argamassas de cal aerea com incorporacao de cinzas de casca de arroz. estudo da influencia da...

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Argamassas de cal aérea com incorporação de cinzas de casca de arroz Estudo da influência da granulometria das cinzas João Carlos Duarte Tiago Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Civil Júri Presidente: Prof. Doutor Jorge Manuel Caliço Lopes de Brito Orientador: Prof.ª Doutora Ana Paula Teixeira Ferreira Pinto França de Santana Co-Orientador: Prof. Doutor Augusto Martins Gomes Vogal: Eng. João Manuel Bessa Pinto Outubro de 2011

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  • Argamassas de cal area com incorporao de cinzas de

    casca de arroz

    Estudo da influncia da granulometria das cinzas

    Joo Carlos Duarte Tiago

    Dissertao para obteno do Grau de Mestre em

    Engenharia Civil

    Jri

    Presidente: Prof. Doutor Jorge Manuel Calio Lopes de Brito

    Orientador: Prof. Doutora Ana Paula Teixeira Ferreira Pinto Frana de Santana

    Co-Orientador: Prof. Doutor Augusto Martins Gomes

    Vogal: Eng. Joo Manuel Bessa Pinto

    Outubro de 2011

  • i

    RESUMO

    A aplicao de argamassas de cal area com incorporao de materiais pozolnicos no

    recente na construo. Contudo, nos ltimos anos a sua aplicao foi gradualmente substituda

    por argamassas base de cimento e de cal hidrulica, o que provocou um esquecimento das

    tcnicas e conhecimentos associados aplicao de argamassas de cal area com adio de

    materiais pozolnicos. Porm, estas novas tcnicas nem sempre so compatveis com os

    materiais existentes nos edifcios a reabilitar, o que suscitou o interesse de readquirir os

    conhecimentos relativos utilizao de argamassas de cal area com incorporao de adies

    pozolnicas.

    A presente dissertao teve como objectivo estudar a reactividade pozolnica de cinzas de

    casca de arroz numa argamassa de cal area e avaliar a influncia da granulometria das

    cinzas no desempenho de argamassas de cal area formuladas com estas cinzas.

    O trabalho experimental incidiu sobre o estudo de quatro argamassas formuladas com cinza de

    casca de arroz, igual relao cal/cinza (1:2) e consistncia (165 5 mm) e uma argamassa de

    referncia. A cinza comercial foi previamente preparada para se obter amostras com

    granulometrias diferentes. A caracterizao das argamassas foi efectuada com base em vrias

    determinaes utilizadas neste tipo de estudos.

    A melhoria de vrias caractersticas das argamassas estudadas evidenciou a reactividade

    pozolnica da cinza estudada, a possibilidade do seu incremento atravs da reduo da

    dimenso das suas partculas, bem como o interesse da sua aplicao em argamassas de

    reabilitao, uma vez que cumprem alguns dos requisitos de compatibilidade com os suportes

    antigos.

    Palavras-chave: argamassas de cal area, cinza de casca de arroz, reactividade pozolnica,

    granulometria.

  • ii

  • iii

    Abstract

    The use of lime based mortars with pozzolanic material is not new in constrution. Its application

    has been gradually replaced by cement-based mortars and hydraulic lime. However, cement

    based mortars and hydraulic lime are often incompatible with the materials used to rehabilitate

    buildings. That increase the interest in recovering the lost knowledge associated with the use of

    lime mortars with pozzolanic materials.

    The aim of the present work is to study the pozzolanic reactivity of rice husk ash in lime mortars

    and evaluate the effect of rice husk ash particle size in lime based mortars. For the purpose,

    four mortars were studied with three fixed parameters: the rice husk ash type), ratio lime/ash

    (1:2) and consistency (165 5 mm). The commercial rice husk ash was previously prepared in

    order to obtain samples with different particle sizes. As a reference a pure lime mortar sample

    was also formulated. The latter was subjected to dry cure whereas the lime mortars with rice

    husk ash were subjected to saturated environments. Mortars characterization tests included:

    determination of consistence of fresh mortar, bulk density, water retention, flexural resistance,

    compressive resistance, ultrasonic propagation velocity, superficial hardness, capillarity water

    absorption, open porosity, karsten tube penetration test.

    Improved characteristics of the mortars suggest that rice husk ash is pozzolanic reactive.

    Furthermore pozzolanic reactivity of rice husk ash is increased by particle size reduction. Given

    that the studied mortars fulfill most of the requirements for old buildings applications, the

    present study highlights its potential as repair mortars.

    Key-Words: lime mortar, rice husk ash, pozzolanic reactivity, particle size.

  • iv

  • v

    AGRADECIMENTOS

    Professora Ana Paula Pinto pela definio das linhas mestras desta dissertao, pelos

    esclarecimentos, disponibilidade e orientaes prestadas.

    Professor Augusto Gomes pela pacincia, pela disponibilidade e auxilio na concluso deste

    trabalho.

    Engenheiro Nuno Almeida, um agradecimento muito especial pela motivao incansvel,

    acompanhamento laboratorial e companheirismo, sem o qual esta dissertao no seria a

    mesma.

    Ana Rita pela ajuda, companhia e pelos bons momentos passados durante o trabalho

    experimental.

    Ao Sr. Leonel pelo apoio prestado durante o perodo de ensaios.

    Eng. ngela Nunes da SECIL assim como ao Centro de Desenvolvimento de Aplicaes de

    Cimento pelo importante contributo para uma melhor caracterizao da Cinza de Casca de

    Arroz.

    A todos os meus amigos que ao longo deste anos sempre estiveram ao meu lado em todas as

    aventuras!

    minha me, ao meu pai e ao meu irmo por serem quem so! Muito obrigado por tudo!

  • vi

  • vii

    NDICE DE TEXTO

    1 Introduo .............................................................................................................................. 1

    1.1 Justificao .................................................................................................................... 1

    1.2 Objectivos da dissertao ............................................................................................. 3

    1.3 Estrutura e organizao da dissertao ........................................................................ 3

    2 Argamassas de Cal Area em edifcios antigos ................................................................... 5

    2.1 Consideraes gerais .................................................................................................... 5

    2.2 Argamassas de cal area para paredes de edifcios antigos ....................................... 6

    2.2.1 Principais anomalias em argamassas de cal area e princpios orientadores de

    interveno face s anomalias .............................................................................................. 6

    2.2.2 Caractersticas das argamassas para rebocos exteriores de edifcios antigos ...... 11

    2.2.2.1 Requisitos e caractersticas relacionadas com a proteco dos substratos... 12

    2.2.2.2 Requisitos e caractersticas relacionadas com a durabilidade das argamassas

    13

    3 Argamassas de cal area e componentes pozolnicos ...................................................... 15

    3.1 Cal area ..................................................................................................................... 15

    3.2 Definio de materiais pozolnicos ............................................................................. 17

    3.3 Reactividade das pozolanas ....................................................................................... 18

    3.4 Medio da reactividade das pozolanas ..................................................................... 20

    3.4.1 Ensaios mecnicos .................................................................................................. 20

    3.4.2 Ensaios qumicos .................................................................................................... 21

    4 Cinzas de casca de arroz .................................................................................................... 23

    4.1 Contextualizao histrica .......................................................................................... 23

    4.2 Propriedades da casca de arroz ................................................................................. 24

    4.3 Propriedades pozolnicas das cinzas de casca de arroz ........................................... 26

  • viii

    4.4 Influncia da granulometria das cinzas de casca de arroz na reactividade pozolnica

    33

    5 Materiais utilizados na produo das argamassas ............................................................. 43

    5.1 Areia de rio .................................................................................................................. 43

    5.1.1 Anlise granulomtrica da areia de rio .................................................................... 43

    5.1.2 Determinao da baridade ...................................................................................... 45

    5.2 Cal area hidratada em p .......................................................................................... 45

    5.3 Cinza de casca de arroz comercial ............................................................................. 46

    5.3.1 Pr peneirao ..................................................................................................... 46

    5.3.2 Moagem ................................................................................................................... 49

    5.3.3 Peneirao fraccionamento da cinza em diferentes granulometrias ................... 53

    6 Plano de ensaios experimentais ......................................................................................... 61

    6.1 Consideraes gerais .................................................................................................. 61

    6.2 Descrio do plano de ensaios ................................................................................... 62

    6.2.1 Primeira fase do trabalho experimental................................................................... 62

    6.2.2 Segunda fase do trabalho experimental.................................................................. 63

    6.3 Caracterizao das argamassas estudadas ............................................................... 65

    6.4 Produo das argamassas e preparao dos provetes.............................................. 66

    6.4.1 Produo da argamassa ......................................................................................... 66

    6.4.2 Produo dos provetes prismticos ........................................................................ 69

    6.4.3 Aplicao da camada de revestimento sobre tijolos ............................................... 71

    6.5 Caracterizao das argamassas no estado fresco ..................................................... 72

    6.5.1 Avaliao da consistncia por espalhamento ......................................................... 73

    6.5.2 Reteno de gua ................................................................................................... 75

    6.5.3 Determinao da massa volmica aparente ........................................................... 76

    6.5.4 Exsudao ............................................................................................................... 78

  • ix

    6.6 Caracterizao das argamassas no estado endurecido ............................................. 79

    6.6.1 Caractersticas mecnicas ...................................................................................... 79

    6.6.1.1 Resistncia flexo e compresso .............................................................. 79

    6.6.1.2 Determinao da velocidade de propagao de ultra-sons ............................ 81

    6.6.1.3 Determinao da dureza superficial Esclermetro Pendular ....................... 84

    6.6.2 Avaliao das caractersticas fsicas ....................................................................... 85

    6.6.2.1 Determinao da absoro de gua por capilaridade .................................... 85

    6.6.2.2 Determinao da porosidade aberta ............................................................... 87

    6.6.2.3 Determinao da absoro de gua sob baixa presso Mtodo do cachimbo

    89

    6.6.2.4 Avaliao da cintica de secagem .................................................................. 90

    6.6.2.5 Avaliao da profundidade de carbonatao com o indicador de fenolflalena

    93

    7 Apresentao, Anlise e discusso dos resultados ............................................................ 95

    7.1 Caracterizao das argamassas no estado fresco ..................................................... 95

    7.1.1 Avaliao da consistncia por espalhamento ......................................................... 95

    7.1.2 Reteno de gua ................................................................................................... 98

