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  • Armas do Estado do Esprito SantoVer descrio no ndice de Gravuras.

    Infogravura de Giovanni Mesquita com base em cpia de Ronald de Melo

  • Histria do Estado do Esprito santo

  • Estado do Esprito santo

    PAULO CESAR HARTUNG GOMESGOVERNADOR

    RICARDO DE REZENDE FERRAOVICE-GOVERNADOR

    sECrEtaria dE Estado da CULtUra

    DAYSE MARIA OSLEGHER LEMOSSECRETRIA DE ESTADO DA CULTURA

    ANNA LUZIA LEMOS SAITERSUBSECRETRIA DA CULTURA

    CHRISTIANE WIGNERON GIMENESSUBSECRETRIA DE PATRIMNIO CULTURAL

    MAURCIO JOS DA SILVAGERENTE DE AO CULTURAL

    RITA DE CSSIA MAIA E SILVA COSTAGERENTE DO SISTEMA ESTADUAL DE BIBLIOTECAS PBLICAS

    SRGIO BLANKSUBGERENTE DE HUMANIDADES

    arQUiVo pBLiCo do Estado do Esprito santo

    AGOSTINO LAZZARODIRETOR-GERAL

    CILMAR FRANCESCHETTODIRETOR TCNICO

    sECrEtaria dE Estado da EdUCao

    HAROLDO CORRA ROCHASECRETRIO DE ESTADO DA EDUCAO

    ADRIANA SPERANDIOSUBSECRETRIA DE ESTADO DA EDUCAO BSICA E PROFISSIONAL

  • JOS TEIXEIRA DE OLIVEIRA

    HISTRIA

    DO

    ESTADO DO ESPRITO SANTO

    3 EDIO

    SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA

    SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAO

    ARQUIVO PBLICO DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    VOLUME 8

    VITRIA

    2008

  • OLIVEIRA, JOS TEIXEIRA DE.

    O48H HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO / JOS TEIXEIRA DE OLIVEIRA.

    3 ED. - VITRIA: ARQUIVO PBLICO DO ESTADO DO ESPRITO SANTO: SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA, 2008.

    670 P. : IL. (COLEO CANA, V. 8)

    ISBN 978-85-98928-04-3

    1. ESPRITO SANTO (CAPITANIA) HISTRIA. 2. ESPRITO SANTO (PROVNCIA) HISTRIA. 3. ESPRITO SANTO (ESTADO) HISTRIA. I. TTULO.

    CDD: 981.52

    FiCHa tCniCa

    FERNANDO ANTNIO DE MORAES ACHIAMCOORDENAO EDITORIAL

    REINALDO SANTOS NEVESREVISO E ATUALIZAO DO TEXTO

    GIOVANNI MESQUITA E STEPHANIE LOSS CASOTTIPROJETO GRFICO, EDITORAO, CAPA E ARTE FINAL

    LUIZ GUILHERME SANTOS NEVESINTRODUO

    JOO EURPEDES FRANKLIN LEALPOSFCIO

    BETO FELCIO, GILDO LOYOLA, GIOVANNI MESQUITA E HUMBERTO CAPAIFOTOS

    SRGIO CARDOSOFOTO DA CAPA

    FiCHa CataLogrFiCa

    oBra Editada pELo goVErno do Estado do Esprito santo

    VEnda proiBida

  • Jos tEixEira dE oLiVEira

    Nasceu em Santa Brbara, Minas Gerais, a 8 de janeiro de 1913, filho de Jos Martins de Oliveira e de Firmiana Teixeira de Oliveira. Estudou o curso ginasial interno em Muria, onde tambm trabalhou como secretrio. Em 1935, muda-se para o Rio de Janeiro, onde mais tarde ingressou na Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro), colando grau em 16 de outubro de 1946.

    Trabalhou no jornal A Noite (1935), no Departamento Nacional do Caf DNC (1936), e foi admitido em 23 de maro de 1948 no Tribunal Federal de Recursos, instituio pela qual se aposentou. Era casado com Stella Fontoura Teixeira de Oliveira e faleceu no Rio de Janeiro em 16 de novembro de 2004.

  • VIII | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    oBras pUBLiCadas

    Vida maravilhosa e burlesca do caf.

    1 ed. Pongetti, Rio de Janeiro, 1942.

    2 ed. Editora Americana, Rio de Janeiro, 1942.

    Dicionrio brasileiro de datas histricas.

    1 ed. Pan-Americana. (Epasa), Rio de Janeiro, 1944.

    2 ed. Pongetti, Rio de Janeiro, 1950. 3 ed. Belo Horizonte, 1992. 4 ed. Vozes, Petrpolis, 2002.

    Vida maravillosa y burlesca del caf.

    1 ed. Orientacin Integral Humana, Buenos Aires, 1945.

    Vidas brasileiras.

    1 srie, Pongetti, Rio de Janeiro, 1945.

    Histria do Estado do Esprito Santo.

    1 ed. Comemorativa do 4 Centenrio da Fundao de Vitria, Rio de Janeiro, 1951.

    2 ed. Fundao Cultural do Esprito Santo, Vitria, 1975.

    O governo Dutra (organizador).

    Civilizao Brasileira, Rio de Janeiro, 1956.

    Histria do caf no Brasil e no mundo.

    1 ed. Kosmos, Rio de Janeiro, 1984.

    2 ed. Barlu, Rio de Janeiro, 2004.

    A fascinante histria do livro.

    Vol. I, 1 ed. Rio de Janeiro, 1984.

    2 ed. Livraria Editora, Rio de Janeiro, 1995;

    Vol. II Livraria Editora, Rio de Janeiro, 1985;

    Vol. III, Kosmos, Rio de Janeiro, 1987; Vol. IV, Kosmos, Rio de Janeiro, 1989.

  • Sempre acentuamos as nossas incertezas, e juntamos as fontes, no com intenes de alardear erudio, mas para

    o leitor tornar-se independente do compilador.

    J. F. de Almeida Prado, Primeiros povoadores do Brasil, 2 edio, p. 6.

  • A

    Jos Pereira Lira

    e

    Mrio de Ururahy Macedo

  • ndiCE gEraL

    Histria do Estado do Esprito Santo: um clssico Paulo Hartung ..................................... XIX

    Vitalidade e permanncia na historiografia capixaba Luiz Guilherme Santos Neves .... XXI

    Nota 3 edio Fernando Antnio de Moraes Achiam .......................................... XXXV

    Este livro .......................................................................................................................XXXIX

    Abreviaturas ......................................................................................................................XLIII

    Introduo

    I De Ceuta a Porto Seguro ..............................................................................................................1

    II ndias, franceses e donatrios........................................................................................................7

    Carta de doao da capitania ...................................................................................................16

    CAPTULO I

    Vasco Fernandes Coutinho e o presente que el-rei lhe deu ................................................................. 23

    Carta de doao Limites da capitania Superfcie Foral Preparativos de viagem do donatrio Quem era Vasco Fernandes Coutinho Sua famlia Folha de servios militares Haveres e propriedades territoriais Casamento Descendncia Outras propriedades Vasco Coutinho e a capitania Primeiros sacrifcios do donatrio: a venda das propriedades Os pioneiros Alguns nomes Nmero Partida do Tejo

    Carta de foral da capitania .............................................................................................................. 32

  • CAPTULO II

    Os pioneiros iniciam a obra ...............................................................................................................37

    Chegada e recepo Batismo da terra Primeiras construes Casas para morar e para rezar Diviso das terras Alguns aquinhoados Instalao dos servios da Coroa Duas grandes tarefas: cultivar a terra e conquistar o corao do ncola Exigncias e deficincias Duarte de Lemos, homem providencial Em retribuio, uma ilha Os homens atravs dos documentos O donatrio em Lisboa Duarte de Lemos volta ao Brasil

    CAPTULO III

    Trabalho, sangue e runas ..................................................................................................................47

    Expanso da f, povoamento do solo A grande obcecao Em busca das minas Perlustrando a costa Limites com a capitania de S. Tom Detalhe sui generis das doaes Vasco Coutinho e Pero de Gis Empresa difcil, homens de fibra Em busca de recursos Em Lisboa, na rua do Baro de Alvito Regresso do donatrio D. Jorge de Menezes frente da capitania Colonos, gente sem lei Fatores do descalabro Produo de acar Primeiro carregamento ndios x brancos Carnificina Sombras e runas

    CAPTULO IV

    A fundao de Vitria Outros sucessos ..........................................................................................61

    Vasco Coutinho testa do governo Auxlio a Pero de Gis Jesutas no Esprito Santo Situao scio-religiosa da capitania Fundao de Vitria Tom de Souza e o Esprito Santo Coordenando a administrao colonial Bahia, armazm do Brasil Comrcio direto com Portugal Coutinho ausenta-se novamente Delao de Duarte de Lemos e outras cartas Crise Armando os engenhos Vasco Coutinho volta ao Brasil Ainda a carta de Duarte de Lemos O donatrio visto pelo governador Duarte da Costa

    CAPTULO V

    Os jesutas instalam-se no Esprito Santo...........................................................................................77

    Nova e poderosa fora: os jesutas Doutrinao de brancos e ndios Exceo honrosa Franceses na costa Tom de Souza visita a capitania O Colgio dos jesutas Outras obras Duarte de Lemos reaparece ainda uma vez Confraria contra a maledicncia Nova investida contra o senhorio Grandezas e pobrezas Vasco Coutinho de novo na terra Maracaiaguau Novas insurreies dos ncolas Prata, ouro e certas pedras ndios semeiam o terror Auxlio da Bahia Ferno de S Matana de ambas as partes

  • CAPTULO VI

    Morte do fundador ............................................................................................................................ 93

    Pessimismo de Mem de S Sede do governo do sul? Coutinho viaja para Portugal Inacianos trabalham sempre Franceses no porto Maracaiaguau e a colaborao de sua gente Pedro Palcios, o So Francisco de Assis do Brasil Frana Antrtica Mem de S volta a falar do Esprito Santo Belchior de Azeredo feito capito Opinam os jesutas Morte do fundador Traos de sua personalidade Providncias do governador geral quanto direo da capitania Os franceses atacam Notcias sobre os primeiros artesos

    CAPTULO VII

    Araribia, Cavendish e Anchieta .................................................................................................... 109

    O segundo donatrio Auxlio a Estcio de S Araribia Detalhes da administrao do segundo Vasco Novos engenhos Comrcio com a metrpole Progresso Depoimentos de Anchieta Tourinho, Adorno, metais e pedras preciosas O Esprito Santo na administrao do sul Os loiolistas, fatores de progresso Descimento de ndios Nova arremetida dos franceses Tambm os ingleses experimentam Morre o segundo donatrio Cavendish A capitania passa a outras mos Morte do Apstolo do Brasil D. Francisco de Souza experimenta as minas capixabas Balano das realizaes A Misericrdia 65 anos aps o desembarque

    CAPTULO VIII

    Batendo repetidamente os flamengos............................................................................................... 129

    Primeiro mapa Jesutas e ndios Cabo Frio Oramento, holandeses e escravos Enfrentando e derrotando os flamengos Maria Ortiz Jesutas-bandeirantes Outra vez os holandeses O destacamento de infantaria Descaminho no dinheyro Privilgios da infantaria Crimes e contrabando

