arte sem arte

Upload: jeansiq

Post on 06-Jul-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    1/13

    Arte sem “arte”

     Dominic McIver Lopes

    Universidade da Colúmbia BritânicaTradução de Vítor Guerreiro

    Há quem argumente não aver arte em algumas culturas não ocidentais !orqueos membros dessas culturas não t"m qualquer conceito de arte# $utros argumentam queos membros de algumas culturas não ocidentais t"m conceitos de arte !orque t"m arte#%mbos os argumentos !ressu!&em que se á arte numa dada cultura' então algunsmembros da cultura t"m um conceito de arte# Há ra(&es !ara !ensar que este

     !ressu!osto ) *also+ e se ) *also' á liç&es a retirar !ara o estudo transcultural das artes'tanto na antro!ologia como na *iloso*ia#

    $s antro!,logos e *il,so*os que argumentam contra a e-ist"ncia da arte dita.!rimitiva'/ .tribal/ ou .não ocidental/ !ressu!&em que não á arte numa cultura cu0osmembros não tenam um conceito de arte# $s *il,so*os que res!ondem a estesargumentos não !useram em causa o !ressu!osto1 !elo contrário' sancionaram2no#Todavia' este !ode ser desa*iado# 3e *or *also' os argumentos e res!ostas aos mesmosnão são s,lidos# %l)m disso' as ra(&es !or que o !ressu!osto !ode ser *also sugeremalgumas liç&es !ara o estudo da arte não ocidental#

    4# Ce!ticismo antro!ol,gico$ ce!ticismo acerca da e-ist"ncia de arte em algumas culturas ) sur!reendente e

     !or essa ra(ão ) im!ortante !onderar o que motiva quem o ado!ta# % dada altura' talce!ticismo emergiu do sim!les cauvinismo# $s c)!ticos contem!orâneos consideram asua atitude !ositiva' na verdade um requisito !ara uma com!reensão não distorcida dasculturas não ocidentais#

    $ ce!ticismo ) sur!reendente' em !rimeiro lugar' !orque muitos cr"em' correctaou incorrectamente' que a arte ) ubíqua1 onde á cultura' á arte# 5sta crença não raro !rov)m de uma ligação conce!tual entre .arte/ e .cultura#/ 6ual o melor local onde !rocurar uma e-!ressão da antro!ologia !o!ular contem!orânea do que a U753C$8 %U753C$ de*ine cultura como algo que engloba .arte e literatura' estilos de vida'modos de viver em con0unto' sistemas de valores' tradiç&es e crenças#/4 3egundo estade*inição' nenum gru!o que não tena arte ) uma cultura#

    % arte !arece tamb)m satis*a(er necessidades umanas !ro*undas# 9sto' maisuma ve(' ) ob0ecto de am!lo acordo' embora ningu)m concorde acerca do que essasnecessidades são' a menos que se0am e-!ressas nos termos mais vagos# Como escreve:onroe Beardsle;' .ao criar obras de arte umani(amos a Terra como de nenum outro

    modo o conseguimos' tornamo2la mais acoledora !ara n,s' tornamo2la num lugar aoqual !ertencemos#/or *im' arte*actos de todas as culturas acabam !or encontrar lugar nas

    instituiç&es artísticas ocidentais# $s entales aida são e-ibidos em galerias de arte'dançarinos a*ricanos a!arecem na Broad?a;' universidades canadianas !atrocinamgru!os de gamelão *ormados !or estudantes' as com!anias de commedia dell'arte em9tália colaboram com actores de @;ogen 0a!oneses# :uitas obras de culturas nãoocidentais constam entre a arte mais admirada e estimada no ocidente#

    $ *acto de o ce!ticismo ser sur!reendente não constitui um argumento contra omesmo# %*inal' a sur!resa resulta do com!romisso com uma antro!ologia !o!ular que

