análise e gestão de bacias hidrográficas

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2013 ANÁLISE E GESTÃO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS Prof. Juliano Alaide Albano Prof.ª Cleci Teresinha Noara Prof.ª Catarina Cristina Barbara de Siqueira Meurer

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Page 1: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

2013

Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

Prof. Juliano Alaide AlbanoProf.ª Cleci Teresinha NoaraProf.ª Catarina Cristina Barbara de Siqueira Meurer

Page 2: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

Copyright © UNIASSELVI 2013

Elaboração:

Prof. Juliano Alaide Albano

Prof.ª Cleci Teresinha Noara

Prof.ª Catarina Cristina Barbara de Siqueira Meurer

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

551.48M598a Meurer, Catarina Cristina Barbara de Siqueira

Análise e gestão de bacias hidrográficas / Catarina Cristina Barbara de Siqueira Meurer; Juliano Alaide Albano; Cleci Teresinha Noara. Indaial : Uniasselvi, 2013. 233 p. : il ISBN 978-85-7830-760-8

I. Hidrologia. II. Análise e gestão. 1. Centro Universitário Leonardo da Vinci. 2. Meurer, Catarina Cristina Barbara de Siqueira.

Impresso por:

Page 3: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

III

ApresentAção

Caro(a) acadêmico(a), é com muita satisfação que damos início aos estudos da disciplina Análise e Gestão de Bacias Hidrográficas. Nesse novo universo a ser explorado por você, muitos conceitos serão apresentados, mas todos diretamente ligados à nossa realidade, seja ela como cidadão ou como profissional.

Adentramos o século XXI com inúmeros desafios na área ambiental. Desafios que irão nos custar muitas mudanças estruturais e comportamentais. Para encararmos essa nova realidade com sabedoria, precisamos conhecer cada vez mais este universo denominado meio ambiente. Precisamos olhar de frente a atual situação e com base nela delinearmos um novo futuro para todos nós.

Nesse contexto, esta disciplina trará uma nova maneira de olharmos a realidade ambiental. Sairemos de uma escala micro (a nossa casa, o nosso município) e partiremos para uma nova dimensão de análise: a bacia hidrográfica. Nesse novo espaço de análise temos o desafio de articular não só pessoas, mas instituições, políticas públicas, problemas e soluções, bem como realizar uma gestão compartilhada dos recursos naturais, principalmente a água, que é a base de estudo desse caderno.

O Caderno de Estudos da disciplina Análise e Gestão de Bacias Hidrográficas está estruturado em 3 unidades. A Unidade 1 irá apresentar um breve panorama sobre o principal objeto de análise da gestão de bacias hidrográficas: os recursos hídricos. Nessa unidade você irá conhecer um pouco sobre as características desse recurso, como ele está distribuído espacialmente e os principais problemas ambientais relacionados à água.

Na Unidade 2, denominada Gestão de Recursos Hídricos, você terá uma noção do que é desenvolvimento sustentável e o que isso tem a ver com os recursos hídricos. Você também conhecerá a Gestão Ambiental e as Políticas Ambientais Brasileiras com o enfoque na Política Nacional de Recursos Hídricos e conhecerá a bacia hidrográfica como unidade de planejamento para a gestão ambiental integrada da água.

Por fim, a Unidade 3 apresenta a implementação da gestão participativa e descentralizada dos recursos hídricos no Brasil. Nessa unidade você irá conhecer mais a fundo como funcionam os Comitês de Bacia Hidrográfica, refletir sobre a importância da participação social na gestão dos recursos ambientais e analisar como está sendo a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos dentro de uma bacia hidrográfica.

Page 4: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

IV

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

Ao final dessa disciplina, você terá um novo conhecimento em mãos, que poderá utilizar tanto na sua vida profissional, como no seu dia a dia. Por isso, leia, releia, faça as autoatividades, procure novos conhecimentos sobre o tema se por acaso surgir qualquer dúvida, não se esqueça de consultar o(a) Tutor(a) Externo(a) dessa disciplina.

Bons estudos!

Prof. Juliano Alaide AlbanoProf.ª Cleci Teresinha Noara

Prof.ª Catarina Cristina Barbara de Siqueira Meurer

NOTA

Page 5: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

V

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

UNI

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VI

Page 7: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

VII

UNIDADE 1 – RECURSOS HÍDRICOS .............................................................................................. 1

TÓPICO 1 – ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA ........................................................................ 31 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 32 CARACTERÍSTICAS DA ÁGUA ...................................................................................................... 4

2.1 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS ....................................................................................................... 42.2 CARACTERÍSTICAS QUÍMICAS ................................................................................................. 52.3 CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS ............................................................................................. 7

3 O CICLO HIDROLÓGICO ................................................................................................................. 9LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 14RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 17AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 18

TÓPICO 2 – POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS ................................................................ 191 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 192 POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS ..................................................................................... 193 O TRATAMENTO DA ÁGUA ........................................................................................................... 234 O TRATAMENTO DE ESGOTO DOMÉSTICO ............................................................................ 26LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 30RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 33AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 34

TÓPICO 3 – DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO ..................................... 351 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 352 DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO.......................................................... 353 USO DA ÁGUA NA PRODUÇÃO DE ALIMENTOS E O COMÉRCIO DA ÁGUA

VIRTUAL ................................................................................................................................................ 44LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 51RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 53AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 54

UNIDADE 2 – GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS ..................................................................... 55

TÓPICO 1 – A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS A PARTIR DA BACIA HIDROGRÁFICA ............................................................................................................. 57

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 572 BACIAS HIDROGRÁFICAS .............................................................................................................. 57

2.1 A BACIA HIDROGRÁFICA SOB O OLHAR TÉCNICO ........................................................... 582.2 DELIMITANDO UMA BACIA HIDROGRÁFICA ..................................................................... 59

3 HIERARQUIA FLUVIAL .................................................................................................................... 633.1 A INFLUÊNCIA DOS FATORES FÍSICOS NA FORMAÇÃO DA REDE DE DRENAGEM 653.2 O GERENCIAMENTO DE BACIA HIDROGRÁFICA ............................................................... 68

4 A GESTÃO INTEGRADA DE BACIA HIDROGRÁFICA ........................................................... 69

sumário

Page 8: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

VIII

5 GESTÃO CONSERVACIONISTA DE BACIA HIDROGRÁFICA: ADOÇÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO PARA PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS ........................ 72

6 O SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA (SIG) COMO FERRAMENTA NA ANÁLISE DE BACIAS HIDROGRÁFICAS .................................................................................... 74

7 RECONHECENDO OS ELEMENTOS DE UMA PAISAGEM NAS BACIAS HIDROGRÁFICAS............................................................................................................................... 75

LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 78RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 83AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 84

TÓPICO 2 – PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS .................................... 851 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 852 ECOLOGIA DOS RIOS ....................................................................................................................... 853 PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS......................................................... 88

3.1 PANORAMA GERAL DAS REGIÕES HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS ............................ 883.1.1 Região Hidrográfica Amazônica .......................................................................................... 903.1.2 Região Hidrográfica do Tocantins-Araguaia ...................................................................... 923.1.3 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental ........................................................... 943.1.4 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental ............................................................. 963.1.5 Região Hidrográfica do São Francisco ................................................................................. 973.1.6 Região Hidrográfica do Parnaíba ......................................................................................... 993.1.7 Região Hidrográfica Atlântico Leste .................................................................................... 1023.1.8 Região Hidrográfica Atlântico Sudeste ................................................................................ 1033.1.9 Região Hidrográfica do Paraguai ......................................................................................... 1063.1.10 Região Hidrográfica do Uruguai ........................................................................................ 1093.1.11 Região Hidrográfica Atlântico Sul ...................................................................................... 1103.1.12 Região Hidrográfica do Paraná........................................................................................... 113

4 POTENCIAL HIDRELÉTRICO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS, IMPACTOS E CONFLITOS .......................................................................................................................................... 116

LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 119LEITURA COMPLEMENTAR II ........................................................................................................... 123RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 127AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 128

TÓPICO 3 – A EMERGÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ........................... 1291 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1292 O SURGIMENTO DA QUESTÃO AMBIENTAL E A BUSCA PELO DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL .................................................................................................................................... 1292.1 O CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL .................................................... 1302.2 AGENDA 21 BRASILEIRA ............................................................................................................. 132

RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 136AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 137

TÓPICO 4 – A GESTÃO AMBIENTAL NA IMPLANTAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................................................................................................................ 139

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1392 A GESTÃO AMBIENTAL ................................................................................................................... 139

2.1 GESTÃO AMBIENTAL INTEGRADA ......................................................................................... 1413 A GESTÃO AMBIENTAL NO BRASIL ............................................................................................ 141

3.1 A CRIAÇÃO DE UMA ESTRUTURA PARA A GESTÃO AMBIENTAL BRASILEIRA ........ 1424 A CONTRIBUIÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 PARA A GESTÃO

Page 9: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

IX

AMBIENTAL .......................................................................................................................................... 145RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 147AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 148

TÓPICO 5 – A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL ................................................................................................. 149

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1492 O INÍCIO DAS DISCUSSÕES SOBRE A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS

HÍDRICOS ............................................................................................................................................. 1503 A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL ............................ 151

3.1 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE PROTEÇÃO AOS RECURSOS HÍDRICOS ........................ 1514 A ESTRUTURA DO SISTEMA DE GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS ......................... 154RESUMO DO TÓPICO 5........................................................................................................................ 160AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 161

UNIDADE 3 – A IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO PARTICIPATIVA E DESCENTRALIZADA DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL ............................................................ 163

TÓPICO 1 – PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS: INSTRUMENTO ORIENTADOR DAS AÇÕES DOS COMITÊS DE BACIAS .......................................................................... 165

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1652 O PLANO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS ................................................................... 165LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 168RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 171AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 172

TÓPICO 2 – GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM VIÉS DOS COMITÊS DE BACIA ....... 1731 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1732 OS COMITÊS DE GERENCIAMENTO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS ............................... 173LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 178RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 182AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 183

TÓPICO 3 – OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DA ÁGUA................ 1851 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1852 A PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS ............................. 1853 OS COMITÊS DE BACIA COMO ESPAÇO DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL............................ 1874 A IMPLANTAÇÃO DOS COMITÊS DE BACIAS NO BRASIL ................................................. 1895 A GOVERNANÇA DA ÁGUA ........................................................................................................... 190LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 192RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 195AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 196

TÓPICO 4 – DESAFIOS E AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL ................................................................................................. 197

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1972 DESAFIOS .............................................................................................................................................. 197

2.1 DESAFIOS DOS COMITÊS DE BACIAS ...................................................................................... 1982.2 VALORES AMBIENTAIS E OS DESAFIOS PARA AVANÇAR NA GOVERNANÇA DOS

RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL ............................................................................................ 199LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 203

Page 10: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

X

RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 206AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 207

TÓPICO 5 – A INSERÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL – PELA CONSERVAÇÃO DA ÁGUA .................................................................................................................................. 209

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 2092 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA CONTEMPORANEIDADE .................................................. 210

2.1 EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM SANEAMENTO – AÇÕES DE PROTEÇÃO DAS ÁGUAS ......2123 PRINCIPAIS POLÍTICAS PÚBLICAS NA GESTÃO DA ÁGUA ............................................. 216

3.1 A NECESSIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ATUALIDADE ................................ 218LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 222RESUMO DO TÓPICO 5........................................................................................................................ 225AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 226REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 227

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1

UNIDADE 1

RECURSOS HÍDRICOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade, você será capaz de:

• contextualizar aspectos relacionados às características da água e do ciclo hidrológico;

• apresentar a distribuição da água no Brasil e no mundo e os seus princi-pais usos;

• abordar e discutir as diferentes formas de poluição deste recurso e distin-tas metodologias de recuperação ambiental dos corpos d’água.

Esta unidade está dividida em três tópicos. No final de cada um deles, você encontrará atividades que reforçarão o seu aprendizado.

TÓPICO 1 – ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA

TÓPICO 2 – POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

TÓPICO 3 – DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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3

TÓPICO 1UNIDADE 1

ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA

1 INTRODUÇÃO

De acordo com a história, a civilização vem se estabelecendo às margens dos rios. Estes lhe proporcionavam água para suas necessidades básicas, escoamento de resíduos, irrigação e, na contemporaneidade, para as práticas industriais. Com o desenvolvimento tecnológico, o homem aprimorou suas técnicas e a capacidade de transportar e controlar a água, deixando de consumir mais, poluir mais e desperdiçar mais.

Para o homem, a água é um elemento da Terra cheio de significados, ela está presente no seu dia a dia como elemento vital para manutenção das atividades metabólicas do corpo. Ela é a força motriz da cadeia produtiva, essencial para o desenvolvimento da agricultura e pecuária, das fábricas e das indústrias. Nós nos ligamos a ela por diferentes aspectos culturais: nos rituais religiosos de vida e de morte, na música, nas artes plásticas etc. Estamos psiquicamente ligados a ela, sua presença nos conforta, nos acalma e tranquiliza. A água é a base da vida no planeta.

Cientes dessa nossa ligação com esse recurso natural, vital para a nossa sobrevivência, a definição de estratégias de preservação, conservação e do seu manejo sustentável se faz necessária e extremamente urgente. Portanto, nós, educadores e futuros educadores, temos o compromisso ético e profissional de compreender a atual situação desse recurso no nosso planeta.

Diante disso, precisamos saber quais são suas características (física, química e biológica), como ela se renova (ciclo hidrológico), qual sua distribuição, que usos fazemos dela, quais são os principais problemas ligados à disponibilidade e à demanda desse recurso e que políticas públicas estão sendo pensadas para a gestão sustentável desse recurso para podermos colocar a “mão na massa” e fazermos a nossa parte.

Nesse sentido, para que possamos compreender os processos que envolvem a análise e a gestão de bacias hidrográficas, o enfoque serão os recursos hídricos. Para tanto, iniciaremos com a apresentação das principais características da água (física, química e biológica) e do ciclo hidrológico. Neste tópico analisaremos também quais são as principais interferências do ser humano nesse ciclo.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

4

2 CARACTERÍSTICAS DA ÁGUA

A água possui uma estrutura molecular bastante simples, é composta por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio (H2O). Cada átomo de hidrogênio liga-se covalentemente ao átomo de oxigênio, onde as moléculas se mantêm juntas pela atração mútua de átomos carregados positiva e negativamente.

Encontramos a água no planeta nos estados sólido, líquido e gasoso, sendo o estado líquido a forma mais frequente. Uma das propriedades mais importantes da água no estado líquido é sua capacidade de dissolver substâncias, dizemos assim que a água é um solvente universal.

A água possui tantas características favoráveis à vida que é impossível imaginar a vida tendo alguma outra base que não fosse a água. Para que possa ser utilizada pelos organismos vivos, a água precisa conter características físicas, químicas e biológicas adequadas às suas necessidades.

Veremos a seguir quais são essas características e qual a importância delas para os organismos vivos.

2.1 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS

A água possui uma densidade relativamente elevada (cerca de oitocentas vezes superior à densidade do ar). Essa densidade varia com a temperatura, a concentração de substâncias dissolvidas e a pressão. No estado sólido a água é menos densa do que no estado líquido, o que faz com que o gelo flutue sobre a água. O fato de a água atingir sua densidade máxima a 4ºC faz com que somente a superfície aquática se congele, gerando um anteparo protetor para as comunidades aquáticas.

Além de densa, a água é viscosa, o que significa que ela resiste ao fluxo ou ao movimento de um corpo através dela. A alta densidade aliada à viscosidade tende a retardar o movimento, o que faz com que os organismos criem mecanismos diferenciados de sobrevivência no meio aquático.

NOTA

Você já parou para pensar, o que acontece quando a água do rio encontra a água do mar? Elas se misturam, formando a água salobra, típica de manguezais, onde encontramos organismos que se adaptaram a este ambiente, como é o caso dos caranguejos.

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TÓPICO 1 | ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA

5

Outra característica importante da água é o seu calor específico. Por ter um calor específico bem elevado, ela pode absorver ou liberar grandes quantidades de calor em variações de temperaturas relativamente pequenas.

Essas propriedades fazem com que grandes massas de água possam alterar características climáticas locais, amenizando as variações de temperatura amplas. Sendo assim, se os oceanos não existissem, a amplitude térmica do planeta seria muito maior (BRAGA et al., 2005).

IMPORTANTE

Você já parou para pensar por que o hemisfério norte é mais frio que o hemisfério sul? Esse fenômeno é caracterizado devido ao calor específico da água que corresponde a 1,0 cal/gC, pois a água retém mais calor que o solo. O hemisfério sul possui porção marítima muito maior que o norte, contudo a água do oceano absorve e retém grande parte do calor que, durante a noite, o oceano perde lentamente para atmosfera. Isso acontece durante todo o ano, fazendo com que a amplitude térmica (variação de temperatura) seja baixa e mais quente no hemisfério sul.

A cor e a turbidez da água também são características físicas importantes. Essas características interferem na penetração de luz dentro dos corpos d’água. A penetração de luz, nos corpos hídricos, é essencial para a produção de fotossíntese e consequentemente para a existência da biota aquática.

A cor da água é constituída por luz refletida, podendo ser uma cor real (quando o meio aquático possui substâncias dissolvidas na água que conferem a ele uma determinada cor) ou aparente (quando reflexos de outros materiais, como algas e rochas, dão ao corpo d’água uma coloração específica).

2.2 CARACTERÍSTICAS QUÍMICAS

A água é conhecida por ser um solvente universal, podendo dissolver tanto moléculas orgânicas como inorgânicas. Muitas dessas partículas dissolvidas são essenciais para os organismos aquáticos.

A água em contato com diferentes minerais e o substrato rochoso provoca a solubilização. O processo de intemperismo químico das rochas pela água é de dissolução, decomposição e hidratação. Esse processo é evidenciado devido à presença dos ácidos orgânicos e inorgânicos e, ainda, pelo aumento da temperatura.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

6

A salinidade da água se refere à quantidade total de sais dissolvidos e é expressa em relação ao peso de uma solução para o peso de igual volume de água destilada.

Como podemos perceber, raramente encontramos água pura na natureza, pois isso dependerá das condições locais, assim como dos minerais, sais e substâncias contidos no solo, em concentrações variadas.

Erroneamente dizemos “água doce”, pois não existe água com açúcar, o que existe é água com menor quantidade de sais.

ATENCAO

Quando mencionamos água destilada, nos referimos à água pura, onde se apresentam apenas as duas moléculas de hidrogênio e uma de oxigênio (H2O). Não encontramos este tipo de água na natureza, pois, para isso, se faz necessário passar por um processo de destilação. A água destilada é utilizada para diversos fins tanto em indústrias como para finalidades médicas.

A água também possui gases (como oxigênio e o dióxido de carbono) e sais minerais dissolvidos, como já vimos, o que favorece a realização da fotossíntese e a existência de organismos vivos nos diferentes ambientes.

O pH da água é uma característica importante a ser observada, já que muitas das reações químicas que ocorrem na água são afetadas pelo seu valor. As comunidades aquáticas são diretamente afetadas pelo pH da água. Os peixes, por exemplo, só conseguem sobreviver em águas com pH entre 5 e 9 e apresentam produtividade máxima com pH entre 6,5 e 8,5 (BRAGA et al., 2005).

Não devemos esquecer que, além da salinidade, do pH e dos gases encontrados na água, existem mais algumas substâncias que devemos conhecer. Vale ressaltar que, entre as características químicas da água ora aqui citadas, existem outras, não menos importantes, como: as substâncias químicas e os metais tóxicos, a demanda de oxigênio, a alcalinidade, os sólidos totais dissolvidos (cloreto, sulfatos entre outros), dureza e matéria orgânica.

A água proveniente do abastecimento público, aquela que chega às nossas residências, contém uma infinidade de nutrientes e elementos. A presença (ou ausência) desses elementos pode ser importante em algumas situações, pois, para o bom funcionamento, o corpo humano também depende desses elementos, como: nitratos, fosfatos, magnésio, ferro, entre outros elementos presentes na água, porém em dosagem adequada de acordo com a demanda do nosso organismo.

Page 17: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

TÓPICO 1 | ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA

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Estudaremos isso com mais detalhes adiante!

2.3 CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS

Os diferentes ambientes aquáticos abrigam uma grande diversidade de espécies de organismos vivos que vivem interligados entre si numa complexa trama ecológica. Esses organismos podem ser desde microscópicos (protozoários, bactérias) até animais de grandes dimensões como as baleias.

Outros são utilizados intensamente pelo ser humano como alimento (peixes, crustáceos e outros) e também podem ser causadores de grandes enfermidades (como protozoários e bactérias presentes no esgoto). As características biológicas da água dependem exclusivamente das características físicas e químicas dos ambientes onde se encontra.

Muitos dos organismos que compõem a comunidade aquática são denominados bioindicadores ou indicadores biológicos, pois a presença ou ausência desses organismos pode indicar boa ou má qualidade da água.

As alterações genéticas, fisiológicas, ecológicas, comportamentais, morfológicas ou ainda bioquímicas poderão nos revelar a presença de poluentes ou stress no ecossistema e, ainda, se houver, o tempo de ocorrência desta determinada perturbação ao meio. São bons exemplos de bioindicadores os fungos, as algas e os liquens.

Uma forma de atribuir condições a serem atendidas pelos corpos hídricos é estabelecer uma classificação para as águas em função de seus múltiplos usos. Com isso, os mananciais são enquadrados em classes, empregando-se, para cada uma, os usos a que se destina e seus requisitos, conforme serão apresentados no quadro a seguir.

No Brasil, a classificação da qualidade das águas compete ao Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), através da Resolução no 357/2005. Esta resolução dispõe sobre a classificação dos corpos hídricos e fornece as diretrizes ambientais para o enquadramento, assim como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes.

Page 18: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

8

QUADRO 1 – ENQUADRAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS BRASILEIROS

Uso preponderante da água

Classificação

Cla

sse

Espe

cial

Cla

sse

1

Cla

sse

2

Cla

sse

3C

lass

e 4

Abastecimento público, preservação aquática em unidade de conservação de proteção integral, com ou sem desinfecção.

X

Abastecimento público, após tratamento convencional. Recreação de contato primário (natação, esqui aquático e mergulho).

X

Comunidades aquáticas em terras indígenas. X

Irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvem rente ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película.

X

Preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas. X

Irrigação de hortaliças, frutas, parques, jardins, campos de esporte e lazer, aquicultura e a atividade de pesca.

X

Abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional ou avançado; irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras; a pesca amadora; a recreação de contato secundário e a dessedentação de animais.

X

A navegação e a harmonia paisagística. X FONTE: Adaptado de: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res86/res2086.html>. Acesso em: 31 maio 2013.

DICAS

Para saber mais a respeito da classificação das águas no Brasil, acesse o site: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res05/res35705.pdf>, entre neste portal e veja a classificação das águas salinas e salobras e, ainda, as condições e padrões de qualidade das águas.

Page 19: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

TÓPICO 1 | ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA

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3 O CICLO HIDROLÓGICO

A água, assim como o carbono, o nitrogênio, o enxofre e outros elementos essenciais à vida, renova-se através de ciclos denominados biogeoquímicos. A água é o único elemento composto (hidrogênio e oxigênio) que participa desse processo.

O ciclo da água é denominado ciclo hidrológico e compreende dois fenômenos básicos: evaporação e precipitação. Conforme é apresentado na figura a seguir, o ciclo hidrológico pode ser resumido nas seguintes etapas:

FIGURA 1 – CICLO HIDROLÓGICO

FONTE: Disponível em: <http://ga.water.usgs.gov/edu/watercycleportuguesehi.html>. Acesso em: 5 abr. 2012.

• Evaporação: é através da evaporação que a água retorna ao ciclo. A evaporação pode ocorrer em qualquer etapa, conforme figura anterior. A água evaporada se mantém na atmosfera por um período de 10 dias.

• Precipitação: sob a ação da gravidade, a água acumulada nas nuvens cai sobre a superfície da terra ou no oceano.

• Detenção: parte da precipitação fica retida na vegetação, depressões do terreno e edificações. Essa água retida pode retornar à atmosfera pela ação da evaporação, penetrar no solo pela infiltração ou ainda escorrer superficialmente.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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• Escoamento superficial: é formado pela água precipitada que escoa pelo solo em direção às áreas de altitudes inferiores. Essa água tende a formar diferentes reservatórios de água, como rios, riachos e lagos, porém durante o processo de escoamento essa água pode ficar retida, evaporar ou infiltrar nas camadas superiores do solo.

• Infiltração: compreende a parcela de água que infiltra e irá alimentar a umidade do solo, os lençóis freáticos e os fluxos subterrâneos. A água infiltrada pode ainda sofrer evaporação ou ser utilizada pela vegetação. A capacidade de infiltração depende do tipo e do uso do solo. A disposição de infiltração do solo da floresta é alta, o que produz baixa quantidade de escoamento superficial; já em solos sem cobertura florestal e compactação, a capacidade de infiltração pode diminuir drasticamente, aumentando o escoamento superficial.

• Escoamento subterrâneo: é constituído por parte da água infiltrada na camada superior do solo, sendo bem mais lento que o escoamento superficial. Através do escoamento subterrâneo os rios e lagos são mantidos nos períodos de estiagem.

• Evapotranspiração: consiste na eliminação da água, na forma de vapor, pelas plantas.

Nos oceanos o volume de água evaporado é maior que o volume de água precipitado, o que difere do continente, onde o volume evaporado é menor que o volume que precipita, ou seja, boa parte da água precipitada nas áreas continentais provém dos oceanos. Especula-se que na bacia amazônica os valores de precipitação e evaporação sejam equivalentes.

Os processos hidrológicos na bacia hidrográfica possuem duas direções de fluxo: vertical e longitudinal. O vertical é representado pelos processos de precipitação, evapotranspiração, umidade e fluxo no solo; enquanto que o processo longitudinal pelo escoamento na direção dos gradientes da superfície (escoamento superficial e rios) e do subsolo (escoamento subterrâneo). Para estruturar o balanço de volumes de uma bacia hidrográfica, depende-se inicialmente dos dados do fluxo vertical.

FONTE: Adaptado de: <http://www.mma.gov.br/estruturas/sqa_pnla/_arquivos/sqa_3.pdf>. Acesso em: 31 maio 2013.

Um ponto importante a ser destacado nesse processo cíclico da água são as intervenções ocasionadas pelo ser humano. Como você pode perceber, a vegetação e o solo possuem um papel importante neste ciclo e para exercermos nossas atividades socioeconômicas interferimos constantemente tanto no solo como na cobertura vegetal. As alterações no uso do solo ocasionam impactos negativos ao meio ambiente como as inundações.

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ESTUDOS FUTUROS

Na Unidade 2 você encontrará o conceito sobre bacia hidrográfica.

Os solos se constituem de grãos de argila, silte, areia e partículas de material orgânico em proporções diferenciadas. A área superficial total das partículas, num dado volume de solo, aumenta à medida que seus tamanhos diminuem. Os solos abundantes em argilas (partículas menores que 0,002 mm de diâmetro) e silte (partículas entre 0,002 a 0,005 mm) retêm mais água do que as areias grossas (partículas maiores que 0,005 mm), através das quais a água é drenada rapidamente. Contudo, não são somente essas características que possibilitam a permanência de água no solo.

Um solo mesmo sendo argiloso, se estiver exposto ao sol, sem proteção, irá facilmente perder a água retida. Nesse sentido, a vegetação sobre esse solo exerce um papel fundamental na retenção e proteção dessa água.

As alterações de uso e manejo do solo da bacia hidrográfica podem ser classificadas quanto ao tipo de mudança, ao uso da superfície e à forma que provoca a alteração da superfície. Essa classificação está apresentada no próximo quadro.

QUADRO 2 – CLASSIFICAÇÃO QUANTO À MUDANÇA E USO DO SOLO

CLASSIFICAÇÃO TIPO

Mudança da superfícieDesmatamento Reflorestamento Impermeabilização

Uso da superfície

Urbanização Reflorestamento para exploração sistemática Desmatamento: extração de madeira, cultura de subsistência; culturas anuais; culturas permanentes

Método de alteraçãoQueimada ManualEquipamentos

FONTE: Tucci e Mendes (2006, p. 25)

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As alterações do solo causam diferentes mudanças na dinâmica hídrica. O desmatamento, por exemplo, tende a aumentar a vazão média em função da diminuição da evapotranspiração. A vegetação presente no solo intercepta a água da chuva e evita o impacto das gotas (splash) diretamente no solo. As folhas e as raízes das plantas, nos períodos de pouca chuva, conseguem reter a água no solo. Sem a vegetação, o solo tende a se tornar mais arenoso e, portanto, mais suscetível à erosão.

A urbanização, por sua vez, gera outros tantos problemas. As principais alterações no ciclo hidrológico são:

• Redução da infiltração devido à impermeabilização ou compactação do solo.

• Aumento do escoamento superficial tanto em volume quanto em velocidade, o que faz com que vazões máximas aumentem, gerando as enxurradas e enchentes.

• Com a redução da infiltração, o aquífero tende a diminuir o nível do lençol freático por falta de alimentação, reduzindo o escoamento subterrâneo.

• A evapotranspiração é reduzida, devido à retirada da cobertura florestal.

Além dessas interferências no ciclo hidrológico, ocorrem ainda:

• aumento das vazões médias devido ao aumento da capacidade de escoamento por meio de conduto, canais e impermeabilização das superfícies;

• aumento da erosão do solo e produção de sedimentos;

• deterioração da qualidade da água superficial e subterrânea.

Inúmeras são as interferências que ocasionamos ao ciclo hidrológico. Muitas vezes não nos damos conta do que pequenas ações podem gerar. Se você mora numa pequena cidade, pode pensar: sabendo-se que o ciclo hidrológico é um fenômeno global, as interferências no meu município não são tão significativas assim.

Talvez não sejam mesmo, quando analisadas numa escala global, mas se você pensar nessas interferências dentro da sua região hidrográfica ou bacia hidrográfica irá perceber que esses pequenos problemas tomam dimensões muito diferenciadas. Por isso e por tantos outros motivos a gestão de águas deve ocorrer por bacia hidrográfica, pois os impactos de pequenas e grandes ações podem ser quantificados e melhor analisados.

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TÓPICO 1 | ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA

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NOTA

Essas breves noções sobre as características da água e sobre o ciclo hidrológico podem ser ampliadas. Leia mais na bibliografia indicada ou na internet, no site da universidade da água <www.uniagua.org.br> e no site da Companhia de Saneamento Básico de São Paulo – Sabesp –<http://site.sabesp.com.br/site/default.aspx>, investigue.

Para ampliar nosso conhecimento sobre a interferência do homem no ciclo hidrológico, segue um texto científico sobre esses aspectos numa das principais bacias hidrográficas brasileiras – a bacia hidrográfica do rio São Francisco.

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TELECONEXÕES, MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO

Eventos climáticos não ocorrem de maneira isolada. Um exemplo desse fato é que a intensidade de chuva que cai sobre o nordeste e o sudeste do Brasil, áreas geográficas onde a bacia hidrográfica do rio São Francisco está inserida, pode, em parte, ser explicada pela temperatura da superfície das águas do oceano Pacífico, como revelam estudos científicos. Essas ligações, ou seja, teleconexões, como o El Niño, modificam o clima local, regional e global e, consequentemente, o ciclo das águas (precipitação, evaporação, escoamento superficial, subterrâneo etc.).

Como se isso não fosse o bastante, as atividades dos seres humanos (ações antrópicas) sobre o meio ambiente estão também alterando a dinâmica do clima e, por conseguinte, das águas do nosso planeta. Emissões dos gases causadores do efeito estufa, também conhecidos como greenhouses – dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O), entre outros – e a concentração desses na atmosfera levam à elevação da temperatura global e ao aquecimento do planeta. Os greenhouses resultam de fontes múltiplas, como da queima de combustíveis fósseis e do desmatamento (e outras formas de mudança no uso da terra).

Existe, ainda, outro fenômeno importante associado às ações antrópicas sobre o clima da Terra: o aumento do buraco da camada de ozônio. Os gases conhecidos como clorofluorcarbonos (CFCs) e outros encontrados nos aerossóis, refrigeradores e condicionadores de ar, quando presentes na atmosfera, causam a destruição da camada de ozônio, que protege o planeta contra os efeitos da radiação solar (raios ultravioleta).

Mas, como os efeitos individuais e cumulativos das teleconexões, do efeito estufa e da destruição da camada de ozônio podem afetar os recursos hídricos da bacia hidrográfica do rio São Francisco?

O clima – local, global e regional – resulta da interação entre variáveis como pressão atmosférica e temperatura das águas superficiais dos oceanos. Essas e outras variáveis afetam, por conseguinte, a ocorrência de chuvas. Vários cientistas ao redor do mundo concordam que as mudanças climáticas já afetam – e irão afetar ainda mais – o ciclo hidrológico, mas os impactos e a capacidade de remediação destes, quando possível, ocorrerão de forma diversa em regiões diferentes do mundo. Teleconexões e mudanças climáticas em geral influenciam os recursos hídricos porque alteram o clima e podem causar eventos extremos, como secas e inundações, levando ao aumento ou redução: na vazão dos rios; no nível de evaporação da água contida no solo, da superfície das plantas e dos corpos aquáticos; na quantidade de água perdida por transpiração por diferentes espécies de plantas; na quantidade e distribuição de chuva; na porção da água que infiltra no solo etc.

LEITURA COMPLEMENTAR

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TÓPICO 1 | ASPECTOS GERAIS SOBRE A ÁGUA

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O rio São Francisco tem 2.700 km de comprimento, atravessa cinco estados e possui 99 afluentes perenes e 69 intermitentes. A bacia hidrográfica ocupa uma área de 638.323 km² em seis estados e no Distrito Federal, o que significa 8% da área do território. Mais de doze milhões de pessoas (aproximadamente 8% da população do país) habitavam a bacia em 2000. A geração de hidroeletricidade, a irrigação e a diluição de esgoto figuram entre os maiores usos dos recursos hídricos da bacia. Para analisarmos os efeitos das teleconexões e mudanças climáticas em geral, vamos pensar em duas situações: escassez e excesso de chuvas que, no caso do São Francisco, podem ocorrer conjuntamente em regiões distintas da bacia.

A seca é um fenômeno que castiga o Nordeste e afeta a qualidade e quantidade de água disponível, bem como ocasiona outras consequências econômicas, sociais e ecológicas. Mudanças climáticas e teleconexões podem afetar a frequência e a intensidade desses eventos. Para muitos, esse cenário é bastante realístico. Estudos indicam que zonas áridas do nordeste do Brasil sofrerão ainda mais com secas resultantes das mudanças climáticas, se nada for feito para reverter o quadro atual. A redução do volume anual de chuva no nordeste do Brasil foi correlacionada a anos de ocorrência do El Niño. Uma elevação da frequência e da área de ocorrência das secas afetará o acesso e a distribuição da água da bacia hidrográfica, e consequências diretas e indiretas podem ser criadas. A falta desse precioso recurso pode levar à ocorrência de desertos; causar a escassez de água para consumo humano, para outras espécies de animais e também plantas; destruir ou reduzir a produção e a produtividade agrícola; aumentar a demanda de água para irrigação; incrementar a migração populacional para centros urbanos, entre outros. A seca pode afetar, também, a geração de energia, já que a Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF), principal empresa de geração elétrica da bacia, é responsável pelo abastecimento de energia das grandes capitais nordestinas. Estas consequências já foram sentidas em 2001, pois o efeito da falta d’água gerou o racionamento e o apagão. Espécies aquáticas também serão prejudicadas. A mudança nas características dos corpos aquáticos, como a elevação da temperatura e o aumento da salinidade devido à escassez e baixo nível da água, pode causar alteração na composição de ecossistemas e, então, a perda de espécies. O decréscimo da vazão na foz pode levar à entrada de água salgada do oceano Atlântico no rio São Francisco, destruindo habitat e espécies.

Mas o que poderia acontecer no caso de aumento da quantidade e frequência das chuvas? Isso já está ocorrendo em diferentes lugares do mundo, como nos Estados Unidos, e vem sendo atribuído às mudanças climáticas e às teleconexões. O El Niño também pode causar aumento de chuva no sul do Brasil, efeito inverso ao que pode ocorrer no nordeste. Mudanças climáticas podem alterar a intensidade das chuvas na região sudeste. Não podemos esquecer que 73,5% da vazão natural média do rio São Francisco vem do estado de Minas Gerais. A vazão do rio São Francisco seria elevada. Esse fato poderia influenciar o uso das estruturas construídas para a geração de energia e outras formas do uso da água e da terra da área. Mais chuva poderia levar a uma maior erosão na bacia, a maior entrada de sedimentos e outros elementos poluentes nos rios afluentes e no São Francisco, como, por exemplo, resíduos químicos aplicados na agricultura.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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A poluição das águas poderia elevar os custos para limpeza e purificação de água pelas empresas de tratamento e distribuição. As espécies aquáticas poderiam ser prejudicadas pela destruição dos habitats, pelo aumento da quantidade de sedimentos e consequente turbidez da água, além da redução da penetração da luz necessária às espécies que precisam da luz para realizar a fotossíntese.

Populações ribeirinhas sofreriam com inundações, perdendo as casas e produções das várzeas; especialmente porque as companhias hidroelétricas, provavelmente, precisariam abrir as comportas para permitir a passagem da água e reduzir o perigo da destruição das estruturas. Mas, quem sabe, o crescimento no volume de chuva, em outras regiões da bacia, poderia aumentar o potencial agrícola que hoje depende de irrigação em áreas interioranas e semiáridas (do Nordeste), se a água chegasse a áreas apropriadas; e poderia elevar a capacidade de produção de energia elétrica, que hoje é abaixo do potencial instalado.

A bacia hidrográfica do rio São Francisco é totalmente dependente do nível e da distribuição das chuvas. Dessa forma, aí está uma importância de natureza climática. Seria impossível mencionar neste artigo todas as possíveis consequências, especialmente porque muitos dos efeitos são desconhecidos e incalculáveis. As mudanças climáticas podem elevar a necessidade de escolha entre usos, como, por exemplo, irrigação ou geração de energia, proteção da vida aquática ou diluição de esgoto. As políticas públicas destinadas à administração dos recursos da bacia terão que levar em consideração essas questões e ter em mente a possibilidade e necessidade de existência de diversos cenários para tentar se adaptar às mudanças climáticas. Esse é um grande desafio! “A água doce não tem substitutos para a maioria dos usos” e o seu ciclo tem sido diretamente influenciado por mudanças antrópicas para atender as necessidades humanas, como no caso de irrigação e hidroeletricidade. O problema maior é que esses fatos estão também associados a outras variáveis, como mudança climática e às teleconexões.

FONTE: Disponível em: <http://www.jornallivre.com.br/73726/teleconexoes-mudancas-climaticas-e-o-velho-chico.html>. Acesso em: 1 jun. 2013.

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Neste tópico, você viu:

• Temos uma ligação muito íntima com a água em diferentes aspectos (biológicos, culturais, psíquico e econômico).

• As características da água estão divididas em físicas, químicas e biológicas. As características físicas e químicas da água influenciam as características biológicas.

• As características da água influenciam tanto na dinâmica do planeta, como nas características e comportamentos de diferentes espécies de seres vivos.

• O ciclo hidrológico pode ser resumido em: precipitação, detenção, escoamento superficial, infiltração, escoamento subterrâneo, evapotranspiração e evaporação.

• As atividades humanas causam inúmeras interferências no ciclo hidrológico, os principais motivos são o desmatamento e a urbanização.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 Descreva as principais características da água.

Chegou a hora de você avaliar o quanto conseguiu aprender com a sua leitura. Responda às questões a seguir e reflita sobre elas.

AUTOATIVIDADE

FONTE: Disponível em: <http://www.google.com.br/search?q=imagem+bacia+hidrografica>. Acesso em: 5 abr. 2013.

Busque informações sobre a bacia hidrográfica de sua região. Pesquise o nome, os municípios que a área total abrange, uso e ocupação do solo, índices pluviométricos, frequência de cheias e outras informações que você ache importantes. Com essas informações estruture um fichário que servirá de base para trabalhos futuros.

2 Sobre o ciclo hidrológico, é CORRETO afirmar:a) ( ) A precipitação é um fenômeno que se distribui igualmente

em todas as regiões da Terra.b) ( ) Nos oceanos o volume de água evaporado é menor do que o

volume de água precipitada.c) ( ) Para se estruturar o balanço de volumes de uma bacia hidrográfica, depende-se

inicialmente dos dados do fluxo vertical.d) ( ) O ciclo hidrológico é um fenômeno natural que não sofre interferência

das ações antrópicas.

3 Analise a figura a seguir e, com base nas informações sobre a interferência do ser humano no ciclo hidrológico, descreva a atual situação da bacia hidrográfica da sua região.

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TÓPICO 2

POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

No tópico anterior analisamos as características físicas, químicas e biológicas da água, como ela se renova no nosso planeta e como o ser humano interfere nesses processos. Essas informações nos deram uma noção da importância da água para a nossa sobrevivência e o equilíbrio do planeta.

Nesse tópico veremos os principais aspectos envolvidos na poluição dos recursos hídricos e algumas formas de revertermos esses impactos.

2 POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

Enquanto a poluição do ar é responsável por três milhões de mortes ao ano, a água contaminada provoca 25 milhões em todo o mundo. De acordo com o CONAMA, poluição da água é:

[...] qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas que possa importar em prejuízos à saúde, à segurança e, ao bem-estar das populações e ainda comprometer a sua utilização para fins agrícolas, industriais, comerciais, recreativos e, especialmente, a existência normal da fauna aquática (BRASIL, 1986).

Essas alterações podem ser provocadas por ações antrópicas. A poluição pode ocorrer de duas formas: pontual ou difusa.

1. A poluição pontual caracteriza-se por lançamentos individualizados, normalmente de fácil identificação, como o lançamento de esgotos por uma residência ou lançamento de tintura por indústrias têxteis.

2. Já as cargas difusas caracterizam-se por não possuírem um local definido de contaminação, como, por exemplo, o lançamento de agrotóxicos pela agricultura.

Comumente encontramos mananciais, rios e lagos poluídos, principalmente os de áreas urbanas. Muitas vezes esses corpos d’água estão tão descaracterizados que nem conseguimos concebê-los como um rio, um exemplo são as ditas “valas” muito comuns em áreas que não possuem drenagem de águas pluviais.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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Essas valas, na maioria das vezes, são rios ou riachos retificados que não apresentam suas características naturais como os meandros (curvas sinuosas do rio) e vegetação ciliar ao longo do seu percurso. Elas vêm sofrendo com processos erosivos, assoreamento, despejo de esgotos domésticos e lixo, o que resulta em corpos d’água com padrões estéticos que fogem à concepção que se tem de rio ou riacho, pois normalmente apresentam coloração alterada e odor desagradável.

Uma água com qualidade possui características físicas, químicas e biológicas específicas, ou seja, existe um padrão que determina se a água tem ou não qualidade, como já foi evidenciado no tópico anterior. A caracterização da qualidade da água é feita através de exames e análises de amostras coletadas do corpo d’água em questão. A balneabilidade das águas litorâneas é evidenciada através dessas análises, que respeitam normas técnicas e padrões preestabelecidos. Observe no próximo quadro, com maior detalhamento, os principais indicadores de qualidade da água e suas principais características.

QUADRO 3 – INDICADORES FÍSICOS, QUÍMICOS E BIOLÓGICOS DA QUALIDADE DA ÁGUA

Principais indicadores de qualidade

Físicos

Cor – a cor se evidencia através da existência de substâncias em solução, sendo essas, na maioria das vezes, de origem orgânica.Turbidez – a turbidez é decorrente da presença de materiais em suspensão na água. Sabor e odor – estão associados à presença de poluentes industriais ou outras substâncias indesejáveis, tais como matéria orgânica em decomposição.

Químicos

Oxigênio dissolvido (OD) – um dos requisitos básicos para a sobrevivência da maioria das espécies aquáticas é a presença de oxigênio dissolvido na água. O oxigênio, além de manter a vida na água, é necessário para a decomposição aeróbica do despejo poluidor. A aeração da água é produzida pela atmosfera, turbulência do rio e a fotossíntese das plantas aquáticas. Demanda bioquímica de oxigênio (DBO) – a DBO mede a quantidade de oxigênio usada pela água na decomposição de material orgânico, ou seja, é a quantidade de oxigênio que vai ser respirada pelos decompositores aeróbios para a decomposição completa da matéria orgânica lançada na água. Nitrogênio e fósforo – o nitrogênio na matéria orgânica transforma-se em nitrito e nitrato, e a presença desses elementos na água, juntamente com a amônia, são indicadores de poluição. O nitrogênio juntamente com o fósforo são indicadores das condições de eutrofização de um corpo d’água.Detergentes – a presença de detergentes na água principalmente os não biodegradáveis, além de ser prejudicial à vida aquática, dificulta os processos de tratamento de água e esgoto.Agrotóxicos – os agrotóxicos (raticidas, herbicidas, inseticidas, fungicidas e outros) são produtos químicos utilizados no combate de pragas. O excesso e o uso incorreto desses produtos são prejudiciais às comunidades aquáticas e ao ser humano.Fenóis – os fenóis são comuns em resíduos industriais. Além de serem tóxicos, interferem no processo de tratamento da água, pois se combinam com o cloro e geram odor e sabor desagradável.

Biológicos

Indicador bacteriológico – testa o número de bactérias na água, como coliformes e estreptococos. Indicador aquático – são utilizados organismos aquáticos como peixes e plâncton para verificar o grau de poluição, por meio da sua resistência a condições anormais.

FONTE: Adaptado de: Braga et al. (2005, p. 100), Tucci e Mendes (2006, p. 86)

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TÓPICO 2 | POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

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QUADRO 3 – INDICADORES FÍSICOS, QUÍMICOS E BIOLÓGICOS DA QUALIDADE DA ÁGUA

FONTE: Adaptado de: Braga et al. (2005, p. 100), Tucci e Mendes (2006, p. 86)

IMPORTANTE

Caro(a) acadêmico(a)! A qualidade é um requisito básico para a gestão da água, não é por acaso que um dos objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos, estabelecida pela Lei nº 9.433/1997, é “[...] assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos”.

DICAS

A eutrofização é o enriquecimento das águas com os nutrientes necessários ao crescimento da vida vegetal aquática. Nos lagos, ela é um processo natural de maturação, sendo lento e associado ao tempo de evolução dos ecossistemas. Um ambiente eutrofizado caracteriza-se pelos altos índices de nutrientes, pouca penetração de luz, baixa concentração de OD, alto crescimento de algas e biodiversidade baixa. Apesar de ser um processo lento, quando ocorre naturalmente, a eutrofização pode ser acelerada pelo despejo excessivo de nutrientes como o fósforo e o nitrogênio na água, presentes no esgoto doméstico, industrial e nos fertilizantes agrícolas.

No quadro a seguir, veremos quais são os principais poluentes (e suas fontes) encontrados na água. Perceba que boa parte dessas fontes tem ligação com os nossos hábitos e comportamentos do dia a dia.

POLUENTE FONTE

Poluentes orgânicos biodegradáveis

São constituídos basicamente por carboidratos, proteínas e gorduras. A sua presença nos corpos d’água pode causar perda de biodiversidade, mau cheiro e outros problemas indesejados. A principal fonte são os esgotos domésticos. No Brasil, esse é um dos poluentes mais comuns nos rios e riachos, principalmente nos espaços mais urbanizados.

