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APLICAÇÃO DO MÉTODO DE ANÁLISE ERGONÔMICA DO TRABALHO EM UMA EMPRESA ALIMENTÍCIA DE PEQUENO PORTE OBJETIVANDO PROPOSTAS DE MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO gabriela franco dos santos vasconcelos maciel (UFF ) [email protected] NISSIA CARVALHO ROSA BERGIANTE (UFF ) [email protected] Ramon Lopes do Nascimento (UFF ) [email protected] Isadora Santos Jardim (UFF ) [email protected] mariana navega custodio de souza (UFF ) [email protected] O estudo analisa as questões ergonômicas de uma empresa alimentícia de pequeno porte, lançando mão do método de Análise Ergonômica do Trabalho (AET), a fim de identificar questões passíveis de melhoria no que diz respeito à saúde do trabalhhador e, consequentemente, ao funcionamento da organização como um todo. Através de entrevistas, aplicação de questionários e observação da execução de atividades foi possível propor soluções eficazes e que, ao mesmo tempo, respeitassem as limitações de investimento de uma pequena empresa. Todo o estudo foi pautado em conceitos e teorias da Ergonomia e os resultados mostram que mudanças simples no ambiente de trabalho podem trazer grandes benefícios para o trabalhador e para a empresa, aumentando a sua produtividade, prevenindo doenças ocupacionais e, por conseguinte, diminuindo os casos de absenteísmo e de afastamentos. Palavras-chaves: Análise Ergonômica do Trabalho, indústria de alimentos, ambiente de trabalho, saúde do trabalhador XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.

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APLICAÇÃO DO MÉTODO DE ANÁLISE

ERGONÔMICA DO TRABALHO EM

UMA EMPRESA ALIMENTÍCIA DE

PEQUENO PORTE OBJETIVANDO

PROPOSTAS DE MELHORIA DAS

CONDIÇÕES DE TRABALHO

gabriela franco dos santos vasconcelos maciel (UFF )

[email protected]

NISSIA CARVALHO ROSA BERGIANTE (UFF )

[email protected]

Ramon Lopes do Nascimento (UFF )

[email protected]

Isadora Santos Jardim (UFF )

[email protected]

mariana navega custodio de souza (UFF )

[email protected]

O estudo analisa as questões ergonômicas de uma empresa alimentícia

de pequeno porte, lançando mão do método de Análise Ergonômica do

Trabalho (AET), a fim de identificar questões passíveis de melhoria no

que diz respeito à saúde do trabalhhador e, consequentemente, ao

funcionamento da organização como um todo. Através de entrevistas,

aplicação de questionários e observação da execução de atividades foi

possível propor soluções eficazes e que, ao mesmo tempo, respeitassem

as limitações de investimento de uma pequena empresa. Todo o estudo

foi pautado em conceitos e teorias da Ergonomia e os resultados

mostram que mudanças simples no ambiente de trabalho podem trazer

grandes benefícios para o trabalhador e para a empresa, aumentando

a sua produtividade, prevenindo doenças ocupacionais e, por

conseguinte, diminuindo os casos de absenteísmo e de afastamentos.

Palavras-chaves: Análise Ergonômica do Trabalho, indústria de

alimentos, ambiente de trabalho, saúde do trabalhador

XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos

Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.

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1. Introdução

O mundo corporativo se apresenta cada vez mais competitivo e, a fim de garantir espaço no

mercado, muitas empresas acabam por exigir demais de seus colaboradores sem lhes

proporcionar um ambiente de trabalho adequado. Assim, para que as atividades sejam

executadas no ritmo demandado, o trabalhador tem, muitas vezes, sua saúde, seja ela física

e/ou mental, prejudicada.

A Ergonomia, nesse contexto, se apresenta como peça fundamental para proporcionar um

ambiente de trabalho que atenda às necessidades do trabalhador. Segundo Abrahão e Pinho

(1999), uma das atribuições da ergonomia seria intervir em situações dos mais diversos tipos,

desde aquelas extremamente automatizadas, passando por questões referentes ao trabalho

manual, sem esquecer as que envolvem problemas de saúde, em particular, os decorrentes das

lesões por esforços repetitivos.