     !ode ser *alsa+ e á uma boa ra(ão !ara duvidar de que a antro!ologia !o!ular se0a um

     bom *undamento !ara uma antro!ologia cientí*ica#

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    2/13

    Considere2se a can,nica Ae algo mítica ist,ria da rece!ção da arte !rimitiva#%t) ao *inal do s)culo 9' a maioria das obras não ocidentais o0e classi*icadas comoarte eram na !ior das i!,teses classi*icadas como curiosidades e na melor dasi!,teses como meros es!)cimes# 7o início do último s)culo' os desenvolvimentos naarte euro!eia' e !ortanto no !ensamento euro!eu acerca da arte' !re!araram o terreno

     !ara a .descoberta/ da arte !rimitiva' que !assou do :useu do Homem !ara o Muséedes Beaux-Arts' onde ) *requentemente e-ibida como !recursora do modernismo#Temos de atentar se' como a ist,ria da rece!ção sugere' á alguma !ossibilidade de aarte não ocidental ser !roduto da imaginação ocidental D se o que vemos na arte

     !rimitiva ) assim uma !ro0ecção da nossa !r,!ria conce!ção de arte# $ c)!tico a!enaseleva esta !recaução a !rincí!io metodol,gico#

    >ara os c)!ticos de carne e osso' a a*irmação de que !elo menos algumasculturas .não ocidentais/ Aou .!rimitivas/ ou .tribais/ não t"m arte envolve uma ideiainequívoca da *ronteira entre o ocidente e o resto' e uma ist,ria conecida de contactoentre ambos# Erequentemente se reconece que os termos .ocidente'/ .não2ocidente'/.!rimitivo/ e .tribal/ são inadequados como nomes descritivos# $ .ocidente/ estende2

    se a todos os emis*)rios e talve( nada a0a de !rimitivo ou tribal em algumas culturas.!rimitivas/ ou .tribais/ A) ,bvio que o uso mais recente de .indígenas/ não ) ummeloramento# 7ão im!orta' desde que os termos nomeiem classes de culturasrelativamente distintas#

    Um c)!tico mais *ilos,*ico !ode !ermanecer com!letamente agn,stico acerca dequem ) o .ocidente/ e quem ) o .resto#/ %dmitirá de bom grado que nas culturas quenão t"m arte se !oderá a*inal incluir a dos bo)mios !arisienses ou dos residentes deTribeca# Fe*ende que os membros de uma cultura t"m um conceito de arte s, emcondiç&es muito es!ecí*icas nem sem!re satis*eitas' mas não tem de se !reocu!ar comidenti*icar que culturas satis*a(em ou não as condiç&es# 3em !restar atenção alguma ist,ria' não !artilará as motivaç&es de muitos c)!ticos de carne e osso' mas deve

     !artilar os seus argumentos#

    ode2se dividir os argumentos em duas classes# %lgunscegam tese !or via da a*irmação de que os membros das culturas em causa não t"mconceito de arte+ outros cegam tese sem a!elar a esta a*irmação# 7a realidade' todosos argumentos !ublicados !ertencem !rimeira classe# Cegam tese de que não áarte em algumas culturas não ocidentais demonstrando que os membros destas mesmasculturas não t"m um conceito de arte#

    5is um e-em!lo sim!les a!resentado !or 3te!en Favies#

     $s membros dequalquer cultura t"m um conceito de arte s, se t"m uma !alavra !ara .arte'/ masalgumas culturas não t"m uma !alavra que se dei-e tradu(ir e-actamente !or .arte'/

     !elo que os membros dessas culturas não t"m conceito de arte# Iogo não á arte nessasculturas# % *orma do argumento ) a de um du!lo modus tollens1