Poluentes orgânicos recalcitrantes ou

refratários

Referem-se a compostos orgânicos que não são biodegradáveis ou com taxa de biodegradação muito lenta. Diferente dos poluentes orgânicos biodegradáveis, os poluentes orgânicos recalcitrantes têm o seu impacto associado à sua toxicidade e não ao consumo de oxigênio utilizado para sua decomposição. As principais fontes são os defensivos agrícolas (inseticidas, herbicidas e outros), detergentes sintéticos e petróleo.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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Metais

Os metais podem gerar danos à saúde, de acordo com a quantidade ingerida, devido à sua toxicidade, ou pelos seus potenciais carcinogênicos, mutagênicos ou teratogênicos. Dentre os metais destaca-se o mercúrio (Hg), usado em grande escala para fins industriais e agrícolas; o cádmio (Cd), também utilizado em larga escala na indústria na produção de ligas metálicas, agrotóxicos, produção e uso de tintas, trabalhos de impressão e fabricação de plásticos; o chumbo (Pb), cuja exposição humana pode se dar através de fontes naturais ou antropogênicas, tais como a mineração, fundição e refino de chumbo e outros metais, indústrias petrolíferas e cerâmicas, produção de vidro e borracha, construção civil, entre outras; o manganês (Mn) é empregado na fabricação de rações, adubos, pilhas secas, ligas não ferrosas, fungicidas, produtos farmacêuticos, entre outros; e o arsênio (As) que pode ser encontrado em depósitos finais de rejeitos químicos, manufatura (fusão) do cobre e outros metais, combustíveis fósseis, agrotóxicos, raticidas, tintas, corantes, entre outros. Um dos principais problemas gerados pelo metal é o seu potencial bioacumulativo. Organismos presentes na água podem acumular quantidades de metal nos seus tecidos e repassar ao longo da cadeia alimentar, podendo prejudicar organismos do topo da cadeia, como o ser humano.

Nutrientes

O excesso de nutrientes na água pode gerar uma série de problemas para o ambiente aquático, como a proliferação de algas e outros organismos vivos, prejudicando diferentes usuários de água. Os principais nutrientes envolvidos nesse processo são o fósforo e o nitrogênio. Eles chegam aos corpos de água por meio da erosão do solo, pela fertilização artificial dos campos agrícolas ou pela própria decomposição natural da matéria orgânica biodegradável existente na água e no solo.

Organismos patogênicos

Inúmeros organismos patogênicos podem estar presentes na água como: vírus (doenças causadas: hepatite infecciosa e poliomielite), bactérias (leptospirose, febre tifoide, cólera (vibrião da cólera), diarreia (enterovírus, E. Colli) entre outras doenças), protozoários (amebíase, giardíase) e helmintos (esquistossomose e ascaridíase). A principal fonte de contaminação da água com esses organismos é o esgoto doméstico.

Sólidos em suspensão

Os sólidos em suspensão podem ser depositados na água de diversas formas, como a erosão acentuada, enxurradas, entre outros fatores. O aumento da turbidez da água dificulta a entrada de luz e consequentemente prejudica a fauna e a flora aquática. O alto índice de turbidez pode prejudicar o acesso à água por diferentes usuários. A rizicultura, por exemplo, quando manejada de forma inadequada pode lançar nos corpos d’água uma grande quantidade de “lama” aumentando assim a turbidez da água e prejudicando usos como o abastecimento urbano.

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TÓPICO 2 | POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

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Calor

As características químicas, físicas e biológicas são afetadas pela temperatura da água. O lançamento de efluentes industriais aquecidos são uma das fontes de alteração da temperatura da água.

FONTE: Adaptado de Braga et al. (2005, p. 83-86), Costa e Costa (2004, p. 17-56)

Cientes dos principais poluentes aquáticos e suas principais fontes, veremos, a seguir, alguns procedimentos técnicos que ajudam a minimizar esses impactos nos recursos hídricos. Contudo, sempre devemos ter em mente que as ações individuais são fundamentais nesse processo.

3 O TRATAMENTO DA ÁGUA

O tratamento da água possui inúmeras finalidades, tais como: higiênicas, econômicas e estéticas.

Higiênicas – possuem a funcionalidade de remover protozoários, vírus, bactérias e outros micro-organismos nocivos à saúde humana, reduzem impurezas e teores elevados de compostos orgânicos.

Econômicas – aqui ocorre a redução da corrosividade, da dureza, do ferro e manganês, pois o excesso faz mal à saúde, podendo levar o indivíduo a sofrer com enfermidades.

Estéticas – a água tratada se torna incolor, sem sabor e sem odor.

Para que a água possa ser consumida com segurança pelos seres humanos, ela precisa possuir certos padrões de potabilidade. Esses padrões, no Brasil, são estabelecidos pela Portaria no 518, de 25 de abril de 2004, do Ministério da Saúde. O abastecimento público de água deve respeitar esses padrões, para isso é feito o tratamento da água.

IMPORTANTE

Para saber mais sobre a vigilância da qualidade da água e dos padrões de potabilidade estabelecidos em nosso país, acesse: <http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2004/GM/GM-518.htm>.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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O tratamento pode ser realizado para atender várias finalidades como já vimos (higiênicas, estéticas e econômicas). O tratamento de água é composto por diversas etapas, parte da captação passa pelo tratamento propriamente dito e termina com a distribuição da água para a população, conforme pode ser visualizado na figura a seguir.

FIGURA 2 – SISTEMA DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA

FONTE: Disponível em: <http://www.copasa.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=23&sid=98&tpl=printerview>. Acesso em: 5 abr. 2013.

Os processos de tratamento de água são:

Oxidação – o primeiro passo é oxidar os metais presentes na água, principalmente o ferro e o manganês, que normalmente se apresentam dissolvidos na água bruta. Para isso, injeta-se cloro ou produto similar, pois tornam os metais insolúveis na água, permitindo, assim, a sua remoção nas outras etapas de tratamento. Coagulação – a remoção das partículas de sujeira se inicia no tanque de mistura rápida com a dosagem de sulfato de alumínio ou cloreto férrico. Estes coagulantes têm o poder de aglomerar a sujeira, formando flocos. Para otimizar o processo adiciona-se cal, o que mantém o pH da água no nível adequado.

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TÓPICO 2 | POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

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Floculação – na floculação, a água já coagulada movimenta-se de tal forma dentro dos tanques que os flocos misturam-se, ganhando peso, volume e consistência.

Decantação – na decantação, os flocos formados anteriormente separam-se da água, sedimentando-se, no fundo dos tanques.

Filtração – a água ainda contém impurezas que não foram sedimentadas no processo de decantação. Ela precisa, por isso, passar por filtros constituídos por camadas de areia ou areia e antracito, suportadas por cascalho de diversos tamanhos que retêm a sujeira ainda restante.

Desinfecção – a água já está limpa quando chega a esta etapa. Contudo, ela recebe ainda mais uma substância: o cloro. Este elimina os germes nocivos à saúde, garantindo também a qualidade da água nas redes de distribuição e nos reservatórios.

Correção de pH – (potencial hidrogeniônico) – para proteger as canalizações das redes e das casas contra corrosão ou incrustação, a água recebe uma dosagem de cal, que corrige seu pH.

Fluoretação – finalmente a água é fluoretada, em atendimento à Portaria do Ministério da Saúde. Consiste na aplicação de uma dosagem de composto de flúor (ácido fluossilícico). Reduz a incidência da cárie dentária, especialmente no período de formação dos dentes, que vai da gestação até a idade de 15 anos.

FONTE: Disponível em: <http://www.copasa.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=23&tpl=printerview>. Acesso em: 3 jun. 2013.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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FIGURA 3 – ESCALA DO PH

FONTE: Disponível em: <http://www.ufrrj.br/institutos/it/de/acidentes/ph.htm>. Acesso em: 5 abr. 2013.

4 O TRATAMENTO DE ESGOTO DOMÉSTICO

Tendo como foco as estações de tratamento de esgoto, a Agência Nacional de Água (ANA) decidiu iniciar um programa de despoluição.

Isto aconteceu porque o tratamento de esgotos é ainda um desafio de grandes dimensões no Brasil, uma vez que apenas cerca de 20% do esgoto urbano passa por alguma estação de tratamento para a remoção de poluentes, antes do despejo final em algum rio ou no mar. O resto do esgoto coletado é conduzido por tubulações para despejo in natura, transformando os rios em focos de disseminação de doenças.

Nas regiões mais pobres não existem as tubulações e o esgoto sai da moradia diretamente para a chamada "vala negra". Isto aumenta enormemente o risco de propagação das doenças infectocontagiosas, vitimando em particular as crianças. Em outras regiões, dependendo da permeabilidade do terreno, adotam-se fossas sépticas. Trata-se de razoável solução para o destino final do esgoto, caso as fossas sejam bem operadas. Contudo, frequentemente as fossas são mal operadas, resultando na contaminação de lençóis freáticos e, consequentemente, da água que vier a ser retirada de poços.

FONTE: Disponível em: <http://www.kelman.com.br/pdf/poluicao_seca_2.pdf>. Acesso em: 3 jun. 2013.

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TÓPICO 2 | POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

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NOTA

In natura – no estado original, no caso, refere-se ao estado que se apresenta, sem receber qualquer tipo de tratamento.

Como você pode perceber, um dos principais problemas ambientais relacionados à água no nosso país é o esgotamento sanitário, principalmente o esgoto doméstico. Uma das formas de minimizar esse impacto é o tratamento coletivo de esgoto doméstico através das Estações de Tratamento de Esgotos (ETE).

O tratamento dos esgotos domésticos tem como objetivo remover o material sólido; reduzir a demanda bioquímica de oxigênio; exterminar micro-organismos patogênicos; reduzir as substâncias químicas indesejáveis e principalmente minimizar os impactos ambientais ocasionados por esse poluente.

FIGURA 4 – ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ESGOTO (ETE)

FONTE: Disponível em: <http://www.ufrrj.br/institutos/it/de/acidentes/esg4.htm>. Acesso em: 21 set. 2012.

A seguir podemos analisar uma descrição das etapas do tratamento de esgotamento sanitário:

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Grade grosseira – retenção dos materiais de grandes dimensões, como latas, madeiras, papelão etc.

Elevatória de esgoto bruto – recalque dos esgotos para o canal das grades médias.

Grade média – remoção de materiais, como trapos, estopas, papéis etc.

Caixa de areia – remoção da areia contida no esgoto, que, depois de sedimentada, vai para o classificador de areia.

Decantador primário – remoção do resíduo sedimentável dos esgotos, gorduras e óleos flutuantes. Estes materiais, após serem recolhidos por pontes raspadoras, são bombeados para os digestores.

Tanque de aeração – o efluente do decantador primário passa para o tanque de aeração. Combinando-se a agitação do esgoto com a injeção de ar, desenvolve-se, no tanque de aeração, uma massa líquida de micro-organismos denominada "lodos ativados". Estes micro-organismos alimentam-se de matéria orgânica contida no efluente do decantador primário e se proliferam na presença do oxigênio.

Decantador secundário – remoção dos sólidos (flocos de lodo ativado), que, ao sedimentarem no fundo do tanque são raspados para um poço central, retornando para o tanque de aeração. A parte líquida vertente do decantador é destinada ao rio.

Elevatória de retorno de lodo – o lodo ativado, recolhido no decantador secundário por pontes removedoras de lodo, é encaminhado às bombas, retornando aos tanques de aeração e o excesso do lodo ao decantador primário.

Elevatória de lodo primário – recalque do lodo gradeado para o interior dos adensadores de gravidade e digestores.

Retirada do sobrenadante – os adensadores e digestores são equipados com válvulas para a retirada do sobrenadante (líquido que se separa do lodo digerido), que retorna ao início do processo.

Adensadores de gravidade – equipados com um removedor mecanizado de lodo e escuma, de tração central. O efluente é coletado em um canal periférico e enviado para um sistema de coleta de efluentes da fase sólida. Digestores – o lodo removido durante o processo de tratamento é enviado aos digestores. São grandes tanques de concreto, hermeticamente fechados, em que, através do processo de fermentação, na ausência de oxigênio (processo

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TÓPICO 2 | POLUIÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

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anaeróbico), se processará a transformação de lodo em matéria altamente mineralizada, com carga orgânica reduzida e diminuição de bactérias patogênicas.

Secador térmico – retira a água do lodo proveniente dos digestores, elevando seu teor de sólidos até o mínimo de 33%, seguindo para os silos e com destino para agricultura ou aterro sanitário.

FONTE: Disponível em: <http://www.daescs.sp.gov.br/index.asp?dados=ensina&ensi=est_trat_esgoto>. Acesso em: 3 jun. 2013.

Tanto o tratamento da água como o tratamento do esgoto doméstico são apenas algumas das formas de se lidar com os impactos negativos gerados nos cursos d’água. Outros impactos como o desmatamento da vegetação ciliar, a poluição industrial e agrícola, a erosão das margens, entre outros, também merecem uma atenção emergencial.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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LEITURA COMPLEMENTAR

POLUIÇÃO DA ÁGUA

Zampepieron, S. L. M. e Vieira, J. L. A.

Alguém já disse que uma das aventuras mais fascinantes é acompanhar o ciclo das águas na Natureza. Suas reservas no planeta são constantes, mas isso não é motivo para desperdiçá-la ou mesmo poluí-la. A água que usamos para os mais variados fins é sempre a mesma, ou seja, ela é responsável pelo funcionamento da grande máquina que é a vida na Terra, sendo tudo isto movido pela energia solar.

Vista do espaço, a Terra parece o Planeta Água, pois esta cobre 75% da superfície terrestre, formando os oceanos, rios, lagos etc. No entanto, somente uma pequenina parte dessa água – da ordem de 113 trilhões de m3 – está à disposição da vida na Terra. Apesar de parecer um número muito grande, a Terra corre o risco de não mais dispor de água limpa, o que em última análise significa que a grande máquina viva pode parar.

A água nunca é pura na Natureza, pois nela estão dissolvidos gases, sais sólidos e íons. Dentro dessa complexa mistura, há uma coleção variada de vida vegetal e animal, desde o fitoplâncton e o zooplâncton até a baleia azul (maior mamífero do planeta). Dentro dessa gama de variadas formas de vida, há organismos que dependem dela inclusive para completar seu ciclo de vida (como ocorre com os insetos). Enfim, a água é componente vital no sistema de sustentação da vida na Terra e por isso deve ser preservada, mas nem sempre isso acontece. A sua poluição impede a sobrevivência daqueles seres, causando também graves consequências aos seres humanos.

A poluição da água indica que um ou mais de seus usos foram prejudicados, podendo atingir o homem de forma direta, pois ela é usada por este para ser bebida, para tomar banho, para lavar roupas e utensílios e, principalmente, para sua alimentação e dos animais domésticos. Além disso, abastece nossas cidades, sendo também utilizada nas indústrias e na irrigação de plantações. Por isso, a água deve ter aspecto limpo, pureza de gosto e estar isenta de micro-organismos patogênicos, o que é conseguido através do seu tratamento, desde a retirada dos rios até a chegada nas residências urbanas ou rurais. A água de um rio é considerada de boa qualidade quando apresenta menos de mil coliformes fecais e menos de dez micro-organismos patogênicos por litro (como aqueles causadores de verminoses, cólera, esquistossomose, febre tifoide, hepatite, leptospirose, poliomielite etc.). Portanto, para a água se manter nessas condições, deve-se evitar sua contaminação por resíduos, sejam eles agrícolas (de natureza química ou orgânica), esgotos, resíduos industriais, lixo ou sedimentos vindos da erosão.

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Sobre a contaminação agrícola temos, no primeiro caso, os resíduos do uso de agrotóxicos (comum na agropecuária), que provêm de uma prática muitas vezes desnecessária ou intensiva nos campos, enviando grandes quantidades de substâncias tóxicas para os rios através das chuvas, o mesmo ocorrendo com a eliminação do esterco de animais criados em pastagens. No segundo caso, há o uso de adubos, muitas vezes exagerado, que acabam por ser carregados pelas chuvas aos rios locais, acarretando o aumento de nutrientes nestes pontos; isso propicia a ocorrência de uma explosão de bactérias decompositoras que consomem oxigênio, contribuindo ainda para diminuir a concentração do mesmo na água, produzindo sulfeto de hidrogênio, um gás de cheiro muito forte que, em grandes quantidades, é tóxico. Isso também afetaria as formas superiores de vida animal e vegetal, que utilizam o oxigênio na respiração, além das bactérias aeróbicas, que seriam impedidas de decompor a matéria orgânica sem deixar odores nocivos através do consumo de oxigênio.

Os resíduos gerados pelas indústrias, cidades e atividades agrícolas são sólidos ou líquidos, tendo um potencial de poluição muito grande. Os resíduos gerados pelas cidades como lixo, entulhos e produtos tóxicos são carregados para os rios com a ajuda das chuvas. Os resíduos líquidos carregam poluentes orgânicos (que são mais fáceis de ser controlados do que os inorgânicos, quando em pequena quantidade). As indústrias produzem grande quantidade de resíduos em seus processos, sendo uma parte retida pelas instalações de tratamento da própria indústria, que retêm tanto resíduos sólidos quanto líquidos, e a outra parte despejada no ambiente. No processo de tratamento dos resíduos também é produzido outro resíduo chamado chorume, líquido que precisa novamente de tratamento e controle. As cidades podem ser ainda poluídas pelas enxurradas, pelo lixo e pelo esgoto.

Enfim, a poluição das águas pode aparecer de vários modos, incluindo a poluição térmica, que é a descarga de efluentes a altas temperaturas, poluição física, que é a descarga de material em suspensão, poluição biológica, que é a descarga de bactérias patogênicas e vírus, e poluição química, que pode ocorrer por deficiência de oxigênio, toxidez e eutrofização.

A eutrofização é causada por processos de erosão e decomposição que fazem aumentar o conteúdo de nutrientes, aumentando a produtividade biológica, permitindo periódicas proliferações de algas, que tornam a água turva e com isso podem causar deficiência de oxigênio pelo seu apodrecimento, aumentando sua toxidez para os organismos que nela vivem (como os peixes, que aparecem mortos nas espumas tóxicas).

A poluição de águas nos países ricos é resultado da maneira como a sociedade consumista está organizada para produzir e desfrutar de sua riqueza, progresso material e bem-estar. Já nos países pobres, a poluição é resultado da pobreza e da ausência de educação de seus habitantes, que, assim, não têm base para exigir os seus direitos de cidadãos, o que só tende a prejudicá-los, pois esta

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

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omissão na reivindicação de seus direitos leva à impunidade das indústrias, que poluem cada vez mais, e dos governantes, que também se aproveitam da ausência da educação do povo e, em geral, fecham os olhos para a questão, como se tal poluição não atingisse também a eles. A Educação Ambiental vem justamente resgatar a cidadania para que o povo tome consciência da necessidade da preservação do meio ambiente, que influi diretamente na manutenção da sua qualidade de vida.

Dentro desse contexto, uma grande parcela da contenção da “saúde das águas” cabe a nós, brasileiros, pois, se a Terra parece o Planeta Água, o Brasil poderia ser considerado sua capital, já que é dotado de uma extensa rede de rios, e privilegiado por um clima excepcional, que assegura chuvas abundantes e regulares em quase todo seu território.

O Brasil dispõe de 15% de toda a água doce existente no mundo, ou seja, dos 113 trilhões de m3 disponíveis para a vida terrestre, 17 trilhões foram reservados ao nosso país. No processo de reciclagem, quase a totalidade dessa água é recolhida pelas nove grandes bacias hidrográficas aqui existentes. Como a água é necessária para dar continuidade ao crescimento econômico, as bacias hidrográficas passam a ser áreas geográficas de preocupação de todos os agentes e de interesse dos setores públicos e privados, pois elas passam por várias cidades, propriedades agrícolas e indústrias. No entanto, a presença de alguns produtos químicos industriais e agrícolas (agrotóxicos) pode impedir a purificação natural da água (reciclagem) e, nesse caso, só a construção de sofisticados sistemas de tratamento permitiriam a retenção de compostos químicos nocivos à saúde humana, aos peixes e à vegetação.

Quanto melhor é a água de um rio, ou seja, quanto mais esforços forem feitos no sentido de que ela seja preservada (tendo como instrumento principal de conscientização da população a Educação Ambiental), melhor e mais barato será o tratamento desta e, com isso, a população só terá a ganhar. Mas parece que a preocupação dos técnicos em geral é sofisticar cada vez mais os tratamentos de água, ao invés de se aterem mais à preservação dos mananciais, de onde é retirada água pura. Este é o raciocínio – mais irracional – de que a técnica pode fazer tudo. Técnicas sofisticadíssimas estão sendo desenvolvidas para permitir a reutilização da água no abastecimento público, não percebendo que a ingestão de um líquido tratado com tal grau de sofisticação pode ser tudo, menos o alimento vital do qual o ser humano necessita. Ou seja, de que adianta o progresso se não há qualidade de vida? A única medida mitigadora possível para este problema, na situação grave em que o consumo da água se encontra, foi misturar e fornecer à população uma água de boa procedência com outra de procedência pior, cuidadosamente tratada e controlada. Vejam a que ponto tivemos que chegar.

Portanto, a meta imediata é preservar os poucos mananciais intactos que ainda restam para que o homem possa dispor de um reservatório de água potável e assim sobreviver nos próximos milênios.

FONTE: Disponível em: <http://educar.sc.usp.br/biologia/textos/m_a_txt5.html>. Acesso em: 25 set. 2012.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Nesse tópico você viu:

• A poluição da água é qualquer “[...] alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas que possa importar em prejuízos à saúde, à segurança e ao bem-estar das populações e ainda comprometer sua utilização para fins agrícolas, industriais, comerciais, recreativos e, especialmente, a existência normal da fauna aquática” (BRASIL, 1986).

• A poluição pode se dar de duas formas: pontual ou difusa.

• Os principais poluentes que alteram a qualidade da água são: poluentes orgânicos biodegradáveis, poluentes orgânicos recalcitrantes ou refratários, metais, nutrientes, organismos patogênicos, sólidos em suspensão.

• Duas formas de minimizar os impactos da poluição da água tanto para o ser humano como para o ambiente natural são os tratamentos de água e esgoto.

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Como você pôde perceber, existem várias formas de poluição dos recursos hídricos que se originam de fontes diversas. Diante do que você conhece da sua região, aponte os principais impactos negativos nos cursos d’água e que alternativas estão sendo pensadas na sua região para lidar com esses problemas. Acrescente essas informações ao seu fichário.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 3

DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL

E NO MUNDO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

De forma geral, praticamente todas as ações do nosso dia a dia dependem da água para existir. Em casa ou no trabalho estamos envoltos por produtos que necessitam da água para ser produzidos ou que a água esteja presente na sua composição (alimentos, produtos de higiene e outros). A água é usada para gerar energia elétrica, para manutenção e funcionamento das máquinas e nos processos de produção (limpeza de equipamentos ou produtos, resfriamento de caldeiras e outros).

A energia elétrica que nos possibilita uma série de confortos, tais como água quente nas torneiras e chuveiros, resfriamento ou aquecimento de ambientes e o uso de eletrodomésticos, no Brasil provém basicamente da hidroeletricidade. Enfim, o desenvolvimento econômico de uma região depende da presença da água para poder avançar.

Apesar dessa necessidade intrínseca que temos da água, ela não está disponível em quantidades ou na qualidade desejada em todo o planeta. Um exemplo claro disso é o nordeste brasileiro, pois, apesar de toda “abundância hídrica” existente em nosso país, sua distribuição é irregular, variando no espaço e no tempo.

Veremos nesse tópico um panorama geral da atual situação da água

no Brasil e no mundo, levando em conta sua distribuição, disponibilidade e demanda em diferentes regiões. Conheceremos quem são os principais usuários da água, para podermos analisar, no tópico seguinte, os impactos gerados por esses diferentes usos.

2 DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

A água é o elemento mais abundante da Terra, cobrindo cerca de 70% de toda a superfície do planeta. Como apresenta a tabela a seguir, ela pode ser classificada em doce, salobra e salgada de acordo com suas características naturais.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

TABELA 1 – CLASSIFICAÇÃO MUNDIAL DAS ÁGUAS EM RELAÇÃO AO TEOR DE SÓLIDOS TOTAIS DISSOLVIDOS

Classificação Teor de sólidos totais dissolvidos (mg/L)Água doce Inferior a 1.000Água salobra Entre 1.000 e 10.000Água salgada Superior a 10.000

FONTE: Adaptado de: Rebouças (1999, p. 7)

No território brasileiro, segundo a Resolução no 357/2005 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), a água é classificada de acordo com a sua salinidade em:

• águas doces: águas com salinidade igual ou inferior a 0,5%;

• águas salobras: águas com salinidade superior a 0,5% e inferior a 30%;

• águas salinas: águas com salinidade igual ou superior a 30%.

Durante os últimos 500 milhões de anos a quantidade total de água na Terra tem permanecido constante, variando apenas no espaço e no tempo, nos diferentes reservatórios naturais de água.

A distribuição percentual de água nestes reservatórios pode ser observada na próxima figura, em que é possível verificar que, do volume total de água no planeta, apenas 2,53% encontra-se sob a forma de água doce, sendo que desta porção 68,9% está reservada nas calotas polares e geleiras, 29,9% encontra-se no subsolo da superfície terrestre, 0,3% nos rios e lagos e 0,9% em outros reservatórios.

FIGURA 5 – VOLUMES TOTAIS DE ÁGUA NOS PRINCIPAIS RESERVATÓRIOS DA TERRA

FONTE: Adaptado de: Rebouças (1999, p. 8)

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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A água doce é um dos recursos naturais mais utilizados pelo homem tanto para o seu desenvolvimento biológico como social. O termo água designa-se ao elemento desvinculado de qualquer uso. Quando nos referimos à água como um bem econômico ou passível de utilização para tal fim, o termo mais apropriado é recurso hídrico.

Apesar da abundância, nem toda água disponível no planeta pode ser utilizada diretamente pelo homem. Desta forma, tanto a água salgada como a água presente nas geleiras, apesar de poderem ser utilizadas indiretamente pelo ser humano, têm sua utilização inviabilizada devido aos altos custos do processamento.

As águas superficiais (rios e lagos) e as águas subterrâneas rasas são as principais fontes viáveis, diretamente, de água doce para o consumo humano. A distribuição destes reservatórios ao longo do planeta ocorre de forma irregular, variando espacialmente e temporalmente.

As regiões que apresentam excedente hídrico estão situadas principalmente entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio. De um modo geral, possuem rios, lagos e outros reservatórios superficiais constantemente cheios, o que leva a uma enganosa percepção de que a água é um recurso natural abundante inesgotável e o seu conceito de conservação significa, em regra geral, deixá-la fluir.

Devido a fatores geológicos desfavoráveis, mesmo nessas regiões úmidas, é possível encontrar problemas regionais e locais de escassez de água. Um exemplo desta problemática é o nordeste do Brasil. O fato de estar localizado sobre o domínio de rochas cristalinas faz com que a zona semiárida do nordeste brasileiro possua condições desfavoráveis para a formação de reservas de água subterrânea, apresentando consequentemente rios temporários e intermitentes.

FIGURA 6 – DISTRIBUIÇÃO DAS REGIÕES ÚMIDAS DA TERRA

FONTE: Rebouças (1999, p. 12)

Trópico de câncer

Trópico de Capricórnio

Tropical ÚmidoClima

SubtropicalTropical MistoTropical Seco

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

Nas regiões secas, a recarga das águas subterrâneas e os escoamentos superficiais podem se tornar escassos ou efêmeros. Desta forma os rios e lagos desta região podem secar temporariamente, e os solos perdem a umidade sob o efeito dos processos de evaporação intensa, o que impossibilita o desenvolvimento regular da biomassa natural ou cultivada.

FIGURA 7 – DISTRIBUIÇÃO DAS ZONAS SECAS DA TERRA

FONTE: Rebouças (1999, p. 12)

Segundo Tundisi (2003), os países que apresentam escassez de água possuem menos de 1.000 m³/(hab. ano). O autor atribui esta escassez à distribuição desigual da água no planeta e à variabilidade natural de séries hidrométricas (medidas dos volumes e vazões dos rios) históricas em determinadas bacias hidrográficas.

Segundo Brasil (2006), os dados da Síntese Executiva do Plano Nacional de Recursos Hídricos apresentam vazão média anual dos rios em território brasileiro de 179 mil m3/s, que corresponde a 12% da disponibilidade mundial.

Da água superficial disponível, mais de 70% concentra-se na região norte do país, o restante está distribuído pelas outras regiões em que vive cerca de 90% da população brasileira.

Mesmo tendo essa distribuição irregular, nenhum estado brasileiro atinge o nível de “estresse de água” que, segundo as Nações Unidas, é inferior a 1.000 m3/s. Entretanto, a forma desordenada de uso e ocupação do solo tem agravado os efeitos da seca ou enchentes, causando prejuízos às populações, principalmente nas regiões mais urbanizadas.

Trópico de câncer

Trópico de Capricórnio

Desértico

ÁridoSemi-árido

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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FIGURA 7 – DISTRIBUIÇÃO DAS ZONAS SECAS DA TERRA

FONTE: Rebouças (1999, p. 12)

TABELA 2 – PAÍSES COM ESCASSEZ DE ÁGUA

Região/PaísSuprimentos de

água renováveis (m³/pessoa)

População (milhões)Tempo de

duplicação da população (anos)

ÁFRICAArgélia 730 26.0 27Botsuana 710 1.4 23Burundi 620 5.8 21Cabo Verde 500 0.4 21Djibuti 750 0.4 24Egito 30 55.7 28Quênia 560 26.2 19Líbia 160 4.5 23Mauritânia 190 2.1 25Ruanda 820 7.7 20Tunísia 450 8.4 33ORIENTE MÉDIOBahrein 0 0.5 29Israel 330 5.2 45Jordânia 190 3.6 20Kuait 0 1.4 23Qatar 40 0.5 28Arábia Saudita 140 16.1 20Síria 550 13.7 18Emirados Árabes 120 2.5 25Iêmen 240 10.4 20OUTROSBarbados 170 0.3 102Bélgica 840 10 347Hungria 580 10.3 -Malta 80 0.4 92Holanda 660 15.2 147Singapura 210 2.8 51População Total 231.5

FONTE: Tundisi (2003, p. 16)

Esses valores evidenciam, para alguns, abundância de água doce, o que tem servido de suporte à cultura do desperdício da água disponível, a não realização dos investimentos necessários ao seu uso e proteção e a sua pequena valorização econômica.

FONTE: Disponível em: <http://www.ct.ufes.br/ppgea/files/BRUNELLA%20PIANNA%20VERONEZ.pdf>. Acesso em: 3 jun. 2013.

O Brasil apresenta uma das maiores reservas de água doce do mundo, entretanto a abundância deste recurso é inversamente proporcional ao planejamento de sua utilização.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

O que falta no país não é água, mas determinado padrão cultural que agregue ética e melhore a eficiência de desempenho político dos governos, da sociedade organizada, das ações públicas e privadas promotoras do desenvolvimento econômico em geral e da sua água doce, em particular.

FONTE: Disponível em: <http://www.mundovestibular.com.br/articles/569/1/IMPORTANCIA-DA-AGUA/Paacutegina1.html>. Acesso em: 3 jun. 2013.

Desta forma, os poderes públicos devem realizar os investimentos necessários para um eficiente gerenciamento, controle e fiscalização das condições de uso e proteção da água. A sociedade, por sua vez, deve perceber que a água é um recurso limitado, um bem público e essencial para o desenvolvimento das sociedades.

Ao longo dos séculos a água tem sido uma das forças motrizes para o desenvolvimento das civilizações humanas.

Analisando a história da humanidade, constata-se que as sociedades estabeleceram-se em regiões de grande abundância hídrica e em vales às margens de rios. Estes, além de fornecerem água para o consumo, fertilizavam os solos, aumentando a produção de alimentos e consequentemente trazendo prosperidade.

FONTE: Disponível em: <http://proxy.furb.br/tede/tde_arquivos/5/TDE-2008-04-29T130315Z-381/Publico/Diss%20Amanda%20Doubrawa.pdf>. Acesso em: 3 jun. 2013.

Mesmo em regiões onde havia escassez de água, com o auxílio da engenharia (desde a construção de pequenos poços até obras monumentais como galerias para captação de água subterrânea), a água tem orientado o desenvolvimento e o progresso das civilizações e culturas humanas.

À medida que as civilizações foram evoluindo tecnologicamente, novas dimensões para o uso da água surgiram. O crescimento da população levou a um aumento progressivo do consumo de água. A tabela a seguir elenca alguns dados referentes aos padrões atuais de consumo humano. Esses dados refletem as desigualdades socioeconômicas vivenciadas pelas diferentes populações da sociedade moderna.

Especula-se que, se considerarmos o padrão consumista dos norte-americanos e levarmos em consideração não só o consumo direto da água, mas produtos e materiais do dia a dia que necessitam da água no processo de evolução, o consumo diário ultrapassaria 1.000 litros/habitantes/dia.

O consumo de água nas atividades humanas varia muito entre diversas regiões e países, os vários usos da água e as permanentes necessidades de água

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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para fazer frente ao crescimento populacional e às demandas industriais e agrícolas têm gerado permanente pressão sobre os recursos hídricos superficiais e subterrâneos (TUNDISI, 2003).

TABELA 3 – EVOLUÇÃO DO CONSUMO PER CAPITA DE ÁGUA PELO HOMEM

Homem Volume (l/d)100 anos a.C. 12Império Romano 20Século XIX Pequenas cidades 40 Grandes cidades 60

FONTE: Macedo (apud ANDREOLI et al., 2003)

Confira, a seguir, quais são os principais usos da água e a distribuição do consumo de água no planeta. Você irá perceber que a agricultura é a atividade que demanda maior volume de água, cerca de 70%.

Agricultura

A água utilizada na agricultura é basicamente direcionada à irrigação. A qualidade de água utilizada na irrigação depende do tipo de cultura a ser irrigada. Ela representa o uso mais intenso dos recursos hídricos, demandando cerca de 70% do consumo de água doce do mundo.

Abastecimento humano

Na Lei no 9.433/97, que estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos, o abastecimento humano e a dessedentação de animais são usos prioritários em períodos de escassez. O abastecimento humano compreende basicamente o uso doméstico e o fornecimento de água tratada respeita padrões de potabilidade também estabelecidos em lei. O esgoto é um subproduto desse uso.

Hidroeletricidade(hidrelétricas)

É a principal fonte de energia elétrica do país. Dependendo da dimensão causa inúmeros impactos ao meio ambiente. Não necessita de alto padrão de qualidade da água.

Usos industriais diversificados

A indústria utiliza a água em seus processos produtivos e na composição de alimentos, remédios, bebidas e outros. A qualidade da água para essa finalidade irá variar de acordo com o tipo de uso.

Recreação, turismo e usos estéticos

A água oferece inúmeras alternativas para exploração recreativa, turismo e em usos estéticos. As Cataratas do Iguaçu, por exemplo, atraem turistas do mundo inteiro devido à sua beleza cênica. Os esportes aquáticos como natação, surf, mergulho, navegação esportiva alcançam cada vez mais novos adeptos, assim como o uso da água na arquitetura para fins paisagísticos, as fontes de jardins são um exemplo.

QUADRO 5 – PRINCIPAIS USOS DA ÁGUA

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

Pesca Produção pesqueira comercial e esportiva.

Aquacultura Cultivo de peixes, moluscos, crustáceos de água doce requer um alto padrão de qualidade.

Transporte e navegação

Para que esse uso ocorra é preciso que a água esteja isenta de substâncias que sejam agressivas ao casco e condutos de refrigeração das embarcações e/ou que propiciem a proliferação de espécies aquáticas.

Assimilação e transporte de

nutrientes

Os corpos d’água também são utilizados para transporte e assimilação de despejos lançados neles, como o esgoto doméstico. Para que isso ocorra, é preciso que haja vazão suficiente para que este uso não interfira em outros usos à jusante.

Preservação de flora e fauna

Outro uso importante é a preservação da flora e da fauna independente dos outros usos existentes. Para esse uso, é importante que o corpo d’água possua características favoráveis à vida como concentrações mínimas de oxigênio dissolvido, sais e nutrientes na água.

FONTE: Adaptado de: Tundisi (2003, p. 28) e Braga et al. (2005, p. 79-81)

TABELA 4 – DISTRIBUIÇÃO DO CONSUMO DE ÁGUA NO PLANETA

Período de referência Região

Volume anual

consumido (Km3)

Consumo anual per capita (m3)

Distribuição do Consumo (%)

Usoagrícola

Usodoméstico

Uso industrial

1987 a 1997 Norte da África e Oriente Médio 221,1 774 80 16 4

1987 a 1995África (exceto

Norte e Oriente Médio)

72,6 151 68 24 8

1988 a 1998 Europa 335,8 523 26 23 51

1990 a 1991 América do Norte 512,4 1.721 27 16 57

1990 a 1997 América Central 105,7 394 65 21 141987 a 1997 América do Sul 157,0 833 76 17 71987 a 1999 Ásia 1.759,9 992 79 11 101985 a 1991 Oceania 14,7 398 45 40 15

1998 Brasil 67,5 398 68 14 181990 Mundo 3.414,0 650 71 9 20

FONTE: Braga et al. (2005, p. 81)

Quanto à natureza de utilização, os usos podem ser classificados em:

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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TABELA 4 – DISTRIBUIÇÃO DO CONSUMO DE ÁGUA NO PLANETA

FONTE: Braga et al. (2005, p. 81)

a) consuntivos: quando se retira água da sua fonte natural, diminuindo suas disponibilidades quantitativas, espacial e temporalmente. São exemplos de usos consuntivos a irrigação e os usos domésticos;

b) não consuntivos: referem-se aos usos que retornam à fonte de suprimento, praticamente a totalidade da água utilizada, como, por exemplo, a navegação e a diluição de esgotos;

c) local: que são os usos que aproveitam a disponibilidade de água em sua fonte sem qualquer modificação relevante, temporal e espacial, de disponibilidade quantitativa. A conservação de banhados é um exemplo de uso local.

IMPORTANTE

Prezado(a) acadêmico(a)! Entendem-se como usuários da água indivíduos, grupos, entidades públicas e privadas e coletividades que, em nome próprio ou no de terceiros, utilizam os recursos hídricos para: a) processo produtivo ou para consumo final; b) receptor de resíduos; c) meio de suporte de atividades de produção ou consumo. Por exemplo, uma empresa que utiliza grande quantidade de água na produção é um usuário de água. Já os que não são usuários são as pessoas que só utilizam a água para o seu consumo (ex.: uso doméstico).FONTE: Adaptado de: <http://www.caminhodasaguas.ufsc.br/comites-de-bacias>. Acesso em: 3 jun. 2013.

O gráfico a seguir mostra a dinâmica de consumo dos principais usos da água em escala mundial. Os dados apontam a evolução numa escala temporal, evidenciando, assim, um aumento crescente na demanda por diferentes usuários. Isto nos chama a atenção para a gestão adequada desse recurso, pois, se hoje ele já apresenta sinais de esgotamento, imagine os problemas futuros de disponibilidade e qualidade de água para os diferentes usos que iremos enfrentar.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

GRÁFICO 1 – EVOLUÇÃO DO CONSUMO GLOBAL DA ÁGUA

FONTE: Tundisi (2003, p. 27)

IMPORTANTE

É importante destacar que problemas futuros referentes à água não serão a respeito da quantidade e sim da má qualidade, proveniente do seu uso inadequado nas atividades exercidas pelo homem.

O aumento e a diversificação dos usos da água resultaram em uma multiplicidade de impactos, de diversas magnitudes, que exigem diferentes tipos de avaliação, tanto qualitativa como quantitativa, e monitoramento adequado a longo prazo (TUNDISI, 2003). Este uso excessivo não coloca em risco apenas os recursos hídricos, mas também todo ecossistema ao redor.

3 USO DA ÁGUA NA PRODUÇÃO DE ALIMENTOS E O COMÉRCIO DA ÁGUA VIRTUAL

A gênese dos estudos a respeito das necessidades humanas mostra que o homem tornou-se sedentário fixando-se às margens dos rios para utilizar a água para suas necessidades básicas e desenvolver práticas agrícolas. Constata-se que desde os tempos remotos a humanidade vem se estabelecendo em seu espaço geográfico, taticamente considerando os fatores físicos.

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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Enquanto vivia de caça e de coleta de produtos vegetais, como frutos e raízes, o homem necessitava de grande espaço para sobreviver. Estima-se que eram necessários 25 quilômetros quadrados para alimentar uma única pessoa.

Com o domínio de técnicas empregadas na agricultura, o homem ampliou sua capacidade de produzir, transportar e armazenar alimentos, melhorando sua condição de vida. Aprimorando sua capacidade de produzir seu próprio sustento, o homem passou a utilizar cada vez menos espaço, porém utilizando cada vez mais água para suas necessidades.

Atualmente, nos deparamos com a escassez da água, fonte de vida de todo planeta, que se apresenta como um desafio para toda a humanidade.

Todos os anos, milhões de pessoas protestam por seus direitos aos recursos hídricos do planeta. Estima-se que, no próximo século, o número de habitantes do planeta será acrescido em três bilhões de pessoas, e a maior parte nascerá em países que já sofrem com a escassez de água potável.

A população mundial atingiu, recentemente, 7 bilhões de indivíduos, "[...] as pressões exercidas pela concentração da população e de atividades geradas pela urbanização e industrialização concorrem para acentuar as modificações do meio ambiente, com o comprometimento da qualidade de vida". (MONTEIRO, 1987, p. 48).

Números estatísticos apontam que 25 milhões de pessoas morrem anualmente em decorrência de doenças transmitidas por veiculação hídrica, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Dados quantitativos indicam que aproximadamente 35% da população mundial não têm acesso à água tratada e 43% não contam com serviços adequados de saneamento.

Paralelamente ao aumento populacional, cresceram as exigências do homem e a exploração dos recursos naturais, ocasionando problemas de degradação ambiental. Consideremos, porém, que grande parte dos recursos naturais utilizados por ele é finito, não renovável.

Não bastasse isso, o ser humano produz, por meio de suas atividades, resíduos dos mais diversos, que são devolvidos à natureza, muitas vezes de forma inadequada, poluindo recursos cruciais como o ar, a água e o solo responsáveis por sua sobrevivência.

Assim, o homem se encontra hoje frente a um quadro de esgotamento acelerado de tais recursos, confrontando uma degradação ambiental crescente. Diante disso, efeitos sobre o meio ambiente, em áreas de grandes concentrações humanas, podem resultar em impactos diretos, incluindo materiais poluentes e produtos tóxicos, colocando em risco a saúde humana e os ecossistemas.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

Um dos grandes desafios da sociedade moderna é o adequado gerenciamento da água potável, pois o uso impróprio, o desperdício e a contaminação estão ocasionando sua escassez. Esta já se faz sentir nas atividades agrícolas, industriais e na dessedentação humana e animal em várias partes do mundo.

A disputa por este bem precioso, a água, se faz sentir no Oriente Médio e no continente africano, onde se afirma que os próximos conflitos não serão mais pelo petróleo e, sim, pela água.

A escassez da água não remete somente à sua utilidade como fonte essencial à vida, sua falta nos leva também à escassez de alimentos, visto que não existe um meio de produzir grãos sem utilizar água. Hoje em dia, países que exportam grãos são países exportadores de água, pois, para produzir uma tonelada de grãos, são necessárias mil toneladas de água.

Países localizados no Oriente Médio e norte da África, que já sofrem com escassez de água para abastecimento público, encontraram na importação de grãos uma forma apropriada de pouparem água. Comprando grãos, não necessitam de água para as atividades agrícolas.

Os conflitos pela água já se fazem sentir nestas regiões, onde a estimativa do crescimento populacional é inversamente proporcional à quantidade de água de que dispõem.

No início do século XX, um agricultor americano produzia, em média, o suficiente para alimentar sete pessoas em um ano. Na década de 1970 esse número foi estimado em 73 pessoas, atualmente produz o suficiente para alimentar 155 pessoas.

O investimento agrícola é um indicador da era moderna, pois se apresenta como o século revolucionário para o mundo onde a tração animal de tempos remotos cedeu lugar aos modernos tratores, os produtos de base como milho, trigo e arroz são produzidos em larga escala, multiplicando em seis vezes o número de áreas irrigadas.

Durante o século XX, a agricultura se fortaleceu de modo que quase quadruplicou a colheita de grãos, isso proveniente de cinco tecnologias: a irrigação, os fertilizantes químicos, a genética de grãos, a redução do tamanho dos cereais e o milho híbrido.

A irrigação oriunda de tempos remotos, como a plantação de batata pelos incas nos Andes, atualmente se caracteriza como forma de desenvolvimento. Em países como a China, por exemplo, criou-se um sistema de desvio das águas do rio Huai, canalizando mais de 1.000 km no sentido Sul-Norte do país, a fim de irrigar áreas urbanas e industriais.

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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Em 1847, o químico alemão Justus von Leibig coordenou pesquisas e desenvolveu os fertilizantes químicos, garantindo o aumento da produtividade das terras, assegurando a fertilidade do solo. Gregor Mendel, em 1860, descobriu o princípio básico da genética, cultivando ervilhas na Áustria, modificando geneticamente os alimentos.

Poucos anos depois, os japoneses obtiveram sucesso com a redução dos cereais, produzindo trigo e arroz em pequenos talos. E a quinta importante façanha tecnológica na produção agrícola foi o desenvolvimento do milho híbrido, elevando esta commodity a uma das três grandes colheitas de cereais, juntamente com o arroz e o trigo.

NOTA

Commodity ou commodities, no plural, é uma palavra de origem inglesa que faz menção à mercadoria. Refere-se a produtos comercializáveis em todo o mundo que, devido à sua importância no mercado mundial, têm seu preço taxado pelo mercado internacional e não pelo produtor. Alguns exemplos são: soja, café, petróleo, minério de ferro, alumínio, arroz, cobre.

As modernas técnicas aplicadas na produção de insumos agrícolas, infortunadamente, não se traduzem em ganhos extraordinários para a humanidade. Estima-se que 850 milhões de pessoas ao redor do mundo não têm uma alimentação adequada para satisfazer suas necessidades diárias de calorias, levando-as à desnutrição.

O mundo parece ter chegado ao limite, pois dependemos de três sistemas básicos de produção alimentícia: recursos pesqueiros, pastagem e terras cultivadas. No que tange à pesca, entre os anos de 2006 e 2008 o incremento da pesca passou de 137 milhões de toneladas para 143 milhões de toneladas.

A China, como principal produtora, liderou o ranking com 48 milhões de toneladas em 2008, comparando esses números com a década passada, isso representa um acrescimento de 20 milhões de toneladas, propiciando quase que a saturação sustentável de seus recursos.

A pastagem mundial triplicou entre 1950 e 1990, fazendo com que a pastagem excessiva diminuísse a produtividade agrícola. Contudo, o crescimento populacional aumentou, e há uma estimativa que países como Nigéria, Etiópia e Paquistão aumentarão sua população 3 vezes até 2050.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

A Índia, um país com mais de 1,224 bilhão de habitantes, poderá chegar, em 2040, a 600 milhões de habitantes a mais. Isso também pode acontecer com a China que, estima-se, terá um adicional de 300 milhões de habitantes até esse período. Atualmente 700 milhões de pessoas oriundas de 43 países vivem abaixo do limiar de nutrição. De acordo com o relatório do Instituto Internacional de Estocolmo, na Suécia, divulgado em 2006, estima-se que há nove milhões de pessoas passando fome e dois milhões subnutridas em todo o mundo.

Se o modelo atual de produção agrícola, empregado nas agroindústrias, continuar a se desenvolver, este levará o mundo ao patamar de escassez alimentar em detrimento das disputas pela água, sendo que 70% da água utilizada tem como destino a produção agrícola. Exemplo: esses 70% representam, em nível de Brasil, aproximadamente 30% do Produto Interno Bruto (PIB), o qual é proveniente do agronegócio, empregando cerca de 37% da mão de obra do país.

A discrepância pela utilização da água é tão grande que em alguns países, como é o caso de Gâmbia, utilizam-se 4,5 litros/pessoa/dia, enquanto nos Estados Unidos da América se utilizam em média 300 litros/pessoa/dia.

Como exemplo disso, temos o Oriente Médio que representa a região do mundo mais afetada pela falta d’água, tendo uma reserva de 1.200m³/pessoa/ano. O consumo de água por um palestino não chega a 70 litros/pessoa/dia (isso significa 0,07m3/pessoa/dia), nas comunidades rurais é ainda pior, com um consumo médio de 20 litros, já apresentando crise aguda por falta d’água. Turquia, Líbano, Irã e Iraque se encontram um pouco acima do limiar mínimo. Nos países da África subsaariana, cerca de um quarto da população vive em países que atualmente sofrem com a falta de água.

