aprendizagem significativa e o ensino de funo do segundo grau

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APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA E O ENSINO DE FUNÇÃO DO SEGUNDO GRAU Maria Eugênia de Carvalho e Silva Apesar de um intenso movimento a favor de metodologias e abordagens mais favoráveis a um processo de ensino- aprendizagem da Matemática mais efetivo, esta é uma disciplina que ainda carece de recursos, técnicas e metodologias diferenciados e inovadores, já que o panorama ainda se mostra deficiente em relação a resultados. As pedagogias tradicionais parecem ter construído os currículos e suas metodologias sem considerar os avanços da psicologia, ignorando as descobertas no âmbito do desenvolvimento cognitivo. De fato, várias décadas depois das primeiras críticas de Jean Piaget aos métodos pedagógicos adotados, as escolas, na sua maioria, permanecem imutáveis na sua organização curricular e parecem não dar importância aos processos do desenvolvimento cognitivo e da aprendizagem [SOU06]. Dentre todas as áreas do saber e de todos os tipos de conhecimento, salienta-se o conhecimento lógico-matemático, um saber saudável, vigoroso e unificado, de importância extrema para toda a humanidade. Até as mais abstratas de suas teorias encontram tradução real na Informática, nas engenharias, na Física e na Biologia [SOU06]. Para Piaget e Inhelder, a noção da conservação da quantidade de matéria,

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Page 1: APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA E O ENSINO DE FUNO DO SEGUNDO GRAU

APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA E O ENSINO DE

FUNÇÃO DO SEGUNDO GRAU

Maria Eugênia de Carvalho e Silva

Apesar de um intenso movimento a favor de metodologias e abordagens mais

favoráveis a um processo de ensino-aprendizagem da Matemática mais efetivo, esta é uma

disciplina que ainda carece de recursos, técnicas e metodologias diferenciados e

inovadores, já que o panorama ainda se mostra deficiente em relação a resultados.

As pedagogias tradicionais parecem ter construído os currículos e suas

metodologias sem considerar os avanços da psicologia, ignorando as descobertas no âmbito

do desenvolvimento cognitivo. De fato, várias décadas depois das primeiras críticas de Jean

Piaget aos métodos pedagógicos adotados, as escolas, na sua maioria, permanecem

imutáveis na sua organização curricular e parecem não dar importância aos processos do

desenvolvimento cognitivo e da aprendizagem [SOU06].

Dentre todas as áreas do saber e de todos os tipos de conhecimento, salienta-se o

conhecimento lógico-matemático, um saber saudável, vigoroso e unificado, de importância

extrema para toda a humanidade. Até as mais abstratas de suas teorias encontram tradução

real na Informática, nas engenharias, na Física e na Biologia [SOU06]. Para Piaget e

Inhelder, a noção da conservação da quantidade de matéria, que se encontra no ponto de

partida da qualificação das qualidades físicas (peso, volume, etc.) pode ser considerada, ao

mesmo tempo, como o ponto de chegada da matematização elementar que engendra o

número. [PIA75] [PIA77]

Percebem-se reais dificuldades em relação aos conceitos da Matemática e também

da Física. Estas surgem das insuficientes dissociações entre as questões de lógica e as

considerações numéricas ou métricas. Isso acontece porque a lógica é considerada inerente

à criança, quando na realidade ela se constrói passo a passo. O desenvolvimento das

capacidades dedutivas só pode ser alcançado quando se estabelece a dissociação dos dois

fatores.

Atualmente, há um consenso de que a Matemática é uma ciência vital para o

desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Contudo, nossa sociedade parece estar repleta de

indivíduos que desenvolveram uma aversão a esta disciplina. Para Souza, 2005, a mudança

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de atitude face à Matemática passa pela demonstração de suas múltiplas facetas: utilidade,

vitalidade, realidade, rigor e raciocínio. Implica, ainda, em alterações profundas que passam

pela dinamização da educação, englobando o poder político, pais e professores, sendo

necessário alterar as metodologias de ensino dos professores e educadores [SOU06]

Para Piaget, a aprendizagem aparece sempre ligada à superação de contradições

internas. Por isso a importância dos métodos ativos no desenvolvimento psicológico da

criança, de situações que propiciem a experimentação e a reflexão sobre o tema.[PIA75]

Para Vygotsky, as potencialidades do indivíduo devem ser consideradas durante o

processo de ensino-aprendizagem. Como defende que a aprendizagem impulsiona o

desenvolvimento, a escola surge com um papel essencial, devendo dirigir o ensino de modo

a incentivar o desenvolvimento potencial do aluno. [SOU05]