Apesar de toda legislação e tecnologia disponíveis atualmente, não é incomum encontrar

organizações, independente do seu porte, que deixam a desejar quando o assunto é segurança

e saúde ocupacionais. Para auxiliar as organizações a adequar o ambiente de trabalho de modo

a beneficiar o trabalhador, lança-se mão de ferramentas, tais como a Análise Ergonômica do

Trabalho (AET).

Para Bouyer (2007), o arcabouço ferramental trazido pela AET é de fundamental importância

para uma maior compreensão do objeto de análise ergonômica, a atividade, o trabalho e o

sujeito que exerce a ação. Daniellou (2004) vai ao encontro desta opinião reforçando que,

sendo uma atividade multidisciplinar, a ergonomia carece de um método ajustado que

propicie a geração de dados brutos para a análise.

O presente artigo tem por objetivo aplicar o método de Análise Ergonômica do Trabalho

(AET) em uma empresa alimentícia de pequeno porte, a fim de propor melhorias nas

condições de trabalho, através da adequação do ambiente laboral às características e

necessidades psicofisiológicas do trabalhador.

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2. Estudo ergonômico

Neste item, serão apresentados os conceitos mais relevantes da Ergonomia para o presente

estudo, além de proporcionar um melhor entendimento sobre o método de Análise

Ergonômica do Trabalho (AET).

2.1. Aspectos gerais da Ergonomia

A Ergonomia é uma área cujo estudo tem avançado significativamente ao longo dos anos,

porém seu uso e aplicação são ainda pouco conhecidos pela sociedade em geral, embora seja

de imensa relevância para o trabalhador e consequentemente para as organizações que o

emprega.

Conforme Lima (2003) aponta, a Ergonomia permite analisar a adaptação do trabalho ao

homem e, por isso, sua importância no que diz respeito ao ambiente moderno de trabalho.

Assim, essa ciência tem por objetivo, de acordo com Abrahão et al (2009), ajustar a atividade

às características peculiares do homem, tornando adequada e saudável a interação entre ele o

processo produtivo em que atua.

Segundo a ABERGO (Associação Brasileira de Ergonomia), sendo uma disciplina científica,

está “relacionada ao entendimento das interações entre os seres humanos e outros elementos

ou sistemas, e à aplicação de teorias, princípios, dados e métodos a projetos a fim de otimizar

o bem estar humano e o desempenho global do sistema”. Neste sentido, a sua dimensão

determina a possibilidade de ampliação da qualidade de vida do trabalhador e do bem/serviço

produzido.

Em função de sua aplicação, Lida (2005) classifica a Ergonomia como de concepção,

correção e conscientização. Como explicado pelo autor, a Ergonomia de concepção ocorre

quando a contribuição ocorre na fase inicial do projeto do produto, do processo ou do

ambiente, antes de sua implantação. Já a Ergonomia de correção ocorre quando a contribuição

se faz em situações já existentes, com o objetivo de solucionar desde problemas físicos até

psicológicos das pessoas através, por exemplo, do redesenho ou até substituição completa de

máquinas e de postos de trabalho. Por último, a Ergonomia de conscientização provém da

necessidade de atuação proativa dos próprios trabalhadores, a qual ocorre por meio de

capacitação dos mesmos para identificação e correção das situações enfrentadas.

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A Análise Ergonômica do Trabalho (AET), método este utilizado pelo presente trabalho, se

apresenta como uma ferramenta da Ergonomia de correção.

2.2. Análise Ergonômica do Trabalho (AET)

A Análise Ergonômica do Trabalho (AET) é uma das metodologias que busca estudar tanto a

dimensão explícita do trabalho (tarefa), quanto a sua dimensão implícita (atividade).

Destarte, a AET é de certa forma uma ferramenta estratégica, já que anseia não apenas

proporcionar conforto e segurança ao trabalhador, mas como resultado deste processo de

melhoria, torná-lo mais produtivo com o objetivo de aumentar a eficiência operacional,

reduzindo as perdas e, por conseguinte, gerando mais lucros (LIMA 2003). O método em

questão é constituído por um conjunto de etapas e ações, segundo Abrahão et al (2009), onde

as hipóteses são construídas, validadas ou refutadas ao longo do processo, o que permite

investigar o trabalho real do sujeito, respeitando a sua variabilidade, bem como da situação de

trabalho e dos instrumentos.

As fases constituintes da AET estão representadas na Figura 1.

