angela sommer bodenburg - o pequeno vampiro - 02 - a mudança do pequeno vampiro (rev. rs & rts)

112
Tradução: José Miguel Rodríguez Clemente Ilustrações: Amelie Glienke Tradução Mecânica: Milla Nebias Revisão: Milla Nebias Formatação: Ana Rosa

Upload: geovana-germano

Post on 12-Aug-2015

454 views

Category:

Documents


38 download

TRANSCRIPT

Page 1: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Tradução: José Miguel Rodríguez Clemente

Ilustrações: Amelie Glienke

Tradução Mecânica: Milla Nebias

Revisão: Milla Nebias

Formatação: Ana Rosa

Page 2: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Informações sobre a série “O pequeno vampiro”

01 - O Pequeno Vampiro - Lançado pelo grupo RS & RTS

02 - A Mudanca do Pequeno Vampiro - Lançado pelo grupo RS & RTS

03 - A Viagem do Pequeno Vampiro - Em revisão pelo grupo RS & RTS

04 - O Pequeno Vampiro no Sítio - Em revisão pelo grupo RS & RTS

05 - O Grande Amor do Pequeno Vampiro - Em revisão pelo grupo RS & RTS

06 -  O Pequeno Vampiro em Perigo - Na lista

07 - O Pequeno Vampiro na Vale das Lamentações - Na lista

08 - O Pequeno Vampiro e a Crônica da Familia - Na lista

09 - O Pequeno Vampiro e o Paciente Misterioso - Na lista

10 - O Pequeno Vampiro na Toca do Leão - Na lista

11 - O Pequeno Vampiro e o Programa Misterioso - Na lista

12 - O Pequeno Vampiro - Surpresas Desagradáveis - Na lista

13- O Pequeno Vampiro - A Grande Conspiração - Na lista

14 - O Pequeno Vampiro - A Excursão da Escola - Na lista

15 - O Pequeno Vampiro – Feliz Natal - Na lista

As personagens:

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

2

Page 3: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Anton gosta de ler histórias emocionantes e assustadoras. Encanta-lhe especialmente as histórias de vampiros, cujo comportamento é plenamente consciente.

Rüdiger, O Pequeno Vampiro é um vampiro, com pelo menos, cento e cinqüenta anos. O fato de ser tão pequeno tem uma razão simples: quando era criança se tornou em vampiro. Sua amizade com Anton começou quando Anton mais uma vez estava em casa sozinho. De repente ali estava o pequeno vampiro sentado no beiral da janela. Anton tremia de medo, mas o vampiro lhe assegurou que já tinha "comido". Na verdade, Anton tinha imaginado vampiros muito mais terríveis e, mas depois que Rüdiger lhe confessou sua predileção por histórias de vampiros e seu medo do escuro, achou muito legal. Desde então, a vida bastante monótona de Anton tornou-se muito emocionante: O Pequeno Vampiro também trouxe um casaco para ele, e voaram juntos ao cemitério e à Cripta Schlottertein. Anton logo encontrou outros membros da família de vampiros.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

3

Page 4: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Ana A Desdentada é a irmã mais nova de Rüdiger. Ainda não nasceram seus dentes de vampiro, assim, ela é a única da família de vampiros que se alimenta de leite. "Mas não por muito tempo!" Ela diz. Ela também lê histórias de horror.

Fort Lumpi, irmão mais velho de Rüdiger, é um vampiro muito irascível. Sua voz, às vezes alta, às vezes estridente, mostra que ele está na adolescência. A única coisa ruim é que nunca vai deixar essa situação difícil, porque ele se tornou um vampiro durante a puberdade.

Os pais de Anton não acreditam em vampiros. A mãe de Anton é uma professora, seu pai trabalha em um escritório.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

4

Page 5: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Tia Dorothee é o vampiro mais sanguinário de todos. Encontrá-la depois do pôr-do-sol pode ser mortalmente perigoso.

O guardião do cemitério, Geiermeier, caça vampiros. Por isso, os vampiros mudaram seus caixões para uma cripta subterrânea. Até a data, Geiermeier não havia sido capaz de encontrar a entrada para a cripta.

O restante dos parentes do Pequeno Vampiro, Anton nunca conheceu pessoalmente. Mas ele viu, uma vez, seus caixões na Cripta Schlotterstein.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

5

Page 6: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Um

Susto na banheira

Anton estava na banheira lendo Na morada do Conde Drácula quando bateram na porta da casa.

“Espero que não seja para mim!”, pensou, e levantou a vista do livro. Ouviu quando sua mãe foi abrir a porta. Depois voltou pelo corredor e bateu na porta do banho.

— Para você! — disse ela.

— Estou lendo — grunhiu Anton. — Quem é?

— Um vampiro!

— Um vampiro? — exclamou Anton sobressaltado.

Esteve a ponto de deixar cair o livro na água. Mas, na verdade, sua mãe só podia estar sendo irônica, já que, depois de tudo, ela não acreditava em vampiros. Apesar de que tinha conhecido recentemente a dois. Mais, igual a seu pai, ela tinha acreditado que ambos, com suas capas de vampiro cheirando a mofo, não eram mais do que dois meninos absolutamente normais que, simplesmente, tinham fuçado muito fundo no baú da avó.

— Que vampiro? — perguntou Anton, agora com cautela.

— Rüdiger — respondeu ela.

Anton se assustou. Se Rüdiger estava em sua casa, algo horrível tinha acontecido!

— Um momento! — exclamou saindo da banheira. — Já vou!

No corredor estava o pequeno vampiro. Seu rosto parecia cinza e enfraquecido, e seus olhos vermelhos ondulavam como se estivesse com febre.

— Tenho que falar com você — sussurrou.

Anton tragou saliva.

— Aqui? — disse passando a vista pela sala de estar onde estavam sentados seus pais.

O vampiro lhe jogou um olhar suplicante.

— Tem que me ajudar — sussurrou.

— Eu? — balbuciou Anton.

— Sim, você é meu único amigo.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

6

Page 7: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— E... como?

— Vêem ao quarto das bicicletas logo que puder — dito isto, o vampiro deu a volta e desapareceu.

— Já partiu? — gritou a mãe. Tinha lhes preparado um suco.

— De todos os modos, não toma — disse Anton, que agora tinha outras preocupações. Como ia conseguir estar às sete da noite no quarto das bicicletas sem levantar suspeitas?

Enquanto se vestia disse de passada:

— Tenho que ir lá embaixo outra vez.

— Agora? — disse a mãe. Mas seu cabelo está completamente molhado...! Tem algo que ver com esse seu estranho amigo? — perguntou ela desconfiando de repente.

— Não — disse Anton.

— E aonde vai?

— Levar minha bicicleta ao porão.

— Sua bicicleta nova? — Essa era a voz do pai. Quer dizer que a esqueceste lá fora?

— Sim — Anton que estava a ponto de rir bem alto porque, de todos os modos, a bicicleta estava, já fazia duas horas, no porão.

— E você tão tranqüilo na banheira! — repreendeu o pai.

— Já vou — disse Anton.

Rindo ironicamente abriu a porta de casa e apertou o botão do elevador. Nossa! Tanto teatro por uma mísera bicicleta! Só faltava seu pai olhar da porta e gritar: “Não se esqueça de fechar!”. O elevador chegou e Anton entrou nele. Enquanto descia lhe veio à mente como parecia o pequeno vampiro parecia esgotado, e quão atormentada parecia sua voz. De repente todo o bom humor desapareceu. O que é que teria levado Rüdiger a ir a sua casa e lhe pedir ajuda? Acaso o guardião do cemitério tinha descoberto a cripta dos vampiros e era Rüdiger o único sobrevivente? Com estes pensamentos, o coração de Anton começou a pulsar mais depressa; isso significaria sem dúvida, que também Anna, a irmã pequena do Rüdiger... Não! Os vampiros não eram tão fáceis de! Nem sequer

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

7

Page 8: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

pelo Geiermeier, o guardião do cemitério! Embora..., não fosse inofensivo, pensou Anton. Sabia por meio do Rüdiger que Geiermeier tinha a ambição de chegar a ter o primeiro cemitério sem vampiros da Europa. Anton tinha chegado ao corredor do porão. Abriu a porta e escutou... Nada! Com precaução, deu um par de passos e, então, apertou o interruptor da luz: o corredor estava vazio, a porta que dava ao quarto das bicicletas, fechada.

Continuou lentamente. Na frente do quarto das bicicletas permaneceu de pé escutando atentamente. Ainda seguia sem mover nada. Tomou ar profundamente e empurrou para baixo o guidão de ferro da porta. Um aroma familiar o golpeou: cheirava a mofo e ar de caixão!

— Rüdiger? — perguntou temeroso.

— Pssst — se ouviu da escuridão do quarto. Entre e feche a porta!

Dois

Cripta proibida

Enquanto Anton fechava a porta atrás de si, pôde então, com a luz que entrava do corredor, reconhecer, precisamente, as bicicletas que estavam apoiadas na parede, assim como uma grande caixa sobre a qual se projetavam duas figuras sombrias. Então tudo voltou a ficar escuro, e passaram-se um par de minutos antes que seus olhos se acostumassem à penumbra procedente das duas pequenas janelas do quarto. Agora via que as figuras levavam capas e tinham pálidos rostos de morto. Portanto, vampiros! O menor e fraco era, sem dúvida, Rüdiger... mas, quem podia ser o segundo vampiro, mais alto e forte, Rüdiger? — perguntou Anton inseguro.

— Sim! — chegou a resposta. — Por que não se senta?

— Me... me sentar? E onde?

— Aqui! Junto a nós, sobre o caixão! Caixão? — Então... A grande caixa era um caixão! Um terrível pensamento percorreu Anton: será que o caixão era para ele... depois de tudo, ele tinha lido muitas vezes como pessoas normais se convertiam em vampiros...

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

8

Page 9: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Vêem já! — exclamou Rüdiger impaciente.

Com os joelhos tremendo, Anton andou até o caixão e se sentou justo na ponta.

— Acaso tem medo? — riu Rüdiger junto a ele.

— Eu...

— Claro que está com medo — ouviu a segunda voz estrepitosa que para Anton parecia conhecida. É que não sabe o que esperar!

— Eu..., tenho que voltar para cima em seguida — murmurou.

— Acaso disse aonde ia? — perguntou cortante Rüdiger.

— Nnn..., não — gaguejou Anton.

— Está bem — a voz do Rüdiger voltou a soar conciliadora. Então vou esclarecer do que se trata.

Fez uma pausa e escutou. Anton tentou jogar uma olhada ao vampiro grande, mas não pôde distinguir nada preciso.

— Escuta! — Embora tudo estava tranqüilo, Rüdiger fez cair sua voz até um sussurro. Sai de casa. Proibiram-me de ficar na cripta.

— Proibido de ficar na cripta? — perguntou Anton sem compreender.

— Sim! Não me é permitido pisar nunca mais na cripta.

— Não? Por que não lhe permitem voltar para casa?

— Porque tinha sou amigo dos seres humanos. Isso para os vampiros é totalmente proibido!

— E como o souberam? —perguntou Anton.

— Por minha tia Dorothee — respondeu Rüdiger. Esteve-me espiando durante semanas. Depois contou tudo na frente do conselho de família e este decidiu me banir da cripta.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

9

Page 10: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Vá infâmia! — disse Anton indignado. E onde vais viver agora?

— Bom..., disse Rüdiger tossindo ligeiramente, em sua casa!

— Em minha casa? — exclamou Anton assustado. Como pode pensar isso? Meus pais...

— Mas não na casa — interrompeu Rüdiger. No porão, naturalmente!

— Mas aqui pode entrar todo mundo! — Anton assinalou as bicicletas que estavam junto à parede. Todo mundo pode guardar aqui sua bicicleta.

Rüdiger fez um gesto de impaciência.

— Aqui não! Em seu porão!

— O que? — exclamou Anton horrorizado. Mas é que meus pais vão se dar conta em seguida.

— Tolices, disse o segundo vampiro, tem que ser inteligente!

— E se minha mãe for pegar algo no porão? Por exemplo.

— Então vai você! — grasnou o vampiro grande.

— E se meu pai quer montar algo?

— Então..., então tem, simplesmente, que lhe dissuadir. Ligar a televisão... ou lhe trazer o jornal esportivo...

— Meu pai não lê jornais esportivos — disse Anton.

— Maldito seja! — exclamou o vampiro. Então leva outra coisa, burro você não é!

— Que seja — Anton trocou rapidamente de atitude para não lhe irritar ainda mais. Seria Lumpi o segundo vampiro? Realmente só Lumpi, o irmão do Rüdiger, era tão irascível. Anton sentia um medo horrível quando recordava seus antigos encontros com ele!

— E o... caixão? Também tem que ir? — dirigiu-se ao Rüdiger com voz tremente.

— Claro, o caixão é o mais importante! Onde vou dormir se não nele? — exclamou Rüdiger. Ou você acha que o arrastamos da cripta até aqui por prazer?

— Não — murmurou. Só disse por quê... nosso porão está muito cheio.

— Pois então teremos que achar um lugar! — declarou Rüdiger ficando em pé. Também o vampiro grande se baixou, deslizando, do caixão. Vamos já de uma vez? —rugiu.

— Um mo... um momento, disse Anton, é que... não tenho a chave do porão.