O computador tem sido cada vez mais explorado como auxiliar no processo de

ensino-aprendizagem. Aliado à sua utilização cada vez mais disseminada em todas as áreas,

está a necessidade de inovação em métodos de ensino, com técnicas efetivas e atraentes ao

aluno. Em relação à Matemática, ele se presta de uma forma surpreendente, barata e

simples, se se levar em conta a grande quantidade de softwares gratuitos existentes. Embora

muitos professores sejam ainda reticentes em relação ao uso de novas tecnologias,

especialmente ao computador, cabe a eles a atualização de técnicas, meios e instrumentos

que proporcionem ao aluno melhorar sua condição de aprendizagem.

Tanto as ferramentas computacionais emergentes como os desenvolvimentos mais

recentes das teorias de aprendizagem têm contribuído para viabilizar algumas mudanças na

educação. Pela evolução tecnológica recente e constante, pode-se prever que os meios

disponíveis nas escolas se tornarão ainda mais poderosos. Tais meios não substituirão

inteira e radicalmente as formas tradicionais de ensinar, mas poderão constituir um

complemento ajustado a dificuldades específicas dos alunos [FIO00].

O estudo de funções é, certamente, um dos mais importantes tópicos de toda a

Matemática fundamental. Com aplicações em todas as áreas, sua utilização vai desde

problemas cotidianos até modelagens sofisticadas de situações da astronomia, engenharias

ou medicina. Seu domínio é indispensável por alunos de todos os níveis. Entretanto, muitas

vezes os conceitos matemáticos envolvidos, são excessivamente abstratos e complexos para

um aluno despreparado e carente de outros conceitos, fundamentais à sua compreensão.

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Procurando contornar esse problema, buscou-se desenvolver uma seqüência

instrucional onde o conhecimento de “funções do segundo grau” é construído pelo aluno de

forma gradual e agradável. Além disso, optou-se pela utilização do computador como

ferramenta, por haver hoje a possibilidade de utilização de muitos softwares gratuitos, de

utilização muito simples, atrativos a alunos e professores.

O software escolhido foi o Graphmática, de Keith Hertzer & Carlos Malaca.

Graphmatica é um programa para desenhar funções matemáticas. É bastante simples de

usar e possui uma completa biblioteca de funções matemáticas. Sua instalação é gratuita, a

partir do endereço eletrônico oficial do programa. [HER06]

Este trabalho traz um enfoque sobre a teoria de aprendizagem significativa de

Ausubel, procurando fundamentar a aplicação no ensino de funções do segundo grau. Traz,

ainda, uma visão geral da teoria do desenvolvimento cognitivo de Piaget e da teoria de

aprendizagem de Vygotsky.

O objetivo do trabalho é dar subsídios a professores de matemática, no sentido de

buscarem novas formas de abordar conteúdos, de maneira que seus alunos experimentem

uma aprendizagem significativa.

A teoria do desenvolvimento cognitivista de Piaget

As propostas de Piaget configuram uma teoria construtivista do desenvolvimento

cognitivo humano. Para explicar como e por que ocorre o desenvolvimento cognitivo,

Piaget usa quatro conceitos básicos: esquema, assimilação,acomodação e equilibração.

Esquemas são estruturas mentais com que os indivíduos intelectualmente se

adaptam e organizam o ambiente e refletem, no indivíduo, seu nível atual de compreensão e

conhecimento do mundo.

A assimilação é o processo cognitivo de colocar novos objetos em esquemas já

existentes. A assimilação ocorre continuamente, o que possibilita a ampliação dos

esquemas, explicando, assim, o crescimento da inteligência.

A acomodação é o aspecto da atividade cognitiva que envolve a modificação dos

esquemas para corresponderem aos objetos da realidade. Na acomodação, os esquemas que

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a pessoa possui são alterados ou novos esquemas são criados para acomodar os novos

estímulos. [BAR96]

Segundo Barros, 1996, Piaget diria que “o organismo não pode se acomodar às

potencialidades de um objeto que não pode assimilar ao seu sistema atual de significados.

O hiato entre o velho e o novo não pode ser muito grande”. Por isso, o desenvolvimento se

processa gradualmente.

