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7/14/2019 Apostila_-_Curso_de_Contabilidade_Aplicada_ao_Setor_Pblico http://slidepdf.com/reader/full/apostila-cursodecontabilidadeaplicadaaosetorpblico-562533ac7d22d 1/320  REALIZAÇÃO APOIO Secretaria do Tesouro Nacional Curso de Contabilidade Aplicada ao Setor Público DISCIPLINA 01 TEORIA DA CONTABILIDADE

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  • REALIZAO

    APOIO

    Secretaria do Tesouro Nacional

    Curso de

    Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico

    DISCIPLINA 01

    TEORIA DA CONTABILIDADE

  • CURSO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

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    TEORIA DA CONTABILIDADE

    SUMRIO

    1. INTRODUO

    2. EVOLUO HISTRICA DA CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    2.1. Evoluo Histrica da Contabilidade e das necessidades de Informao

    2.2. Tratamento Cientfico da Contabilidade no inicio do sculo XX

    2.2.1. Positivismo

    2.2.2. Dinamismo

    2.2.3. Reditualismo

    2.2.4. Patrimonialismo

    2.2.5. Neopatrimonialismo

    2.3. Enfoques bsicos das teorias contbeis

    2.4. Outras abordagens da Contabilidade

    2.5. Exerccios

    3. FUNDAMENTOS TERICOS DA CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    3.1. Evoluo da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico no Brasil 3.2. Fatos relevantes da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico no Brasil 3.3. Mudanas nos sistemas de contabilidade 3.3.1. Introduo 3.3.2. Teorias institucionais mais significativas (Burns e Scapens, 2000) 3.3.3. Teoria da agncia 3.3.4. Governana no setor pblico 3.4 Teoria da Comunicao em Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico 3.4.1 Transparncia 3.4.2 Evidenciao 3.5 Exerccios 4. PATRIMNIO PBLICO 4.1. Conceitos bsicos 4.2. A Contabilidade e o campo de sua aplicao 4.2.1. Critrio jurdico 4.2.2. Critrio Contbil

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    4.3 Exercicios

    5 MENSURAO DE ATIVOS E PASSIVOS

    5.1 Conceitos bsicos

    5.2 Mtodos de calculo da depreciao

    5.3 Outros instrumentos de ajuste do valor

    5.4 Exercicios

    6 CUSTOS CARACTERSTICAS DA CONTABILIDADE DE CUSTOS NAS ORGANIZAES PBLICAS

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    TEORIA DA CONTABILIDADE

    1. INTRODUO

    O objetivo do Curso de Multiplicadores realizado pelo Conselho Federal de Contabilidade em parceria com a Secretaria do Tesouro Nacional apresentar os fundamentos tericos e prticos da Contabilidade Aplicada ao setor pblico e, desta forma, permitir a identificao, o estmulo, a adoo e a manuteno de boas prticas de governana e de contabilidade no mbito do Estado, cumprindo uma das orientaes para o desenvolvimento da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico.

    A importncia da Contabilidade, no setor pblico, pode ser constatada a partir da verificao de que aproximadamente 10,6% da populao ocupada esta voltada para atividades do setor pblico segundo pesquisa mensal de emprego do IBGE de novembro de 2008. Em novembro de 2007 esse percentual era de 10,2%1 revelando que as oportunidades no setor governamental esto aumentando. Sem dvida a complexidade da administrao pblica exige funcionrios bem treinados, com conhecimento das boas prticas de gerncia, tanto de recursos humanos, como da gesto do patrimnio pblico.

    O Mdulo 1 Teoria da Contabilidade procura revelar as bases, fundamentos tericos e abrangncia da Contabilidade, envolvendo temas como a Evoluo Histrica da Contabilidade, Fundamentos Tericos, Patrimnio Pblico, Mensurao de Ativos e Passivos e Custos Aplicados, no mbito do setor plico, pois envolve as decises (atos administrativos), bem como suas conseqncias para o patrimnio (fatos administrativos). Essa abrangncia foi ampliada a partir da Constituio Federal de 1988 e reforada aps a edio da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000) em especial com o estabelecimento de parmetros da boa governana, entre os quais merecem destaque a ao planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilbrio das contas pblicas.

    O estudo da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico deve incluir temas ligados ao planejamento, transparncia, controle, responsabilizao e instrumentalizao do controle social, como forma de facilitar a prestao de contas dos responsveis pela gesto de bens e valores cuja utilizao tem como objetivo principal a prestao de servios pblicos ao cidado.

    1 Pesquisa Mensal de Emprego Novembro 2008 - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE - ESTIMATIVAS PARA O MS DE NOVEMBRO DE 2008 - REGIES METROPOLITANAS DE: RECIFE, SALVADOR, BELO HORIZONTE, RIO DE JANEIRO, SO PAULO e PORTO ALEGRE. Http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme_nova/pme_200811tmcomentarios.pdf

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    2. EVOLUO HISTRICA DA CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    2.1 Evoluo Histrica da Contabilidade e das necessidades de Informao

    No passado a contabilidade surge como necessidade imperiosa de criar um conjunto de processos prticos destinados:

    a suprir a memria dos mercadores; a necessidade de reproduzir com fidedignidade as quantidades e valores das

    mercadorias a crdito; e. a medio do PATRIMNIO.

    A Contabilidade foi a primeira cincia a despertar a mente humana para o uso da razo sobre os processos de vida em comum e tambm sobre a utilizao dos meios materiais competentes para satisfazerem s necessidades pertinentes, especialmente depois da adoo da moeda metlica como instrumento destinado a facilitar as operaes comerciais. Nas sociedades primitivas era caracterizada pela forma rudimentar dos seus processos os quais refletiam a prpria organizao dessas sociedades, cujo alicerce era constitudo dos seguintes elementos fundamentais:

    Regime de trabalho; Perfeio dos instrumentos de trabalho; Mtodos de produo; Distribuio de bens; e Regime de propriedade.

    A anlise da evoluo do conhecimento contbil mostrar que, em cada perodo histrico, a Contabilidade como sistema de informaes foi sendo adaptado s necessidades dos seus usurios diretos ou indiretos. Entretanto, essa evoluo sempre ficou limitada pela carncia de recursos tecnolgicos que, na atualidade, produzem impactos positivos principalmente no que se refere velocidade com que tais informaes so obtidas pelos respectivos usurios.

    Em decorrncia desse processo histrico possvel desenhar o Quadro 1 - Evoluo das Necessidades de Informao, das possibilidades tecnolgicas e da resposta que o sistema contbil produzia.

    Quadro 1 - Evoluo das Necessidades de Informao

    Perodo histrico

    Necessidades de informao

    Recursos tecnolgicos utilizados

    Resposta dos sistemas contbeis.

    Grandes civilizaes

    Conhecer entradas e sadas de dinheiro Papiro, escritura cuneiforme Partida simples.

    Inicio do comrcio Registrar cada movimento Papel Partida dobrada e os primeiros livros contbeis

    Revoluo industrial

    Importncia dos ativos e conhecer o benefcio Papel, imprensa

    Aperfeioamento das partidas dobradas. Demonstraes contbeis

    1960 Mais informao com maior rapidez

    Primeiros computadores, muitos usurios para um equipamento.

    Automatizao dos sistemas manuais.

    1981 Obter informao til para a tomada de decises Computadores pessoais. Popularizao da informtica

    Sistemas de informao contbil integrados em bases de dados. Relatrios, indicadores e grficos.

    Sculo XXI

    Informao em tempo real. Comrcio eletrnico. Medio de ativos intangveis para a gesto do conhecimento.

    Computadores em rede. Internet. Uso das tecnologias de comunicao.

    Automatizao da captura de dados. Intercambio eletrnico de documentos. Escritrios sem papel.

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    Fonte: Universidad REDContable.com. Contabilidade na era do conhecimento de Julio Sanchez de La Puente. Adptado pelos autores.

    2.2 Tratamento Cientfico da Contabilidade no inicio do sculo XX

    O sculo XX deu origem a um perodo no qual a Contabilidade teve vrios avanos e desenvolvimentos - assumiu definitivamente uma posio entre as cincias do conhecimento humano - entre as quais podem ser destacadas as apontadas a seguir:

    2.2.1 Positivismo

    Em 1914, Jean Dumarchey, estabelece regras matemticas para regular a Contabilidade constituindo uma bsica lgica estabelecendo que o patrimnio constitudo por quatro massas patrimoniais principais visto que a Situao lquida tanto pode, parcial ou totalmente, encontrar-se ora ao lado do Passivo ora ao lado do Ativo. Da resulta a seguinte expresso:

    Ativo + Situao Liquida passiva = Passivo + Situao Liquida ativa

    Nesta poca diversos autores estudavam o balano como a representao esttica do patrimonio da qual decorria a lei do equilibrio quantitativo que um postulado bsico da Contabilidade.

    Toda alterao de valor ocrrida em qualquer componente do patrimonio ou da situao liquida provoca outra alterao igual e de sentido contrrio em outro elemento, ou vrias alteraes em diferentes elementos de tal modo que a soma algbrica das mutaes provocadas produza uma resultante de valor absoluto igual e em sentido contrrio.

    2.2.2 Dinamismo

    A idia de que o balano representa a situao esttica sempre incomodou diversos autores que defendiam a idia dinmica do patrimnio. Entre estes autores encontra-se Eugen Schmalenbach que escreveu a obra Dinamische Bilanz (Balano Dinmico) onde procura criar uma teoria que prove que o Balano pode ser dinmico.

    No seu trabalho chama ateno para a necessidade de reproduo do jogo de foras que levam ao aparecimento do lucro. D prioridade rentabilidade mais que estrutura patrimonial estabelecendo os princpios bsicos do dinamismo, conforme relatado a seguir:

    Desembolsos que ainda no so consumos (mquinas, matrias primas, etc.). Produes que ainda no so receitas (produtos acabados, etc.). Consumos que ainda no so desembolsos (fornecedores, juros a pagar, etc.). Receitas que ainda no so desembolsos (financiamentos, etc.).

    O dinamismo examina o patrimnio pela lei da fluncia que estuda os fenmenos patrimoniais espontneos que ocorrem independentemente da ao dos administradores. A lei da fluncia compara o patrimnio s guas de um rio que observadas da margem sero sempre classificadas como gua, mas nunca ser o mesmo lquido em observao.

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    2.2.3 Reditualismo

    O reditualismo tem origem nos estudos de Schmalenbach e teve como grande defensor Gino Zappa tratando do reconhecimento do valor dos fluxos em Contabilidade, ou seja, do estudo de uma dinmica patrimonial, da relatividade do lucro e da realidade empresarial.

    Os trabalhos de Zappa incluam criticas:

    aos que faziam da Contabilidade um simples intrumento. a todos que estavam excessivamente preocupados com normas de registros.

