“as novas estratégias para o sector da Água” · 2007. 3. 22. · para o período de 2007-2013...

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  • As Novas Estratégias para o Sector da Água

    Maria José [email protected]

    EditorialMaria José Verde

    Plano Estratégico de Abastecimento de Águae Saneamento de Águas Residuais para oPeríodo de 2007-2013 (PEAASAR II)Maria José Verde / Filipe Jorge Vieira

    O Novo Regime Jurídico da Utilização dosRecursos HídricosMaria José Verde / Ana Rita João

    O Anteprojecto do Novo Regime Económicoe Financeiro dos Recursos HídricosAna Rita João

    Clara AzevedoS/ título, 2000Papel Baritado

    40 x 50 cmObra da Colecção da Fundação PLMJ

    EDITORIAL

    O enquadramento legal da temática da água em Portugal foirevisto e consolidado pela última vez nos finais do século XIXe no primeiro quartel do século XX com o Regulamento dosServiços Hidráulicos de 1892, aprovado pelo Decreto n.º 8de 1 de Dezembro de 1892, e a Lei de Águas de 1919,aprovada pelo Decreto n.º 5787-III, de 10 de Maio.

    Por essa razão, a legislação das águas que vigorou noordenamento jurídico português até aos dias de hoje traduziu-se num conjunto de diplomas dispersos e absolutamentedesfasados da realidade, que, prescrevendo soluções nemsempre convergentes, originavam frequentes conflitos denormas e determinavam a existência de diversas lacunas, comtodas as consequências daí resultantes para a segurança econfiança jurídicas.

    Paralelamente, o aumento da população, a modificaçãoprofunda das formas de ocupação do solo, o progressivodesenvolvimento tecnológico e a gestão cada vez maisdescontrolada dos recursos hídricos, clamavam por umareorganização e sistematização da legislação existente,destinada não só a tornar coerente e consistente o normativoregulador da temática da água, mas também a melhorar ascondições de utilização dos recursos hídricos e a sua protecção,adequando o regime nacional de gestão dos recursos hídricosà legislação comunitária.

    Assim, respondendo a uma necessidade premente doordenamento jurídico português, foi encetado um processode reformulação do enquadramento legal dos recursos hídricos,

    o qual teve início com a publicação da Lei n.º 54/2005, de 15 deNovembro, que estabeleceu a Titularidade dos Recursos Hídricos, daLei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro, que aprovou a Lei da Água,estabelecendo as bases e o quadro institucional para a gestão sustentáveldas águas e transpondo para a ordem jurídica portuguesa a Directiva-Quadro da Água (Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeue do Conselho, de 23 de Outubro) e, por último, do Decreto-Lei n.º77/2006, de 30 de Março, que complementou a transposição damencionada Directiva, prescrevendo um conjunto de normas denatureza essencialmente técnica e de carácter transitório.

    A Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos, cujo início de vigênciaficou, desde logo, dependente da entrada em vigor da Lei da Água,visou sistematizar e unificar as normas dispersas e não introduziualterações significativas ao anterior regime da titularidade dos recursoshídricos, mantendo como traços essenciais a atribuição das águas domar e das restantes águas desde que navegáveis ou flutuáveis aodomínio público do Estado e a sujeição de todas as actuações quecomprometam a qualidade e a quantidade das águas subterrâneas adeterminados condicionamentos administrativos.

    A inexistência de um registo das águas do domínio público foi, pois,colmatada com a publicação do referido diploma, que colocou soba égide do Instituto da Água, enquanto autoridade nacional da água,a classificação técnica das águas do domínio público como águasnavegáveis ou águas flutuáveis, bem como a organização e manutençãode um registo de águas do domínio público hídrico, que compreendeo domínio público marítimo, o domínio público lacustre e fluvial eo domínio público das restantes águas.

    A Lei da Água, por seu lado, definiu um novo enquadramento paraa gestão das águas superficiais, designadamente as águas interiores,de transição e costeiras, e das águas subterrâneas e introduziu profundasalterações ao normativo anteriormente existente, consagrando princípiosabsolutamente inovadores no domínio da política da água,designadamente o princípio do valor económico da água, por forçado qual se consagra o reconhecimento da escassez do mencionadorecurso e a necessidade de garantir a sua utilização economicamenteeficiente, com a recuperação dos custos dos serviços de águas, mesmo

    22 de Março de 2007

  • PLANO ESTRATÉGICO DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA E SANEAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAISPARA O PERÍODO DE 2007-2013 (PEAASAR II)

    em termos ambientais, tendo por base os princípios do poluidor-pagador e do utilizador-pagador, os quais ocupam um lugarde destaque na Directiva-Quadro da Água.

    A recente aprovação do Plano Estratégico de Abastecimentode Água e Saneamento de Águas Residuais para o período de2007 a 2013 (PEAASAR II) pelo Ministro do Ambiente, doOrdenamento do Território e do Desenvolvimento Regionalveio relançar a necessidade de completar a reformulação doregime nacional de gestão dos recursos hídricos iniciada pelaLei da Água, nomeadamente através da aprovação de um novoregime da utilização dos recursos hídricos e de um novo regimeeconómico e financeiro dos recursos hídricos, os quais seassumem como instrumentos essenciais na prossecução dasmetas e dos objectivos preconizados no referido planoestratégico, e constituem diplomas essenciais para aoperacionalização da Lei da Água.

    A Assembleia da República, mediante a Lei n.º 13/2007 de 9 de Março,autorizou o Governo a aprovar o novo regime jurídico de utilização dosrecursos hídricos, nos termos estabelecidos nos artigos 56.º a 76.º da Leida Água, que substituirá o regime actualmente em vigor, plasmado noDecreto-Lei n.º 46/94, de 22 de Fevereiro.

    Embora a reformulação do regime nacional de gestão da água tenhaainda um longo percurso pela frente, nomeadamente porque aimplementação cabal da Lei da Água depende da publicação de inúmeralegislação complementar, o PEAASAR II e os citados projectos legislativospermitem perceber, desde já, os contornos que a política de recursoshídricos irá assumir durante os próximos anos, razão pela qual a suaanálise constitui objecto da presente edição da NewsLextter.

    Maria José [email protected]

    Filipe Jorge [email protected]

    Após um longo período de consulta pública, foi aprovado peloMinistro do Ambiente, do Ordenamento do Território e doDesenvolvimento Regional o Plano Estratégico deAbastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuaispara o período de 2007-2013 (PEAASAR II), apenas vinculativopara Portugal Continental, dadas as prerrogativas constitucionaisdas Regiões Autónomas.