    7.1.3 Massa volmica aparente ..................................................................................... 100

    7.1.4 Exsudao ............................................................................................................. 100

    7.2 Caracterizao das argamassas no estado endurecido ........................................... 102

    7.2.1 Avaliao das caractersticas mecnicas.............................................................. 102

    7.2.1.1 Resistncia flexo e compresso ............................................................ 102

    7.2.1.2 Determinao da velocidade de propagao de ultra-sons .......................... 107

    7.2.2 Avaliao das caractersticas fsicas ..................................................................... 111

    7.2.2.1 Determinao da absoro de gua por capilaridade .................................. 111

  • x

    7.2.2.2 Determinao da porosidade aberta ............................................................. 114

    7.2.2.3 Determinao da absoro de gua sob baixa presso Mtodo do cachimbo

    121

    7.2.2.4 Avaliao da cintica de secagem ................................................................ 122

    7.2.2.5 Determinao da dureza superficial Esclermetro Pendular ..................... 125

    7.2.2.6 Avaliao da profundidade de carbonatao ................................................ 127

    8 Consideraes finais ......................................................................................................... 129

    8.1 Concluses ................................................................................................................ 129

    8.2 Propostas para desenvolvimentos futuros ................................................................ 131

    Bibliografia ................................................................................................................................. 133

    Anexos

  • xi

    NDICE DE FIGURAS

    Figura 2-1 Esquema da metodologia proposta para interveno envolvendo a aplicao de

    novas argamassas. ..................................................................................................................... 10

    Figura 4-1 Distncia (aproximadamente 50 m) entre superfcie externa, A, e interna, B. ..... 25

    Figura 4-2 Possibilidades de aplicao da casca de arroz e da respectiva cinza. .................. 26

    Figura 4-3 (a) Estrutura da slica cristalina formada por tomos orientados a longa distncia;

    (b) Slica amorfa cuja orientao dos tomos ocorre apenas a curta distncia. ..................... 27

    Figura 4-4 Curvas que representam a perda da massa durante o processo de incinerao. . 30

    Figura 4-5 Curva que representa a perda da massa durante o processo de incinerao. ..... 31

    Figura 4-6 Curvas granulomtricas cinza de casca de arroz utilizada na argamassa cp3 e

    cpm3, cp e cpm3 respectivamente.............................................................................................. 34

    Figura 4-7 Evoluo da resistncia compresso ao longo do tempo. .................................. 35

    Figura 4-8 Esquema do processo de moagem das vrias cinzas volantes ............................. 38

    Figura 4-9 Relao entre o dimetro mdia das partculas e o ndice da actividade resistente

    ..................................................................................................................................................... 40

    Figura 4-10 Variao do ndice de actividade pozolnica com o tempo de moagem. ............ 41

    Figura 5-1 Curva granulomtrica da areia de rio. .................................................................... 44

    Figura 5-2 Peneirao da cinza da cinza de casca de arroz. .................................................. 47

    Figura 5-3 (a) Cinza de casca de arroz comercial C ;(b) Cinza de casca de arroz

    peneirada CP . ....................................................................................................................... 48

    Figura 5-4 Curvas granulomtricas da cinza de casca de arroz comercial (C) e da cinza de

    casca de arroz passada pelo peneiro de abertura 500 m (CP). ............................................... 48

    Figura 5-5 Moinho para o ensaio de Los Angeles utilizado na moagem da cinza de casca de

    arroz. ........................................................................................................................................... 49

  • xii

    Figura 5-6 Curvas granulomtricas da cinza de casca de arroz passada em 500 m CP e

    das cinzas de casca de arroz obtidas durante o processo de moagem CPm15, CPm30 . ... 50

    Figura 5-7 Curvas granulomtricas da cinza de casca de arroz passada em 500 m CP e

    das cinzas de casca de arroz obtidas durante o processo de moagem CPm15, CPm30,

    CPm60 e CPm75 . .................................................................................................................... 51

    Figura 5-8 Curvas granulomtricas da cinza de casca de arroz passada em 500 m CP e

    das cinzas de casca de arroz obtidas durante o processo de moagem CPm30 e CPm60 . . 51

    Figura 5-9 Curvas granulomtricas da cinza de casca de arroz passada em 500 m CP e

    da cinza de casca de arroz obtidas durante o processo de moagem CPm60 e CPm75 . .... 52

    Figura 5-10 esquerda Cinza de casca de arroz peneirada CP . direita Cinza de

    casca de arroz moda CPm75 . .............................................................................................. 52

    Figura 5-11 Curvas granulomtricas da cinza obtida aps 75 minutos de moagem e das

    cinzas utilizadas na produo de argamassas resultantes da peneirao CM500, CM250,

    CM125, CM75 . ......................................................................................................................... 53

    Figura 5-12 (a) Cinza de casca de arroz moda CM500 ; (b) Cinza de casca de arroz

    moda direita CM250 . ......................................................................................................... 54

    Figura 5-13 (a) Cinza de casca de arroz moda CM125 ; (b) Cinza de casca de arroz

    moda CM75 . ......................................................................................................................... 54

    Figura 5-14 Anlise granulomtrica da cinza de casca de arroz comercial (C) pelo mtodo de

    peneirao (lavagem e peneirao). ........................................................................................... 57

    Figura 5-15 Anlise granulomtrica da cinza CM500, CM250, CM125 e CM75 por difraco

    laser. ............................................................................................................................................ 58

    Figura 6-1 Ensaios mecnicos e nmero de provetes que foram efectuados sobre cada

    composio na primeira fase do trabalho. .................................................................................. 63

    Figura 6-2 Esquema de ensaios dos provetes prismticos realizados na segunda fase do

    trabalho. ....................................................................................................................................... 64

    Figura 6-3 Esquema de ensaios realizados sobre os provetes constitudos por uma camada e

    acabamento aplicado tijolos cermicos. ..................................................................................... 65

  • xiii

    Figura 6-4 Sequncia de procedimentos da produo de argamassa. (a) Preparao previa

    dos constituintes; (b;c) Pr-mistura manual dos ligantes; (e;f) Perodo inicial de

    amassadura; (g;h) Introduo de areia; (i) Remoo do material das faces laterais; (j;m)

    Perodo final da amassadura. ..................................................................................................... 68

    Figura 6-5 Sequncia de procedimentos da preparao dos provetes prismticos: (a)

    Aparelho de compactao mecnica; (b;e) Colocao da argamassa; (f) Colocao dos

    moldes em cmara saturada. ...................................................................................................... 70

    Figura 6-6 Sequncia de procedimentos da preparao da camada de revestimento em

    tijolos. (a) Molde e tijolo; (b;e) Aplicao da argamassa; (f) Regularizao da camada de

    revestimento; (g;i) Desmoldagem. ........................................................................................... 72

    Figura 6-7 Sequncia de procedimentos realizados para a avaliao da consistncia por

    espalhamento. (a) Colocao de argamassa no molde; (b) - Compactao; (c;d)

    enchimento do molde; (e) Alisamento da superfcie; (g) Limpeza da mesa de espalhamento;

    (h;i) Argamassa; (j) Medio com craveira. .......................................................................... 74

    Figura 6-8 Esquema de ensaio da reteno de gua. ............................................................. 75

    Figura 6-9 Avaliao da reteno de gua. (a) Preparao do material; (b) Ensaio de

    reteno de gua. ....................................................................................................................... 76

    Figura 6-10 Sequncia de procedimentos realizados para a determinao da massa volmica

    aparente.(a) Colocao de argamassa no recipiente; (b;c) Compactao da argamassa;

    (d;e) Alisamento da superfcie; (f) Determinao da massa do conjunto. ............................ 77

    Figura 6-11 Sequncia de procedimentos realizados para a determinao da exsudao. (a)

    Proveta com argamassa isolada; (b) Argamassa em repouso; (c) Determinao da lmina

    liquida de gua. ........................................................................................................................... 79

    Figura 6-12 Determinao da resistncia flexo e compresso. (a) Mquina de ensaio;

    (b) Provetes a ensaiar; (c;d) Ensaio de resistncia flexo; (e;f) Ensaio de resistncia

    compresso. ................................................................................................................................ 81

    Figura 6-13 Calibrao do aparelho e medio directa em provetes prismticos. (a)

    Equipamento; (b;c) Realizao do ensaio de velocidade de propagao de ultra-sons. ........ 82

    Figura 6-14 Calibrao do aparelho e medio indirecta em provetes constitudos por

    argamassa aplicada como camada de revestimento em tijolos. (a) Calibrao do

  • xiv

    equipamento; (b) regularizao da superfcie de contacto; (c;d) Colocao dos

    transdutores; (e;f) Medio do tempo de propagao da onda. .............................................. 84

    Figura 6-15 Determinao da dureza superficial Esclermetro Pendular. (a) Ensaio de

    esclermetro nos pontos principais; (b) Ensaio de esclermetro em pontos secundrios. ..... 85

    Figura 6-16 Sequncia do ensaio de absoro de gua por capilaridade. (a;b)

    Posicionamento dos provetes; (c) Realizao do ensaio. ....................................................... 87

    Figura 6-17 determinao da porosidade aberta. (a) Exsicador ligado a bomba de vcuo;

    (b) Esquema de ensaio (pesagem hidrosttica) ...................................................................... 89

    Figura 6-18 Ensaio de absoro de gua sob baixa presso .................................................. 90

    Figura 6-19 Exemplo de uma curva de secagem. ................................................................... 92

    Figura 6-20 Preparao dos provetes para o ensaio de secagem. ......................................... 93

    Figura 6-21 Procedimentos para a determinao da profundidade de carbonatao. (a)

    Material utilizado; (b;d) Ensaio em provetes de argamassa com cinza de casca de arroz;

    (e;f) Ensaio em provetes de argamassa de referncia. ........................................................... 94

    Figura 7-1 Determinao da relao gua/ligante (Cal). ......................................................... 96

    Figura 7-2 Determinao da relao gua/(mistura ligante) (CM500)..................................... 96

    Figura 7-3 Determinao da relao gua/(mistura ligante) (CM250)..................................... 96

    Figura 7-4 Determinao da relao gua/(mistura ligante) (CM125)..................................... 96

    Figura 7-5 Determinao da relao gua/(mistura ligante) (CM75). ...................................... 97

    Figura 7-6 Relao gua/mistura ligante para a obteno de um espalhamento de 1655mm.