    Nos seus estudos sobre reditualismo Zappa apresentou como principios bsicos:

    Reduzir a distino das contas aos elementos mais simples que elas comportam e classifica-los em subordinao aos processos seguidos na determinao dos valores que proporcionam rentabilidade.

    No se podem considerar os caracteres distintos das contas margem do sistema por elas constituido, se se quiser evitar os erros frequentemente cometidos na interpretao do seu significado e uso indevido dos dados que elas proporcionam.

    A classificao das contas deve refletir o mais possvel as classes de valores em subordinao s necessidades da gesto empresarial.

    Segundo ROCHA2 (2004) tanto Schmalenbach como Zappa tem o mesmo pensamento e diferem, apenas, na forma como observam os fenmenos patrimoniais e o resultado. O primeiro observa o balano atravs da sua dinmica e da qual resulta o patrimnio lquido. O segundo observa o balano pelos movimentos positivos ou negativos decorrentes dos fenmenos patrimoniais.

    A Figura 1 - Viso de Schmalenbach e Zappa sobre o patrimnio bem ilustrativa quanto a abordagem do Patrimnio:

    Figura 1 - Viso de Schmalenbach e Zappa

    Fonte: ROCHA, Armandino. Lies de Teoria da Contabilidade: apontamentos de aulas. Lisboa: Universidade Lusiada Editora, 2004. Adaptado pelos autores.

    2 ROCHA, Armandino. Lies de Teoria da Contabilidade: apontamentos de aulas. Lisboa: Universidade Lusiada Editora, 2004.

    Viso de Schmalenbach

    ATIVO

    PASSIVO

    SITUAO LIQUIDA

    Viso de Zappa

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    2.2.4 Patrimonialismo

    A doutrina patrimonialista tem em Vicenzo Masi seu maior defensor. Para ele o fim da Contabilidade precisamente o governo econmico do patrimnio e o seu objeto a anlise qualitativa e quantitativa do mesmo, tanto no aspecto esttico como dinmico da riqueza.

    Segundo ROCHA (2004), Masi nega a situao de imobilidade patrimonial e s aceita a concepo de esttica como forma de estudar-se o equilbrio a ser considerado em relao ao funcionamento dos meios patrimoniais.

    Assim, podemos estabelecer o conceito de principio esttico e dinmico do patrimonio.

    Princpio esttico - determinado de forma objetiva pelo Inventrio. J a subjetividade compreende as relaes dos elementos inventariados com as pessoas que compe a entidade. A cada elemento deve ser atribudo um valor ("avaliao"), nominal e efetivo, atual, diferido e figurativo (chamado em termos contbeis de "quantificao do patrimnio"). Cada elemento do patrimnio, determinado e avaliado, dever ser distribudo em uma classificao (ou seja, a "qualificao do patrimnio").

    Princpio dinmico - De posse dos meios patrimoniais (relacionados no inventrio), a gesto econmica do patrimnio levar a Entidade a alcanar seus objetivos, ou seja, atravs dos elementos estveis realizar fatos essenciais buscando alcanar seus fins. No caso da acumulao de riqueza, verifica-se o fenmeno do rdito.

    2.2.5 Neopatrimonialismo

    A doutrina neopatrimonialista derivou-se da teoria geral do conhecimento contbil, de autoria do Prof. Dr. Antnio Lopes de S, nascida da fuso de diversas outras teorias de autoria do mesmo, arquitetadas desde os anos 60 do sculo XX, assim como apoiada fundamentalmente nas teses de Vincenzo Masi (Itlia), Francisco Duria (Brasil) e Jaime Lopes Amorim (Portugal)3.

    A doutrina neopatrimonialista apresenta as seguintes premissas bsicas:

    Parte do princpio que o capital deve satisfazer as necessidades de um empreendimento humano para que ele seja sempre eficaz e possa crescer continuadamente (a isto denomina prosperidade).

    Reconhece que o patrimnio est sempre em mutao, ou seja, em constante transformao.

    A partir de tais verdades bsicas o neopatrimonialismo contbil constri seus dois primeiros axiomas: o axioma do movimento e o axioma da transformao.

    Admite que o capital no se mova por si mesmo, mas, sob a ao de foras externas a ele.

    As indagaes doutrinrias buscam, pois, nessa corrente de pensamento da contabilidade,

    conhecer no apenas o que aconteceu, mas, sim, porque aconteceu o fato patrimonial. Parte do pressuposto que: QUALQUER MOVIMENTO DA RIQUEZA IMPLICA TRANSFORMAO E QUE ESTA CONSTANTE.

    3 http://pt.wikipedia.org/wiki/Neopatrimonialismo

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    Ao tratar dessa teoria S4 (2001) esclarece: O que gera o fato, como devemos percebe-lo e o que o cerca, ensejaram-me a concepo

    de trs grandes grupos de relaes lgicas sob as quais devemos estudar os fenmenos patrimoniais, ou sejam, as: Essenciais (da natureza originria do fato), Dimensionais (as do julgamento da essncia) e Ambientais (as dos fatores agentes sobre a essncia).

    2.3 Enfoques bsicos das teorias contbeis As teorias contbeis podem ser distribudas nos seguintes enfoques bsicos:

    As que do Contabilidade fundamento jurdico e para quem o Balano uma demonstrao de direitos e obrigaes Essncia jurdica

    As que do contabilidade um fundamento econmico representado por duas tendncias: o 1. Tendncia O balano tem como meta principal dar a conhecer a

    verdadeira situao da empresa. (escola Anglo-saxonica) o 2. Tendncia O Balano como ferramenta essencial para a determinao,

    estudo e interpretao dos equilbrios patrimoniais (Escola Italiana). As que do contabilidade um significado tcnico e instrumental segundo a qual o

    Balano uma recopilao de Contas, sntese final da Contabilidade.

    2.4 - Outras abordagens da Contabilidade Alm das teorias acima relacionadas ainda podem ser encontrados os estudos de Len

    Gomberg que utilizou as formas matriciais para elaborar o seu modelo de Contabilidade Integral (anos 20 e 30 do sculo passado) que distribui as diversas contas segundo um critrio baseado no modo como considera as consequncias das atividades de uma empresa. Assim, leva em considerao que qualquer alterao numa conta tem tres tipos de consequencias:

    a) Especficas, quando h alteraes na sua substancia, vale dizer no Ativo ou no

    Passivo; b) Jurdicas, quando h modificaes dos direitos e obrigaes; c) Econmicas, se foram alterados aspectos economicos representativos das perdas,

    ganhos ou do prprio patrimonio liquido. VIANA5 (1959) esclarece que Gomberg foi o primeiro autor que concebeu o estudo da

    Contabilidade como integrante de um sistema de disciplina, denominada Einzelwirtschaftlehre, ou seja, a cincia da economia aziendal ou economia das empresas concluindo:

    esta ciencia que estudava a atividade economica, sob o ponto de vista do interesse singular distinguia-se da que a encarava sob o aspecto do interesse geral, social e coletivo, isto , a volkswirtschaftslehre.

    4 S, Antonio Lopes de S: "Bases das Escolas Europia e Norte-Americana, perante a cultura contbil e a proposta neopatrimonialista"(2001) in http://www.5campus.com/leccion/neo01 acesso em 06/08/2009. 5 VIANA, Cibilis da Rocha. Teoria Geral da Contabilidade 2. Edio. Sulina: Porto Alegre, 1959.

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    Mais recentemente podemos encontrar a denominada teoria multidimensional de Yuji Ijiri que foi estudado por ROCHA6 (2000) mostrando que, enquanto continuista, Ijiri preocupa-se em saber quando foi o momento em que de simples registro de dados em unigrafia a contabilidade passou dupla entrada, ou digrafia, para justificar depois a sua passagem para a entrada multipla.

    O mesmo autor esclarece, ainda, que Ijiri foi um dos que pretendeu estabelecer um campo de observao multidimensional da medida na contabilidade, em vez da habitual observao feita em duas dimenses. Na passagem da bidimensionalidade para a multidimensionalidade considera que na anlise das possibilidades de extenso da partida dobrada duas condies devam ser satisfeitas:

    a) Preservao do velho sistema; b) Integridade do novo sistema. Os estudos de Ijiri revelam que a medida da contabilidade deve partir do principio de que a

    Contabilidade no uma mera coleo de medidas independentes, mas sim uma estrutura integrada de medidas mutuamente interdependentes.

    ainda ROCHA (2.000) que aponta a existencia de diversar outras obras que surgiram nos

    anos 60 e 70 do sculo passado e entre elas destaca as de MATESSICH cujo pensamento foi evolutivo, como ele prprio confessa no prefcio do seu livro Accounting and Anaytical Methods.....:

    muitas mudanas ocorreram no meu prprio pensamento.

    Na esteira dessa evoluo verifica-se que a busca de objetivos em matria contbil deu lugar, no final dos anos 50 e, principalmente na dcada de 60 do sculo passado, a um novo modo de pensamento contbil normativo que orientava o contedo das demonstraes contbeis para a satisfao das necessidades dos diversos usurios interessados nessas informaes, assumindo que se trata de um instrumento idneo para a tomada de decises.

    Esta nova orientao comea a gestar-se, segundo Hendricksen & Breda7 (1999, ), nos ltimos anos da dcada de 20 e princpios dos anos 30, em que as mudanas mais importantes do pensamento contbil foi a modificao do objetivo da contabilidade de apresentar informao gerencia e aos credores, para fornecer informao financeira para os investidores e acionistas bem como a obrigatoriedade de pareceres de auditoria..

    A American Accounting Association (AAA) teve um importante papel na evoluo para o paradigma da utilidade, com suas revises peridicas do estado da teoria contbil e, em especial, com A statement of Basic Accounting Theory (1966), em que define a contabilidade como o processo de identificar, medir e comunicar a informao econmica, que permite juzos e decises informados a seus usurios. Dentro desta perspectiva, os objetivos da contabilidade consistem, para a AAA, no fornecimento de informao para uma pluralidade de propsitos, entre os quais a tomada de decises relativa ao uso de recursos limitados, a direo e controle efetivos dos recursos humanos e materiais da empresa ou a identificao de reas cruciais de deciso.

    6 ROCHA, Armandino Cordeiro dos Santos. Contributo da Contabilidade Multidimensional para a anlise e informao empresarial. Editora da Univali; Blumenau: Furb 2.000. 7 ENDRIKSEN, Eldon S. e BREDA, Michael F. Van. Teoria da Contabilidade ; traduo de Antonio Zoratto Sanvicente.

    S.Paulo: Atlas, 1999.