Figura 1 – Etapas da AET

Fonte: Adaptado de Abrahão et al (2009)

Vale ressaltar que este é um método interativo, não sendo necessário cumprir rigorosamente a

linearidade apresentada. A complexidade do objeto de estudo determinará o andamento de

cada trabalho.

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3. Desenvolvimento do estudo

3.1. Metodologia utilizada

Neste presente estudo utilizou-se uma metodologia baseada na AET, visando ao entendimento

do trabalho realizado na empresa escolhida, à definição do diagnóstico ergonômico e à

proposição de melhorias para o ambiente de trabalho e, consequentemente, para a saúde do

trabalhador.

Primeiro, foi feito um levantamento geral a respeito da empresa com o próprio dono, que

também ocupa a posição de gerente e participa ativamente de todos os setores. Neste

momento, procurou-se entender as características da empresa, o contexto no qual se insere

juntamente com os seus principais processos, cargos e funções.

Em seguida, foi feita uma entrevista coletiva com todos os funcionários que trabalham na sede

da empresa. Tal interação ocorreu no próprio local de trabalho durante uma pausa autorizada

pelo gerente e buscou-se criar um ambiente agradável, de modo que os entrevistados se

sentissem a vontade. Durante a entrevista, levantou-se uma série de dados, como idade,

função, tempo de serviço, nível de escolaridade peso e altura; foi aplicado um questionário, o

qual se encontra em anexo; e também foi solicitado que eles preenchessem o diagrama de

áreas dolorosas (CORLETT; MANENICA, 1980), em anexo, objetivando identificar as partes

do corpo mais exigidas durante a atividade laboral.

Após entrevista, procurou-se observar na seção crítica, definida a partir das etapas anteriores,

o processo de trabalho, o deslocamento neste local, as posturas, as comunicações verbais e

gestuais, as ações efetuadas, as tomadas de decisão, dentre outros fatores.

A partir das informações obtidas nas etapas supracitadas, foi definido um diagnóstico e, então,

foram desenvolvidas propostas de melhoria.

3.2. Informações sobre a empresa

O estudo foi realizado em uma empresa alimentícia de pequeno porte, localizada na cidade de

São Gonçalo, Rio de Janeiro, Brasil. A principal linha de produtos da empresa diz respeito a

pastas a base de soja, a qual serviu como objeto de estudo.

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A crescente demanda por produtos a base de soja é uma característica do setor e se apresenta

como uma oportunidade de ampliação para os negócios da empresa. Por fim, destaca-se no

setor alimentício a forte dependência dos grandes supermercados, responsáveis pela maior

quantidade de vendas. Uma alternativa que já vem sendo adotada é a conquista de novos

clientes de menor porte e políticas de parcerias de longo prazo com os principais clientes.

3.3. População de trabalho da empresa

A empresa conta com 23 funcionários, os quais se encontram distribuídos nas áreas conforme

mostra o organograma na Figura 2. Como a empresa não possuía uma estrutura

organizacional formalizada, o grupo de estudo a fez a partir da análise dos cargos existentes e

suas respectivas funções desempenhadas.

Figura 2 – Organograma da empresa

Tendo realizado as entrevistas e aplicado os questionários, foi possível fazer um levantamento

de dados importantes dos funcionários da empresa. Vale ressaltar que alguns funcionários não

possuem a sede da empresa como local fixo de trabalho, como aqueles que trabalham com

distribuição e vendas, e, por isso, não participaram da entrevista nem responderam o

questionário.

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Quanto à faixa etária, a idade dos funcionários varia entre 20 e 56 anos, sendo que 70% dos

funcionários têm até 40 anos, como pode ser observado na Figura 3. O cargo de Auxiliar de

Produção inclui embalador, cozinheiro e envasador.

Figura 3 – Quantidade de funcionários por faixa etária

Ao calcular o índice de massa corpórea (IMC) se constatou que 65% dos funcionários estão

com o peso acima do recomendável, que segundo a Associação Brasileira para o Estudo da

Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) varia entre 18,5 e 24,9. Esta situação pode ser

resultado de uma má alimentação e pouca atividade física, mesmo observando-se uma

atividade laboral intensa.

Figura 4 – Índice de massa corpórea dos funcionários

Quanto ao grau de escolaridade, é exigido o segundo grau completo para os cargos de

produção, motorista e promotor, no entanto, algumas vezes é preciso abrir exceções para o

Representante Comercial

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pessoal da produção, desde que passem em um teste realizado na seleção. Para as funções de

expedição e armazenagem e para o auxiliar administrativo é exigido também conhecimento de

informática, o qual é avaliado por meio de treinamento. A escolaridade dos funcionários é

mostrada na Figura 5.

