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 Bem vinda, Maria Teresa Rosa Foss Bastos Duarte [Sair] Institucional Outros Serviços AASP Cultural Aproximação Profissional Mapa do Site Fale Conosco  E-mail  Senha 1 2  3 4  << Voltar  Todas as Revistas  Regulamento  Revista do Advogado A aplicação da Teoria da Imprevisão na empreitada. Arnoldo Wald Advogado. Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e membro da Corte Internacional de Arbitragem da CCI. “A garantia do equilíbr io f inan ceiro é, assim, a exterioriza ção dos prin cípios de justiça social que devem presidir a organização da ordem econômica” (Caio Tácito, Direito Administrativo, p. 248). Sumário 1. A evolução legal da Teoria da Imprevisão no Brasil 2. A Teoria da Imprevisão do Código Civil de 2002 3. Da evolução do regime legal da empreitada integral 4. A interpretação e a aplicação dos artigos 619, parágrafo único, e 625, incis o II, do Código Civil 4.1. A regra do parágr afo único do artigo 619 d o Código Civil 4.2. O artigo 625, inciso II, do Código Civil 5. Conclusão Bibliografia 1. A evolução legal da Teoria da Imprevisão no Brasil A Teoria da Imprevisão não foi acolhida pelo Código Civil de 1916, que, inspirado na tradição liberal e individualista do Código Civil francês, era fiel ao Princípio Pacta Sunt Servanda , só admitindo raras exceções. Entretanto, ela já era acolhida, desde meados do século passado, por renomados juristas, dentre os quais Arnoldo Medeiros da Fonseca,(1) Francisco Campos,(2)  Eduardo Espínola(3)  e Caio Mário da Silva Pereira,(4)  como já salientamos em estu do que fizemos em 1959.(5) A primeira decisão sobre a imprevisibilidade foi proferida por Nélson Hungria, em 1930:  “Há, porém, a considerar, na espécie, que um ev ento extraordinário, imprevisto e imprevisível, ve io alterar profundamente o ambiente objetivo dentro do qual se operava o acordo de vontad es, a voluntas contrahendum. Ora, a resolubilid ade dos con trato s de execução futur a, em virtu de de subseqü ent e mudanç a radical do est ado de fat o, não é contemplada expressamente em nossa lei civil, mas decorre dos princípios gerais de Direito e exprime um mandamento de eqüidade. A Juri sprudê ncia, com o apoio da Dou tri na, tem decidido que tai s contratos devem entender-se rebus sic stantibus et in eodem statu momentibus. É uma cláusula resolutória implícita, subentendida. Desde o momento que um fato inesperado e fora da previsão comum destrói por completo a equação entre prestação e a contraprest ação ajus tadas, deixa de subsistir o que Oertmann chama a base do co ntrato (Geschäftsgrundlage), isto é, o pensamento das partes, manifestado no momento de celebrar-se o contrato, AASP :: Associão dos Advogados de São Paulo http://www.aasp.org.br/aasp/servicos/revista advogado/revista98/Arn... 1 de 13 05/08/2011 21:06

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Maria Teresa Rosa FossBastos Duarte [Sair]

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Revista do Advogado

A aplicação da Teoria da Imprevisão na empreitada.

Arnoldo WaldAdvogado. Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e membro daCorte Internacional de Arbitragem da CCI.

“A garantia do equilíbrio f inanceiro é, assim, a exteriorização dos princípios de justiça social que devem presidir a organização da ordem econômica” 

(Caio Tácito, Direito Administrativo, p. 248).

Sumário

1. A evolução legal da Teoria da Imprevisão no Brasil

2. A Teoria da Imprevisão do Código Civil de 2002

3. Da evolução do regime legal da empreitada integral

4. A interpretação e a aplicação dos artigos 619, parágrafo único, e 625, inciso II, do Código Civil

4.1. A regra do parágrafo único do artigo 619 do Código Civil

4.2. O artigo 625, inciso II, do Código Civil

5. Conclusão

Bibliografia

1. A evolução legal da Teoria da Imprevisão no Brasil

A Teoria da Imprevisão não foi acolhida pelo Código Civil de 1916, que, inspirado na tradição liberal e individualista doCódigo Civil francês, era fiel ao Princípio Pacta Sunt Servanda, só admitindo raras exceções. Entretanto, ela já era acolhida,desde meados do século passado, por renomados juristas, dentre os quais Arnoldo Medeiros da Fonseca,(1) FranciscoCampos,(2) Eduardo Espínola(3) e Caio Mário da Silva Pereira,(4) como já salientamos em estudo que fizemos em1959.(5)

A primeira decisão sobre a imprevisibilidade foi proferida por Nélson Hungria, em 1930:

 “Há, porém, a considerar, na espécie, que um evento extraordinário, imprevisto e imprevisível, veio alterar profundamenteo ambiente objetivo dentro do qual se operava o acordo de vontades, a voluntas contrahendum. Ora, a resolubilidade doscontratos de execução futura, em virtude de subseqüente mudança radical do estado de fato, não é contempladaexpressamente em nossa lei civil, mas decorre dos princípios gerais de Direito e exprime um mandamento de eqüidade. A

Jurisprudência, com o apoio da Doutrina, tem decidido que tais contratos devem entender-se rebus sicstantibus et in eodem statu momentibus. É uma cláusula resolutória implícita, subentendida. Desde o momentoque um fato inesperado e fora da previsão comum destrói por completo a equação entre prestação e acontraprestação ajustadas, deixa de subsistir o que Oertmann chama a base do contrato(Geschäftsgrundlage), isto é, o pensamento das partes, manifestado no momento de celebrar-se o contrato,

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acerca da existência das circunstâncias determinantes. (...)

É certo que quem assume uma obrigação a ser cumprida em tempo futuro sujeita-se à alta dos valores, que podem variarem seu proveito ou prejuízo; mas, no caso de uma profunda e inopinada mutação, subversiva do equilíbrioeconômico das partes, a razão jurídica não pode ater-se ao rigor literal do contrato, e o Juiz deve pronunciar arescisão deste. A aplicação da cláusula rebus sic stantibus tem sido mesmo admitida como um corolário da teoria do errocontratual” (6) (grifos nossos).

A consagração de tal teoria, em 1941, no anteprojeto de Código das Obrigações, foi considerada “uma conquista definitivado Direito moderno”.(7)

No campo do Direito Civil, várias normas legais consagraram a teoria da imprevisão, que foi objeto de numerosos julgados eestudos doutrinários nos últimos 60 anos.

Nesse sentido, vale destacar a lição de Francisco Campos, em obra publicada em 1956:

 “O contrato se forma e se conclui no pressuposto de que entre a sua conclusão e a sua execução não sobrevenhamacontecimentos estranhos, independentes da vontade das partes e que elas não poderiam prever, e que de tal formaalteram as circunstâncias, que na execução o contrato deixa de corresponder não só à vontade dos contraentes, que seprevissem aqueles acontecimentos não teriam contratado, como à natureza objetiva do contrato considerado comoinstrumento econômico em que uma das partes não consente, obrigando-se à prestação estipulada, a um sacrifícioilimitado do seu patrimônio, senão a um sacrifício que corresponde, na medida do possível, do razoável ou do normal, àcontraprestação prometida pela outra parte. Esta é a função normal do contrato, este seu fundamento econômico,pressuposto que inspira ambas as partes a se deixarem prender para o futuro pelo vínculo contratual.