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    Em estudo sobre a incidncia das normas internacionais de contabilidade no mbito da Contabilidade Pblica TORRECILAS apud TUA8 (2003) indica as principais conseqncias que levam aceitao do paradigma da utilidade das informaes contbeis, como sendo::

    A progressiva ampliao do conceito de usurio da informao contbil;

    A busca e discusso dos objetivos e requisitos da informao financeira;

    Sua incidncia na quantidade de informao fornecida pela empresa;

    Sua influencia na evoluo da epistemologia contbil; e

    Finalmente, sua incidncia no desenvolvimento da investigao emprica na disciplina.

    Assim, a contabilidade moderna d nfase na estruturao do sistema de informaes para os usurios vez que cabe a ela capturar, processar, armazenar e distribuir a informao financeira que vital para a correta tomada de decises e para a instrumentalizao do controle social, quando aplicada ao setor pblico.

    2.5 - Exerccios

    a) Quais os elementos fundamentais que caracterizavam os processos organizacionais nas sociedades primitivas?

    b) Descreva de modo sucinto as principais caracteristicas dos trabalhos de Jean Dumarchey e do dinamismo de Schmalenbach?

    c) A partir do final dos anos 50 e, principalmente, na dcada de 60, do sculo passado, teve inicio um novo pensamento contbil normativo que orientava o contedo das demonstraes contbeis para a satisfao das necessidades dos diversos usurios interessados nessas informaes, assumindo que se trata de um instrumento idneo para a tomada de decises e a instrumentalizao do controle social, quando aplicada ao setor pblico. Comente a afirmativa com relao utilidade das demonstraes contbeis.

    8 TORRECILAS, Jos Antonio Monz. INCIDENCIA DE LAS NIIF EN EL MBITO DE LA CONTABILIDAD PBLICA:

    CUENTA DE RESULTADOS. Instituto de Estudios Fiscales. Doc. 23/03.

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    3. FUNDAMENTOS TERICOS DA CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    3.1 Evoluo da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico no Brasil A Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico no Brasil tem origem no perodo colonial com a

    vinda da famlia real quando D. Joo VI, entre os primeiros atos, criou o Errio Rgio e instituiu o Conselho da Fazenda por intermdio do alvar de 28 de junho de 1808 com a finalidade de centralizar todos os negcios pertencentes arrecadao, distribuio e administrao da Fazenda Pblica

    O referido Alvar no ttulo II estabelecia normas reguladores do mtodo de escriturao e normas de contabilidade, conforme a seguir:

    TITULO II

    DO METHODO DA ESCRIPTURAO E CONTABILIDADE DO ERARIO9

    I. Para que o methodo de escripturao, e formulas de contabilidade da minha Real Fazenda no fique arbitrario, e sujeito maneira de pensar de cada um dos Contadores Geraes, que sou servido crear para o referido Erario: ordeno que a escripturao seja a mercantil por partidas dobradas, por ser a nica seguida pelas Naes mais civilisadas, assim pela sua brevidade para o maneio de grandes sommas, como por ser a mais clara, e a que menos logar d a erros e subterfugios, onde se esconda a malicia e a fraude dos prevaricadores.

    II. Portanto haver em cada uma das Contadorias Geraes um Diario, um Livro Mestre, e um Memorial ou Borrador, alm de mais um Livro auxiliar ou de Contas Correntes para cada um dos rendimentos das Estaes de Arrecadao, Recebedorias, Thesourarias, Contratos ou Administraes da minha Real Fazenda. E isto para que sem delongas se veja, logo que se precisar, o estado da conta de cada um dos devedores ou exactores das rendas da minha Coroa e fundos publicos.

    III. Ordeno que os referidos livros de escripturao sejam inalteraveis, e que para ella se no possa augmentar ou diminuir nenhum, sem se me fazer saber, por consulta do Presidente, a necessidade que houver para se diminuir ou accrescentar o seu numero.

    Importante observar que, j naquela poca, o documento inclui a segregao entre mtodo

    de escriturao que na lio de VIANA10 (1962) corresponde ao conjunto de anotaes e registros que, com formas e fins diversos servem para registrar os fenmenos da gesto indicando ainda de modo rudimentar, uma referncia Contabilidade como cincia que estuda as movimentaes do patrimnio da entidade na poca denominada de minha real fazenda.

    Portanto, o alvar de 28 de junho de 1808 deu Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico uma feio diferente, instituindo o mtodo das partidas dobradas e estabelecendo normas reguladoras na escriturao da contabilidade do Errio Rgio, contribuindo para que o corpo funcional se adaptasse s novas exigncias.

    Entretanto, em que pese esse avano em direo modernidade a evoluo do pensamento contbil do setor pblico mostrar diversas discusses ocorridas no Poder Legislativo sobre a necessidade de um Cdigo de Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico , cabendo sublinhar a viso distorcida de David Campista11 ao apreciar o projeto apresentado por Didimo da Veiga12 no final de 1903:

    9 Texto original extrado no sitio da web http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_35/Alvara.htm acesso

    20/01/2009 10 VIANA, Cibilis da Rocha. Teoria Geral da Contabilidade, 2. Ed. Sulina: Porto Alegre, 1962 11 David Morethson Campista foi Deputado Federal, Secretrio das Finanas de Minas Gerais e Ministro de Estado da Fazenda, nasceu no Rio de Janeiro em 22/01/1863 e faleceu em Copenhagen/Dinamarca em 12/10/1911 na sua

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    Mesmo prescindindo dos artifcios de contabilidade criados com deliberado propsito de ocultar penosas verdades o objeto da contabilidade ampliou-se em propores inauditas com o desenvolvimento da atividade do Estado moderno, cujos milhares de braos recebem, administram e despendem sob formas cada vez mais variadas. Toda esta atividade pblica criou do ponto de vista da contabilidade difcil soluo. (Biolchini, 1930)

    At a edio do Cdigo de Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico da Unio (1922) a Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico era organizada segundo velhos princpios oriundos do perodo colonial em que prevalecia o regime do governo desptico, segundo o qual os bens pblicos eram propriedade do soberano. Se, por um lado, no prestava contas a ningum dos atos que praticava, exigia, por outro, que, aqueles a que estavam afetos os negcios do Errio Rgio, fossem severamente punidos caso no prestassem contas dos negcios que lhes tinham sido confiados pelo monarca.

    Ocorre que a sociedade brasileira foi gradativamente conquistando direitos polticos e chegou ao governo republicano que exige a responsabilizao individual de todos quantos administrem ou tenham relao com o patrimnio do Estado. Entretanto, o setor pblico brasileiro, salvo raras excees, ainda adota o modelo de Estado patrimonialista e burocrtico cujo objetivo maior a fiscalizao dos agentes responsveis por bens e valores em funo do exerccio temporrio de mandato eletivo. Desta forma, fica em segundo plano o registro e estudo da contabilidade patrimonial da entidade cujo contedo perpassa diversos exerccios e, conseqentemente, diversos mandatos.

    Neste aspecto, bom lembrar que em 1918 quando o projeto do Cdigo de Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico foi colocado em audincia pblica, foram apresentadas diversas sugestes, entre elas, a de J. Rezende Silva13 que, em correspondncia ao Presidente da Comisso Especial do Cdigo de Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico da Cmara dos Deputados, assim se expressou em relao Contabilidade Patrimonial:

    Segundo os verdadeiros princpios de contabilidade, no dia do encerramento definitivo e total do exerccio financeiro, todas as dividas ativas, certas, incontestveis, e cujos credores sejam determinados so incorporadas ao patrimnio e deixam de figurar, sob qualquer titulo, nos oramentos futuros. So ttulos de crdito patrimonial e sero liquidadas em qualquer exerccio, pelas operaes do patrimnio.

    Semelhantemente e pela mesma ocasio, todas as dividas passivas, certas, incontestveis, pertencentes a credores determinados, para as quais j tenha havido ordem de pagamento e de registro no Tribunal de Contas, so incorporadas ao patrimnio nacional e deixam de figurar, sob qualquer rubrica, nos oramentos futuros. So ttulos de dbito patrimoniais e sero liquidados em qualquer exerccio pelas operaes do patrimnio.

    Os primeiros so atualmente chamados alcances (fixados) e figuram no oramento sob o titulo de receita extraordinria indenizaes e os segundos so atualmente chamados de restos a pagar e so solvidos pela verba exerccios findos do Ministrio da Fazenda. (Biolchini, 1930).

    E conclui:

    estabelecido o regime patrimonial, tudo isto se simplifica com grandes vantagens para a administrao e para as partes interessadas (Biolchini, 1930)

    bibliografia destaca-se o seguinte: Consolidao das leis fiscais do estado de Minas Gerais, Belo Horizonte Imprensa Oficial 1900. 12 Ddimo Agapito da Veiga Jnior, nascido em Nova Friburgo, RJ, em 1847, diplomado em Direito, foi o Presidente do Tribunal de Contas da Unio de 1895 a 1917 13 BIOLCHINI, Alberto. Codificao da Contabilidade Pblica Brasileira. Imprensa Nacional, RJ, 1930 p. 568

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    O texto acima mostra que j existiam reflexes sobre o papel do oramento e suas ligaes aos atos de gesto e a funo do patrimnio como objeto de estudos da contabilidade.

    Nos estudos de Contabilidade do setor pblico relevante considerar as ponderaes de MAGNET14 (1978) de que a Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico embora diariamente aplicada apresenta algumas dificuldades para sua definio. Por sua vez, o mesmo autor revela de modo surpreendente que na Frana o estudo de Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico est ausente dos programas de ensino superior e inclusive que a mesma foi banida das escolas de formao profissional concluindo que trata-se de um campo de conhecimento emprico que feita por praticantes para ser usada por praticantes futuros.

    Ao tratar da definio da Contabilidade aplicada ao setor pblico LPEZ apud Devaux15 (1995: 37) indica uma diversidade de definies para estes ramos da contabilidade, sugerindo a existncia de diversas aproximaes uma definio tcnica, tambm denominada formal em que a Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico pode ser constituda por regras da apresentao das contas; uma definio administrativa que pode ser denominada "orgnica" - em que a Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico alm de fixar as regras de apresentao das contas anuais deve tratar tambm da organizao dos servios de contabilidade e uma definio jurdica que indica a Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico como um conjunto de regras que tem por objeto determinar as responsabilidades dos ordenadores de gastos e dos contadores pblicos.

    As abordagens acima levaram inevitavelmente falsa idia da existncia de diversas contabilidades aplicadas ao setor pblico como o caso das denominadas Contabilidade Oramentria e Contabilidade Financeira que na realidade representam apenas uma particularidade das organizaes sem finalidade lucrativa cuja nfase a arrecadao e distribuio dos recursos. A idia de que existam tais contabilidades pode ser classificada como um equivoco, pois a Contabilidade una e tem como foco a viso integral do patrimnio que inclui as vises oramentria e financeira como meros elementos informativos.