Equilibração é um processo ativo pelo qual uma pessoa reage a distúrbios ocorridos

em sua maneira comum de pensar, através de um sistema de compensações; isto resulta em

nova compreensão e satisfação, ou seja, em equilíbrio. Os mecanismos de assimilação e

acomodação são acionados quando há mudanças no ambiente ou alterações no organismo

do indivíduo. A equilibração leva a pessoa a um modo de funcionamento mental mais

elevado. Quando este equilíbrio é rompido por experiências não assimiláveis, o organismo

se reestrutura (acomoda), a fim de construir novos esquemas de assimilação e atingir novo

equilíbrio.A aprendizagem só ocorre quando há acomodação, uma reestruturação da

estrutura cognitiva do indivíduo, que resulta em novos esquemas de assimilação. [MOR97]

[MOR99]

Piaget distingue três tipos de conhecimento: físico, lógico-matemático e social.

O conhecimento físico resulta da abstração empírica, da observação direta, isto é, da

percepção que a criança vai tendo de algumas características do objeto, sem relacioná-las

entre si. O conhecimento social resulta das convenções construídas pelas pessoas. Sua

natureza é arbitrária, podendo ser ensinado por meio da linguagem. O conhecimento lógico-

matemático se desenvolve quando a criança começa a operar sobre a realidade, a relacionar

seus diversos elementos, tanto concretamente como mentalmente. Este estabelecimento de

relações é resultante da abstração reflexiva e é o ato de relacionar objetos por suas

propriedades, comparando-os e agrupando-os. Não se pode realizar abstração reflexiva

independentemente de construções feitas anteriormente. A coordenação de relações entre os

objetos possibilita o conhecimento lógico-matemático. O conhecimento lógico-matemático

não pode ser ensinado diretamente, por meio da transmissão social ou da linguagem. Cada

criança tem que construí-lo por si mesma. [BAR96]

A teoria de aprendizagem de Vygotsky

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Para Vygotsky, o desenvolvimento cognitivo pode ser compreendido como a

transformação de processos básicos, biologicamente determinados, em processos

psicológicos mais complexos. Essa transformação ocorre de acordo com a interação com o

meio social e do uso de ferramentas e símbolos culturalmente determinados. [ALV06]

Quanto mais o sujeito vai utilizando signos, tanto mais vão se modificando,

fundamentalmente, as operações psicológicas que ele é capaz de fazer. E, quanto mais

instrumentos ele vai aprendendo a usar mais se amplia a gama de atividades nas quais pode

aplicar suas novas funções psicológicas. [MOR97]

Para internalizar signos, o ser humano tem que captar os significados já

compartilhados socialmente. O mais importante, para Vygotsky, é enfocar a interação

social entre os indivíduos, já que esta é fundamental para a transmissão do conhecimento

social histórica e culturalmente construído. [MOR99]

Teoria da aprendizagem significativa de Ausubel

A expressão “aprendizagem significativa” foi usada pela primeira vez por David P.

Ausubel, professor emérito da Universidade de Columbia, em Nova Iorque. É médico

psiquiatra por formação, mas dedicou sua carreira acadêmica à psicologia educacional. Ao

aposentar-se, há vários anos, voltou à psiquiatria. Desde então, Joseph D. Novak, professor

de Educação da Universidade de Cornell, é quem tem elaborado, refinado e divulgado a

teoria de aprendizagem significativa. A tal ponto que, hoje, seria mais adequado falar na

teoria de Ausubel e Novak.[MOR99]

Ausubel identifica quatro tipos de aprendizagem:

(1) significativa por recepção: o aprendedor recebe conhecimentos e consegue

relacioná-los com os conhecimentos da estrutura cognitiva que já possui;

(2) significativa por descoberta: o aluno chega ao conhecimento por si só e

consegue relacioná-lo com os conhecimentos anteriormente adquiridos);

(3) mecânica por recepção: o aluno recebe conhecimentos e não consegue

relacioná-los com os conhecimentos que possui na estrutura cognitiva e

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(4) mecânica por descoberta: o aluno chega ao conhecimento por si só e não

consegue relacioná-lo com os conhecimentos anteriormente adquiridos.

[WAA04]

Ausubel é um representante do cognitivismo, embora reconheça a importância da

experiência afetiva. Para ele, aprendizagem significa organização e integração do material

na estrutura cognitiva. Como outros teóricos do cognitivismo, ele se baseia na premissa de

que existe uma estrutura (a estrutura cognitiva) na qual essa organização e integração se

processam. A atenção de Ausubel está constantemente voltada para a aprendizagem. Para

ele, o fator isolado que mais influencia a aprendizagem é aquilo que o aluno já sabe. Cabe

ao professor identificar isso e ensinar de acordo. Novas idéias e informações podem ser

aprendidas e retidas, na medida em que os conceitos relevantes e inclusivos estejam

adequadamente claros e disponíveis na estrutura do indivíduo e funcionem, dessa forma,

como ponto de ancoragem às novas idéias e conceitos.