FONTE: Adaptado de: <http://hdr.undp.org/en/media/05-Chapter4_PT.pdf>. Acesso em: 4 jun. 2013.

Hidrólogos calculam o grau de risco da falta de água através da disponibilidade hídrica/pessoa, veja o quadro a seguir.

QUADRO 6 – DISPONIBILIDADE HÍDRICA/PESSOA

Água m³ Período de 1 ano/pessoa

1700 Limiar mínimo 1000 Situação de escassez500 Escassez absoluta

FONTE: Adaptado de: PNUD (2006, p.135-140)

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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FONTE: Adaptado de: <http://hdr.undp.org/en/media/05-Chapter4_PT.pdf>. Acesso em: 4 jun. 2013.

Na bacia hidrográfica do rio Murray-Darling, na Austrália, a produção agrícola consome 80% do volume de água disponível do rio, resultando em uma destruição ambiental extensiva, pois esta bacia abrange 14% do território do país, em que está agregada aproximadamente 40% de toda a produção de gado, arroz, algodão e trigo.

Nos últimos anos, as águas do rio Murray não têm chegado ao mar, isso representa um preço ambiental muito alto e insustentável. No Iêmen a problemática vem de décadas, com a perfuração de poços que chegam a uma profundidade de 50 metros. Atualmente, o nível do lençol freático baixou em dois terços do volume de água que conseguiam retirar.

Como podemos observar, o declínio das camadas freáticas pela exploração dos recursos hídricos é maior do que o ciclo consegue repor.

A lei da demanda pela água depende de estratégias e ações governamentais. Ao importarem produtos agrícolas, os países também estão importando a água utilizada na produção desses grãos, o chamado comércio de água virtual.

Como já foi dito, a disponibilidade de alimentos no mundo está ameaçada, visto que a escassez de água resulta em carência de alimentos. Na economia globalizada, em que impera a escassez, a água atravessa fronteiras por meio de commodities como trigo, soja, arroz e milho, presentes no comércio internacional de grãos. Para produzir uma tonelada de grãos são necessárias 1.000 toneladas de água, com isso, a maneira mais eficiente para os países com déficit hídrico importarem água é importando grãos (BROWN, 2004 apud MEURER, 2011).

Ações governamentais voltadas ao fomento do uso racional da água para agricultura se fazem necessárias, pois a disparidade do uso da água para produção de alimento é desigual no mundo. Embora existam alguns aspectos físicos do ambiente que contribuem para isto, a adoção de algumas medidas de proteção da água é necessária. A Jordânia e a Tunísia, por exemplo, desenvolveram campanhas de educação voltadas aos produtores rurais, com estratégias a fim de reduzir os riscos à saúde associados ao uso das águas residuais.

Como podemos perceber, a atuação do governo é de suma importância para a adoção de métodos de utilização da água, pois se observam diferentes sistemas de irrigação nos países.

Caro(a) acadêmico(a), perceba, nos exemplos a seguir, a importância da boa aplicação das políticas públicas, quando se trata da água.

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

No estado da Califórnia, nos Estados Unidos da América, para produzir 1,3 kg de trigo, é necessária uma tonelada de água, já no Paquistão, a mesma quantidade de água produz menos da metade. Na França, a produção de uma tonelada de milho consome menos da metade da quanti dade de água que seria necessária para se produzir a mesma quantidade na China. Já a Índia produz a metade da quantidade de arroz que a China, com o mesmo volume de água. Para o Egito produzir a quantidade de grãos que consome, seria necessário utilizar um sexto da água da barragem do lago Nasser.

FONTE: Disponível em: <http://hdr.undp.org/en/media/05-Chapter4_PT.pdf>. Acesso em: 5 jun. 2013.

FIGURA 8 – LAGO NASSER, CIDADE DE ASSUÃ, EGITO

FONTE: Arquivo pessoal dos autores

De acordo com dados das Nações Unidas sobre Desenvolvimento dos Recursos Hídricos no Mundo e o Fundo das Nações Unidas para a Infância, no cenário atual, a irrigação representa 73% do consumo de água, 21% destina-se às atividades industriais e 6% ao consumo doméstico. (SÃO PAULO, 2010).

O Brasil possui 12% do total de água doce disponível para consumo, porém encontra-se entre os países que mais desperdiçam água potável no mundo, pois perde 70% da água que recebeu tratamento. Essa perda ocorre tanto pela má utilização (água tratada utilizada para lavação de carros e calçadas) como pelas tubulações antigas em mau estado de conservação, destacando ainda a falta de planejamento e políticas públicas eficazes quanto à utilização dos recursos hídricos.

Em síntese, o crescimento desordenado dos aglomerados urbanos, aliado à ocupação de áreas de mananciais, provoca o esgotamento das reservas naturais de água e obriga as companhias de água a buscar fontes de captação cada vez mais distantes dos centros consumidores. A água potável está ameaçada não somente pela escassez, mas, sobretudo, pela carência de alimentos para a humanidade.

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TÓPICO 3 | DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL E NO MUNDO

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LEITURA COMPLEMENTAR

A ESCASSEZ DE ÁGUA NO FUTURO PODERÁ AUMENTAR OS RISCOS DE CONFLITOS NO MUNDO, AFIRMAM ESPECIALISTAS QUE

PARTICIPAM DO FÓRUM MUNDIAL DA ÁGUA, EM MARSELHA, NA FRANÇA

Daniela Fernandes

Apesar da quantidade de água disponível ser constante, a demanda crescente em razão do aumento da população e da produção agrícola cria um cenário de incertezas e conflito.

A OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) diz que a demanda mundial de água aumentará 55% até 2050. A previsão é que, nesse ano, 2,3 bilhões de pessoas suplementares – mais de 40% da população mundial – não terão acesso à água, se medidas não forem tomadas.

“O aumento da demanda torna a situação mais complicada. As dificuldades hoje são mais visíveis e há mais conflitos regionais”, afirma Gérard Payen, consultor do secretário-geral da ONU e presidente da Aquafed, Federação Internacional dos Operadores Privados de Água. Ele diz que os conflitos normalmente ocorrem dentro de um mesmo país, já que a população tem necessidades diferentes em relação à utilização da água (para a agricultura ou o consumo, por exemplo) e isso gera disputas.

Problemas também são recorrentes entre países com rios transfronteiriços, que compartilham recursos hídricos, como ocorre entre o Egito e o Sudão ou ainda entre a Turquia, a Síria e o Iraque.

Brasil x Bolívia

O Brasil também está em conflito atualmente com a Bolívia em razão do projeto de construção de usinas hidrelétricas no rio Madeira, contestado pelo governo boliviano, que alega impactos ambientais.

Tanto no caso de disputas locais, que ocorrem em um mesmo país, ou internacionais, a única forma de solucionar os problemas é a “vontade política”, segundo o consultor da ONU.

O presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu, que também participa do fórum em Marselha, acredita que hoje existe maior preocupação por parte dos governos em buscar soluções para as disputas. Segundo ele, “O problema dos rios transfronteiriços é discutido regularmente nos fóruns internacionais. Aposto na capacidade dos governos de antecipar os potenciais conflitos.” O Brasil defende uma governança global para a água e a

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UNIDADE 1 | RECURSOS HÍDRICOS

criação de um conselho de desenvolvimento sustentável onde a água seria um dos temas tratados de maneira específica. “A água está sempre vinculada a algum outro setor, como meteorologia, agricultura ou energia. Achamos que ela tem que ter uma casa própria para discutir suas questões”, diz Andreu.

Direito universal

A ONU diz que 800 milhões de pessoas não têm acesso à água potável. Na declaração ministerial realizada no fórum em Marselha, aprovada por unanimidade, os ministros e chefes de delegações de 130 países se comprometeram a acelerar a aplicação do direito universal à água potável e ao saneamento básico, reconhecido pela ONU em 2010.

No Fórum Internacional da Água realizado na Turquia em 2009, esse direito universal ainda era contestado por alguns países. Os números divulgados por ocasião do fórum mundial em Marselha são alarmantes. Segundo estudos de diferentes organizações, 800 milhões de pessoas no mundo não têm acesso à água potável e 2,5 bilhões não têm saneamento básico.

Houve, no entanto, alguns progressos: o objetivo de que 88% da população mundial tenha acesso à água potável em 2015, segundo a chamada meta do milênio, já foi alcançado e mesmo superado em 2010, atingindo 89% dos habitantes do planeta.

Mas Gérard Payen alerta que o avanço nos números globais oculta uma situação ainda preocupante. “Entre 3 e 4 bilhões de pessoas não têm acesso à água de maneira perene e elas utilizam todos os dias uma água de qualidade duvidosa. É mais da metade da população mundial”, afirma Payen.

Ele diz que pelo menos 1 bilhão de pessoas, que têm acesso à água encanada, só dispõem do serviço algumas horas por dia e a água não é potável devido ao mau estado das redes de distribuição.

Segundo Payen, 11% da população mundial ainda compartilha água com animais em leitos de rios. De acordo com a OMS, sete pessoas morrem por minuto no mundo por ingerir água insalubre e mais de 1 bilhão de pessoas ainda defecam ao ar livre.

FONTE: Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/03/120316_agua_escassez_df.shtml>. Acesso em: 5 abr. 2013.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Nesse tópico você viu:

• A distribuição de água no planeta varia espacial e temporalmente e as regiões que possuem excedente hídrico se encontram entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio.

• O Brasil, apesar de toda abundância declarada (cerca de 12% do potencial hídrico do mundo), também apresenta uma distribuição irregular ao longo do seu território, e a maior parte da população se encontra em áreas com o menor potencial hídrico.

• A agricultura é responsável por 70% do consumo de água doce do mundo.

• De acordo com a natureza de utilização, os usos da água podem ser classificados em consuntivos, não consuntivos e local.

• Os usos consuntivos são aqueles em que se retira a água da sua fonte natural, diminuindo suas disponibilidades quantitativas, espacial e temporalmente, já os não consuntivos referem-se aos usos que retornam à fonte de suprimento, praticamente a totalidade da água utilizada. Os locais fazem uso da água sem modificações relevantes, temporais e espaciais e de disponibilidade quantitativa.

FONTE: Adaptado de: <http://www.em.ufop.br/deciv/departamento/~carloseduardo/Aula%2002%20Usos.pdf>. Acesso em: 5 jun. 2013.

• A gestão da água se faz por pessoas e com pessoas, portanto prestar atenção nas nossas ações cotidianas ajuda a minimizar os impactos ambientais.

• A escassez da água acarreta também escassez de alimento, pois, para poupar água, países com déficit hídrico importam grãos.

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1 Como você pôde perceber, vários países possuem volume de água inferior a 1.000 m3/s, o que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), indica uma situação de estresse hídrico. Diante destes fatos, é muito provável que nessas regiões haja conflitos entre os diferentes usuários da água. Escolha um dos países citados em seu Caderno de Estudos e pesquise os principais conflitos ligados à água nesse país. Compartilhe com seus colegas de classe o resultado dessa pesquisa (se desejar pesquise outros conflitos relacionados à água em outras regiões).

AUTOATIVIDADE

2 No seu fichário, inclua dados sobre as vazões e a respectiva distribuição de sua bacia hidrográfica. Essas informações podem ser obtidas com a Secretaria de Recursos Hídricos do seu estado, pois são informações base para o Plano de Recurso Hídrico da sua bacia ou do seu estado.

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UNIDADE 2

GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade, você será capaz de:

• reconhecer a bacia hidrográfica como unidade de planejamento para a gestão ambiental integrada da água;

• conhecer o sistema de gestão para a sustentabilidade da água no Brasil;

• conhecer as principais bacias hidrográficas brasileiras;

• contextualizar o desenvolvimento sustentável como uma proposta para minimizar os impactos ambientais;

• evidenciar a gestão ambiental como ferramenta na implementação do de-senvolvimento sustentável.

Esta unidade está organizada em cinco tópicos e ao final de cada um deles você encontrará atividades visando à compreensão dos conteúdos apresen-tados.

TÓPICO 1 – A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS A PARTIR DA BACIA HIDROGRÁFICA

TÓPICO 2 – PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

TÓPICO 3 – A EMERGÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

TÓPICO 4 – A GESTÃO AMBIENTAL NA IMPLANTAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

TÓPICO 5 – A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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TÓPICO 1

A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS A

PARTIR DA BACIA HIDROGRÁFICA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

A gestão de bacias hidrográficas vem assumindo uma importância cada vez maior no Brasil, à medida que aumentam os efeitos da degradação ambiental sobre a disponibilidade de recursos hídricos e sobre os corpos de água em geral.

Assim, as bacias hidrográficas são vistas como uma unidade estratégica de gestão, já que através delas os recursos hídricos vêm sendo geridos de forma integrada de acordo com a particularidade de cada região em que se localiza cada bacia.

IMPORTANTE

Neste contexto, no espaço geográfico limitado à unidade básica dos estudos ambientais, as bacias hidrográficas, observa-se a interdependência e correlação dos fatores bióticos, abióticos e transformações antropogênicas. As interações dos elementos se organizam na totalidade desta unidade geográfica.

2 BACIAS HIDROGRÁFICAS

A bacia hidrográfica, ou bacia de drenagem, representa uma unidade ideal de planejamento do uso do solo, porém não somente para o planejamento do uso do solo, como também para qualquer tipo de estudo que envolva a dinâmica ambiental de uma região. Para tal faz-se necessário o levantamento de seus componentes bióticos, abióticos, sociais, a dinâmica de suas inter-relações e a dependência entre seus elementos paisagísticos.

Quando pensamos nos principais quesitos da conceituação de uma bacia como unidade de planejamento, não devemos esquecer que seus principais elementos relacionam-se com o tipo de planejamento ambiental que se deseja implementar.

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Devemos considerar a área, a técnica a ser aplicada, os recursos e tempo disponível, a equipe de trabalho e o que almeja a comunidade (esta pode variar de acordo com a abrangência da área de estudo). Contudo, a área deverá ser suficiente para que abranja os elementos físicos, sociais, sua dinâmica e relações.

IMPORTANTE

O planejamento ambiental é visto como uma ferramenta da qual se organiza ações, em um processo de análise, para que se possa escolher a melhor alternativa, e que se obtenha eficiência e eficácia em seu processo de implementação. De acordo com Gomez Orea (1978, p. 24), o planejamento ambiental é “[...] um processo racional para tomada de decisão, o qual implica necessariamente uma reflexão sobre as condições sociais, econômicas e ambientais que orientam qualquer ação e decisão futura”.

Diante da qualidade, disponibilidade e demanda, com o intuito de atender as necessidades humanas e dos ecossistemas, no que se refere à qualidade hídrica, o país vem adotando uma política de gerenciamento para, assim, reformular a utilização dos recursos hídricos disponíveis.

Veremos mais a respeito da política de gerenciamento, assim como o planejamento ambiental dos recursos hídricos, nos tópicos a seguir. Entretanto, a estratégia de elaborar um plano de ação para a proteção dos recursos hídricos provém da crescente preocupação com as alterações que vêm sendo causadas às águas, no que tangencia a escassez de água potável.

Foi com a implantação do Código Florestal, em 1934, que o governo brasileiro legitimou o planejamento ambiental baseado nos recursos hídricos, aprimorando técnicas e gestão estratégica de conservação voltada para a quantidade e qualidade da água e a relação custo/benefício.

Com isso, os conceitos de bacias hidrográficas surgiram a partir de questões na esfera política para atender as reivindicações sociais, e somente a partir da década de 1980 ganharam um caráter técnico.

2.1 A BACIA HIDROGRÁFICA SOB O OLHAR TÉCNICO

Os trabalhos científicos pautados nas redes de drenagem comprovaram que os rios são as unidades naturais básicas que compõem uma bacia hidrográfica, e que esses rios interagem com a atmosfera, numa troca de energia e matéria.

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Assim, “[...] qualquer alteração ocorrida no microclima local causa reações de imediato na morfologia e no fluxo hídrico dos rios” (ZUCCARI, 2005, p. 24), argumento pautado na inter-relação dos fatores físicos e antropogênicos que envolvem a dinâmica da bacia.

Assim, uma bacia hidrográfica é um meio natural espacialmente definido, cujos elementos físicos, biológicos e socioeconômicos mantêm relações dinâmicas entre si. Devido a essa interligação natural, as bacias hidrográficas tornam-se excelentes unidades de planejamento e gerenciamento.

Segundo Barrella et al. (2002, p. 138), a bacia hidrográfica é

[...] um conjunto de terras drenadas por um rio e seus afluentes, formadas nas regiões mais altas do relevo por divisores de água, onde as águas das chuvas ou escoam superficialmente, formando os riachos e os rios, ou infiltram no solo para formação de nascentes e do lençol freático. As águas superficiais escoam para as partes mais baixas do terreno, formando riachos e rios, sendo que as cabeceiras são formadas por riachos que brotam em terrenos íngremes das serras e montanhas e, à medida que as águas dos riachos descem, juntam-se a outros riachos, aumentando o volume e formando os primeiros rios. Esses pequenos rios continuam seus trajetos recebendo água de outros tributários, formando rios maiores até desembocar no oceano.

A bacia de drenagem limita o espaço geográfico estrategicamente, servindo de referência para os estudos ambientais, pois se apresenta como uma unidade de planejamento e gerenciamento que abarca a correlação dos fatores bióticos, abióticos e a intervenção antropogênica, considerando sua dinâmica.

Zona ripária, conhecida popularmente como mata ciliar ou mata de galeria, compreende a vegetação circundante dos cursos d´água. Esta área possui uma funcionalidade ímpar na proteção dos corpos hídricos, servindo como filtro e tampão de nutrientes e agrotóxicos, retenção de sedimentos, corredor ecológico, proteção das margens dos rios para que não ocorra desmoronamento devido à ação da vazão, proteção da fauna local, para minimizar os efeitos das inundações, para evitar o assoreamento.

ATENCAO

2.2 DELIMITANDO UMA BACIA HIDROGRÁFICA

Para melhor entendimento do conceito de bacia hidrográfica, podemos exemplificar utilizando uma meia-água (uma pequena casa), em que a cumeeira é o divisor de águas: o telhado funciona como sistema de captação de água (a bacia propriamente dita) e a calha é o rio. A figura a seguir mostra um telhado de casa como representação didática de uma bacia hidrográfica.

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Podemos entender a bacia hidrográfica como uma área que funciona como se fosse um funil. Toda água que cai com a chuva escorre para um único rio, que, por sua vez, deságua no mar ou lago. Observe:

FIGURA 9 – ESQUEMA DE REPRESENTAÇÃO DE BACIA HIDROGRÁFICA

FONTE: Projeto Piava (2009)

A cumeeira é o divisor de águas O telhado é a bacia

A calha é o rio, abastecido pelo telhado

A próxima figura representa uma bacia hidrográfica com seus principais componentes: o rio principal, seus afluentes, subafluentes, divisores de água e exutório.

A ideia de bacia hidrográfica (Figura 10) está atrelada a seus elementos básicos, como: as nascentes, os divisores de águas, também chamados de divisores topográficos, atributos dos cursos d’água, principais e secundários, denominados afluentes e subafluentes. Todo rio, por menor que seja, está inserido em uma bacia hidrográfica.

FIGURA 10 – DELIMITAÇÃO DA BACIA HIDROGRÁFICA

FONTE: Disponível em: <www.ana.gov.br>. Acesso em: 24 jun. 2013.

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A delimitação das bacias hidrográficas é realizada através das cartas topográficas (figura a seguir). O recorte da bacia é realizado através dos seus pontos mais altos, os chamados divisores topográficos, esses divisores de água que captam as águas pluviais e as desviam para um dos cursos d'água desta bacia.

A seguir, veja uma bacia hidrográfica, delimitada com seus elementos principais: rio principal, afluentes, subafluentes e divisores de água.

FIGURA 11 – BACIA HIDROGRÁFICA DELIMITADA NA CARTA TOPOGRÁFICA

FONTE: Adaptado de: Carta topográfica de Itaipava, IBGE. Representação meramente ilustrativa (2013)

A delimitação de uma bacia está atrelada aos topos (partes mais altas do terreno). Estes topos, por sua vez, são aferidos através de linhas imaginárias, as chamadas curvas de nível, cujos valores de altitude são fornecidos em metros (m), como apresentado na figura a seguir. Unindo os topos dos morros e envolvendo os rios os quais fazem parte da bacia, teremos a delimitação da bacia, como mostra a Figura 13.

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FIGURA 12 – CURVAS DE NÍVEL

FONTE: Os autores

As bacias hidrográficas caracterizam-se pelas suas características fisiográficas, clima, tipo de solo, geologia, geomorfologia, cobertura vegetal, tipo de ocupação, regime pluviométrico, regime fluviométrico e disponibilidade hídrica.

FIGURA 13 – LIMITES DE UMA BACIA HIDROGRÁFICA

FONTE: Os autores

Curva de Nível

Divisor de Águas

Margem Esquerda

111

1

2

2

2

Margem Direita

Sentido do Rio

Exutório

MAR

BACIA

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A nomenclatura de uma bacia hidrográfica é dada pelo principal rio ou curso de água por onde ocorre a descarga da água drenada por esta bacia, desconsiderando o fluxo de água subterrâneo, que pode, até certo ponto, ser independente da bacia, ou bacias, sob a qual ocorre. Por exemplo, a bacia do São Francisco levará o nome do rio principal da sua região, o rio São Francisco.

A bacia hidrográfica pode ter diversas ordens, e dentro de uma bacia podem ser delimitadas bacias menores, chamadas de sub-bacia e microbacia.

É importante salientar que na literatura referente às bacias hidrográficas ocorre uma série de conceitos que são aplicados na conceituação de sub-bacias e microbacias, podendo ser adotados critérios como: hidrológicos, ecológicos e de área.

A discussão que gira em torno destes conceitos (sub-bacia e microbacia) remete à adoção da área de drenagem, por exemplo: para Faustino (1996), as sub-bacias representam somente as áreas de drenagem que envolvem os rios tributários que abastecem o rio principal, adotando como áreas entre 100 km² e 700 km²; Rocha (1991) adota áreas de sub-bacias entre 200 km² e 300 km².

De acordo com Faustino (1996), a área de uma microbacia é inferior a 100 km². Esta, por sua vez, envolve a área de drenagem do curso principal de uma sub-bacia. O autor ressalta ainda que uma sub-bacia envolve inúmeras microbacias.

Porém, ao estudarmos uma microbacia, esta deverá possuir um tamanho suficiente para que sejam analisadas as relações físico-naturais e socioeconômicas, com suas análises de campo aplicadas pela equipe.

As informações das bases cartográficas de uso e cobertura do solo servirão para diagnósticos de bacias hidrográficas. Elas são de suma importância, pois permitem uma visão dos complexos componentes que integram a dinâmica da bacia, como área vegetal, área edificada (urbana), cursos d’água, área agrícola, reflorestamento, pastagens, unidades de conservação, entre outros componentes.

Uma bacia hidrográfica evidencia a hierarquia dos rios, ou seja, a organização natural por ordem de menor volume para os mais caudalosos, que vai das partes mais altas para as mais baixas.

3 HIERARQUIA FLUVIAL

Para Christofoletti (1980), conceituar a hierarquia da rede fluvial consiste em estabelecer padrões para a classificação dos cursos d’água no que concerne ao arranjo da rede de drenagem.

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Inúmeras são as classificações da rede de drenagem, porém o mais usual dos procedimentos adotados segue o modelo proposto por Horton, desenvolvido em 1945 e aprimorado por Strahler em 1952, que permite a identificação do canal principal.

De acordo com Strahler, a identificação se inicia nas nascentes, com os rios de primeira ordem, que são aqueles que não possuem nenhum afluente; a partir da confluência de dois rios de primeira ordem, forma-se um rio de segunda ordem; a confluência de dois rios de segunda ordem forma um rio de terceira ordem, e assim por diante. Quando dois rios de ordens diferentes se encontram, prevalecerá sempre o de maior ordem; contudo, quanto maior a ordem de um rio principal, maior será sua extensão e, consequentemente, maior número de afluentes. Observe na figura a seguir.

FIGURA 14 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA SEGUNDO A CONCEITUAÇÃO DA HIERARQUIA FLUVIAL DE STRAHLER (1952)

FONTE: Os autores

IMPORTANTE

Agora que você já sabe como se delimita uma bacia, falaremos sobre as dimensões, ou seja, as partes que constituem uma bacia hidrográfica.

Uma bacia hidrográfica pode ser analisada por meio de diversos fenômenos, todos associados à gestão de recursos hídricos e que levam à compreensão do sistema bacia hidrográfica.

Uma bacia hidrográfica pode ser observada a partir de três dimensões, sendo caracterizada primeiramente através de: a) sistema natural: a área de drenagem da bacia, com todos os seus atributos naturais (solo, clima, relevo...); b) a dimensão biogeofísica: sobre ela ocorre a ocupação humana e o desenvolvimento econômico, gerando a dimensão socioeconômica, responsável por uma gama de

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problemas ambientais decorrentes do uso dos recursos; c) instituições políticas: devido aos impactos e visando à regulamentação dos usos, a sociedade cria políticas e instituições diversas para gerir os recursos naturais, inclusive a água, que pode apresentar um recorte espacial ainda diferente das duas primeiras.

3.1 A INFLUÊNCIA DOS FATORES FÍSICOS NA FORMAÇÃO DA REDE DE DRENAGEM

A rede de drenagem se constitui a partir da formação de canais naturais ou não, que segue o fluxo do escoamento das águas superficiais, com uma das funcionalidades de modelagem do relevo.

A importância dos estudos hidrológicos consiste em reconhecer, localizar e quantificar o fluxo de água nas vertentes, de onde se podem delimitar os gradientes topográficos.

Para estudo dos processos hidrológicos se faz necessária a interação de fatores físicos, biológicos e antropogênicos que compõem a bacia hidrográfica, como já visto, considerando que alterações na composição desses fatores podem ocasionar modificações significativas na dinâmica espaço-temporal.

Portanto, ao analisarmos uma bacia de drenagem, alguns aspectos deverão ser considerados, como: a rede de drenagem, o clima, a geologia, o relevo, solo, cobertura vegetal, uso e cobertura do solo, entre outros.

De acordo com Guerra e Cunha (2001), os fatores do meio físico, como rede de drenagem, clima, geologia, solos, relevo, cobertura vegetal e o tipo de mapeamento são características de suma importância para análise desses fatores, tornando-se imprescindíveis ao planejamento ambiental, pois, para o levantamento das reais potencialidades e limitações do uso e ocupação de uma determinada área, faz-se necessário conhecer seus atributos abióticos.

Rede de drenagem: características: nascentes, padrão, densidade, velocidade, turbidez, qualidade da água são levantamentos que permitem avaliar desde a disponibilidade de recursos hídricos para irrigação até o estado de degradação de terras adjacentes, em função da carga de sedimentos transportados e/ou assoreados para o leito do rio.

O arranjo da rede de drenagem é reflexo de um conjunto de variáveis físicas como: clima, relevo, solo, substrato rochoso e vegetação. Indicadores hidrológicos: precipitação mensal ou sazonal, escoamento, característica do leito do rio.

Clima: a precipitação é um dos fatores principais do clima em uma bacia; a quantidade (volume), seus regimes sazonais ou diários (distribuição temporal) e intensidades (volume/duração), a temperatura média, entre outros fatores,

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podem caracterizar o período de maior potencialidade erosiva das chuvas, riscos de estiagem, geadas etc. e, ainda, o balanço hídrico, tornando-se possível conhecer as perdas de água no solo por evapotranspiração e também períodos de excedente ou deficiência hídrica.

Um importante recurso é a instalação de um pluviômetro (figura a seguir) na bacia. Na sua ausência, utilizam-se os dados do pluviômetro mais próximo ou ainda de cidades com características similares às da área que está sendo analisada.

São indicadores climáticos: radiação solar, temperatura, vento, umidade, precipitação e evapotranspiração.

FIGURA 15 – PLUVIÔMETRO, MEDIDOR DE VOLUME DE CHUVA

FONTE: Disponível em: http://www.ocean-net.info/instrumentacion/deltaohm/Pluviometros.htm>. Acesso em: 22 mar. 2013.

Geologia: o estudo da geologia local permite a reconstrução histórica da evolução da paisagem e do seu comportamento atual, podendo ser identificadas áreas de risco e movimentação de massa que têm como possíveis fatores condicionantes as propriedades mineralógicas e texturas das rochas, existência de fraturas, planos de esfoliação e diáclases e, ainda, posição estratigráfica.

São indicadores geológicos: substrato geológico (tipo de estratificação da rocha), sismicidade.

Solos: substrato derivado de sedimentos que varia de acordo com o tipo de rocha. É um material dinâmico erodido, transportado e depositado. Os solos determinam o nível de escoamento da precipitação.

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São indicadores de solo: tipos (classificação pedológica), erodibilidade, compatibilidade, permeabilidade e pH.

Relevo: influencia diretamente na velocidade dos fluxos de água que, por sua vez, podem conduzir à atuação de processos erosivos. A forma do relevo apresenta condições hidrológicas específicas, como afloramento rochoso, depósito de taludes, rampa de colúvio, terraços, planície de inundação e cicatrizes de feições erosivas e movimento de massas.

Cobertura vegetal: uma de suas principais funções é interceptar parte da precipitação através do armazenamento de água; ainda oferece proteção contra o impacto das gotas de chuva (splash); diminui a velocidade de escoamento superficial (runoff); através do aumento da rugosidade do terreno e da estrutura que compõem o solo, oferecerá maior resistência aos agentes erosivos.

IMPORTANTE

Como podemos perceber, a bacia hidrográfica é uma região que envolve diferentes aspectos (naturais, econômicos, sociais) e tem sido utilizada como unidade de planejamento para se tratar da gestão da água.

Ver a bacia hidrográfica desta forma é considerar o ambiente como um todo e caminhar em direção da gestão dos recursos hídricos de forma integrada, conforme propõe a Política Nacional de Recursos Hídricos.

Adotar a bacia hidrográfica como unidade para planejamento e gerenciamento ambiental possibilita o entendimento da dinâmica entre os diversos elementos que a compõem, entre eles: as diversidades sociais, econômicas e culturais das regiões, associadas aos fenômenos físicos e biológicos. Significa gerir um espaço que vai ao encontro da gestão dos recursos hídricos através da participação da sociedade e do poder público, defendendo a água como um recurso natural, público, limitado e dotado de valor econômico, como preconiza a Agenda 21 brasileira.

Esta opção se mostra muito acertada, pois é no âmbito da bacia hidrográfica que ocorrem os principais fatores capazes de mudar a quantidade e a qualidade da água disponível para uso múltiplo, tais como:

• erosão e assoreamento;

• mudanças das características de permeabilidade do solo, provocadas pelo desmatamento e pela agricultura;

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• a poluição de qualquer ponto de um curso d'água da bacia acarreta consequências em todas as áreas à jusante;

• a poluição do subsolo em aquífero livre, ação da água superficial da bacia, desde que este aquífero livre não seja extenso.

3.2 O GERENCIAMENTO DE BACIA HIDROGRÁFICA

O gerenciamento de bacia hidrográfica é o instrumento orientador das ações do poder público e da sociedade no controle do uso dos recursos ambientais (naturais, econômicos e socioculturais) na área de abrangência de uma bacia hidrográfica, com vistas ao desenvolvimento sustentável.

Para Tucci e Mendes (2006), o gerenciamento ambiental pode ser identificado através de três dimensões:

1) o gerenciamento do uso dos recursos naturais;

2) o gerenciamento da oferta dos recursos ambientais;

3) a conservação dos recursos naturais.

A compatibilização dos dois gerenciamentos acima ocorre no contexto político, legal e administrativo, ou seja, pode ser chamada de gerenciamento interinstitucional.

A conservação dos recursos naturais, conforme lembram Tucci e Mendes (2006), é, por característica, um campo de ação interdisciplinar. O planejador necessita reunir os processos das diferentes fases de forma sucinta e clara, para que sejam tomadas as decisões que melhor atendam a sociedade e a proteção dos recursos naturais.

Devido ao grande número de alternativas que existem no planejamento dos recursos hídricos, já que se devem considerar seus usos, disponibilidade e conservação, é necessário utilizar metodologias que melhor quantifiquem os processos, permitindo analisar alternativas que auxiliem no processo de decisão.

Alguns modelos a ser utilizados no gerenciamento podem ser vistos no quadro a seguir.

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QUADRO 7 – EXEMPLOS DE MODELOS DE GERENCIAMENTO

DESENVOLVIMENTO POTENCIAIS AÇÕES

POTENCIAIS IMPACTOS

INDICADORESQUANTITATIVOS

POTENCIAISMEDIDAS

1. Urbano

Ocupações residenciais, comerciais, industriais; infraestrutura urbana; serviços clínicos, hospitais

Efluentes de esgoto; erosão do solo e área degradada; inundação

Coliformes fecais; frequência e locais de inundação

Gestão integrada com: desenvolvimento sustentável do espaço urbano; tratamento de efluentes; controle das inundações

2. Rural

Plantio de subsistência; uso de pesticida; irrigação; agropecuária

Erosão e perda do solo fértil; qualidade da água dos rios; barragens de contenção e conflitos pelo uso da água

Produção de sedimentos e áreas degradadas; demanda versus disponibilidade no período seco

Manejo do solo; preservação dos leitos e área de risco; racionalização do uso da água por meio de práticas sustentáveis

3. Produção de energia Barragem; operação da usina

Alteração dos níveis e vazões à montante e à jusante; conflito com a gestão das inundações

Vazões de cheia à montante e à jusante; flutuação das vazões durante operação diária e semanal

Sistemas de efluentes para limpeza de sedimentos; sistemas de volume de espera para gestão de inundações

FONTE: Tucci e Mendes (2006)

Deste modo, o gerenciamento de uma bacia hidrográfica envolve os diferentes cenários relacionados aos componentes que envolvem os recursos hídricos. Na gestão de uma bacia hidrográfica, os principais componentes envolvidos se referem aos usos dos recursos hídricos, seus impactos e o controle de inundação.

4 A GESTÃO INTEGRADA DE BACIA HIDROGRÁFICA

A gestão integrada da água pode ser definida por pelo menos quatro formas distintas de integração, que são:

a integração dos diferentes componentes da água ou das diferentes fases do ciclo hidrológico;

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a integração da gestão da água e da gestão da terra e outros recursos naturais e ecossistemas relacionados;

a integração dos interesses dos diversos usos e usuários da água, com o objetivo de reduzir os conflitos entre os que competem por este escasso recurso, tanto em quantidade como em qualidade e tempo de ocorrência;

a integração da gestão da água com o desenvolvimento econômico, social e ambiental.

Com relação às diferentes possibilidades de gestão em uma bacia hidrográfica e em diferentes estágios de implementação, Dourojeanni, Jouravlev e Chávez (2002) apresentam o seguinte quadro:

IMPORTANTE

Considerando a interdependência dos aspectos bióticos, abióticos, antrópicos que constituem os recursos hídricos, é notável que estes necessitem ser geridos a partir de uma gestão ambiental que possibilite maior interação entre esses diferentes aspectos, que é possível a partir da gestão integrada da água.

QUADRO 8 – CLASSIFICAÇÃO DE AÇÕES DE GESTÃO EM BACIAS HIDROGRÁFICAS

Etapas de gestão

Objetivos da gestão em baciasAproveitar e manejar de forma integrada

Aproveitar e manejar todos os recursos naturais

Aproveitar e manejar só a água

Multissetorialmente Setorialmente

(a) (b) (c) (d)(1)

Prévia Estudos, planos e projetos

(2) Intermediária (investimentos)

(desenvolvimento integrado de bacias ou desenvolvimento regional)

(desenvolvimento ou aproveitamento de recursos naturais)

(desenvolvimento ou aproveitamento de recursos hídricos)

(água potável e esgoto, irrigação e drenagem, hidroenergia)

(3)Permanente (operação e

manutenção, manejo e

conservação)

(gestão ambiental)(gestão ou manejo de recursos naturais)

(gestão ou administração da água)

(gestão da água potável, irrigação e drenagem)

FONTE: Dourojeanni; Jouravlev; Chávez (2002)

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Em suma:

a etapa prévia (1) envolve estudos e formulação de planos e projetos;

a etapa intermediária (2) envolve investimentos para a habilitação da bacia com fins de aproveitamento dos recursos naturais. Esta etapa se associa com o termo desenvolvimento;

a etapa permanente (3) é a etapa de operação e manutenção das obras construídas, gestão e conservação dos recursos naturais. Esta etapa se associa com o termo gestão.

A ideia proposta por Dourojeanni, Jouravlev e Chávez (2002) permite uma análise da realidade de uma bacia hidrográfica do ponto de vista da dinâmica da gestão.

Contudo, os principais componentes que permitem avaliar o desenvolvimento sustentável em recursos hídricos dependem de uma visão integrada de: ambientes ou bioma, sistemas hídricos, disciplinas do conhecimento.

Estes componentes são reunidos na gestão de recursos hídricos. Por exemplo, os principais ambientes brasileiros que apresentam características distintas são: Amazônia; Pantanal; Semiárido; Cerrado; Costeiro e Sul/Sudeste.

1. O componente socioeconômico envolve: desenvolvimento urbano e rural, com energia, transporte, produção agrícola, conservação e impacto ambiental, efeitos dos eventos extremos de estiagem.

2. Os sistemas hídricos são águas atmosféricas, bacia hidrográfica, rios, lagos, reservatórios, aquíferos, e as disciplinas do conhecimento como: hidrologia, hidráulica, qualidade da água, economia, sedimentologia, meteorologia, entre outras.

3. Enquanto unidade espacial de gestão, calcada na questão dos recursos hídricos em um contexto amplo de planejamento ambiental, uma bacia hidrográfica deve ser estudada através de uma metodologia sistêmica e holística, baseada na interdisciplinaridade, e que permita a investigação de suas paisagens, identificando os impactos ambientais resultantes das ações socioespaciais.

A gestão ambiental deve voltar-se para o território, a bacia hidrográfica, o espaço de convivência, o lugar onde as pessoas moram, promovendo o conhecimento dessas áreas, suas riquezas e carências, suas demandas e equilíbrio, promovendo o encontro e negociação entre os diferentes atores sociais, perguntando aos cidadãos: o que é que o senhor deseja? Que desenvolvimento e meio ambiente prefere para trabalhar e viver? Para seus filhos e netos? Que água? Que ar? Que áreas verdes? Que lazer?

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Assim, é necessário construir uma cidadania local, construir pontes para o enfrentamento dos problemas do dia a dia e o enfrentamento das ameaças globais, influenciar nas prefeituras ou nos fóruns de negociações.

5 GESTÃO CONSERVACIONISTA DE BACIA HIDROGRÁFICA: ADOÇÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO PARA PROTEÇÃO DOS MANANCIAIS

Exemplo de uma das inúmeras ações implantadas para a conservação dos mananciais e preservação das nascentes é a implantação das unidades de conservação nas bacias hidrográficas.

Entre a comunidade científica é unânime afirmar que a melhor forma de preservação e/ou conservação dos recursos hídricos é manter a mata nativa ao longo dos cursos d´água e nascentes, pois ela desempenha um papel fundamental para proteção hídrica, ameniza o impacto da lixiviação e do escoamento superficial, mantém o equilíbrio entre vegetação, solo e água, pois evita o desmoronamento e, para a fauna, serve como habitat e corredor ecológico, entre inúmeras outras serventias.

Contudo, a fim de somar valores na contribuição de um ambiente ecologicamente equilibrado, são adotadas, no país, as unidades de conservação, com o objetivo de garantia da manutenção e qualidade dos recursos hídricos.

As unidades de conservação (UCs), como preconiza sua legislação, Lei nº 9.985/2000, do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), num primeiro momento não foram criadas para a proteção dos corpos hídricos e, sim, visando à proteção da diversidade biológica, porém, em estudos realizados, as unidades de conservação se apresentam como medida eficaz na proteção hidrológica, em especial de nascentes.

Unidades de Conservação são porções do território nacional, incluindo as águas territoriais, com características naturais de relevante valor, de domínio público ou propriedade privada, legalmente instituídas pelo poder público, com objetivos e limites definidos, sob regimes especiais de administração, às quais aplicam-se garantias especiais de proteção. (BRASIL, 2000).

Em suma, as UCs são compostas por um espaço territorial delimitado, nacional, incluindo as águas territoriais, que engloba os recursos naturais, instituído pelo poder público e que possui regimes especiais administrativos (plano de manejo), cujo principal objetivo é a conservação da diversidade biológica.

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As UCs estão divididas em dois grupos: Unidades de Proteção Integral, possuindo objetivo de preservação da natureza, e o uso de seus recursos é permitido apenas na forma indireta para fins de estudos científicos; e as Unidades de Uso Sustentável, cujo objetivo é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais.

IMPORTANTE

Observe a diferença entre conservação e preservação. A primeira refere-se ao uso de forma sustentável, enquanto a preservação refere-se a manter o recurso na forma intacta, sem intervenção antropogênica.

As ações dentro das UCs serão coordenadas de acordo com o objetivo da implantação de cada categoria, no que se refere à proteção dos recursos hídricos. Podem representar as esferas federal, estadual ou municipal, respectivamente, de acordo com a delimitação da bacia hidrográfica se localizar em dois ou mais estados (federal), dois ou mais municípios (estadual) e municipal que, no caso, são implementadas para proteção de um curso d’água importante para o abastecimento público local, conforme quadro a seguir (MEURER, 2011).

QUADRO 9 – CATEGORIAS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Unidades de Proteção Integral Unidades de Uso SustentávelEstação Ecológica Área de Proteção Ambiental Parque Nacional Área de Relevante Interesse EcológicoReserva Biológica Floresta NacionalMonumento Natural Reserva de FaunaRefúgio de Vida Silvestre Reserva Extrativista

Reserva de Desenvolvimento SustentávelReserva Particular do Patrimônio Natural

FONTE: Adaptado de: Brasil (2000), Meurer (2011)

O estado de São Paulo é um dos pioneiros na adoção de grandes áreas para proteção e recuperação da qualidade ambiental dos cursos d’água para abastecimento público, a exemplo, a criação das Áreas de Proteção e Recuperação de Mananciais – APRMs – criadas através da lei estadual nº 9.866/97.

Outra forma de compensar a utilização dos recursos hídricos é pelos órgãos e empresas, públicas ou privadas, que são responsáveis pelo fornecimento de água ou que façam uso de recursos hídricos. A instituição deverá adotar uma UC (Mapa a seguir) e contribuir financeiramente para a proteção e implementação da unidade de conservação.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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FIGURA 16 – MAPA TEMÁTICO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO EM BACIA HIDROGRÁFICA

FONTE: Meurer (2011)

6 O SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA (SIG) COMO FERRAMENTA NA ANÁLISE DE BACIAS HIDROGRÁFICAS

O mapa temático representando as unidades de conservação na bacia hidrográfica em destaque na figura anterior é um exemplo de como a aplicação do Sistema de Informação Geográfica (SIG) pode representar graficamente nos estudos das paisagens nas bacias hidrográficas e assim ajudar a tomada de decisão dos estudos ambientais.

Para melhor compreendermos as novas tecnologias, façamos um apanhado em sua trajetória: da gênese da cartografia antiga aos precursores de técnicas modernas de mapeamento, ao longo da trajetória dessa ciência, a humanidade vem desenvolvendo técnicas que estão sendo aprimoradas para a construção, exploração e modificação do meio de acordo com suas necessidades.

Portanto, ao construir, utilizar e aprimorar técnicas cartográficas, quanto mais a sociedade amplia seu domínio técnico, mais complexa será sua organização socioespacial. Assim, ao reproduzir sua vida material, qualquer sociedade, da mais simples à mais complexa, estará inserida e dominando o espaço geográfico.

As técnicas de representação cartográfica vêm se modernizando para atender às demandas sociais, onde novas técnicas geográficas estão sendo implantadas para representar graficamente soluções no posicionamento da

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TÓPICO 1 | A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS A PARTIR DA BACIA HIDROGRÁFICA

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superfície terrestre, servindo como instrumento de análise em diversas áreas, como, por exemplo: nas áreas ambiental, espacial, da saúde, segurança, transporte, entre outras.

As técnicas primordiais dos mapas vêm sendo desenvolvidas e, com isso, as tecnologias computacionais, que servem de base para análise geoespacial com a finalidade de facilitar e identificar elementos e fenômenos ocorridos em uma determinada posição na superfície terrestre.

Neste sentido, a aplicação do Sistema de Informação Geográfica (SIG) constitui um sistema eficaz para análise espacial de elementos geográficos, por apresentar alta capacidade de relacionar e armazenar informações espaciais com elementos gráficos, conforme Rocha (2002):

Características de um Sistema de Informação Geográfica:

• 1º capacidade de coletar e armazenar dados espaciais, obtidos a partir de fontes como: GPS, mapas, fotogrametria, sensoriamento remoto etc.;

• 2º capacidade de armazenar, recuperar, atualizar e corrigir os dados processados de forma eficiente;

• 3º capacidade de permitir manipulação e realização de análise dos dados armazenados para execução de tarefas, como: alterar a forma dos dados, produzir estimativas de parâmetros, gerar informações rápidas a partir da entrada de dados e suas inter-relações;

• 4º capacidade de gerar saídas de formatos gráficos e tabulares.

A aplicação do Sistema de Informação Geográfica (SIG) se faz de suma importância para os estudos dos elementos da paisagem e recursos ambientais que estão inseridos na bacia hidrográfica e seu devido monitoramento.

7 RECONHECENDO OS ELEMENTOS DE UMA PAISAGEM NAS BACIAS HIDROGRÁFICAS

O geógrafo von Humboldt iniciou a análise da paisagem nos estudos geográficos e Troll a relacionou aos ecossistemas, classificando a paisagem como o resultado da fusão cultural, portanto antrópica, com as relações dinâmicas e instáveis dos fatores físicos e biológicos num arcabouço indissociável em contínua transformação.

A paisagem se forma a partir de três elementos básicos, conforme a figura a seguir: matriz, manchas e corredores. Matriz é o elemento que predomina em uma paisagem, após delimitar uma escala de trabalho da paisagem que será analisada, a exemplo de uma bacia hidrográfica; manchas são fragmentos que podem ser remanescentes florestais; corredores conectam as manchas (MARENZI, 2005).

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FIGURA 17 – ESTRUTURA DE UMA PAISAGEM GEOGRÁFICA

FONTE: Adaptado de: Marenzi (2005)

Os principais elementos considerados na análise de uso e cobertura do solo a serem mapeados dependerão do objetivo do trabalho que o usuário pretende desenvolver. A seguir veremos um exemplo para implantação de Unidade de Conservação: as classes de floresta; estágio inicial; estágio médio avançado; vegetação exótica (Pinus e/ou Eucalyptus); urbanização (edificação); cultura; água; pastagem.

• floresta: representa toda formação vegetal original, ou seja, aquela que conserva o conjunto de características ambientais típicas do seu clímax;

• estágio inicial: vegetação herbácea;

• estágio médio avançado: representa estágios evoluídos de desenvolvimento vegetal, também referenciados como capoeirões;

• vegetação exótica: os reflorestamentos com Eucalyptus e/ou Pinus;

• urbanização: são áreas edificadas consolidadas, típicas de aglomerados urbanos;

• culturas: representam cultivos agrícolas, como: hortaliças, cebola, maracujá, morango etc., plantações típicas de cada região;

• água: representa a drenagem, ou seja, os rios da bacia;

• pastagem: são áreas ocupadas por vegetação herbácea de formação antropogênica com finalidade, em geral, pecuarista.

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TÓPICO 1 | A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS A PARTIR DA BACIA HIDROGRÁFICA

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FIGURA 18 – MAPA TEMÁTICO DE USO E COBERTURA DO SOLO EM BACIA HIDROGRÁFICA

FONTE: Meurer (2011)

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LEITURA COMPLEMENTAR

GOVERNANÇA DA ÁGUA E TECNOLOGIAS DE MAPEAMENTO PARA A CONSTRUÇÃO DE CENÁRIOS AMBIENTAIS EM BACIA

HIDROGRÁFICA

Nos anos 80 era senso comum as pessoas acreditarem que o mundo acabaria na entrada do novo milênio ou, caso contrário, fantasiava-se como seria a vida nessa época. Teríamos robôs para os serviços domésticos, como nos desenhos animados da “Família Jetson”, o homem já teria pisado em Marte e os carros seriam voadores, os prédios... Sim, só haveria prédios e eles teriam um design arrojado, teríamos alimentos para todos, pois estes seriam em pílulas... E a água... Bem, a água jamais acabaria, afinal, seu ciclo é infinito.

