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REVISTA AQUI É FRESCO DEZEMBRO 2017 26 TEXTO BRUNO FARIAS FOTOS SARA MATOS

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REVISTA AQUI É FRESCO DEZEMBRO 201726

TEXTO BRUNO FARIASFOTOS SARA MATOS

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Em quase 12 anos de atividade da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), o panorama global nacional mudou. Hoje, o nível de cumprimento dos agentes económicos é claramente superior face ao verificado em 2006, o que vem reforçar o papel, assertividade de atuação e a aposta na prevenção e informação pedagógica dos vários agentes preconizada por esta autoridade. Em pleno século XXI, novos desafios se colocam à ASAE. Os novos modelos de negócio que surgem em plena época digital implicam uma capacidade de adaptação que nem sempre é fácil, mas que é obrigatória para continuar a pugnar pela transparência do mercado. O passado, o presente e o futuro abordado por Pedro Portugal Gaspar, inspetor geral da ASAE, em entrevista conduzida por Carla Esteves, gestora da rede Aqui É Fresco.

“O grande desafio que se colocará à ASAE será a adaptação às novas tendências de mercado” PUB

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Carla Esteves – 2006 -2017. O que mudou nestes 12 anos de atividade da ASAE? A ideia generalizada de que apenas atua, ou atuava, com o fito de aplicar coimas pertence ao passado ou nunca chegou a ser uma realidade?Pedro Portugal Gaspar - Nestes 12 anos de atividade da ASAE, em geral, o panorama global nacional é de maior cumprimento. Se nos primeiros cinco anos se pode situar a taxa de incumprimento acima dos 25%, já nos últimos seis anos essa taxa ficou clara-mente abaixo dessa cifra, o que, pelo período temporal, permite retirar algumas conclusões. E essas passam pela noção de maior cumprimento, um objetivo central da atividade da ASAE, que é a fiscalização que visa o cumprimento, com duas linhas de força em destaque: por um lado, um papel preventivo, de divulgação e de articulação com os agentes económicos e respetivas associa-ções sectoriais e, por outro, a matéria de fiscalização e, por vezes, deteção do incumprimento com um papel dissuasor, a chamada prevenção geral além da específica. Nesse sentido, e apesar de ser difícil extrapolar conclusões, ou estabelecer nexos causais, há um conjunto de matéria informativa que nos leva a avaliar essa resposta como positiva.

CE – Do ponto de vista da segurança alimentar, pode-se considerar que Portugal é um país seguro? A ASAE veio de-sempenhar uma tarefa importante nessa matéria?PPG - O Plano Nacional de Colheita de Amostras (PNCA) tem como objetivo principal verificar se os géneros alimentícios colo-cados à disposição do consumidor são seguros do ponto de vista

microbiológico, químico e nutricional, através de co-lheita de amostras e análi-se no laboratório da ASAE. Representa, assim, uma ferramenta fundamental de análise de avaliação da ex-posição do consumidor ao risco alimentar. Para além das questões de segurança, é também um dos objetivos deste plano salvaguardar os interesses do consumidor no que diz respeito à veraci-dade de informação que lhe é prestada ao nível da sua rotulagem, apresentação e publicidade, sendo, para isso, efetuada a avaliação da rotulagem de todos os géneros alimentícios colhi-dos, bem como efetuada uma série de análises labo-ratoriais para a verificação dos requisitos específicos de qualidade exigidos para cada género alimentício e consequente deteção de fraudes alimentares.As características e a dimen-são (frequência de amostra-gem por grupo de género

alimentício) do PNCA assentam na conjugação de duas metodo-logias. A primeira é a matriz de risco composta (MRC), que permite classificar qualitativamente quanto ao risco os grupos alimenta-res, que constam do plano de monitorização e, dessa forma, pro-gramar a amostragem com base na classificação obtida. A MRC tem como fatores a probabilidade de ocorrência (de 1 a 5, escala de mínima a muito alta, respetivamente) e o índice de severidade (de 1 a 5, escala de mínimo a muito alto, respetivamente); o nú-mero prioritário de risco (NPR) possibilita classificar quantitativa-mente os grupos de géneros alimentícios quanto ao nível de risco que estes representam, através do produto de três indicadores (índice de gravidade, índice de ocorrência e índice de deteção).

CE – O caso clássico do Livro de Reclamações pode ser entendido como um instrumento regulador do mercado? Houve mais reclamações em Portugal ao longo dos últimos anos?PPG - No caso, por exemplo, do Livro de Reclamações, regista--se uma média de 160 mil reclamações por ano, isto no caso da ASAE, que, como se sabe, regula tudo o que não tem regulação específica.Esta multiplicidade de amostragem é excecional do ponto de vis-ta quantitativo e qualitativo para se tomar o pulso da cidadania relativamente, por exemplo, à questão da prestação do serviço.A este indicador juntam-se, ainda, 18 mil denúncias que nos che-gam de diversos modos. Este tipo de informação ajuda a orientar a ação preventiva. Nunca podemos pensar na coima como fim de

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subsistência administrativa, mas sempre numa lógica de sancio-namento ajustado e proporcional, quando o mesmo se justifica.

