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AnoVII-nº14 Julho/ Dezembro 2013

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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano VII · Número 14 · Julho - Dezembro de 2013 1

Ano V II- nº 14Julho/

Dezembro2013

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Endereço para permuta:Rua Mal. José Inácio da Silva, 355 Passo D’Areia - Porto Alegre - RS

Tel: (51) 3361.6700 www.faculdade.dombosco.net

Porto Alegre, 2013

REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades Periódico da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre Ano VII - Nº 14 - Julho a Dezembro de 2013 Porto Alegre - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre.

ISSN 1809-5720

A REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades tem por finalidade a produção e a divulga-ção do conhecimento nas áreas das ciências aplicadas produzido particularmente pelo seu cor-po docente e colaboradores de outras instituições, com vistas a abrir espaço para o intercâmbio de ideias, fomentar a produção científica e ampliar a participação acadêmica na comunidade. O Conselho Editorial reserva-se o direito de não aceitar a publicação de matérias que não estejam de acordo com esses objetivos. Os autores são responsáveis pelas matérias assinadas.

É permitida a cópia (transcrição) desde que devidamente mencionada a fonte.

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Diretor/DirectorProf. Dr. Pe. Marcos Sandrini - [email protected]

Editor/EditorProf. Dr. Silvio Javier Battello Calderon - [email protected]

Comissão Editorial/Editorial BoardProfa. Dra. Andréa Souza Castro - [email protected]

Profa. Dra. Aurélia Adriana de Melo - [email protected]. Dr. Luís Fernando Fortes Garcia - [email protected]

Prof. Dr. Silvio Javier Battello Calderon - [email protected]

Comissão Científica/Scientific CommitteeProfa. Dra. Adriana Dreyzin de Klor (UNC/Córdoba, Argentina)

Profa. Dra. Angela Beatrice Dewes Moura (FDB/Porto Alegre, RS)Prof. Dr. Bachir Hallouche (UNISC/Santa Cruz do Sul, RS)

Prof. Dr. Carlos Garulo (IUS/Roma, Itália)Prof. Dr. Erneldo Schallenberger (UNIOESTE/Cascavel, PR)Prof. Dr. Fábio José Garcia dos Reis (UNISAL/Lorena, SP)

Prof. Dr. Friedrich Wilherm Herms (UERJ/Rio de Janeiro, RJ)Prof. Dr. Geraldo Lopes Crossetti (FDB/Porto Alegre, RS)Profa. Dra. Letícia da Silva Garcia (FDB/Porto Alegre, RS)

Pesq. Dr. Manoel de Araújo Sousa Jr. (INPE-CRS/Santa Maria, RS)Profa. Dra. Marisa Tsao (UNILASALLE/Canoas, RS)

Prof. Dr. Nelson Luiz Sambaqui Gruber (UFRGS/Porto Alegre, RS)Prof. Dr. Neuri Antonio Zanchet (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Dr. Osmar Gustavo Wöhl Coelho (UNISINOS/São Leopoldo, RS)Prof. Dr. Stefano Florissi (UFRGS/Porto Alegre, RS)

Pesq. Dra. Tania Maria Sausen (INPE-CRS/Santa Maria, RS)

Avaliadores ad-hoc/Ad-hoc reviewersProf. Ms. Aécio Cordeiro Neves (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Dr. Bruno Nubens Barbosa Miragem (FDB/Porto Alegre, RS)Pesq. Ms. Camila Cossetin Ferreira (INPE-CRS/Santa Maria, RS)

Prof. Dr. José Néri da Silveira (FDB/Porto Alegre, RS)Prof. Ms. José Nosvitz Pereira de Souza (FDB/Porto Alegre, RS)

Profa. Ms. Luciane Teresa Salvi (FDB/Porto Alegre, RS)Prof. Dr. Luís Carlos Dalla Rosa (FDB/Porto Alegre, RS)

Prof. Ms. Luiz Dal Molin (FDB/Porto Alegre, RS)Prof. Dr. Marcelo Schenk Duque (FDB/Porto Alegre, RS)Pof. Dr. Ricardo Alvarez (UM/Buenos Aires, Argentina)

Pesq. Ms. Silvia Midori Saito (INPE-CRS/Santa Maria, RS)Profa. Ms. Viviani Lopes Bastos (UCS/Caxias do Sul, RS)

Publicação e Organização/Organization and PublicationRevista Atitude - Construindo Oportunidades

Rua Mal. José Inácio da Silva, 355 – Porto Alegre – RS – BrasilCEP: 90.520-280 – Tel.: (51) 3361 6700 – e-mail: [email protected]

Produção Gráfica/Graphics Production Arte Brasil Publicidade

R. P. Domingos Giovanini, 165 – Pq. Taquaral – Campinas – SPCEP 13087-310 – Tel: (19) 3242.7922 – Fax: (19) 3242.7077

Revisão:Wesley Nunes

Os artigos e manifestações assinados correspondem, exclusivamente, às opiniões dos respectivos autores.

Revista Atitude - Construindo Oportunidades – Revista de Divulgação Científica da FaculdadeDom Bosco de Porto Alegre

Ano VII, Volume 6, número 14, jul-dez 2013 – ISSN 1809-5720

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1. Os Acordos de Basiléia e os perigos ocultos na avaliação do risco Soberano ....................09 Gustavo Vicente Sander

2. O Conteúdo do Direito Fundamental ao Contraditório e as Consequências de sua Violação no Processo Civil Alemão ...............................................................17 Klaus Cohen Koplin

3. Pejotização e a precarização das relações de emprego ..............................................25 Laura Machado de Oliveira

4. Montesquieu e o risco da igualdade extrema ..........................................................33 Lúcio Antônio Machado Almeida

5. La causa en la insinuación concursal del crédito... ...................................................37 Carlos E. López Rodríguez

6. Competências e habilidades adquiridas durante o curso de graduação em Administração De Empresas na percepção dos alunos formandos .................................45 Neuri A. Zanchet e Flavio Gabriel Paz Serpa

7. Consumerização: Aspectos de segurança, produtividade e fidelização ...........................55 Adriana Paula Zamin Scherer, Luis Fernando Fortes Garcia e Vítor Dorneles Pimentel

8. Fauna silvestre, entre prateleiras e traficantes .......................................................61 Carolina Brandt Gualdi

9. Participação popular em programas de coleta seletiva: aspectos indutores de sucessos e fracassos .............................................................69 Fernanda Bobsin Dai-Prá e Luciane Teresa Salvi

10. A subvenção de orgânicos no Brasil e na União Europeia sob a ótica da RBV ...........................................................................................79 Alexandre Melo Abicht, Alessandra Carla Ceolin, Paulo Rodrigo Pereira, Augusto Faria Corrêa e Tania Nunes da Silva

11. O processo de gestão dos polos de educação a distância ...........................................87 Eduardo Pertille Costa Leite

12. Relações de coautorias na revista eletrônica de administração: análises e perspectivas ......................................................................................99 Ariel Behr e Caterina Marta Groposo Pavão

Sumário

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Apresentação

A Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre já completou 10 anos de exitência. Foi em novembro de 2002 que recebemos nosso recredenciamento. Um processo longo, prazeroso e empenhativo foi feito para que isto se tornasse uma realidade. Nosso grande objetivo era e é ajudar as novas gerações a se posicionarem diante da vida como profissionais e cidadãos. Queremos ser fiéis à missão que nos foi deixada por Dom Bosco (1815-1888) de educar pessoas para serem “bons cristãos e honestos cidadãos”.

Começamos com três cursos: Administração, Ciências Contábeis e Sistemas de Informação. Logo a seguir se juntou a esses o curso de Engenharia Ambiental e Sanitária. Um pouquinho mais pra frente veio o curso de Direito. Todos estes cinco cursos já estão reconhecidos e já realizamos treze formaturas. O que era projeto se tornou realidade. Sonhar é bom e melhor ainda é ver que o sonho continua nas realizações.

A Revista Atitude já está em seu número 14. São sete anos de publicação ininterrupta. Somos capazes, sim, de construir uma revista indexada no Qualis. Professores, alunos, convidados estão pre-sentes em suas páginas com o grande objetivo de defender, promover e alavancar a vida, cada vida, em todas as suas dimensões. Este é o sentido de nossa presença no mundo da educação superior.

Nossa Faculdade conta hoje com um excelente grupo de mais de 70 (setenta) professores mestres e doutores, cerca de 20 (vinte) profissionais técnico-administrativos, e aproximadamente de 900 (novecentos) alunos que dão vida à instituição. Portanto, um milhar de pessoas promovendo-se e promovendo.

Fazemos parte de uma rede de Instituições de Educação Superior chamada IUS, ou seja, Instituições Universitárias Salesianas presente em quatro continentes com mais de 70 (setenta) insti-tuições. Todas com o mesmo objetivo, a mesma utopia, as mesmas metodologias, o mesmo desejo de encarnação no seu entorno. Como Dom Bosco, presentes na vida de milhares de jovens para apontar lhes caminhos para que construam oportunidades. Afinal, somos uma Faculdade de Atitude construindo oportunidades com os jovens universitários.

Agradecemos a todos os que escreveram seus artigos, relataram suas experiências, fizeram resenha de livros... A todos nosso respeito e nosso incentivo.

REVISTA ATITUDE - Construindo Oportunidades!

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Os Acordos de Basiléia e osperigos ocultos na avaliação

do risco Soberano.Gustavo Vicente Sander1

RESUMO O presente artigo aborda os critérios de classificação de risco previstos nos Acordos de Basiléia e demonstra que a classificação do risco da dívida interna soberana pode expor os credores a riscos de default que não são adequadamente levados em consi-deração pelo atual sistema de classificação.

PALAVRAS-CHAVE

Acordos de Basiléia, risco soberano, critérios de classificação, inadequação.

ABSTRACT

This paper addresses the risk-weighting criteria adopted by the Basel Agreements and shows that the risk-weighting of internal sovereign debt may expose creditors to risks of default, which are not adequately covered by those criteria. KEYWORDS

Basel Agreements, sovereign risk, risk-weighting criteria, inadequacy.

INTRODUÇÃO

Os chamados Acordos de Basiléia são um conjunto de recomendações e padrões de avaliação e de supervisão do sistema bancário, editados pelo Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia, com o objetivo de formar um arcabouço regulatório comum para os sistemas bancários dos países integrantes do Comitê. Estes acordos foram implementados originalmente a partir de 1988 (os Acordos de Basiléia I), profundamente revisados e alterados em 2004 (os Acordos de Basiléia II) e desde 2011 existe uma nova revisão que se encontra em fase inicial de implementação (os Acordos de Basiléia III).

Dentre os objetivos centrais destes acordos, está a criação de um quadro institucional capaz de assegurar a solvência e a estabilidade dos sistemas bancários dos Estados signatários. Note-se que não se trata de um objetivo qualquer, pois nas economias contemporâneas, cujo funcionamento ampa-ra-se na emissão de moeda fiduciária e na ampla disponibilidade de crédito, a garantia de solvência e a consequente confiabilidade nos bancos é essencial não apenas para o estabelecimento de condições gerais propícias ao desenvolvimento da dimensão econômica da pessoa humana, mas para a própria existência da economia de mercado tal como a conhecemos2.

(1) Doutor em Direito, Professor de Direito Econômico na Uniritter e de Direito Constitucional da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre.(2) Vale a pena lembrar a observação feita por MISSES, que destaca a importância central do fator confiança ao analisar a utilização da moeda fiduciária e de notas bancárias como veículos das relações de troca na economia: “Claims to a definite amount of money, payable and redeem-able on demand, against a debtor whose solvency and willingness to pay there does not prevail the slightest doubt, render to the individual all the services money can render, provided that all parties with whom he could possibly transact business are perfectly familiar with these essential qualities of the claim concerned: daily maturity as well as undoubted solvency and willingness to pay on the part of the debtor”. MISSES, Ludwig von. Human Action – A Treatise on Economics. Indianapolis: Liberty Fund, 2007. Vol. II, p. 432.

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Há três pilares de sustentação do sistema regulatório preconizado pelos Acordos de Basiléia: I) a exigência de requisitos mínimos de capital no sistema bancário; II) a definição de critérios uniformes de supervisão e gestão do sistema bancário e III) a ampliação na transparência e melhorias na gestão de risco dos bancos, que o Comitê denomina de disciplina de mercado. Este trabalho tem como objeto a análise de um problema que afeta o primeiro destes pilares: a classificação do risco de crédito das dívidas emitidas por Estados Soberanos, que normalmente compõe uma parcela substancial dos ativos de grandes bancos.

A primeira parte deste trabalho explicitará as recomendações do Comitê quanto às modalida-des de classificação do chamado risco soberano, com ênfase na divisão entre os critérios de avaliação do risco atrelado à divida soberana de países estrangeiros (dívida externa) e da dívida soberana inter-na, ou seja, aquela denominada em moeda local e tomada na carteira de ativos dos bancos sediados no próprio país emissor (dívida interna). A segunda parte do trabalho apontará o que considero riscos implícitos na abordagem metodológica escolhida para a classificação do risco soberano da dívida in-terna, que expõe o sistema bancário à possibilidade de uma crise de insolvência sistêmica em caso de default desta dívida.

1. O CÁLCULO DOS REQUISITOS MÍNIMOS DE ADEQUAÇÃO DE CAPITAL

O Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia propõe requisitos mínimos de solvência a serem observados pelos bancos. O mais importante destes requisitos é o chamado Índice de Capital (também conhecido como “Índice de Basiléia”), cujo princípio orientador é o de que uma entidade bancaria deve possuir capital suficiente para cobrir os riscos de crédito, operacional e de mercado a que está exposta3.

Assim, propõe-se que o cálculo do Índice de Capital tome como parâmetros a definição de ca-pital de referência (regulatory capital) e os ativos ponderados pelo risco – APR - (risk-weighted assets), em uma fórmula bastante simples:

Nos termos do Acordo de Basiléia II, o Índice de Capital deve ser de no mínimo 8% para que um banco seja considerado solvente, e a este mínimo, os acordos de Basiléia III adicionam uma reserva de conservação de capital (conservation buffer) e uma reserva contracíclica (countercyclical buffer) que elevam o Índice de Capital para um mínimo situado entre 10,5% e 13%4.

1.1. A formação do Capital de Referência

De acordo com as regras ainda em vigor, o capital de referência deve ser divido em três níveis (Tier I, Tier II e Tier III)5, de acordo com a solidez e a segurança dos instrumentos que o compõem: o capital básico, que está prontamente disponível para absorver perdas e que não está sujeito à volati-lidade deve ser considerado como Tier I; o capital suplementar, mais flexível e sujeito a alguma vola-tilidade, deve ser considerado como Tier II e o capital destinado a cobrir parte dos riscos de mercado e veiculado por instrumentos de curto prazo deve ser classificado como Tier III. Concretamente, os Acordos de Basiléia II indicam a seguinte metodologia de classificação do capital bancário6:

3 Basel II: International Convergence of Capital Measurement and Capital Standards: A Revised Framework. Bank for International Settlements. Basel, 2004. p. 12. 4 Basel III: A global regulatory framework for more resilient banks and banking systems. Basel Commitee on Banking Supervision. Basel, 2011. p. 5 e 6. 5 Esclareça-se que o capital Tier III foi abolido por Basiléia III, cuja implementação será feita em estágios a partir de 2013 e deve ser concluída apenas em 2023. No restante deste trabalho, utilizarei os parâmetros de formação do Capital de Referência em vigor no momento em que escrevo, quais sejam, aqueles previstos em Basiléia II. 6 Basel II: International Convergence of Capital Measurement and Capital Standards: A Revised Framework. Op. cit. p. 14 a 16.

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Tier I Tier II Tier IIIPatrimônio dosacionistas Reservas de Reavaliação Obrigações de Curto Prazo.

Lucros retidos Provisões Gerais

Instrumentos híbridos dedívida e capital

Dívida subordinada

1.2 A ponderação de risco dos ativos bancários

O Capital de Referência formado de acordo com os parâmetros acima apontados nos indica o denominador na fórmula de cálculo do Índice de Capital, já o divisor será indicado pela ponderação de risco dos ativos bancários. Os Acordos de Basiléia I e II estabelecem uma sistemática de ponderação de risco de crédito relativamente complexa, dada a necessidade de abarcar as mais diversas espécies de crédito, tais como:

a) Operações de crédito ordinárias (crédito para entidades soberanas, empresas, pesso-as físicas, outros bancos, etc.);

b) Operações de crédito nos mercados de balcão (OTC);

c) Operações de swap, de recompra (repo agreements) e que envolvem instrumentos derivativos;

d) Operações off-balance sheet.

Os riscos de crédito podem ser avaliados, a grosso modo, com base em dois conjuntos de cri-térios, cabendo a cada banco decidir qual deles será utilizado, sempre que a possibilidade de escolha for dada pelo respectivo Banco Central nacional (que pode impor uma ou outra metodologia).

A primeira possibilidade é a de utilizar a metodologia padronizada, (também chamada de ECAI, em referência à External Credit Assessment Institution), no qual uma agência de classificação de risco, tal como a Moody’s ou a Standard & Poor’s, fornece os ratings de crédito dos diversos instrumen-tos que integram o ativo do banco, cabendo ao banco aplicar o fator de ponderação de risco vinculada ao respectivo rating. A segunda possibilidade é utilizar a metodologia IRB (Internal Ratings-Based) na qual o próprio banco avalia o risco de crédito de seus ativos e insere os parâmetros de avaliação em uma fórmula fornecida pelo Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia, daí derivando a ponderação de risco para cada classe de ativo.

Ativo ValorTítulos Públicos Federais $ 3000,00

Operações de Câmbio $ 900,00

Operações de Crédito Privado $ 840,00

Total $ 4.740,00

1.3 Um exemplo concreto de cálculo do Índice de Capital

A fim de ilustrar com simplicidade o mecanismo de cálculo do Índice de Capital, apresentamos o seguinte exemplo fictício: o Banco X possui um Capital de Referência equivalente a 100 unidades monetárias quaisquer ($) e uma carteira de ativos concentrada em operações de créditos ordinárias, consolidada na tabela abaixo:

Aplicando-se os fatores de ponderação de risco pertinentes, teríamos os seguintes valores dos Ativos Ponderados pelo Risco:

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Ativo Valor Risco APRTítulos Públicos Federais $ 3000,00 0 $ 0

Operações de Câmbio $ 900,00 0,4 $ 360,00

Operações de Crédito Privado $ 840,00 1 $ 840,00

Total $ 4.740,00 $ 1.200,00

Partindo-se da tabela acima, a última etapa do cálculo consiste em dividir o patrimônio de referência do banco pelo APR:

Nota-se que no exemplo apresentado, o Banco X pode ser considerado um banco solvente, uma vez que o seu Índice de Capital está acima do mínimo exigido por Basiléia II.

2. AVALIAÇÃO DO RISCO SOBERANO NOS ACORDOS DE BASILÉIA

O Acordo de Basiléia II prevê que a dívida soberana de uma nação seja ponderada pelo risco de acordo com o rating de crédito atribuído ao país emissor por agências internacionais de avaliação de risco (metodologia padronizada) ou de acordo com o sistema IRB. Na primeira hipótese, o próprio Comitê de Supervisão Bancária exemplifica esta metodologia, utilizando os critérios de avaliação da agência Standard & Poor’s7:

Avaliação de Crédito AAA a AA- A+ a A- BBB+ a BBB- BB+ a BB- Abaixo de B- Sem Avaliação

Ponderação de Risco 0% 20% 50% 100% 150% 100%

Percebe-se que quanto mais elevado o risco de inadimplência (default) de um país, maior será o fator de ponderação aplicado ao crédito concedido a este país. Isto tem conseqüências sérias para os bancos que concedem o crédito e incorporam o instrumento de dívida (títulos do tesouro, bônus, bonds, etc.) em sua carteira de ativos: quanto mais alto o fator de ponderação, maior será o valor do divisor na equação de cálculo do Índice de Capital e, portanto, maior será a necessidade de manter elevadas as reservas de Capital de Referência para preservar a solvência. Note-se que a metodologia IRB tende a produzir resultados semelhantes ao método padronizado no que toca aos fatores de ponde-ração de risco da dívida soberana. Em geral, ambas as metodologia resultam em uma baixa exigência de capital para cobrir eventual inadimplência dessa classe de ativos, o que encoraja os bancos a con-centrar suas carteiras de ativos em instrumentos de dívida soberana8.

De qualquer sorte, as metodologias de avaliação do risco de crédito de dívida externa sobe-rana estão amparadas em um princípio fundamental que desde o início norteia o primeiro pilar dos Acordos de Basiléia, qual seja, o de que quanto maiores os riscos de crédito em que um banco incorre, maior deve ser a base de capital disponível para absorver eventuais perdas9. Esse princípio, todavia, pode ser excepcionado pelas autoridades regulatórias locais, em relação à dívida soberana denomina-da em moeda local, absorvida pelos bancos sediados no próprio país emissor (dívida interna). É o que se lê no parágrafo 54 do Acordo de Basiléia II10:

(7) Basel II: International Convergence of Capital Measurement and Capital Standards: A Revised Framework. Bank for International Settlements. Basel, 2004. p. 19(8) NOUY, Danièle. Is sovereign risk properly addressed by financial regulation? Banque de France – Financial Stability Review. no 16. Paris, France. 2012. p. 96.(9) Com efeito, uma das mais importantes inovações regulatórias promovidas pelo Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia foi justamente atrelar o modelo de adequação do capital aos riscos das operações de crédito. Cf. ONO, Fabio Hideky. O Acordo de Basiléia, a Adequação de Capital e a Implementação nos Sistema Bancário Brasileiro. Unicamp: Campinas, 2002. p. 09/10. (10) “54. At national discretion, a lower risk weight may be applied to banks’ exposures to their sovereign (or central bank) of incorporation denominated in domestic currency and funded in that currency. Where this discretion is exercised, other national supervisory authorities may also permit their banks to apply the same risk weight to domestic currency exposures to this sovereign (or central bank) funded in that currency.”

I .C.100

= =1200

8,3%

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“À discricionariedade de cada país, uma menor ponderação de risco pode ser aplicada à exposição dos bancos à sua dívida soberana (ou do Banco Central) cujo instrumento seja denominado e financiado em moeda local. Onde esta discricionariedade for exercida, outras autoridades supervisoras nacionais podem também permitir aos bancos a aplicação do mesmo fator de ponderação de risco à exposição em moeda local a esta dívida soberana (ou do Banco Central) financiada em moeda local.” (tradução nossa).

Em essência, o permissivo acima transcrito permite que os bancos de determinado país in-corporem a dívida soberana denominada em moeda local aplicando um fator de ponderação de risco menor do que aquele aplicado à dívida soberana desse mesmo país denominada em moeda estrangeira, desde que a autoridade regulatória local assim disponha (o que normalmente ocorre). Note-se, ainda, que as autoridades regulatórias tendem a diminuir a 0% a ponderação de risco da dívida soberana em moeda local11, considerando-a, para todos os efeitos práticos, como dívida de risco zero, independente da avaliação de crédito internacional do país (o rating da dívida soberana externa).

Observando o conjunto dos critérios de ponderação de risco recomentados por Basiléia II, não é difícil concluir que a dívida soberana é a categoria de ativo bancário com a mais generosa pondera-ção de risco. Essa afirmação é válida não só em relação à dívida soberana interna, pois os critérios de classificação de risco da dívida soberana externa também a colocam (potencialmente) entre os ativos com menor ponderação de risco que um banco pode possuir.

Não há dúvida que tal generosidade na ponderação do risco soberano encoraja os bancos a concentrar desproporcionalmente sua carteira de ativos em títulos de dívida soberana (e não há sinais de que Basiléia III reverta esse encorajamento)12, expondo, conseqüentemente, o sistema bancário à uma crise sistêmica de insolvência caso um grande emissor de dívida soberana torne-se inadimplente.

3. UMA PERSPECTIVA REALISTA DO RISCO SOBERANO

Os Acordos de Basiléia claramente partem de uma perspectiva bastante otimista quanto aos riscos de inadimplência dos Estados Soberanos. Neste sentido, chama especialmente a atenção que os Bancos Centrais nacionais possam considerar os instrumentos da dívida soberana interna como de risco zero (à prova de inadimplência).

Tal otimismo está amparado em uma crença na qual se assume “a priori” que é baixa ou nula a probabilidade de um Estado Soberano deixar de honrar seus compromissos financeiros, uma vez que possui à sua disposição (a) o poder de coerção necessário para a extração de riqueza por via tributária e (b) a capacidade de imprimir toda a moeda necessária para honrar seus compromissos (precisamente daí vem a justificativa para classificar a dívida interna como “risco zero”, pois, in extremis, cria-se moeda nova para honrá-la).

Ocorre que esse otimismo infelizmente não encontra amparo na realidade concreta. Um exa-me histórico das ocasiões em que Estados Soberanos deixaram de honrar compromissos de dívida com seus credores internos ou externos contradiz frontalmente o otimismo das premissas que fundamen-tam os Acordos de Basiléia neste particular. É o que demonstra a ampla e conhecida pesquisa empírica elaborada por REINHART & ROGOFF, que me serve de fonte para a compilação das tabelas abaixo13, nas quais indico a incidência de default da dívida soberana interna e externa de alguns países Latino Americanos e também de economias avançadas, para que não se pense que a inadimplência é uma prática restrita às economias em desenvolvimento.

(11) NOUY, Danièle. Is sovereign risk properly addressed by financial regulation? cit. p. 96.(12) “As the Level 2 regulation has not been adopted, it is still not yet possible to formally describe what will be the treatment for Member States’ sovereign bonds in the standard formula, but at this stage it is however possible to indicate that so far the project has always been to exempt the Member States’ sovereign bonds from any capital charge stemming from either “spread risk” or “concentration risk. (...) This exemption is a clear encouragement to invest in sovereign bonds issued by Member States.”NOUY, Danièle. Is sovereign risk properly addressed by financial regulation? Cit. p. 100.(13) REINHART, Carmen M. et ROGOFF, Kenneth S. This Time is Different: Eight Centuries of Financial Folly. Princeton: Princeton University Press, 2009. passim.

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3.1 Episódios de default da dívida interna

A inadimplência da dívida interna pode assumir as mais variada formas e, de fato, REINHART & ROGOFF apontam uma infinidade de mecanismos que podem ser utilizados como veículo para um default de dívida soberana interna, dentre eles, (a) a conversão forçada em títulos com taxas de juros mais baixas, (b) reduções unilaterais do valor do principal e (c) suspensão de pagamentos14.

Note-se que os referidos autores não incluem como hipótese de inadimplência o pagamento da dívida interna com moeda desvalorizada (o conhecido processo de inflacionar a moeda para “resol-ver” problemas de excessivo endividamento público), ainda que o efeito prático dessa medida para os credores não seja muito diferente de um default explícito. Os autores identificaram mais de 70 casos de inadimplência da dívida soberana interna, contados desde o ano de 1800 ou desde a fundação do país em default, dentre os quais destacamos:

País Número AnoArgentina 4 1890, 1982, 1989, 2002

Brasil 2 1986, 1990Peru 3 1850, 1931,1985

Uruguai 1 1932Dinamarca 1 1813

Estados Unidos 2 1790,1933Reino Unido 5 1749, 1822, 1834, 1888, 1932

3.2 Episódios de default da dívida externa.

Os dados de inadimplência da dívida interna certamente não nos mostram um quadro dos mais otimistas, todavia, são ainda modestos diante da inadimplência da dívida externa. Com efeito, os calotes externos são bem mais comuns e frequentes, dentre outra razões, porque em ocasiões de aperto financeiro é mais fácil deixar de pagar os credores externos do que os internos, especialmente quando se consideram as consequências políticas de um default.

Os episódios de default da dívida externa englobam a suspensão total ou parcial dos paga-mentos e tecnicamente diferem da repactuação, pois nesta última há uma alteração mais ou menos voluntária das taxas de juros e prazos de vencimento da dívida. Note-se que REINHART & ROGOFF con-sideram a repactuação como uma espécie de default parcial e voluntário (por parte dos credores), uma vez que os seus efeitos práticos não são muito diferentes daqueles de um default no sentido estrito do termo15. Assim, os autores listaram mais de 250 episódios de inadimplência ou repactuação de dívida externa desde o ano de 1800, dentre as quais destacamos:

País Defaults eRepactuações Ano

Argentina 7 1827,1890, 1951, 1956, 1982, 1989, 2001Brasil 8 1898, 1902, 1914, 1931,1937, 1961, 1964, 1983Peru 6 1826, 1876, 1931, 1969, 1976, 1878

Uruguai 8 1876, 1891, 1915, 1933, 1983, 1987, 1990, 1993 Dinamarca 0 -

Estados Unidos 0 -Reino Unido 0 -

CONCLUSÃO

Os dados apontados pela pesquisa de REINHART & ROGOFF desmentem a noção corriqueira de que títulos da dívida soberana são ativos de “risco zero”. Na verdade, antes mesmo da publicação desta pesquisa, qualquer observador da história financeira global dos séculos XIX e XX já a descontaria como demasiado otimista para embasar qualquer decisão séria de investimento. (14) REINHART, Carmen M. et ROGOFF, Kenneth S. This Time is Different: Eight Centuries of Financial Folly. cit. p. 111. (15) REINHART, Carmen M. et ROGOFF, Kenneth S. This Time is Different: Eight Centuries of Financial Folly. cit. p. 90.

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De fato, é o que fazem os credores ao exigir o pagamento de juros mais elevados quando da oferta de crédito à nações com um reconhecido histórico de inadimplência de sua dívida externa. Ademais, ainda que os critérios adotados por Basiléia sejam bastante generosos quanto à ponderação do risco soberano, é fato que tendem a impor um mínimo de disciplina aos credores que tomam esta modalidade de dívida.

A situação torna-se mais complicada e perigosa, todavia, quando se trata da dívida interna, pois sua classificação como “risco zero” pela maioria das autoridades regulatórias nacionais torna extremamente atrativa para os bancos (para não dizer irresistível) a perspectiva de financiar o endivi-damento público muito além dos limites prudenciais, tanto sob a ótica de concentração desta espécie de dívida na carteira de ativos, quanto sob a perspectiva de continuada solvência do devedor. Diante deste quadro, uma eventual inadimplência da dívida soberana interna praticamente assegura uma crise de insolvência no sistema bancário do país em default, com todas as conhecidas conseqüências adversas no plano macroeconômico e no plano microeconômico (especialmente sobre os poupadores que confiaram seus recursos aos bancos), para não mencionar as consequências políticas.

A frequência com que Estados Soberanos repudiaram suas obrigações financeiras ao longo dos últimos dois séculos torna claro que a normativa prevista no §54 do Acordo de Basiléia II, não pode ser considerada mais do que uma ficção juris et de jure, convenientemente inserida nos Acordos para que, dentre outros, os Bancos Centrais nacionais tenham a possibilidade de assegurar uma demanda interna praticamente inesgotável para as emissões da dívida pública soberana16, assumindo, em contrapartida, o risco de gerar uma crise sistêmica nativa no sistema bancário.

Parece evidente que esta brecha contraria os próprios fins gerais almejados pelos Tratados de Basiléia, uma vez que abre as portas para seríssimas crises sistêmicas, da espécie que costuma deses-tabilizar de forma profunda e duradoura a economia de um país e impor um longo e penoso caminho de recuperação à sua população.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Basel II: International Convergence of Capital Measurement and Capital Standards: A Revised Framework. Bank for International Settlements. Basel, 2004.

Basel III: A global regulatory framework for more resilient banks and banking systems. Basel Commitee on Banking Supervision. Basel, 2011.

ONO, Fabio Hideky. O Acordo de Basiléia, a Adequação de Capital e a Implementação nos Sis-tema Bancário Brasileiro. Unicamp: Campinas, 2002.

MISSES, Ludwig von. Human Action – A Treatise on Economics. Indianapolis: Liberty Fund, 2007.

NOUY, Danièle. Is sovereign risk properly addressed by financial regulation? Banque de France – Financial Stability Review. no 16. Paris, France. 2012.

REINHART, Carmen M. et ROGOFF, Kenneth S. This Time is Different: Eight Centuries of Finan-cial Folly. Princeton: Princeton University Press, 2009.

RÖPKE, Wilhelm. A Humane Economy. Isis Books: Delawere,1998.

(16) Note-se que em quase todas as democracias avançadas inspiradas no sistema do Welfare State, a oferta de dívida pública soberana tende a ser igualmente elevada, dadas as enormes necessidades financeiras geradas pelo gasto público inerente a este modelo. Além disso, deve-se também considerar os desperdícios gerados pela concentração de poder econômico nas mãos do Governo, cujos gastos são inevitavelmente influenciado por interesses de partidos, fações e paixões demagógicas, como muito bem apontou Röpke já nos anos sessenta do século passado: “A demagogia e os grupos de pressão transformaram a política na arte de encontrar os caminhos de menor resistência e de imediato proveito próprio ou em um instrumento para canalizar o dinheiro dos outros para o próprio grupo de interesse”. RÖPKE, Wilhelm. A Humane Economy. Isis Books: Delawere,1998. p.142.

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O Conteúdo do Direito Fundamental ao Contraditório e as Consequências

de sua Violação no ProcessoCivil Alemão1

Klaus Cohen Koplin2

Resumo

O presente artigo busca identificar o conteúdo fundamental e as consequências da violação do direito fundamental ao contraditório no processo civil alemão. O obje-tivo do texto é contribuir como subsídio para a melhor compreensão desse direito fundamental no contexto brasileiro. Inicialmente, tratar-se-á do conteúdo essencial do direito ao contraditório, abrangendo os direitos à informação, a à manifestação e à consideração, bem como de aspectos correlatos. Logo após, serão abordadas consequências da violação do direito fundamental ao contraditório e os meios pro-cessuais destinados a sanar tais consequências. Ao final, seguir-se-ão as principais conclusões alcançadas.

Palavras-chave

Constituição. Princípio do contraditório. Direito alemão.

Abstract

This article seeks to identify the essence of the adversarial principle (enshrined in the article 103, I of the German Basic Law, which establishes the right to a hearing in accordance with law) and the consequences of its violation in German civil pro-cedure. The objective of this paper is to contribute for better understanding of that fundamental right in the Brazilian context. Initially, the paper examines the essential content of the adversarial principle, including the rights to information, expression and consideration. Soon after, the text analyses the consequences of violation of the adversarial principle and the procedural means to remedy them. Finally, the article presents the main findings of the research.

Keywords

Constitution. Adversarial principle. German law.

1. Introdução

O presente artigo procura analisar o princípio do contraditório na experiência do direito ale-mão, identificando-se seu conteúdo e as consequências de sua violação. (1) Artigo originado de projeto institucional de pesquisa docente, desenvolvido no Curso de graduação em Direito do Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter), campus de Porto Alegre, durante o ano de 2013, no contexto do Grupo de Pesquisa “Direitos humanos e fundamentais: eficácia e fundamentação”.(2) Bacharel e Doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor de direito processual civil na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, na Faculdade de Direito da UFRGS, e no Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter). Advogado. E-mail: [email protected].

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Para tanto, buscar-se-á identificar, em primeiro lugar o conteúdo essencial do direito fun-damental ao contraditório, a partir do exame da Lei Fundamental alemã e sua interpretação juris-prudencial e doutrinária. Em segundo lugar, serão estudadas as consequências da violação do direito fundamental ao contraditório por parte do juiz, enfocando-se, em especial, o estudo dos mecanismos processuais destinados a repará-las. Finalmente, seguir-se-á uma apresentação das principais conclu-sões obtidas.

2. Conteúdo do direito fundamental ao contraditório

No sistema alemão, o direito fundamental ao contraditório está consagrado no art. 103, I da Lei Fundamental alemã (23.05.1949), o qual estabelece que “em juízo, todos têm pretensão à audi-ência jurídica” (“Vor Gericht hat jedermann Anspruch auf rechtliches Gehör”). Desde a sua instalação, coube ao Tribunal Constitucional Federal (‘Bundesverfassungsgericht’) disciplinar de forma pormeno-rizada as questões atinentes a esse direito, explicitando o seu conteúdo e os seus limites a partir do dispositivo constitucional em questão.3

A doutrina alemã determinou, com base na jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal, que o direito ao contraditório envolve três momentos essenciais: a informação, a manifestação e a consideração.

2.1 Informação

Em primeiro lugar, o direito fundamental ao contraditório pressupõe necessariamente que seus legitimados tenham direito a ser informados a respeito de tudo o que se passa no processo. A ga-rantia em tela desdobra-se, pois, em primeiro lugar, em direito a informação. Os autores germânicos se referem geralmente ao seu lado passivo, ou seja, ao dever de informar (‘Informationspflicht’ 4), que se concentra na figura do juiz. Portanto, é ao órgão judicial que compete, em primeira linha, o exercício desse dever.5

Existe um conteúdo mínimo a ser informado. Aponta-se, nesse sentido, a necessidade de infor-mar a respeito do conteúdo do processo (‘Prozeßstoff’), incluindo-se nele as alegações, visões fáticas e jurídicas. Igualmente, todas as questões processuais (v. g., propositura da demanda, movimentação processual, provas, petições em geral) devem ser informadas. Ressalta-se, por oportuno, que a infor-mação não apenas se estende aos atos praticados pelas partes, mas também os do juiz e dos demais participantes do processo.

Para viabilizar o direito à informação, faz-se necessária a previsão de meios de comunicação e de conhecimento dos atos processuais.6 De todos os atos de informação, o que maior importância teó-rica e prática tem recebido, através da tradição, fora de dúvida, a citação.7 Destaca-se, quanto a isso, a preocupação da jurisprudência alemã com a citação por edital (‘öffentliche Zustellung’), devido ao seu caráter eminentemente ficto.8 Gize-se, por fim, no que se refere aos atos judiciais, a necessidade de que todos os de conteúdo decisório – e não apenas os atos recorríveis ou as sentenças – devem ser comunicados às partes.9

Além disso, destaca-se, na Alemanha, a importância da vista dos autos do processo (‘Akte-neinsicht’) como elemento fundamental da ideia de contraditório, sendo deduzido diretamente do art. 103, I da Lei Fundamental (‘verfassungsrechtliche Akteneinsichtsrecht’).10 O direito em tela abrange conhecimento assim dos atos do juiz e das partes como dos atos dos demais auxiliares do juízo (oficiais e peritos, por exemplo).11 (3) FERDINAND KOPP, Das rechtliche Gehör in der Rechtsprechung des Bundesver fassungsgerichts, Archiv des öffentlichen Rechts, 106(1981):604-632, esp. p. 604.(4) Wolfram Waldner prefere a expressão “Recht auf Orientierung” (direito à orientação), tomada do direito suíço (WOLFRAM WALDNER, Der Anspruch auf rechtliches Gehör, 2. Aufl., Köln: Otto Schmidt, 2000, p. 13).(5) DIETER LEIPOLD, Der Anspruch auf rechtliches Gehör, In: STEIN; JONAS, Kommentar zur Zivilprozeßordnung, Tübingen: J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), Bd. 2, 1993, RN 41. (6) PHILIP KUNIG, Grundgesetz-Kommentar, München: C. H. Beck, 1996, Bd. 3, Rn 12.(7) Os jusnaturalistas, tanto os tomistas, quanto os racionalistas, baseavam o contraditório fundamentalmente na citação. Os primeiros a viam como instituição divina, existente já no Paraíso; cf. HINRICH RüPING, Der Grundsatz des rechtlichen Gehörs und seine Bedeutung im Strafverfahren, Berlin: Duncker & Humblot, 1976, pp. 16-18. Os segundos, entre os quais se alinha Pufendorf, a tinham como imperativo da razão; cf. KNUT WOLFGANG NÖRR, Naturrecht und Zivilprozeß, Tübingen: J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), 1976, pp. 6-7. (8) E que deve ter possibilidades reais de ser conhecida pelo interessado. Cf. EBERHARD SCHMIDT-AßMANN, Spezialschriftum zu Art. 103 Abs. I, In: MAUNZ; DüRIG, Grundgesetz Kommentar, München: C. H. Beck, 1997, RN 72.(9) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 73.(10) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 74.(11) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 75.

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Por fim, a doutrina e jurisprudência alemãs destacam existir um dever de advertência por parte do juiz (‘Hinweispflicht’), que se traduz como verdadeiro direito subjetivo das partes. Consiste essa garantia, de forma concreta, no dever de o juiz chamar a atenção das partes para os rumos preju-diciais ao contraditório, em cuja direção suas alegações se dirigem.12 Essa advertência pode se referir a pontos de fato ou de direito; de mérito ou a respeito dos aspectos processuais da causa.

Verifica-se, por conseguinte, o esforço para tornar o contraditório garantia efetiva, com o consequente incremento dos poderes judiciais.13 Gize-se, entretanto, que tal garantia deve ser com-preendida em conjunto com os caracteres gerais do processo civil, dentro de cujos pilares está o sentido de autorresponsabilidade das partes, elemento essencial para que o juiz não se transforme em advogado ou mero conselheiro do autor ou do réu.

2.2 Manifestação

O segundo aspecto do contraditório (que pressupõe seja atendido o primeiro) consiste no di-reito de manifestação. Por meio de tal dimensão, as partes assumem o papel de verdadeiros sujeitos ativos do processo (‘Verfahrenssubjekte’).14 Estruturalmente, consoante a lição de Wolfram Waldner, o direito de manifestação abrange um componente agressivo e um componente repressivo.15

O primeiro componente significa que o titular da garantia tem o direito de formular proposi-ções, realizar alegações e de efetuar o impulso processual, através do exercício dos direitos, poderes e ônus que lhe são conferidos.16

Inicialmente, observa-se que a garantia do contraditório assegura a oportunidade de mani-festação. Não se pode deduzir do art. 103, I da Lei Fundamental nenhum dever de manifestação para o seu titular. Os casos em que isso ocorre situam-se fora dos limites da garantia em tela.17 Por conse-guinte, manifestar-se, ou não, é decisão da parte; o processo, por seu turno, consagra e respeita essa liberdade. Cabe unicamente a ela decidir a respeito da respectiva oportunidade e conteúdo.

Não há nenhuma garantia constitucional específica no que diz respeito à forma, escrita ou oral, simples ou solene, que esta manifestação terá de obedecer. O princípio da oralidade, como res-salta Schmidt-Aßmann, não tem assento constitucional.18 A manifestação, como qualquer ato proces-sual, pressupõe, como regra, a capacidade postulatória, o que implica na necessidade de que a mesma seja realizada por intermédio de advogado, a não ser que o manifestante seja habilitado para tanto (advogado atuando em causa própria, promotor de justiça, procurador de entidade estatal).