Os anos passaram e o mundo não acabou com a entrada do terceiro milênio, os carros continuam percorrendo nossas mal conservadas estradas e as empregadas domésticas estão cada vez mais escassas, mas ainda não são robôs. Alguns prédios possuem arquitetura arrojada, mas os alimentos ainda precisam ser plantados, colhidos, embalados, cozidos e, infelizmente, grande parte da população do planeta não possui acesso a eles. E a água? A água está cada vez mais escassa e poluída, a água está acabando...

O mundo está passando por uma crise que impulsiona o planeta para uma mudança radical de atitudes, conceitos, paradigmas e valores, e essa mudança já pode ser observada no nosso cotidiano. Estamos no meio de uma transição, denominada por Capra (2005) de mutação civilizatória, a qual terminará por definir o nosso futuro e o futuro das próximas gerações de seres vivos do planeta Terra.

Poderíamos falar em crise ambiental como responsável pela mutação civilizatória, mas esse termo certamente seria parcial, uma vez que o processo em crise é um complexo de fatores que estão inter-relacionados e são interdependentes. Dessa forma, a crise é ambiental, mas também é econômica, social, política, espiritual, ética, moral etc., e esses aspectos, como já dito, formam um emaranhado de relações que permeiam a vida no planeta.

Os três indicadores da mutação civilizatória apontados por Capra (2005) são três quebras e substituições de paradigmas fortemente enraizados na essência da humanidade. O primeiro existe há pelo menos 3.000 anos, considerando apenas o período de tempo no qual há a existência de uma documentação histórica incontestável: o domínio do patriarcado nas civilizações. O segundo, alicerce e sustentáculo de grande parte da economia mundial, existe há aproximadamente 300 anos: a utilização do combustível fóssil como principal fonte de energia do planeta. Finalmente, o terceiro, marco da revolução científica e base da ciência moderna, surgiu no século XIX através das concepções científicas de Descartes e Newton: a visão cartesiana do mundo.

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TÓPICO 1 | A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS A PARTIR DA BACIA HIDROGRÁFICA

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Uma verificação cotidiana da mutação civilizatória é o despertar da consciência ambiental, acompanhado de pesquisas que apontam para a finitude dos recursos naturais do planeta e para o colapso da população humana caso medidas drásticas não sejam tomadas na próxima década. Nenhuma tecnologia ainda á capaz de refazer a camada de ozônio, de produzir água ou restituir a biodiversidade de ecossistemas perdidos, porém a tecnologia pode ser utilizada para que um maior número de pessoas tenha acesso à informação e possa atuar de forma ativa nas decisões a ser tomadas para o futuro.

Nos últimos 20 anos a população do planeta aumentou em 2.072.841.041 bilhões de habitantes, passando de 4.452.645.562 de pessoas para 6.525.486.603 bilhões, e as previsões são de que em 2025 teremos quase 8 bilhões; em 2050, 9 bilhões, dos quais 4 bilhões viverão em países com escassez crônica de água.

Verifica-se que o planeta caminha para a estabilidade populacional, prevista para 2100, onde se estimam 10 bilhões de habitantes. Essa tendência é verificada após o ano de 2050 devido à queda das taxas mundiais de crescimento e de fecundidade. A estabilidade no múmero de pessoas aumenta a importância dos investimentos em pesquisas voltadas para o Desenvolvimento Sustentável (DS) das nações, pois dessa forma pode-se prever a quantidade necessária de recursos e gerar cenários que nos apontem para a melhor forma de viabilizá-los para o futuro, considerando o consumo atual de forma equilibrada e equitiva para todos.

O termo “Desenvolvimento Sustentável” é utilizado atualmente de forma vazia e inexpressiva. De modo geral, há uma vaga ideia sobre o seu significado, que muitas vezes é associado à reciclagem do lixo e atitudes pontuais por parte de organizações não governamentais ou, ainda, a atitudes de cunho publicitário por parte de algumas empresas privadas.

Para que o conceito de DS pudesse ser utilizado de forma apropriada seria necessário acoplar a ele a complexidade que existe entre o desenvolvimento e a sustentabilidade; o ambiente e a exploração dos recursos naturais; a estrutura social e a degradação ambiental; a distribuição de renda e a economia mundial etc. São inúmeras as dimensões que envolvem o Desenvolvimento Sustentável, porém temos a ideia de que esse termo só se aplica a duas dimensões: a ambiental e a econômica. Essa simplificação reduz nossa visão e prejudica a prática da sustentabilidade, a qual, muitas vezes, utiliza o conceito como rótulo de atividades que na verdade são insustentáveis.

Dessa forma, entre os maiores problemas desse século, vários serão causados pela falta de sustentabilidade dos sistemas, como a escassez de água, as guerras, as doenças e a fome. Os dados apresentados por Clarke e King (2005), no mínimo alarmantes, mostram que atualmente 2,3 bilhões de pessoas sofrem de doenças disseminadas pela água, 2 bilhões não possuem acesso ao saneamento básico e isso causa a morte de 200 pessoas por hora, a cada 3,6 segundos uma pessoa morre de fome no mundo, as guerras desse século serão pela água e os conflitos giram, na sua maioria, em torno da escassez.

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A crise ambiental atingirá a todos, países de primeiro ou de terceiro mundo, pessoas ricas ou pobres, com ou sem acesso à informação. Todos necessitam de carbono e oxigênio, seja na forma combinada da molécula de água ou através das substâncias alotrópicas de oxigênio e ozônio. O primeiro forma o ar que respiramos e o segundo a camada que protege nosso planeta dos raios nocivos do Sol e do excesso de aquecimento.

Com o quadro atual de degradação da biodiversidade, miséria, aumento da população mundial, poluição, disseminação de doenças, escassez de água, falta de alimentos, aquecimento global e tantos problemas contemporâneos, surge a necessidade da mudança urgente de atitudes e paradigmas, que possuam repercussão não apenas no meio científico e político do país, mas também, e principalmente, nas comunidades locais.

Um dos pensamentos utilizados como base para a sustentabilidade é o da compreensão global e atuação local, pois compreender os processos e os eventos que ocorrem na biosfera é importante, mas atuar na comunidade é decisivo. Nos últimos anos, termos como governança, participação, descentralização e empoderamento local têm sido debatidos e inseridos em trabalhos de pesquisas, principalmente por perceber que a força da comunidade no processo de gestão ambiental é muito grande e pode tanto auxiliá-lo como dificultá-lo, dependendo da forma como a comunidade local atua e encara o desafio. Geralmente, as decisões tomadas em gabinetes, por uma minoria de políticos e/ou cientistas e impostas para uma maioria, parecem não mais ser respeitadas, como ocorria em décadas anteriores.

Para a existência da sustentabilidade é necessário que haja equilíbrio entre os diversos fatores que integram o ambiente. A desigualdade social, a degradação ambiental, a perda de espécies e ecossistemas, a concentração de recursos naturais em determinadas regiões geográficas do planeta e sua escassez em outras são exemplos de desequilíbrios que necessitam de instrumentos de gestão para auxiliar sua compreensão e o processo necessário para mitigar os efeitos produzidos por esses problemas.

Como a diversidade de fatores é imensa e resulta de características intrínsecas de cada localidade, é cada vez mais intensa a realização de trabalhos que apontam estratégias, ações e resultados positivos no envolvimento das comunidades para resolver os problemas locais e auxiliar nos processos de gestão dos recursos naturais. Exemplos de participação da sociedade podem ser encontrados em nível internacional.

As políticas também seguem o mesmo raciocínio e possibilitam a participação das pessoas nos processos de decisão, como pode ser observado nas Leis nos 9.433/97 (Política Nacional de Recursos Hídricos), 10.257/01 (Estatuto das Cidades) e 9.795/99 (Política Nacional de Educação Ambiental), por exemplo.

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Esta nova perspectiva de cidadania contrapõe o poder de governança local com o de governo, no qual o primeiro trata da capacidade efetiva de atuação da comunidade nos processos de gestão e, no segundo, apenas os representantes legais participam.

No Brasil, com a institucionalização da participação através dos Comitês de Bacias, iniciou-se uma nova era na gestão, na qual a comunidade decide quais políticas deverão ser adotadas para cada bacia hidrográfica, decisões estas que respeitam, ou deveriam respeitar, as particularidades, a realidade local e as decisões comunitárias.

Tais trabalhos apontam para um cenário que, embora seja positivo, no sentido de políticas que incentivam a participação das comunidades locais e do crescente aumento da atuação da comunidade por parte dos cidadãos, ainda não é representativo de um processo efetivo e não está evoluindo com toda a sua potencialidade no nosso país.

Na questão técnica, temos muitas tecnologias e metodologias desenvolvidas, como as de sensoriamento remoto e geoprocessamento, com imagens de alta resolução e aplicativos livres, que, embora também sejam um fator positivo, ainda não estão auxiliando efetivamente nos processos de gestão.

Entre a legislação e o incentivo para a participação, a vontade e a disponibilidade das pessoas e os mapas e dados gerados em laboratórios, existe um grande vazio, uma grande falha na comunicação, na apresentação desses dados e, principalmente, na utilização dos mesmos. De modo geral, os resultados obtidos com as tecnologias citadas estão colocados de forma extremamente técnica, distanciando-se do agricultor, do pescador, dos professores da educação básica e Ensino Médio, das mulheres envolvidas com as associações de bairro, de toda a comunidade em geral.

Este é o grande desafio da gestão de recursos hídricos, auxiliar as comunidades de bacias para que estas possam atuar na resolução de seus problemas, buscar as soluções que forem melhores “para todos” e exercer plenamente sua cidadania. Essas comunidades precisam aumentar sua capacidade de governança, a qual só é possível mediante o conhecimento e a capacitação.

Algumas metodologias têm sido utilizadas para capacitar as pessoas e fornecer ferramentas de empoderamento que possibilitem o aumento da governança local. Entre elas encontramos metodologias de participação da sociedade para a utilização de Sistemas de Informações Geográficas, construção de cenários ambientais e produção de mapas gerados a partir de dados de sensoriamento remoto e a utilização de todas essas ferramentas e produtos na gestão local e governança da água.

Essas metodologias, abordadas de forma construtivista e pedagógica, permitem ao indivíduo não só o conhecimento da técnica em si, mas também o

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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conhecimento espacial da sua realidade, a compreensão da paisagem na qual está inserido, a importância do seu papel como gestor do seu entorno e a oportunidade de participar na solução de problemas locais e manejo da paisagem.

Neste contexto, verifica-se que os cenários ambientais podem ser construídos através de diversos métodos, porém o objetivo desse produto é a espacialização da realidade em tempo presente e passado, possibilitando a comparação da mudança da paisagem e também a projeção de cenários futuros, os quais podem ser controlados através da inserção de perspectivas otimistas ou não.

Além do produto em si, percebe-se que o processo de construção é capaz de empoderar a comunidade com conhecimentos e informações que aumentam a governança local e agregam efetividade à gestão de bacias.

FONTE: SANTOS, J. S. M. Governança da água e tecnologias de sensoriamento remoto e geoprocessamento para a construção de cenários ambientais na bacia hidrográfica do Rio Tijucas, Santa Catarina, Brasil. 2009. 235f. Tese (Doutorado em Engenharia Ambiental) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2009.

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RESUMO DO TÓPICO 1

Nesse tópico você viu:

• Uma bacia hidrográfica é um meio natural espacialmente definido, cujos elementos físicos, biológicos e socioeconômicos mantêm relações dinâmicas entre si. Devido a essa interligação natural, as bacias hidrográficas tornam-se excelentes unidades de planejamento e gerenciamento.

• O gerenciamento de bacia hidrográfica é o instrumento orientador das ações do poder público e da sociedade no controle do uso dos recursos ambientais (naturais, econômicos e socioculturais pelo ser humano) na área de abrangência de uma bacia hidrográfica, com vistas ao desenvolvimento sustentável.

• A bacia hidrográfica deve ser gerida a partir de uma metodologia sistêmica, baseada na interdisciplinaridade, e que permita a interação entre seus diferentes aspectos (bióticos, abióticos, antrópicos) que constituem os recursos hídricos, a partir da gestão integrada.

• Uma das formas de assegurar a conservação dos recursos hídricos é implementar as unidades de conservação em bacias hidrográficas.

• O Sistema de Informação Geográfica (SIG) é uma poderosa ferramenta para gerenciar e monitorar os recursos ambientais presentes em uma bacia hidrográfica.

• A estrutura de uma paisagem geográfica envolve: matriz, mancha e corredores.

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AUTOATIVIDADE

De acordo com o que você viu neste tópico, responda às seguintes questões:

1 O que é uma bacia hidrográfica?

2 Por que a bacia hidrográfica é vista como uma unidade de planejamento e gestão da água?

3 Para Dourojeanni, Jouravlev e Chávez (2002), a gestão integrada da água pode ser definida pelo menos por quatro formas distintas de integração. Quais são elas?

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TÓPICO 2

PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Perceba que somos corresponsáveis pelos impactos negativos e o consumo excessivo dos recursos. Quando desperdiçamos água durante a higiene pessoal ou limpeza de carros e residências, quando aderimos cegamente ao modelo consumista que nos é oferecido (roupas, sapatos, eletrônicos e outros), estamos, sim, contribuindo para o aumento da crise ambiental.

Por isso, devemos prestar atenção para esses pequenos detalhes e mudar hábitos e costumes prejudiciais ao meio ambiente. Se não mudarmos por vontade própria, num futuro bem próximo seremos forçados a mudar.

Como uma das bases da gestão de bacias hidrográficas é a gestão dos recursos hídricos, é importante conhecer um pouco sobre o principal reservatório superficial de água doce do mundo: os rios.

A seguir serão abordadas características a ser observadas nos rios, pois é a partir destas características que se pode mensurar a qualidade em ambientes hídricos.

2 ECOLOGIA DOS RIOS

Apresentaremos como exemplo a ecologia de riachos de Mata Atlântica, com base nas concepções de Oyakawa et al. (2006).

Os riachos de Mata Atlântica são caracterizados por apresentar leitos formados predominantemente por rochas e pedras, águas límpidas, forte correnteza, temperaturas relativamente baixas e alta concentração de oxigênio dissolvido na água. Nos trechos com mata ciliar, a menor incidência de luz solar determina valores mais baixos de temperatura e a mata contribui com o material alóctone, sob a forma de ramos, troncos e folhas que se acumulam no fundo.

Os ambientes de rios, riachos e corredeiras, onde a água se desloca rapidamente, denominam-se ambientes lóticos ou águas lóticas, em oposição às águas de lagos, represas e brejos que circulam com baixa velocidade, que são denominados ambientes lênticos ou de águas lênticas.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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Os riachos podem ser divididos em três tipos principais (quadro a seguir), de acordo com a sua situação topográfica: riachos de montanha ou de cabeceiras, riachos de planície e riachos litorâneos.

QUADRO 10 – CARACTERIZAÇÃO DOS DIFERENTES TIPOS DE RIOS E RIACHOS LOCALIZADOS NAS REGIÕES DE DOMÍNIO DA MATA ATLÂNTICA

RIACHOS DE MONTANHA OU DE

CABECEIRASRIACHOS DE PLANÍCIE RIACHOS LITORÂNEOS

Caracterizam-se pela grande declividade do terreno, alta velocidade das águas, baixas temperaturas, maior transparência das águas, teores mais altos de oxigênio dissolvido, substrato de fundo mais grosseiro e canal relativamente reto.

Apresentam menos declividade e a água escoa mais lentamente, á g u a s m a i s t u r va s , c o m temperaturas mais elevadas e com menores teores de oxigênio dissolvido. Podem ter águas ácidas e maior quantidade de sedimentos finos (argila e areia) no leito e apresentam um canal sinuoso, formando meandros.

De um modo geral, apresentam num curto trecho as características das duas categorias anteriores, pois possuem suas nascentes na encosta da serra ou de morros isolados próximos ao litoral, percorrendo, inicialmente, trechos de maior declividade e, depois, se estendem sinuosos por uma curta distância na planície costeira. Apresentam águas com temperaturas mais elevadas, menor teor de oxigênio dissolvido e uma coloração escura.

FONTE: Adaptado de: Oyakawa et al. (2006)

A qualidade de um corpo d’água pode ser caracterizada por meio de uma série de parâmetros físicos, químicos e biológicos, como vimos nos conteúdos anteriores. Vamos refletir agora sobre a importância desses parâmetros na biota aquática.

O oxigênio dissolvido, por exemplo, é um parâmetro essencial para o metabolismo dos organismos aeróbios que habitam as águas naturais, especialmente da fauna de peixes. A maioria das espécies de peixes não tolera concentrações inferiores a 4mg/L. Isso significa que, dependendo da concentração de oxigênio dissolvido na água, podemos determinar a existência de uma determinada espécie animal ou vegetal.

As concentrações mais baixas de oxigênio dissolvido estão relacionadas aos ambientes de águas paradas, com maior teor de matéria orgânica e menor incidência de luz. Nestes casos, o desenvolvimento de organismos decompositores acaba por consumir grande parte do oxigênio disponível, e as algas não dispõem de luminosidade ideal para realizar fotossíntese e oxigenar as águas. As maiores concentrações de oxigênio, por outro lado, ocorrem em rios de cabeceiras e nos trechos encachoeirados e de corredeiras, onde o movimento das águas aumenta a mistura com o ar e permite que o oxigênio venha a se dissolver.

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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O pH da água é um outro parâmetro, indica a acidez do meio e é um fator que controla a solubilidade de vários nutrientes e interfere diretamente na fisiologia dos organismos em geral. As águas mais ácidas, em geral de coloração mais escura, influenciada pela matéria orgânica do solo, ocorrem nos trechos de matas de restinga, mais próximos ao mar. As águas mais alcalinas, em geral, são resultado da influência do carbonato de cálcio dissolvido das rochas calcárias.

Em ambientes naturais, a temperatura da água varia de acordo com as condições climáticas e características do corpo d’água, como suas dimensões, presença de mata ciliar, exposição da vertente, entre outros. Geralmente, ambientes desprotegidos pela ausência de mata ciliar apresentam grandes variações na temperatura da água, principalmente em função do clima ou mesmo da hora do dia. Mudanças na temperatura causam alterações na velocidade das reações bioquímicas e na solubilidade dos gases dissolvidos, além de interferir diretamente na fisiologia e no comportamento dos peixes.

Normalmente, as temperaturas mais baixas encontram-se no inverno e nos rios de cabeceiras, e as mais elevadas estão presentes nas lagoas e rios de água escura, na planície, próximas ao mar.

Agora vejamos como os organismos vivos, neste caso os peixes, se adaptaram aos ambientes dos rios de Mata Atlântica.

Os rios de Mata Atlântica apresentam uma grande diversidade de ambientes, desde as cabeceiras situadas no planalto ou em topos e encostas de serras e morros, até rios de maior porte na planície costeira, desaguando no mar.

A figura a seguir representa, de um modo geral, os três principais trechos de um rio, denominados aqui de curso superior e curso médio, onde existe muita declividade, águas mais turbulentas e com grande potencial de carregamento de partículas, e o trecho inferior, que se caracteriza por ter pequena declividade, formação de meandros e maior deposição de sedimentos. Cada qual cria condições específicas para o estabelecimento de espécies.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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FIGURA 19 – CARACTERÍSTICAS DE UM RIO, DAS NASCENTES À FOZ (EXUTÓRIO)

FONTE: Disponível em: <http://www.prof2000.pt/users/elisabethm/geo8/rios2.htm>. Acesso em: 17 set. 2012.

Observamos nas descrições acima, apontadas por Oyakawa et al. (2006), que a dinâmica de um rio é muito mais complexa do que imaginamos. Nesse sentido, antes de qualquer alteração num corpo d’água, é preciso conhecer a sua estruturação e a ecologia dos organismos que vivem ou dependem do rio para sobreviver. Caso contrário, além de extinguir espécies, a desestruturação de um rio pode acarretar perda do volume de água ou até mesmo a morte do curso d’água, principalmente os de pequeno porte.

3 PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

3.1 PANORAMA GERAL DAS REGIÕES HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

CanyonVale profundo de paredes abruptas. Tem um forte poder de desgaste. É um vale em garganta ou V fechado.

RápidoQueda grande de água.

CatarataQueda de água devida a um desnível brusco de terreno.

AfluenteRio que desagua noutro.

Praia fluvialAcumulação de aluviões.

Vale em caleira aluvialVale pouco profundo, em regiões planas, onde o rio diminui a velocidade e acumula aluviões.

DeltaTerreno triangular formado na desembocadura do rio pela acumulação de aluviões.

MeandrosCurvas do rio.

Curso inferior

Vale em V abertoVale menos profundo onde o desgaste incide sobre as margens.

Planície aluvialAcumulação de aluviões com a aproximação da foz.

Curso médio

Curso superior

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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FIGURA 20 – REGIÕES HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

FONTE: Disponível em: <www.ecoagencia.com.br>. Acesso em: 17 set. 2012.

Neste item iremos conhecer um pouco mais a realidade de algumas regiões hidrográficas. O texto a seguir tem como base informações levantadas pelo Plano Nacional de Recursos Hídricos e pelo Projeto Marca D’Água.

IMPORTANTE

A base físico-territorial utilizada pelo Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) segue as diretrizes estabelecidas pela Resolução do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) nº 30, de 11 de dezembro de 2002, e adota como recorte geográfico para seu nível 1 a Divisão Hidrográfica Nacional, estabelecida pela Resolução CNRH nº 32, de 15 de outubro de 2003, que define 12 regiões hidrográficas para o país. Esta resolução institui a Divisão Hidrográfica Nacional, em regiões hidrográficas, com a finalidade de orientar, fundamentar e implementar o Plano Nacional de Recursos Hídricos. Todas estas resoluções estão disponíveis no site do CNRH <http://www.cnrh.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=14>.

Neste sentido, considera-se como região hidrográfica o espaço territorial brasileiro compreendido por uma bacia, grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas com características naturais, sociais e econômicas homogêneas ou similares, com vistas a orientar o planejamento e gerenciamento dos recursos hídricos.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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3.1.1 Região Hidrográfica Amazônica

A Região Hidrográfica Amazônica representa cerca de 40% do território brasileiro e possui mais de 60% de toda a disponibilidade hídrica do país, ocupando aproximadamente 3,8 milhões de km2 do território nacional (figura a seguir). Os recursos hídricos desta região, abundantes e até hoje pouco explorados, constituem um patrimônio nacional. Em várias escalas do espaço geográfico amazônico percebem-se questões vinculadas à água.

Na escala regional, existem problemas vinculados aos regimes dos grandes rios, sua tipologia e disponibilidade hídrica afetadas por questões relacionadas com a expansão das ações antropogênicas, como: o desmatamento, a mineração, a monocultura de grãos, entre outras. Na escala de detalhe e/ou local, os problemas principais envolvem o saneamento, em especial nas áreas urbanas, a questão fundiária, os conflitos em relação aos usos preponderantes da água (irrigação, consumo humano, entre outros) e o uso indiscriminado da água subterrânea.

Os textos a seguir foram compilados dos cadernos regionais elaborados para a estruturação do PNRH. Eles fazem uma breve abordagem sobre cada região hidrográfica brasileira.

Essa pressão antrópica, que a região vem sofrendo, ainda não compromete a grande abundância de água existente na Amazônia. Porém, as pressões, acontecendo em uma velocidade cada vez maior em um ecossistema sensível e vulnerável, repleto de desafios e esperanças, preenchem o imaginário nacional quanto às suas perspectivas de desenvolvimento e sustentabilidade.

No contexto da sustentabilidade, algumas alternativas de desenvolvimento podem ser vistas como vocações regionais, dentre as quais se destacam: a indústria do ecoturismo, a aquicultura, o uso da biodiversidade para produção de fármacos e a indústria de transformação de baixo impacto.

FONTE: Disponível em: <http://sistemas.unipacbomdespacho.com.br/bibliotecavirtual/32826%20-%200207%20-%20Caderno%20da%20Regi%C3%A3o%20Hidrogr%C3%A1fica%20Amaz%C3%B4nica.pdf>. Acesso em: 24 maio 2013.

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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FIGURA 21 – REGIÃO HIDROGRÁFICA AMAZÔNICA

FONTE: Disponível em: <http://sistemas.unipacbomdespacho.com.br/bibliotecavirtual/32826%20-%200207%20-%20Caderno%20da%20Regi%C3%A3o%20Hidrogr%C3%A1fica%20Amaz%C3%B4nica.pdf>. Acesso em: 24 maio 2013.

Em relação aos aspectos econômicos, apesar de a região ocupar 60% da superfície do Brasil, o PIB não representa mais de 5% do PIB nacional, e esta região concentra cerca de 10% da população urbana do país. Enquanto a densidade populacional média brasileira é de 20 hab/km2, a média para a região é de pouco mais de 2 hab/km2.

Os principais setores econômicos presentes na Região Hidrográfica Amazônica, com expressão nacional e com forte influência polarizadora regional, são: a indústria de transformação, principalmente a eletroeletrônica, a agroindústria, a pecuária, a exploração mineral, a exploração madeireira e a exploração de gás e petróleo. Em menor escala está o extrativismo vegetal, marcadamente da castanha, andiroba e dendê, além da caça e da pesca, que também merecem destaque.

FONTE: Adaptado de: <http://sistemas.unipacbomdespacho.com.br/bibliotecavirtual/32826%20-%200207%20-%20Caderno%20da%20Regi%C3%A3o%20Hidrogr%C3%A1fica%20Amaz%C3%B4nica.pdf>. Acesso em: 24 maio 2013.

No que diz respeito aos usos da água (gráfico a seguir), a principal demanda é para o consumo humano, com 36,6%.

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GRÁFICO 2 – USOS DA ÁGUA NA REGIÃO AMAZÔNICA

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

3.1.2 Região Hidrográfica do Tocantins-Araguaia

A Região Hidrográfica do Tocantins-Araguaia (figura a seguir) possui uma área total de 918.273 km2, o que corresponde a aproximadamente 11% do território nacional. Inclui os estados de Goiás (26,8%), Tocantins (34,2%), Pará (20,8%), Maranhão (3,8%), Mato Grosso (14,3%) e o Distrito Federal (0,1%). Grande parte situa-se na região Centro-Oeste, desde as nascentes dos rios Araguaia e Tocantins até a sua confluência, e daí, para jusante, adentra na região Norte até a sua foz. Em grande parte da região Centro-Sul prevalece o bioma Cerrado, enquanto ao Norte e Noroeste domina o Bioma Amazônia.

Esta região apresenta uma população de 7.890.714 habitantes, sendo 72% em áreas urbanas, com uma densidade demográfica de 8,1 hab/km2. A rede urbana é fragmentada, com predominância de municípios com até cinco mil habitantes (54,3%), correspondendo a apenas 13% da população urbana regional. As principais cidades são: Belém-PA (1.280.614 hab.), Imperatriz-MA (230 mil hab.), Marabá-PA (168 mil hab.), Palmas-TO (228 mil hab.) e Araguaína-TO (150 mil hab.), de acordo com o Censo 2010 IBGE.

A maior parte da população concentra-se nas unidades hidrográficas do Tocantins e litoral do Pará. Esta região hidrográfica possui 411 municípios inseridos, total ou parcialmente, no seu território. Entre os usos da água, o mais expressivo é para a irrigação (47%), seguida pela dessedentação animal (28%).

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FIGURA 22 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA DO TOCANTINS-ARAGUAIA

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

Araguaia

CapitaisCidadesPólos Regionais

Tocantins AltoTocantins BaixoLimite da Região HidrográficaLimite EstadualHidrografia

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GRÁFICO 3 – DEMANDA DE ÁGUA POR SETOR NA REGIÃO HIDROGRÁFICA DO TOCANTINS-ARAGUAIA

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

3.1.3 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental

A Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental (veja mapa na figura a seguir) ocupa uma superfície de 268.897 km2, sendo 244.696,27 km2 no Maranhão e 24.200,73 km2 no estado do Pará. Este território é ocupado por uma população de 5.490.100 habitantes distribuídos em 263 municípios, sendo que 214 são do estado do Maranhão e 49 do estado do Pará. Vários ecossistemas estão inseridos dentro dessa área, dos quais os mais importantes são a floresta de transição entre os biomas Amazônico e Cerrado, a floresta estacional decidual (mata caducifólia), o Cerrado e as formações litorâneas.

Devido às suas características singulares de riqueza natural e beleza cênica, as formações litorâneas do Maranhão e Pará correspondem a ecossistemas de relevante importância, tanto para os estudos biológicos quanto para o desenvolvimento sustentável do ecoturismo.

A demanda total na Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental é da ordem de 20,46 m3/s. Para a irrigação é de 4,04 m3/s (20,0% do total), a demanda animal é de 3,79 m3/s (18% do total) e a indústria 1,26 m3/s ou 6,15% do total.

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FIGURA 23 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA DO ATLÂNTICO NORDESTE OCIDENTAL

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

CapitaisCidades

Mearim

ItapeouruGurupi

Limite da Região HidrográficaLimite EstadualLimite MunicipalHidrografia

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3.1.4 Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental

A região ocupa uma superfície de 285.281 km2, o equivalente a 3% do território brasileiro. Os estados da Paraíba e Rio Grande do Norte estão 100% contidos nesta região hidrográfica, o estado do Ceará possui 97% de seu território contido nesta região, enquanto Pernambuco e Alagoas possuem apenas parte do território.

A Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental contempla cinco importantes capitais do Nordeste (Fortaleza, Natal, João Pessoa, Recife e Maceió), vários grandes núcleos urbanos e um significativo parque industrial. Esta região é uma das mais populosas entre as 12 do país, compreendendo aproximadamente 21,6 milhões de habitantes. A maior parte desta população sofre com a falta de água e cobra, cada vez mais, do poder público, soluções que garantam o fornecimento deste recurso em quantidade suficiente para satisfazer suas necessidades básicas.

No que diz respeito à vegetação, essa região contempla fragmentos dos biomas Cerrado, Caatinga, Floresta Atlântica e ecossistemas costeiros (mapa a seguir).

A demanda total de água na Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Oriental é de 179,17 m3/s (11% da demanda do país), da qual 53% (95,24 m3/s) correspondem ao uso para irrigação. Em relação aos outros usos, destacam-se os usos doméstico (urbano e rural, 31%), industrial (13%) e para dessedentação animal (2,5%).

As condições mais críticas no tocante à relação demanda/disponibilidade, no Brasil, ocorrem na região Atlântico Nordeste Oriental, com um comprometimento de 100% da disponibilidade. Em alguns locais a situação é agravada em função da elevada densidade populacional. Eventualmente, é necessária a transposição de água a partir de bacias próximas (por exemplo, a cidade de Fortaleza é parcialmente abastecida com água da Bacia do Rio Jaguaribe) ou a exploração de águas subterrâneas, quando possível (por exemplo, a região costeira do Rio Grande do Norte).

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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FIGURA 24 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA DO ATLÂNTICO NORDESTE ORIENTAL

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

3.1.5 Região Hidrográfica do São Francisco

Essa região está situada entre as coordenadas 7º17’ a 20º50’ de latitude sul e 36º15’ a 47º39’ de longitude oeste e é formada por diversas sub-bacias que deságuam no rio São Francisco, e este, por sua vez, no oceano Atlântico, em divisa com os estados de Alagoas e Sergipe. Apresenta 638.323 km² (8% do território nacional), abrange 503 municípios (e parte do Distrito Federal, 1.277km2 representando 0,2% da bacia) e sete unidades da Federação: Bahia (307.794 km2, 48,2%), Minas Gerais (235.635 km2, 36,9%), Pernambuco (68.966 km2, 10,8%), Alagoas (14.687 km2, 2,3%), Sergipe (7.024 km2, 1,1%) e Goiás (3.193 km2, 0,5%).

CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO HIDROGRÁFICA ATLÂNTICO NORDESTE ORIENTAL - Sub-Divisão 1

CapitaisLimite da Região HidrográficaLimite EstadualHidrografia

NORTE CE (59.271,25).

JAGUARIBE (73.175,41). PARAÍBA (19.679,18)LITORAL RN PB (30.285,74)

LITORAL AL PE PB (43.168,41)

PIRANHAS-APODI (59.701,23).

Sub-Divisão 1 (km2)

Cidades

PIRANHAS-APODI

PARAÍBA

NORTE CELITORAL RN PB

LITORAL AL PE PB

JAGUARIBE

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A população total na Região Hidrográfica do São Francisco, no ano 2000, era de 12.823.013 habitantes, sendo que a população urbana representava 74,4%. A densidade demográfica média na bacia é de 20 hab/km2.

A Região Hidrográfica do São Francisco (mapa a seguir) possui acentuados contrastes socioeconômicos, abrangendo áreas de acentuada riqueza e alta densidade demográfica, áreas de pobreza crítica e população bastante dispersa.

A população encontra-se distribuída de forma heterogênea nas regiões fisiográficas: Alto São Francisco (48,8%); Médio São Francisco (25,3%); Submédio São Francisco (15,2%); e Baixo São Francisco (10,7%). A população é predominantemente urbana, sendo que 50% da população da bacia vivem em 14 municípios com população urbana maior que 100 mil habitantes, localizados nos seguintes estados: Minas Gerais (Belo Horizonte, Contagem, Betim, Montes Claros, Ribeirão das Neves, Santa Luzia, Sete Lagoas, Divinópolis, Ibirité e Sabará); Bahia (Juazeiro e Barreiras), Alagoas (Arapiraca) e Pernambuco (Petrolina). Mais de 90% do total de municípios da bacia são de pequeno porte, com população urbana inferior a 30 mil habitantes.

A população rural da bacia corresponde a 25,6% do total. Em relação aos usos da água, do total da vazão retirada (165m3/s), 69% são para irrigação, 16% para abastecimento urbano, 4% para uso animal, 9% para abastecimento industrial e 2% para abastecimento rural.

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FIGURA 25 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA DO SÃO FRANCISCO

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

3.1.6 Região Hidrográfica do Parnaíba

A Região Hidrográfica do Parnaíba (veja figura) é uma das mais importantes da região nordeste do Brasil. É ocupada pelos estados do Ceará, Piauí e Maranhão, abrangendo uma área de 331.441 km2, sendo 249.497 km2 no Piauí, 65.492 km2 no Maranhão, 13.690 km2 no Ceará e 2.762 km2 de área em litígio entre Piauí e Ceará.

Suas águas atravessam diferentes biomas, como o Cerrado, no Alto Parnaíba, a Caatinga, no Médio e Baixo Parnaíba, e o Costeiro, no Baixo Parnaíba, tornando diferenciadas as características hidrológicas de cada uma destas regiões.

Limite da Região Hidrográfica

Alto São FranciscoMédio São FranciscoSub-Médio São FranciscoBaixo São Francisco

Sede Capital Estadual SUB 1Sede MunicipalLagosRios Principais

Limites EstaduaisLimites Municipais

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A maior parte do estado do Piauí (99%) está inserida na Bacia do Parnaíba, e apenas o município de Luiz Correia não se encontra dentro da região hidrográfica. Ao todo são 220 municípios, sendo o mais populoso Teresina, com mais de 655 mil habitantes (cerca de 25% da população do estado). A maioria dos municípios não ultrapassa 10 mil habitantes. O estado do Maranhão participa com 35 municípios. Os mais populosos são os municípios de Balsas, com 60.139 habitantes, Timon, com 121.858 habitantes, e Caxias, com 10.781 habitantes.

O estado do Ceará tem 20 municípios inseridos na área da bacia, sendo os mais populosos Crateús, com 70.898 habitantes, e Tianguá, com 58.069 habitantes.

Uma das características da região é o grande contingente populacional vivendo na área litorânea, em especial no centro sub-regional, representado pela cidade de Parnaíba. A região possui a única capital fora da área litorânea no Nordeste, a cidade de Teresina, situada às margens do rio Parnaíba.

As principais atividades econômicas da área estão ligadas à agropecuária, com maior destaque para a agricultura de sequeiro (soja, arroz, feijão, milho, caju, algodão, cana-de-açúcar). A agricultura irrigada ainda não é significativa, apesar do grande potencial para a fruticultura (manga, coco, maracujá e banana).

As atividades extrativas vegetais são representadas principalmente pela carnaúba e pelo coco babaçu. Também merecem registro a madeira e o carvão. No Piauí, a produção de mel – apicultura – tem se desenvolvido rapidamente e espera-se uma grande expansão associada à cultura do caju. A aquicultura concentra-se principalmente na região do Delta e a carcinicultura encontra-se em expansão. Não existe pesca comercial na bacia.

Em relação à pecuária, as atividades relevantes são a bovinocultura, a caprinocultura e a avicultura. O setor secundário é ainda pouco expressivo, com destaque para a agroindústria de açúcar, álcool e couro. Algumas cidades possuem zonas industriais em fase de expansão, como Teresina, Floriano, Parnaíba e Picos, no Piauí, e Balsas, no Maranhão.

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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FIGURA 26 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA DO PARNAÍBA

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

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3.1.7 Região Hidrográfica Atlântico Leste

A Região Hidrográfica Atlântico Leste (figura a seguir) compreende os estados da Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo e Sergipe. Possui uma área de 386.092 km2, equivalente a 4% do território brasileiro. A região pode ser dividida como 26% de sua área dentro do estado de Minas Gerais, 1% no estado do Espírito Santo, 69% no estado da Bahia e 4% no estado de Sergipe. Em toda a área de estudo, a rede hidrográfica encontra-se dividida em 16 unidades hidrográficas, e 12 estão total ou parcialmente no estado da Bahia.

A Região Hidrográfica Atlântico Leste pode ser percebida como uma unidade geográfica marcada por duas características fundamentais que, de certa forma, explicam todo o conjunto de aspectos relacionados aos recursos hídricos quando analisados frente às disponibilidades, demandas ou entraves constatados no presente estudo.

A primeira característica de cunho geográfico muito importante é a discreta influência da latitude no que tange à alternância dos atributos naturais. Nota-se que os aspectos naturais identificados numa determinada latitude possuem um padrão de repetição quando considerada sua distribuição em relação aos vetores norte e sul. Observa-se que a variação dos atributos ambientais, entre os limites latitudinais de aproximadamente 10ºs e 19ºs, são bastante discretos.

A segunda característica que se destaca na área de estudo, também de cunho geográfico, é a heterogeneidade dos atributos ambientais quando analisada a sua distribuição no sentido longitudinal. Observa-se a ocorrência de um nítido gradiente ambiental orientado no sentido leste-oeste, marcado por faixas de larguras variadas, permitindo a individualização de domínios ambientais muito específicos.

Esta distribuição no sentido longitudinal é reflexo da relação continentalidade e maritimidade, como também da dinâmica geomorfológica que influenciou na distribuição e evolução de parte dos atributos físicos presentes na área de estudo, em particular os processos de esculturação do relevo.

FONTE: Disponível em: <http://sistemas.unipacbomdespacho.com.br/bibliotecavirtual/32825%20-%200206%20-%20Caderno%20da%20Regi%C3%A3o%20Hidrogr%C3%A1fica%20Atl%C3%A2ntico%20Leste.pdf>. Acesso em: 24 maio 2013.

Para uma caracterização geral dos recursos hídricos da Bacia do Atlântico Leste é importante destacar sua localização em área predominantemente tropical. Submetida a um clima quente e úmido e sob forte radiação solar, a região pode ser caracterizada por quatro tipos básicos de clima: superúmido, úmido, semiúmido e semiárido.

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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FIGURA 27 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA ATLÂNTICO LESTE

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

3.1.8 Região Hidrográfica Atlântico Sudeste

A Região Hidrográfica Atlântico Sudeste (veja figura a seguir) é um dos principais palcos da história passada e contemporânea do Brasil. Ela é formada pelas bacias hidrográficas dos rios que deságuam no litoral sudeste brasileiro, do norte do Espírito Santo ao norte do Paraná. Drena uma das mais expressivas regiões brasileiras, marcada pelo elevado contingente populacional, pela diversidade econômica e pelo significativo parque industrial.

REGIÃO HIDROGRÁFICA DO

ATLÂNTICO LESTE

DIVISÃO HIDROGRÁFICA

Legenda

Rio de Contas

Rio de Itapicuru-Paraguaçu

Sub-Bacias Hidrográficas Rio Jequitinhonha

Litoral BA ES

Litoral SE

Cidade

Capital

Fios

Divisão Estadual

Limite da Região

Bacias Hidrográficas

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Abrange parte das regiões leste e Zona da Mata mineiras, drenando águas das bacias dos rios Doce e Paraíba do Sul, respectivamente. Abrange praticamente todo o estado do Espírito Santo, com exceção da Bacia do Rio São Mateus, ao norte, todo o estado do Rio de Janeiro, grande parte do litoral paulista, em regiões como a Baixada Santista, e as vertentes paranaenses do rio Ribeira do Iguape, região ainda preservada e de raras belezas cênicas.

A região ocupa uma área total de 213.171,63 km², abrigando total ou parcialmente 589 municípios. Destes, 507 têm a sede em sua área de drenagem e 82 têm parte da área do município na região e sede fora, em regiões hidrográficas vizinhas.

Atualmente, os sérios desafios ambientais exigem da população dessa região, de localização privilegiada no país, o repensar de paradigmas culturais e comportamentais e dos modelos de desenvolvimento.

Veja que estamos falando de uma das regiões mais importantes do Brasil e que, pelo fato de estar no litoral, tem como uma das suas bases econômicas o turismo, que é atraído pelas belezas naturais e a qualidade ambiental. Nesse sentido, se não houver um planejamento visando à sustentabilidade dos ambientes naturais e de sua recuperação, a região sofrerá impactos significativos na economia.

A Região Hidrográfica Atlântico Sudeste apresenta uma das maiores demandas hídricas nacionais, bem como uma das menores disponibilidades hídricas relativas. Com uma área equivalente a 2,5% do território brasileiro, a população total da região hidrográfica em 2000 – 24.939.130 habitantes – representava 14,7% da população brasileira. A disponibilidade de águas superficiais é de 3.178 m3/s (vazão média (BRASIL, 2006), o que representa 2,0% do total de água doce disponível no país, que é de 160.067 m3/s.

De modo geral, há um conflito da modernidade com o meio ambiente. Embora absolutamente novo no espaço do tempo da trajetória do homem sobre a Terra, tal conflito é o resultado de um modo de viver que vem sendo construído desde alguns milhares de anos e teve um abrupto crescimento a partir da Segunda Guerra Mundial.

A acumulação de bens e a visão da inesgotabilidade dos recursos naturais pautaram a ocupação e o desenvolvimento da Região Hidrográfica Atlântico Sudeste, criando um cenário cuja sustentabilidade está seriamente comprometida. Esse processo histórico tem gerado conflitos de toda ordem, como os que ocorrem no campo social, com o crescente distanciamento entre as camadas sociais. No campo ambiental, o desrespeito ao meio ambiente é praticamente uma rotina, resultado do construto cultural.

Page 115: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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Tal reflexão é importante para conhecimento e resolução dos conflitos, já que o que é culturalmente aceito não resulta em conflito. Pelo delicado estado em que se encontram os rios e cursos de água, a região hidrográfica tem um número insignificante de conflitos explicitados no âmbito institucional.

Entre os cenários identificáveis, estão aqueles situados nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Vitória e Baixada Santista. Tanto em um como em outro, os mananciais de abastecimento encontram-se comprometidos ou vulneráveis. Tendo em vista a relação entre disponibilidade e demanda [...], as regiões vivem um alto risco de atendimento à demanda.

Na Região Metropolitana da Baixada Santista, a qualidade e quantidade das águas superficiais e subterrâneas [...] apresentam condições preocupantes, pelos altos índices de contaminação e exploração.

De modo semelhante pode ser considerada a Região Metropolitana de Vitória: considerando os baixos índices de IQA aferidos e a vulnerabilidade dos mananciais, o abastecimento pode ser considerado de alto risco de atendimento à demanda. O médio e baixo cursos do rio Paraíba do Sul vivem situações de médio risco de atendimento às demandas, seja industrial ou abastecimento.

Há três razões principais: as condições de qualidade das águas, que recebem grandes cargas de efluentes; a vulnerabilidade dos cursos de água quanto a acidentes ambientais; e a vazão, em especial no trecho à jusante de Santa Cecília, onde quase 2/3 das águas do Paraíba do Sul são transpostas para a geração de energia e abastecimento da Grande Rio.

FONTE: Disponível em: <http://www.mma.gov.br/estruturas/161/_publicacao/161_publicacao03032011024223.pdf>. Acesso em: 24 maio 2013.

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FIGURA 28 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA ATLÂNTICO SUDESTE

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

3.1.9 Região Hidrográfica do Paraguai

A Região Hidrográfica do Paraguai (figura a seguir) compreende os territórios do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul na porção brasileira, e em sua totalidade possui importantes áreas nos territórios paraguaio e boliviano.

Page 117: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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FIGURA 28 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA ATLÂNTICO SUDESTE

3.1.9 Região Hidrográfica do Paraguai

Da sua área total de 362.259 km2, 188.374,68 km2 correspondem ao território de Mato Grosso e 173.874,32 km2 ao Mato Grosso do Sul, 52% e 48%, respectivamente. A bacia compreende a área de 86 municípios, dos quais 53 pertencem ao Mato Grosso e 33 ao Mato Grosso do Sul. A população total da região em 2000 era de 1.887.365 habitantes, dos quais 1.597.601 (84,15%) correspondem à área urbana e 289.067 (15,32%) à área rural.

As principais cidades em Mato Grosso, localizadas na região hidrográfica, são: Cuiabá, com 483.346 habitantes; Várzea Grande, com 215.298 habitantes; Rondonópolis, com 150.227 habitantes, e Cáceres, com 85.857 habitantes. Outras cidades, como as da região de Tangará da Serra, no norte do estado, e Jaciara, no leste, desempenham importantes funções econômicas, com atividades sucroalcooleiras.

As principais cidades no território de Mato Grosso do Sul são: Corumbá, com 95.901 habitantes, no Pantanal, e Campo Grande, com 653.621 habitantes. Embora a área urbana de Campo Grande não esteja localizada na Região Hidrográfica do Paraguai, possui uma acentuada influência econômica na região, além de Bonito, Aquidauana e Miranda. Em termos gerais, a densidade habitacional na Bacia é de 5,21hab/km2.

No cenário ambiental a Região Hidrográfica do Paraguai abriga importantes ecorregiões, entre elas destaca-se o Pantanal Mato-Grossense, que é uma das maiores extensões úmidas contínuas do planeta.

Na região os conflitos não são evidentes, no entanto, mesmo que os conflitos não sejam latentes ou evidentes como em outras regiões hidrográficas, é importante implementar mecanismos preventivos que proporcionem que os potenciais conflitos venham a ser administrados em futuro próximo.

Em relação aos conflitos potenciais destaca-se, segundo estudos realizados na região, a inexistência de organismos de bacias, associada à ausência de implementação dos instrumentos de gestão e à insuficiente capacitação dos atores da região para realizar a gestão dos recursos hídricos.

Assim, com o aumento das atividades produtivas, particularmente na agropecuária, na indústria da mineração e no turismo, aumentam expressivamente as demandas por água para irrigação, dessedentação de animais, para as atividades de mineração e para as populações vinculadas a essas atividades, além da população flutuante relacionada ao turismo. Como consequência destes aspectos pode decorrer o aumento da degradação da qualidade das águas, relacionada aos despejos dos resíduos da agricultura irrigada, dos dejetos animais e humanos, das mineradoras e dos resíduos da atividade turística.