    Por sua vez, estudando as novas tendncias da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico (RAMIREZ16, 1992) mostra que a Contabilidade um sistema de informao de carter universal e tem sua origem no mundo empresarial que compreende a utilidade dessas informaes para a administrao dos negcios. Sem dvida esta tambm a necessidade do Estado que precisa deixar de estar unicamente centrado no controle do oramento e, em conseqncia, obter a medio correta e adequada dos elementos do patrimnio,

    Estudos realizados por SILVA17 (2009, 48) mostram que a tradio na Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico limitar seu campo de estudo anlise, registro e interpretao da movimentao oramentria e, ao final de cada exerccio, apresentar um balano patrimonial indicando o dficit ou supervit bem como o confronto entre receitas e despesas inicialmente oradas com a sua realizao. Nesta modalidade o sistema patrimonial somente refletia no patrimnio liquido os reflexos do oramento, mais especificamente os relativos a receitas e despesas de capital.

    A partir das exigncias da Lei de Responsabilidade Fiscal e da globalizao a Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico apresentou grande evoluo sendo conduzida gradativamente a um modelo dualista, que incorpora informao econmico-financeira, elaborada de acordo com os

    14 MAGNET, Jacques. Comptabilit Publique. Paris, Frana: Presses Universitaires de France, 1978.

    15 LPEZ, Bernardino Benito. Manual de Contailidad Pblica. Editora Piramide. Madrid. 1995. 16 RAMIREZ, Alfonso Rojo. Nuevas Tendencias em Contabilidad. Revista Espanola de Financiacion y Contabilidad. Vol. XXII, n. 72, julio-septiembre 1992 pp. 551-566 17 SILVA, Lino Martins da. Contabilidade Governamental: um enfoque administrativo da nova contabilidade pblica, 8. Edio. So Paulo: Atlas, 2009.

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    princpios contbeis e informaes oramentrias, estabelecida de acordo com os princpios oramentrios e legais que sustentam o modelo de oramento.

    Esta dualidade supe a coexistncia de informaes elaboradas em conformidade com as regras oramentrias de apurao do resultado financeiro, em que as receitas so reconhecidas pelos valores efetivamente arrecadados e as despesas so apropriadas pelos valores legalmente empenhados (art. 35 da Lei n 4.320/64) e, por outro lado a utilizao de todas as ferramentas tericas e as melhores prticas com vistas adequada mensurao do patrimnio disposio da entidade pblica.

    3.2 - Fatos relevantes da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico no Brasil

    As discusses sobre a Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico no Brasil foram levadas a efeito na Cmara dos Deputados em fins de 1903 sobre o projeto do Cdigo de Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico encaminhado por Didimo da Veiga ao ento Ministro dos Negcios da Fazenda, Dr. Jos Leopoldo de Bulhes Jardim como um substitutivo ao projeto antes apresentado (1902) pelo Deputado Alfredo Varela.

    Tais discusses foram mais enfaticas no final do ano de 1903 quando da apreciao do projeto de Didimo da Veiga, principalmente as questes levantadas pelo Deputado David Campista, como membro da comisso de finanas e posteriormente Ministro da Fazenda.

    Uma das discusses foi se a administrao financeira deveria seguir uma contabilidade de exerccio (como ainda defendida por alguns) ou uma contabilidade de gesto (que poderia ser comparada ao atual principio da competncia).

    Contabilidade de exerccio era definida no artigo 37 do referido projeto:

    Art. 37. Exerccio o espao de tempo durante o qual se realizam e liquidam as operaes de receita e despesa autorizadas na lei do oramento para o provimento dos servios, que demandam a administrao, a defesa e o desenvolvimento da Repblica no decurso de um ano.

    O artigo 38, por sua vez, definia que o exerccio toma o nome do ano regido pela lei de oramento e o artigo 37 esclarecia que so pertencentes a um exerccio somente as operaes relativas aos servios feitos e aos direitos adquiridos Repblica e a seus credores

    No mesmo projeto aparecia a definio de contabilidade de gesto:

    Art. 56. A contabilidade por gesto compreende os atos referentes arrecadao da receita e sua aplicao despesa pblica dentro dos doze meses, que constituem o ano financeiro.

    J o artigo 57 indica que:

    a administrao financeira rege-se pelo preceiturio regulador da contabilidade por exerccio. A funo dos agentes fiscais obedece ao regime da contabilidade por gesto; a sua responsabilidade apura-se pelo exame institudo sobre seus atos funcionais durante tantos anos quantos se compreenderem ao perodo de durao de seu cargo.

    Para entender as discusses preciso conhecer comentrios de David Campista ao analisar a justificativa dada por Didimo da Veiga ao referido projeto:

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    a) Considerava que a experincia dos dois sistemas aplicada no Brasil era defeituosa explicando que at 1840 a legislao fiscal adotou o regime da contabilidade por gesto e que os processos at ento seguidos eram, em boa parte, os mesmos que foram estabelecidos pelo alvar de 28 de junho de 1808, que criou o Errio Rgio.

    b) Informa tambm que depois de a reorganizao administrativa realizada com base na lei de 04 de outubro de 1831, a importante matria da contabilidade continuou a ser regulada, em parte, segundo os mesmos mtodos e prticas em voga, sabidamente defeituosas, em parte por ordens e instrues, parciais ou desconexas, dos Ministros da Fazenda e, em parte, finalmente, pelas disposies ocasionais que foram sucessivamente sendo enxertadas nas caudas18 das diversas leis oramentrias.

    Nesse mesmo parecer David Campista defendendo o regime de contabilidade por exerccio, pergunta:

    Haveria vantagem em alterar o regime da contabilidade, preferindo a gesto ao exerccio?

    Para em seguida refletir sobre o tema esclarecendo que a prtica de ambos os regimes tem revelado uma sensvel aproximao entre eles, fazendo-os perder as caractersticas essenciais de suas diferenas concluindo que o exerccio uma personagem contbil. Concebida, nasce e vive: morrendo deixa uma herana ativa ou passiva, isto , um saldo ou um dficit.

    Esclarece, ainda, que essa herana prolonga a personalidade, fazendo-a conviver com a que a sucedeu e, citando alguns autores da poca, mostra que o regime do exerccio no impede, de modo algum, os resduos ativos e passivos da contabilidade italiana, e as naes que o adotam vo, cada vez mais, restringindo os limites do prolongamento, de modo a aproxim-lo do exerccio anual propriamente dito como se estabeleceu na Itlia.

    A idia essencial do exerccio, diziam Boucard e Jze19 que, enquanto uma operao que afete um oramento no fica completamente terminada, o exerccio no est encerrado e, neste aspecto, bom lembrar que o Brasil adotou por muitos anos o denominado perodo adicional onde eram arrecadadas as receitas e liquidadas as despesas do exerccio a que se referiam.

    De notar que o artigo 1 do decreto n 41, de 20 de fevereiro de 1840, determinou que, o principio do ano financeiro de 1840 a 1841 os balanos e contas do Tesouro, tesouraria e mais reparties de recebimento e despesa seriam organizados por exerccio e no por gesto, como at ento. Compreendia o exerccio o ano financeiro (de junho de um ano a julho do seguinte) e um perodo complementar de seis meses destinado ultimao das operaes de arrecadao da receita, liquidao e pagamento da despesa e escriturao dos livros.

    Tratando do perodo complementar, o parecer de David Campista alertava para o seguinte:

    Terminado o perodo complementar, encerrava-se definitivamente o exerccio, passando os saldos de caixa para o exerccio em andamento, assim como os restos a arrecadar que eram destinados ao pagamento do atrasado passivo e aumento dos recursos que faltassem ao exerccio em curso.

    18 As caudas oramentrias decorriam da ausncia, na poca, do principio da exclusividade e significava o aproveitamento da celeridade da Lei de Oramento para incluir temas que no tinham qualquer relao com a previso da receita e a fixao da despesa. 19

    Max Boucard; Gaston Jze E le ments de la science des finances et de la le gislation financie re francaise,

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    17

    O perodo adicional foi alterado por fora do Decreto de 05 de janeiro de 1889 que regulou o modo de contar o exerccio que passou a compreender o espao de dezoito meses, a contar de 1 de janeiro de um ano a 30 de junho do ano seguinte.

    Sem dvida nesse decreto tm origem os exerccios findos, ainda to temidos pelos fornecedores do Estado, pois o mesmo estabelecia que os trs meses do primeiro semestre do ano seguinte eram destinados ao complemento das operaes e trs meses, liquidao e encerramento das contas. Dentro do terceiro semestre (de janeiro a maro do ano seguinte) no se ordenavam despesas novas por conta do exerccio em vigor e dentro do trimestre da liquidao (de maro a junho do ano seguinte) no se autorizavam pagamentos de servios prestados no correr do exerccio em vigor.

    Logicamente, os registros da contabilidade deveriam ficar indefinidamente abertos enquanto todas as operaes oramentrias no estivessem completamente terminadas ou, pelo menos, at a expirao dos prazos de prescrio dos direitos ativos e passivos.

    Em sua anlise David Campista esclarece, tambm, que a contabilidade por gesto no tem na Itlia o mesmo carter que na Inglaterra. Com a virtuosidade que lhes prpria, os Italianos no aceitaram francamente como os ingleses as conseqncias do regime da gesto. Conquanto limitadas as operaes realizadas no correr do ano financeiro, as contas gerais da Itlia classificam distintamente os fatos relativos a esse exerccio (competenza) e os reliquats provenientes dos exerccios anteriores (residui). principio da contabilidade italiana que a conta dos resduos do oramento deve ficar sempre distinta da de competncia, de maneira que nenhuma despesa relativa aos resduos possa ser levada aos recursos sob o regime de competncia e vice-versa.

    O parecer informa tambm que na Frana, os reliquats recebidos ou pagos durante o perodo complementar do exerccio so compreendidos na conta desse exerccio. Na Itlia, pelo contrrio, a conta desses restos conquanto distinta das operaes da competncia englobada com esta na conta geral do ano.

    A respeito da semelhana entre os dois regimes de contabilidade o Relatrio do Tribunal de Contas de 1904 assim se expressou:

    em um e outro regime o passivo a solver figura na conta de novo ano, como responsabilidade oriunda de operaes do ano findo, a liquidar e pagar por meio dos recursos do oramento corrente. No regime do exerccio pago o passivo anterior por uma verba existente desde 1865, no oramento do Ministrio da Fazenda.

    O relatrio acima ainda inclui que:

    No sistema de gesto, ou o passivo de um ano financeiro incorpora-se no do ano que se lhe segue, existindo, em todo o caso, um perodo em que as dividas do ano anterior, j ordenadas, so pagas conta dos recursos do mesmo ano, durante os trs primeiros meses do novo ano fiscal, como se observa na Inglaterra, ou figuram no oramento do ano seguinte em titulo especial, consagrado liquidao dos resduos passivos do ano devedor , como se pratica na contabilidade italiana.