O conceito central da teoria de Ausubel é o de “aprendizagem significativa”, um

processo por meio do qual uma nova informação relaciona-se com um aspecto

especificamente relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo, o subsunçor. Essa

palavra não existe em português; trata-se de uma tentativa de aportuguesar a palavra inglesa

“subsumer” cujo significado se aproxima de inseridor, facilitador ou subordinador. A

aprendizagem significativa ocorre quando a nova informação ancora-se em conceitos

relevantes, preexistentes na estrutura cognitiva do aprendiz. Ausubel vê o armazenamento

de informações no cérebro humano como sendo organizado, formando uma hierarquia

conceitual, na qual elementos mais específicos de conhecimentos são ligados e assimilados

a conceitos mais gerais, mais inclusivos. .[MOR99]

Contrastando com a aprendizagem significativa, Ausubel define aprendizagem

mecânica (ou automática) como sendo a aprendizagem de novas informações com pouca ou

nenhuma interação com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva. Nesse caso,

a nova informação é armazenada de maneira arbitrária. Não há interação entre a nova

informação e a aquela já armazenada.

Ausubel recomenda o uso de organizadores prévios que sirvam de âncora para a

nova aprendizagem e levem ao desenvolvimento de conceitos subsunçores que facilitem a

aprendizagem subseqüente. Organizadores prévios são materiais introdutórios

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apresentados antes do material a ser aprendido em si. A principal função do organizador

prévio é servir de ponte entre o que o aprendiz já sabe e o que ele deve saber, a fim de que

o material possa ser aprendido de forma significativa. .[MOR99]

Os organizadores prévios fornecem um quadro contextual no qual a pessoa vai

incorporar detalhes progressivamente mais diferenciados. A diferenciação progressiva vê

a aprendizagem significativa como um processo contínuo no qual adquirem

significados mais abrangentes na medida em que são estabelecidas novas relações entre

os conceitos.

Apesar de seu potencial em estabelecer, em um nível mais alto de generalidade,

inclusividade e abstração, relações explícitas entre o novo conhecimento e o conhecimento

prévio do aluno, a estratégia dos organizadores tem um efeito na aprendizagem, mas

pequeno, já que o aprendiz precisa ter algum conhecimento prévio relevante e apresentar

uma predisposição para aprender. [MOR99] [WAA04]

Outro importante princípio da aprendizagem significativa é a reconciliação

integradora, o princípio programático segundo o qual a instrução deve também explorar

relações entre idéias, apontar similaridades e diferenças importantes e reconciliar

discrepâncias reais ou aparentes. Para facilitar esse processo, o material instrucional deve

procurar integrar qualquer material novo com material anteriormente apresentado.

Organizadores prévios, diferenciação progressiva e reconciliação integradora são os

três conceitos centrais da teoria da aprendizagem significativa. [WAA04]

Em uma aprendizagem significativa não acontece apenas a retenção da estrutura do

conhecimento, mas se desenvolve a capacidade de transferir esse conhecimento para a sua

possível utilização em um contexto diferente daquele em que ela se concretizou. [TAV05]

Relação entre as teorias

Atualmente as palavras de ordem são aprendizagem significativa, mudança

conceitual e construtivismo. Um bom ensino deve ser construtivista, promover a mudança

conceitual e facilitar a aprendizagem significativa. É provável que a prática docente ainda

tenha muito do behaviorismo, mas o discurso é cognitivista/construtivista/significativo.

[MOR97]

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Ausubel, um psicólogo educacional, não criou uma única teoria cognitiva, mas

aceitou, geralmente, aquelas de vários outros teóricos, especialmente Jean Piaget. Os

estádios de desenvolvimento de Piaget suportam, segundo Ausubel, a sua perspectiva do

“desenvolvimento de aprendizagem significativa”. [ALV06]

Na perspectiva ausubeliana, o conhecimento prévio (a estrutura cognitiva do

aprendiz) é a variável crucial para a aprendizagem significativa. A teoria de Piaget é de

desenvolvimento cognitivo, não de aprendizagem. Nesta perspectiva, só há aprendizagem