Figura 5 – Escolaridade dos funcionários

3.4. Dados gerais sobre a organização do trabalho

A jornada de trabalho na empresa é das 09h às 18h, tendo uma hora de almoço às 12h. A

organização pode ser dividida, para melhor entendimento, nos setores administrativo, estoque

e produção, os quais serão apresentado a seguir.

3.4.1. Setor administrativo

Este setor é responsável pelo recebimento dos pedidos e pelo faturamento dos mesmos. Conta

com apenas uma funcionária que realiza a maior parte dos procedimentos no computador. Ela

também é responsável por atender aos telefonemas.

Na entrevista, a funcionária se mostrou satisfeita com as atividades que executa, apesar de

ressaltar que o volume de trabalho aumentou cerca de três vezes ao longo dos dois anos que

está na empresa. Quanto ao posto de trabalho, houve algumas queixas. A cadeira, bastante

antiga, não é regulável e, por isso, gera desconforto e não há apoio para os pés. Também

houve queixa de dor nos olhos e nos pés. A temperatura às vezes incomoda quando o ar está

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regulado para temperaturas muito baixas, por volta dos 19ºC. O monitor tem altura regulável e

há apoio para os pulsos. Além disso, o ambiente apresenta iluminação satisfatória e não há

incidências de ruídos intensos.

3.4.2. Setor de estoque

Há um funcionário responsável pelo estoque que faz a verificação e a separação dos pedidos.

Ele também é responsável por levar os pedidos completos para o refrigerador com a ajuda de

um carrinho. Não há um limite de carga determinada para o funcionário carregar.

Na entrevista, o funcionário descreveu seu trabalho como bastante fácil e muitas vezes

monótono. Disse ser a sua primeira experiência de emprego formal e que o treinamento foi

feito com o um antigo funcionário da área. Conforme observado, o volume de produção não é

constante durante o dia e, com isso, não há necessidade de vários carregamentos de caixas até

o refrigerador. Segundo ele, no período próximo ao final do expediente há uma maior

agitação dos funcionários e ele tende a cometer mais erros. Essa agitação, de acordo com ele,

seria decorrente da afobação para terminar o trabalho mais rápido e poder ir embora.

Houve queixas relacionadas à iluminação do refrigerador, a qual está bem fraca, e com

relação à temperatura deste local, que é muito baixa. No estoque, ao contrário, costuma ser

quente e abafado. Não há incidência de ruídos intensos e, por trabalhar sozinho, não é comum

haver conversas.

3.4.3. Setor de produção

Neste setor, o treinamento que o funcionário novo recebe é dado pelos funcionários antigos,

ou seja, não há um responsável por isso e o aprendizado do funcionário é na prática. Todos

aprendem a executar todas as tarefas da linha de produção, o que possibilita a cooperação

entre eles. Com isso, quando um funcionário termina a execução de sua tarefa, ele ajuda o

funcionário daquele posto de trabalho que se encontra mais atarefado, adiantando o trabalho

de toda a equipe, pois os trabalhadores também são os responsáveis pela limpeza do ambiente

de trabalho no final do expediente. Para não saírem muito tarde, os trabalhadores tendem a

produzir o máximo que conseguirem durante a manhã, para que, caso cheguem novos pedidos

durante a tarde, eles possam produzir de modo que não atrapalhe o horário de saída.

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Ao longo de todo o processo produtivo, o qual é apresentado na Figura 6, todos os

trabalhadores do setor permanecem na posição em pé durante a maior parte da jornada de oito

horas de trabalho, o que acaba provocando dores nas costas e nas pernas.

Figura 6 – Processo produtivo da linha a base de soja

Como pôde ser visto, há um excesso de carga de trabalho, pois a quantidade de pedidos vem

aumentando e o número de funcionários se mantém o mesmo. Além disso, não há uma

distribuição uniforme de produção ao longo do dia, o que acaba sobrecarregando os

funcionários. Pode-se observar também que não há ventilação suficiente no setor, dentre

outros pontos que serão levantados mais adiante.