— E onde está?

— A... vamos. Não sabia que...

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

10

Page 11: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Então vá pegá-la! — exclamou o vampiro grande indignado.

— E depressa!

— Sim — disse Anton e foi para a porta dando tropeções.

Três

Jogo com armadilhas

Sem acender a luz, Anton atravessou o corredor e subiu as escadas do porão até o elevador.

Qual motivo daria a seus pais para ir de novo ao porão? Ou devia entrar ema casa às escondidas para pegar a chave?

Mas já tinha estado muito tempo fora e, se não voltasse logo, era certo que eles desceriam para ver o que ocorria! Possivelmente deveria achar uma desculpa. Sim, essa era a melhor idéia! Aliviado entrou no elevador e subiu.

— Anton? — perguntou sua mãe quando ele abriu a porta de casa.

— Sim? —disse ele com a voz mais alegre do que foi capaz.

— Vêem aqui! Onde esteve por tanto tempo?

— Eu...? No porão. Além disso, encontrei um colega do colégio.

— Seja, seja — disse seu pai zombeteiro. — No porão, né?

— Claro que não! Na escada.

— E quem era? —perguntou a mãe.

— Andreas.

— Acreditava que você não gostava dele.

— Humm..., sim — disse arrastando a palavra. Além disso, me convidou para jogar monopólio. Posso ir lá embaixo jogar?

— Agora? — exclamou a mãe.

— Mas só são pouco mais de sete horas!

Pensava nos vampiros, que já estavam a quase dez minutos esperando! E se o segundo vampiro fosse realmente Lumpi... seguro que teria um tremendo ataque de raiva por fazê-lo esperar!

— Grande convite, e você têm que levar seu jogo — resmungou o pai.

— Por quê? — disse Anton. Ele não tem nenhum.

— E onde vive esse Andreas? — perguntou a mãe.

— Né... né... no segundo andar.

A mãe o olhou examinando durante um momento e logo disse:

— Mas as oito subir!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

11

Page 12: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Claro — exclamou Anton mordendo a língua para não tornar a rir; pois então...

Nas pontas dos pés, foi até o porta-chaves, tirou do gancho a do porão e a colocou no bolso da calça. Já estava na porta de casa quando seu pai gritou:

— Não vai levar o jogo?

— Ah, sim, sussurrou, na... naturalmente.

Correu rapidamente ao seu quarto. Onde ele tinha visto o jogo na última vez? Na escrivaninha? Em vão, procurou de cima a baixo nas quatro gavetas. Na prateleira tampouco estava, e no roupeiro só encontrou álbuns de selos e revistinhas em quadrinho. Por último, sua vista foi dar na pilha de jogos. Os levaria então! Colocou a caixa embaixo do braço e saiu para o vestíbulo.

— Até mais tarde! — exclamou fechando a porta da rua atrás dele.

Quatro

Portadores de caixões

- Até que enfim! – Anton foi recebido no quarto de bicicletas pelo vampiro mais alto. Você levou um século!

— Eu..., antes tive que contar a meus pais aonde ia.

— E? — exclamou Rüdiger. O que você disse?

— Que ia até a casa de um amigo.

— Ora... amigo! — zombou o vampiro mais alto. Melhor, nos ajude a carregá-lo!

— E o jogo? — perguntou desolado Anton.

— Que jogo? — O vampiro examinou a caixa que estava sob o braço do Anton. Deixa isto comigo, agarrou a caixa e a fez desaparecer debaixo da sua capa.

— Ei! — protestou Anton olhando para Rüdiger em busca de ajuda. Entretanto, este só encolheu os ombros.

— Venha, vamos! — bramou o maior vampiro. Agarra! Você na frente e Rüdiger atrás!

— E você? — perguntou Anton enquanto levantava o caixão.

— Eu manterei a porta aberta!

O caixão pesava mais do que ele tinha imaginado, e Rüdiger tampouco era o mais forte! Ofegando, alcançaram a porta do porão de Anton.

— O que foi? — perguntou o maior vampiro observando com sarcasmo como Anton e Rüdiger esfregavam os dedos doloridos.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

12

Page 13: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Co... como conseguiram trazer o caixão até aqui? — perguntou Anton.

— Lumpi o trouxe — respondeu Rüdiger.

— E, além disso, sozinho! — exclamou Lumpi.

— Vá — sussurrou Anton. Então efetivamente Lumpi era o Forte. Cheio de respeito o olhou de soslaio. Brigar com o Lumpi podia ser muito perigoso!

— Não vai abrir de uma vez? — resmungou Lumpi.

— Em... em seguida — disse Anton tirando apressado do bolso a chave do porão. Com mãos trêmulas a introduziu no cadeado; a porta se abriu chiando. Lumpi empurrou o caixão dentro do quarto e fechou a porta atrás deles.

— De... devo acender a luz? — gaguejou Anton.

— A luz? — soprou Lumpi. Está louco?

— Mas se não vemos absolutamente nada!

— Eu sim! — declarou Lumpi, e começou a jogar para o lado as caixas que estavam no centro do quarto.

— Cuidado! —gritou Anton. Isso são garrafas de vinho!

Muito tarde; produziu-se um ruído de cristais e começou a formar um grande atoleiro no chão.

— Não importa, declarou, já secará.

— E aonde vamos colocar meu caixão?

— Atrás, entre os trastes!

— Entre os trastes? — exclamou indignado Rüdiger.

— Claro que sim! Ali chama menos a atenção!

— Nós... nós não temos trastes — disse Anton. Meu pai põe... todos os meses o porão em ordem.

— O que?! — gritou Rüdiger. E você só diz isso agora? E se me encontra ao fazê-lo?

— Anton fará algo para impedi-lo — disse Lumpi golpeando afavelmente Anton no ombro. Não é certo?

— Né...? Sim — sussurrou Anton, que ficou muito mal pensando no que o esperava nas próximas semanas.

— Eu, hummm..., vou recolher as tesouras — colocou a mão na caixa e deu um grito. Ai, meu dedo!

Lumpi se aproximou interessado:

— Deixe-me ver! E com voz mais rouca pela excitação exclamou: Sangue?

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

13

Page 14: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Sss..., sim, hummm..., não — disse Anton metendo rapidamente na boca o dedo que sangrava intensamente. já... já se cortou.

Vampiros E..., sangue! Sabia que os vampiros se alimentam de sangue e em algum lugar tinha lido que podem cheirar uma gota de sangue a metros de distância!

—Não..., não íamos colocar o caixão? — perguntou distraindo a atenção. Além disso, devo subir em seguida...

—Isso pode esperar — respondeu primeiro Lumpi. Quero ver seu dedo!

— A... aqui — balbuciou Anton. O corte estava lá, mas já não sangrava.

Lumpi cheirou os dedos um a um.

— Nada — murmurou. Enfurecido, deu uma volta. Vamos! —ordenou para Rüdiger. Vamos colocar de uma vez o caixão no lugar! Tenho fome!

—Não deveriam acender a luz? — perguntou Anton. Quem sabe o que ainda poderia ser quebrado!

— Por minha parte... — resmungou Lumpi.

Anton acendeu a luz e ficou de pé atemorizado: Lumpi tinha um aspecto tão horrível que ficou com os cabelos arrepiados; branco como leite, com uma boca grande e vermelha como sangue, suas presas saiam como as de uma fera.

— O que foi? — exclamou Lumpi. Não vai nos ajudar?

— Sss... sim — balbuciou Anton.

— Eu gostaria detrás daquela caixa! — declarou Rüdiger.

— Não pode ser — disse Anton. Essa é a caixa das batatas. Está fixa à parede.

— Então, junto à caixa — precisou Rüdiger.

Lumpi empurrou o caixão até a parede e olhou ao redor procurando por algo. Descobriu um montão de fitas de madeira com as quais o pai do Anton queria revestir a parede da cozinha.

— Homem! — exclamou. Justo o que precisava!

Apoiou-os inclinados contra a parede de forma que o caixão desapareceu detrás deles.

— E agora — bramou — devo comer algo logo ou se não vou desmaiar! Vem, Rüdiger?

Anton se sobressaltou. Mas a fome do Lumpi não parecia referir-se a ele, pois estava já na janela do porão e abria a veneziana metálica. Com um forte salto foi para cima e subiu. Rüdiger o seguiu.

— Deixa a janela aberta! De acordo? — zombou Lumpi estendendo os braços sob sua capa.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

14

Page 15: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Sim — disse Anton. Ouviu os vampiros se elevavarem no ar. Depois se fez o silêncio.

“Não terei sonhado tudo isto?”, pensou Anton.

Mas ali, junto à parede, estavam as fitas de madeira, e detrás estava o caixão do Rüdiger!

Aflito, dirigiu-se para a porta, apagou a luz e voltou a colocar o cadeado. Pode contar que viriam péssimas semanas pela frente!

Cinco

Sombrias perspectivas

Os pais do Anton continuavam sentados diante da televisão.

— Bom, que tal foi? — exclamou o pai.

— Bem — disse Anton, que gostaria de ir para o quarto, saindo pela porta da sala de estar. Estava morto de cansaço.

— E que tal o monopólio?

Anton ficou parado.

— Também bem — disse bocejando.

— Trouxeste-o de novo?

— Sim.

— Que estranho! — disse o pai. Podia jurar que passou pela porta sem o monopólio.

— Já o levei ao meu quarto.

— Certo. E você pode me explicar como ele está aqui em cima da televisão?

— Em cima da televisão? — disse Anton assustado.

— Sim, senhor — exclamou o pai. O que diz agora?

— Eu..., não o encontrei antes — sussurrou Anton. — E..., então...

— Sim?

—... então..., levei os jogos reunidos.

— E onde estão agora?

— Esqueci-me.

O pai soprou indignado.

— Estupendo! —exclamou. Se todos fizessem com suas coisas igual a você...

Nesse momento começou o telejornal. O rosto do pai adquiriu em seguida uma expressão de atenção e fez um gesto negativo em direção ao Anton que significava que agora tinha que calar-se.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

15

Page 16: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Posso ir? — perguntou Anton com uma raiva mal contida.

O pai não respondeu, mas a mãe ficou em pé e colocou um braço no ombro do Anton.

— Anda, vá! — disse amavelmente. Eu também vou — no corredor disse ela. Já conhece seu pai quando começa o telejornal.

— Primeiro me espreme como a um limão! — disse Anton indignado. E logo não tem nada mais importante que fazer do que ver o telejornal!

— É que gosta de saber o que está ocorrendo no mundo!

— Ora! — reclamou Anton. Mas todo dia é sempre a mesma coisa! Sempre há guerra em algum lugar, os políticos não adiantam um passo em suas negociações... Deveria preocupar-se melhor com o que acontece ao seu redor!

— E com o que deveria preocupar-se, segundo sua opinião? — perguntou sorrindo a mãe.

— Comigo, por exemplo, estou furioso com ele — explicou Anton. Ele se interessa mais com o telejornal do que conosco!

— Mas ele não é sempre assim — disse a mãe tranqüilizando-o. Durante o fim de semana quer inclusive revestir de madeira a cozinha.

— O que? — gritou Anton assustado. Acreditava iria fazer isto nas férias!

— É verdade, sim — respondeu a mãe. Mas agora, entretanto, quer começar este fim de semana.

— Eu..., então, irei ajudá-lo — disse rapidamente Anton. Possivelmente conseguiria manter ao pai afastado do porão.

— Isso é muito amável por sua parte — disse a mãe. E agora, vá dormir, de acordo?

— Boa noite — sussurrou Anton.

Hoje é terça-feira, pensou na cama. Portanto, ainda tenho três dias até sábado. De todas as formas, falaria com Rüdiger no dia seguinte! Possivelmente os dois juntos encontrariam uma solução.

Seis

Resmungão matutino

O dia seguinte foi turvo e chuvoso. Por volta das seis começou a escurecer. O pai de Anton nunca chegava a casa antes das sete, e sua mãe estava sentada em seu quarto e corrigia redações, e, como ela tinha deixado claro, «não queria ser incomodada».

A ocasião para ir ao porão e ver o Rüdiger era, portanto, propícia! Em silêncio, Anton percorreu o corredor, tomou a chave do porão e abriu a porta de casa sem fazer ruído.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

16

Page 17: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Depois desceu de elevador. Não tropeçou com ninguém e o corredor do porão também estava deserto. Um aroma de mofo que ele nunca tinha sentido antes veio ao nariz; Será que vinha do Rüdiger? Na frente da porta do porão que tinha o letreiro do Bohnsack ficou parado escutando com atenção.

— Rüdiger? — sussurrou golpeando a madeira. Sou eu, Anton.

Nenhuma resposta. Será que Rüdiger já teria saído voando? Mas para isso ainda havia muita claridade! Pois, enquanto o sol não se pusesse, os vampiros não podiam abandonar seus caixões.

— Rüdiger? — perguntou desta vez mais forte.

Novamente tudo permaneceu em silêncio. Possivelmente Rüdiger não tinha retornado ao porão e tinha passado a noite em algum outro lugar? Mas não, ele tinha que dormir em seu caixão!