    O PEAASAR II, que consubstancia o ponto-chave na definiçãoe consequente clarificação da estratégia para o sector da águae do saneamento de águas residuais, define os grandes objectivosestratégicos para o sector, tendo em vista a resolução dosdiversos problemas de ordem estrutural, operacional,económico-financeira e ambiental que o PEAASAR 2000-2006(PEAASAR I), apesar dos progressos registados, não logroucolmatar.

    O primeiro problema estrutural enunciado pelo PEAASAR IIconsiste no fosso existente entre os níveis de atendimento àspopulações, em qualidade e quantidade, e os padrões deprotecção ambiental e de qualidade de vida exigíveis numasociedade moderna e desenvolvida. Trata-se de umapreocupação decalcada nas obrigações de serviço público aque o Estado se encontra adstrito seja nos casos de gestãodirecta dos serviços de abastecimento de água e de saneamentode águas residuais, seja nos casos de gestão delegada porforça dos princípios da universalidade, da continuidade e daqualidade dos serviços públicos essenciais, que se encontramexpressamente consagrados no ordenamento jurídico português,mormente no Decreto-Lei n.º 207/94, de 6 de Agosto, e naLei n.º 23/96, de 26 de Julho, e reconhecidos no Livro Verdesobre Serviços de Interesse Geral (COM/2003/270 final, § 49).

    Paralelamente, o PEAASAR II elege como problema estruturaldo sector a gestão separada do abastecimento de água e dosaneamento de águas residuais com ausência de integraçãona perspectiva do ciclo urbano da água, não permitindo umacorrecta articulação entre captações e rejeições. Este é umproblema evidente nos municípios cujas populações já seencontram dotadas de infra-estruturas públicas de abastecimentode água mas que ainda não beneficiam das necessárias infra-estruturas públicas de recolha, tratamento e rejeição das águasresiduais.

    O PEAASAR II confere, ainda, especial enfoque às consequênciasdecorrentes da deficiente articulação entre as vertentes em alta (i.e.os sistemas multimunicipais, definidos como os sistemas que servempelo menos dois municípios e exigem um investimento predominantea efectuar pelo Estado, em função de razões de interesse nacional) eem baixa (i.e. os sistemas municipais que consistem nos demaissistemas, bem como nos sistemas geridos através de associações demunicípios), não só ao nível da operacionalidade das infra-estruturas,mas também ao nível do atendimento ao público. Esta deficientearticulação configura uma das mais importantes problemáticas do sector,de cuja resolução depende, em grande medida, a solução dos demaisproblemas que o mesmo actualmente evidencia.

    A par dos problemas de ordem estrutural, o PEAASAR II elenca igualmenteum conjunto de problemas de natureza operacional, de entre os quaiscumpre destacar a ausência de regulamentação da obrigação legal deligação dos utilizadores aos sistemas municipais e multimunicipais e afalta de mecanismos de penalização das entidades competentes. Trata-se de um grave problema que tem reflexos não só ao nível da própriasustentabilidade dos sistemas (numa lógica de recuperação de custos ede amortização de investimentos), mas também, e sobretudo, ao níveldo ambiente e da saúde pública.

    Quanto aos problemas de cariz económico, o PEAASAR II destaca, porum lado, as fortes discrepâncias existentes entre as tarifas que sãocobradas por diferentes municípios, dentro da mesma região, quer parao abastecimento de água, quer para o saneamento de águas residuaise, por outro lado, o desfasamento existente entre as tarifas que sãoefectivamente aplicadas e as tarifas necessárias numa lógica de recuperaçãodos custos reais, de forma absolutamente avessa à lógica inerente à Leida Água.

    Por último, e no que respeita aos problemas ambientais detectados noâmbito da avaliação do processo de implementação do PEAASAR I, oPEAASAR II assinala a falta de capacidade dos agentes envolvidos nocumprimento da legislação ambiental em vigor, mormente pordesajustamento das infra-estruturas de saneamento às exigências legais,por falta de realização de investimentos nas necessárias infra-estruturasde abastecimento de água e, sobretudo, de saneamento e, ainda, porproblemas inerentes à exploração das infra-estruturas existentes. A esterespeito, o PEAASAR II alerta para a necessidade de ajustamento dossistemas de abastecimento de água e de saneamento à vasta legislaçãonacional e comunitária e, em especial, à Lei da Água, cujo cumprimentoexige não só uma melhoria a nível técnico, mas também uma maiorcoordenação institucional.

  • De modo a colmatar os problemas enunciados, e outros quese encontram longamente explanados no documento emanálise, o PEAASAR II enuncia três grandes objectivosestratégicos para o sector, os quais deverão ser desenvolvidospelos agentes envolvidos durante o período de 2007 a 2013.

    Assim, reconhecendo que o abastecimento de água e osaneamento de águas residuais constituem serviços essenciaisao bem-estar, à saúde pública e à segurança colectiva daspopulações, às actividades económicas e à protecção doambiente, o PEAASAR II começa por definir como primeiroobjectivo estratégico para o sector a universalidade, acontinuidade e a qualidade dos referidos serviços.

    Tendo em vista a prossecução do citado objectivo, o PEAASARII visa, de um ponto de vista operacional: (i) Servir cerca de95% da população total do País com sistemas públicos deabastecimento de água (taxa idêntica à prevista no PEAASARI, que não foi atingida, ficando-se pelos 93%, de acordo comos dados constantes do PEAASAR II) e cerca de 90% dapopulação total do País com sistemas públicos de saneamentode águas residuais urbanas (os dados constantes do PEAASARII apontam para níveis de atendimento de 80% em tratamentode águas residuais); (ii) Obter níveis adequados de qualidadedo serviço de acordo com os indicadores de qualidade definidospelo Instituto Regulador de Águas e Resíduos e (iii) Estabelecerorientações para a definição das tarifas ao consumidor final,evoluindo tendencialmente para um intervalo razoável ecompatível com a capacidade económica das populações.

    O segundo objectivo estratégico traçado pelo PEAASAR IIconsiste na sustentabilidade do sector, mediante a recuperaçãointegral dos custos incorridos nos serviços, a optimização dagestão operacional, a eliminação de custos de eficiência e adinamização do tecido empresarial privado nacional e local.Desta forma, o PEAASAR II visa a harmonização dos tarifários,bem como a adequação das tarifas cobradas nos diversosmunicípios às novas regras prescritas na Lei da Água, de modoa que as mesmas (i) cubram os custos dos serviços de águas,(ii) sejam socialmente aceitáveis e (iii) sejam escalonadas deforma a contribuir para o seu uso eficiente e para a protecçãodo ambiente.

