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FACULDADE PITÁGORAS DISCIPLINA: HOMEM, CULTURA E SOCIEDADE Prof. Ms. Carlos José Giudice dos Santos [email protected] www.oficinadapesquisa.com.br

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FACULDADE PITÁGORAS

DISCIPLINA: HOMEM, CULTURA E SOCIEDADE

Prof. Ms. Carlos José Giudice dos Santos

[email protected]

www.oficinadapesquisa.com.br

Objetivo:

Ao final desta unidade, o aluno deverá sercapaz de:

Conhecer um pouco da cultura do povobrasileiro a partir de nossa origem africana;

TEXTO BASE

O texto atual é um resumo comentado dodocumentário “Matriz Afro”, baseado no livro cujareferência é mostrada abaixo:RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido doBrasil. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. Disponívelem: <http://www.iphi.org.br/sites/filosofia_brasil/Darcy_Ribeiro_-_O_povo_Brasileiro-_a_forma_e_o_sentido_do_Brasil.pdf>. Acesso em: 28 abr. 2013.

É importante ressaltar que este texto jamaissubstituirá o texto original. Darcy Ribeiro foi um dosmaiores antropólogos brasileiros. Sua obra é leituraobrigatória para aqueles que querem saber mais sobrea origem de nosso povo.

A MATRIZ AFRO

África. O chamado “continente negro”. Lugar da espaçonaveTerra, onde há milênios, a espécie humana nasceu. Espaçogeográfico que vem abrigando, ao longo dos tempos,sociedades, línguas e culturas muito variadas. A África nuncafoi uma realidade homogênea, em termos humanos ou culturais.

Alguns povos africanos, vindos de Angola, do Congo, deMoçambique, da Nigéria, do antigo Daomé e de outras partesdo continente negro, atravessaram o Oceano Atlântico paradesembarcar no Brasil.

Darcy Ribeiro declara: “E estes negros passaram a ser a massasubstancial da força de trabalho de fazer o Brasil”.

Toda a cultura brasileira está impregnada desta herançaafricana. Sua presença fez quase tudo que aqui se fez.

A MATRIZ AFRO

Os africanos que primeiro chegaram aos trópicos brasileiros,vieram da costa ocidental africana ao norte do equador. Foi ochamado “Ciclo da Guiné”. Depois foram os bantus. A palavra“bantu” significa “os homens”. Vinham das regiões de Angola edo Congo, da África Central Atlântica.

Os povos bantus possuíam uma longa história. Produziamobjetos de cerâmica, praticavam a agricultura, criavam gado.Haviam domesticado diversas plantas e dominavam as técnicasde metalurgia. Além disso, bem antes da chegada dos povoseuropeus à África, se ordenavam em estados, conheciam ocomércio, a moeda e a escravidão.

Os bantus conferiam um valor sagrado ao ferro. Como muitosoutros povos, celebravam a sua potência divina. Por toda aÁfrica e no Brasil, espalharam-se deuses metalúrgicos.

A MATRIZ AFRO

O sagrado está presente em todos os instantes e em todasas instâncias da vida bantu. O natural e o extranatural sãoinseparáveis. Os bantus acreditam na existência de doismundos: o visível e o invisível. Acreditam na interação dessesdois mundos, e em um Deus que é criador e pai de tudo queexiste. Pai dos homens, pai das coisas, pai dos insetos.

Deus, criador de toda a criação, não pertence ao mundo dosseres, das criaturas. Ele é o incriado, o princípio, semprincípio, de todo e qualquer princípio. Como dizem osbacongos, acima de tudo reina Zambikungu. Kalunga Zambi,dizem os ambundus.

São nomes que traduzem sempre, ideias de união, laço ouvínculo supremo.

