análise da migração de uma unidade consumidora para o

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1 Resumo— Este artigo tem como objetivo analisar a migração de uma unidade consumidora pertencente ao mercado cativo, para o mercado livre de energia elétrica, mostrando através de um caso real, o impacto econômico dos estudos voltados para o enquadramento tarifário e as vantagens que estes podem trazer na fatura de energia elétrica de uma unidade consumidora. Analisa também a evolução do mercado de energia no Brasil ao longo dos anos, a legislação vigente para o mercado livre que incentiva o consumo de formas de energia renováveis, suas van- tagens em relação ao mercado cativo de energia e a mudança de tratamento das concessionárias de energia para com seus clien- tes. Palavras Chaves—Mercado de Energia, Tarifação Energéti- ca, Migração, Economia, Legislação. I. INTRODUÇÃO reforma do setor elétrico brasileiro começou em 1993 com a lei nº 8.631 [1], que extinguiu a equalização tari- fária vigente e criou os contratos de suprimento entre gerado- res e distribuidores. Também foi marcada pela promulgação da lei nº 9.074 de 1995 [2], que criou o Produtor Independen- te de Energia e o conceito de Consumidor Livre. Até meados da década de 90, o setor de energia elétrica bra- sileiro era um monopólio estatal, sem interferência das regras de mercado. A partir de 1995, iniciou-se um processo de aber- tura do setor elétrico. Foram instituídas regras que permiti- ram a concorrência na concessão dos serviços públicos de energia elétrica e abriram espaço para o processo de privati- zação de significativa parte das empresas de distribuição e geração. Em 2001, o setor elétrico sofreu uma grave crise de abasteci- mento que culminou em um plano de racionamento de ener- gia elétrica. Esse acontecimento gerou uma série de questio- namentos sobre os rumos que o setor elétrico estava trilhando. Visando adequar o modelo em implantação, foi instituído em A. B. Vasconcellos, email: ([email protected]). S. C. Camolesi, email: ([email protected]). L. O. Silva, email: ([email protected]). E. T. Anabuki, email: ([email protected]). T. I. R. C. Malheiro, email: ([email protected]). 2002 o Comitê de Revitalização do Modelo do Setor Elétrico, cujo trabalho resultou em um conjunto de propostas de altera- ções no setor elétrico brasileiro. A partir de 2003, o Novo Modelo para o setor de energia elétrica estabeleceu regras mais claras para a expansão do parque de geração e para a contratação no mercado livre e no mercado regulado de ener- gia elétrica. Nesse novo ambiente o mercado livre se desen- volveu com a migração de consumidores industri- ais/comerciais buscando redução de custos e gerenciamento do seu portifólio de energia. Essas mudanças no setor elétrico brasileiro abriram caminho para que a energia elétrica passasse a ser tratada como uma mercadoria passível de comercialização, seguindo uma ten- dência mundial. Entretanto, o processo de abertura do setor elétrico não ocorreu de forma completa. Hoje coexistem no Brasil dois mercados distintos de energia: o tradicional – Mercado Cativo e o novo - Mercado Livre. No Ambiente de Contratação Regulada (ACR) participam os Agentes de Gera- ção e de Distribuição de energia elétrica e no Ambiente de Contração Livre (ACL) participam os Agentes de Geração, Comercialização, Importadores e Exportadores de energia, e Consumidores Livres. Nesse contexto, o presente artigo apresenta os resultados obti- dos através de simulações de faturamento de uma instituição de ensino superior, a Universidade Federal de Mato Grosso, nas opções tarifárias do mercado cativo em relação ao merca- do livre para verificação do impacto real que possíveis mu- danças da estrutura tarifária trariam no custo da energia elé- trica para esta Unidade Consumidora. II. AMBIENTE DE CONTRATAÇÃO REGULADO O ACR ou Mercado Cativo é o ambiente de contratação de energia elétrica no qual o papel do consumidor é totalmente passivo. A energia é fornecida exclusivamente pela distribui- dora local, com o preço e as demais condições de fornecimen- to reguladas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). A contratação no ACR é formalizada através de contratos bilaterais regulados, denominados Contratos de Comerciali- zação de Energia Elétrica no Ambiente Regulado (CCEAR), Teresa I. R. C. Malheiro, PhD. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso – IFMT. Análise da Migração de uma Unidade Consumidora para o Mercado Livre de Energia Arnulfo Barroso de Vasconcellos, Dr.; Sthefany Campos Camolesi, Acad.; Luciana Oliveira da Silva, Eng.; Erika Tiemi Anabuki, Acad. Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT. A