(...) O risco que os contraentes assumem no contrato não pode ser concebido como excedendo o risco normal,isto é, aquele que se compreende nos limites da previsão humana. Levar mais longe o dogma da intangibilidade docontrato seria, sob o pretexto de garantir a liberdade contratual, destruir o fundamento mesmo do contrato, a sua baseeconômica e moral, como instrumento de comércio e de cooperação entre os homens, o elemento de boa-fé e de justiça,sem a qual a liberdade dos contratos seria apenas uma aparência destinada a legitimar o locupletamento injusto de umaparte à custa do patrimônio da outra, sobre esta recaindo de modo exclusivo os riscos estranhos à natureza do contrato eque, se previsíveis na ocasião de atar-se o vínculo contratual, teriam impedido sua formação” (8) (grifos nossos).

Inspirando-se nos textos legislativos, a Doutrina e a Jurisprudência consideram requisitos necessários para a aplicação emgeral da Teoria da Imprevisão:

i) que o contrato seja bilateral; e

ii) que ocorra um empobrecimento relevante, imprevisível e inevitável de uma das partes contratantes, com o

correspondente enriquecimento da outra.

A obediência a esses requisitos garante um justo equilíbrio entre as necessidades de segurança da sociedade contemporâneae a eqüidade, que, ao lado da Justiça, devem desempenhar papel importante nas relações jurídicas. Daí por que osdoutrinadores têm advertido acerca dos limites da revisão contratual baseada na Teoria da Imprevisão, de modo a evitar-seo conflito com outros princípios de Direito.(9)

Ainda na vigência do CC/1916, os Tribunais reconheciam o cabimento da revisão do contrato com base na Teoria daImprevisão. Ilustra a assertiva aresto do Superior Tribunal de Justiça, cuja ementa e trecho do voto do Relator sãotranscritos a seguir:

 “Teoria da imprevisão – Aplicabilidade, mesmo à míngua de texto expresso, posto que exigência da eqüidade. Necessidade,entretanto, de que se apresentem todos seus pressupostos. Entre eles, o de que os fatores imprevisíveis alterem aequivalência das prestações, tal como avaliadas pelas partes, daí resultando empobrecimento sensível para uma delas com

enriquecimento indevido da outra.(...)

Trata-se de imposição da eqüidade, a informar o modo por que se devem compor os litígios. A observância da regra pacta

sunt servanda não deve conduzir à ruína econômica de um dos contratantes, quando fatores imprevistos e imprevisíveisalteraram de tal sorte a situação de fato que se possa ter como rompido o equilíbrio contratual, assentado naequivalência das prestações. Equivalência essa, não como a possa eventualmente entender o Juiz, mas como aavaliaram os contratantes”.(10) (grifos nossos)

Verifica-se, portanto, que, mesmo antes de adotada pelo Código Civil de 2002, a Teoria da imprevisão já era, desde muito,acolhida pela doutrina e jurisprudência pátrias, admitindo-se a resolução ou a revisão de contrato cujo equilíbrio econômicoinicialmente pactuado pelas partes tivesse sido rompido por circunstâncias extraordinárias e imprevisíveis surgidas durantesua execução, com o fim de restabelecê-lo. Passa-se a analisá-la, assim, sob a ótica atual, haja vista as novas disposiçõestrazidas pelo CC/2002, que a consagrou como princípio geral de nosso sistema legal e previu casos especiais de sua

incidência com regime distinto, neles dispensando o enriquecimento de uma das partes.

2. A Teoria da Imprevisão do Código Civil de 2002

Em relação à imprevisão, o CC/2002 operou a transformação de uma norma, que, no passado, foi consideradaexcepcional,(11) em verdadeiro Princípio Geral do Direito, que, no fundo, deflui dos Princípios da Boa-Fé na celebração e

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execução do contrato (art. 422), da Função Social do contrato (art. 421) e da Vedação de Enriquecimento sem causa, demodo a admitir a resolução ou a revisão do contrato por excessiva onerosidade.

O legislador, inspirado no texto constitucional, admite a resolução ou a revisão do contrato por excessiva onerosidade,adotando a tese consolidada na Jurisprudência e seguindo o modelo do Codice Civile italiano.(12)

O CC/2002 trata da resolução e da revisão dos contratos em geral por excessiva onerosidade nos artigos 478 a 480. O novotexto legal permite tanto o reajustamento do contrato como a sua resolução, no caso de agravamento extraordinário daonerosidade da prestação de uma das partes, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentosimprevisíveis.

Sobre a onerosidade excessiva, cumpre mencionar a conceituação de Ricardo Pereira Lira:

 “Ocorre a onerosidade excessiva quando uma prestação de obrigação contratual, em razão de acontecimento extraordinárioe imprevisível no momento da formação do contrato, se torna, no momento da execução, notadamente mais gravosa doque era quando surgiu.

(...)

A apuração da onerosidade excessiva se faz por meio da avaliação objetiva da prestação, em si e por si, em confronto com acontraprestação.” (13)

Nos contratos de execução continuada ou diferida, nos quais a prestação de uma das partes se tornar excessivamenteonerosa ou extremamente vantajosa para a outra parte, poderá a parte prejudicada pleitear a redução de sua prestação oua alteração do modo de execução, a fim de evitar a onerosidade excessiva.

As referências, no Código Civil, à boa-fé na celebração e execução do contrato (art. 422) e ao regime de proteção efavorecimento do contratante mais fraco, no caso dos contratos de adesão (arts. 423 e 424), complementam um quadro derenovação do contrato, dando-lhe caráter dinâmico, flexível e eqüitativo.(14)

Sintetizando a posição do projeto do novo Código Civil nesse sentido, na sua fase de revisão pelo Senado Federal, esclareceo Professor Josaphat Marinho que:

 “Repele o Projeto, pois, a majestade do contrato, da velha cláusula  pacta sunt servanda, para imprimir às obrigaçõesassumidas caráter compatível com o alcance social do Direito. Adota o espírito de justiça, que desenvolveu Duguit, já em1911, na Faculdade de Direito de Buenos Aires, e se alargou, pelo tempo afora, com Ripert, Savatier e tantos outrosmestres. Mas transmitindo flexibilidade às relações jurídicas, o Projeto não as desguarnece de segurança.” (15)

Nesse contexto, cabe reconhecer que a resolução ou a revisão do contrato por onerosidade excessiva, ocasionada poracontecimentos extraordinários e imprevisíveis, tem por finalidade manter a equação contratual, ou seja, a relaçãoinicialmente estabelecida entre as partes.(16)

Também o artigo 317 do CC/2002, que trata do objeto do pagamento e mantém uma forma de correção monetária do valordevido, foi inspirado na idéia de manutenção do equilíbrio do contrato e do valor real da prestação inicialmente estabelecida,assegurando a continuidade da situação contratual inicial durante toda a execução do contrato.

Nesse sentido, explica Judith Martins-Costa:

 “Ora, as ‘normas de direcionamento’ têm relevantíssimo peso na hermenêutica infraconstitucional. É precisamente o queocorre com a concreção e interpretação do artigo 317: no seu momento aplicativo, o intérprete deve levar em conta osprincípios que orientam a ordem econômica, traduzidos no solidarismo ou na socialidade antes apontados eque, no campo contratual, encontram maximização no Princípio do Equilíbrio Contratual, do qual decorre odever de reequilibrar o contrato quando a relação entre os ‘pesos’ originais da operação jurídico-econômicavenha a ser manifestamente distorcida pelo correr do tempo e da incidência de certas circunstâncias . É

 justamente esse direcionamento hermenêutico que deve incidir na análise das condições de incidência da regra oracomentada” (grifos nossos).(17)

A evolução realizada pelo CC/2002 corresponde a um movimento de caráter internacional, que se inspira na maioria daslegislações elaboradas recentemente. Assim, entre outros, o novo Código Civil holandês e a reforma do Código Civil alemãotambém dão maior ênfase à boa-fé e apresentam uma nova visão do contrato.(18)

Note-se, entretanto, que o que fez o novo Código foi explicitar um princípio geral já anteriormente acolhido, doutrinária e jurisprudencialmente, pelo nosso Direito, como elemento importante para a readequação dos contratos, diante de radicalmodificação da situação das partes, rompendo o equilíbrio contratual inicialmente pactuado e ensejando o empobrecimentode uma delas e, na maioria dos casos, o enriquecimento da outra.