A MATRIZ AFRO

Os bantus cultuavam deuses chamados inkisses, e reverenciavamseus antepassados. Os antepassados tem suas aldeias à maneirados vivos. Na aldeia, possuem casas e campos. São senhores eproprietários da terra e da água, da floresta e do sertão, comtodos os animais que nele vivem e das palmeiras divinas que nelascrescem. O pesquisador Carlos Serrano no ensina:“As primeiras linhagens, os primeiros clãs, as primeiras migrações paraos territórios é que legitimam o poder sobre estes territórios. E, porisso, aqueles indivíduos que descendem mais próximo, diretamente, dealguns ancestrais míticos, são aqueles que detém o poder. Dentro destaverticalidade, os mais velhos, mais próximos desses ancestrais são osindivíduos, não só que detém o poder, mas que tem um poder tambémreligioso. Pode-se então compreender, o culto aos ancestrais, o culto aosmortos, porque são esses mortos, que de certa maneira, trazem asbenesses, trazem a possibilidade da fertilidade das mulheres, dafertilidade dos campos, da agricultura, do afastamento de certosperigos. Daí, um constante culto aos ancestrais”.

A MATRIZ AFRO

Toda vida é sagrada, e no centro de toda a criação está o serhumano, a primeira realidade sagrada que Deus criou. A vidahumana, o homem, centro da criação, é o critério do bem e do mal.A ética negro-africana é antropocêntrica e vital.

No reino do Congo existiam três ordens: a aristocracia, oshomens livres e os escravos. O rei não se confundia com o comumdos mortais. Ao cometer incesto com a irmã, tornava-se o sem-família, o que o capacitava a governar todas as famílias. O atoincestuoso e a iniciação lhe davam poder sobre os encantamentos,o poder dos feiticeiros.

Quando o rei aparecia, sentava-se numa cadeira de marfim, etrazia braceletes de ferro e marfim, ou então, vestuárioartisticamente tecido, ou ainda, certas peles de animais que lheestavam reservadas. Na cabeça, um boné bordado, e ao ombro,uma cauda de zebra.

A MATRIZ AFRO

Diante dele, as pessoas se ajoelhavam e lançavam poeira por cima dascabeças, antes de implorar por sua benção, que ele dava estendendo asmãos e mexendo os dedos.

Por vezes, nas grandes manifestações, ele se levantava e junto com ospoderosos do país, entregava-se a uma dança reservada, cujo ritmo eracheio de pompa, de gravidade e de graça.

Esse rei e seu povo conheciam as artes da guerra. Dizem que osatiradores reais era capazes de lançar, sucessivamente, vinte e oitoflechas antes que a primeira flecha disparada cravar no chão.

A África era um continente de escravos e de senhores de escravos. Noreino do Congo, a aristocracia empregava escravos no cultivo doscampos. Entre os negros alçás, escravos eram comprados e vendidos,usados como soldados e lavradores, servindo ainda de moeda paratransações comerciais.

Assim, quando europeus e africanos se encontraram, ambos sabiammuito bem o que era escravidão.

A MATRIZ AFRO

Entre os bacongos do estuário do Zaire, a palavra para sol é“tangu”, uma palavra que significa “tempo”, “tempo presente“,“hora”, “ocasião”, “tempo favorável”, “momento preciso”. Assim,quando um bacongo quer saber que horas são, ele pergunta:“Que sol é?”.

Para muitos povos africanos, o sol simboliza a transição entre avida e a morte. Quando o sol desaparece da vista humana, osbacongos dizem que ele é a canoa que transporta as almas dosmortos.

No século XVIII houve uma alteração no contingente negro denossa população. Enquanto traficantes de escravos de outrasregiões brasileiras permaneciam nas rotas de Angola e doCongo, a Bahia passou a enviar navios para a Costa de Mina, eem seguida, para o Golfo de Benim.

A MATRIZ AFRO

Começou a receber ondas sucessivas de gezes, de nagôs, e emmenor escala, de alçás. A expressão “geze” designava gruposétnicos do antigo Daomé, como a gente “Fon”. A expressão“nagô” referia-se a grupos étnicos de língua iorubá. Estesagrupamentos vieram para dar a definição única da fisionomiabiológica e cultural da gente da Bahia, de Recife e de São Luísdo Maranhão. Os gezes trouxeram seus boduns. Os nagôstrouxeram seus orixás e seus orikis.