Page 118: Análise e Gestão de BAciAs HidroGráficAs

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FIGURA 29 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA PARAGUAI

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

CapitaisMunicípios < 20.000 hab.Municípios entre 20.000 e 50.000 hab.Municípios entre 50.000 e 100.000 hab.Municípios > 100.000 hab.Limite Estadual - MT/MSRegião Hidrográfica do ParaguaiDivisão Municipal - MT/MSHidrografiaRodovias - BRs

Sub-Bacias - Nível 2APAAQUIDAUANACUIABÁ 01CUIABÁ 02CUIABÁ 03ITIQUIRA PARAGUAI PANT 01

SANTA RITA - PARAGUAISEPOTUBASÃO LOURENÇOITAQUARI 01ITAQUARI 02

PARAGUAI 01NEGRO MS 01NABILEQUE

JAURUMIRANDA

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FIGURA 29 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA PARAGUAI 3.1.10 Região Hidrográfica do Uruguai

A Bacia Hidrográfica do Rio Uruguai (figura a seguir) possui cerca de 385.000 km2, destes, 45% (ou seja, 174.412 km2) estão situados em território nacional, o que corresponde à Região Hidrográfica do Uruguai, sendo assim a menor das 12 regiões brasileiras, com apenas 2% do território do país, o que não a exclui de sua importância econômica.

O potencial hidrelétrico e as atividades agroindustriais são de extrema importância para o país. Dentro do território nacional a região possui 73% de sua área no Rio Grande do Sul e 27% em Santa Catarina.

O rio principal desta região é o rio Uruguai, que é formado da confluência do rio Pelotas com o rio Canoas. Deste ponto em diante ele faz um percurso de 2.200 km de extensão, até a sua foz no estuário do rio da Prata.

O rio Uruguai divide os estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, em seu trecho nacional. Como rio transfronteiriço, o rio Uruguai materializa a fronteira entre o Brasil e Argentina; a seguir, deixa de banhar o território brasileiro, servindo de fronteira para o Uruguai e a Argentina.

Entre os conflitos pelo uso da água destacam-se, levando em conta questões de disponibilidade e demanda, as áreas onde ocorre a utilização dos recursos hídricos para irrigação de arroz. Em muitos pontos, a demanda se aproxima do dobro da disponibilidade, o que indica que a irrigação está comprometida.

No que se refere à qualidade das águas, os conflitos são gerados devido aos dejetos da suinocultura, do esgotamento sanitário, dos efluentes industriais e da potencial contaminação por agrotóxicos.

A partir deste contexto quali-quantitativo é possível caracterizar os principais conflitos, existentes ou potenciais, quanto ao uso dos recursos hídricos na bacia do rio Uruguai. São eles: abastecimento público x irrigação, irrigação x irrigação, implantação de empreendimentos hidrelétricos, principalmente no Alto Uruguai, e o lançamento de efluentes.

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FIGURA 30 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA URUGUAI

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

3.1.11 Região Hidrográfica Atlântico Sul

A Região Hidrográfica Atlântico Sul (figura a seguir) situa-se entre as coordenadas 24°30’ e 34°30’ de latitude sul, 48°00 e 58°00’ de longitude oeste, correspondendo à porção mais meridional do Brasil, no que diz respeito à vertente litorânea. Abrange 2,2% do território nacional, detendo 2,6% da disponibilidade hídrica do país e exercendo 14,6 % da demanda total por recursos hídricos.

CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO HIDROGRÁFICA DO URUGUAI

Limite da Região Hidrográfica do UruguaiSede Municipal > 50.000 hab.IBICUINEGRO RSURUGUAI ALTOURUGUAI MÉDIO

Sistema de Coordenada Geográfica Datum SAD-69

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FIGURA 30 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA URUGUAI

3.1.11 Região Hidrográfica Atlântico Sul

A sua área é de 186.080 km2, sendo 142.178 km2 do Rio Grande do Sul (76,4%), 36.649 km2 de Santa Catarina (19,7%), 5.732 km2 do Paraná (3,1%) e 1.521 km2 de São Paulo (0,8 %).

A população da região corresponde a 6,8% da população nacional. Os 11.681.744 habitantes (dados Censo 2000) estão distribuídos da seguinte forma: 7.888.890 Rio Grande do Sul (67,5%), 3.505.689 Santa Catarina (30,0%), 245.717 Paraná (2,1%) e 41.447 São Paulo (0,4%).

Os principais conflitos na Região Hidrográfica Atlântico Sul podem ser enquadrados em três tipologias principais: 1) quantitativos, decorrentes de demandas que em alguns pontos superam as disponibilidades; 2) qualitativos, decorrentes da degradação por determinado uso que acaba por inviabilizar outro; 3) conflitos produzidos pela ocorrência de eventos extremos (inundações e estiagens).

Na região é comum observar divergências entre irrigantes. Um exemplo são as derivações irregulares realizadas por determinados irrigantes, chegando a interromper o fluxo para jusante e impedindo a captação de outros usuários. Esta realidade é observada nas sub-bacias com vocação agrícola, como a do Guaíba, Gravataí, litoral do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Nos conflitos de natureza qualitativa tem-se talvez o exemplo mais emblemático na sub-região Guaíba, onde a combinação de despejos de esgotos domésticos, resíduos sólidos, despejos industriais e efluentes da irrigação comprometem a tal ponto a qualidade das águas no curso inferior, que o abastecimento de água para as cidades de Gravataí, Cachoeirinha, Alvorada e Viamão requer a captação de água bruta a cerca de 15 km de distância, no delta do Guaíba.

De um modo geral, os conflitos estão relacionados com as áreas onde

ocorre irrigação em larga escala, concentração populacional, polarização industrial, turismo sazonal e áreas com maior risco de inundações.

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FIGURA 31 – REGIÃO HIDROGRÁFICA ATLÂNTICO SUL

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

CAPITAIS

Legenda

Principais CidadesCursos de águaLimite da Região HidrográficaSub-Regiões (SUB1)Limites estaduaisLimites internacionaisOceano

Guaíba Litoral RS Litoral SC, PR e SPITAJAÍ

LITORAL NORTE SC 01

LITORAL PR 01LITORAL RS SC 01

LITORAL RS SC 02LITORAL RS SC 03

LITORAL RS 03

LITORAL RS 02LITORAL RS 01

JAGUARÃOGRAVATAÍ

GUAÍBA 01

GUAÍBA 02JACUÍ ALTO

PARDO RSSINOS

TAQUARÍ

VACACAÍ

CAÍ

LITORAL RS 04

LITORAL SUL SP

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FIGURA 31 – REGIÃO HIDROGRÁFICA ATLÂNTICO SUL 3.1.12 Região Hidrográfica do Paraná

A Região Hidrográfica do Paraná (figura a seguir) possui 879.860 km², o que corresponde a 10,3% do território nacional, sendo assim a terceira mais extensa do Brasil. Limita-se ao sul com a Região Hidrográfica (RH) do Uruguai; a sudeste com a RH do Atlântico Sul; a sudeste e leste com a RH do Atlântico Sudeste; a leste e nordeste com a RH do São Francisco; ao norte com a RH do Tocantins-Araguaia; a noroeste com a RH do Paraguai; a oeste com o Paraguai e a sudoeste com a Argentina.

Ela compreende o trecho brasileiro de uma das unidades hidrográficas da Bacia do Rio da Prata, o Alto Paraná, a qual corresponde à área de drenagem da Bacia do rio Paraná até a foz, este do rio Iguaçu, na tríplice fronteira Brasil–Argentina– Paraguai. Corresponde a aproximadamente 59% da Bacia do Rio Paraná e 29% da Bacia do Rio da Prata como um todo.

Na maior parte da Região Hidrográfica do Paraná predomina o clima tropical, com exceção de áreas que apresentam variações do clima subtropical temperado (estados de Paraná e Santa Catarina).

Assim como nas outras regiões hidrográficas, os conflitos se manifestam em diferentes situações e em diferentes pontos da região. Na parte central da região existe o conflito potencial entre geração de energia e navegação e transporte fluvial.

Nas áreas mais populosas, com ênfase para São Paulo, Campinas e Curitiba, mas também Brasília, Goiânia e outras localidades, o conflito ou interferência ocorre quando a poluição ambiental diminui as disponibilidades hídricas para usos de água diversos, como nas situações de captações à jusante de pontos de lançamento de efluentes ou de trechos de rio com qualidade regular a péssima.

Estas cargas poluidoras, se não tratadas, não somente diminuem a quantidade de água disponível pelo comprometimento de sua qualidade, como também apresentam elevado impacto negativo à vida aquática.

Outro tipo de conflito encontrado na região é o que ocorre em pequenas ou microbacias, em que as demandas para usos consuntivos diversos superam as vazões de estiagem. Situações como esta estão relatadas nos planos de bacia de unidades de gerenciamento de recursos hídricos de diferentes pontos da região hidrográfica.

Complementarmente a estes conflitos está a transposição de bacias na Região Hidrográfica do Paraná, sendo uma intrarregional e outra inter-regional. Estas situações podem, potencialmente, gerar futuros conflitos, pois as unidades hidrográficas produtoras já apresentam situação de criticidade.

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Além dos problemas levantados, a ANA (Agência Nacional de Águas) lista outros aspectos relevantes com repercussão sobre os recursos hídricos da Região Hidrográfica do Paraná:

• necessidade de fomentar programas para uso e manejo adequado dos solos e controle de erosão visando à preservação dos mananciais e o controle dos processos de assoreamento dos rios;

• necessidade de racionalizar o uso da água na irrigação e na indústria e diminuir as perdas nos sistemas de abastecimento;

• necessidade de implementar sistema de outorga e de cobrança pelo uso dos recursos hídricos nas unidades hidrográficas mais críticas;

• ocupação desordenada de áreas sujeitas à inundação, colocando em risco a vida humana e a propriedade, principalmente nas regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas, Curitiba e de outros grandes centros urbanos;

• problemas de erosão e degradação do solo;

• necessidade de ampliação de programas de extensão rural, baseados em um zoneamento agroclimático e de aplicação de melhores práticas agrícolas, para conter o avanço desses processos;

• necessidade de investimentos para programas de recuperação de áreas degradadas;

• poluição difusa nos corpos de água ocasionada pelo uso intensivo de insumos agrícolas;

• necessidade da promoção de ações que permitam avançar na gestão descentralizada dos recursos hídricos.

Outro ponto a ser considerado é a bioinvasão do mexilhão dourado. O mexilhão dourado é um molusco bivalve originário da Ásia. A espécie chegou à América do Sul provavelmente de modo acidental, na água de lastro de navios cargueiros, tendo sido a República Argentina o ponto de entrada. Do país vizinho chegou ao Brasil. Hoje a espécie já foi detectada em quase toda a região Sul e em vários pontos do Sudeste e Centro-Oeste.

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FIGURA 32 – ÁREA DA REGIÃO HIDROGRÁFICA PARANÁ

FONTE: Cadernos Regionais do Plano Nacional de Recursos Hídricos (2006)

Como você pode ver, existe uma série de diferenças e similaridades entre as regiões hidrográficas brasileiras. Chamamos a atenção para as diferenças culturais e semelhanças ligadas aos conflitos pelos usos da água.

Por mais que tenhamos um país de dimensões continentais, somos culturalmente e paisagisticamente diversos, porém os problemas em relação à água são os mesmos. Todos estão ligados à qualidade e quantidade, associados à inexistência de gestão adequada e de cuidados ambientais.

Com os dados iniciais coletados para o Plano Nacional de Recursos Hídricos, o país poderá se planejar melhor para enfrentar os diferentes problemas associados ao processo de gestão.

A seguir apresentaremos a fonte de energia que provém dos rios, a energia hidrelétrica, uma das principais fontes de geração de energia elétrica do país.

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UNI

A Leitura Complementar deste tópico nos mostra uma avaliação geral sobre a situação atual dos recursos hídricos no país. Amplie seus conhecimentos lendo as informações complementares indicadas e tire as suas próprias conclusões.

4 POTENCIAL HIDRELÉTRICO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS, IMPACTOS E CONFLITOS

A energia hidrelétrica é proveniente do potencial hidráulico de um rio. Para obtenção deste tipo de energia se faz necessária a intervenção do homem na construção de usinas.

UNI

A maior parte da energia elétrica gerada no Brasil tem procedência de empreendimentos hidrelétricos, que respondem por quase 71% de toda a capacidade instalada do país, hoje em cerca de 115 mil megawatts (MW). As 929 usinas hidrelétricas em operação espalhadas no território nacional têm capacidade de gerar 81,43 mil MW, de acordo com dados de agosto de 2011 do Banco de Informações de Geração da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A segunda maior fonte de energia do país é a termelétrica, responsável por 28,2% da capacidade instalada, sendo 11,4% de térmicas a gás; 7,3% de térmicas a biomassa; 1,7% de térmicas nucleares e 1,7% de térmicas a carvão mineral. Outra fonte participante da matriz de energia elétrica é a eólica (0,97%). FONTE: Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/sobre/economia/energia/setor-eletrico/geracao/print>. Acesso em: 24 maio 2013.

Para a implantação de uma usina hidrelétrica é necessário que o rio possua algumas especificidades, como: grande volume de água (caudaloso) e que apresente desníveis em seu curso, para a geração de energia potencial (água em movimento).

A força e velocidade da água, ao atravessar as turbinas, faz com que esta se movimente, transformando a energia potencial, aquela obtida pela água em movimento, em energia mecânica, gerada a partir da movimentação das turbinas. Estas, por sua vez, estão conectadas a um gerador que transformará a energia mecânica em energia elétrica. O aproveitamento da energia gerada gira em torno de 95%, onde o custo da matéria-prima (água) utilizada é zero.

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FIGURA 33 – FUNCIONAMENTO DE USINA HIDRELÉTRICA

FONTE: Disponível em: <http://www.infoescola.com/energia/usina-hidreletrica/>. Acesso em: 11 abr. 2013.

A utilização da energia hidrelétrica corresponde a 18% da produção de energia elétrica no mundo, o que denota a pouca exploração deste recurso, que só não é maior devido às especificidades que os recursos hídricos devem apresentar nos países. Para que haja a instalação de uma usina hidrelétrica se faz necessário que a localidade tenha condições naturais favoráveis, como as já mencionadas anteriormente.

Alguns países se destacam nesse assunto, o Brasil, por exemplo, onde quase 71% da energia elétrica produzida provêm das usinas hidrelétricas, pois nosso continente é dotado de grandes fontes hídricas com potencial para geração de energia (quadro a seguir). Há ainda outros países, como Canadá, China, Estados Unidos e Rússia, que apresentam grande potencial hidráulico.

A produção de energia a partir das hidrelétricas se apresenta como uma fonte de energia renovável e não poluente ao meio ambiente, porém não se exime da geração de impactos sociais e ambientais.

Grandes áreas são inundadas para a construção das barragens, gerando problemas de perda de fauna (nem todos os indivíduos de uma espécie são retirados) e relocação de habitações (pessoas são relocadas e perdem suas terras onde possuíam valor financeiro e sentimental, como é o caso de agricultores, ribeirinhos e indígenas).

A exemplo da hidrelétrica de Itaipu, para sua construção, cerca de 1.500 km2 foram inundados em função do represamento da água. Foram retirados aproximadamente 4.500 animais, entre lagartos, porcos-espinhos, roedores, macacos, entre outros, e levados para regiões circundantes protegidas das águas.

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QUADRO 11 – POTENCIAL HIDRELÉTRICO BRASILEIRO POR BACIA HIDROGRÁFICA

Potencial hidrelétrico brasileiro por bacia hidrográfica – situação em março de 2003

Bacia Código Estimado (MW) [a] Inventariado (MW) [b] Total (MW) [a]+ [b]

Bacia do Rio Amazonas 1 64164,49 0,78835433 40883,07 0,230411 105047,56 0,405862Bacia do Rio Tocantins 2 2018,8 0,024803902 24620,65 0,138758 26639,45 0,102924Bacia do Atlântico Norte/Nordeste 3 1070,5 0,013152654 2127,85 0,011992 3198,35 0,012357Bacia do Rio São Francisco 4 1917,28 0,023556581 24299,84 0,13695 26217,12 0,101292Bacia do Atlântico Leste 5 1779,2 0,021860067 12759,81 0,071912 14539,01 0,056173Bacia do Rio Paraná 6 7119,29 0,08747086 53783,42 0,303115 60902,71 0,235304Bacia do Rio Uruguai 7 1151,7 0,014150314 11664,16 0,065737 12815,86 0,049515Bacia do Atlântico Sudeste 8 2169,16 0,026651294 7296,77 0,041123 9465,93 0,036573Total - 81.390,42 100 177.435,57 100 258.825,99 100

FONTE: CENTRAIS elétricas brasileiras. Disponível em: <http://www.eletrobras.com/elb/data/Pages/LUMIS293E16C4PTBRIE.htm>. Acesso em: 24 maio 2013.

Os impactos ambientais são visíveis já no início da construção: desde a abertura de estradas que servirão para transportar o material para a obra até o represamento da água nos lagos artificiais, gerando a destruição de áreas vegetais e habitats, assoreamento dos rios, desmoronamento das margens, extinção de espécies endêmicas e de peixes, entre outros.

De acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), somente a bacia do rio Paraná representa 60% da capacidade hidrelétrica instalada no país, seguido da bacia do São Francisco, com potencial utilizado de 16%, e do Tocantins com 12%.

O suprimento energético da região Sudeste deriva da linha de transmissão que liga Itaipu (rio Paraná) ao estado de São Paulo. Já na região Nordeste, sendo a menos provida de recursos hídricos em função de suas secas, sua matriz energética provém do rio São Francisco, que corta a região, e ainda outra parcela da linha de transmissão da usina de Itacuruí (rio Tocantins).

O maior potencial hidrelétrico brasileiro representa capacidade de apenas 1%, que é a bacia do Amazonas. Os principais fatores desse baixo índice de aproveitamento na região são: o predomínio de planície no relevo amazônico, a biodiversidade e a distância dos consumidores, pois representam um alto custo para a implantação de linhas de transmissão e alto índice de perdas energéticas no percurso.

Atualmente as Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) representam prioridade na geração energética no Brasil, pois proporcionam especificidades estratégicas para sua implantação. Tais características se atribuem ao seu baixo custo de implantação e menos danos ambientais, comparadas às de uma usina

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QUADRO 11 – POTENCIAL HIDRELÉTRICO BRASILEIRO POR BACIA HIDROGRÁFICA hidrelétrica, pois representam: rapidez na construção, podem ser instaladas próximas aos centros de consumo, otimizando gastos com linhas de transmissão, um único rio suporta inúmeras PCHs de pequeno porte, pois isso varia de acordo com o volume do rio e quedas d’água. Em contrapartida, a geração de potência deverá estar entre 1 MW e 30 MW, com reservatório inundável igual ou inferior a 3 km².

LEITURA COMPLEMENTAR

A POLÊMICA DA USINA DE BELO MONTE

A polêmica em torno da construção da usina de Belo Monte, na bacia do rio Xingu, em sua parte paraense, já dura mais de 20 anos. Entre muitas idas e vindas, a hidrelétrica de Belo Monte, hoje considerada a maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal, vem sendo alvo de intensos debates na região, desde 2009, quando foi apresentado o novo Estudo de Impacto Ambiental (EIA), intensificando-se a partir de fevereiro de 2010, quando o MMA concedeu a licença ambiental prévia para sua construção.

Em 13 de agosto de 2012, o TRF 1ª Região, em decisão inédita, determinou a paralisação das obras – que caminham rapidamente – enquanto os povos indígenas afetados por ela não forem consultados. Mas em 27 de agosto, o STF deferiu pedido de liminar da Advocacia Geral da União suspendendo a decisão do TRF, e as obras foram retomadas.

Movimentos sociais e lideranças indígenas da região consideram que os impactos socioambientais não estão suficientemente dimensionados. Em outubro de 2009, por exemplo, um painel de especialistas debruçou-se sobre o EIA e questionou os estudos e a viabilidade do empreendimento. Um mês antes, em setembro, diversas audiências públicas haviam sido realizadas sob uma saraivada de críticas, especialmente do Ministério Público Estadual, seguido pelos movimentos sociais, que apontavam problemas em sua forma de realização.

Ainda em outubro, a FUNAI liberou a obra sem saber exatamente que impactos causaria sobre os índios, e lideranças indígenas kayapó enviaram carta ao Presidente Lula na qual diziam que, caso a obra fosse iniciada, haveria guerra. Para culminar, em fevereiro de 2010 o Ministério do Meio Ambiente concedeu a licença ambiental, também sem esclarecer questões centrais em relação aos impactos socioambientais.

Em junho de 2011, o IBAMA anunciou a liberação definitiva para a construção da usina, sob o argumento de que 40 condicionantes previstas na licença prévia haviam sido "atendidas". E o presidente do órgão à época, Curt Trennepohl, fez uma diferenciação entre "atendidas" e "cumpridas". Sublinhou que muitas delas só seriam cumpridas quando a usina entrasse em operação.

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Com a realização da Rio+20 em junho de 2012, no Rio de Janeiro, muitas manifestações contra Belo Monte, lideradas pelo cacique Raoni Metuktire, tomaram as ruas da cidade. Enquanto isso, bem longe do Rio de Janeiro, em Belo Monte (PA), índios Xikrin ocuparam a ensecadeira (espécie de barramento) do sítio Pimental, pedindo a suspensão da obra por descumprimento de condicionantes. Saíram depois de 21 dias de ocupação e de tensas negociações com a Norte Energia, empresa que está construindo a usina.

Dias depois, engenheiros da empresa terminaram detidos na aldeia Miratu, na Terra Indígena Paquiçamba, quando foram explicar aos indígenas como seria o mecanismo de transposição de pessoas e embarcações do rio Xingu, para acesso à cidade.

Veja como anda o cumprimento das condicionantes do componente indígena do Plano Básico Ambiental pela Norte Energia, atualizado até 5 de julho de 2012.

Abaixo um resumo dessa história que teve início em fevereiro de 1989, em Altamira, no Pará, com a realização do I Encontro dos Povos Indígenas no Xingu.

Realizado entre 20 e 25 de fevereiro de 1989, em Altamira (PA), o I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu reuniu três mil pessoas – 650 eram índios –, que bradaram ao Brasil e ao mundo seu descontentamento com a política de construção de barragens no rio Xingu. A primeira, de um complexo de cinco hidrelétricas planejadas pela Eletronorte, seria Kararaô, mais tarde rebatizada Belo Monte. De acordo com o cacique Paulinho Paiakan, líder kaiapó e organizador do evento ao lado de outras lideranças como Raoni, Ailton Krenak e Marcos Terena, a manifestação pretendia colocar um ponto final às decisões tomadas na Amazônia sem a participação dos índios. Tratava-se de um protesto claro contra a construção de hidrelétricas na região.

Em 2008, 19 anos depois, realizou-se em Altamira o II Encontro dos Povos Indígenas do Xingu e daí nasceu o Movimento Xingu Vivo para Sempre.

Na memória dos brasileiros, o encontro ficou marcado pelo gesto de advertência da índia kaiapó Tuíra, que tocou com a lâmina de seu facão o rosto do então diretor da Eletronorte, José Antônio Muniz Lopes, aliás presidente da estatal durante o governo FHC. O gesto forte de Tuíra foi registrado pelas câmaras e ganhou o mundo em fotos estampadas nos principais jornais brasileiros e estrangeiros. Ocorrido pouco mais de dois meses após o assassinato do líder seringueiro Chico Mendes, em Xapuri (AC), que teve repercussão internacional, o encontro de Altamira adquiriu notoriedade inesperada, atraindo não apenas o movimento social e ambientalista, como a mídia nacional e estrangeira.

O I Encontro dos Povos Indígenas foi o resultado de um longo processo de preparação iniciado um ano antes, em janeiro de 1988, depois que o pesquisador Darrel Posey, do Museu Emílio Goeldi do Pará, e os índios kaiapó Paulinho Paiakan e Kuben-I participaram de seminário na Universidade da Flórida, no qual

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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denunciaram que o Banco Mundial (BIRD) liberara financiamentos para construir um complexo de hidrelétricas no rio Xingu sem consultar os índios. Convidados por ambientalistas norte-americanos a repetir o depoimento em Washington, lá foram eles. E, por causa disso, Paiakan e Kube-I acabaram enquadrados pelas autoridades brasileiras, de forma patética, na Lei dos Estrangeiros e, por isso, ameaçados de ser expulsos do país. O Programa Povos Indígenas no Brasil, do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi), uma das organizações que deu origem ao Instituto Socioambiental (ISA), convidou Paiakan a vir a São Paulo, denunciou o fato e mobilizou a opinião pública contra essa arbitrariedade.

Para avançar na discussão sobre a construção de hidrelétricas, lideranças kaiapó reuniram-se na aldeia Gorotire em meados de 1988 e decidiram pedir explicações oficiais sobre o projeto hidrelétrico no Xingu, formulando um convite às autoridades brasileiras para participar de um encontro a ser realizado em Altamira (PA). A pedido de Paiakan, o antropólogo Beto Ricardo e o cinegrafista Murilo Santos, do Cedi, participaram da reunião, assessorando os kaiapó na formalização, documentação e encaminhamento do convite às autoridades. Na sequência, uniram-se aos kaiapó na preparação do evento. O encontro finalmente aconteceu e o Cedi, com uma equipe de 20 integrantes, reforçou sua participação naquele que seria, mais tarde, considerado um marco do socioambientalismo no Brasil. Ao longo desses anos, o Cedi, e depois o ISA, acompanharam os passos do governo e da Eletronorte na questão de Belo Monte, alertas para os impactos que provocaria sobre as populações indígenas, ribeirinhas e todo o ecossistema da região.

Listada no governo FHC como uma das muitas obras estratégicas do programa Avança Brasil, a construção do complexo de hidrelétricas no rio Xingu faz parte da herança legada ao governo Lula, eleito em novembro de 2002. Herança que era bem conhecida. Tanto assim, que o caderno temático O Lugar da Amazônia no Desenvolvimento do Brasil, parte do Programa de Governo do presidente eleito, alertava: “Dois projetos vêm sendo objeto de intensos debates: a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, e o de Gás de Urucu, no Amazonas. Além desses, também preocupam as 18 barragens propostas na bacia do rio Araguaia e Tocantins. A matriz energética brasileira, que se apoia basicamente na hidreletricidade, com megaobras de represamento de rios, tem afetado a bacia amazônica. Considerando as especificidades da Amazônia, o conhecimento fragmentado e insuficiente que se acumulou sobre as diversas formas de reação da natureza em relação ao represamento em suas bacias, não é recomendável a reprodução cega da receita de barragens que vem sendo colocada em prática pela Eletronorte”.

Decisão ficou para o governo Lula

Exemplos infelizes como a construção das usinas hidrelétricas de Tucuruí (PA) e Balbina (AM), as últimas construídas na Amazônia, nas décadas de 1970 e 1980, estão aí de prova. Desalojaram comunidades, inundaram enormes extensões de terra e destruíram a fauna e flora daquelas regiões. Balbina, a 146

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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quilômetros de Manaus, significou a inundação da reserva indígena Waimiri-Atroari, mortandade de peixes, escassez de alimentos e fome para as populações locais. A contrapartida, que era o abastecimento de energia elétrica da população local, não foi cumprida. O desastre foi tal que, em 1989, o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), depois de analisar a situação do rio Uatumã, onde a hidrelétrica fora construída, concluiu por sua morte biológica. Em Tucuruí não foi muito diferente. Quase dez mil famílias ficaram sem suas terras, entre indígenas e ribeirinhos. Diante desse quadro, em relação a Belo Monte, é preciso questionar a forma antidemocrática como o projeto vinha sendo conduzido, a relação custo-benefício da obra, o destino da energia a ser produzida e a inexistência de uma política energética para o país que privilegie energias alternativas.

Essas questões continuam a ser repisadas pelos movimentos sociais que atuam na região, como, por exemplo, o Movimento Xingu Vivo para Sempre, criado recentemente, e que reúne os que levam adiante a batalha contra a construção de Belo Monte e de outras hidrelétricas no rio Xingu.

Empossado na presidência da Eletrobras em janeiro de 2003, o físico Luiz Pinguelli Rosa declarou à imprensa que o projeto de construção de Belo Monte seria discutido e opções de desenvolvimento econômico e social para o entorno da barragem estariam na pauta, assim como a possibilidade de reduzir a potência instalada, prevista em 11 mil megawatts (MW) no projeto original.

A persistência governamental em construir Belo Monte está baseada numa sólida estratégia de argumentos dentro da lógica e vantagens comparativas da matriz energética brasileira. Os rios da margem direita do Amazonas têm declividades propícias à geração de energia, e o Xingu se destaca, também pela sua posição em relação às frentes de expansão econômica (predatória) da região central do país. O desenho de Belo Monte foi revisto e os impactos reduzidos em relação à proposta da década de 80. O lago, por exemplo, inicialmente previsto para ter 1.200 km2, foi reduzido, depois do encontro, para 400 km2. Os socioambientalistas, entretanto, estão convencidos de que além dos impactos diretos e indiretos, Belo Monte é um cavalo de Troia, porque outras barragens virão depois, modificando totalmente e para pior a vida na região.

[...]

FONTE: Adaptado de: <http://www.socioambiental.org/esp/bm/index.asp>. Acesso em: 11 abr. 2013.

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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LEITURA COMPLEMENTAR II

PRINCÍPIOS ESPECÍFICOS DE SUSTENTABILIDADE NA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS POR BACIAS HIDROGRÁFICAS

Gestão Descentralizada por Bacias Hidrográficas

A descentralização da gestão dos recursos hídricos no Brasil é baseada na adoção da bacia hidrográfica como unidade de gerenciamento e planejamento destes, visando ao envolvimento de atores inseridos no contexto local.

Gestão Participativa dos Recursos Hídricos

Deve haver incentivos para que todos possam cooperar para a preservação dos recursos hídricos e participar de sua gestão. Para sistematizar esta gestão participativa faz-se necessária ampla conscientização dos atores envolvidos sobre a problemática existente e sobre as formas de contribuição possíveis, fornecendo, desta forma, a oportunidade para que estes se sintam envolvidos no processo de busca pela sustentabilidade e, assim, maior comprometimento.

Cooperação Internacional e Inter-Regional

A relação entre países deve ser de cooperação, como, por exemplo, na divulgação e disponibilização de tecnologias e experiências de sucesso, colaborando no desenvolvimento tecnológico de ambos, bem como na capacitação de recursos humanos. A cooperação internacional deve surgir também em caso de existência de rios transfronteiriços, considerando que os deveres e direitos sobre estes recursos deverão ser divididos entre ambos os países, e os conflitos que possam surgir ser sanados de forma pacífica.

Sistematização e Disponibilização das Informações

A participação e a efetivação da gestão participativa dependem, principalmente, do acesso às informações de forma clara e direcionada aos atores pertencentes a todos os níveis, desde governos, organizações não governamentais, sociedade civil organizada, usuários, empresários e demais interessados. Desta forma, torna-se essencial a sistematização e a disponibilização das informações sobre recursos hídricos.

Atuação Preventiva na Gestão dos Recursos Hídricos

O uso do recurso hídrico, considerado um recurso natural renovável, é restringido devido à distribuição de forma desigual no território, poluição dos corpos d’água existentes e escassez deste em condições favoráveis (água doce) ao consumo, devendo-se considerar alguns aspectos complementares, como: avaliação da disponibilidade x demanda, uso racional, planejamento e controle do

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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uso dos recursos hídricos, desenvolvimento de novas tecnologias e capacitação de recursos humanos, avaliação sistemática dos recursos hídricos, avaliação da capacidade do meio em receber rejeitos (capacidade de autodepuração), consideração dos recursos segundo a qualidade/quantidade na previsão dos usos múltiplos e garantir, por meio de instrumentos e políticas, o uso sustentável. Dentre os instrumentos previstos em lei no Brasil tem-se: plano de recursos hídricos, outorga do direito de uso, cobrança pelo uso, enquadramento dos corpos d’água, além do ordenamento territorial e o sistema de informações sobre recursos hídricos, utilizados para nortear o uso e a conservação dos recursos hídricos.

A previsão dos efeitos adversos ou benéficos de cada ação, atividade ou projeto é também essencial no planejamento, controle e gestão dos recursos hídricos, devendo esta avaliação ser realizada segundo uma visão sistêmica, pois assim se pode possibilitar o uso racional dos recursos; o uso múltiplo; a integração entre os aspectos sociais, econômicos e ambientais; o ordenamento territorial necessário e orientar os demais instrumentos com fundamento no conceito da sustentabilidade. Podem-se prever ainda ações e medidas para mitigar os efeitos adversos e reduzir os impactos futuros.

Recomenda-se ainda a análise dos impactos potenciais existentes durante a avaliação, considerando como restrição até mesmo aqueles que não estejam comprovados cientificamente, mas que possam ocasionar problemas ou risco à saúde humana, e devendo-se, portanto, adotar medidas precatórias para estes impactos. Ainda referente à avaliação de impactos, devem-se evitar danos ambientais o máximo possível, e este princípio deve nortear o processo de tomada de decisões.

Planejamento Integrado, Sistemático e Abrangente do Uso dos Recursos Hídricos

Para assegurar o direito de acesso e a participação dos atores envolvidos na gestão dos recursos hídricos, deve-se garantir que estes estejam e sintam-se inseridos no contexto utilizado como base para o planejamento e a previsão de ações. No Brasil, convencionou-se por lei que a unidade de planejamento dos recursos hídricos é a bacia hidrográfica, sendo que cada estado do país deve subdividir-se em bacias e estas, por sua vez, serão responsáveis por gerir os recursos hídricos existentes, por meio dos comitês e das agências de bacia.

Deve-se considerar ainda, neste princípio, a preocupação na adequabilidade de instrumentos e políticas fundamentadas em experiências utilizadas em contextos diversos daquele encontrado no âmbito em questão, observando os custos econômicos e sociais das ações a serem implementadas e se estes são apropriados ao local, assim como respeitar a cultura da população inserida no contexto e suas tradições.

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TÓPICO 2 | PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS BRASILEIRAS

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O planejamento integrado dos recursos hídricos deve abranger o uso múltiplo destes, a verificação da disponibilidade em relação à quantidade e qualidade, bem como prever o ordenamento territorial e um sistema de coordenação.

Valor Econômico dos Recursos Hídricos

Este princípio prevê a implementação de instrumentos de cobrança que responsabilizem os poluidores e usuários sob aspectos financeiros, quanto ao uso e à poluição dos recursos hídricos, sendo estes reconhecidos como bem econômico.

Educação para a Gestão dos Recursos Hídricos

Segundo este princípio, deve-se promover a educação ambiental, a capacitação de recursos humanos e o desenvolvimento tecnológico para garantir a sustentabilidade na gestão de recursos hídricos.

Solução Negociada de Conflitos

O uso e a gestão integrada dos recursos hídricos, por meio de uma visão sistêmica destes e considerando os usos múltiplos, são essenciais para que possíveis conflitos sejam evitados ou minimizados. A participação e cooperação de usuários, de forma que estes possam externar sua opinião, também pode ser eficaz como agente controlador de conflitos.

Considerações Finais

Observa-se neste artigo a possibilidade de utilizar princípios genéricos da sustentabilidade para nortear os princípios específicos para gestão de recursos hídricos, sendo que os princípios levantados por Milanez e Teixeira (2001) permitem uma relação com as diretrizes utilizadas na Política Nacional de Recursos Hídricos, os instrumentos desta e demais princípios existentes na bibliografia pesquisada, com respeito ao uso, proteção e gestão de recursos hídricos no Brasil.

Desta forma, demonstrou-se como interagem os princípios genéricos e específicos e estes entre si, podendo o resultado destas interações fundamentar pesquisas e ações no âmbito da gestão de recursos hídricos considerando os conceitos da sustentabilidade, tendo a bacia hidrográfica como contexto da implementação destas ações.

Alguns dos princípios específicos constituem-se instrumentos de gestão, previstos na legislação ou recomendados na literatura, devendo ser implementados no âmbito da bacia hidrográfica, podendo fornecer bases sustentáveis para a gestão de recursos hídricos. Dentre estes instrumentos destacam-se os princípios do poluidor e usuário pagador, onde a cobrança pelo uso da água e a outorga do direito de uso podem ser utilizados como respaldo legal.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

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Os princípios específicos devem também nortear a seleção de outros instrumentos utilizados na gestão de recursos hídricos como indicadores de sustentabilidade, subsídio para sintetizar informações e analisar dados técnicos; além de colaborar na proposição de medidas e ações sobre temas prioritários; identificar problemas e área de ação; fixar objetivos e metas de desenvolvimento e qualidade ambiental; e medir e comunicar sobre tendências, evolução e condições de recursos naturais, verificando a evolução para um contexto visando à sustentabilidade, (WINOGRAD, 1995 apud DOMINGUES, 2000). A seleção de indicadores de sustentabilidade pode ainda colaborar na elaboração do Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, previsto na Lei Federal nº 9.433/97.

A construção destes indicadores de sustentabilidade coopera com a formulação de políticas públicas e com a implementação dos princípios de cooperação e participação, podendo ser utilizados como veículo de disseminação de informações sobre as condições e tendências relacionadas aos recursos hídricos, aumentando a conscientização dos usuários e demais atores. Para que esta participação seja efetiva é necessária, além do incentivo, a formulação de indicadores facilmente interpretados pela população, mesmo possuindo bases técnicas e científicas.

FONTE: Adaptado de: <http://www.anppas.org.br/encontro_anual/encontro3/arquivos/TA312-09032006-163231.PDF>. Acesso em: 11 abr. 2013.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Nesse tópico você viu:

• Os rios são os principais reservatórios superficiais de água doce do mundo e, por serem superficiais, são de mais fácil acesso aos recursos hídricos.

• Os ambientes de rios onde a água se desloca rapidamente denominam-se ambientes lóticos ou então águas lóticas e onde as águas circulam com baixa velocidade são denominados ambientes lênticos ou águas lênticas, como em lagos, por exemplo.

• A divisão física utilizada pelo Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) segue as diretrizes estabelecidas pela Resolução do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) que adota como recorte geográfico da Divisão Hidrográfica Nacional o que estabelece a Resolução CNRH nº 32/03, que define as 12 maiores e mais importantes regiões hidrográficas do Brasil.

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AUTOATIVIDADE

1 O que são ambientes aquáticos lênticos e lóticos? Cite exemplos.

2 Como podemos classificar os riachos?

3 Como estão divididas as regiões hidrográficas brasileiras? Cite-as.

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TÓPICO 3

A EMERGÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

A resultante socioambiental atualmente enfrentada é consequência da relação de exploração entre os seres humanos e o meio em que vivem. Tal situação tem gerado problemas no âmbito ambiental e social sem precedentes na história. Para responder aos problemas ambientais gerados, novas formas de pensar o desenvolvimento são debatidas aqui, em especial o desenvolvimento sustentável.

NOTA

Para iniciar nossa conversa sobre a gestão sustentável dos recursos hídricos, primeiramente é necessário resgatar a emergência da questão ambiental e buscar o desenvolvimento sustentável, questões estas importantes e que fazem parte do processo que também propiciou o debate sobre a gestão sustentável dos recursos hídricos.

2 O SURGIMENTO DA QUESTÃO AMBIENTAL E A BUSCA PELO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Com todos os problemas ambientais gerados, inúmeros debates são promovidos no fim da década de 60 e início da década de 70, quando o meio ambiente passa a ser tema central em debates mundiais, iniciando com o Clube de Roma em 1969; Conferência de Estocolmo em 1972; ECO/92 no Rio de Janeiro; Rio + 10 ocorrida em Johanesburgo, na África, em 2002; Rio + 20 em maio de 2012, no Rio de Janeiro. Uma das mais recentes, tratando especificamente do tema água, foi a Conferência Internacional sobre Governança e Sustentabilidade Ambiental: a questão da água, realizada em São Paulo em 2009. Estes eventos partem para a discussão e proposição de caminhos em busca da sustentabilidade socioambiental.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

IMPORTANTE

A necessidade de buscar novos caminhos para a conservação ambiental não partiu apenas da expectativa da existência dos problemas ambientais, mas, sim, com a primeira ida do homem à Lua em 1969, quando então a sociedade mundial pôde ter a noção de que a Terra era um planeta pequeno e que seus recursos eram finitos. Este foi o marco inicial para que começassem as discussões em torno da temática ambiental.

2.1 O CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Referente ao conceito de desenvolvimento sustentável, as primeiras discussões surgiram na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA –, ocorrida em 1972 em Estocolmo, na Suécia.

Até hoje, inúmeras são as discussões que buscam definir o que é o desenvolvimento sustentável, porém não há consenso para a sua definição. A ideia que ora predomina como um conceito melhor definido de desenvolvimento sustentável é o da Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – CMMAD. Mais tarde, em 1992, na Rio-92, também chamada ECO/92, na Conferência das Nações Unidas para Meio Ambiente e Desenvolvimento, foram traçados os princípios do desenvolvimento sustentável.

UNI

A Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – CMMAD – foi criada a partir da Conferência de Estocolmo, na Suécia, em 1972, e foi essa comissão que iniciou os primeiros debates sobre o conceito de desenvolvimento sustentável.

Depois de finalizado o debate, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento registrou, em seu relatório sob o título “Nosso Futuro Comum”, ou Brundtland, em 1987, o conceito por ela criado sobre o desenvolvimento sustentável, como sendo “[...] aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas necessidades”.

Com este conceito a CMMAD quer dizer que o desenvolvimento não deve pôr em risco os sistemas naturais que sustentam a vida na Terra. Ou seja, deve haver um equilíbrio entre o desenvolvimento econômico, social e ambiental.

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TÓPICO 3 | A EMERGÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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Para a CMMAD, o crescimento precisa ser retomado nos países em desenvolvimento, porque neles é que estão mais diretamente interligados o crescimento econômico, o alívio da pobreza e as condições ambientais. Considerando que esses países fazem parte de uma economia mundial, suas perspectivas dependem também dos níveis e padrões de crescimento das nações industrializadas.

O relatório anuncia a necessidade do apoio mútuo entre o desenvolvimento econômico e social, lembrando que é preciso haver mais alimentos para alimentar e não só um número maior de pessoas, pois há também a necessidade de habitação, de abastecimento de água, saneamento e serviços médicos.

Conforme já havíamos comentado, não existe um conceito de desenvolvimento sustentável, mas sim inúmeros debates em torno da temática. Por isso, um dos nomes mais importantes e respeitados ao falarmos em desenvolvimento sustentável é Ignacy Sachs.

Sachs (1986) diz que o desenvolvimento sustentável não representa um estado estático de harmonia, mas, antes, um processo de mudanças, no qual a exploração dos recursos, a dinâmica dos investimentos e a orientação das inovações tecnológicas e institucionais são feitas de forma consciente face às necessidades tanto atuais quanto futuras. O autor enfatiza cinco dimensões que considera de fundamental importância para atingir o desenvolvimento sustentável, veja a seguir:

a) sustentabilidade social: estabelecimento de um processo de desenvolvimento que conduza a um padrão estável de crescimento, com uma distribuição mais equitativa da renda, assegurando os direitos das grandes massas da população entre aqueles que têm e os que não têm;

b) sustentabilidade econômica: possível graças ao fluxo constante de inversões públicas e privadas, além da alocação e do manejo eficientes dos recursos naturais;

c) sustentabilidade ecológica: implica a expansão da capacidade mediante a intensificação dos usos do potencial de recursos existentes nos diversos ecossistemas, intensificação esta compatível com um nível mínimo de deterioração deste potencial, da redução de substâncias poluentes mediante a política de conservação de energia e de recursos, reciclagem, substituição por recursos renováveis e inofensivos;

d) sustentabilidade geográfica: é a necessidade de se buscar uma configuração rural-urbana mais equilibrada, de se estabelecer uma rede de reservas da biosfera para proteger a diversidade biológica e, ao mesmo tempo, ajudar a população local a viver melhor; e

e) sustentabilidade cultural: buscar a mudança em sintonia com a continuidade cultural vigente em contextos específicos.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

Desta forma, desenvolvimento sustentável é mais que crescimento. Exige uma mudança no teor do crescimento, a fim de torná-lo menos intensivo de matérias-primas e energia e mais equitativo em seu impacto.

UNI

Crescimento difere de desenvolvimento. Crescimento está atrelado à elevação da produção de uma nação, porém isso não garante o bem-estar da população. O desenvolvimento indica melhora no índice de desenvolvimento humano (IDH) demonstrado através de indicadores como, por exemplo: saúde, educação, renda.

Já para a CMMAD, a sustentabilidade do desenvolvimento está diretamente ligada à dinâmica do crescimento populacional. Destaca que o desenvolvimento sustentável é um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender às necessidades e aspirações humanas.

Assim, o desenvolvimento para a sustentabilidade socioambiental deixa de ser linear, único, que assumiu o desenvolvimento dominante até os dias atuais.

2.2 AGENDA 21 BRASILEIRA

UNI

A Agenda 21 é um programa de ação para viabilizar o desenvolvimento sustentável. Foi o documento de maior abrangência criado na Rio/92 para aliviar os problemas ambientais.

Aprovada na Rio/92, a Agenda 21 tem como alguns princípios a tomada de consciência por todos os indivíduos sobre o papel ambiental, econômico, social e político que desempenham em sua comunidade e exige, portanto, a integração de toda a sociedade no processo de construção do futuro.

Partindo desses princípios é que o governo brasileiro tem mobilizado os vários segmentos da sociedade para a construção da Agenda 21 nacional.

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TÓPICO 3 | A EMERGÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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O processo teve início a partir de seis temas: Agricultura Sustentável, Cidades Sustentáveis, Infraestrutura e Integração Regional, Gestão de Recursos Naturais, Redução das Desigualdades Sociais, e Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Sustentável.

De acordo com essa organização, a Agenda 21 brasileira aborda a problemática e propõe estratégias de ação para chegar ao desenvolvimento sustentável. Alguns exemplos abordados: a problemática da superpopulação urbana nas grandes cidades, propondo que para que estas se tornem sustentáveis precisam superar sua degradação física e de consumo, gerando alternativas concretas às injustiças; a deficiência do saneamento básico (água tratada, tratamento do esgoto e coleta do lixo), as divergências na sua implementação; o déficit habitacional e as ocupações desordenadas, falta de melhor planejamento urbano.

A partir de sua elaboração, o país passa a ter uma proposta de ações e recomendações a respeito dos temas ligados ao meio ambiente e à água. Entre outros temas ligados à questão ambiental, a Agenda 21 brasileira trata da preservação da quantidade e melhoria da qualidade da água nas bacias hidrográficas no país.

As ações e recomendações apresentadas vão desde a necessidade de difusão da consciência de que a água é um bem finito e mal distribuído no Brasil, até aspectos ligados ao combate da poluição do solo e da água, passando pela implantação de políticas de gestão de recursos hídricos e programas de educação ambiental, definição de formas de assegurar a preservação de mananciais através de florestas protetoras por meio da implantação de um sistema de gestão ambiental.

O conceito exacerbado de consumo, e que vem gradativamente ganhando mais espaço, é um dos responsáveis pela criação de novas e complexas exigências em todos os setores da sociedade moderna. Porém, a necessidade de conciliar as necessidades humanas ao meio ambiente é ressaltada na Agenda 21, gerando uma proposta dos países participantes da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92, realizada no Rio de Janeiro.

Este documento dá ênfase e reforça a ideia de que desenvolvimento e meio ambiente devem ser considerados como indissolúveis, incorporados às políticas públicas e práticas sociais de todos os países, uma vez que as pressões exercidas pelo aumento populacional e pelos sistemas de produção sobre o meio ambiente vêm ocasionando expressiva degradação dos recursos ambientais. As consequências dessa degradação perpassam os limites geográficos, sociais, políticos e econômicos, despertando a consciência mundial para a interdependência entre qualidade ambiental e qualidade de vida.

Assim, a questão ambiental passa também a fazer parte da agenda global, com implicações que muitas vezes afetam as relações entre países.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

Porém faz-se necessária não somente em nível local, mas sobretudo global, que é justamente o cerne da Agenda 21: “agir localmente, pensar globalmente”. Este importante documento tem por objetivo unir os países em torno de estratégias partindo do âmbito local para o global, a fim de alcançar o desenvolvimento sustentável.

Partindo do pressuposto de que é um documento que serve de guia para orientar governos e sociedades e assim inserir as iniciativas educacionais resultantes das questões ambientais, parte de uma visão integrada na formulação e implementação de políticas públicas.