CE – A nova Lei Quadro das Contraordenações Económicas irá trazer maior equilíbrio nessa matéria?PPG – Desde 2015 que se fala nesse assunto, numa lógica da modernização do sistema das contraordenações, por um lado, mas principalmente para haver um equilíbrio neste sector (alimen-tar), que é muito vasto e onde se registam, por exemplo, coimas elevadíssimas por situações como a falta de certos dísticos e, em casos de dinâmicas com maior impacto do consumidor, como re-gras de segurança alimentar e higiene, coimas muito mais baixas. Essa Lei Quadro permitiria trazer um equilíbrio, um pouco como noutras áreas, como a laboral ou rodoviária, por exemplo, onde existe a infração leve, grave e muito grave. Aqui podíamos adicionar outra questão que é o auto de advertên-cia, que permitira não partir logo para a coima à primeira infração, no caso de uma infração leve, o que poderia ser uma alternativa interessante e quase formativa.

CE - No que à venda com prejuízo diz respeito, o Decreto-Lei n.º 166/2013, mais conhecido pela lei das PIRC, veio trazer algum equilíbrio às relações entre operadores económicos e o mercado? Este decreto em concreto logrou terminar, ou atenuar, algumas situações abusivas que vinham a regis-tar-se até então?PPG – Em 2014, criámos brigadas especializadas para acompa-nhar mais de perto esta questão. Desde então e até 2016 te-mos cerca de mil ações inspetivas e 130 processos. Houve uma parte significativa dos processos que foi arquivada por falta de sustentação, outros onde se aplicou a coima e o agente económi-co pagou e outros ainda onde houve uma impugnação da coima em tribunal. Desses, apenas num caso o tribunal deu razão à ad-ministração. De facto, a interpretação da jurisprudência vai num sentido amplo dos descontos. Não obstante, a integração da ASAE veio permitir uma estabili-zação face ao que existia. Não basta medir numericamente os processos para se aferir sobre a estabilidade do sector. Temos também recebido essa indicação por parte dos vários agentes do mercado, com um saldo positivo da nossa intervenção, indepen-dentemente de, em termos quantitativos, parecer efetivamente o contrário. O número de processos decididos ao abrigo do diploma das PIRC atingiu os 48, dos quais 24 foram alvo de arquivamento, 18 redundaram na aplicação prática de coimas e s seis que foram concluídos com pagamentos voluntários. Com recursos judiciais encontram-se 16 processos, dos quais apenas dois não se encon-tram ainda devidamente decididos, sendo a destacar dentro dos

“A estratégia seguida pela ASAE privilegia ir a montante das questões e não tanto no retalho capilar, que representa o fim da cadeia de valor”

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“A ASAE já não atua apenas em feiras e café, como é a opinião generalizada, pelo contrário, viu o seu leque de atuação muito alargado. No combate à economia paralela tem conseguido alguns resultados que lhe têm valido o reconhecimento de empresas e marcas de renome, como a Louis Vuitton e a Rolex, pelo seu combate à contrafação”

decididos uma condenação, com redução de coima, um processo considero nulo, uma decisão considerada nula, assim como 11 absolvições totais. O que a ASAE está a pretender agora fazer é trabalhar para uma metodologia de aplicação do diploma. Vamos manter a nossa atuação, mas explorar, em termos de intervenção, outras áreas do diploma, cujo objeto é muito amplo e vai muito além das vendas com prejuízo. Em 2018, vamos lançar matérias com base nesta experiência.

CE - A economia paralela continua a ser uma preocupação ou o seu peso relativo na balança comercial tem vindo a diminuir?PPG – Este é um problema muito complicado e potenciado pelo comércio eletrónico. É uma preocupação nossa, pelo desvirtuar da concorrência. Os sectores são múltiplos e o grande desafio que se colocará à ASAE, nos próximos tempos, será, efetivamente, a adaptação a estas tendências de mercado. Por exemplo, a própria Black Friday começa a ganhar uma forma diferente da inicial e da roupa já invadiu os serviços. Este cruzamento do estabelecimento virtual com o físico, onde muitas vezes a componente física nem sequer existe, é talvez das questões principais que a instituição tem pela frente. A ASAE já não atua apenas nas feiras e cafés, como é a opinião generalizada, pelo contrário, viu o seu leque de atuação muito alargado. No combate à economia paralela, tem conseguido al-guns resultados que lhe têm valido o reconhecimento de empre-sas e marcas de renome, como a Louis Vuitton e a Rolex, pelo seu combate à contrafação. Mas, hoje, a contrafação vai para além do têxtil e invade também a área alimentar, onde detetamos exemplos de contrafação de vinho, azeite, etc. Além disso, a nos-sa sensibilidade é que, devido à vaga de incêndios que assolou o país, para o ano, não haverá oferta de produtos agroalimentares das áreas afetadas, o que potenciará a subida do preço da oferta genuína e também a sua contrafação.