Anton bateu na porta outra vez. Ao não obter de novo nenhuma resposta, abriu a porta e entrou. Na penumbra, viu que a janela estava fechada. Portanto, Rüdiger tinha que estar no caixão! Com precaução, rodeou as fitas de madeira e observou o caixão detrás delas. A tampa estava fechada e só o aroma de mofo indicava que estava ocupado. No interior do caixão ressonou agora um gemido apagado, um ruído, um rangido, e pouco depois a tampa se levantou lentamente.

O rosto cor cinza do Rüdiger emergiu. Os olhos estavam ainda fechados; só a boca estava aberta para um enérgico bocejo, com o qual Anton pôde ver as poderosas presas.

— Rüdiger? — sussurrou.

O pequeno vampiro se levantou precipitadamente.

— Quem está aí? — grasnou.

— Né..., eu — gaguejou Anton.

— Ah, você — disse aliviado o vampiro sentando-se. Aconteceu algo?

— Sim..., quero dizer, não — respondeu Anton. Quer dizer, meu pai vai usar as fitas de madeira.

—Que fitas? — gemeu o vampiro.

— Quais vão ser! Estas daqui! — assinalou Anton as fitas de madeira. E, além disso, todas as ferramentas estão no porão.

O vampiro se sentou na borda do caixão e soluçou.

— E o que eu tenho que ver com isso?

— Será que você não compreende? — a voz do Anton fez um falsete. Se vier ao porão irá te encontrar!

— Ah, já — dormitado, o vampiro esfregou os olhos. E tudo isto com o estômago vazio! — disse queixoso.

—Temos que pensar algo! — exclamou Anton.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

17

Page 18: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Então pomos outra vez as fitas de madeira no lugar — propôs o vampiro.

— E o caixão? — perguntou Anton. O que fazemos com ele?

— Se não estivesse tão cansado...! — disse o pequeno vampiro quase chorando. Não posso pensar absolutamente.

— Hoje é quarta-feira! — exclamou Anton. No sábado vai recolher as fitas!

O vampiro voltou a cabeça para a parede e soluçou.

— Já o compreendi, disse. Mas com o estômago vazio não sirvo para nada... E, além disso, você alterou meu plano diário — exclamou de repente indignado. Eu leio sempre no caixão antes de me levantar!

Com um gesto ofendido, recostou-se no caixão, jogou a mão debaixo do travesseiro e tirou uma vela, fósforos e um livro. Sem dignar-se a dirigir um olhar para Anton, acendeu a vela, colocou-a na borda do caixão e abriu o livro.

Anton ficou de pé desconcertado e olhou fixamente para o vampiro, que, totalmente imperturbável, lia A vingança da Drácula.

Isso significava que queria lhe passar todo o trabalho? Pois não seria mais que jogo sujo...; instalar-se no local preparado e confiar que ele, Anton, tirasse do caminho todas as dificuldades!

— Isso não tem nada que ver com a amizade! — exclamou Anton muito zangado.

— Psst! —bufou o vampiro — Quando me interrompem durante a leitura posso ser terrível!

Zangado, Anton mordeu os lábios.

E agora? Passou a vista pelo quarto e refletiu. Devia colocar de novo as fitas de madeira em seu lugar original? Mas, então, com o que iam ocultar o caixão? E por que tinha que estar o quarto tão endiabradamente ordenado! Outras pessoas tinham um montão de trastes no porão onde podia se esconder sem dificuldade o caixão do Rüdiger!

E se o caixão fosse coberto com um lençol grande? Mas então seu pai iria querer saber o que havia debaixo. Não, isso tampouco serviria. Só ficava a possibilidade de impedir totalmente o pai de ir ao porão!

— Agora vou — disse.

— E não volte tão cedo! —exclamou o vampiro. Pelas manhãs estou insuportável!

— Nisso tem razão — grunhiu Anton enquanto saía.

Sete

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

18

Page 19: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Ásperas desculpas

Sábado era o dia em que Anton gostava de dormir até tarde. Quando se levantava por volta das dez ou das dez e meia, seus pais, na maioria das vezes, já tinham tomado o café da manhã e já haviam saído para as compras. Então só o prato do Anton estava sobre a mesa da cozinha com pãezinhos e um ovo cozido sob o aquecedor.

Entretanto, nesse sábado Anton se levantou muito cedo. Acendeu a luz e jogou uma olhada no quarto. Será que ainda estava no porão com seu pai? E seu pai não acabava de querer abrir a tampa do caixão...? Claro que não! Devia ter sonhado tudo, pois ele estava na cama e ainda estava de pijama!

Olhou no despertador: sete e quinze! Até seus pais estavam dormindo! Suspirando, Anton se tampou com a manta até o queixo. Seguro que não ia se voltar a dormir; estava muito nervoso! Teria êxito seu plano? E se não?

Tomou seu novo livro, Gargalhadas da cripta, e tentou ler. Mas aquilo que se contava ali sobre o terror da cripta lhe parecia absolutamente ridículo comparado com o que esperava ele essa manhã, e assim, deixou o livro de lado.

Deveria, possivelmente, tomar o café da manhã? Levantou-se e foi ao banho. Observou sua cara no espelho. Tinha um aspecto bastante pálido... mais ou menos como o de seus pais alguns domingos, quando tinham estado muito tempo em uma festa! Pegou o sabão e esfregou a pele até que ficou corada. Depois se vestiu e foi para a cozinha. Encheu a cafeteira, pôs a chaleira de leite no fogão e começou a cozinhar os ovos. Uma vez que colocou a mesa do café da manhã, pensou se ainda faltava algo. Ah, sim, os pãezinhos! Esperou os ovos ficarem prontos, então correu até a padaria e comprou seis pãezinhos. Bom, se isto não causasse impressão a seus pais...! Foi para a porta do quarto e chamou.

— Sim? — perguntou a mãe sonolenta.

— O café da manhã! — exclamou Anton. Passaram-se um par de minutos. Então apareceu sua mãe na soleira.

— De verdade você fez o café da manhã? — perguntou.

— Claro! — disse Anton como se não fosse nada de mais. E agora vêem! Os ovos vão ficar frios!

— Sim..., em seguida, disse a mãe, tenho que despertar a seu papai. Deve já levantar-se; definitivamente, hoje vai arrumar a cozinha!

Um calafrio percorreu Anton. Como se tivesse esquecido disso...!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

19

Page 20: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— O que? Já está tudo preparado? — exclamou o pai com assombro mal simulado quando entrou na cozinha. Sentou-se, pegou o ovo e o agitou.

— Duro como uma pedra, não?

Anton pôs um rosto ofendido.

— Você acha que eu não sei cozinhar um ovo?

— E o café? —dirigiu-se o pai à mãe. Que tal está?

— Bom — disse a mãe.

Anton resmungou:

— Cozido automaticamente.

— Inclusive pãezinhos! — o pai agarrou um e lhe deu uma dentada. Já não reconheço meu filho! E tudo isto por quê? — perguntou depois de um momento olhando-o. Fizesse alguma travessura?

— Eu? —exclamou Anton desarmado. Não.

— Foi mal nas provas?

— Não.

Enquanto passava manteiga no pãozinho, o pai não deixou de olhar Anton nos olhos.

— Algo, não obstante, tem que haver — disse.

Anton titubeou.

— Eu..., perdi a chave do porão — disse então.

— O que você fez...? —exclamou o pai. Perdeste a chave do porão? E como vou pegar as fitas de madeira e as ferramentas?

— Não..., não sei — sussurrou Anton tentando parecer o mais aflito possível.

— E como a perdeste?

— Andando de bicicleta.

— E quando?

— Ontem.

— Procuraste-a ao menos?

— Não, disse Anton, já tinha escurecido.

—Então vá procurá-la agora mesmo! — exclamou indignado o pai. Como pode ser tão desatento?

— Já estou a caminho — respondeu Anton.

— Deixe-o, ao menos, tomar o café da manhã tranqüilo — disse a mãe. A chave do porão nem é tão importante assim!

— De toda maneira, já não tenho mais fome — sussurrou Anton.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

20

Page 21: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Ficou parado na porta.

— Vai..., vai começar a colocar o revestimento? — perguntou com precaução.

— E como, sem ferramentas? —resmungou o pai. Não, espero você!

No elevador, Anton cantou tão forte quanto podia. Uma sensação de triunfo o enchia: seu plano tinha dado certo!

Ninguém tinha descoberto que a chave do porão estava guardada no bolso de sua calça! E se voltasse à tarde com a chave já não valeria a pena, seu pai ir ao porão. Além disso, seus pais iriam ao cinema a noite. E amanhã, domingo, vinham seus avós de visita; e então seu pai, também não, iria ao porão!

Enquanto seguia cantando, Anton pegou o caminho para a casa de seu amigo Olé, onde jogaria monopólio até o meio-dia... naturalmente com o jogo de Olé!

Oito

Visita tardia

Eram oito e meia. Anton estava em sua cama escutando música. Pouco antes seus pais haviam partido, como sempre com pressa. A habitual pergunta do Anton «Quando irão voltar?» tinha respondido o pai:

— Por volta da meia-noite.

Para Anton estava muito bem! Provavelmente, seus pais pensavam que não gostava de ficar sozinho...; o qual, normalmente, era correto, embora, naturalmente, não quando havia um bom filme na televisão. Por exemplo, um policial tão bom como o desta noite; virou para um lado e pegou a revista com a programação, que estava diante de sua cama; e, além disso, com seus atores favoritos!

Deram golpes na janela. Surpreso, Anton levantou a cabeça. As cortinas ainda não estavam fechadas e pôde distinguir uma figura que estava na frente da janela. Seria Rüdiger? Ou sua irmã pequena, Anna? Notou como seu coração pulsava mais depressa.

Chamaram de novo e então ouviu a voz do Rüdiger:

— Anda depressa!

Correu para a janela e a abriu.

De um salto, o pequeno vampiro entrou no quarto.

— Buff! —ofegou. Quase me apanham!

— Quem? — perguntou Anton.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

21

Page 22: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Tia Dorothee. Espiando por toda parte.

— O que...? —gritou Anton. Tia Dorothee? Por um acaso ela sabe onde eu moro?

— Claro — disse o vampiro, e reprimindo a risada acrescentou: Mas de que eu vivo aqui não tem a menor idéia!

Anton estava branco como leite.

— Como assim sabe onde vivo?

— Como? — disse o vampiro rindo. É que sempre me seguia voando antes de ser proibido de entrar na cripta.

Assustado, Anton o olhou fixamente. Não havia dito o pequeno vampiro uma vez que Tia Dorothee era a pior de todos...? Se viesse de noite a sua janela e chamasse, e se ele, então, abrisse sem ter idéia...

— E o que... o que quer ela? — gaguejou.

— Sem dúvida alguma, saber onde está meu caixão!

O vampiro espreitava para fora na escuridão; esfregou seus dedos ossudos rindo.

— Esta vez eu estou preparado para ela!

— E... vai voltar? — perguntou com medo.

— Hoje é certo que não — disse o vampiro.

— E Am... amanhã?

O vampiro encolheu os ombros.

— O principal é que não encontre meu caixão.

Indignado, Anton mordeu os lábios.

— Você é a pessoa mais egoísta que eu já encontrei! — exclamou então.

— Você disse pessoa? — contrapôs o vampiro de forma irônica.

— Pois então, o vampiro! — exclamou Anton. Em qualquer caso, não tem coração e a amizade não conta para você!

Mas em lugar de sentir-se ofendido, o vampiro parecia extraordinariamente adulado.

— Ah..., isso os outros vampiros tinham que ouvir! — suspirou. Eles afirmam sempre que eu sou muito bom!

Irritado, Anton deu a volta. À exceção de seus próprios problemas, não parecia interessar a mais nada ao vampiro, e inclusive a possibilidade de que sua sanguinária tia pudesse lhe pegar!

— De qualquer modo... não é um verdadeiro amigo! — disse.

— Não? — exclamou o vampiro. E se tivesse vindo te buscar para a reunião dos vampiros?

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

22

Page 23: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Para... o que? — perguntou Anton.

— Para a reunião dos vampiros — disse o vampiro tirando-a capa. Debaixo levava outra mais gasta.

— Ou por acaso seus pais estão em casa?

— Não — disse Anton. Mas, o que é uma reunião de vampiros?

— Ah, disse o vampiro fazendo um amplo movimento, isso você mesmo tem que ver — e acrescentou diligente: Vem, agora vamos lhe converter em vampiro!

Anton esteve a ponto de gritar. Será que já não sabia pelos seus livros de que maneira se convertia os seres humanos em vampiros? Instintivamente protegeu o pescoço com as mãos.

Mas o vampiro só riu.

— Mas não como você está pensa! O que vamos fazer é pintá-lo!

— Me pintar? — perguntou Anton sem compreender.

— Claro que sim! Têm creme para crianças? Um batom?

— Sss... sim —disse Anton—, no banheiro...

— Então, vamos!

Nove

O segundo rosto do Anton

No banheiro, o pequeno vampiro arremessou para Anton a capa. Depois deu um par de passos para trás e o examinou.

— Venha..., temos que ver suas calças jeans — declarou ele criticando, nenhum vampiro usa calças jeans!

— Então, o que? — perguntou Anton.

O vampiro levantou a capa de modo que Anton pudesse ver suas meias-calças de lã negros.

— Algo assim, disse, feito a mão.

— Mas eu não tenho meias-calças — murmurou Anton.

— Não? — disse o vampiro. E o que usa no inverno?