Importante destacar, a respeito do empobrecimento de uma das partes e do correspondente enriquecimento da outra, quenão há necessidade de que se comprove a ruína de uma parte e a conseqüente pujança da outra parte, ou mesmo uma ou

outra individualmente, mas que tenha sido caracterizado um custo excessivo, de um lado, e, na maioria dos casos, umganho, de outro, em relação ao que se previa no momento da celebração do contrato, quando fora calculado o equilíbriocontratual.(19)

Feitas estas considerações gerais sobre o alcance e a aplicação da Teoria da Imprevisão e sua adoção pelo CC/2002 comocausa para revisão e resolução de contratos em geral, passa-se a examinar a evolução do regime legal da empreitada

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integral.

3. Da evolução do regime legal da empreitada integral

No que tange ao contrato de empreitada, é perfeitamente aplicável a resolução ou a revisão por onerosidade excessivaprevistas nos artigos 478 a 480 do Código, bastando, para tanto, que sejam verificados, no caso concreto, os requisitos parasua aplicação. Nesse sentido, o CC/2002 traça três regimes legais distintos, que podem ser aplicados concomitantemente ounão, conforme o caso, se presentes os requisitos previstos para a aplicação de cada um deles:

i) o dos artigos 478 a 480, que prevêem a Teoria da Imprevisão baseada na onerosidade excessiva, como regra geral, para

a revisão dos contratos, estabelecendo requisitos específicos para sua aplicação;ii) o do artigo 619, que consagra a revisão do preço do contrato no que tange à realização de serviços suplementares,quando resultarem de instruções do dono da obra (caput ) ou se este tinha ciência dos serviços excedentes que estavamsendo realizados pelo empreiteiro e nunca se opôs (parágrafo único);(20) e

iii) o do inciso II do artigo 625, que prevê uma hipótese específica de revisão por onerosidade excessiva no contrato deempreitada, que independe do enriquecimento do dono da obra – tendo neste aspecto certa analogia com o artigo 6º, incisoV, do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11/9/1990) –, também estabelecendo requisitos específicos parasua incidência.

O CC/1916, inspirado na matéria pela legislação francesa do século XIX, elaborado em outra fase da evolução tecnológica,na qual ainda não se realizavam as construções modernas, fixou dogmaticamente o Princípio da Intangibilidade do preçoacertado na empreitada integral. O artigo 1.246 do CC/1916 adotou a redação do artigo 1.793 do Código Civil francês, que,como já se disse, protegia o proprietário e o credor, baseando-se em uma posição individualista exacerbada. Numa épocaem que as construções eram mais simples do que as atuais, os redatores do artigo 1.793 entenderam que protegiam o donoda obra contra a eventual ganância do arquiteto e do construtor, impedindo a revisão do preço global da construção quandopreviamente convencionado.(21)

A partir de 1930, com a gradativa aceitação da Teoria da Imprevisão, à qual aludimos, houve uma flexibilização nainterpretação e aplicação do artigo 1.246 do CC/1916. Examinando o assunto, há mais de meio século, escrevemos que, jáentão, reconhecia-se que o mencionado artigo não era de ordem pública, e podia, portanto, ser afastado pela vontade daspartes, admitindo-se a inclusão de cláusulas que previssem a revisão do preço, seja em virtude da depreciação da moeda,seja em decorrência de mudanças do projeto, ou até da ocorrência de situações não previstas pelas partes que tornassemmais onerosa a prestação de uma delas.(22) No fundo, já era o pensamento anteriormente exposto por Clóvis Beviláqua,que entendia ser imutável o preço, “salvo nos casos em que a situação se tenha alterado consideravelmente”.(23)

Por ocasião da elaboração do CC/2002, o individualismo excessivo da legislação civil anterior foi superado, passando aprevalecer a socialidade, com importantes reflexos na empreitada, em relação à qual pôs fim aos “odiosos privilégios” do

passado.(24)

Verifica-se, pois, que o CC/2002 adotou a teoria da imprevisão, baseada na onerosidade excessiva, considerando aspeculiaridades do contrato de empreitada global ou integral, prevendo-a em seu artigo 625, com o fim de manter oequilíbrio inicialmente estabelecido entre as partes.(25)

Os comentadores do CC/2002 salientam essa finalidade do referido artigo. Nesse sentido, afirmam os Ministros NancyAndrighi e Sidnei Beneti e a Desembargadora Vera Andrighi que:

 “O CC/2002 busca o equilíbrio contratual por entender que as relações sociais devem ser calcadas na dignidadehumana, único caminho para se construir uma sociedade livre, justa e solidária, sendo inaceitáveis a usura e toda forma delocupletamento à custa do sacrifício alheio. As relações contratuais comutativas haverão de ser, portanto,harmoniosas e equilibradas.

(...)Ora, como tivemos oportunidade de observar ao comentar o artigo 619, supra, o empreiteiro, em empreitada por preçofixo, não pode exigir majoração de preço caso aumentem seus custos com mão-de-obra e materiais. A regra, comohavíamos mencionado, sofre exceções por força do Princípio do Equilíbrio Contratual, e o artigo 625, II, CC/2002,traz expressa tal exceção. O fato extraordinário ou imprevisível, que sobrecarregue os custos do empreiteiro, comvantagem econômica para o comitente, subsume-se à regra geral da Teoria da Imprevisão (art. 478, CC/2002) e à regraespecífica do art. 625, II, em tela(26) (grifos nossos).

Na busca do equilíbrio contratual, que atende às condições próprias das partes e aos usos e costumes do mercado, olegislador estabeleceu, ao lado da responsabilidade pela culpa, o dever de indenizar decorrente do risco assumido. Oprincípio geral que se aplica a todos os contratos é o da responsabilidade pelo ato culposo praticado por um dos contratantes(arts. 395 e ss. do Código Civil), mas, em determinados casos, por necessidades econômicas ou sociais, o legislador adota oPrincípio da Responsabilidade pelo Risco.

Há até uma evolução, assinalada pela Doutrina, de acordo com a qual a base da responsabilidade civil evoluiria, nas últimasdécadas, da culpa para o risco e a garantia. Assim, estabeleceu a lei que a responsabilidade, nos acidentes de trabalho e detransporte, é objetiva, independentemente de culpa, baseada no risco assumido, bem como a do produtor e a do comitenteou empregador, pelos atos do preposto ou empregado.