    ..................................................................................................................................................... 98

    Figura 7-7 Influncia da mxima dimenso da cinza na relao gua/(mistura ligante) para a

    obteno de consistncia por espalhamento de 1655mm. ....................................................... 98

    Figura 7-8 Reteno de gua das argamassas estudadas. .................................................... 99

    Figura 7-9 Massa volmica das argamassas estudadas. ...................................................... 100

    Figura 7-10 Exsudao das argamassas estudadas. ............................................................ 101

  • xv

    Figura 7-11 Libertao de gua de amassadura durante o ensaio de espalhamento. ......... 101

    Figura 7-12 Valores mdios das tenses de rotura compresso aos 14 dias de idade. .... 103

    Figura 7-13 Valores mdios das tenses de rotura flexo aos 14 dias. ............................. 103

    Figura 7-14 Valores mdios das tenses de rotura compresso em provetes aos 28 dias de

    idade. ......................................................................................................................................... 105

    Figura 7-15 Valores mdios das tenses de rotura flexo em provetes aos 28 dias de idade.

    ................................................................................................................................................... 105

    Figura 7-16 Valores mdios das tenses de rotura compresso em provetes aos 14 e 28

    dias de idade. ............................................................................................................................ 106

    Figura 7-17 Valores mdios das tenses de rotura flexo em provetes aos 14 e 28 dias de

    idade. ......................................................................................................................................... 106

    Figura 7-18 Influncia da mxima dimenso da cinza de casca de arroz nos valores mdios

    da resistncia mecnica aos 14 e 28 dias de idade. ................................................................ 107

    Figura 7-19 Valores mdios da velocidade de propagao de ultra-sons das diferentes

    argamassas. .............................................................................................................................. 108

    Figura 7-20 Evoluo da velocidade de propagao de ultra-sons avaliada com o mtodo

    indirecto. .................................................................................................................................... 110

    Figura 7-21 Comparao das velocidades de propagao de ultra-sons entre ensaio directo e

    indirecto. .................................................................................................................................... 110

    Figura 7-22 Curvas de absoro de gua por capilaridade. .................................................. 112

    Figura 7-23 Curvas de absoro de gua por capilaridade (0-120 minutos). ....................... 113

    Figura 7-24 Valores de coeficiente de absoro de gua por capilaridade. .......................... 114

    Figura 7-25 Valores assimptticos da absoro de gua por capilaridade. .......................... 114

    Figura 7-26 Valores mdios da porosidade aberta das argamassas estudadas. .................. 116

    Figura 7-27 Valores mdios da massa volmica aparente e real. ......................................... 117

    Figura 7-28 Anlise granulomtrica dos ligantes, efectuada por Almeida ............................. 118

  • xvi

    Figura 7-29 (a) Resistncia mecnica (compresso e flexo) de cada argamassa estudada;

    (b) Resistncia mecnica (compresso e flexo) em funo da porosidade das argamassas.

    ................................................................................................................................................... 118

    Figura 7-30 (a) Influncia da porosidade aberta no coeficiente de absoro de gua por

    capilaridade das argamassas estudadas; (b) Coeficiente de absoro de gua em funo da

    porosidade das argamassas. .................................................................................................... 119

    Figura 7-31 (a) Influncia da porosidade aberta no valor assimpttico das argamassas

    estudadas; (b) Valor assimpttico em funo da porosidade das argamassas .................... 120

    Figura 7-32 (a) Influncia da porosidade aberta na velocidade de propagao de ultra-sons

    das argamassas estudadas; (b) Velocidade de propagao de ultra-sons em funo da

    porosidade das argamassas. .................................................................................................... 120

    Figura 7-33 (a) Valores de absoro de gua a baixa presso das argamassas estudadas;

    (b) Curvas de regresso polinomial dos valores de absoro de gua a baixa presso. ..... 121

    Figura 7-34 Curvas de secagem da argamassa CAL. ........................................................... 123

    Figura 7-35 (a) Curvas de secagem da argamassa A500; (b) Curvas de secagem da

    argamassa A250. ...................................................................................................................... 123

    Figura 7-36 (a) Curvas de secagem da argamassa A125; (b) Curvas de secagem da

    argamassa A75. ........................................................................................................................ 124

    Figura 7-37 Comparao das curvas de secagem mdias das vrias argamassas. ............ 125

    Figura 7-38 Relao entre ndice escleromtrico e resistncia compresso das diferentes

    argamassas. .............................................................................................................................. 126

    Figura 7-39 baco do esclermetro pendular do Tipo PT. .................................................... 127

  • xvii

    NDICE DE TABELAS

    Tabela 2-1 Principais fenmenos de deteriorao..................................................................... 8

    Tabela 2-2 Fontes de humidade mais comuns nos edifcios antigos. ....................................... 8

    Tabela 3-1 Vantagens e desvantagens associadas aos diferentes mtodos de extino da cal

    viva. ............................................................................................................................................. 16

    Tabela 3-2 Classificao, composio e caracterizao de materiais com caractersticas

    pozolnicas ou hidrulicas latentes. ........................................................................................... 18

    Tabela 3-3 Classificao pozolnica de materiais baseada na medio da condutividade. ... 22

    Tabela 4-1 Listagem dos 10 maiores produtores de arroz do mundo. .................................... 24

    Tabela 4-2 Constituies qumic0as das cinzas obtidas por Della e Zhang. .......................... 29

    Tabela 4-3 Mtodos de incinerao controlada da casca de arroz. ........................................ 32

    Tabela 4-4 Mtodos de incinerao no controlada da casca de arroz. ................................. 32

    Tabela 4-5 Caracterizao qumica de cinzas de casca de arroz resultante de vrios estudos.

    ..................................................................................................................................................... 33

    Tabela 4-6 Caractersticas das cinzas de casca de arroz . ..................................................... 35

    Tabela 4-7 Caractersticas fsicas da CCA. ............................................................................. 36

    Tabela 4-8 Resistncia compresso da CCA. ...................................................................... 36

    Tabela 4-9 Propriedades fsicas do cimento e das cinzas volantes analisadas. ..................... 39

    Tabela 4-10 Valores da resistncia compresso e restantes relaes. ............................... 40

    Tabela 5-1 Caracterizao da areia de rio. .............................................................................. 44

    Tabela 5-2 Determinao da baridade da areia de rio. ........................................................... 45

    Tabela 5-3 Ensaios realizados por tipologia de cinza de casca de arroz. ............................... 55

    Tabela 5-4 A anlise qumica obtida pelo ensaio de fluorescncia de raio-X das cinzas C e

    CP. ............................................................................................................................................... 55

  • xviii

    Tabela 5-5 Superfcie especfica Mtodo de Blaine. ............................................................ 56

    Tabela 5-6 Determinao da superfcie especfica pela anlise granulomtrica por difraco

    laser. ............................................................................................................................................ 59

    Tabela 6-1 Composies das argamassas estudadas experimentalmente. ........................... 66

    Tabela 7-1 Caracterizao no estado fresco das diferentes argamassas. .............................. 95

    Tabela 7-2 Resistncia compresso e flexo aos 14 dias de idade. ............................... 102

    Tabela 7-3 Resistncia compresso e flexo aos 28 dias de idade. ............................... 104

    Tabela 7-4 Valores mdios da velocidade de propagao de ultra-sons das diferentes

    argamassas. .............................................................................................................................. 108

    Tabela 7-5 Velocidade de propagao de ultra-sons (ensaio indirecto). .............................. 109

    Tabela 7-6 Valores de coeficiente de absoro de gua por capilaridade, quantidade de gua

    absorvida e valor assimpttico. ................................................................................................. 113

    Tabela 7-7 Valores mdios da porosidade aberta, massa volmica aparente e real das

    diferentes argamassas. ............................................................................................................. 115

    Tabela 7-8 Equaes das regresses polinomiais das diferentes argamassas e os

    respectivos coeficientes de determinao. ............................................................................... 122

    Tabela 7-9 Valores mdios do ndice de secagem das diferentes argamassas estudadas. . 124

    Tabela 7-10 ndice escleromtrico e respectiva resistncia superficial das diferentes

    argamassas. .............................................................................................................................. 126

    Tabela 7-11 Valores mdios da espessura carbonatada das vrias argamassas. ............... 127

  • xix

    SIMBOLOGIA

    Cal Cal area hidratada

    C Cinza de casca de arroz comercial

    CP Cinza de casca de arroz peneirada

    CPm15 Cinza de casca de arroz peneirada e moda durante 15 minutos

    CPm30 Cinza de casca de arroz peneirada e moda durante 30 minutos

    CPm45 Cinza de casca de arroz peneirada e moda durante 45 minutos

    CPm60 Cinza de casca de arroz peneirada e moda durante 60 minutos

    CPm75 Cinza de casca de arroz peneirada e moda durante 75 minutos

    CM500 Fraco de cinza de casca de arroz moda e passada no peneiro de malha 500 mm

    CM250 Fraco de cinza de casca de arroz moda e passada no peneiro de malha 250 mm

    CM125 Fraco de cinza de casca de arroz moda e passada no peneiro de malha 125 mm

    CM75 Fraco de cinza de casca de arroz moda e passada no peneiro de malha 75 mm

    CAL Argamassa de cal area hidratada

    A500 Argamassa de cal area com adio de CM500

    A250 Argamassa de cal area com adio de CM250

    A125 Argamassa de cal area com adio de CM125

    A75 Argamassa de cal area com adio de CM75

  • xx

  • 1

    1 INTRODUO

    1.1 Justificao

    Sendo as argamassas componentes importantes na construo desde h longo tempo, quer

    como revestimento superficial exterior ou interior, quer como aglutinante de outros materiais,

    fundamental o continuado estudo sobre estas.