4. Definição e análise da situação crítica

A partir da análise realizada, foi definido como seção crítica o setor de produção, o qual

apresenta diversos fatores ergonômicos com potencial necessidade de melhoria e onde foram

reveladas queixas e reclamações entendidas como mais relevantes. Constatou-se sobrecarga

de trabalho dos funcionários; ausência de pausas para descanso; menos tempo do que devido

para realizar atividades fisiológicas, como ir ao banheiro; dores no corpo; e necessidade de

um ambiente mais confortável para pausas e almoço.

4.1. Observação sistemática da situação crítica

Foi observado que há execução de movimentos repetitivos dos membros superiores, o que

provoca desconforto nas mãos e nos pulsos dos trabalhadores. Também foi possível observar

a grande movimentação dos trabalhadores, inclusive para transportar as duas balanças digitais

existentes de um posto de trabalho para outro devido à quantidade insuficiente desses

instrumentos.

O levantamento de peso ocorre em algumas etapas do processo. A pessoa que cozinha a soja

necessita despejar os grãos cozidos da panela para a centrífuga, carga esta que contém cerca

de 30 quilos. O transporte do extrato de soja da centrífuga para o cutter, utilizado para triturar

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alimentos, também é feito manualmente pelo trabalhador que vai preparar a pasta. Após o

preparo da pasta, a mesma precisa ser levada do cutter para a envasadora, a qual fica

localizada a uma altura de 2,15 metros. Neste transporte, o peso da carga é de

aproximadamente 20 quilos e é realizado, em média, dez vezes ao dia. Ao final do dia alguns

dos equipamentos precisam ser levados até a pia para serem lavados e, segundo os

trabalhadores, eles são bastante pesados, no entanto, não foi possível mensurar esses pesos.

Quanto ao ambiente de trabalho, observou-se que, apesar dos ventiladores de teto instalados, a

temperatura próxima ao fogão é bastante elevada e a sensação térmica do trabalhador que

utiliza a envasadora também não é confortável, pois há grande incidência do sol em seu posto

de trabalho. Vale ressaltar que apenas três das seis bocas do fogão se encontravam em

funcionamento, sendo apenas uma em fogo alto, aumentando o tempo que o trabalhador

permanece à frente do fogão. Quanto ao ruído, quando a centrífuga e/ou o cutter estão

ligados, não é possível haver comunicação verbal entre os trabalhadores, os quais passam a

utilizar gestos. Inclusive não é possível escutar o alarme que sinaliza o término da atividade

do cutter.

A iluminação é satisfatória na maior parte do espaço utilizado, inclusive há bastante

incidência de luz natural, como dito anteriormente. Porém, sobre a pia, a qual é bastante

utilizada no final do dia para a lavagem de alguns equipamentos, essa iluminação não pareceu

ser suficiente. Vale lembrar que, infelizmente, pelos autores não possuírem instrumento de

medição adequado para verificar o fluxo luminoso, o luxímetro, não foi possível quantificar

tal variável.

As dimensões da fábrica facilitam a execução das tarefas, assim como a disposição e a altura

de máquinas e bancadas no setor de produção. Ademais, os funcionários fazem uso dos

seguintes equipamentos de proteção individuais (EPI): touca de cabelo, bota de borracha e

cano alto, máscara e luvas.

4.2. Caracterização da organização do trabalho

No processo de produção da linha de produtos a base de soja trabalham três funcionários. Um

é responsável por preparar a massa (fogão e centrífuga), outro por envasar, selar e colocar a

data de validade do produto, e o último coloca a tampa e embala em caixas com 12 potes.

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Esse terceiro funcionário, que está em treinamento, ainda não apresenta o ritmo de trabalho

exigido pela linha de produção.

O funcionário responsável pelo envase também cuida da manutenção dos equipamentos e faz

a inspeção de pesagem do produto após o envase.

As massas têm que ser feitas exatamente conforme a receita, mas os movimentos não são pré-

estabelecidos nem especificados em documentos de prescrição de trabalho.

4.3. As três dimensões da carga de trabalho

Identificaram-se as dimensões da carga de trabalho segundo a classificação de Wisner (1994).

A primeira delas é a carga física que está associada principalmente às queixas de cansaço e

dores nos pés, pernas, coluna, punhos e mãos, devido aos movimentos repetitivos, à alta carga

de trabalho e ao peso das cargas transportadas.