Na sociedade de risco na qual vivemos,(27) ao legislador cabe atribuir a responsabilidade pelos riscos decorrentes dos

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contratos. É o que fez o legislador brasileiro, no artigo 625, inciso II, do CC/2002, em virtude da complexidade crescente docontrato de construção, quando o contratado encontra riscos geológicos ou hídricos ou outros semelhantes, determinandoque, em tais casos, o risco corre por conta do proprietário da obra, que será o beneficiário final do negócio jurídico, pois teráo uso, o gozo e a disposição da obra quando terminada. Sobre a álea natural do contrato de empreitada, cumpre destacar osensinamentos de Domenico Rubino e Giovanni Iudica:

“Ma puramente e semplicemente in base ad un razionale criterio di distribuzione del rischio (economico): è conforme alla

natura dell’appalto che, entro un certo limite, quell’alea economica sia a carico dell’appaltatore. Oltre tale limite, invece,e in presenza di determinate cause, la legge tutela l’appaltatore contro di essa, riconoscendogli il diritto ad unproporzionato aumento del prezzo” (28) (grifos nossos).

A norma do CC/2002 (art. 625, II) se justifica não só considerando os princípios gerais da justiça comutativa e distributiva,mas também em virtude de exigência do mercado, ao qual não interessa que as partes tenham de se precaver contra riscosimprevisíveis (o que aumentaria o preço da obra), especialmente no setor da construção, cuja importância para odesenvolvimento é primordial para o desenvolvimento nacional.

Sobre o assunto, já salientavam os Professores Alpa, Bessone e Roppo:

 “O risco da iniciativa contratual não pode abranger a eventualidade de circunstâncias imprevisíveis, sem que a coerência dosistema ceda ao irracional.” (29)

No mesmo sentido, afirmam Eros Grau e Paula Forgioni que as rotas de correção do Princípio Pacta Sunt Servanda, que orelativizam, em muitos aspectos, dão testemunha, na verdade, “da vida dos contratos e não de sua morte”.(30)

4. A interpretação e a aplicação dos artigos 619, parágrafo único, e 625, inciso II, do Código Civil

4.1. A regra do parágrafo único do artigo 619 do Código Civil

Ao confrontar-se com o aparente conflito entre a essência da empreitada por preço fixo, que veda a alteração do preçoinicialmente acordado, e o problema do desequilíbrio de prestações, em virtude de acontecimentos extraordinários eimprevisíveis, que rompe o sinalagma funcional do contrato, acarretando excessivo ônus a uma das partes, Teresa AnconaLopez assevera que:

 “Devemos conciliar os princípios aparentemente antagônicos de acordo com a função social do contrato de empreitada que,por força do artigo 421 do Código Civil de 2002, significa elemento limitador da liberdade de contratar.

Se entendêssemos que a regra do artigo 619, bem como aquela já prevista no artigo 1.246, tem o condão deafastar a teoria da imprevisão, bem como da onerosidade excessiva, forçosa seria a conclusão do império doPrincípio do Pacta Sunt Servanda e que o empreiteiro deveria cumprir a avença a qualquer custo, ainda que

isso significasse a sua ruína e mesmo que isso inviabilizasse a sua atividade profissional. Essa idéia não podeprosperar.

(...)

Cabe ao contrato, por sua função social, garantir a viabilidade da empreitada e seu sinalagma” (31) (grifosnossos).

Cumpre distinguir a imprevisibilidade da imprevisão. O fato imprevisto não se confunde com o fato imprevisível. Deveras, o “fato imprevisto será todo aquele que poderia ter sido previsto e não o foi; imprevisível, aquele a que faltou a possibilidadenormal de previsão”.(32) A previsibilidade, por sua vez, pode ser caracterizada como “a possibilidade de representação deum ato ou de um fato como resultado de análise e compreensão dos elementos disponíveis em determinadassituações”.(33)

Quanto à responsabilidade pelos custos adicionais de serviços não previstos no projeto inicialmente contratado entre as

partes, decorrentes de circunstância superveniente ou preexistente, de caráter extraordinário e imprevisível, cabe aaplicação do parágrafo único do artigo 619 do CC/2002, que dispõe que, ainda que não tenha havido autorização escrita, odono da obra é obrigado a pagar ao empreiteiro os aumentos e acréscimos, segundo o que for arbitrado, se, semprepresente à obra, por continuadas visitas, não podia ignorar o que se estava passando, e nunca protestou.

Conforme exposto no capítulo anterior, ainda na vigência do CC/1916, já se discutia a possibilidade de se aplicar a Teoria daImprevisão ao contrato de empreitada por preço fixo. A Doutrina(34) e a Jurisprudência(35)  já interpretavam de formamais liberal o artigo 1.246 do CC/1916. Essa exegese se consolidou com a redação do parágrafo único do artigo 619 doCC/2002.

Com efeito, independentemente de norma legal expressa, tal orientação vem sendo acolhida pelos pretórios nacionais desdemeados do século passado. É o que se conclui pela leitura do julgado do STF, de relatoria do Ministro Luís Gallotti, datadode 1949, do qual se transcreve o trecho abaixo:

 “Empreitada. Acréscimo. Autorização escrita. Exigir, rigorosamente, autorização escrita do dono da obra em todos os casosde acréscimo, importaria locupletamento com a jactura alheia. Inteligência do artigo 1.246 do Código Civil.

(...)

Por isso e porque, à falta de documento escrito, não seria de boa moral jurídica impor ao autor inadequada

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rigidez da regra do artigo 1.246 do Código Civil, com o que se facilitaria a locupletação de um contratante coma espoliação do outro, a sentença julgou em parte procedente a ação.”  (36) (grifos nossos)

Assim, desde meados do século passado, a melhor doutrina, na qual se destacam autores como Serpa Lopes,(37) Alfredode Almeida Paiva,(38)

Washington de Barros Monteiro(39) e Hely Lopes Meirelles,(40) entre outros, também já afirmava não havernecessidade de autorização escrita nesta hipótese, caso houvesse ciência inequívoca da realização do serviço extraordináriopelo dono da obra.

Como não poderia deixar de ser, o STJ, ao tratar do tema, firmou entendimento reconhecendo a desnecessidade deautorização expressa do dono da obra para a realização de serviços extraordinários, caso estes tenham sido realizados coma ciência e fiscalização do dono da obra, sendo, portanto, justificada a cobrança dos valores a tal título. É o que sedepreende da ementa de julgado daquela Corte Superior, em que figura como Relator o Ministro Sálvio de FigueiredoTeixeira:

 “Direitos Civil e Econômico. Contrato de empreitada. Subempreitada. Alteração do valor do preço extraordinário. Execuçãoà vista do subempreiteiro que inclusive fiscalizou e acompanhou a obra. Autorização tácita. Validade. Interpretação ao artigo1.246 do Código Civil. Doutrina. Recurso desacolhido. Interpretando o art. 1.246 do Código Civil, a Doutrina acolhe a tesede que, se o serviço extraordinário foi executado às claras, inclusive sob a supervisão de prepostos da subempreiteira,tem-se como pertinente a cobrança dos seus valores, independentemente de autorização por escrito.” (41)

A regra do parágrafo único do artigo 619 do CC/2002 veio, portanto, consagrar e explicitar regra já acolhida pela Doutrina epela Jurisprudência sob a égide do CC/1916, que foi mantida a fortiori nas decisões mais recentes, para reconhecer ao

empreiteiro o direito ao pagamento, pelo dono da obra, dos custos extraordinários em que tiver incorrido em decorrência detrabalhos suplementares necessários à conclusão da obra, quando forem realizados com a ciência e sob a fiscalização dodono da obra, sem necessidade de autorização escrita do mesmo.

Com respaldo em remansosa Jurisprudência e na melhor Doutrina, a incidência do parágrafo único do artigo 619 do CódigoCivil depende, para a sua configuração, da conjugação dos seguintes elementos:

i) existência de um contrato de empreitada;

ii) ocorrência de aumentos e acréscimos nos serviços objeto desse contrato;

iii) ciência presumida do dono da obra; e

iv) ausência de qualquer oposição à execução do serviço por parte do dono da obra.