    Nas discusses cabe citar as observaes de Francisco D`Auria que em correspondncia de 1918, ao Dr. Josino de Araujo, Presidente da Comisso do Cdigo de Contabilidade da Cmara dos Deputados, assim se expressou:

    VI No h propriedade na expresso Balano do oramento, referindo-se execuo oramentria, tanto mais que ao movimento oramentrio se deve juntar o extra-oramentrio, devendo-se designar esse todo pelo termo tcnico de Balano de Receita e Despesa.

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    VII Dispor sobre a necessidade do balano patrimonial, com a maior discriminao em anexos, e referente a cada exerccio.

    Portanto, podemos verificar que o grande Mestre D`Auria criticava, naquela poca, a denominao de Balano Oramentrio para o demonstrativo que, na verdade, confrontava ingressos e desembolsos e, chamava a ateno para a necessidade do balano patrimonial, com a maior discrimino em anexos e referente a cada exercicio.

    A partir de 1964 com a edio da Lei n 4.320/64, foram efetuadas diversas alteraes na estrutura da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico brasileira, entre as quais se destacam:

    Extino da Contadoria Geral da Repblica

    Criao das Inspetorias Gerais de Finanas, como rgos do sistema de administrao financeira, contabilidade e auditoria.

    Criao da Secretaria do Tesouro Nacional (1986) com as funes de auditoria e de contabilidade.

    Transformao das Inspetorias Gerais de Finanas em Secretarias de Controle Interno (CISETs).

    Segregao da Secretaria Federal de Controle do Ministrio da Fazenda e criao da Controladoria Geral da Unio.

    Com a Constituio de 1988 o sistema de Controle Interno foi estruturada na forma apresentada na figura a seguir:

    Figura 2: Estrutura do Sistema de Controle Interno e Externo na Constituio de 1988

    Fonte: Prpria

    PODER JUDICIRIO

    PODER EXECUTIVO

    PODER LEGISLATIVO

    Controle Interno Controle Interno Controle Interno

    CONTROLE INTERNO INTEGRADO Economicidade

    Eficincia Eficcia

    Legalidade

    TRIBUNAL DE CONTAS

    Controle Externo

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    A anlise da evoluo histrica da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico no Brasil revela diversos ciclos contbeis, como quadro a seguir:

    Quadro 2: Quadro da Evoluo da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico

    Perodo histrico Principais caractersticas do perodo Principais fatos

    1500-1800 Brasil colonail. Explorao do pau Brasil

    Primeiros contadores Controles da Coroa Casa dos contos Reforma Pombalina Partidas dobradas

    1808-1899 Brasil Imprio/Brasil Repblica

    Constituio de 1891 Partidas dobradas Alvar Rgio Criao do Tribunal de Contas da Unio.

    1900-1930 Brasil Repblica (Repblica Velha)

    Projeto do cdigo de Contabilidade da Unio. Discusses sobre o sistema contbil oramentrio e patrimonial. Cdigo de Contabilidade Pblica da Unio

    1930-1945 Brasil Repblica (Estado novo) Criao do DASP Constituio de 1937 Primeiras normas de oramento e finanas pblicas.

    1945-1964 Brasil Repblica (Queda do Estado Novo Ps-guerra)

    Constituio de 1946 Lei n 4.320/64

    1964- em diante

    Brasil Reforma Administrativa

    Decreto-lei 200/67 Extino do controle prvio Constituio Federal de 1988 Lei de Responsabilidade Fiscal Interpretao dos Princpios Fundamentais de Contabilidade sob a Perspectiva do Setor Pblico Plano de Contas nico.

    Fonte: Prpria

    3.3 Mudanas nos sistemas de contabilidade

    3.3.1 Introduo

    A partir da edio do livro Relevncia Perdida de Johnson e Kaplan20 (1987) foi iniciado um debate sobre novos sistemas de contabilidade em confronto com os sistemas convencionais. O principal foco das discusses de que os sistemas convencionais no respondiam convenientemente s necessidades de informao das organizaes em face da globalizao de mercados.

    Logo na introduo do livro acima os dois renomados autores apresentam, nos seguintes termos, uma critica aos sistemas convencionais:

    Atualmente, as informaes de contabilidade gerencial, condicionadas pelos procedimentos e pelo ciclo do sistema de informes financeiros da organizao, so

    20 No Brasil a 2. Edio da obra foi editada pela Editora Campus sob o titulo A relevncia da Contabilidade Custos,

    1996.

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    atrasadas demais, agregadas demais e distorcidas demais para que sejam relevantes para as decises de planejamento e controle dos gerentes.

    Para logo a seguir esclarecerem que os informes da contabilidade gerencial so de pouca valia para os gerentes operacionais, no seu empenho de reduzir custos e melhorar a produtividade.

    3.3.2 Teorias institucionais mais significativas (Burns e Scapens, 2000)

    Estudando a teoria institucional na pesquisa em Contabilidade, MAJOR e RIBEIRO21 ( (2009) esclarecem que a Contabilidade de Gesto compreende o conjunto de sistemas de informao contbil que apoiam os decisores na prossecuo dos objetivos organizacionais. Nesta definio esto implicitos diversos pressupostos, a saber:

    A racionalidade dos decisores, que utilizaro a informao contbil de forma tima

    atendendo a objetivos como a maximizao do resultado ou da riqueza; O carater axiomtico desses objetivos organizacionais; A unicidade desses objetivos, isto , a no existencia de objetivos diversos e/ou situaes

    em conflito. Este enfoque foi tratado pelos pesquisadores que centravam suas reflexes teoricas no

    desenvolvimento de modelos timos de apoio tomada de deciso com base nos pressupostos acima referidos. Entretanto, mais recentemente surgiram teorias voltadas para a compreenso da Contabilidade dentro do contexto institucional conforme relao constante do Quadro 3: Teorias e Caractersticas.

    O conceito de instituio na OIE est ligado idia de formas de pensar e fazer, muitas vezes aceites de forma relativamente inconsciente ou automtica pelos agentes sociais. Na Contabilidade de Gesto, as idias da OIE tm sido aplicadas crescentemente em anos recentes. A linha de investigao que tem tido maior desenvolvimento aquela que se dedica ao estudo dos processos de mudana intra-organizacional (Burns e Scapens, 2000; Burns, 2000; Busco et al, 2006)

    Quadro 3: Teorias e Caractersticas

    Teoria Caractersticas

    (NIE) New Institutional Economics Razes econmicas para explicar a diversidade nas formas de arranjos institucionais.

    (OIE) Old Institutional Economics

    Estuda as prticas contbeis como regras e rotinas institucionalizadas. Os sistemas de contabilidade so vistos como regras que uma vez assimiladas pelos gestores internos, se transformam em rotinas posteriormente transmitidas a novos membros (fincando institucionalizadas).

    (NIS) New Institutional Sociology

    Estuda o processo de homogeneizao das organizaes que pode ser de trs formas: (a) Coercivo como resultado de presses formais e informais impostas por outras organizaes e/ou pela sociedade; (b) Mimtico, quando resultante de imitaes das decises e cpia das melhores prticas de outras organizaes tidas como referncia. (c) Normativo, isto , resultante de presses efetuadas pelas organizaes de profissionais na busca da sua legitimao perante a sociedade.

    Fonte: Prpria

    21 MAJOR, Maria Joo e RIBEIRO, Joo. Contabilidade e Controlo de Gesto. Escolar Editora: Lisboa, 2009.

  • CURSO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    21

    Os primeiros estudos de Scapens (1994) identificaram um gap entre a teoria da

    contabilidade e a prtica. Entretanto, suas reflexes posteriores concluram que melhor esquecer este gap e o objetivo deve ser estudar a prtica (para desenvolver a teoria) e utilizar a teoria para ajudar a compreender a forma como os gestores se comportam em relao contabilidade e as causas do seu comportamento, fornecendo assim os argumentos para a teoria institucional.

    Os estudos de ROBALO22 (2009) mostram que de acordo com o modelo de Burns e

    Scapens, o qual se encontra representado na figura a seguir, existe uma relao entre as aes, rotinas e as instituies. As instituies influenciam a ao num momento temporal especfico (efeito sincrnico). Da as setas a e b serem representadas de forma vertical. Por sua vez, as aes dos agentes envolvidos nos processos de mudana produzem e reproduzem instituies ao longo do tempo (efeito diacrnico) por via da criao de rotinas e de regras. Este efeito da ao sobre as instituies representado atravs das setas oblquas c e d.

    ainda o mesmo autor que alerta para o fato de que os processos de mudana a nvel

    institucional necessitam de perodos mais longos de tempo que os processos de mudana ao nvel da ao.

    Neste sentido a teoria institucional representa a viso proposta por Burns e Scapens de que

    os elementos (artefatos) gerenciais devem fazer parte de hbitos e rotinas institucionais conforme Figura 3: Processo de Institucionalizao.

    Figura 3: Processo de Institucionalizao

    a d a d

    b c b c b c b c b c b c

    F i g u r a 3 . 9 P r o c e s s o d e i n s t i t u c i o n a l i z a o d e d i s p o s i t i v o s ( g a d g e t s ) c o n t b e i s R e p r o d u z i d o d e B u r n s e S c a p e n s ( 2 0 0 0 )

    E s f e r a I n s t i t u c i o n a l

    R o t i n a s

    R e g r a s

    R o t i n a s

    R e g r a s

    C a m p o d e A o

    T e m p o

    a = c o d i f i c a o ; b = p r o m u l g a o ; c = r e p r o d u o ; d = i n s t i t u c i o n a l i z a o

    22 ROBALO, Rui. Contabilidade e Controle de Gesto Teoria, Metodologia e Prtica, capitulo 9. Escolar Editora: Lisboa,

    2009.

  • CURSO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    22

    Estudando a influencia que a teoria institucional produz na contabilidade gerencial, Reis23 (2008) apud Boland considera o sistema de contabilidade um ato interpretativo, ou seja, esquemas interpretativos e normas que so usadas pelos gestores com a finalidade de planejar, tomar decises e controlar recursos sua disposio. O mesmo autor esclarece que por meio desse processo de interpretao, a gesto ocorre em um ambiente no qual h vrias dicotomias, como a existncia do poder pessoal e do poder hierrquico, a necessidade de mudana e a tendncia da estabilidade, as decises de curto prazo e as decises de longo prazo. (Boland JR., 1993, p. 139).