A garantia em discussão abrange manifestações sobre fatos, provas e sobre situações jurídi-cas. Estende-se sobre questões de fundo e também sobre questões processuais.19

No que respeita ao momento temporal em que haverá de ter lugar a manifestação, existe a regra de que a mesma deve ser prévia à formação da decisão judicial (princípio da anterioridade – ‘Vorherigkeitsgrundsatz’)20. Mas não somente isso. A garantia em tela postula, quanto às partes, que as mesmas disponham do tempo necessário para a tomada de conhecimento a respeito de um determi-nado ponto processual, para a reflexão a seu respeito, e para a formação, conclusão e apresentação, enfim, da sua manifestação. O juiz deve, assim, aguardar um mínimo de tempo (fixado na lei ou por sua própria disposição21) antes de decidir.

Os casos em que a manifestação é diferida para momento posterior à decisão judicial são tratados pela prática alemã como exceção ao princípio da anterioridade.22 Bem entendido, exceção ao princípio da anterioridade, e não ao princípio do contraditório em si. De qualquer forma, tais si-tuações, quando admitidas pelo legislador ordinário atendem a determinadas necessidades jurídicas bastante especiais e submetem-se a requisitos bastante rígidos.

O segundo componente que integra a garantia em tela impõe ao juiz o dever de fundamentar sua decisão apenas sobre os pontos de fato e de direito a cujo respeito as partes tenham podido se manifestar.23 (12) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 76; LEIPOLD, op. cit., RN 41. (13) LEIPOLD, op. cit., RN 41: “Dem Zweck, die möglichst effektive Nutzung des Rechts auf Gehör zu ermöglichen”.(14) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 80.(15) WALDNER, op. cit., RN 54.(16) WALDNER, op. cit., RN 54. (17 ) SCHMIDT-ASSMANN, op. cit., RN 81.(18) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 84.(19) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 85.(20 ) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 92.(21) SCHMIDT-AßMANN. op. cit., RN 90. A questão deve ser entendida a partir do sistema processual alemão, em que a questão da fixação dos prazos pelo juiz (prazos judiciais) assume maior importância do que a que recebe no sistema processual civil brasileiro. (22) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 93. (23) WALDNER, op. cit., RN 54.

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2.3 Consideração

Além da informação e da manifestação, o direito ao contraditório desdobra-se em uma tercei-ra e necessária etapa: a consideração daquilo que foi manifestado. Por conseguinte, impõe-se ao juiz o dever de ponderar e valorar (‘Erwägung’) todas as alegações fáticas e jurídicas, além, obviamente, da matéria cognoscível de ofício.24 Inclui-se aí o dever de fixação dos principais pontos controvertidos da causa.25

Pelo que se percebe, esse aspecto do direito fundamental ao contraditório liga-se ao dever, atribuído ao juiz, de conhecer e interpretar o Direito objetivo de ofício (“iura novit curia”). Isso signi-fica que as partes, titulares do direito ao contraditório, não podem exigir que o juiz se atenha à mesma qualificação jurídica dos fatos que tenham realizado, ou às visões jurídicas que tenham formulado.26

Ademais, tem-se reconhecido que esse dever de valoração judicial fornece estabelece tam-bém o dever de fundamentação das decisões judiciais, que não está expressamente positivado na Lei Fundamental alemã.27 De fato, é por meio da motivação que o juiz demonstra ter valorado as mani-festações das partes.

Outra dimensão do dever de consideração consubstancia-se na proibição de decidir de modo a causar surpresa às partes (“Vertbot der überraschungsentscheidungen”). O julgado é tido como sur-preendente sempre que se afaste das expectativas legítimas das partes, avaliadas em vista os pontos de vista jurídicos discutidos no processo, até o momento da formação da sentença.28 Para evitar que isso ocorra, é necessário o juiz exercitar o dever de advertência, antes apontado.29 Extensivamente, conclui-se que o juiz também deve ouvir as partes antes de declarar inadmissível um recurso.30

Por fim, a duração a sentença do juiz deve ser prolatada dentro de um prazo razoável (‘Recht auf Entscheidung in angemessener Zeit’).31 Para a determinação dessa razoabilidade, entram em cena elementos como a natureza do conflito em questão, a complexidade do processo, a existência de litis-consortes e de demais incidentes processuais.

3. Violação do direito fundamental ao contraditório e mecanismos destinados à sua correção

O tema da violação ao direito ao contraditório é, por si só, bastante complexo, pois toca de uma forma muito séria no assunto – também problemático – das nulidades processuais. Ademais, a questão em tela complica-se ainda mais quando se pensa a respeito dos meios processuais destinados a reparar tais violações.

A análise de tais temas será dividida, assim, da seguinte forma. Primeiramente, será abortada a problemática teórica atinente à violação propriamente dita da garantia constitucional. Posterior-mente, serão destacadas as consequências processuais por ela acarretadas. Por fim, serão examinadas as formas de afastar tais violações.

3.1 Natureza da violação ao direito fundamental ao contraditório

A questão atinente à violação da garantia constitucional do art. 103, I impõe a solução de um delicado problema teórico: como se caracteriza uma violação do direito fundamental ao contraditório? Como distingui-la da violação de um preceito processual comum, de natureza infraconstitucional?

Como se sabe, existe uma influência mínima dessa direito fundamental em cada norma pro-cessual infraconstitucional. Isso não significa, em contrapartida, que a violação dessas normas hierar-quicamente inferiores implique ao mesmo tempo em violação do art. 103, I da Lei fundamental alemã. Deve-se distinguir, portanto, a vulneração de preceitos de direito infraconstitucional da vulneração de preceitos constitucionais.

(24) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 97.(25) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 99. (26) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 98.(27) KOPP, com apoio em decisões do Tribunal Constitucional Federal alemão, reconhece o dever de fundamentação como parte essencial do direito ao contraditório (op. cit., p. 626: “Es geht dabei mit Recht davon aus, daß die Begründungspflicht insoweit notwendiger Bestandteil des Rechts auf Gehör ist, weil nur so sichergestellt ist, daß die Gerichte das, was die Parteien ihnen im Rahmen des rechtlichen Gehörs vortragen, auch wirklich dei den Entscheidungen berücksichtigen”). Cf., ademais, SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 99. No Direito Brasileiro, o dever de fundamentação constitui princípio constitucional autônomo (Constituição Federal de 1988, art. 93, IX).(28) WALDNER, op. cit., RN 216; SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 140.(29) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 141.(30) LEIPOLD, op. cit., RN 21 a.(31) ACHIM VON WINTERFELD, Das Verfassungsprinzip des rechtlichen Gehörs, Neue juristische Wochenschrift, 1961:849-853, esp. p. 850.

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Schmidt-Aßmann propõe que a questão seja solucionada a partir da análise da função desem-penhada pelos preceitos legislativos ordinários em face da garantia constitucional.32

Em primeiro lugar, encontram-se preceitos da legislação ordinária que relacionam-se direta-mente ao direito fundamental instituído no art. 103, I da Lei Fundamental. Eles abrangem, segundo o critério adotado por Schmidt-Aßmann, a determinação dos titulares do direito à audiência judicial e dos deveres judiciais. Sua violação importa vulneração simultânea da regra ordinária e da regra cons-titucional do contraditório.33

Em segundo lugar, tem-se preceitos infraconstitucionais que estão associados de forma um pouco mais distante com a garantia do art. 103, I e, em razão disso, não se referem a seus contor-nos fundamentais. Nesse caso, para que se verifique lesão também ao art. 103, I, é necessário que a não-observância do preceito ordinário tenha prejudicado concretamente a garantia do contraditório, considerada em pelo menos um daqueles seus três níveis (informação, manifestação, consideração). Se isso não ocorrer, configura-se simples lesão a norma de nível infraconstitucional (e. g., a regra de um determinado Código de Processo). Enquadram-se nessa classe as regras relativas ao defensor da-tivo e à audiência oral.34

Por fim, tem-se o caso das regras legais ordinárias limitadoras do direito ao contraditório. É o que ocorre com os dispositivos infraconstitucionais que estabelecem prazos preclusivos. Para que haja violação ao mandamento constitucional, em tal caso, é necessário que esses prazos ou importem em diminuição drástica das possibilidades de manifestação, ou que a sua respectiva contagem tenha sido realizada de modo incorreto.

3.2 Consequências processuais decorrentes da violação

Acima foram estabelecidos critérios para que se possa caracterize a violação específica da garantia constitucional à audiência jurídica. Não basta, entretanto, que o preceito do art. 103, I da Lei Fundamental tenha sido simplesmente desatendido. É necessário que isso tenha acarretado um prejuízo concreto e delimitável ao titular daquela garantia. Essa necessidade decorre do próprio cará-ter instrumental do processo. Consequentemente, se o legitimado teve condições fáticas de exercer o direito ao contraditório, mesmo que tenha havido violação nominal ao preceito do art. 103, I, tem-se que a garantia foi materialmente implementada.

Wolfram Waldner informa ser atualmente questão incontroversa que a violação do direito à audiência judicial não acarreta a simples inexistência jurídica (‘Nichtigkeit’) da decisão.35 Trata-se apenas de erro de procedimento (‘Verfahrensmangel’).36

3.3 Meios para reparar o dano decorrente da violação

Os danos decorrentes da violação do art. 103, I são reparáveis em regra pelas vias ordinárias, recursais ou não-recursais. O acesso às vias extraordinárias depende necessariamente do insucesso na utilização daquelas.

Os meios ordinários abrangem formas de autocorreção do erro, manifestação posterior à de-cisão ou reparação através de procedimento recursal.

Primeiramente, tem-se a correção do erro no interior do próprio procedimento, por falta de prejuízo, pois meras irregularidades processuais são sanadas de forma automática.37

Quando o erro judicial relativo ao contraditório importa desobediência ao princípio da ante-rioridade da audiência em relação à decisão (abstraídas as exceções de contraditório diferido), a sua correção pode ser efetuada garantindo-se à parte lesada a oportunidade de manifestar-se posterior-mente (‘Heilung durch Nachholung’), seja na mesma instância, seja em instância superior àquela que prolatou a decisão.38

(32) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 147.(33) Ibidem. (34) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 147. (35) WALDNER, op. cit., RN 466. Cf., ademais, SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 148.(36) LEIPOLD, op. cit., RN 50. A questão, no Direito Brasileiro, deve ser vista em outros termos, pois a falta ou nulidade da citação conduz à nulidade da própria sentença. Cf., a esse respeito, PONTES DE MIRANDA, Tratado da ação rescisória das sentenças e de outras decisões, 5. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1976, § 17, n. 2, pp 164-168 e § 18, n. 2, p. 192, e CARlOS AlbERTO AlvARO DE OlIvEIRA, Execução de título judicial e defeito ou ineficácia da sentença, Revista da AJURIS, 62(nov./1994.):93-107 esp. pp. 102-103. (37) “Selbstkorrektur”. Cf. SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 148 e 161.(38) SCHMIDT-AßMANN, op. cit., RN 149.

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Além dos expedientes anteriormente nomeados, existe sempre a possibilidade de se corrigir o dano decorrente da violação através dos meios recursais ordinários: a apelação (‘Berufung’), a revisão (‘Revison’) e ação de nulidade (‘Nichtigkeitsklage’).

Conforme acentua a doutrina germânica, a utilização da apelação (‘Berufung’) somente tem lugar quando a violação em questão ocorrer em uma sentença de primeiro grau (ZPO, § 539) e não puder mais ser alterada nessa mesma instância recursal.39

O emprego do recurso de revisão (‘Revision’ – equivalente ao recurso especial do Direito Brasileiro), por seu turno, é mais difícil, pois esse recurso só é cabível quando o julgado inquinado tiver aplicado mal algum preceito legal de natureza infraconstitucional (ZPO, § 549). Em tal caso, é indispensável para o sucesso do recurso a demonstração de que a decisão judicial teria sido outra se não tivesse sido denegada a audiência judicial.

Já a ação de nulidade (‘Nichtigkeitsklage’, equivalente à ação rescisória do Direito Brasileiro), através da qual se ataca uma decisão já transitada em julgado, não é aplicável genericamente a todos os tipos de violação ao art. 103, I da Lei Fundamental. Dieter Leipold aponta dois casos principais nos quais a utilização desse tipo de recurso é possível: em caso de irregularidade na representação da parte (ZPO, § 579, Abs. 1, Nr. 4) e em caso de desconhecimento justificável da propositura da ação, em decorrência de citação do réu por edital.40

Os instrumentos extraordinários para correção do erro abrangem a queixa constitucional (‘Verfassungsbeschwerde’), dirigida ao Tribunal Constitucional Federal, e a queixa à Corte Europeia de Direitos Humanos (‘Menschenrechtsbeschwerde’)

A queixa constitucional representa a via judicial de correção de lesões a direitos fundamentais por excelência. Sua admissibilidade, no entanto, requer que o interessado tenha esgotado todas as vias ordinárias para corrigir o erro (princípio da subsidiariedade da queixa constitucional).41 Mate-rialmente, é necessária a demonstração específica da violação, como ressalta, desde os tempos mais antigos, Adolf Arndt.42 Tenha-se em mente, ademais, que sua utilização pressupõe violação direta ao princípio constitucional, conforme visto anteriormente.

É de se destacar que, em virtude desse princípio, reconhecido pela jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal alemão, e de uma decisão específica desse Tribunal prolatada no ano de 2003, foi instituído por lei, em 09.12.2004, um novo remédio jurídico destinado à correção da violação ao contraditório pelo próprio magistrado prolator da decisão.43 Trata-se da “Anhörungsrüge” (também chamada pela doutrina de “Gehörsrüge”), a queixa pela denegação do contraditório, regulada pelo novo § 321a da Zivilprozessordnung (ZPO).44 Segundo se depreende da alínea 1 desse dispositivo, a queixa pela denegação do contraditório poderá ser utilizada quando inexistir recurso ou outro meio de impugnação previsto para questionar a decisão e o juiz houver lesado de modo significativo o direito da parte ao contraditório.

Consoante a alínea 2 do § 321a da ZPO, a queixa em questão deve ser interposta no prazo de duas semanas após o conhecimento da violação ao direito fundamental, em petição escrita e funda-mentada dirigida ao próprio órgão prolator da decisão. Conforme a alínea 3, a parte contrária deverá ser intimada para se manifestar, quando necessário. Se procedente a queixa, estatui a alínea número 5 que o magistrado deve anular o procedimento até a etapa anterior à decisão, ou seja, o momento

(39) WALDNER, op. cit., RN 479. (40) LEIPOLD, op. cit., RN 54b.(41) KUNIG, op. cit., p. 814; WALDNER, op. cit., RN 470; LEIPOLD, op. cit., RN 58.(42) ADOLF ARNDT, Das Verfassungsbeschwerde wegen Verletzung des rechtlichen Gehörs, Neue juristische Wochenschrift, 1959:1297-1301, esp. p. 1297.(43) RüDIGER ZUCK, Die Anhörungsrüge im Zivilprozess, Münster: ZAP Verlag, 2008, pp. 3-4 e 9. (44) “(1) Auf die Rüge der durch die Entscheidung beschwerten Partei ist das Verfahren fortzuführen, wenn 1. ein Rechtsmittel oder ein anderer Rechtsbehelf gegen die Entscheidung nicht gegeben ist und2. das Gericht den Anspruch dieser Partei auf rechtliches Gehör in entscheidungserheblicher Weise verletzt hat.Gegen eine der Endentscheidung vorausgehende Entscheidung findet die Rüge nicht statt.(2) Die Rüge ist innerhalb einer Notfrist von zwei Wochen nach Kenntnis von der Verletzung des rechtlichen Gehörs zu erheben; der Zeitpunkt der Kenntniserlangung ist glaubhaft zu machen. Nach Ablauf eines Jahres seit Bekanntgabe der angegriffenen Entscheidung kann die Rüge nicht mehr erhoben werden. Formlos mitgeteilte Entscheidungen gelten mit dem dritten Tage nach Aufgabe zur Post als bekannt gegeben. Die Rüge ist schriftlich bei dem Gericht zu erheben, dessen Entscheidung angegriffen wird. Die Rüge muss die angegriffene Entscheidung bezeichnen und das Vorliegen der in Absatz 1 Satz 1 Nr. 2 genannten Voraussetzungen darlegen.(3) Dem Gegner ist, soweit erforderlich, Gelegenheit zur Stellungnahme zu geben.(4) Das Gericht hat von Amts wegen zu prüfen, ob die Rüge an sich statthaft und ob sie in der gesetzlichen Form und Frist erhoben ist. Mangelt es an einem dieser Erfordernisse, so ist die Rüge als unzulässig zu verwerfen. Ist die Rüge unbegründet, weist das Gericht sie zurück. Die Entscheidung ergeht durch unanfechtbaren Beschluss. Der Beschluss soll kurz begründet werden.(5) Ist die Rüge begründet, so hilft ihr das Gericht ab, indem es das Verfahren fortführt, soweit dies auf Grund der Rüge geboten ist. Das Verfahren wird in die Lage zurückversetzt, in der es sich vor dem Schluss der mündlichen Verhandlung befand. § 343 gilt entsprechend. In schriftlichen Verfahren tritt an die Stelle des Schlusses der mündlichen Verhandlung der Zeitpunkt, bis zu dem Schriftsätze eingereicht werden können.”

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anterior à audiência, pois é nessa que as partes têm a oportunidade concretizar com maior intensidade o direito ao contraditório.

Interessante assinalar que o objetivo último da instituição desse mecanismo foi reduzir o número de queixas constitucionais dirigidas ao Tribunal Constitucional Federal alemão. De fato, como ressalta Rüdiger Zuck, aproximadamente metade de tais recursos diziam respeito total ou parcial-mente à violação do direito fundamental ao contraditório.45 Dessa maneira, é reforçado o princípio da subsidiariedade da queixa constitucional, competindo ao juiz ordinário reparar a violação ao con-traditório.

Se a violação ao direito fundamental ao contraditório não for solucionada pelas vias judici-árias alemãs, existe ainda a possibilidade de se lançar mão da ‘Menschenrechtsbeschwerde’ (queixa referente aos direitos humanos), dirigida ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Isso porque o di-reito ao contraditório também está assegurado no art. 6, I da Convenção Europeia para Proteção dos Direitos Humanos.46 Neste caso, a queixa deve ser proposta diretamente à Corte Europeia de Direitos humanos.

4. Conclusões

Em conclusão, observa-se que o direito fundamental ao contraditório no processo civil alemão abrange não apenas a oportunidade de ter ciência a respeito dos atos e termos processuais, mas tam-bém a possibilidade de manifestação efetiva das partes a respeito dos atos processuais praticados por elas mesmas e também pelo Poder Judiciário. Pelo que se viu, esses dois aspectos seriam vazios sem a existência de um terceiro, que consiste no direito à consideração e análise daquilo que foi manifes-tado, por parte do órgão judicial. Nessa linha, prestou-se especial atenção à vedação de julgamentos surpreendentes, questão especialmente importante quando se cuida da possibilidade de o juiz consi-derar determinadas matérias de ofício.

Ademais, também se constata que o tratamento das consequências da violação do direito fundamental ao contraditório também foi objeto de atenção da doutrina e da jurisprudência alemãs. Primeiramente, ressalta que nem toda violação ao contraditório se traduz automaticamente em vio-lação direta ao preceito constitucional, de modo que a questão, muitas vezes, deve ser resolvida à luz da legislação infraconstitucional e das peculiaridades do caso concreto. Além disso, nota-se que o sistema alemão fornece uma multiplicidade de formas de correção da violação ao direito fundamental em questão. Assim, o recurso ao Tribunal Constitucional Federal alemão constitui apenas um meio, não o único, destinado a sanar a denegação do contraditório às partes no processo civil. Aliás, nesse sentido, merece destaque a criação recente da queixa pela denegação do contraditório, como forma de correção da violação ao direito ao contraditório pelo próprio magistrado prolator da decisão.

Referências

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ARNDT, Adolf. Das Verfassungsbeschwerde wegen Verletzung des rechtlichen Gehörs. Neue juristische Wochenschrift, 1959:1297-1301.

KOPP, Ferdinand. Das rechtliche Gehör in der Rechtsprechung des Bundesver fassungsgerichts. Archiv des öffentlichen Rechts, 106(1981):604-632.

KUNIG, Philip. Grundgesetz-Kommentar. München: C. H. Beck, 1996, Bd. 3. LEIPOLD, Dieter. Der Anspruch auf rechtliches Gehör. In: STEIN; JONAS. Kommentar zur Zivil-

prozeßordnung. Tübingen: J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), Bd. 2, 1993.NÖRR, Knut Wolfgang. Naturrecht und Zivilprozeß. Tübingen: J. C. B. Mohr (Paul Siebeck),

1976.PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado da ação rescisória das sentenças e de

outras decisões. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976.RüPING, Hinrich. Der Grundsatz des rechtlichen Gehörs und seine Bedeutung im Strafver-

fahren. Berlin: Duncker & Humblot, 1976. SCHMIDT-ASSMANN, Eberhard. Spezialschriftum zu Art. 103 Abs. I. In: MAUNZ; DüRIG. Grund-

gesetz Kommentar. München: C. H. Beck, 1997.WALDNER, Wolfram Der Anspruch auf rechtliches Gehör. 2. Aufl. Köln: Otto Schmidt, 2000.

(45) ZUCK, op. cit., p. 4. (46) LEIPOLD, op. cit., RN 61.

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VON WINTERFELD, Achim. Das Verfassungsprinzip des rechtlichen Gehörs. Neue juristische Wochenschrift, 1961:849-853.

ZUCK, Rüdiger. Die Anhörungsrüge im Zivilprozess. Münster: ZAP Verlag, 2008.

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Pejotização e a precarizaçãodas relações de emprego

Laura Machado de Oliveira1

RESUMO

Com o intuito de fraudar relações de emprego típicas, empregadores tendem a uti-lizar o instituto da pejotização, isto é, transformam verdadeiros liames emprega-tícios, em uma simples locação de mão de obra, contrato de empreitada, entre outras denominações, visando burlar os diretos trabalhistas que deveriam circundar o contrato trabalhista, uma vez que é esse o objetivo precípuo desse ramo jurídico, a proteção à parte hipossuficiente. Para alcançar o estágio atual do direito trabalhista no nosso ordenamento jurídico pátrio, muitos lutas e discussões foram travadas, e agora, as partes dessa relação jurídica estão por desvirtuar o pacto laboral clássico, restando ao poder judiciário analisar o caso concreto, evitando que tais situações continuem permeando a sociedade.

Palavras chave

Pessoa jurídica; Pessoa física; Fraude nas relações trabalhistas; Relação de emprego.

ABSTRACT

“Pejotização” and precarious employment relationsWith the intention of defrauding typical employment relationships, employers tend to use the institute’s “pejotização”, ie transform real bonds employment in a simple lease of labor, contract, among other names, in order to circumvent the labor rights that should circle the labor contract, since that is the primary objective of this area of law, the protection part hipossuficiente. To reach the current stage of labor law in our legal parental rights, many fights and arguments have been fought, and now, the parties of that legal relationship are by distorting the labor pact classic, leaving the judiciary to review the case, preventing such situations continue permeating society.

Keywords

Corporations, Individuals; Fraud labor relations; Employment relationship.

*Pejotização: The transformation of a individual into a corporation to the legal sys-tem.

Prática que vem se tornando típica dentro do direito trabalhista é a pejotização, isto é, o uso da pessoa jurídica para encobrir uma verdadeira relação de emprego, fazendo transparecer formal-mente uma situação jurídica de natureza civil. A denominação é fruto da sigla da pessoa jurídica, isto é, PJ = pejotização, a “transformação” do empregado (sempre pessoa física) em PJ (pessoa jurídica).

Trata-se de um dos tantos reflexos ocasionado pela precarização das relações do trabalho, que demonstra a mitigação dos valores não apenas trabalhistas, mas também conceitos consagrados na Constituição Federal, como o da dignidade da pessoa humana, que permeia todos os demais princípios existentes em nosso ordenamento jurídico.(1) Advogada especialista em Direito Trabalhista. Professora de Direito e Processo do Trabalho, e também de estágio Supervisionado na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. Mestranda em Direito do Trabalho pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Autora de diversos artigos trabalhistas.

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O ato é adotado em muitos estabelecimentos como obrigação para a admissão do empregado, o qual receberá como prestador de serviços assim regulado pelo Código Civil de 2002, principalmente pelos artigos 593 ao 609, e não regido pela CLT, apesar de estarem presentes todos os aspectos ne-cessários para a constituição da relação emprego, isto é, a onerosidade, a subordinação, não even-tualidade, a pessoalidade e ser o trabalho prestado por pessoa física. Assim sendo, a típica relação de emprego será burlada, mascarando-a com a finalidade de não aplicação da legislação trabalhista.

Para a existência de uma verdadeira pessoa jurídica é necessária a livre iniciativa em constituí-la, e não uma obrigação imposta por um terceiro (no caso, seu empregador), e também a vontade de assumir o risco econômico em criá-la, os lucros e prejuízos entre os sócios. Para o civilista predomina o principio da autonomia da vontade das partes no ajuste da situação jurídica, algo inconcebível diante do direito laboral. Amauri Mascaro disserta sobre o tema: “... enquanto no direito civil as disposições legais em matéria contratual têm caráter supletivo ou subsidiário, no direito do trabalho têm caráter principal, ao passo que a autonomia da vontade funciona de forma complementar. Invertem-se, por-tanto, as posições2”.

No momento da concretização do instituto, nos aproximamos do direito do trabalho do século XVIII, onde o liberalismo predominava, contudo, esse não é o modelo adotado no nosso sistema atual, porém os empresários agem de forma a ignorar a legislação protetiva do empregado, apesar de tantas lutas e discussões para o alcance de direitos e garantias, agora tratadas como inexistentes.

O Direito do trabalho tutela a pessoa física, não havendo a possibilidade de uma pessoa jurídi-ca ser um empregado. Conforme o conceito de empregado extraído do artigo 3° da CLT, encontramos essa exigência, além do fato do contrato ser intuito personae, isto é, o contrato é personalíssimo, não podendo ser executado por pessoa diversa daquela que o pactuou; no momento em que se vislumbra a presença da pessoa jurídica no pólo que deveria ser do empregado, é configurada uma locação de serviços, ou um contrato de empreitada, temporário, terceirização, trabalhador autônomo, etc. Em suma, a pejotização é um instituto antagônico ao típico empregado do direito laboral.

O fenômeno, a primeira vista, chama a atenção do empregado, pois a pecúnia oferecida pelo empregador é maior, alegando que com a redução com o pagamento de impostos possibilitará o aumento do valor do “salário”, contudo, leva o a acreditar que a oferta é recompensadora, mas na verdade ao empregado não será assegurado pela lei o direito ao décimo terceiro salário, às horas extras, às verbas rescisórias, os direitos previdenciários (e consequentemente à licença maternidade, auxilio reclusão, auxílio doença, etc), ao salário mínimo, ao labor extraordinário, aos intervalos remu-nerados (descanso semanal remunerado e férias com adicional constitucional de um terço), ao FGTS, aos direitos concernentes na ocorrência do acidente de trabalho, entre outros direitos garantidos pela Lei ou em acordos e convenções coletivas, além de trazer muita insegurança ao empregado que labora em tais condições, sem nenhuma garantia. Se não fossem apenas os direitos trabalhistas suprimidos, o empregado ainda terá que arcar com as despesas provenientes de uma pessoa jurídica, como o con-tador, o pagamento de impostos e contribuições de abertura, manutenção e encerramento da firma, além de assumir os riscos de um negócio que não tem razão de existir.

Por outro lado, o empregador se beneficia pela desoneração de uma séria de responsabilida-des como a acima expostas, além da carga tributária reduzida, contando com a prestação de serviços ininterrupto pelos 12 meses do ano (pois a empresa contratada não tem o direito a gozar férias), não precisará respeitar a jornada de 8 horas de trabalho e carga horária de 44 horas semanais, é liberado do pagamento do INSS de 20% sobre a folha a título de contribuição previdenciária assim como a con-tribuição para o Sistema “S” sobre esse prestador de serviço, também não precisará pagar a alíquota de 8% referente ao FGTS assim como a indenização de 40% sobre o seu montante, nem tampouco o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço. Um empregador que se dispõe a pejotizar um empre-gado com o fim de pagar menos encargos sociais, desrespeitando os preceitos laborais, provavelmente também estará disposto a aplicar outras arbitrariedades. Partindo do mesmo raciocínio, o empregador almejando o maior lucro possível, sobrecarrega os empregados e não possui nem o encargo de efetuar o reajuste salarial na data base.

De acordo com o artigo 9° da CLT, o instituto é considerado fraude nas relações trabalhistas: “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”, devendo ser considerada nula a prestação de serviços mediante a pejotização. De certa forma é uma repressão imposta pelos empregadores com o intuito de não aplicar a legislação trabalhista. O empregado acaba cedendo, pois é o seu modo de subsistência, além da dependência econômica face ao empregador.

(2) NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p 383.

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Também é considerado crime de frustração de direito trabalhista, conforme mencionado no titulo dedicado aos Crimes contra a Organização do Trabalho, disposto no artigo 203 do Código Penal, que assim disciplina: “Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho: Pena: detenção de um ano a dois anos, e multa, além da pena correspondente à violência”. Mas para tanto, deverá ser ajuizada uma ação no juízo criminal para a sua configuração.

Na ocorrência do instituto há o nascimento de outro aspecto pouco suscitado, é a questão da dificuldade de sindicalização, e por conseguinte, a formação de acordos ou convenções coletivas para reivindicar direitos e impedir eventuais abusos patronais, sendo de fundamental importância para a categoria, enfraquecendo consideravelmente o setor.

Como a legislação não possui nenhum dispositivo expresso para ser aplicado quanto à matéria, resta utilizar o artigo 8° da CLT3, permitindo a utilização de princípios para a resolução de controvér-sias na ocorrência de falta de disposição legal.

Neste contexto, verifica-se a importância do princípio da primazia da realidade, considerado um dos pilares do ramo laboral, no qual se detém a situação realmente existente à situação acordada pelas partes, disposta formalmente nos documentos. Conforme Mario de La Cueva:

A existência de uma relação de trabalho depende, em conseqüência, não do que as partes tiverem pac-tuado, mas da situação real em que o trabalhador se ache colocado, porque [...] a aplicação do Direito do Trabalho depende cada vez menos de uma relação jurídica subjetiva do que de uma situação objeti-va, cuja existência é independente do ato que condiciona seu nascimento. Donde resulta errôneo pre-tender julgar a natureza de uma relação de acordo com o que as partes tiverem pactuado, uma vez que, se as estipulações consignadas no contrato não correspondem à realidade, carecerão de qualquer valor.

Em razão do exposto é que o contrato de trabalho foi denominado contrato-realidade, posto que exis-te não no acordo abstrato de vontades, mas na realidade da prestação do serviço, e que é esta e não aquele acordo o que determina sua existência4.

Segundo uma decisão narrada por Américo Plá Rodriguez, datando de 28 de dezembro de 1934:

Não é o empregador quem deve atribuir a qualidade de empregado; esta surge da natureza dos fatos da relação jurídica que a configura, independentemente da interpretação mais ou menos tendenciosa dos interessados5.

A partir do apontado, examinamos que o fato de deturpar a relação de emprego é antigo, mas os juristas desde então a configuram, pois conforme explanado, essa relação é intrínseca a natureza do vínculo.

À natureza jurídica do contrato de emprego é dado o nome de contrato realidade, e as normas trabalhistas, como são de natureza cogente, isto é, vinculada, são de aplicação obrigatória, portanto não cabem às partes do contrato – empregador e empregado – escolher qual será a natureza do con-trato celebrado. A pejotização encontra o obstáculo no principio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, os quais foram adquiridos ao longo de anos e não poderão ser suprimidos ou reduzidos por simples vontade dos contratantes; o que poderá ser feito pelas partes é apenas a sua ampliação.

Seguindo o raciocínio, conforme o parágrafo único do artigo 8° da CLT, também podemos apli-car o artigo 166 do Código Civil que considera nulo todo negocio jurídico que: “VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa”; assim como o artigo 167 também do CC, que disciplina: “É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. § 1o Ha-verá simulação nos negócios jurídicos quando: [...] II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira”. Por conseguinte, também encontramos respaldo no Código Civil para consi-derarmos o contrato de emprego (contrato dissumulado) ao contrato pejotizado (contrato simulado).

A jurisprudência tem se calcado nesse argumento para firmar a relação de emprego existen-te, desde que presentes os pressupostos para tal, conforme trecho do acórdão do TRT da 2ª, 3ª e 17ª Região, respectivamente:

(3) Artigo 8º CLT. As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público. Parágrafo único: O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.(4) CUEVA, Mario de La apud RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr. 4ª Ed. 1996, p 218.(5) GARICOITS, Farmín apud RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr. 4ª Ed. 1996, p 239.

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Do vínculo empregatício. Exsurge da prova oral que a depoente, assim como o recorrido, cumpriam jornada fixa e havia controle de horário. O fato do reclamante ter aberto uma empresa, em seu pró-prio nome, para corretagem de seguros, nada comprova; trata-se de mais um caso incluído no rol da chamada “pejotização”, isto é, os trabalhadores tornam-se “pessoas jurídicas”, por força da imposição patronal, como garantia da manutenção ou obtenção do emprego. Presentes, os requisitos da pessoali-dade, da subordinação jurídica; havia onerosidade, habitualidade e não eventualidade...” (Processo n° 02096-2004-036-02-00-1 RO, Acórdão n° 20090179921. Public 17 março 2009. 10ª Turma, TRT 2ª Região. Desembargadora Relatora Marta Casadei Momezzo)6.

Fraude trabalhista - prestação de serviço por suposta pessoa jurídica. O conjunto probatório constitu-ído nos autos comprova a fraude à legislação trabalhista, na medida em que o reclamante, através de empresa interposta foi inserido no processo produtivo da atividade econômica da reclamada, desem-penhando atividades imprescindíveis à consecução do empreendimento empresarial. A pessoa jurídica constituída pelo trabalhador é típica empresa de fachada, hipótese clara de pejotização, com capital social de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), dividido em 100 cotas, sendo que apenas uma cota pertencia ao outro sócio, com o qual o reclamante possui relação de parentesco”. (Processo n° 01288-2009-100-03-00-8 RO, Public 10 março 2010. 8ª Turma, TRT 3ª Região. Desembargadora Relatora Maria Cristina Diniz Caixeta)7.

Princípio do Contrato Realidade. Fraude. Vínculo de Emprego Reconhecido. Comprovado que o autor, por todo o período de trabalho, laborou para a reclamada com pessoalidade, onerosidade, não-even-tualidade e subordinação jurídica, é imperativo o reconhecimento do vínculo de emprego, reputando-se fraudulenta, nos termos do art. 9º da CLT, a empreitada da reclamada de mascarar a relação de emprego, forçando o empregado a prestar-lhe serviços como se pessoa jurídica fosse”. (Processo n° 00788.2009.001.17.00.4 RO, Public 15 março 2011. 1ª Turma, TRT 17ª Região. Desembargador Relator Gerson Fernando da Sylveira Novais)8.

Conforme verificado, resta ao Poder Judiciário reconhecer a situação fática existente, descon-siderando o que se encontra documentalmente exposto, visto que a verdade de fato é mais benéfica ao empregado.

O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região também se baseou no principio da continuidade da relação de emprego para configurar o liame empregatício:

Verifica-se, pois, que ao contrário do quanto afirmado pelo Recorrente, o Recorrido trabalhou efetiva-mente como advogado da empresa de dez/83 a dez/86, ocasião em que foi despedido para ser, auto-maticamente recontratado, prestando os mesmos serviços. A diferença básica entre os dois contratos reside no fato de que antes prestava os serviços como empregado, após a despedida, como autônomo. O fenômeno ocorrido nos presentes autos, embora incipiente em 1986, ganhou depois grande notoriedade o mundo das relações de trabalho e é hoje denominado de “PEJOTIZAÇÃO”. A pejotização é uma forma de terceirização mediante a qual a mesma pessoa, antes empregada, continua a realizar os mesmos serviços com a diferença de que a forma do contrato de trabalho transmuda-se geralmente sob a deno-minação jurídica de profissional liberal, micro-empresa ou cooperativa. Ora, são princípios basilares do contrato de trabalho o da primazia da realidade e da continuidade da relação de emprego. Este último decorre da presunção de que ao empregado não é vantajoso o término do vínculo empregatício, uma vez que o contrato de trabalho é regido por legislação específica que assegura ao obreiro vantagens que dificilmente encontrará noutras relações de trabalho. Quanto ao princípio da primazia da realidade, é relevante no caso dos autos uma vez que retira o valor probatório do contrato escrito se a relação ma-terial com aquele não se coaduna.” (Processo 0049200-11.2004.5.05.0021 RO, DJ 19/11/2009. 5ª Turma TRT 5ª Região. Desembargadora Relatora Maria Adna Aguiar)9.

Como podemos analisar, o magistrado levou em consideração o fato, em consonância com as demais provas realizadas no processo, que na ocorrência da continuidade da relação de serviços, isto ocorreu através da relação típica de emprego, e não através de um contrato de prestação de serviços.

O Tribunal Superior do Trabalho também se posiciona da mesma maneira, conforme decisão do Agravo de Instrumento que tinha o intuito de dar seguimento ao Recurso de Revista denegado pelo TRT da 1ª Região, tratando do célebre caso envolvendo uma jornalista:

Agravo de Instrumento. Recurso de Revista. Constituição de pessoa jurídica com o intuito de dissimular o contrato de trabalho. Discrepância entre o aspecto formal e a realidade. O acórdão recorrido contém todas as premissas que autorizam o exame do enquadramento jurídico dado pelo TRT aos fatos regis-

(6) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. São Paulo. Disponível em < http://www.trt2.jus.br>. Acesso em 09 jun.2013(7) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Minas Gerais. Disponível em <http://www.mg.trt.gov.br>. Acesso em 14 jun.2013(8) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região. Espírito Santo. Disponível em <www.trt17.gov.br>. Acesso em 20 jun.2013.(9) BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Bahia. Disponível em <http://www.trt5.jus.br> Acesso em 20 jun.2013

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trados. Nesse contexto, verifica-se que se tratava de típica fraude ao contrato de trabalho, consubs-tanciada na imposição feita pelo empregador para que o empregado constituísse pessoa jurídica com o objetivo de burlar a relação de emprego havida entre as partes. Não se constata violação dos artigos 110 e 111 do Código Civil, uma vez que demonstrada a ocorrência de fraude, revelada na discrepância entre o aspecto formal (contratos celebrados) e a realidade. Agravo de instrumento improvido (AIRR - 1313/2001-051-01-40. 6ª Turma TST. Publicação DEJT 31/10/2008. Ministro Relator Horácio Senna Pires)10.

Além do mais, corroborando com nossa teoria, o artigo 442 da CLT regulamenta que o “Con-trato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”, portanto por mais que o serviço seja prestado por uma pessoa jurídica mediante contrato formalmente escrito com outra denominação, tacitamente a relação de emprego está perfectibilizada.

O magistrado ao reconhecer a questão da fraude trabalhista, decretando a sua nulidade, constituirá a relação de emprego, com a assinatura da carteira de trabalho e previdência social com o direito ao percebimento de todas as verbas trabalhistas advindas.

Muitas empresas justificam a utilização da pessoa jurídica no momento da prestação dos ser-viços se calcando no artigo 129 da Lei n° 11.196 de 2005, que dispõe:

Artigo 129 Lei n° 11.196/2005. Para fins fiscais e previdenciários, a prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, se sujeita tão-somente à legislação aplicável às pessoas jurídicas, sem pre-juízo da observância do disposto no art. 50 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.

Parágrafo único: VETADO.

Contudo, a interpretação da citada norma, muito criticada por diversos doutrinadores, tem sido equivocada, uma vez que é recente. O uso da pessoa jurídica poderá ocorrer no momento de prestações de serviços não habituais e/ou sem subordinação, apenas para suprir alguma demanda específica, isto é, de caráter temporário ou esporádico, assim poderíamos utilizar a sua figura sem burlar a legislação trabalhista, visto que estará configurado um verdadeiro e típico contrato de pres-tação de serviços. Entretanto será uma situação implausível quando se tratar de atividade corrente do estabelecimento, ou seja, sem eventualidade. Além do mais o próprio parágrafo único do artigo 3° da CLT, que conceitua o termo empregado, disciplina que não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual, portanto, a lei ordinária jamais poderia estabelecer qualquer diferenciação entre essas classes. Se a relação de trabalho encontra-se revestida nas características de uma relação de emprego, qual seja a modalida-de adotada (se científica, artística ou cultural) os preceitos empregatícios deverão estar presentes. Destarte, a leitura e aplicação da norma deverão ser minuciosas para evitar interpretações errôneas.

Quanto ao veto do parágrafo único do mesmo artigo, vejamos o que continha: “O disposto neste artigo não se aplica quando configurada relação de emprego entre o prestador de serviço e a pessoa jurídica contratante, em virtude de sentença judicial definitiva decorrente de reclamação trabalhista”.

Portanto, o próprio parágrafo único já alertava sobre o fato de caso esteja configurada uma relação de emprego, o disposto no caput não seria aplicado, porém, houve o veto. Todavia, as razões do veto são as seguintes:

O parágrafo único do dispositivo em comento ressalva da regra estabelecida no caput a hipótese de ficar configurada relação de emprego entre o prestador de serviço e a pessoa jurídica contratante, em virtude de sentença judicial definitiva decorrente de reclamação trabalhista. Entretanto, as legisla-ções tributária e previdenciária, para incidirem sobre o fato gerador cominado em lei, independem da existência de relação trabalhista entre o tomador do serviço e o prestador do serviço. Ademais, a condicionante da ocorrência do fato gerador à existência de sentença judicial trabalhista definitiva não atende ao princípio da razoabilidade.

Analisando o veto, verificamos que o legislador apenas considerou a hipótese de incidência do

fato gerador para a aplicação da legislação tributária e previdenciária, o achando prescindível diante do caput, no entanto, esqueceu que o parágrafo único vai mais além, regulando também a legislação (10) BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em <http://www.tst.gov.br> Acesso em 14 jun.2013.

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trabalhista, e não apenas aquelas áreas, ocasionando celeuma no campo laboral. Ocorre que a Lei n° 11.196/2005 foi idealizada para regular o direito tributário, o artigo em questão não deveria ser tra-tado dentro de uma Lei com o objetivo tão distante do direito trabalhista, e uma vez ocorrido, surge tal situação como a apontada, sem a devida atenção aos princípios justrabalhistas.

Não obstante, caso ainda reste alguma duvida no momento da aplicação do artigo 129 da lei em comento ou a CLT, podemos recorrer mais uma vez aos princípios, nesse caso o princípio da prote-ção e o princípio da norma mais favorável, que segundo Alice Monteiro de Barros:

O principio da proteção é consubstanciado na norma e na condição mais favorável, cujo fundamento se subsume à essência do Direito do Trabalho. Seu propósito consiste em tentar corrigir desigualdades, criando uma superioridade jurídica em favor do empregado, diante da sua condição de hipossuficiente.