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Resumo— Este artigo tem como objetivo analisar a migração

de uma unidade consumidora pertencente ao mercado cativo, para o mercado livre de energia elétrica, mostrando através de um caso real, o impacto econômico dos estudos voltados para o enquadramento tarifário e as vantagens que estes podem trazer na fatura de energia elétrica de uma unidade consumidora. Analisa também a evolução do mercado de energia no Brasil ao longo dos anos, a legislação vigente para o mercado livre que incentiva o consumo de formas de energia renováveis, suas van-tagens em relação ao mercado cativo de energia e a mudança de tratamento das concessionárias de energia para com seus clien-tes.

Palavras Chaves—Mercado de Energia, Tarifação Energéti-ca, Migração, Economia, Legislação.

I. INTRODUÇÃO reforma do setor elétrico brasileiro começou em 1993 com a lei nº 8.631 [1], que extinguiu a equalização tari-

fária vigente e criou os contratos de suprimento entre gerado-res e distribuidores. Também foi marcada pela promulgação da lei nº 9.074 de 1995 [2], que criou o Produtor Independen-te de Energia e o conceito de Consumidor Livre. Até meados da década de 90, o setor de energia elétrica bra-sileiro era um monopólio estatal, sem interferência das regras de mercado. A partir de 1995, iniciou-se um processo de aber-tura do setor elétrico. Foram instituídas regras que permiti-ram a concorrência na concessão dos serviços públicos de energia elétrica e abriram espaço para o processo de privati-zação de significativa parte das empresas de distribuição e geração. Em 2001, o setor elétrico sofreu uma grave crise de abasteci-mento que culminou em um plano de racionamento de ener-gia elétrica. Esse acontecimento gerou uma série de questio-namentos sobre os rumos que o setor elétrico estava trilhando. Visando adequar o modelo em implantação, foi instituído em

A. B. Vasconcellos, email: ([email protected]). S. C. Camolesi, email: ([email protected]). L. O. Silva, email: ([email protected]). E. T. Anabuki, email: ([email protected]). T. I. R. C. Malheiro, email: ([email protected]).

2002 o Comitê de Revitalização do Modelo do Setor Elétrico, cujo trabalho resultou em um conjunto de propostas de altera-ções no setor elétrico brasileiro. A partir de 2003, o Novo Modelo para o setor de energia elétrica estabeleceu regras mais claras para a expansão do parque de geração e para a contratação no mercado livre e no mercado regulado de ener-gia elétrica. Nesse novo ambiente o mercado livre se desen-volveu com a migração de consumidores industri-ais/comerciais buscando redução de custos e gerenciamento do seu portifólio de energia. Essas mudanças no setor elétrico brasileiro abriram caminho para que a energia elétrica passasse a ser tratada como uma mercadoria passível de comercialização, seguindo uma ten-dência mundial. Entretanto, o processo de abertura do setor elétrico não ocorreu de forma completa. Hoje coexistem no Brasil dois mercados distintos de energia: o tradicional – Mercado Cativo e o novo - Mercado Livre. No Ambiente de Contratação Regulada (ACR) participam os Agentes de Gera-ção e de Distribuição de energia elétrica e no Ambiente de Contração Livre (ACL) participam os Agentes de Geração, Comercialização, Importadores e Exportadores de energia, e Consumidores Livres. Nesse contexto, o presente artigo apresenta os resultados obti-dos através de simulações de faturamento de uma instituição de ensino superior, a Universidade Federal de Mato Grosso, nas opções tarifárias do mercado cativo em relação ao merca-do livre para verificação do impacto real que possíveis mu-danças da estrutura tarifária trariam no custo da energia elé-trica para esta Unidade Consumidora.