É somente com essa visão que a população teoricamente assume a forma mais abrangente possível do controle quanto às suas iniciativas no meio ambiente, abandonando assim uma postura passiva e tornando-se corresponsável com a questão.

NOTA

Atualmente o número de organismos tanto nacionais quando internacionais com atuação na área ambiental é crescente. Em nível mundial, veja a seguir as organizações de maior destaque:

• Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS) – Commission on Sustainable Development

• PNUMA (ou UNEP) – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente• Conselho Consultivo de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável (High Level Advisory Board on Sustainable Development) e Comitê Inter- Agências sobre

Desenvolvimento Sustentável• FAO (Food and Agriculture Organization) – Organização das Nações Unidas para a

Alimentação e a Agricultura • WHO (World Health Organization) – Organização Mundial de Saúde• IAEA (International Atomic Energy Agency) – Agência Internacional de Energia Atômica• WMO (World Metereological Organization) – Organização Meteorológica Mundial• IMO (International Maritime Organization) – Organização Marítima Internacional• IWC (International Whaling Commission) – Comissão Internacional sobre a Pesca da Baleia• ILO (International Labor Organization) – Organização Internacional do Trabalho (OIT)

FONTE: Disponível em: <http://www.tierramerica.net/2002/0818/pconectate.shtml>. Acesso em: 24 maio 2013.

Lembre-se ainda de que, além dessas, diversas outras organizações, inclusive brasileiras, também estavam engajadas na causa ambiental, como é o caso das Organizações Não Governamentais – ONGs. Na Rio-92, através do chamado Fórum Global 92, participaram mais de 10 mil representantes de Organizações Não Governamentais (ONGs) das mais variadas atividades de

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TÓPICO 3 | A EMERGÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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todo o mundo, onde foram discutidos temas relevantes sobre mulheres, crianças, jovens e povos indígenas. Em decorrência foi elaborada a primeira minuta da "Carta da Terra", que conclamou todos os participantes a adotar o seu espírito e os seus princípios, em nível individual e social, através de ações concretas das ONGs signatárias.

No Brasil, são inúmeras associações e ONGs, tendo como uma das mais antigas do país a AGAPAN (Associação Gaúcha de Proteção Ambiental), criada em 1971 na cidade de Porto Alegre/RS, e a ACAPRENA, criada em 1973 na cidade de Blumenau/SC, atuante hoje na região do Médio Vale do Itajaí/SC.

As ONGs e associações possuem papel fundamental no exercício da pressão política para a implementação da sustentabilidade ambiental nas instituições públicas.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Nesse tópico você viu:

• Não existe uma definição para o termo desenvolvimento sustentável. Sua implementação vem ocorrendo, de forma gradativa, de acordo com cada realidade socioambiental.

• Entre os principais temas ligados à questão ambiental tratados na Agenda 21 brasileira, estão o fortalecimento de mecanismos institucionais, a conscientização ambiental, os processos participativos, entre outros.

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1 De acordo com a leitura feita até aqui sobre o desenvolvimento sustentável, como você percebe que ele vem sendo implementado em sua cidade? Cite exemplos de ações que são desenvolvidas para garantir o equilíbrio econômico social e ambiental.

2 Qual o conceito aproximado de “desenvolvimento sustentável” que o caderno propõe?

3 Qual a diferença entre crescimento e desenvolvimento, termos discutidos neste tópico?

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 4

A GESTÃO AMBIENTAL NA IMPLANTAÇÃO DO

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico trataremos da gestão ambiental como uma forma de implantar o desenvolvimento sustentável. Aqui apontaremos o que é e quais são os instrumentos que constituem a gestão ambiental. Posteriormente, saberemos como se organiza a gestão ambiental no Brasil.

2 A GESTÃO AMBIENTAL

A gestão ambiental é o processo de articulação das ações dos diferentes agentes sociais que interagem em um dado espaço, com vistas a garantir a adequação dos meios de exploração dos recursos ambientais – naturais, econômicos e socioculturais.

NOTA

Para entender melhor o conceito de gestão ambiental tratado pelos autores, observe a figura a seguir. A partir da figura, podemos entender que as instituições são os sujeitos responsáveis em fazer a gestão e os recursos naturais serão o foco ou o objeto da gestão.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

FIGURA 34 – INSTRUMENTO DE ANÁLISE SOBRE O CONCEITO DE GESTÃO AMBIENTAL

FONTE: Schult; Eduarte; Bohn (2006, p. 11)

A gestão ambiental é também uma atividade voltada à formulação de princípios e diretrizes, à estruturação de sistemas gerenciais e à tomada de decisões que têm por objetivo final promover, de forma coordenada, o inventário, o uso, controle, proteção e conservação do ambiente visando a atingir o objetivo estratégico do desenvolvimento sustentável.

Fazem parte da gestão ambiental:

• política ambiental: trata-se do conjunto de princípios doutrinários que venham ao encontro das necessidades sociais e governamentais no que diz respeito à regulamentação no uso, controle e proteção e conservação ambiental;

• planejamento ambiental: é o estudo que visa à adequação do uso, controle e proteção do meio ambiente. Ou seja, o planejamento visa à promoção da humanização da oferta e do uso dos recursos naturais no espaço e no tempo;

• gerenciamento ambiental: é o conjunto de ações destinadas a regular na prática operacional o uso, o controle, a proteção e conservação do ambiente e avaliar a conformidade da situação de acordo com os princípios doutrinários da política ambiental;

• modelo de gerenciamento ambiental: é o referencial teórico que orienta os procedimentos, os papéis e as participações dos diferentes agentes sociais envolvidos no gerenciamento ambiental;

• sistema de gerenciamento ambiental: é o conjunto de organismos, agências e instalações governamentais e privadas, com o objetivo de executar a política ambiental.

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TÓPICO 4 | A GESTÃO AMBIENTAL NA IMPLANTAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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FONTE: Schult; Eduarte; Bohn (2006, p. 11)

2.1 GESTÃO AMBIENTAL INTEGRADA

Quando pensamos em gestão ambiental, há um ponto fundamental que precisamos considerar para sua efetivação, na busca de soluções da crise socioambiental, e que diz respeito à gestão ambiental integrada.

IMPORTANTE

Em se falando de gestão ambiental integrada, Tucci e Mendes (2006) acreditam que a gestão dos recursos naturais deve levar em conta as interdependências das partes dos ecossistemas, bem como a ideia de que uma parte do sistema (por exemplo, uma área florestada) não pode ser gerida independentemente de outras partes do sistema (por exemplo, solos e águas). Ou seja, a gestão de recursos naturais deve levar em conta todos os seus aspectos que evolvem o meio natural.

À medida que todos os sistemas ecológicos são compostos de elementos bióticos, abióticos e antrópicos, a gestão integrada diz respeito a uma percepção mais clara da dinâmica interdependente dos sistemas ecológicos. Além disso, a gestão integrada pode assumir um perfil transdisciplinar, na medida em que se procura compatibilizar aquilo que tem constituído o objeto de estudo das ciências naturais (florestas, solos, águas, ar) com os vários aspectos relacionados à busca de satisfação de necessidades humanas fundamentais (economias locais, meios de subsistência, desenvolvimento) e também com processos participativos de tomada de decisão política.

Em resumo, uma gestão ambiental eficiente deve ser constituída por uma política ambiental, que estabelece as diretrizes gerais por um modelo de gerenciamento ambiental que oriente as ações gerenciais, e por um sistema de gerenciamento ambiental, que articula instituições e aplica os instrumentos legais e metodológicos para o preparo e execução do planejamento ambiental.

3 A GESTÃO AMBIENTAL NO BRASIL

O ponto de partida para a emergência da gestão ambiental no Brasil aconteceu na década de 30, com as primeiras ações em âmbito governamental. A legislação federal possuía 20 dispositivos legais, entre os quais destacamos alguns como: Código das Águas de 1934; Código Florestal de 1934; Legislação do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional criado em 1937; Código de Pesca instituído em 1938; Código de Mineração criado em 1940; Estatuto da Terra implantado em 1964.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

Estas são as principais leis deste período, que marcaram o surgimento de uma política de meio ambiente no Brasil. No entanto, Tucci e Mendes (2006) dizem que o referido aporte legal foi criado como meio regulatório, não com o enfoque de realmente preservar os recursos naturais, visto que o país estava, na época, envolvido com a industrialização. Para a legislação ambiental atribuiu-se a garantia de utilização dos recursos naturais para o progresso industrial.

Entretanto, como nas demais partes do mundo, foi a partir da década de 70, com a Conferência de Estocolmo, que o Brasil começou a tomar medidas realmente preventivas contra os problemas ambientais. Assim, o início da preocupação com os recursos naturais deu-se com o choque da crise do petróleo em 1973. Esta preocupação era a única ponte existente entre o movimento ecológico e os setores da tecnoburocracia estatal.

As três alternativas desenhadas para a crise do petróleo, porém, foram predatórias: a opção nuclear em grande escala através do acordo com a Alemanha; a energia de biomassa através de uma de suas formas ecologicamente mais perigosas, o álcool da cana-de-açúcar; e a aceleração na construção de grandes usinas hidroelétricas, sem avaliar precisamente seu impacto ambiental. Contudo, mesmo com essa prática contraditória, o Brasil cria a SEMA (Secretaria Especial de Meio Ambiente), em 1973, haja vista que, até esse momento, não possuía uma estrutura de governo responsável pelo meio ambiente como um todo.

Nesta época também foram instituídas as primeiras leis sobre poluição, como o Decreto nº 1.413, em 1975, visando ao controle da poluição provocada por atividades industriais.

3.1 A CRIAÇÃO DE UMA ESTRUTURA PARA A GESTÃO AMBIENTAL BRASILEIRA

Foi a partir da implantação da Secretaria de Meio Ambiente (SEMA) e da criação da Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA) que a gestão ambiental brasileira começa a se estruturar, através da Lei nº 6.938/81, que instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente, baseada nos seguintes objetivos: o desenvolvimento social, econômico e ambiental; a preservação e restauração dos recursos naturais; a pesquisa de tecnologia voltada à proteção ambiental.

Para colocar em prática esses objetivos, a política instituiu os seguintes instrumentos:

- o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental;

- o zoneamento ambiental;

- a avaliação de impactos ambientais;

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TÓPICO 4 | A GESTÃO AMBIENTAL NA IMPLANTAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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- o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras;

- os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologias voltadas para a melhoria da qualidade ambiental;

- a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo poder público federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas;

- o sistema nacional de informações sobre o meio ambiente;

- o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumento de Defesa Ambiental.

Além dos instrumentos que viabilizam a PNMA, conforme já citamos, a lei que institui essa política também prevê uma estrutura organizacional responsável em operacionalizar, ou seja, colocar em prática a política através dos seus instrumentos. Assim, a Lei nº 6.938/81, no mesmo ano da criação da PNMA, cria o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA).

O SISNAMA é um sistema que organiza as instituições responsáveis pela implementação da Política Nacional de Meio Ambiente.

ATENCAO

O SISNAMA é composto por órgãos da União, dos estados e dos municípios, como:

a) Conselho de Governo, órgão superior responsável por assessorar o Presidente em matérias ambientais;

b) Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), órgão deliberativo e consultivo com a finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente, bem como estabelecer e normatizar padrões de qualidade ambiental;

c) Secretaria de Meio Ambiente da Presidência da República, o órgão central com a finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e controlar a política nacional de meio ambiente;

d) Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), órgão executivo com a finalidade de fazer as diretrizes da política nacional de meio ambiente;

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144

UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

e) órgãos setoriais, com a finalidade de proteção ambiental ou dos recursos naturais; órgãos seccionais, órgãos e entidades estaduais responsáveis pela execução de políticas ambientais e pela fiscalização de atividades com potencial de degradação ambiental; e os órgãos locais, órgãos municipais com essas mesmas responsabilidades, sob a jurisdição do município.

Para melhor entender a estrutura que organiza os órgãos do SISNAMA, ou seja, os órgãos responsáveis em fazer a gestão ambiental em nosso país, observe no quadro a seguir como fica essa organização.

ATENCAO

QUADRO 12 – INSTRUMENTO DE ANÁLISE DO SISNAMA

NÍVEL DE ATUAÇÃO

ÓRGÃO QUE A EXERCE FUNÇÃO NO SISNAMA

ÓRGÃOS FEDERAIS

Conselho do Governo Assessorar o Presidente da República na formulação da PNMA.

Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA

Estudar e propor diretrizes e políticas governamentais e deliberar sobre normas, padrões e critérios de controle ambiental a ser concedido pela União, estados, Distrito Federal e municípios e supervisionado pelo próprio IBAMA. Incentivar a instituição e fortalecimento institucional dos Conselhos estaduais e municipais de meio ambiente.

Ministério do Meio Ambiente

Planejar, coordenar e supervisionar as ações da PNMA.

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais – IBAMA

Executar a PNMA e sua fiscalização.

ÓRGÃOSESTADUAIS

Conselho Estadual do Meio Ambiente – CONSEMA

Elaborar normas supletivas e complementares e padrões relacionados com o meio ambiente, observados os que forem estabelecidos pelo CONAMA.

Secretaria do Desenvolvimento Sustentável – SDS

Planejar, coordenar e executar políticas, programas e projetos das ações relacionadas à proteção ambiental. Composta pelas Diretorias: de Desenvolvimento das Cidades, de Meio Ambiente, de Saneamento e de Recursos Hídricos.

Fundação ou Secretaria Estadual de Meio Ambiente

Órgão ambiental estadual que faz fiscalização; licenciamento; pesquisas; gestão de Unidades de Conservação.

Polícia Ambiental – PA Organização policial militar responsável pela fiscalização da flora, fauna, mineração, poluição e agrotóxicos.

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TÓPICO 4 | A GESTÃO AMBIENTAL NA IMPLANTAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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QUADRO 12 – INSTRUMENTO DE ANÁLISE DO SISNAMA

FONTE: Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>. Acesso em: 22 set. 2012.

ÓRGÃOSMUNICIPAIS

Conselho Municipal do Meio Ambiente – CMMA

Elaborar normas supletivas e complementares e padrões relacionados com o meio ambiente, observando os que forem estabelecidos em níveis federal e estadual.

Organismos municipais de meio ambiente

Órgão ou entidade municipal responsável pela implementação da PNMA no âmbito local.

IMPORTANTE

O que você precisa lembrar quando pensar no SISNAMA é que em nível federal a hierarquia sempre será a mesma, conforme demonstrado no quadro anterior, porém, em nível estadual e municipal, essa estrutura ou hierarquia pode variar. Isso dependerá da forma de administração de cada estado ou município, mas, é claro, sempre respeitando o que está na Lei nº 6.938/81.

Como podemos notar, a aprovação da Lei nº 6.938/81 marca o início de uma nova fase na trajetória da gestão ambiental brasileira. A referida lei seria uma espécie de “guarda-chuva” para a organização da nossa política ambiental e introduziu aspectos importantes, como a descentralização das ações executivas, enfocando também a atuação dos estados e municípios, deixando a cargo da União apenas a edição de normas e a ação supletiva às demais esferas de governo.

Por outro lado, essa lei significou uma mudança de enfoque, pois a prioridade de ação de governo nos aspectos ambientais fica desvinculada do desenvolvimento econômico, procurando uma ação sistêmica de planejamento, prevenção e fiscalização dos serviços ambientais, dando ênfase à fiscalização das atividades produtivas.

4 A CONTRIBUIÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 PARA A GESTÃO AMBIENTAL

Vieira e Bredariol (2006) advertem que apenas uma definição geral de política ambiental e a distribuição de atribuições entre níveis de governo não são suficientes para implementar a política, mas, sim, torna-se necessário, também, a descentralização do próprio Estado e dos processos de gestão da política ambiental.

Neste sentido, acreditamos que um dos marcos importantes para a gestão ambiental no Brasil ocorreu quando a legislação ambiental passou a ter visibilidade na Constituição Federal de 1988, a partir do artigo 225, que trata do direito referente à preservação do meio ambiente.

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146

UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

De acordo com a Constituição Federal de 1988 (2007, p. 127), “[...] todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum ao povo, essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações”. A partir disso, inúmeras outras políticas foram criadas. Citam-se, como exemplo, a Lei nº 9.433/97, que dispõe sobre os recursos hídricos, como também a Lei de Crimes Ambientais nº 9.605/98.

Como podemos perceber, até a década de 70 o modelo de gestão baseava-se na concentração do poder decisório e executivo no nível do governo federal, mas em 1988 aumenta a participação dos estados e municípios, com a descentralização do poder de decisão dos municípios.

Como é apresentado no artigo 23, a Constituição Federal (1988) enfatiza o processo de descentralização no que diz respeito à responsabilidade de cada esfera de governo, atribuindo aos entes federados (União, estados e municípios) competências na execução da política ambiental de acordo com cada âmbito de atuação.

Considerando que um processo de descentralização não avançará se não houver uma redefinição dos espaços institucionais, foi necessário estabelecer competências comuns à União, aos estados, Distrito Federal e aos municípios, no que diz respeito à proteção ambiental, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, fauna e flora. No artigo 30, a Constituição reforça a ação municipal no âmbito ambiental quanto a legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar às legislações federal e estadual, no que couber.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico você viu:

• A criação das primeiras políticas ambientais no Brasil foi na década de 30, porém a sua implementação com caráter de proteção ambiental foi a partir da década de 1970, com a ampliação das leis ambientais. Apenas na década de 80, com a Lei nº 6.938/81, criou-se uma estrutura mais completa para a gestão ambiental.

• A Constituição Federal de 1988 é um marco importante na garantia da efetivação da gestão ambiental no Brasil, já que afirma em seu artigo 225 a necessidade da conservação ambiental e distribui responsabilidades para a sua implementação.

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Com base no texto desse tópico, responda:

AUTOATIVIDADE

1 Quais são os elementos envolvidos na gestão ambiental?

2 Entre os órgãos descritos a seguir, assinale aqueles que fazem parte do SNRH (Sistema Nacional de Recursos Hídricos):

a) ( ) Conselho Federal de Implantação de Unidades de Conservação.b) ( ) Organizações Civis de Recursos Hídricos. c) ( ) Comitê de Bacia Hidrográfica.d) ( ) Agência de Águas.

3 Conforme o que você viu sobre gestão ambiental, faça uma pesquisa e verifique como é feita a gestão ambiental em seu município. Observe se o seu município possui uma estrutura (política, secretaria ou conselho de meio ambiente) para fazer a gestão ambiental.

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TÓPICO 5

A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS

RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Historicamente, a falta de um planejamento ordenado com políticas públicas adequadas trouxe muitos problemas para a sociedade brasileira, entre eles os relacionados à água, como é o caso da degradação dos mananciais; contaminação dos rios por esgotos domésticos e industriais; falta de coleta e disposição do lixo urbano, entre outros.

Por isso, hoje, a gestão dos recursos hídricos e a conservação dos sistemas naturais constituem um desafio que deve levar em conta vários fatores que envolvem a problemática da água, e estes fatores relacionam-se às condições ambientais, econômicas, políticas, sociais e culturais.

Neste sentido, a Lei nº 9.433/97 foi criada para dar um novo direcionamento, estabelecendo as regras, procedimentos e competências na gestão dos recursos hídricos no Brasil.

Os pontos fundamentais da lei são: a gestão da água deverá ser realizada por bacia hidrográfica, a água passa a ter valor econômico e a gestão deve ser integrada, descentralizada e participativa, sendo os Comitês de Bacia os principais protagonistas.

Ocupando espaço importante no cenário da gestão, os Comitês de Bacia possuem como principal função orientar o uso e a proteção da água no território da bacia hidrográfica.

Atualmente, a situação da qualidade da água tem sido a grande preocupação, já que se constitui num dos recursos vitais para a existência de qualquer espécie de vida.

Neste sentido, os impactos ambientais têm demandado ações de prevenção, controle, conservação e recuperação da qualidade e quantidade da água dos corpos hídricos, questões estas que poderão ser alcançadas através da gestão de recursos hídricos, como veremos agora a partir deste tópico.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

2 O INÍCIO DAS DISCUSSÕES SOBRE A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS

NOTA

Agora que você já viu como se deu a emergência da questão ambiental e observou que a gestão ambiental é apontada como proposta de superação dos problemas ambientais criados, passaremos a apresentar como se deram as primeiras discussões sobre a problemática dos recursos hídricos e, posteriormente, abordaremos a gestão de recursos hídricos em nosso país.

O início do século XXI é marcado pelas preocupações em nível mundial no intuito de procurar maior eficiência no uso dos recursos hídricos, dentro, é claro, dos princípios básicos da sustentabilidade ambiental. Tucci e Mendes (2006) lembram que as Nações Unidas definiram, entre as chamadas metas do milênio, a redução da pobreza, focada principalmente na disponibilidade de água e oferta de saneamento básico.

Estas metas foram consolidas em Joanesburgo, na África, e discutidas em diferentes fóruns e também na 3ª Conferência Mundial da Água, em Kyoto, em 2003. Em resumo, no que se refere aos recursos hídricos, essas metas estabelecem que se deve procurar reduzir pela metade o número de pessoas sem água potável e saneamento até o ano de 2015.

Para buscar atender essas metas, inúmeras ONGs internacionais, como a International Water Resource Association, por exemplo, buscam impulsionar o gerenciamento integrado dos recursos hídricos como meio de busca da sustentabilidade hídrica.

Para que as metas de sustentabilidade dos recursos hídricos sejam cumpridas, as Nações Unidas aprovaram em 2000 os objetivos e metas a serem atingidos até 2015, quando, naquela oportunidade, a maioria dos países, entre eles o Brasil, se comprometeu a atuar para: erradicar a pobreza extrema e a fome (sustentabilidade humana); obter o ensino primário universal (educação); promover a igualdade entre gênero e a autonomia da mulher; reduzir a mortalidade infantil (saúde); garantir a sustentabilidade do meio ambiente (ambiente); fomentar uma associação mundial para o desenvolvimento.

Para atingir essas metas, o Brasil criou um sistema institucional (uma política e um sistema de gerenciamento dos recursos hídricos), o qual passaremos a ver a seguir.

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TÓPICO 5 | A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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3 A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

A Política Nacional de Recursos Hídricos, defendida através da Lei nº 9.433/97, apresenta como premissa que a água é um recurso natural, de domínio público, finito e dotado de valor econômico, cujo uso, em caso de escassez, se restringe ao consumo humano e à dessedentação de animais.

Sua gestão deverá priorizar o uso múltiplo, e a bacia hidrográfica deverá ser adotada como unidade de planejamento e gerenciamento, com gestão descentralizada e participativa da sociedade organizada. Por ser um recurso natural finito em qualidade, o objetivo desta lei é assegurar água em quantidade e qualidade para as gerações futuras.

3.1 LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE PROTEÇÃO AOS RECURSOS HÍDRICOS

Para Meurer (2011, p. 20):

[...] o debate técnico e jurídico entre exploração e conservação dos recursos hídricos no Brasil se consolida legalmente em 1934, pelo Decreto Federal nº 24.643, que instituiu o Código das Águas, regulamentando a classificação e utilização dos corpos d’água. Porém, foi a partir de 1990 que o governo instituiu medidas de políticas públicas voltadas para o uso das bacias hidrográficas. Assim sendo, foi adotado como unidade de planejamento e gestão especialmente voltada aos recursos hídricos, através da Lei no 9.433/97, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos (BRASIL, 1997). Entre as diretrizes gerais dessa política é importante destacar a integração do planejamento e a gestão dos recursos hídricos, onde no art. 33 foi instituído o Conselho Nacional de Recursos Hídricos nos estados, o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) e os Comitês de Bacias Hidrográficas dos rios federais e estaduais (CBHEs), gerenciados por órgãos estaduais e municipais e, ainda, as Agências de Águas.

Contudo, somente no ano 2000 ocorre a implantação da Agência Nacional de Águas (ANA), através da Lei no 9.984/2000, contribuindo como entidade federal do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SNGRH), para fins de gerenciar e regularizar ações voltadas para conservação dos recursos hídricos de todo o território brasileiro.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

NOTA

A adoção de uma política pública voltada à conservação das águas se estabelece através da Resolução CONAMA nº 303/2002, referente ao Código Florestal, que constitui Áreas de Preservação Permanente (APPs), pois são áreas que possuem funções ecológicas específicas.

De acordo com o Código Florestal, Lei nº 4.771 (BRASIL, 1965), são consideradas APPs “[...] as áreas cobertas ou não por vegetação nativa, com a função de preservar recursos hídricos, paisagem, mantendo a estabilidade geográfica, biodiversidade, o fluxo gênico da fauna e flora, protegendo o solo e assegurando o bem-estar da população”.

São consideradas como APPs as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: 1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura; 2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; 3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura; 4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; 5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros ao redor de lagoas, lagos ou reservatórios d’água naturais ou artificiais; b) redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais; c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d'água", qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura; d) no topo de morros, montes, montanhas e serras; e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive; f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação. (BRASIL, 1965).

UNI

Caro(a) acadêmico(a), acesse o site <http://www2.planalto.gov.br/imprensa/noticias-de-governo/novo-codigo-florestal-brasileiro-e-sancionado-com-vetos> e saiba o que mudou com o novo Código Florestal brasileiro a partir de 2013.

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TÓPICO 5 | A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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A gestão dos recursos hídricos no Brasil, até a década de 80, era realizada de forma setorial, sem nenhuma integração. Os setores atuantes eram os setores de energia, irrigação, meio ambiente. Dentro do contexto institucional, existia apenas o Código de Águas aprovado em 1934.

A base de dados hidrológicos estava no Ministério de Minas e Energia, e os projetos eram desenvolvidos com um único objetivo e sem visão de bacia, por entidades setoriais e com limitada visão ambiental.

Mais tarde, com a Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, se estabelecem novos procedimentos a serem adotados na gestão da água. Pontos centrais desta lei são que a gestão da água deverá ser realizada por bacia hidrográfica e que a água passa a ter valor econômico, mas que, no entanto, por isso o gerenciamento de recursos hídricos deve levar em conta os usos múltiplos da água e a desigual distribuição dos recursos hídricos no espaço brasileiro.

UNI

Prezado(a) acadêmico(a): para você ter uma visão geral da trajetória dos recursos hídricos no Brasil, veja o quadro a seguir.

QUADRO 13 – TRAJETÓRIA HISTÓRICA DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

FASE PERÍODO CARACTERÍSTICAS

I Setorial Até 1997 Desenvolvimento setorial dos recursos hídricos

II Instituição do marco legal integrador nacional 1997 - 2000

Lei Nacional dos Recursos Hídricos, instituição do Conselho de Recursos Hídricos e da Agência Nacional de Água

III Descentralização e regulamentação setorial 2000

Desenvolvimento institucional dos estados, criação de Comitês de Bacias

FONTE: Tucci e Mendes (2006) (Neste quadro não entra o Código das Águas de 1934.)

O quadro anterior poderá ser melhor compreendido com o próximo quadro dos modelos de gestão dos recursos hídricos adotados no Brasil.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

QUADRO 14 – MODELOS DE GESTÃO EM RECURSOS HÍDRICOS

MODELOS CARACTERÍSTICAS PERÍODO

Burocrático Centralizado no Estado, instrumentos de comando e controle

1930 até 1970

Econômico-financeiro

Planejamento estratégico, instrumentos econômicos, tecnocracia

1970 até 1997, criação da Lei nº 9.433

Sistêmico

Descentralizado, compartilhamento do planejamento, instrumentos econômicos, gestão participativa

1997 até os dias atuais, com a implementação da Lei de Recursos Hídricos.

FONTE: Adaptado de Setti et al. (2001) apud Souza Júnior e Fidelman (2009)

4 A ESTRUTURA DO SISTEMA DE GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

Lembra quando falamos da Constituição Federal de 1988, que foi um marco importante na gestão ambiental? Então, esse marco se reflete no sistema de gestão dos recursos hídricos. Os princípios da Constituição se evidenciam tanto na formulação da política, pois foi com base no seu artigo 225 que os objetivos da Política de Recursos Hídricos foram formulados, quanto na sua implementação, pensada a partir do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, que seguiu a lógica da descentralização do poder de decisão, artigo 23 da Constituição Federal de 1988. Veja a seguir.

A Constituição Federal de 1988 introduziu um avanço importante em relação à gestão dos recursos hídricos no Brasil, ao considerar a água um bem público e ao instituir o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH). Essas medidas foram consolidadas na forma da Lei nº 9.433/97, que estabeleceu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos: a água é um bem de domínio público; a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico; em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais; a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas; a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos; a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do poder público, dos usuários e das comunidades.

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TÓPICO 5 | A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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QUADRO 14 – MODELOS DE GESTÃO EM RECURSOS HÍDRICOS

FONTE: Adaptado de Setti et al. (2001) apud Souza Júnior e Fidelman (2009)

Criada em 1997, a Política Nacional de Recursos Hídricos tem dois grandes objetivos: (1) assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, tendo em vista o desenvolvimento sustentável; (2) a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos (secas e inundações).

Para efetivar seus objetivos, a referida política instituiu os seguintes instrumentos:

• os Planos de Recursos Hídricos: nestes planos estão o Plano Nacional de Recursos Hídricos, Planos Estaduais e os Planos de Recursos Hídricos de Bacia. Esses planos devem buscar uma visão de longo prazo e compatibilizar aspectos quantitativos e qualitativos da água;

• o enquadramento dos corpos de água em classes segundo os usos preponderantes da água: trata da definição da compatibilidade da água e seus usos. Busca a minimização dos impactos sobre a água;

• a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos: serve para assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água;

• a cobrança pelo uso de recursos hídricos: visa incentivar o uso racional da água e reconhecer a água como um recurso natural dotado de valor econômico, além de dar sustentabilidade econômica ao funcionamento do comitê e agência da bacia;

• o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos: é um sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos. Um dos objetivos deste sistema é reunir, dar consistência e divulgar os dados e informações sobre a situação qualitativa e quantitativa dos recursos hídricos no Brasil.

NOTA

Lembra que a Política Nacional de Meio Ambiente criou um Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA) para organizar os órgãos de acordo com sua competência para executar a gestão ambiental? Então, de igual forma, a Política de Recursos Hídricos também criou um sistema para organizar os órgãos que irão implementar a gestão dos recursos hídricos, é o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SNRH. Este sistema é que veremos agora.

Conforme a Lei nº 9.433/97, seguem os órgãos, de acordo com sua hierarquia dentro do Sistema Nacional de Recursos Hídricos (veja o fluxograma a seguir):

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

FIGURA 35 – FLUXOGRAMA DO SINGREH

FONTE: Adaptado de: <http://www.mma.gov.br/agua/recursos-hidricos/sistema-nacional-de-gerenciamento-de-recursos-hidricos>. Acesso em: 24 maio 2013.

1 - Conselho Nacional de Recursos Hídricos: a quem cabe decidir sobre as grandes questões do setor, além de dirimir as contendas de maior vulto.

2 - Agência Nacional de Água: é uma autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de implementar em nível nacional a Política Nacional de Recursos Hídricos.

3 - Conselhos Estaduais: a quem cabe decidir sobre as grandes questões do setor, além de dirimir as contendas de maior vulto em nível de estado.

4 - Comitês de Bacias Hidrográficas: são um tipo de organização nova com relação à administração dos bens públicos no Brasil, os quais contam com a participação dos usuários, das prefeituras, da sociedade civil organizada, dos demais níveis de governo (estaduais e federal), tendo como objetivo agir como o “parlamento das águas da bacia”, pois seriam esses comitês o fórum de decisão no âmbito de cada bacia hidrográfica.

4 - Agências de Água: sendo estas um tipo de organismo como o braço técnico de seus correspondentes comitês, destinado a gerir os recursos oriundos da cobrança pelo uso da água, desenvolvendo a chamada “engenharia” do sistema.

5 - Organizações Civis de Recursos Hídricos: são entidades atuantes no setor de planejamento e gestão do uso dos recursos hídricos e que podem ter destacada participação no processo decisório e de monitoramento das ações.

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TÓPICO 5 | A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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Então, agora vamos apresentar, no quadro a seguir, como se organizam as instituições do Sistema Nacional de Recursos Hídricos (SINGREH) para fazer funcionar a Política de Recursos Hídricos, de acordo com a sua hierarquia.

NÍVEL DE ATUAÇÃO ÓRGÃO QUE A EXERCE Função no SINGREH

ÓRGÃOS FEDERAIS

Conselho Nacional de Recursos Hídricos – CNRH

Cabe decidir sobre as grandes questões do setor, além de dirimir as contendas de maior vulto.

Agência Nacional de Água – ANA

Implementar em nível nacional a Política Nacional de Recursos Hídricos.

ÓRGÃOSESTADUAIS

Conselhos Estaduais – CERH

Cabe decidir sobre as grandes questões do setor, além de dirimir as contendas de maior vulto em nível de estado.

Fundos Estaduais de Recursos Hídricos

Cabe dar o suporte financeiro ao sistema de gestão das águas.

Comitês de Bacias Hidrográficas

Agir como o “parlamento das águas da bacia”, pois seriam esses comitês o fórum de decisão no âmbito de cada bacia hidrográfica.

Agências de Água Gerir os recursos oriundos da cobrança pelo uso da água, desenvolvendo a chamada “engenharia” do sistema.

Organizações Civis de Recursos Hídricos

Atuar no setor de planejamento e gestão do uso dos recursos hídricos com destacada participação no processo decisório e de monitoramento das ações.

Agências de Água ou de Bacia São o braço executivo dos comitês de bacia.

FONTE: Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/l9433.htm>. Acesso em: 22 set. 2012.

QUADRO 15 – INSTRUMENTO DE ANÁLISE DO SINGREH

Você deve ter percebido que as atribuições vão até o nível estadual, não aparecendo a figura dos municípios. Você sabe por quê? A gestão da água se dará por bacia hidrográfica e a abrangência de uma bacia hirdográfica, na maioria das vezes, ocorre em vários municípios, ou seja, diferentemente dos municípios, por apresentarem fronteiras político-administrativas.

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UNIDADE 2 | GESTÃO DE RECURSOS

Os rios não possuem essas fronteiras, mas sim a sua delimitação deve ser de ordem física, já que um mesmo rio pode fazer divisa com vários municípios. Por isso, a gestão da água precisa ser pensada em nível regional ou estadual, mas, é claro, os municípios possuem, de igual forma, as suas responsabilidades em realizar ações de preservação dos recursos hídricos.

O esquema a seguir traz uma visão geral da estrutura, a política e os órgãos executores, da gestão dos recursos hídricos em nosso país. Observe.

FIGURA 36 – FLUXOGRAMA COM VISÃO ESQUEMÁTICA DA ESTRUTURA DA LEI Nº 9.433/97

FONTE: Adaptado de: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/l9433.htm>. Acesso em: 23 mar. 2013.

DICAS

Para aprofundar seus conhecimentos sobre a Política Nacional de Recursos Hídricos, consulte a Lei nº 9.433/97. Nesta lei você poderá observar de forma mais abrangente a competência de cada órgão ou instituição responsável em implementar a política de recursos hídricos. A lei encontra-se disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/l9433.htm>.

Lei no 9.433/97

Política Nacional de Recursos Hídricos

Fundamentos

Domínio Público

Valor Econômico

Uso Prioritário

Uso Múltiplo

Bacia Hidrográfica

Gestão Descentralizada e

Participativa

Desenvolvimento Sustentável

Prevenção e Defesa contra

Eventos Hidrológicos

Críticos

Quantidade/Qualidade

Adequação às Diversidades

Físicas...

Integração Gestão

Ambiental

Articulação Uso do solo

Objetivos Diretrizes Instrumentos

Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

Planos de Rec. Hídricos

Enquadramento

Outorga

Cobrança

Sistema de Informações

Agências de Água

Comitês de Bacia

Agência Nacional de Águas

Conselho Estadual de Rec. Hídricos

Órgãos Públicos Relacionados a

Recursos Hídricos

Conselho Nacional de Rec. Hídricos

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TÓPICO 5 | A GESTÃO AMBIENTAL PARA A SUSTENTABILIDADE DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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Enfim, podemos dizer que o Brasil criou uma política pública para gerenciar suas águas, que pouco a pouco vai sendo incorporada pela sociedade, que se organiza em comitês de bacia hidrográfica para cuidar da água.

A Lei nº 9.433/97 promoveu uma descentralização na gestão da água. A partir da citada lei, a gestão deixa de ser de competência exclusiva do poder público, podendo passar para a esfera local de cada bacia hidrográfica. E para que isso seja possível, a referida lei estabeleceu um arranjo institucional, claro, ou seja, uma estrutura administrativa baseada na organização da gestão compartilhada do uso da água.

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RESUMO DO TÓPICO 5

Neste tópico você viu:

• No Brasil, até a década de 80 a gestão dos recursos hídricos era realizada de forma setorial, sem nenhuma integração. Dentro do contexto institucional, existia apenas o Código de Águas aprovado em 1934.

• Com a Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, se estabelecem novos procedimentos a serem adotados na gestão da água. Pontos centrais desta lei: a gestão da água deverá ser realizada por bacia hidrográfica, de forma integrada, descentralizada e dotada de valor econômico.

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1 Segundo a Lei nº 9.433/97, são objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos:

a) ( ) Assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, tendo em vista o desenvolvimento sustentável.

b) ( ) Proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas.c) ( ) Prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos.d) ( ) Promover a educação ambiental de maneira integrada aos programas

educacionais que desenvolvem.

AUTOATIVIDADE

2 Pontue os instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos.

3 Complete as questões a seguir:

a) De acordo com a Lei nº 9.433/97, a hierarquia do sistema nacional de recursos hídricos envolve as seguintes entidades: Conselho Nacional de Recursos Hídricos, Agência Nacional de Águas, Conselhos Estaduais, _______________________, Agência de Água e Organizações Civis de Recursos Hídricos.

b) Os Comitês de Bacias são um colegiado que envolve o poder público, os usuários de água, as ONGs e em especial a ________________.

c) A Agência de Água de um Comitê de Bacia é uma entidade responsável por gerir a ________________ pelo uso da agua em uma bacia.

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UNIDADE 3

A IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO PARTICIPATIVA E DESCENTRALIZADA DOS

RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade, você será capaz de:

• compreender o funcionamento dos Comitês de Gerenciamento de Recur-sos Hídricos e sua importância e objetivos na gestão da água;

• refletir sobe a importância da participação social na gestão pública dos recursos hídricos no Brasil;

• conhecer a experiência de gestão dos recursos hídricos no Brasil.

Esta unidade está organizada em cinco tópicos. No final de cada um deles, você encontrará atividades que reforçarão o seu aprendizado.

TÓPICO 1 – PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS: INSTRUMENTO ORIENTADOR DAS AÇÕES DOS COMITÊS DE BACIAS

TÓPICO 2 – GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM VIÉS DOS COMITÊS DE BACIA

TÓPICO 3 – OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DA ÁGUA

TÓPICO 4 – DESAFIOS E AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

TÓPICO 5 – A INSERÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL – PELA CONSERVAÇÃO DA ÁGUA

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TÓPICO 1

PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS: INSTRUMENTO

ORIENTADOR DAS AÇÕES DOS COMITÊS DE BACIAS

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

O Plano de Recursos Hídricos é o instrumento orientador dos Comitês de Bacia na gestão dos recursos hídricos. O processo de construção do Plano configura-se como um exercício que objetiva alcançar o desenvolvimento sustentável, englobando ações ambientalmente sustentáveis, economicamente viáveis e socialmente justas. Isso é o que veremos neste tópico.

IMPORTANTE

Como você viu, a Lei nº 9.433/97, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) e estabelece seis instrumentos da política, entre os quais se encontram os Planos de Recursos Hídricos. São estabelecidos três recortes geográficos para o planejamento de recursos hídricos: o nacional, os estaduais e o das bacias hidrográficas. Mas o que podemos entender por plano de recursos hídricos, também chamados de plano de bacia? Leia a seguir.

2 O PLANO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS

Os planos de recursos hídricos visam fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional e do Gerenciamento dos Recursos Hídricos, ou seja, em resumo, é um planejamento estratégico, que estabelece diretrizes, metas e programas pactuados de forma democrática entre os diversos atores sociais e políticos envolvidos, por meio de um amplo processo de discussão, para a tomada de decisão em prol dos recursos hídricos da bacia hidrográfica a qual está em discussão.

O Plano Nacional de Recursos Hídricos visa à base do desenvolvimento sustentável, que é de assegurar às atuais e futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos usos múltiplos e sua utilização racional.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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IMPORTANTE

Importante lembrarmos que em um Comitê de Bacia se inserem inúmeras microbacias, e, uma vez formulado o Plano de Bacia do Comitê X, haverá ações para todas as microbacias contíguas.

A gestão integrada que se discute dentro dos Comitês de Bacia tem como finalidade estabelecer um cenário que concilie a proteção dos ecossistemas, os interesses dos usuários da água, o atendimento às necessidades humanas e o controle de riscos de eventos hidrológicos.

A Lei nº 9.433/97 de recursos hídricos estabelece que os Planos de Bacia sejam de longo prazo, impondo um conteúdo mínimo, como:

a) a situação atual dos recursos hídricos, ou seja, o diagnóstico da bacia hidrográfica em questão;

b) a análise de alternativas de crescimento demográfico de evolução de atividades produtivas e a de modificação dos padrões de ocupação do solo;

c) o balanço entre disponibilidade e consumo futuro dos recursos hídricos, em quantidade e qualidade, com análise de risco de conflitos;

d) metas de racionalização de uso, aumento da quantidade e melhoria da qualidade dos recursos.

Nesta perspectiva, são especialmente consideradas as alternativas de harmonização e adequação das políticas públicas e privadas, objetivando o uso racional da água, além da necessária articulação entre os diferentes níveis de planejamento no que se refere à gestão de recursos hídricos.

O eixo central do Plano Nacional de Recursos Hídricos corresponde à elaboração de cinco etapas de planejamento, onde os volumes a serem produzidos correspondem ao resultado de um processo dinâmico e participativo e sua elaboração sustenta-se em dois eixos básicos inter-relacionados: um em produção de informações técnicas e o outro em processo de discussão com a sociedade.

As etapas de discussões do plano serão balizadas através de estudos técnicos previamente desenvolvidos e disponibilizados aos diversos atores que participarão do processo de construção do documento.

De acordo com a Lei nº 9.433/97, o documento formal do Plano Nacional pode ser assim definido:

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TÓPICO 1 | PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS: INSTRUMENTO ORIENTADOR DAS AÇÕES DOS COMITÊS DE BACIAS

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1) panorama nacional dos recursos hídricos: estabelecer um panorama geral sobre os recursos hídricos do país;

2) o estado dos recursos hídricos do Brasil: avaliar quanto à disponibilidade quali-quantitativa e suas demandas pelo uso da água, com análise retrospectiva e avaliação dos referidos assuntos analisados, com estratégia dos atores envolvidos, apontando conflitos e parcerias pelo uso dos recursos hídricos;

3) água para o futuro: uma visão para 2020: apresentar os cenários prováveis de prognóstico;

4) diretrizes e metas: estabelecer as diretrizes de abrangência nacional para efetivar a gestão integrada e as metas em curto, médio e longo prazo;

5) programas nacionais e regionais: estabelecer medidas e programas estruturais e não estruturais a ser implementados em nível nacional e em regiões hidrográficas.

O método a ser implementado para o desenvolvimento do plano associa-se à produção documental de acordo com as etapas de discussão, por assim dizer, que cria condições para o acompanhamento e validação gradativa dos resultados parciais dos estudos, por parte dos envolvidos.

Essa metodologia permite, além da inclusão dos atores do SINGREH no processo, identificar ajustes necessários e realizar correções quando estes sejam pertinentes, de acordo com os anseios da sociedade.

Veja agora a estruturação político-administrativa do Plano Nacional de Recursos Hídricos.

Quanto ao arranjo institucional para a elaboração do Plano Nacional de Recursos Hídricos, foi através da Resolução do Conselho Nacional de Recursos Hídricos – CNRH nº 4, de 10 de junho de 1999, que foi instituída a Câmara Técnica do Plano Nacional de Recursos Hídricos (CT-PNRH), com a atribuição de acompanhar, analisar e emitir parecer sobre o plano.

UNI

Procure o Comitê de Bacias Hidrográficas do seu município e faça parte da Câmara Técnica de Bacias Hidrográficas. Acesse o site do governo federal e saiba mais: <http://www.cbh.gov.br/>.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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Considerando a importância de articulação das organizações que compõem o SINGREH, a CT-PNRH e o CNRH, criou-se o Grupo Técnico de Coordenação e Elaboração do Plano – GTCE, composto pela Secretaria de Recursos Hídricos – SRH e pela Agência Nacional de Água – ANA.

O GTCE/PNRH configura-se como o “Núcleo Executor do Plano Nacional de Recursos Hídricos”, com a função de suporte à sua execução técnica.

Cabe à SRH/MMA (Ministério do Meio Ambiente) coordenar o processo de construção do Plano e monitorar sua implementação, viabilizando financeiramente sua elaboração e promovendo a articulação político-institucional para o seu desenvolvimento.

DICAS

Leia a seguir um fragmento importante sobre o assunto. Para saber mais, acesse o endereço citado na fonte.

LEITURA COMPLEMENTAR

FUNDAMENTOS DO PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SÃO FRANCISCO

Historicamente, as bacias hidrográficas de um país sempre foram consideradas como áreas privilegiadas para a promoção do desenvolvimento regional e para acelerar o processo de integração nacional. Essa prioridade dada às bacias hidrográficas nos sistemas de planejamento nacional do desenvolvimento regional se explica pelos seguintes motivos:

• em geral, as bacias hidrográficas apresentam uma intensa e diversificada base de recursos naturais, renováveis e não renováveis, a qual pode servir de apoio para a promoção de projetos de investimentos diretamente produtivos;

• a existência de uma inequívoca potencialidade de desenvolvimento nas áreas de influência das bacias hidrográficas cria uma justificativa de racionalidade econômica para a alocação de investimentos de infraestrutura, por parte do poder público;

• usualmente, as bacias hidrográficas, pela sua localização e pela sua extensão geográfica, são capazes de contribuir para a integração territorial e dos mercados internos de um país.

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TÓPICO 1 | PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS: INSTRUMENTO ORIENTADOR DAS AÇÕES DOS COMITÊS DE BACIAS

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Bacias hidrográficas de maior dimensão, quando tratadas de forma sustentável, contribuem para o equilíbrio dos ecossistemas do país. Embora o Plano Decenal de Recursos Hídricos da Bacia do Rio São Francisco – PBHSF (2004-2013) – possa contribuir para objetivos múltiplos do sistema nacional de planejamento (gerar excedentes exportáveis indispensáveis ao equilíbrio das nossas contas externas, atenuar os desequilíbrios de desenvolvimento econômico e social entre as regiões brasileiras, melhorar as condições de vida dos habitantes em suas áreas de influência), tem como foco o estabelecimento de um conjunto de ações regulatórias e programa de investimentos, por meio de uma agenda transversal entre órgãos da administração pública, para viabilizar um conjunto de ações estratégicas com os seguintes objetivos:

• implementar o SIGRHI – Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos da Bacia;

• estabelecer diretrizes para a alocação e uso sustentável dos recursos hídricos na Bacia;

• definir a estratégia para revitalização, recuperação e conservação hidroambiental da Bacia;

• propor programa de ações e investimentos em serviços e obras de recursos hídricos, uso da terra e saneamento ambiental.

O plano não é, pois, um plano de desenvolvimento regional integrado com suas diferentes dimensões (sociais, econômicas, institucionais), nos moldes dos tradicionais PDRIs, mas constitui-se em um dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei nº 9.433/97, que tem como um de seus princípios exatamente a adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento. Embora a ênfase seja na gestão dos recursos hídricos, a perspectiva conceitual do plano é sempre a de desenvolvimento sustentável da bacia.

A gestão dos recursos hídricos no país se organiza estruturalmente através do Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos em três âmbitos (nacional, estadual e bacia hidrográfica).