    Dada a situao do patrimnio edificado em Portugal e considerando que na construo nem

    sempre construir de raiz o mais indicado, o mercado de reabilitao de Portugal apresenta

    fortes possibilidades de expanso, principalmente devido conduta dos pases europeus.

    A este aspecto acrescenta-se, ainda, o aumento da preocupao relativa ao meio ambiente

    levada a cabo pelas tentativas de valorizao e reciclagem de resduos e subprodutos,

    contribuindo para a prtica indispensvel da sustentabilidade. Deste modo, dada importncia

    reduo da degradao ambiental e da utilizao de recursos naturais. Um princpio que

    traduz este pressuposto a utilizao de um material que j se encontra em fim de ciclo para a

    reabilitao do edificado. , ento, imprescindvel conhecer os materiais existentes nas

    construes a reabilitar possibilitando uma adequada seleco dos materiais que melhor

    apresentam solues compatveis com os existentes e ao mesmo tempo, adequados prtica

    construtiva actual.

    As argamassas base de cal area apresentam-se como uma soluo compatvel para a

    reabilitao de alvenarias antigas. Contudo, esto-lhes associadas vrias caractersticas que

    dificultam a sua aplicao neste domnio. A principal dificuldade prende-se com estas

    apresentarem dificuldades de endurecimento em locais de fraco contacto com o dixido de

    carbono presente na atmosfera ou em ambientes muito hmidos.

    Neste contexto, as argamassas de cal com adio de componentes pozolnicos apresentam-

    se como uma interessante alternativa. A possibilidade da presa destas argamassas passar a

    ocorrer tambm por reaces de hidratao permite assim a sua aplicao como argamassas

    de junta e como argamassas de revestimento em condies climticas mais diversificadas.

    Assim sendo, controlando a quantidade de pozolanas, ser possvel formular argamassas com

    diferentes propriedades em funo da finalidade, tendo presente a necessidade de

    compatibilidade em termos mecnicos, fsicos e qumicos.

    Considerando a necessidade de utilizao de subprodutos anteriormente referida assim como

    a adopo de solues que possam envolver uma reduo do consumo de energia, tm sido

  • 2

    desenvolvidos diversos estudos sobre formulaes de argamassas de cal area com

    incorporao de subprodutos industriais com caractersticas pozolnicas. As cinzas de casca

    de arroz apresentam-se como um material com bastante potencialidade neste contexto. Torna-

    se ento essencial conhecer os factores condicionantes da reactividade pozolnica das cinzas,

    de forma a maximizar a sua potencial utilizao na formulao de argamassas.

    Deste modo, o presente trabalho tem como objectivo estudar a aco pozolnica conferida pela

    adio de cinzas de casca de arroz em argamassas de cal area e avaliar a influncia da sua

    granulometria no desempenho das argamassas.

    A presente dissertao enquadra-se num projecto de investigao que tem como objectivo

    estudar formulaes de argamassa de cal area com incorporao de cinzas de casca de arroz

    com potencial interesse para a aplicao em revestimentos de paredes de edifcios antigos.

    Este projecto surge no seguimento do estudo desenvolvido por Almeida (2008) e foi

    desenvolvido em parceria com um estudo intitulado Argamassas de cal area com adio de

    cinza de casca de arroz. Influncia das condies de cura desenvolvido por Marques (2010).

    Os trabalhos tiveram em comum uma primeira fase, onde foram definidas as granulometrias da

    cinza de casca de arroz a utilizar no desenvolvimento de ambas as dissertaes. No mbito

    dos estudos realizados para a seleco das granulometrias a utilizar na formulao das

    argamassas a estudar, encontra-se publicado o artigo intitulado Argamassas de cal area e

    cinza de casca de arroz. Influncia da finura na reactividade pozolnica, (Ferreira Pinto et al.,

    2010). Tambm se encontra publicado o artigo Effect of Rice Husk Ash Particle Size in Lime

    Based Mortars (Ferreira Pinto et al., 2010).

  • 3

    1.2 Objectivos da dissertao

    O trabalho desenvolvido d continuidade ao estudo que tem sido realizado sobre argamassas

    de cal area com incorporao de cinzas de casca de arroz, nomeadamente o trabalho

    desenvolvido em Almeida (2008). O principal objectivo desta dissertao o estudo da

    influncia da finura de uma cinza de casca de arroz na reactividade pozolnica, atravs da

    avaliao de diversas caractersticas nomeadamente da resistncia mecnica de argamassas

    de cal area com incorporao de cinzas de granulometrias diferentes.

    1.3 Estrutura e organizao da dissertao

    A presente dissertao est organizada em nove captulos, os quais, para alm da presente

    introduo (captulo 1), das concluses e propostas para desenvolvimentos futuros (captulos 8

    e 9), agrupam-se em duas partes distintas.

    Na primeira parte, apresenta-se um estado de arte que se desenvolve nos captulos 2 a 4. No

    captulo 2, so abordados os conceitos gerais para intervenes em edifcios antigos, onde se

    apresentam os requisitos de compatibilidade e durabilidade a exigir s novas argamassas.

    No captulo 3, referente a argamassas de cal area e componentes pozolnicos, alm da breve

    introduo da cal area e do tratamento que lhe est associado, apresenta os materiais

    pozolnicos e as suas caractersticas, enumerando alguns mtodos de avaliao da

    reactividade pozolnica.

    O captulo 4 aborda o caso concreto da casca de arroz, a qual possui caractersticas que

    mediante uma transformao adequada permite obter uma cinza com propriedades

    pozolnicas. Deste modo, neste captulo so apresentadas as propriedades da casca de arroz,

    bem como os conceitos inerentes ao seu processo de transformao em cinza. Este captulo

    aprofunda ainda as propriedades pozolnicas das cinzas de casca de arroz, assim como a

    influncia da granulometria das cinzas nessas mesmas propriedades.

    A segunda parte da dissertao apresenta e descreve o desenvolvimento experimental e inclui

    os captulos 5 a 7.

    O captulo 5 descreve a preparao e caracterizao de todas os materiais (areia de rio, cal

    area e cinza de casca de arroz) utilizadas na formulao das argamassas estudadas, sendo

    dada especial nfase ao processo de peneirao e moagem aplicado cinza de casca de

    arroz.

  • 4

    No captulo 6, procede-se apresentao do plano de ensaios bem como descrio dos

    procedimentos de todos os ensaios realizados no mbito do presente trabalho.

    O captulo 7 apresenta numa fase inicial a justificao para a escolha das argamassas

    estudadas. Posteriormente, procede-se anlise detalhada dos resultados obtidos nos

    diferentes ensaios, tendo sempre presente a influncia da granulometria da cinza de casca de

    arroz nesses mesmos resultados.

    O captulo 8, como referido, sintetiza a anlise dos resultados, apresentando as concluses de

    todo o trabalho desenvolvido. As concluses finais so apresentadas tendo em vista o

    cumprimento dos objectivos propostos, ou seja, apresenta-se a influncia da finura das cinzas

    de casca de arroz nas argamassas de cal area.

    Por fim, o captulo 9 apresenta propostas para desenvolvimentos futuros.

  • 5

    2 ARGAMASSAS DE CAL AREA EM EDIFCIOS ANTIGOS

    Neste captulo, faz-se uma breve introduo ao uso de argamassas de cal area em edifcios

    antigos, onde so abordados os conceitos gerais para as intervenes nesses mesmos

    edifcios. Enumera-se ainda um conjunto de requisitos que as argamassas a usar na

    reabilitao devem respeitar.

    2.1 Consideraes gerais

    Os primeiros vestgios da utilizao da cal pelo homem remontam ao incio da Idade da Pedra,

    no perodo Paleoltico, aps a descoberta do fogo. No entanto, as primeiras referncias

    utilizao da cal na construo remontam ao perodo compreendido entre 12000 e 5000 a.c.

    em algumas zonas da Turquia (Cavaco, 2005; Silva, 2006).

    Na construo da Pirmide de Shersi no Tibete, datada de 5000 a.c., a estabilizao do solo

    argiloso foi efectuada com o recurso cal. Atravs de anlises efectuadas aos materiais

    utilizados no revestimento das cmaras da Piramide de Quops assim como nas juntas dos

    blocos de calcrio e granito da Pirmide de Qufren, foram tambm encontrados vestgios de

    cal (Guimares, 2002; Cowan, 1977).

    A civilizao grega evidenciou o uso em grande escala de argamassas de cal, atravs da sua

    aplicao em revestimentos de paredes. Contudo, foi no imprio romano que definitivamente

    se desenvolveu o conhecimento associado aplicao da cal na construo. Este processo foi

    motivado pela constante expanso territorial que impunha uma necessidade de desenvolver

    tcnicas mais rpidas e econmicas de fabrico de cal (Ferreira Pinto et al., 2006/2007).

    Alm do uso das argamassas de cal, os romanos assumiram um papel importantssimo no

    estudo da influncia das adies pozolnicas, adquirindo o conhecimento de quando e como

    aplic-las. Deste modo, a sua aplicao em revestimentos de vrias camadas com espessuras

    elevadas e a conjugao das caractersticas dos seus elementos em termos de compatibilidade

    de materiais, permitiram que as argamassas de cal e adies comeassem a desempenhar um

    papel estrutural e de proteco gua (Ferreira Pinto et al., 2006/2007).

    A erupo do Vesvio em 79 D.C., que cobriu com um manto de cinza as cidades de Pompeia

    e Herculano, permitiu a descoberta das vantagens do uso das cinzas em argamassas,

    contribuindo para o conhecimento da aplicao de adies, em particular das pozolanas

    naturais. So exemplo da aplicao de argamassas base de cal e pozolanas, assim como da

    durabilidade que lhe est associada, o Coliseu e o Panteo em Roma, bem como o aqueduto

    de Pont du Grad no sul de Frana (Margalha, 2008).