(aumento de conhecimento) quando o esquema de assimilação sofre acomodação. Para

Ausubel, quando o material de aprendizagem não é potencialmente significativo, não é

possível a aprendizagem significativa. Para Piaget, quando o desequilíbrio cognitivo gerado

pela experiência não assimilável é muito grande, não ocorre a acomodação. Assimilar e

acomodar podem ser interpretados em termos de dar significados por subordinação ou por

superordenação. Trata-se de uma analogia que permite dar significado ao conceito de

aprendizagem significativa em um enfoque piagetiano. [MOR97]

Existe uma forte similaridade entre a aquisição e construção de significados de

Ausubel e a internalização de instrumentos e signos de Vygotsky. Na ótica vygotskyana, a

internalização de significados depende da interação social. A aprendizagem significativa

depende de interação social, de intercâmbio, troca, de significados via interação social. Para

facilitar a aprendizagem significativa é preciso dar atenção ao conteúdo e à estrutura

cognitiva, para identificar conceitos, idéias, procedimentos básicos e concentrar neles o

esforço instrucional. A análise crítica da matéria de ensino deve ser feita pensando no

aprendiz. De nada adianta o conteúdo ter boa organização lógica, cronológica ou

epistemológica, e não ser psicologicamente aprendível. [MOR97]

Metodologia adotada e relação deste trabalho com as teorias de aprendizagem

estudadas

Foi desenvolvida uma seqüência instrucional para ser aplicada em duas aulas

geminadas, em laboratório de informática, com um computador para cada aluno. A

seqüência de atividades começa pela representação gráfica de algumas funções do segundo

grau, convenientemente escolhidas, onde os seguintes conceitos vão sendo construídos:

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- as três formas de se representar uma função: gráficos, tabelas e equações

- a forma da equação da função do segundo grau e seus parâmetros a, b e c:

- o vértice da curva

- o eixo de simetria da curva e sua relação com o vértice e as raízes

- as raízes da função

- a concavidade, dependente do sinal do parâmetro a

- os intervalos onde a função é crescente ou decrescente

- os dois ramos infinitos da curva

- translações:

- o deslocamento horizontal da curva, em relação ao eixo x, quando se substitui x

por (x+a)

- o deslocamento vertical da curva, em relação ao eixo y, quando se altera o valor

do parâmetro c

- expansões: alterações na forma do gráfico, quando se multiplica a função por uma

constante

- soma de funções

- funções compostas

- a representação de situações reais através de uma função do segundo grau

- a forma fatorada da equação de uma função e a relação com suas raízes

- a inclinação da curva, diferente em cada ponto, e sua relação com a reta tangente

- a análise da tabela de pontos da função do segundo grau e sua relação com o eixo

de

simetria

A figura 1 mostra dois dos exercícios propostos na seqüência de atividades.

Através das atividades propostas, pretende-se estimular:

- a assimilação de novos objetos em esquemas já existentes, pois o aluno já deverá

ter tido uma introdução ao estudo de funções;

- a acomodação: os esquemas que o aluno possui serão ampliados e novos esquemas

serão criados;

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Figura 1 - dois dos exercícios propostos na seqüência de atividades

7) Para deslocarmos a função quatro unidades para a direita, substituímos x por

Até agora, todas essas alterações na expressão da função não provocaram nenhuma alteração em sua forma. Mas algumas alterações podem deixar a função mais “magra” ou mais “gorda”, mais “alta” ou mais “baixa”. Veja os seguintes exemplos:

8) Multiplicando a função por 2, todos os pontos da função obtida terão o dobro da altura

dos pontos correspondentes da função . Portanto, a função fica mais “alta”. Faça os dois gráficos num mesmo sistema de eixos, para verificar isto.

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- equilibração: os enunciados das atividades propostas pretendem criar um

desequilíbrio em relação ao que o aluno já sabe, levando-o a uma reação em busca da

compreensão do novo conceito e conseqüente reequilíbrio;

- a abstração reflexiva, a partir de construções feitas anteriormente;

- a construção do conhecimento lógico-matemático, através da coordenação de

relações entre os objetos novos e antigos;

- utilização de signos matemáticos com significados culturalmente determinados;

- ampliação das funções psicológicas do aluno, a partir desta utilização de signos.