O fundamento do principio da norma mais favorável é a existência de duas ou mais normas, cuja prefe-rência na aplicação é objeto de polemica. Esse princípio autoriza a aplicação da norma mais favorável, independentemente da sua hierarquia11.

Conforme dados apontados na matéria veiculada por Sandra Turcato e Rosualdo Rodrigues:

De acordo com estudo do IBGE veiculado em 2004, com base no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), havia no país aproximadamente 4,5 milhões de empresas cadastradas naquele ano. Desses, 3,1 milhões (68%) são empresas sem empregados. O próprio IBGE diagnostica que, na maioria desses casos, a empresa é assim constituída com o objetivo de modificar o vínculo do trabalhador com a empresa em que ele realmente trabalha12.

Conforme relatado, em decorrência de serem empresas sem empregados, apenas de fachada, a pejotização também é comumente e ironicamente chamada da empresa do “eu sozinho”.

Para evitar a ocorrência, campanhas de prevenção devem ser realizadas a fim de aprofundar os direitos que os empregados fazem jus. O Ministério Público do Trabalho está engajado no Combate à Pejotização com apoio dos Sindicatos representativos das categorias. Foi criada pela Procuradoria Geral do MPT, a Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho – CONAFRET - e por sua vez nas Procuradorias Regionais, as Coordenadorias Regionais de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho, com um dos intuitos de inibir a pejotização.

O assunto tomou proporções ainda maiores nos últimos anos devido à Emenda n° 3 da Lei n° 11.457 em 2007, que alteraria o artigo 6°, § 4° da Lei n° 10.593 de 2002, que trazia o seguinte: “No exercício das atribuições da autoridade fiscal de que trata esta Lei, a desconsideração da pessoa, ato ou negócio jurídico que implique reconhecimento de relação de trabalho, com ou sem vínculo em-pregatício, deverá sempre ser precedida de decisão judicial”, que após apelos de diversos setores da sociedade, sofreu Veto Presidencial conforme a razão exposta:

As legislações tributária e previdenciária, para incidirem sobre o fato gerador cominado em lei, in-dependem da existência de relação de trabalho entre o tomador do serviço e o prestador do serviço. Condicionar a ocorrência do fato gerador à existência de decisão judicial não atende ao princípio cons-titucional da separação dos Poderes.

Sem o veto, o artigo estaria por incentivar a pejotização, visto que os fiscais não teriam a prerrogativa de executar o seu poder de oficio que é autuar e fiscalizar atos que atentam contra o direito trabalhista, obrigando o empregado a ajuizar uma reclamação trabalhista perante o poder judiciário pleiteando a sua condição, porém, nem todos sabem que possuem este direito, e até o mo-mento de ingresso na justiça, várias verbas já poderão estar prescritas, ocasionando reflexos ainda mais severos na vida do obreiro. Além do mais, diversos empregados não ajuizariam a ação, pois muitos não gostariam de “manchar” seu currículo profissional com tal informação. O fiscal do trabalho que verificar a situação fraudulenta tem o condão de corrigi-la, transformando a prestação de serviços em um genuíno contrato de empregado, de acordo com a competência disciplinada no artigo 21, XXIV Constituição Federal13 para tanto.

O mercado de trabalho mostra-se cada dia mais enxuto, crises financeiras globalizadas assus-tam a sociedade constantemente, e os trabalhadores, por sua vez, veem-se na situação de não ter

(11) BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 4ª Ed. São Paulo: LTr, 2008. P 180.(12) TURCATO, Sandra; RODRIGUES, Rosualdo. PJ é artifício para sonegação de direitos. Revista ANAMATRA, Brasil, Ano XVII. n° 55 p. 11-15, 2º semestre de 2008. 64 p.(13) Artigo 21 CF. Compete à União: XXIV - organizar, manter e executar a inspeção do trabalho;

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saída e se rendem a situação tratada. Por fim, o direito do trabalho não serve apenas para regular as relações sociais entre trabalhadores e suas possíveis soluções, também é utilizado para tutelar o empregado, que na maioria das vezes encontra-se na situação de hipossuficiência, acabando por se sujeitar ao poder de comando arbitrário do empregador. Os princípios mostram-se muito importantes nessas ocasiões, visto que no mundo dos fatos os acontecimentos ocorrem mais rapidamente do que no campo do direito positivado, e recorremos a eles para o deslinde da situação, encontrando uma solução justa e equilibrada.

Ademais, também existem movimentos a favor da transformação da pessoa física em pessoa jurídica, complicando o estudo sobre o evento. Gostaríamos que ficasse claro que não se quer evitar a transformação da pessoa física em pessoa jurídica, empresários surgem diariamente, mas com o ver-dadeiro fim de uma empresa, qual seja administrar uma sociedade empresária. O que não desejamos é que isso encubra uma verdadeira relação de emprego. Empresas devem ser criadas e representam desenvolvimento dentro da sociedade, mas em nenhum momento esse desenvolvimento deverá passar por cima dos direitos trabalhistas e muito menos fraudando a legislação em vigor, camuflando uma relação de emprego que deve ser calcada nos seus devidos princípios. Cada instituto deve ser aplicado onde couber, sem romper barreiras existentes entre as suas classificações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 4ª Ed. São Paulo: LTr, 2008. 1384 p.

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. São Paulo. Disponível em < http://www.trt2.jus.br>. Acesso em 09 jun.2013.

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Minas Gerais. Disponível em <http://www.mg.trt.gov.br>. Acesso em 14 jun.2013.

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Bahia. Disponível em <http://www.trt5.jus.br> Acesso em 20 jun.2013.

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região. Espírito Santo. Disponível em <www.trt17.gov.br>. Acesso em 20 jun.2013.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em <http://www.tst.gov.br> Acesso em 14 jun.2013.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. 1312 p.

RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr. 4ª Ed. 1996, 315 p.

TURCATO, Sandra; RODRIGUES, Rosualdo. PJ é artifício para sonegação de direitos. Revista ANAMATRA, Brasil, Ano XVII. n° 55 p. 11-15, 2º semestre de 2008. 64 p.

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Montesquieu e o riscoda igualdade extrema

Lúcio Antônio Machado Almeida1

INTRODUÇÃO

Este pequeno ensaio buscará analisar a preocupação desenvolvida por Montesquieu no Livro VIII, especialmente, o capítulo III, sobre a igualdade extrema. Ponto crucial nas democracias contemporâneas é o de saber o limite da igualdade, qual a igual-dade que queremos em uma democracia?2 Igualdade material? Somente igualdade formal? Uma igualdade complexa? Uma igualdade liberal? Uma igualdade social nos moldes socialistas? Enfim, há pouco ou quase nenhum consenso sobre o tema. Da perspectiva do limite da igualdade é que tentaremos refletir a partir da análise do pensamento do autor.

1. O princípio próprio da democracia: virtude política

Montesquieu ressalta como princípio próprio da democracia o princípio da virtude política, assim ele declara:

Il ne faut pas beaucoup de probité pour qu’un gouvernement monarqhique ou un gouvernement despo-tique se maintienne ou se soutienne. La force des lois dans l’un, le bras du prince toujours levé dans l’autre, règlent ou contiennent tout. Mais, dans un état populaire, il faut un ressort de plus, qui est la VERTU.3

A razão dada pelo autor é que na história em uma monarquia, onde quem manda executar as leis se julga acima das leis, logo, tem-se necessidade de menos virtude do que em um governo popular, ao passo que, quem manda executar as leis é também destinatário destas leis. Portanto, em uma democracia, remetente e destinatário das leis se confundem.4 Na dimensão da igualdade política, está a de participar da construção das leis, via escolha dos legisladores ou mesmo, modernamente, por mecanismos de participação direta. Na dimensão da igualdade jurídica está em ser destinatário dessas mesmas leis. Ademais, a igualdade política é corolário da participação do cidadão, naquilo que Aristóteles definiu como cidadão naquele que tem a “capacidade de participar na administração da justiça e do governo”,5 na sua teoria do Estado, esboçada no livro III da obra Política.

Por outro lado, a ausência da virtude política, pode ter consequências não desejadas em uma república, podendo levá-la a corrupção. Elementos nefastos para república, como ambição, governo dos homens e tantos outros vícios políticos resultam no fim do Estado. As leis que são frutos da parti-cipação política passam a não ser mais executadas, como bem observou Montesquieu:

(...) Lorsque, dans un gouvernement populaire, les lois ont cessé d’etrê exécutées, comme cela ne peut venir que de la corruption de la republique, l’État est déjà perdu.6

(1) Professor de Direito da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre e Ulbra Torres. Doutorando em Direito pela UFRGS, Mestre em Direito pela UFRGS, Advogado. Assessor da Diretoria Legislativa da CMPA, avaliador das Revistas eletrônicas do PPGD-UFRGS e da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Uberlândia. (2) Sobre a Democracia, Ver: A Democracia na Constituição de 1988, de Luis Fernando Barzotto, autor analisa os três tipos de democracia, e destaca a democracia deliberativa como o modelo próprio da democracia brasileira. Inimigos íntimos da democracia, de Tzvetan Todorov, autor destaca o perigo da tirania dos indivíduos, colocando em risco a própria concepção de bem comum e soberania. (3) MONTESQUIEU. De L’Esprit des Lois. Avec des notes de Voltaire, de Crevier, de Mably, de La Harpe, etc. Paris: Garnier, 1922, p. 20.(4) Ce que jê dis est confirmé par le corps entier de l’histoire, et est très conforme à la nature des choses. Car Il est clair que dans une monar-chie, où celui qui fait exécuter les lois se jugue au-dessus des lois, on a besoin de moins de vertu que dans um gouvernement populaire, où celui qui fait exêcuter les lois sent qu’il y soumis lui-memê, et qu’il en portera le poids. (MONTESQUIEU, p. 20). (5) ARISTÓTELES. Política. Portugal: Vega, 1998, 1275a, 22. (6) MONSTESQUIEU, p.20.

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2. Dois valores que a igualdade extrema corrompe: Autoridade e a hierarquia

Montesquieu declara que há dois fatos que corrompem a democracia. O primeiro fato é a desigualdade, quando ocorre a perda do espírito da igualdade. O segundo fato é a igualdade extrema, quando se procura ser igual àquele que escolheu para comandá-lo. Assim declara:

Le príncipe de la démocratie se corrompt, non seulement lorsqu’on perd l’esprit d’egalité, mais encore quand on prend l’esprit d’égalité extrême, et que chacun veut être égal à ceux qu’il choisit pour lui commander.7

Disso decorre, também, a ameaça a dois valores que Montesquieu entende como necessários para a preservação da democracia, a autoridade e a hierarquia.8 Sobre o temor da perda da autoridade e da hierarquia, e a perda da virtude, assim ele ilustra:

Il ne peut plus y avoir de vertu dans la république. Le peuple veut faire les fonctions des magistrats; on ne les respecte donc plus. Les deliberations du sénat n’ont plus de poids; on n’a donc plus d’égards pour les sénateurs, et par consequent pour les vieillards, on n’en aura pas non plus pour les pères; les maris ne méritent pas plus de deference, ni les maîtres plus de soumission. Tout le monde parviendra à aimer ce libertinage; la gêne du commanndement fatiguera comme celle de l’obéissance. Les femmes, les enfants, les esclaves n’auront de soumission pour personne. Il n’y aura plus moeurs, plus d’amour de l’ordre, enfin plus de vertu.9

3. Análise de caso: A paridade universitária

Aplicaremos a tese da negativa da igualdade extrema de Montesquieu ao caso brasileiro da paridade universitária, em que alunos exigem a mesma participação absoluta na eleição de reitores da mesma forma que os professores nas Instituições Universitárias10. Entendemos claro caso de romper com a autoridade do professor, pois o professor tem como finalidade, grosseiramente, passar o conhe-cimento, com isso, a autoridade é mais que necessária para a ideia de permanência do conhecimento. Ao se confundir professor e aluno, a própria possibilidade de preservação e a busca da verdade ficam bastante comprometidos, em especial, nas universidades.

Outro aspecto é a hierarquia, onde aluno jamais pode se confundir com o professor, pois se isso ocorrer, o próprio processo de passagem do conhecimento fica bastante comprometido. Quem é o professor? Quem é o aluno? Embora reconhecessem o valor da pedagogia da relação, ela em si, só faz sentido na existência clara de quem é o professor, e de quem é o aluno. Logo, exigir igualdade extrema entre aluno e professor no processo de decisão da escolha de reitor, é por em risco a própria tarefa de ensinar, de busca da verdade e da permanência da verdade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do que foi apresentado, concluímos pela necessidade, nos dias atuais, da avaliação das me-didas que visam a igualdade, que não venham inviabilizar a própria democracia. É preciso virtude política para que a igualdade extrema não venha a ser aplicada.

(7) Ibidem, p. 108.(8) Definição de autorité: Pissance légitime. Influence morale: homme de grande autorité. Auteur, opinion dont on s’autorise. D’autorité, sans consulter personne, sans management. Pl. Représentants du pouvoir. Definição de hiérarchie: Ordre et subordination des rangs, des pouvoirs, des dignités. Classification d’éléments quelconques em série croissante ou décroissante. (LAROUSSE POCHE. Rio de Janeiro, 1984).(9) Ibidem, p.10-109.(10 ) Sobre o papel das instituições na perspectiva da justiça, ver: John Rawls, theory of justice.

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BIBLIOGRAFIA

ARISTÓTELES. Política. Portugal: Vega, 1998.

BARZOTTO, Luis Fernando. A democracia na constituição de 1988. São Leopoldo, Unisinos, 2003.

BOBBIO, Norberto. L’età dei diritti. Turim: Eunaudi, 1997.

LAROUSSE POCHE. Rio de Janeiro, 1984.

MONTESQUIEU. De L’Esprit des Lois. Avec des notes de Voltaire, de Crevier, de Mably, de La Harpe, etc. Paris: Garnier, 1922.

RAWLS, John. Theory of Justice. Massachusetts: Harvard, 1971.

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La causa en la insinuaciónconcursal del crédito

Carlos E. López RodRíguez1

Sumario

I. La indicación de la causa cuando el insinuante presenta un título valor de con-tenido dinerario

A. Posición que niega la carga de indicar la causaB. Posición que sustenta que la carga del insinuante se limita a la indicación de la causa de su créditoC. Posición que sustenta que el insinuante debe aportar prueba sobre la causa del crédito

II. Situaciones especiales

A. La indicación de la causa cuando el insinuante es portador mediato de un título librado por el concursadoB. Insinuación acompañada con chequesC. La causa en los créditos reconocidos por sentencia

Introduccción

La Ley de Declaración Judicial del Concurso y Reorganización Empresarial uruguaya n° 18.387 de 2008 (LCU) establece que todos los acreedores que integran la masa pasiva del deudor, deben insinuar sus créditos ante el síndico o el interventor que se haya designado en el concurso de su deu-dor2: los privilegiados especiales (art. 109)3, los privilegiados generales (art. 110), los acreedores con créditos sujetos a condición y litigiosos (art. 103), los acreedores subordinados (art. 111 y 112) y los acreedores quirografarios o comunes. La masa pasiva del concurso, de acuerdo a lo dispuesto en el art. 55, comprende a todos los acreedores del deudor, cualquiera sea su naturaleza, nacionalidad o domicilio, anteriores a la declaración del concurso, siempre que hayan verificado sus créditos4.

La LCU establece la necesidad de que la insinuación, además, de contener expresamente la solicitud de verificación, contenga una serie de detalles tendientes a hacer posible el cotejo del crédito con los libros y documentos del deudor. Los datos que se exigen serán, luego, las categorías utilizadas por el síndico o por el interventor para la confección de la lista de acreedores.

Entre otras cosas, en el n° 1 del art. 95 de la LCU, se exige que los acreedores, al insinuar

(1) Profesor adjunto efectivo (grado 3) en las carreras de Abogacía y Notariado de la Facultad de Derecho de la Universidad de la República, Uruguay. (2) “Insinuación” es una expresión utilizada por la doctrina para referirse a la presentación que deben realizar los acreedores para convertirse en acreedores concurrentes (Creimer Bajuk, Concursos, Ley n° 18.387 de 23 de octubre de 2008 [Montevideo, Fundación de Cultura Universita-ria, 2009], p. 55. En su acepción forense, significa presentar un instrumento público ante el juez competente para que éste interponga en él su autoridad y decreto judicial de aprobación (esCriChe, Diccionario razonado de legislación y jurisprudencia; real aCademia española, Diccionario de la lengua española [19 ed.]).(3) En el régimen anterior, los acreedores con garantía hipotecaria o prendaria (denominados “preferentes”), estaban exonerados del deber de verificar sus créditos. Se esgrimían dos argumentos: en primer lugar, en virtud de lo dispuesto en el art. 1.737 del CCom, estos acreedores no participaban del proceso concursal; en segundo lugar, los requisitos propios de constitución de estas garantías tornan indiscutibles la legi-timidad del crédito. Sin embargo, mezzera Álvarez recomendaba que, de todas formas, se procediera a verificarlos puesto que, eventualmente y por el saldo impago, podían asumir la condición de acreedores quirografarios. Además, el control del resto de los acreedores no debía descartarse porque la hipoteca o la prenda podía ser nula o anulable por haberse realizado en los períodos de sospecha (mezzera Álvarez, Curso de Derecho Comercial, t. 5, 4ª ed [Montevideo, Fundación de Cultura Universitaria, 1997], pp. 219 y ss.). Es, también, la recomendación de rodríguez olivera (Manual de Derecho Comercial uruguayo, v. 6, Derecho concursal uruguayo, t. 1, Quiebra [Montevideo, Fundación de Cultura Universitaria, 2005], p. 185).(4) Doctrinariamente, también, se la denomina “masa de acreedores” o “masa subjetiva” (mezzera Álvarez, op. cit., p. 215; rodríguez olivera, op. cit., p. 171.

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sus créditos, indiquen la causa de los mismos5. En el contexto de la LCU, la causa se refiere al hecho generador o fuente de la obligación y de su contrapartida, que es el crédito6. En el mismo sentido que en materia de títulos valores, la palabra “causa” refiere a la vinculación de cada crédito con el negocio jurídico al que deben su origen7.

I. La indicación de la causa cuando el insinuante presenta un título valor de contenido dinerario

En términos generales, se admite que el insinuante debe ser claro y explícito con relación a las circunstancias que explican el origen del crédito8. Sin embargo, la cuestión se vuelve controversial cuando el insinuante se presenta a solicitar la verificación de su crédito, acompañando un título valor de contenido dinerario. En este caso, las posiciones pueden ser reducidas a tres9.

A. Posición que niega la carga de indicar la causa

El libramiento de todo título valor supone una relación fundamental entre quien lo libra y su beneficiario, sin perjuicio de la existencia de un pacto cambiario, que es un convenio explícito o tácito entre los sujetos del negocio fundamental por el cual ellos acuerdan la creación y la posterior entrega de un título valor. La relación fundamental es la causa mediata de la creación del título valor; el pacto cambiario es su causa inmediata. La relación fundamental - contrato de compraventa, préstamo, de-pósito, etcétera - puede documentarse mediante la firma de un contrato por las dos partes (comprador y vendedor, prestamista y prestatario, depositante y depositario). Por el pacto cambiario las partes contratantes acuerdan que el comprador, el prestatario o el depositario emitan un título valor10.

En los juicios ejecutivos que se promueven con base en letras de cambio, vales o cheques, el demandado se encuentra impedido de presentar excepciones fundadas en su relación con el actor, según disponen, expresamente, el art. 108 del Decreto Ley de Títulos Valores n° 14.701 de 1977 y el art. 45 del Decreto Ley de Cheques n° 14.412 de 1975 (DLCh). Se entiende que la expresión “relaciones personales”, se refiere, entre otras, a la relación fundamental que fue causa de la creación del título valor. A esa particularidad del juicio ejecutivo cambiario, la doctrina la denomina “abstracción”11.

La indicación de la “causa” sólo sería exigible en los documentos causados como, por ejemplo, la factura. En el caso de los títulos valores de contenido dinerario, que son documentos abstractos, pareciera carecer de justificación12.

Sin embargo, corresponde advertir que la abstracción, estrictamente, no es un atributo de los títulos valores en sí mismos considerados13 y que se aplique sea cual sea el ámbito en que estos se presenten. Precisamente, ese atributo carece de toda aplicación en el Derecho concursal14.

Por el contrario, la LCU exige expresamente que el acreedor indique cual es la causa del

(5) Esta carga se encontraba ya en el art. 82 del Decreto Lei de Falências n° 7.661 de 1945 y se repite en el art. 9, n° II, de la Lei de Falências e Recuperação de Empresas n° 11.101 de 2005. Aparece, también, en los arts. 32 y 200 LCA (1995), aunque la carga de indicar la causa del crédito ya existía durante la vigencia de la Ley 19.551 de 1972.(6) galíndez, Verificación de créditos (Buenos Aires, Astrea, 1990), p. 197; padilla (h), “Algunas cuestiones sobre la eterna discusión respecto a la causa en la verificación de créditos con títulos cambiarios y la preferencia por exclusión concursal”, in: AA.VV., Derecho concursal (Buenos Aires, La Ley, 2005), p. 621; rodríguez masCardi, “La causa del crédito del acreedor concursal”, in: aa.vv. Sociedades y concursos en un mundo de cambios (Montevideo, Fundación de Cultura Universitaria, 2010), p. 553; rouillon, “El problema de la causa en la verificación de créditos. Evolución de la doctrina judicial”, Derecho Económico, año II, n° 13, agosto-setiembre (Buenos Aires, 1990), p. 20.(7) rodríguez masCardi et alt., Cuaderno…, p. 183.En la legislación brasileña se prefirió utilizar la palabra “origem”, expresión a la que la doctrina le ha dado el mismo sentido que nuestra doctrina atribuye a la palabra “causa” en la LCU. Así, por ejemplo, valverde sostiene lo siguiente:

“Por ‘origem’ se entende, em princípio, o negócio, o fato ou as circunstâncias de que provém a obrigação do falido. É a causa eficiente (causa efficiens), a causa certa, como diz o art. 120, III, do Cód. Comercial, da qual deriva a obrigação. Daí ser necessário, ainda mesmo para aqueles créditos que se materializam nos documentos, que lhe servem de forma legal (letras de câmbio, notas promissórias), a denúncia da causa que provocou o seu nascimento.” (valverde, Comentários à Lei de Falências, v. 2 [Rio de Janeiro: Forense, 1962] n.º 556, p. 14).

(8) rouillon, op. cit., p. 20; Tonón, Derecho Concursal. Instituciones generales, v. 1 (Buenos Aires, Depalma, 1992), p. 255.(9) algorTa morales, “Los títulos valores abstractos en la verificación concursal”, in: aa.vv. Sociedades y concursos en un mundo de cambios (Montevideo, Fundación de Cultura Universitaria, 2010), p. 466.(10) rodríguez olivera y lópez rodríguez, Manual de Derecho Comercial Uruguayo, v. 5, Derecho cambiario uruguayo, t. 1, Títulos valores (Monte-video, Fundación de Cultura Universitaria, 2010), pp. 54 y 55.(11) rodríguez olivera y lópez rodríguez, íd., pp. 53 y 54.(12) CÁmara, El concurso preventivo y la quiebra, vol. 1, (Buenos Aires, Depalma, 1978), pp. 665 y ss.(13) En este sentido, maffía advierte que la abstracción no es un atributo de los títulos valores sino un nombre técnico para referirse a las de-fensas excluidas en el juicio ejecutivo cambiario (maffía, “El deber de indicar la causa del crédito”, La Ley, t. 1978, C, p. 801).(14) rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 554.Esta ha sido la posición predominante en la jurisprudencia argentina. Así, por ejemplo, la Sentencia de la Cámara de Apelaciones en lo Civil y Comercial (SCCCom) - Sala I, de Buenos Aires, de 14/9/004 - desecha tajantemente las argumentaciones basadas en la abstracción de un cheque, bajo la argumentación siguiente:

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crédito que insinúa, sin excepciones. De modo que quien presente un vale, una letra de cambio o un cheque, también, debe indicar cuál fue el origen de la emisión del título (si el insinuante fuera su beneficiario inmediato) o cuál fue la relación fundamental que motivó la transmisión del título (de no existir tal inmediatez)15. La carga de insinuar los créditos abarca a todas las acreencias, incluyendo a los títulos valores16.

B. Posición que sustenta que la carga del insinuante se limita a la indicación de la causa de su crédito

En esta posición se aduce que el art. 95 de la LCU se limita a establecer que los insinuantes deben solicitar la verificación de sus créditos “indicando” la causa de los mismos. Esto ha llevado a que se sostenga – con base en cierta doctrina17 y jurisprudencia18 argentina - que la carga del insinuante se limita a la invocación del origen de su crédito19. Esa mera indicación sería suficiente para que el síndico o el interventor, investiguen la legitimidad del crédito insinuado20.

Esta posición se sustenta en la interpretación literal del art. 95 de la LCU, que se limita a exi-gir la indicación de la causa. La LCU no impone al insinuante carga probatoria alguna. La única carga probatoria se encuentra en el n° 2 del art. 95, referida a la acreditación de la existencia del crédito.

En esta posición, si no existen elementos que permitan sospechar la presencia de un acuerdo fraudulento, es suficiente con la presentación del título y una indicación razonable del negocio extra-cartular21. Descartada la connivencia fraudulenta entre el concursado y el insinuante, no habría razón para extremar los recaudos hasta el límite de exigir una prueba puntual y definitiva del negocio fun-damental22. En cambio, si se presume la posibilidad del fraude entre el concursado y alguno o algunos de los insinuantes, le correspondería al síndico o el interventor, la función de comprobar la ausencia o falsedad de la causa23.

En todo caso, en esta posición, el insinuante sólo debiera realizar un esfuerzo probatorio en la etapa incidental que, eventualmente, se hubiere generado a partir de la impugnación de la lista de acreedores presentada por el síndico o el interventor (art. 104)24. En este caso, como en todo proceso contencioso de conocimiento, cada parte tendrá la carga de la prueba de sus dichos25.

“… este tipo de proceso es sustancialmente un juicio de pleno conocimiento. Esto desecha como decisivo para el análisis del tema traído todas las reglas procesales que benefician la persecución de títulos abstractos por la vía ejecutiva… la vigente legislación concursal establece con alcance inequívoco la necesidad de que el acreedor exprese la causa de su crédito.”

Hasta tal punto se deja de lado el concepto de abstracción en materia concursal, que la jurisprudencia argentina se llegó a rechazar la ve-rificación de un pagaré, cuya causa era una compraventa de maquinaria, por no haber cumplido el vendedor con la entrega comprometida (SCNCom, Sala C, 27/9/968, LL, 138, p. 996, 23.944-S).Del mismo modo lo ha entendido el Superior Tribunal de Justicia (STJ) brasileño en reiterada jurisprudencia: ASTJ de 14/6/004, Recurso Espe-cial (REsp) 556.032/SP (DJ 20/9/004 p. 285); ASTJ de 01⁄10⁄991, REsp 10.208/SP (DJ 28/10/991 p. 15.254; ASTJ de 1⁄9⁄992, REsp 18.995⁄SP (DJ 3⁄11⁄1992 p. 19.762).En ASTJ, de 20/10/009, se sostuvo lo siguiente:

“Nas habilitações de crédito regidas pelo Decreto-lei 7.661⁄45, é imprescindível que seja demonstrada a origem do crédito, mesmo nas hipóteses em que o valor reclamado encontra-se lastreado em título de crédito dotado de autonomia e abstração... Não indicado o negócio, o fato ou as circunstâncias da quais resultariam as obrigações do falido, impõe-se a improcedência do pedido de habilitação do crédito.” (REsp 890.518/SC 2006⁄0213721-4, http://www.jurisway.org.br).

(15) rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 556.(16) rodríguez masCardi, íd., p. 551.(17) CÁmara, “La letra de cambio y el pagaré ¿se transforman en simple quirógrafo para admisión al pasivo concursal?, in: AA.VV., Homenaje al Profesor Rodolfo Oscar Fontanarrosa (Rosario, Universidad Nacional de Rosario, 1981), p. 59; esCuTi y junyenT Bas, op. cit., p. 200; junyenT Bas y riChard, “La concursalidad”, RDCO, 1995-B, p. 142; maffía, “Verificación del crédito sustentada en una sentencia pronunciada en juicio ejecutivo” (LL 1993 E, p. 1.040).(18) SCS Tucumán, “Hiriondo, Heraldo s/ concurso preventivo, Inc. de Verificación tardía del Banco Roberts” (LL, 1996 D, p. 205; DJ, 1996-2, p. 862).(19) algorTa morales, op. cit., pp. 466 y 472.(20) maffía, “Verificación del crédito…”, p. 1.040.(21) algorTa morales, íd., p. 467.(22) “De Tomasso, s/incid. de verificación por Chirighelli de Margarolli” (LL 1991 B, p. 80).(23) maffía, “El deber…”, p. 801; roiTman y di Tullio, “Prueba de la causa de los títulos de crédito en los concursos. Evolución jurisprudencial”, Revista de Derecho Privado y Comunitario, n° 14, Prueba II [Santa Fe, Rubinzal Culzoni, 1997], p. 229; CNCom., Sala C, 29/4/1983, Dirección Nacional de Recaudación Previsional c. Kiklos SA(24) Así se lo ha considerado en la jurisprudencia argentina. Así, por ej., en la SSCJ, de 17/9/008, causa C. 87.270, “Saint Germes. Quiebra. Incidente de verificación de crédito promovido por Granja Macris SA” se manifestó lo siguiente:

“… como esta Corte puntualizara, en el pedido de verificación todos aquellos que pretendan hacer valer sus derechos frente a la masa deberán indicar la causa del crédito, pero, una vez abierta la etapa incidental de revisión del crédito, será necesario probar la causa de la obligación (conf. Ac. 54.603, sent. del 8-IX-1998, “D.J.B.A.”, 155-366; Ac. 78.868, sent. del 2-X-2002; Ac. 78.568, sent. del 23-IV-2003; Ac. 79.573, sent. del 9-XII-2004.”

(25) algorTa morales, op. cit., p. 469; padilla (h), op. cit., p. 625; paolanTonio y moCCero, “Causa y verificación”, LL 1991 D, p. 509.

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C. Posición que sustenta que el insinuante debe aportar prueba sobre la causa del cré-dito

En la doctrina nacional y en nuestra jurisprudencia26 - así como en la doctrina27 y jurispru-dencia argentina y brasileña - se considera que no basta con la mera indicación del origen del crédito insinuado28. Se requiere que quien esgrime un título valor de contenido dinerario contra el concursado, aporte elementos demostrativos del origen de su crédito29. La falta de acreditación de la causa impide que los créditos sean verificados y que los insinuantes se conviertan en acreedores concurrentes30.

Consecuentemente, el acreedor, al presentarse, debe acompañar, no sólo los títulos valores donde consta su crédito sino, también, la prueba que acredite la existencia del negocio que dio origen a la creación o trasmisión del título valor que agregan a la insinuación31. Debe acompañarse, entonces, el contrato de donde surge la relación fundamental (compraventa, arrendamiento, transporte, seguro, etc.) o los documentos que prueben la ejecución de estos contratos (factura, carta de porte, etc.), u otros documentos de los cuales pueda surgir, en forma veraz, la causa del libramiento de los títulos32.

1. Fundamentación

La necesidad de acreditar el origen de los créditos que se insinúan no surge del texto de la LCU. Sin embargo, tal como establece el art. 137 del CGP, “corresponde probar los hechos que invo-quen las partes y sean controvertidos”. En el mismo sentido, el art. 139 dispone que “corresponde probar, a quien pretende algo, los hechos constitutivos de su pretensión”.

En última instancia, esta exigencia se justifica por la necesidad de verificación de la legitimi-dad de los créditos, con la finalidad de evitar que sean cometidos fraudes y abusos en detrimento de los verdaderos acreedores del concursado33. En particular, se advierte la necesidad de verificar que los títulos valores no fueron emitidos de favor, a los efectos de facilitarle al deudor la obtención de las mayorías necesarias para la aprobación de convenios34 o para lograr una vía indirecta para el recupero de parte de su activo, sea a través de los pagos acordados en el convenio con los acreedores concur-rentes o aun en el caso de liquidación de sus bienes35.

2. Moderación de la exigencia probatoria

Ha sido observado que una exigencia probatoria demasiado exigente podría acabar perjudi-cando a acreedores reales, licuando indebidamente el pasivo concursal36. Como contrapartida, ob-servan que acreedores falsos, en connivencia con el concursado, están en inmejorables condiciones para documentar la causa de sus créditos que, sin dificultad, aparecen asentados en la contabilidad de aquel37.

De allí que, tanto en la doctrina como la jurisprudencia extranjera, se advierte una tendencia a la atenuación de la carga probatoria que recae sobre el insinuante38. En este sentido, la doctrina argentina posterior a los plenarios Translínea y Difry, hizo dos precisiones.

En primer lugar, destacó que el propósito de los plenarios fue desbaratar eventuales manio-bras fraudulentas del deudor, a través de un abultamiento ficticio de su pasivo39.

En segundo lugar, la doctrina advirtió que los plenarios se dictaron en sendos incidentes de verificación tardía. El criterio impuesto por la doctrina plenaria, entonces, según algunos autores, sólo

(26) marTínez BlanCo, op. cit., p. 291; rodríguez masCardi, “La causa…”, pp. 553 y 558; rodríguez masCardi et alt., Cuaderno de Derecho Comercial (Montevideo, Fundación de Cultura Universitaria, 2010), p. 183(27) BosCh, “La causa del crédito del acreedor concursal y la interpretación del plenario”, LL, 1987, C, p. 187; fassi y geBhardT, Concursos y quiebras (Buenos Aires, Astrea, 1997) p. 113; ferrario, “Estructura de la insinuación de acreedores”, ED, 100, p. 1.007; migliardi, Concursos y procedimiento concursal (Buenos Aires, Depalma, 1982).(28) marTínez BlanCo, op. cit., p. 291; rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 558.(29) SCNCom, Sala C, 5/12/974, LL 1975 A, p. 792, sum. 32.190.(30) rodríguez masCardi et alt., Cuaderno…, p. 183; rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 551.(31) marTínez BlanCo, op. cit., p. 291; rodríguez masCardi et alt., Cuaderno…, p. 183; rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 553.(32) marTínez BlanCo, íd. ibíd.; riBera, Estado actual de la jurisprudencia sobre la verificación de títulos de crédito abstractos (Instituto de Dere-cho Concursal del Colegio de Abogados de San Isidro), p. 3.(33) ASTJ de 20/10/009, Recurso Especial nº 890.518 - SC 2006⁄0213721-4.(34) riBera, íd., p. 5; roiTman y di Tullio, op. cit., p. 222.(35) rodríguez masCardi et alt., Cuaderno…, p. 183; rodríguez masCardi, “La causa…”, pp. 553 y 554.(36) paolanTonio y moCCero, op. cit., p. 508. (37) maffía, “Verificación del crédito…”, p. 1.040; rivera, Instituciones de Derecho Concursal (Santa Fe, Rubinzal Culzoni, 1996), p. 260.(38) Esta tendencia se origina con la SCNCom, Sala E, de 22/08/1986, “Lajst, Julio s/ Quiebra s/ Incidente de impugnación de Crédito por López Yañez, Juan” (LL 1986 E, p. 67).(39) amadeo, “Verificación del cheque y pagaré, prueba de la causa”, LL, 1984-D, p. 732; BosCh, op. cit., p. 187; rouillon, op. cit., p. 22.

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sería aplicable a los supuestos de incidentes de verificación tardía y los de revisión, debido a que la propia naturaleza de los incidentes permite una amplitud de posibilidad probatoria acabada40.

La jurisprudencia argentina, a partir de 1986, sin perjuicio de asumir como principio la doctri-na plenaria, ha adoptando soluciones que flexibilizan dicha doctrina41. En este sentido, se ha resuelto que, a pesar de la inexistencia de prueba sobre la causa del crédito, la pretensión de verificación igualmente debe ser admitida si no existen indicios que permitan inferir la existencia de concilium fraudis42. La Cámara de Apelaciones en lo Civil y Comercial, Sala I, de la Provincia de Buenos Aires expresó esta idea en los términos siguientes:

“La télesis de esas decisiones plenarias no fue exigir una consumada demostración del crédito: imponer ese requisito importaría fácticamente la directa desestimación de toda insinuación fundada en títulos abstractos. Por el contrario, la ratio inspiradora de tales doctrinas plenarias fue evitar el ’concilium fraudis’ entre el presunto acreedor y deudor, en orden a impedir la creación de pasivos inexistentes, que pudiesen conducir a la aprobación de acuerdos preventivos por la sola voluntad del deudor.”43

Por otra parte, algunos fallos posteriores moderaron o adecuaron al caso, la línea de los ple-narios referidos, reduciendo la carga del insinuante a la presentación de un relato plausible de las circunstancias en que se desarrollaron los hechos y el aporte de elementos indiciarios que sustenten los mismos en forma suficiente para formar la convicción favorable de la Cámara4445. Así, por ejemplo, se admitió la verificación en virtud de la valoración de la regularidad de los asientos contables del insinuante46. En otro fallo, se atenuó la exigencia probatoria en función de que el insinuante era un endosatario que habría solicitado la falencia, resistida por el deudor47. En un sentido similar, se de-claró cumplido el requisito de la prueba de la causa de un crédito, en virtud del reconocimiento de la concursada y de la prueba testimonial aportada por el acreedor48.

II. Situaciones especiales

A. La indicación de la causa cuando el insinuante es portador mediato de un título libra-do por el concursado

El art. 95, n° 2, de la LCU no exige la indicación de la causa del título valor sino del crédito que presenta el insinuante. Por lo tanto, parece claro que al insinuante a quien se le ha transmitido un título librado por el concursado, debe limitarse a indicar cuál ha sido la causa de la transmisión que originó su crédito, esto es, las circunstancias determinantes de la adquisición del título49.

En el caso de endoso en procuración, la indicación deberá recaer en la relación fundamental existente entre su endosante y el endosante precedente50.

Naturalmente, en ambas hipótesis se repite la controversia que acabamos de reseñar en el numeral anterior, en cuanto a si alcanza con la mera indicación de la causa de la transmisión del cré-dito o si se requiere la acreditación de dicha transmisión. Sobre esta cuestión, la doctrina uruguaya mayoritaria insiste en exigir la acreditación de lo que se invoca. Entonces, en el caso de que un título valor librado por el concursado haya circulado y de que quien insinúa el crédito no sea el primer to-mador del título, le es exigible la carga de probar cuál es el negocio por el cual recibió el título, esto es, cuál fue la relación fundamental que motivó la transmisión del título51.

(40) roiTman y di Tullio, op. cit., p. 223. Contra: fusaro, Concursos: teoría y práctica de la Ley 19.551 [Buenos Aires, Depalma, 1981], p. 111; Tonón, op. cit., p. 256.(41) SCNCom, Sala E, de 13/9/990, “Lemes Bacigaluz, Carlos s/ conc. prev. s/ inc. de rev. prom. por Levy, Abraham” (LL, 1991 D, p. 507. (42) Jurisprudencia argentina:

• SCNCom, Sala D, de 23/12/003, “Fefer, Jorge”, http://litigantes.blogspot.com/2008.• SCCCom, Bahía Blanca, Sala 2, de 17/4/001, “De Simone, Néstor Hugo s/Inc. de Revisión, en autos: Videla, Felix Atilio. Concurso Preventivo”; • SCCCom, Bahía Blanca, Sala 1, de 13/3/001, “De Simone, Néstor Hugo s/ Incidente de Revisión, en autos: Carbonetti, Marta

Susana s/ Quiebra”;• SCNCom, Sala A, de 9/12/999, “Bolado, Francisco c/ Burguera, Frorian Aníbal s/ Concurso s/ Inc. de sentencia”.

(43) SCCCom de 14/9/004.(44) SCNCom, Sala D, de 22/06/996, “Nantes, Esteban y otros” (LL 1997, t. C, p. 984).(45) SCCCom de 14/9/004; SCNCom de 16/4/003, Sala B, “Belforte Uruguay SA s/Concurso Preventivo”, incidente de nulidad.(46) SCNCom, Sala E, de 4/6/986 (LL 1986 E, p. 178).(47) SCNCom, Sala C, de 9/03/001, “Abejorro S.A. s/ Quiebra s/Inc. de Revisión por García Jorge A.”, (ED 5/10/001).(48) SCNCom, sala D, de 8/8/986 (LL 1987 C, p. 187).(49) algorTa morales, op. cit., pp. 468 y 469; fassi y geBhardT, op. cit., p. 113; ferrer monTenegro, op. cit., p. 516; rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 556.SCNCom, en pleno, “Difry SRL”, 19/6/980 (ED 88, p. 583, LL 1980 C, p. 78, JA 1980 III, p. 169).(50) SCNCom, “Difry SRL”, 19/6/980.(51) ferrer monTenegro, op. cit., p. 516; rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 556. Contra: algorTa morales, op. cit., p. 468.

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B. Insinuación acompañada con cheques

El cheque común y, especialmente, el cheque de pago diferido, es comúnmente utilizado por el librador, en la práctica nacional, como instrumento para obtener un crédito, muchas veces prefe-rido por el acreedor, que se considera más garantizado porque además de la acción civil tiene en sus manos la acción penal, en el caso de haberse librado sin tener provisión de fondos52.

Como contrapartida, no puede ser utilizado el cheque – ni común ni diferido - como medio para garantir obligaciones preexistentes. Quien lo exija con ese fin o quien lo aceptare, comete el delito previsto por el art. 60 del DLCh. La aceptación o exigencia de un cheque como garantía del préstamo usurario es un agravante del delito de usura pero, a la vez, configura un delito autónomo.

La doctrina argentina entiende que debe rechazarse la verificación del crédito que se preten-de probar con cheques si, al mismo tiempo, no se prueba la relación causal, puesto que ellos no son un reconocimiento de deuda53. Incluso, la jurisprudencia argentina ha considerado que se debe ser todavía más severo en la exigencia de que el actor demuestre el ingreso del contravalor en el patri-monio del deudor, que motivara la emisión del cheque, si se tiene presente como ya se expresó varias veces, que el cheque no sirve por sí mismo para establecer la relación jurídica que podría existir entre el tenedor y el librador garante de su pago, ni menos aún para probar la causa de la obligación, a pe-sar de que puede ser invocado como principio de prueba por escrito que determina la admisibilidad, entre otras, de la prueba testimonial54. En este sentido se invocan algunos fallos de la jurisprudencia argentina de larga data55.

Por esta vía, no sólo se impide la obtención fraudulenta de las mayorías necesarias para la aprobación de convenios o el logro de una vía indirecta para el recupero de parte de su activo, sino que prospere en el ámbito concursal, la práctica corriente en nuestro medio de exigir cheques en garantía del préstamo que se otorga, a pesar de la sanción penal establecida en el art. 60 del DLCh.

