente para justificar uma separação especial para falar desta linguagem tão particular do teatro de bonecos.

4.1 TEORIA E TÉCNICA

“Da projeção da luz misturada à matéria, nasce o teatro de sombras.”(Jean Pierre Lescot)

Há milênios, o teatro de sombras existe e encanta. A linguagem de animação e as técnicas inseridas neste estilo teatral podem ser relativamente simples, porém são sempre encantadoras. O uso de tela branca e de foco de luz que se projeta sobre silhuetas de figuras distintas ou mesmo objetos remetem a um mundo mágico e muito particular do universo teatral.

Acredita-se que o homem da Pré-História já experimentava mover-se com sua sombra sendo projetada pelas paredes da caverna e fazendo uso das mãos, teria desenvolvido um teatro de dedos ao relatar seus feitos. No Brasil, o teatro de sombras ainda é muito recente se comparado ao seu histórico de existência.

A inspiração para o desenvolvimento desta manifestação artística veio primeiramente do oriente de onde foi largamente difundido; sua utilização como recurso didático aparece em apresentações envolvendo lendas, contos, eventos históricos e religiosos. Os registros mais antigos são provenientes dos países asiáticos. Na China existe uma lenda que conta a história do nascimento do teatro de sombras, entre 140 a 87 a.C., período sobre o domínio do imperador Wu-ti, da dinastia do Han, amante das artes.

É incerto o período em que o teatro de sombras foi inserido no ocidente, mas é sabido que ao se utilizar a linguagem da sombra, trabalhar com a mobilidade de silhuetas, fazer uso de transparências físicas, de projeções de luz, criando magia e explorando a imaterialidade, o impalpável, estamos com toda certeza apreciando um espetáculo teatralmente mágico.

A proporção do espaço, uma pequena caixa (cenas fechadas) ou um palco inteiro (cenas abertas) é pouco importante se levarmos em consideração a enorme capacidade de se estabelecer uma relação entre a forma (representada pela sombra) e o conteúdo ou linguagem teatral (representada pela ação). O que torna o teatro de sombras significativo do ponto de vista pedagógico é sua capacidade de prender a atenção ao mesmo tempo em que ludicamente desenvolve mecanismos de compreensão e domínio sobre uma linguagem desafiadora. A construção desta linguagem se dá no fazer, no vivenciar, no apreciar.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

É sabido que a pesquisa impulsionou a divulgação dessa linguagem e a reflexão teórica levou ao aprofundamento das construções teatrais e formação de importantes grupos, mas vale ressaltar que as projeções de sombras e o aperfeiçoamento da técnica no ocidente serviram também de inspiração para o cinema de animação.

É também importante ressaltar que o teatro de sombras normalmente faz uso de bonecos de vara, ou seja, bonecos manipulados por varetas que são coladas nas partes articuláveis do corpo do boneco. O que não impede, no caso de uma grande tela, que o “boneco” seja o próprio aluno/ator, representando uma personagem fazendo uso de sua silhueta.

FIGURA 58 – POR TRÁS DA TELA NO TEATRO DE SOMBRAS

FONTE: Disponível em: <http://plimplimhistorias.blogspot.com>. Acesso em: 31 jan. 2012.

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TÓPICO 5 | O TEATRO DE BONECOS

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DICAS

A obra de Michael Ende e Friedrich Hechelmann, “O teatro de sombras de Ofélia”, é um material riquíssimo para ser utilizado como forma introdutória do teatro de sombras em sala de aula. Além da linguagem fácil, o texto é cativante e as ilustrações remetem a um mundo imaginário e criativo.

Alguns espetáculos teatrais mesclam o teatro de sombras com teatro de bonecos, você pode apreciar exemplos e observar distinções acessando o <www.youtube.com.br> e procurando com as palavras teatro de sombras ou teatro de bonecos, você vai encontrar centenas de opções de filmagens de apresentações teatrais, inclusive alguns dos vídeos podem servir como excelentes fontes de material didático.

NOTA

FIGURA 59 – EM FRENTE À TELA NO TEATRO DE SOMBRAS

FONTE: Disponível em: <http://ursinhosecologicos.blogspot.com>. Acesso em: 31 jan. 2012.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

FIGURA 60 – CAPA DE O TEATRO DE SOMBRAS DE OFÉLIA

FONTE: Disponível em: <www.livrariascuritiba.com.br>. Acesso em: 26 fev. 2012.