É também importante investigar a conduta das partes posterior à celebração do contrato, para que se verifique a aplicaçãodo parágrafo único do artigo 619. Aliás, esse critério, que constava do artigo 131 do revogado Código Comercial, continua anortear a interpretação e a aplicação de normas contratuais.(42)

4.2. O artigo 625, inciso II, do Código Civil

A idéia de revisão do contrato de empreitada já estava presente no Projeto de Código de Obrigações de 1964, redigido porCaio Mário da Silva Pereira. O autor propôs dispositivo que concedia ao empreiteiro a faculdade de suspender a obra nocaso de onerosidade excessiva. Em sua Exposição de Motivos, afirmou:

 “Na disciplina do contrato de empreitada aproveitei para resolver algumas questões que a prática civil veio suscitando e quereclamam constantes atenções.

(...)

Mantida a inalterabilidade do preço ajustado, foi admitida a modificação convencional, bem como a decorrente dos princípiosinspiradores da resolução por onerosidade excessiva. A prática dos negócios, que é também fonte de direito (René David),mostra que nos períodos de instabilidade a empreitada é arma perigosa. A faculdade de reajuste por excessiva onerosidadepode emendar os seus efeitos.” (43)

Na revisão do Projeto de Código de Obrigações de 1965,(44) manteve-se tal orientação, em dispositivo que dizia:

 “Art. 512 – Sob pena de responder por perdas e danos, não pode o empreiteiro suspender a execução da empreitadainiciada, salvo por motivo de força maior ou excessiva onerosidade e ainda por culpa do dono da obra.” 

Diante do abandono da idéia de se promulgar um código específico para as obrigações, as suas disposições foramincorporadas ao Projeto de Código Civil.(45) Na versão de 1973, que foi mantida no Projeto de Lei nº 634-A/1975,(46) aredação do dispositivo era quase idêntica à atual:

 “Art. 624 – Poderá o empreiteiro suspender a obra:

(...)

II  – quando, no decorrer dos serviços, se manifestarem dificuldades imprevisíveis de execução, resultantes de causasgeológicas ou hídricas, ou outras semelhantes, de modo que torne a empreitada excessivamente onerosa, e o dono da obrase opuser ao reajuste do preço;

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(...).” 

Afinal, o Código vigente, considerando os princípios que informam a disciplina dos contratos, inclusive os da Boa-Fé Objetiva,da Função Social do Contrato e o que prevê a revisão do contrato no caso de onerosidade excessiva, não poderia deixar deestabelecer regra que, no âmbito da empreitada, desse plena operatividade a esses princípios, prevendo:

 “Art. 625 – Poderá o empreiteiro suspender a obra:

(...)

II – quando, no decorrer dos serviços, se manifestarem dificuldades imprevisíveis de execução, resultantes de causasgeológicas ou hídricas, ou outras semelhantes, de modo que torne a empreitada excessivamente onerosa, e o dono da obrase opuser ao reajuste do preço inerente ao projeto por ele elaborado, observados os preços;

(...).” 

A explicação para a redação final da norma foi dada na Exposição de Motivos, esclarecendo que o legislador pretendeu:

 “i) No capítulo relativo à empreitada, estabelecer disposições mais adequadas às exigências tecnológicas hodiernas, demodo a atender às finalidades sociais do contrato e às relações de equilíbrio que devem existir entre o dono daobra, o projetista e o construtor, tais como revelado pela experiência dos últimos anos.” 

E acrescentou:

 “Também neste capítulo, como nos demais, foi dada especial atenção aos casos de onerosidade excessiva,prevendo-se regras capazes de restabelecer o equilíbrio dos interesses em conflito, segundo critérios práticospara a sua solução. Embora se pudesse considerar tal matéria implícita nos preceitos relativos à ‘resolução dos contratos poronerosidade excessiva’, atendeu-se a algumas particularidades da matéria no âmbito do negócio deempreitada.” (47) (grifos nossos)

Esta era a posição, aliás, de Miguel Reale:

 “Por outro lado, firme consciência ética da realidade socioeconômica norteia a revisão das regras gerais sobre a formaçãodos contratos e a garantia de sua execução eqüitativa, bem como as regras sobre resolução dos negócios jurídicos emvirtude de onerosidade excessiva, às quais vários dispositivos expressamente se reportam, dando a medida do propósito deconferir aos contratos estrutura e finalidade sociais. É um dos tantos exemplos de atendimento da ‘socialidade’ do Direito.(...)

Nesse contexto, bastará, por conseguinte, lembrar alguns outros pontos fundamentais, a saber: (...)

i) No capítulo relativo à empreitada, estabelecer disposições mais adequadas às exigências tecnológicashodiernas, de modo a atender às finalidades sociais do contrato e às relações de equilíbrio que devem existirentre o dono da obra, o projetista e o construtor, tais como reveladas pela experiência dos últimos anos. (...)

Também neste capítulo, como nos demais, foi dada especial atenção aos casos de excessiva onerosidade,prevendo-se regras capazes de restabelecer o equilíbrio dos interesses em conflito, segundo critérios práticos para asua solução.” (48) (grifos nossos)

A decisão do legislador inspirou-se na Jurisprudência que se sedimentou na matéria.

Efetivamente, no final da década de 1970, a aplicação da cláusula rebus sic stantibus aos contratos de empreitada já eraamplamente difundida, conforme se verifica em acórdão do TJRJ:

 “Cláusula rebus sic stantibus – Teoria da imprevisão. Modificadas as condições vigentes ao tempo do contrato de

empreitada, de forma a provocar prejuízo para o empreiteiro, é lícito invocar a cláusula implícita rebus sicstantibus. Em tempos inflacionários é possível invocar a cláusula rebus sic stantibus se a inflação, em lentodesenvolvimento, assume subitamente proporções de crise com efeitos calamitosos, inclusive prejuízos para o construtor eeste, ainda assim alienando bens e fazendo empréstimos, cumpre a obrigação assumida.” (49)

Muito antes já se tinha decidido no mesmo sentido:

 “O risco assumido pelo empreiteiro no contrato de empreitada é o risco normal e próprio do contrato, e não orisco criado contra a vontade e a intenção das partes, por acontecimento extraordinário e inevitável que elasnão poderiam prever e que, se estivesse na sua previsão, teria impedido a formação do contrato.” (50) (grifosnossos)

O artigo 625 estabelece as condições segundo as quais o empreiteiro, nas hipóteses em que o equilíbrio do contrato éabalado por circunstâncias imprevisíveis, pode valer-se do direito de paralisar a obra, que, se prosseguir, haverá de

acarretar-lhe prejuízos. Assim, o empreiteiro pode se valer do inciso II do artigo 625 do Código Civil, suspendendo a obra,quando:

i) pendente o contrato, manifestarem-se dificuldades imprevisíveis de execução;

ii) tais dificuldades tornarem a empreitada excessivamente onerosa para ele; e

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iii) houver discordância do dono da obra com o reajuste do preço do projeto elaborado.

O inciso II do artigo 625 faculta ao empreiteiro a suspensão da execução do contrato, tendo como requisito apenas aimprevisibilidade, além da recusa do dono da obra em reajustar o preço e da onerosidade excessiva. Note-se que há umdistanciamento do artigo 478 do CC/2002, que exige, como requisito de aplicação, o enriquecimento de um contratante e oempobrecimento do outro.