Sin perjuicio de ello, en un fallo argentino se consideró que la presentación de un cheque con-figuraba un principio de prueba por escrito, que permitiría formar convicción al Tribunal en el sentido de la veracidad y legitimidad de la operación en la que el insinuante basó su reclamo56.

C. La causa en los créditos reconocidos por sentencia

La indicación de la causa es requerida por la LCU en el art. 95, al referirse a la insinuación. Siendo que el acreedor que cuenta con su crédito reconocido por una sentencia está eximido de ve-rificar su crédito, podría entenderse que, también, lo estaría respecto a indicar y acreditar la causa del mismo.

El reconocimiento judicial del crédito obtenido en un proceso de conocimiento, razonable-mente, exime al acreedor de reiterar el esfuerzo probatorio respecto a la legitimidad de su crédito. Sin embargo, quien solicita la verificación no opone la sentencia sólo frente al concursado que fue parte en el juicio sino frente a toda la masa de acreedores57.

Por otra parte, si el crédito que se denuncia fue objeto de un juicio ejecutivo, al argumento anterior se le agrega que sólo existiría cosa formal58. La sentencia ejecutiva no hace cosa juzgada material por no se consecuencia de un proceso de conocimiento. Es meramente el acto procesa que le reconoce habilidad ejecutiva a un documento, sin haber declarado derecho subjetivo alguno del reclamante59.

Además, en la providencia que inicialmente se dicta en el juicio ejecutivo, el juez no declara (como haría en un proceso de cognición) si existe el derecho sino que da como declarada su existencia, y ordena, por eso, su realización forzosa. En el decreto inicial no hay reconocimiento judicial alguno del crédito; la sentencia se limita a trabar u ordenar la traba del embargo, citar de excepciones al demandado y mandar llevar adelante la ejecución. Esta primera sentencia se dicta inaudita altera (52) Así lo observa marTiré, al fundamentar su voto en la SCNCom, “Difry SRL”, 19/6/980.(53) fassi y geBhardT, op. cit., p. 113.(54) SCNCom, “Difry SRL”, 19/6/980.(55) SCNCom, Sala A, de 31/10/968 (ED 27, p. 46); íd. Sala C, 22/11/968, (ED 27, p. 154). En contra: SCJ Salta, Sala II, 21/10/964, JA 1966 II, p. 348.En particular, la jurisprudencia argentina considera el de la SCNCom, “Difry SRL”, de 19/6/980, donde se expresó:

“que el solicitante de verificación en concurso, con fundamento en un cheque, debe declarar y probar la causa, entendidas por tal las circunstancias determinantes del libramiento por el concursado, si el portador fuese su beneficiario inmediato o las determinantes de la adquisición del título por ese portador, de no existir tal inmediatez.”

(56) SCNCom, Sala E, de 22/08/1986, “Lajst, Julio s/ Quiebra s/ Incidente de impugnación de Crédito por López Yañez, Juan”.(57) rodríguez masCardi et alt., Cuaderno…, p. 181.(58) rodríguez masCardi et alt., Cuaderno…, p. 182.(59) rodríguez masCardi, “La causa…”, p. 553.

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pars. Consecuentemente, en el juicio ejecutivo, la cognición judicial no se efectúa con la amplitud necesaria para obtener certeza respecto al derecho esgrimido por el actor60.

La eventual oposición del deudor se encuentra limitada dentro de un especial término preclu-sivo, transcurrido el cual, la orden de ejecución se convierte en irrevocable, no porque el juez esté convencido del crédito que el actor alega, sino porque el deudor ha decaído en su derecho a oponerse a la ejecución iniciada61. Esta posición ha sido sustentada en nuestra doctrina62 y jurisprudencia63.

(60) Chiovenda, Instituciones de Derecho Procesal Civil, v. 1 (1954), pp. 274 y 275.(61) plozl, Beitrage sur Theorie des Kiagerechts.(62) lagarmilla, Juicio ejecutivo y concurso de acreedores (1934); moreTTi, Juicio ejecutivo (1952), pp. 20 y 21; vÁsquez aCevedo, Concordancias y anotaciones del Código de Procedimiento Civil (1900), p. 5. zeBallos, Juicio ejecutivo (1952), p. 31; zeBallos, “El juicio ejecutivo en la Ley n° 13.355”, Revista El Derecho, n° 91, pp. 160 y 161.(63) SJLCivil de 4° t. (Berro Oribe), n° 322, de 16/08/961; LJU c. 639 (Garicoits); LJU c. 681 (Imhof); STA de 1er t., LJU c. 4.714 (Achard, Piñeyro, Sánchez Roge).

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Competências e habilidades adquiridas durante o curso de graduação em

Administração De Empresas napercepção dos alunos formandos

Neuri A. Zanchet1

Flavio Gabriel Paz Serpa 2

Resumo

O presente estudo procura identificar as competências e habilidades desenvolvidas pelos alunos da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDBPA), de acordo com a percepção dos formandos do ano de 2013 do Curso de Graduação em Administração. O tipo de pesquisa caracteriza-se como descritivo, de caráter quantitativo. Como desenho mais apropriado, optou-se por um sorveu interseccional. O universo da pes-quisa foi constituído por 40 formandos do ano de 2013. Os dados foram analisados utilizando-se a modalidade de distribuição de frequência como estatística descriti-va. Os resultados indicaram que as competências e habilidades mais voltadas a um posicionamento flexível e adaptável do aluno e a aspectos relacionados ao escopo individual e interno são mais bem avaliadas pelos formandos.

Palavras-chave

Graduação, administração, diretrizes curriculares, alunos formandos.

Abstract

This study aims at identifying the competences and abilities developed by students of the Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDBPA), according to the view of the 2013’s graduates of the business administration course. The research is characteri-zed as descriptive and quantitative. The research design is an intersectional sorveu. The universe of the study involved 40 graduates. Data were analysed using frequency distribution as descriptive statistics. Results indicated that the main skills and abili-ties were the ones aiming at a flexible and adaptable positioning and aspects related to the individual and internal scope.

Key words

graduate course, business administration, curricular guidelines, graduates.

Introdução

A Resolução nº 4, de 13 de julho de 2005, em consonância com a Lei nº 9.394 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996, institui as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do Curso de Graduação em Administração, em nível de bacharelado (CNE/CES, 2005; BRASIL, 2005), a serem observadas pelas Instituições de Ensino Superior (IES) em sua organização curricular.(1) Bacharel em Administração. Mestre em Ciências Sociais Aplicadas. Doutor em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul – Unisc. Consultor de Empresas e professor da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. [email protected](2) Bacharel em Administração pela Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: [email protected]

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Em linhas gerais, as DCN abordam o que deve constar no projeto pedagógico de curso, indicam quais serão as etapas que os cursos devem seguir e estabelecem como deverá ser a organização do curso, a execução do estágio curricular, os mecanismos de avaliação, com critérios definidos, e o perfil do formando no decorrer do curso e na época da sua conclusão, possibilitando o desenvolvimento de competências e habilidades específicas (GASPARIN, 2003).

De acordo com as leis que regem o ensino superior no Brasil, criaram-se espaços de ação que permitiram aos gestores desses cursos, os denominados coordenadores, a atuarem conforme as exigên-cias e configurações do ambiente social no qual a Instituição se estabelece, em termos de característi-cas locais, regionais e de mercado. Considerando esse contexto, o presente estudo procura identificar as competências e habilidades que a Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, na percepção dos alunos formandos do ano de 2013 do Curso de Graduação em Administração têm desenvolvido.

Este estudo está organizado em seis seções, sendo a introdução a primeira delas. Na segunda seção, apresentam-se os conceitos e significados de competência e habilidades. Na sequência, desta-ca-se o ensino de Administração no Brasil e a formação de profissionais em Administração. Seguem-se a metodologia e os resultados da pesquisa. Por fim, na última seção, apresentam-se as conclusões.

Conceitos e Significados de Competência e Habilidades

Os termos competência e habilidades são conceituados e compreendidos de diferentes manei-ras por diversos autores. De acordo com Deffune e Depresbiteris (2000, p.51) “as definições dependem dos autores em que foram baseadas, das metodologias de análise das atividades do mundo do trabalho e das maneiras como elas serão vertidas para o currículo”. Neste sentido, eles são produzidos de di-ferentes modos nos contextos em que são mobilizados, conforme explicitado nos exemplos a seguir.

As competências são as modalidades estruturais da inteligência, ou melhor, ações e operações que uti-lizamos para estabelecer relações com e entre objetos, situações, fenômenos e pessoas que desejamos conhecer. As habilidades decorrem das competências adquiridas e referem-se ao plano imediato do “sa-ber fazer”. Através das ações e operações, as habilidades aperfeiçoam-se e articulam-se, possibilitando nova reorganização das competências (INEP, 1999, p. 9).

Entendemos por competências os esquemas mentais, ou seja, as ações e operações mentais de caráter cognitivo, sócio-afetivo ou psicomotor que, mobilizadas e associadas a saberes teóricos ou experiên-cias, geram habilidades, ou seja, um saber fazer (BERGER, 1998, p. 8 e 2000, p.5).

Assim, as competências seriam entendidas como estruturas mentais organizadas em rede, responsáveis pela interação dinâmica entre os próprios saberes do indivíduo e os saberes já constru-ídos pela humanidade, pela incorporação de novos conhecimentos à bagagem cognitiva do aluno e pela aplicação desses saberes em novas situações, possibilitando, assim, a construção de novas com-petências. As habilidades, por sua vez, seriam o saber fazer em si, o que, consiste na conversão das potencialidades cognitivas em ação (BERGER, 1998).

De acordo com Perrenoud (1999), as competências praticamente equivalem à própria (re)ação eficaz em um tipo definido de situação a partir de toda uma bagagem cognitiva de saberes e experiên-cia. Já pela definição de Berger (2000), as competências ficariam no campo das faculdades mentais, cognitivas, sócio-afetivas ou psicomotoras que, ao serem estimuladas de uma forma ou de outra geram habilidades, essas sim, de caráter prático. Nesse sentido, as habilidades são entendidas como o saber fazer, ou seja, representam as dimensões práticas do conhecimento e seriam uma consequência da associação entre saberes e experiências mobilizados pelas competências.

No entanto, Dutra, Hipólito & Silva (1998) salientam que, para os autores como McClelland, & Dailey (1972) e Boyatzis (1982) que realizaram seus trabalhos nas décadas de 70 e 80, na maioria americanos, competência significa o conjunto de qualificações que um indivíduo detém para executar trabalho com nível superior de desempenho. Contudo, após a década de 80, outros autores como Le Boterf (1994); Zarifian (1996) e Jacques (1990), predominantemente europeus, contestaram esse con-ceito de competência, associando-o às realizações das pessoas, àquilo que elas provêem, produzem, entregam. Este segundo grupo percebe que o fato de uma pessoa possuir as qualificações necessárias para determinado trabalho não garante que elas sejam realmente utilizadas e, consequentemente, que se realize tal atividade produtiva (DUTRA, HIPÓLITO & SILVA, 1998).

Mclagan (1997) afirma que, no ambiente de trabalho, a palavra competência tem assumido di-versos significados normalmente alinhados a características dos indivíduos ou das suas atividades pro-dutivas e resultados decorrentes. Assim, a competência representaria a união das características pró-

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prias do ser humano e o desempenho alcançado em determinadas atividades profissionais exercidas.Segundo Ruas (1999), o conceito de competência, nos últimos anos, tem aparecido como uma

forma de repensar as interações entre pessoas, seus saberes e capacidades, e as organizações e suas demandas. O autor coloca que:

[...] a competência não se reduz ao saber, nem tampouco ao saber-fazer, mas sim à sua capacidade de mobilizar e aplicar esses conhecimentos e capacidades numa condição particular, onde se colocam recursos e restrições próprias à situação específica. Alguém pode conhecer métodos modernos de reso-lução de problemas e até mesmo ter desenvolvido habilidades relacionadas à sua aplicação, mas pode não perceber o momento e o local adequados para aplicá-los na sua atividade. [...] A competência, por-tanto, não se coloca no âmbito dos recursos (conhecimentos, habilidades), mas na mobilização destes recursos e, portanto, não pode ser separada das condições de aplicação (RUAS, 1999, p. 04).

Zarifian (2001, p. 68) considera a competência como a “inteligência prática de situações que se apóiam sobre os conhecimentos adquiridos e os transformam tanto mais quanto maior for a comple-xidade das situações”. Para o autor, existem dois fatores que tornam o indivíduo competente: o conhe-cimento social, ou seja, o conhecimento que ele herda da sociedade em sua trajetória histórica, e a inteligência prática, isto é, a compreensão das situações nas quais os conhecimentos são mobilizados.

Para Levy-leboyer (1996) as competências estão vinculadas tanto a uma tarefa quanto a um conjunto de atividades e são saberes articulados, realizados de maneira internalizada, uma vez que o indivíduo utiliza este saber no momento adequado, sem ter a necessidade de consultar regras básicas ou perguntar qual conduta adotar. Para essa autora, contudo, justamente por tratar-se de diferentes saberes tácitos, é difícil descrever e, por consequência, compreender, as características reais das competências.

Le Boterf (2003) coloca a competência com três eixos formados pela pessoa com biografia e socialização, pela sua formação educacional e pela sua experiência profissional. A competência é o conjunto de aprendizagens sociais e comunicacionais alimentadas pela aprendizagem e formação e a jusante por sistema de avaliações. Ressalta ainda que a competência é saber agir responsável e reconhecido pelos outros. É saber como mobilizar, integrar e transferir os conhecimentos, recursos e habilidades no contexto profissional.

Fleury e Fleury (2001) apud Lombardi e Nodari (2008, p. 35) definem competências indi-viduais como “um saber agir responsável e reconhecido, que implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos, habilidades, que agreguem valor econômico à organização e valor social ao indivíduo”.

Prahalad e Hamel (1990) trabalham o conceito no âmbito organizacional, referindo-se à com-petência como um conjunto de conhecimentos, habilidades, tecnologias, sistemas físicos, gerenciais e valores que geram um diferencial competitivo para a organização. Javidan (1998) coloca que as competências organizacionais constituem-se em um conjunto de habilidades e conceitos baseados em unidades estratégicas de negócios.

Assim, o tema competências, vem sendo comumente compreendido a partir de dois níveis: organizacional e individual. As competências organizacionais se baseiam no conhecimento das pesso-as, no trabalho das equipes, na estrutura e cultura organizacional. A competência individual envolve diretamente o indivíduo inserido em sua equipe de trabalho através de sua atividade prática, uma vez que sua rotina diária implica num saber aprender constante.

Neste sentido, as competências compreendem a soma dos conhecimentos presentes nas ha-bilidades individuais e nas unidades organizacionais. As habilidades correspondem à facilidade para utilizar as capacidades físicas e intelectuais.

Contudo, de acordo com Bateman e Snell (1998), as habilidades podem ser agrupadas em três categorias: habilidade técnica é poder desempenhar uma tarefa especializada que envolve certo método ou processo. Já as habilidades interpessoais e de comunicação influenciam o modo como o administrador trabalha com as pessoas. É uma das habilidades consideradas mais importantes pelos autores, em todos os níveis gerenciais, para se conseguir uma colocação, mantê-la e desempenhá-la bem. Em contrapartida, as habilidades conceituais e de decisão envolvem o reconhecimento de questões complexas e dinâmicas, o exame de fatores numerosos e conflitantes que influenciam essas questões e problemas, bem como a resolução de problemas para o benefício da organização e de todos os envolvidos.

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O Ensino de Administração no Brasil e a Formação de Profissionais em Administração

Como vimos, os termos competência e habilidades são conceituados e compreendidos de di-ferentes maneiras por diversos autores. Suas aplicações são múltiplas, assim como as incertezas sobre sua própria definição e sobre a função que eles vêm a cumprir na educação.

O ensino em Administração necessita de atualização constante para atender de forma rápida e eficaz as novas necessidades organizacionais. A exposição do estudante ao mundo organizacional e a diferentes contextos é fundamental.

Já no início da trajetória do ensino da Administração no Brasil, na década de 40, a área se de-parou com a necessidade crescente de formar sujeitos com determinadas competências e habilidades para lidar com as novas atividades exigidas pelo processo de industrialização brasileira.

De acordo com Martins (1989), o surgimento da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, e a criação da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP) re-presentaram um marco para as atividades de ensino e pesquisa de temas econômicos e administrativos no Brasil, tendo contribuído para o processo de desenvolvimento econômico do país.

A origem da FGV remonta à criação do Departamento de Administração do Serviço Público (DASP), em 1938. Este órgão tinha como finalidade, estabelecer um padrão de eficiência no serviço público federal e criar canais mais democráticos para o recrutamento de recursos humanos para admi-nistração pública, através de recursos de admissão. Em 1952, surge a Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP), criada pela FGV, que teve o apoio da ONU e da UNESCO para sua manutenção inicial. Posteriormente, esta Fundação cria a Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP). Para sua implantação, a FGV contou com apoio do Governo Federal, do Estado de São Paulo e da iniciativa privada, além do convênio firmado com o Desenvolvimento internacional do Governo dos Estados Uni-dos.

Já a USP, que surgiu em 1934 da articulação de faculdades já existentes e da abertura de novos centros de ensino, foi também, segundo Martins (1989), outra instituição relevante para o desenvol-vimento do ensino de Administração. Em 1946, foi criada a Faculdade de Economia e Administração (FEA), com o objetivo principal de prestar colaboração a empresas privadas e a todos os órgãos do serviço público. No entanto, essa Faculdade possuía apenas os cursos de Ciências Econômicas e Ciên-cias Contábeis, que tratavam de disciplinas relacionadas com questões de administração. O curso de Administração teve início apenas em 1963, quando a faculdade passou a oferecer os Cursos de Admi-nistração de Empresas e Administração Pública.

Em nove de setembro de 1965, mediante a Lei nº. 4.769, o exercício da profissão foi regula-mentado no Brasil. Inicialmente chamado de “Técnico de Administração”, o profissional diplomado no Brasil, em cursos regulares de ensino superior, oficial, oficializado ou reconhecido, cujo currículo seja fixado pelo Conselho Federal de Educação (CFE), nos termos da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961 que fixa as Diretrizes e Bases de Educação no Brasil (BRASIL, 1965). A fim de garantir o cumpri-mento destas, e de outras determinações contidas na lei, tornou-se necessária a criação de órgãos de classe que tivessem este objetivo. Com isso, em seus parágrafos 6º, 7º e 8º, a Lei 4.769/65 institui e define as funções do Conselho Federal de Administração (CFA) e dos Conselhos Regionais de Adminis-tração (CRA’s).

No ano seguinte à regulamentação da profissão, por meio do parecer n.º 307/66, aprovado em 08 de julho de 1966, o CFE fixou o primeiro currículo mínimo do Curso de Administração. Habilitava-se, de fato, o profissional para o exercício da profissão de Técnico de Administração, denominação da categoria alterada para “Administrador” por meio da Lei nº. 7.321, de 13/06/1985 (BRASIL, 1985).

O primeiro currículo mínimo do curso de Administração procurou agrupar matérias de cultura geral, objetivando o conhecimento sistemático dos fatos e condições institucionais em que se inseria o fenômeno administrativo; matérias instrumentais, oferecendo os modelos e técnicas da natureza conceitual ou operacional e matérias de formação profissional.

Esse currículo permaneceu em vigor até 1993, quando, então, foi substituído por um novo, aprovado pela Resolução n.º 2, de 04 de outubro de 1993, composto por matérias de formação básica instrumental, matérias de formação profissional, disciplinas eletivas e complementares e estágio su-pervisionado, bem como a duração do curso de administração (BRASIL, 1966; BRASIL, 1993).

Em 1996, a Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro (BRASIL, 1996), nos seus artigos 43 a 57, trata de questões relativas ao ensino superior, com o intuito de tornar o ensino superior mais eficaz, trazendo em seu contexto uma proposta que enfatiza a flexibilidade curricular. Em 1997, por meio do Edital nº. 04/97, a Secretaria de Educação Superior iniciou um processo de discussão de diretrizes curriculares dos cursos superiores com as IES, com o objetivo de adaptá-los a Lei das Diretrizes e Bases da Educação

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Nacional, que estabeleceu as normas gerais aplicáveis a todos os níveis e modalidades de educação. Os cursos de Administração criados após a Resolução nº. 02/1993 passaram a incluir o nome

das habilitações específicas na nomenclatura do curso, proporcionando uma grande diversificação dos cursos de Administração. Tal diversificação descaracterizou os cursos, pulverizando conteúdos e com-petências. Visando alterar essa tendência com prejuízo da identidade acadêmica do curso de Adminis-tração, procurou-se, em 2001, construir critérios de transição com vistas às novas DCN. Dessa forma, com o apoio do CFA e da Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Administração (ANGRAD), a Comissão de Especialistas de Ensino de Administração (CEEAD) elaborou uma recomendação com o objetivo de fixar critérios transitórios para pedidos de autorização de cursos de graduação em Adminis-tração até a aprovação das novas DCN. Essa recomendação teve como base, principalmente, a neces-sidade de resgatar a essência da profissão de Administrador no processo de ensino de Administração.

Em abril de 2002, foi aprovado o parecer da Câmara de Educação Superior (CES) do Conselho Nacional de Educação (CNE) nº. 0146/2002, instituindo as DCN do Curso de graduação em Administra-ção, modificado posteriormente pelo parecer CES/CNE nº. 0134/2003. O documento resultante de toda essa discussão ao longo dos anos é a Resolução nº. 01, do CNE de fevereiro de 2004, que instituiu as DCN para o Curso de Administração, posteriormente substituída pela Resolução nº 04, de 13 de julho de 2005 (CNE/CES, 2005; BRASIL, 2005).

Encontra-se nas Diretrizes Curriculares Gerais dos Cursos de Graduação, dentre outras, as especificações quanto ao perfil desejado do formando e às competências e habilidades, por curso. Tais Diretrizes são divididas em diretrizes comuns aos cursos e diretrizes específicas. Dentre as primeiras, têm-se aquelas que se referem ao projeto pedagógico, à organização curricular, aos estágios e ati-vidades complementares, ao acompanhamento/avaliação e à monografia/trabalho de conclusão de curso. Nas Diretrizes Específicas por Curso, encontra-se a definição do perfil desejado do formando, as competências e habilidades que devem ser possibilitadas na formação do estudante e os conteúdos curriculares.

No que se refere ao perfil desejado do formando do curso de graduação Administração, as DCN definem o seguinte:

capacitação e aptidão para compreender as questões científicas, técnicas, sociais e econômicas da pro-dução e de seu gerenciamento, observados níveis graduais do processo de tomada de decisão, bem como para desenvolver gerenciamento qualitativo e adequado, revelando a assimilação de novas informações e apresentando flexibilidade intelectual e adaptabilidade contextualizada no trato de situações diver-sas, presentes ou emergentes, nos vários segmentos do campo de atuação do administrador (BRASIL, 2005, p.2).

Também foram definidas as competências e habilidades que devem ser reveladas pelo profis-sional formado em curso de graduação em Administração, conforme se segue:

I - reconhecer e definir problemas, equacionar soluções, pensar estrategicamente, introduzir modificações no processo produtivo, atuar preventivamente, transferir e generalizar conhecimentos e exercer, em diferentes graus de complexidade, o processo da tomada de decisão;

II - desenvolver expressão e comunicação compatíveis com o exercício profissional, inclusive nos processos de negociação e nas comunicações interpessoais ou intergrupais;

III - refletir e atuar criticamente sobre a esfera da produção, compreendendo sua posição e função na estrutura produtiva sob seu controle e gerenciamento;

IV - desenvolver raciocínio lógico, crítico e analítico para operar com valores e formulações matemáticas presentes nas relações formais e causais entre fenômenos produtivos, administrativos e de controle, bem assim expressando-se de modo crítico e criativo diante dos diferentes contextos organizacionais e sociais;

V - ter iniciativa, criatividade, determinação, vontade política e administrativa, vontade de aprender, abertura às mudanças e consciência da qualidade e das implicações éticas do seu exercício profissional;

VI - desenvolver capacidade de transferir conhecimentos da vida e da experiência cotidianas para o ambiente de trabalho e do seu campo de atuação profissional, em diferentes modelos organiza-cionais, revelando-se profissional adaptável;

VII - desenvolver capacidade para elaborar, implementar e consolidar projetos em organiza-ções;

VIII - desenvolver capacidade para realizar consultoria em gestão e administração, pareceres e perícias administrativas, gerenciais, organizacionais, estratégicos e operacionais (BRASIL, 2005, p. 2).

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Assim, a formação profissional que busca desenvolver as competências e habilidades necessá-rias para os administradores exercerem suas funções e desempenhar seus papéis gerenciais em diver-sas áreas do setor público, privado e não governamental foi institucionalizado.

O curso de Administração deve ensejar condições para que o bacharel em Administração esteja capacitado a compreender as questões científicas, técnicas, sociais e econômicas da produção e de seu gerenciamento no seu conjunto, observados os níveis graduais do processo de tomada de decisão, bem como a desenvolver o alto gerenciamento e a assimilação de novas informações, apresentando flexibili-dade intelectual e adaptabilidade contextualizada no trato de situações diversas presentes ou emergen-tes nos vários segmentos do campo de atuação do administrador.

Contudo, qualquer que seja a área de atuação do administrador, o grande desafio repousa em o aluno que conclua o curso de graduação ter as competências e habilidades demandadas e, a partir destas, mobilizar conhecimentos em diferentes situações.

O Curso de Administração de Empresas da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre tem por objetivo formar profissionais que tenham capacidade de gerir empresas e/ou organizações, públicas e privadas, visando atingir resultados que visem ao desenvolvimento sustentável e responsável de re-cursos econômicos muitas vezes escassos, aplicando as mais modernas técnicas de gestão empresarial. O curso tem ainda o objetivo de desenvolver nos alunos a capacidade empreendedora para negócios próprios, característica que marca o seu currículo e que permeia as disciplinas, tanto de conteúdo técnico quanto humanístico.

Metodologia

O tipo de pesquisa realizado, neste estudo, caracteriza-se como descritivo. Segundo Malhotra (2001), a pesquisa descritiva tem como objetivo principal a descrição de algo, ao mesmo tempo que procura relatar como ocorrem certos fenômenos. No que se refere à natureza das variáveis pesqui-sadas, a pesquisa possui caráter quantitativo, pois permitiu a tradução em números das informações coletadas. Segundo Malhotra (2001, p. 155), “a pesquisa quantitativa procura quantificar os dados e aplicar alguma forma de análise estatística”. Nesse sentido, o estudo procurou identificar as compe-tências e habilidades desenvolvidas pelos alunos da FDBPA, de acordo com a percepção dos formandos do ano de 2013 do Curso de Graduação em Administração.

Como desenho mais apropriado para a presente pesquisa, optou-se por um sorveu interseccio-nal, em que os dados são tratados em um único momento, de uma amostra selecionada para descrever a relação entre variáveis em uma população na mesma ocasião (BABBIE, 1999). O universo da pesquisa foi constituído pelos 41 alunos formandos do ano de 2013, regularmente matriculados no Curso de Administração da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. Destes, 40 estavam presentes em sala de aula no período da pesquisa.

Os dados foram obtidos por meio da aplicação de um questionário estruturado, organizado em dois blocos: no primeiro, composto por quatro questões, solicitava-se um conjunto de informações destinadas à caracterização dos sujeitos. O segundo bloco continha 22 itens, colocados de forma ale-atória no questionário e baseados nas competências e habilidades sugeridas pelas DCN (BRASIL, 2005) para os Cursos de Administração. Essas questões foram respondidas por meio de uma escala Likert, com cinco possibilidades de respostas (discordo totalmente, discordo parcialmente, indiferente, con-cordo parcialmente, concordo totalmente).

Os dados coletados foram analisados de forma quantitativa, utilizando-se a modalidade de distri-buição de frequência como estatística descritiva. Segundo Appolinário (2006), este tipo de análise permite a organização e visualização dos dados de acordo com a ocorrência de diferentes resultados observados.

Apresentação dos Resultados da Pesquisa

A apresentação dos resultados da pesquisa inicia-se com a caracterização dos respondentes, os quais são classificados a partir de diferentes critérios. Assim, a pesquisa demonstrou que o público de formandos do curso de Administração de Empresa de 2013 da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDBPA) é, na maioria, feminino (55%). Esses alunos são jovens, com idade entre 20 e 30 anos (62%). Um número considerável de formandos cursou o ensino médio em escola pública (77,5%), demonstran-do que o ensino gratuito tem papel fundamental na educação do público-alvo.

A grande maioria dos respondentes (90%) exerce atividade remunerada integral, o que seria esperado em se tratando de curso noturno. O motivo pela escolha do curso divide-se entre a relação

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com o trabalho atual (55%) e obtenção de oportunidade no mercado de trabalho (40%), totalizando 95%. Quanto às questões relacionadas ao objetivo deste trabalho, que foi identificar as competências

e habilidades desenvolvidas pelos alunos da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (FDBPA), os resultados foram ordenados de forma decrescente a partir da maior pontuação dos itens com respostas favoráveis, ou seja, aqueles que obtiveram maior percentual em “Concordo parcialmente” e “Concordo totalmente”.

De maneira geral, o estudo revela que a percepção dos discentes é que a FDBPA tem consegui-do desenvolver as competências e habilidades sugeridas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN). Somando-se os valores “Concordo parcialmente” e “Concordo totalmente”, resulta um percentual médio positivo de 80%.

As competências e habilidades que aparecem em 1° e 2° lugares tiveram percentuais iguais a 95% para “Desenvolver a capacidade para transferir conhecimentos da escola para o ambiente de trabalho” e 95% para “Transferir conhecimentos adquiridos nas aulas a colegas e outras pessoas”

Estas competências e habilidades demonstraram que os alunos da FDBPA identificam relação e conseguem aplicar os conteúdos vistos no curso, em seus ambientes de trabalho, acompanhados de um senso de equipe. Provavelmente esses resultados estão relacionados com o fato de a maioria dos alunos exercerem atividade profissional, podendo, assim, ter oportunidade de vivenciar a teoria na prática. Essa característica também pode ter sido um dos maiores responsáveis pela 3° competência e habilidade - “Ter vontade de continuar a aprender” - com alta pontuação favorável (92,5%). Quando o aluno tem a possibilidade de verificar resultados reais enquanto estuda, percebe que estudar vale a pena, e que é uma das maiores, senão a maior, oportunidade de evolução profissional e pessoal.

As competências e habilidades listadas em 4° lugar, “Ter consciência da qualidade e das impli-cações éticas do meu exercício profissional”, ao 15° lugar “Tomar decisões em situações de diferentes graus de complexidade”, obtiveram pontuação favorável, que variou de 87,5% a 75%, apresentando grau semelhante de aproveitamento na percepção dos alunos. Entre elas, estão características relacio-nadas a aspectos cognitivos dos alunos, como ética, comunicação, expressão, iniciativa e tomada de decisão, bem como aspectos mais complexos ao exercício da profissão do administrador, relacionada a pensamento crítico, conscientização e pensamento estratégico.

As respostas posicionadas do 16° ao 18° lugar obtiveram percentuais favoráveis praticamente iguais a 72,5%, e representaram as competências “Introduzir modificações nos processos de gestão”, “Ter consciência do que seja um trabalho de qualidade” e “Atuar preventivamente de maneira a an-tecipar a ocorrência de problemas”.

Adicionalmente, é importante salientar as competências e habilidades que obtiveram menor percentual favorável, a saber, “Desenvolver capacidade para realizar consultoria em gestão e admi-nistração”, em 19° lugar (67,5%), “Atuar preventivamente de maneira a antecipar a ocorrência de problemas”, em 20° lugar, (65%) e “Desenvolver raciocínio lógico, crítico e analítico para operar com valores e formulações matemáticas presentes nas decisões organizacionais”, em 21° lugar (57,5%), e “ter capacidade para elaborar, implementar e consolidar projetos em organizações”, em 22° lugar (57,5%). Esses resultados dão oportunidade à FDBPA refletir e desenvolver atividades intra e extraclas-se, de forma a proporcionar melhor desenvolvimento dessas questões.

Conclusões

O objetivo do estudo foi identificar as competências e habilidades desenvolvidas pelos alunos da FDBPA, de acordo com a percepção dos formandos do ano de 2013 do Curso de Graduação em Administração. O estudo revela que na percepção dos discentes a FDBPA tem conseguido desenvolver as competências e habilidades sugeridas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN).

Percebe-se também que as competências e habilidades mais bem avaliadas ficam no campo das faculdades mentais, cognitivas, sócio-afetivas ou psicomotoras que, ao serem estimuladas de uma forma ou de outra geram habilidades, de caráter prático (Berger, 2000). Assim, as habilidades são entendidas como o saber fazer, ou seja, representam as dimensões práticas do conhecimento e seriam uma consequência da associação entre saberes e experiências mobilizados pelas competências.

Contudo, as competências e habilidades que envolvem a capacidade para realizar consultoria em gestão e administração são vistas com mais cautela pelos futuros administradores. Tais competên-cias e habilidades envolvem atuar preventivamente de maneira a antecipar a ocorrência de proble-mas, bem como desenvolver raciocínio lógico, crítico e analítico para operar com valores e formula-ções matemáticas presentes nas decisões organizacionais e ter capacidade para elaborar, implementar e consolidar projetos em organizações

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Consumerização: Aspectos de segurança, produtividade e fidelização

Adriana Paula Zamin Scherer1

Luis Fernando Fortes Garcia2

Vítor Dorneles Pimentel3

Resumo

Há uma tendência impulsionada por tecnologias simples, acessíveis e móveis que permite às pessoas passarem mais tempo conectados à Internet, e com o crescente número de dispositivos que são lançados simultaneamente, tornou-se comum os usu-ários levarem seus dispositivos pessoais para as empresas e a usá-los para realizar as suas tarefas pessoais e profissionais. A este movimento deu-se o nome de Consumeri-zação. O objetivo deste trabalho, que é um ensaio teórico, é compartilhar o conhe-cimento sobre esta tendência de mercado e enfatizar alguns dos principais aspectos que a envolvem. Dentre os aspectos considerados importantes, surge a relação entre consumerização e a fidelidade, bem como a relação entre consumerização e produ-tividade. Adicionalmente destaca-se a relação entre consumerização e segurança que é uma discussão fundamental, por envolver o risco sobre o acesso indevido às informações e a responsabilidade deste fato. Aspectos estes, que todas as organiza-ções, independentemente de porte e área de atuação, devem estar preparadas para explorar, conhecendo os pontos positivos e negativos.

Palavras-chave

Consumerização, Fidelização de funcionários, Produtividade, Segurança

Abstract

There is a tendency driven by simple, affordable and mobile technology that allows people to spend more time connected to the Internet, and the increasing number of devices that are released simultaneously, it has become common for users to bring their personal devices for business and use them to achieve their personal and pro-fessional tasks. This movement gave the name of Consumerization. This work, which is a theoretical essay is to share knowledge on this market trend and emphasize some of the key aspects that surround it. Among the aspects considered important, there is the relationship between consumerization and fidelity, as well as the relationship between productivity and consumerization. Addicionality there is the relationship between consumerization and security is a fundamental discussion because it invol-ves the risk of unauthorized access to information and accountability of this fact. These aspects, all organizations, regardless of size and area, should be prepared to explore, knowing the positives and negatives.

Keywords

Consumerization, staff loyalty, productivity, safety

(1) Mestre em Ciências da Computação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, RS - Brasil. [email protected](2) Doutor em Ciência da Computação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre, RS – Brasil e da Universidade Luterana do Brasil – Campus Canoas, RS – Brasil. [email protected](3) Bacharelando do curso de Sistemas de Informação da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. [email protected]

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1. Introdução

O avanço da tecnologia e o fácil acesso da população a aparelhos portáteis tais como, smar-tphones, notebooks, tablets, entre outros, ocasionou uma revolução no acesso à Internet móvel, fazendo com que as pessoas passem um tempo maior acessando e navegando na Internet. Como con-sequência deste fato, as pessoas passaram a levar para seus locais de trabalho os próprios dispositivos e os utilizando para resolver assuntos relacionados ao trabalho.

Tal fato, conforme indicação ocorrida pelo Instituto Gartner, em meados de 2005, foi chama-do de Consumerization, ou também como Consumerization in IT, em português, o termo foi apenas adaptado, não havendo uma tradução literal para o português, logo ficou denominado como Consu-merização (GARTNER, 2005). Juntamente com o termo consumerização, o movimento que implica em os funcionários levarem para os seus ambientes de trabalhos os seus dispositivos também é conhecido como BOYD (Bring Own Your Device).

Este artigo tem o objetivo de explorar aspectos e relações envolvendo a consumerização e seus impactos para as empresas. Para atingir este objetivo, desenvolveu-se uma extensa pesquisa bibliográfica na área e nas suas áreas relacionadas. Para maior compreensão do assunto, além desta introdução, este artigo está dividido em 04 (quatro) seções: na seção 02 (dois) serão discutidos as-pectos sobre a fidelização, comentando casos de como a consumerização pode trazer benefícios para as corporações; na seção 03 (três) serão abordadas questões sobre a produtividade de funcionários em relação a consumerização, resumindo em como a mesma pode ser usada a favor das corporações; na seção 04 (quatro), as questões de segurança, que englobam um dos temas mais debatidos sobre consumerização, fator este que gera tantas discussões sobre como chegar ao melhor método para ter o controle absoluto, ou quase, da segurança das informações das corporações junto aos dispositivos pessoais dos funcionários; e, por fim, na seção 05 (cinco) serão expostas as considerações finais.

2. Relação entre Consumerização e Fidelização de Colaboradores

De acordo com D’Arcy (2012), em um mundo que anda cada vez mais rápido, a separação entre ambiente de trabalho e ambiente privado, está desaparecendo e uma parcela de responsabili-dade por este movimento é da tecnologia. Ao mesmo tempo em que novos dispositivos móveis mais avançados e com mais recursos vão sendo lançados a cada dia, o trabalho móvel está aumentando e se espalhando por diversas áreas do setor produtivo.

Paralelamente a este fato, estão entrando no mercado de trabalho os nascidos entre meados dos anos 80 até meados dos anos 90, e são os indivíduos que compõem um grupo chamado de Geração Y. Segundo Curbete (2012), são características marcantes desta geração a intimidade com as novas tecnologias, o uso sistemático das redes sociais, a impaciência, a capacidade de executar diversas tarefas ao mesmo tempo e a necessidade de estarem sempre conectados e extremantes informados. Além disso, D’Arcy (2012) afirma que os indivíduos desta geração são fortemente conectados com sua carreira profissional, ao mesmo tempo em que mantém uma identidade pessoal muito forte. Com isto, tem surgido um novo perfil de profissional que escolhe o dispositivo para realizar as tarefas de forma mais otimizada, não levando em consideração se a tarefa é de cunho pessoal ou profissional, o dispositivo deverá ser o mesmo.

Para Renner (2012), a empresa precisa saber lidar com a questão de que seus funcionários levarão sim seus dispositivos móveis para o local de trabalho e precisa tirar proveito desta realidade. Illegra (2012) vai mais adiante e afirma que para estes profissionais, seus telefones inteligentes se tornaram uma extensão do corpo e que eles se sentem invadidos quando um empregador os obriga a desistir de seu próprio dispositivo em prol da utilização padronizada de equipamentos da empresa. Em concordância com este aspecto, Illegra (2012) ainda afirma que dois em cada cinco profissionais da geração Y aceitariam receber um salário menor para atuar em um ambiente mais flexível e que permitisse a utilização do próprio dispositivo. Já empresas menos flexíveis com maiores salários não atraem tanto este novo perfil de profissional, ou seja, empresas que adotam a prática da consumeri-zação tendem a atrair e fidelizar estes novos profissionais.

Intel (2012) relaciona 04 (quatro) necessidades apontadas por profissionais desta nova cate-goria. São elas:

a) Reciprocidade: cada vez mais as empresas cobram disponibilidade, em qualquer dia e horário, de seus funcionários. Em contrapartida, eles desejam ter a possibilidade de es-colher qual a tecnologia que lhes permite trabalhar remotamente com mais eficiência;

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b) Adaptação: os funcionários gostariam que suas empresas se adaptassem às suas prefe-rências de dispositivos ao invés de ficarem presas aos antigos padrões já estabelecidos;

c) Velocidade de acesso: eles querem acessar a informação de que precisam o mais rápido possível e sem limitar a capacidade de acesso à informação;

d) Relevância: este novo grupo de funcionários gostaria de contribuir com decisões acerca de novas aquisições tecnológicas ou ao menos a liberdade de escolher a sua própria tecnologia.

Intel (2012) vai além destas colocações e afirma que profissionais desta nova categoria, aban-donariam os seus empregos em razão de políticas restritivas para o uso de novas tecnologias. Ao passo que, com a consumerização cria-se um novo cenário dentro das empresas, reduzindo os conflitos e as mantendo atrativas para esta nova geração de funcionários.

3. Relação entre Consumerização e Produtividade

A produtividade na era da consumerização é um dos aspectos ainda em expansão junto às corporações. Numa primeira análise surgem dois aspectos importantes a serem considerados. O pri-meiro, de acordo com Computer World (2012), diz respeito aos funcionários se sentirem felizes porque eles podem usar a sua tecnologia preferida na empresa, misturando a vida pessoal e profissional em um único dispositivo, e assim funcionários felizes tornam-se mais produtivos. Já o segundo aspecto está centrado justamente nesta felicidade gerada pelo uso de sua tecnologia favorita no ambiente de trabalho, quando o funcionário sente-se confortável com seu dispositivo e com isto deixa de fazer seu trabalho para realizar atividades pessoais, tais como navegar nas redes sociais, responder seu e-mail pessoal e, por que não fazer uso de jogos.

A partir deste segundo aspecto, a empresa pode adotar diferentes posturas de ação, tais como:

• Permitir parcialmente o acesso desde que o mesmo não interfira na relação do empregado com o trabalho;

• Não permitir o acesso para garantir o foco do funcionário junto à corporação, mantendo assim a rigidez do sistema para assim, ter um controle total sobre o tempo que o mesmo permanece no estabelecimento;

• Não permitir no horário de trabalho e permitir parcialmente nos horários de intervalo que a empresa fornece para os empregados;

• Apenas definir a proibição sem nenhum tipo de argumentação junto aos empregadores (COM-PUTER WORLD, 2012).

No entanto, Savvas (2012) descreve que já é possível verificar que muitos funcionários estão trabalhando até 20 (vinte) horas adicionais por semana, como resultado da política de BYOD adota-da nas empresas. E, sendo que, estas horas adicionais trabalhadas não estão sendo remuneradas. O motivo pelo qual os funcionários estariam trabalhando mais e não se importando em não receber por estas horas, se deve ao fato de que muitos se sentem felizes mesmo trabalhando em seus horários de descanso em troca da flexibilidade sobre como e onde trabalham.