Um recurso simples que o professor não pode deixar de utilizar é o retroprojetor. Este equipamento possui capacidade suficiente para produzir efeitos significativos para o teatro de sombras.

As informações contidas neste tópico vêm de encontro à leitura complementar do Tópico 3. Vale recordar refazendo a leitura.

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RESUMO DO TÓPICO 5

Nesse tópico, você viu que:

• A história do teatro de bonecos é antiga e que existem inúmeras possibilidades e técnicas tanto para criar personagens, quanto para encenar peças teatrais envolvendo esta linguagem cênica.

• Conheceu as diferentes linguagens e algumas de suas especificidades do teatro de bonecos articulados, de luva e de vara.

• Percebeu que o teatro de sombras é um recurso significativo e que merece ser aprofundado, pois desenvolver atividades de manipulação da sombra desenvolve significativamente nossa percepção espacial e consequentemente nossa visão de mundo.

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Agora que você já sabe um pouquinho mais sobre o teatro de bonecos que tal criar seu próprio boneco, não importa se de vara, de luva - você pode buscar inspiração em imagens da internet ou mesmo em revistas, destas encontradas nas bancas e relacionadas a trabalhos manuais. Assim que tiver seu boneco em mãos experimente, mesmo que diante de um espelho, dar “vida” a ele através de movimentos. Você vai observar que no começo parece difícil, mas logo vai perceber quão prazeroso é. Depois que tiver certo domínio sobre os movimentos do boneco experimente deixar seu boneco contar uma história para alguém.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 6

O TEATRO DE MÁSCARAS

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Este tópico trata especificamente da máscara, seu significado e sua influência no universo teatral. A máscara, desde que surgiu, sempre representou a transformação e a posse de uma personalidade distinta. Como o próprio nome que a designa, no latim persona, a máscara abre a possibilidade de mudança da personalidade, deixo de ser eu mesmo e assumo outra identidade, tal seu efeito na sociedade desde os primórdios. Por esta razão e também por propiciar a oportunidade de enfrentamento de muitos temores, ela personifica e transforma as qualidades do ser representado e adentra em um universo mágico e fascinante, talvez essa seja a essência do fascínio exercido em todas as culturas existentes. Este recurso no que concerne à educação e à aprendizagem na linguagem teatral é um dos meios mais eficazes e significativos, pois desde a mais tenra idade ela exerce relativo domínio sobre a imaginação de crianças, jovens e adultos.

2 BREVE HISTÓRIA DA MÁSCARA

A máscara sempre teve uma natureza simbólica e ao longo da história sempre exerceu diferentes funções. Nas sociedades primitivas sua relação com a magia e a religiosidade lhe dotavam de poderes distintos. Sob a máscara tudo está oculto, ao mesmo tempo em que dota aquele que dela faz uso, de outra personalidade. Sua utilização adquiriu diferentes significados ao longo do tempo, podendo representar crenças e mitos. Para os povos indígenas eram utilizadas nas diversas cerimônias (de cura, casamentos e ritos de passagem) no Egito, por exemplo, eram colocadas nos rostos dos mortos para auxiliarem na passagem para a outra vida, na China afastavam maus espíritos. No mundo ocidental, foi na arte de representar que ganharam largo proveito e foram os gregos a dar o primeiro passo na significação e no uso para teatro.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

A máscara no teatro grego não possuía apenas a função de determinar a aparência de uma personagem, mas também a de ampliar a possibilidade vocal do ator, como uma espécie de megafone. Esse recurso permitia ao ator ser ouvido por todo o espaço do anfiteatro. Além desse recurso os gregos aumentavam a altura das personagens fazendo uso de sapatos de plataforma e ombreiras que alargavam os ombros, tornando a personagem visível. As máscaras gregas caracterizavam deuses e heróis das tragédias e eram confeccionadas com materiais diversos, madeira, cortiça, barro... as máscaras também foram utilizadas no teatro romano, uma herança do teatro grego.

No princípio do teatro romano se fazia uso da pintura no rosto, com a introdução de máscaras palpáveis, adornos como perucas e orifícios para os olhos foram introduzidos, além da madeira, o bronze e o couro que passam a ser também utilizados.