    CAPTULO IX

    Dias aziagos .....................................................................................................................................149

    Um caldeireiro, a paz de Holanda e o dote da infanta Tempestade que a fora amainou Tentando o eldorado Administradores incompetentes e subservientes Mau governo, finanas pssimas Estrada Esprito Santo-Bahia Os inacianos Suas grandes propriedades territoriais

  • CAPTULO X

    Esmeraldas! Ouro ............................................................................................................................161

    Deficincia da administrao dos capites-mores Angustiosa conjuntura Um capito-mor operoso Esmeraldas! Esmeraldas! Vende-se a capitania por 40.000 cruzados Principais realizaes de Francisco Gil de Arajo Comrcio e agricultura Limites O donatrio deixa a capitania Novo donatrio A psicose das minas Ouro! Ouro! Febre amarela, piratas, jesutas

    CAPTULO XI

    Capitania da Coroa ........................................................................................................................183

    As minas e o territrio capixaba Tentativas oficiais Governadores em litgio Estradas e aventureiros Retalhos de uma administrao Um donatrio displicente Um bacharel formado Flagrantes da capitania Discrdias Ainda o caminho das minas Franceses no Rio de Janeiro Capitania da Coroa Grandes e pequenos problemas administrativos Empecilhos penetrao territorial Judicirio, eclesistico, militar Impostos Vida social Construindo fortificaes Recenseamento Cousas da administrao colonial Minerao e mineradores Mimoso e a criao da ouvidoria

    CAPTULO XII

    A expulso dos jesutas .....................................................................................................................211

    Incria da administrao Penria do pas Estende-se a jurisdio da ouvidoria Revolta dos ndios de Iriritiba Minas do Castelo O soldado Santo Antnio Rendas e despesas da capitania Novas vilas A expulso dos jesutas Prejuzos sofridos pela catequese e ensino Aumenta o efetivo militar Dados sobre a populao e comrcio Invaso das minas do Castelo Ensino pblico Censo Recrutamento Correios, ndios e negros Bandeirantes esquecidos Populao Ms autoridades Novas unidades militares Censo Comrcio e indstria Exrcito de papel

    CAPTULO XIII

    Intermezzo........................................................................................................................................247

    Perspectivas animadoras O territrio Diviso administrativa Populao Governo Justia Religio O ensino Agricultura, indstria e comrcio

  • CAPTULO XIV

    O Esprito Santo liberta-se do governo da Bahia ............................................................................. 259

    Providncia revolucionria Demarcao de limites com Minas Gerais Fisco e comrcio Tentando o povoamento das margens do rio Doce Agricultura, comrcio e um governante honrado A Coroa e os ndios Acusaes contra Silva Pontes Novo governador Ainda o rio Doce e as minas do Castelo O Esprito Santo liberta-se do governo da Bahia A capitania em 1811 Rubim e a passagem terrestre para Minas Gerais Os aorianos Favores fiscais Mandioca, trigo, linho e sericicultura Caf, assistncia hospitalar, ensino, etc. Maximiliano, Saint-Hilaire e Rubim

    CAPTULO XV

    Antes e depois da Independncia ....................................................................................................295

    Prdromos da Independncia nacional Motins e desatinos Primeiros representantes da capitania em congressos eletivos Penria dos cofres pblicos A Junta do Governo Provisrio Novas agitaes Independncia ou morte! S. Mateus adere ao movimento emancipador Caravelas Quadros desalentadores O recrutamento do Ururau Os indivisos A diviso da propriedade territorial Agricultura Pecuria Comrcio Indstrias Construo naval Artes e ofcios Meios de conduo Estradas e canais Igrejas Conventos e edifcios pblicos As casas Iluminao das ruas Assistncia social Populao Padres, cirurgies, rbulas, etc. Governana e militana A Justia e a Igreja Rendas Despesas Dvidas O ensino

    CAPTULO XVI

    Duas tribunas populares: A Assemblia Provincial e o jornal ......................................................... 339

    A estrada Vitria-Ouro Preto ndios Colonos alemes A ordem pblica Repulsa s idias de restaurao A primeira Assemblia Provincial Entre 1830 e 1840 O primeiro jornal Coroao de D. Pedro II A insurreio do Queimado O incio de uma nova era

    CAPTULO XVII

    A visita imperial e a Guerra do Paraguai ....................................................................................... 365

    Governos melanclicos A febre amarela Varola, clera, fome Outras doenas Abolio do trfico Populao Colonizao Agricultura, indstria, comrcio e navegao Ensino Primeira biblioteca pblica Guarda Nacional Visita imperial Sedio de Pima Questo Christie Guerra do Paraguai Telgrafos e correios Iluminao Farol da Barra de Vitria Flagelados do Cear Ameaa de clera Colonizao Populao Vias de comunicaes

  • CAPTULO XVIII

    O 13 de maio e o 15 de novembro........................................................... ............................. ..........407

    Abolio da escravatura A Repblica Diviso administrativa, populao e justia Igreja e representao parlamentar Administrao e servios pblicos Principais rgos administrativos Oramento e ensino Bibliotecas pblicas e jornais Vida associativa Indstrias e profisses Comrcio e corpo consular Agricultura O caf e a sua nobreza

    CAPTULO XIX

    A Repblica at 1947 ..................................................................................................................... 427

    Diretrizes republicanas Governo Afonso Cludio Partidos polticos Constituio Golpe de Estado de 3-11-1891 Junta Governativa Nova Constituio Primeiro governo Muniz Freire 1896-1900 O Esprito Santo em 1900 Crise do caf e poltica Quadrinio Jernimo Monteiro Primeira greve operria Reforma da Constituio Lutas polticas Estradas Caf Primeira Guerra Mundial Interveno federal Censo de 1920 Governo Florentino Avidos A Revoluo de 30 1930-1943 Censo de 1940 Nova Constituio do Estado

    CAPTULO XX

    Arrancada para o futuro ..........................................................................................................473

    Partindo para novos destinos Primeiro governo Lindenberg 1951-1954 A soluo do caso Mantena A Revoluo chega ao Esprito Santo A eloqncia dos algarismos Governo Arthur Gerhardt

    Histria do Esprito Santo: uma reflexo, um caminho Joo Eurpedes Franklin Leal ............503

    Relaes de governantes do perodo colonial .....................................................................535

    Governantes do Esprito Santo desde novembro de 1823 at o presente...........................542

    Bibliografia ...........................................................................................................................549

    ndice de gravuras ................................................................................................................565

    ndice remissivo ...................................................................................................................577

    Clofon ................................................................................................................................669

  • HISTRIA DO ESTADO

    DO ESPRITO SANTO: UM CLSSICO

    Alguns livros tm a vocao para se tornarem clssicos. Este o caso da Histria do Estado do Esprito Santo, de Jos Teixeira de Oliveira.

    De carter singular em sua categoria, este livro foi lanado em 1951, no governo de Jones dos Santos Neves. Em 1974, o ento governador Arthur Carlos Gerhardt Santos decidiu-se pela segunda edio, revista e ampliada pelo prprio autor. Neste 2008, a obra ganha a sua terceira edio, enriquecida com Apresentao de Luiz Guilherme Santos Neves e Posfcio de Joo Eurpedes Franklin Leal.

    O livro de Jos Teixeira de Oliveira tornou-se um clssico da nossa histria pela monumental pesquisa de que resulta, pela fenomenal reunio de informaes e dados de nossa trajetria e tambm pela riqueza de referncias a outras obras que se dedicam ao mesmo assunto. Tratando-se de histria capixaba, o adjetivo enciclopdico cabe-lhe com inconteste justia.

    Alm de tratar-se de um clssico, o que por si s j seria motivo maior para este lanamento, fixa-se aqui uma outra razo ao empreendimento desta terceira edio. A conscincia de nossa caminhada de quase cinco sculos de colonizao multicultural enriquece a identidade capixaba. O exerccio de nossa memria s tem a nos fortalecer no incio de uma nova era histrica em que muitos desafios e oportunidades se colocam no presente e no horizonte prximo.

    Motiva-nos de modo especial a constituio de bases slidas para o exerccio de nossa memria neste momento em que o Esprito Santo avana em seu terceiro ciclo histrico, com uma prtica poltico-administrativa renovada pela devoo incondicional tica republicana e com um paradigma econmico transformado pelo petrleo e gs e pela ampliao do agronegcio e da indstria exportadora.

  • XX | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Conscientes do que fomos, de nossos pontos fortes e fracos, de nossas aptides e dons, seremos, cada vez mais, capixabas fortes, com ampliado potencial de vitria. Ou seja, a conscincia de nossa trajetria histrica s tem a contribuir com o nosso futuro.

    Um futuro que trabalhamos e lutamos no presente para que seja de igualdade de oportunidades a todos os capixabas, a partir de um novo modelo de desenvolvimento, socialmente inclusivo, ambientalmente sustentvel e geograficamente desconcentrado.

    De forma bastante evidente, o lanamento desta terceira edio da Histria do Estado do Esprito Santo vai ao encontro deste propsito maior de nossa ao poltico-governamental. Ao democratizar o acesso a uma obra to singular e fundamental, estamos possibilitando aos capixabas o acesso a uma das mais importantes ferramentas para se construir o futuro mais justo e igualitrio, qual seja, a nossa memria histrica.

    PAULO HARTUNG

    Governador do Estado do Esprito Santo

  • VitaLidadE E pErmannCia

    na HistoriograFia CapixaBa

    Saibam os que a presente apresentao lerem que no se trata de um texto de cunho acadmico nem de crtica histrica. O seu objetivo tecer apreciaes sobre um livro que ocupa lugar essencial na historiografia capixaba, desde que foi publicado em 1951. da que partiremos. E resgatar a conjuntura histrica em que se deu a publicao da Histria do Estado do Esprito Santo, de Jos Teixeira de Oliveira, parece-me o ponto de partida para compreender a importncia de uma obra que ressurge em terceira edio sob os auspcios do Governo do Estado, como ocorreu nas duas vezes anteriores.

    Na metade do sculo XX, o Esprito Santo era um estado essencialmente agrcola, com economia vinculada monocultura do caf. A maior parte da sua populao vivia no meio rural, sendo difcil e demorado o acesso a Vitria, em virtude da falta de transporte regular e de razoveis estradas de rodagem.

    A capital do Estado, que se encontrava a bons passos de distncia da brutal transformao urbana por que passaria nas dcadas seguintes, comeava a consolidar o seu perfil de cidade porturia graas exportao de caf, madeira e minrio de ferro. No seu modo de vida, porm, teimava em ser um pacato burgo provinciano cuja populao rodava pelos 50.000 habitantes, em nmero bruto.

    Bairros principais da cidade, alm do centro histrico denominado Cidade Alta, eram o Parque Moscoso, Vila Rubim, Caratora, Santo Antnio, Jucutuquara, Praia do Su, Praia de Santa Helena e Praia Comprida (no se falava em Praia do Canto). A regio de Marupe preservava suas caractersticas de fazendo rural e a ponte da Passagem fazia a ligao com o norte do Estado, pela qual se ia tambm a uma Camburi desabitada e de mata na praia. O aeroporto de Goiabeiras estava mais para um campo de pouso de avies do que para aeroporto. Sobre a baa de Vitria, as Cinco Pontes, grudadas ilha do Prncipe, eram o meio de contato direto com o continente e pairavam acima de qualquer suspeita de que um dia se tornariam quase obsoletas e desprezadas.