    3.3.3 Teoria da agncia

    Kimura et al24 (1998) definem a relao de agncia como um contrato sob o qual um ou mais indivduos, denominados principais, atribuem a outro individuo ou outros indivduos, denominados agentes, autoridade para desempenhar funes de tomada de deciso e que a relao de agncia pode indicar uma busca de eficincia, onde o principal, por no dispor de recursos, como por exemplo, tempo, capacitao, competncia ou vantagens competitivas, confere ao agente a tarefa de gerenciamento de recursos ou a incumbncia da execuo de atividades.

    Na administrao pblica as relaes de agncia so observadas a partir do momento em que a populao, por meio do voto, delega poderes aos agentes pblicos que tomam decises e atitudes em nome dos interesses do cidado como destinatrio de suas aes. Tal relao, em principio, indica uma busca de eficincia que o sistema contbil deve mensurar com vistas transparncia da prestao de contas e a correta evidenciao do patrimnio.

    Em decorrncia, as organizaes so formadas por meio das aes dos elementos da entidade (pessoais, patrimnio, operaes, interesses e ligaes) e que na ao cotidiana esto envolvidos em processos internos, que se ligam s estruturas organizacionais.

    3.3.4 Governana no setor pblico

    Estudando a governana no setor pblico o IFAC25 (2001) define governana corporativa como o sistema pelo qual as organizaes so dirigidas e controladas e tambm indica os trs princpios fundamentais de governana corporativa, a saber:

    Sinceridade; Integridade e Responsabilidade.

    Estes princpios so pertinentes tanto para entidades de setor pblico como entidades do setor privado. Entretanto, sua aplicao deve ser adaptada para refletir as caractersticas da atividade pblica tendo em vista a complexidade dos objetivos polticos, econmicos e sociais que, no setor pblico, esto sujeitos a um jogo diferente de influncias e constrangimentos, tanto internos quanto externos alm de diversas formas de responsabilidade para com o cidados.

    A sinceridade exigida com o objetivo de assegurar aos stakeholders26 que o processo decisrio voltado para o atendimento de seus interesses e para isso todas as informaes devem estar disponveis de modo claro e oportuno.

    23 REIS, Luciano Gomes dos. A influncia do discurso no processo de mudana da contabilidade gerencial: um estudo de caso sob o enfoque da teoria institucional. (Tese doutorado Universidade de So Paulo. So Paulo, 2008) 24

    KIMURA, Herbert, Lintz, Alexandre Carlos e Suen, Alberto Sanyuan. Uma contribuio da Teoria de opes para a avaliao dos custos mximos de agencia. Cadernos de Pesquisa em Administrao, S.Paulo, v. 1, n 6, 1. Trim/98. USP. 25 Governana no Setor Pblico (Governance in the Public Sector - Study 13 IFAC, 2001): 26

    Stakeholder ou, em Portugus, parte interessada ou interveniente, refere-se a todos os envolvidos num processo, por exemplo, clientes, colaboradores, investidores, fornecedores, comunidade etc. O processo em questo pode ser de

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    A integridade est baseada nos princpios da honestidade e da objetividade, bem como no cumprimento de padres de alto decoro e probidade na gesto dos negcios da entidade e da dvida pblica.

    Responsabilidade o princpio por meio do qual as entidades do setor pblico e os respectivos responsveis pelas decises e aes so avaliados externamente. A responsabilidade alcanada quando os papis estiverem claramente definidos por uma estrutura que demonstre adequadamente as linhas de subordinao tanto verticais (estrutura orgnica) como horizontais (identificao dos processos) voltados para o atendimento das demandas da sociedade.

    Estes princpios fundamentais so refletidos em cada uma das "dimenses" da governana das entidades do setor pblico, conforme a seguir:

    a) Padres de comportamento - como a administrao exercita sua liderana e determina os valores e padres da organizao dando origem cultura organizacional que define o comportamento segundo um cdigo de conduta a ser seguido por todos os componentes da organizao;

    b) Estrutura organizacional e processos - como os nveis mais altos da organizao so designados e como suas responsabilidades so definidas;

    c) Controle - a rede de diversos controles estabelecidos pelos nveis mais altos da organizao tem o objetivo de apoiar a entidade no alcance de seus objetivos verificando a conformidade na aplicao das normas, regulamentos e polticas internas garantindo a efetividade e eficincia das operaes;

    d) Controles Externos a forma como a alta administrao demonstra sua responsabilidade financeira no s no gerenciamento adequado do dinheiro pblico como tambm no desempenho no uso dos recursos.

    O Quadro 4 a seguir apresenta uma sntese das recomendaes para governana no setor pblico.

    Quadro 4: Recomendaes para governana no setor pblico

    Padres de comportamento (Cdigo de conduta) 1. Liderana (leadership) 2. Altruismo (selflessness) 3. Integridade )integrity) 4. Objetividade (objectivity) 5. Responsabilizao (accountability) 6. Abertura (openness) 7. Honestidade (honesty)

    Estrutura organizacional e Processos Controle Controle Externo (Transparncia)

    Responsabilidade Constitucional e Legal Responsabilidade na aplicao do dinheiro

    pblico Comunicao com os stakeholders

    (cidado) Papis e Responsabilidades o Equilbrio de foras entre os Poderes; o Equilbrio entre autoridade e

    responsabilidade.. o Gerncia executiva o Poltica de remunerao

    Gerenciamento de riscos Auditoria interna Comit de auditoria Controle Interno Oramento Gerencia financeira Treinamento de pessoal

    Relatrio anual (Demonstraes contbeis)

    Uso adequado dos padres de contabilidade

    Medidas de desempenho Auditoria Externa.

    Nota: Adaptado pelos autores com base no estudo do IFAC

    carcter temporrio (como um projeto) ou duradouro (como o negcio de uma empresa ou a misso de uma organizao sem fins lucrativos).

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    3.4 Teoria da Comunicao em Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico

    3.4.1 Transparncia

    A noo de transparncia no mbito governamental cada vez mais empregada em pases que defendem o processo democrtico de acesso s informaes sobre a ao dos gestores pblicos em especial no que se refere poltica fiscal e capacidade contributiva. A nfase a essa abertura constitui um dos alicerces da democracia representativa, pois incentiva o comportamento voltado para o esprito pblico e inibe a ao dos que se julgam donos da informao. Paralelamente fornece informaes de apoio deciso dos administradores tanto em relao reduo dos custos de monitoramento das aes como a promoo de melhorias na governana corporativa dos governos.

    Porm, a palavra transparncia tem sido utilizada de forma imprecisa por se referir ao nmero de caractersticas de um sistema aberto sem anlise independente da complexidade de que se reveste a administrao do Estado.

    A transparncia pode estar em confronto com outros importantes valores da democracia e, em alguns casos, sua defesa e aplicao pode ser contraproducente. Por outro lado, o uso da palavra em oposio a segredo e desonestidade, acaba por enfraquecer a prpria idia de transparncia por colocar o assunto numa difcil discusso retrica. O tema transparncia no processo oramentrio foi estudado por GARRETT, E.; VERMEULE, A. (2006)27 que identificaram como um processo de escolhas pblicas opaco pode levar a boas deliberaes, enquanto, em troca, a abertura ampla pode limitar a margem de negociao com grupos de interesses preferenciais para quem a informao uma commodity.

    Por outro lado, no existe razo para acreditar que o grau de transparncia para os atores polticos alcanou o ponto timo do ponto de vista da sociedade, vez que os prprios agentes polticos podem ser incentivados a manter em segredo alguns aspectos das discusses oramentrias, principalmente na parte em que decidem pela distribuio de recursos em benefcio de determinados seguimentos sociais ou econmicos com o propsito de traduzirem tais benefcios em apoios e votos nas prximas eleies.

    Tratando do fenmeno pagar para jogar o jogo das escolhas pblicas MONTEIRO28 (2006) esclarece que tem sido alvo de crescente ateno dos economistas e no deixa de ser paradoxal que, nas discusses sobre a presena (oramentria ou no-oramentria) do governo na economia brasileira, relevantes aspectos da interao dos polticos com grupos de interesses especiais sejam deixados de lado.

    O mesmo autor trata tambm da dupla configurao de cortar ou no cortar gasto pblico e do comprometimento dos atendimentos preferenciais a determinados seguimentos da economia em pocas eleitorais mostrando como os polticos lanam mo do que denomina de estratgia de ameaa e, por outro lado, como certos grupos de interesses encaminham aos polticos suas reivindicaes com o objetivo da apresentao de emendas Lei de Oramento de forma que os favoream.

    27 GARRETT, E.; VERMEULE, A. (2006) Transparency in the budget process. 2006. (University of Southern California

    Law School Law and Economics Working Paper Series, n. 44) 28

    MONTEIRO, Jorge Vianna. Intermediao poltica, transparncia decisria e atendimentos preferenciais. Revista de Administrao Pblica, vol.40 no.4 Rio de Janeiro Jul/Ago. 2006 http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-76122006000400012&script=sci_arttext

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    Como os recursos so escassos e as demandas da sociedade so amplas fica caracterizado que a idia de transparncia esta sempre ligada a aes de curto prazo que revelam uma estreita ligao com os ciclos polticos oramentrios (political budget cycles theory) em que os tomadores de deciso preocupam-se em demonstrar sua competncia administrativa no curto prazo com o objetivo da obteno de um certificado dos Tribunais de Contas como uma espcie de salvo conduto a ser apresentado durante o processo eleitoral.

    Ao tratar das evidencias dos ciclos polticos na economia brasileira BITTENCOURT29 (2002) esclarece

    Quando um poltico tem por objetivo principal a implantao de um programa, usa-se o termo partidrio para caracteriz-lo, j quando o objetivo principal manter-se no cargo refere-se a ele como oportunista.

    Por sua vez ao estudar o modelo de ciclo poltico e as variveis oramentrias o mesmo autor faz referencia aos estudos de Blanco (2000a, b e c) sobre os determinantes da poltica fiscal nos estados brasileiros com a identificao dos efeitos do ciclo eleitoral sobre as variveis oramentrias agregadas e revela que esse mesmo autor utilizando um conjunto de dados de painel, e incluindo variveis dummies, para o perodo 1985-1997, identifica que os grandes grupos de despesa dos Estados sofrem efeito do perodo eleitoral concluindo da seguinte forma:

    Para as trs variveis de despesa estadual estudadas em Blanco (2000a) despesa total, despesa corrente e despesa de capital o autor identifica a presena de ciclos poltico. Dado que o sinal esperado se verificou e que o coeficiente foi significativo, os resultados mostram que em anos eleitorais pode se esperar um aumento dos gastos eleitorais entre 10% e 15%.