A segunda dimensão é de natureza cognitiva. Os funcionários memorizam uma série de

informações referentes à receita da pasta de soja, assim como normas de higiene e vigilância

sanitária, essenciais na fabricação de alimentos.

Quanto à dimensão psíquica, os funcionários se sentem sobrecarregados e pressionados a

nunca faltar ao trabalho, se atrasar ou sair mais cedo, o que implicaria no não recebimento da

cesta básica no fim do mês.

5. Propostas de melhoria

A partir da análise da demanda, das tarefas e das atividades e, por conseguinte, da definição

do diagnóstico, foi possível estabelecer uma série de melhorias não só para a seção crítica, a

qual foi estudada em maior profundidade, mas também para os demais setores. Buscou-se

considerar as limitações de investimento da organização, por ser uma empresa de pequeno

porte. A Tabela 1 traz as propostas de melhoria para a seção crítica.

Tabela 1 – Propostas de melhoria para a seção crítica

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Problemas identificados Diagnóstico Recomendações

Tempo excessivo em pé

Dores nas costas e

nas pernas,

sensação

prolongada de

cansaço

Duas pausas de 15 min

ao longo do dia, além de

1 hora para o almoço

Movimentos repetitivos

dos membros superiores

Fadiga e cansaço

corporal, dores nos

punhos e nos braços

Revisão do método de

realização das tarefas

Levantamento de peso

inadequado

Dores nos ombros e

nos punhos

Utilização de tubo já

existente na empresa

para levar pasta de soja

do cutter para

envasadora

Temperatura elevada

Sensação térmica

desconfortável,

provocando mal-

estar e até desmaio

Aumento do número de

exaustores e ventiladores

Fogão precário

Aumento do tempo

de execução das

atividades elevando

o desconforto

resultante da alta

temperatura

Aquisição de um novo

fogão ou uma

manutenção corretiva do

fogão existente

Ruído excessivo

Impossibilidade de

comunicação entre

os trabalhadores,

dificultando a

execução do

trabalho

Utilização de protetores

auriculares quando todas

as máquinas estiverem

ligadas e avisos

luminosos ao invés de

sonoros

Luminosidade

inadequada sobre a pia

Esforço excessivo

da vista

Iluminação mais intensa

sobre a pia

Quantidade insuficiente

de balanças precisas

Movimentação

desnecessária dos

funcionários e atraso

na execução de

tarefas

Aquisição de novas

balanças para agilizar as

etapas do processo

produtivo

6. Considerações finais

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Através do presente trabalho foi possível perceber que problemas ergonômicos são uma

realidade nas organizações, porém muitas vezes não são priorizados ou nem ao menos

conhecidos. Essa negligência gera uma série de consequências, tanto no que diz respeito à

saúde e segurança dos trabalhadores, quanto ao resultado esperado no produto ou serviço

produzido, além do aumento da possibilidade de perdas e aumento de custos ao longo do

processo produtivo.

O método de AET utilizado, dada a realização de entrevistas e aplicação de questionários, se

mostrou adequado para a observação, não apenas das questões relacionadas ao aspecto físico

e às condições de trabalho mas também problemáticas relacionadas à cognição do trabalhador

e sua forma de convivência com os demais. Ficou claro aos autores que o estudo dessas

questões é primordial para a ampliação do entendimento da atividade e dos elementos de

ordem emocional intrínsecos a ela, e que de tal modo são inerentes a qualquer ser humano ao

desempenhar sua atividade laboral.

De todo modo, mesmo com o planejamento do trabalho e a utilização das ferramentas aqui

descritas para realização do estudo, não foi possível quantificar todas as variáveis exploradas,

como o fluxo luminoso, a temperatura do ambiente e do ruído gerado pelas atividades

analisadas.

Entretanto, mesmo com estas limitações, o estudo mostrou que algumas variáveis do processo

produtivo precisam ser revistas e melhoradas de modo a proporcionar ao trabalhador um

ambiente mais favorável à realização das suas atividades diárias e, assim, aumentar a

produtividade de toda a equipe.

REFERÊNCIAS

ABERGO. O que é Ergonomia. Disponível em:

<http://www.abergo.org.br/internas.php?pg=o_que_e_ergonomia> Acesso em: 22 abril 2013.

ABESO. Calcule seu IMC. Disponível em: < http://www.abeso.org.br/calcule-seu-

imc.shtml> Acesso em: 22 abril 2013.