  • XXII | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    O lado setentrional da ilha Capital, cortado pela estrada do contorno, de terra batida, era vazio de gente e habitaes exceo da ilha das Caieiras, tradicional reduto de pescadores, siris e caranguejos (as desfiadeiras de siris no tinham alcanado a celebridade de que desfrutam atualmente).

    As atividades comerciais em Vitria realizavam-se notoriamente no centro da cidade, revestindo-se a expresso centro de significado comercial, determinando um espao fsico que ia do Parque Moscoso praa Costa Pereira. As indstrias do Estado, em sua maioria de pequeno e mdio porte, escreviam, sem pressa, um captulo modesto no desenvolvimento industrial capixaba.

    No havia livrarias em Vitria. Em seu lugar existiam papelarias e tipografias onde, em balces discretos, podiam ser encontrados, meio que ao acaso, livros de literatura de autores nacionais e estrangeiros, ou obras de histria e outros assuntos. Livros tcnicos e especializados encomendavam-se fora do Estado. Sobre histria do Esprito Santo, nem pensar em consegui-los eram espcimes raros, domiciliados em bibliotecas particulares e, ocasionalmente, na Biblioteca Pblica Estadual.

    Dois educandrios (termo da poca) ministravam o ensino pblico de nvel mdio, o Colgio Estadual do Esprito Santo e a Escola Normal, esta uma usina formadora de professoras primrias, profisso da preferncia da mulher capixaba por falta de outras opes. Numa outra ponta, a Escola Tcnica Federal, com reduzido elenco de cursos profissionalizantes, preparava tcnicos para um mercado de trabalho que ainda no se sofisticara. Com os colgios pblicos competiam os particulares: o So Vicente de Paulo, o Americano, o Salesiano, o Carmo e o Sacr Coeur de Marie, os dois ltimos para moas. No ensino superior, apenas dois cursos eram oferecidos em Vitria, pelas faculdades isoladas de Direito e de Odontologia. Para estudar medicina ou engenharia, os jovens capixabas tinham que ir, normalmente, para o Rio de Janeiro.

    O meio de transporte mais utilizado pela populao da capital era o bonde, que cobria a distncia entre Santo Antnio e a Praia Comprida com funcionamento satisfatrio.

    No campo cultural, alm do Instituto Histrico e Geogrfico do Esprito Santo, que j editava sua revista, embora sem a regularidade desejada, a Academia Esprito-Santense de Letras e a Academia Feminina de Letras reuniam a chamada intelectualidade da terra. Era pelas pginas da Vida Capichaba e dos jornais A Gazeta e A Tribuna que os intelectuais (o termo

  • XXIII

    tinha emprego usual e certo vezo pejorativo) davam vazo s suas publicaes, inclusive sobre a histria do Estado. A Vida Capichaba, por exemplo, foi o veculo no qual o historiador Mrio Aristides Freire divulgou, inicialmente, os textos que deram origem sua obra A capitania do Esprito Santo, editada em 1945 na oficina da prpria revista.

    Bibliotecas pblicas, com acervos que deixavam a desejar a estadual e a municipal exibiam prateleiras desfalcadas para leitores curiosos, e o Museu Capixaba, hoje museu Solar Monjardim, fundado em Jucutuquara, em 1939, num velho casaro colonial, no adquirira nem envergadura nem funo efetiva de museu. E, j que falamos em Jucutuquara, que no nos fuja a deixa porque foi nesse bairro (ento cortado por um valo de esgoto a cu aberto) que, graas ao Cine Trianon ali instalado, os olhos do capixaba (e seu corao e sua mente) entraram em direto contato com a gerao dos Cahiers du Cinma e o neo-realismo do cinema italiano, libertando-se dos esteretipos hollywoodianos dos filmes exibidos no Cine Teatro Glria e no Carlos Gomes.

    Mas, se havia cinemas, no havia editoras em Vitria. Os livros dos escritores capixabas tinham que ser impressos fora do Estado, geralmente no Rio de Janeiro, ou, quando muito, nas oficinas grficas do Dirio Oficial do Estado ou na Escola Tcnica, em Jucutuquara, tendo os seus autores de bancar o custo da edio e quase sempre se aborrecer com a qualidade da impresso grfica.

    Foi dentro desse cenrio singelo que surgiu a histria de Jos Teixeira de Oliveira, em edio comemorativa do 4 centenrio da cidade de Vitria. Sua impresso (como depois a da 2 edio) ficou a cargo do IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica, sediado no Rio de Janeiro, confirmando o que dissemos sobre a edio de obras fora do Esprito Santo.

    *

    Pelo quadro antes exposto, do qual dou cincia porque o vivi pessoalmente, pode-se afirmar que o livro de Jos Teixeira no veio com o intuito de desbancar qualquer outra histria sobre o Esprito Santo. Isso porque no havia nenhuma histria, no sentido de narrativa sistematizada e orgnica dos fatos (historia rerum gestarum), atualizada at a metade do sculo XX, a ser desbancada. A obra veio, na verdade, para suprir uma grande lacuna na minguada bibliografia histrica

  • XXIV | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    do Esprito Santo, onde a falta de uma histria geral do Estado, consistente e confivel, fazia-se sentir a toda hora.

    Tanto que, antes de Teixeira de Oliveira, a narrativa histrica mais completa e clssica sobre o Estado, abarcando o perodo colonial at uma determinada fase provincial, onde terminava, era, em nossa opinio, a Provncia do Esprito Santo. Sua descoberta, histria, cronologia, sinopse e estatstica, de Baslio Carvalho Daemon, publicada em 1879, pela Tipografia do Esprito-Santense, em Vitria.

    A obra narra os acontecimentos histricos (res gestas) em cronologia linear, sendo tipicamente um relatrio de efemrides que peca pela falta de citao das fontes que o autor consultou. Um estilo de fazer histria bem ao jeito do sculo XIX, em que a Provncia foi escrita.

    Afora Daemon, e j no sculo XX, de se mencionar Mrio Aristides Freire, historiador competente e pesquisador criterioso, autor de A capitania do Esprito Santo, na qual tratou da fase colonial da nossa histria. Mas Mrio Freire publicou seu livro a partir de artigos que escreveu para a revista Vida Capichaba, fato antes referido, o que comprometeu o carter inteirio da sua narrativa.

    No foram apenas essas as publicaes que precederam a de Jos Teixeira de Oliveira. Houve outras, versando com predominncia aspectos factuais e singulares do nosso passado, ora encarados pelo prisma ufanista, ora pelo vis da exemplaridade e do magistrio de vida, segundo velho e cedio figurino historiogrfico.

    Tratava-se, no se pode negar, de um modelo de escritura da histria compatvel com uma poca em que a produo de obras histricas derivava, muitas vezes, de impulsos diletantes dos seus autores voltados para a redeno de um passado que se queria belo e edificante, e que era encarado sentimentalmente.

    E nem podia ser diferente o tratamento dado histria em nosso Estado e do nosso Estado uma vez que ainda no se havia estabelecido entre ns um pensamento acadmico e crtico ligado pesquisa e elaborao do conhecimento histrico em moldes analticos e interpretativos.

    Para acentuar o quadro conjuntural que estamos resumindo, basta lembrar que a primeira edio da obra de Jos Teixeira de Oliveira foi contempornea da fundao da Universidade do Esprito Santo, no governo Jones dos Santos Neves, a partir de quando se instituiu no Estado a Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras, inaugurando o curso de Histria que, no decorrer do tempo,

  • XXV

    tornar-se-ia operosa clula na construo do conhecimento histrico com fundamentao terico-metodolgica.

    Destarte, fica explicado, em funo das condicionantes culturais antes recordadas, o processo de elaborao e publicao das obras sobre histria do Esprito Santo at meados do sculo XX.

    Temos assim que a Histria do Estado do Esprito Santo, de Jos Teixeira de Oliveira, dispunha, ao vir luz em meados do sculo passado, de um nicho espaoso para reinar sem concorrncia na historiografia capixaba. Um reinado que, pela sua vitalidade e permanncia, pede explicao.

    *

    Poucos foram os historiadores que se abalanaram proeza de escrever narrativas histricas sobre o Esprito Santo, nos quase cinqenta e cinco anos seguintes edio da obra de Jos Teixeira. Talvez por respeitarem a dimenso do desafio que tinham pela frente, talvez por entenderem, como o autor desta introduo, que um livro sobre a histria do Esprito Santo, para se pretender abrangente e completo, deve ficar a cargo de uma equipe que congregue especialistas de diferentes reas de conhecimento trabalhando sob uma coordenao geral. Algo no modelo da Histria geral da civilizao brasileira, coordenada inicialmente por Srgio Buarque de Holanda, e publicada, em vrios volumes, pela Difuso Europia do Livro, a partir de 1960.

    Apesar disso, pelo menos dois autores publicaram relatos histricos que se tornaram obras de referncia em nosso meio cultural, embora com caractersticas, metodologia e objetivos diferentes da histria de Teixeira de Oliveira. Os autores so Luiz Derenzi e Maria Stella de Novaes, com Biografia de uma ilha e Histria do Esprito Santo, respectivamente. Mas, pelo simples fato de fazer de Vitria o ncleo irradiante de sua narrativa, Derenzi coloca-se a razovel distncia de Teixeira de Oliveira. Por seu turno, Maria Stella de Novaes, consagrada historiadora do Estado, preferiu formatar a sua Histria do Esprito Santo seguindo o esquema do seriado cronolgico em que se inspirara Daemon, com a diferena de ter Dona Stellinha, como era chamada, construdo uma narrativa em estilo coloquial que resultou numa movimentada crnica historiogrfica desde a doao da capitania a Vasco Coutinho at 1967.

  • XXVI | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Longe andaram, portanto, os dois autores de ameaar, com suas obras, a primazia desfrutada pelo livro de Jos Teixeira, do qual se pode dizer que bsico e indispensvel para se conhecer a histria do Esprito Santo.

    E penso que no erro na qualificao porque no estou afirmando que se trata de obra definitiva e completa, visto que no . Ento, entenda-se a conceituao indicada como definidora de uma obra que, pela riqueza de informaes e pela variedade documental que apresenta, torna-se de consulta obrigatria para o conhecimento do nosso passado e para qualquer trabalho ou estudo sobre o Esprito Santo.

    Dou a esse respeito um testemunho pessoal. O mestre e historiador Renato Pacheco, notvel conhecedor e estudioso da cultura capixaba, jamais deixava de transitar pela histria de Jos Teixeira de Oliveira, da qual escreveu que ainda hoje a mais completa histria narrativa sobre o Estado (in A cultura capixaba, IHGES, Vitria, 2004), sempre que tinha de levantar dados, informaes e referncias sobre os temas que iria versar sobre o Esprito Santo.

    A obra de Teixeira de Oliveira servia, pois, para Renato Pacheco, tanto quanto tem servido para inmeros outros pesquisadores, como verdadeira tramontana uma espcie de histria-guia de consulta indispensvel e obrigatria. Donde se pode chegar ao seguinte enunciado propedutico: quando o assunto histria do Esprito Santo visite-se primeiro o livro de Teixeira de Oliveira nem que seja para se verificar o que ele no informa sobre o nosso passado histrico.