— Ceroulas largas, disse Anton, brancas.

— Iíííh! — chiou o vampiro. Sabe uma coisa? Eu vou te dar os meus!

— Os seus? — disse Anton espantado. Levando em conta a surrada meia-calça do vampiro, isso era a última coisa que gostaria de fazer! Mas o vampiro já havia começado a tirá-la.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

23

Page 24: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Além disso, tenho outros dois debaixo — disse.

— O que...? — exclamou Anton incrédulo. Outros dois?

— Pois sim, disse o vampiro lhe entregando as meias-calças, é pelos buracos...

Anton retirou as calças jeans e as colocou em cima da banqueta.

— Espe... espero que esteja bom — sussurrou enquanto colocava os pés nas meias-calças.

— Seguro, disse o vampiro, são do Lumpi.

Ainda isso! Já não era só ter que usar esta coisa horrível, mas agora também tinha que contar com o aborrecimento do Lumpi! Além disso, a lã arranhava deploravelmente.

— Tal... talvez eu devesse ficar em casa, propôs temeroso. Mas o vampiro não queria saber nada disso.

— Quer perder esta oportunidade única? — exclamou.

— Nnnn... não, disse Anton, só que... vão muitos vampiros?

— Todos! Por isso temos, também, que nos vestir mortalmente bem!

— Mo... mortalmente? — gaguejou Anton. O que... o que quer dizer com isso?

— De tal forma que ninguém te reconheça, nem mesmo suspeite! Vamos começar pelo cabelo! — pegou a escova e a passou tão grosseiramente pela cabeça do Anton que este deu um grito.

— Ai! Além disso, está sujando toda a capa!

— Como pode ser isto? — disse o vampiro. Tem piolhos? Bem, é estupendo; então a capa parecerá muito usada!... Assim; e agora o rosto! Onde está o creme para crianças?

— No armário — respondeu Anton levando a mão a seus cabelos que pareciam um espanador.

O vampiro tinha encontrado, enquanto isso, o creme infantil e pôs no rosto de Anton uma espessa camada.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

24

Page 25: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— E agora, é só esfregar!

— Primeiro terá que saber! — resmungou Anton esforçando-se para espalhar por igual a firme e branca massa.

— Já é suficiente, declarou o vampiro, e agora o pó! Ao dizer isto, levantou a caixa de pó e espalhou com força no rosto de Anton. Enquanto Anton ofegava, ele esfregava as mãos gritando entusiasmado: Extraordinariamente chique Anton! ...E agora, os lábios! Onde está o batom?

— Na gaveta de abaixo — gemeu Anton com voz afogada.

O vampiro tirou o batom da gaveta e o observou com rosto extasiado.

— Hummm, disse, vermelho sangue! Sustentou-o sob o nariz e o cheirou. Mas em seguida seu rosto adotou uma expressão de asco e, cheio de desdém, exclamou: Ora! Doce como um caramelo!... Bom , disse depois, é nem é para comer.

Com rápidos traços, começou a pintar os lábios do Anton.

— Com gotas de sangue ou sem elas? — perguntou.

— Você, o que me recomenda?

— Com elas - respondeu o vampiro, e deu um par de toques à comissura dos lábios do Anton - assim parece mais autêntico. Pelo menos, para meninos vampiros. Ou acaso crê que nossos pais vão voando atrás de nós para nos limpar a boca? — riu de si mesmo. Agora só faltam as olheiras — afirmou.

— Olheiras também? — exclamou Anton. Já sentia muito calor debaixo do creme!

— Claro — disse o vampiro— para que pareça realmente morto. Mas..., com o que podemos fazer?

— Com o lápis de olho — contrapôs Anton. Ali, na segunda prateleira!

O vampiro tirou o lápis e cercou os olhos do Anton com traços negros.

— Irreconhecível! — exclamou.

— E..., se cair? — perguntou Anton.

— O que vai! — disse o vampiro. Se não se aproximar de ninguém...!

— E... isso é certo que não — disse Anton, que não podia evitar pensar em Tia Dorothee e todos outros horríveis parentes do pequeno vampiro.

— Está bem! — disse satisfeito o vampiro que se separou dele dando um passo atrás. Pode olhar!

Com os joelhos frouxos, Anton se levantou do beirada da banheira aonde tinha estado sentado todo o tempo e se olhou no

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

25

Page 26: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

espelho. A imagem que oferecia superava inclusive suas piores previsões: uma horrível máscara branca como a cal o olhava fixamente; a boca vermelha de sangue convertia-se em uma careta diabólica e dois olhos que saíam de escuras cavernas o olhavam espreitando.

— Isso..., isso sou eu? — gaguejou.

— Contente? — riu sarcasticamente o vampiro. Assim ninguém te reconhecerá! Nem sequer Anna! — acrescentou reprimindo a risada.

—Anna também estará lá? — exclamou Anton.

—Claro! Já te está esperando!

Anton tossiu ruborizado.

— Eu..., tenho tido enormes dificuldades — disse rapidamente para distrair a atenção do vampiro— meu pai quer ir de todos os modos ao porão!

— Ah!, sim? — disse o vampiro com bastante indiferença.

— No sábado é certo que não vou poder impedi-lo. Não poderia voltar para a cripta... ?

— Já veremos — disse o vampiro — possivelmente haja novidades.

— Oxalá — gemeu Anton.

— E agora vamos voar! — declarou o vampiro indo para a janela.

— Não me atrevo — disse Anton.

— Não? — riu o vampiro lhe dando uma cotovelada amistosa no flanco. Então faça como eu. Sabe como eu supero? Fecho os olhos e me ponho a voar!

— Você também tem medo? — exclamou Anton surpreso.

— Agora já não — respondeu o vampiro elevando-se do batente na noite.

— Eu..., eu tampouco — disse Anton; fechou os olhos e... voou.

Dez

Vôo no Vale da Amargura

Um vento suave inflou a capa de Anton e sulcou seu cabelo que estava penteado grosseiramente. Estendeu seus braços e... flutuou no ar.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

26

Page 27: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Vêem! — zombou Rüdiger soltando a capa. A festa começou já faz muito tempo.

Subiu com poderosos movimentos e Anton teve dificuldades para segui-lo.

— Espera! — exclamou. Não consigo ir tão depressa.

Jogou um medroso olhar para baixo: as casas pareciam de brinquedo e sua própria casa, onde tinha deixado acesa o abajur do escritório, não era mais que um diminuto quadrado claro.

O vampiro diminuiu a velocidade de seu vôo.

— Não te enjoará...? — disse rindo ironicamente.

— Não — sussurrou Anton rapidamente ao ver na luz da lua a expressão brincalhona.

Rüdiger fez um gesto de satisfação.

— Além disso, teria sido ruim, opinou, porque ainda temos que voar cinqüenta quilômetros!

— Tanto? — exclamou Anton.

— Você acha que cem vampiros podem celebrar uma reunião no meio da cidade?

— Cem? — perguntou Anton espantado. E onde se reúnem?

— Nas ruínas do Vale da Amargura.

— No Vale da Amargura? — exclamou Anton. Não dizem que por ali andam lobisomens?

O vampiro reprimiu uma risada.

— Você acredita nesses contos?

— Pois claro, disse Anton, também crescem vampiros.

— O que...? — bufou Rüdiger. Atreve-te a pôr os vampiros e os lobisomens no mesmo nível?

— Não, não — disse rapidamente Anton. Só que..., a maioria das pessoas não acredita nem em vampiros nem em lobisomens.

— É que são idiotas — disse com desdém o vampiro. Naturalmente, não houve nunca lobisomens. É uma invenção dos vampiros.

— Dos vampiros?

— Naturalmente! Era o modo mais singelo de afastar os bisbilhoteiros curiosos!

Anton fez uma cara tão surpresa que o vampiro teve que rir.

— Ocorreu-lhe a idéia a nossa tatara-tatara-tatara-vampiro, Elizabeth a Gulosa. Estava farta de ter as pessoas sempre rondando nas reuniões dos vampiros.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

27

Page 28: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— É as pessoas não tinham medo dos vampiros? — perguntou Anton.

—Sim. Mas sabiam que os vampiros em suas festas nem comem nem bebem. Isso, acrescentou o vampiro rindo sarcasticamente, isso já ocorreu antes.

— Que estranho! — sussurrou Anton. Em nossas festas a comida e a bebida são sempre o mais importante.

O vampiro negou com um gesto.

— Os seres humanos não têm nem idéia de vida social.

Anton arranhou o queixo refletindo.

— Então, os vampiros que se reúnem esta noite nas ruínas já comeram também...

— Claro — disse o vampiro.

— Vá — escapando um suspiro de alívio dos lábios de Anton. Isso eu não sabia.

De repente estava alegre por ir à festa!

— E o que aconteceu com os lobisomens? —perguntou.

— Muito singelo — disse o vampiro. Naquela época ainda havia lobos por toda parte. Elizabeth a Gulosa só teve que estender o rumor. Dizendo que os lobos que rondavam as ruínas eram na realidade seres humanos especialmente maus que se convertiam depois do pôr-do-sol em bestas ferozes. Ninguém mais se atreveu a passar pelas ruínas e os vampiros puderam celebrar em paz suas festas!

— E segue havendo lobos lá até hoje? — perguntou Anton temeroso.

— Não — riu o vampiro. Mas o Vale da Amargura mantém até hoje sua má fama. Além disso, os vampiros não deixam de ser culpados pela redução dos números de lobos no passar das décadas.

— Como pode ser?

— Bom, pois..., nos maus tempos, tempos de fome em certa medida...

Anton notou como ficava pálido. Será que o vampiro tinha que lhe recordar constantemente de seus atrozes costumes culinários?

— Atenção! — exclamou excitado o vampiro. O Vale da Amargura!

Com a pálida luz da lua viu de cima uma muralha escura, sombria e ruinosa, em uma clareira. Era uma extensa construção da qual só havia ficado ainda em pé os muros exteriores. O edifício principal, pelo contrário, parecia bem conservado, ao menos no que Anton podia distinguir.

— Está tão escuro... — sussurrou.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

28

Page 29: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Os vampiros não necessitam luz — respondeu Rüdiger. Mas no salão da festa há luzes acesas.

Perseverante, voou para a torre do castelo e aterrissou nas ameias.

— Aqui? — perguntou Anton surpreso. Tinha aterrissado junto ao vampiro e olhava temeroso para a escada meio em ruína que conduzia ao interior da torre.

— Sempre chegamos de cima — informou-lhe o vampiro. De qualquer maneira..., quase sempre.

Saltou sobre a plataforma e pisou no último degrau.

—Espera! — exclamou Anton, baixando atrás dele com os joelhos trêmulos.

Onze

Recebimento desconfiado

Ainda refletia a luz da lua sobre os quebradiços degraus e este mostrava a Anton onde podia pôr os pés. Mas depois da primeira curva se fez completa escuridão. Medindo com as pontas dos pés,

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

29

Page 30: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

procurava o caminho e mais de uma vez teve que segurar-se ao frio muro da torre para não cair. Pareceu passar uma eternidade até que, finalmente, apareceu sobre um patamar um débil resplendor.

Ali estava o vampiro. Anton olhou angustiado ao redor. Tudo causava uma impressão horrenda e lúgubre: a escada meio ruída que conduzia ainda para a profundidade; os muros da torre, brilhantes pela umidade, com suas gretas e brechas nas quais, com segurança, alojavam-se centenas de morcegos, e o escuro corredor que conduzia ao interior das ruínas.

— Venha! — disse o vampiro tomando-o brandamente pelo braço. Vamos!

— Aonde? — perguntou lentamente Anton.

— Ao salão da festa — disse o vampiro. Não ouve a música? Sabine a Horrível toca o órgão!

Começou a andar pelo corredor e arrastou consigo Anton. Agora percebia também Anton os longínquos sons do órgão, solenes como em uma igreja.

— E isto quem está tocando é a Sabine a Horrível? — maravilhou-se.

— Pois claro — disse o vampiro; cheio de entusiasmo acrescentou: Nós os vampiros amamos a música!

Chegaram a um grande pavilhão vazio sobre o qual caía a luz da lua através de seus cristais quebrados. Entulhos e pedras cobriam o chão.

— Em seguida chegaremos — disse sussurrando o vampiro.

Seu pálido rosto tinha adquirido uma expressão tensa e seus dentes golpeavam um contra o outro com um atroz tilitar. Em frente a eles se estendia um pavilhão ainda maior. Mortalhas negras penduradas nos ocos das janelas e em candelabros que havia nas paredes, e onde existiam velas negras acesas.

— É aqui — sussurrou o vampiro; na sombra da porta se desprendeu uma escura figura dirigindo-se para eles. Era um vampiro fraco com um rosto deformado pelas cicatrizes. Olhou desconfiado com seus olhos piscando e bufou:

— Quem são vós?

O pequeno vampiro fez uma reverência.

— Eu sou Rüdiger von Schlotterstein e este aqui — assinalou Anton — é meu amigo.

— Seu amigo? É também vampiro?

— Claro que sim!

— Entretanto, parece tão humano...!

Anton notou como lhe corria um calafrio pelas costas.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

30

Page 31: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— É estrangeiro — esclareceu o pequeno vampiro.

— Estrangeiro?

— Sim, da Itália.