Outro ponto que diferencia a regra do artigo 625, inciso II, da regra do artigo 478 é que este prevê apenas a resolução  judicial ou por acordo do contrato, ao passo que aquele autoriza o empreiteiro a, mediante decisão unilateral,

“suspender a obra”, tendo, assim, uma modalidade de execução específica que a norma geral não prevê, pois resolvesempre o litígio determinando o pagamento de perdas e danos e não admitindo, em tese, a suspensão da obra.

Deve-se atentar, ainda, para o fato de que a revisão à qual se refere a regra geral do artigo 478 prevê uma “modificaçãoeqüitativa”, que, pela mencionada adjetivação, pode não ser completa, ao passo que o artigo 625, inciso II, exige, para quea obra não seja suspensa, que o dono da obra pague “o preço inerente” ao projeto, ou seja, o preço justo e adequado.

Com efeito, ao assegurar a suspensão do contrato de empreitada, nas hipóteses do artigo 625, inciso II, do CC/2002, o queobjetivou o legislador foi propiciar ao empreiteiro fundamento adequado para exigir a imediata recomposição do equilíbrioeconômico-financeiro do contrato, rompido por causas extraordinárias e imprevisíveis verificadas após a suacelebração.(51)

Obviamente, o fato de não ter ocorrido a suspensão da execução do contrato não constitui obstáculo ao restabelecimento doseu equilíbrio, mesmo após a entrega da obra, com base neste Dispositivo Legal. Nada impede que as conseqüências dodesequilíbrio sejam sanadas a posteriori ,

considerando-se a função social do contrato, a boa-fé objetiva, a onerosidade excessiva criada para uma das partes e ointeresse de ambas na mais rápida conclusão da obra. Efetivamente, o Código Civil sempre favorece a continuidade docontrato, em vez da sua suspensão ou ruptura,(52) que, no caso, não atenderia à vontade das partes, nem à função socialdo acordo por elas firmado.

Tal como ocorre, portanto, com o parágrafo único do artigo 619, o Princípio do Equilíbrio Contratual impõe que o fatoextraordinário ou imprevisível que venha a sobrecarregar os custos do empreiteiro imponha a revisão do preço e, emhavendo inviabilidade de negociação entre as partes, autorize a suspensão da execução da obra. Nesse sentido, têm semanifestado a Doutrina e a Jurisprudência, considerando que a regra atinente à impossibilidade de revisão do preço naempreitada por preço fixo sofre exceções por força do Princípio do Equilíbrio Contratual, sendo que o artigo 625, inciso II,consigna expressamente tal exceção.

5. Conclusão

Num seminário realizado na década de 1980, o Professor Serge Lazareff fez uma excelente palestra referente ao respeitodo contrato, entendendo que estava superada a fase das crises e da instabilidade, decorrente da inflação e dos conflitosmundiais.(53) Assim, não haveria mais motivo para renegociação ou revisão dos contratos, que deveriam ser cumpridossem qualquer modificação.

Decorridos quase trinta anos, chegamos, infelizmente, a uma conclusão contrária em relação aos fatos. Jamais o mundoevoluiu tão rapidamente. Nunca o capitalismo e a globalização ensejaram tantas alterações nas relações jurídicas, naorganização do trabalho, nas migrações humanas. As modificações, além de se multiplicarem, tornaram-se cada vez maisrápidas. E, por outro lado, cada vez mais são necessários e indispensáveis os contratos de longo prazo para permitir oplanejamento econômico.

A solução consiste, pois, em admitir o contrato flexível, que mantém o espírito das partes, a equação inicial no seu espírito ena sua proporcionalidade, mas adapta as cláusulas às novas realidades.

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(1) - Arnoldo Medeiros da Fonseca, Caso fortuito e Teoria da Imprevisão, 3ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1958, pp. 345-6.

(2) - Francisco Campos, Direito Civil, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1956, pp. 6-7.

(3) - Eduardo Espínola, “A cláusula rebus sic stantibus no Direito contemporâneo”, in Revista Forense, vol. 137, set./1951, p.291.

(4) - Caio Mário da Silva Pereira, “Cláusula rebus sic stantibus”, in Revista Forense, vol. 92, out./1942, pp. 797/800.

(5) - Naquela ocasião, mencionamos que: “[à] Teoria da Imprevisão, ou seja, à cláusula rebus sic stantibus cabe o honroso eeficiente papel de permitir que, não obstante a insegurança monetária, os homens possam continuar a negociar e aestabelecer prestações futuras e que os contratos assim realizados possam continuar a obedecer aos princípios da Justiça.” (Arnoldo Wald, “Teoria da Imprevisão”, in Revista Jurídica da Faculdade Nacional de Direito, vol. XVII, 1959, pp. 151/168, ein Arnoldo Wald, Questões de responsabilidade civil, Belém, Cejup, 1990, p. 46).

(6) - Decisão prolatada pelo então Juiz Nélson Hungria, 5ª Vara Cível do Distrito Federal (Rio de Janeiro), em 27/10/1930,publicada na Revista de Direito, nº 100, p. 178.

(7) - Exposição de Motivos do anteprojeto de Código das Obrigações, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1941, p. 19.

(8) - Francisco Campos, ob. cit., pp. 6-7.

(9) - Tito de Oliveira Hesketh observa que: “Assim, é de ver-se que a cláusula rebus sic stantibus, como preceitoderrogatório daquele princípio tradicional e necessário à segurança da vida jurídica, deverá ser usada com muitaprudência, com grande moderação, só merecendo ser invocada em casos realmente excepcionais, e com raias o maisestreitas possível, evitando-se assim que, com o seu emprego abusivo, venha a causar a desordem na esfera obrigacional,

infundindo a desconfiança e a má-fé no espírito dos contratantes” (grifos nossos), “Da cláusula rebus sic stantibus”, in RT,vol. 302, dez./ 1960, p. 22.

(10) - STJ, 3ª T., REsp nº 5723-MG, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 19/8/1991. E ainda STJ, 6ª T., REsp nº 177018-MG,Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJ de 21/9/1998 e STJ, 6ª T., REsp nº 98673-SP, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJde 17/3/1997.

(11) - Ver, nesse sentido, Arnoldo Medeiros da Fonseca, ob. cit., pp. 323/9, e Paulo Carneiro Maia, Da cláusula rebus sicstantibus, São Paulo, Saraiva, 1959, p. 215.

(12) - A Exposição de Motivos do CC/2002, ao tratar das novas disposições relativas ao direito das obrigações e doscontratos, menciona expressamente que, nesta matéria, o projeto final adotou diversas soluções inspiradas em codificaçõese reformas legislativas estrangeiras, aplicáveis às nossas circunstâncias (Miguel Reale, História do novo Código Civil, SãoPaulo, RT, 2005, p. 91).

(13) - Ricardo Pereira Lira, “Onerosidade excessiva nos contratos”, in Revista de Direito Administrativo, vol. 159, jan./mar.1985, p. 11.

(14) - Arnoldo Wald, “A evolução do contrato no terceiro milênio e o novo Código Civil”, in Arruda Alvim, Joaquim Portes deCerqueira César e Roberto Rosas (coord.), Aspectos controvertidos do Código Civil: estudos em homenagem ao MinistroJosé Carlos Moreira Alves, São Paulo, RT, 2003, pp. 59/77.

(15) - Josaphat Marinho, “O projeto de novo Código Civil”, in Revista de Informação Legislativa, ano 37, nº 146, abr./jun.2000, p. 8.