    *

    de ressaltar que as duas edies do livro, com quase vinte e cinco anos de diferena entre si, estiveram associadas iniciativa de diferentes governos do Estado. Antes de 1951, ano em que saiu a primeira edio na administrao Jones dos Santos Neves, os entendimentos comearam durante o governo anterior de Carlos Lindenberg; a segunda edio, lanada pela Fundao Cultural do Esprito Santo no governo lcio lvares, decorreu de apoio recebido pelo seu autor na administrao de Arthur Carlos Gerhardt Santos. A 3 edio se faz, agora, com o governador Paulo Hartung.

  • XXVII

    Essa repetio de patrocnio governamental contribuiu para conferir obra de Oliveira uma conotao de histria oficial do Estado. O prprio Jos Teixeira ajudou a convalescer tal impresso devido ao tom diplomtico com que apresentou a parte poltica de sua histria, relativa aos tempos menos antigos da Repblica no Esprito Santo.

    O captulo XX, o ltimo do livro, acrescentado 2 edio, que versa o momento histrico de 1947 a 1975, no esconde, desde o ttulo triunfal de Arrancada para o futuro, o arranjo estratgico e o engajamento poltico com que se houve o autor na sua redao, evitando ferir suscetibilidades de possveis atores da histria ento ainda vivos e passando ao largo das questes scio-econmicas emergentes na poca.

    claro que, no fosse o apoio oficial dado obra, talvez dificilmente os seus originais tivessem sado da penumbra da gaveta onde estavam enfurnados depois que no foi adiante o projeto em que coube a Jos Teixeira escrever sobre o Esprito Santo, na coleo sobre a histria geral do Brasil, coordenada pelos historiadores Afonso dEscragnolle Taunay e Rodolfo Garcia. Esta particularidade explica tambm por que a obra de Oliveira, que estava pronta para ser editada quando a oportunidade surgiu, no exibe documentos de arquivo por ele levantados e pesquisados diretamente no Estado. Cumpre recordar que foi somente na dcada de 1970 que Teixeira de Oliveira veio ao Esprito Santo pela primeira vez, quando manteve um rpido contato com uma pequena poro do espao geogrfico que serviu de base para a sua histria a cidade de Vitria.

    Mas, se o autor escreveu seu livro longe do Esprito Santo, desfrutou em compensao do acesso fcil a inmeros documentos e publicaes localizadas em rgos da ento capital federal, onde residia, tais como o Arquivo Nacional, a Biblioteca Nacional, o Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro, o Servio do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, o Ministrio das Relaes Exteriores e o Servio Geogrfico do Exrcito. Alguns desses documentos, inclusive mapas e pranchas ilustradas, foram divulgados em primeira mo nas pginas da Histria do Estado do Esprito Santo, numa iniciativa ento rara em relao s obras do gnero, o que s valorizou o livro publicado. Na apresentao que fez para a 2 edio, escreveu a propsito Jos Teixeira: Alm da reviso de todo o texto [da 1 edio], pudemos acrescentar numerosas notas a todos os captulos da Histria do Estado do Esprito Santo, dar nova dimenso ao ndice remissivo e enriquecer o volume com alguns mapas de valor excepcional.

  • XXVIII | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Alm disso, residindo no Rio de Janeiro, Teixeira de Oliveira pde contar com a preciosa colaborao de vrios historiadores que l tambm residiam, e que atuaram como verdadeiros consultores na produo da sua histria. A eles o autor agradeceu com citao nominal no Clofon da 1 edio, destacando, em especial, as contribuies que lhe deram Alberto Lamego e Mrio Aristides Freire, pesquisadores da histria do Esprito Santo. A este ltimo, Teixeira qualifica de autoridade maior em histria esprito-santense, declarando que dele obteve assistncia permanente nas dificuldades encontradas, alm de acesso facilitado ao seu magnfico arquivo religiosamente construdo atravs de decnios de patritico empenho.

    Veja-se que no se trata de mero agradecimento generoso. confisso que declara a influncia que Mrio Freire exerceu na contextualizao de vrias partes da Histria do Estado do Esprito Santo, ponto a que voltaremos nesta introduo.

    *

    Sabe-se que pessoal e subjetivo o processo de recuperao do passado numa narrativa histrica. O historiador elege previamente o seu campo de pesquisa, define espaos e tempos especficos a serem correlacionados, opta pela linha conceitual e metodolgica que vai seguir, arregimenta o instrumental investigatrio de que se quer valer, identifica e levanta as fontes de consulta, articula relaes de causa e efeito, processa enquadramentos e cortes cronolgicos, sistematiza dados e informaes para gerar o texto que a substncia expressa do seu ato de construir a histria.

    Trata-se de um somatrio de procedimentos cujo resultado derradeiro a histria formalizada em texto exterioriza o pensamento do historiador em relao ao objeto historiado. Mas este objeto, como obvio, jamais poder ser recuperado em sua totalidade complexa e multiforme porque a ao do historiador est sujeita a diferentes influncias e limitaes filosficas, ideolgicas, sociais, polticas, econmicas, metodolgicas etc. a comear pela distncia temporal que o separa do seu campo inteligvel de estudo, o que, por si s, pode pesar contrariamente completude da pesquisa empreendida e amplitude da verso textualizada que o historiador queira produzir da pesquisa que realizou.

  • XXIX

    Ao elaborar a sua histria do Estado do Esprito Santo, Jos Teixeira de Oliveira viveu, por certo, esse contexto de condicionantes inescapveis e h disso provas marcantes em seu livro. Desta forma, as solues que encontrou para desenvolver o trabalho, as omisses que no pde superar por razes pessoais ou circunstanciais, acabaram permeando o texto que logrou edificar.

    Identificar e entender, nesta introduo, o porqu das peculiaridades que marcam a histria de Jos Teixeira ajuda a compreender e valorizar as condies em que o autor atuou para realizar o seu projeto de resgate do passado histrico do Estado ou, se o preferirem, o seu projeto de construo de uma narrativa da histria do Esprito Santo.

    E que projeto era esse?

    A resposta pode ser recolhida pgina 339 da 1 edio da obra. Depois de deixar de lado alguns comentrios que fez sobre a vida capixaba na segunda metade do sculo XIX (captulo XVII) em relao a questes que considerou de somenos importncia, escreveu Teixeira de Oliveira: Passemos, porm, narrativa dos fatos. Eles falam mais eloqentemente do que os comentrios porventura expendidos. Comentrios, alis, de que temos nos esquivado sistematicamente, preocupado em oferecer a maior cpia possvel daquilo que se poderia denominar histria macia (grifado no original).

    O trecho transcrito de iluminada revelao para se verificar que Jos Teixeira de Oliveira teve o propsito assumido de construir uma narrativa sobre fatos da histria do Esprito Santo que desembocassem numa histria abrangente (macia). Mas o autor refere-se tambm maior cpia possvel do que seria necessrio para produzir a histria que almejava publicar. E cpia, ensina o dicionrio do Aurlio, tanto pode significar transcrio textual do que est escrito algures, quanto reproduo, ou grande quantidade, abundncia. Pois prestam-se os trs significados questo que estamos abordando.

    Compulsando-se a obra de Jos Teixeira, das primeiras s ltimas pginas, no somente salta aos olhos que se trata de uma histria que narra acontecimentos que se sucederam ao longo do tempo, em escala cronolgica direta, como ainda que obra que exibe, pela primeira vez na historiografia capixaba, uma quantidade estonteante de documentos relatrios, ofcios, cartas, mensagens governamentais, quadros e estatsticas, mapas e plantas, fotos em geral franqueados consulta dos interessados.

  • XXX | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Ao contrrio de uma prtica que perdurou em nossa historiografia durante muito tempo, nos idos pr-acadmicos, Jos Teixeira no ocultou as suas fontes de pesquisa. Escancarou-as e alardeou-as num convite ostensivo para que os interessados, conhecendo as balizas em que se louvou ao compor a sua narrativa, pudessem, se fosse o caso, pelo mesmo caminho por ele trilhado, chegar a concluses diferentes, deixando aberta a possibilidade do contraditrio.

    Esse tipo de conduta, inovadora na historiografia capixaba, tem uma denominao especfica: honestidade profissional. E nem a desmerece o fato de se admitir que a divulgao da massa documental que recheia as pginas da Histria do Estado do Estado Santo equivaleu a um recurso tcnico para tornar a obra substanciosa, como era desejo do autor, restringindo-se este funo de costurar com habilidade os temas que a documentao lhe sugeriu. O que pontifica que boa parte dos documentos utilizados na elaborao da obra foram tornados pblicos e acessveis a todos, a comear pela carta de doao e do foral da capitania do Esprito Santo, antes de conhecimento restrito a uns poucos privilegiados.

    Mas voltemos ao trecho acima transcrito para uma observao a mais.

    Ao se dispor a escrever uma histria macia (e tambm massiva) do Esprito Santo, percebe-se que seu autor estava consciente de que havia na historiografia capixaba um vazio a ser preenchido por uma obra do tipo da sua. No uma histria que explicasse ou interpretasse o Esprito Santo, embora Jos Teixeira o tenha feito pelas vias transversais da sua narrativa. Mas uma obra que relatasse o passado do Esprito Santo segundo um discurso documentado, coerente e coeso, cujo coroamento final foi contribuir para a formao da conscincia histrica do povo capixaba. Meta que atingiu em cheio.

    *

    Independente do que j foi salientado, afinemos outras apreciaes sobre a histria ora reeditada.

    Ao estruturar o contedo de sua obra por tpicos sucessivos, justapostos em seqncia cronolgica, Jos Teixeira de Oliveira montou um mosaico abrangente do processo evolutivo do Estado do Esprito Santo, escrito em estilo econmico, objetivo e claro. histria de conjunto, sem dvida alguma,

  • XXXI

    mas que se distribui por fragmentos ao longo do texto, observando trs ritmos que convergem para um trinmio nico: integrao, totalidade e sntese. Neste trinmio est imanente o compromisso historiogrfico do autor de reduzir a amplitude da histria do Esprito Santo a um corpus bsico e generalizante, contextualizado de forma multifacetada.

    No foi sem razo que o historiador Odilon Nogueira de Matos, em comentrio publicado na segunda capa da 2 edio, depois de ressaltar que o livro de Oliveira uma histria do Esprito Santo e no uma histria do Brasil adaptada ao Esprito Santo, destaca, com aguda perspiccia, o carter caleidoscpico da narrativa apresentada. E conclui observando que, apesar de a concepo da obra no atender aos interesses do mtodo da moderna critica histrica, preencheu os objetivos do autor de apresentar um balano da vida capixaba em quatro sculos.

    Eis um bom retrato da Histria do Estado do Esprito Santo que chega a explicar, em parte, a sensao de incompletude textual que a sua leitura muitas vezes provoca em relao a certos temas ou assuntos que poderiam ter sido mais desenvolvidos e no o foram.

    Um deles, por exemplo, refere-se atuao dos judeus e cristos novos em terras capixabas no perodo colonial, possivelmente por ter faltado a Jos Teixeira maiores informaes bibliogrficas que lhe permitissem avanar na questo.