    Note-se, aliás, que um dos principais propósitos do PEAASARII, para além da revisão da estratégia do sector e a resoluçãode problemas de fundo que o sector continua a evidenciar,consistiu na definição de uma estratégia que se adequasse aosobjectivos traçados no âmbito de outras estratégias de âmbitosectorial, como é o caso da estratégia plasmada na já citadaLei da Água. Na mesma senda, as metas e objectivos enunciadosno PEAASAR II visam, ainda, a sua coordenação com outrosdocumentos, tais como o Plano Nacional da Água, as Basespara a Estratégia de Gestão Integrada da Zona Costeira Nacional,o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água, bem comode âmbito transversal, como é o caso da Estratégia Nacionalpara o Desenvolvimento Sustentável, o Programa Nacional deReformas para a Estratégia de Lisboa e o Plano Tecnológico.

    Como terceiro grande objectivo estratégico para o sector doabastecimento de água e de saneamento de águas residuais,o PEAASAR II elege a protecção dos valores ambientais, tendoem vista: (i) A conformação do sector com a extensa legislaçãonacional e comunitária; (ii) Garantir uma abordagem integradana prevenção e controlo da poluição causada pela actividadehumana e pelos sectores produtivos; e (iii) Aumentar aprodutividade e a competitividade do sector através de soluçõesque promovam a eco-eficiência.

    Para efeitos de prossecução do supra referido objectivo, oPEAASAR II consagra um pacote de medidas, entre as quaisse destaca a realização dos investimentos necessários àconclusão e expansão dos sistemas em alta e a continuaçãoda infra-estruturação da vertente em baixa, tendo em vistaa adequada articulação entre os sistemas multimunicipais eos sistemas municipais de abastecimento de água e desaneamento.

    De acordo com os elementos avançados pelo PEAASAR II, osinvestimentos na vertente em alta de abastecimento de água e desaneamento de águas residuais para o período de 2007 a 2013 deverãorondar os 1 600 milhões de euros (a preços constantes de 2005),sendo que apenas 700 milhões justificam apoios do Quadro deReferência Estratégico Nacional (QREN) relativo ao mesmo período.

    Quanto aos investimentos na vertente em baixa os quais setraduzem, sobretudo, na execução de obras de interligação entre avertente em alta e a vertente em alta, de redes de distribuição deágua e reservas municipais e de redes de drenagem de águas residuais,na execução de obras de renovação e reabilitação das infra-estruturasde abastecimento de água e de saneamento já existentes (essenciaisno processo de redução das perdas nas redes de abastecimento deágua) e na execução de sistemas de drenagem de águas residuais parao início do processo de separação da componente pluvial em sistemasunitários e de erradicação de ligações cruzadas nos sistemas separativos o PEAASAR II aponta para um investimento de 2 200 milhões deeuros (subtraído o montante de 900 milhões de euros correspondenteaos investimentos realizados e em curso na vertente em baixa pelasautarquias e apoiados pelo FEDER no período de vigência do PEAASARI), dos quais cerca de 1 400 milhões de euros serão elegíveis no quadrodo QREN.

    Está, pois, em causa assegurar a implementação do PEAASAR II emarticulação com o novo período de programação dos fundoscomunitários, de forma a utilizar eficientemente tais fundos.

    Em virtude das exigências ambientais preconizadas na densa massade directivas comunitárias que se encontram actualmente em vigorou em processo de revisão, o PEAASAR II prevê, ainda, elevadosinvestimentos na implementação de projectos complementares aossistemas de abastecimento de água e de drenagem de águas residuais,nomeadamente nos domínios (i) dos tratamentos complementares delamas de ETA e ETAR; (ii) do tratamento integrado de efluentes urbanose industriais; (iii) da implementação da Lei da Água; (iv) da investigaçãotecnológica; e (v) das intervenções de valorização ambiental.

    Complementando a estratégia preconizada pelo PEAASAR I, cujoprincipal enfoque consistiu no desenvolvimento dos sistemas integradosem alta, o PEAASAR II destaca-se por centrar-se nos sistemas embaixa, a par de outros aspectos, tais como os já mencionadosinvestimentos destinados a permitir a anunciada articulação entre ossistemas em alta e os sistemas em baixa, e a necessidade decriação das necessárias condições para a cobertura integral dos custosdos serviços de abastecimento de água e saneamento, de modo aassegurar a sustentabilidade económica e financeira dos sistemas.

    Para tal, o PEAASAR II preconiza a optimização dos modelos actuais,quer ao nível operacional quer ao nível do enquadramento regulamentar,e a adopção de modelos de gestão futuros que incluam soluçõesalternativas de gestão.

    Os sistemas multimunicipais deverão ser reorganizados, se necessário,alargando-os a outros municípios, ou mediante fusões de sistemasem alta.

    No que respeita à baixa, a estratégia do PEAASAR II assenta noseguinte: (i) Integração territorial das soluções numa lógicaplurimunicipal, envolvendo os sistemas de abastecimento de água esaneamento de águas residuais; (ii) Coincidência, preferencialmente,dos sistemas em baixa com a área geográfica dos sistemas em alta;(iii) Integração dos sistemas em baixa na alta integração verticalde todos os serviços (com respeito das soluções já existentes e, semprejuízo dos municípios optarem pela não integração nos novossistemas plurimunicipais); (iv) Adopção de modelos de gestãoempresarial; (v) Adopção do princípio de remuneração dos municípiosintegrantes do sistema em função do esforço de infra-estruturação jáefectuado; (vi) Adopção de um regime tarifário uniformizado na áreade cada sistema.

    Apesar do princípio da autonomia das Autarquias locais e da liberdadede escolha dos municípios liberdade essa que pressupõe ocumprimento das suas obrigações legais e contratuais o PEAASARII preconiza claramente um modelo de organização do sector quepassa pela integração da baixa no sistema multimunicipalcorrespondente (modelo verticalizado) ou, em alternativa, a criação

  • O NOVO REGIME JURÍDICO DA UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

    de novos sistemas municipais em forma empresarial, integradoscom a participação do Estado, através da Águas de Portugal(AdP) ou das empresas concessionárias dos sistemasmultimunicipais, que assumiria o financiamento do investimentoe a gestão da baixa. Estes sistemas em baixa integrariamos respectivos activos municipais. As baixas assim integradaspoderão ser geridas em regime de concessão de serviço público(affermage) por prazo de 10 a 15 anos, mediante prévioconcurso público.

    As empresas multimunicipais poderão, ainda, recorrer aoutsourcing para contratar, mediante prévio procedimentoconcursal, serviços nas áreas de projecto, construção, operaçãoe manutenção de sistemas.