(16) - Vale lembrar a lição do Professor Luiz Gastão Paes de Barros Leães: “No entanto, exceções ao Princípio daIntangibilidade [do conteúdo do contrato] têm sido admitidas, principalmente a partir do século anterior, por razõesde eqüidade, sem que se queira com isso sinalizar que se pretenda bani-la do Direito atual dos contratos, até porque afunção de certeza e segurança jurídicas do Princípio do Pacta Sunt Servanda é que garante a sobrevivência do instituto.

Ocorre que acontecimentos futuros podem sobrevir, alterando de tal modo as circunstâncias dentro das quais foi pactuado ocontrato, que tornam extremamente gravoso o cumprimento da obrigação por parte de um dos contratantes, no momentode sua execução. Nesse sentido, a alteração radical das condições econômicas, nas quais o contrato foi celebrado,tem sido considerada uma das causas possíveis que, com concurso de outros fatores, podem determinar aresolução ou a revisão do ajuste” (“Resolução por onerosidade excessiva”, in Revista de Direito Mercantil, Industrial,Econômico e Financeiro, vol. 140, out./dez. 2005, p. 24).

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(17) - Judith Martins-Costa, Comentários ao novo Código Civil - do direito das obrigações, do adimplemento e da extinçãodas obrigações, Sálvio de Figueiredo Teixeira (coord.), 2ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, vol. 5, t. 1, p. 300.

(18) - Jean-Louis Baudouin, “Justice et équilibre: la nouvelle moralité contractuelle du Droit Civil québécois”, in Le contrat audébut du XXIe siècle: études offertes à Jacques Ghestin, Paris, LGDJ, 2001, pp. 29 e ss., e Georges Flécheux, “Renaissancede la notion de bonne foi et de loyauté dans le Droit des Contrats”, na mesma obra, pp. 341 e ss. No mesmo sentido, sobrea boa-fé na execução dos contratos em Direito holandês, Diana Dankers-Hagenaars, “La bonne foi”, in Travaux del’Association Henri Capitant: la bonne foi - journées louisianaises, Paris, Litec, 1994, pp. 311 e ss.

(19) - Para Lily Frah e Miriam Smayevsky: “(…) la comparación de la onerosidad de las prestaciones es intrínseca a la propiarelación contractual y que allí se va a encontrar la mutación sufrida por una prestación en relación con la otra, que excedelas fluctuaciones que se puede considerar normales para ese tipo de negocios” (Teoría de la Imprevisión, Buenos Aires,Depalma, 1989, p. 27).

(20) - Este posicionamento já era defendido pela jurisprudência antes da vigência do CC/2002, conforme se verifica noseguinte acórdão: “Direitos Civil e Econômico. Contrato de empreitada. Subempreitada. Alteração do valor do preçoextraordinário. Execução à vista do subempreiteiro que inclusive fiscalizou e acompanhou a obra. Autorização tácita.Validade. Interpretação ao artigo 1.246 do Código Civil. Doutrina. Recurso desacolhido. Interpretando o art. 1.246 doCódigo Civil, a doutrina acolhe a tese de que, se o serviço extraordinário foi executado às claras, inclusive sob asupervisão de prepostos da subempreiteira, tem-se como pertinente a cobrança dos seus valores,independentemente de autorização por escrito” (grifos nossos) (STJ, 4ª T., REsp nº 103.715-MG, Rel. Min. Sálvio deFigueiredo Teixeira, DJ de 28/2/2000).

(21) - Jérome Huet, “Les principaux contrats spéciaux”, in Jacques Guestin (dir.), Traité de Droit Civil, Paris, LGDJ, 1996, nº32455, p. 1365, in fine.

(22) - Arnoldo Wald, A cláusula de escala móvel, São Paulo, Max Limonad, 1956, nº 84, p. 136.

(23) - Clóvis Beviláqua, Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado, 8ª ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1950,vol. IV, p. 434.

(24) - Miguel Reale, Estudos Preliminares do Código Civil, São Paulo, RT, 2003, pp. 31/4.

(25) - Note-se que, neste ponto, o CC/2002 também se inspirou na tradição brasileira dos contratos administrativos, nosquais a manutenção da equação econômico-financeira inicial é imperativo constitucional e legal.

(26) - Nancy Andrighi, Sidnei Beneti e Vera Andrighi, Comentários ao Novo Código Civil - Artigos 570 a 652, Sálvio deFigueiredo Teixeira (coord.), Rio de Janeiro, Forense, 2008, pp. 328 e 347.

(27) - Ulrich Beck, Risk Society towards a new modernity, trad. inglesa da obra em alemão Risikogesellschaft: Auf dem Wegin eine andere Moderne, Londres, Sage Publication, 1992, passim.

(28) - Domenico Rubino e Giovanni Iudica, Dell’Appalto: art. 1655-1677, 4ª ed., Roma, Foro Italiano, 2007, p. 324.

(29) - Alpa, Bessone e Roppo, Rischio contrattuale e autonomia privata, Nápoles, Jovene, 1982, p. 282.

(30) - Eros Grau e Paula A. Forgioni, “Ainda um novo paradigma dos contratos?”, Estado, empresa e contrato, São Paulo,Malheiros, 2002, pp. 15/23.

(31) - Teresa Ancona Lopez, Comentários ao Código Civil: Parte especial - Das várias espécies de contrato, AntônioJunqueira de Azevedo, (coord.) São Paulo, Saraiva, 2003, vol. 7, pp. 618-9. Confira-se, também, no mesmo sentido, MariaHelena Diniz, Curso de Direito Civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, 23ª ed., São Paulo,Saraiva, 2007, vol. 3, pp. 300-1.

(32) - Nelson Borges, A teoria da imprevisão no Direito Civil e no Processo Civil, São Paulo, Malheiros, 2002, p. 309,trazendo à colação o posicionamento de Luís Alberto Carvalho Fernandes.

(33) - Nelson Borges, ob. cit., p. 307.

(34) - Nesse sentido, veja-se a lição de Francisco Campos, ainda na vigência do CC/1916: “O artigo 1.246 do Código Civilbrasileiro, na parte em que dispõe que o arquiteto ou construtor não terá direito a exigir acréscimo no preço ainda que o dossalários ou o do material encareça, é uma regra igualmente válida para todos os contratos. Deve ser interpretada nosmesmos termos em que o é a regra implícita em todos os contratos em que é fixado o valor da prestação. Não impede,portanto, que em relação aos contratos de empreitada se façam sentir os efeitos da imprevisão. O risco assumido peloempreiteiro no contrato de empreitada é o risco normal e próprio do contrato e não o risco criado, contra a vontade e aintenção das partes, por acontecimento extraordinário e inevitável, que elas não poderiam prever e que se estivesse na suaprevisão teria impedido a formação do contrato. É o caso típico da imprevisão” (ob. cit., p. 10). No mesmo sentido, Alfredode Almeida Paiva, Aspectos do contrato de empreitada, Rio de Janeiro, Forense, 1955, pp. 56 e 66-7.

(35) - Vale conferir o acórdão do STF em que o Rel. Min. Hermes Lima afirmou que “a cláusula [rebus sic stantibus] aplica-seaos contratos de empreitada. A cláusula só ampara o contratante contra alterações fundamentais, extraordinárias dascondições objetivas, em que o contrato se realizou” (STF, 2ª T., RE nº 56.960-SP, DJ de 8/12/1964).

(36) - STF, RE nº 11.442, Rel. Min. Luis Gallotti, j. 26/12/1949, Revista Forense, 1950, vol. 132, pp. 93-4; no mesmo

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sentido, RE nº 17.908, Rel. Min. Barros Barreto, j. 30/10/1950, Revista Forense, 1952, vol. 139, pp. 119-20.