     74 $s membros da cultura C t"m um conceito de arte s, se J# 7

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    3/13

    Favies a!resenta mais dois argumentos negativos desta *orma# Um começa !ela !remissa de que os membros de C t"m um conceito de arte s, se acerca de algunsarte*actos !ensam que são des!rovidos de utilidade' que são criados !or um g)nio nãorestringido !elas regras de um o*ício' e que !ro!orcionam um estado de contem!laçãodistanciada# 7uma *ormulação mais directa' os membros da cultura C t"m um conceito

    de arte s, se tiverem um conceito de Belas %rtes#K

     $ segundo argumento !ressu!&e queos membros de C t"m um conceito de arte s, se t"m consci"ncia que !ertencem' eles !r,!rios' a uma cultura D s, se estão cientes de que as suas !ráticas e tradiç&esconstituem uma cultura distinta# Lesumindo' os membros da cultura C t"m um conceitode arte s, se tiverem um conceito de C#M %mbos os argumentos se a0ustam ao moldere!resentado em 7427K# $s membros de algumas culturas não t"m um conceito deBelas %rtes e os membros de algumas culturas não estão cientes que !ertencem' eles

     !r,!rios' a uma cultura distinta# 5m cada um dos casos' não t"m um conceito de arte' !elo que as suas culturas estão isentas de arte#

    5sta *orma de argumentar não ) um arti*ício da a!resentação de Favies# Favid 7ovit( *a( uma bateria de argumentos que se a0ustam ao mesmo !adrão#N 3eguindo uma

    discussão das atitudes dos baule !ara com os seus entales' 7ovit( conclui que as obras.ocu!am uma !osição social muito di*erente da !osição social ocu!ada !elas obras dearte na nossa cultura' e OPQ em virtude disto' descrev"2las como obras de arte seria namelor das i!,teses enganador e na !ior ine-acto#/R Gene Bloc@er ) agn,stico acercade 7< e !ortanto de 7K' mas aceita que se nos de!arássemos com uma cultura cu0osmembros não t"m o conceito de arte' teríamos então de concluir que não t"m arte#S

    Fenis Futton reconstr,i e critica o raciocínio de orientação semelante dasantro!,logas I;nn Hart e 3usan Vogel# Vogel a*irma que .embora a arte baule se0aim!ortante na !ers!ectiva ocidental da arte a*ricana' as !essoas que *i(eram e usaramestes ob0ectos não as concebem como .arte/ OPQ a .arte/ no nosso sentido não e-istenas aldeias baule#/4 3idne; Iittle*ield as*ir dá continuidade a uma discussão sobreentales a*ricanos observando1 .) sobe0amente conecido !ara ser ob0ecto de discussãoque' de uma !ers!ectiva a*ricana' estes ob0ectos não são arte no sentido ocidentalcorrente#/44

    Uma ve( que qualquer versão de argumento negativo ) válida' as res!ostas t"mde visar a verdade de uma ou mais !remissas# %ssim' !odíamos dis!utar as condiç&es de

     !osse do conceito de arte *ormuladas na !remissa maior' ou !odíamos negar a a*irmaçãoem!írica de que os membros de uma dada cultura não satis*a(em essas condiç&es de

     !osse# Como seria de es!erar' os *il,so*os !re*erem a !rimeira abordagem#Favies e Futton demonstram caso a!,s caso que os argumentos negativos

    estabelecem condiç&es irrealistas !ara se ter um conceito de arte# 4

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    4/13

    são boas !erguntas' e a res!osta s mesmas im!lica ter uma e-!licação das condiç&es de !osse do conceito de arte#

    %inda assim' ) im!ressionante que se dei-e intocada a FC# 3e a FC *or *alsa'então não ) s,lido qualquer argumento negativo que cegue conclusão !or via daa*irmação de que os membros de algumas culturas não t"m conceito de arte# 7ão á

    necessidade de dis!utar as condiç&es de !osse do conceito de arte ou os *actosem!íricos acerca do re!ert,rio conce!tual dos membros desta e daquela cultura#Contudo' ningu)m entre os que res!ondem aos argumentos negativos !&e em causa o

     !ressu!osto de que á arte numa cultura s, se os seus membros t"m um conceito dearte#

    # Fa arte .arte/%lguns vão al)m da crítica aos argumentos negativos e argumentam que os

    membros das culturas descritas !elos antro!,logos t"m realmente um conceito de arte#5ste argumento im!lica tamb)m a de!end"ncia conce!tual#