— É há vampiros ali?

— Pois claro! Ali há uma vila como esta..., mais ou menos parecida; está cheia de vampiros.

— E como se chama a estirpe? — investigou o fraco vampiro.

— A estirpe? — disse Rüdiger ganhando tempo. Chamam-se Bohnsackio os Multicéfalos.

— Os Multicéfalos? —perguntou o outro.

— Sim. Pelo muitos que são.

— E seu amigo, como se chama?

— Este é Antonio Bohnsackio o Lúgubre.

Anton riu às escondidas. Antonio Bohnsackio..., isso soava bem; muito melhor de todos os modos que Anton Bohnsack.

— Bem — disse o vampiro fraco pondo um rosto indeciso. - Nunca deixo de aprender. Refletiu e, então, inclinou-se de repente e farejou a capa do Anton. Pela primeira vez seu rosto clareou. — Humm... — murmurou — delicioso aroma de caixão!

Examinou mais uma vez Anton dos pés a cabeça, mas agora muito mais amistoso.

— Tudo em ordem — bramou. Pode entrar!

Anton e Rüdiger trocaram um olhar de alívio. Já iam entrar, quando o vampiro fraco agarrou Anton pelo ombro.

— Um momento!

Anton se voltou tremendo.

— Sim?

— Como é o clima em sua terra?

— O clima? — perguntou Anton assustado. Bo..., bom — gaguejou então.

— Possivelmente vá visitar-lhes — declarou o vampiro deixando cair sua mão. Aqui não vou me livrar nunca de meu reumatismo!

Dizendo isto, colocou-se de novo junto à porta e olhou indiferente por cima do Anton e Rüdiger para o longe, no interior da sala.

Doze

O prazer do baile

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

31

Page 32: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Na soleira, Anton ficou parado e respirou o ar. O aroma de mofo era tão forte que durante um momento acreditou que teria que sair correndo dali. Além disso, cheirava a cebolas e ovos podres. O pequeno vampiro sorvia o ar a grandes baforadas.

— Ah! — suspirou. Como cheira bem!

Anton tossiu timidamente.

— Não se pode ventilar isto um pouco? — murmurou.

— O que...? — bufou Rüdiger. Ventilar? Você está nas mão dos vampiros bons! — e depois de ter olhar ao redor cuidadoso e temeroso, sussurrou: Que ninguém te ouça dizer isso! Se não, descobrirão que você não é um vampiro!... Além disso, logo vai se conceder o grande prêmio ao aroma — acrescentou.

— Premio ao aroma? — perguntou Anton sem compreender.

— Sim. Ao vampiro que tenha o aroma mais forte!

Nesse momento se reiniciou a música de órgão e em seguida se levantaram os vampiros das mesas e foram por casais ao centro do pavilhão.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

32

Page 33: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Vêem — disse o pequeno vampiro. Vamos dançar também!

— No..., nós? — gaguejou Anton.

— Vamos, vêem!

Tomou o braço do Anton e o levou. Enquanto isso mostrava sua dentadura de fera e inclinava amigavelmente a cabeça para todos os lados.

— Você é a garota — sussurrou. Coloque as mãos sobre os meus ombros, inclina a cabeça para trás e me olha como se estivesse apaixonado!

— Eu? — balbuciou Anton indignado. A garota eu?

— Sim, homem! Isso é o que passa mais inadvertido. Os meninos vampiros parecem, sem exceção, todos iguais.

Anton tragou saliva, mas, à vista dos muitos vampiros que os olhavam já curiosos, pareceu-lhe que o melhor era seguir as indicações do Rüdiger. Por conseguinte, jogou para trás a cabeça e olhou sonhador para o teto enquanto Rüdiger o fazia girar em círculo até que o deixou tonto.

— Sinto-me mal — lamentou.

Mas Rüdiger quão único fez foi sujeitá-lo ainda mais forte.

— Dança de sonho! — disse com voz apagada.

— Sim? — disse confundido Anton. A dança!

— Seriamente — disse o vampiro rindo para si mesmo. Você deverá ver, ao contrário, Lumpi!

— Ah, sim? — exclamou então uma voz rouca. O que há comigo?

Um grande vampiro se separou da multidão e foi até eles com passos lentos e pesados. Era Lumpi!

Anton empalideceu. Descobria agora que era ele...

— Não há nada com você — disse rapidamente Rüdiger.

— Mas você falou de mim! — exclamou Lumpi com voz oculta.

— Eu só disse que ali estava Lumpi — esclareceu Rüdiger, a quem, com a pressa, não parecia ocorrer nada mais razoável.

— E por quê? — grunhiu Lumpi.

— Por que... — disse Rüdiger olhando para Anton em busca de ajuda. Meu amigo da Itália quer seu autógrafo.

— Um autógrafo? — Lumpi olhou para Anton examinando-o das órbitas de seus olhos. E por que meu autógrafo?

Rüdiger levantou exaltado os braços.

— E ainda o pergunta? — exclamou. Sua fama se estendeu até a Itália!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

33

Page 34: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— De verdade? — disse Lumpi lisonjeado; seu rosto ficou de repente vermelho escuro. Rapidamente deu a volta e desapareceu entre os que dançavam.

— Agora já sabem — murmurou Rüdiger.

— Quem? —perguntou Anton.

— Minha família. Lumpi os informará que estou aqui.

— Isso é mau?

— Já veremos. Em definitivo, eu estou proibido de ir à cripta... Mas proibição de cripta não é proibição de baile — disse então altivo, e tomando Anton começou a dançar com ele de novo.

Treze

O primeiro baile

— Anton? — Alguém tocou sua capa e ele deu a volta assustado.

— Anna?

Ela baixou os olhos envergonhada.

— Lumpi me contou que estavam aqui. Dançamos?

— Né..., eu... — murmurou Anton olhando indeciso de Anna para seu irmão. Já estou comprometido.

Anna deu uma risadinha.

— Com o este aqui?

Rüdiger deu um passo para o lado.

— Por favor, deixo-lhe isso!

Anna fez uma reverência.

— Obrigado — disse. Além disso — disse então para Rüdiger — se eu estivesse em seu lugar, preferiria partir.

— E por quê?

— Se te vir Tia Dorothee...

O pequeno vampiro encolheu os ombros com indiferença.

—Isto não é a cripta — grunhiu dando meia volta.

— A..., aonde vai? — exclamou Anton.

Mas o pequeno vampiro tinha desaparecido já de sua vista.

— E agora vai e me deixa sozinho — murmurou.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

34

Page 35: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Mas eu estou aqui — sorriu Anna. Dito isto, rodeou com seus braços o pescoço do Anton e se apertou contra ele. Anton sentiu como lhe comprimia o estômago... e isso é certo que não era devido ao ar carregado!

Enquanto dançava, olhava extasiado: tinha os olhos fechados e cantarolando baixinho. Sua boca pequena, vermelha como uma cereja sorriu e seu rosto estava lavada, como se realmente vivo. Bastava lembrar-se do paletó surrado para ver que era um vampiro. Mas era, afinal, enquanto ainda não tinha dentes de vampiro?

Agora, ela abriu os olhos.

— É formoso, não? — sussurrou.

— Sss..., sim — gaguejou Anton.

— E o que você acha de mim?

— Você? — disse tragando saliva. Doce.

— Seriamente? — exclamou tingindo-se ainda mais suas bochechas. Ai, Anton! — ficou nas pontas dos pés e o beijou na boca.

Anton ficou como se tivesse criado raízes. Imaginou que todos os vampiros do salão estavam olhando-os. Não podia compreender absolutamente que seguissem dançando como se não tivesse ocorrido nada.

— Não está zangado comigo? — perguntou com cautela Anna depois de um momento.

— Não — murmurou Anton tímido.

Ela suspirou aliviada.

— Sabe? Eu sempre sou assim exaltada — declarou. Rüdiger diz que deveria ser mais dona e senhora de meus atos. Mas eu não quero ser, absolutamente, uma senhora —acrescentou com picardia. No máximo, uma dama!

Enquanto ela falava, Anton passou rapidamente a língua pela boca. Sentiu os lábios secos e planos e não havia neles a menor gota de sangue.

— O que te parece realmente a festa? — perguntou Anna.

— A festa? — disse Anton olhando inseguro ao seu redor. Parece-me algo antiquada.

— Não é certo? — assentiu Anna. Eu queria que pusessem uma discoteca embaixo, nas masmorras. Mas os vampiros mais velhos se opuseram — levantou a vista por volta do órgão e contraiu sua cara. Sempre esta música de ratoeira — protestou.

— Poderíamos ir tomar um pouco de ar fresco — propôs Anton, a quem, enquanto isso, tinha começado a doer a cabeça.

— Oh, sim! — exclamou entusiasmada Anna. Passearemos à luz da lua!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

35

Page 36: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Pegou-o pela mão com ternura e o levou para a saída.

Quatorze

Espanto sob a luz da lua

Atravessaram o salão e acabaram em uma escada escura. A porta da frente estava entreaberta e dava apenas em um jardim cheio de ervas daninhas. A grama aqui foi cultivada até a altura do joelho e os arbustos cobriam as estradas há muito tempo. Anna pegou a mão de Anton e descansou a cabeça em seu ombro.

— É..., a minha perna adormeceu, balbuciou Anton, que estava incomodando com o excesso de familiaridade de Anna. Ele abaixou-se e começou a massagear sua perna.

— Eu amo a lua cheia, disse Anna dando fuga para a imaginação, e disse em voz alta:

— Você vê a lua? Ela só pode ser visto na metade, no entanto, é redonda e bonita. Assim são muitas das coisas que nos enganamos em silêncio, porque os nossos olhos não vêem.

Anton lhe lançou um olhar de suspeita.

— É seu? — perguntou.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

36

Page 37: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Não, riu, mas não é formoso? Quando brilha a lua sempre fico melancólica — olhou Anton com seus grandes olhos e, lentamente, uma lágrima correu por sua bochecha.

— E por..., por que chora? — perguntou Anton preocupado.

— Porque sou tão feliz...! — sussurrou e saiu correndo.

— Anna! — gritou desconcertado Anton.

Ninguém respondeu. Só entre as aveleiras se ouviu um leve rumor.

—Anna! — gritou de novo.

Esta vez respondeu uma voz:

— Estou aqui!

Essa era a voz da Anna? Não parecia muito grave? Uma horrível impressão surgiu em Anton. Permaneceu sem se mover e conteve a respiração.

— Onde está? — gritou a voz, agora já não havia dúvida alguma: não podia ser Anna de maneira nenhuma!

Mas quem seria então? Vieram-lhe à memória as histórias sobre lobisomens que Rüdiger tinha contado...

Algo despedia luz entre as matas. Sentiu de repente um desejo inexplicável de estar ali e, sem podê-lo evitar, deu um par de passos lentos.

Então lhe agarraram pela capa por detrás.

— Anton! — ouviu exclamar suplicante.

Era Anna!

—Rápido! Para casa! Ali em cima, Tia Dorothee...

Anton viu sair uma sombra de entre as matas que se aproximava deles a grande velocidade; mas já tinham alcançado a porta e a fecharam de repente atrás de si.

Tremendo com todo o corpo, Anna se apoiou contra a porta fechada.

— Quase te apanha — sussurrou ela. E teria sido minha culpa.

— Pensei que ela estivesse na festa — disse Anton.

— Isso eu também pensava — disse Anna em voz baixa. Seus lábios tremiam e seu rosto estava branco como leite. Anton não deve ficar sozinho nunca mais à luz da lua!

— Nnn..., não — disse Anton perplexo. Eu tampouco o desejo...

— Sei — disse ela envergonhada. Voltamos para a festa?

— E Tia Dorothee? — perguntou Anton.

— Ela não pode fazer nada ali dentro — esclareceu Anna. Por isso queria fortalecer antes.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

37

Page 38: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Fortalecer chama você a isso? — disse Anton indignado tocando o pescoço.

Ela riu.

— Vêem! Possivelmente já vão anunciar o prêmio do aroma.

Quinze

Quem despede o melhor aroma

Quando entraram no salão da festa, a música de órgão tinha cessado. Os vampiros tinham voltado para suas mesas e olhavam fixamente, cativados para um vampiro pequeno e um pouco inclinado que estava de pé sobre um pedestal no centro do salão.

— Elizabeth a Gulosa — sussurrou Anna, que tinha encontrado dois lugares livres perto da entrada.

Ao contrário da maioria dos vampiros, que pareciam conceder pouca importância a seu aspecto externo, Elizabeth a Gulosa estava extremamente arrumada: levava uma capa de seda negra sem manchas, seu cabelo cinza estava ondulado em elegantes cachos e em seus fracos dedos havia reluzentes anéis.

— Queridos amigos! — começou a falar. Alegro-me que tenham vindo! E agora vamos começar nosso concurso “Quem despede o melhor aroma?”! A banca do júri está constituída nesta ocasião por: Magdalene a Bífida, Günther o Bondoso e Elke a Infame. Rogo aos jurados que ocupem seus lugares.

Os que tinham sido nomeados subiram ao estrado junto a ela.

— A de óculos é Magdalene — sussurrou Anna. Pensa que tem as pernas mais bonitas entre todos os vampiros!

— Seriamente? — disse Anton rindo sozinho.