    Considerando os vultuosos investimentos previstos no PEAASARII, a sua implementação eficaz implica uma articulação como QREN e critérios rigorosos de acesso a financiamento. Serão,à partida, considerados para financiamento através do QRENos projectos de candidaturas apresentados por qualquerentidade gestora de sistemas de abastecimento público deágua e de saneamento de águas residuais, independentementedo seu modelo de gestão, podendo corresponder a gestãodirecta, delegação, concessão ou subconcessão.

    Os critérios de acesso a financiamento dos projectos pelosfundos comunitários serão, em princípio, os seguintes: oprojecto deverá inscrever-se nos objectivos nacionais para osector definidos no PEAASAR II e deverá enquadrar-se numplano geral ou de acção, evidenciando a optimização dosinvestimentos na perspectiva de interesse público. O projectodeverá, ainda, evidenciar ter condições de sustentabilidadeeconómico-financeira e que o financiamento a fundo perdidoé essencial para permitir uma tarifa média aceitável para onível de desenvolvimento económico e social da população.Mais deverá o projecto evidenciar um adequado modelo degestão e que é compatível com os objectivos de planeamentode recursos hídricos da respectiva bacia hidrográfica e satisfazeras exigências da legislação ambiental.

    De acordo com o PEAASAR II, serão considerados projectosprioritários para financiamento pelos fundos os que demonstrem

    permitir: (i) Completar as ligações entre os sistemas em alta e embaixa; (ii) Níveis adequados de integração de soluções técnicas quepermitam economias de escala; (iii) O cumprimento das normas legaisrelativas ao tratamento de águas residuais urbanas; (iv) Uma relevantemelhoria da qualidade da água para consumo humano; (v) Umarelevante melhoria da qualidade do serviço; (vi) Uma relevante melhoriaem termos ambientais, nomeadamente em termos de utilização racionalda água e de protecção contra a poluição; (vii) Uma elevada maturidade,nomeadamente em termos de capacidade efectiva de gestão, e de estarassegurada a contrapartida nacional.

    O PEAASAR II conta, em primeira linha, com os subsídios comunitáriosno âmbito do QREN, como fonte de financiamento dos investimentosno sector mas enuncia o recurso a capitais próprios, auto financiamento,financiamento do Banco Europeu de Investimento, financiamento dabanca comercial ou outras formas de financiamento como a titularizaçãode receitas ou emissão de obrigações.

    O sucesso da estratégia preconizada pelo PEAASAR II depende emgrande medida da resposta e envolvimento das Autarquias locais epassará igualmente pelo reforço e alargamento do âmbito dosmecanismos de regulação dos serviços e de regulação ambiental e deinspecção, com destaque para o reforço do IRAR, cujo estatuto serárevisto e reforçado, e do INAG, enquanto Autoridade Nacional daÁgua.

    A adopção de novos modelos de gestão do sector implicará alteraçõesno respectivo enquadramento legal e regulamentar, desde logo aonível da revisão das bases dos contratos de concessão dos sistemasmultimunicipais, da regulamentação da gestão dos sistemas municipais,da criação de uma lei de bases de concessões em baixa, daregulamentação das várias modalidades de gestão directa autárquica.A implementação da Estratégica implica, ainda, a necessidade deregulamentação da obrigatoriedade legal de ligação dos utilizadoresaos sistemas multimunicipais e municipais.

    No âmbito da concretização do PEAASAR II deverá ser conduzido oprocedimento de avaliação ambiental estratégica, sistema de controloestabelecido pela Directiva 2001/42/CE (cuja transposição para alegislação nacional se aguarda), que visa a avaliação dos efeitos noambiente de determinados programas e planos.

    A Assembleia da República, mediante a Lei n.º 13/2007 de 9de Março, autorizou o Governo a aprovar o novo regimejurídico de utilização dos recursos hídricos (doravante oRJURH), nos termos estabelecidos nos artigos 56.º a 76.º daLei da Água, e que substituirá o regime actualmente em vigor,plasmado no Decreto-Lei n.º 46/94, de 22 de Fevereiro.

    O RJURH sujeita a título de utilização todas as actividadesque tenham um impacte significativo no estado das águas,entendido como o resultado da actividade humana que causeuma alteração no estado das águas, ou coloque esse estadoem perigo, ou que preencha os requisitos definidos para oefeito pelos organismos competentes para a gestão das águas.

    A atribuição dos títulos de utilização de recursos hídricos seráda competência da administração da região hidrográficaterritorialmente competente (ARH) e ficará dependente documprimento das normas prescritas na Lei da Água, dascondições previstas no RJURH que sejam aplicáveis à utilização

    em causa, da demais legislação aplicável, bem como de outros aspectoscomplementares tais como (i) a inexistência de outros usos efectivosou potenciais dos recursos hídricos, reconhecidos como prioritáriose não compatíveis com o pedido de utilização; (ii) a possibilidade decompatibilizar a utilização com direitos preexistentes; (iii) a inobservânciados requisitos aplicáveis à captação a que se destina, no caso depesquisa de captação de águas subterrâneas; e (iv) a inexistência depareceres vinculativos desfavoráveis.

    À semelhança do que já resultava do Decreto-Lei n.º 46/94, de 22 deFevereiro, o novo regime prevê a possibilidade de qualquer interessadoformular um pedido de informação prévia à entidade licenciadoraacerca da possibilidade de utilização dos recursos hídricos para o fimpretendido. A este respeito, a novidade do RJURH traduz-se noalargamento do prazo durante o qual a informação prestada vinculaa entidade licenciadora, já que o Decreto-Lei n.º 46/94, de 22 deFevereiro prescrevia um prazo de seis meses e o RJURH vem agoraestipular um prazo de um ano.

    Maria José [email protected]

    Ana Rita Joã[email protected]

  • Uma das principais inovações do novo regime consiste naintrodução de um novo título de utilização, a autorização,que se junta às actuais figuras da licença e da concessão.Assim, enquanto a licença e a concessão são, em regra,exigíveis nos casos em que a utilização incida sobre recursoshídricos do domínio público em regra porque, emdeterminados casos, a licença é igualmente exigível quandoa utilização tem por objecto recursos hídricos particulares estarão sujeitas a autorização a realização de construções, aimplantação de infra-estruturas hidráulicas, a captação deáguas e outras actividades que alterem o estado das massasde águas ou coloquem esse estado em perigo (e que não seencontrem sujeitas a licença, nos termos do artigo 62.º, n.º 2da Lei da Água), quando tais actividades incidam sobre leitos,margens e águas particulares.