Mãe Estela nos ensina:

“O africano pra tudo ele tem o cântico, ele tem o oriki, ele tem aforma de saudar, não tem aquela coisa de “meu pecado”, “meuerro”. Orixá não tem pensamento negativo. Dizem que orixácastiga, mas orixá não castiga ninguém. O camdomblé é umareligião, que para ela, nossa formação é toda mística, é todaparticular. É uma coisa que vai do sangue da pessoa”.

A MATRIZ AFRO

Os alçás eram vizinhos dos iorubanos. É provável que elessejam um povo autócne, coisa mais do que rara na história dahumanidade.

Ainda no século XIV, os alçás se viram envolvidos pela maréislâmica que se espraiou pelo continente africano. Aprenderama ler e a escrever em árabe.

No início do século XIX, chegaram ao Brasil, onde foramchamados de malês, promovendo insurreições sanguináriascontra a escravidão.

As nações do alçá eram florescentes e das mais adiantadas daÁfrica Central. Era de se prever que uma nação assim,aguerrida e culta, não poderia fazer passivas máquinas deplantio agrícola. Por sob a ignorância e brutalidade dossenhores brancos, o islamismo organizou-se em seita poderosa.

A MATRIZ AFRO

Os iorubás eram um povo, não uma nação, e retraçaram suaorigem na cidade de Ifé, espaço ancestral que se tornoucélebre pelo requinte de suas esculturas de metal. No Brasil,os iorubanos foram chamados nagôs.

Entre os diversos grupos de iorubanos, os deuses variam deregião para região, de reino para reino. No império de Oió,por exemplo, quem estava no centro era Xangô, o deus dotrovão.

Além de Oió, outros pequenos reinos dos iorubás tornaram-se referências preciosas para nós, brasileiros, como oQueto, a terra de Oxossi., e Irê, a terra de Ogum, regiõesque haviam conhecido, antes de qualquer contato com oeuropeu, a metalurgia, um alto grau de urbanização, umaprodução estética sofisticada, e a economia monetária.

A MATRIZ AFRO

Afonjá, chefe de Cossô, a folha já fortalece. Aquele quedança entre crianças, faz o fogo vingar sem que se veja, e sónotamos o talo das folhas estalando.

Derruba no barro quem é burro, ninguém pode corromper onosso ori, Senhor do Saber, Olho Brilhante.

Ele fende além o alto céu. Murro no muro da mentira, matavarando o olho do mentiroso. Mata selando porta e porto.Mata quem não sabe pensar. Alá Ganju, destelha casa alheiae a telha sua. Água ao lado do fogo no seio do céu. Alado,escala rápido o alto céu. Faz o fogo cair do meio do céu.

Oriki de Xangô, declamado por Gilbeto Gil

A MATRIZ AFRO

O pesquisador François Neyt nos ensina:“Podemos dizer que as artes africanas se desenvolveram sobre quatropilares: a pessoa, a comunidade, a natureza e a criação. Mas também, sobreo tradição, o passado e a história. E esses quatro pilares manifestam-secom exuberância através de formas extraordinárias, formas que nãorepresentam a realidade tal qual a percebemos, mas que procuramrepresentar os valores que estão além do real. Ver o que não vemos. Pormeio disso, os africanos criaram formas esculturais e artísticas únicas nomundo”.

Deuses mudam ou morrem. Ogum, por exemplo. Ele não éapenas o deus do ferro, mas deus da tecnologia. Daí que hoje,na Nigéria, como no Brasil, seja visto como senhor das novastécnicas, do repertório high tech, da informática. Ogum é oorixá das vanguardas e dos computadores, e por conta de teraberto uma picada em tempos míticos, ele é hoje o deus dashigh ways.

A MATRIZ AFRO

Os orixás iorubanos estão vivos entre nós. Daí, que hoje nãosejam somente iorubanos, mas mitos multinacionais.