Ainda de acordo com Savvas (2012), os funcionários utilizando seus dispositivos móveis pesso-ais se sentem incentivados a ajudar suas empresas a permanecerem competitivas.

4. Relação entre Consumerização e Segurança As análises elaboradas nas seções 2 e 3 abordaram, respectivamente, os aspectos de fideliza-

ção e de produtividade, consideradas por Unisys (2012) como pontos positivos à empresa no processo de consumerização. No entanto, Unisys (2012) também afirma que este mesmo processo que traz benefícios importantes para a empresa, faz com que os setores de segurança da informação precisem encontrar formas de tratar os desafios gerados, à medida que os novos dispositivos e seus aplicativos conectam-se à infraestrutura da empresa.

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Ainda sobre esta perspectiva, pode-se afirmar que o fator que gera os desafios para a área de segurança da informação nas empresas, é que cada novo dispositivo que se conecta, representa um risco potencial. Bradley (2012) justifica esta colocação ao afirmar que quando uma empresa fornece equipamentos para seus funcionários, eles são protegidos, gerenciados e atualizados por sistemas de segurança da empresa e, além disto, os equipamentos são distribuídos já com uma política de uso. No entanto, com a consumerização os equipamentos estão codificados de acordo com o seu proprietário, fato esse que muda dependendo do perfil de cada usuário.

Já Martinelli (2012) acrescenta à lista de problemas com a segurança, as formas mais primiti-vas de risco: o furto e a perda. Nestes casos, os dispositivos usados pelos funcionários, ao serem furta-dos ou perdidos, e carregando dados estratégicos da empresa, permitirão que pessoas de má intenção acessem os dados das empresas. Novamente, o problema está relacionado ao fato que Bradley (2012) expõe, sobre a falta de gerência corporativa sobre os dispositivos pessoais.

Outra questão muito abordada é a constante frequência de infecções através de malwares e vírus, através de e-mails mal intencionados e sites com links maliciosos. Esse tipo de ataque atinge todas as categorias de dispositivos com acesso a Internet, chegando também aos dispositivos móveis, como smartphones e tablets. Em quase 90% (noventa por cento) dos casos, a infecção de vírus ocorre por falha do próprio usuário por falta de conhecimento ou descuido (BEREZIN, 2012).

Já para Pinheiro (2013), a melhor abordagem sobre segurança envolvendo a consumerização deve partir da premissa de que, “não importa de quem é o dispositivo, e sim de quem é a informa-ção”. Sendo assim, cabe à empresa definir a sua política de BYOD, onde precisam estar claras as regras acerca da utilização do equipamento, além de estabelecer quais os requisitos de segurança que o funcionário deverá cumprir com seu dispositivo e quais as obrigações e limites de uso do mesmo.

Ainda Pinheiro (2013), sugere algumas regras que as empresas deveriam estabelecer em suas políticas de BYOD. Entre elas estão:

• Obrigatoriedade do funcionário em utilizar mecanismos de segurança em seu dispositivo, tais como: bloqueio por senha e apagamento remoto;

• É responsabilidade do funcionário manter softwares de segurança, tais como antivírus, fi-rewall e antispam, ativos e atualizados;

• O funcionário é responsável por realizar backups periódicos dos dados armazenados em seus dispositivos móveis;

• O colaborador é responsável também por quaisquer softwares e conteúdos instalados em seu dispositivo particular, além de ter o dever de apenas fazer uso de ambientes seguros de conexão;

• Um apontamento sugerindo que a empresa não é responsável por qualquer dano, extravio ou perda ocorrida no dispositivo do colaborador e que se algum destes eventos ocorrerem, a

empresa deverá ser imediatamente informada.

Para o funcionário resta aceitar as regras estabelecidas pela empresa no que tange a utiliza-ção dos dispositivos particulares, sob a pena de ter a entrada destes, bloqueada para os perímetros físicos da empresa. No entanto, esta ação somente será legítima, por parte da empresa, se as regras estiverem definidas nas políticas e normas de segurança da informação (PINHEIRO, 2013).

5. Considerações Finais

Este artigo trouxe à luz a discussão sobre alguns dos aspectos – positivos e negativos - que envolvem a consumerização, pois se sabe que ela é uma tendência que não tem volta.

Inicialmente, foi abordada a positividade da fidelização de funcionários através da prática de consumerização, pois para a nova geração de trabalhadores, é mais importante permanecerem conectados com seus próprios dispositivos dentro das empresas, do que receberem salários maiores. Sobre este aspecto, cabe às empresas tirarem proveito desta nova realidade para fazer com que seus colaboradores sejam cada vez mais comprometidos e dedicados.

Posteriormente, abordou-se a relação entre a consumerização e a produtividade, mostrando que neste aspecto, as empresas precisam estar mais atentas aos resultados obtidos. Pois, assim como a produtividade pode aumentar por que os funcionários se sentem felizes por estarem conectados a

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sua vida particular através dos dispositivos móveis particulares, ela também pode diminuir, justamente pelo mesmo motivo, já que os funcionários por estarem próximos de suas vidas particulares podem perder o foco de suas atividades profissionais e passar o tempo realizando tarefas de lazer.

E, finalmente, o artigo trouxe discussões envolvendo as questões de segurança e, nesta rela-ção, o mais importante é que a empresa se estabeleça como proprietária das informações que o fun-cionário irá carregar em seu dispositivo particular e para possuir este privilégio, ele precisa se adaptar as regras da empresa. Logo, tão importante quanto estabelecer a propriedade das informações é estabelecer regras claras que o colaborador precisará seguir, independentemente de sua disposição. A partir do momento que o funcionário decide levar seu próprio dispositivo para o ambiente de trabalho, ele deve aceitar as regras estabelecidas pela empresa, mas isto só será possível se a empresa dispuser de regras e normas claras para isto.

Ao concluir, pode-se afirmar que as empresas não tem outra saída a não ser conhecer a con-sumerização através de suas possibilidades e fraquezas sendo este o melhor caminho a ser seguido. Com isto, acredita-se que este artigo poderá ajudar sendo fonte de informações para que gestores de Tecnologia da Informação possam preparar suas empresas para a consumerização.

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Fauna silvestre, entre prateleirase traficantes

Carolina Brandt Gualdi1

Resumo

O tráfico de animais e a exploração dos seres vivos como meros adornos tem em sua base a demanda do mercado consumidor. Além dos fatores envolvidos no mercado ilegal de animais silvestres, mesmo tratando-se de animais com origem legal ou ani-mais domésticos, quando a posse não ocorre de forma responsável e aliada ao conhe-cimento necessário sobre a espécie adquirida, os riscos para o animal em questão, pessoas envolvidas e ao meio ambiente são muitos, sendo de extrema importância a implementação de políticas públicas de caráter preventivo e educativo que regu-lamentem a guarda responsável, promovendo o bem-estar dos animais e exigindo posturas adequadas dos guardiões.

Palavras–Chave

Animais de estimação. Tráfico de animais silvestres. Consumo. Conservação.

Abstract

The illegal trade of wild animals and the exploitation of living beings as mere adorn-ment have its base in the demand of the consumer market. In addition to the factors involved in the illegal wildlife market, even dealing with animals or pets with legal origin, when the possession does not occurs with responsibility and coupled with the necessary knowledge about the species gained, the risks to the animal in question, people involved and the environment are many, been of extremely importance the implementation of preventive and educational public policies that govern the re-sponsible guard, promoting the welfare of animals and requiring proper postures of guardians.

Keywords

Pets. Traffic of wild animals. Consumption. Conservation.

Introdução

O costume de manter animais de estimação nos acompanha desde os primórdios da civiliza-ção, sendo atualmente um setor do mercado altamente lucrativo (Anfalpet, 2010). Além disso, tal hábito é um dos grandes propulsores do tráfico de animais silvestres (Lima, R., 2007), atividade que abrange a captura, o transporte e a distribuição ilegal de animais, de suas partes ou derivados (Wyler e Sheikh, 2008). Estima-se que 95% da fauna silvestre comercializada têm como origem o tráfico de animais, o qual ocupa o terceiro lugar entre os mercados ilegais. (IBGE, 2004). Esta atividade ilícita tem como característica ser um crime transnacional, de modo que para seu combate faz-se necessária (1) Especialista em Direito Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS (2012) e graduada em Ciências Bio-lógicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS (2008). Tem experiência na área de Ecologia, com ênfase em Conservação, atuando principalmente nos seguintes temas: animais de estimação, comércio de animais, tráfico de animais silvestres, direito ambiental e ética aplicada a animais. Atualmente é pesquisadora associada ao Laboratório de Bioética do Instituto de Biociências da Pontifícia Universi-dade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).Endereço (residencial): Rua Antenor Lemos, nº 127. Menino Deus. Porto Alegre/RS. Telefone: (51) 9314.1775E-mail: [email protected]

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a cooperação internacional, a exemplo da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies de Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção - CITES (Elliott, 2009). Baseada em princípios do desen-volvimento sustentável, a CITES atua no combate ao tráfico de animais por meio da regulamentação do comércio, mecanismo internalizado sob a forma de instruções normativas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA (Lima, G., 2007, 2008).

Sob a ótica do mercado, os animais são meros produtos que, no universo do tráfico, precisam sobreviver à cadeia de processos gerenciada por fornecedores e intermediários até, quando conse-guem, chegar às mãos dos consumidores. Estes são os principais mantenedores do tráfico, pois só há tráfico porque existe demanda pelo “produto” traficado. Entretanto o caráter de “produto” se estende aos animais envolvidos no comércio legalizado, visto se tratar de uma ótica também do consumidor, construída em função da atual sociedade de consumo. Como resultado tem-se, por exemplo, inúmeros animais abandonados, vítimas de maus-tratos e a introdução de espécies invasoras.

Diante dessa realidade, o presente trabalho pretende expor brevemente o caminho que os animais envolvidos no tráfico têm que ultrapassar para chegar ao consumidor, bem como questionar a atual sociedade de consumo, mantenedora dessa atividade, e apresentar a iniciativa desenvolvida pelo município de Porto Alegre na busca da conscientização da população quanto à responsabilidade envolvida no comércio e criação de animais.

O produto fauna no âmbito legal

Visto que as leis regem o comportamento da sociedade, faz-se necessário uma breve exposi-ção do conceito de fauna, vítima de traficantes de animais silvestres e seus respectivos fregueses, no universo jurídico. Classificada até então no âmbito legal como objeto de propriedade, em 1967 a fauna é definida pela Lei de Proteção à Fauna (Lei nº 5.197/67, art. 1º) como compreendendo “os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais”. Tal dispositivo ainda instituiu que a mesma é propriedade do Estado, proibindo sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha (Brasil, 1967). Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 (art. 225), a fauna (silvestre, exóti-ca ou doméstica) adquire o status de bem de natureza difusa, um bem de uso comum do povo, de modo que a titularidade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado incide sobre a coletividade e cada um de seus integrantes (Stifelman, [200-]). Segundo a Stifelman ([200-]), esse status não se confunde com os bens públicos de nenhum ente da federação e é protegido pelos dispositivos do or-denamento jurídico ambiental mesmo tratando-se de propriedade privada. Entretanto, como ressalta Santana ([200-]), fundador da Revista Brasileira de Direito Animal, as alterações na natureza jurídica dos animais silvestres pouco contribuíram para que sua integridade física e psíquica fosse assegurada, pois, nas palavras do autor, “[...] se antes eles eram considerados coisas de ninguém agora são de to-dos, o que no fundo é a mesma coisa” (Paginação irregular). Com o passar do tempo, novas definições foram estabelecidas, a exemplo da trazida pela Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98, art. 29, § 3°), que a conceitua como “[...] todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras”.

Num contraponto ao desenvolvimento de conceitos na esfera jurídica ambiental, os ani-mais, classificados por meio de expressões como “bens móveis suscetíveis de movimento próprio”, “coisas sem dono sujeitas à apropriação”, ou adjetivos do calão de “coisa” ou “caça” pelo Código Civil brasileiro de 1916, não obtiveram modificação significativa em sua denominação em tal esfera, ainda sendo classificados como bens suscetíveis de movimento próprio pelo art. 82 do Código Civil de 2002 (Levai, [200-?]). Ao mesmo tempo, a legislação brasileira estabelece que a fauna é um bem de uso comum do povo, um bem difuso indivisível e indisponível, salientando a contradição que ultrapassa definições e alcança o sentimento e a relação humana com os outros animais. Apesar da diversidade de especificações, é lamentável dizer que no universo do tráfico e do comércio uma é suficiente: produto.

O tráfico de animais no Brasil

Gerador de impactos significativos nas esferas econômica, social e ecológica, nada se compara aos danos e ao sofrimento impostos aos animais envolvidos nesta atividade. Mesmo com a carência generalizada de dados a respeito do tráfico de fauna, estimativas supõem que a atividade seja respon-sável pela retirada de 38 milhões de animais silvestres do Brasil anualmente, sendo que de cada dez

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animais traficados somente um sobrevive (RENCTAS, 2001). Todo o processo envolve uma série de personagens que podem ser sintetizados em três grupos:

fornecedores, intermediários e consumidores (Lima, R., 2007; RENCTAS, 2001). O primeiro tem como característica ser uma população de baixa renda, interiorana, sem acesso à educação e saúde, que utiliza a fauna para alimentação e que encontrou no comércio da fauna uma fonte de renda adicional (Lima, R., 2007; RENCTAS, 2001). Geralmente são populações historicamente incitadas a explorar os recursos ambientais de forma extrativista, não tendo consciência do processo que estão desencade-ando (RENCTAS, 2001).

Os intermediários primários são responsáveis por fazer a conexão entre as zonas rurais (de captura) e os centros urbanos (zonas de venda), abrangendo barqueiros, caminhoneiros, ambulantes, entre outros (Lima, R., 2007; RENCTAS, 2001). Destes, a “mercadoria” é encaminhada para pequenos e médios traficantes que estabelecem contato com os traficantes envolvidos em organizações criminosas maiores, atuantes dentro e fora do País (RENCTAS, 2001). Acredita-se que do volume total de animais envolvidos no tráfico, por volta de 60% supram a demanda interna e os 40% restantes sejam destinados ao mercado internacional (Lima, R., 2007).

No Brasil, a maior parte dos animais silvestres comercializados ilegalmente tem como origem as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, de onde são retirados e transportados (com o emprego de métodos cruéis para não atrair a atenção da fiscalização) pelas rodovias federais para as regiões Sul e Sudeste (Lima, R., 2007; RENCTAS, 2001). No interior do País, os animais têm como destino final, prin-cipalmente, a venda em feiras livres nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo ou sua exportação nos portos e aeroportos dessas regiões (Lima, R., 2007; RENCTAS, 2001). Ao saírem do Brasil, os animais são destinados tanto a países não signatários da CITES quanto a países signatários, havendo muitas vezes o fornecimento de documentação falsa seguido de exportação (RENCTAS, 2001). Na fronteira com as Guianas, Venezuela e Colômbia, por exemplo, a retirada de animais silvestres brasileiros é intensa em função da escassa fiscalização (RENCTAS, 2001). As grandes organizações criminosas envolvem comer-ciantes (além de pesquisadores, zoológicos e criadouros) de diversas nacionalidades, familiarizados com o esquema de corrupção, táticas de suborno, fraude e falsificação de documentos (Lima, R., 2007; RENCTAS, 2001).

Já o último grupo, os consumidores, é formado por diversas modalidades, destacando-se, en-tre elas, o comércio de animais de estimação. Há, ainda, colecionadores particulares, zoológicos ile-gais, a indústria química e farmacêutica, produtores e estilistas de moda, proprietários de curtumes, etc (Lima, R., 2007; RENCTAS, 2001). A manutenção de animais em cativeiro é uma característica que atinge todas as classes sociais, seja na posição de troféus, de companheiros, de alimento, de capital; de um modo geral, o grupo social não determina padrões de consumo e comportamento, havendo necessidade de investimento em políticas públicas que abranjam a população em sua totalidade, inde-pendentemente de peculiaridades (Gualdi, 2008).

Consumo versus conservação – a fauna como um produto

A subsistência e o desenvolvimento de inúmeras nações, a exemplo do Brasil, encontram-se calcadas no comércio da fauna e flora silvestres, bem como de produtos advindos destes (Lima, G., 2008). Em função disso e da ligação que o meio ambiente possui com as atividades comerciais humanas (pois é o meio onde as atividades humanas acontecem e, consequentemente, recebe o impacto que tais atividades geram, impacto que no final das contas repercutirá na qualidade de vida humana), o meio ambiente adquiriu foco central nas relações internacionais contemporâneas (Queiroz, 2009). O desenvolvimento econômico, baseado principalmente em atividades extrativistas dos recursos natu-rais, por outro lado, disponibiliza o capital necessário para que haja investimento em conservação ambiental (Queiroz, 2009). Assim, a princípio, com o manejo adequado e uso ponderado dos recursos, é possível aliar desenvolvimento econômico e proteção ao meio ambiente (Queiroz, 2009). Entretanto, a abertura comercial potencializa características como consumo, produção e novas tecnologias (Quei-roz, 2009), características com as quais, talvez, a sociedade e as políticas públicas ainda não estejam preparadas para lidar com a devida cautela.

O tráfico de animais e a exploração dos seres vivos como meros adornos tem em sua base a demanda do mercado, a atual sociedade de consumo. Sociedade esta em que o sujeito autônomo é desconstruído e assume a forma de um sujeito fragmentado, que já não age a partir de seus princípios e valores, mas sim em função das necessidades dessa sociedade de consumo, do modelo de vida ideal pré-moldado para toda a população (Pereira, 2011). De acordo com Pereira (2011, p. 131): “Pode-se dizer que foi construída uma subjetividade completamente heterônoma, que elabora uma raciona-

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lidade cognitiva, moral e estética, que, por sua vez, obriga o indivíduo a racionalizar como tal.” E continua (p.132):

[...] não é por acaso que se percebe na efemeridade dos anúncios e no descompromisso com o dura-douro, pois o espetáculo tem o fim em si mesmo. Constitui-se no desenrolar do processo de construção dos sujeitos e dos objetos à sua volta; no que eles se tornam ou deixam de se tornar tem pouco valor, o importante é que se constitua o trajeto de produção, a venda e a constituição do espetáculo, a autor-reprodução do sistema econômico.

No início da nossa caminhada, as necessidades dos indivíduos se restringiam as relações entre os homens e com os outros seres vivos, não tendo como base o acúmulo de bens (Pitton, 2009). Tal relação sofreu uma grande transformação com o passar do tempo, marcada pela degradação do ser para o ter. Essa transformação foi, infelizmente, ainda mais longe, passando da concepção do ter para a do parecer (Pereira, 2011). Seguindo o mesmo raciocínio, em meio à realidade relatada, o indivíduo adquire o status de consumidor para não se tornar um excluído do sistema e da sociedade de consumo (Pereira, 2011). O meio ambiente, que já era um objeto, tem seu status de mercadoria mais firmemen-te alicerçado atualmente, ampliando-se os produtos disponíveis (serviços ambientais, por exemplo) (Pereira, 2011).

Ortigoza e Cortez (2009, p.7) também debatem o assunto:

Uma explosão do consumo surge como modo ativo de relação das pessoas com os objetos, com a coleti-vidade e com o mundo, servindo de base ao nosso sistema cultural. Os objetos não estão mais relacio-nados exclusivamente à sua utilidade, mas ao prestígio simbolizado por sua posse.

Nesse sentido, os animais, que para muitos ainda não perderam o status de objeto, acabam sendo vítimas da concretização da aparência almejada pelas pessoas.

O desafio principal encontra-se no indivíduo-consumidor, moldado por princípios econômi-cos, sociais e psicológicos que determinam que quanto maior for o consumo (ainda que de “produtos verdes”), maior será o sucesso econômico e pessoal (Pitton, 2009). Com efeito, a educação, como sempre, é a peça chave para a tomada de consciência e mudança de comportamento (Pitton, 2009).

Como questiona Levai (2006), lamentavelmente, o uso econômico da fauna e a finalidade recreativa dos animais resultam no consentimento normativo (a exemplo do estabelecido na lei dos rodeios, Lei nº 10.519/02) de práticas que envolvem maus-tratos, contrariando o estabelecido em nossa Carta Magna (art. 225, §1º, inciso VII). A exploração animal acaba se tornando legítima em meio a conflitos normativos somados à permissividade de alguns dispositivos legais, favorecendo a continui-dade de atitudes humanas que ocorrem às custas do sofrimento animal. O autor também expõe que tal comportamento vai de encontro ao princípio geral da atividade econômica (art. 170, VI, da CF), o qual estabelece a observância da ética em qualquer atividade que envolva a exploração da natureza e dos animais. Ainda, ressalta que os conflitos são aparentes, são favoráveis para os envolvidos nas prá-ticas em questão, pois a legislação brasileira protege constitucionalmente todos os animais de atos de crueldade e maus-tratos. E destaca que o direito à vida e à integridade física não pode perecer, pelo princípio da proporcionalidade, diante de interesses econômicos ou comerciais. Mas como “vigência não se confunde com eficácia”, cabe ao bom senso colocar em prática tais mandamentos (Levai, 2006, p. 177).

Iniciativa: o cenário do município de Porto Alegre

Nos últimos anos, a Prefeitura Municipal de Porto Alegre (RS) deu um grande passo no que se refere à proteção da fauna, do meio ambiente e da sociedade e à mudança de atitude e de consciên-cia da população frente aos animais, ao criar, pela primeira vez no Brasil, a Secretaria Especial dos Direitos Animais (SEDA) por meio da Lei nº 11.101/2011. A SEDA tem como objetivo a formulação e o estabelecimento de políticas públicas que visem à saúde, à proteção, à defesa e ao bem-estar animal em Porto Alegre e, para isso, possui no âmbito de suas competências: a fiscalização de maus-tratos aos animais; a articulação e promoção de políticas para os animais, bem como a promoção de eventos para discussão destas; a organização, gerenciamento e capacitação de grupos voluntários relacionados com a causa animal; entre outros (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2011a, art. 2º e 3º).

A Secretaria também é responsável por administrar as atividades públicas municipais relativas aos animais domésticos, o que lhe confere atividades como (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2011a, art. 4º): “o monitoramento dos animais de rua, visando ao seu bem-estar, bem como à segu-

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rança da população” e o “licenciamento e a fiscalização de estabelecimentos destinados à criação, ao comércio, à hospedagem, ao transporte, ao alojamento, às feiras e à prestação de serviços envolvendo ou utilizando animais”.

A questão da criação e comércio de animais foi tema de debate na Câmara Municipal de Porto Alegre, resultando na Lei Complementar nº 694/12 que consolida a legislação sobre criação, comércio, exibição, circulação e políticas de proteção de animais no Município. Tal normativa representa um avanço por tratar de inúmeras problemáticas resultantes da relação do homem com animais não-humanos, cabendo a análise de alguns segmentos.

Já nas Disposições Preliminares, em meio a conceituações, o regulamento demonstra seu caráter inovador e o avanço que sua implementação representa ao trazer para a esfera normativa o conceito de guarda responsável, até então tratado em pouquíssimas leis municipais, como na Lei nº 13.131/01 do Município de São Paulo (Lei da Posse Responsável), pioneira ao levantar tais aspectos, sob a denominação de propriedade responsável, e na Lei nº 5.131/02 do Município de Piracicaba, de modo incipiente, sob a denominação de tutela responsável, o que já foi um avanço quanto à termino-logia. Conforme a lei complementar em questão, guarda responsável é (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2012, art. 2º, VII):

o conjunto de compromissos, assumidos pela pessoa natural ou jurídica – guardiã ou responsável – ao adquirir, adotar ou utilizar um animal, que consiste no atendimento das necessidades físicas, psicológi-cas e ambientais e de saúde do animal e na prevenção de riscos que esse possa causar à comunidade ou ao ambiente, tais como os de potencial de agressão, de transmissão de doenças ou de danos a terceiros.

De acordo com o artigo 5º da referida lei, a adoção e a guarda responsável devem ser o foco de campanhas de conscientização das quais estabelecimentos que exponham, comercializem ou prestem serviços relacionados a animais domésticos participarão, e esses locais devem manter em áreas visíveis ao público cartazes educativos sobre tais temas.

O Capítulo II traz em sua primeira seção a questão da responsabilidade pelos animais, esta-belecendo que o guardião do animal é o responsável por sua manutenção em perfeitas condições de alojamento, saúde, alimentação e bem-estar, sendo proibida qualquer prática de maus-tratos (prática esta definida de forma exemplificativa pelo art. 8º da lei). As próximas seções trazem de forma es-miuçada questões relacionadas à saúde pública, à segurança da população quando se trata de animais agressivos, ao funcionamento de canis e gatis, à comercialização de animais, entre outros.

A comercialização de animais é abordada na Seção V, Capítulo II, que, além de trazer exi-gências para que se alcance o bem-estar dos animais durante sua permanência em estabelecimentos comerciais, traz proibições, como (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2012, art. 23, grifo nosso):

I – expor, manter ou comercializar animal silvestre, salvo quando autorizado pelo órgão ambiental nacional competente;II – comercializar ou manter em estabelecimento comercial animais doentes;III – manter, no estabelecimento comercial, animais que não aqueles expostos à comercialização; e IV – expor animais em vitrinas de estabelecimentos comerciais.

A análise do inciso I faz-se necessária porque, caso o mesmo seja lido sem a devida atenção, pode parecer um grande avanço, quando, na verdade, a exceção de proibição do comércio de silves-tres para os casos autorizados pelo órgão ambiental nacional competente, infelizmente, acaba com tal possibilidade. De qualquer forma, o fato de ser vedada a manutenção de animais no estabelecimento comercial além dos expostos para comercialização já é relevante, pois tal possibilidade permitiria a existência de animais vítimas de maus-tratos e do tráfico sem que os mesmos chamassem a atenção, guardando-os somente para o momento da venda.

Na Seção VIII a lei discorre sobre circulação de animais em locais públicos, tendo como foco a garantia da segurança da população. Para isso, por exemplo, condiciona o passeio de cães em vias públicas à condução dos mesmos por pessoas com idade e força para o controle do animal; impõe o uso de focinheira e enforcador de aço para o passeio com cães de guarda, impõe ao guardião ou condutor a responsabilidade de recolher os dejetos do animal em espaços públicos; entre outros. A lei ainda versa sobre as posturas que serão exigidas em outros cenários, como escolas, locais de uso coletivo, e casos de cães-guias.

As políticas públicas também têm destaque, sendo instituídos o Programa de Proteção aos Ani-mais Domésticos, o Programa de Conservação da Fauna Silvestre, o Fórum de Debates sobre as Políticas de Proteção aos Animais e o Disque-Denúncia de Maus-Tratos aos Animais.

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Quanto ao Programa de Proteção aos Animais Domésticos, este objetiva incentivar a guarda responsável por meio de educação ambiental; estímulo à adoção de animais; esterilização; incentivo ao cadastramento de animais, e ainda consiste na destinação de local para sepultamento de animais. Infelizmente, os artigos 61 e 62, de extrema importância, por definirem, por exemplo, que animais recolhidos ou apreendidos seriam encaminhados para abrigos, no caso de maus-tratos não poderiam ser resgatados e no caso de doação seria exigido termo de compromisso, foram vetados. (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2011b), enfraquecendo o incentivo a uma mudança de postura e percepção do animal não-humano como “outro”.

Apesar dos artigos vetados serem de grande importância, o disposto na lei complementar em questão busca medidas como interação com a população para promover a conscientização e, ao mesmo tempo, a esterilização dos animais para que, a longo prazo, o problema realmente seja solucio-nado, deixando de lado ações imediatistas, como a eutanásia como método de controle populacional, que por muito tempo foram utilizadas e não promoveram nada além de sofrimento e desperdício de capital público. Além disso, promove a adoção responsável ao invés da compra, enfraquecendo a visão, que precisa ser transmutada, desses animais como meros objetos, adornos ou produtos.

O Programa de Conservação da Fauna Silvestre, por sua vez, tem como finalidade a definição de políticas e a implementação de ações relativas à conservação e ao manejo da fauna silvestre, promovendo a conservação da fauna silvestre em seu ambiente natural através de ações educativas e projetos de conservação, bem como a finalidade de harmonizar e integrar ações entre setores e órgãos envolvidos com a proteção da fauna (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2012).

A lei ainda traz uma série de outras especificações, dispõe sobre a fiscalização (Seção XV) e penalidades (Seção XVI), impondo aos infratores, sem prejuízo das consequências civis e criminais cabíveis, as penalidades de advertência, multa, interdição da atividade (parcial ou total), fechamento do estabelecimento e cassação da autorização de funcionamento. Lamentavelmente, a penalidade “apreensão dos animais”, prevista no Projeto de Lei Complementar nº 005/11, de extrema importância para a defesa de animais que sofram maus-tratos, foi vetada.

O questionamento de alguns trechos selecionados da norma evidencia a amplitude de sua abrangência e a mudança de atitude que seus preceitos proporcionam para a sociedade. De acordo com a Lei Complementar nº 140 de 2011 (Brasil, 2011, art. 9º, XI), cabe aos municípios “promover [...] a conscientização pública para a proteção do meio ambiente”, fazendo-se necessário que medidas como as tomadas nos últimos anos pela Prefeitura de Porto Alegre tornem-se cada vez mais comuns, estimulando a mudança de atitude de todos, o que, por sua vez, é a única forma de se chegar a verda-deiras soluções para os problemas resultantes da relação do homem com o meio ambiente.

A partir da análise é possível perceber o caráter que permeia as resoluções: a responsabilida-de que a guarda de um animal exige. Responsabilidade essa que vai além da relação guardião-animal e se estende ao cuidado com os outros integrantes da sociedade, exigindo posturas para seu cumprimen-to e capital para isso; fatores que precisam ser analisados antes de se optar pela guarda de um animal.

Conclusão

É importante ter clareza que o tráfico de animais silvestres existe porque há procura e venda dos “produtos”, sendo de extrema importância atuar na conscientização da sociedade consumidora. Mas, independente de estarmos tratando de animais silvestres ou domésticos, o animal não-humano deve ser visto como “outro” e não como outro produto a ser comprado e, quiçá, descartado como qualquer mercadoria.

Santana e Oliveira (2006) sugerem a elaboração de uma legislação específica a nível federal, de caráter preventivo e educativo, que regulamente a guarda responsável, promovendo o bem-estar dos animais e estabelecendo penas para os guardiões que infringirem a lei. Cabe citar como exem-plo a Lei Complementar nº 694/12 do município de Porto Alegre, comentada anteriormente, e a lei de bem-estar animal da Noruega. Esta última traz em seu texto questões ligadas à responsabilidade necessária para que se adquira um animal, dispondo, por exemplo, que detentores de animais não devem transferi-los para pessoas caso haja razão para acreditar que as mesmas não tratarão os ani-mais adequadamente, que pais não devem permitir que crianças menores de dezesseis anos sejam responsáveis, de forma independente, por animais, além de outras regulamentações relacionadas ao tema (NORWAY, 2010).

A necessidade de regulamentar o comércio de animais de estimação torna-se ainda mais imi-nente visto que o comércio legal tem servido para encobrir o tráfico de animais. Por meio de tal regu-lamentação seria possível evitar, ou ao menos enfraquecer, as inúmeras compras baseadas em impulso

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que resultam em animais abandonados, maus-tratos, introdução de espécies, além de ser mais uma ferramenta no combate ao tráfico.

Inúmeros aspectos em nossa percepção e posicionamento frente aos outros seres vivos que compartilham o ambiente conosco necessitam ser revistos e modificados. Apesar de muitos não mais chamarem e/ou considerarem os animais meras coisas, bem semoventes, bens móveis suscetíveis de movimento próprio, caça, entre outros adjetivos do mesmo calibre, o estigma de mercadoria ainda não foi perdido, evidenciado pela expressão “posse” (ao invés de guarda), que como tudo que possui um proprietário, possui um caráter de objeto implícito (Santana e Oliveira, 2006). Como Levai (2006, p. 177, grifo no original) brilhantemente expõe: “Não é à toa que, para o direito civil, o animal é coisa ou semovente; no direito penal, objeto material; e, no direito ambiental, bem ou recurso natural”. Nota-se uma mudança no cenário, o papagaio de pirata cedeu seu lugar a um iguana “descolado” que passeia pelo parque no ombro de seu dono, mas a mesma e triste essência pode ser percebida se, em meio a nossa falta de tempo, quisermos com ela nos deparar. E na verdade, como mudar tal visão fren-te aos animais não-humanos se eles continuam na prateleira, se o comércio de animais como animais de estimação, como adornos, como decoração das paredes, como uma mera música matinal continua sendo estimulado sem a necessária conscientização do animal como “outro”? Pode até mesmo estar camuflado em meio a regulamentos que o tornam “correto” e “aceitável”, mas a base é a mesma e o objetivo é o mesmo.

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Participação popular em programas de coleta seletiva: aspectos indutores

de sucessos e fracassos

Fernanda Bobsin Dai-Prá1

Luciane Teresa Salvi2

Resumo

O presente artigo dissertará sobre programa de coleta seletiva, como parte inte-grante de um sistema de gerenciamento de resíduos sólidos e a participação popular nesta campanha. O objetivo do presente trabalho é identificar e refletir a respeito dos aspectos indutores de sucessos e fracassos que levam à participação da popula-ção nestes programas implantados pelos municípios. Esta pesquisa traz uma concei-tuação sobre coleta seletiva e apresenta estudos de caso que descrevem diferentes experiências já realizadas. A pesquisa desenvolvida é do tipo revisão bibliográfica. O estudo mostra que o planejamento na implantação de programas de coleta seletiva e o investimento em campanhas de educação ambiental, juntamente com a sua divulgação às comunidades, são aspectos indutores de sucesso para obter o engaja-mento da sociedade neste programa. Com este estudo, pretendeu-se contribuir para a discussão sobre o aumento da eficiência na implantação destas campanhas junto aos municípios.

Palavras-chave

Coleta Seletiva. Participação popular. Resíduos sólidos. Educação ambiental.

Abstract

This article will address both the seletive collection program as part of a system of solid waste management and the popular participation in this campaign. The objec-tive of this study is to identify and reflect on aspects wich leads to successes and to failures regarding to the participation of community in these programs. This research is based in a literature review and it provides a conceptualization of selective col-lection and a case studies presentation describing different experiments. The study showed that the planning in implementation of selective collection programs and the investment in environmental education campaigns, along with its disclosure to the communities, are aspects of success to get the society engagement in this program. With this study, we intended to contribute to the discussion on increasing efficiency in the implementation of these campaigns in the cities.

Key-words

Selective Collection. Popular participation. Solid waste.Environmental education.

(1) Bacharel e Licenciada em Ciências Biologicas, Pós-graduanda do Curso de Gestão Ambiental da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre/RS. E-mail: [email protected] (2) Coordenadora e Professora do Curso de Engenharia Ambiental e Sanitária da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre e do Curso de Especia-lização em Gestão Ambiental da mesma IES; graduada em Ciências Biológicas (PUCRS – 1988) e Arquitetura e Urbanismo (UniRitter – 2001); especialista em Genética (UFRGS – 1991); mestre em Gestão Urbana (PUCPR – 2008). E-mail: [email protected]

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Introdução

A problemática da geração de resíduos sólidos está atrelada, entre outros fatores, ao aumento populacional e ao consumismo desenfreado, processos estes que desafiam a capacidade natural do planeta em absorver a quantidade dos resíduos sólidos produzidos, uma vez que sua geração ocorre em velocidade maior que a de sua decomposição (Ghesla; Gomes, 2011; Prochnow; Rosseti, 2010). Segun-do Ghesla e Gomes (2011, p. 1), “uma das formas de equacionamento deste problema é a adoção de três pontos básicos: a redução, a reutilização e a reciclagem”. A reciclagem é viabilizada pela coleta seletiva, onde os resíduos sólidos – seco, orgânico e rejeito - são triados na fonte geradora, coletados separadamente a fim de evitar sua contaminação e, posteriormente, encaminhados à reciclagem.

Um Programa de Coleta Seletiva (PCS) – elemento essencial em um plano de gerenciamento integrado de resíduos – é visto apenas como uma das alternativas para a recuperação de alguns ma-teriais, associada a outras formas de tratamento, como a compostagem de resíduos orgânicos, e de disposição final, como aterros sanitários ou energéticos, que sempre serão necessários para a deposi-ção dos rejeitos. De acordo com Bringhenti (2004), a inclusão do princípio de não geração e redução de resíduos sólidos urbanos em programas de coleta seletiva são importantes para se obter ganhos ambientais e sanitários, caso contrário, segundo a autora (2004, p.14), “corre-se o risco da população acreditar, ao participar da coleta seletiva que: quanto mais lixo for reciclado melhor”, levando ao aumento da produção de resíduos. A coleta seletiva de resíduos sólidos domiciliares como um instru-mento de gestão constitui um processo de valorização dos resíduos selecionados e classificados na própria fonte geradora, visando seu reaproveitamento e reintrodução no ciclo produtivo (Lima, 2006).

A implantação de programas de coleta seletiva tem sido apontada como uma das alternativas para a gestão de resíduos e para fomentar o envolvimento das comunidades em torno da temática ambiental. Entretanto, apesar das diversas experiências já bem-sucedidas e dos benefícios ambientais e sociais gerados por este tipo de programa, percebe-se que campanhas de coleta seletiva têm tido resultados abaixo do esperado e que ainda há dificuldades em se ampliar o alcance desta iniciativa (Aguiar; Philippi Jr., 2001). Partindo-se dessa problemática, este estudo tem por objetivo identificar e refletir sobre os aspectos indutores de sucessos e fracassos da participação dos cidadãos nos programas de coleta seletiva, buscando-se, dessa forma, contribuir para o aprimoramento da implantação destes programas junto aos municípios.

O presente artigo está estruturado em dois capítulos: Coleta Seletiva – que traz uma breve abordagem sobre a temática, conceituação e dados estatísticos da taxa de participação da população brasileira (por regiões) neste Programa; e Estudos de Caso – que relata as experiências de alguns mu-nicípios que têm implantado esta campanha, ou o fizeram como projeto-piloto.

São importantes para fins de embasamento deste trabalho, os estudos de caso apresentados pelos pesquisadores: Bringhenti (2004), Prochnow e Rossetti (2010); Barros e Fernandes (2011); Ghesla e Gomes (2011); Bringhenti e Günther (2011) e Departamento Municipal de Limpeza Urbana/Prefeitura Municipal da Porto Alegre (2013), os quais contribuem para o entendimento dos aspectos indutores de sucessos e fracassos da participação da população nos PCS.

Procedimentos Metodológicos

Esta pesquisa é do tipo revisão bibliográfica e retoma estudos de caso, a fim de identificar aspectos relevantes e refletir sobre o tema aqui abordado.

Coleta Seletiva

A Lei Federal nº 12.305 de 2010 (BRASIL, 2010), que institui a Política Nacional de Resíduos Sóli-dos – PNRS, estabelece diferenças para a determinação do que constitui-se em resíduo (aqueles materiais que podem ser reaproveitados ou reciclados) e rejeito (não apresentam possibilidade de reutilização e por esse motivo devem ser efetivamente descartados). Essa distinção é fundamental para que o país avance de forma definitiva quanto a questão de gestão de resíduos, uma vez que diariamente, volumes expressivos de resíduos sólidos gerados nas cidades brasileiras são encaminhados de forma inapropriada aos aterros.

De uma forma geral, dados do IBGE (2010) indicam uma gradual ampliação do sistema no terri-tório nacional no que diz respeito ao manejo de resíduos sólidos (limpeza pública, coleta e destinação final de lixo). A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico – PNSB de 2008 (IBGE, 2010) mostra que, no

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ano de 2000, 99,4% dos municípios brasileiros contavam com o serviço, o qual atingiu a totalidade dos municípios em 2008. Entretanto, embora se constate uma evolução do panorama nacional referente à destinação final adequada dos resíduos gerados pelos municípios brasileiros, muito ainda há o que se avançar de forma a atingir sua gestão plena. A Tabela 1 demonstra a evolução desse quadro no Brasil no período compreendido entre os anos de 1989 e 2008 (IBGE, 2010):

Tabela 1 – Destino final dos resíduos sólidos, por unidade de destino dos resíduos – Brasil (1989/2008)

Ano

Destino final dos resíduos sólidos (%)

Vazadouro a céu aberto –“lixão”3 Aterro controlado4 Aterro sanitário5

1989 88,2 9,6 1,1

2000 72,3 22,3 17,3

2008 50,8 22,5 27,7

Fonte: Adaptado de IBGE, 2010.

Os dados mostrados na Tabela 1 indicam que reduziu-se o percentual daqueles municípios que destinavam seus resíduos a vazadouros ou “lixões” - de 72,3% para 50,8%. Foi também constatado o aumento no número de municípios que passaram a encaminhar seus resíduos aos aterros sanitários: o uso destas instalações passou de 17,3% para 27,7%, registrando-se também o crescimento no número de Programas de Coleta Seletiva implantados no país.

Conforme pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE, 2010), em 5.565 municípios existentes no Brasil, 3.207 (57,6%) indicaram a existência de Programas de Coleta Seletiva. Destacam-se as iniciativas de Programa de Coleta Sele-tiva na Região Sudeste (79,5%); seguido da Região Sul (77,7%); Região Norte (45,7%); Região Nordeste (34,8%) e Região Centro-Oeste (27,7%) (ABRELPE, 2010).

De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei nº 12.305/10 (BRASIL, 2010, p. 1), a coleta seletiva é definida como a “coleta de resíduos sólidos previamente segregados, conforme sua constituição ou composição”. Uma vez que a PNRS define entre seus objetivos o aumento das taxas de reciclagem no país e a geração de emprego e renda para os catadores de materiais recicláveis, torna-se evidente a necessidade de se ampliar os Programas de Coleta Seletiva entre os municípios de forma a atender aos objetivos propostos pela referida Lei.

Importante ressaltar que a coleta seletiva traz diversos benefícios ambientais e sociais, dentre os quais destacam-se: redução do consumo de novas matérias-primas (recursos naturais que deixam de ser explorados, havendo uma diminuição de impactos negativos sobre os ecossistemas e redução de gastos energéticos) através de posterior reciclagem; aumento da vida útil dos aterros sanitários, por meio da redução do volume diário de material enviado a estas instalações; destinação adequada dos resíduos; geração de emprego e renda através da inclusão dos catadores nos processos de triagem (inclusive organizados em cooperativas); oportunidade para o desenvolvimento de ações voltadas à educação ambiental e de saúde pública com uma população vulnerável, representando uma nova for-ma de se promover a inclusão social.