    Fazendo referencia teoria das escolhas pblicas e dos interesses individuais e o bem comum ALVES e MOREIRA30 (2004) fazem referencia a David Hume que em vrios de seus ensaios assumiu de forma sistemtica a perspectiva de que os indivduos agiam motivados essencialmente pelos seus prprios interesses, mas esclarece mais adiante que uma boa governana depende essencialmente da adoo de uma correta abordagem moral por parte de quem detm o poder e a este propsito afirma:

    Todos os governos absolutos dependem em grande medida da administrao; e este um dos grandes inconvenientes desta forma de governo. Mas um Governo republicano e livre seria um bvio absurdo se os controles e restries previstos pela Constituio no tivessem nenhuma influncia e no fizessem com que fosse do interesse, mesmo de homens maus, agir para o bem pblico.

    Alm das reflexes sobre os interesses individuais e o bem comum que tem relao com os ciclos polticos de curto prazo e sua influncia sobre a administrao do patrimnio publico ALVES e MOREIRA (2004) revelam diversos estudos entre os quais destacam-se os de SHUMPETER sobre a democracia como um sistema de competio pelo poder; de PARETO, sobre o critrio do timo social e de WICKESELL ao tratar da proteo das minorias e da unanimidade revelando preocupao com a ineficincia e a injustia que poderiam resultar de medidas e polticas aprovadas por uma maioria de votos.

    Os estudos dos ciclos polticos de curto prazo mostram que a transparncia31 tem fortes ligaes com a responsabilidade fiscal por representar a capacidade de resposta dos governos aos

    29 BITTENCOURT, Jeferson Luis. Evidencias de ciclo poltico na economia brasileira: um teste para a execuo oramentria dos governos estaduais 1983/2000. Orientador Prof. Dr. Ronald Otto Hillbrecht. Dissertao de Mestrado. Programa de ps-graduao em economia da Faculdade de Cincias Econmicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre 2002 30

    ALVES, Andr Azevedo e MOREIRA, Jos Manuel. O que escolha pblica? Para uma anlise econmica da poltica. Principia. Cascais. 2004; 31 So exemplos de transparncia

    Na Unio o Portal da Transparncia http://www.portaltransparencia.gov.br/default.asp

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    cidados, ou seja, obrigao de informar e explicar seus atos na gesto pblica tendo como instrumentos, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal o Planejamento, a Transparncia, o Controle e a Responsabilizao cabendo destacar que a transparncia materializada pelos seguintes instrumentos da Gesto Fiscal (art. 48-LRF)

    os planos, oramentos e leis de diretrizes oramentrias;

    as prestaes de contas e o respectivo parecer prvio;

    o Relatrio Resumido da Execuo Oramentria;

    o Relatrio de Gesto Fiscal;

    as verses simplificadas desses documentos.e;

    As contas ficaro disponveis, durante todo o exerccio, no respectivo Poder Legislativo e no rgo tcnico responsvel pela sua elaborao, para consulta e apreciao pelos cidados e instituies da sociedade.

    Em reforo ao conceito de que a transparncia esta ligada a conceitos de curto prazo, basta verificar que a alterao efetuada no Cdigo Penal pela lei dos crimes contra as finanas pblicas32 estabeleceu penas de recluso para os que ordenarem, autorizarem ou realizarem operaes de crdito, interno ou externo, sem prvia autorizao legislativa ou, ainda, quem ordenar ou autorizar a inscrio em restos a pagar, de despesa que no tenha sido previamente empenhada ou que exceda limite estabelecido em lei. Trata-se, portanto, de atos de gesto realizados em determinado exerccio que devem ser examinados luz das regras da transparncia e, conseqentemente, do ciclo poltico a que se refiram ou seja de curto prazo.

    3.4.2 Evidenciao

    Em contraponto com a regra da transparncia preciso considerar que os atos produzidos pela execuo oramentria implicam na aquisio ou produo de ativos que, certamente, a partir da sua incorporao ao patrimnio sero capazes de gerar benefcios futuros para o Estado. Por sua vez, os atos dos administradores tambm podem constituir obrigaes de curto e longo prazo que devem ser registrados no passivo da entidade pblica.

    Por essa razo a teoria contbil separa os elementos de evidenciao do patrimnio em duas categorias, as contas diferenciais que acumulam valores relativos s contas de receita e despesa com vistas identificao do resultado do perodo e as contas integrais que indicam os elementos do ativo (bens e direitos) e passivo (obrigaes). As primeiras so postas em relevo por intermdio da transparncia enquanto as segundas esto relacionadas com o processo de evidenciao que significa por em evidencia ou seja mostrar com clareza e comprovar de modo insofismvel a prtica da divulgao (disclousure) de todas as informaes positivas ou negativas, que possam influenciar o processo decisrio.

    Alm da nfase transparncia e dos ciclos polticos de curto prazo a Lei de Responsabilidade Fiscal incluiu no artigo 4 uma espcie de evidenciao proativa ao indicar que a Lei de Diretrizes Oramentrias deve incluir, entre outros temas, o seguinte:

    evoluo do patrimnio lquido nos ltimos trs exerccios;

    destaque para a origem e a aplicao dos recursos obtidos com a alienao de ativos;

    No Municpio do Rio de Janeiro o Portal Rio Transparente http://riotransparente.rio.rj.gov.br/ 32

    Lei n 10.028 de 19 de outubro de 2.000

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    avaliao da situao financeira e atuarial;

    dos regimes geral de previdncia social e prprio dos servidores pblicos;

    dos demais fundos pblicos e programas estatais de natureza atuarial

    demonstrativo da estimativa e compensao da renncia de receita e da margem de expanso das despesas obrigatrias de carter continuado.

    anexo de Riscos Fiscais, onde sero avaliados os passivos contingentes e outros riscos

    Por outro lado, a mesma Lei indica especificamente que a contabilidade das entidades pblicas deve (Art. 50):

    obedecer s normas de Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico segregar as disponibilidades de caixa, dos recursos vinculados; aplicar o regime de competncia para Despesa e compromissos apurar complementarmente o resultado do fluxo financeiro apresentar as receitas e despesas previdencirias em demonstrativos especficos; evidenciar na escriturao o montante e variao da dvida pblica; destacar a aplicao das receitas de alienaes; apresentar a avaliao da eficincia dos programas com a manuteno da

    contabilidade de custos; proceder consolidao das contas nacionais e por esfera de governo; e estabelecer as normas gerais editadas pelo Conselho de Gesto Fiscal

    A Figura 4 A Nova Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico demostra as reas onde se situam as prticas da transparncia e da evidenciao com base no comando Constitucional do controle interno integrado previsto no artigo 74, dando origem ao que pode ser denominada de a nova Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico apoiada tanto nos princpios fundamentais de contabilidade como nas normas brasileiras de contabilidade aplicadas ao setor pblico.

    A edio dos Princpios Fundamentais de Contabilidade sob a perspectiva do setor pblico e das Normas Brasileiras de Contabilidade aplicadas ao setor pblico, representa uma nova etapa da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico que passa a incluir alm do enfoque oramentrio a viso patrimonial j que o patrimnio constitui seu objeto de estudo. A partir dessa nova viso ser possvel aos contadores pblicos vencer o desafio para considerar a Contabilidade do setor pblico como uma aplicao da Cincia Contbil a uma rea especifica como ocorre na contabilidade bancria, na contabilidade de instituies financeiras e na contabilidade de organizaes sem fins lucrativos.

    Por outro lado preciso considerar que a medida da eficincia no est restrita a conceitos oramentrios e financeiros. Tanto nas organizaes pblicas como nas privadas preciso absorver os conceitos de custos, de restries e de oportunidade, uma vez que no pode existir um sistema eficiente de controle interno que no seja sustentado por uma contabilidade patrimonial que atue na medio integral e real do patrimnio.

    A necessidade da viso integral do ativo, do passivo e do patrimnio lquido no setor pblico imprescindvel, pois no resta dvida de que, desde os primrdios, o patrimnio o objeto de estudo da Contabilidade, inclusive da Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico . O que ocorre na administrao pblica to somente um problema que diz respeito nfase dada aos aspectos oramentrio-legalistas para fins de apurao de responsabilidades imediatas em detrimento da correta e adequada evidenciao patrimonial em mdio e longo prazo.

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    Figura 4 A Nova Contabilidade Aplicada ao Setor Pblico

    Fonte: prpria

    As figuras 5 e 6, a seguir mostram a nfase no oramento (transparncia) representada por ciclos de curto prazo e a nfase no patrimnio representada pela evidenciao de todos os movimentos de curto e longo prazo.

    Figura 5 Transparncia - nfase no Oramento (Ciclos de curto prazo)

    Fonte: Prpria

    Contabilidade Crdito pblico

    Gesto financeira

    Oramento pblico

    A NOVA CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO TRANSPARNCIA X EVIDENCIAO

    PODER JUDICIRIO

    PODER EXECUTIVO

    PODER LEGISLATIVO

    Controle Interno Controle Interno Controle Interno

    CICLOS POLTICOS DE CURTO PRAZO Execuo do Oramento de Receita e Despesa

    TRA

    NA

    PAR

    NC

    IA

    Patrimnio no inicio do exerccio

    Movimentaes resultantes da execuo oramentria

    Patrimnio no final do exerccio

    Movimentaes independentes da execuo

    oramentria

    EVID

    ENC

    IA

    O

    DEMONSTRAES CONTBEIS DA NOVA CONTABILIDADE APLICADA SETOR PBLICO a) Princpios Fundamentais de Contabilidade Resoluo CFC n 1.111/2007 b) Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao setor pblico

    TRIBUNAL DE CONTAS

    Controle Externo

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    Figura 6 Evidenciao - nfase no Patromnio

    Fonte: Prpria

    3.5 Exerccios

    a) Defina o campo de aplicao e o objeto da contabilidade?

    b) A aplicao estrita do principio da anualidade oramentria induz considerao de que a pea oramentria representa o fluxo de caixa do governo. Comente esta afirmativa luz do principio contbil da continuidade?

    c) As dimenses da governana das entidades incluem: (a) padres de comportamento; (b) estrutura organizacional e processos; (c) controle e (d) controles externos. Comente cada uma destas dimenses.

    d) Quais as vantagens da utilizao, por parte dos administradores, dos conceitos de transparncia?

    e) Quais os instrumentos de gesto fiscal que tratam da transparncia segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n 101/2000).

    f) Porque sob o enfoque contbil deve prevalecer os princpios da evidenciao e da conversibilidade dos registros sobre o patrimnio?

    Oramento pblico

    Crdito pblico

    Gesto financeira

    Contabilidade

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    4. PATRIMNIO PBLICO

    4.1 Conceitos bsicos

    Patrimnio o conjunto de bens, direitos e obrigaes vinculados a uma pessoa fsica ou jurdica. Entretanto, os estudos sobre o patrimnio revelam que qualquer conjunto de bens, direitos e obrigaes somente constituiro um patrimnio quando forem observados dois requisitos bsicos:

    Sejam componentes de um conjunto que possua contedo econmico avalivel em moeda;

    Exista interdependncia dos elementos componentes do patrimnio e vinculao do conjunto a uma entidade que vise alcanar determinados fins.