CE - Quais as situações ilícitas mais frequentes?PPG – Uma das áreas a que estamos particularmente atentos é o alojamento turístico local. Outra das brigadas criadas em 2014 segue precisamente a oferta turística. O alojamento local e a ofer-ta online são uma questão que nos desafia. São uma área onde temos um projeto-piloto de acompanhamento para que consiga-mos detetar o incumprimento do início ao fim. Na área alimentar, há alguma preocupação com a fraude alimen-tar, que começa a ganhar alguma dimensão, e temos também en-dereçado a nossa ação ao transporte de alimentos. Em ambos os casos, vemos que o incumprimento não é preocupante. A estratégia seguida pela ASAE privilegia ir a montante das ques-tões e não tanto no retalho capilar, que representa o fim da cadeia

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de valor. Por exemplo, na contrafação, já não atuamos tanto nas feiras, mas mais nas fábricas que produzem esse produto contra-feito e na cadeia de distribuição antes do produto chegar à feira. No alimentar, atuamos junto com a Marinha em pleno alto mar, para abordar os arrastões que capturam e congelam logo o pes-cado antes que este chegue à costa, à lota, e entre no circuito.

CE - Os protocolos de cooperação e troca de informações estabelecidos à escala mundial permitem atuar de forma global ou, pelo menos, numa perspetiva de tentativa de antecipação do ilícito? A ASAE é uma instituição de portas abertas para esclarecer os operadores económicos?PPG – A ASAE só possui laboratórios para a parte de seguran-ça alimentar. Noutras matérias, como a segurança dos produtos, nomeadamente brinquedos, as análises são feitas externamente. Os laboratórios servem de suporte à atividade inspetiva, mas tam-bém fornecem serviços externos, seja a outras entidades públicas seja a operadores privados. 30% dos nossos serviços são externos e dentro destes a maioria é prestada a entidades privadas. Por exemplo, imagine-se um produtor que quer exportar vinho para a China. O nosso laboratório faz a análise das amostras para avaliar se estão em conformidade com o mercado de destino. O LSA é um laboratório acreditado pelo IPAC pela norma 17025 para mais de 110 ensaios em variadas matrizes. É reconhecido pela Comissão Europeia como laboratório nacional de referência para os doseamentos de PAHs, dioxinas e PCbs e ainda micotoxi-nas e também como laboratório oficial de controlo para o sector vitivinícola. É igualmente reconhecido pelo COI para análise físico--química e sensorial de azeites.Tendo em conta as competências da ASAE como organismo de controlo oficial no sector alimentar, todos estes estatutos se re-vestem de grande importância, reconhecendo e assegurando a qualidade dos resultados produzidos.O trabalho analítico desenvolvido no LSA é solicitado quer pelos clientes internos quer por clientes externos. Relativamente aos clientes externos, estes podem ser outros organismos públicos, operadores económicos, associações de consumidores, etc, sendo que em 2016 o LSA satisfez as necessidades de 175 clientes de acordo com os dados seguintes: atividades da ASAE 65%, clientes privados 20%, outros operadores 15%.Por outro lado, os protocolos de colaboração estabelecidos são significativos. Temos protocolos com todos os países da CPLP, à exceção da Guiné Equatorial, e também com os países observa-dores da CPLP, como o Japão e a Turquia. Estes protocolos são importantes para a proteção dos produtos nacionais no grande mercado lusófono, mas também o inverso. Por exemplo, permiti-ram-nos detetar a produção ilegal, às portas de Lisboa, de grogue, a aguardente típica de Cabo Verde. Estes protocolos visam estabelecer laços de ligação com as con-géneres da ASAE para capacitação institucional, de formação e laboratorial, mas também para uma maior facilidade e fluidez na deteção e combate à fraude e adulteração de marca. A ASAE é claramente uma instituição de portas abertas para o ex-terior. Não esconde nem renega, muito pelo contrário, o seu papel preventivo, de divulgação e de articulação com os vários agentes económicos e respetivas associações sectoriais sobre as diferen-tes matérias, sejam elas novos diplomas, sejam outros temas na ordem do dia. É um papel que abraçamos e que queremos reforçar ainda mais.

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