    Futton' !or e-em!lo' dá um argumento !ara mostrar que um conceito de arte *a(

     !arte da erança comum da cultura umana#4 3u!onamos que os entales baule sãoarte# 5ste !ressu!osto será sustentado !or uma teoria da arte D uma *ormulação do que*a( alguns itens serem obras de arte# Futton !ro!&e que as obras de arte são itens quet"m um subcon0unto su*iciente das seguintes características1 evocam !ra(eres sensíveisna e-!eri"ncia' e-!rimem emoção ou sentimento' !ro!orcionam uma atençãoimaginativa intensa' !ertencem a um estilo tradicional ou reagem contra este' são *eitasou e-ecutadas com !erícia' ou simboli(am ou re!resentam# 4K $s entales baule são arte

     !orque t"m todas ou muitas destas características# Uma ve( que não á arte baule amenos que alguns baule tenam um conceito de arte' alguns baule t"m um conceito dearte#

    %rgumentos como este D .argumentos !ositivos/ D cegam tese de quealguns membros de uma dada cultura t"m um conceito de arte !or via da a*irmação deque á arte na sua cultura# %bstraindo do caso dos baule e dos detales da teoria da artede Futton' *icamos com a seguinte *orma argumentativa1>4 Um item' -' ) uma obra de arte se - ) W#> Iogo' á arte em C#FC Há arte em C s, se alguns membros de C t"m um conceito de arte#>K Iogo' alguns membros de C t"m um conceito de arte#

    % *orma dos argumentos !ositivos inverte a dos argumentos negativos' usandoFC como !onto de a!oio# %o !asso que os argumentos !ositivos di*erem entre si no que

    res!eita teoria da arte' os argumentos negativos di*erem entre si no que res!eita scondiç&es de !osse do conceito de arte# %o !asso que os argumentos !ositivos t"m uma !remissa em!írica acerca da e-ist"ncia de arte numa cultura' os argumentos negativost"m uma !remissa em!írica acerca de os membros de uma cultura terem um conceito dearte# 5 ao !asso que os argumentos !ositivos cegam a uma conclusão acerca da !ossedo conceito de arte' os argumentos negativos cegam a uma conclusão acerca dae-ist"ncia de arte#

    Uma ve( que tanto os argumentos !ositivos como os negativos im!licam a FC' o !reço de negar a FC em res!osta aos argumentos negativos ) destruir os argumentos !ositivos# %ssim quem quer que aceite um argumento !ositivo dei-ará intocada a FCnos argumentos negativos#

    K# %rgumentos a *avor da de!end"ncia conce!tual

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    5/13

    $ que motiva a de!end"ncia conce!tual ) bastante ,bvio# 3e esta ) *alsa' então oseguinte ) verdadeiro1 !ara alguma C' á arte em C e nenum membro de C tem umconceito de arte# :as ) di*ícil imaginar uma cultura na qual se *a( arte e no entantoningu)m tem um conceito de arte# Ea(er arte ) uma actividade com!le-a e intricada quenão !odia ser levada a cabo !or algu)m que não tivesse uma conce!ção da actividade#

    Contudo' !ara ver em que redundam estas intuiç&es' ) !reciso um argumento# 5is dois D nenum dos quais ) conclusivo#%s teorias institucionais da arte im!licam a FC# 3egundo tais teorias' um item )

    uma obra de arte s, se contar como arte no conte-to C#4M Fi*erentes teoriasinstitucionais da arte t"m modos di*erentes de e-!licitar C# 3egundo a versão de teoriainstitucional da arte !or George Fic@ie' um item conta como arte s, se *or um arte*acto*eito !or um artista que o !retende a!resentar como arte a um !úblico do mundo da artecu0os membros reconecem que o arte*acto ) a!resentado deste modo#4N Iogo' nada )uma obra de arte a não ser que o seu !rodutor o a!resente como arte' e daqui FC vaium !equeno !asso# %l)m disso' não se trata de uma característica es!ecial da versão deteoria institucional da arte de Fic@ie# Xon 3earle observa que' regra geral' .a atitude