Neste sentido, Mãe Estela nos ensina:“Quando você consegue uma coisa, e pra isso, você se sacrificou,você chorou, você passou horas ruins, você valoriza muito mais aquilo.Se você sofreu por causa daquilo, é evidente que você valoriza muitomais. Daí, que a religião africana chegou ao Brasil através de muitosofrimento, muitas perdas, e isso fortaleceu o descendente deafricano, porque ele sabe, se eu tenho meu orixá, eu sofri por causadele, apanhei por causa dele, por causa da minha linguagem, por causado meu nome, tudo isso, da minha forma de ser, se as pessoasquiseram cortar essa característica minha, é porque ele é de muitovalor e ela ameaçava. Você vê que foi plantado com a vinda dosnegros para o Novo Mundo, e ele cultivou, ao molde deles, econseguiu florescer muita coisa e está sendo conservado, estetrabalho todo feito”.

A MATRIZ AFRO

O pesquisador François Neyt declara:“As artes africanas e as culturas africanas podem ajudar a salvar o homemcontemporâneo, que esqueceu por completo, que existem outras coisas paraalém do dinheiro e dos valores econômicos. As culturas africanas e mesmoas religiões africanas nos ensinam o que existem, além do mundo visível, eque o ser humano não é apenas um ser de carne, mas que existem também oespírito, o coração e outros valores além daqueles que podemos ver”.

O que aconteceu no Brasil foi que os africanos foram tão fundona aventura da construção deste país, que hoje eles já não sãoeles. Eles somos nós, os brasileiros.

Darcy Ribeiro nos lembra que “a cultura brasileira, tem por suabase negra, por sua base índia, pelo que já incorporou dessasbases, tem um vigor que vai permitir que ela floresçaformidavelmente, e floresça não por peculiaridades, mas porcriatividade”.

A MATRIZ AFRO

O pesquisador François Neyt declara:“As artes africanas e as culturas africanas podem ajudar a salvar o homemcontemporâneo, que esqueceu por completo, que existem outras coisas paraalém do dinheiro e dos valores econômicos. As culturas africanas e mesmoas religiões africanas nos ensinam o que existem, além do mundo visível, eque o ser humano não é apenas um ser de carne, mas que existem também oespírito, o coração e outros valores além daqueles que podemos ver”.

O que aconteceu no Brasil foi que os africanos foram tão fundo naaventura da construção deste país, que hoje eles já não são eles.Eles somos nós, os brasileiros.

Darcy Ribeiro nos lembra que “a cultura brasileira, tem por sua basenegra, por sua base índia, pelo que já incorporou dessas bases, temum vigor que vai permitir que ela floresça formidavelmente, efloresça não por peculiaridades, mas por criatividade”.

O negro vem a ser, apesar de todas as dificuldades, o componentemais criativo da cultura brasileira!

A MATRIZ AFRO

Um trecho do livro nos mostra as estratégias utilizadas pelosportugueses para impedir que os negros conseguissem manter suacultura e seus laços:

“A diversidade linguística e cultural dos contingentes negrosintroduzidos no Brasil, somada a essas hostilidades recíprocasque eles traziam da África e à política de evitar a concentraçãode escravos oriundos de uma mesma etnia, nas mesmaspropriedades, e até nos mesmos navios negreiros, impediu aformação de núcleos solidários que retivessem o patrimôniocultural africano.

Encontrando‐se dispersos na terra nova, ao lado de outrosescravos, seus iguais na cor e na condição servil, mas diferentesna língua, na identificação tribal e frequentemente hostis pelosreferidos conflitos de origem, os negros foram compelidos aincorporar‐se passivamente no universo cultural da novasociedade”.

A MATRIZ AFRO

“Dão, apesar de circunstâncias tão adversas, um passoadiante dos outros povoadores ao aprender o portuguêscom que os capatazes lhes gritavam e que, mais tarde,utilizariam para comunicar‐se entre si. Acabaramconseguindo aportuguesar o Brasil, além de influenciar demúltiplas maneiras as áreas culturais onde mais seconcentraram, que foram o nordeste açucareiro e as zonasde mineração do centro do país.

Hoje, aquelas populações guardam uma flagrante feiçãoafricana na cor da pele, nos grossos lábios e nos narigõesfornidos, bem como em cadências e ritmos e nossentimentos especiais de cor e de gosto”.