No que concerne ao cumprimento de sua função, não raro o ator tinha que retirá-la em cena para que seu público conferisse a sua real expressão fisionômica.

Durante a Idade Média, no ocidente, as máscaras praticamente desapareceram, seu retorno se deu no período conhecido como Renascimento e consequentemente com o retorno da comédia. E foi na Itália, mais especificamente na Sicília que se deu tal fato, vinha para criticar e caricaturizar os poderosos, através de interpretações diversas e acompanhadas de um significativo trabalho corporal, era o nascimento da Commedia dell’Arte.

As diferentes personagens da Commedia dell’Arte tinham máscaras feitas em geral de couro fino, costuradas na roupa branca, as mais conhecidas eram Pierrot, Colombina, Pulcinela e Arlequim. A comédia incorporou meia máscara que deixou à mostra a boca do ator o que permitia ver sua expressão.

A partir desse ponto o uso da máscara se intensificou, ela foi ganhando espaços além do teatro e percorrendo ruas como no carnaval de Veneza e do Brasil. Essa recriação, por assim dizer, deixa de ter sentido puramente teatral e assume uma função que possibilita o anonimato, adota um disfarce, esconde a verdadeira face e retorna a origem.

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TÓPICO 6 | O TEATRO DE MÁSCARAS

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FIGURA 61 – MEIA MÁSCARA COMMEDIA DELL’ ARTE

FONTE: Disponível em: <www.lugaresdomundo.com> Acesso em: 18 fev. 2012.

No oriente, ela vai se destacar no Japão, refinada e simbólica com uma história que perpassa 600 anos, o teatro Nô ou Noh, uma combinação de canto, dança e poesia. Um espetáculo de máscaras cuja base são máscaras de divindades sobrenaturais, de anciãos e de mulheres. Nas máscaras do Nô pode hever diferenças nas expressões do lado direito e esquerdo da máscara, face direita entristecida e face esquerda alegre.

Fazer uso da máscara no teatro Nô é sinônimo de magia, há toda uma preparação, por anos a fio. Vestir a máscara é como um ritual, o ator observa a máscara antes de colocá-la, pois ela conterá seu corpo e alma nos quais ela passa a viver. São verdadeiras obras-primas esculpidas em madeira, seu fabrico é complexo e exige muito empenho, poucos são os profissionais que dominam essa arte.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

FIGURA 62 – MÁSCARA DO TEATRO NÔ

FONTE: Disponível em: <www.galeriagrazinegoes.com>. Acesso em: 18 fev. 2012.

3 O USO DA MÁSCARA E SUA CRIAÇÃO NAS PRODUÇÕES ESCOLARES

Já sabemos que o uso da máscara no teatro além de fascinante nos remete ao misticismo e magia que a máscara propicia. Na escola não é diferente, desde muito pequenos crianças e adolescentes quando instigados a confeccionar e vestir máscaras, não medem esforços e imaginação para a criação, confecção e uso. Para tal basta que o educador proponha a atividade e disponibilize materiais de diferentes texturas e composições e que os estimule através de exemplos que podem ser desde o estabelecimento de um comparativo entre máscaras de heróis conhecidos do universo infantil até aqueles que povoam a imaginação e o universo dos alunos aprendizes.

Para que a produção de máscaras se concretize, o educador pode agir como um provocador, um desafiador e iniciar seu trabalho pedindo aos alunos que desenhem uma máscara da qual gostariam de fazer uso. Não necessariamente a sugestão deva ficar muito aberta, para tal pode ser utilizado, a exemplo, um poema, um texto teatral ou literário, com personagens bem definidos e que façam parte do universo imagético do grupo em questão.

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Antes de iniciar propriamente a criação é importante deixar claro que existem mais de um tipo de máscara e que cada uma delas possui um fim em si. Meia máscara permite que o aluno/ator fale, pois deixa à mostra sua boca e queixo, máscaras inteiras já não proporcionam essa possibilidade, podem conter elásticos ou fitas que as fixem na cabeça com mais firmeza ou podem apenas ser seguradas por uma vara na lateral ou na parte de baixo.