    que tomamos !ara com um *en,meno social ) !arcialmente constitutiva do*en,meno#/4R 3e todos !ararem de acreditar que coisas como as moedas no meu bolsosão dineiro' elas dei-am de ser dineiro# Fe todas as teorias institucionais da artedecorre que a arte ) !arcialmente constituída !or atitudes que envolvem o !r,!rioconceito de arte D embora di*erentes teorias caracteri(em di*erentemente as atitudes#4S

    %ssim' eis um argumento a *avor da FC1 sendo verdadeira uma teoriainstitucional da arte' e sendo que todas as teorias institucionais da arte im!licam a FC' aFC ) verdadeira#

    $ !roblema com este argumento ) que as teorias institucionais da arte sãocontroversas# Uma de*esa da FC que se a!oie em qualquer teoria semelante não ) demomento bestialmente !ersuasiva# :ais im!ortante' nem todos os que sancionam a FCsim!ati(am com as teorias institucionais da arte# Favies )2les moderadamentesim!ático+ Futton não#4 Um argumento melor a *avor da FC a!elaria a!enas a

     !remissas am!lamente aceites#$ segundo argumento e-!lora a ideia de que *a(er arte ) uma actividade

    intencional# Ea(er arte envolve necessariamente uma intenção de *a(er arte' mas não se !ode ter a intenção de *a(er arte a menos que se tena um conceito de arte' !elo quequalquer cultura que tena arte ) uma cultura cu0os membros t"m um conceito de arte#Came2se a isto .argumento a !artir das intenç&es#/

    $ argumento ) válido' mas á ra(ão !ara !ensar que não ) s,lido# % !remissa deque não se !ode ter a intenção de *a(er arte a menos que se tena um conceito de arte

    segue2se do !rincí!io geral !lausível de que não se !ode ter a intenção de *a(er E amenos que se tena um conceito de E# Todavia' á ra(ão !ara duvidar da !remissa deque *a(er arte envolve necessariamente uma intenção de *a(er arte# = certo que *a(er arte ) uma actividade necessariamente intencional# %s obras de arte são arte*actos e osarte*actos são itens *eitos intencionalmente# 7ão obstante' não se segue que são *eitoscom a intenção es!ecí*ica de *a(er arte# >odem ser *eitos com uma intenção di*erente#Um arte*acto !ode ser arte !or acidente# Fe*ina2se .*a(er acidentalmente/ do seguintemodo1

    3 *a( acidentalmente um E s, se 3 tem a intenção de *a(er um G' um E não ) G' 3 não*a( um G' e' ao não *a(er G' 3 *a( um E#

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    6/13

    Tendo a intenção de *a(er um naco de !ão' engano2me e *aço um !isa2!a!)is' ao inv)s#5m ve( de *a(er um não2sei2qu"' engano2me e *aço uma obra de arte# >osso conseguir isto sem ter um conceito de arte#

    5m última análise' isto não im!ugnará o argumento a !artir das intenç&es# = !ouco !rovável que toda a arte numa cultura' se a ouver em ra(oável quantidade' se0a

    *eita !or acidente# Fada uma escola entre a i!,tese de que uma cultura !rodu(milares de obras de arte cada ano a!enas !or acidente' e a i!,tese de que os membrosda cultura t"m a intenção de *a(er arte' a ra(ão leva2nos a aceitar que *oram *eitas com aintenção de *a(er arte# Com!are2se1 os brasileiros !odem !rotestar veementemente que

     !onta!eiam bolas de uma maneira que se con*orma s regras do *utebol a!enas !or acidente A!ois na verdade estão a tentar sambar' mas o *acto de !onta!earem bolasdaquela maneira' a!esar dos seus !rotestos' ) boa ra(ão !ara les atribuir a intenção de