II. AMBIENTE DE CONTRATAÇÃO REGULADO O ACR ou Mercado Cativo é o ambiente de contratação de

energia elétrica no qual o papel do consumidor é totalmente passivo. A energia é fornecida exclusivamente pela distribui-dora local, com o preço e as demais condições de fornecimen-to reguladas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

A contratação no ACR é formalizada através de contratos bilaterais regulados, denominados Contratos de Comerciali-zação de Energia Elétrica no Ambiente Regulado (CCEAR),

Teresa I. R. C. Malheiro, PhD. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso – IFMT.

Análise da Migração de uma Unidade Consumidora para o Mercado Livre de Energia

Arnulfo Barroso de Vasconcellos, Dr.; Sthefany Campos Camolesi, Acad.; Luciana Oliveira da Silva, Eng.; Erika Tiemi Anabuki, Acad.

Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT.

A

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celebrados entre Agentes Vendedores (comercializadores, geradores, produtores independentes ou autoprodutores) e Compradores (distribuidores) que participam dos leilões de compra e venda de energia elétrica.

Atualmente, a Resolução n° 414 de 09 de setembro de 2010 da ANEEL [3], define as condições gerais de forneci-mento e constitui a principal referência das práticas comerci-ais reguladas entre clientes de energia elétrica e concessioná-ria. Nesta regulamentação os consumidores são divididos em dois grandes grupos tarifários: Grupo A e Grupo B.

A. Grupo A Grupamento composto de unidades consumidoras com for-

necimento em tensão igual ou superior a 2,3 kV, ou atendidas a partir de sistema subterrâneo de distribuição em tensão se-cundária, caracterizado pela tarifa binômia. Os consumidores do Grupo A possuem algumas opções de enquadramento tari-fário, tais como: Tarifa Horossazonal Azul: modalidade caracterizada pela aplicação de tarifas diferenciadas de consumo de energia elé-trica, de acordo com as horas de utilização do dia e os perío-dos do ano, assim como de tarifas diferenciadas de demanda de potência, de acordo com as horas de utilização do dia. Tarifa Horossazonal Verde: modalidade caracterizada pela aplicação de tarifas diferenciadas de consumo de energia elé-trica, de acordo com as horas de utilização do dia e os perío-dos do ano, assim como de uma única tarifa de demanda de potência.

B. Grupo B Grupamento composto de unidades consumidoras com for-

necimento em tensão inferior a 2,3 kV, caracterizado pela tarifa monômia. Os consumidores do Grupo B, além de carac-terizarem-se pela aplicação da tarifa monômia, ou seja, tarifa com preços aplicáveis unicamente ao consumo de energia elétrica ativa, não possuem outra estrutura tarifária além da Convencional.

C. Enquadramento Tarifário As unidades consumidoras pertencentes ao Sistema Inter-

ligado Nacional são enquadradas de acordo com os itens a seguir: Na modalidade tarifária horossazonal azul, aquelas com tensão de fornecimento igual ou superior a 69 kV; Na modalidade tarifária horossazonal azul ou verde, de acordo com a opção do consumidor, aquelas com tensão de fornecimento inferior a 69 kV e demanda contratada igual ou superior a 300kW; Na modalidade tarifária convencional, ou horo-sazonal azul ou verde, de acordo com a opção do consumidor, aquelas com tensão de fornecimento inferior a 69 kV e demanda con-tratada inferior a 300kW.

III. AMBIENTE DE CONTRATAÇÃO LIVRE O ACL ou Mercado Livre é o ambiente de contratação de

energia elétrica em que a energia é tratada como uma merca-doria qualquer, passível de comercialização. O consumidor livre pode comprar montantes de energia de comercializado-res e/ou geradores e as condições (preço, prazo, volume, in-dexador etc.) são pactuadas entre as partes.