De acordo com Bringhenti (2004) as principais modalidades de coleta seletiva e seus aspectos positivos e negativos são os seguintes:

a) Porta a porta: realizado por meio de veículo coletor, com a coleta dos resíduos previamente segregados e acondicionados em sacos plásticos, através de rotas e turnos pré-definidos. São considerados aspectos positivos nesta modalidade, o fato do cidadão não precisar deslocar-se

(3) Vazadouro ou lixão: local a céu aberto no qual são depositados resíduos sólidos de diferentes procedências, sem qualquer tipo de controle; nenhuma medida de proteção ao meio ambiente é implementada e o acesso à área se dá de forma irrestrita.(4) Aterro controlado: local utilizado para a disposição de resíduos, os quais são cobertos por uma camada de terra ou argila e, eventualmente, sofrem compactação, reduzindo os riscos à saúde pública; o acesso de catadores ao local não é permitido.(5) Aterro sanitário: instalação utilizada para a disposição final de resíduos, sujeita ao licenciamento ambiental de acordo com a legislação pertinente, construída por meio de projeto de engenharia e gerenciada de forma a aumentar sua vida útil; conta com mecanismos de im-permeabilização do solo, canais de drenagem, tratamento de chorume e gases, atividades diárias de compactação de resíduos, entre outros.

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a um ponto de entrega voluntária, a possibilidade de mensurar a participação da população no programa e agilidade no descarregamento em um centro de triagem. São considerados aspectos negativos: maior infraestrutura, devido à frota de veículos, maior custo de trans-porte e coleta, comparado a outros tipos de coleta, e o fato de atrair a presença informal de catadores.

b) Pontos de Entrega Voluntária (PEV ou Ecopontos): locais estratégicos do município onde são disponibilizados contêineres identificados e que necessitam que os cidadãos desloquem-se até o ponto de coleta para efetuar a entrega do resíduo previamente segregado. Consideram-se aspectos positivos, o menor custo de coleta e transporte e a melhor separação do material. Como desvantagens são citados o vandalismo e a depredação, a exigência de maior disponi-bilidade da população para a entrega do material em locais determinados, a manutenção e limpeza periódicas das instalações e a dificuldade em estimar a adesão da comunidade ao programa.

c) Coleta por catadores: esta modalidade é realizada por trabalhadores autônomos de reciclagem ou trabalhadores organizados em associações ou cooperativas, podendo ou não ter o apoio do poder público municipal por meio de investimentos ou subsídios. Entre os benefícios gerados por este tipo de coleta pode-se citar: inclusão social, geração de emprego e renda e redução do custo de coleta, transporte, triagem e destinação final de resíduos sólidos urbanos. O risco de acidentes, nas situações nas quais os trabalhadores atuam sem equipamentos de sinaliza-ção de trânsito e proteção individual, é apontado como o aspecto negativo mais recorrente.

Estudos de Caso

O estudo de Aguiar e Philippi Jr. (2001) trata do planejamento como uma ferramenta funda-mental para que seja possível se obter sucesso na implantação do programa de coleta seletiva, des-crevendo desde a fase inicial do processo até sua execução, ações e objetivos. Segundo estes autores, para a implantação destes programas devem ser levados em consideração aspectos como a caracteri-zação dos resíduos gerados, a possibilidade de sua comercialização, a conscientização dos envolvidos, o diagnóstico dos bairros onde haverá implantação da coleta seletiva (densidade populacional, sistema viário, entre outros itens), os investimentos, infraestrutura e equipamentos necessários.

De acordo com a entidade Compromisso Empresarial para a Reciclagem (CEMPRE), 1999 (apud Bringhenti, 2004), a elaboração, implantação e operação de um programa de coleta seletiva podem ser esquematizadas nas seguintes fases: (a) fase de diagnóstico, com realização de pesquisas e estudos; (b) fase de planejamento, com a definição de modelo(s) de coleta a serem adotados, estratégias de sensibilização e abrangência do programa; (c) fase de implantação, com a definição de infraestrutura e logística; (d) fase de operação e monitoramento, com a avaliação de indicadores de desempenho e (e) fase de análise de benefícios, com a contabilidade de receitas econômicas, sociais e ambientais

Segundo Campos, Braga e Carvalho, 2002 (apud LIMA 2006), a coleta seletiva deve estar ba-seada sobre o seguinte tripé: tecnologia (realizando a coleta, separação e posterior reciclagem), informação (motivando os envolvidos em torno do processo) e mercado (para reintrodução do material recuperado no sistema produtivo).

Diversas experiências têm sido relatadas na literatura descrevendo os Programas de Coleta Seletiva implantados em municípios e os resultados distintos obtidos com o andamento dos projetos. O município de Porto Alegre/RS começou a gestão dos resíduos sólidos no início dos anos 90 através de um sistema integrado, o qual tem se aperfeiçoado através das décadas, sendo responsabilidade do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) a coleta, o transporte e a destinação final dos re-síduos sólidos urbanos. No referido ano, iniciou-se a coleta seletiva porta a porta no município, no Bairro Bonfim, com aproximadamente 100.000 habitantes, devido a existência de trabalhos realizados com foco ambiental por Organizações Não Governamentais e no ano 2000, o programa estava implan-tado e em funcionamento, em 100% do município, com coleta semanal.

Conforme informações obtidas junto ao DMLU (2013), atualmente, a cobertura da coleta se-letiva no município é de 100%, sendo realizadas coletas três vezes por semana no Centro Histórico e duas vezes por semana no restante da cidade. O material coletado é distribuído entre as 18 Unidades de Triagem conveniadas com o DMLU, em diversificados bairros do município, para separação por tipo de material, prensagem e venda para indústria de reciclagem e/ou reaproveitamento. A Prefeitura de Porto Alegre fornece a infraestrutura para as Usinas e repassa o valor de R$ 2.500,00/mês para

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sua manutenção. O resultado da comercialização é dividido entre os integrantes das associações ou cooperativas que gerenciam cada Usina de Triagem. Em 2000, quando completou 10 anos, esse serviço recebeu o prêmio Coleta Seletiva – Categoria Governo, da CEMPRE, em reconhecimento à melhor prá-tica de gestão na reciclagem de resíduos sólidos do Brasil.

A coleta do resíduo orgânico, por sua vez, se dá de duas formas: por meio de coleta automa-tizada, implantada em julho de 2011, através de contêineres distribuídos em bairros de Porto Alegre e através da coleta domiciliar, no restante da cidade (em locais onde não há contêineres), três vezes por semana. Aproximadamente 100 toneladas de resíduos domiciliares são diariamente encaminhados à Estação de Transbordo da Lomba do Pinheiro, para a Unidade de Triagem e Compostagem (UTC), cujo objetivo é o reaproveitamento dos resíduos orgânicos através de compostagem. O restante segue para o Aterro Sanitário no município de Minas do Leão, distante 113 km de Porto Alegre. O dinheiro proveniente da comercialização do composto produzido gera renda para os integrantes da associação. A Figura 1 demonstra, de forma esquemática, os processos que ocorrem na Unidade de Triagem e Com-postagem de Resíduos Sólidos Domiciliares de Porto Alegre.

Figura 1. Esquema ilustrativo dos processos que ocorrem junto à Unidade de Triagem e Com-postagem de Resíduos Sólidos Domiciliares de Porto Alegre, RS

Fonte: Departamento Municipal de Limpeza Urbana, 2013.

O (DMLU) inaugurou em fevereiro de 2010, o primeiro Ecoponto de Porto Alegre, denominado “Destino Certo”, conjunto de unidades que estão sendo distribuídas estrategicamente pela cidade e se destinam a atender pequenos geradores de resíduos que não são recolhidos habitualmente pelas coletas regulares, domiciliar e seletiva. As Unidades têm ainda um Posto de Entrega de Óleo de Fritura (PEOF), um Posto de Entrega Voluntária (PEV) para materiais destinados à coleta seletiva e um espaço para receber pneus usados.

A educação ambiental foi instituída como parte integrante das ações e atribuições do DMLU, a partir da Lei 234/1990 – Código Municipal de Limpeza Urbana – em seu artigo 59. Até o início da década de 1990, a educação ambiental era realizada em ações específi cas, procurando levar à po-pulação ideias sobre uma cidade mais limpa. Segundo Bringhenti (2004), entre as medidas adotadas pela gerência responsável pela coleta seletiva quando da sua implantação no município na década de 90 era a de não realizar a coleta quando os resíduos não estavam adequadamente triados pela fonte geradora, o que fazia com que o cidadão entrasse em contato com o DMLU para esclarecimentos e reclamações e fosse orientado sobre os procedimentos adequados para triagem dos RSU. O trabalho

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de divulgação e sensibilização da comunidade para a implantação da coleta seletiva porta a porta foi realizado mediante divulgação por meio de carro de som e visitas as residências localizadas na área contemplada pelo programa. Quando da expansão da campanha no ano de 1996 para demais bairros de Porto Alegre, foi possível a divulgação a comunidade por meio de rádio e carro de som. De acordo com a representante dos catadores da Usina de Triagem da Vila Cavalhada, (apud Bringhenti, 2004), após o início do trabalho da Prefeitura junto às escolas, incluindo visitas didáticas às Usinas de Triagem, com a colaboração dos professores, a qualidade dos materiais recicláveis melhorou, ao mesmo tempo, reduzindo a quantidade de matéria orgânica misturada.

Todavia, foi a partir da criação do Sistema de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos (SGIRS) e do Código Municipal de Limpeza Urbana que a educação ambiental modificou o seu caráter, passando a ser alinhada com as diretrizes e princípios mundiais buscando responsabilizar os indivíduos pela geração e disposição dos resíduos a serem coletados e destinados pelo DMLU. Por meio da res-ponsabilização dos munícipes para a preservação do ambiente através do manejo dos resíduos sóli-dos e dos chamados “3R’s” (reduzir, reaproveitar e reciclar), o SGIRS ganhou dimensões maiores e mais eficazes, considerando a educação ambiental como um elemento que deve permear todas as ações de prestação de serviços do DMLU.

A área responsável pelas ações de educação ambiental no DMLU é o Serviço de Assessoria Socioambiental (SASA), estruturado em setembro/2003, o qual tem sua gestão baseado no princípio da responsabilidade social e na preservação do ambiente por meio de ações de educação ambien-tal que estejam diretamente relacionadas aos resíduos sólidos e a limpeza urbana em Porto Alegre. O principal eixo de atuação do SASA é a formação de multiplicadores que ocorre entre servidores públi-cos do DMLU, lideranças comunitárias, entre outros.

Entre as ações do SASA, se destaca visitas técnicas às unidades do DMLU ou aos locais de in-teresse na promoção da educação para a preservação do ambiente, cursos, palestras oficinas com materiais reaproveitados, apresentações. Outra forma de intervenção que o DMLU mantém para realizar educação ambiental, ou apontar a importância da prestação de serviço de limpeza e de manejo com os resíduos sólidos, é a participação em eventos, promovidos pelo poder público ou pela socieda-de civil organizada, através de exposição, visitação, oficinas ou atividades lúdicas, palestras, distri-buição de materiais informativos e de conscientização, apresentações artísticas, entre outras. Em 2005 foi criado o Túnel de Sensibilização Ambiental na sede do DMLU onde são abordadas as questões relativas aos resíduos sólidos (do descarte sem qualquer preocupação ambiental até os processos de reciclagem e reaproveitamento dos resíduos, bem como a destinação dos mesmos em aterros sanitá-rios).

Cabe destacar que a Prefeitura de Porto Alegre, por meio do DMLU, em 2006, iniciou a con-cepção e produção do Plano Diretor de Resíduos Sólidos (PDRS), instrumento legal normativo - ainda em fase de estudos e definições - que contempla o diagnóstico de todos os aspectos relacionados a resíduos sólidos, instruindo e prognosticando as ações e estratégias futuras na área do gerenciamento de resíduos sólidos. Encontra-se também em construção, o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PMGIRS), instrumento de planejamento operacional, o qual já se encontrava pre-visto no PDRS, e teve sua construção antecipada devido à obrigação decorrente da Lei Fede-ral nº 12.305/2010 (Brasil, 2010).

Percebe-se no caso de Porto Alegre, a importância do planejamento na implantação da coleta seletiva e as estratégias e investimentos contínuos realizados pelo órgão responsável em ações de divulgação do programa, junto aos diferentes setores da sociedade; assim como, em políticas públicas voltadas a esta temática, que vem colocando o município, através destas ações, em lugar de destaque e servindo, até mesmo, de exemplo para outras cidades.

O município de Lisboa/Portugal implantou a coleta seletiva no ano de 1987, utilizando Pontos de Entrega Voluntária através da distribuição de coletores em diferentes bairros da cidade, os quais eram voltados ao recolhimento de vidros; em 1993, os PEVs passaram a aceitar também papel. Em 1997, o município já havia instalado 1.000 ecopontos na malha urbana, ampliando a coleta para me-tais e plásticos. A partir da análise dos resultados de implantação do sistema, percebeu-se, porém, que esta forma de coleta (PEV) não era a mais adequada, pois não atingia as taxas de reciclagem inicialmente determinadas. Constatou-se que havia falta de espaço no núcleo histórico de Lisboa para a colocação de instalações adequadas e que os Ecopontos estavam sendo utilizados para disposição inadequada de resíduos no seu entorno (Câmara Técnica de Lisboa, 2012).

Atualmente, a capital portuguesa tem apostado na coleta seletiva porta a porta, levando em conta os horários, dias de coleta e a forma de disposição utilizada (sacos, fardos de papel) de acordo com as características funcionais de cada área da cidade (edificação, zonas históricas, atividade eco-

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nômica). Em bairros periféricos, o Departamento de Higiene Urbana optou por adotar a metodologia de coletores idênticos, porém com cores diferenciadas67, em locais onde já havia coletores, para que os munícipes depositem seus resíduos.

Enquanto que a experiência de Lisboa levou os técnicos a optarem pelo sistema de coleta sele-tiva porta a porta (em detrimento dos PEV), não existe unanimidade sobre o assunto, sendo necessário um estudo aprofundado da realidade de cada município para a definição da melhor estratégia e ser im-plementada. O trabalho de Ghesla e Gomes (2011), por exemplo, relata, por meio de um estudo com-parativo entre a eficiência de gestão dos Resíduos Sólidos Urbanos - RSU nas cidades de São Leopoldo/RS e Zurique/CH, opções distintas para a coleta seletiva. Enquanto que em São Leopoldo o processo é efetuado porta a porta, sem a normatização dos recipientes de coleta, em Zurique o mesmo dá-se por meio de um sistema de Pontos de Entrega Voluntária, com o uso de contêineres distribuídos em pontos estratégicos da cidade. Ghesla e Gomes (2011, p. 7) destacam que o sistema PEV na cidade suíça “en-volve a população, colocando-a como participante direta, com a obrigação de levar seus resíduos até o local da coleta”. A pesquisa conclui que Zurique possui maior eficiência na coleta dos resíduos pelo intenso envolvimento dos moradores ao programa devido a sua conscientização ambiental.

Prochnow e Rossetti (2010) descrevem o processo da implementação da coleta seletiva em Esteio, município da região metropolitana de Porto Alegre. A experiência foi acompanhada de uma campanha de conscientização ambiental junto à comunidade do Bairro Tamandaré, por meio da distri-buição de material educativo. Durante as cinco semanas de acompanhamento do projeto, percebeu-se um aumento do material coletado a cada semana, sendo nas três primeiras semanas de coleta, um aumento médio de 50%, estabilizando-se na quinta semana. A campanha foi realizada porta a porta, com o envolvimento de uma Escola Municipal do Bairro Tamandaré, da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e da Associação de Recicladores e Catadores de Esteio - ARCA.

O município de Ibiporã/PR, conforme relatam Barros e Fernandes (2011), implantou a separa-ção dos resíduos na fonte geradora, em domicílios e comércios no ano de 2009. Para tanto, promoveu a distribuição de sacos plásticos com cores diferenciadas para a coleta do resíduo seco e rejeito e sacola comum para o orgânico. A cidade foi organizada em três setores, com o estabelecimento da frequência da coleta em função da densidade populacional, desta forma, no centro da cidade, a frequência de coleta é maior que nos bairros. O projeto foi acompanhado de forte campanha de educação ambiental junto aos diferentes segmentos da sociedade, com a distribuição de material educativo, realização de palestras, campanhas de mídia e carro de som. O programa foi monitorado ao longo de oito meses através da pesagem dos resíduos secos e análise da composição gravimétrica dos resíduos orgânicos e rejeitos recolhidos.

Os resíduos recicláveis coletados passaram a ser encaminhados à empresa terceirizada, respon-sável pela sua triagem e posterior comercialização. A avaliação dos recicláveis era realizada por meio da pesagem do material que entrava e saía do galpão de triagem, tendo por objetivo o levantamento da porcentagem de resíduos recicláveis e não-recicláveis recolhidos. A análise da composição gravimétrica dos resíduos orgânicos era realizada diariamente na empresa. A composição gravimétrica7 do rejeito, por sua vez, era efetuada quatro vezes ao mês no Aterro de Ibiporã. De acordo com Barros e Fernandes (2011), notou-se ao longo do processo, um aumento gradativo dos resíduos secos coletados, assim como uma melhora quanto à separação dos rejeitos e orgânicos que anteriormente eram coletados mistura-dos. As autoras constataram que são necessárias constantes campanhas de educação ambiental junto aos cidadãos a fim de que o hábito da separação de resíduos seja efetivamente incorporado à rotina da população.

Em ambos os projetos – descritos por Prochnow e Rossetti (2010) e Barros e Fernandes (2011) –, percebe-se, entre as ações realizadas, a necessidade de investimento na divulgação dos Programas de Coleta Seletiva e na conscientização ambiental dos diferentes segmentos da sociedade. Assim, é possível se obter um retorno positivo da comunidade em relação a sua participação nas campanhas e no aumento da separação dos resíduos na fonte geradora. Segundo Gil (2003 apud Prochnow; Rossetti, 2010), para que um Programa de Coleta Seletiva seja bem sucedido, são necessárias ações de educa-ção ambiental junto à comunidade, visando sensibilizar o cidadão sobre o seu papel como gerador de resíduos sólidos urbanos.

(6) No Brasil, é a Resolução CONAMA nº 275, de 25 de abril de 2001, que padroniza as cores para os diferentes tipos de resíduos, as quais devem ser adotadas para os coletores, transportadores e durante as campanhas informativas sobre o programa (BRASIL, 2001).(7) Para a realização das análises gravimétricas, tanto os resíduos orgânicos quanto os rejeitos, são analisados por amostragem utilizando as metodologias embasadas na norma técnica NBR 10007 e nos manuais: “Resíduos Sólidos Urbanos: Aterro Sustentável para Municípios de Pequeno Porte” do PROSAB – Programa de Pesquisas em Saneamento Básico e o “Manual de Gerenciamento Integrado” do IPT – Instituto de Pesquisa Tecnológica.

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Segundo Lopes 2003 (apud Lima 2006), a campanha de coleta seletiva deve estar integrada a movimentos que propõem mudanças de hábitos e costumes, divulgando informações sobre o potencial de reutilização e reciclagem dos materiais. Dessa forma, o programa não corre o risco de ser interrom-pido por falta de envolvimento da comunidade ou de recursos financeiros.

Outro estudo interessante é apresentado por Bringhenti e Günther (2011), as quais realizaram pesquisa do tipo qualitativa com grupos populacionais do município de Vitória, no Espírito Santo. O es-tudo buscou conhecer a percepção dos entrevistados sobre a coleta seletiva e os motivos da população para aderir ou não aos programas existentes (PEV/porta a porta/cooperativa). As autoras verificaram que a adesão ao programa se deve ao “exercício da cidadania”, à organização em relação à limpeza do bairro, à preocupação com a problemática dos RSU, à geração de emprego, à organização nos Progra-mas de Coleta Seletiva, e existência de ações continuadas na divulgação, mobilização e informação. De acordo com Bringhenti (2004), a mobilização da comunidade para a participação neste programa “pode ser considerada uma das etapas mais importantes e complexas na implantação de programas, projetos e ações que envolvem mudanças nas rotinas e/ou hábitos dos indivíduos”

O trabalho destaca ainda a importância de se dar retorno dos resultados obtidos aos parti-cipantes dos programas, o qual é relatado como uma importante ferramenta para se obter sucesso e deve ser levada em conta durante a implantação do programa, em busca da participação plena da comunidade. A divulgação é uma ferramenta que contribui para a transparência do processo, criando confiabilidade para garantir a participação social. De acordo com as autoras, a informação dos bene-fícios gerados incentiva a continuidade do engajamento ou, até mesmo, novas adesões à campanha.

Bringhenti e Günther (2011) também identificaram na pesquisa diversos aspectos que prejudi-cam a participação da população nos Programas de Coleta Seletiva. Entre os itens relacionados estão: a falta de incentivo, de orientação de como o munícipe deve proceder, a necessidade de deslocamento a grandes distâncias para destinar o resíduo, além da acomodação, falta de tempo e falta de oportuni-dade. Segundo as pesquisadoras, outros elementos importantes a serem destacados são a insuficiência de ações de divulgação do programa e seus resultados, nível cultural e de instrução dos munícipes, falta de espaço para armazenamento temporário dos resíduos nas residências e necessidade da lim-peza das embalagens para seu armazenamento temporário. Embora consistindo em uma realidade completamente distinta aos municípios brasileiros, moradores de bairros de Nova York também apon-taram a falta de compreensão do Programa de Coleta Seletiva por parte dos moradores e a qualidade da infraestrutura do sistema como aspectos significativos para a determinação de diferentes taxas de participação no programa (Clarke; Maantay, 2006 apud Bringhenti; Günther, 2011).

Resultados e Discussões

Conforme os estudos de caso trazidos por Prochnow e Rossetti (2010) e Barros e Fernandes (2011), percebe-se que os projetos implantados, tanto no município de Esteio/RS, quanto Ibiporã/PR, obtiveram sucesso devido à forte campanha de educação ambiental realizada junto à população. A divulgação do programa e a sensibilização dos munícipes devem ser realizadas de forma prévia e também simultaneamente à implantação da coleta seletiva. A campanha de divulgação pode ser rea-lizada porta a porta com entrega de material educativo, por meio de palestras para a comunidade e por meio da mídia, a fim de envolver a maior parte dos diferentes segmentos da sociedade e buscar seu engajamento no projeto.

Os resultados obtidos por estas pesquisas vêm ao encontro do trabalho realizado pelo De-partamento Municipal de Limpeza Urbana de Porto Alegre, que instituiu a educação ambiental desde 1990 como parte integrante de suas ações e atribuições, estando alinhada com as diretrizes e princí-pios mundiais que buscam responsabilizar os indivíduos pela geração e disposição dos resíduos.

De acordo com o comparativo trazido pelas autoras Ghesla e Gomes (2011), observa-se que há diferenças no sistema de coleta entre os municípios (porta a porta / PEV), assim como em relação ao acondicionamento dos resíduos (normatização e identificação de coletores). Os casos relatados demonstram, neste caso, que com o sistema PEV há maior envolvimento dos cidadãos, uma vez que a população pode sentir-se responsabilizada pela destinação adequada do resíduo que produz. Além disso, o comparativo demonstra novamente a conscientização da população como uma ferramenta importante para o sucesso da participação da população em Programas de Coleta Seletiva.

Bringhenti e Gunther (2011) afirmam que a adesão ao programa dá-se devido ao exercício da cidadania, fato este que vai ao encontro do que foi apresentado por Ghesla e Gomes (2011). A eficiência do sistema PEV em Zurique coloca a população como participante direta no projeto, com a obrigação pela destinação adequada do resíduo no ponto de coleta. Assim, acredita-se ser fundamen-

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tal, independente do sistema de coleta efetuado no município – porta-a-porta / PEV – que durante as campanhas de conscientização e divulgação do projeto, haja a sensibilização das comunidades para a percepção da importância de seu engajamento, representando uma responsabilidade individual de cada cidadão. Percebe-se, nestes estudos de caso, que o sentir-se responsável e ter consciência da importância da participação em iniciativas como esta, promove o aumento da adesão aos projetos e, consequentemente, uma maior eficiência na obtenção de resultados.

Considerações Finais

É importante ressaltar que Programas de Coleta Seletiva são peças-chave em um sistema de gerenciamento integrado de resíduos sólidos e, ao mesmo tempo, para seu sucesso, um dos pontos fundamentais é a participação popular, sendo assim, a difusão da informação e a sensibilização dos envolvidos são ferramentas essenciais para sua maior eficiência.

De acordo com os estudos apresentados ao longo deste trabalho, sugere-se para municípios que ainda não possuem implantada esta iniciativa, que seja realizado um diagnóstico a fim do levan-tamento, conhecimento e percepção da realidade local, levando em conta neste diagnóstico fatores como: a caracterização dos resíduos sólidos gerados, mapeamento de pontos estratégicos para a de-finição da melhor forma de coleta – PEV ou porta a porta – a percepção da comunidade em relação a temática meio ambiente e gerenciamento de resíduos sólidos, ações pontuais de coleta seletiva e educação ambiental já existentes no município. Sendo que a partir destes instrumentos e dos dados coletados, será possível traçar a metodologia de planejamento das ações a serem implantadas. Além disso, devem-se considerar os estudos de caso e experiências de cidades e projetos-piloto onde a cam-panha de coleta seletiva foi bem sucedida.

É notável que para obter o sucesso e a eficiência nos Programas de Coleta Seletiva, além do planejamento, um dos pontos em que deve haver um investimento maior é em educação ambiental junto à população, conforme percebido, a educação ambiental é uma ferramenta importante que possibilita a permanência da população junto ao programa, além de estimular a adesão de novos participantes.

Desta forma, propõe-se a formação de um grupo de trabalho de educação ambiental (EA) que esteja presente no município, desde o momento do diagnóstico e posteriormente participando de forma concomitante com a implantação do PCS, através de ações voltadas à sensibilização da comunidade. Para o sucesso da campanha e continuidade do programa é necessário que a educação ambiental seja constante e não ocorra apenas na forma de ações pontuais em determinados períodos, prática comum na maior parte das cidades. Destaca-se entre as ações de EA: a inclusão de campanhas de sensibilização ambiental sobre a temática resíduos sólidos junto aos diferentes setores da socieda-de (escolas, comunidades em geral, instituições privadas, comércio, etc.), por meio da divulgação do projeto, seus benefícios, resultados, palestras, cartilhas, eventos, programas de rádio e a criação de mascote do município que represente a Coleta Seletiva e esteja presente nas atividades.

Sugere-se para municípios que já possuam Programas de Coleta Seletiva, a realização de monitoramentos periódicos, através de pesquisa, com a aplicação de questionários e coleta de dados quali-quantitativos junto à população, a fim de obter a taxa de participação popular no projeto e a percepção da comunidade em relação à campanha. O monitoramento é um instrumento que avaliará a eficiência do programa, apontando falhas no decorrer da sua execução, assim como, possibilitando perpetuar os aspectos positivos, permitindo aos gestores intervenções em busca de melhoria, assim como, replicando as experiências bem sucedidas.

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A subvenção de orgânicos no Brasil e na União Europeia sob a ótica da RBV

Alexandre Melo Abicht1

Alessandra Carla Ceolin2

Paulo Rodrigo Pereira3

Augusto Faria Corrêa4

Tania Nunes da Silva5

Resumo

Este artigo tem por objetivo a discussão sobre o foco da comercialização dos produ-tos cítricos orgânicos no Brasil, realizando-se um comparativo entre Brasil e União Européia (UE), sob a ótica da Visão Baseada em Recursos (RBV). Tem-se como funda-mentação teórica uma explanação a cerca do mercado europeu de orgânicos cítricos, seguido da situação brasileira dos mesmos, tendo por fim, a teoria da RBV. O estudo possui uma natureza qualitativa, sendo caracterizado por pesquisas exploratórias através da leitura de journals, artigos e também com a realização de, visitas de cam-po a propriedades rurais e uma cooperativa de produtos orgânicos. Com base nos dados coletados e na literatura, reuniu-se elementos para a análise e discussão dos resultados, afim de responder à questão-chave da pesquisa, isto é, a comercialização brasileira de cítricos orgânicos deve ser voltada para o mercado interno ou para a União Européia. Face a essa problemática, e considerando os pressupostos da RBV, entende-se haver desvantagem competitiva para o agricultor brasileiro em relação aos produtores de cítricos orgânicos da União Europeia, quando o primeiro exporta para o mercado europeu. Assim, entende-se que as estratégias estabelecidas pelos produtores brasileiros de orgânicos, deveriam ter como foco principal o mercado interno para a comercialização de seus produtos.

Palavras-chaves

Agronegócios; Cítricos Orgânicos; Subsídios Agrícolas.

Abstract

This article has as a goal to discuss about the focus on commercialization of orga-nic citric products in Brazil, making a comparative between Brazil and European Community (EC), under the view of the View Based on Resources (RBV). One has as fundamental theory an explanation about the European market of organic citric products, followed by the Brazilian situation of the same ones, having as an aim, the theory of the RBV. This study is of qualitative nature, being characterized by explanatory researches through the reading of journals and articles, as well as field visits to the rural real states and to a cooperative of organic products. Based on the data collected and on the literature, one reunited elements for the analysis and discussion of the results, in order to answer the key question of the research, that is, the Brazilian commercialization of organic citric products must be focused on the domestic market or on the European Market. Owing this problem and considering the requirements of the RBV, one understands to have competitive disadvantage for the Brazilian agriculturist compared to the European Community organic products,

(1) FDB POA e UNISC(2) UFRPE(3) UFPI(4) UFRGS(5) PPGA EA-UFRGS

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when the first exports to the European market. Therefore, one understands that the strategies set up by the Brazilians producers of organic should have as main goal for the commercialization of their products the domestic market.

Key Words

Agribusiness; Organic Citric; Agricultural Subsidies

1. Introdução

Alimentos orgânicos são produtos de origem vegetal ou animal que estão livres de agrotóxicos ou qualquer outro tipo de produtos químicos, pois estes são substituídos por práticas culturais que buscam estabelecer o equilíbrio ecológico do sistema agrícola. A crescente demanda por alimentos produzidos com menos agrotóxicos e menos agressivos ao meio ambiente é uma tendência mundial que se reflete também no Brasil. Essa procura tem como consequência a geração de novas oportunidades de negócio para os vários segmentos da agropecuária nacional.

Os primeiros registros de agricultura orgânica no mundo foram na Índia, na década de 1920, quando a utilização de agrotóxicos alcançava escalas jamais vistas até então. As técnicas de produ-ção orgânicas surgiam, assim, como uma forma alternativa de produção de alimentos saudáveis, que pregava a ampliação do contato do ser humano com a natureza e o respeito ao meio ambiente. A agricultura orgânica rapidamente encontrou muitos adeptos e foi, então, levada para a França, disse-minando-se, em seguida, por outros países da Europa e de outros continentes, em especial, Alemanha, Japão e Austrália (NORONHA, 2007).

A agricultura orgânica chegou ao Brasil durante a década de 1970, sendo as suas técnicas difundidas no campo durante a década de 1980. Mas somente após a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (ECO-92), que esses produtos ganharam expressividade comercial, ganhando espaço em supermercados e feiras livres, conquistando uma fatia maior dos consumidores.

Atualmente, a produção agrícola com base nos princípios sustentáveis amplia-se ano a ano nas diferentes regiões do mundo, tornando-se um modelo alternativo e crescente no desenvolvimento agrícola, oferecendo condições de preservação dos recursos naturais e, em sistemas mais avançados, produção de alimentos com certificação de origem.

Muitos estudos sobre agricultura orgânica enfatizam a importância dos seus benefícios econô-micos, sociais e ambientais e as oportunidades que ela traz. Cabe ressaltar que esse é um setor ainda pequeno e que enfrenta pontos de estrangulamento na produção, comercialização e institucionalização.

As políticas públicas, em especial, mas também as privadas, sempre tiveram papel impres-cindível no desenvolvimento da agricultura orgânica em países mais desenvolvidos, como a Alemanha, Estados Unidos e Japão. Nessas nações, a participação de produtos orgânicos no mercado cresceu rapi-damente. Estruturas econômicas estáveis e políticas claras têm papel significativo na disponibilização do conhecimento e nas escolhas estratégicas dos agricultores.

O apoio governamental à agricultura orgânica nestes países ocorre de forma direta, através de subvenções, e indireta, por intermédio do estabelecimento de marcos regulatórios claros e estáveis. Tal suporte configura-se através de barreiras comerciais que dificultam os fluxos de comércio nesse segmento.

Em nível mundial, as agências de desenvolvimento e a iniciativa privada, nacionais e inter-nacionais, têm cumprido papel importante, os quais objetivam garantir a segurança dos alimentos, o aumento da renda dos produtores (principalmente pequenos) e a interrupção (ou reversão) da degra-dação ambiental.

No Brasil, existem regulamentações que conceituam e estabelecem normas a respeito da agricultura orgânica, porém, parecem ser ainda carentes de expressividade no que diz respeito à co-ordenação da produção e comercialização de produtos orgânicos. Além disso, o governo proporciona condições para o financiamento à agricultura por meio da criação de linhas de crédito que contemplam principalmente a agricultura familiar, porém sem distinguir se a produção é convencional ou orgânica.

Deve-se destacar ainda, que não constam nos portfólios de crédito das organizações gover-namentais brasileiras, mecanismos de financiamento que contemplem o período de conversão de um sistema agrícola convencional para um orgânico, o que pode representar uma barreira importante para

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a expansão da produção orgânica. Dessa forma, o cultivo de orgânicos tenderia a apresentar perdas de competitividade por preço em relação aos alimentos convencionais. Motivado principalmente, por custos relacionados a conversão da área a ser cultivada, certificação, uso de embalagens mais onero-sas e menor escala na produção. Por outro lado, por se tratar de um produto diferenciado, é possível atribuir-lhe um preço mais elevado, buscando dessa forma remunerar melhor o produtor.

Por se tratar ainda de um mercado embrionário no contexto do agronegócio brasileiro e ainda carente de estudos acadêmicos, o presente trabalho busca abordar a subvenção de produtos cítricos orgânicos no Brasil e na União Europeia levando em consideração a RBV, com base na seguinte questão-chave: O foco da comercialização dos produtos cítricos orgânicos no Brasil deve estar voltado para o mercado interno ou para a União Europeia?

Após a referida introdução, realiza-se uma breve fundamentação teórica demonstrando a situação da União Europeia, principal cliente do país e a situação brasileira do comércio citricultor orgânico, sob a ótica da RBV. Em continuidade, apresenta-se o método utilizado na pesquisa, seguido pela análise e discussão dos resultados e, por fim, apresentam-se as considerações finais do estudo e o referencial bibliográfico utilizado na elaboração desse artigo.

2. Método

Esse trabalho caracteriza-se por se tratar de uma pesquisa qualitativa, onde são analisadas as subvenções de culturas cítricas orgânicas na UE, e de que forma essas interferem na gestão desse setor no Brasil, à luz da Teoria da RBV. Com isso, busca-se atender ao questionamento de qual deve ser o foco de comercialização dos produtos cítricos orgânicos no Brasil. Voltado para o mercado interno ou para a União Europeia?

Para a realização do presente trabalho, primeiramente, fez-se necessária uma pesquisa ex-ploratória bibliográfica em journals, artigos, web sites, acerca dos temas RBV, subvenção agrícola de culturas cítricas na UE e comportamento do setor de alimentos orgânicos no Brasil.

De modo a quantificar alguns pontos observados, realizou-se um levantamento de informa-ções nos bancos de dados de instituições públicas e privadas de pesquisa e estatística, que aparecem citadas no corpo desse artigo.

Com objetivo de complementar o construto do conhecimento, realizou-se uma visita de cam-po à Cooperativa dos Citricultores Ecológicos do Vale do Caí (Ecocitrus), no dia 26 de outubro de 2007. Nesta data, também, visitou-se algumas propriedades de cooperativados, envolvidas na produção e comercialização de produtos cítricos orgânicos.

Por fim, realizam-se a análise e discussão dos dados obtidos seguido pelos comentários finais e sugestões para pesquisas futuras.

3. Panorama da produção de cítricos orgânicos União Europeia (UE)

Conforme informações disponíveis em OJEC (2007), em 1992, com a implementação da re-solução Council Regulation (EEC) 2078/92, posteriormente substituída pela Council Regulation (EEC) 1257/99 – a comunidade europeia firmou-se no compromisso de fomentar o desenvolvimento rural através da produção de alimentos orgânicos, trazendo como reflexos entre outros fatores, a preser-vação do meio ambiente e a diminuição da sobre-oferta de produtos, onde essa última pressiona para baixo os preços ao produtor, implicando em uma demanda ainda maior de subsídios financeiros e o que de forma recorrente leva destruição de alimentos com o propósito de reduzir essa sobre-oferta, não sem, porém, causar o óbvio constrangimento de desperdiçar alimentos em um planeta onde uma parte significativa da população passa fome.

De uma forma lógica, de acordo com dados disponibilizados por Juliá (2000), os subsídios são destinados preferencialmente para as pequenas propriedades rurais, que em decorrência de uma menor escala e também menor potencial competitivo, são demandantes de maior volume de recursos públicos para permanecerem viáveis.

O autor descreve ainda, que os custos de duas frutas cítricas, laranja e bergamota, são em Valência na Espanha (principal produtor de orgânicos na Europa) 30% mais elevados para os orgânicos, e ainda apontam uma produtividade cerca de 20% maior. Esses fatores combinados implicam em um custo final da fruta, na faixa de 40% superior ao do fruto convencional.

Conforme Juliá e Server (2000), a produção de orgânicos em Valência, na Espanha, só torna-se viável quando há uma preferência extremamente alta do consumidor por esse produto, nesse cenário

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ele estaria de uma forma prevalente a pagar um valor monetário compatível ao custo de produção desse alimento.

Para compensar essa baixa eficiência econômica e produtiva, algumas localidades da União Europeia, conforme dados de Moll (2004), chegam a ofertar ao produtor, por um período de até 5 (cinco) anos, um volume total de subsídios de aproximadamente 4000 €/ha (quatro mil euros por hec-tare), a exemplo do que ocorre na região de Calábria na Itália e 1700 €/ha (um mil e setecentos euros por hectare) em Valência na Espanha. Esses subsídios visam estimular os produtores a migrarem da agricultura convencional para um processo de produção orgânica. Ainda segundo esse autor, os baixos valores de subsídios oferecidos pelo governo espanhol aos produtores de citrus, estariam limitando a adesão de novos entrantes.

Segundo dados disponibilizados por Eurostat (2007) e CEPEA (2007), o PIB agrícola na UE mostra-se nominalmente mais elevado do que o PIB agrícola brasileiro, com valores superiores a 600 (seiscentos) bilhões de reais no ano de 2006 para o primeiro e a 85 (oitenta e cinco) bilhões de reais para o Brasil no mesmo período. Todavia, em valores percentuais, na UE, a agricultura básica ou den-tro da porteira, é menos expressiva do que no Brasil em relação à participação no PIB, com valores aproximados a 2% para a primeira e 5% para o segundo.

Embora o grau de participação da agricultura na economia da UE não se mostre tão expressivo quanto o é no Brasil, observa-se na resolução (EEC) 1257/99, disponível em OJEC (2007), que há uma grande preocupação em mantê-la e torná-la mais atrativa para os que dela vivem, determinando inú-meras situações onde há um grande número de explorações desprovidas de condições estruturais que permitam assegurar aos agricultores e as suas famílias, rendimentos e condições de vida mais justa, as quais devem ser compensadas por meio de adequadas subvenções.

4. Mercado de alimentos orgânicos no Brasil

Nas últimas décadas houve profundas modificações que causaram e ainda estão causando for-tes impactos na estrutura social de muitos países, tanto de forma local como global. Entre as muitas mudanças ocorridas, pode-se afirmar que o assunto preservação e degradação ambiental vêm influindo em muitas das grandes decisões. Com o aumento da modernização das práticas agrícolas ocorreram, juntamente com os benefícios para a população, muitas preocupações além das sociais e econômicas, quanto aos impactos ambientais destas modernas técnicas, ressaltando-se o uso intensivo e desordena-do de insumos artificiais (agrotóxicos e fertilizantes) e da mecanização. Com isso, a agricultura orgâni-ca passou a ser enfatizada, principalmente, em função da crescente demanda por parte da população preocupada com aspectos ambientais, sociais e de saúde.

Assim, a agricultura orgânica oportuniza a revisão das relações de cooperação e de compe-titividade no agronegócio brasileiro, possibilitando, desta forma, o estabelecimento de um relativo equilíbrio de forças entre os agentes das cadeias produtivas de alimentos, por meio de estratégias associadas às mudanças nos padrões de consumo e da conscientização ecológica (SCHULTZ, 2006).

Além dos aspectos socioambientais, os produtos orgânicos têm um forte apelo econômico, pois, segundo estimativa da Associação Brasileira de Supermercados, as vendas de produtos orgânicos nos supermercados do país devem superar R$ 1,25 bilhão em 2007, com aumento de 25% em relação a 2006 (GLOBO RURAL, 2007).

O Brasil é o segundo maior produtor de orgânicos do mundo e o setor tem 70% de suas vendas voltadas para o mercado externo. Com 6,5 milhões de ha (hectares) cultivados com produtos orgâni-cos, ocupando atualmente o segundo lugar no ranking mundial, atrás apenas da Austrália, que cultiva 11,3 milhões de ha.

Segundo dados do MDIC (2007), o Brasil exportou produtos orgânicos para 21 (vinte e um) pa-íses no período de agosto de 2006 a setembro de 2007, totalizando um valor pouco superior a US$ 12 (doze) milhões, sendo que desse montante, cerca de 60% foram adquiridos por países da UE.

No Rio Grande do Sul, foi constatado, através de pesquisa realizada pela Emater/RS, a exis-tência de 100 (cem) núcleos de produção agroecológica em todo o Estado, abrangendo um total de 2,5 mil hectares. Estes núcleos possuem desde 5 (cinco) famílias até mais de 100 agricultores na região, atuando, em grupos formais (cooperativas e associações) ou informais, na produção, industrialização e comercialização de alimentos orgânicos (SCHULTZ, 2002).

No que diz respeito à viabilidade econômica da agricultura orgânica, Pelinski (2004) em pes-quisa efetuada no município de Palmeira, estado do Paraná, observou que os cultivos de orgânicos de fumo e soja sem a necessidade de sobrevalorização de preço, alcançavam rentabilidade superior aos cultivos convencionais, resultado oposto ao verificado para cultura de batata inglesa. Segundo o autor,

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o resultado financeiro negativo atribuído ao cultivo orgânico da batata inglesa, se deve ao fato do manejo tecnológico dessa cultura ainda ser deficiente.

Um dos grandes problemas enfrentados no Brasil é a baixa especialização na produção e dis-tribuição dos produtos orgânicos. Conforme Fonseca & Campos (2000), a possibilidade dos agricultores coletivamente poderem ofertar um mix de produtos de acordo com as aptidões locais, observando os recursos de capital e mão-de-obra é uma realidade que deve ser explorada. Para esse autor, inde-pendente da forma de comercialização escolhida, há necessidade de um planejamento conjunto da produção, de uma parceria agricultor/assistência técnica/núcleo de agricultores e canais de comer-cialização. Assim, os plantios deveriam ser efetuados de acordo com uma venda provável e regular de mercadorias e com a época do ano, valorizando a oferta de um produto de qualidade.