    Nos casos em que esteja em causa a captação de águasparticulares com potência igual ou inferior a 5 cv, ou noscasos previstos nos regulamentos dos planos de gestão debacia ou nos planos especiais de ordenamento do territórioaplicáveis, o novo regime admite que a autorização sejasubstituída por uma mera comunicação prévia às autoridadescompetentes, a qual deverá ser efectuada por escrito e conteros elementos definidos em portaria a aprovar pelo membrodo Governo responsável pela área do ambiente.

    Tendo em vista a simplificação administrativa dos processosde autorização, o novo regime dispõe que o pedido deautorização considera-se tacitamente deferido se a entidadelicenciadora não se pronunciar sobre o mesmo no prazo dedois meses a contar da data da respectiva apresentação, exceptonos casos em que esteja em causa a captação de água paraconsumo humano.

    Na esteira do regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 46/94, de22 de Fevereiro, o RJURH sujeita a licença as utilizaçõesprivativas dos recursos hídricos do domínio público enunciadasno artigo 60.º da Lei da Água, entre as quais cumpre destacara captação de águas, a rejeição de águas residuais, a imersãode resíduos e a ocupação temporária para construção oualteração de infra-estruturas hidráulicas. Quando esteja emcausa a utilização de leitos, margens e águas particulares, alicença é igualmente exigível nas actividades de rejeição deáguas residuais, imersão de resíduos, recarga e injecção artificialem águas subterrâneas, extracção de inertes, aterros eescavações.

    A licença de utilização será atribuída pela ARH competenteatravés de pedido apresentado pelo particular à entidadelicenciadora, o qual deverá ser publicitado através da fixaçãode editais e da publicação nos locais de estilo durante o prazode trinta dias, abrindo a faculdade de outros interessadospoderem requerer para si a emissão do título com o objectoe finalidade para a utilização publicitada ou apresentarobjecções à atribuição do mesmo. O procedimento delicenciamento terá início se, decorrido o mencionado prazode trinta dias, não tiver sido apresentado qualquer pedidoconcorrente. Caso venham a ser apresentados pedidos idênticosde atribuição de licença no referido prazo, a autoridadecompetente deverá iniciar um procedimento concursal entreos interessados.

    À semelhança do disposto no regime anterior, o RJURH impõeque, em determinados casos, a licença de utilização sejaatr ibuída através de procedimento concursal ,independentemente de pedido de atribuição de licençapreviamente formulado pelos interessados. Neste contexto,são obrigatoriamente atribuídas através de concurso, asutilizações de recursos hídricos sujeitas a licença (i) de extracçãoem margens e leitos conexos com águas públicas em volumesuperior a 500 m3; (ii) de ocupação do domínio públicohídrico (salvo nos casos de descarga de águas residuais); (iii)de recarga e injecção artificial em águas subterrâneas ou ainda,em área de jurisdição portuária, de usos dominiais com umprazo igual ou inferior a um ano; e (iv) de instalação de apoiosde praia nos terrenos do domínio público.

    Do mesmo modo, o novo regime não introduz alterações de montaquanto às utilizações que se encontram sujeitas a concessão. Deverãoser concessionadas as utilizações enunciadas no artigo 61.º da Lei daÁgua, nomeadamente a captação de água para abastecimento público,a captação de água para rega de área superior a 50 hectares, a utilizaçãode terrenos do domínio público hídrico que se destinem à edificaçãode empreendimentos turísticos e simulares, a captação de água paraenergia e a implantação de infra-estruturas hidráulicas que se destinemaos fins referidos nos casos mencionados.

    Nas situações referidas no parágrafo precedente, o novo regime impõeque a escolha do concessionário pela Administração seja realizadaatravés de uma das seguintes formas: (i) procedimento contratual deconcurso público; (ii) decreto-lei, nos casos em que recaia sobreentidades públicas empresariais e demais empresas públicas às quaisdeva caber a exploração de empreendimentos de fins múltiplos; ou (iii)procedimento iniciado a pedido do interessado. Neste último caso, aAdministração deverá abrir um procedimento concursal entre osinteressados (gozando o primeiro requerente de direito de preferênciaem igualdade de condições) se tiver recebido um pedido com o mesmopropósito no prazo de trinta dias a contar da afixação dos editais e dapublicação no jornal oficial.

    Outra importante novidade introduzida pelo RJURH consiste naconsagração expressa dos direitos dos utilizadores, esclarecendo-se queos títulos de utilização, mormente as licenças e as concessões, conferemaos seus titulares o direito de utilização exclusiva, para os fins e comos limites consignados no respectivo título constitutivo, das parcelas dodomínio público hídrico a que respeitam. Se a utilização permitidaenvolver a realização de obras ou alterações, o direito do uso privativoabrange poderes de construção, transformação ou extracção, conformeos casos, entendo-se que tanto as construções efectuadas como asinstalações desmontáveis se mantêm na propriedade do titular da licençaou da concessão até expirar o respectivo prazo. Uma vez expirado oprazo da concessão, as obras executadas e as instalações construídasno estrito âmbito da concessão revertem gratuitamente para o Estado.Caso se trate de licença, as instalações desmontáveis são removidas eas instalações fixas são demolidas, salvo se a Administração optar pelareversão a título gratuito.

    Na mesma senda, o RJURH coloca sob a égide do Estado a garantiados direitos do uso privativo dos bens públicos objecto de um título deutilização, vinculando as entidades competentes a tomar todas asmedidas necessárias a favor do respectivo titular sempre que algumaparcela do domínio público hídrico se encontrar afecta a um usoprivativo e este for perturbado por ocupação abusiva. O Estado responderácivilmente perante o interessado, nos termos gerais, por todos os danosque para aquele decorram da falta, insuficiência ou inoportunidade dasprovidências adequadas à garantia dos seus direitos.

    Paralelamente, o RJURH enuncia, com precisão, os casos em que aAdministração pode recorrer ao mecanismo da revogação de um títulode utilização, exigindo que a mesma seja sempre precedida de préviaaudiência do interessado, cabendo à Administração adverti-lo doincumprimento e conceder-lhe um prazo para remediá-lo. Nos casosem que o titular de uma utilização tenha realizado investimentos eminstalações fixas, deverá o mesmo ser ressarcido do valor do investimentorealizado, na parte ainda não amortizada, em função da duração previstano respectivo título de utilização e que não possa ser concretizada.

    O RJURH destaca-se, ainda, por introduzir a possibilidade de transacçãode licenças relativas a captação de águas e rejeição de águas residuais,bem como a cedência temporária de direitos de utilização emergentesdesses títulos e a possibilidade de criação de um mercado organizadode transacção de licenças e concessões e de cedências temporárias dedireitos que respeite os princípios da publicidade e da livre concorrência,remetendo o respectivo regime jurídico para regulamentação específica.