Constituído no final dos anos 90, o mercado livre movi-menta cerca de 28% do volume total de energia elétrica que circula no Sistema Interligado Nacional e funciona paralela-mente ao ambiente regulado. Esse mercado reúne três moda-lidades de agentes:

A. Produtores Independentes: Geradores de energia elétrica que operam sob o regime de resolução autorizativa cedida pela ANEEL a cada empreendimento e que podem vender a produção diretamente ao consumidor e comercializador. Comercializadora: Empresas independentes ou vinculadas a grupos geradores e/ou distribuidoras, que adquirem a ener-gia para vendê-la aos consumidores livres ou atuam na con-tratação e fechamento de negócios entre as pontas comprado-ra e vendedora. Clientes Livres: Clientes que têm a possibilidade de esco-lher seus fornecedores e negociar as condições contratuais, inclusive preço.

A Tabela 1 abaixo mostra as condições para se tornar um consumidor livre.

TABELA I CONDIÇÕES PARA SE TORNAR CONSUMIDOR LIVRE

Demanda Tensão de Conexão

Data de Instalação Caracterização

Menor de 500 kW ---- ---- Consumidor Cativo.

Maior de 500 e Menor que 3.000 kW

---- ---- Consumidor livre para com-prar energia apenas de "Fon-

tes Alternativas".

Maior que 3.000 kW < 69 kV Anterior a

07/07/1995

Consumidor livre para com-prar energia apenas de "Fon-

tes Alternativas". Maior que 3.000 kW < 69 kV Posterior a

07/07/1995 Consumidor potencialmente

livre. Maior que 3.000 kW > 69 kV ---- Consumidor potencialmente

livre.

No Mercado Livre os serviços de transporte e de contrata-ção da energia são desvinculados. O transporte é pago à con-cessionária de distribuição ou de transmissão onde o consu-midor livre esteja conectado, através de tarifas reguladas pela ANEEL. A concessionária local, por sua vez, é totalmente responsável pela continuidade e qualidade do fornecimento de energia elétrica ao consumidor livre. As tarifas referentes ao transporte da energia elétrica são conhecidas como: TUST (Tarifas de uso do Sistema de Transmissão) – Refe-rem-se ao pagamento do serviço de transporte de grandes quantidades de energia elétrica por longas distâncias que, no caso do Brasil, é feito utilizando-se de uma rede de linhas de transmissão e subestações em tensão igual ou superior a 230 kV, denominada Rede Básica. Qualquer agente do setor elé-trico, que produza ou consuma energia elétrica tem direito ao uso da Rede Básica, uma vez atendidas certas exigências téc-

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nicas e legais. TUSD (Tarifas de Uso do Sistema de Distribuição)- Refe-rem-se ao pagamento pelo uso do sistema de distribuição de energia elétrica de um agente de distribuição (linhas de transmissão com tensão inferior a 230 kV, estações transfor-madoras e redes de distribuição).

No Mercado Livre existe uma categoria de consumidor de-nominada consumidor especial, que é por definição: o consu-midor responsável por unidade consumidora ou conjunto de unidades consumidoras do Grupo “A”, integrante(s) do mes-mo submercado no SIN, reunidas por comunhão de interesses de fato ou de direito, cuja carga seja maior ou igual a 500 kW, atendidos em qualquer classe de tensão e que optem pelo for-necimento de pequenas centrais hidrelétricas, fontes eólicas, biomassa ou solar.

Um atrativo adicional desse mercado de consumidores es-peciais é que, ao serem atendidos por fontes de energia alter-nativa, os consumidores têm direito a pelo menos 50% de desconto sobre a parcela “fio” da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD), este desconto pode chegar a 100%, de-vendo o consumidor atender as seguintes condições: Os caracterizados como PCH, com potência maior do que 1.000 kW e menor ou igual a 30.000 kW, que iniciaram a operação comercial no período entre 1º de outubro de 1999 e 31 de dezembro de 2003, conforme Resolução nº 281, de 1999 [4]; Aqueles a partir de fonte eólica, biomassa, assim como os de co-geração qualificada, conforme regulamentação da ANEEL, que iniciaram a operação comercial no período entre 23 de abril de 2003 e 31 de dezembro de 2003, de acordo com a Resolução da nº 219 ANEEL [5].