     0ogar *utebol#% !ossibilidade da arte acidental s, mostra que os argumentos !ositivos e

    negativos e-igem uma versão recti*icada da FC#

    FCY Há um *a(er arte generali(ado em C s, se alguns membros de C t"m um conceitode arte#

     7ada im!ede quem a!resenta argumentos !ositivos e negativos de aceitar estatese da de!end"ncia conce!tual' e a arte acidental dei-a intacto o argumento a !artir dasintenç&es !ara FCY# Foravante' revertamos !ara a FC' tendo em mente que a FCY a

     !ode substituir quando necessário#$utro modo de *a(er arte não intencionalmente ) ZdiscernívelZ# Fi(em2nos que

    uma *amosa mistura de salitre' carvão e en-o*re *oi originalmente !rodu(ida !ara *ogos2de2arti*ício e s, mais tarde ada!tada !ara armas de *ogo# 3e esta ist,ria *or correcta' osseus !rodutores originais tinam a intenção de *a(er !,lvora negra mas não !,lvora de*u(il# %o *a(er !,lvora negra' *i(eram !,lvora de *u(il' !ois a !,lvora negra ) !,lvorade *u(il' embora ter a intenção de *a(er !,lvora negra não se0a ter a intenção de *a(er 

     !,lvora de *u(il D ter a intenção de ) um conte-to o!aco# %l)m disso' não *i(eram !,lvora de *u(il acidentalmente D não a *i(eram como !roduto indirecto de seatra!alarem no !rocesso de *a(er !,lvora negra# >ortanto' digamos que *i(eram

     !,lvora de *u(il .incidentalmente/1

    3 *a( um E incidentalmente s, se 3 tem a intenção de *a(er um G' 3 não tem a intençãode *a(er um E' 3 *a( um G' e ao *a(er um G' 3 *a( tamb)m um E#

    6uando um E ) *eito incidentalmente' ) E e G' mas não ) *eito com a intenção de ser umE# Fadas as de*iniç&es de *a(er incidentalmente e acidentalmente' nada *eitoincidentalmente ) *eito acidentalmente#

    % !,lvora negra ) !,lvora de *u(il' mas *a(er as coisas incidentalmente nãoe-ige a identidade# Consideremos uma cultura' os >ella' que *a(em intencionalmente

     0anelas# Como o vidro tem !ro!riedades que o tornam adequado !ara usar em 0anelas eos >ella trabalam o vidro' muitas 0anelas >ella são *eitas de vidro# Uma ve( que as

     !ro!riedades que tornam o vidro bom !ara 0anelas tamb)m o tornam bom !ara es!elos'algumas 0anelas >ella D es!ecialmente as suas 0anelas !ara arrana2c)us D sãoes!elos# % ra(ão não está em os es!elos serem 0anelas mas antes em os es!elos devidro e as 0anelas de vidro terem muitas !ro!riedades em comum# 7ão obstante'

     !odemos estar certos de que os >ella não t"m a intenção de *a(er es!elos' !ois não t"mo conceito de es!elos D não t"m um conceito de es!elos !orque são todos cegos# $s

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    7/13

    >ella não *a(em es!elos acidental nem intencionalmente1 *a(em es!elosincidentalmente#

    % arte tamb)m !ode ser *eita incidentalmente#

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    8/13

    como a bele(a' graciosidade' e elegância+ e-!rimir emoção+ desa*iar o intelecto+comunicar signi*icados com!le-os+ e-!rimir uma !ers!ectiva !essoal+ ser original+ ee-ibir !erícia#

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    9/13

    .aut"ntica'/ ao !asso que aos entales *eitos com a intenção de*a(er %rte no nosso sentido' isto )' *eitos !ara serem a!reciadosunicamente !ela sua a!ar"ncia' se cama .*a@e/ e são redu(idosao estatuto de mero artesanato comercial#/