    De acordo com o RJHRH a transacção de títulos e a cedência temporáriade direitos, estão dependentes do preenchimento de um conjunto derequisitos, nomeadamente (i) que os títulos objecto da transacção sereportem a utilizações situadas em diferentes locais dentro da mesmabacia hidrográfica e para as quais esteja prevista esta possibilidade norespectivo plano de gestão de bacia hidrográfica; (ii) que a transacçãoou a cedência não envolva a transmissão de títulos de utilização relativosa abastecimento público para utilizações de outro tipo e (iii) que sejamcumpridos os requisitos para atribuição do título.

  • No caso específico de licença de descarga de águas residuais,a transacção só será admissível quando se destine à mesmaactividade e contenha os mesmos parâmetros e respectivoslimites de emissão e programa de autocontrolo.

    Embora não se encontre sujeita a prévia autorizaçãoadministrativa (à semelhança do que acontece com a cedência),a transacção deverá ser notificada à autoridade competentecom a antecedência mínima de um mês relativamente à dataem que a mesma produzirá efeitos. Esta notificação é irrevogávele deverá incluir todas as condições da transacção, podendoa autoridade competente exercer o direito de preferência nascondições declaradas até quinze dias antes da data em quea transacção produzirá efeitos ou, no mesmo prazo, notificaras partes da impossibilidade de realização da transacção pornão se encontrarem preenchidos os requisitos legalmenteestabelecidos para o efeito.

    Tendo em vista uma gestão racional e sustentável dos recursoshídricos, o RJURH visa, ainda, a criação do Sistema Nacionalde Informação dos Títulos de Utilização dos Recursos Hídricos(SNITURH), em conformidade com o disposto no artigo 73.ºda Lei da Água. O SNITURH, gerido pelo Instituto da Água,deverá incluir o registo e a caracterização sumária de todasas autorizações, licenças e concessões de utilização, qualquerque seja a entidade emissora, devendo conter os direitos eobrigações dos utilizadores e os critérios legais de emissão efiscalização da utilização. Para este efeito, ficam as entidadeslicenciadoras obrigadas a efectuar o registo e a comunicaçãode todos os títulos de utilização dos recursos hídricos quesejam por si atribuídos, antes da emissão do respectivo título.Nos casos em que a utilização respeite a actividade sujeita alicença ambiental, a emissão dessa licença fica igualmentesujeita a registo no SNITURH.

    O RJURH estabelece, ainda, o enquadramento legal dosempreendimentos múltiplos ou equiparados (empreendimentosque, embora originariamente constituídos para realizar apenasutilização principal, passaram ou dispõem de condições para,no decurso da sua exploração, realizar outras utilizaçõesprincipais, como é o caso dos aproveitamentos hidroagrícolase os aproveitamentos hidroeléctricos), dispondo que a gestãodos mesmos deverá caber a uma única entidade, pública ouprivada, através de contrato de concessão outorgado pelomembro do Governo responsável pela área do ambiente.

    A verificação do cumprimento das obrigações prescritas no RJURHserá efectuada de acordo com o disposto nos artigos 90.º a 94.º da Leida Água, podendo revestir a forma de fiscalização ou de inspecção.Enquanto as acções inspectivas estarão a cargo da Inspecção-Geral doAmbiente e do Ordenamento do Território, as acções de fiscalizaçãoficarão sob a égide das ARH, coadjuvadas pelas autoridades policiaisou administrativas.

    A este propósito, o RJURH acolhe um vasto elenco de contra-ordenaçõesambientais, as quais são classificadas como contra-ordenações leves,graves e muito graves, consoante a relevância dos direitos e interessesenvolvidos. Tais ilícitos contra-ordenacionais serão punidos emconformidade com o disposto na Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto,que aprovou a Lei-Quadro das Contra-Ordenações Ambientais, nãosó no que respeita aos limites mínimos e máximos das coimas, mastambém no que concerne ao decretamento de medidas cautelares eaplicação de sanções acessórias.

    O RJURH concede aos utilizadores não titulados um prazo de doisanos para requererem o necessário título de utilização, ficando taisutilizadores isentos de aplicação de coima pela utilização não tituladaaté à emissão do respectivo título. Os títulos emitidos ao abrigo dalegislação anterior, mormente do Decreto-Lei n.º 46/94, de 22 deFevereiro, mantêm-se em vigor nos termos em que foram emitidos,desde que os respectivos titulares os levem ao conhecimento da ARHrespectiva, no prazo de um ano a contar da data de entrada emfuncionamento destas. Caso sejam necessárias alterações para aprogressiva adaptação do título emitido às disposições da Lei da Águae dos actos legislativos que a complementam, a ARH fixará umcalendário com as medidas adequadas para a sua concretização, tendosempre em conta as legítimas expectativas do detentor do título.

    O RJURH introduzirá importantes inovações, sobretudo ao nível dosdireitos e garantias dos utilizadores dos recursos hídricos. Com efeito,apesar de instituir um regime mais rigoroso para a utilização da água por força dos exigentes princípios consagrados pela Lei da Água o novo regime vem conferir uma maior protecção aos titulares deautorização, licença ou concessão de recursos hídricos, obrigando asentidades competentes ou os seus respectivos órgãos e agentes, aadoptar as necessárias providências face a qualquer utilização abusivaque contenda com o título de utilização daqueles e a indemnizar osreferidos utilizadores por todos os danos resultantes da falta, insuficiênciaou inoportunidade das providências adequadas à garantia dos seusdireitos.

    O ANTEPROJECTO DO NOVO REGIME ECONÓMICO E FINANCEIRODOS RECURSOS HÍDRICOS

    Encontra-se actualmente em preparação o diploma que aprovaráo novo regime económico e financeiro dos recursos hídricos(REFRH), regulando o disposto nos artigos 77.º a 83.º da Leida Água, e revogando o regime instituído pelo Decreto-Lein.º 47/94, de 22 de Fevereiro.

    O REFRH surge, antes de mais, como um instrumento essencialna concretização dos princípios consagrados na Lei da Água,mormente (i) o princípio do valor social da água, pelo qualse reconhece que a água é um bem de consumo ao qual todosos cidadãos devem ter acesso para satisfação das suasnecessidades elementares, (ii) o princípio da dimensãoambiental da água, nos termos do qual a água é configuradacomo um activo ambiental que exige uma protecção capazde garantir um aproveitamento sustentável e, por último, (iii)o princípio do valor económico da água, pelo qual se reconhece

    que a água, constituindo um recurso escasso, deve ter uma utilizaçãoeficiente, confrontando-se o utilizador da água com todos os custose benefícios que lhe são inerentes.