Mesmo sendo o desconto de 100% sobre o valor da TUST/TUSD, existe uma parcela desta tarifa, sobre a qual não incide desconto, ou seja, o consumidor livre ainda terá que pagar um pequeno valor de TUST/TUSD, isto é especifi-cado de acordo com a Resolução Nº 77da ANEEL [6]: O percentual de redução para as unidades consumidoras conectadas na Rede Básica será aplicado somente sobre a par-cela fio das Tarifas de Uso dos Sistemas de Transmissão – TUST vigentes; O percentual de redução para as unidades consumidoras conectadas na rede de distribuição será aplicado somente so-bre as componentes TUSD – Fio B, TUSD – Fio A, TUSD – Encargos do Serviço de Distribuição e TUSD – Perdas Técni-cas; O percentual de redução não incidirá sobre o valor do uso do sistema de transmissão e distribuição cobrado nos contra-tos de reserva de capacidade.

Ao participar do Mercado Livre o consumidor assume res-ponsabilidades em relação a sua exposição aos preços da energia. Por isto é de suma importância que o consumidor livre tenha um contrato com seus fornecedores que garanta o atendimento à totalidade de sua carga, pois a não existência

deste contrato pode sujeitar o cliente livre a penalidades, na hipótese de vir a ultrapassar o valor do montante de energia contratado. O consumidor livre corre o risco de que quando o lastro de energia contratado exceder o seu o valor, ele será obrigado a comprar esta energia no Mercado de Curto Prazo.

O Mercado de Curto Prazo (Spot) depende do Preço de Li-quidações da Diferença (PLD). O PLD é obtido pela liquida-ção das diferenças entre a energia contratada e energia gera-da, determinado semanalmente para cada patamar de carga e para cada submercado, tendo como base o Custo Marginal de Operação do sistema, limitado por um preço mínimo e por um preço máximo.

O PLD é significativamente volátil e caracterizado por ele-vada imprevisibilidade, o que aumenta consideravelmente os riscos dos agentes do mercado livre de energia, embora a ca-pacidade instalada de geração de energia no país seja superior à demanda. A dificuldade é que parte da energia de sobra é considerada “de reserva” e não pode ser comercializada li-vremente, o que resulta em preços mais altos de energia para os consumidores livres.

Outro fator importante que deve ser observado antes da migração do consumidor cativo para o mercado livre de ener-gia é que, após a opção pelo mercado livre de energia, caso o cliente queira voltar ao mercado cativo, deve informar essa decisão à concessionária de distribuição local com um prazo mínimo de cinco anos, sendo que esse prazo pode ser reduzi-do mediante acordo entre as partes. No caso de consumidor especial, que optou por adquirir parte ou a totalidade do res-pectivo consumo de energia por meio da comercialização de energia incentivada, poderá voltar a ser atendido plenamente pela respectiva concessionária ou permissionária de distribui-ção, desde que manifeste formalmente essa opção com ante-cedência de 180 (cento e oitenta) dias.

IV. ENQUADRAMENTO TARIFÁRIO: ESTUDO DE CASO Apresenta-se a seguir um estudo de caso real da Instituição

de ensino superior UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso) que deseja obter redução com o custo de energia elé-trica, verificando primeiramente se a atual estrutura tarifária representa a melhor opção. Para comprovação do impacto real que possíveis mudanças de estrutura tarifária trariam no custo da energia elétrica, o método utilizado para essa análise será o da simulação do faturamento. Isto consiste basicamente em aplicar os preços vigentes de cada tipo de tarifa aos valores estimados de consumo de energia elétrica nos horários de ponta e fora de ponta e demanda de potência ativa nos horá-rios de ponta e fora de ponta ou, neste caso, o histórico de consumo de energia elétrica ativa e demanda de potência ati-va.