No âmbito nacional, tem-se o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), que é o órgão mais expressivo da hierarquia do SIGRHI, possuindo caráter normativo e deliberativo. Como Secretaria Executiva do CNRH atua a Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente (SRH/MMA), a qual possui, entre outras funções, a de formular a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH). A Agência Nacional de Águas (ANA), autarquia especial vinculada ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), possui, dentro do SIGRHI, a função de implementar a PNRH e sua atuação é desenvolvida em articulação com órgãos e entidades públicas e privadas. No âmbito dos estados, a estrutura é similar, com a formação de Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos (CERH) e a presença de órgãos executivos estaduais.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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No âmbito das bacias hidrográficas, o principal órgão é o Comitê de Bacia. Os comitês são compostos por representantes dos poderes públicos federal, estadual e municipal e por representantes da sociedade civil e dos usuários de água. Na sua área de atuação, entre outras funções, promove o debate das discussões relacionadas com os recursos hídricos, contribuindo para o caráter participativo da sua gestão. O comitê possui, como órgão executivo, a Agência de Bacia, que tem suas atividades relacionadas com a ANA e os órgãos estaduais.

O fato de não ser um plano de desenvolvimento regional integrado não diminui as interfaces do Plano de Bacia. A Lei nº 9.433/97, em suas diretrizes gerais de ação para a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, estabelece uma série de relações a serem observadas na gestão e no planejamento de recursos hídricos.

Além do Plano de Recursos Hídricos, a Política Nacional de Recursos Hídricos prevê outros instrumentos que devem ser utilizados para viabilizar sua implantação. Esses instrumentos de gestão podem ser divididos em três categorias: técnica, econômica e estratégica. Os principais instrumentos técnicos são:

• Plano de Recursos Hídricos;

• enquadramento dos corpos d’água, que visa ao estabelecimento do nível de qualidade (classe) a ser alcançado ou mantido em um segmento de corpo d’água ao longo do tempo;

• outorga, que é o ato administrativo que autoriza, ao outorgado, o uso de recursos hídricos, nos termos e condições expressos no ato de outorga;

• sistema de informações, que consiste em um sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos e fatores intervenientes em sua gestão.

[...]

FONTE: Adaptado de: PROJETO de gerenciamento integrado das atividades desenvolvidas em terra na bacia do São Francisco. Disponível em: <http://www.ana.gov.br/prhbsf/arquivos/Sintese_Resumo_Exec.pdf>. Acesso em: 2 dez. 2012.

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Neste tópico, você viu:

• O Plano de Recursos Hídricos é o instrumento orientador dos Comitês de Bacia na gestão da água. O processo de construção do PNRH configura-se como um exercício em prol do alcance do desenvolvimento sustentável.

• A estrutura central do Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) corresponde à elaboração de cinco volumes de documentos, com as etapas de planejamento. Os volumes a serem produzidos correspondem ao resultado de um processo dinâmico e participativo em dois eixos básicos inter-relacionados: (1) produção de informações técnicas e (2) o processo de discussão com a sociedade.

RESUMO DO TÓPICO 1

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De acordo com o que você viu neste tópico, responda às seguintes questões:

AUTOATIVIDADE

2 Quais são os cinco volumes que fazem parte do conteúdo do Plano Nacional de Recursos Hídricos?

3 Qual é a importância do Plano de Recursos Hídricos para a gestão da água?

1 Qual é o instrumento orientador das ações do comitê e para que serve?

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TÓPICO 2

GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM VIÉS DOS

COMITÊS DE BACIA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Sendo a água um bem público, dotado tanto de valor social quanto econômico, os interesses envolvidos são múltiplos na gestão do uso e aproveitamento desse recurso. Por isso, a Política Nacional para gerenciamento dos recursos hídricos em processo de implementação no Brasil prevê a ação integrada entre as diversas instâncias, poder público, usuários de água e sociedade civil, como base fundamental para a resolução dos problemas ambientais da atualidade, na administração, gerenciamento e proteção dos recursos hídricos.

Com isso, através de legislação específica, os Comitês de Bacia Hidrográfica, também conhecidos como “Parlamento das Águas”, são colocados na condição de linha de frente na implementação da gestão integrada e participativa dos recursos hídricos.

Como já mencionamos, o processo de gestão dos recursos hídricos está diretamente ligado ao novo formato atribuído à gestão pública, impulsionada pela Constituição Federal de 1988.

Por isso, não dá para falar da implementação da gestão de recursos hídricos sem antes conhecer um dos importantes protagonistas desse novo formato de gestão, que são os Comitês de Gerenciamento de Recursos Hídricos, denominados Comitês de Bacias. Esses comitês são a base, ou linha de frente, para fazer acontecer a gestão da água.

Vamos ver por quê?

2 OS COMITÊS DE GERENCIAMENTO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS

O Comitê de Bacias Hidrográficas é um órgão colegiado, relativamente novo para a realidade dos órgãos públicos no Brasil. Conta com a participação dos usuários de água, que representam 40% (a exemplo das companhias municipais de água), da sociedade civil organizada contando com 20% (através de associações de bairros, ONGs, entre outros), de representantes de governos municipais

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

(secretarias municipais de Meio Ambiente), estaduais (órgãos responsáveis como FATMA) e federal (IBAMA, ANA). Esses três últimos não poderão ultrapassar 40% com representatividade dentro dos comitês de bacias.

NOTA

Se você quiser saber mais a respeito da formação de um Comitê de Bacia, acesse ao site do governo da Paraíba, lá você encontrará informações valiosas e de forma bem didática: <http://www.aesa.pb.gov.br/comites/paraiba/cartilhas/Cartilha_5.pdf>.

Os comitês de bacias atuam como "Parlamento das Águas", ou seja, um fórum de discussões e decisões no âmbito de domínio de cada bacia hidrográfica.

Como já sabemos, uma bacia hidrográfica poderá envolver diversos municípios, estados e até mesmo outros países, pois sua delimitação é de ordem natural através dos divisores de água, portanto os comitês poderão ser compostos por rios de domínio da União e, com isso, representantes da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e representantes da sociedade, tais como usuários das águas de sua área de atuação, e das entidades civis que estão inseridas na bacia.

Quando uma bacia hidrográfica envolve outros países, no caso de rios fronteiriços ou transfronteiriços, faz-se necessário incluir no comitê representantes do Ministério de Relações Exteriores, assim como nos comitês que abranjam terras indígenas, representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e representantes das respectivas comunidades indígenas.

Esta norma estabelece diretrizes, ou seja, dita as regras para a formação e funcionamento dos Comitês de Bacia, representando um avanço na participação da sociedade civil e assegurando uma governabilidade mais transparente e democrática.

NOTA

Lembra-se dos 40%, 20% e 40%, dos representantes nos comitês? Foi através do Conselho Nacional de Recursos Hídricos que se estabeleceu a porcentagem das instituições que farão parte dos comitês, através da Resolução nº 05/2000. Para saber mais acesse: <http://www.cbh.gov.br/legislacao/20000410_CNRHRes005_DiretrizesCBH.pdf>.

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TÓPICO 2 | GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM VIÉS DOS COMITÊS DE BACIA

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Agora você deve estar se perguntando: como são eleitos os membros que farão parte dos comitês? Pois bem, os comitês serão presididos por um de seus membros, eleito por votação que cumprirá um mandato de dois anos, permitida a reeleição. Todos os integrantes do comitê deverão ter plenos poderes de representação dos órgãos de que fazem parte.

Cabe ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos o estabelecimento das

normas e orientação do funcionamento e formação do estatuto dos comitês.

Os Comitês de Bacia são a base do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SNGRH) e, se eles passarem a exercer de fato as competências que lhes são atribuídas por lei, ocuparão um importante espaço de poder político e nas comunidades.

O exercício de sua competência depende, em boa parte, da implementação dos instrumentos de gerenciamento por parte dos governos federal e estaduais, embora vários princípios e instrumentos de gestão ainda precisam ser implementados, especialmente a cobrança pelo uso da água.

Existem hoje mais de 180 comitês de bacia instituídos em todo o país, sobretudo comitês de rios estaduais. De acordo com Jacobi (2003), isto significa que a sociedade está se movimentando intensamente na busca de soluções para os conflitos de uso da água.

Então, como você pode ver, de acordo com a lei, todos são iguais e possuem as mesmas responsabilidades. Porém, o que você precisa saber é que a composição específica de cada comitê não varia, pois sua formação é específica de acordo com a legislação federal.

Por isso, um comitê de bacia no estado de São Paulo terá a mesma composição de seus membros de um comitê de bacia do estado do Acre, por exemplo.

NOTA

Caso tenha dúvidas sobre os instrumentos que compõem a Política Nacional de Recursos Hídricos e a lei responsável pela criação do Gerenciamento de Recursos Hídricos do nosso país, acesse o site <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9433.htm>.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

Para cumprir sua função, os comitês obedecem à seguinte estrutura:

Cada comitê de bacia tem seu próprio estatuto, com base na legislação federal, no qual são estabelecidas regras e procedimentos para realização das assembleias deliberativas, formas de participação, eleição e competências. Todos os cidadãos podem participar.

As assembleias são abertas ao público e os representantes eleitos para compor o colegiado, como titulares e suplentes, têm poder de voto.

O comitê é presidido por um presidente e um secretário, tendo mandato de dois anos, podendo ser reeleito com votação de seus membros. Porém, não há um número preestabelecido para composição de chapas a disputar o gerenciamento do comitê.

Quais são as competências de um Comitê de Bacia?

De acordo com a Lei nº 9.433/97, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, compete aos Comitês de Bacias Hidrográficas:

1 elaborar e aprovar a proposta do Plano da respectiva bacia hidrográfica e acompanhar sua implementação;

2 encaminhar ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos a proposta relativa à bacia hidrográfica, contemplando, inclusive, objetivos de qualidade, para ser incluída no Plano Estadual de Recursos Hídricos;

3 aprovar os programas anuais e plurianuais de investimentos em serviços e obras de interesse da bacia hidrográfica, tendo por base o Plano da respectiva bacia;

4 propor ao órgão competente o enquadramento dos corpos de água da bacia hidrográfica em classes de uso e conservação;

5 propor ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos os valores a serem cobrados pelo uso da água da bacia hidrográfica;

6 realizar o rateio dos custos de obras de interesse comum a serem executados na bacia hidrográfica;

7 compatibilizar os interesses dos diferentes usuários da água, dirimindo, em primeira instância, os eventuais conflitos;

8 promover a cooperação entre os usuários dos recursos hídricos;

9 realizar estudos, divulgar e debater, na região, os programas prioritários de serviços e obras a serem realizados no interesse da coletividade, definindo objetivos, metas, benefícios, custos, riscos sociais e ambientais;

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TÓPICO 2 | GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM VIÉS DOS COMITÊS DE BACIA

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10 fornecer subsídios para elaboração do relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos da bacia hidrográfica;

11 gestionar recursos financeiros e tecnológicos com organismos públicos, privados e instituições financeiras;

12 solicitar apoio técnico, quando necessário, aos órgãos que compõem o Sistema Estadual de Gerenciamento dos Recursos Hídricos.

NOTA

Procure o Comitê de Bacias de seu município e faça parte dele: Camaquã: <http://www.comitecamaqua.com/> Rio Tijucas: <http://www.aguas.sc.gov.br/sirhsc/index.jsp?idEmpresa=22>Itajaí-Açu: <http://comiteitajai.org.br/>Rio das Velhas: <http://www.cbhvelhas.org.br/>Rio São Francisco: <http://cbhsaofrancisco.org.br/>Bahia: <http://www.cbh.gov.br/DataGrid/GridBahia.aspx>Amazonas: <http://www.cbh.gov.br/DataGrid/GridAmazonia.aspx>Rio Tietê: <http://www.comiteat.sp.gov.br/>Paraná: <http://www.cbh.gov.br/DataGrid/GridParana.aspx>

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

LEITURA COMPLEMENTAR

A DESCENTRALIZAÇÃO DO GERENCIAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS

Amália Maria Golberg Godoy

A descentralização usualmente refere-se à transferência de autoridade e responsabilidade do governo central ao nível mais baixo na hierarquia administrativa e territorial (CROOK; MANOR, 1998; AGRAWAL; RIBOT, 1999; GREGERSEN et al., 2004). Nesse contexto, a descentralização significa que os governos locais devem tomar decisões relativas às atribuições designadas por uma lei maior e concernentes à sua esfera de poder com relação à legislação e gestão das águas.

Contudo, o fato de haver descentralização não implica a ausência total do governo central nos diferentes níveis, pois os governos locais não possuem poder para tomar decisões sobre questões-chave que estão sob a responsabilidade do governo central, como rios de fronteira entre países e rios federais.

Entre os estudiosos não há um consenso se a descentralização permite melhor gestão dos recursos naturais, em particular, o hídrico.

Entre os aspectos positivos constantemente lembrados pelos estudiosos estão as experiências que sugerem que o sistema descentralizado frequentemente leva a formas mais sustentáveis de uso dos recursos, as decisões são tomadas localmente e por aqueles que farão o monitoramento, fiscalizarão e implementarão as políticas (CONYERS, 1981). Além disso, a descentralização leva à maior participação das comunidades nas políticas de decisão e maior accountability dos políticos para com as pessoas (BRANDON; WELLS, 1992).

Significa também distribuição mais equitativa e local dos benefícios (ASCHER, 1995; OSTROM, 1990). Essa proximidade, por sua vez, leva em conta os conhecimentos locais das condições biofísicas, sociais e institucionais que influenciam na gestão das águas (CARNEY, 1995).

Ferguson e Ribot (2002, p. 2-3) resumem algumas outras vantagens:

• aumenta a transparência, a responsabilidade e a capacidade de resposta das instituições governamentais;

• permite maior representação política dos diversos grupos políticos, étnicos, religiosos e culturais na tomada de decisões;

• aumenta a estabilidade política e a unidade nacional, permitindo aos cidadãos controlar melhor os programas públicos no plano local;

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TÓPICO 2 | GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM VIÉS DOS COMITÊS DE BACIA

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• atua como terreno fértil para novas ideias políticas, conduz a programas mais criativos e inovadores.

Por outro lado, a descentralização da gestão tem várias críticas. Os pesquisadores, em sua maioria, afirmam que as estratégias de descentralização, frequentemente, ocorrem impondo novos papéis e autoridades sobre os recursos e ignoram as regras positivas preexistentes e os hábitos e culturas das populações locais e tradicionais (CONTRERAS, 2003, SARIN et al., 2003).

Soma-se a isso o problema da interferência dos políticos locais, caracterizados por clientelismo, corrupção ou outros, que fazem com que as decisões políticas não sigam as prioridades técnicas e sociais estabelecidas pela comunidade afetada. A democracia é prejudicada quando elites locais conseguem monopolizar os processos decisórios ou quando a sociedade civil local não é bem organizada (AGRAWAL; RIBOT, 2000; ARRETCHE, 1996; BLAIR, 2000; BRANNSTROM, 2004; RIBOT, 2002; MANOR, 1999).

Estudos recentes demonstram que os atores locais que recebem as novas responsabilidades geralmente não têm representatividade nem poder (LARSON, 2004, p. 2-3; GREGERSEN et al., 2004, p. 30).

O que se quer enfatizar também é que o próprio termo descentralização assume característica diferente na questão das águas. Não é somente um processo de transferência de poder e recursos do governo central para o estadual e local (de cima para baixo). Esse processo é mais complexo, segundo Arretche (2000) e Abers (2003). O processo de descentralização ocorre simultaneamente em dois níveis, nacional e estadual, com a criação de organismos de bacia tanto para as águas federais quanto para as águas estaduais.

Portanto, num mesmo local (município) precisa existir uma articulação dos comitês de bacia de rios federais com os comitês estaduais da mesma bacia e, segundo a legislação, esta será feita caso a caso, como ocorreu na criação do Comitê para Integração da Bacia do Rio Paraíba do Sul, envolvendo os estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. No entanto, segundo Abers (2003), verificaram-se vários obstáculos na implementação dessas leis. Primeiro, a dupla dominialidade da água criou muitas indefinições quanto ao papel dos diferentes níveis da Federação na gestão da água. Não se pode esquecer que ocorre, também, articulação entre a Agência de Águas, federal, e as Agências de Bacias previstas nas leis estaduais, também definidas caso a caso. As tomadas de decisão e as formas de articulação, portanto, poderão ter as mais diversas composições.

A descentralização também não envolve a transferência de poder para as instâncias locais já implementadas (como para um conselho, secretaria ou outros), mas propõe a criação de uma nova esfera de decisão, que é o comitê de bacia hidrográfica.

Consequentemente, os municípios, que já possuem uma série de instâncias que se preocupam com as questões de recursos hídricos, inclusive de maneira

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

obrigatória (conselhos de Educação, Saúde e Meio Ambiente, entre outros), terão de conviver (de que maneira?) com o comitê formado, que possui atribuições que, em princípio, estão acima das atribuições de cada município (gestão da bacia). É mais uma instância de participação, numa sobreposição que pode ter complexos arranjos.

Além disso, os comitês de bacia enfrentam problemas como: a vontade política em instalá-lo; problemas de representatividade e conflitos com outras organizações existentes (órgãos ambientalistas municipais, estaduais e municipais, conselhos ambientais, entre outras), falta de capacidade técnica na implementação de decisões como a outorga, monitoramento e fiscalização, segundo Godoy (2006).

Legalmente, há espaço para a participação da sociedade civil organizada nos comitês, a grande questão é: como esta é implementada? A sua composição diverge? Os mecanismos propostos pela lei permitem a participação igualitária (com o mesmo poder de decisão) de todos os usuários afetados? Não se responderá todas, mas estas perguntas têm seu fundamento, pois, enquanto leis e normas, a gestão de água deve ser prioritariamente implementada a partir da construção de consensos entre o poder público, setor privado e sociedade civil.

Pode-se apontar que nada obriga a criação dos comitês em todas as bacias hidrográficas. Segundo Abers (2003), a criação dos comitês parece ocorrer de acordo com múltiplas lógicas. Em alguns casos, como “prioridade” por parte do poder público; em outros casos, pela organização da sociedade e atores locais.

Observa-se que a maior parte dos instrumentos está prevista nas leis estaduais, no entanto, há desigualdades no ritmo e na forma de implantação. Existem instrumentos que exigem a participação/decisão dos comitês e estes não existem, muitas decisões continuam centralizadas nas mãos dos governos, a aplicação de muitos instrumentos incipientes e/ou inexistentes são pouco participativos e não levam em conta o objetivo principal, que é a articulação entre os diferentes usuários (GODOY, 2005, 2006).

Além da questão da representatividade dos vários segmentos, inclusive estatais (será que defendem a sustentabilidade dos recursos hídricos baseados nos critérios técnicos e sociais ou aqueles estabelecidos pela gestão do prefeito, que precisa prestar determinados serviços?), Abers e Jorge (2003) comentam que o instrumento da cobrança pelo uso da água divide bem os segmentos representados.

De um lado, há os defensores do instrumento de cobrança “mediante o não repasse dos valores para os custos finais dos consumidores” e, de outro lado, os contrários ao instrumento. No estudo feito pelos autores, do setor governamental vem a observação de que existem “os usuários que se preocupam com o bolso”; e usuários que se preocupam com o retorno devido das taxas pagas e que, por isso, agem no sentido de garantir que todos os valores pagos, nos limites da lei, sejam efetivamente aplicados na bacia hidrográfica de origem e de acordo com o plano de bacia.

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TÓPICO 2 | GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM VIÉS DOS COMITÊS DE BACIA

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Abers e Jorge (2003, p. 2) comentam que ainda persistem indefinições relativas ao estabelecimento da cobrança. Na falta de regulamentação de questões essenciais, como no caso dos mecanismos que garantem o retorno do recurso às bacias de origem que estão sob controle dos comitês, observa-se que apenas cinco estados instituíram a cobrança mais ou menos nos moldes da proposta de gestão descentralizada.

Outro aspecto levantado é como e quem fomenta a criação dos comitês de bacia? O Estado ou a sociedade e usuários?

A primeira opção parece ser a mais viável, no sentido de o comitê surgir com poder (de lei) de criar as condições para a sua sustentabilidade econômica, assim como obter melhor infraestrutura, apoio, acesso a conhecimentos técnicos, entre outros.

Por último e não menos importante, destaca-se que em qualquer uma das instâncias em que se prevê a participação há discussões, conflitos e negociações. Nesse ambiente é que se definem as prioridades dos usos das águas, as estratégias de gestão, as formas de decisão e o preço a ser cobrado. São instâncias em que ocorrem relações sociais e de poder.

As estratégias traçadas explicitam os interesses e as relações estabelecidas entre os atores sociais envolvidos, o que acentua/define a estrutura de poder. Como afirma Seabra (1987, p. 275-276), “[...] a atuação ideal do Estado está permeada de interesses privados atuando, os detentores desses interesses atuam sobre os aparelhos de Estado, ora como polo de uma relação conflituosa, ora através dele em benefício próprio” .

A conclusão que se pode tirar é que a defesa da descentralização dos recursos naturais, além de não ser um consenso entre os estudiosos, permite que se afirme que a aplicação pura e mesmo total das normas legais não leva necessária e automaticamente a uma melhor gestão dos recursos hídricos. Existem diversos determinantes que interferem na descentralização e na própria gestão, que precisam ser melhor analisados e ser levados em conta na implantação das normas da lei.

Assim, para entender a gestão das águas é fundamental entender o ambiente em que ocorrerá o processo de decisão, ou seja, as instituições existentes. Os preços a serem cobrados de cada setor, as prioridades nos investimentos e o próprio plano de gestão precisam ser entendidos como o resultado de opções, negociações e dinâmicas sociais existentes nos comitês e agências de bacia.

O contexto de disputa e negociação é que, de um lado, existem os agentes que tentam trazer para seus grupos privilégios e rendas e, por outro lado, aqueles que visam atender às demandas da sociedade como um todo.

FONTE: Adaptado de: <http://br.monografias.com/trabalhos915/comites-bacia-hidrografica/comites-bacia-hidrografica2.shtml>. Acesso em: 12 dez. 2012.

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Neste tópico, você viu:

• Os Comitês de Bacia são a base do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SNGRH). Por isso, são vistos como a base, ou linha de frente, para fazer acontecer a gestão da água, sendo chamados de “Parlamento das Águas”.

• Uma das principais atribuições dos Comitês de Bacias é aprovar o Plano de Bacia (que é um dos instrumentos da Política de Recursos Hídricos), no qual são definidas as propostas de aplicação de recursos financeiros, além de programas e ações que visam promover a integração entre os usuários das águas, a manutenção e recuperação dos recursos hídricos.

• De acordo com a lei, todos os comitês são iguais e possuem as mesmas responsabilidades, porém com especificidades de acordo com cada localidade onde o comitê esteja implantado.

RESUMO DO TÓPICO 2

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AUTOATIVIDADE

De acordo com o que você estudou neste tópico, responda às seguintes questões:

1 Qual a importância do comitê de bacia para a gestão de recursos hídricos?

2 Como são estruturados os comitês?

3 Cite três competências de um comitê de bacia.

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TÓPICO 3

OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO

PARTICIPATIVA DA ÁGUA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, o Brasil vem formulando sua legislação em processos participativos. Observamos isto ao analisar a Constituição Federal de 1988, a Lei Federal nº 9.433/97, que institui a Política Nacional dos Recursos Hídricos, a Lei Federal nº 9.795/99, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, a Lei nº 9.985/00, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), e a Lei Federal nº 10.257/01, que institui a Política Nacional Urbana, também conhecida como Estatuto da Cidade.

As legislações apresentadas representam um progresso de políticas com um viés de poder de decisão aberto aos diferentes atores sociais vinculados em um contexto de gestão descentralizada, participativa e integrada, como princípios norteadores.

2 A PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

A participação está pautada como um dos cinco princípios do processo de democratização. Sem a participação do cidadão no processo decisório não é possível transformar em realidade nenhum dos outros princípios fundamentais que integram a democracia, são eles: liberdade, igualdade, participação, solidariedade e diversidade.

IMPORTANTE

Antes de falarmos sobre a gestão participativa da água através de comitês é necessário lembrar o conceito de participação. O conceito de participação provém do vocábulo latino “participare”, que significa fazer parte, tomar parte ou ainda ter parte, porém de forma ativa, questionadora e efetiva.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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A participação é pensada principalmente sobre os interesses dos grupos inseridos no processo decisório e não apenas da perspectiva dos interesses gerais definidos pelo Estado. Lembra-se da composição dos Comitês de Bacia, da sociedade civil organizada, de representantes de usuários de água e do município? Todos têm direito à voz, voto e participação na tomada de decisão.

Essa nova perspectiva abriga a possibilidade de buscar a articulação entre a implantação de práticas descentralizadoras e ação institucional que concilie a participação mais ativa e heterogênea entre os representantes.

Desta forma, esse novo formato de gerir os bens públicos vem rompendo com práticas do gerenciamento tecnocrático e autoritário, compartilhando o poder de decisão para as instituições que fazem parte de bacia, juntamente com as representações da sociedade civil, como afirmação de uma nova cultura de direitos.

Vale lembrar que o marco histórico da descentralização do poder para a tomada de decisão nos processos políticos, em nosso país, data a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988.

Neste momento, o Brasil estava no ápice da redemocratização. Algumas reformas já estavam acontecendo e uma delas tratava da transferência de responsabilidade e de competências do governo federal para a descentralização do poder para os governos locais, ou seja, para os municípios, rompendo de certa forma com a hegemonia do poder decisório nas mãos do governo federal.

Podemos citar como exemplo a Lei das Águas, como é conhecida a Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei nº 9.433/97, que mostra esse novo enfoque na administração pública. Prova disto é a criação dos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica. Lembra-se de seus princípios norteadores, quando menciona a descentralização do poder de decisão e a participação de diferentes atores sociais?

Para que a população tenha de fato o direito de participar e decidir sobre os rumos da gestão pública no país, vários espaços de participação estão sendo criados, como: comitês de bacia, conselhos de meio ambiente, associações de bairro, entre outros. Alguns instrumentos de participação que estas instituições podem utilizar são: audiências públicas, assembleias, reuniões, mobilizações/passeatas e referendos.

ATENCAO

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TÓPICO 3 | OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DA ÁGUA

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Essa nova perspectiva permitirá uma mudança na realidade social brasileira, sob o enfoque de um novo caminhar para uma cultura de maior participação e envolvimento da população em geral nas tomadas de decisão sobre os bens públicos, aqui, em especial, com a criação e implementação de ações participativas em defesa das águas.

3 OS COMITÊS DE BACIA COMO ESPAÇO DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL

Compete aos Comitês de Bacia seguir os princípios da nossa Constituição, ou seja, atuar com transparência, participação e de forma apartidária.

Através de seus representantes legais e instituições que fazem parte dos comitês, estes deverão partir para o efetivo exercício da cidadania, propor que as informações obtidas, através dos levantamentos científicos de estudos da área de abrangência da bacia, estejam disponíveis à comunidade, órgãos ou estabelecimentos para fins de consulta, e que estes sirvam de instrumentos para que a realidade da bacia hidrográfica e consequentemente de seu município seja transformada para melhor, em termos de diversidade biológica e qualidade de vida para todos.

IMPORTANTE

Caro(a) acadêmico(a): como você pode observar, a questão da participação social nos comitês começa pela sua composição, ou seja, quando a Lei nº 9.433/97 diz que estes devem ser compostos tanto pelo poder público (ex.: prefeitos, secretários, técnicos), como pela sociedade (ex.: usuários de água, ONGs, sindicatos entre outros).

Porém, o princípio da participação não acaba na composição, e sim, é apenas seu início, ou seja, para que de fato exista o princípio da participação, todos que fazem parte do comitê devem ter direito a expor suas ideias e participar ativamente das decisões que deverão ser tomadas.

O que cabe dizer é que a forma como foram estruturados os Comitês de Bacias estabelece mudanças quanto ao envolvimento entre o Estado e a sociedade civil, na medida em que as regras do jogo se voltam aos recursos hídricos e seus diferentes usos, passam a articular um número maior e de diferentes representantes da sociedade no processo decisório.

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Por assim dizer, este espaço de discussões, que são os Comitês de Bacias, garante uma participação mais efetiva da sociedade civil na gestão da água, redefinindo o papel entre o Estado e a comunidade, a relação entre os peritos e os leigos, entre quem detém o poder econômico e a comunidade que necessita dos recursos naturais para sua economia, como, por exemplo, os pequenos agricultores.

Abrange aqui o envolvimento das relações do poderio econômico e a sociedade civil em um mesmo nível de envolvimento nos processos decisórios.

Caro(a) acadêmico(a), o que estamos querendo dizer é que a dinâmica do parlamento das águas, que são os Comitês de Bacias, foi criada de forma a facilitar a transparência e a permeabilidade nas relações entre o poder público, a comunidade, os empresários locais e as ONGs, garantindo a incorporação dos principais interessados no processo dos recursos hídricos e seu poder participativo, onde todos deverão ser ouvidos.

Assegura-se um espaço de negociação, articulação e debate da problemática voltada aos recursos hídricos, abrindo espaço para a expressão e defesa dos interesses difusos, fortalecendo a transparência e o poder de decisão. Desta forma, diminui o risco de predomínio de opiniões de grandes empresários, da comunidade científica ou de interesses individuais. E contribui para a lógica cooperativa em um espaço democrático.

Podemos afirmar que o acesso à informação e a participação social têm promovido mudanças de atitude que beneficiam e fortalecem o desenvolvimento de uma consciência ambiental coletiva, um importante avanço na direção da construção da cidadania.

Levando-nos a crer que o planejamento participativo é uma importante ferramenta em organizações, que resulta na defesa dos interesses dos cidadãos e na busca da gestão do seu próprio desenvolvimento, a fim de que o interesse coletivo se sobreponha ao individual atuando na tomada de decisão sobre a real necessidade local. Este conceito de planejamento participativo consiste na complementação de conhecimentos científicos com os conhecimentos e anseios da população, para que o desenvolvimento e o respeito, tanto à natureza como à sociedade, caminhem em harmonia. Essa nova tendência ambiental para a tomada de decisão baseia-se no incremento da participação da sociedade civil organizada, que visa desenvolver um plano estratégico, pautado nos princípios do planejamento participativo, fazendo com que o diálogo seja primordial. (MEURER, 2011, p. 84).

As atribuições dos comitês têm se baseado no tripé: Câmara Técnica, Planos e Programas e, a terceira, na Fonte Financiadora. Seguindo esta ordem, respectivamente relacionadas: aos mecanismos de gestão para o funcionamento da logística do Comitê em si; estudos e debates para implantar programas ou planos na gestão; e última, porém não menos importante, a alocação de recursos financeiros para a execução de ações elencadas pelo Plano.

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Podemos concluir que não se trata apenas da participação da população no processo decisório da bacia, e muito menos elaborado em um espaço de trabalho fechado de corpo técnico-científico do poder público ou de empresas com interesses individuais, porém o objetivo é de garantir a efetiva participação de todos, na transparência dos processos decisórios e na consolidação e materialização de um pacto através de práticas políticas devidamente reconhecidas por lei.

4 A IMPLANTAÇÃO DOS COMITÊS DE BACIAS NO BRASIL

Foi durante a década de 1990 que alguns estados brasileiros começaram a romper com o paradigma estabelecido voltado à gestão dos recursos hídricos, quando então era adotado um modelo com forte viés normativo, centralizador e setorizado.

Dando início a um período de implantação de um novo sistema, fortemente marcado pela organização da sociedade civil, pela integração de entidades estaduais e municipais em nível regional, formando um fórum de discussões a respeito da água, assim existe um caráter do que se conhece hoje em dia como Comitês de Bacias Hidrográficas.

Atualmente, o Brasil possui cerca de 180 comitês de bacias hidrográficas, legalmente instituídos, dos quais 10 são federais, pois os rios a que pertencem as bacias são de domínio da União, e 170 são constituídos de comitês estaduais, que, como já foi mencionado, são formados de rios de domínio dos estados e do Distrito Federal.

Conforme os estudos elaborados por Abers e Jorge (2005), os estados de Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul saíram na frente, com o maior número de comitês estaduais existentes, tendo em vista que em 2001 esses estados possuíam quase 90% dos comitês estaduais no Brasil. Porém, na região Nordeste esse número também vem crescendo.

Foi a partir da aprovação da Lei das Águas, em 1997, que a criação de comitês estaduais se acelerou e tomou forma de Parlamento das Águas, prova disto foi o número de comitês cadastrados entre 1998 e 2003.

Essa aceleração, em parte, decorre do fato de que muitos estados apenas criaram suas leis de água após a aprovação da Lei nº 9.433/97. No entanto, a criação de comitês também se acelerou nos estados onde já havia leis de recursos hídricos.

Por exemplo, 14 comitês mineiros, 13 comitês gaúchos e 11 comitês catarinenses foram criados a partir de 1998 em diante, pois estes estados já tinham formulado suas leis de recursos hídricos. No caso de Santa Catarina, desde 1993, e os estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul desde 1994.

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O fato de alguns estados se distinguirem uns dos outros na implantação de seus comitês remete a dois supostos eixos: um decorrente da inexistência de leis de recursos hídricos, e por isso a demora em se adequar à nova legislação; e, por outro lado, os que saíram à frente e logo a partir de 1998 já instalaram seus comitês, decorre, supostamente, de que a lei federal tenha fortalecido as leis estaduais já existentes, validando o modelo de descentralização da gestão da água.

5 A GOVERNANÇA DA ÁGUA

A busca por fortalecer a participação da rede de atores sociais na gestão pública tem levado alguns autores a interessar-se pelo tema, adotando-o sob o termo “governança”.

IMPORTANTE

É importante antes saber que a palavra governança tem a mesma origem da palavra governo, que vem do latim gubernare e do grego kubernân. O termo foi utilizado pela primeira vez na França com o mesmo significado que governo (que é a arte de governar). Mais tarde, no século XVIII, o termo servia para ilustrar a ambição de um governo e o respeito dos interesses e valores do povo. Já o termo inglês governance, usado na Idade Média (século XIV), foi no sentido de evocar a partilha do poder entre os diferentes segmentos da sociedade inglesa na época.

A metodologia que o processo de governança emprega envolve diferentes atores, entre governamentais e não governamentais, onde acordam em processo de discussão, consenso e cooperação, em nome dos interesses em comum, justificando a aceitação de princípios, normas, regras e procedimentos que diferenciam e dão coerência a suas ações.

A governança não é um processo em si, faz parte de um processo maior, porém é um processo contínuo, o qual abarca diferentes realidades sociais e culturais, com distintos interesses conflitantes, a partir do qual se poderão realizar ações cooperativas.

Esse processo de governança envolve não somente instituições e regimes formais que impõem obediência, como é possível também atender aos acordos informais de pessoas e distintas instituições.

De modo geral, o ponto importante, quando se trata de governança, são os níveis de governança, que podem se apresentar em escalas: subnacional, nacional e supranacional, pois o processo da existência de governança não está

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associado apenas aos espaços do Estado, tal qual a governança com governo, mas, sobretudo, à participação ativa da sociedade como um todo nos distintos espaços informais, sem a presença do Estado.

IMPORTANTE

A governança exige uma compreensão sob a ótica de valores e relações de poder de diferentes interesses, na qual esses interesses devem ser contextualizados na realidade em que estão inseridos, pois desta forma ocorrerá o empoderamento e o fortalecimento da população no processo para tomada de decisão.

Na gestão dos recursos hídricos, o conceito de governança pode ser entendido como:

Um enfoque conceitual que propõe caminhos teóricos e práticos alternativos que façam uma real ligação entre as demandas sociais e sua interlocução em nível governamental. Geralmente, o termo inclui leis, regulação e instituições, mas também se refere a políticas e ações de governo, a iniciativas locais e a redes de influência, incluindo mercados internacionais, o setor privado e a sociedade civil, os quais são influenciados pelos sistemas políticos nos quais se inserem (JACOBI; GÜNTHER; GIATTI, 2012, p. 43).

A Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei nº 9.433/97) aborda o conjunto de atores sociais importantes que constituem a governança da água no Brasil, apontando que o que tem diferenciado esta política das demais políticas ambientais, entre outros aspectos, é o seu caráter participativo, tendo em vista a oportunidade de participação garantida à rede de atores sociais, tanto do poder público quanto da sociedade civil organizada.

Conforme os aspectos observados anteriormente, o processo de governança na gestão dos recursos hídricos não é meramente formal, com apenas instrumentos de comando e controle, mas também com a participação popular, com critérios tais como: capacidade de inclusão, equidade; participação; comunicação; transparência; responsabilidade; incentivos; coerência; eficácia; capacidade de resposta; integração; e ética.

O Brasil está construindo sua governança da água, e para isso depende de um conjunto da estrutura política do país e do desenvolvimento de capacidades e aprendizagem social nos sistemas hídricos. Sabendo-se que a governança não possui resposta simples, considera-se e entende-se que os conceitos, contradições e limites da governança, ou de dimensão política, espelham o contexto histórico em que foram produzidos e pensados.

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LEITURA COMPLEMENTAR

FRAGILIDADES A SER VENCIDAS PARA SE CONSOLIDAR UMA GESTÃO PÚBLICA DESCENTRALIZADA E PARTICIPATIVA

J. C. S. Machado

Nesses tempos de mudanças e futuro incerto, a administração democrática de um bem de uso comum do povo, a água, está no centro de nossas inquietações e perplexidades diante dos rumos da modernização brasileira no cenário de um mundo globalizado.

Não obstante, para que a gestão colegiada seja instrumento de implementação do desenvolvimento sustentável, é necessário atentar para algumas fragilidades a serem vencidas, a fim de que ocorra uma maior representatividade e efetiva participação da sociedade em entidades de gestão pública, colegiada, como os Comitês de Bacias.

Torna-se relevante destacar que o princípio da gestão colegiada, integrada, descentralizada e participativa no Brasil é fundamental para a compreensão da lei como instrumento de mudança do paradigma de política pública. Contudo, o princípio em questão é motivo para alguns conflitos entre sociedade civil e poder público, uma vez que há uma cultura administrativa de forte tradição centralizadora e tecnocrática ainda bastante arraigada no Brasil.

No caso dos recursos hídricos, essa cultura sobrevive através de toda uma geração de especialistas das mais variadas formações que ocupam cargos decisórios em órgãos do poder público, detentores de conhecimentos sobre as bacias hidrográficas e agindo com base em extensas redes de relações socioprofissionais.

Trata-se de funcionários públicos que compartilham a crença segundo a qual os técnicos são os que sabem o que é melhor para todos. Esses funcionários não entendem que as ciências e as tecnologias não devem tutelar a democracia direta na gestão integrada das águas, pois nenhum desenvolvimento sustentável poderá existir sem a participação ampliada das populações envolvidas.

A gestão integrada, descentralizada e participativa de uma bacia hidrográfica é um assunto sério demais para ficar nas mãos tão somente dos técnicos do poder público. Além disso, como nos têm ensinado as Ciências Sociais em geral, a Antropologia e a Sociologia, em particular, toda e qualquer decisão tomada com base em critérios técnicos serve a algum propósito político, quer se tenha ou não consciência disso.

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TÓPICO 3 | OS COMITÊS DE BACIA E A GESTÃO PARTICIPATIVA DA ÁGUA

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Tal característica deve-se ao fato de que todo e qualquer técnico, na condição de pessoa humana, traz dentro de si os valores políticos, éticos, morais e hábitos profissionais da sociedade e da cultura da qual faz parte, valores esses que norteiam suas ações individuais. Uma pessoa habitua-se a tal ponto com certas identidades que, mesmo quando sua situação social muda, ela encontra dificuldade para acompanhar as novas exigências.

A lógica da gestão territorial participativa e descentralizada contida na “Lei das Águas” não pode esconder o fato de que o termo ‘participação’ acomoda-se a diferentes interpretações, já que se pode participar ou tomar parte em alguma coisa de formas diferentes, que podem variar da condição de simples espectador, mais ou menos marginal, à de protagonista de destaque.

Assim, a pretendida e esperada participação da sociedade, dos usuários e das comunidades em geral está formalmente incluída na lei, garantida por meio de sua representação equitativa nos comitês e demais organismos de bacia hidrográfica, assim como nos conselhos estaduais e nacional.

Mas a participação efetiva e material da sociedade também deve ser garantida através de outros mecanismos, que valorizem as histórias particulares de cada localidade e as diversas contribuições das populações envolvidas, incorporando-as aos planos diretores e ao enquadramento dos cursos de água.

Não se trata apenas de apresentar à população um plano diretor de bacia, elaborado no espaço de trabalho fechado do corpo técnico-científico do poder público com o objetivo de validá-lo, mas de garantir a efetiva participação da população local na consolidação e materialização de um pacto através da prática política anteriormente denominada “gestão colegiada e integrada com negociação sociotécnica”.

A base empírica do conhecimento local da população sobre os corpos d’água de uma bacia hidrográfica deve ser valorizada, pois possui um valor socioambiental inigualável. Além disso, os cursos d’água fazem parte da história do indivíduo, da família e da comunidade que integram essa população, ganhando sentidos simbólicos que ocupam uma parte importante de seu patrimônio cultural.

A defesa da participação, portanto, não envolve apenas um princípio democrático de sentido humanista, filosófico (quando não degenera para o demagógico ou puramente retórico), mas é também parte importante na construção de uma nova forma de encarar a gestão de recursos públicos caros e escassos.

Ela pressupõe ainda o fato de que uma pessoa envolvida na tomada de uma decisão sentir-se-á comprometida e procurará vê-la cumprida. Será, portanto, um agente de implementação dessas decisões, não apenas um agente passivo.

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De fato, a aceitação é maior quando existe participação em todo o processo de gestão de um projeto ou de uma política e quando o participante faz sua própria escolha.

Nos comitês de bacias hidrográficas, a população envolvida é gestora e deve poder reconhecer as decisões que resultam num plano diretor ou no enquadramento de um rio como propriamente suas, ou pelo menos deve estar convicta de que elas são a expressão de um consenso possível, resultante de uma negociação sociotécnica onde suas aspirações foram consideradas.

FONTE: Adaptado de: MACHADO, J. C. S. Recursos hídricos e cidadania no Brasil: limites, alternativas e desafios. Ambiente e Sociedade, Campinas, v. 6, n. 2, jul./dez. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/asoc/v6n2/a08v06n2.pdf>. Acesso em: 2 dez. 2012.

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Neste tópico, você viu:

• O marco histórico da descentralização do poder de tomada de decisão, no que diz respeito à gestão da coisa pública no Brasil, data a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988.

• Com base na Constituição Federal de 1988, a Política Nacional de Recursos Hídricos mostra um novo enfoque na administração pública, abordando em seus princípios a descentralização do poder de decisão através da participação de diferentes atores sociais, a partir da criação de Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica.

• Os comitês se configuram como espaço importante de articulação, de negociação, de debate de problemas, abrindo espaço para a expressão dos atores envolvidos em defesa dos interesses difusos, aqui, em especial, a água.

• A criação de comitês estaduais se acelerou depois de 1997, após a aprovação da lei nacional. Em sua maioria os comitês foram instalados entre 1998 e 2003.

• A Lei nº 9.433/97 ainda não havia sido promulgada, mas a Política Estadual de Recursos Hídricos de alguns estados brasileiros, como o caso de São Paulo, de Santa Catarina e Minas Gerais, já estabelecia as bases legais para a criação do comitê.

RESUMO DO TÓPICO 3

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AUTOATIVIDADE

Depois de ter lido este tópico, você deve ter percebido a importância da participação social na gestão da água e que esta, entre outros espaços, pode ser viabilizada por meio de comitês de bacia. Pensando nisso, responda ao seguinte:

1 Você já participou ou faz parte de alguma organização da sociedade? Se sim, diga qual é e o porquê da sua participação.

2 Faça uma pesquisa e identifique quais são as organizações ou entidades da sua cidade que abrem espaços para a participação social. Você conhece alguém que participa desses espaços? Caso sim, você costuma interrogá-lo sobre o que foi discutido? Por quê?

3 Sobre a participação social, assinale V ( para verdadeiro) ou F (para falso).

a) ( ) A noção de partição deve ser pensada dentro de uma ótica global, não levando em consideração os interesses de pequenos grupos e, sim, os interesses do Estado.

b) ( ) A participação constitui um dos cinco princípios da democracia. c) ( ) São exemplos de espaços de participação social: Comitê de Bacia

Hidrográfica, Conselho Municipal de Meio Ambiente e associação de bairros.

d) ( ) A participação pressupõe que uma pessoa envolvida na tomada de uma decisão sentir-se-á comprometida e procurará vê-la cumprida, sendo, assim, um agente de implementação dessas decisões.

4 De acordo com a leitura complementar, a lógica da gestão territorial participativa e descentralizada contida na “Lei das Águas” não pode esconder o fato de que o termo ‘participação’ acomoda-se a diferentes interpretações, já que se pode participar ou tomar parte em alguma coisa de formas diferentes, que podem variar da condição de simples espectador, mais ou menos marginal, à de protagonista de destaque. Neste sentido, como você percebe o processo participativo?

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TÓPICO 4

DESAFIOS E AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO

DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Como vimos até o momento, muita coisa tem sido pensada e colocada em prática para a gestão de bacias hidrográficas no território nacional. Porém, num país de dimensões continentais como o Brasil, são necessários muitos recursos financeiros e educação para que políticas públicas possam ser implementadas e consolidadas.

Um grande desafio nesse processo é a participação social nesses espaços de discussão e decisão, pois não existe uma cultura de participação na sociedade brasileira. No entanto, muitos esforços estão sendo feitos para o alcance desses objetivos. Se analisarmos o caso de qualquer comitê de bacia, veremos que a comunidade está sendo envolvida em diferentes etapas de construção, tanto nos planos de recursos hídricos, como nas atividades que desempenha, pois este é um direito legalmente instituído.

Esse tópico fará uma breve abordagem sobre os desafios e os avanços alcançados na implementação da gestão de recursos hídricos do Brasil.

2 DESAFIOS

Por se tratar de um processo aparentemente novo, vários ainda são os desafios enfrentados para a implementação e uma boa gestão dos recursos hídricos, entre os quais se dará ênfase aos que se acredita estar sendo mais latentes no momento, que são os seguintes: o processo de atuação dos Comitês de Bacias e a base que norteia suas ações, seus valores éticos ambientais; a inserção da educação ambiental como processo de busca de conservação da água; e a promoção de uma visão mais integrada das principais políticas públicas que contribuem diretamente para uma boa gestão da água.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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2.1 DESAFIOS DOS COMITÊS DE BACIAS

Um dos grandes problemas que podem ser observados nos comitês, e que vem se acentuando ao longo dos anos, está associado com a lentidão na captação de recursos, uma vez que estes (comitês) não têm personalidade jurídica própria. E por isso a dificuldade de se captar recursos para aplicação de seus projetos.

Este déficit institucional, somado à não concreção da cobrança pelo uso da água, exceto para alguns comitês que já implantaram a cobrança, dificulta a viabilização do processo, uma vez que a cobrança e outorgas são vistas como instrumentos fundamentais de controle e realização de políticas aplicadas aos recursos hídricos. E que demandam a institucionalização de uma Agência de Águas.

Associada à falta de recursos para implantação de projetos vem a falta de informações a respeito da atuação dos comitês, que é sempre objeto de críticas por parte da sociedade civil, e as críticas se dirigem à pouca participação social. No geral, a participação social se torna efetiva na ocorrência de algum acontecimento que lhe tenha causado dano material, como, por exemplo, em caso de perda de terreno devido a desmoronamento das margens de rios, inundações, entre outros.

Neste sentido, a função dos técnicos que atuam dentro de um Comitê tem sido estratégica para o seu fortalecimento, principalmente para que as informações possam convergir e produzir indicadores da realidade local em termos técnicos.

Porém, a problemática está em dar continuidade aos trabalhos realizados, pois frequentemente ocorre a descontinuidade administrativa dos órgãos/membros participantes dos comitês, em especial quando envolve projetos de longo prazo.

O comprometimento dos atores envolvidos representa o cerne das questões ambientais dentro de um comitê de bacias, pois, acima de conhecimento técnico que devemos ter de nossa unidade geográfica, há o desafio de atender aos interesses difusos. E seu funcionamento depende basicamente da atuação de alguns atores governamentais e da sociedade civil, no empoderamento das questões, quando participam de um espaço privilegiado de discussões que, no caso, é um Comitê de Bacias.