5. Visão baseada em recursos (Resource-Based View - RBV)

Devido às diferentes mudanças globais ocorridas no cenário político e econômico mundial, surgiu uma oportunidade para a aplicação da Visão Baseada em Recursos no campo estratégico. Este estudo iniciou no final da década de 1950, sendo que um dos trabalhos pioneiros foi o realizado por Edith Penrose, publicado em 1959. A RBV busca observar as causas da variabilidade de desempenho nas firmas sendo relacionada à natureza específica dos recursos e competências que acumulam.

O caráter eclético que a Resource-Based View (RBV) possui considera os aspectos originados de várias linhas de pesquisa, como a economia, estratégia e organização industrial (RUGMAN & VER-BEKE, 2002).

Carneiro, Cavalcanti & Silva (1997) comentam que a RBV é disposta através das características necessárias dos recursos para que se tornem uma fonte de vantagem competitiva sustentável, incluin-do, a influência das barreiras de imitação sobre as diferenças de rentabilidade entre as empresas, o papel da história da empresa na obtenção e desenvolvimento de competências organizacionais críti-cas, a importância das diferenças das rotinas organizacionais para explicar as diferenças de rentabili-dade entre as empresas.

Os autores, ainda, destacam a complementaridade da RBV com o modelo de Porter, pois essa fornece uma análise consistente das forças e fraquezas da empresa, introduzindo entendimento supe-rior das condições à obtenção de vantagem competitiva sustentável.

Os recursos que as organizações possuem são dispostos através de todos os seus ativos, ca-pacidades, processos organizacionais, atributos das firmas, informação, conhecimento, entre outros controlados por esta. Os recursos devem ser habilitados para que a organização aperfeiçoe suas estra-tégias de modo a otimizar sua eficiência e efetividade (BARNEY, 1991).

Há uma diferenciação relacionada aos recursos e competências. Os recursos são elementos básicos, que podem ser adquiridos ou imitados em determinado grau, como os equipamentos, recursos financeiros, tecnologia e marca. Já as competências são elementos de nível superior, específicos da empresa, resultantes do aprendizado organizacional e da combinação única de vários recursos (CAR-NEIRO, CAVALCANTI & SILVA, 1997).

Grant (1991) classifica os componentes da RBV através dos recursos tangíveis, que podem ser visualizados e avaliados com clareza, que são os recursos humanos, financeiros e equipamentos; re-cursos intangíveis, que não podem ser observados diretamente, que é dado através do conhecimento, cultura organizacional, reputação da organização, habilidades gerenciais não documentadas ou tec-nológicas e o relacionamento que a organização possui com seus fornecedores e clientes, parceiros, e demais atores envolvidos.

Na Visão Baseada em Recursos, a percepção da estratégia deve ser iniciada através da identi-ficação dos recursos e competências existentes, seguindo pela avaliação da sustentabilidade da vanta-gem competitiva, para, por fim, escolher a estratégia adequada ao ambiente.

Na RBV há uma distribuição heterogênea de recursos entre as organizações de uma determi-nada indústria, resultando diferentes trajetórias experimentadas por estas. Já quando há dificuldade na replicação desses recursos, gera-se um potencializador de vantagens competitivas, podendo-se ter um desempenho sustentável e superior, até que a concorrência obtenha um conjunto de recursos semelhantes (BARNEY, 1991).

Com base nessa premissa, Durand (1999) realizou uma pesquisa em organizações francesas, as quais, visualizaram evidências empíricas onde a inimitabilidade e a imobilidade dos produtos afeta o desempenho financeiro e mercadológico de uma organização.

Barney (1991) ainda comenta que a RBV dispõe de forças que a organização pode utilizar para o aperfeiçoamento estratégico. Para que um recurso possua potencial que proporcione uma vantagem

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competitiva, necessita apresentar as seguintes características: é necessário que seja valioso, que tor-ne possível o aproveitamento de oportunidade ou a neutralização das ameaças presentes no ambiente organizacional; é preciso que seja raro entre as organizações envolvidas no mercado e seus potenciais concorrentes; também, deve ser não-perfeitamente imitável. Portanto, não deve haver substitutos que sejam estrategicamente equivalentes valiosos, disponíveis e imitáveis.

Mathews (2002) comenta que os recursos que a organização possui são considerados uma unidade fundamental de geração de valor. Estes não existem independentemente, mas dentro do con-texto da organização, são utilizados isoladamente ou de forma conjugada de maneira a criar vantagens competitivas sustentáveis para levar a organização ao sucesso de seus resultados que são esperados por seus sócios e acionistas.

Esses valores esperados deverão ser mensurados por alguma métrica de forma a estabelecer uma avaliação em relação ao desempenho da organização. Ressalta-se que a RBV estabelece uma união entre os recursos e o diferencial competitivo, sendo de suma importância a avaliação dos aspec-tos relacionados aos recursos, tais como a raridade e a imobilidade, e também dos aspectos que são associados ao desempenho da organização.

6. Análise e discussão dos resultados

No intuito de se analisar as questões referentes aos mecanismos de subvenções praticados

pela UE, observou-se que esses mecanismos - barreiras não-tarifárias - podem refletir diretamente na gestão do setor da citricultura orgânica brasileira.

Para Brasil (2007), um dos exemplos de barreiras não-tarifárias são os subsídios ofertados pe-los países desenvolvidos à produção e exportação de produtos agrícolas, que fomentam o crescimento do setor no mercado interno, diminuindo a necessidade de importações e provocando deslocamento da sobre-oferta de outros países para mercados menos atrativos, causando com isso, distorções nos preços internacionais e perda de competitividade por parte das nações em desenvolvimento.

Sob a ótica da RBV, os subsídios agrícolas podem ser classificados como recursos financeiros disponíveis que proporcionam vantagens competitivas a seus detentores. Barney (1991) comenta que tais recursos podem proporcionar desempenho sustentável e superior a concorrência até que esses obtenham as mesmas condições.

No que diz respeito à agricultura orgânica, a legislação europeia deixa claro a intenção de incrementar a atividade agrícola orgânica de seu produtor rural, subsidiando o sistema de produção a fim de compensar a redução de produtividade e rentabilidade. Tal política parece não fazer parte do contexto de rentabilidade e sustentabilidade econômica do produtor brasileiro, que não dispõe de semelhantes recursos para compensar a perda de riquezas.

Cabe ressaltar, ainda, que a disponibilidade de recursos financeiros por meio de subsídios neutraliza, na maioria das vezes, a ameaça de novos entrantes no mercado de produtos orgânicos na UE, o que comprometeria a competitividade, rendimentos e as condições de vida desejáveis a seus agricultores.

Como mencionado anteriormente, para que um recurso possa ser considerado como um ins-trumento de vantagem competitiva, é necessário que o mesmo seja valioso, raro e não perfeitamente imitável.

Entende-se, portanto, que o produto orgânico brasileiro, no caso específico dos citrus, é um produto valioso, pois por ser diferenciado, possui um relativo valor agregado em relação aos conven-cionais e também raro, pois o menor volume de produção não permite que seja facilmente acessível.

Do ponto de vista da imitabilidade, pode-se dizer que não é perfeitamente inimitável quando comparado ao produto convencional, pois suas características de cultivo e manejo o tornam um pro-duto diferenciado. No entanto, quando comparado a outros produtos orgânicos, salienta-se que o suco ou fruta cítrica produzidos na UE possuem praticamente as mesmas características físico-químicas do produto brasileiro, com a vantagem de fomentar o mercado local e manter as divisas dentro dessa comunidade, podendo ser considerada, contudo, uma commodity imitável.

Em vista dos pontos acima abordados e dadas as condições de análise, entende-se importante salientar os pressupostos da RBV utilizados para o presente estudo, isto é, a disponibilidade de recur-sos financeiros, a raridade e inimitabilidade dos produtos. Com base nesses pressupostos, sugere-se que o foco principal para a produção de cítricos orgânicos no Brasil deve estar voltado ao mercado in-terno, uma vez que os produtores europeus dispõe de vantagens competitivas em recursos inexistentes no Brasil, como por exemplo, a política de pagamentos ou subsídios agrícolas.

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Contudo, para substancializar esta análise, aponta-se a importância da construção e utiliza-ção de métricas para avaliação do desempenho do mercado de produtos orgânicos, em vista de que a escassa literatura encontrada sobre esse tema, não permite dispor dos elementos necessários para a realização de inferências mais concisas a respeito do assunto.

7. Considerações finais

Pode-se constatar neste trabalho que é possível avaliar com base nos pressupostos da RBV, os fatores que geram vantagem competitiva quando se compara o setor de produtos cítricos orgânicos numa relação bilateral entre o Brasil e UE.

Desse modo, utilizou-se como pressupostos de análise do mercado, a disponibilidade de re-cursos financeiros, a raridade e inimitabilidade dos produtos, características estas da RBV. Em função disso, sugeriu-se que a produção de cítricos orgânicos no Brasil seja direcionada para o mercado inter-no, uma vez que a realidade europeia dispõe de vantagens competitivas em recursos não existentes no Brasil, principalmente devido ao fato de que na UE os produtos orgânicos são vistos como um instru-mento de política social.

É importante destacar, que para a elaboração de uma análise macroeconômica quantitativa deste setor, faz-se necessário a existência de dados mais consistentes e com maior rigor científico a respeito do mercado de produtos orgânicos no Brasil, pois observou-se na coleta de material para elaboração desse artigo a incipiência de informações numéricas e a grande ocorrência de publicações opinativas carregadas de ideologia.

Outra questão observada diz respeito a ausência de leis específicas nacionais vigentes sobre a regulamentação do setor de orgânicos, havendo somente, normatizações superficiais que dispõem de forma geral sobre este assunto.

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O processo de gestão dos polosde educação a distância

Eduardo Pertille Costa Leite1

Resumo

São indiscutíveis as contribuições que a educação à distância oferece à expansão do ensino superior público e de qualidade. Nesse novo cenário, o polo de apoio pre-sencial aparece como espaço importante, trazendo à tona a necessidade de se olhar para seus processos de gestão. Este estudo buscou, então, apresentar como está ocorrendo a gestão desses polos através das cinco áreas preconizadas por Catapan et al. (2011): gestão estratégica, de projetos, de infraestrutura, de equipe e de proces-sos. Para tanto, realizou-se uma pesquisa descritiva, através da aplicação individual de questionário para dez gestores de polos gaúchos, constituindo uma amostra de 20% dos polos UAB/CAPES do Estado. Os resultados mostraram que a gestão de pro-jetos não está sendo implementada em nenhum polo e as gestões estratégica e de processos encontram-se ainda incipientes. Com relação à gestão estratégica, apesar de 70% dos polos efetuarem procedimentos de planejamento de ações, apenas um o faz a partir de um plano de gestão propriamente dito. Na gestão de processos, 60% dos polos ainda não possuem orçamento próprio e a alocação e gerenciamento de recursos são realizados a partir de decisões tomadas em conjunto com as Secretarias Municipais de Educação. Nenhum polo faz autoavaliação de processos, deixando esta por conta, basicamente, do MEC. As gestões de infraestrutura e de equipe foram as de melhor estruturação, apesar de possuírem problemas. A infraestrutura é o que mais tem preocupado os gestores, tanto em nível de espaço físico, quanto de tec-nologia. E na gestão da equipe observou-se que os coordenadores estão assumindo mais do que deveriam, pois estão acompanhando e supervisionando os tutores pre-senciais, incumbência esta dos coordenadores de curso e de tutoria. Conclui-se que a complexidade requerida à gestão de polos ainda não está totalmente viabilizada, necessitando de novos e mais aprofundados estudos.

Palavras-chave

Educação a distância; processos de gestão; polos de apoio presencial.

Abstract

The contributions of Distance Education to expansion of quality State higher educa-tion are unquestionable. In this new scenario the personal assistance pole is shown as an important space bringing out a need for looking inside your management processes. So this study aimed to outline how are being managed these poles trough the five areas recommended by Catapan et al. (2011): strategic management, pro-jects, infrastructure, team and processes. It has been held a descriptive research by way of an individual application of a questionnaire to ten managers of poles of Rio Grande do Sul which resulted in a sample of 20% of UAB/CAPES poles of the State. The results have shown that project management was not being implemented in any pole and strategic management and processes management are still inci-pient. Besides 70% of the poles realize procedures ofplanning actions regarding to strategic management only one does that from a management plan. In processes

(1) Mestre em Políticas e Planejamento Universitário, Professor da Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre (RS), Professor da Faculdade IENH de Novo Hamburgo (RS), Coordenador de Projetos da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS. E-mail: [email protected]

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management, 60% of the poles do not have their own budget as allocation of the resources and management is carried out from decisions taken together with Mu-nicipal Secretaries of Education. No self- evaluation of processes was carried out by the poles but by Ministry of Education and Culture. The infrastructure and team management were best structured even though problems may exist. The infrastructure is the most concerning item for the managers whether in the level of physical space or technology level. In the team management it was noted that the coordinators are more committed than they should as they are monitoring and supervising the personal tutors, which should be done by course coordinators and tutoring coordinators. The conclusion is that the required complexity to pole management is not completely provided yet requiring new and depth studies.

Keywords

distance education; processes management; personal assistance poles.

1. Introdução

Nos últimos anos, várias mudanças significativas foram promovidas pelo Ministério da Edu-cação, no sentido de colocar em ação políticas públicas voltadas à inclusão social de pessoas que foram, historicamente, excluídas do sistema educacional. Dentre os diversos programas a serviço da educação, de acordo com Brito (2008), “o ensino superior público brasileiro foi redimensionado, espe-cialmente, pela confluência de três importantes iniciativas políticas: a democratização, a expansão e a interiorização da educação superior”.

Nesse contexto, as Instituições de Ensino Superior (IES) vivem num ambiente de mudanças e transformações que desafiam suas tradicionais estruturas e suas estratégias. E, uma das principais mudanças remete-se ao crescimento da educação a distância (EAD) nas Universidades, a qual “ressur-ge no cenário educacional como uma das possibilidades de democratizar o acesso ao ensino superior, especialmente, para as pessoas que residem em regiões geograficamente distantes das cidades que possuem universidades públicas” (BRITO, 2008).

No ano de 2006, através do Decreto nº 5800, criou-se o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), integrando diversas universidades públicas que oferecem cursos superiores à distância, visando facilitar o acesso à formação universitária, minimizando tais dificuldades através da educação a dis-tância, priorizando a formação de professores da educação básica, bem como dos trabalhadores em educação.

Seu funcionamento se dá a partir da articulação entre as instituições de ensino superior e os governos dos Estados e Municípios, atendendo às demandas locais por educação superior. A partir dessas, identifica-se a instituição para atendê-las e os polos de apoio presencial para desenvolvimento dos cursos. Após todas as articulações necessárias, o Sistema UAB encarrega-se do fomento às ações.

Para que esse crescimento seja consolidado, então, é necessária a criação de Polos de Apoio Presencial. O polo é o “braço operacional” da Instituição de Ensino Superior na cidade do estudante ou mais próxima dele, onde acontecem os encontros presenciais, o acompanhamento e a orientação para os estudos, as práticas laboratoriais e as avaliações presenciais.

De acordo com o já referido Decreto nº 5800 de 2006, um polo de apoio presencial pode ser caracterizado como uma unidade operacional para o desenvolvimento descentralizado de atividades pedagógicas e administrativas, relativas aos cursos e programas ofertados a distância pelas instituições públicas de ensino superior.

Estudos comprovam que o polo de apoio presencial cria as condições para a permanência do aluno no curso, possibilitando um vínculo mais próximo com a Universidade, valorizando a expansão, a interiorização e a regionalização da oferta de educação superior. Dada a sua importância, pode-se afirmar que tais polos se tornam essenciais à efetivação da educação a distância brasileira.

Nesse sentido, Zuin (2006) afirma que os polos de apoio presencial podem ser identificados como elementos cruciais para o desenvolvimento do processo educacional a distância.

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Nos locais escolhidos como polos, os estudantes dos cursos superiores a distancia tem acesso a bibliote-cas, são atendidos pelos tutores, assistem às aulas e têm a sua disposição um laboratório de informática com recursos tecnológicos, interligados à internet, que lhes possibilitam estudar os módulos dos res-pectivos cursos na forma de artigos e apostilas on line, por exemplo (COSTA; COSTA, 2009).

Assim, a educação a distância pode ser vista como um espaço sistêmico, descentralizado e éti-co, o qual exige a flexibilidade dos processos, postura de escuta e valorização do outro, apresentando características que contribuem para a democratização do acesso ao conhecimento, diversificação no processo de aprendizagem e ampliação dos espaços educacionais. E, nesse contexto, os polos de apoio presencial representam grande parte do sucesso dessa modalidade educacional.

Conforme se pode observar, a gestão da educação a distância passa necessariamente pelos polos de apoio presencial. Mais do que isso, de acordo com Catapan et al. (2011), a criação dos polos é uma das condições essenciais à educação a distancia, pois possibilita “que se estenda o ensino supe-rior a lugares distantes, favorecendo a uma descentralização do ensino e uma maior democratização e acesso”.

Sobre esta questão, estudos de Catapan et al. (2011) propõem a construção de referenciais de qualidade para a gestão eficaz desses polos diante do Sistema Universidade Aberta do Brasil, já que, segundo os mesmos autores, “a gestão destes polos de apoio presenciais tem constituído um problema, devido à carência de encaminhamentos adequados para gerenciamento e operacionalização destes ambientes”.

Segundo tais estudos, a gestão dos polos de apoio presencial passa pelo domínio e emprego de técnicas relacionadas com cinco grandes áreas da gestão: gestão estratégica, gestão de projetos, gestão de infraestrutura, gestão de equipe e gestão de processos (CATAPAN et al., 2011).

Neste contexto surge nosso problema de pesquisa: Como está sendo desenvolvida a gestão nos polos de apoio presencial, a partir das cinco áreas de gestão - estratégica, de projetos, de infraestru-tura, de equipe e de processos? Para dar conta desse grande questionamento, este estudo se propõe a investigar a gestão nos polos de apoio presencial do Estado do Rio Grande do Sul.

2. Metodologia

Este estudo caracteriza-se como uma pesquisa descritiva, a qual segundo Gil (2008) possui como objetivo a descrição das características de uma população, fenômeno ou de uma experiência. Nesse sentido, a pesquisa descritiva é realizada para compreender-se uma dada situação, proporcio-nando novas visões sobre uma dada realidade, buscando a compreensão sobre dado fenômeno.

No caso específico deste estudo, a pesquisa descritiva teve como objetivo identificar como está sendo desenvolvida a gestão nos polos de apoio presencial situados no Estado do Rio Grande do Sul, a partir das cinco áreas de gestão - estratégica, de projetos, de infraestrutura, de equipe e de processos – estabelecidas por Catapan et al. (2011).

O estudo explorou a literatura e a legislação pertinentes à área de interesse. Além do suporte da literatura, também se coletou dados empíricos, através de questionário estruturado, aplicado a 10 polos situados no Estado do Rio Grande do Sul, o que corresponde à amostra de 20% do total de polos UAB/CAPES no referido Estado. O questionário foi aplicado individualmente, a cada coordenador de polo. Os dados geraram análises quantitativas e qualitativas a respeito da gestão desses polos.

3. Análise dos Dados – A Gestão dos Polos de Apoio Presencial

Os polos de apoio presencial constituem-se de grande importância ao processo de educação a distância de qualidade. O Decreto nº 5622 de 2005 (BRASIL, 2005) prevê, em seu artigo 1º, momentos presenciais obrigatórios, os quais devem ser realizados na sede da instituição ou nos polos de apoio presencial, devidamente credenciados, conforme orienta o Decreto nº 6.303 de 2007 (BRASIL, 2007).

Nesse contexto, investigar a gestão nesses espaços torna-se crucial para identificar, em última instância, como os processos de educação à distância estão sendo desenvolvidos. Tanto a literatura pertinente, quanto as documentações e regramentos legais sobre o tema abordam uma estrutura mí-nima a esses espaços, tanto em nível de infraestrutura, equipamentos, quanto de recursos humanos.

Essa estrutura proposta constitui-se em balizador para análises de adequação aos parâmetros mínimos de qualidade e serão discutidos conjuntamente com os dados que serão apresentados a seguir. Assim, para dar conta do objetivo geral deste estudo, a análise e discussão dos dados serão feitas a partir das cinco áreas de gestão investigadas.

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3.1. Gestão Estratégica

De acordo com Certo; Peter (1993, p. 5) o conceito para gestão estratégica tem evoluído através do tempo e continuará a evoluir, não possuindo, ainda, um consenso conceitual. Para Andrade; Santos (2009, p. 7), “a gestão estratégica refere-se a um modelo de gestão que incorpora os princípios de pensamento e ferramentas do planejamento, desenvolvimento, controle e avaliação estratégicos e sua aplicação nos diversos subsistemas que compõem o sistema administrativo de uma organização”.

Também Tavares (1991) afirma que essa gestão vincula-se ao planejamento estratégico vincu-lado a tomada de decisão em todos os níveis institucionais. A gestão de um polo de apoio presencial deveria orientar-se pelos preceitos da gestão estratégica, ou seja, nas palavras de Certo; Peter (1993, p. 6), um “processo contínuo e iterativo que visa manter uma organização, como um conjunto apro-priadamente integrado ao seu ambiente”.

Observa-se, portanto, que a gestão estratégica está vinculada a tomada de decisão, ao plano estratégico, bem como as possibilidades de dirigir o polo. Com relação ao processo de planejamento do polo, identificou-se que 70% dos polos referem que efetuam procedimentos de planejamento de suas ações, conforme mostra o Gráfico 1, abaixo.

Gráfico 1: Percentual de planejamento dos polos.

Buscando esclarecimentos mais profundos acerca desse processo de planejamento, realizado pelos polos, buscou-se identificar a forma de desenvolvimento do mesmo. Como resposta, obteve-se o seguinte retorno, conforme apresenta a Tabela 1, que se segue.

Tabela 1: Forma de Planejamento realizado pelos polos (%).

Formas de planejamento Percentual Nº

Articulação informal com a Prefeitura 10 01

Elaboração do Plano de Gestão do Polo 10 01

Planejamento articulado entre equipe do polo e ConselhoMunicipal de Educação

10 01

Planejamento articulado entre equipe do polo, IES e Prefeitura 20 02

Planejamento construído pela equipe do polo 30 03

Observa-se que 60% dos polos referem que seu planejamento envolve a equipe que compõe o próprio polo. Destes, alguns polos envolvem, ainda, a prefeitura, o conselho municipal de educação e as instituições de ensino superior que desenvolvem atividades no polo. Apenas um polo relatou a construção de um plano de gestão propriamente dito. No outro extremo, um polo relatou que o pla-nejamento é feito a partir de uma articulação informal com a prefeitura. Desses dados depreende-se que a gestão estratégica, tal qual propõem os conceitos estudados, ainda está longe de acontecer nos polos gaúchos investigados.

Ainda com relação à gestão estratégica, a questão do nível de autonomia do gestor torna-se fundamental. Nesse contexto, identificou-se que 60% dos coordenadores de polo relatam que possuem

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um nível alto de autonomia nas decisões do polo, conforme mostra a Tabela 2.

Tabela 2: Nível de autonomia do gestor nas decisões do polo (%).

Níveis de autonomia Percentual Nº

Baixo 0 0

Médio 40 04

Alto 60 06

A partir dos dados informados anteriormente, observa-se que o papel do coordenador do polo, enquanto gestor, é fundamental. Sobre esta questão Catapan et al. (2011, p. 6) afirmam que “sem o domínio dos princípios básicos de gestão o coordenador pode ter dificuldade de conduzir o polo e permitir sérios transtornos aos professores, tutores e coordenação geral dos cursos, tornando assim insustentável as realizações previstas para sua função”. Dessa afirmação depreende-se que a formação desse gestor torna-se importante, já que esta deve contemplar não somente aspectos pedagógicos, como também administrativos. Assim, quanto à formação dos gestores, temos os seguintes dados, explicitados na Tabela 3:

Tabela 3: Formação dos gestores dos polos (%).

Formação dos Gestores Percentual Nº

Graduação 100 10

Especialização em diversas áreas do conhecimento 80 08

Especialização em gestão 40 04

Conforme se pode identificar, todas as pessoas envolvidas com a coordenação dos polos pes-quisados possuem pelo menos formação em nível de graduação. São professores da rede pública de ensino, com formação pedagógica, que foram realocados pelas prefeituras para atuar nos polos. Tal dado vem ao encontro do regramento do Sistema UAB, que afirma que “o Coordenador de Polo é um professor da rede pública selecionado para responder pela coordenação de polo de apoio presencial”. E, ainda, “o Coordenador de Polo deve ser graduado e comprovar, no mínimo, três anos de experiência em magistério na educação básica ou superior” (UAB, 2012).

Desses coordenadores, 80% possuem alguma formação em nível de pós-graduação lato senso (especialização) em diversas áreas do conhecimento e, dentre essas, 40% são especialistas na área específica de gestão. O que se depreende desse dado é que a coordenação desses polos está sendo efetivada por profissionais da área da educação, capacitados pedagogicamente, com conhecimentos na área da educação, fato importante para a compreensão da educação à distância, enquanto modali-dade de educação e sua importância. No entanto, ainda necessitariam de capacitação mais específica na área da gestão.

3.2. Gestão de Projetos

Um projeto refere-se a uma iniciativa única, com objetivo bem definido e com início, meio e fim. Nesse sentido, a gestão de projetos relaciona-se com a aplicação de conhecimentos, habilidades e técnicas na elaboração de atividades relacionadas para atingir um conjunto de objetivos pré-definidos, envolvendo escopo, prazo, custo, risco, qualidade e metas do projeto.

De acordo com Catapan et al. (2011, p. 7), “um coordenador de polo pode e deve utilizar o conhecimento de gestão de projeto para controlar os processos administrativos e pedagógicos nos polos”. Esse conhecimento poderia auxiliar o desenvolvimento de projetos nos polos, bem como “no entendimento de projetos capilarizados da coordenação geral de polos”. No entanto, apesar da impor-tância, não se identificou o uso desse tipo de gestão nos polos investigados.

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3.3. Gestão de Infraestrutura

Para Catapan et al. (2011, p. 6), “a gestão de infraestrutura é um ponto de fundamental importância dentro da administração de um polo”. Gestar a infraestrutura significa dar conta da administração das condições básicas de uso do polo, tanto em nível de tecnologia da informação, quanto de distribuição de área física.

Sobre este ponto, há que se pensar no tamanho geral do polo e quantitativos de equipamen-tos, dependendo do número de alunos e cursos a serem atendidos, mantendo instalações físicas neces-sárias ao atendimento de todos os atores envolvidos nos processos de ensino-aprendizagem à distân-cia. Assim, com relação à área física dos polos, verificou-se que 50% dos mesmos possuem área superior a 300m2, podendo ser considerados de médio a grande porte, conforme mostra o Gráfico 2, a seguir.

Gráfico 2: Área física dos polos (%).

Tal dado parece estar coerente com relação ao número de alunos que são atendidos, em média, nesses polos, já que 60% deles possuem mais de 300 alunos, conforme apresenta o Gráfico 3, abaixo.

Gráfico 3: Nº de alunos nos polos (%).

Ainda, há que se considerar, conforme apresenta o site da UAB, a proposta de infraestrutura mínima aos polos de apoio presencial, a partir da área física mínima, a qual deve conter (UAB, 2012):

• Sala para secretaria acadêmica;• Sala de coordenação de polo;• Sala de tutores presenciais;• Sala de professores;• Sala de aula presencial;• Laboratório de informática;• Biblioteca.

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Com relação a esta área física mínima, identificamos que os polos investigados possuem a seguinte distribuição de área física, conforme mostra o Gráfico 4:

Gráfico 4: Distribuição da área física nos polos (%).

A partir do gráfico 4, observa-se que principalmente as salas de coordenação, de secretaria e biblioteca encontram-se deficitárias em alguns polos. Há que se considerar, também, que um polo não respondeu essa questão, o que explica porque o percentual máximo de respostas para a questão está em 90%.

A gestão da infraestrutura responde também pelas questões que envolvem a tecnologia da informação, assegurando aos usuários do polo o bom funcionamento dos recursos que compõem o par-que tecnológico do polo. Neste estudo verificamos que 100% dos polos possuem redes de internet sem e com fio e que os gestores se preocupam com a otimização na utilização dos recursos tecnológicos disponíveis nos polos.

Complementando essa questão, quando questionados sobre a manutenção dos recursos tec-nológicos do polo, os gestores informaram que esta se dá, basicamente, de três formas, dependendo do polo: por empresas terceirizadas, pela própria prefeitura ou por uma equipe existente no polo. O Gráfico 5, que se segue, apresenta tais dados:

Gráfico 5: Manutenção dos equipamentos de informática do polo (%).

Observa-se que apenas 20% dos polos relatam possuir equipe própria para a manutenção dos recursos tecnológicos. Esse ponto pode ser considerado perigoso, haja vista que as atividades pedagó-gicas de cursos à distância dependem, basicamente, do bom funcionamento da infraestrutura tecno-lógica existente nos polos. Nesse sentido, a gestão da infraestrutura deveria coadunar com a gestão estratégica, somando esforços no sentido de garantir equipe própria em tempo integral para este fim.

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3.4. Gestão da Equipe

A gestão da equipe responde, basicamente, em como o gestor conduz sua equipe e como essa equipe é selecionada. Assim, de acordo com Catapan et al. (2011, p. 7), “a perspectiva da criação de uma boa equipe multidisciplinar de trabalho é fundamental para que se consigam atingir os resultados no sistema de educação a distância”.

Minimamente, a UAB apresenta em seu site, como atores imprescindíveis nos polos de apoio presencial (UAB, 2012):

• Coordenador de polo;• Tutor presencial;• Técnico em informática;• Bibliotecário;• Auxiliar de secretaria.

O sistema UAB oferece bolsas aos coordenadores e aos tutores. A remuneração dos demais atores fica a cargo do mantenedor do polo, que pode ser o Município, o Estado ou ambos, através de consórcio (UAB, 2012). Com relação aos atores que atuam nos polos investigados, encontramos as se-guintes funções, conforme Gráfico 6:

Gráfico 6: Equipe que atua nos polos (%).

Dos dados apresentados, dois pontos são importantes e merecem destaque. O primeiro diz respeito à ausência, em número significativo de polos (60%), da figura do bibliotecário, considerado como recurso humano fundamental nos polos. O segundo ponto trata da presença de técnicos de infor-mática nos polos, onde 80% deles referem ter esse técnico. No entanto, em questão anterior apenas 20% dos polos relata realizar as manutenções tecnológicas necessárias através de equipe própria. Desse dado depreende-se uma contradição nas informações, ou seja, de um lado temos 80% dos polos com técnico de informática, e por outro, temos esses mesmos polos com apenas 20% das manutenções na área realizadas por equipe própria.

Outro ponto importante da gestão de equipe trata da seleção dessa equipe, sendo que essa se inicia pelo próprio gestor do polo. Assim, com relação à seleção da coordenação dos polos, foram obtidas as seguintes respostas, conforme mostra a Tabela 4:

Tabela 4: Seleção dos gestores dos polos (%).

Seleção dos gestores Percentual Nº

Processo seletivo/edital 10 01

Pela UAB/MEC a partir de lista tríplice de currículos 60 06

Pela Secretaria de Educação a partir de currículos 10 01

Pelas IPES a partir de currículos 10 01

Convite da Secretaria de Educação 01 01

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Algumas das respostas obtidas são de coordenadores que estão já há algum tempo na função, quando esse regramento não era tão acurado e a seleção praticamente não existia. A partir do ano de 2006, através da Resolução CD/FNDE nº 26/2009 (BRASIL, 2009) esse processo foi delineado com mais precisão.

A referida Resolução define, em seu artigo 5º, que é da competência dos Estados e Municípios proponentes de polos presenciais de apoio a educação à distância a indicação de professores da rede pública de ensino para a função de coordenador de polo. Complementarmente, é da competência das Instituições Públicas de Ensino Superior (IPES) a seleção desses coordenadores. Ainda, o artigo 6º da mesma Resolução determina que essa seleção deve ser precedida de ampla divulgação, tornando públicos os critérios de seleção dos interessados.

No ano de 2008, a partir de um Comunicado, a UAB/CAPES reiterou a importância do processo de seleção dos coordenadores de polo, orientando os Municípios a encaminhar aos Coordenadores UAB de todas as IPES que ofertam cursos nos polos, a indicação de três professores da rede pública de en-sino, acompanhada de seus currículos. Essa orientação explica algumas das respostas obtidas.

Para o ano de 2012 a DED/CAPES orienta que o órgão mantenedor de cada polo envie uma lista tríplice à DED/CAPES, acompanhada de currículo, comprovante de tempo de experiência no ma-gistério, comprovante de efetividade na rede pública de ensino e comprovantes de formação superior. A DED/CAPES verificará os currículos enviados e enviará a lista tríplice às IPES, que farão a seleção.

Cabe acrescentar que o papel da coordenação é importante à execução das políticas educa-cionais, já que é no polo que tais políticas são executadas em última instância. Conforme o Anexo 1 da Resolução nº 26/2009 do FNDE, cabe ao coordenador de polo, dentre outras atribuições, acompanhar e coordenar as atividades docentes, discentes e administrativas do polo; acompanhar as atividades de ensino, presenciais e a distância; garantir as atividades de ensino-aprendizagem; articular, junto às IPES presentes no polo, a realização das atividades dos diversos cursos.

Outra atividade que cabe ao coordenador do polo é elaborar e encaminhar às coordenações de cursos relatório de frequência e desempenho dos tutores e técnicos atuantes no polo. Ou seja, o papel do gestor do polo é de observação desses tutores. No entanto, quando questionados sobre a autonomia da coordenação do polo sobre os tutores presenciais, 80% deles responderam possuí-la. O Gráfico 7 mostra esses dados.

Gráfico 7: Autonomia da coordenação do polo sobre os tutores presenciais (%).

O mesmo Anexo 1 da Resolução nº 26/2009 do FNDE coloca como função da coordenação do curso acompanhar e supervisionar as atividades dos tutores e, ainda, como função do coordenador de tutoria acompanhar e supervisionar as atividades dos tutores. Ou seja, o acompanhamento dos tutores não cabe ao coordenador de polo, mas a esses outros dois atores, segundo regramento legal pertinente.

3.5. Gestão de Processos

Um processo pode ser definido como um grupo de tarefas interligadas, que utilizam recursos institucionais para gerar resultados definidos, de forma a apoiar os objetivos da instituição (HARRIN-GTON, 1993). A gestão de processos deve ocorrer, então, através de ações sistemáticas e delineadas previamente, buscando o estabelecimento de rotinas de trabalho em prol de determinado resultado.

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Para tanto, torna-se essencial que a gestão desses processos ocorra desde o delineamento inicial dos mesmos, a partir da chegada de recursos financeiros, até a sua execução final, através da prestação de contas. Silva et al. (2010, p. 08) afirmam que “a excelência de gestão dos polos de apoio presencial é fundamental para um desenvolvimento profícuo do trabalho de mediação do ensino e aprendizagem”.

Tal processo de gestão se inicia pela presença, nos polos, de um orçamento próprio. Nesse contexto, identificamos que 60% dos polos investigados ainda não possuem tal orçamento, conforme apresenta o Gráfico 8:

Gráfico 8: Condição de orçamento nos polos (%).

Complementando tal informação, temos a questão da alocação e gerenciamento dos recur-sos financeiros que possibilitam a implementação dos processos nos polos. Sobre este ponto, 60% dos gestores afirmaram que esta é uma decisão tomada pela coordenação do polo em conjunto com a Secretaria Municipal de Educação. O Gráfico 9, apresenta melhor tais dados.

Gráfico 9: Alocação e gestão de recursos financeiros nos polos (%).

Conforme se observa no Gráfico 9, apenas 10% dos polos afirmam possuir LDO (lei de diretrizes orçamentárias) própria, fato que pode impactar na gestão de processos e tomada de decisão dos ges-tores com relação à administração do polo ou, até mesmo, impedi-la.

Ainda, toda gestão de processos depende, em sua última etapa, do processo de avaliação ou feedback. Nos polos investigados, 100% referem possuir processo externo de avaliação instalado regu-larmente. Quando questionados sobre quais instituições avaliam o polo regularmente, obtivemos como retorno as seguintes respostas, constantes na Tabela 5:

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Tabela 5: Instituições que avaliam os polos (%).

Instituições Percentual Nº

Ministério da Educação 100 10

Instituições de Ensino Superior 60 06

Prefeitura Municipal 10 01

Conforme apresenta a Tabela 5, todos os polos referem ser avaliados externamente. O MEC aparece como sendo a instituição que avalia regularmente todos os polos investigados. Este fato está condizente com a política de educação à distância, a qual prevê a avaliação da SEED/MEC e também do INEP de todos os polos cadastrados pelo Sistema UAB, objetivando com isto zelar pela qualidade da oferta dos cursos, bem como orientar e dar suporte aos polos para o fortalecimento da educação a distância no país (UAB, 2012).

Chamou-nos a atenção o fato de somente 10% dos polos referirem ser avaliados pela Prefeitura Municipal. No entanto, esta é a principal instituição mantenedora dos mesmos, sendo responsável por estruturar, organizar e manter os polos de apoio presencial de acordo com as orientações do Sistema UAB, provendo-os de infraestrutura adequada e contratação de pessoal (UAB, 2012). Há que se consi-derar ainda o processo de avaliação interno ou autoavaliação, o qual não foi mencionado por nenhum polo, apesar de se constituir em etapa importante da gestão de processos.

4. Considerações Finais

São indiscutíveis as contribuições da expansão e da interiorização da educação à distância no país, no sentido de levar a um público novo as possibilidades de uma educação superior pública e de qualidade, conseguindo através desse processo atingir uma maior quantidade de pessoas, muitas das quais distanciadas dos grandes centros urbanos.

Nesse novo cenário, os polos de apoio presencial aparecem como importantes espaços de con-cretização do processo de ensino-aprendizagem à distância, abrigando os novos atores que passam a fazer parte deste. A complexidade de estrutura requerida pela educação a distância de qualidade traz a tona a necessidade de se olhar com cuidado para os processos de gestão desses espaços.

Este estudo buscou, então, apresentar como está ocorrendo a gestão desses polos, vistos enquanto espaços fundamentais à concretização da educação à distância, através das cinco grandes áreas de gestão preconizadas por Catapan et al. (2011): gestão estratégica, gestão de projetos, gestão de infraestrutura, gestão de equipe e gestão de processos.

De todas as cinco áreas, a gestão de projetos não foi identificada em nenhum polo e as gestões estratégica e de processos encontram-se ainda de forma bastante incipiente. Assim, com relação à gestão estratégica identificou-se que 70% dos polos efetuam procedimentos de planejamento de suas ações. Porém, apenas um polo o faz a partir de um plano de gestão propriamente dito. No outro extre-mo, encontramos um polo cujo planejamento é feito a partir de articulação informal com a prefeitura.

Com relação à gestão de processos, 60% dos polos ainda não possuem orçamento próprio e a alocação e gerenciamento de seus recursos financeiros, os quais possibilitam a implementação de processos, é realizada a partir de decisões tomadas em conjunto com a Secretaria Municipal de Educa-ção. Também a avaliação está comprometida, já que nenhum polo relatou fazer autoavaliação de seus processos, deixando esta por conta, basicamente, do MEC.

As gestões de infraestrutura e de equipe, apesar de ainda possuírem problemas, foram as de melhor estruturação nos polos investigados. Assim temos que a gestão de infraestrutura é a que mais têm preocupado os gestores, tanto em nível de espaço físico, quanto de tecnologia. Já na gestão de equipe os dados mostraram que os coordenadores estão assumindo mais do que deveriam, pois estão acompanhando e supervisionando as atividades dos tutores presenciais, incumbência esta que caberia aos coordenadores de curso e de tutoria.

Como palavra final fica a certeza da necessidade de novos e mais profundos estudos a respeito do tema, tendo em vista a sua relevância à educação à distância brasileira. A gestão dos polos de apoio presencial afeta diretamente os processos de ensino-aprendizagem à distância, cabendo também às instituições de ensino superior, no sentido de parceira nesse processo educativo, graças a seu know-how, contribuir com os gestores de polos, no sentido de muni-los de conhecimentos e habilidades necessários ao bom desempenho de suas funções.

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Relações de coautorias na revistaeletrônica de administração:

análises e perspectivas

Ariel Behr1

Caterina Marta Groposo Pavão2

Resumo

A cooperação científica em termos de coautoria vem permitindo a realização de estudos na área de redes sociais. O artigo escrito em coautoria não consegue refletir a real cooperação entre os autores, uma vez que a coautoria de um artigo está rela-cionada ao contexto social e tecnológico em que se encontram os colaboradores. O objetivo deste artigo esteve em analisar as relações de coautorias em um periódico da área de Administração, para encontrar padrões de cooperação na publicação de seus artigos. Para tanto foi escolhida a Revista Eletrônica de Administração – REAd. Para tornar mais claro o tema tratado foram trazidas referências acerca das temá-ticas de Redes Sociais na Ciência e de Contribuições da Coautoria. A pesquisa teve como objeto de estudo os artigos publicados na REAd entre os anos de 1995 e 2010, a coleta desses artigos realizou-se numa busca no SABi - Sistema de Automação de Bibliotecas da UFRGS. Com base nesses critérios foram recuperados 514 artigos da REAd incluídos no SABi pela biblioteca da Escola de Administração. Utilizou-se na análise dos dados uma abordagem quantitativa que permitiu, além do apoio às análi-ses de rede, obter informações estatísticas complementares sobre o comportamento da Revista no que tange ao número de artigos publicados. Foi possível verificar que a rede de coautoria da REAd é uma rede pouco conectada, muitos artigos são de autoria única, os quais foram excluídos da análise; ou de autoria dupla sem conexão com grupos maiores ou atores mais centrais da rede.

Palavras-Chave

Coautoria; Bibliometria; Redes Sociais na Ciência.

Abstract

Scientific cooperation in terms of co-authorship is allowing studies in the area of social networks. The article written in co-authorship fails to reflect the real coope-ration between the authors, once the co-authors of an article is related to the social and technological context in which collaborators are. This paper looks to analyze the co-authorship relations in a journal in the field of Administration, to find patterns of cooperation in the publication of their articles. Was chosen Revista Eletrônica de Administração – REAd. To clarify the topic addressed were brought references about Science Social Networks and contributions of co-authorship. The research had as its object of study the REAd published articles between the years 1995 and 2010, and collecting these items held in a quest on SABi - Sistema de Automação de Bibliote-cas by UFRGS. Based on these criteria were retrieved 514 REAd articles included in SABi by School of Management Library. It was used in the data analysis a quantita-tive approach that allowed, in addition to support for network analysis, additional

(1) [email protected] . Universidade Federal do Rio Grande do Sul – RS / Brasil.