    Mais incmoda a escassez de informes sobre a ao dos imigrantes europeus no processo de ocupao e colonizao do territrio capixaba, desde meados do sculo XIX. Nesse particular, vem a ser indesculpvel o tratamento dado aos italianos, cujo papel nessa colonizao foi dos mais notveis, e que passa quase batido no texto de Teixeira de Oliveira. Ainda bem que teve o autor a felicidade de recorrer colaborao de Luiz Derenzi que conhece o tema e d os ltimos retoques a um livro sobre a imigrao italiana (p.335, da 2 edio) para escrever mais do que duas linhas sobre esses imigrantes.

    No obstante, em foot note de n 45, p. 334 da mesma edio, Jos Teixeira desce ao extremo de negar genericamente aos colonos europeus uma participao decisiva na conquista e ocupao do territrio capixaba, quando diz que ao estrangeiro coube receber a terra penosamente conquistada [pelo brasileiro] e lavr-la. Ilhados nas suas colnias, mui remotamente influenciaram a agricultura e a indstria dos nacionais com os seus mtodos, necessariamente mais adiantados. Aqui como no resto do Brasil a conquista da terra foi obra exclusiva dos brasileiros.

  • XXXII | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Injustias de historiador ou imperfeies de anlise histrica por carncia de informaes? Inclino-me pela segunda hiptese.

    Outro aspecto que, por dever de ofcio, pede um apontamento, a desproporcionalidade na distribuio do contedo histrico na estrutura do livro, com base no seu encadeamento cronolgico. A observao feita para acentuar as circunstncias a que Jos Teixeira se viu condicionado na elaborao da sua histria e no para desmerecer o seu trabalho.

    Assim, tomando-se para anlise a 2 edio da obra, suprida com novos documentos e com a incluso do captulo Arrancada para o futuro, pode-se levantar o seguinte quadro comparativo em relao distribuio do contedo do livro: os captulos I a XIV tratam do Esprito Santo enquanto capitania (perodo colonial); os captulos XV a XVII so dedicados fase provincial; e apenas os trs ltimos, ao perodo republicano.

    Dir-se- que o desequilbrio apontado decorre de ter sido o perodo colonial at agora temporalmente mais longo do que os outros dois, na histria do Brasil. Todavia, no se pode esquecer que, nos sculos coloniais, o Esprito Santo no passava de um rinco da colnia brasileira em que a ocupao da terra estava constrangida faixa litornea, onde raros e esparsos eram os pontos povoados. A populao que habitava a capitania, s vsperas da Independncia do Brasil, talvez no ultrapassasse 25.000 habitantes, no computados os ndios, partindo-se de estimativa feita por Saint-Hilaire, que esteve no Esprito Santo em 1818.

    Diante disso, duas razes parecem explicar a preferncia de Teixeira de Oliveira pelo perodo colonial, em detrimento dos outros dois, o provincial e o republicano, nos quais se fundamenta o Esprito Santo contemporneo. A primeira a influncia que confessadamente o autor recebeu de Alberto Lamego e de Mrio Freire, especialistas em histria colonial do Esprito Santo; a segunda decorreu, provavelmente, da maior facilidade que teve o autor em consultar a bibliografia ento divulgada sobre a capitania capixaba e, por extenso, sobre a histria do Brasil em relao aos sculos coloniais.

    Em contrapartida, a carncia de bibliografia sobre os perodos provincial e republicano da histria do Esprito Santo, com que sem dvida se defrontou Jos Teixeira, parece ter prejudicado o levantamento de dados que lhe permitissem dar uma ateno mais equnime s trs fases cronolgicas consideradas. E isso apesar do volume de fontes documentais existentes nos arquivos sobre o perodo provincial e o republicano, algumas das quais foram consultadas e divulgadas por Teixeira de Oliveira em seu livro.

  • XXXIII

    Essa questo se evidencia com nitidez quando o tema a Repblica no Esprito Santo, fase pouco pesquisada e estudada na historiografia capixaba at a dcada de quarenta do sculo passado, quando Jos Teixeira terminou o preparo da 1 edio. Da o tratamento reducionista a que foi restringido o perodo republicano nas pginas da sua histria, mesmo com o acrscimo do captulo vigsimo, para atualizar a 2. edio.

    *

    Mas importa observar que estamos focalizando aspectos estruturais de uma narrativa. Seria injusto que apenas pelo desequilbrio contextual comentado se acusasse a histria de Jos Teixeira de padecer de defeito que comprometa o seu historicismo. O que sobreleva, nos nove fora de uma avaliao com iseno de nimo, a totalidade do contedo que a narrativa abarca, convalidando a viso de conjunto histrico que o autor pretendeu oferecer. Ademais, num nico captulo de um livro pode o historiador contextualizar questes e problemas que se abram em variantes para mltiplas propostas de investigao, enquanto, em outros captulos, a narrao pura e simples de fatos e eventos os torne fechados em si mesmos, sem criar oportunidades semelhantes.

    Destarte, pretendendo ser uma histria macia do Estado do Esprito Santo, a obra de Teixeira de Oliveira excede esse objetivo, fazendo-se campo de sugesto frtil para novas pesquisas sobre o nosso passado pelos temas que coloca disposio dos pesquisadores. As possibilidades neste terreno so ilimitadas e desafiadoras.

    As lacunas e senes que foram citados no invalidam, portanto, o trabalho do autor, realizado com denodo e seriedade inquestionveis, visando a construo da identidade histrica do Esprito Santo dentro de perspectiva pluralista, numa poca em que a elaborao do conhecimento histrico se pautava por frmulas hierarquizadas que o tempo superou at no modo de se pensar o passado como fonte da histria.

    Finalmente, mister registrar, por aplicvel histria de Teixeira de Oliveira, o cabimento das palavras de Jos Carlos Reis (in As identidades do Brasil De Varnhagen a FHC, Fundao Getlio Vargas, Rio, 2005): Em cada presente, o que se tem uma viso parcial, uma articulao original do passado e do futuro. A histria visada segundo perspectivas diversas, e, com o avano do tempo, as proposies histricas mudam.

  • XXXIV | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Ora, nos ltimos trinta anos, nada mudou tanto na historiografia quanto o modo de escrever e pesquisar a histria, marcado por profunda sofisticao metodolgica e pela diversificao de especialidades. E, se o discurso narrativo do historiador identifica-o a uma poca e a um estilo do fazer histrico, por recproca, identifica tambm a prpria poca em que o discurso foi elaborado.

    Jos Teixeira de Oliveira, com sua Histria do Estado do Esprito Santo, enquadra-se numa latitude conjuntural especfica, sem que a obra que escreveu tivesse perdido valor e significao. Seu livro , pois, digno de respeito e merecedor de todos os louvores.

    Ele a est, em sua terceira apario, na forma como o autor o concebeu e no como poderia ser ou seria desejvel que fosse pela tica de quem esteja posicionado distncia de cerca de sessenta anos da sua 1. edio, sem a percepo da importncia de que a obra se revestiu e continua se revestindo para o conhecimento da histria do nosso Estado. livro de muitos servios prestados, e ainda por prestar, historiografia capixaba.

    Esta afirmao eu a fao com a f de ofcio que me conferem vinte e seis anos em que lecionei histria do Esprito Santo na Universidade Federal do Esprito Santo, tendo a histria de Jos Teixeira por obra-nua de uso indispensvel a cada ano. Vezes sem conta passei por suas pginas, vezes sem conta perpassei seu ndice remissivo, precioso mecanismo de consulta que a histria de Jos Teixeira foi a primeira a apresentar no Estado, que arremessa o leitor rapidamente aonde ele quer chegar, em suas pginas.

    Posso, portanto, saudar com entusiasmo a nova edio. Posso, devo e o fao com votos de boas vindas. E vida longa, rainha!

    LUIZ GUILHERME SANTOS NEVES

    do Instituto Histrico e Geogrfico do Esprito Santo e

    do Centro Cultural de Estudos e Pesquisas do Esprito Santo

  • nota 3 Edio

    Inicialmente, para concretizar uma nova tiragem desta Histria do Estado do Esprito Santo de Jos Teixeira de Oliveira, pensou-se em fazer um fac-smile da 2 edio do livro. Tal alternativa foi de pronto afastada pela necessidade de se corrigir pontualmente o texto e pela possibilidade de ele ser escaneado, o que economizaria tempo devido ao volume da obra. Aps o escaneamento, o texto sofreu uma primeira reviso, feita por Reinaldo Santos Neves e por mim, de forma a corrigir as freqentes incongruncias no processamento da imagem digitalizada.

    No estabelecimento do texto e na reviso final foram adotados os seguintes critrios principais:

    a) Corrigiram-se os erros tipogrficos.

    b) As iniciais de muitos nomes comuns grafadas em maisculas foram transformadas em minsculas.

    c) Completaram-se os caracteres referentes aos anos quando registrados somente com a centena ou a dezena (exemplos: 798 por 1798 ou 65 por 1865), mesmo sendo inteligveis no contexto em que foram empregados.

    d) Atualizou-se a partir do captulo XIV, inclusive, a ortografia de documentos transcritos, j que essa ortografia, muito prxima da de hoje, no tem influncia sobre sua interpretao. Deve-se ressaltar que na 2 edio da obra diversos documentos, alguns deles integrantes de captulos anteriores ao XIV, estavam com sua grafia atualizada ou parcialmente atualizada nesse caso, procurou-se uniformizar o texto de tais documentos.

    e) As inconsistncias encontradas nas tabelas e no texto foram assinaladas em notas do editor.

  • XXXVI | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    f) As tabelas referentes Memria estatstica da provncia do Esprito Santo escrita no ano de 1828 de Incio Acioli de Vasconcelos, e reproduzidas nos captulos XIV e XV, foram retiradas da obra de ttulo idntico editada pelo Arquivo Pblico Estadual do Esprito Santo em 1978; tal procedimento justificou-se pelo fato de aquelas tabelas terem sido minuciosamente cotejadas com os originais que se encontram na Seo de Manuscritos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, o que permitiu se corrigissem diversos equvocos das transcries feitas na 2 edio deste livro.

    g) Na Bibliografia eliminaram-se as abreviaturas dos nomes de autores e respectivas obras, que constavam entre parnteses ao fim de cada verbete, providncia que, alm de permitir melhor padronizao dos nomes, no prejudicar as buscas.

    h) Manteve-se a estrutura do ndice remissivo tal como elaborada pelo Autor, somente reposicionando-se na ordem alfabtica as palavras que tiveram sua grafia atualizada.

    Foi descartada a cogitao inicial de se completar a obra ora reimpressa com as realizaes governamentais dos ltimos trinta anos, por considerarmos que isso seria trabalho para um novo livro. Somente foram acrescentadas as Relaes de governantes do perodo colonial, trabalho gentilmente cedido pelo Prof. Dr. Joo Eurpedes Franklin Leal, e os nomes dos titulares do Governo do Estado aps 1975 com a data da respectiva posse, para atualizar o anexo Governantes do Esprito Santo desde novembro de 1823 at o presente.