(37) - José Maria de Serpa Lopes, Curso de Direito Civil, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1999, vol. 4, pp. 241-2.

(38) - Alfredo de Almeida Paiva, ob. cit, pp. 82-3.

(39) - O Professor Washington de Barros Monteiro elucida: “Duas correntes disputam a verdadeira inteligência desse textolegal. A primeira, mais ortodoxa, aplica-o ad litteram: o empreiteiro-construtor, para receber acréscimo, não contempladono plano primitivo, há de necessariamente exibir instrução escrita do outro contratante. (...) Segunda corrente, maisliberal, manda pagar o serviço extraordinário, ainda que não autorizado por escrito, se executado à vista do

proprietário, sem qualquer impugnação de sua parte, ou por ele mesmo confessado. É a orientaçãomerecedora de acolhida, porque, realizado o serviço em tais condições, se subentende autorizado. De outromodo, consagrar-se-ia ilícito locupletamento do proprietário, à custa do empreiteiro, condenado pelo direito” (grifos nossos) (Curso de Direito Civil - direito das obrigações, 10ª ed., São Paulo, Saraiva, 1975, vol. II, pp. 198-99. Nomesmo sentido, Luiz Roldão de Freitas Gomes, Contrato: de acordo com o novo Código Civil, 2ª ed., Rio de Janeiro,Renovar, 2002, p. 259).

(40) - Assevera o mestre Hely Lopes Meirelles: “Diante dessa realidade, a jurisprudência tem atenuado o rigor da lei, parapermitir a cobrança dos acréscimos da construção desde que o empreiteiro demonstre, por qualquer meio de prova, que osfez com aquiescência do dono da obra” (Direito de construir, 8ª ed., São Paulo, Malheiros, 2000, pp. 221-2).

(41) - STJ, 4ª T., REsp nº 103.715-MG, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 5/10/1999, DJ de 28/2/2000, p. 84. Omesmo posicionamento consta de voto do Ministro Nilson Naves, do STJ, que conclui: “Ora, na minha compreensão, comoafirmei linhas atrás, é a de que não é necessária a autorização por escrito, desde que, como no caso em comento aconteceu,

tornou-se inequívoca a realização do serviço. O que então se busca é amenizar o rigor da norma, qual o estatuído nosacórdãos paradigmas e nas lições de Washington e de Hely” (voto vencido proferido pelo Min. Nilson Naves no REsp nº94.609-SP, 3ª T., j. 27/3/2000, DJ de 22/5/2000). Alinhando-se ao mesmo entendimento, estão os arestos emanados dosTribunais Estaduais: TJSP, 35ª Câm. Cível, Seção Direito Privado, ACi nº 929216-0/3, Rel. Des. Melo Bueno, j. 18/6/2007;TJRJ, 6ª Câm. Cível, ACi nº 00531/2002, Rel. Des. Gilberto Rego, j. 17/9/2001; TJRJ, 5ª Câm. Cível, ACi nº1999.001.19450, Rel. Des. Carlos Raymundo Cardoso, j. 8/2/2000; TJMG, 14ª Câm. Cível, ACi nº 1002401541389-1/001,Rel. Des. Valdez Leite Machado, j. 20/7/2006; TJMG, 8ª Câm. Cível, ACi nº 1000000334084-1/001, Rel. Des. Duarte dePaula, DO de 4/5/2005, entre outros.

(42) - “O artigo 131 do Código Comercial, por sua vez, traz importantes pautas para interpretação e integração contratual.Sua revogação formal, como é logo de se perceber, não logrou extirpá-las de nosso sistema jurídico. Assim como éimpossível revogar as regras de Pothier, acima estudadas, não se pode extirpar a penadas a tradição que existe nasentranhas de nosso direito mercantil” (Paula A. Forgioni, “Apontamentos sobre algumas regras de interpretação doscontratos comerciais: Pothier, Cairu e Código Comercial de 1850”, Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e

Financeiro, jan./mar. 2006, vol. 141, p. 37).(43) - Anteprojeto de Código de Obrigações, apresentado por Caio Mário da Silva Pereira, Rio de Janeiro, 1964, p. 30.

(44) - A Comissão Revisora era composta pelos seguintes juristas: Orosimbo Nonato, Caio Mário da Silva Pereira, Theophilode Azeredo Santos, Sylvio Marcondes, Orlando Gomes, Nehemias Gueiros e Francisco Luiz Cavalcanti Horta.

(45) - Anteprojeto de Código Civil, 2ª ed., 1973. Coordenador da Comissão de Estudos Legislativos: Almiro do Couto e Silva.Comissão Elaboradora e Revisora: Miguel Reale, José Carlos Moreira Alves, Agostinho de Arruda Alvim, Sylvio Marcondes,Ebert Vianna Chamoun, Clóvis do Couto e Silva e Torquato Castro.

(46) - Neste projeto, o dispositivo encontrava-se no artigo 634, inciso II.

(47) - Explicando, ainda, as razões que justificaram essa evolução legislativa, ficou consignado na Exposição de Motivos que: “Mantida, em linhas gerais, a sistematização da matéria proposta pelo ilustre Professor Agostinho Alvim, e por ele tão

minuciosa e objetivamente fundamentada, apresenta a redação final do projeto algumas modificações, resultantes daorientação seguida nas demais partes do sistema, bem como para acentuar o atendimento às já apontadasexigências de socialidade e concreção, em consonância com o imperativo da função social do contrato,  adinstar do que se dá com o direito de propriedade. Outras alterações resultam do estudo de sugestões recebidas porórgãos representativos de diversos ‘campos de interesse’, como se dá, por exemplo, quanto ao contrato de empreitada. Asreivindicações dos construtores foram atendidas, sem se deixar de salvaguardar, concomitantemente, osdireitos dos proprietários. Este é, dentre muitos, um exemplo de como se procurou sempre compor osimperativos do bem individual com os do bem comum” (grifos nossos) (Miguel Reale, ob. cit., pp. 91 e 94).

(48) - Idem, ibidem, p. 94.

(49) - Acórdão citado em 1ª T., RE nº 85.714-RJ., Rel. Min. Soares Muñoz, j. 19/6/1979, Revista Trimestral deJurisprudência, mai./1981, vol. 96, p. 668.

(50) - TJRJ, 5ª Câm., ACi nº 3.147, Rel. Des. A. Sabóia Lima, j. 23/8/1943, RT, set./1944, vol. 151, p. 719.

(51) - A previsão de suspensão da obra pelo empreiteiro tem como finalidade assegurar-lhe não só o equilíbrio econômico,que é apurado no fim do contrato, abrangendo a garantia de rentabilidade, mas também o equilíbrio financeiro, que exigeque a toda despesa ou custo (output) corresponda de imediato uma receita (input) (Arnoldo Wald, “O equilíbrio econômico efinanceiro no Direito brasileiro”, in Carlos Alberto Menezes Direito (coord.), Estudos em homenagem ao Professor Caio

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Tácito, Rio de Janeiro, Renovar, 1997, pp. 88 e ss).

(52) - Analisando o mencionado preceito legal, Jones Figueiredo Alves destaca que a regra insculpida no presente Dispositivorefere-se, na verdade, a hipóteses de rescisão motivada do contrato de empreitada, em que fica excluída, desde já, aresponsabilidade do empreiteiro (Ricardo Fiuza (coord.), Novo Código Civil comentado, São Paulo, Saraiva, 2002, pp.562-3).

(53) - Serge Lazareff, “Le respect du contrat”, in Revue de l’Arbitrage, nº 2, avr./jui. 1984, p. 197.

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