FIGURA 63 – MEIA MÁSCARA CARNAVAL DE VENEZA

FONTE: Disponível em: <www.lugaresdomundo.com>. Acesso em: 18 fev. 2012.

4 CRIANDO MÁSCARA PARA TEATRO NA ESCOLA

Desde a mais tenra idade, crianças demonstram um interesse muito forte pelo teatro de máscaras. Explorar essa identificação é como encontrar uma chave para abertura de um baú de tesouro e o melhor de tudo isso, será experimentar a parte mais prazerosa do trabalho do educador, o reconhecimento de que propiciou a seus alunos uma experiência inesquecível e significativa que os marcará para sempre.

Inúmeras são as possibilidades de criação na escola. Elas vão desde a confecção de máscaras fazendo uso de sacos de pão, cartolina, caixas de leite, pratos de papelão, balão, gaze gessada, papel machê e até bases prontas compradas em livrarias e lojas de armarinhos. Independente da escolha tenha certeza de que estará proporcionando uma atividade que possibilita o envolvimento de todos.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

É importante levar em consideração alguns pontos antes de se propor a confeccionar máscaras em sala de aula. Primeiramente, dependendo do número de alunos e o tipo de máscara que se pretende fazer, você vai precisar de mais tempo e espaço adequado, por exemplo, um local com acesso a torneiras e mesas grandes, dessas que facilmente encontramos nos pátios cobertos das escolas. Outro ponto é o local de armazenamento, alguns tipos de máscaras necessitam de secagem, pois dependem de diversas etapas para concretização.

Desse ponto em diante o objetivo é exemplificar algumas alternativas de confecção, mas é importante que saiba que existem inúmeras alternativas e que você à medida que vai dominando algumas técnicas, vai também desenvolvendo as suas.

4.1 MÁSCARA DE CAMADAS: (KRAFT/JORNAL)

Material necessário:

Papel kraft, jornal, cola de farinha de trigo, massa corrida, lixa fina, tinta à base de água ou plástica para artesanato, pincel, argila e vaselina sólida ou plástico tipo filme utilizado na cozinha.

Etapas:

a) Primeiramente, você irá preparar a cola de farinha de trigo. Esta cola é mais eficiente que qualquer outra, além de ser econômica e prática, leve ao fogo dois copos de água, acrescente uma colher de sopa de farinha de trigo e cinco gotas de suco de limão ou vinagre, ferva mexendo sempre até engrossar, a textura deve ser a de um mingau não muito espesso. Assim que amornar e guarde em uma garrafa pet, se manter resfriada ela pode durar uma semana inteira.

b) Escolha a base para seu trabalho, uma máscara plástica neutra, dessas já adquiridas prontas ou mesmo uma base confeccionada em argila modelada de acordo com o desenho pré-estabelecido da máscara que deseja fazer – lembre que ela deve ser modelada, levando em consideração comprimento e largura (tamanho) do rosto. Sobre esta base aplique vaselina sólida bem espessa ou filme plástico. Tanto a vaselina quanto o filme servem para desenformar a máscara após a conclusão das primeiras etapas de papietagem.

c) Molhe o papel kraft e aperte bem para sair todo o excesso de água, rasgue em pequenos pedaços, passe a cola de farinha de trigo dos dois lados e aplique por toda a superfície da máscara.

d) Em seguida, rasgue pequenos pedaços de jornal, passe cola dos dois lados e aplique sobre a camada de papel kraft, cobrindo toda a superfície da máscara.

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TÓPICO 6 | O TEATRO DE MÁSCARAS

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Repita esta operação pelo menos por quatro vezes em cada etapa, sempre alternando kraft/jornal. Deixe secar.

e) Assim que estiver bem seca retire a máscara da base, recorte as aberturas dos olhos e fure o nariz fazendo uso da medida cilíndrica de um lápis. Reinicie o processo de papietagem aplicando caprichosamente uma camada de papel kraft na parte interna da máscara e outra na parte externa. Para um melhor acabamento aplique primeiramente o papel nas bordas e no contorno dos olhos, dobrando o papel ao meio para evitar qualquer possibilidade de abertura das bordas da máscara. Nesse ponto se torna necessário fixar um ilhós em cada lado da máscara para passar o elástico ou fita para que a máscara se mantenha no rosto.

f) Após completar o processo final de papietagem, deixe secar bem. Em seguida aplique na parte externa uma leve camada de massa corrida, deixe secar, faça uso da lixa para retirar excessos e a aspereza da superfície.

g) Pinte a máscara e bom uso.