    Optou-se por fazer a reproduo colorida dos mapas a partir dos originais existentes em instituies no Rio de Janeiro. Os poucos casos em que tais originais no foram localizados esto assinalados nas legendas dos mapas que os substituram. Registrou-se da mesma forma os documentos cartogrficos acrescentados nesta edio. Providenciaram-se tambm novas fotos de diversos motivos escolhidos pelo Autor e ligados histria esprito-santense. Os retratos dos ex-governantes do estado do Esprito Santo foram copiados daqueles existentes no Palcio Anchieta, em Vitria. Nesta edio, somente acrescentamos o do Dr. Carlos Fernando Monteiro Lindenberg, por ele ter desempenhado papel decisivo na poltica esprito-santense durante vrias dcadas, circunstncia, alis, destacada por Jos Teixeira de Oliveira, que certamente por escrpulo no incluiu tal retrato na tiragem de 1975, quando ainda estava vivo aquele eminente homem pblico. As demais gravuras foram reproduzidas da 2 edio da obra.

  • XXXVII

    Agradeo, em primeiro lugar, a Reinaldo Santos Neves, por me ter indicado para a coordenao editorial e ter compartilhado algumas decises referentes a esta edio ou seja, me passou o problema, mas ajudou a equacion-lo, especialmente no que diz respeito s questes da reviso final do texto, cipoal que ele desbastou com pacincia. A pessoa de D. Stella Fontoura Teixeira de Oliveira tambm se faz presente neste momento em que a gratido deve ser registrada, pela sua simplicidade e desprendimento, honrando a memria do seu falecido esposo. Em seguida, agradeo a Neusa Maria Mendes, ento titular da Secretaria de Estado da Cultura do Esprito Santo Secult, pela confiana e apoio, assim como a compreenso e eficincia demonstradas por Srgio Blank, Subgerente de Humanidades, e demais servidores da Secult, aqui representados por Rita de Cssia Maia e Silva Costa, Joo Lauro de Freitas Aquino Neto, Penha Lopes Rangel Nascimento e Rogrio Ribeiro Coimbra, todos com expresses de boa vontade ao encaminharem os diversos processos.

    Tambm agradeo aos historiadores Regina Rodrigues Hees, Sebastio Pimentel Franco, Maria Cilda Soares da Costa, La Brgida Rocha de Alvarenga Rosa, Gabriel Augusto de Melo Bittencourt e Walace Bonicenha, que emprestaram seus nomes para o cumprimento de exigncias burocrticas necessrias consecuo deste empreendimento. Devem ficar registrados tambm os agradecimentos a Cilmar Franceschetto, Diretor Tcnico do Arquivo Pblico do Estado; Hilda Cabas, Chefe do Cerimonial do Governo do Estado; s professoras Ins Aguiar dos Santos Neves e Juliana Braz Ferri; e aos colegas da Secretaria de Estado da Fazenda do Esprito Santo Sefaz, por terem contribudo de diferentes modos para que esse projeto chegasse a bom termo.

    Estendo os meus melhores agradecimentos a todos os colaboradores desta nova edio, pela forma com que procuraram enriquecer obra to importante para a historiografia esprito-santense, especialmente a Luiz Guilherme Santos Neves, que elaborou a Apresentao; Joo Eurpedes Franklin Leal, autor do Posfcio; Carlos Giovanni L. Mesquita Melo e Stephanie Loss Casotti, que nos presentearam com a bela capa e a nova editorao do livro; Humberto Capai, autor das novas fotos; e Carlos Alberto (Beto) Felcio dos Santos, que reproduziu os mapas existentes em instituies do Rio de Janeiro.

    Finalmente, seria ingrato se no inclusse nestes agradecimentos Marta Gonalves Achiam que, alm de me auxiliar no escaneamento e ordenao do texto da segunda edio, empenhou-se na trabalhosa atualizao do ndice remissivo, e, sobretudo, entendeu as razes de ter-me ausentado do seu convvio em muitos momentos para que pudesse me desincumbir desta tarefa.

    FERNANDO ANTNIO DE MORAES ACHIAM

    Coordenador editorial

  • EstE LiVro...

    Em 1945, foi confiada aos professores Affonso dEscragnolle Taunay e Rodolfo Garcia nomes excelsos entre os historiadores patrcios por editora recm-fundada, a direo de sua Biblioteca Histrica Brasileira. Plano generoso, previa, inicialmente, a coleo das crnicas de todos os Estados da Federao. Seria o alicerce de futura e monumental Histria Geral do Brasil.

    Honrado com o convite para escrever o volume referente ao Estado do Esprito Santo, convite que, para ns, teve e tem a dimenso de imerecido prmio aos nossos esforos de estudante da Histria Ptria, transferiu-se o assunto para a fase contratual, com a editora, de imediato concluda.

    Inesperadamente, o plano concebido com tanta segurana e tanto entusiasmo desmoronou-se. E os originais foram enclausurados na tranqilidade de gaveta acolhedora.

    Um dia, amigo prestimoso nos aproximou do senador Carlos Lindenberg, ento frente do governo do Estado do Esprito Santo. Os entendimentos para a edio do livro s expensas da Administrao capixaba superaram entretanto o lapso de tempo que restava ao governo Lindenberg. Seu substituto Dr. Jones dos Santos Neves louvado em parecer de colenda comisso de membros do Instituto Histrico e Geogrfico do Esprito Santo, decidiu, afinal, promover a edio, como parte das comemoraes do Quarto Centenrio da Fundao de Vitria.

    Vinte e trs anos aps a publicao da primeira edio, o Dr. Arthur Carlos Gerhardt Santos atual governador do Estado manifestou Fundao Cultural do Esprito Santo o desejo de ver reeditado o livro.

    Sensibilizado com a honrosa lembrana, vimo-nos obrigado a voltar ao convvio dos livros de nosso passado aps dois decnios de devoo a outros altares.

  • XL | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Embora o tempo disponvel para a tarefa tenha sido reduzidssimo, confiamos no decepcionar os que esperam algo melhor da segunda edio de uma obra.

    Alm da reviso de todo o texto, pudemos acrescentar numerosas notas a todos os captulos da Histria do Estado do Esprito Santo, dar nova dimenso ao ndice remissivo e enriquecer o volume com alguns mapas de valor excepcional.

    Foi reservado maior espao documentao referente ao sculo passado, quando o Esprito Santo comea a se definir para o futuro. Estamos certos da aprovao dos estudiosos para a copiosa messe de papis agora divulgados, oriundos daquela centria.

    A bibliografia foi atualizada, isto , procuramos enriquecer a nova edio com as lies de quanto se publicou, aps 1950 aqui e no exterior de interesse para a Histria capixaba.

    Atualizamos o texto, compondo a crnica do Estado at os dias que correm, o que se justifica pela incontida exaltao que provoca o contato com a atualidade esprito-santense. De notar-se, apenas, que o entusiasmo pelo presente no traduz desapreo pelo passado. Ao contrrio, afirmamos que a pujana da colheita que se anuncia to promissora traduz o esforo paciente, perseverante, sofrido das geraes que, pelos sculos a fora, regaram a terra capixaba com suor e com sangue.

    * * *

    Em nota parte reproduzida, j assinalamos os nomes dos que nos ajudaram na elaborao da primeira edio desta obra.

    Aqui, cabe a apresentao dos nossos mais comovidos agradecimentos a Armando Ivo Pinto de Andrade cultura e devotamento postos a servio de velha amizade que tomou a seu cargo a reviso de todo o texto; a Luiz Derenzi memria viva dos ltimos cinqenta anos da vida capixaba pela sua prestimosa contribuio em todas as fases da preparao desta tiragem; escritora Neida Lcia Moraes, diretora da Biblioteca Pblica Estadual do Esprito Santo, pela presena constante e insupervel assistncia na tarefa que se imps de tornar realidade a nova edio deste livro.

    Ao Arquivo Nacional dirigido com carinhosa eficincia por Raul Lima e Biblioteca Nacional devemos a quase totalidade da documentao original que serviu de apoio ao nosso texto.

  • | XLI

    Trabalho deste porte produto do esforo de numerosas dedicaes, de gestos de desprendimento de toda ordem, de delicadezas inimaginveis.

    com o pensamento voltado para os que me estenderam as mos generosas que me curvo agradecido diante daquele funcionrio atencioso onde quer que ele se encontre sempre paciente e pronto para satisfazer a curiosidade do pesquisador.

    Sem particularizar a colaborao sempre valiosa de cada um, deixamos aqui consignado o nosso reconhecimento a D. Maria Luza Fernandes de Carvalho e seus auxiliares da Seo de Consultas do Arquivo Nacional; a D. Lindalva Sabastianelli Couto, tambm do Arquivo Nacional; ao Professor Waldyr da Cunha, da Seo de Manuscritos da Biblioteca Nacional; a D. Isa Adonias e D. Maria Marlene de Sousa, da Mapoteca do Ministrio das Relaes Exteriores; ao coronel Roberto de Oliveira Morais, ao Sr. Jorge Rosa Ferreira e ao subtenente Vinicius Mrio Sartori e sargento Clarindo Nunes Neto, do Centro de Operaes Cartogrficas, do Servio Geogrfico do Exrcito; ao Dr. Antnio Augusto Rosetti, subchefe do Gabinete Civil do senhor governador do Estado do Esprito Santo.

    Editora a Fundao Cultural do Esprito Santo meus melhores agradecimentos pela delicadeza do convite para visitar Vitria: oportunidade feliz que me foi dada de conhecer a Cidade Prespio, to justa e carinhosamente decantada por seus filhos, e tomar proveitoso contacto com as figuras mais expressivas da cultura e da inteligncia capixabas.

    O volume bem cuidado que o leitor tem em mos justifica nossos agradecimentos ao pessoal do Servio Grfico do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica) equipe magnfica, responsvel pela continuidade da obra ali iniciada pelo saudoso Renato Americano.

    Com muita gratido, junto a tantos nomes amigos o da companheira infatigvel de trs decnios de lutas Stella Fontoura Teixeira de Oliveira minha esposa.

    Rio de Janeiro, outubro de 1974.

    Jos Teixeira de Oliveira

    P. S. De justia, cabe aqui uma palavra de reconhecimento ao governador lcio lvares que sucedeu ao Dr. Arthur Carlos Gerhardt Santos frente da Administrao capixaba pelo apoio dado iniciativa de seu antecessor e para que esta edio se beneficiasse de todos os recursos necessrios ao seu aprimoramento.

  • XLII | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Acreditamos ser ainda prematuro fixar a grafia de alguns nomes da Histria esprito-santense. Por isto mesmo, apresentamo-los tais como os encontramos nos documentos consultados, com duas ou trs variantes, espera de que a pesquisa revele fontes mais puras, capazes de impor a forma definitiva.

    E que se tenha sempre presente o grande nmero de questes ainda no esclarecidas da Histria esprito-santense, realadas todas no texto, e que esto pedindo o esforo dos estudiosos para sua elucidao.

  • | XLIII

    ABREVIATURAS

    AN Arquivo Nacional

    BN Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro

    BNRJ Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro

    Cap Capitania

    Cons Ult Conselho Ultramarino

    DH Documentos Histricos (publicao do Arquivo Nacional e

    Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro)

    ES Esprito Santo (capitania, provncia, estado)

    Func pub Funcionrio pblico

    Gov Governo, governador

    HB Histria do Brasil, de Rocha Pombo

    HCJB Histria da Companhia de Jesus no Brasil, de Serafim Leite

    HCP Histria da Colonizao Portuguesa do Brasil

    HG Histria Geral, de Varnhagen

    MG Minas Gerais (capitania, provncia, estado)

    Min Ministro

    Ms Manuscrito

    Pres Presidente

    Prof Professor

    RIHGB Revista do Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro

    RIHGES Revista do Instituto Histrico e Geogrfico do Esprito Santo

    RJ Rio de Janeiro (provncia, estado, cidade)

    Sec Secretrio, sculo

  • I

    INTRODUO

    DE CEUTA A PORTO SEGURO

    1 - BENSAUDE, Lacunes, 305.