De debaixo da capa de Magdalene, que só chegava até os joelhos, saíam duas curtas e grosas pernas que eram tudo, menos bem formadas.

— Por que ele se chama Günther o Bondoso? — perguntou Anton.

— Não vê quão magro está? — riu Anna. É tão bondoso que sempre cede a preferência a outros vampiros.

Elke a Infame passava os outros dois em uma cabeça. Para um vampiro era surpreendentemente boa pinta, conforme pareceu a Anton, mas a inveja e o ciúmes tinham causado profundas rugas em seu rosto.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

38

Page 39: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— E agora rogo a todos aqueles que queiram tomar parte no concurso que venham aqui e se coloquem em fila! — gritou Elizabeth a Gulosa.

Em seguida se levantaram uns dez vampiros de seus assentos.

— Rogaria agora ao primeiro concorrente que se presente a vampirada reunida!

Um atlético vampiro de crânio anguloso e completamente calvo subiu ao estrado.

— Eu sou Jorg o Colérico — disse com voz chiada. Apontei-me ao concurso porque acredito que tenho um aroma particularmente aromático!

— Deixe-me cheirar! — disse com voz melosa Magdalene a Bífida farejando o ar ao seu redor. Günther o Bondoso e Elke a Infame seguiram seu exemplo. Depois se olharam e assentiram.

— O seguinte! — gritou Elizabeth a Gulosa.

Um vampiro alto e magro vinha a seguir.

— Eu sou Hannelore o Impaciente — disse com voz elevada de falsete. Minha especialidade é o aroma de bosta de cavalo.

Depois que o júri do concurso cheiro-o também, veio ainda um vampiro presunçoso, com papada e focinho de porco, uma moça vampiro de bochechas afundadas, um vampiro com antolhos e um vampiro ativo desde tempos antigos que só podia falar vaiando, porque lhe faltavam todos os dentes, exceto as presas.

Então subiu ao estrado um vampiro alto de ombros largos.

— Meu nome é Lumpi o Forte, exclamou para a sala inteira, e sou famoso por meu aroma de mofo!

Anna tampou a boca com as mãos.

— Mas se Lumpi não despede nenhum aroma..., murmurou, só cheira...

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

39

Page 40: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Com gesto triunfal Lumpi se vangloriava sobre o estrado e se deixava cheirar.

— Completamente petulante — zombou Anna.

Depois de Lumpi se apresentar ao júri e ao público outros dois concorrentes. Com isso tinha terminado a primeira parte do concurso.

Sabine a Horrível se sentou novamente ao órgão e tocou enquanto os membros do júri se reuniam com Elizabeth a Gulosa para determinar o vencedor.

— Acha que Lumpi ganha? — perguntou sussurrando Anton.

Anna negou com a cabeça.

— Nunca! Estive antes sentada junto a Hannelore a Impaciente. Em comparação com ela, Lumpi não é absolutamente nada! E quem sabe que aroma tem os outros!

Nesse momento Elizabeth a Gulosa levantou os braços e instantaneamente a música silenciou.

— Queridos amigos! — gritou com voz trêmula. O vencedor de nosso concurso de hoje, o vampiro que melhor aroma despede, é... — aqui fez uma pequena pausa e olhou uma vez mais aos candidatos por ordem — Jorg o Colérico!

Produziu-se um clamoroso aplauso. Jorg o Colérico chegou tropeçando à cena e fez uma reverência.

— E como prêmio, uma manta gateada para o caixão! — exclamou lhe entregando um pano negro.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

40

Page 41: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Agora Lumpi estará insuportável — sussurrou Anna.

—Mas se foi justo! — disse Anton.

— Lumpi se acha sempre tratado injustamente — esclareceu Anna — e então é melhor não ficar em seu caminho. Vêem melhor irmos!

— E Rüdiger? — perguntou Anton.

— Já sabe encontrar sozinho o caminho de volta.

Dezesseis

Vôo de volta

— E se agora me apanha Tia Dorothee? — perguntou Anton quando saíram para a plataforma da torre do castelo.

— Ah! — disse Anna fazendo um gesto negativo. Ela ainda está a espreita no jardim.

Ela se elevou no ar e Anton também desdobrou os braços e voou.

— Ar fresco! — gemeu ele, inspirando profundamente.

— E meu «muftí elegante»? — perguntou Anna doída. Não cheira meu perfume?

— Sim, sim — disse Anton rapidamente. O autêntico mau aroma era inequívoco, mas aqui, em céu aberto, apenas se notava.

— Hoje me perfumei muito, a propósito! — declarou. E só para você!

— Muito amável da sua parte — murmurou Anton.

— De verdade quer ir já para casa? — perguntou Anna olhando Anton com olhos brilhantes.

— Por que não? — perguntou surpreso.

— Bom, disse ela sorrindo, é que ainda poderíamos fazer algo. Por exemplo, eu sempre quis ir a uma discoteca.

— Uma discoteca! — disse Anton com desdém. Mas isso é aborrecido.

— Você acha? — perguntou Anna.

— Claro! — disse Anton. Tudo só para lucrar!

— Então podemos ir nadar — propôs Anna. Nadar à luz da lua, isso é muito romântico!

— Eu..., não tenho traje de banho — disse Anton ruborizando.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

41

Page 42: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— E o que? — riu ela. Eu tampouco.

— Estou doente — disse Anton espirrando para comprovar.

— Ora! — grunhiu Anna. Não tem vontades de nada.

— Me..., meus pais vão voltar logo — gaguejou Anton.

— Está bem — disse ela furiosa.

Durante um momento seguiram voando em silêncio um junto ao outro. Anton se zangou consigo mesmo. Sempre tinha que preocupar-se com o mau humor!

— Quer que te conte uma piada? — perguntou finalmente.

— Se você quiser — disse indiferente Anna.

— Pois bem: Fritz vai comprar uma camisa para seu pai de aniversário. «Queria uma camisa», pede ao vendedor. «Uma como a que estou vestindo?», perguntou este. «Não», responde Fritz, «uma mais limpa!»

— Ha, ha — disse Anna sem alterar-se.

Ao menos, pensou Anton, tinha dito algo. Febrilmente ficou em outra piada para contar.

— Um boxer vai passeando pela rua. Em cima dele, dois pisos mais acima, há um pastor alemão em um balcão. «Ei!», grita o boxer, «Desça que poderemos sair juntos!» «Acaso estou louco?», responde o pastor alemão. «você crê que quero ficar com meu focinho como o teu?»

Anna teve que rir ironicamente. Mas ainda seguia olhando fixamente para frente.

— Conhece a piada do cão-salsicha? — perguntou Anton. Um homem está sentado no cinema com um cão-salsicha. O cão ri continuamente. Então se volta uma senhora e diz: «Tem você um cão curioso.» «Sim», responde o homem, «eu também o acho estranho. Sabe você? “O livro de que tiraram o filme não tinha gostado absolutamente.»

Agora Anna riu em voz baixa tampando a boca com a mão. O gelo estava quebrado! Só faltava Anton fazê-la rir de tudo. E agora lhe ocorria também uma piada apropriada!

— Duas vacas pastam pacificamente em um prado. De repente, começa uma a tremer terrivelmente. “O que está acontecendo?”, pergunta a outra preocupada. “Oh, não!”, queixa-se a primeira. “Ali vem outra vez a ordenhadeira das mãos frias!”.

Isto foi muito para Anna. Olhou para Anton e pôs-se a rir. Também Anton teve que rir e, assim, seguiram voando rindo e soprando.

— Esta eu tenho que contar para Lumpi! — disse Anna.

Anton sorriu adulado.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

42

Page 43: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Sabe mais? — perguntou ela.

Anton moveu negativamente a cabeça.

— Mas eu sei uma! —disse Anna. Vai uma mulher ao médico. «Doutor», conta-lhe ela seu problema, «cada vez que tomo café tenho uma espécie de espetada no olho direito!» E o médico lhe aconselha: «Então você deve tirar a colher da xícara!»

Anton ofegou.

— Engraçado! — disse rindo.

— Não tão alto! — disse Anna. Em seguida chegaremos à cidade!

Ante eles surgiram as primeiras casas. Veio à memória de Anton que ainda tinha que falar algo importante com a Anna.

— Quanto tempo ainda terá Rüdiger proibição de cripta? — perguntou.

Ela encolheu os ombros.

— Dois meses, três meses. Depende do que definir o conselho de família.

— O que...? — exclamou Anton.

Isso era horrível! Como ia manter seus pais tanto tempo afastados do porão?

— Tudo que eu desejo! — queixou-se. Ele fica preguiçosamente deitado no caixão, lendo histórias sobre vampiros, e me deixa sozinho descascando as batatas quentes.

— Típico de Rüdiger! — riu ironicamente Anna. Mas você também tem culpa; se não se deixasse utilizar por ele...!

— O que tenho que fazer então? — disse Anton indignado. Observar quando meu pai o encontrar?

— Naturalmente que não, disse Anna, mas tem que deixar claro que ele não pode ficar eternamente no porão de sua casa. A semana que vem há de novo reunião do conselho de família e possivelmente...

— Sim? — exclamou Anton.

—... possivelmente lhe levantem então a proibição de cripta. Eu intervirei, de qualquer modo, a seu favor.

— Está você está no conselho de família? — perguntou Anton surpreso.

Ela pôs uma cara cheia de dignidade.

— Naturalmente, disse, ou você acha que eu deixo de apresentar aos outros meus interesses?

Tinham alcançado a casa do Anton. Em sua casa seguia ainda acesa o abajur do escritório. Respirou aliviado; isso significava, seus pais não tinham retornado ainda.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

43

Page 44: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Aterrissou sobre o beiral da janela e levantou a folha que só tinha deixado encostada.

— Boa noite, Anna — disse ele.

— Boa noite, Anton — sorriu ela — e não se esqueça de tirar a maquiagem!

Dezessete

Frango com arroz

A manhã do domingo despertou Anton com um notável zumbido na cabeça e quando quis levantar-se a vista ficou turva. Sentou-se de novo em sua cama e refletiu: Tinha comido ou bebido ontem algo que não lhe havia feito bem? Mas na reunião dos vampiros não tinha tomado nada, e a comida de casa seguro que estava em ordem.

Possivelmente ainda não tinha dormido o necessário? Olhou o relógio: quase onze! Por certo, tinha dormido quase onze horas. Havia, acaso, dormido muito? Ou a noite de ontem tinha sido muito fatigante? Teria lhe feito mal possivelmente o aroma do salão da festa?

Uma suave chamada na porta interrompeu suas reflexões.

—Anton, está acordado? — era a voz de sua mãe.

— Não! — gritou colocando a colcha sobre a cabeça.

Ouviu a porta do seu quarto se abrir; depois, duas mãos se meteram sob a colcha e lhe fizeram cócegas.

— Não! —soluçou. Basta!

— Está acordado agora?

Sua mãe estava sentada no bordo da cama e observava como saía de debaixo da colcha.

— Mas que aspecto tem! — exclamou sobressaltada.

— Como?

— Tem os olhos completamente melados e sua pele está tão marcada...!

— Sim...? —grunhiu Anton. Será que não tinha conseguido tirar toda a maquiagem? Ontem de noite, no espelho, os olhos só queriam se fechar e por isso passou o trapo molhado só um par de vezes pelo rosto. Olha que a coisa era resistente...!

— Te lave rapidamente! — disse ela. As doze seus avós chegam para o almoço!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

44

Page 45: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Ah, sim! — lembrou-se. E o que é o que há? — perguntou de passada a seu pai que estava sentado à mesa da cozinha.

— Sua comida favorita: frango com arroz.

— E de sobremesa?

— Sorvete de baunilha caseiro.

— Humm...! — disse Anton lambendo os lábios. Seguiam ainda tendo o sabor do batom nos lábios.

Pouco antes das doze soou a campainha. Anton, enquanto isso, lavou-se e trocou de roupa; de qualquer maneira, não tinha posto as calças de tecido negros como queria sua mãe.

— Você já sabe que a avó... — havia dito ela, mas Anton tinha permanecido obstinado e se pôs suas calças jeans.

A pestilenta capa do Rüdiger e as meias-calças furadas tinham sido guardados em uma capa de travesseiro e colocado o mais fundo no armário.

A avó do Anton era uma mulher pequena e gorducha como uma bola. Quando ria, via-se uma fila de iguais dentes brancos como pérolas. Antigamente, Anton tinha admirado muito a sua avó por seus dentes... até um dia em que dormiu na casa de seus avós e viu pela manhã seus dentes em um copo de água!

O avô do Anton não era muito mais alto. A maioria das vezes levava calças de suspensórios e camisas quadriculada. Hoje, entretanto, estava em seu melhor traje.

Desembrulhou um ramo de tulipas e o entregou à mãe. Ao Anton deu, como de costume, um pacote plano... Chocolate ao leite com nozes inteiras!

— Mas só para depois da comida! — acautelou a avó.

— Claro! — disse Anton.

Os avós penduraram seus casacos e depois tomaram lugar na sala de estar na mesa posta.

— Anton tem hoje uma cor tão sã...! — elogiou a avó.

Anton riu ironicamente. Naturalmente, quase tinha arrancado a pele esfregando o rosto com sabão!

— Mas sempre essas calças jeans! — protestou. Não pode pôr outras calças ao menos no domingo?