Sendo assim, um dos principais desafios é a capacitação constante dos membros participantes, a interação entre os comitês e a busca por uma participação efetiva e afetiva da sociedade civil organizada. Estas observações estão no percalço de elementos homogeneizadores a fim de fortalecer a dinâmica de troca de experiências e práticas inovadoras.

Poucos conflitos emergem nos comitês, por ocorrer uma busca incessante dentro do consenso das questões que estão em pauta, embora se observe que a existência de conflitos contribui significativamente para a mobilização dos

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TÓPICO 4 | DESAFIOS E AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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2.1 DESAFIOS DOS COMITÊS DE BACIAS atores envolvidos. As experiências refletem, muitas vezes, de forma controversa, as condições para a definição de novas ideias, para as relações entre técnicos e leigos, técnicos e usuários e entre os setores: público, privado e sociedade civil.

Os comitês representam o respeito entre as diferenças, porém com desafios comuns, entre os quais se destacam:

a) a fragilidade dos mecanismos voltados para garantir a efetiva participação e representatividade da sociedade civil e usuários;

b) a dificuldade para se pôr em prática mecanismos legais e institucionais que permitam e operacionalizem a cobrança pelo uso da água.

IMPORTANTE

Pensar os desafios que se apresentam aos Comitês de Bacias na gestão da água é muito mais que entender como seu sistema está estruturado, é, sim, perceber quais são os pensamentos e crenças que estão por trás da construção desta estrutura de gestão e que dão base para ela continuar existindo. Por isso, convidamos você para refletir sobre um assunto ainda muito pouco discutido, mas que integra a história da humanidade, que sãos os valores humanos socialmente construídos, ou seja, qual o pensamento que conduz nosso comportamento na prática do dia a dia e que resulta em consequências boas ou não a tudo o que nos diz respeito, neste caso, a gestão da água.

Antes de iniciarmos a conversa relacionada aos nossos valores ambientais na gestão da água, queremos esclarecer o que são os valores éticos. Para Steven (2003), a ética pode ser conceituada como um conjunto de valores que levam um grupo social a se portar de acordo com suas crenças, e ética ambiental seria a aplicação de seus valores dentro do contexto certo/errado no que concerne às questões ambientais de acordo com as influências culturais.

2.2 VALORES AMBIENTAIS E OS DESAFIOS PARA AVANÇAR NA GOVERNANÇA DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

Para Arrojo (2006), a sustentabilidade é apenas uma parte do desafio ético que está despertando o movimento de cidadãos para uma nova cultura da água, tendo em vista que o atual modelo globalizado propõe-se a reforçar a abordagem tradicional de gestão da água como apenas um recurso para promover a comercialização e a liberação do abastecimento de água.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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Quando a gestão da água é vista sob o ponto de vista da burocracia e da ineficiência da administração pública, é trocada pela eficiência e modernidade da gestão privada sob as leis do mercado, ou seja, o acesso à água dá-se de acordo com as condições dos que possuem meios de pagar.

Unindo-se a este desafio, a Declaração Europeia por uma Nova Cultura da Água (FNCA, 2005) lembra que outro desafio está relacionado à governança, com a falta de transparência e envolvimento da população. Deste ponto de vista, pode-se perguntar: estamos vivendo uma crise ecológica dos ecossistemas da água ou uma crise de governança da água?

Respondendo a estes desafios, a ética para a sustentabilidade e a governança deve estar associada às ações desenvolvidas em cada realidade, cada localidade geográfica, através de programas e políticas já existentes em cada local e que respeitem a capacidade para desenvolver habilidades regionais através da participação ativa dos cidadãos, envolvendo a cooperação descentralizada.

A mudança do paradigma deverá ser concebida de acordo com a diversidade cultural, no respeito mútuo entre o patrimônio natural e cultural, integrando valores para um modo de vida sustentável, adotando uma visão integrada nos valores ambientais, econômicos, sociais, éticos, religiosos e emocionais, no intuito de construir uma nova inteligência coletiva.

Para tanto, necessita-se relembrar que os valores humanos são socialmente construídos, a fim de compreender que há a possibilidade de revisar e modificar estes valores. E isso é claramente identificado ao retratarmos que os significados e valores se constroem culturalmente, porém se aplicam de maneira diferenciada e se reinterpretam de acordo com as possibilidades existentes e, em circunstanciais mudanças, podem gerar novos padrões culturais.

De acordo com a Declaração Europeia (FNCA, 2005), deve-se pensar nas prioridades sobre os usos da água não apenas no âmbito da técnica ou de estratégia política, mas também no comprometimento da sociedade e seu empoderamento, considerando do ponto de vista da interdisciplinaridade na gestão da água, onde os saberes são diferentes, mas possuem igual importância nas discussões.

Isso requer uma mudança bastante aprofundada ao se tratar da governança da água, principalmente nos quesitos democráticos nos processos decisórios, quando se necessita de reformas institucionais de difícil alcance, que garantam não somente transparência e participação proativa dos cidadãos, mas também uma abordagem interdisciplinar no trato destas questões.

No Brasil, este desafio é facilmente identificado em diversos estudos, apontando que a gestão pública é caracterizada por um modelo baseado em um valor racional de escolhas que privilegiam o conhecimento técnico-científico.

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TÓPICO 4 | DESAFIOS E AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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Conforme já enfatizamos, a tomada de decisão, em geral, ainda é com base nas opiniões de técnicos do setor público, tornando o processo desigual no que diz respeito ao poder de decisão.

Para chegar à mudança social a partir do complexo processo da governança, principalmente considerando-se do ponto de vista da interdisciplinaridade, se fazem necessárias algumas reflexões que, do ponto de vista de Long (2007), parecem essenciais para avançar e atingir certo grau de mudança. Entre elas é que:

a) a vida social é heterogênea. Compreende uma ampla diversidade de formas sociais e repertórios culturais, em circunstâncias aparentemente homogêneas;

b) é necessário estudar como se produzem e reproduzem, consolidam e transformam as diferenças cotidianas, e identificar os processos sociais envolvidos e não somente os resultados estruturais;

c) tal perspectiva requer uma teoria de agência baseada na capacidade dos atores para ordenar e sistematizar suas experiências e as de outros atores sobre elas;

d) a ação social nunca é unicamente individual, centrada em si (no ego), e sim, tem lugar nas redes de relações, formando-se tanto pela rotina quanto por práticas organizativas, sujeitas a convenções sociais, valores e relações de poder;

e) relacionada com esses processos está a questão da escala, onde o projeto individual do ator social em escala micro penetra nos vários espaços sociais, simbólicos e geográficos da escala macro;

f) a interface social, na qual se exploram as maneiras em que as discrepâncias de interesse social, interpretação cultural, conhecimento e poder são mediadas e perpetuadas, ou transformadas e confrontadas.

Essas reflexões possibilitam entender os processos pelos quais as formas sociais e arranjos surgem e se consolidam e redefinem a vida cotidiana das pessoas, dando pistas de como acontece a construção e reconstrução social, que constroem os cenários locais e como estes se entrelaçam com cenários mais amplos.

As interações devem ser analisadas como parte dos processos contínuos de negociação, adaptação e transferência de significados entre os atores envolvidos, pois o estudo das diferentes interfaces sociais, da conjuntura crítica das arenas, em que se supõem diferenças de valores normativos e interesses sociais, implica não só a compreensão da luta e das diferentes relações de poder, mas sim também um esforço de revelar a dinâmica da acomodação cultural que faz ser possível a interação das diferentes visões de mundo.

Portanto, mais importante que uma multiplicidade de redes de conhecimento, é essa multiplicidade de conhecimento integrado, dialogando e considerando os valores e interesses de cada ator social envolvido.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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A complexidade dos processos sociais suscita pensar a respeito de quais são as formas de atuação que até então se têm construído para a governança da água. A partir da ideia de Warner (2009), apontam-se duas formas de abordagem mais conhecidas que conduzem o aprendizado social na governança, conforme o quadro a seguir:

QUADRO 16 – MODELOS DE ABORDAGEM PARA A GOVERNANÇA DA ÁGUA

ABORDAGEM DE PROJETO ABORDAGEM DE PROCESSOBaseada na autoridade. Baseada na confiança e interdependência.

Diferença de poder. Ideal de igualdade de direitos: todos podem colaborar.

FONTE: Adaptado de: Warner (2009)

Para refletirmos melhor, talvez a pergunta a ser feita fosse: quais são os valores que norteiam as diferentes abordagens que direcionam o perfil da governança da água no Brasil?

Na tentativa de iniciar essa discussão, toma-se como ponto de partida alguns dos princípios da Declaração Europeia para uma Nova Cultura da Água (FNCA, 2005), em comparação com os fundamentos da Lei nº 9.433/07, conforme segue no quadro.

QUADRO 17 – UMA NOVA ÉTICA NA GESTÃO DA ÁGUA E OS FUNDAMENTOS DA LEI Nº 9.433/07

PRINCÍPIOS DA DECLARAÇÃO EUROPEIA PARA UMA NOVA CULTURA DA ÁGUA

FUNDAMENTOS DA LEI Nº 9.433/07

Água para viver: função primordial à qual deve ser atribuída prioridade máxima, reconhecendo os recursos hídricos como patrimônio da biosfera e o acesso à água potável como um direito humano universal que, juntamente com a sustentabilidade da biosfera, deve ser garantido a todos segundo o princípio da eficácia.

I - a água é um bem de domínio público; [. . .] III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais; [...]

Água para objetivos de interesse geral: diz respeito às funções da água na preservação da saúde pública e da coesão social, envolvendo direitos sociais (segurança e bem-estar coletivos) que devem ser os próximos na escala de prioridades, conforme o princípio da eficiência social.

IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas; [...]

Água para o crescimento econômico: refere-se a atividades econômicas legítimas baseadas no uso da água, orientadas pelo interesse privado e o direito individual de melhorar os padrões de vida, às quais se confere o último nível de prioridade. A alocação de água para esta função deve ser gerida de acordo com os princípios de racionalidade e eficiência econômica.

II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico; [...]

FONTE: Adaptado de: Declaração Europeia por uma Nova Cultura da Água (FNCA, 2005) e Lei nº 9.433/07

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TÓPICO 4 | DESAFIOS E AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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QUADRO 17 – UMA NOVA ÉTICA NA GESTÃO DA ÁGUA E OS FUNDAMENTOS DA LEI Nº 9.433/07

A partir da comparação destes princípios, nos desafiamos a refletir e repensar: qual é o perfil da governança da água que está se construindo no Brasil, considerando-se do ponto de vista das práticas e valores estabelecidos pelos Comitês de Bacia vistos até o momento?

Isto tendo em vista que os fundamentos da Lei nº 9.433/07 é que regulamentam as ações dos Comitês de Bacia e que os princípios da Declaração Europeia para uma Nova Cultura da Água (FNCA, 2005) têm sido uma das propostas mais relevantes em termos de orientações para a mudança de valores éticos na governança da água no mundo.

LEITURA COMPLEMENTAR

GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: DIFICULDADES DE ARTICULAÇÕES TERRITORIAIS

Gisela Aquino Pires do Rio Vinícius Pinto Moura

Maria Naíse de Oliveira Peixoto

Definições de Planejamento, Gestão e Gerenciamento

A concepção acerca da gestão, que permeia o nosso trabalho, é de que ela é um processo fundamentalmente marcado pela negociação que envolve diversos atores sociais, com o intuito de tomarem decisões. Entendemos também que a gestão não pode ser dissociada de um caráter participativo e integrado, ou seja, para que um processo de negociação visando à tomada de decisões seja eficaz, ele deve proporcionar tanto a participação do maior número de atores sociais e entidades representativas destes atores, como garantir que tais atores tenham, relativamente, o mesmo peso na tomada de decisões.

Desta forma, a criação de um grupo gestor constituído de membros do Estado, usuários dos recursos, organizações civis, instituições de ensino e pesquisa, imprensa, entre outros, formando o que se denomina de poder local, seria o primeiro passo para a prática efetiva da gestão. Isso dá ao processo uma perspectiva integrada, participativa e descentralizadora, pressupondo uma atuação interdisciplinar e interinstitucional. Além disso, a participação no processo de tomada de decisões tem um recorte espacial específico para que seus princípios e instrumentos sejam aplicados com eficácia, visando ao alcance da melhoria da qualidade de vida: a escala local. Isso, todavia, não quer dizer que a tomada de decisões deva restringir-se à escala local. Ao contrário, as atividades de gestão abarcam a totalidade da bacia hidrográfica em questão. A escala local apenas facilita a eficácia da participação na tomada de decisões sobre a bacia hidrográfica.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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Entendemos, portanto, a gestão como um processo de constante discussão de problemas, proposição de soluções, resolução de interesses difusos, ou seja, um trabalho de reavaliação de diretrizes anteriormente fixadas em um plano de ação. Este mecanismo de adequação visa reconhecer e avaliar os novos elementos que entram e fazem parte desta arena que envolve interesses difusos, seus impactos e como eles devem ser conduzidos.

Fica implícita a ideia de que o processo de gestão possui ações diferenciadas. Identificamos estas ações como sendo: a gestão propriamente dita, o planejamento e o gerenciamento.

As ações que compõem o processo de gestão ocorrem com uma certa simultaneidade e estão inter-relacionadas umas com as outras, diferenciando-se pelos seguintes critérios:

a) as forças que, inseridas dentro da escala hierárquica da tomada de decisão, atuam em cada uma destas etapas;

b) as finalidades ou objetivos de cada etapa;

c) os instrumentos utilizados.

O planejamento está ligado, dentro da escala hierárquica da tomada de decisão, ao poder público. Este projeta metas, objetivos e atividades a serem alcançados em um intervalo de tempo relativamente amplo e em conjunto com os demais atores envolvidos no processo de gestão, através do plano. A etapa do planejamento também inclui a elaboração de políticas públicas regulatórias sobre o processo de gestão, com o estabelecimento de diretrizes para a atuação dos atores envolvidos.

A motivação do planejamento está geralmente ligada à necessidade de resolução de conflitos entre os atores sociais envolvidos, em decorrência das demandas diversificadas, ou ainda em razão de pressões sobre o Estado por parte de alguns grupos sociais.

No caso dos recursos hídricos, estes movimentos de pressão podem ser gerados por problemas relacionados à escassez ou poluição hídrica e seus desdobramentos. O planejamento assume, portanto, os pressupostos de ser participativo e integrado, por estar inserido no processo de gestão, possuindo também como recorte espacial a bacia hidrográfica.

O gerenciamento, por sua vez, é entendido como uma ação de administração setorial do que foi planejado. Portanto, na gestão dos recursos hídricos temos o gerenciamento da demanda abarcando tanto aspectos quantitativos quanto os de qualidade da água, o gerenciamento de conflitos e outros.

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TÓPICO 4 | DESAFIOS E AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL

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Entendemos, desta forma, que o gerenciamento relaciona-se de modo mais estreito com a escala regional/local. Como já foi dito anteriormente, o processo de negociação para a tomada de decisões é dinâmico. A entrada de novas informações e variáveis neste campo de forças ou arena é inevitável. Existe, portanto, a necessidade constante de reavaliar e remodelar o que foi planejado, para adequar as metas, objetivos e diretrizes gerais à nova dinâmica que se constrói.

Nota-se que a definição da escala de atuação é um processo intrínseco à gestão, ao planejamento e ao gerenciamento dos recursos hídricos. A adoção da bacia hidrográfica como unidade de gestão pela Lei nº 9.433/97 “[...] impõe um novo recorte espacial sobre a malha federativa do país, pois os limites das bacias muitas vezes ultrapassam municípios, estados, regiões e, em alguns casos, países” (PIRES DO RIO et al., 2001, p. 95).

Cria-se uma nova lógica espacial para a atuação de certos atores e surgem conflitos decorrentes de “[...] uma ruptura que afeta as articulações territoriais tradicionais. Em outros termos, os atores possuem uma localização que implica posicionamentos, disputas, conflitos e negociação que colocam em jogo forças que são espaciais” (PIRES DO RIO; PEIXOTO, 2001, p. 62).

Afetada por esta nova lógica espacial estabelecida está a distribuição dos recursos financeiros, conforme já havíamos apontado. As visões diferenciadas sobre a questão decorrem da criação de uma superfície de regulação que se superpõe ao modelo federativo brasileiro (PIRES DO RIO; PEIXOTO, 2001).

FONTE: Adaptado de: <http://www.abrh.org.br/novo/ii_simp_rec_hidric_centro_oeste_campo_grande46.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2013.

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Neste tópico você estudou:

• A verdadeira participação compreende os desafios da implantação dos comitês de bacias, pois esta deverá ser efetiva.

• A ética ambiental e a governança devem se entrelaçar nas ações desenvolvidas de cada realidade e para cada localidade, através de programas e políticas que são implantadas. Elas devem respeitar as especificidades de cada grupo e chamá-lo à participação.

• A mudança do paradigma deverá ser concebida de acordo com a diversidade cultural, adotando uma visão integrada dos valores ambientais, econômicos, sociais, éticos, religiosos e emocionais, no intuito de construir um novo padrão, participativo e ativo.

• Os princípios norteadores da Declaração Europeia para uma Nova Cultura da Água permeiam os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos, pois afirmam que a água é um bem público, finito e dotado de valor econômico. Em outra instância, defende seus múltiplos usos e uso prioritário.

• Vimos inúmeras informações importantes que nos proporcionaram entender como se formam e como se formarão os processos de análise e gestão de uma bacia hidrográfica. Vimos que o principal foco da gestão são os recursos hídricos, mas que todos os outros aspectos (físico, social, econômico e ambiental) estão intrinsecamente ligados a esse processo.

RESUMO DO TÓPICO 4

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AUTOATIVIDADE

Faça uma análise crítica das políticas públicas implantadas no seu município, nos últimos anos, leve para a sala de aula e discuta com os demais acadêmicos. Observe se os problemas enfrentados entre os municípios a serem discutidos são os mesmos e proponha soluções.

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TÓPICO 5

A INSERÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL – PELA

CONSERVAÇÃO DA ÁGUA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Lei no 9.795, de 27 de abril de 1999

Art. 1o Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.

UNI

Observando o assunto acima tratado, este nos inspira a pensar em nossos próprios valores e interesses, o que exige muita informação, conhecimento, educação e, principalmente, responsabilidade e participação ativa de todos. Neste importante debate insere-se outro aspecto importante e que contempla uma das propostas para a mudança destes valores: a educação ambiental.

Caro(a) acadêmico(a), chamo a sua atenção agora a respeito da Lei nº 9.795/1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA), pois um dos seus objetivos é o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações. Relações estas que envolvem aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos.

Assim, esta lei deve ser entendida como o conjunto de processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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Estimular as pessoas a refletir sobre seu comportamento frente às questões de consumo, para que seja possível diminuir os impactos, é o primeiro passo para a implantação da base legal e social referente à lei de educação ambiental.

2 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA CONTEMPORANEIDADE

A sociedade contemporânea é marcada pelo consumo. Muitas vezes, queremos mais do que realmente precisamos, e a decisão está nas mãos dos consumidores a pensarem sobre a próxima compra.

O consumidor deverá considerar a real necessidade da mercadoria, seu modo de fabricação e quais são as alternativas disponíveis no mercado que respeitam o meio ambiente.

Segundo Paula Júnior e Modaelli (2011), o consumo sustentável configura uma importante ferramenta para o desenvolvimento de um país, mas para que isso ocorra deverá haver a necessidade plena de sensibilização e responsabilidades por parte dos produtores e consumidores.

No contexto em que se insere o consumo responsável, cada indivíduo deverá se preocupar com seu consumo individualmente, onde cada um faz a sua parte e, assim, somatizando suas ações às de outros indivíduos.

Para isso, os centros educacionais em todos os níveis, formais ou não formais, representam um papel preponderante na formação de consumidores responsáveis.

O exercício de soberania do cidadão está passando pela educação ambiental, consolidando-se através de práticas pedagógicas transdisciplinares, facilitando o diálogo, a troca de saberes e a tomada de decisão, onde o interesse coletivo se sobreponha ao individual.

A educação ambiental está sendo utilizada como uma importante ferramenta da análise ambiental, que contribui para disponibilizar informações compartilhando percepções e assim contribuindo para facilitar os diálogos e negociações dos diferentes interesses e da aprendizagem compartilhada em sua dimensão ética, onde somente através de processos educacionais se consegue uma nova postura do homem em relação ao meio ambiente.

Numa ação conjunta entre entidades governamentais, não governamentais, técnicos e sociedade civil organizada, uma gestão compartilhada visa a um nivelamento das informações e da sensibilização da sociedade como um todo, acerca da importância da preservação e conservação ambiental, fazendo com que seja uma educação ambiental que atue em qualquer nível, seja formal ou informal.

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TÓPICO 5 | A INSERÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL – PELA CONSERVAÇÃO DA ÁGUA

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A partir daí, a EA está sendo vista como uma possibilidade de mudança positiva do comportamento e ações adquiridas da sociedade, individual ou coletivamente, com o benefício do uso racional dos recursos naturais, uma vez que os problemas ambientais são decorrentes de fatores culturais, sociais e econômicos.

A sociedade vem tomando consciência de que para alcançar uma gestão eficaz é necessária uma nova postura, tanto por parte do poder público como por parte do cidadão. E assim, nada melhor do que a inserção da educação ambiental como principal ferramenta da mudança de paradigma para o conhecimento ambiental. O homem se tornando crítico e fiscal de seus atos. Se pudermos chegar a esse nível, nosso trabalho terá valido a pena.

FONTE: Meurer (2011, p. 67)

A educação deve se sustentar em quatro pilares, em um processo contínuo, sendo, de algum modo, os pilares do conhecimento de cada indivíduo: 1) aprender a conhecer, implica em adquirir instrumentos para melhor compreender o mundo à sua volta; 2) aprender a fazer para poder agir; 3) aprender a viver juntos, o estímulo à cooperação, e aprender a ser a mola propulsora que integra os três precedentes (DELORS, 2001).

ATENCAO

Paula Júnior e Modaelli (2011) chamam a atenção para algumas questões relacionadas à participação social nas ações ambientais, entre as quais destacam:

1) a ampliação e qualificação do comprometimento, tanto social como político, por parte da sociedade, nas questões referentes à gestão ambiental e hídrica;

2) a participação ativa na gestão e na representatividade perante os comitês de bacia.

O grande desafio do Programa Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) é implementar o Programa de Educação Ambiental (PEA) de forma permanente em todos os comitês de bacias hidrográficas. No entanto, deverá ser de forma estratégica, a fim de que esta não seja meramente vista como uma prática educativa, mas que sirva como fonte de consulta, com informações claras, para que a sociedade possa ampliar sua capacidade de interpretar informações socioambientais a respeito de sua comunidade.

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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Podemos perceber que o entrave da EA no país é pedagógico e político e vem sendo desenvolvido em processos, na sociedade. Contudo, que seja uma forma que propicie diagnósticos e planejamentos socioambientais, amplie a capacidade de interpretação dos indivíduos e assim contribua para uma participação de qualidade nas distintas representatividades dos colegiados ambientais.

IMPORTANTE

Caro(a) acadêmico(a), em 1992 a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o dia 22 de março como Dia Mundial da Água. A partir de então, a cada ano o órgão promove assuntos relevante relacionados à água. Fique atento(a) aos eventos de que você poderá participar no Comitê de Bacias do seu município.

Em suma, o contexto que envolve a EA deve ser desenvolvido a fim de ajudar o cidadão a construir o seu próprio conhecimento e opinião sobre as questões ambientais, para que, dessa forma, possa assumir posições e valores referentes à sua proteção, equilibrando o desenvolvimento e a disponibilidade dos recursos ambientais.

2.1 EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM SANEAMENTO – AÇÕES DE PROTEÇÃO DAS ÁGUAS

IMPORTANTE

Sabe-se que são muitos os problemas que afetam a qualidade dos recursos hídricos. Muitos estudiosos associam esta problemática à falta de planejamento decorrente do crescimento desordenado das cidades, onde a falta de saneamento básico representa um dos maiores problemas e desafios a serem enfrentados pelos gestores. Para saber mais sobre este assunto, pesquise sobre a Lei nº 11.445/07, que trata especificamente do saneamento básico e suas regras para implementação no país.

A cidade de Johanesburgo, na África do Sul, no ano de 2002, serviu de palco aos debates promovidos pela Cúpula Mundial de Desenvolvimento Sustentável, reunindo representantes dos governos de várias nações, bem como instituições financeiras, representantes da sociedade civil, entre outras entidades, com o propósito do comprometimento de reduzir pela metade o número de pessoas que não têm acesso à água de boa qualidade e das que não dispõem de redes de esgotos no mundo (VIEIRA; COSTA; BARRETO, 2006).

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TÓPICO 5 | A INSERÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL – PELA CONSERVAÇÃO DA ÁGUA

213

A seguir, encontram-se enumerados os propósitos e acordos firmados sobre esta reunião, incluindo:

1. atender necessidades básicas: água boa e suficiente e condições sanitárias para todos;

2. garantir suprimento alimentar: especialmente para os pobres e os mais vulneráveis pelo uso da água;

3. proteger os ecossistemas: garantindo sua integridade via gerenciamento sustentável dos recursos hídricos;

4. promover a cooperação pacífica entre os Estados envolvidos e seus diferentes usos da água pelo gerenciamento sustentável do nível de base dos rios;

5. gerenciar riscos: oferecendo segurança a partir de ações que evitem as doenças transmitidas pela água;

6. valorar a água: gerenciar a água a partir de seus diferentes valores (econômicos, sociais, ambientais, culturais); cobrar o uso para recuperar os custos de fornecimento, levando em conta a equidade e as necessidades dos pobres;

7. gerenciar a água: envolvendo o público e os interesses de todos;

8. promover a integração entre água e cidades: reconhecendo os desafios distintos de um mundo crescentemente urbanizado, onde o interesse econômico se sobrepõe às necessidades da população e da natureza.

Com o propósito de atingir esses objetivos, além de cuidar dos recursos hídricos e de economizar água, é uma questão de cidadania rever antigos conceitos, hábitos e comportamentos inadequados nas questões de cunho ambiental. Pequenas mudanças de hábito poderão significar grandes avanços para o desenvolvimento sustentável.

O Brasil vem abarcando essas metas de várias formas, entre elas, a implantação de políticas públicas que envolvem tais questões, como é o caso da Política de Saneamento Básico.

De acordo com as diretrizes da Lei nº 11.445/07, o saneamento básico envolve não somente o esgoto sanitário, como a maioria das pessoas acredita, como também o abastecimento de água potável, a limpeza urbana, o manejo de resíduos sólidos, a drenagem e o manejo das águas da chuva. Essas atividades integram ações que garantem a salubridade ambiental.

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Vale ressaltar, no estudo desta lei, a importância que envolve os comitês de bacias, onde os planos municipais de saneamento básico deverão ser compatíveis com os planos da bacia hidrográfica na qual o município se insere, de forma articulada e transparente, envolvendo os distintos segmentos sociais em comum acordo com o poder público, reafirmando o que diz a Lei das Águas.

Já que os assuntos ambientais são do interesse de todos, devem-se desenvolver atividades educativas ambientais que possibilitem a compreensão sistêmica que este assunto exige e estimular a participação das comunidades, de forma consciente, em prol da melhoria da qualidade de vida.

Nessa busca pela melhoria dos serviços de saneamento é preciso um olhar atento à realidade de sua comunidade, pois para transformá-la é essencial que a população conheça os diferentes aspectos que envolvem o saneamento.

IMPORTANTE

Caro(a) acadêmico(a), participe ativamente dos foros de discussões e audiências públicas, onde são tomadas as decisões sobre as prioridades de investimentos e empreendimentos de sua comunidade e exerça seu direito social ao longo do processo.

Nesse contexto, a educação ambiental em saneamento se torna uma importante ferramenta, constituindo-se de forma promissora na participação popular de atuação, que busca, por meio de ações articuladas entre poder público e o cidadão, formas eficazes de transformação da realidade social e estrutural de sua cidade.

Com esta preocupação, o governo federal criou o Programa de Educação Ambiental e Mobilização Social em Saneamento (PEAMSS), a fim de implementar o saneamento básico nas cidades, a partir da educação ambiental.

Um forte pilar deste programa é contribuir para a formação de uma população mais comprometida, para atuar coletivamente norteando a construção de “sociedades sustentáveis”, como preconiza o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global e a Lei Nacional do Saneamento Básico nº 11.445, de 05/01/2007.

Como podemos perceber, a perspectiva da política federal do setor deixa clara a importância da participação popular na regulamentação e implantação das diretrizes nacionais para o saneamento básico. É de responsabilidade de todos a melhoria dos serviços de saneamento básico.

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Porém, para que este objetivo seja alcançado, faz-se necessário conhecer com clareza a realidade local. Para tanto, cada brasileiro também pode contribuir, como:

criar grupos de voluntários para proteção das nascentes e áreas de mananciais;

promover ações de educação ambiental e de educação para a saúde no seu ambiente de estudo e/ou trabalho;

promover um diagnóstico da situação ambiental, econômica e social da água, no seu município;

promover palestras educacionais para a conservação dos recursos hídricos e a melhoria das condições de higiene pessoal;

envolver e desenvolver grupos de estudos de educação ambiental com agricultores, pescadores e comunidades quilombolas;

identificar, informar e mobilizar as autoridades e instituições sobre a realidade da água em seu município.

As políticas públicas para o saneamento são direcionadas para todos os segmentos sociais, desde os quilombolas aos agricultores, portanto, quando essas não são bem elaboradas, há necessidade de outro aparato, as políticas sociais, que irão servir de suporte social.

IMPORTANTE

As políticas sociais são ações desenvolvidas pelo governo, em forma de programas, a fim de assegurar direitos do cidadão. Elas podem ser aplicadas em diversos segmentos, como: ambiental, habitacional, educacional, trabalho, saúde, agricultura, assistência social, entre outros.

Medidas sociais direcionadas para um segmento da sociedade priorizam seus valores calcados no convívio participativo e na sustentabilidade, beneficiando a todos e fornecendo condições de superar suas desigualdades.

Caro(a) acadêmico(a), fique atento(a) à importância de uma política pública bem planejada, pois ela deve beneficiar a todos, independentemente de suas diferenças socioculturais, propiciando-lhes igualdade de condições para superar suas desigualdades e mantendo sua história e identidade cultural.

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As políticas públicas são voltadas ao comunitário e participativo em desenvolvimento local, respeitando variáveis como fauna e flora, onde cada ator social possui a sua especificidade, a fim de tornar um ambiente igualitário e econômico, respeitando sua relação com o meio ambiente.

NOTA

Falamos em políticas públicas, mas você sabe o que isso significa? “Políticas públicas são conjuntos de programas, ações e atividades desenvolvidas pelo Estado diretamente ou indiretamente, com a participação de entes públicos ou privados, que visam assegurar determinado direito de cidadania, de forma difusa ou para determinado segmento social, cultural, étnico ou econômico.”FONTE: Disponível em: <http://www.meioambiente.pr.gov.br/arquivos/File/coea/pncpr/O_que_sao_PoliticasPublicas.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2013.

3 PRINCIPAIS POLÍTICAS PÚBLICAS NA GESTÃO DA ÁGUA

A ideia central para uma política pública ser eficiente é que ela deve ser pensada de forma integrada, e algumas discussões que giram em torno desta temática foram realizadas.

Alguns países firmaram compromissos em eventos como na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (ECO-92), realizada no Rio de Janeiro; a Conferência Panamericana sobre Saúde e Ambiente no Desenvolvimento Humano Sustentável, sediada em Washington, nos Estados Unidos, em 1995; e as Reuniões de Cúpula de Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, em 1996, e Santiago, no Chile, em 1998.

Apresentamos alguns pontos em comum desses eventos:

• a justiça social;

• a participação e responsabilidade da sociedade;

• o desenvolvimento sustentável;

• o respeito aos direitos humanos;

• a conservação ecológica.

No Brasil, foi a partir da Constituição Federal de 1988, que se fixou no artigo 225, o marco fundamental para a conservação e preservação ambiental. Este artigo estabelece que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”.

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3 PRINCIPAIS POLÍTICAS PÚBLICAS NA GESTÃO DA ÁGUA

Outro artigo constitucional que se destaca é o artigo 196, que faz menção à saúde:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Embora já tenhamos apresentado algumas dessas leis em nosso caderno, vale a pena relembrar algumas políticas que defendem a proteção ambiental atrelada à qualidade de vida e à saúde. A integração das políticas e as ações em prol do saneamento refletem no ecossistema ecologicamente equilibrado e na saúde da população.

Lei nº 6.938/1981, a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental;

Lei nº 9.433/1997, Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), que tem como objetivo assegurar às atuais e futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequada aos usos múltiplos;

Lei nº 8.080/90, representa ações voltadas a: vigilância sanitária e epidemiológica, fiscalização e inspeção de alimentos, água e bebidas para consumo humano; participação e formulação da política e na execução de ações de saneamento, colaboração na proteção do meio ambiente. Destaca-se ainda em atribuições desta lei o artigo 7º, inciso X, sobre a integração das ações de saúde, meio ambiente e saneamento;

Lei nº 9.795/1999, institui a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA), que tem como um dos principais objetivos o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos;

Lei nº 11.445/07, Política Nacional de Saneamento Básico (PNSB), que tem por objetivo minimizar os impactos ambientais relacionados à implantação e ao desenvolvimento das ações de saneamento básico e assim assegurar a proteção do meio ambiente.

A proteção da água deve ser pensada e vinculada a setores como: saneamento, meio ambiente e saúde da população, por isso o planejamento e as ações devem ser voltados às demais políticas e programas, que permitam sua integração.

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3.1 A NECESSIDADE DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ATUALIDADE

IMPORTANTE

A educação ambiental deve fazer parte no nível formal e informal na sociedade, de forma crítica, contínua e em longo prazo.

Atualmente o homem se defronta com graves problemas que assolam a humanidade, em decorrência da busca incessante pelo desenvolvimento e avanços tecnológicos. Estamos diante desta nova realidade: a escassez de água potável, a destruição em massa de florestas, a extinção de espécimes, o buraco da camada de ozônio, o aquecimento global, entre outros fatores que geram o caos político e social.

Chegamos ao fim de nossa era? Devemos acreditar que não, pois fazemos parte de uma nova forma de organização social e passamos por um período de transição de uma nova forma de o homem se adaptar ao meio.

Quando se fala em Gaia (deusa grega que representa a personificação da Terra), refere-se ao planeta como um organismo vivo, onde todas as formas de vida são interdependentes e inseparáveis. Atualmente o homem vem interferindo de modo negativo e com isso desequilibra esse imenso organismo vivo.

Desde seu surgimento na Terra, o homem luta por sua sobrevivência. Enquanto vivia de caça e coleta de produtos vegetais, foi escravo do meio. Porém, levou milhões de anos para escravizar o meio, e dessa forma, numa proporção direta com o aumento populacional, cresceram também suas exigências consumistas, desencadeando os problemas ambientais em um alarmante quadro de esgotamento de recursos, consequentemente ocasionou uma crescente degradação sobre o meio.

Em um quadro geral que envolve os recursos naturais, estamos diante da ameaça da poluição das águas, da destruição das matas ciliares e das florestas, que envolve: a perda de espécimes; a aceleração da erosão genética e, ainda, a devastação de ecossistemas.

A extinção de espécies é um fenômeno natural e parte do processo evolutivo de adaptação ao meio. Mas a questão é o ritmo acelerado pelo homem, suas atividades afetando negativamente a sobrevivência das demais espécimes e da sua própria.

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Uma vez desequilibrando Gaia, seus efeitos se farão sentir, como as fúrias da natureza que enfrentamos hoje, e especialistas preveem que essas manifestações serão ainda mais frequentes e intensas.

O desaparecimento de espécies de plantas e animais não está restrito às áreas urbanas e nem aos países desenvolvidos que possuem tecnologia de ponta. Os impactos urbanos sobre a diversidade biológica chegam ao seu grau mais elevado nos países em fase de desenvolvimento, e estima-se que milhares de espécimes endêmicas foram levadas à extinção antes de serem descritas.

[...] A diversidade genética ocorre tanto dentro de um indivíduo quanto no conjunto dos indivíduos de uma população da mesma espécie. Aí se encontra a totalidade da variabilidade genética, que aumenta ou diminui conforme o tamanho desta população. É por isso que espécies ameaçadas de extinção – que contêm populações reduzidas – podem perder a variabilidade genética... Esta perda também é conhecida por erosão genética. A erosão genética reduz as chances de sobrevivência de uma espécie, pois diminui a sua capacidade de se adaptar às mudanças ambientais. (CRESPO, 2006, p. 6).

A importância de se preservar a diversidade biológica e seus organismos ecológicos dos quais fazem parte está justamente em assegurar a conservação do seu habitat natural e assim garantir a produção e manutenção de seus espécimes, numa tentativa reducionista dos impactos ambientais.

IMPORTANTE

A diversidade biológica ou biodiversidade, como também é conhecida, é formada pelo conjunto de todos os seres vivos do planeta. Ela se divide, basicamente, em três níveis: nível molecular (diversidade genética); nível intermediário (onde ocorre a diversidade de espécies em um ecossistema) e nível superior (diversidade dos ecossistemas).

Grandes efeitos sobre o meio ambiente em áreas de grandes concentrações humanas podem resultar em grandes impactos diretos, incluindo muitos materiais poluentes e produtos tóxicos, colocando em risco a saúde humana e os ecossistemas.

A efetiva proteção dos recursos ambientais se faz necessária à implementação da educação ambiental de forma contínua e em longo prazo em todos os níveis educacionais, ou seja, partindo dessa premissa é esperado que a sociedade como um todo passe a ter uma postura ativa, tornando-se corresponsável com as questões ambientais, com a mudança de hábitos e atitudes, com uma nova racionalidade civilizatória.

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A Constituição brasileira de 1988 preconiza sua implantação em pequenas ações locais pensando em âmbito global. Assim sendo foi criada a Agenda 21, pois enfatiza o lema da ECO-92: “Pensar globalmente, agir localmente”. Este documento objetiva a união dos países em prol de estratégias e ações que orientam sociedades e governos a implantarem iniciativas educacionais/ambientais em uma visão integrada com o fim de se alcançar o desenvolvimento sustentável.

A visão integrada que deve ser adotada na mudança do paradigma, tanto comportamental como cultural das sociedades, insere-se na Teoria da Complexidade, por proporcionar uma visão integrada de análise, entendimento e ação para implantação de planos estratégicos para tomada de decisão nos processos de gestão compartilhada, para fins de maior efetividade nas questões ambientais, e, assim, permitindo um elo entre a sensibilização e as práticas da racionalidade sustentável.

Essa teoria nos ajuda a refletir a respeito do quanto as práticas impactantes ao meio ambiente são o resultado de um modo de vida adquirido ao longo dos anos de destruição e reconstrução do pensamento e da intervenção do homem no meio ambiente.

IMPORTANTE

A mudança do paradigma ambiental encontra suas raízes calcadas na adoção de políticas sólidas, capazes de aprimorar práticas sociais a fim de fortalecer a gestão democrática, pois se apresentam na gestão democrática, participativa e transparente, orientando as práticas pedagógicas, ofertando capacitação em todos os níveis e nos diversos segmentos da sociedade, formando um cidadão consciente e entendedor de seus direitos, deveres e proativo.

A legislação ambiental estabelecida no Brasil, como já vimos, adota as bacias hidrográficas como unidades de planejamento e gestão dos recursos hídricos. Contudo, ressalta que esta gestão deverá ser participativa, de forma que envolva os distintos atores sociais representando as diferentes instâncias: federal, estadual, municipal, além dos usuários de água e entidades civis.

É sabido que para mantermos a conservação de nossos recursos se faz necessária a participação de todos. Apesar dos desafios comuns, pode ser percebida certa heterogeneidade na capacidade destes Comitês de Bacia em superar tais desafios.

O procedimento de implantação dos novos paradigmas de implantação da gestão em educação ambiental, envolvendo as esferas federal e estadual, tem demonstrado consideráveis avanços.

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Ressalta-se que a comunicação entre ambas as esferas de poder tem levado à melhoria das políticas públicas implementadas. Entretanto, podemos destacar alguns aspectos positivos e inovadores:

a) o reconhecimento da água como um bem público e dotado de valor econômico, como preconiza a Lei nº 9.433/97 de recursos hídricos;

b) a adoção e valorização do planejamento integrado e intersetorial; e

c) o fórum democrático, descentralizado e participativo da gestão local - os Comitês de Bacia.

Para que a comunidade apoie e participe ativamente, ela deve estar envolvida com a causa, e esse envolvimento parte, a priori, do conhecimento e da compreensão dos problemas ambientais em questão.

FIGURA 37 – PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE

FONTE: Os autores

Nesse contexto, a formação da criança crítica e participativa, envolvida com as causas ambientais de sua comunidade, forma um forte elo entre os conceitos que surgem da tecnologia, da informação e das transformações do conhecimento. Com isso, motiva seus pais e, consequentemente, modela uma sociedade.

Assim, o engajamento que se faz entre o elo aluno/sociedade e escola tem um papel fundamental, pois direciona e medeia a relação da instrução, conhecimento (cognitivo) e criticidade na formação de futuros cidadãos participativos e críticos. Esses adjetivos se tornam primordiais para a elevação do nível social e econômico de uma nação.

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ÁGUAS SEM FRONTEIRAS: A GESTÃO DEPENDE DE CADA UM

Andrée de Ridder VieiraLarissa Costa

Samuel Roiphe Barreto

Cada pessoa tem um jeito de organizar seu modo de viver. Programa a maneira de cuidar da família, do trabalho ou do lazer, direcionando as atividades de acordo com o tempo, o espaço, as limitações e os recursos. Conforme vai amadurecendo e interagindo com outras pessoas em lugares como a escola ou o trabalho, percebe que o seu jeito de levar a vida pode afetar a vida dos outros.

Quando forma uma família, faz parte de um grupo de amigos ou de colegas de trabalho, passa a trocar ideias, muitas vezes, vivenciando situações de conflito onde é preciso conversar e negociar soluções. O que esta reflexão tem a ver com a água? Tendo como espelho o cotidiano, podemos pensar sobre os desafios e dificuldades encontradas no gerenciamento da água.

O primeiro deles tem a ver com o fato de as discussões sobre o assunto terem ficado restritas, durante muito tempo, a um grupo de cientistas e técnicos de universidades preocupados com a degradação dos rios e com o agravamento dos conflitos de uso da água. A sociedade praticamente ignorou a questão até surgirem movimentos organizados para discutir a forma de os governos gerenciarem os recursos naturais.

Estes grupos, além de exigirem um controle mais eficaz das questões ambientais, passaram a estimular a participação da sociedade na resolução desses conflitos. Um segundo desafio refere-se a problemas, como a escassez, a degradação da qualidade e o uso ineficiente da água, que vêm se tornando insustentáveis.

Mas o maior desafio de todos no processo de gestão dos recursos hídricos sempre esteve na própria água: como administrar um recurso que não estabelece fronteiras, que circula por todo o planeta e do qual várias pessoas se beneficiam, com diferentes usos, ao mesmo tempo? A falta de visão do todo resultou num enfoque de gestão voltado à recuperação, à conservação, à proteção ou ao controle de rios ou cursos d’água, de forma isolada.

Um olhar muito limitado, pois a água não existe sozinha no ambiente, ela faz parte de um conjunto, como elemento que liga tudo e no qual todos se conectam para a vida. Graças ao avanço do conhecimento e à sensibilização das pessoas, o enfoque para a gestão da água foi sendo ampliado, passando a abranger as áreas de captação e incorporando a proteção dos recursos, como o solo, a flora, a fauna, os minerais e o relevo, elementos estes que influem na produção e na descarga de água.

LEITURA COMPLEMENTAR

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Esta nova forma de gestão, chamada de gestão por bacias hidrográficas, correlaciona as atividades naturais e humanas que influem na qualidade e na preservação dos recursos hídricos em uma determinada região. Por isso, algumas práticas sugeridas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) podem se transformar em ideias a serem desenvolvidas na sua região.

Conheça e anote algumas dicas e práticas de preservação e recuperação dos mananciais. Algumas podem ser feitas individualmente, outras requerem um grupo mobilizado com o apoio de instituições, e todas devem ser lembradas nos momentos de decisão, como eleições, orçamentos participativos e criação de comitês gestores. Seguem algumas sugestões:

• proteger e recuperar as APPs – áreas de preservação permanente, compostas de vegetação natural ao longo dos rios, lagoas, lagos e reservatórios naturais e artificiais;

• armazenar, coletar e dar destino adequado ao lixo;

• evitar o desmatamento e promover ações de recuperação das áreas degradadas;

• incentivar a criação e a participação em comitês, câmaras técnicas e grupos de trabalho vinculados à proteção dos recursos hídricos. Ao participar dos Comitês de Bacias, você pode colaborar ao: planejar os usos múltiplos da água, respeitando limites, capacidades e qualidade para cada tipo de uso;

• estabelecer planos de saneamento, tratamento de esgotos domésticos e industriais, para atender às particularidades de cada bacia hidrográfica e seus recursos hídricos;

• elaborar, implementar e respeitar os planos diretores para uso ordenado do solo;

• ter cuidados no uso do solo e da água, inclusive no destino final das embalagens de agrotóxicos;

• estabelecer penalidades para as ações que desrespeitam as leis de proteção dos mananciais;

• adotar novas ideias sugeridas pela sua comunidade.

FONTE: Vieira; Costa; Barreto (2006, p. 58-60)

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UNIDADE 3 | A IMPLEMENTAÇÃO DA

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NOTA

Chegamos ao final do nosso caderno. Nós, autores, acreditamos que estamos fazendo a nossa parte como pais, cidadãos críticos e participativos, mediadores de informação, mas acima de tudo como seres humanos, livres e autores de nossa própria história.

Escreva a sua história, plante árvores compatíveis com o que você quer colher, estude, pois isso ninguém tira de nós; seja ético(a), pois os bons ventos sempre voltam, respeite seu professor não apenas pelo fato de que um dia você também estará no lugar dele, mas, acima de tudo, por ele ser um profissional que tenta dar o melhor de si. Pratique o hábito da leitura, sorria sempre e VIVA INTENSAMENTE. Aproveite o nosso bem pessoal mais valioso: a vida!

É fantástico poder compartilhar com você nossos princípios norteadores: não basta saber é preciso saber fazer; cada um tem que construir sua história; formação de empreendedores; e a negociação: paradigma do relacionamento humano.

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Neste tópico você estudou:

• O repasse de recursos aos Comitês de Bacia é um dos grandes desafios a serem superados.

• A implantação desses novos modelos de gestão tem representado consideráveis avanços em termos de políticas públicas.

• A participação social tem contribuído para a conquista de uma nova dimensão na gestão de bacias hidrográficas.

• A fim de que alcancemos a mudança na recuperação e proteção da água, mudar os valores éticos ambientais hoje construídos é ponto central.

• A educação ambiental como processo educativo deve ser pensada como um dos principais caminhos na busca da preservação da água, sobretudo na busca de uma visão integrada dos aspectos que compõem a gestão da água, neste caso, o conjunto das políticas acima relacionadas, associado à efetiva participação e controle social.

RESUMO DO TÓPICO 5

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AUTOATIVIDADE

Depois do nosso estudo, promova uma reflexão com sua rede social (família, amigos, vizinhos e comunidade) referente às seguintes questões:

1 Existe alguma atividade de educação ambiental relacionada especificamente à preservação da água na sua comunidade? Qual(quais) é(são)?

2 Quais são as ações do poder público (municipal, estadual e federal) que vêm sendo realizadas em seu município?

3 As empresas da região incentivam a educação ambiental?

4 O que você faz e/ou poderia fazer para fortalecer as redes de educação ambiental em sua região?

5 Pesquise em seu município e verifique a existência de algum programa de educação ambiental e saneamento básico e relate quais, dos quatro itens que compõem o saneamento básico, o projeto abrange.

6 Com base no texto, explique o que são os valores éticos ambientais.

7 Resumidamente, fale um pouco a respeito de como você percebe que o Brasil vem incorporando a nova cultura da água na gestão dos recursos hídricos.

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