  • 6

    Aps o fim do Imprio Romano e durante a Idade Mdia, o uso de argamassas de cal tornou-se

    pratica corrente. Contudo, o custo da produo da cal reflectiu-se na qualidade da argamassa

    base da mesma. Com a entrada dos Califados rabes na Pennsula Ibrica no sculo XVIII,

    chegou tambm a prtica de argamassas base de gesso. Aps esta data, tornou-se habitual

    o fabrico de argamassas de cal area e de gesso com a adio de vrios produtos, como

    gorduras vegetais e animais. A introduo do gesso permitiu uma menor retraco da

    argamassa assim como um menor tempo de presa. A argamassa de cal com a adio de

    pozolanas ou de gesso teve o seu momento de maior utilizao no sculo XX. Porm, foi neste

    perodo que se descobriu o cimento Portland e a cal hidrulica. Este acontecimento marcou o

    progressivo desuso das argamassas de cal na construo, dadas as caractersticas que estes

    novos ligantes conferiam s argamassas tais como o aumento das resistncias mecnicas e a

    reduo do tempo de endurecimento das mesmas, que permitiam um encurtamento no tempo

    de construo das obras (Alvarez et al., 2005).

    A generalizao da utilizao dos ligantes hidrulicos teve como consequncia o actual

    desconhecimento por parte dos intervenientes na construo em relao aos procedimentos e

    cuidados associados utilizao e aplicao de argamassas de cal area (Botelho, 2003;

    Ferreira Pinto et al., 2006/2007). No entanto, tem-se agora constatado que os ligantes

    hidrulicos so responsveis por vrias anomalias que surgem aps a sua aplicao na

    reabilitao de edifcios. Tal deve-se ao facto da sua incompatibilidade qumica com as

    argamassas de cal area, pela introduo de sais solveis, pela sua baixa permeabilidade e

    pelo seu elevado mdulo de elasticidade, o que impossibilita a compatibilidade de deformaes

    com os elementos da alvenaria. Deste modo, as argamassas de cal area voltam a apresentar

    um papel relevante na construo, em particular nas alvenarias de pedra, sendo importante

    voltar a fomentar o seu uso e a sua compreenso.

    2.2 Argamassas de cal area para paredes de edifcios antigos

    2.2.1 Principais anomalias em argamassas de cal area e princpios

    orientadores de interveno face s anomalias

    As causas da degradao dos rebocos exteriores em edifcios antigos podem assumir

    diferentes formas, podendo estas ser classificadas como de origem estrutural ou no estrutural.

    Contudo, interessa apenas referir as que ocorrem com maior frequncia neste contexto, ou

    seja, o envelhecimento e a incompatibilidade dos prprios materiais, a presena de gua e de

    sais solveis (Appleton, 2003; Magalhes, 2002).

  • 7

    Importa ainda realar que grande parte das anomalias verificadas no so independentes das

    caractersticas do prprio suporte, as paredes dos edifcios antigos. Este factor ganha maior

    importncia se considerarmos que estes tipos de parede possuem uma tipologia e um

    funcionamento totalmente diferente das paredes actuais (Appleton, 2003). As paredes antigas

    foram definidas para desempenharem um papel estrutural e ao mesmo tempo de proteco do

    interior das construes, garantindo deste modo as exigncias mnimas de segurana

    estrutural e de conforto face aos agentes atmosfricos do exterior (Veiga, 2006).

    Tendo em considerao os ltimos factores apresentados, as paredes dos edifcios antigos

    apresentam usualmente uma espessura elevada, sendo constitudas por materiais com

    resistncias inferiores e com maior porosidade que os materiais actuais. Devido s

    caractersticas dos materiais e ao seu processo construtivo, as paredes conseguem manter um

    equilbrio hdrico razovel, possibilitando a evaporao rpida da gua presente, que resulta de

    fenmenos de ascenso capilar ou de infiltrao atravs de paramentos, garantindo que muitas

    construes se tenham mantido at aos nossos dias.

    Na Tabela 2-1 apresentam-se os vrios tipos de fenmenos de deteriorao que possibilitam a

    degradao dos materiais constituintes, pedras, tijolos e argamassas. Tais fenmenos no s

    danificam os elementos anteriormente referidos como ainda deterioram as ligaes entre os

    elementos da alvenaria e das camadas de revestimento, possibilitando uma progressiva

    degradao da alvenaria.

    Entre os fenmenos de degradao apresentados na Tabela 2-1, a aco da gua sempre foi,

    e continua a ser, um dos principais agentes que contribui para a deteriorao dos materiais

    existentes neste tipo de suporte (Appleton, 2003; Magalhes, 2002). Na Tabela 2-2

    apresentam-se ainda as principais fontes de humidade que podem interferir com os

    revestimentos das paredes antigas.

    importante ter em considerao que na maioria das patologias a sua complexidade e a

    gravidade so majoradas pela conjugao de mais do que uma causa patolgica, tendo como

    consequncia o seu agravamento, como o caso das fissuras que possibilitam o aumento da

    humidade no interior dos rebocos ou das alvenarias.

  • 8

    Tabela 2-1 Principais fenmenos de deteriorao (Almeida, 2008)

    Designao Causas mais provveis

    Fsicos Causados pelas variaes de temperatura,

    eroso provocada pela gua e vento.

    Fsico-qumicos

    Fenmenos de deteriorao que se encontram associados cristalizao de sais ou

    hidratao de cristais.

    Qumicos Degradao devida, essencialmente,

    formao de sulfatos como consequncia da poluio atmosfrica.

    Biolgicos Degradao provocada pela aco de microrganismos, plantas ou at mesmo

    resultantes da aco do homem.

    Refira-se ainda que grande parte das anomalias no de fcil eliminao, principalmente

    devido sua natureza. Por exemplo no caso da fissurao, devem ser bem analisadas as suas

    causas previamente a qualquer tipo de interveno, para que no se executem trabalhos cuja

    eficincia se possa vir a constatar que bastante baixa, ou que possa at facilitar o

    aparecimento de novas fissuras.

    Tabela 2-2 Fontes de humidade mais comuns nos edifcios antigos (Magalhes, 2002).

    Tipo de humidade Causas mais provveis

    De obra ou construo

    Tem origem na gua de amassadura.

    De terreno

    Existncia de zonas de paredes em contacto com a gua do solo; Existncia de materiais de elevada capacidade de absoro de gua

    por capilaridade nas paredes; Inexistncia ou deficiente posicionamento de barreiras estanques nas paredes.

    De precipitao Revestimentos com elevada permeabilidade gua.

    De condensao Ocorrncia de condensaes, geralmente quando a temperatura

    superficial das paredes em contacto com o ar hmido atinge o ponto de orvalho.

    Devida a fenmenos de

    higroscopicidade

    Existncia de sais higroscpicos no interior dos revestimento que fixam a gua em grandes quantidades, constituindo uma espcie de depsito de gua, permitindo a dissoluo de mais sais, originando

    assim um fenmeno em cadeia.

    Devido a causas fortuitas

    Humidade com origens acidentais, tais como roturas de canalizaes em rede de guas e esgotos, entupimentos de caleiras, algerozes,

    tubos de queda, corroso de canalizaes metlicas, deficincias de remates da cobertura, entre outras.

    Considerando o acima exposto, importante perceber que para cada tipo de interveno em

    rebocos anmalos deve-se analisar previamente o seu real estado de conservao, de modo a

    ser determinado o grau de severidade assim como a verdadeira causa da anomalia. Deste

    modo, os projectos de recuperao e/ou reabilitao em edifcios antigos devero compreender

    quatro etapas: Anamnese e Anlise, Diagnstico, Terapia e Controlo (Almeida, 2008).

  • 9

    Na primeira fase, designada por Anamnese e Anlise, efectuada uma compilao histrica e

    uma anlise preliminar, atravs de uma inspeco visual onde se realiza um mapeamento das

    patologias. Na fase de Diagnstico, realizam-se vrios ensaios de modo a identificar as causas

    das anomalias, permitindo tambm uma caracterizao qumica, fsica, mineralgica e

    mecnica das argamassas existentes. A fase da Terapia a fase onde se realizam as

    intervenes nos rebocos. Finalmente, a fase de Controlo a fase ps interveno, onde se

    realiza uma monitorizao peridica, com o objectivo de avaliar a evoluo do estado das

    argamassas com o tempo. Esta fase desempenha um papel muito importante com vista a

    novas reabilitaes, uma vez que atravs desta que se podero criar bases de dados,

    elementos estes que podero facilitar e melhorar qualquer uma das quatro etapas num futuro

    processo de reabilitao/recuperao.

    Almeida apresentou de uma forma esquemtica, uma proposta de metodologia a adoptar em

    intervenes que envolvam argamassas, a qual foi baseada em metodologias previamente

    propostas por outros autores (Almeida, 2008). Este esquema apresentado na Figura 2-1.

    Apesar de j referido anteriormente, interessa realar que o presente trabalho incide sobre as

    argamassas destinadas proteco das camadas subjacentes, mais concretamente, sobre o

    caso dos rebocos exteriores. No se inclui o revestimento de paramentos interiores neste

    estudo uma vez que estes, estando expostos a uma menor quantidade de agentes de

    degradao, no necessitam de requisitos de durabilidade to exigentes.

    Por fim, importa referir que uma interveno do reboco (conservao, consolidao, reparao

    localizada, substituio parcial ou total) com o recurso a argamassa dever ser programada

    nas diferentes fases de modo a sustentar as opes tomadas. A escolha do tipo de interveno

    depender sempre de factores tcnicos como o estado de conservao da argamassa,

    avaliado pelo tipo e severidade da anomalia constatada. Alm destes factores, o tipo de

    interveno depender ainda das possibilidades existentes assim como dos meios e

    oramentos disponveis, sem esquecer os factores respeitantes ao seu valor patrimonial e ao

    prprio edifcio.

  • 10

    Figura 2-1 Esquema da metodologia proposta para interveno envolvendo a aplicao de novas argamassas (Almeida, 2008).