(2) [email protected] . Universidade Federal do Rio Grande do Sul – RS / Brasil.

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statistical information about the behavior of the Journal regarding the number of articles published. It was possible to verify that co-authorship network of REAd is a bit connected network, many articles are authored by a single author, which were excluded from the analysis; or dual authorship without connecting to larger groups or central actors in the network.

Keywords

Co-authorship; Bibliometrics; Science Social Networks.

Introdução

A área de administração segue a tendência de muitas outras, rumando à especialização de seus profissionais e de suas áreas de atuação. Nesta corrente, as temáticas que constituem a área de estudos seguem a mesma tendência, o que pode ser visualizado inclusive nos eventos e periódicos da área.

A Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD) coordena o evento mais relevante da área – EnANPAD – que em sua última edição, em 2010, obteve 2.910 traba-lhos submetidos, dentre os quais 860 selecionados. As divisões acadêmicas deste encontro represen-tam esta tendência de especialização da área, sendo elas 11 divisões, e estas compostas entre 7 e 13 áreas cada, totalizando 108 áreas temáticas (ANPAD, 2011). Diante desta realidade estudos que abor-dem as tendências da área, incluindo aí a produção de conhecimento na mesma, se fazem relevantes, influenciando organizações, profissionais e acadêmicos.

A cooperação entre pesquisadores tem aumentado em freqüência e em número de colabora-dores possibilitando a formação de redes. A construção do conhecimento científico, que tradicional-mente era vista como trabalho individual, agora é formada por um grande conjunto de relacionamen-tos, cuja estrutura pode ser investigada por métodos formais de análise de redes sociais (ROSSONI; GUARIDO FILHO, 2009).

Os termos colaboração e cooperação muitas vezes são tratados como sinônimos, porém po-demos adotar a definição dada por Bair (1989) na qual coloca que colaboração é a comunicação entre pessoas que trabalham juntas e com um mesmo objetivo, porém essas pessoas são avaliadas individu-almente, e cooperação é a comunicação em que não existe mais o conceito de indivíduo, apenas o de grupo.

Frequentemente os estudos sobre a colaboração, utilizando a metodologia de análise de re-des sociais, tomam como base a cooperação entre cientistas evidenciada pela coautoria em artigos de periódicos ou outros documentos formais. Sabendo disso, e inspirada pelo estudo de Rossoni e Guarido Filho (2009), onde por meio de relações de coautoria é verificada a presença de estruturas de cooperação entre Programas de Pós-graduação em Administração no Brasil, esta pesquisa se propõe a analisar as relações de co-autorias em um periódico da área de Administração, para encontrar padrões de cooperação na publicação de seus artigos.

A fim de atingir este objetivo geral, foram traçados os seguintes objetivos específicos, quais sejam: contabilizar a quantidade de artigos publicados por autor; identificar a instituição de vínculo dos autores; contabilizar os artigos em coautoria e em autoria única e; identificar os assuntos mais abordados nos artigos, de acordo com a indexação atribuída pela Biblioteca da Escola de Administra-ção da UFRGS. Sendo assim, esta pesquisa se faz relevante, pois apresenta uma realidade na área de Administração, evidenciada pelos artigos publicados na Revista Eletrônica de Administração – REAd, pelas temáticas abordadas e pela relação de co-autorias em um tradicional periódico brasileiro.

A REAd, criada e publicada pela Escola de Administração da UFRGS no ano de 1995, foi a pri-meira revista eletrônica da área na América Latina. Atualmente está classificada no Sistema Qualis da CAPES no nível B2 (antigo Nacional A), e é um dos periódicos brasileiros aprovados para entrar na Co-leção SciELO. A Revista pode ser encontrada em diferentes indexadores e catálogos da área, no âmbito nacional e internacional, como por exemplo, no Catálogo LATINDEX (Sistema Regional de Información em Línea para Revistas Científicas de América Latina, Caribe, España y Portugal) e no ORIENTADOR Adviser (Infobase IBBA - Índice Brasileiro de Bibliografia de Administração).

Este estudo está dividido em cinco partes, sendo a primeira esta introdução, seguida pela apresentação das bases teóricas utilizadas, exposição do método de pesquisa, evidenciação e análise dos resultados e, por fim, a realização de conclusões.

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Bases teóricas

Nesta seção são apresentadas as principais bases teóricas que amparam o presente estudo. Sendo assim são trazidas referências acerca das temáticas de Redes Sociais na Ciência e de Contribui-ções da Coautoria, que futuramente aportarão a análise dos resultados.

1.1. Teoria das Redes Sociais

A Teoria de Redes Sociais, cuja origem remonta aos anos 30 e 40, tem recebido até sua configu-ração atual, diversas influências provenientes basicamente da antropologia, da psicologia, da sociologia e da matemática, tendo esta última, contribuído sobremaneira na sua formalização. É uma teoria na qual o desenvolvimento metodológico e formal, segundo Lozares (1996), não tem se dado de forma inde-pendente do teórico e conceitual, por isto se constitui num bom paradigma para um tipo de aproximação na qual teoria, corpo conceptual, métodos e técnicas de investigação estão mutuamente vinculados.

Durante as décadas de 70 e 80 a Teoria de Redes Sociais teve grandes avanços. Lozares (1996) acredita que a perspectiva inovadora da Teoria neste período teve fundamento em seu aspecto rela-cional, isto é, naquilo que traça vínculos ou relações entre entidades, sendo este aspecto atributivo diferente dos habituais baseados em análises estruturais empíricas.

As redes sociais podem ser representadas de diversas formas: pares de produtos cartesianos que indicam a relação entre as unidades, representação hierarquizada, grafos e matrizes. As duas úl-timas formas são as que possibilitam à primeira, mais gráfica, com uma melhor visualização da trama reticular. Já a representação hierarquizada proporciona uma maior potencialidade para cálculo de índices em redes de qualquer tamanho e complexidade (LOZARES, 1996).

A representação de uma rede social por meio de grafos ou sociograma é a forma mais simples utilizada para visualizar todos os tipos de relações presentes na rede. Resumidamente, Hanneman e Riddle (2005), explicam que, um grafo é composto por nós (atores ou pontos) conectados por linhas (vínculos ou relações). Um grafo pode representar um único tipo de vínculo entre os atores (simples) ou mais de um tipo (múltiplo). Cada vínculo, ou relação, pode ser orientado quando se origina de um ator forte e alcança um ator alvo, e também pode se configurar como representação de concorrência, presença ou reciprocidade entre um par de atores.

Os vínculos orientados são representados com setas, os vínculos recíprocos são representados por segmentos de reta. Os vínculos orientados podem ser recíprocos (A cita B, e vice-versa), sendo neste caso representados por uma seta com duas pontas. A fortaleza dos vínculos entre atores num grafo pode ser no-minal ou binária (representam presença ou ausência de vínculo). Por meio de sinais podem ser representados vínculos positivos, negativos ou ausência de vínculo. Números ordinais representam vínculos fortes, menos fortes, fracos, etc. Quando se faz referência à posição de um ator ou nó em um grafo, em relação aos outros nós ou atores, chama-se o ator focal de “ego” e os outros de “alters” (HANNEMAN; RIDDLE, 2005).

Contudo, a análise de redes sociais não se limita a uma descrição da forma como os atores se conectam, mas permite visualizar a estrutura das relações entre os agentes, a localização de cada um na rede, sua importância e as conseqüências da sua participação tanto para si como para o sistema como um todo. Corrobora com esta afirmação o que assevera Marteletto (2001):

A análise de redes não constitui um fim em si mesma. Ela é o meio para realizar uma análise estrutural cujo objetivo é mostrar em que a forma da rede é explicativa dos fenômenos analisados. O objetivo é demonstrar que a análise de uma díade (interação entre duas pessoas) só tem sentido em relação ao conjunto das outras díades da rede, porque a sua posição estrutural tem necessariamente um efeito sobre sua forma, seu conteúdo e sua função.

A participação em redes está associada ao capital social estrutural. Marteletto e Oliveira e Silva (2004) ressaltam que capital social não deve ser confundido com o capital humano. O capital humano engloba as habilidades e conhecimentos dos indivíduos que aumentam as possibilidades de produção e de bem-estar pessoal, social e econômico. Por sua vez o capital social é definido como sendo as normas, valores, instituições e relacionamentos compartilhados que permitem a cooperação dentro de, ou entre, diferentes grupos sociais.

Apesar do conceito acima se referir à troca ou compartilhamento de capital social entre gru-pos, é a partir deste conceito que se norteia este estudo, pois se entende a cooperação entre pesqui-sadores como uma forma de compartilhamento de informações, que visa à geração e disseminação de conhecimento para produzir bem-estar social.

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1.2. Contribuições da Co-Autoria

Compartilhar informações, além de proporcionar economia de tempo e de recursos financei-ros e materiais, tem permitido o aumento de estudos realizados de forma conjunta, não só no âmbito nacional, mas também no internacional.

A colaboração científica aparece muitas vezes na literatura relacionada à coautoria. Frequentemente, os dois termos são considerados sinônimos pelos pesquisadores, mas convém afirmar que a coautoria é apenas uma faceta da colaboração científica, pois ela não mede a colaboração na sua totalidade e complexidade (VANZ; STUMPF, 2010).

Os principais aspectos identificados na literatura sobre o tema de cooperação científica são levantados por Caregnato e Maia (2008). Segundo as autoras, junto ao estudo das publicações com-partilhadas cresce também o interesse em analisar as formas de colaboração, sendo a coautoria de produtos gerados pela atividade científica um importante indicador de colaboração. Segundo as au-toras inúmeros estudos sobre coautoria têm sido realizados com objetivos diversos, como por exem-plo, identificar diferenças entre colaboração acadêmica e técnica, características de colaboração em determinadas disciplinas e colaboração entre pesquisadores de diferentes instituições, do mesmo ou de diferentes países. Como principais resultados obtidos por este estudo, são apontados que: a cola-boração entre autores tem aumentado em todas as disciplinas, mas o grau dessa colaboração difere entre elas; os trabalhos teóricos geram artigos com menos autores do que aqueles com caráter expe-rimental; trabalhos com cooperação internacional têm maior impacto e visibilidade; e a colaboração aumenta a produtividade dos pesquisadores.

A cooperação científica em termos de coautoria vem permitindo a realização de estudos na área de redes sociais. Os aspectos sobre as relações existentes na construção do conhecimento cien-tífico permitem verificar um grande conjunto de relacionamentos, que podem ser investigados pelos métodos de análise de redes sociais.

As diferentes formas de organização em torno da geração do conhecimento podem indicar as características de organização e os tipos de cooperação científica. Como exemplos de formas de orga-nização Rossoni e Guarido Filho (2009) destacam a existência de configurações do tipo: small worlds, ligações preferenciais e centro-periferia, e associação entre produtividade e centralidade.

O conceito de mundos pequenos, small worlds, pressupõe a situação em que um indivíduo pode acessar qualquer outro a partir de seus relacionamentos. Apesar das pessoas manterem contato com um número limitado de indivíduos, nos seus círculos de amizade ou profissionais, podem se rela-cionar com outras pessoas indiretamente a partir dos relacionamentos cultivados por esses contatos, já que cada um deles possui vínculos com indivíduos em círculos sociais diversos.

Barabási (2009) explica o estudo de Duncan Watts e Steven Strogatz para modelar uma rede altamente conectada do tipo mundo pequeno, os autores partiram de um círculo de nós onde cada nó se conectava ao seguinte e ao seu vizinho mais próximo, a seguir acrescentaram links extras conectan-do nós escolhidos aleatoriamente, fornecendo um atalho entre nós distantes. Desta forma era reduzida a separação média entre os nós, mas sem alterar o coeficiente de conexão entre os nós.

A capacidade que tem o modelo de reduzir drasticamente a separação, mantendo o coeficiente de clus-terização praticamente inalterado, indica que podemos ser bastante provincianos na escolha dos nossos amigos, [...] os seis graus de separação baseiam-se no fato de que algumas pessoas possuem amigos e parentes que já não vivem próximos a elas. Esses links distantes nos oferecem atalhos para pessoas que se encontram em regiões muito remotas do mundo. Grandes redes não precisam ser repletas de links aleatórios para revelar traços de mundos pequenos. Poucos links desses darão conta do recado (BARABÁSI, 2009).

As ligações preferenciais pressupõem que quanto mais ligações um ator possui com outros, mais central ele estará na rede e terá chances maiores de ter novos relacionamentos. Ou seja, serão atores preferenciais nas redes e se tornarão cada vez mais centrais, pois são responsáveis por conectar uma grande rede ao seu redor.

As ligações preferenciais podem estar relacionadas à produtividade e centralidade dos atores na rede. Em redes de coautoria se destaca a capacidade de alguns poucos atores atrair número de colaboradores significativamente maior que a maioria dos demais. Deste modo, ligações preferenciais indicam tendência de novos relacionamentos se darem a partir daqueles já existentes, definindo a trajetória de crescimento da rede (ROSSONI; GUARIDO FILHO, 2009). O mesmo autor identificou, nos

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seus estudos, dois grupos, o centro e a periferia, em termos de sua produtividade no campo e testou uma das suas hipóteses na configuração do tipo centro-periferia, na qual os atores no centro estão densamente conectados entre si, enquanto os atores da periferia apresentam maior densidade de laços com os atores do centro do que com seus pares periféricos.

Segundo Barabási (2009) quando se trata de decidir a quem conectar-se, novos nós preferem ligar-se a nós mais conectados e o crescimento dessas conexões preferenciais faz surgir nós altamente conectados. Pois, quando se tem de escolher entre dois nós, um com o dobro de links do outro, é duas vezes mais provável que o novo nó se conecte ao nó mais conectado. A noção de centralidade implica em que quanto mais centrais mais importantes são os atores de uma rede. A centralidade pode ser me-dida pelo grau da centralidade, pela proximidade e pela centralidade de intermediação. Para calcular os dois últimos utilizam-se os caminhos geodésicos mais curtos e de mesmo tamanho que ligam os nós. Para definir estas três medidas de centralidade serão utilizados conceitos encontrados em Tomael e Marteleto (2006).

O grau de centralidade é definido pelo cálculo do número de contatos diretos que um ator mantém em uma rede, quando o grau de um ponto é muito maior que outros pontos da rede signifi-cam que este é mais central. A proximidade de um ator mede o quanto o nó que representa o ator está próximo de todos os demais nós da rede. Para calcular a centralidade de proximidade se soma a distância geodésica do nó em relação a todos os demais nós do grafo e depois inverte-se, uma vez que quanto maior a distância menor a proximidade. A centralidade de intermediação analisa o quanto um nó está no caminho geodésico entre outros nós. O ponto é dito central quando está entre muitos pares de pontos. O índice de centralidade de intermediação mede, para um nó a soma de probabilidades de o mesmo estar no caminho geodésico entre todos os demais nós do grafo.

Além dos aspectos acima, mais voltados às análises de redes sociais, podem ser considerados também os apontados no estudo de Newman (2001), quais sejam: o número de autores a distância entre autores, a média de artigos por autor e de autores por artigos, o número de colaboradores e o grau de agrupamento ou separação. Algumas limitações aos estudos de coautoria para identificar a colaboração científica têm sido levantadas por diversos autores, pois nem toda colaboração acaba em coautoria. O artigo escrito em coautoria não consegue refletir a real cooperação entre os autores, uma vez que a coautoria de um artigo está relacionada ao contexto social e tecnológico em que se encon-tram os colaboradores. Apesar da limitação exposta, Vanz e Stumpf (2010) ressalta que a coautoria tem sido utilizada com sucesso por muitos pesquisadores das áreas de bibliometria e cientometria para investigar a colaboração entre pessoas, instituições e países.

2. Metodologia utilizada na pesquisa

A pesquisa teve como objeto de estudo os artigos publicados na Revista Eletrônica de Adminis-tração (REAd) entre os anos de 1995 e 2010. Para coletar esses artigos realizou-se uma busca no SABi - Sistema de Automação de Bibliotecas da UFRGS. Inicialmente foi pesquisado o título da revista para identificar o número de sistema, e a partir da identificação do número 000134936, utilizou-se a Lin-guagem de Comando (CCL) para identificar os registros dos artigos de periódicos do período estudado. A estratégia utilizada foi “WLK=134936 not WYR=2011”. Com base nesses critérios foram recuperados 514 artigos da REAd incluídos no SABi pela biblioteca da Escola de Administração.

Os registros recuperados foram salvos no formato Resumido, disponível na opção de salvar do-cumentos recuperados do SABi, em um arquivo de texto do tipo .txt, que posteriormente foi utilizado para gerar uma matriz no BibExcel versão 17/05/2011. Além disso, também foi gerada uma planilha no Microsoft Excel® que permitiu tabular e manipular os dados relativos aos títulos, números de sistema, autorias, ano de publicação e temáticas dos artigos publicados.

Utilizou-se na análise dos dados uma abordagem quantitativa que permitiu, além do apoio às análises de rede, obter informações estatísticas complementares sobre o comportamento da Revista no que tange ao número de artigos publicados desde seu primeiro fascículo, a quantidade de artigos publicados por autor, o número de autores que publicaram artigos, média de artigos por autor, média de autores por artigo e número de indexadores utilizados pela biblioteca para identificar as temáticas abordadas pelos artigos, entre outras informações.

A partir das análises estatísticas e da matriz de coautoria representada no Bibexcel foi pos-sível construir a estrutura da rede de coautoria da REAd, cuja análise foi conduzida com o apoio dos softwares UCINET. Os dados obtidos nas análises serão descritos a seguir.

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3. Análise dos resultados

A análise dos resultados foi dividida em seis partes, na finalidade apresentar de forma siste-mática a seqüência de análises empregada.

3.1. Quantidade de artigos publicados

A partir dos 514 artigos publicados entre 1995 e 2010 na REAd foi possível verificar que a quan-tidade de artigos publicados por ano foi aumentando gradativamente, tendo seus maiores níveis entre 2004 e 2006 como mostra o Figura 1, gerado no Microsoft Excel®. Aplicando uma curva de tendência foi possível visualizar os dados e ao mesmo tempo identificar flutuações. O ‘Período’ utilizado na definição da curva de tendência foi ‘2’, sendo assim a média dos primeiros dois pontos de dados é usada como o primeiro ponto na linha de tendência da média móvel, a média do segundo e terceiro pontos de dados são usados como o segundo ponto na linha de tendência e assim sucessivamente. Na Figura 1 a média móvel (linha vermelha) suaviza as flutuações nos dados, mostrando mais claramente o padrão, ou a tendência na quantidade de publicações de artigos por ano.

Figura 1 - Quantidade de artigos publicados por anoFonte: Dados da pesquisa

Para tentar explicar os dados deste gráfico se fez uma comparação com a produção intelectual da Escola de Administração entre os anos de 2002 a 2010. Nesta comparação verificou-se que o aumen-to da quantidade de artigos publicados na REAd coincide com os anos em que a Escola produziu uma maior quantidade de documentos. Conforme os registros do SABi, em 2002 e 2003 foram registrados 756 e 763 documento de produção intelectual respectivamente, aumentando este número a partir de 2004, chegando a um total de 1031 documentos registrados em 2006. Verificou-se que este comporta-mento também se refletiu nos demais períodos quando a Escola produziu 763 documentos em 2009 e 636 em 2010.

Para saber os motivos que levaram ao aumento e diminuição na publicação de artigos, assim como da produção científica em geral da Escola de Administração, estes dados deveriam ser confron-tados com outros de natureza acadêmica, científica e de extensão; e para tanto uma análise mais aprofundada.

3.2. Temáticas dos artigos

Uma segunda análise baseia-se na indexação das temáticas dos artigos, realizada pela biblio-teca responsável durante o processamento técnico dos mesmos para inclusão no SABi. Após a leitura técnica do artigo, para proceder à descrição bibliográfica e temática do mesmo, o bibliotecário deve selecionar os termos de indexação que serão utilizados para melhor representar o conteúdo do artigo. Os bibliotecários da Escola de Administração foram consultados em relação à utilização de vocabulá-rios controlados da área, e conforme informação obtida, a indexação é feita a partir dos termos atribu-ídos pelos próprios autores do artigo e, posteriormente, consultando uma lista de termos controlados da própria biblioteca.

1995

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2000

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2008

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Nos dados coletados verifi cou-se a utilização de 989 termos de indexação para representação temática dos assuntos abordados nos artigos. Na Figura 2 estão representados os 20 termos mais utilizados pela biblioteca e a quantidade de artigos em que cada termo foi utilizado, estando esta quantidade representada em sentido horário.

Figura 2 - Termos de indexação e sua utilização nos artigosFonte: Dados da pesquisa

Verifi cou-se inicialmente que esses 20 termos foram utilizados em 365 artigos, ou seja, em 71% dos artigos indexados. Outra constatação possível a partir dos dados coletados foi a preferência pela utilização da indexação pós-coordenada e a quantidade de termos atribuídos aos artigos. Em média são utilizados 1,26 termos de indexação por artigo, sendo que em 2 artigo foram atribuídos 10 e 12 termos, respectivamente, e em 18 artigos, apenas 1 termo foi utilizado. Porém, analisando os outros valores verifi ca-se que a 47,47% dos artigos foram atribuídos entre 3 e 4 termos, podendo-se inferir que estes seriam valores médios de termos de indexação considerados ideais pela biblioteca para representar as temáticas abordadas.

Outras análises relacionadas às temáticas abordadas pelos artigos são possíveis a partir dos dados coletados, como por exemplo, as principais temáticas ano a ano e a evolução dos temas com o passar do tempo. Estas análises poderiam sugerir tendências na área da administração, contudo seriam informações questionáveis, uma vez que seriam fruto de análises subjetivas dos autores e do biblio-tecário; e por este motivo optou-se por não trazer ao estudo tais informações. Fosse este o objetivo, seria de maior valia este tipo de análise num levantamento de artigos realizado, por exemplo, em anais de congressos da área de administração.

3.3. Instituições dos artigos

Para realizar as análises referentes a autorias foram identifi cados 990 autores que publicaram artigos na REAd. Utilizando os dados do Currículo Lattes, procurou-se identifi car as instituições às quais pertenciam os autores na época da publicação do artigo. E nos casos onde isso não foi possível, utilizou-se a instituição atual do autor.

A Figura 3 mostra a representatividade da quantidade de instituições nos artigos publicados, sendo que em 321 artigos os autores pertenciam a apenas uma instituição, em 165 artigos a 2 institui-ções e em 26 artigos a 3 instituições, esses valores totalizaram 512 instituições.

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Figura 3 - Quantidade de Instituições por ArtigoFonte: Dados da pesquisa

Continuando a mesma análise foi identificado que, entre os 990 autores, apenas 99 eram filiados à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Baseado nesse dado pôde-se fazer uma análise da concentração institucional da autoria dos artigos. A avaliação de endogenia pode ser feita a partir da afiliação dos autores ou a partir dos artigos que possuem pelo menos um autor filiado à UFRGS. Para esta pesquisa optou-se pelo segundo critério, então realizando uma busca no SABi para identificar os artigos de autoria filiada à UFRGS. Utilizou-se a estratégia de busca “WLK=1349362 and WPI=prod” e obteve-se o resultado de 136 artigos registrados como produção intelectual da UFRGS. Para o calculo utilizou-se o número de artigos de professores da Escola de Administração sobre o núme-ro total de artigos, obtendo-se o índice de 0,26. A apuração de tendência à concentração institucional é considerada, pelo SciELO (2004), como um resultado negativo na avaliação dos periódicos para a admissão na coleção, todavia o índice encontrado está nos padrões aceitáveis visto ainda que a REAd faz parte da coleção do SciELO.

3.4. Autoria dos artigos

Nas análises seguintes foi possível identificar a quantidade de artigos publicada por cada autor, a média de artigos por autor e a média de autores por artigos. Os autores que mais publicaram artigos estão relacionados na Tabela 1, onde consta o nome do autor e a quantidade de artigos publi-cados. Verificou-se, também, que 559 autores (56,46%) publicaram apenas um artigo.

Tabela 1 - Autores que mais publicaram artigos e a quantidadeAutores Número de artigos

Freitas, Henrique Mello Rodrigues de 18Pinheiro, Ivan Antonio 12

Oliveira, Mirian 11Piccinini, Valmiria Carolina 9Antunes, Elaine di Diego 7

Luciano, Edimara Mezzomo 7Mazzilli, Claudio Pinho 6

Grisci, Carmem Ligia Iochins 6Fonte: Dados da pesquisa

Dentre os oito autores da Tabela 1, apenas 2 não pertencem diretamente à UFRGS, todavia têm relação institucional com a UFRGS por terem sido discentes de pós-graduação na Instituição. Logo, a quantidade de artigos publicados pode ser justificada pela coautoria com orientandos do mestrado e/ou doutorado. Neste caso específico, pode-se verificar que os dois autores que não são da UFRGS, foram orientadas pelo mesmo docente, que é o autor com maior quantidade de publicações no peri-ódico. Mas ressalva-se que nem todas as publicações desses autores externos à UFRGS são conjuntas com o orientador.

A distribuição de autores por ano e a média de autores por artigos publicados no ano pode ser

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vista na Tabela 2, onde na primeira linha encontra-se a quantidade de autores que publicaram artigos em cada ano e na segunda linha a média de autores por artigo, ano a ano.

Tabela 2 - Autores por ano e média de autores por artigo, por ano

Autores/Ano 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Qtd Autores/Ano 7 22 26 6 35 58 49 55 89 111 132 137 91 61 68 43

Média Aut./Art./Ano 1,75 1,69 1,73 1,50 1,46 1,61 1,53 1,62 1,85 1,88 2,24 2,21 2,28 2,03 2,27 2,15

Fonte: Dados da pesquisa

Se compararmos a quantidade de artigos publicados da Figura 1, onde verifica-se um aumento na quantidade de artigos entre 2004 e 2006 e um considerável decréscimo após este período, verifica-mos que a quantidade de autores que a Tabela 2 nos mostra no mesmo período pode ser aliada àquele resultado, se comportando de forma semelhante.

3.5. Relações de Coautoria

Iniciando as análises de coautorias podemos ver na Tabela 3 a quantidade de autores por arti-go, ano a ano. Esses dados totalizam 166 artigos com autoria simples, 226 com autoria dupla, 104 com autoria tripla, 11 artigos com 4 autores, 2 com 5 autores e 1 único artigo com 6 autores.

Tabela 3 - Quantidade de autores, por artigo, por ano

Qtd Autores por Artigo/Ano 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

1 autor 1 6 7 2 17 21 19 17 18 18 13 9 8 5 2 3

2 autores 3 5 5 2 5 9 10 14 21 30 24 32 16 19 20 11

3 autores 0 2 3 0 1 5 2 2 7 11 20 20 13 6 6 6

4 autores 0 0 0 0 0 1 1 1 2 0 0 1 3 0 2 0

5 autores 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0

6 autores 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0

TOTAL 4 13 15 4 24 36 32 34 48 59 59 62 40 30 30 20

Fonte: Dados da pesquisa

Ainda analisando as coautorias, na Figura 4 está representada a concentração da quantidade de autores nas coautorias no decorrer dos anos.

É visível a concentração de artigos com somente um autor até o ano de 1999, quando a re-presentatividade de artigo com dois autores passou a aumentar, até ultrapassar e se tornar dominan-te desde o ano de 2003. Este gráfico, representando o aumento das coautorias ao longo do tempo, também reflete as políticas de avaliação da CAPES, que valoriza e pontua a produção conjunta, entre docentes e discentes, e também entre instituições.

Figura 4 - Percentual de coautoriasFonte: Dados da pesquisa

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

1 autor 2 autores 3 autores4 autores 5 autores 6 autores

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3.6. Redes de Coautorias

Para esta parte do estudo foram utilizados os recursos do BibExcel para a extração dos dados cientométricos, criação de arquivos de freqüências e matrizes de colaboração, do UCINET 6 para as análises de Redes Sociais e do NETDRAW, um aplicativo que está incorporado ao UCINET, para a visuali-zação dos grafos das redes de colaboração entre os autores, assim como para os cálculos individuais de centralidade e proximidade desses atores. Este último recurso permite a representação plana (mapas) das redes e as relações (redes) entre os atores. A partir de agora, em diversos momentos do relato de resultados, nos referiremos aos autores dos artigos como atores na rede de coautorias.

A Figura 5 mostra o mapa da rede de autores da REAd, cada nó representa um ator da rede, as setas são os laços que expressam relações de co-autoria. Os atores que não mantiveram colaboração com nenhum outro foram excluídos da matriz do BibExcel e portanto não constam do mapa abaixo, onde estão representadas apenas as relações de co-autorias.

Figura 5 - Grafo da rede de coautoria da REAdFonte: Dados da pesquisa

Como se pode observar, a rede não se mostra totalmente conecta, apresenta vários agrupa-mentos, a maioria desses agrupamentos é de poucas colaborações e três grupos de maior tamanho localizados na parte central do mapa.

Na representação da Figura 6 podemos visualizar de maneira mais clara, além dos grupos maio-res de co-autoria, a grande quantidade de co-autorias duplas e sem conexão com outros grupos da rede.

Figura 6 - Grafo da rede de coautoria e a diferença entre os nós de coautoria

Fonte: Dados da pesquisa

A Figura 6 mostra, além da quantidade de coautorias duplas e pouca conexão com grupos maiores, a existência de poucos grupos muito conectados. Os nós maiores da rede se referem aos ato-res mais conectados ou centrais na rede, o que será analisado logo a seguir.

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A medida de centralidade representa o número de laços que um nó possui na rede, o quanto um ator é importante na rede e o número de contatos diretos que o ator mantém na rede de coautoria. Des-taca-se a capacidade de alguns poucos atores atrair um número de colaboradores significativamente maior que a maioria dos demais, ou seja, são os atores preferenciais da rede e, portanto são os mais centrais, permitindo confirmar a teoria das ligações preferenciais, visto que são os responsáveis por conectar uma grande rede ao seu redor, se comparados com a grande quantidade de atores pouco conectados da rede.

Na Figura 7 estão representados os nós mais conectados da rede. Somente um ator possui alto grau de centralidade e a grande maioria dos atores um grau de centralidade muito baixo, pois a maior parte das ligações é entre duplas ou trio de autores, que por sua vez não se conectam a grupos maiores. Para uma melhor visualização dos nós mais conectados da rede foi gerado um grafo sem as ligações de duplas de coautorias e as medidas de grau de centralidade foram representadas em cores diferentes.

Figura 7 - Grafo dos atores mais conectadosFonte: dados da pesquisa

No Grafo representado pela Figura 7 foram caracterizados por cores os nós que possuem o mesmo grau de centralidade. Os círculos da figura mostram os atores com maior grau de centralidade e a rede à qual pertence, podendo-se verificar que existe ligação apenas entre as redes dos atores com grau de centralidade 13 e 10 e os outros dois não se conectam entre si nem com as outras duas redes maiores, mostrando mais uma vez a desconexão existente na rede de coautoria da REAd.

O nome de cada um dos atores com seu respectivo grau de centralidade estão relacionados na Tabela 4, sendo que foram relacionados apenas os atores até a medida de centralidade igual a 06, pois a grande maioria dos atores possui graus de centralidade inferiores.

Tabela 4 - Grau de centralidade dos principais atores da rede

Grau de centralidade Atores da rede13 Freitas, Henrique Mello Rodrigues de10 Oliveira, Mirian

08 Hoppen, NorbertoPiccinini, Valmiria Carolina

07

Antunes, Elaine di DiegoBrito, Mozar José de

Grisci, Carmem Ligia IochinsMerlo, Edgard MonfortePinheiro, Ivan Antônio

Revillion, Jean Philippe Palma

06

Federizzi, Luiz CarlosForte, Sérgio Henrique Arruda Cavalcante Melo, Marlene Catarina de Oliveira Lopes

Luciano, Edimara MezzomoPadula, Antonio Domingos

Pereira, Breno Augusto Diniz

Fonte: Dados da pesquisa

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Os nomes dos atores foram mantidos em ordem inversa, as matrizes do BibExcel foram geradas dessa maneira, pois é dessa forma que os mesmos são registrados na base SABi, que forneceu os dados para as análises.

Nas duas redes selecionadas na Figura 7, o grau de centralidade de cada um dos atores foi calculado e representado na Tabela 5 onde também foi incluída a quantidade de artigos publicados para mostrar que os autores que mais publicam são os mais conectados, comprovando a relação da produtividade com a centralidade.

Tabela 5 - Autores, número de artigos publicados e grau de centralidade

Nome Artigos publicados Grau de centralidadeFreitas, Henrique Mello Rodrigues de 18 13

Oliveira, Mirian 11 10Piccinini, Valmiria Carolina 09 08

Hoppen, Norberto 05 08Antunes, Elaine di Diego 07 07

Brito, Mozar José de 03 07Grisci, Carmem Ligia Iochins 06 07

Merlo, Edgard Monforte 04 07Pinheiro, Ivan Antônio 12 07

Revillion, Jean Philippe Palma 02 07Fonte: dados da pesquisa

Como se pode constatar na tabela acima o maior grau de centralidade está relacionado ao número de artigos publicados, visto que esses autores foram os que mais publicaram artigos no período estudado. A exceção fica por conta de Brito, Mozar José de e Revillion, Jean Philippe Palma que pos-suem grau de centralidade 07 a pesar de terem publicado 3 e 2 artigos respectivamente. Nestes casos o grau de centralidade se justifica pela quantidade de co-autorias, tendo ambos publicado seus artigos com 7 autores diferentes. O cálculo a centralidade de grau é dado simplesmente pelo número de laços adjacentes de um ator com relação aos outros numa rede.

A relação dos autores Freitas, Henrique Mello Rodrigues de e Oliveira, Mirian, sendo eles os mais produtivos e com maior grau de centralidade, pode mostrar a confirmação da teoria centro-periferia, onde atores mais produtivos tendem a interagir entre si. As ligações preferenciais, que fazem com que atores sejam altamente conectadas, pode ser explicada pela sua produtividade, já que atores mais pro-dutivos tende a atrair mais ligações. Podemos também verificar que há ligações de nós mais centrais com nós periféricos, isto talvez possa ser explicado pela relação orientador/orientado.

A centralidade de proximidade é uma medida pode ser utilizada para identificar os atores mais importantes de uma rede, utilizando essa medida foram representadas as relações de proximidade na Figura 8, o tamanho dos nós representa a maior ou menor proximidade entre os nós de uma rede.

Segundo Hanneman e Riddle (2005), a segunda razão porque um ator é mais poderoso do que outros atores numa rede estrela é porque ele está próximo de mais atores do que qualquer outro ator. Quanto menor a distância geodésica, ou menor o número de passos para que um ator chegue ao outro, maior sua proximidade.

Figura 8 - Medida de proximidade de uma rede de co-autoriaFonte: Dados da pesquisa

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Outra medida de centralidade possível é a intermediação, para Moura (2009) a centralidade

está relacionada ao fato de um ator conectar sub-grupos que de outro modo estariam desconectados na rede. Considera-se uma posição de vantagem estar situado entre outros atores, pois este ator per-mite que a informação circule por toda a rede e mesmo tendo poucos vínculos diretos, é uma figura essencial no processo de disseminação de informações em uma rede, como pode ser visto na Figura 9.

Figura 9 - Medida de intermediação da rede de coautoriaFonte: Dados da pesquisa

Além das medidas mostradas acima ainda foi possível verificar a força dos laços entre os ato-res da rede. Os laços fortes denotam um contato direto entre as pessoas que estão compondo a rede e consequentemente formam um grupo altamente clusterizado. Os laços fracos são a relação entre pessoas que possuem um intermediário comum, mas que não possuem um vínculo direto, ou seja, a relação se constrói através de um intermediário, este tipo de laço é considerado importante por que conectam vários grupos e sem eles os clusters seriam ilhas isoladas. Para Granovetter (1973), os laços fortes têm uma grande densidade, mas não são tão amplos; já os laços fracos não são tão densos, mas possuem uma grande amplitude, pois possibilitam oportunidade de mobilidade.

Considerações Finais

Neste artigo procurou-se identificar algumas características da Revista Eletrônica de Adminis-tração da UFRGS, no que diz respeito aos artigos publicados desde seu início no ano de 1995 até o ano de 2010 quando foi realizada a coleta dos dados. Procurou-se verificar as alterações ocorridas com o passar dos anos e identificar um padrão de cooperação entre os autores dos artigos.

O estudo foi realizado em 514 artigos recuperados na base de dados SABi, inicialmente foram relacionados a quantidade de artigos publicados por ano onde foi possível identificar os períodos em que ocorreu o aumento na publicação de artigos e outros de diminuição da quantidade de artigos pu-blicados, os motivos desta variação poderia ser investigada por meio de entrevistas com os editores que conseguiram identificar as características de cada um desses períodos para justificar esse fato.

Em relação às temáticas mais abordadas cabe ressaltar que foram utilizados os termos atribuídos pela biblioteca e não os termos atribuídos pelos autores aos artigos. Neste sentido verifica-se que a revista se caracteriza por possuir artigos mais voltados para as áreas de gestão nos seus diversos aspectos, característi-cas e aplicações. Quando foram iniciadas as análises referentes às autorias foi possível identificar 990 autores diferentes e as instituições de filiação dos mesmos verificando-se que a maioria dos artigos são publicados por autores pertencentes a apenas uma instituição evidenciando pouca colaboração interinstitucional.

Seguindo a análise de autorias foi contabilizada a quantidade de artigos por autor, a quantida-de de autores que publicaram artigos, ano a ano, assim como a média de autores por artigo. Este últi-mo dado permitiu verificar o aumento pequeno e gradual das coautorias com o decorrer dos anos. Nas análises de coautoria, objetivo principal deste artigo, foi possível verificar que a rede de co-autoria da REAd é uma rede pouco conectada, muitos artigos são de autoria única, os quais foram excluídos da análise, ou de autoria dupla sem conexão com grupos maiores ou atores mais centrais da rede. Sendo que as redes maiores são constituídas de poucos atores e apenas um ou dois atores com maior grau de

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centralidade, apenas um autor foi identificado como o maior grau de centralidade. Pela centralidade de proximidade foi possível verificar a proximidade ou distância de um ator

em relação a todos outros na rede e pela centralidade de intermediação pode ser vista a dependência de atores que atuam como uma espécie de ponte para a efetivação da interação entre os atores da rede. As medidas de centralidade permitiram identificar que as ligações preferenciais estão relaciona-das aos atores mais produtivos da rede.

Por meio das egonets dos atores mais centrais da rede foi possível identificar a força dos laços que os unem a outros atores centrais ou a atores periféricos, assim como a conexão e/ou isolamento de algumas destas redes. Na análise dos atores mais conectados da rede foi possível fazer referência a teoria dos mundos pequenos devido ao tipo de conexão identificada entre os atores centrais e peri-féricos a rede.

Pelo exposto pode-se acrescentar que os objetivos propostos foram alcançados, porém aná-lises complementares se fazem necessárias para entender o comportamento da rede de forma mais ampla e profunda. Isto seria possível utilizando dados da própria Escola de Administração no que diz respeito à quantidade cursos de pós-graduação e de alunos dos períodos, dados sobre financiamento próprio ou de agências de fomento que possam ter influenciado na edição dos fascículos da revista, assim como por meio de entrevistas realizadas com os atores centrais da rede e com os editores, pois estes poderiam interpretar os dados coletados com maior propriedade.

Referências

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• Os artigos deverão ser enviados em CD, acompanhado de duas vias impressas ou via e-mail, em arquivo eletrônico anexo, desde que não ultrapasse a 8 Mb. O autor receberá a confirmação de recebimento.

• Os artigos serão selecionados de acordo com a sua relevância, originalidade e qualidade cientí-fica. Toda submissão deverá estar adequada às normas da revista ATITUDE e aprovada por todos os autores do trabalho.

• Os trabalhos enviados para a publicação serão analisados, primeiramente, por um dos mem-bros da Comissão Editorial, que decidirá pela sua pertinência para as áreas de Ciências Sociais, Ciências Tecnológicas ou afins. Posteriormente, os manuscritos serão enviados a pelo menos dois avaliadores ad-hoc, que farão uma revisão cega. Os pareceres dos avaliadores deverão discorrer sobre os seguintes pontos do manuscrito: atendimento das normas de publicação estipuladas; pertinência na área; relevância dos resultados; adequação científica da redação; atualização da literatura utilizada; clareza dos objetivos, da metodologia e dos resultados; e sustentabilidade da discussão pelos resultados obtidos e na literatura científica. O parecer final poderá ser: acei-to sem modificação; aceito com modificações; ou recusado. O(s) autor(es) serão informados da decisão, assim que ela for tomada.

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Revista Atitude - Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre · Ano VII · Número 14 · Julho - Dezembro de 2013 117

• Os artigos que tiverem recomendação de alteração serão remetidos ao autor para as devidas providências e será necessário o reenvio de nova cópia impressa em um mês e outra em disquete ou CD ou e-mail para a Comissão Editorial.

• A aceitação final do manuscrito será condicionada à concretização das modificações solicitadas pelo pareceristas ou com a devida justificativa do(s) autor(es) para não fazê-la. O Conselho Edi-torial da Revista Atitude fará revisões de linguagem no texto submetido, quando necessário.

• Toda responsabilidade do conteúdo do artigo é do(s) autor(es).• Cada artigo submetido à Revista Atitude receberá cinco exemplares da revista.

THE ATITUDE JOURNAL is an open access, biannual scientific journal that publishes original scien-tific papers on the Social Sciences, Technological Sciences and their applications. Manuscript sub-mission is spontaneous and free of charge, and the papers selection is based on recommendation by ad-hoc reviewers, using peer-review process.

Submission Procedures and manuscript evaluation

Manuscripts will be selected according to relevance, originality and scientific quality. All submission must meet the journal’s format expectations. Each authors needs to approve of the article’s content. The submitted papers will be analyzed primarily by one of the members of the Editorial Committee to assess whether if it is appropriate for the journal. Then the manuscript will be sent to at least two reviewers. The reviewers will evaluate the manuscript according to the following criteria: conformity to the expected format and style; its fit with the particular area of the Journal; quality and relevance of the findings; scholarly content of the review; scientific adequacy; coverage of current literature; clarity of the study aims, methods and results; adequate correspondence between results obtained and discussion and scientific review. The final decision can be: accepted without modifications; ac-cepted with modifications or refused. The author(s) will be informed of the final decision in a timely manner. The final manuscript acceptance will depend upon the authors’ revision of the paper accor-ding to the modifications suggested by the reviewers or with an adequate author(s) report justifying why the suggested modifications were not performed. The Editorial Committee of Atitude Journal of Dom Bosco Faculties from Porto Alegre, RS, Brazil will make language revisions in the submitted text, when necessary.

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