ATENCAO

Esse tipo de máscara pode ter como base um balão papietado em toda sua superfície. Após a secagem das primeiras camadas, você irá cortar ao meio, recortar os orifícios que compõem olhos e nariz e até boca se preferir, terá assim duas máscaras ao invés de uma.

FIGURA 64 – ETAPA DE CONFECCÃO MÁSCARA EM PAPEL KRAFT

FONTE: Disponível em: <http://tripeteatroclown.blogspot.com>. Acesso em: 19 fev. 2012.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

4.2 MÁSCARA DE SACO DE PÃO

Material necessário:

Saco de papel pardo; pedaços de papel-cartão medindo 13 centímetros de comprimento por 20 centímetros de largura; folhas de papel crepom coloridos; tinta plástica de várias cores; pincel chato; cola branca; lápis; tesoura; fita dupla face; grampeador.

Etapas:

• Cara desenhada: Com o saco de papel pardo fechado e bem esticado, marque aproximadamente 20 centímetros desde o fundo, risque com o lápis e corte. Deixe de lado a parte cortada. Novamente, contando a partir do fundo do pacote, deixe aproximadamente 10 centímetros e faça uma dobra. Neste ponto será feito o cabelo. Experimente o cartucho na cabeça, e marque levemente a altura exata dos olhos. Com o lápis, desenhe os olhos, o nariz e a boca.

• Pintura: Com a tinta plástica, use a criatividade e pinte os traços fisionômicos. Para representar o cabelo, passe tinta na faixa horizontal marcada anteriormente pela dobra. Deixe secar. Lembre-se de colocar um plástico ou pedaço de papelão dentro do saco para que a tinta não ultrapasse a parte da frente.

• Cabeça e cabeleira: Grampeie no limite entre a cor do cabelo e o papel pardo do saco. Esses grampos delimitam a cabeça. Corte o crepom em tiras, abra ou mantenha os rolinhos fechados para formar o cabelo e cole como desejar.

• Figura masculina: Dobre o papel-cartão ao meio e desenhe uma orelha. Corte as duas partes e, com a fita dupla face, cole-as nas laterais do saco. Para enfeitar, você pode acrescentar bigode, barba, nariz de palhaço, óculos ou o que mais puder inventar.

• Figura feminina: Para representar uma figura feminina, os passos são os mesmos da versão masculina, com exceção do cabelo. Corte tiras do papel crepom dobrado. Abra essas tiras e cole-as no fundo do saco no tamanho que preferir. Faça uma maquiagem e, se quiser, coloque brincos nas orelhas e laço no cabelo.

• Para enxergar: Com a tesoura, faça um furo redondo no local onde as bolinhas dos olhos estão pintadas.

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FIGURA 65 – MÁSCARAS DE SACO DE PÃO

FONTE: Disponível em: <http://lilika-forever.blogspot.com>. Acesso em: 19 fev. 2012.

4.3 MÁSCARA DE PAPEL MACHÊ

Material necessário: papel higiênico; cola branca e um recipiente.

Etapas:

a) Rasgue o papel higiênico em pedaços pequenos e coloque-os em um recipiente.

b) Despeje sobre eles água e deixe o papel amolecendo por até 24 horas (ou, dependendo da qualidade do papel, por no mínimo 4 horas). Acrescente vinagre ou água sanitária (até uma colher de sopa se ultrapassar 10 litros de água) para evitar o mofo e o consequente mau cheiro;

c) Esprema a massa para tirar o excesso de água e bata no liquidificador se achar que não amoleceu o suficiente;

d) Recoloque as bolas formadas no recipiente, adicione a cola e forme uma massa, de preferência, compacta; trabalhe-a bem com as mãos e ela está pronta para ser usada.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

ATENCAO

Para manter a forma é importante que você aplique a massa sobre uma superfície que pode ser já modelada, como no caso das máscaras plásticas compradas em lojas de armarinhos, ou sobre, por exemplo, um balão. (O balão deve ser cheio, apenas até o tamanho que se aproxime da medida do rosto). Não se esqueça de deixar aberturas para os olhos e modelar em relevo o nariz (este pode ter os orifícios feitos a partir da medida cilíndrica de um lápis), pois é quase impossível abrir estes orifícios sem danificar a máscara após a secagem.