Os valores de energia elétrica reativa excedente e de de-manda de potência reativa excedente não foram utilizados, pois são considerados desprezíveis. As tarifas de energia elé-trica utilizadas para a simulação de faturamento estão sem o acréscimo dos valores dos impostos, conforme Tabela II da

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Resolução Homologatória da Rede Cemat n° 1.131 [7]. Para realizar esta simulação se faz necessário o levantamento dos dados da unidade consumidora UFMT apresentados a seguir: Estrutura tarifária atual: Horo-sazonal Verde; Tensão de fornecimento: 13,8 kV; Subgrupo: A – 4; Demanda Contratada: 4.500 kW

TABELA II

VALORES DAS TARIFAS EM R$ Subgrupo A4

Horo-Sazonal Azul

Ponta Fora de Ponta Seca Úmida Seca Úmida

Consumo (R$/KWh) 0,31619 0,28613 0,19779 0,18035

Demanda (R$/KW) 46,97 13,97

Horo-Sazonal Verde

Ponta Fora de Ponta Seca Úmida Seca Úmida

Consumo (R$/KWh) 1,40690 1,37684 0,19779 0,18035

Demanda (R$/KW) 13,97

As Figuras 1, 2, 3 e 4 ilustram os perfis dos consumos men-

sais de energia elétrica ativa e demandas de potência ativa para os horários de ponta e fora de ponta da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Fig. 1. Consumo de Energia Elétrica Ativa da Unidade Consumidora

Fig. 2. Demanda de Potência Ativa da Unidade Consumidora

Fig. 3. Consumo de Energia Elétrica Ativa da Unidade Consumidora

Fig. 4. Demanda de Potência Ativa da Unidade Consumidora

V. SIMULAÇÃO NO MERCADO CATIVO DE ENERGIA Através dos dados verifica-se que a referida unidade con-

sumidora não atende às condições para enquadramento nas estruturas Grupo A Convencional e Grupo B, por ter uma demanda contratada superior a 300 kW e potência total de transformadores instalada superior a 112,5 kVA. Serão com-parados os faturamentos nas estruturas horo-sazonal verde (atual) e horo-sazonal azul.

A. Simulação Horo-Sazonal Azul Através da Equação 1 foi realizada a simulação do fatu-

ramento na tarifa horo-sazonal azul:

(1)FAzul FP FP P P FP FP P PV CA TCA CA TCA DF TD DF TD

Onde, VFAZUL –Valor da Fatura de Energia Elétrica enquadrada na Horo-Sazonal Azul CAFP – Consumo de Energia Ativa no horário fora de ponta. CAP - Consumo de Energia Ativa no horário de ponta. DFFP – Demanda de Potência Ativa Faturada no horário fora de ponta. DFP - Demanda de Potência Ativa Faturada no horário de ponta. TCAFP – Tarifa de Consumo de Energia Ativa no horário fora de ponta. TCAP - Tarifa de Consumo de Energia Ativa no horário de ponta. TDFP – Tarifa de Demanda de Potência Ativa no horário fora de ponta. TDP - Tarifa de Demanda de Potência Ativa no horário de ponta.

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B. Simulação Horo-Sazonal Verde Através da Equação 2 foi realizada a simulação do fatu-

ramento na tarifa horo-sazonal verde:

(2)FVerde FP FP P PV CA TCA CA TCA DF TD

Onde, VFVerde –Valor da Fatura de Energia Elétrica enquadrada na Horo-Sazonal Verde CAFP – Consumo de Energia Ativa no horário fora de ponta. CAP - Consumo de Energia Ativa no horário de ponta. TCAP - Tarifa de Consumo de Energia Ativa no horário de ponta. TDFP – Tarifa de Demanda de Potência Ativa no horário fora de ponta. DF - Demanda de Potência Ativa Faturada. TD - Tarifa de Demanda de Potência Ativa. C. Comparação Horo-Sazonal Azul e Horo-Sazonal Verde

Após a realização das simulações das faturas de energia elétrica enquadradas na horo-sazonal azul e horo-sazonal verde, pode-se compará-las através da análise da Figura 5.