    2 - OLIV. MARTINS, Hist. Port., I, 193.

    A conquista de Ceuta, em frica, assinala, de fato, o primeiro grande passo de Portugal em busca do seu destino. Batido o vizinho castelhano, em Aljubarrota; unificado o pas em torno de um prncipe de feitio absolutista; alheia, enfim, a Nao s graves perturbaes polticas em que se debatiam os demais Estados europeus, o reino de Afonso Henriques se pde lanar empresa temerria de fincar lanas em frica.1

    Quatro sculos decorridos, ainda nos surpreendemos com a poderosa fora expedicionria que D. Joo I e seus filhos organizaram para levar a guerra aos infiis. Trinta e trs galees grandes, vinte e sete menores, de trs bancos de remeiros, trinta e duas galeras e cento e vinte fustas, transportes e outros vasos secundrios, conduziram cinqenta mil homens de Lisboa praa marroquina.2

    No que tange ao aspecto naval de importncia superior para o nosso objetivo a travessia Lisboa-Ceuta traduz o resultado do trabalho perseverante de algumas geraes.

  • 2 | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Em verdade, remonta aos dias da independncia nacional portuguesa a organizao de sua Marinha. Sem possibilidades de marchar para leste, embargado que estava pelo vizinho vigilante, Portugal tinha no Atlntico o campo natural para sua expanso. Ali residiam seu futuro, sua riqueza, sua glria. Toca, portanto, a aparelhar-se para dominar o salso elemento.

    Aprendendo nas rudezas dos trabalhos de navegao e observando o progresso dos que, indo e vindo, arribavam aos portos lusitanos, forjava-se na extremidade da Europa autntica estirpe de marinheiros.

    Governantes e governados, ainda nos albores da nacionalidade, acataram o chamado constante e inexorvel do Oceano. Como sempre, foi nas pescarias que se iniciou o aprendizado das artes nuticas,3 e a conseqente navegao de cabotagem teve, com a presena dos cruzados nos portos lusos, incentivo para rumos distantes.4

    Assinale-se que a marinha mercante, embora portuguesa, devia ser, em grande parte, propriedade de judeus senhores quase absolutos do comrcio internacional daquele tempo.5 Vale a advertncia como elemento comprobatrio de que a expanso teve fundamento no esprito comercial, de lucro.

    Era numerosa esta armada: bem se deixa ver, depois de to grandes preparativos. Todavia, no sabemos ao certo quantos navios a formavam. No o diz Azurara. Di-lo, contudo, Mateus Pisano: duzentos e quarenta e dois navios, isto , sessenta e trs naus, vinte e sete gals trirremes, trinta e duas birremes e cento e vinte outras embarcaes menores: mas Zurita d duzentas e doze velas, isto , trinta e trs galees, vinte e sete gals trirremes, trinta e duas galeras e cento e vinte outras embarcaes menores, com cinqenta mil homens; e o mesmo diz, quanto composio da armada, D. Antnio Caetano de Sousa, que copiou neste particular Duarte Nunes de Lio. Oliveira Martins aceitou a informao exagerada e indocumentada de Zurita de que iam na armada cinqenta mil homens, entre mareantes e gente de embarque (CORTESO, Descobrimentos, 386).

    3 - Habitantes de um pas cuja costa naturalmente adequada ao exerccio da pesca e frtil em valiosas espcies piscatrias, cedo se dedicaram os lusitanos s lides martimas, com as quais os vemos familiarizados na poca distante em que a cincia nutica assentava em vaga intuio individual e em confusa experincia coletiva (LAGOA, Grandes e Humildes, Introduo, VIII). Nas cinqenta e seis pginas que constituem a Introduo de seu trabalho, o visconde de Lagoa apresenta sntese magistral da histria martima de Portugal at Bartolomeu Dias. Pginas de leitura proveitosa para um estudo sobre os descobrimentos.

    4 - AZEVEDO, pocas, 28.

    5 - Dedutivamente, e cingindo-nos regra tirada dos fatos observados em outros pases, acertaremos supondo os hebreus exclusivos senhores do incipiente comrcio interno e do trfico, s vezes avultado, com as terras estrangeiras (AZEVEDO, Cristos Novos, 31).

  • INTRODUO I | 3

    Damio Peres resumiu: O que se sabe quanto s origens do comrcio internacional praticado pelos portugueses mostra-se harmnico com os sucessos polticos: de 1184 a mais antiga notcia da existncia de mercadores portugueses em Bruges, sendo pouco posteriores as relaes comerciais por eles estabelecidas em portos franceses e ingleses; em 1188 surge a primeira referncia importao de tecidos por mar; um documento portugus de meados do sculo XIII, a lei de almotaaria, de vinte e seis de dezembro de 1253, menciona j muitos artigos de luxo importados da Frana e da Inglaterra tecidos finos de linho e seda, at com aplicaes de ouro, plumas etc.; em 1390, Felipe o Belo concede aos mercadores portugueses que freqentavam o porto de Harfleur importantes privilgios. Ao findar o sculo XIII, o comrcio externo portugus tomara tal incremento que os mercadores organizaram antre sy uma bolsa ou associao de auxlio mtuo a que deu confirmao a carta rgia de dez de maio de 1293; os associados pagavam uma determinada importncia por cada navio que carregassem para o estrangeiro, depositando-se na Flandres e em Portugal as somas assim obtidas, e que eram destinadas ao custeio de despesas, especialmente as forenses, derivadas do exerccio de atos comerciais.6

    O Estado corria pari passu com o esforo particular. Enquanto construa sua esquadra de guerra que teve aes de relevo em Espichel (1180), Silves (1180)7 e Sevilha (1266),8 promovia uma legislao de protecionismo martimo surpreendente para a poca. L esto entre os atos fernandinos a franquia de embandeiramento, os prmios de construo e de navegao, os seguros mtuos, a estatstica naval, a inspeo tcnica...9

    Vislumbrada a possibilidade de ampliar os conhecimentos dos seus capites com o saber de gente estranha, apelaram os soberanos para Gnova cujos filhos eram, ento, os mais adiantados mestres da arte de navegar e de l trouxeram, entre outros, o almirante10 Manuel Pezagno,11 a quem foi entregue o comando dos navios de el-rei.

    6 - PERES, Descobrimentos, 24-5.

    7 - SELVAGEM, Port. Militar, 57.

    8 - OLIV. MARTINS, Port. nos Mares, I, 19.

    9 - OLIV. MARTINS, Port. nos Mares, I, 27.

    10 - Almirante, conforme se denominava moda rabe o que moda feudal, ou goda, se dizia conde-do-mar (OLIV. MARTINS, Port. nos Mares, I, 19-20).

    11 - OLIV. MARTINS, Port. nos Mares, I, 20.

    Reproduzimos o nome e apelido usados pelo prprio na assinatura do contrato de primeiro de fevereiro de 1317 (PERES, Descobrimentos, 26).

  • 4 | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    Os assuntos martimos iam, pouco a pouco, empolgando a alma portuguesa. Ferno Lopes, na Crnica de El Rei D. Fernando, registou que, nos dias do governo desse soberano, se viam por vezes, no Tejo, quatrocentos a quinhentos navios de carga.12

    Estavam lanados os alicerces para o advento de D. Henrique o Navegador. Homem de estudos e de ao, sua volta de Ceuta fez-se rodear de brilhante equipe de marinheiros, astrnomos, cosmgrafos, armadores. Um predestinado, o visionrio de Sagres. Juntava ao esprito de aventura to leal sua grei inquebrantvel fora de vontade. No Promontrio Sacro dos romanos, levantou um pao, uma capela, um gabinete para estudos, um observatrio o mais antigo de Portugal e uma vila para seus auxiliares e servidores, fundando, de novo, o estudo sistemtico da cincia aplicada, entre os cristos, melhor ainda que o trabalho da velha Universidade de Alexandria, com que a tm comparado, porque essencialmente prtico.13

    Conjugando o que se poderia chamar de patrimnio cultural portugus com os conhecimentos dos seus colaboradores, principalmente italianos e catales, bem como com a cincia astronmica dos rabes e dos judeus da pennsula ibrica e da Provena que foram de grande auxlio para a organizao definitiva dos seus estudos14 o infante elevou a cartografia e a construo naval a nveis nunca antes alcanados no Ocidente.15

    Vindo depois de Ceuta, Sagres surge como ponto de reestruturao das enormes foras que, no peito lusitano, aguardavam o momento de expandir-se. Ceuta seria a aventura, Sagres o clculo sereno e cientfico. Daqui para o futuro, as expedies contam reduzido nmero de barcos e avanam cautelosas. Em verdade, os navios que partem dos estaleiros henriquinos so legtimos empreendimentos comerciais, com tudo previsto para evitar perdas inteis.

    Soa a hora da entrada de Portugal na Histria Universal. Pas de reduzida populao,16 sobrepujou-se a si mesmo por via dos feitos martimos. O mar iria facilitar-lhe um lugar honroso no concerto das naes civilizadas, entre as que mais fizeram pela propagao da cultura ocidental.

    12 - CORREIA, Hist. Econ., I, 57.

    13 - BEAZLEY, O Infante, 156.

    14 - CORTESO, LExpansion.

    15 - BEAZLEY, O Infante, 157.

    16 - Segundo COSTA LOBO Histria da Sociedade em Portugal no Sculo XV a populao de Portugal em 1495, ano em que D. Manuel subiu ao poder, era avaliada em 1.122.112 habitantes, dos quais somente 331.000 homens em condies de manter a mquina do Estado, a lavoura, a pesca e a milcia, e de realizar empresas martimas (apud FIDELINO FIGUEIREDO, Estudos, 13-4).

  • INTRODUO I | 5

    * * *

    A Renascena e o aparecimento de novos Estados europeus criaram problemas novos no continente. Estes, por sua vez, foravam solues. Velhos preconceitos caam aos golpes de mentalidade que se emancipava de dogmas seculares. Sobre todo o cenrio imenso em que se iria desenrolar o soberbo drama, iluminando-o, um poderoso foco de luz o comrcio das especiarias.

    Era o tempo das Cruzadas, quando multides frenticas tudo abandonavam, tomadas de verdadeira crise de exaltao religiosa coletiva, para lutar pela libertao do Santo Sepulcro, cuja localizao rarssimos adivinhavam. Cidades inteiras eram assaltadas por paroxismos neurticos e o homem comum vivia sob o terror de duendes e demnios. A imaginao no conhecia limites e o maravilhoso constitua o alimento predileto daqueles crebros exaltados. Avalie-se, pois, como reagiriam s informaes disseminadas pelos cruzados, em que os povos do Oriente, com suas maravilhas, com suas inesgotveis riquezas, se apresentavam como terra da promisso, destinada a contribuir para minorar as misrias de uma populao dispersa por vrias naes, empobrecidas e atormentadas por uma vida agitada de guerras, de fome e de epidemias.17

    Certamente, por um processo lgico e primrio, os cristos seriam levados a estabelecer a comparao entre os esplendores da civilizao oriental, pag, e as dificuldades com que lutavam para conseguir o indispensvel a uma vida simples, de parcas exigncias materiais.