    Tendo em vista a concretização dos sobreditos princípios, o REFRHenceta uma revisão profunda ao regime económico e financeiro dosrecursos hídricos actualmente em vigor, disciplinando a taxa de recursoshídricos (TRH), as tarifas dos serviços públicos de águas e os contratos-programa em matéria de recursos hídricos.

    A TRH, que constitui uma das principais e mais polémicas inovaçõesdeste novo regime, surge como um importante instrumento da políticade gestão preconizada pela Lei da Água, não só porque constitui umincentivo ao uso eficiente dos recursos hídricos (visando compensaro benefício resultante da utilização privativa do domínio públicohídrico e os custos ambientais inerentes às actividades susceptíveis decausar um impacte adverso significativo nos recursos hídricos), mastambém porque permite o financiamento de actividades destinadas amelhorar a eficiência do uso da água e a qualidade dos recursoshídricos.

    Nos termos do Anteprojecto, encontram-se sujeitos à TRH todas aspessoas, singulares ou colectivas, que, estando ou devendo estarmunidas dos necessários títulos de utilização, realizem as seguintes

    Ana Rita Joã[email protected]

  • utilizações dos recursos hídricos: (i) aproveitamento de águasdo domínio público hídrico do Estado; (ii) descarga, directaou indirecta, de efluentes sobre os recursos hídricos, susceptívelde causar impacte adverso significativo; (iii) extracção demateriais inertes do domínio público hídrico do Estado; e (iv)aproveitamento de águas, sujeitas a planeamento público,susceptível de causar impacte adverso significativo. Emconsonância com o disposto no artigo 80.º da Lei da Água,não estão sujeitas a TRH as utilizações que sejam reconhecidas,por decreto-lei, como insusceptíveis de causar impacte adversosignificativo no estado das águas e dos ecossistemas associados,nem de agravar situações de escassez.

    Nos casos em que a TRH não seja devida pelo utilizador final,o sujeito passivo da mencionada taxa deverá fazer repercutiro encargo económico que a mesma representa sobre o utilizadorfinal, através dos preços e tarifas que pratique. É o que acontece,por exemplo, com os utentes dos serviços públicos deabastecimento de água e de saneamento de águas residuaisque, não sendo sujeitos passivos da TRH, suportarãoindirectamente o custo dessa taxa mediante o pagamento dastarifas praticadas pelas empresas concessionárias dos referidosserviços (estas sim sujeitos passivos da TRH).

    A base tributável da TRH é constituída por diversas componentese expressa pela fórmula A + E + I + O + U, sendo que ainaplicabilidade de qualquer uma destas componentes nãoprejudica a aplicação das demais.

    A componente A corresponde ao aproveitamento de águas dodomínio público hídrico do Estado e é calculada pela aplicaçãode um valor de base ao volume de água captado, desviado,represado ou restituído após utilização, expresso em metrocúbico, multiplicado pelo coeficiente de escassez aplicável.

    A componente E, por seu lado, corresponde à descarga, directaou indirecta, de efluentes sobre os recursos hídricos, susceptívelde causar impacte adverso significativo, calculando-se pelaaplicação de um valor de base à quantidade de poluentescontida na descarga, expressa em quilogramas. Estão isentasdesta componente as descargas de águas residuais provenientesde habitações isoladas com soluções próprias de tratamento,as descargas provenientes de aglomerados urbanos comdimensão até 200 habitantes, desde que as respectivas águasresiduais não contenham efluentes industriais não tratados,bem como as descargas de águas residuais no solo apóstratamento ou armazenamento, com vista à reutilização ouespalhamento para efeitos de fertilização.

    A componente I corresponde à extracção de inertes do domíniopúblico hídrico do Estado, calculando-se pela aplicação deum valor de base de 2,50 ao volume de inertes extraídos,expresso em metro cúbico. Este valor de base deve ser tomadocomo preço mínimo de referência quando a atribuição dalicença de extracção de inertes seja feita por meio deprocedimento concursal ou quando a extracção de inertesseja promovida por iniciativa das Administrações das RegiõesHidrográficas (ARH) e realizada por sua conta.

    A componente O corresponde à ocupação de terrenos ouplanos de água do domínio público hídrico do Estado,calculando-se através da aplicação de um valor de base à áreaocupada, expressa em metro quadrado. Nos termos doAnteprojecto, encontram-se isentas desta componente aocupação de terrenos ou planos de água em que estejamimplantados equipamentos ou infra-estruturas de apoio aactividades piscatórias tradicionais, nos casos em que essaocupação já exista à data de entrada em vigor do diploma emapreço e enquanto se mantenham aqueles fins. Do mesmomodo, encontram-se também isentas da sobredita componentea ocupação de terrenos por habitações próprias e permanentesde sujeitos passivos cujo agregado familiar não aufirarendimento bruto englobável para efeitos de IRS que ultrapasseo dobro do valor anual da retribuição mínima mensal, quandoessa ocupação já exista à data de entrada em vigor do diplomaa que se refere o Anteprojecto e enquanto se mantenhamaqueles fins.

    Por último, a componente U corresponde à utilização de águas sujeitasa planeamento público, qualquer que seja a sua natureza ou regimelegal, susceptível de causar impacte adverso significativo, sendocalculada pela aplicação de um valor de base ao volume de águacaptado, desviado, represado ou restituído após utilização, expressoem metro cúbico. Estão isentas desta componente a utilização de águasque seja realizada por meio de equipamentos de extracção cujapotência total não ultrapasse os 5cv, excepto quando a ARH respectivaou o instrumento de planeamento aplicável qualifique a captaçãocomo tendo impacte adverso negativo nos recursos hídricos.

    A análise das diversas componentes que constituem a base tributávelda TRH permite concluir, desde logo, que a referida taxa não serácobrada aos pequenos utilizadores dos recursos hídricos, mas apenase tão-somente aos utilizadores que promovam uma utilização dosrecursos hídricos que, pela sua dimensão e efeitos, estejam sujeitos atítulo de utilização. O legislador pretende, desta forma, penalizarapenas os utilizadores que causem um maior desgaste ambiental,poupando, ao mesmo tempo, os utilizadores que provocam custosambientais e administrativos menos significativos.

    Os valores de base aplicados no cálculo da TRH serão actualizadostodos os anos por aplicação do índice de preços no consumidor,publicados pelo Instituto Nacional de Estatística, sendo que o valor daTRH em vigor para cada ano será regularmente divulgado pelo Institutoda Água e pelas ARH.