DICAS

Material necessário: 1/4 de rolo de papel higiênico; farinha de trigo; gesso em partes iguais a de farinha de trigo e cola branca.

Depois de seca, ela dever ser retirada da superfície de secagem, pode ser lixada levemente e pintada da maneira que desejar. Uma boa camada de cola branca após a pintura funciona como impermeabilizante além de proporcionar um brilho leve.

IMPORTANTE

Etapas:

a) Corte o papel em pedaços bem pequenos e deixe-os de molho em bastante água durante a noite. Ferva-os na mesma água, durante uma hora. Para obter melhor qualidade no trabalho, é importante que o papel fique completamente desmanchado.

b) Em seguida coe o papel num pano, até tirar toda a água. Trabalhe sempre com pequenas quantidades que possibilitem espremer facilmente com as mãos.

c) Depois de espremido todo o papel, acrescente o gesso e a farinha de trigo, previamente misturados. A proporção para a massa é de uma colher de sopa cheia da mistura farinha-gesso e uma colher de sopa de cola branca, para cada “bolo” de papel que você espremeu.

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TÓPICO 6 | O TEATRO DE MÁSCARAS

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d) Amasse bem, até obter uma pasta homogênea. Se estiver muito seca pode esfarinhar. Neste caso, acrescente água aos pouquinhos, até obter o ponto em que possa trabalhar a massa.

FONTE: Adaptado de: <http://www.arteducacao.pro.br/Tecnicas_e_Materiais/materiais.htm#Papel Machê (receita o1)>. Acesso em: 9 abr. 2012.

Prepare quantidades pequenas de massa, apenas o que pretende usar, pois uma vez seco o gesso, não há possibilidade de reaproveitamento.

IMPORTANTE

FIGURA 66 – MÁSCARAS DE PAPEL MACHÊ

FONTE: Disponível em: <http://grupo-manos-creadoras.blogspot.com>. Acesso em: 19 fev. 2012.

ATENCAO

Há também a possibilidade de confeccionar máscaras tendo como base a gaze gessada, mas observe este tipo de trabalho só deve ser realizado com alunos maiores ou adultos já que exige a modelagem sobre o próprio rosto. Se o aluno não se sentir seguro para realizar esse tipo de atividade, já que terá seu rosto coberto por uma camada espessa de gesso e no caso de máscara deverá respirar apenas por pequenos orifícios, o melhor será escolher outra das alternativas.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

FIGURA 67 – CONFECCIONANDO MÁSCARA DE GAZE GESSADA

FONTE: Disponível em: <www.teatrobac.com>. Acesso em: 19 fev. 2012.

DICAS

Ao confeccionar máscaras, você deve ter em mente que jamais se deve pintar a parte interna delas, pois o contato com diferentes produtos pode ocasionar lesões de pele, portanto, muito cuidado com o que vai usar e procure manter o interior da máscara sempre neutro. Uma boa ideia é fazer uso do papel kraft no acabamento e cola de farinha de trigo feita em casa ou branca de boa qualidade comumente encontrada em livrarias.

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TÓPICO 6 | O TEATRO DE MÁSCARAS

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LEITURA COMPLEMENTAR

DRAMATURGIA DA MÁSCARA

Tiche ViannaA máscara é em si a sua dramaturgia,Não precisa de texto nem contexto pra existir,Existe porque foi criadaE se foi criada,é porque mereceu existir!

A máscara é um objeto vinculado ao universo simbólico através da escultura de uma forma que representa um conteúdo específico. Nas sociedades chamadas primitivas, a máscara representava divindades, e como tal, não poderia ter a forma humana. Ao observarmos estas máscaras, é comum verificarmos que o imaginário daquele homem, atribuía a imagem de suas divindades a animais, provavelmente porque sua vida cotidiana o inseria na natureza de modo a fazer desta relação algo, para ele, muito natural.