    No que respeita a Portugal, pas ardentemente religioso e de longo convvio com os mercadores que, desde o Mediterrneo, traficavam, por via martima, com o Norte da Europa, era de esperar-se que a miragem do Oriente provocasse o entusiasmo de sua gente, providencialmente aparelhada para comandar a aventura.

    Enquanto os portugueses eram assim empolgados pelas maravilhas do Levante, decisivos acontecimentos ocorriam nos confins do Mediterrneo: a expanso do poderio turco causava tantas dificuldades s comunicaes comerciais entre os centros produtores e consumidores das especiarias18 que elas

    17 - CORREIA, Conseqncias, 9.

    18 - As especiarias no eram utilizadas apenas como condimentos na alimentao. A designao genrica de especiarias e aromas aplicava-se a todos os adjuvantes dos xtases religiosos, a todos os elementos da farmacopia dessa poca. Com estes produtos se fabricavam os narcticos, os blsamos, os venenos, os fermentos, os aperitivos, os excitantes, os diurticos, os desintoxicantes, os purgativos. Por este motivo o seu consumo se generalizou rapidamente por toda a Europa (MORAND, La Route).

  • 6 | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    se tornaram to caras a ponto de quase desaparecerem dos mercados europeus.19 E as especiarias eram um suprfluo que se tornara necessrio.20

    Comrcio to compensador, impunha-se encontrar novos caminhos para escoamento das especiarias, a salvo da pirataria muulmana.

    Portugal tomou a si a grande empresa, que insculpiria seu nome na eterna lembrana da Humanidade.

    Quase um sculo de lutas e sacrifcios para chegar terra da especiaria. At l, foi proporcionando freguesia gulosa um sucedneo da pimenta da ndia a malagueta africana. Acar, conseguiu-o das terras descobertas da ilha da Madeira, principalmente.

    Logo nas primeiras viagens s costas africanas, barcos de armadores particulares juntaram-se s caravelas reais. O soberano era mercador, mas permitia a concorrncia rendosa de privilegiados parceiros, reservando para si o monoplio de um ou dois produtos, apenas, conforme as circunstncias.

    Pelo caminho, foi ensaiando processos de colonizao feitorias e donatarias. Escravizando negros. Demolindo toda a geografia antiga.

    Um dia... descobriu, de passagem, o Brasil.

    19 - MATOSO, Hist. Port., I, 210.

    20 - Os perfumes tropicais, sndalo, mirra, benjoim, incenso, misturas, essncias, cnfora, tinturas, foram um alvio e um deleite. Com as essncias e os perfumes, o sunturio que agrada vista, tapetes, sedas, cetins, telas, damascos, jias, porcelanas, mil objetos exticos invadiram a Europa, e tudo era especiaria.

    Mas as dominantes eram as do gosto. A Europa no aprendera ainda a sucesso sazonal das colheitas, nem tinha como guardar alimento, da estao calmosa para a estao fria. Por faltar forragem aos bovdeos, durante o inverno, eram abatidos, os mais deles, em novembro, aos primeiros frios, em todo o Norte, e salgada a carne para o consumo dos meses seguintes. No havia a batata, que americana, nem os legumes j eram do hbito da mesa, nem a estao os permitiria. O regime alimentar era, pois, severo e ingrato: trigo e carne salgada. O tempero, as especiarias tropicais, pimenta, cravo, canela, gengibre, noz moscada ... foram bnos do cu ... festa do apetite e alegria do gosto. Dado o hbito, tal sunturio transforma-se na mais exigente necessidade. O parco mel de abelhas teve o sucedneo milagroso do acar, a princpio nas boticas, de to precioso, depois nas mercearias. O ch, o caf, o cacau, como fora o lcool, viriam a ser delcias desse gosto, tanto e to severamente tratado durante sculos (PEIXOTO, Hist. Brasil, 2-3).

  • II

    INTRODUO

    NDIAS, FRANCESES E DONATRIOS

    1 - AZEVEDO, pocas, 110.

    2 - Alguns Documentos, 96.

    Como sabido, Vasco da Gama partiu de Lisboa, a oito de julho de 1497, com trs naus: So Gabriel, So Rafael e Brrio, alm de uma barcaa de mantimentos. De regresso, trazia duas daquelas naus e um tero da tripulao.

    Em 1498, Vasco da Gama lana as pesadas ncoras dos seus barcos no porto de Calecute. Eram, finalmente, as ndias. Nada menos que um conto de fadas feito realidade. Portugal tomava em suas mos o mais lucrativo comrcio at ento conhecido.

    Da pouca especiaria trazida na viagem de retorno, calcularam-se os lucros em sessenta vezes o cabedal investido na empresa.1 D. Manuel relatando, triunfante, aos reis de Espanha, o achamento, observou: Da dita especearya e pedrarya nam trouxeram logo tanta ssoma, como poderam, por nam levarem para ello aquella mercadarya, nem tanta, como convynha.2

    O entusiasmo que a notcia provocou em Portugal s comparvel ao abalo que sofreram os entrepostos que, at ento, monopolizavam o trfico dos produtos orientais. Os sditos do Venturoso consideravam-no o mais bem afortunado rei

  • 8 | HISTRIA DO ESTADO DO ESPRITO SANTO

    da Cristandade, pois nos primeiros dous anos de seu reinado descobrira maior estado Coroa deste reino, do que era o patrimnio que com ele herdara cousa que Deus no concedera a nenhum prncipe de Espanha, nem a seus antecessores que nisso bem trabalharam per discurso de tantos anos. Nem se achava escritura de gregos, romanos, ou dalgua outra nao, que contasse tamanho feito, como era trs navios com obra de cento e sessenta homens, quase todos doentes de novas doenas de que muitos faleceram, com a mudana de tam vrios climas per que passaram, diferenas dos mantimentos que comiam, mares perigosos que navegavam e com fome, sede, frio e temor, que mais atormenta que tdalas outras necessidades, obrar neles tanto a virtude da constncia e preceito de seu rei que, propostas todas estas cousas, navegaram trs mil e tantas lguas, e contenderam com trs ou quatro reis tam diferentes em lei, costumes e linguagem, sempre com vitria de tdalas indstrias e enganos da guerra que lhe fizeram.3

    O deslumbramento, entretanto, no ofuscou o bom senso. Seis meses aps o regresso do Gama, a nove de maro de 1500, outra e poderosa armada deixava o Tejo esta, agora, aparelhada de gente e material suficientes e capazes de celebrar ou impor tratados aos prncipes asiticos, afastando assim a concorrncia estranha. De treze naus se compunha a armada a mais fermosa e poderosa que t aquele tempo para tam longe deste reino partira4 confiado seu comando a Pedro lvares Cabral.5

    O comrcio colabora: duas naus so de fidalgos, o Conde de Porto Alegre, aio de el-rei, e D. lvaro de Bragana, este associado ao banqueiro Bartolomeu Marchioni, florentino que reside em Lisboa, privado da corte e com grandes servios ao Estado.6

    A natural pressa que tinha Portugal de fixar-se em bases seguras nas ndias e as instrues oferecidas a Cabral por Vasco da Gama levam a concluir pelo acaso do descobrimento do Brasil a vinte e dois de abril de 1500.

    3 - BARROS, sia, I, 180.

    4 - BARROS, sia, I, 181.

    5 - Pedro lvares Cabral nasceu em Belmonte no ano de 1467 ou de 1468, sendo seus pais Ferno Cabral e Izabel de Gouveia. Pedro lvares era o segundo filho, sendo seu irmo, Joo Fernandes Cabral, o primognito. Talvez por isso usasse o apelido de sua me, sendo conhecido por Pedro lvares de Gouveia. O prprio D. Manuel ainda assim o tratava a quinze de fevereiro de 1500, ao nome-lo capito-mor da esquadra; mas a primeiro de maro j lhe chama Pedro lvares Cabral. (FONTOURA DA COSTA, Os Sete nicos Documentos, 11).

    6 - PEIXOTO, Hist. Brasil, 20-1.

  • INTRODUO II | 9

    Simples incidente no roteiro das ndias, a terra americana nenhum atrativo oferecia aos felizes detentores do comrcio das especiarias.7

    Era natural que Portugal s tivesse olhos para a sia cobiada, e afinal alcanada.

    Vera Cruz, Santa Cruz, Terra dos Papagaios,8 afinal e definitivamente BRASIL, era pas sem ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou ferro9. Pero Vaz de Caminha, no obstante aquela profunda simpatia com que lavrou o auto oficial do nascimento do Brasil,10 no viu nele outra utilidade que a de servir de pousada para esta navegao de Calecute.11

    7 - O Brasil foi como uma carta de paus puxada num jogo de trunfo em ouros. Um desapontamento para o imperialismo que se iniciara com a viagem ndia de Vasco da Gama. Da o gesto mole, desinteressado, sem vontade, com que a Coroa recolheu ao seu domnio as terras de pau de tinta descobertas por Pedrlvares Cabral. S em nova fase de atividade portuguesa a propriamente colonizadora, a do fim do sculo XVI e parte do sculo XVII o Brasil teria fora de trunfo no jogo das competies imperialistas das naes europias. Essa transformao, em virtude da repentina valorizao do acar nos mercados aristocrticos e burgueses da Europa. O acar tornou-se artigo de luxo, vendido a preos elevadssimos e dando lucros enormes a produtores e intermedirios. At o mascavo, notou Dampier, quando esteve na Bahia nos fins do sculo XVII, que se exportava para a Europa, valendo cerca de vinte xelins por cem libras. (FREYRE, Casa-Grande, I, 359-60).

    8 - O mais antigo nome dado pelos portugueses ao nosso pas Terra de Vera Cruz, Ilha de Vera Cruz ou simplesmente Vera Cruz j aparece nas cartas de mestre Joo, artium et medicinal bachalarius como ele prprio se dizia, e de Pero Vaz de Caminha, escrivo nomeado para a feitoria de Calecute, apontado alhures como o nosso primeiro historiador. Comunicando aos reis catlicos, a vinte e nove de julho de 1501, a incorporao dos novos domnios sua coroa, exprimiu-se D. Manuel no entanto de outra forma, como se verifica da verso espanhola desse documento: la cual puso nombre de Santa Cruz. Encontra-se tambm essa ltima num planisfrio de 1502, conservado em Modena e executado por um cartgrafo portugus, ao servio de Alberto Cantino, agente de Ferrara em Lisboa, bem assim num alvar de vinte e quatro de janeiro de 1504. [...]

    Sob a denominao apenas de Ilha da Cruz, mencionou-se o Brasil em regimentos de navegao dados a Joo da Nova (1501), Afonso de Albuquerque (1503), D. Francisco de Almeida (1505) e Ferno Soares (1507). Com as primeiras notcias sobre o pas, tambm chegaram a Lisboa, entre outros psitacdeos, algumas araras vermelhas, Ara Chloroptera, Gray, cujo tamanho e cores vivas teriam provocado movimento de justificada curiosidade, da