Fig. 5. Comparativo entre tarifa Horo-Sazonal Verde x Horo-Sazonal Azul

Através da Figura 5 constata-se que a tarifa horo-sazonal azul, para o segmento (A4), representa atualmente a melhor opção, apresentando uma economia anual de R$ R$ 52.034,22 (cinquenta e dois mil e trinta e quatro reais e vinte e dois centavos) nos meses analisados.

VI. SIMULAÇÃO NO MERCADO LIVRE DE ENERGIA Como no Mercado Livre de energia a negociação da ener-

gia elétrica é livre, foi proposta para esta unidade consumido-ra em estudo duas maneiras de faturamento de energia elétri-ca no mercado livre.

A primeira consiste em faturar a energia como se a unida-de consumidora estivesse enquadrada na tarifa horo- sazonal azul, lhe propiciando um desconto de 12% no valor da tarifa de energia elétrica. Desta maneira o valor da tarifa de energia elétrica ativa paga será efetuado pela Equação 3.

0, 88DTE TE (3) Onde,

TE – Valor da Tarifa de Energia Elétrica Ativa TED – Tarifa de Energia Elétrica Ativa com desconto

Com o valor da tarifa de consumo de energia elétrica ativa com desconto, pode-se realizar a simulação da unidade con-sumidora na tarifa horo-sazonal azul.

Os valores obtidos na simulação de faturamento podem ser observados de acordo com a Figura 6:

Fig. 6. Valores das faturas Horo-Sazonal Azul com desconto na TE.

Comparando os valores da simulação de faturamento, ilus-trados na Figura 6, com os valores da Figura 5, pode-se ob-servar que se obteve uma economia anual de R$ 228.582,26 (duzentos e vinte e oito mil e quinhentos e oitenta e dois reais e vinte e seis centavos).

A segunda opção de faturamento de energia elétrica no ACL é a de compra de energia a um valor mínimo de 230,00 R$/MWh e um valor máximo de 260,00 R$/MWh, tendo desconto de 100% no valor da TUSD, sendo tarifado apenas a TUSDP –1,80 R$/kW e TUSDFP – 0,54R$/kW.

Para simulação das fatura de energia elétrica nesta opção tarifária, primeiramente deve-se compreender como é elabo-rado o faturamento da energia elétrica no ACL.

A primeira fatura de energia é subdividida em três partes. A primeira refere-se às cobranças dos valores de TUSD/TUST e encargos, que são repassados à distribuidora de energia da qual se está utilizando o sistema de distribuição ou transmis-são. A segunda fatura de energia refere-se ao o valor pago à geradora de energia, devido ao montante de energia elétrica contratado, deve-se incluir sobre o consumo de energia elétri-ca ativa o valor de 2,7% referentes às perdas da rede. Para a realização desta simulação, considerou-se apenas o maior preço pago pela energia elétrica no ACL (260,00 R$/MWh). A terceira parte refere-se à cobrança dos impostos incidentes sobre os valores dos encargos da energia elétrica, o TUSD/TUST e montante de energia elétrica, que são recolhi-dos pela distribuidora de energia e repassados à Secretaria de Fazenda do Estado.

A Figura 7 apresenta os valores da simulação de fatura-mento de energia elétrica da UFMT, enquadradas no ACL a

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um preço de 260,00R$/MWh. Como citado anteriormente neste artigo, os valores dos impostos foram desconsiderados nas simulações tarifárias.

Fig. 7. Valores das faturas de energia elétrica da U.C enquadrada no ACL.