Estas máscaras divinas eram usadas por um sacerdote. Nenhum homem comum poderia evocar o “Divino” sem que tivesse sido preparado para isto. Esta pessoa, ao vestir a máscara, como se perdesse completamente sua identidade cotidiana, era imediatamente identificada, pelos demais membros da sociedade, como a divindade evocada e não mais como o sacerdote.

No teatro quem usa a máscara é o ator, que como o sacerdote das sociedades primitivas, deverá tornar-se outro ser e para isto, deverá escapar de seu cotidiano transformando o seu corpo, sua voz, seu pensamento e suas ações, a partir da relação íntima que estabelecerá com a máscara que porta.

Atrás da Máscara, ninguém se oculta e tudo se revela.

A MÁSCARA É UMA LINGUAGEM CÊNICA PORQUE CONSTITUI A SUA PRÓPRIA DRAMATURGIA.

A máscara é um objeto de representação e ligação simbólica com o imaginário de um povo, capaz de estabelecer, através da sua utilização, uma relação de “presentificação” ou materialidade de arquétipos e do seu universo mitológico. Consideramos arquetípico, aquilo que apresenta uma essencialidade humana, capaz de atravessar todas as culturas em diversas épocas. Consideramos como universo mitológico, o conjunto de histórias e figuras que atravessaram os tempos apresentando diversos arquétipos através de sua formalização específica.

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

Ao trazermos a máscara para dentro do teatro, como instrumento de expressão, instituímos um modo específico de criar a cena e consequentemente, um treinamento específico para o ator que pretende utilizar e criar um espetáculo de máscara.

No teatro, a máscara, pode assumir duas funções claras: a de objeto cênico ou a de expressão cênica. Como objeto cênico, uma máscara corresponde a qualquer objeto que possa ser utilizado por um ator para demonstrar uma determinada realidade, por exemplo, uma máscara poderá ocultar a identidade de uma personagem ou decorar o cenário de um baile à fantasia. Como objeto, ela não age, ela será “agida” por alguém. A máscara como expressão cênica, porém, não é objeto. Ela é reconhecida, através de um conjunto de códigos, como um ser vivo passível de sofrer toda sorte de paixões humanas. O espectador, então, não estará interessado em ver a história de quem veste a máscara sobre seu rosto estando, portanto, atrás dela. O espectador estará se relacionando diretamente com a máscara, reconhecendo que ela em si, é o sujeito da realidade apresentada.

Dentro desta especificidade, ou seja, considerando a máscara uma expressão cênica, nos perguntamos então, o que faz um ator para tornar-se máscara, sem esconder-se por trás dela?

Retomemos a ideia de que a máscara é, antes de mais nada, um objeto de couro, papel ou látex, com uma forma definida e fixa, colocado sobre o rosto. Para torná-la viva, é preciso fazê-la “respirar” e para fazermos isto, precisaremos atribuir a esta forma fixa, o movimento. É preciso vê-la em movimento para percebermos que está viva e consequentemente, se relacionando com o mundo ao seu redor.

Não podemos desconsiderar, porém, que no teatro, não é qualquer movimento que será capaz de se expressar, se não for uma ação ou reação. Deste modo, podemos afirmar que são as ações e reações das máscaras observadas no corpo do ator através do movimento, que seremos capazes de compreender quais e quanto as coisas do mundo lhe interessam.

Em particular, as máscaras nos apresentam outro aspecto a ser considerado: não podemos fazer com que o olho do ator que está por trás dela, apareça diante de seu espectador. Para que isto não aconteça, atribuímos o olhar da máscara ao nariz dela e não aos seus olhos. Desta forma, quando uma máscara vê algo, certamente observamos que a cabeça do ator move-se na direção do seu ponto de interesse de modo a alinhar o nariz da máscara com este ponto, ao qual damos o nome de “foco”. Todos os movimentos do corpo do ator deverão partir da máscara. É preciso então focalizar, para que o espectador saiba que a máscara

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TÓPICO 6 | O TEATRO DE MÁSCARAS

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está estabelecendo uma relação com seu ponto de interesse. Se o movimento for apenas dos olhos do ator, a máscara continuará parada, fixada em uma única direção, “morta” ou “pendurada em uma cabeça”, como se estivesse pendurada na parede. Portanto, não é possível que os olhos do ator olhem para uma coisa, o nariz da máscara aponte para outra coisa. Olho do ator e nariz da máscara tornam-se uma única coisa.