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    10/13

    re0eição da FC resulta uma abordagem metodol,gica di*erente D uma abordagem quetalve( vala a !ena ado!tar#

    Há tr"s *en,menos que não se deve con*undir# Um ) a arte D itens no mundoque t"m determinadas características' as características constitutivas da arte# $ segundo) o conceito de arte# 3u!onamos que um conceito ) no mínimo uma ca!acidade

    relativamente *iável de reconecer membros de um ti!o e distingui2los dos membros deoutros ti!os# Fada esta descrição mínima dos conceitos' um conceito de arte ) umaca!acidade relativamente *iável de distinguir a arte do que não ) arte# $ terceiro*en,meno' !rocessos de *a(er arte' ) o mediador entre arte e .arte#/ >ara *a(er arte temde se *a(er algo D cortar madeira de um bloco' mover o cor!o ritmicamente' encontrar a metá*ora correcta' colocar algo num certo conte-to' ou *i-ar carta(es que anunciam aabertura de um es!ectáculo#

    Cada um destes *en,menos !ode ser estudado te,rica ou em!iricamente# >ode2se !rocurar uma teoria da arte que identi*ica as características que *a(em qualquer item ser uma obra de arte' ou !ode2se estudar as características que as obras de artee*ectivamente t"m entre os inuit ou os !arisienses do s)culo V999# >ode2se !ro!or uma

    e-!licação do que se0a !ara qualquer conceito ser um conceito de arte' ou !ode2seestudar o conceito de arte e*ectivamente ado!tado !elos baule ou !or *il,so*osegelianos# >or *im' !ode2se *a(er uma caracteri(ação geral do que se0a !ara qualquer 

     !rocesso ser um !rocesso de *a(er arte' ou !ode2se estudar o uso da gra-a !ara.ebani(ar/ esculturas ma@onde setani ou o !a!el do mani*esto do artista na 5scola de

     7ova 9orque#Le0eitar a FC se!ara o estudo da arte e os !rocessos de *a(er arte do estudo dos

    conceitos de arte# % se!aração não signi*ica que os resultados de um estudo não !odemser usados noutro# Um modo !er*eitamente ra(oável de estudar o conceito baule de arte) estudar a arte Baule' e os *actos acerca do conceito baule de arte !odem !or sua ve(assinalar características da arte baule que de outro modo seriam ignoradas# 5is doise-em!los de se!aração#

    $s antro!,logos descrevem os conceitos dis!oníveis numa cultura' e !or ve(es !rocuram descrever o material da cultura segundo uma !ers!ectiva .interna'/ usandoa!enas conceitos dis!oníveis nessa cultura# Fescobrir que conceitos estão dis!oníveisnuma cultura não )' evidentemente' tare*a *ácil# 3e a FC *or *alsa' então não !odemosin*erir que o conceito de arte está dis!onível numa cultura a!enas a !artir do *acto deaver arte nessa cultura# Tem de se a!resentar indícios su!lementares a res!eito dasatitudes que os membros da cultura t"m !ara com os seus arte*actos D e talve( a0a quee-aminar a cultura como um todo# %ssim' ) !ossível uma cultura ter arte emboranenum dos seus membros tena um conceito de arte# = tamb)m !ossível que alguns

    dos seus membros tenam um conceito de arte di*erente do .nosso/ D ou dosso!radores de vidro vene(ianos do s)culo V9' dos assalariados de T,quiocontem!orâneos' ou dos bo)mios !arisienses do s)culo 9# >ela mesma ra(ão' !odesuceder que !artilam um conceito de arte# $ relevante ) que se trata de uma questãoem!írica#

    %qui reside uma vindicação !arcial dos c)!ticos' ou !elo menos das !reocu!aç&es que motivam o ce!ticismo# :uitos raciocinaram sobre o !rincí!io de que.ao camar2les .obras de arte/ sugiro que as !essoas que *a(em e usam estes ob0ectost"m as mesmas atitudes e crenças envolvidas no signi*icado de .obras de arte/ em