    De acordo com o Anteprojecto, a matéria tributável da TRH serádeterminada com base nos valores máximos constantes dos títulos deutilização. Nos casos em que não seja possível proceder à determinaçãodirecta da matéria tributável, em virtude da falta de título de utilizaçãoou da violação dos seus termos, a liquidação da TRH deverá ser feitaoficiosamente por métodos indirectos, procedendo-se à estimativa dascomponentes que integram a sua base tributável com fundamento noselementos de facto e de direito que a ARH tenha ao seu dispor.

    A falta de pagamento atempado da TRH, cuja liquidação será dacompetência da ARH respectiva, constitui contra-ordenação punívelcom coima, cujo montante poderá variar entre 250,00 a 3.740,no caso de pessoas singulares e de 500,00 a 44.890,00, no casode pessoas colectivas. Nos casos em que a mora se prolongue pormais do que um semestre, a falta de pagamento da TRH poderá aindaimplicar a revogação do título de utilização, devendo esta ser sempreprecedida de aviso prévio ao utilizador.

    De modo a promover a introdução progressiva da TRH, em consonânciacom o disposto no artigo 80.º, n.º 2 da Lei da Água, o Anteprojectobeneficia todos aqueles que solicitem a emissão de títulos de utilizaçãode recursos hídricos no prazo de um ano após a entrada em vigor donovo regime da utilização dos recursos hídricos, concedendo umaredução de 50% na TRH a pagar no ano imediatamente subsequente.

    Em conformidade com os princípios basilares da Lei da Água, o regimeeconómico e financeiro dos recursos hídricos plasmado no Anteprojectovem ainda disciplinar os critérios que deverão presidir à fixação doregime tarifário a praticar pelas entidades que prestam os serviçospúblicos de águas (entendidos como todos os serviços prestados acasas de habitação, entidades públicas ou qualquer actividadeeconómica através de represamento, captação, armazenamento,tratamento, elevação, adução e distribuição de águas superficiais ousubterrâneas e de recolha, tratamento e rejeição de águas residuais),o qual será estabelecido em diploma específico, tal como a forma decálculo das tarifas e de facturação dos serviços em apreço.

    Assim, o Anteprojecto determina que o regime tarifário a estabelecerpelas empresas concessionárias dos serviços públicos de águas deveráacautelar a recuperação, em prazo razoável, do investimento iniciale de eventuais novos investimentos de expansão, modernização esubstituição das infra-estruturas e equipamentos necessários à prestaçãodos serviços de águas, assim como assegurar a manutenção, reparaçãoe renovação de todos os bens e equipamentos afectos ao serviço e opagamento de outros encargos obrigatórios, onde se inclui,nomeadamente a TRH e outras taxas devidas pelas entidades gestorasdos serviços ao Instituto Regulador de Águas e Resíduos (IRAR).

    Paralelamente, a fixação das tarifas em apreço deverá (i) assegurar aeficácia dos serviços num quadro de eficiência da utilização dos

  • recursos necessários e tendo em atenção a existência de receitasnão provenientes de tarifas; (ii) assegurar o equilíbrio económico-financeiro da concessão e uma adequada remuneração doscapitais próprios da concessionária, nos termos do respectivocontrato de concessão, e em cumprimento dos critérios definidosnas bases legais aplicáveis e das orientações definidas pelo IRAR;(iii) garantir a proporcionalidade entre a tarifa a pagar peloutilizador final e cada um dos serviços que lhe é prestado,preservando, simultaneamente, o acesso ao serviço dos utilizadoresdomésticos, considerando a sua condição sócio-económica, noque respeita a determinados consumos de água; (iv) incentivaruma eficiente utilização dos recursos hídricos; e, por último, (v)clarificar, sempre que necessário, as situações abrangidas pordiferenciação tarifária.

    Finalmente, o Anteprojecto vem regular os contratos-programarelativos a actividades de gestão de recursos hídricos que podemser celebrados entre a administração central e as autarquias locais,respectivas associações, empresas concessionárias, entidadesprivadas ou utilizações de utilizadores, os quais terão por objectoo apoio técnico ou financeiro à realização de diversosinvestimentos, tais como a introdução de novas tecnologiasdestinadas à maximização da eficiência na utilização da água eà diminuição do potencial contaminante de emissões poluentes,e a introdução de técnicas de auto-controlo e monitorização nautilização da água e na emissão de poluição sobre os recursoshídricos.

    Os referidos contratos poderão ainda incidir sobre a construçãode determinadas infra-estruturas, designadamente, a construçãode sistemas de abastecimento de água, de drenagem e tratamentode águas residuais e suas componentes, a construção de infra-estruturas hidráulicas, bem como sobre a execução de trabalhosde manutenção e recuperação das margens dos cursos de águae das galerias ripícolas.

    O apoio financeiro concedido pela administração central no âmbito doscontratos-programa traduz-se na participação dos respectivos custos deinvestimento, podendo ser concedido através da prestação de subsídios,concessão de crédito ou bonificação de juros. Já o apoio técnico poderátraduzir-se em diversas acções, tais como actividades de formação técnicae profissional, bem como na elaboração de estudos e pareceres, ou noacompanhamento e fiscalização de projectos.

    Nos termos do Anteprojecto, a celebração dos contratos-programa ficasujeita ao preenchimento de determinados requisitos que se encontramgenericamente previstos no Decreto-Lei n.º 384/87, de 24 de Dezembro,e do Decreto-Lei n.º 219/95, de 30 de Agosto, os quais disciplinam acelebração de contratos-programa de natureza sectorial ou plurissectorialentre a administração central e os municípios e freguesias, respectivasassociações e empresas concessionárias. Adicionalmente, as propostasde contratos-programa deverão ser acompanhadas de estudos quedemonstrem que os projectos em causa podem contribuir para aconcretização dos objectivos fixados nos instrumentos de planeamentodos recursos hídricos em vigor, sendo certo que tais contratos apenaspoderão ser celebrados por entidades que não tenham incorrido emincumprimento contratual grave na gestão de sistemas de abastecimentode água ou de drenagem e tratamento de águas residuais e que não seencontrem em situação de incumprimento para com as entidades gestorasdesses sistemas.

    Dada a importância que este diploma reveste na concretização daprincipal bandeira da Lei da Água a utilização sustentável dos recursoshídricos resta agora aguardar pela sua aprovação e, sobretudo, pelalegislação complementar que irá disciplinar alguns aspectos essenciaisdo regime económico e financeiro dos recursos hídricos sem os quaisdificilmente será possível determinar, com precisão, o impacto que oreferido normativo terá sobre os diversos agentes envolvidos, mormenteos sujeitos passivos da TRH.

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    Enfrentando a escassez da água, é o tema do Dia Mundial da Água, instituído pela Assembleia-Geralda ONU em Dezembro de 1992.