    Inspeco visual:

    Compilao histrica;

    Mapeamento de patologias com recurso a levantamentos fotogrficos.

    Pesquisa histrica

    Levantamento de intervenes anteriores (materiais utilizados)

    Caracterizao das argamassas e seu estado de degradao

    Ensaios realizados in situ: o Cachimbos, esclormetros, ultra-sons.

    Ensaios realizados em laboratrio o Caracterizao fsica: porosidade, porometria; o Caracterizao mecnica: resistncias; elasticidade,

    deformabilidade; o Caracterizao qumica e mineralgica: tipo e

    proporo de ligantes; o Anlise microscpica: tipo de agregado, presena de

    sais solveis.

    Caracterizao das condies ambientais do local de interveno.

    Definio da constituio da argamassa:

    Caracterizao das matrias-primas: ligantes, agregados, adies.

    Definio das formulaes de argamassas a testar: o Caracterizao fsica, qumica e mecnica das

    argamassas frescas e endurecidas; o Verificao de requisitos.

    Seleco das formulaes de argamassas a testar in situ: o Realizao de painis experimentais; o Ensaios realizados in situ.

    Seleco da formulao e/ou formulaes de argamassas a aplicar;

    Aplicao.

    Inspeces ao local para avaliao do estado da nova argamassa ou

    sistema de argamassas aps a sua aplicao. Contr

    olo

    T

    era

    pia

    D

    iag

    nstico

    A

    na

    mnese

  • 11

    2.2.2 Caractersticas das argamassas para rebocos exteriores de

    edifcios antigos

    Devido s condies atmosfricas e aos agentes de degradao, os rebocos das paredes

    exteriores expostos a estes elementos, apresentam frequentemente anomalias que definem o

    seu grau de conservao. Uma vez que os rebocos apresentam tambm um papel de

    proteco dos elementos do suporte, o estado destes mesmos elementos est sempre

    dependente do estado de degradao dos rebocos.

    Deste modo, o primeiro requisito a respeitar na formulao de argamassas de rebocos

    exteriores para edifcios antigos dever ser o da proteco dos estratos subjacentes. Este

    primeiro requisito est directamente relacionado com o princpio da compatibilidade de

    materiais (Henriques, 2004), o qual ser apresentado no subcaptulo 2.2.2.1.

    O segundo, e no menos importante requisito a ser respeitado para que todas as propriedades

    da argamassa adquiram significado, o conjunto das caractersticas relacionadas com a

    durabilidade da prpria argamassa. Tal desempenha um papel preponderante numa

    reabilitao pois s assim ser possvel garantir uma proteco mais duradoura dos substratos

    assim como a manuteno do aspecto esttico que se exige, contribuindo deste modo para o

    aumento do perodo de vida til do elemento ou do edifcio (Henriques, 2004).

    Interessa ainda referir, mesmo no fazendo parte do mbito deste trabalho, que as tcnicas de

    execuo dos rebocos so tambm um factor fundamental para que sejam cumpridos os

    diferentes princpios associados reabilitao dos rebocos (Cavaco et al., 2003).

    Contudo, muitas vezes as solues adoptadas para as intervenes no so as mais

    adequadas tendo como consequncia o agravamento ou o desenvolvimento de processos de

    degradao. Uma das solues mais adoptadas a remoo e a substituio total dos rebocos

    antigos por novas argamassas sem que exista um conhecimento adequado do potencial dessa

    argamassa de reparao e sem se analisar as causas das anomalias observadas (Veiga et al.,

    2002).

    Concluindo, as argamassas para rebocos exteriores de edifcios antigos no devem contribuir

    para a degradao dos elementos j existentes nem para a descaracterizao dos elementos

    ou do edifcio, devendo por isso evidenciar um conjunto de caractersticas necessrias para

    que se apresentem como soluo durvel e compatvel com os suportes onde aplicadas

    (Ferreira Pinto et al., 2006/2007; Veiga, 2005; Veiga, 2003).

  • 12

    2.2.2.1 Requisitos e caractersticas relacionadas com a proteco dos

    substratos

    Como referido nos subcaptulos anteriores, para que se possa assegurar a proteco dos

    substratos, necessrio que se verifique uma compatibilidade entre a argamassa utilizada na

    interveno e os elementos do substrato. Esta compatibilidade dever ser avaliada em trs

    grupos: mecnica, fsica e qumica. No estudo desenvolvido em Almeida (2008), apresentada

    uma descrio desse grupo, como se indica seguidamente:

    Compatibilidade mecnica:

    As argamassas devem apresentar resistncias mecnicas e mdulos de elasticidade

    semelhantes s argamassas originais e inferiores s do suporte, para que

    acompanhem os movimentos do suporte e deste modo no se verifiquem elevadas

    tenses internas. Nas situaes em que os rebocos so constitudos por diferentes

    argamassas, as resistncias destas devero ser decrescentes do interior para o

    exterior enquanto que a deformabilidade dever ser crescente.

    A aderncia ao suporte dever ser caracterizada por uma rotura adesiva ou coesiva

    pelo reboco.

    Para que se evite a formao de fissuras, dever ser garantida a estabilidade

    dimensional ao longo do termo da argamassa. Se o reboco foi executado com o

    recurso a vrias camadas, este requisito dever ser verificado na camada exterior para

    que se evitem tenses no suporte ou na prpria argamassa que poderiam conduzir

    perda de adeso entre ambos.

    Compatibilidade fsica:

    A absoro de gua por capilaridade das argamassas dever ser a menor possvel,

    devendo ser semelhante da argamassa utilizada no reboco original e inferior do

    suporte.

    Em relao permeabilidade ao vapor de gua, esta dever ser semelhante da

    argamassa utilizada no reboco original e superior do suporte, permitindo assim a

    libertao de gua de infiltrao.

    Dever ser utilizada uma argamassa com um coeficiente de dilatao trmica o mais

    semelhante ao do suporte para que, na presena de gradientes trmicos e associada a

    um baixo mdulo de elasticidade, no origine grandes deformaes e

    consequentemente no se verifiquem tenses de origem trmica.

  • 13

    Compatibilidade qumica:

    A argamassa no dever ser rica em sais solveis, pois a sua libertao poder ser

    prejudicial para os elementos do suporte, tendo como consequncia o agravamento ou

    o desenvolvimento de aces de degradao.

    2.2.2.2 Requisitos e caractersticas relacionadas com a durabilidade das

    argamassas

    Os agentes de deteriorao que podem gerar e agravar esses fenmenos so os sais solveis,

    a gua, organismos, microrganismos e todas as condies ambientais. De seguida, e tendo

    tambm como base o estudo desenvolvido em (Almeida, 2008), enumeram-se as

    caractersticas que as argamassas devero possuir para a interveno em rebocos exteriores,

    de modo a respeitar as exigncias necessrias a um adequado desempenho:

    Permeabilidade ao vapor de gua que permita a sada da gua infiltrada ou o

    transporte de sais solveis para o exterior. No caso em que estes existam nas

    argamassas, a sua cristalizao deve ocorrer na superfcie exterior, formando assim

    eflorescncias, patologia esta muito menos abrasiva que as criptoflorescncias.

    Resistncia aco de sais solveis. Nos edifcios antigos frequente a presena

    destes sais no interior das paredes, sendo a resistncia das argamassas s aces

    destes sais um aspecto importante a ter em considerao na formulao da argamassa

    a aplicar. Deste modo, para fazer face aos sais que provocam degradao nas

    argamassas atravs de ataques qumicos, a argamassa a aplicar dever possuir baixos

    teores de silicatos e aluminatos. Por outro lado, para fazer face aos sais solveis que

    causam degradao nas argamassas por aces mecnicas, isto , por alteraes

    cclicas do volume dos respectivos sais no interior dos poros, a argamassa dever

    possuir uma resistncia mecnica elevada, assim como uma elevada porometria.

    Uma boa resistncia a ciclos de gelo degelo quando a argamassa aplicada em

    climas frios, o que ser possvel se a argamassa possuir uma reduzida absoro de

    gua e uma resistncia mecnica capaz de suportar as tenses geradas durante a

    gelidificao.

    Boa resistncia colonizao biolgica que ser conseguida se for garantido um bom

    comportamento da argamassa face gua, assim como uma baixa percentagem de

    elementos orgnicos na constituio da mesma, uma vez que a presena de fungos

    bastante potenciada pela presena prolongada de humidade.

  • 14

  • 15

    3 ARGAMASSAS DE CAL AREA E COMPONENTES

    POZOLNICOS

    Este captulo descreve as argamassas de cal area com adio de produtos com

    caractersticas pozolnicas. Enumera ainda alguns mtodos de avaliao da reactividade

    pozolnica desses componentes.

    3.1 Cal area

    A matria-prima que origina a cal area a rocha de calcrio com baixo teor de impurezas

    devendo essa apresentar uma percentagem superior a 95 % de carbonato de clcio ou

    carbonato de clcio e de magnsio. Esta diferenciao de elementos na sua constituio

    origina uma denominao distinta. Se o teor de magnsio na matria-prima for superior a 20 %,

    a cal designa-se por cal magnesiana. Caso contrrio, a cal denomina-se por cal clcica

    (Cavaco, 2005).

    No passado eram utilizadas duas denominaes para a cal: cais gordas e cais magras. Estas

    ltimas apresentam uma cor menos clara assim como uma resistncia mecnica inferior. Em

    relao sua constituio, o seu teor de carbonato de clcio situa-se entre os 95 % e os 99 %,

    enquanto que nas cais gordas, este teor superior a 99 %. Um outro aspecto que difere nestes

    dois tipos de cal o incremento de volume que existe em ambas aquando da sua extino,

    sendo o da cal gorda superior (Cavaco, 2005).

    Em relao s principais etapas associadas produo e endurecimento da cal area,

    interessa referir que podem ser divididas em trs fases: calcinao, hidratao ou extino e

    carbonatao. A calcinao ocorre num forno cuja temperatura ronda os 900 C, o que

    possibilita a cozedura dos calcrios, que causa a transformao do carbonato de clcio

    (CaCO3) em dixido de carbono e xido de clcio (CaO), composto este vulgarmente

    conhecido por cal viva (Cavaco, 2005; Botelho, 2003).