    As Normas Brasileiras de Contabilidade ao tratar do setor pblico (NBC T SP) definem patrimnio pblico como o conjunto de direitos e bens, tangveis ou intangveis, onerados ou no, adquiridos, formados, produzidos, recebidos, mantidos ou utilizados pelas entidades do setor pblico, que seja portador ou represente um fluxo de benefcios, presente ou futuro, inerente prestao de servios pblicos ou explorao econmica por entidades do setor pblico e suas obrigaes33

    Por sua vez a leitura da Lei n 4.320/64 mostrar que os estudos de contabilidade na administrao pblica devem ser efetivadoss sob dois aspectos perfeitamente distintos como apresentado na figura 5.

    Figura 5: Aspectos do Patrimnio conforme a Lei n 4.320/64

    Fonte: Prpria

    4.2 A Contabilidade e o campo de sua aplicao

    A Contabilidade definida como a cincia que estuda e pratica as funes de orientao, controle e registro dos atos e fatos da administrao de qualquer entidade, seja ela pblica ou privada, com ou sem fins lucrativos. Entretanto, para melhor entendimento deste conceito, necessrio distinguir o seu campo de aplicao e o objeto dos estudos da cincia contbil, como a seguir:

    33 RESOLUO CFC N. 1.129/08 - APROVA A NBC TSP 16.2 PATRIMNIO E SISTEMAS CONTBEIS.

    Execuo do Oramento

    (at o artigo 82)

    Contabilidade (aps o artigo 83)

    Patrimnio

    Objeto

    Caixa

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    o campo de aplicao envolve o entorno da cincia contbil representado pela entidade; e

    o objeto est representado pelo patrimnio, definido como o conjunto de bens, direitos e obrigaes vinculados a uma pessoa fsica ou jurdica.

    A Contabilidade aplicada ao setor pblico, por sua vez, o ramo da cincia contbil que aplica, no processo gerador de informaes, os princpios fundamentais de contabilidade e as normas contbeis direcionadas ao controle patrimonial de entidades do setor pblico34.

    O campo de aplicao da contabilidade abrange qualquer entidade pblica ou privada que alguns autores preferem denominar de economia, entidade econmica, organismo econmico, unidade econmica, unidade de produo (quando com fins lucrativos) ou unidade de distribuio (quando sem fins lucrativos) ou, ainda, azienda, que no dizer de BARROS35 deve ser entendida como:

    poderia ser, perfeitamente, substitudo pelo vernculo fazenda e que se tornou de uso geral entre contabilistas e autores brasileiros principalmente pelo emprego que dele fez o Professor Frederico Hermann Junior, sem favor algum o maior vulto dentre os autores brasileiros de Contabilidade de seu tempo.

    Conforme se pode verificar na Contabilidade, os bens e direitos constituem o ATIVO e as obrigaes o PASSIVO, cujo contedo econmico dado pelo valor que constitui o atributo comum que lhe d homogeneidade.

    Embora a administrao pblica opere fundamentalmente na obteno de recursos financeiros que permitam o atendimento das necessidades pblicas, no podemos esquecer que, em decorrncia dos fatos administrativos de ordem financeira, o patrimnio sofre mutaes variadas, tanto nos elementos ativos, como nos elementos passivos.

    Assim, por fora da execuo do oramento, alm dos recursos financeiros obtidos e da realizao dos gastos de custeio, o Estado realiza gastos na construo ou aquisio de bens cujo conjunto deve administrar e conservar. Esse conjunto de bens constitui os BENS PBLICOS36 que pertencem ou que so produzidos pelo Estado e que, uma vez incorporados ao patrimnio do Estado, ficam submetidos ocorrncia de fenmenos espontneos ou administrativos que podem alterar seu valor como o caso de valorizaes e depreciaes .

    Por outro lado, a administrao pblica tambm assume compromissos com terceiros mediante a obteno de emprstimos internos e externos, a curto e longo prazos, que constituem o que se denomina DVIDA PBLICA.

    O patrimnio do Estado, como matria administrvel, isto , como objeto da gesto patrimonial desempenhada pelos rgos da administrao, o conjunto de bens, valores, crditos e obrigaes de contedo econmico e avalivel em moeda que a Fazenda Pblica possui e utiliza na consecuo dos seus objetivos.

    No mbito da Contabilidade, os estudos do patrimnio pressupem o detalhamento do conjunto do Ativo, Passivo e Patrimnio Liquido de modo a determinar como o mesmo est evidenciado nas demonstraes contbeis da entidade e, deste modo, identificar:

    34 RESOLUO CFC N. 1.128/08. Aprova a NBC T 16.1 Conceituao, Objeto e Campo de Aplicao. 35 BARROS, J. dAssuno. Introduo Contabilidade. R.J. Editora Escol 1959 3. edio p. 12. 36 O conceito de bem pblico aqui utilizado o conceito contbil e no o conceito econmico em que os bens pblicos so aqueles que tm duas caractersticas bsicas: uma vez disponveis para um indivduo ficam disponveis para todos e, ao mesmo tempo, o consumo de mais de um individuo no prejudica o consumo dos outros que j consomem o bem. O sinal luminoso emitido por um farol da Marinha para orientar os navios um exemplo de bem pblico vez que estar disponvel imediatamente para todos os navios e sua utilizao por qualquer navio no afeta o sinal luminoso disponvel para outros navios. Entretanto, a torre e o prdio onde est localizado o farol constitui um bem pblico no sentido contbil.

  • CURSO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    32

    os fatores que influem a estrutura patrimonial;

    as relaes entre os componentes patrimoniais;

    as modificaes que o patrimnio sofreu ao longo dos exercicios;

    os riscos a que esto submetidos os elementos desse patrimnio.

    Os bens que formam o patrimnio do Estado classificam-se segundo dois critrios:

    critrio jurdico;

    critrio contbil.

    4.2.1 Critrio jurdico

    O Cdigo Civil divide inicialmente os bens em pblicos e particulares conceituando como pblicos os do domnio nacional, pertencentes Unio, aos Estados e aos Municpios e como particulares todos os outros.

    No desenvolvimento de sua atividade, a administrao tanto se serve de bens que se acham sujeitos ao seu domnio como de bens dos cidados sobre os quais exerce determinados poderes no interesse geral.

    Esses bens, segundo o critrio jurdico, so assim classificados:

    bens de uso comum do povo;

    bens de uso especial;

    bens dominicais.

    Os bens de uso comum do povo, tambm denominados de domnio pblico, so divididos, segundo sua formao em:

    naturais correspondem aos bens que no absorveram ou absorvem recursos pblicos como mares, baas, enseadas, rios, praias, lagos, ilhas etc.;

    artificiais so aqueles bens de uso comum que absorveram ou absorvem recursos pblicos e , portanto, cuja existncia supe a interveno do homem, como ruas, praas, avenidas, canais, fontes etc.

    So, portanto, de uso comum todos os bens destinados ao uso da comunidade quer individual ou coletivamente e por isso apresentam as seguintes caractersticas:

    quando naturais no so contabilizados como Ativo ;

    quando artificiais so contabilizados no ativo e includos no patrimnio da instituio;

    quando naturais no so inventariados ou avaliados;

    no podem ser alienados enquanto conservarem a qualificao de uso comum do povo37;

    so impenhorveis e imprescritveis;

    o uso pode ser oneroso ou gratuito, conforme estabelecido em lei;

    37 Entre as diversas situaes em que um bem de uso comum pode ser alienado pode ser citado o caso de alienao

    aos proprietrios de imveis lindeiros (vizinhos, limtrofe, fronteirios) e que sejam remanescentes ou resultante de obra pblica (modificao do alinhamento de reas urbanas de uso comum, tais como ruas e praas), na forma e nos limites prescritos na Lei de Licitaes (Lei 8.666/93 (art. 17, 3. inciso I com a nova redao dada pela Lei 9648/98.),

  • CURSO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    33

    As normas de contabilidade estabelecem que os bens de uso comum que absorveram ou absorvem recursos pblicos, ou aqueles eventualmente recebidos em doao, devem ser includos no ativo no circulante da entidade responsvel pela sua administrao ou controle, estejam, ou no, afetos a sua atividade operacional. Assim, ao realizarem investimentos ou despesas de capital nesses bens a entidade deve proceder ao seu registro no Ativo com o objetivo de acumular o custo da construo ou reforma, bem como as perdas do valor em decorrncia do uso (depreciao, amortizao ou exausto).

    Com a introduo da contabilidade de custos no setor pblico inevitvel a manuteno do registro desses investimentos como elemento permanente no ativo, seja para fins de controle das aplicaes, seja porque muitos desses ativos podem ser alienados mediante autorizao legislativa ou ser explorados pelo Estado com o objetivo de auferir receitas em funo do respectivo uso.

    Os bens de uso especial, ou do patrimnio administrativo so os destinados execuo dos servios pblicos, como os edifcios ou terrenos utilizados pelas reparties ou estabelecimentos pblicos, bem como os mveis e materiais indispensveis ao seu funcionamento. Tais bens tm uma finalidade pblica permanente, razo pela qual so denominados bens patrimoniais indispensveis.

    Os bens do patrimnio administrativo tm as seguintes caractersticas:

    so contabilizados no ativo;

    so inventariados e avaliados;

    so inalienveis quando empregados no servio pblico e enquanto conservarem esta condio.

    Os bens dominicais, ou do patrimnio disponvel, so os que integram o patrimnio das pessoas jurdicas de direito pblico como objeto de direito pessoal ou real das entidades do setor pblico.

    Os bens dominicais possuem as seguintes caractersticas:

    esto sujeitos contabilizao no ativo;

    so inventariados e avaliados;

    podem ser alienados nos casos e na forma que a lei estabelecer;

    do e podem produzir renda.

    Ainda sob o aspecto jurdico, os bens patrimoniais do Estado podem ser classificados em:

    Bens mveis

    So mveis os bens suscetveis de movimento prprio, ou de remoo por fora alheia, sem alterao da substncia ou da destinao econmico-social. Por outro lado, so tambm mveis por determinao legal as energias que tenham valor econmico, os direitos reais sobre objetos mveis e as aes correspondentes, bem como os direitos pessoais de carter patrimonial e respectivas aes.

    Assim, compreendem-se entre os bens mveis os diversos materiais para o servio pblico, o numerrio, os valores, os ttulos e, ainda, os materiais destinados a construo, enquanto no empregados, mas podendo, no futuro, readquirir essa qualidade quando provenientes da demolio de algum prdio.

  • CURSO DE CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PBLICO

    34

    Bens imveis

    So bens imveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente, sendo que para efeitos legais tambm se consideram imveis:

    os direitos reais sobre imvei