— Ai, vovó, todos usam calças jeans!

— O avô não! — replicou ela.

— Posso servir? — perguntou o pai.

— Para mim uma perna, por favor! — disse a avó.

— O que quer? Uma perna? — Anton riu.

A avó o olhou de soslaio.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

45

Page 46: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Assim se chama, jovenzinho.

— Aqui se chama coxa — declarou Anton.

— Para mim, por favor, uma parte de peito! — pediu o avô, e Anton teve que rir novamente.

Rapidamente encheu de arroz o prato e se inclinou para ele como se fosse comer, enquanto ria por dentro até que ficou sem ar.

— Muito saboroso! — fez-se ouvir o avô. Como mais eu gosto de comer o peito é quando está bem assado por dentro!

Anton riu baixo.

— Diga-me, disse o avô, já revestiu de madeira a cozinha?

O pai do Anton, que nesse momento tinha a boca cheia de arroz, negou com a cabeça.

— Anton perdeu a chave do porão.

— O que...? — disse o avô olhando para Anton indignado. Simplesmente assim, perdeu?

— Já a encontrei — grunhiu Anton.

— Não fale com a boca cheia! — corrigiu-o a avó.

— E bem? — dirigiu-se o avô ao pai. Quando vais fazer a cozinha?

— No próximo fim de semana estou em um congresso, desde sexta-feira até domingo. E no fim de semana seguinte tenho que descansar.

— O que...? — exclamou Anton entusiasmado. Isso era maravilhoso!

— Sabe uma coisa? — disse o avô. Terá que ter na próxima semana um dia livre e eu te ajudo! O que te parece isso?

O pai pôs cara de surpresa.

— Não é má idéia — disse então. Anton, de todas as maneiras, não é uma grande ajuda — acrescentou.

— Como diz? — exclamou Anton desarmado. Eu ia recolher do porão as pranchas e as ferramentas.

— Isso melhor eu mesmo fazer — disse o pai. Ou seu avô. Pode ser na quinta-feira, avô?

— Sim — assentiu o avô.

— Está bem! — todos pareciam contentes, menos Anton.

— Come jovenzinho! — disse a avó, que tinha notado que estava pálido. Isso te dá forças!

— Que seja — murmurou Anton revolvendo seu arroz. Tinha-lhe tirado o apetite por completo!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

46

Page 47: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Dezoito

Esperando o crepúsculo

— Não tem que ir treinar? — perguntou na segunda-feira a mãe do Anton pouco antes das cinco da tarde.

— Sim — disse Anton. Mas hoje começa mais tarde.

— Ah, sim? Quando?

— Às seis.

— E por quê?

— por quê? — não tinha pensado ainda em nenhuma desculpa apropriada. O treinador tem que ir ao dentista — disse.

— Precisamente quando tinham treino? — sua mãe sacudiu com incredulidade a cabeça. Então vais voltar para casa de noite...

— Bom, sim, disse Anton rindo por dentro, mas tampouco é mau. Além disso, Olé também vai.

— Ah, bom. Está bem — a mãe voltou outra vez aos trabalhos de matemática que ia corrigir.

Anton foi para seu quarto e ficou lendo até pouco antes das seis. Então agarrou do armário sua sacola esportiva, tirou a capa com a roupa do Rüdiger e as colocou junto com a roupa de ginástica.

Naturalmente, não iria hoje ao treino, que, como sempre, foi das cinco as seis. Ficaria das seis até quinze para as sete na casa de Olé, como tinha combinado, e depois disso, logo que escurecesse, visitaria o pequeno vampiro no porão.

— A que hora volta? — perguntou sua mãe quando ele se despediu.

— Pouco depois das sete.

Na volta da casa de Olé, Anton tropeçou, para susto dele, com a senhora Puvogel, uma vizinha do quarto andar a quem os meninos do prédio chamavam tia delator.

Ela estava como sempre com seu asqueroso avental e na cabeça o lenço transparente de nylon sob o qual seus cabelos estavam colhidos com cachos.

— Vá, Anton — disse ela rindo com hipocrisia. Tão tarde ainda fora? Não tem nenhum medo do porão?

— Não... — grunhiu querendo escapar dela.

Entretanto, ela o manteve fortemente agarrado pelo braço e zombou:

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

47

Page 48: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Já se deu conta do mal que cheira do porão? Não há quem o suporte!

Fez uma pausa e ofegou.

— Se isto não melhorar, todo mundo deverá ser obrigado a abrir seu quarto do porão para que se possa descobrir de onde vem o mau cheiro!

Anton se assustou.

— É..., está permitido isso? — gaguejou.

— Claro que sim — disse ela. Em um caso como este...

Ao dizer isto, ela soltou seu braço e seguiu subindo as escadas.

— Vá uma nojeira! — ouviu-a ainda na escada pôr o grito no céu.

Anton ficou parado no corredor do porão até que tudo ficou em silêncio. Depois se dirigiu silenciosamente à porta de seu quarto, chamou e abriu.

Dezenove

Um vampiro triste

O aroma de mofo hoje parecia para Anton muito mais penetrante. Ou acaso o tinha contagiado a senhora Puvogel com seu bate-papo?

Permaneceu de pé junto à porta pestanejando.

— Rüdiger? — disse em voz baixa. Trouxe sua roupa!

— Outra vez tão cedo? — saiu uma resposta pouco amistosa da profundidade do quarto do porão.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

48

Page 49: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Posso acender a luz? — perguntou Anton precavido.

— Não! — chiou o pequeno vampiro. Por todos os diabos, não terá que acender a luz elétrica para me despertar!

Um fósforo ondulou e Anton viu como o vampiro acendia a vela do bordo do caixão.

— Ainda não lavei os dentes — resmungou tirando do caixão uma escova de dente vermelha com cerdas deformadas.

— Mas se não tem água! — disse Anton.

— E o que? —disse o vampiro olhando-o sarcasticamente. Acaso necessito água para escovar as gengivas?

— Não, disse Anton, só pensava que...

— O que tem que pensar? — grunhiu o vampiro enquanto voltava à cabeça com a escova de dente na boca.

Anton tirou a capa e as meias-calças da sacola esportiva e as deixou sobre o bordo do caixão.

O vampiro parecia não querer fazer caso nem a ele nem à roupa.

— Está zangado? — acabou perguntando Anton.

— Sim! — grunhiu o vampiro.

— Por ontem?

—Sim.

Anton refletiu.

— Porque estive dançando com a Anna?

— Não! — Apesar das outras vezes era tão precavido, o vampiro rugiu: Simplesmente porque você se largou e eu estive te procurando por toda a ruína, e então fui dar nas mãos de Tia Dorothee!

— OH! — disse Anton, que podia compreender perfeitamente o susto do Rüdiger. E o que?

— O disse a Elizabeth a Gulosa, a chefa dos vampiros, e esta me dirigiu uma admoestação.

— Uma admoestação? E por quê?

— Porque, conforme diz, é uma falta de vergonha ir à festa dos vampiros apesar da proibição de cripta. Não sabia eu que, além disso, tinha proibição de festa! — acrescentou irritado.

— Então, certamente, ainda não lhe levantaram a proibição de cripta — se interessou Anton.

— Ao contrário! — exclamou o vampiro. Ainda me acrescentaram um incremento de dois dias de proibição de vôo.

— Proibição de vôo? — disse Anton sem compreender.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

49

Page 50: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Sim. Devo procurar meus..., né..., mantimentos a pé.

— Não ouço mais que proibição, proibição, proibição! — exclamou Anton, indignado. Proibida a cripta, proibida a festa, proibido voar... Isto é uma ditadura!

O pequeno vampiro encolheu com tristeza os ombros.

—O que quer que faça? — disse.

— Te defenda! — exclamou Anton.

Mas o vampiro só sacudiu a cabeça cansado.

— Entre os homens possivelmente resultasse, mas entre nós, vampiros, isso teria as mais terríveis conseqüências.

— Quais? —perguntou Anton curioso.

O vampiro lhe jogou um olhar abismal e sussurrou:

— Proibição de emprego.

— Proibição de emprego? — repetiu Anton. E isso o que é?

— A morte por fome — disse o vampiro com voz de sepulcral.

Anton calou aterrorizado. Os métodos de educação dos vampiros lhe pareciam realmente atrozes. As pessoas não podiam fazer outra coisa que alegrar-se de não ser um vampiro!

— Posso te ajudar de algum modo? — perguntou compassivo.

Os olhos do vampiro começaram a iluminar-se.

— Faria isso por mim? — exclamou lambendo-se excitado.

Anton advertiu como o sangue lhe golpeava as veias.

— A..., assim não, gaguejou, pensava... de outra forma.

Imediatamente o rosto do vampiro voltou a escurecer.

— E como..., de outra forma? — murmurou. Quer me ajudar a caçar ratos?

— Nnn..., não — disse rapidamente Anton. Realmente tinha uma capacidade única para meter-se em apuros!

— O melhor será que ponha em seguida os pés na estrada — disse pesaroso o vampiro. Quem sabe quanto tempo me levarão meus..., né..., assuntos?

Apagou a vela de um sopro e ficou em pé.

— Boa sorte! — disse Anton em voz baixa. De repente o vampiro lhe deu uma tremenda pena. Podia agora subir e agarrar simplesmente da geladeira a parte de queijo que gostava!

— Obrigado! — bufou o vampiro subindo pela janela do quarto. Pode-me fazer falta!

Quando Anton fechou a porta do porão lhe veio à memória que não lhe tinha contado nada ao pequeno vampiro do que se estava para acontecer para ele na quinta-feira. Mas depois se alegrou

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

50

Page 51: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

absolutamente de não dado um novo choque ao já abatido vampiro. E, além disso, até então ficavam ainda três dias...

Vinte

Agitação no corredor do porão

Cantarolando sua canção favorita “Havia uma vez um barquinho pequeno”, Anton foi para sua casa na terça-feira. Haviam-lhe devolvido os ditados e Anton, que sempre tirava só um bem ou um aprovado, tinha tido um notável alto!

Por isso poderia pedir um livro, e já sabia qual: Histórias de vampiros para avançados. De um empurrão abriu a pesada porta do edifício e se dirigiu ao elevador. Ali ficou parado de repente: do porão provinha uma agitada confusão de vozes e às vezes uivava um cão. Teria aquilo algo que ver com o Rüdiger?

Colocou-se no lance superior da escada do porão e escutou.

— Aqui tem que ser! — resmungou uma voz de mulher. Exatamente aqui, onde a meu Susi lhe arrepia a pele!

Uma voz de homem respondeu:

— Este é o quarto dos Bohnsack!

— Dos Bohnsack? — exclamou a voz de mulher. Ontem à noite me encontrei com Anton quando se dirigia ao porão com uma grande bolsa! Às escondidas, digo-lhe eu a você, e quando lhe perguntei aonde ia ficou vermelho como um tomate!

— Tudo mentira! — zombou Anton.

— Quando ocorreu isso? — perguntou a voz do homem.

— Às sete. Suspeitei em seguida.

— E você notou após este..., este..., aroma?

— Não, isso já o tinha notado antes.

— Quando?

— Faz aproximadamente uma semana.

A isto seguiu um selvagem uivo e a voz de mulher exclamou:

— Vê você? Completamente louca fica minha Susi diante da porta do quarto!

Nesse momento se abriu a porta do edifício e entrou a mãe do Anton.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

51

Page 52: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Você aqui? — exclamou surpreendida ao ver o Anton na escada do porão. Como é que ainda não subiu?

— É você, senhora Bohnsack? — perguntou a voz de mulher do porão.

— Sim! O que acontece? — perguntou a mãe.

— Você pode descer aqui! — exclamou a voz do homem.

— Sabe do que se trata? — dirigiu-se sua mãe sussurrando ao Anton.

— Nem idéia — grunhiu. Não se sentia muito bem em sua pele. Tomara que sua mãe não levasse a chave do porão!

Desceram as escadas do porão. Um cão-salsicha gordo se dirigiu cambaleando para eles com latidos irados: era o cevado cão mulherengo da senhora Puvogel.

— Está bem que venha em seguida o vagabundo! — saudou a senhora Puvogel. Com a excitação o lenço de nylon tinha soltado e agora os cachos lhe penduravam pela cabeça em forma caótica.

— O que você disse? Vagabundo? — perguntou estranhamente sua mãe.

— É por acaso não é um vagabundo aquele que se desliza pelo corredor do porão com uma bolsa às sete da tarde? — pôs a senhora Puvogel gritando alto.

A mãe jogou para Anton um olhar que significava «já falaremos logo!», e depois disse:

— Por isso não tem você direito de chamar de vagabundo a meu filho. Eu tampouco a chamo de... fofoqueira.

— Como diz? — chiou a senhora Puvogel. Fofoqueira me chamou você?

Procurou palavras para descarregar sua ira.

— Entendeu-me você mal — disse a mãe com frieza. Eu disse que não a chamo de fofoqueira!

A senhora Puvogel ficou sem fala.

Enquanto isso, o porteiro, que até então tinha permanecido de pé calado junto à senhora Puvogel, interveio na conversação:

— A senhora Puvogel me queixou que mau aroma que há no porão.

— E o que tenho eu que ver com isso? —disse a mãe.

— A senhora Puvogel acredita que o aroma vem de seu quarto!