    [3-1]

    A hidratao ou extino da cal uma fase fundamental, uma vez que a cal viva no possui

    caractersticas de ligante, necessitando previamente de ser hidratada. A hidratao, que resulta

    da mistura do xido de clcio com gua, desencadeia uma reaco muito expansiva e

    exotrmica, originando a sua desagregao com efervescncia transformando o xido de

    clcio em hidrxido de clcio (Ca(OH)2). Este produto que se designa por cal apagada,

  • 16

    hidratada ou extinta, utilizado como ligante (Cavaco, 2005; Botelho, 2003). A equao

    qumica que descreve o processo de hidratao apresentada de seguida.

    [3-2]

    A extino da cal viva pode ser realizada por trs processos distintos (asperso, imerso e

    tambm atravs da mistura com areia molhada, dos quais resultam, respectivamente, a cal em

    p, a cal em pasta e uma argamassa de cal e areia) (Faria-Rodrigues, 2004). Almeida (2008)

    ao citar Faria-Rodrigues (2004), apresenta uma tabela com as vantagens e as desvantagens

    dos respectivos mtodos de extino da cal viva.

    Tabela 3-1 Vantagens e desvantagens associadas aos diferentes mtodos de extino da cal viva (Faria-Rodrigues, 2004).

    Mtodos de extino

    Vantagens Desvantagens

    Asperso

    Facilidade de transporte, armazenamento e utilizao;

    Facilita processos industriais; Mais adequada para cais hidrulicas.

    No optimiza a plasticidade; Necessidade de controlo elaborado para garantir

    hidratao completa.

    Imerso

    Garante a hidratao completa; Reduz a dimenso das partculas (maior reactividade); Aumenta a

    plasticidade e reduz a quantidade de gua.

    Inadequada para cais hidrulicas; Processo

    perigoso (calor e causticidade); Necessidade

    de perodo prolongado.

    Atravs de areia molhada

    Envolvimento total dos agregados pela pasta; Menos gua para obter

    plasticidade; Menor retraco e maior durabilidade das argamassas;

    Trao mais forte em ligante.

    Requer tempo, espao e boa execuo in situ; Geralmente reservado para trabalhos de conservao importantes.

    Durante o processo de endurecimento da cal area ocorrem dois fenmenos principais, a

    evaporao da gua em excesso e a reaco do hidrxido de clcio com o dixido de carbono

    presente na atmosfera, reaco esta conhecida por carbonatao. Associadas a estes

    fenmenos esto a libertao de calor e a formao de carbonato de clcio. O fenmeno de

    carbonatao pode ser traduzido pela seguinte equao da reaco (Cavaco, 2005):

    [3-3]

  • 17

    A reaco de carbonatao desenvolve-se durante vrios meses, ocorrendo do exterior para o

    interior da argamassa. Como tal, para um adequado desenvolvimento do fenmeno de

    carbonatao necessrio que a argamassa seja suficientemente porosa de modo a permitir a

    evaporao da gua em excesso, assim como possibilitar a penetrao do dixido de carbono

    do ar para o seu interior (Ferreira Pinto et al., 2006/2007).

    3.2 Definio de materiais pozolnicos

    Coutinho define os materiais pozolnicos como produtos naturais ou artificiais constitudos

    essencialmente por slica e alumina que, apesar de no terem por si s propriedades

    aglomerantes e hidrulicas, contm constituintes que s temperaturas ordinrias se combinam,

    em presena de gua, com o hidrxido de clcio, originando compostos de grande estabilidade

    na gua e com propriedades aglomerantes (Coutinho, 2006).

    As pozolanas podem ser classificadas em duas categorias: as pozolanas naturais e as

    artificiais.

    As pozolanas naturais so materiais com elevada percentagem de slica amorfa e que podem

    ser divididas consoante a sua origem: as de origem vulcnica (Pozolanas dos Aores,

    Pozolanas do Porto Santo, Pozolanas de Santo Anto, Pozolanas Italianas, Terras de

    Santorini, etc.) e as de origem sedimentar (Terra diatomcea/ diatomite) (Lea, 1970; Taylor,

    1972). Quer nas pozolanas de origem vulcnica, quer nas de origem sedimentar, o local da

    origem das mesmas desempenha uma forte influncia na sua composio e reactividade

    pozolnica. Um outro aspecto que tambm define as pozolanas naturais o facto de no

    necessitarem de um tratamento especial alm da sua extraco e de uma possvel moagem

    (Coutinho, 2006).

    Por sua vez, as pozolanas artificiais podem ser obtidas atravs de tratamentos trmicos

    (calcinao) de materiais rochosos com constituio predominantemente siliciosa ou atravs de

    subprodutos industriais, como o caso das cinzas de casca de arroz, material utilizado no

    presente estudo.

    Almeida (2008), com base no estudo desenvolvido por Metha (1983), elaborou uma tabela

    (Tabela 3-2) onde apresenta uma classificao de materiais com caractersticas pozolnicas ou

    hidrulicas latentes (Almeida, 2008). De realar que nesta tabela esto includas as escrias de

    alto-forno, subproduto da industria do ao, material este que apresenta uma constituio muito

    semelhante do cimento, sendo considerado um ligante hidrulico por vrios autores (Charola

    et al., 1995; Coutinho, 2006).

  • 18

    Tabela 3-2 Classificao, composio e caracterizao de materiais com caractersticas pozolnicas ou hidrulicas latentes (Almeida, 2008).

    Classificao Composio qumica e

    mineralgica Caractersticas das partculas

    Po

    zo

    lan

    as

    co

    m p

    rop

    rie

    da

    des

    hid

    ru

    lic

    as l

    ate

    nte

    s

    Escrias de alto-forno

    Constitudas essencialmente por silicatos, contendo maioritariamente clcio, magnsio, alumina e slica. Compostos cristalinos do grupo da melilite podem ser encontrados em

    pequenas quantidades.

    O material no tratado possui o tamanho da areia e contm cerca de

    10 a 15% de fraco no slida. Antes de ser usada, seca e moda

    em partculas de dimenses inferiores a 45 m (geralmente com

    cerca de 500 m2/kg Blaine). As

    partculas possuem uma textura rugosa.

    Cinza volante com elevado teor de clcio

    Constitudas por silicatos amorfos de clcio, magnsio, alumina e alcalis. A

    pequena quantidade de matria cristalina consiste geralmente em quartzo e C3A; poder tambm

    ocorrer cal livre e perclases; CS e C4A3S podem tambm ocorrer no

    caso de serem utilizados arrefecimentos rpidos com

    sulfuretos.

    As partculas modas correspondem de 10 a 15% de partculas com dimenses superiores a 45 m

    usualmente de 200-300 m2/kg Blaine.

    A maior parte das partculas so esferas slidas com dimetro mdio

    inferior a 20 m. As partculas apresentam uma textura lisa mas no

    tanto como nas cinzas volantes de baixo teor de clcio.

    Po

    zo

    lan

    as

    de

    ele

    va

    da

    rea

    cti

    vid

    ad

    e Slica de fumo

    Consistem essencialmente em slica pura no estado amorfo.

    Extremamente fina de forma esfrica com dimetros mdios de 0,1 m

    (superfcie especfica de aproximadamente 20 m

    2/g por

    adsoro de nitrognio)

    Cinza de casca de arroz

    Consistem essencialmente em slica pura no estado amorfo.

    Partculas de dimenso geralmente inferiores a 45 m e extremamente celulares (superfcie especfica de

    aproximadamente 60 m2/g por

    adsoro de nitrognio).

    Po

    zo

    lan

    as

    no

    rma

    is

    Cinza volante de baixos valores de

    clcio

    Constitudas maioritariamente por silicatos amorfos de alumina, ferro e lcalis. A pequena parte da matria cristalina consiste, geralmente, em quartzo, hematite e magnetite. A

    presena de carbono geralmente inferior a 5% podendo, no entanto,

    ser superior a 10%.

    15 a 30% de partculas com dimenses superiores a 45 m (usualmente de 200-300 m

    2/kg

    Blaine). A maior parte das partculas so esferas slidas com dimetro

    mdio de 20 m. As partculas apresentam uma textura lisa.

    Po

    zo

    lan

    as

    frac

    as Escrias e

    cinzas de arrefecimentos

    lentos

    Consistem essencialmente em minerais de slica cristalina e apenas uma pequena quantidade de matria

    no cristalina.

    Os materiais devem ser pulverizados de modo a obter-se partculas muito

    finas e conferir-lhes alguma actividade pozolnica. As partculas modas apresentam uma textura lisa.

    3.3 Reactividade das pozolanas

    A reactividade pozolnica pode designar-se como a capacidade que as pozolanas tm em se

    combinar quer com o hidrxido de clcio, quer com os constituintes do cimento hidratado na

  • 19

    presena de gua, para formarem silicatos e aluminatos de clcio hidratados, do tipo que se

    desenvolvem com a hidratao dos ligantes hidrulicos (Coutinho, 2006).

    Neste contexto, importante diferenciar a hidratao do cimento da reaco pozolnica

    (Almeida, 2008; Velosa, 2006). Um dos aspectos que se evidencia em primeiro lugar o facto

    que na hidratao do cimento, os principais compostos do tipo silicatos e aluminatos estarem

    no estado cristalino, decompondo-se rapidamente na gua em ies de silicatos e aluminatos,

    formando compostos de hidratao. J na reaco pozolnica, para que a slica e a alumina se

    combinem com o hidrxido de clcio, necessrio que se apresentem na forma de partculas

    de pequenas dimenses e no estado amorfo. Assim sendo, nem todos os materiais contendo

    slica e alumina podem ser considerados pozolanas, como o caso da slica na forma de

    quartzo.

    Coutinho refere ainda que, para alm de quantidade de slica e alumina amorfa existente nas

    pozolanas, esta reaco qumica tambm influenciada pela sua estrutura interna (Coutinho,

    2006). Isto , a reactividade ser tanto maior quanto maior estiver a sua estrutura interna

    afastada do estado cristalino.