Outro aspecto, que logo se evidencia quando o ator veste uma máscara, é a proporção que assume seu corpo diante dos olhos do espectador. O corpo se engrandece e torna-se tão presente que não é possível aceitarmos movimentos realizados de modo natural, cotidiano ou realista como os movimentos do dia a dia corpo humano. O corpo de uma máscara não tem a dimensão do corpo de um homem ou mulher. Seus movimentos são maiores e mais amplos e o corpo do ator deverá aproveitar cada uma de suas partes, como se compusesse um gesto específico para cada uma delas, na medida em que se movimenta.

Para construir fisicamente o corpo da máscara, o ator trabalhará com a ideia de eixo, que é uma composição que reorganiza a relação entre a cabeça, coluna, quadril e pés do ator. Esta construção será inspirada pela forma fixa da máscara e definirá seu corpo. Composto este corpo como um todo: cabeça, tronco e membros, suas relações e movimentos, estarão diretamente ligados a esta forma, que será responsável pelo seu modo de realizar, até mesmo os movimentos mais banais e cotidianos, que não serão convencionais, embora verdadeiros. O mesmo consideramos para a voz, que também deverá assumir uma dimensão corpórea, acompanhando a proporção do corpo da máscara e não do corpo do ator que está por trás dela e que não será visto.

Por fim, ao olhar para uma máscara antes de vesti-la, o ator se dá conta de que aquele rosto em suas mãos é uma cara esculpida com relevos fixos, que lhe sugerem um caráter, um modo de ser fisicamente no espaço, um ritmo e um estado de espírito.

Se o movimento é o instrumento que dá vida à máscara e possibilita que ela mude sua expressão que é fixa, fazendo com que quem a vê saiba o que lhe está acontecendo, é obvio que não podemos deixá-la parada por muito tempo. Mas então, o que faz uma máscara o tempo todo? A máscara age e reage.

A ação é o meio através do qual a máscara desenvolve suas relações. É assim que ela mostra quem é. Uma máscara não discute com outra máscara nem com ninguém sobre as coisas. Isto seria muito banal, corriqueiro e naturalmente humano. Uma máscara faz alguma coisa a respeito das coisas que estão lhe acontecendo. A máscara também não pensa sobre si mesma. Isto seria dotá-la de um caráter psicológico, que ela, por não ser humana, não tem. A máscara mostra

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UNIDADE 3 | TEATRO E VISUALIDADE

o que lhe acontece e o espectador poderá compreender como isto lhe afeta, através das suas reações físicas. Podemos então afirmar sem medo de errar, que uma máscara precisa estar em relação a alguma coisa ou alguma outra máscara para que o espectador possa se inserir no universo imaginário que ela propõe.

Realizar a máscara expressiva, para o ator que a porta, é considerar que o rosto da máscara é seu olho, e o corpo que reage ao que vê é o olhar que esta máscara coloca sobre o mundo que a envolve.

FONTE: VIANNA, Tiche. A Dramaturgia da Máscara. Disponível em: <www.primeirosinal.com.br>. Acesso em: 18 fev. 2012.

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RESUMO DO TÓPICO 6

Nesse tópico, você viu que:

• A máscara exerce grande fascínio sobre as diferentes culturas e há muito é utilizada pelo homem para diferentes tipos de rituais e cerimônias, sempre mantendo a característica de dotar o ser que dela faz uso de uma personalidade distinta da sua permitindo que assuma outra identidade.

• A recriação da máscara no mundo contemporâneo assume também a função que possibilita o anonimato e a adoção de um disfarce, ocultando a realidade pessoal.

• O teatro de máscaras permanece vivo socialmente e que ainda persiste com suas características distintas e marcantes no Teatro Nô.

• Existe uma gama de sugestões de atividades envolvendo o uso da máscara e que sua aplicabilidade no universo escolar é possível.

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Neste momento, você pode criar a sua própria máscara. Basta escolher uma das sugestões dadas referentes aos meios de criação e pode colocar em prática uma delas. Não se esqueça de levar o resultado para o próximo encontro acadêmico e dividir a experiência com seus colegas.

AUTOATIVIDADE

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REFERÊNCIAS

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ANOTAÇÕES

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