Através da comparação da simulação de faturamento, ilus-trada na figura 7, com os valores da simulação de faturamento da UFMT no ACR, enquadrada na tarifa horo-sazonal verde, observa-se que a unidade consumidora obteve uma economia anual de R$ 588.275,54 (quinhentos e oitenta e oito mil e duzentos e setenta e cinco reais e cinquenta e quatro centa-vos).

VII. CONCLUSÃO Durante a realização deste artigo, com o objetivo de propi-

ciar um melhor esclarecimento sobre o mercado livre de energia, pode-se observar que ao longo dos anos o mercado de energia elétrica brasileiro vem se modernizando, com o intui-to de diminuir o preço da energia elétrica às empresas e insti-tuir a competitividade no setor elétrico do mercado brasileiro. Outro ponto importante da instituição do mercado livre de energia foi à regulamentação da energia incentivada, conce-dendo descontos nas tarifas para que os consumidores cativos migrassem para o mercado livre.

Com o consumidor alerta às possibilidades, principalmente as de migração para outro tipo de fornecimento, como o mer-cado livre, as concessionárias mudam o conceito de atendi-mento a esses consumidores, aplicando medidas que procu-rem a satisfação e fidelização dos seus clientes.

Para que o cliente cativo possa migrar para o mercado livre, é necessário ser feito um estudo muito minucioso, para que os riscos no ambiente de contratação livre sejam minimizados ao máximo. É de suma importância que o consumidor livre tenha um contrato com seus fornecedores que garanta o atendimento a totalidade de sua carga, pois a não existência deste contrato pode sujeitar o cliente livre a penalidades, na hipótese de vir ultrapassar o valor do montante de energia contratado. O con-sumidor livre corre o risco de que quando o lastro de energia contratado exceder o seu o valor, ele será obrigado a comprar esta energia no Mercado de Curto Prazo, onde estará sujeito

pagar um preço elevado pela energia, que pode ser maior que o valor da energia no mercado cativo.

VIII. REFERENCES [1] BRASIL. Lei Nº 8.631, de 04 de março de 1993. [2] BRASIL. Lei Nº 9.074, de 07 de julho de 1995. [3] ANEEL. Resolução N° 414 de 09 de setembro de 2010. [4] ANEEL. Resolução Nº 281, de 1º de outubro de 1999. [5] ANEEL. Resolução Normativa Nº 219, de 11 de abril de 2006. [6] ANEEL. Resolução N° 77, de 18 de agosto de 2004. [7] Resolução Homologatória da Rede Cemat n° 1.131, de 5 de Abril de 2011.

IX. BIOGRAFIA

Arnulfo Barroso de Vasconcellos nasceu em Corumbá-MT, Brasil. Obteve o título de Bacharel em engenharia elétrica em 1980 na UFMT, e os títulos de Mestre e Doutor, respectivamente em 1987 e 2004, na UFU. Atualmente é professor e pesquisador na Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT .

Sthefany Campos Camolesi nasceu em São José do rio Preto-SP, Brasil. É acadêmica do curso de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT. Atualmente é bolsista do programa de extensão acadêmica.

Luciana Oliveira da Silva nasceu em Cuiabá-MT, Brasil. Obteve o título de Engenheira Eletri-cista em 2012 pela Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT. Atualmente é mestranda do Pro-grama de Pós-Graduação em Engenharia de Edifi-cações e Ambiental, pela Universidade Federal de Mato Grosso. Seus especiais campos de interesse estão ligados à eficiência energética, automação e simulação computacional.

Erika Tiemi Anabuki nasceu em Goiânia-GO, Brasil. É acadêmica do curso de Engenharia Elé-trica da Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT. Atualmente é bolsista do programa de pesquisa acadêmica.

Teresa Irene Ribeiro de Carvalho Malbeiro nasceu em Portugal. Obteve o título de Bacharel em engenharia elétrica em 1981 na Universidade de Mato Grosso Federal, e o título de PhD na University Newcastle, em Tyne - Reino Unido em 1994. Atualmente é professora e pesquisadora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnolo-gia de Mato Grosso-IFMT - Brasil. Sua principal área de interesse é a qualidade da energia.