    Nas pozolanas naturais com origem vulcnica, o estado amorfo das partculas predomina em

    virtude do arrefecimento brusco das lavas e da alterao subsequente pelos agentes

    atmosfricos, que tendem a destruir os raros cristais que se formaram durante o arrefecimento

    brusco do magma.

    Nas pozolanas artificiais conseguem-se obter arranjos na estrutura atravs da aco da

    temperatura, desde que esta no seja suficientemente intensa para provocar um rearranjo

    cristalino. Deste modo, consegue-se obter pozolanas mais reactivas (Velosa, 2006).

    Alm destes ltimos aspectos, um factor que condiciona significativamente a reactividade das

    pozolanas a sua elevada superfcie especfica. Tal justificado pelo facto de a reaco se

    realizar entre um slido a pozolana e um reagente dissolvido o hidrxido de clcio (James

    et al., 1986).

    Para o caso das cinzas de casca de arroz e ao contrrio das pozolanas de baixa rugosidade,

    como o caso da slica de fumo, Metha (1983) afirma que a superfcie especfica no s

    depende da dimenso das partculas como tambm da rugosidade que lhe est associada visto

    que esta caracterizada por uma estrutura celular e por uma superfcie rugosa (Metha, 1983).

    A natureza da reaco pozolnica ainda no bem conhecida, o que tem promovido a

    realizao de vrios estudos sobre este assunto. A nvel nacional Velosa (2006), ao citar Villar-

    Cocia, refere que na reaco pozolnica ocorre primeiramente uma interaco na superfcie

  • 20

    das pozolanas, entre estas e os ies de Ca2+

    ,que so obtidos atravs da hidrlise do hidrxido

    de clcio. Posteriormente, esta interaco passa a realizar-se no interior do ncleo das

    partculas pozolnicas (Velosa, 2006).

    Tal conjunto de interaces permitir que numa soluo aquosa, os monosilicatos e aluminatos

    possam reagir com os ies de clcio, resultantes da hidrlise do clcio, possibilitando deste

    modo a origem de compostos do tipo silicatos de clcio hidratados e aluminatos de clcio

    hidratados.

    Almeida refere que em argamassas base de cal area, a quantidade de cal livre que se

    combina com os materiais pozolnicos fornece um indicador da pozolanicidade destes

    materiais, o que se encontra fortemente relacionado com a sua superfcie especfica (Almeida,

    2008).

    3.4 Medio da reactividade das pozolanas

    No estudo das propriedades pozolnicas, corrente recorrer a mtodos expeditos e rpidos

    como so os mtodos qumicos. Como consequncia, quando se pretende avaliar a resistncia

    mecnica ou qumica de uma pozolana misturada com uma cal, em vez de se optar pelos

    mtodos mais longos como o caso da caracterizao mecnica, opta-se pelo mtodo qumico

    (Coutinho, 1958).

    3.4.1 Ensaios mecnicos

    Um dos tipos de ensaio utilizado para efectuar a medio da reactividade pozolnica o ensaio

    mecnico.

    Os ensaios mecnicos baseiam-se no princpio de que os produtos originados pela reaco

    pozolnica provocaro um aumento da resistncia mecnica de pastas de cal e pozolana. Este

    incremento permitir identificar uma pozolana ao nvel da sua capacidade de reaco com a

    cal, atravs da sua comparao com resistncias mecnicas de provetes normalizados

    (Velosa, 2006).

    Velosa (2006), ao citar Vicat (1837), comenta que este utilizava os termos muito energtico,

    energtica, fracamente energtica e finalmente inerte, consoante o grau de dureza que

    atingiam as pastas de cal e pozolana, tendo como referncia o grau de dureza de outros

    produtos, como por exemplo o tijolo, a pedra branda ou o sabo.

  • 21

    Muitos pases j possuem uma normalizao especfica para este tipo de ensaios, sendo as

    principais diferenas verificadas quer na execuo dos provetes (composio, trao e

    execuo), quer no condicionamento. Estes ensaios so usualmente efectuados aos 7 e 28

    dias de idade (Velosa, 2006; Wanson et al., 2009).

    O Caderno de Encargos para Fornecimento e Recepo de Pozolanas (1991) descreve as

    exigncias para pozolanas e ensaios em pasta de cal e pozolanas e argamassas de areia.

    Quanto a Portugal, o documento regulava nica e exclusivamente pastas de cal e pozolana,

    permitindo a classificao de pozolanas e estabelecendo um mtodo de avaliao da

    pozolanicidade. O mtodo de avaliao tinha como base as caractersticas fsicas da pozolana

    assim como a tenso de rotura flexo e compresso das pastas.

    A ASTM C 593-06 (2006) apresenta os valores mnimos de resistncia mecnica que as

    argamassas formuladas com cal e pozolanas devem respeitar.

    Actualmente, e apesar da existncia da NP EN 196-5, Mtodos de ensaio de cimentos. Parte

    5: Ensaio de pozolanicidade dos cimentos pozolnicos, no existe um normativo europeu que

    regulamente os ensaios de pozolanicidade em argamassas de cal area hidratada.

    3.4.2 Ensaios qumicos

    Os ensaios qumicos desempenham um papel importante na determinao da sua origem,

    permitindo uma classificao das pozolanas em relao sua natureza. Para efectuar esta

    classificao, importante determinar a percentagem de elementos qumicos existentes nas

    mesmas. Alm dos usuais SiO2, Al2O3, Fe2O3, MgO e CaO, ainda necessrio a determinao

    da percentagem de FeO, MnO, K2O, Na2O, TiO2, P2O5 e H2O. Contudo, este tipo de ensaio

    requer de bastante rigor tendo em conta o possvel estado alterado em que as partculas se

    podem encontrar (Coutinho, 2006).

    O teste Chapelle apresenta-se como um mtodo qumico muito utilizado para a medio da

    reactividade pozolnica, sendo este semelhante a outros mtodos utilizados, tais como a

    determinao da quantidade de xido de clcio (CaO) numa soluo, aps aquecimento ou por

    anlise trmica diferencial (Coutinho, 1958). O teste Chapelle preconiza a colocao de 1 g da

    pozolana em estudo e de 1 g de hidrxido de clcio em 199 ml de gua a ferver durante 16 h.

    Terminado este perodo e com o recurso a um equipamento padronizado, efectua-se a

    medio da quantidade de hidrxido de clcio que ficou por reagir.

    Apesar de no se enquadrar no domnio das argamassas de cal area com adio de

    componentes pozolnicos, a NP EN 196-5, Mtodos de ensaio de cimentos. Parte 5: Ensaio

  • 22

    de pozolanicidade dos cimentos pozolnicos, sugere a possibilidade de verificao da

    pozolanicidade dos cimentos pozolnicos. Para tal, usam-se 20 g de pozolana para 100 ml de

    gua. No final, mede-se a quantidade de Ca(OH)2 existente na soluo e compara-se com a

    quantidade do mesmo composto que satura uma outra soluo com a mesma alcalinidade. Em

    relao a esta norma europeia, importa referir que no aplicvel s pozolanas.

    Vrios autores (Luxan et al., 1989; Lea, 1970) defendem que a medio da pozolanicidade das

    respectivas pozolanas pode ser efectuada atravs do fenmeno da condutividade, ou seja, na

    variao da condutividade de uma soluo saturada de hidrxido de clcio antes e aps a

    adio da pozolana. O mtodo consiste em determinar a condutividade inicial de 200 ml de

    soluo saturada, introduzir 5 g de pozolana na soluo e, aps 2 minutos de reaco,

    determinar a condutividade final.

    Tabela 3-3 Classificao pozolnica de materiais baseada na medio da condutividade (Luxan et al., 1989).

    Classificao da Pozolanicidade do Material

    Condutividade [mSi]

    No pozolnico < 0,4

    Com pozolanicidade varivel 0,4 - 1,2

    Com Boa Pozolanicidade >1,2

    O princpio inerente aos ensaios apresentados baseia-se no facto de a actividade pozolnica

    possibilitar uma fixao do hidrxido de clcio na pozolana, pelo que quando menor for a

    concentrao no final de hidrxido de clcio, maior ser a pozolanicidade.

  • 23

    4 CINZAS DE CASCA DE ARROZ

    Neste captulo, aborda-se o tema da casca de arroz, mais concretamente a cinza derivada da

    sua calcinao. Apresentam-se os seus processos de transformao e aprofunda-se as

    propriedades pozolnicas das cinzas de casca de arroz, assim como a influncia da

    granulometria das cinzas nessas mesmas propriedades.

    4.1 Contextualizao histrica

    Na mitologia, pode-se encontrar vrias lendas que relatam a origem do arroz. Por exemplo, os

    rabes acreditavam que o arroz foi gerado a partir de uma gota de suor de Maom. Por sua

    vez, uma lenda chinesa conta que durante um perodo de grande fome, alguns habitantes da

    regio de Sichuan, num acto de desespero, enviaram pssaros aos deuses pedindo um

    alimento que os pudesse ajudar. Como resposta a este pedido, os pssaros trouxeram gros

    de arroz

    As referncias bibliogrficas mais antigas situam a origem do arroz na ndia e sudeste asitico,

    mais concretamente, existem documentos datados de 3000 a.c. que relatam a existncia deste

    cereal na China e tambm vrios escritos hindus que citam o arroz por esta data. Pelos anos

    1000 a.c., o valor nutritivo do arroz j era conhecido. Posteriormente, a cultura do arroz

    expandiu-se at Prsia e Indonsia. Por meados de 100 a.c., o arroz j era cultivado no

    Japo, e tambm nas Filipinas, onde foram criados os Arrozais de Banaue. Os rabes levaram-

    no para o delta do Nilo, possibilitando assim a sua descoberta, atravs dos turcos, pelos

    pases mediterrnicos, onde comeou a ser cultivado nos Balcs. Com a ocupao da

    Pennsula Ibrica pelos muulmanos, o arroz chegou a este territrio, com os primeiros indcios

    do cultivo em Portugal a apontarem para que este ten