Através da metodologia adotada, pretende-se que os alunos cheguem a uma

aprendizagem significativa por recepção e/ou por descoberta, conseguindo relacionar os

novos conhecimentos com aqueles que já possui. Além disso, os conceitos

apresentados servirão como organizadores prévios para as próximas aulas, nas quais o

conteúdo “função do segundo grau” será trabalhado de forma tradicional, na seqüência

em que figura na maior parte dos livros didáticos atuais. Portanto, o intuito é facilitar a

aprendizagem, não só de função do segundo grau, mas de funções em geral, já que os

conceitos desenvolvidos neste trabalho, em sua maioria, são facilmente estendidos às

outras funções.

Nas próximas aulas, o aluno deverá incorporar detalhes progressivamente mais

diferenciados, de forma a que continue a experimentar uma aprendizagem significativa.

Após o conteúdo ter sido trabalhado de forma tradicional, a mesma seqüência de

atividades aqui apresentada deve ser novamente mostrada aos alunos, agora na forma de

slides, mais rapidamente. O objetivo é levá-los a perceber detalhes e tirar conclusões que

apenas o amadurecimento do seu conhecimento sobre o tema pode permitir. Assim

acontecerá a reconciliação integradora, que deve levar o aluno a explorar relações entre

idéias, apontar similaridades e diferenças importantes e reconciliar discrepâncias.

Conclusão

A teoria da aprendizagem significativa de Ausubel não se encontra desvinculada de

outras teorias. Percebeu-se que há uma forte similaridade entre os preceitos de Ausubel e os

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de Piaget e Vygotsky. Em muitos pontos, estas teorias se complementam. Os ensinamentos

desses três grandes mestres podem e devem ser utilizados no cotidiano escolar.

O professor de Matemática precisa se auto-avaliar e entender que ele próprio é a

chave para melhores resultados na aprendizagem de seus alunos. Melhorar a Educação

significa, antes de mais nada, melhorar a eficiência e eficácia da aula do professor, cuja

autonomia permite, até certo ponto, a utilização de recursos e metodologias mais adequados

ao perfil do aluno atual.

Este trabalho tem a pretensão de tornar o estudo de funções mais agradável ao

aluno, levando-o a apresentar uma predisposição para aprender, fundamental no processo

de ensino-aprendizagem. Procurou-se levar em conta os principais preceitos das teorias de

aprendizagem estudadas, especialmente da aprendizagem significativa de Ausubel.

Referências

[ALV06] ALVES, Aline de Sousa. MAGALHÃES, Pedro Barroso.Teorias da Aprendizagem de Vygotsky e Ausubel. Disponível em http://home.alunos.utad.pt/~al12940/Psicologia.htm#_Toc509575499. Acesso em 17/08/2006.

[BAR96] BARROS, Célia Silva Guimarães. Psicologia e construtivismo. São Paulo: Ática, 1996.

[FIO00]. FIOLHAIS, C. TRINDADE, J. Revista brasileira de ensino de Física. Física no Computador: O computador como uma ferramenta no ensino e na aprendizagem das ciências físicas. Disponível em http://nautilus.fis.uc.pt/personal/jtrindade/~jtrindade/pub/27.pdf.25, 259. (2003). Acesso em 06/06/2006.

[HER06] HERTZER, K. MALACA, C. Graphmatica. Software computacional. Disponível em http://graphmatica.apoioescolar.net/ acesso em 21/09/2006

[MOR97] MOREIRA, Marco Antônio. Conferência feita no Encontro Internacional sobre Aprendizagem Significativa. Aprendizagem significativa: um conceito subjacente. Burgos, Espanha, 15 a 19 de setembro, 1997.

[MOR99] MOREIRA, Marco Antônio. Teorias de aprendizagem. São Paulo: EPU, 1999.

[PIA75] PIAGET, J. INHELDER, B. O desenvolvimento das quantidades físicas na criança. 2.ed.Rio de Janeiro: Zahar editores, 1975.

[PIA77] PIAGET, J. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro: ed. José Olimpio, 1977.

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[SOU05] SOUZA, Pedro M.L. O ensino da matemática: Contributos pedagógicos de Piaget e Vygotsky. 2005. Disponível em www.psicologia.com.pt/artigos/ver_artigo.php ?codigo =A02 58. Acesso em 24/06/2006.

[TAV05] TAVARES, Romero. Aprendizagem significativa e o ensino de ciências. Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação. 28a. Reunião Anual. 2005.

[WAA04] WAAL, Paula. TELLES, Marcos. DynamicLab Gazette. reflexões sobre a aprendizagem on-line. Aprendizagem Significativa (Ausubel). Abril, 2004. disponível em http://www.dynamiclab.com/moodle/mod/forum/discuss.php?d=421. acesso em 22/08/2006.