ABRAHÃO, J; PINHO, D. Teoria e prática ergonômica: seus limites e possibilidades.

Escola, Saúde e Trabalho: estudos psicológicos. Brasília: Editora Universidade de Brasília,

1999.

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Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.

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ABRAHÃO, J; SZNELWAR, L; SILVINO, A; SARMET, M; PINHO, D. Introdução à

Ergonomia: da prática à teoria. São Paulo, 2009.

BOUYER, G. C. A ciência ergonômica entre a epistemologização e a cientificidade. In:

ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 27.2007, Foz do Iguaçu.

Anais... Foz do Iguaçu: PUC-PR, 2007.

CORLETT, E. N.; MANENICA, I. The effects and measurement of working postures.

Applied Ergonomics, v. 11, p. 7-16, 1980.

DANIELLOU, F. Introdução - questões epistemológicas acerca da ergonomia. In:

DANIELLOU, F. (Coord.). A ergonomia em busca de seus princípios: debates

epistemológicos. São Paulo: Edgard Blucher, 2004. p. 1-18.

LIDA I. Ergonomia Projeto e Produção. 2a edição revisada e ampliada. Editora EDGARD

BLÜCHER, 2005

LIMA, João. Metodologia de Análise Ergonômica. João Pessoa: UFPB, 2003. Monografia

(Especialização) – Departamento de Engenharia de Produção, Universidade Federal da

Paraíba, João Pessoa, 2003.

WISNER, A. Organização do Trabalho, carga mental e sofrimento psíquico. In: A

inteligência no Trabalho, São Paulo: Fundacentro, 1994.

ANEXO

Questionário

Nome: ___________________________________________________________________

Função e tempo de função: _________________________________________________

Estado Civil: __________________

Filhos: ________________

1) Conte-nos um pouco sobre o seu trabalho aqui:

* O que faz quando chega?

* Tem que preparar, limpar alguma máquina e/ou ferramenta?

* Quais são as máquinas e/ou ferramentas que utiliza?

* Quais são os movimentos que você faz?

* Há uma pausa durante o trabalho?

2) No primeiro dia de trabalho aqui, você tinha essa mesma função? Quem te ensinou? Havia regras

escritas ou alguém veio e te mostrou como fazia? Teve muita dificuldade? Qual foi sua primeira

impressão? O que mudou de lá pra cá?

3) Quanto tempo demora da sua casa aqui? Vem a pé?

XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos

Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.

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4) Quando tem dúvidas e/ou ocorre algum problema, a quem recorre? Você mesmo resolve?

5) Houve algum momento engraçado e/ou um aperto que já passou aqui na empresa? Pode ser durante

o expediente ou no caminho.

6) É comum erros repetitivos quando você está realizando o trabalho? Há algum período do dia que

isso mais ocorre?

7) Ao final do dia, qual a parte do seu corpo que você sente mais cansada?

8) Você considera que seu trabalho exige muito esforço de alguma parte do corpo específica: olhos,

pernas, braços, costas...

9) Como você avaliaria o nível de conforto visual do seu posto de trabalho, sendo 1 sem conforto e 4

muito confortável: _______

10) Como você avaliaria o nível de ruído do seu posto de trabalho, sendo 1 sem conforto e 4 muito

confortável: _______

11) Como você avaliaria o nível de conforto da temperatura em seu posto de trabalho, sendo 1 sem

conforto e 4 muito confortável: _______

12) Durante o ano, há períodos em que o nível de conforto da temperatura diminui? Explique:

13) Vocês trocam informações e/ou sugestões durante o trabalho ou cada um fica no seu posto quieto?

É comum momentos de descontração?

14) Vamos fazer de conta que o André foi viajar e te deu autonomia e dinheiro para poder alterar o seu

posto de trabalho, seja com novas ferramentas, máquinas, mobiliários, enfim, qualquer coisa. Quais

seriam as suas principais ações?

15) Agora, se tivesse que escolher apenas um setor na empresa toda e melhorá-lo, qual seria esse

setor? Por quê?

16) Sente falta de algum tipo de treinamento específico para a sua função ou para a fábrica como um

todo?

17) Vocês costumam a ficar até depois do horário?

18) Caso positivo, existe alguma remuneração por hora-extra?

19) Existe alguma hora de descanso, além da hora do almoço?

Diagrama de áreas dolorosas

XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos

Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.

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