     !ortugu"s' ou atitudes semelantes/#

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    11/13

    única reacção# $utra reacção nega o !rincí!io' aceita que os baule t"m arte' mas não queesse *acto determina o conteúdo do re!ert,rio conce!tual dos Baule#

     7egar a FC tamb)m tem e*eitos no estudo da arte# 3e a arte não ) a!enas aquilode que os ocidentais t"m um conceito' então os teori(adores t"m de ir al)m da arteocidental !ara averiguar a nature(a da arte# 7ão !odem !ressu!or que a nature(a da arte

    ) determinada !elo conceito ocidental de arte# %ssim' os estudos antro!ol,gicos da arteem di*erentes culturas são recursos essenciais no desenvolvimento de teorias da arte#Le*ormulando a questão' da FC decorre o relativismo cultural acerca da arte# Feladecorre que' estritamente *alando' não á arte D s, á arte euro!eia' arte aida' arter;u@;u' arte baule' etc# Consequentemente' não se !ode a!render o que ) a arteestudando a arte baule As, se !ode a!render o que ) a arte baule# 3egue2se que se áarte' então o relativismo ) um grave erro metodol,gico#eter Iamarque distingue entre ado!tar !osiç&es internas e e-ternas sobre*en,menos nos estudos transculturais da arte1 .a !ers!ectiva interna ) a do !artici!ante

     !ara quem os *en,menos estão imbuídos de signi*icado+ a !ers!ectiva e-terna ) a doobservador distanciado !ara quem não são senão instâncias de leis sociol,gicas

    gerais#/oderá a!resentar2seum argumento s,lido a *avor da FC# Contudo' negar a FC dá aos c)!ticos o querealmente !retendem ao mesmo tem!o que !reserva a ideia dos não c)!ticos' de que aarte ultra!assa *ronteiras culturais# % ideia ) digna de !reservar se a arte !ode ser umveículo de com!reensão !ara lá dessas *ronteiras# $s c)!ticos t"m ra(ão quanto a nãoocorrer comunicação alguma quando uma cultura !ro0ecta os seus conceitos noutracultura# >ara comunicar sem !ro0ecção !recisamos a!enas de se!arar a arte da .arte#/4

    $riginalmente !ublicado em British ournal of Aesthetics' vol# KR' n#\ 4' #' 4Sress'rimitive Ea@es_ ' _Tourist %rt_' and te 9deolog; o* %utenticit;'/ ournal of 

     Aesthetics and Art &riticism' vol# M< A4K' !!#

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    12/13

    N# Favid 7ovit(' .%rt b; %noter 7ame'/ British ournal of Aesthetics' vol# SA4S' !!# 42rimitive %rt %rt8'/ ournal of Aesthetic (ducation' vol#

    ress' ress' 4M#

    4# 3usan :ullin Vogel' Baule) African Art, estern (%es A7e? Haven' CT1 aleU# >#' 4R' !# S' ver tamb)m !!# 4K24R#

    44# 3;dne; Iittle*ield as*ir' .%*rican %rt and %utenticit;1 % Te-t ?it a3ado?'/ African Arts' vol# aleolitic Cave >ainting1 % Test Case*or Transcultural %estetics'/ in Tomas He;d e Xon CleggAorgs#' Aesthetics and *ock Art  A%ldersot1 %sgate' or 

    e-em!lo' os trilos são arte*actos' embora muitos trilos não se0am *eitos coma intenção de *a(er um trilo D este ) *eito !or !essoas que sim!lesmentetencionam !ercorrer o camino mais curto ao longo de um terreno# Ver %mieTomasson' .%rti*acts and Human Conce!ts'/ em 5ric :argolis e 3te!enIaurence Aorgs#' &reations of the Mind  A$-*ord Universit; >ress' no !relo eListo Hil!inen' .$n %rti*acts and ^or@s o* %rt'/ !heoria' vol# MS A4rimitive Ea@es_'/ !!#

  • 8/18/2019 Arte Sem Arte

    13/13