— De meu quarto? — exclamou. Isso é o maior absurdo que já ouvi! De meu quarto, que se limpa a cada duas semanas! Já estou um pouco acostumada a seus falatórios, senhora Puvogel — disse então. Mas isto já é realmente demais!

A senhora Puvogel se pôs completamente pálida.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

52

Page 53: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— E meu Susi? — perguntou diminuída. Por que infalivelmente ladra diante da porta de seu porão?

— O que sei eu? — perguntou a mãe medindo ao cão com um olhar de desprezo. Certos cães encontram sempre algo para ladrar.

Um peso saiu de cima de Anton! Que sua mãe tivesse advogado assim por ele...! Naturalmente, quereria saber o que ido fazer ontem às sete da tarde no porão. Mas para isso já lhe ocorreria alguma explicação plausível!

A senhora Puvogel ficou desinflada e também ao porteiro parecia o assunto muito penoso.

— Você perdoe, por favor, disse à mãe do Anton, mas eu, naturalmente, devo atender todas as reclamações.

Sem dizer uma palavra, a senhora Puvogel agarrou em braços ao cão-salsicha e partiu murmurando.

— Vamos, Anton! — disse a mãe. Seguro que não comeste nada ainda!

Vinte um

Os talharins são divertidos

— E bem, perguntou a mãe na mesa da cozinha depois de colocar o talharim na mesa, o que é que você estava fazendo no porão às sete da noite?

Anton enrolou com uma lentidão incrível um par de talharins no garfo.

— É um segredo — disse.

— Também é um segredo o motivo pelo qual faltou ontem ao treino?

Anton levantou assustado à vista. Como sabia ela isso?

— Sim, surpreende-te! Né? — disse ela. Encontrei-me precisamente com a mãe de Olé e me contou que ontem estiveram em sua casa jogando monopólio.

— É..., sim — murmurou Anton tímido. É que ontem não tinha vontade de treinar. Correr sempre em círculo, levantar pesos...

— Mas você sempre gostou de ir...!

Isso era, definitivamente, certo.

— E Olé? Tampouco ele tinha vontade? — perguntou a mãe.

Anton refletiu. Provavelmente ela já sabia a verdade e por isso disse:

— Faz meio ano que saiu da equipe.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

53

Page 54: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Muito bonito como me enganaste com sua história do treinador que tinha que ir irremediavelmente ao dentista!

A voz da mãe não soou absolutamente zangada, mas sim bem divertida.

— Eu só gostaria de saber como vais explicar esse vagar como um espírito pelo porão.

— Vagar como um espírito? Com essas coisas não se brinca! — disse Anton cheio de dignidade.

— E o que é que você foi fazer no porão?

Anton sacudiu a cabeça.

— É um segredo — repetiu.

— Mas é que eu sou muito curiosa! — disse a mãe. Não posso me inteirar disso?

— Sim. Na quinta-feira.

— Terei que esperar tanto? Bom, se você o diz!

Ela parecia tomar o assunto como uma brincadeira; e isso era, naturalmente, o melhor que podia acontecer para ele! Em quanto ela não suspeitasse, o vampiro, de certa forma, estava a salvo! E daqui até a quinta-feira teria que ter desaparecido do porão de toda maneira. Assim ele poderia contar à sua mãe com toda a tranqüilidade do mundo que o segredo tinha sido um vampiro vivendo por uma semana no porão!

Anton teve que rir agora por dentro ao imaginar a cara que ela poria ante tal revelação!

— Parece que comer talharins te diverte muito — observou ela.

— Os talharins são divertidos — disse Anton. Não sabia?

Em seu quarto, Anton se sentou na escrivaninha, abriu seu livro de leitura e começou a fazer sua tarefa: “Como os abderitanos semearam sal em um campo”. Mas seus pensamentos voava sempre para Rüdiger no porão, até que, finalmente, fechou o livro. De todas as formas tinha que falar hoje ainda com o Rüdiger e deixar claro que não podia ficar mais tempo no quarto!

Mas o que ia dizer a seus pais sobre por que tinha que voltar a descer ao porão? E se baixasse agora, as cinco, e depois chegasse tarde ao jantar?... Bom, isso podia lhe passar a qualquer..., ou não? Voltou a abrir seu livro. Em qualquer caso, ele não era tão parvo como os abderitanos!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

54

Page 55: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Vinte dois

Estômago vazio

— Vou um pouco lá embaixo! — disse pouco antes das cinco.

— Por mim... — respondeu a mãe. Mas não se esqueça de que às seis e meia é o jantar!

Embaixo, Anton montou em sua bicicleta. Duas horas eram muitíssimo tempo, mas logo iriam passar! Além disso, levava consigo «Gargalhadas da cripta» e podia lê-lo enquanto houvesse luz.

Voltou às sete. Abriu sem ruído a porta de casa. Não se via ninguém e, assim, recolheu sua bicicleta rapidamente e a levou escada abaixo. O corredor do porão estava vazio e nada parecia ter trocado salvo o aroma de mofo, que havia se tornado ainda mais forte.

Deixou sua bicicleta e depois abriu a porta de seu próprio quarto do porão.

O pequeno vampiro já estava acordado. À luz da vela estava sentado no caixão e olhava de frente a Anton com olhos grandes e famintos. Mas apenas o reconheceu, sua cara adquiriu uma expressão decepcionada.

— Ora, você! — disse de mau humor.

O cabelo lhe saía desordenado da cabeça e seus dentes batiam com tanta rapidez como se tivesse calafrios.

— Rüdiger! — exclamou surpreso Anton. Está doente?

— Doente? — disse o vampiro tentando rir. Meio morto de fome é o que estou!

— É que não agarraste..., nada? — quis saber Anton.

O vampiro lançou um olhar que puseram os cabelos de Anton arrepiados.

— Nem sequer um camundongo! — gemeu apertando sua mão contra o corpo. Se você soubesse quão vazio está meu estômago!

Ao dizer isto, olhou para Anton com olhos brilhantes passando lentamente a língua pelos lábios. Anton se assustou. Pareceu-lhe de repente como se o vampiro olhasse fixa e impertubavelmente seu pescoço!

— Não..., não quererá por acaso...? — gaguejou retrocedendo. Quem sabia do que seria capaz um vampiro faminto!

Mas o vampiro negou com a cabeça e gemeu ainda mais alto.

— Não pode nem correr? — perguntou Anton compadecido.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

55

Page 56: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

O vampiro se levantou, deu um par de passos cambaleantes e se deixou cair novamente no caixão.

— Se apenas não tivesse tanto enjôo...! — soluçou.

Tinha um aspecto tão deplorável que dava muita pena a Anton. Era de algum modo passível carregar agora Rüdiger com preocupações extras? Não devia, ao menos, esperá-lo pegar algo? Anton notou que com só pensamento da comida favorita do vampiro lhe corria um suor frio pelas costas; mas sobrepondo-se a isso com orgulho disse:

— Eu... poderia te ajudar.

— E como? — perguntou o vampiro.

Anton titubeou.

— Eu não sou tão mal caçando coelhos.

—Seriamente? — disse o vampiro. Seu sombrio rosto se iluminou. O podemos tentar!

Em seguida saltou do caixão e correu à janela do quarto. As perspectivas de comida lhe haviam, evidentemente, revitalizado de tal forma que podia mover-se novamente com absoluta normalidade. Anton quase se arrependia de ter oferecido sua ajuda.

— Você, Rüdiger — começou hesitante. Pelo do porão..., pois, meu pai..., e meu avô...

Mas o vampiro já tinha aberto a janela e subia para fora.

— Vêem! — exclamou! Ali há dois coelhos!

Vinte Três

Desgraça para um artista

Anton o seguiu mal-humorado. Quando se tratava de seus interesses — os do Anton — o vampiro preferia se fazer de surdo!

Agora se escondia na grama e olhava procurando a seu redor.

— Estavam bem aqui — sussurrou.

— Melhor vamos! — disse Anton jogando um olhar temeroso às janelas iluminadas da sala de estar que estava sobre eles. Se não, nos vão ver meus pais!

— E aonde? — disse excitado o vampiro.

— Ali..., ali acima — gaguejou Anton indicando o parque de recreio protegido de olhares curiosos por altos matagais.

— Será que ali há coelhos? — perguntou desconfiado o vampiro.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

56

Page 57: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Claro que sim! — disse Anton apesar de não estar tão seguro disso.

Com cautela, deslizaram sobre a grama. Quando tinham alcançado os matagais, Anton respirou aliviado.

— E onde estão agora os coelhos? — perguntou o vampiro observando desinteressado os andaimes para subir.

Anton apartou um par de ramos.

— Aqui, disse, este é seu lugar favorito.

— Seriamente? — disse o vampiro. Sua voz soou de repente completamente áspera e seus olhos começaram a brilhar. De um salto desapareceu entre os matagais. Mas voltou em seguida. Sua cara estava arranhada e havia vários buracos grandes em sua capa.

— Você chama isto de coelhos? — exclamou mantendo frente a Anton duas gordas aranhas.

— Uaaah! — escapou ao Anton. Não podia suportar por nada do mundo às aranhas. Rapidamente deu a volta, pois não queria presenciar como o vampiro devorava as aranhas!

O vampiro então o agarrou pela manga.

— Acha que eu como aranhas? — exclamou as deixando cair ao chão com um gesto de repugnância. Pelo que se vê, vê muitos filmes maus de vampiros!

— Só pensava que... — murmurou Anton. Então teve uma idéia. Poderia ir por ti à farmácia!

— À farmácia? —perguntou o vampiro receoso—. E por quê?

— Ali têm com..., conservas de sangue — disse Anton.

Mas o vampiro parecia não querer ouvir nada disso.

— Puff! Conservas! — bufou o vampiro. Eu não como nada de latas!

— E como eu ia saber? — disse Anton ferido.

Nesse momento ouviram uns passos que se aproximavam do parque de recreio. A cara do Rüdiger tomou em seguida uma expressão de expectativa.

— Um ser humano — sussurrou. Seus dentes bateram excitados.

Anton ficou gelado. Rüdiger não se atreveria A...

— Nós íamos só a caçar Co..., coelhos! — balbuciou. E se você agora caçar outra coisa, então...

— Então o que? — grunhiu o vampiro.

—... então isso é traição!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

57

Page 58: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Os passos estavam agora a sua altura. O vampiro tinha posto a descoberto seus dentes bicudos como agulhas e olhava fixamente na escuridão dos matagais. Todo seu corpo tremia de excitação.

— Não! — suplicou Anton.

O vampiro o olhou espumando de raiva.

— Não se meta em meus assuntos! — zombou.

— Se fizer isso, disse Anton com voz tremente, já..., já não serei mais seu amigo!

Os passos se afastaram. Uma porta se abriu e fechou, e logo ficou tudo em silêncio. Com um grito, o vampiro deu uma palmada diante de sua cabeça.

— Uma ocasião assim! — lamentou-se. Uma ocasião única como esta!

Chiando os dentes, olhou para Anton.

— Você chama isto de ajudar? — exclamou. Morrerei de fome, morrerei de fome miseravelmente! Mas agora vou seguir procurando sozinho!

Decidido, alisou sua capa e deu meia volta para partir.

— E o que passa com o porão? — exclamou Anton, mas o vampiro já não respondeu. Anton o viu desaparecer entre os matagais.

Partiu triste para casa. Não tinha adiantado nada e agora já só ficava a quarta-feira!

— São possivelmente agora às seis e meia? — disse sua mãe quando ele abriu a porta de casa.

— Não — grunhiu. Na sala de estar já está passando o telejornal.

—E por que vem tão tarde?

— Eu..., estive brincando de esconde-esconde.

— Tanto tempo?

— Não. Mas meu esconderijo era tão bom que até agora ninguém me encontrou.

A desculpa não era má e contra sua vontade teve que sorrir ironicamente.

— Eu não acho graça! — disse a mãe de mau humor. Se isto ocorrer outra vez não volte de noite!

Tampouco queria fazê-lo, pensou Anton de caminho para seu quarto. Unicamente amanhã.

Vinte e Quatro

Febre de caça

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

58

Page 59: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

O relógio da torre da igreja deu oito e meia. Tiritando de frio, o pequeno vampiro saiu de entre os troncos das árvores depois dos quais tinha permanecido escondido desde fazia meia hora. Tinham passado por ali um par de pessoas, mas, por desgraça, não as apropriadas: ou foram em casal, o qual dificultava o ataque surpresa, ou cheiravam já de longe a alho.

Mas agora uma mulher só dobrou a esquina. Rapidamente, o vampiro se ocultou depois de uma coluna de anúncios. Sapateando, a mulher se aproximava; uma mulher alta e fornida, conforme tinha visto o vampiro, e de seguro nada anêmica! Já quase tinha alcançado a coluna de anúncios quando, de repente, ficou parada. Um terror gelado percorreu ao vampiro. Teria notado algo? Vigiava a rua com precaução: a mulher estava só a poucos metros de distância dele e lhe dava as costas. Seus loiros cabelos estavam sujeitos à nuca por um alfinete e seu casaco só tinha um pescoço estreito e ajustado, de modo que o vampiro podia ver seu pescoço branco e imaculado. Suspirou e, como se o arrastasse uma força magnética, encurvou os dedos e saiu de detrás da coluna.

Nesse momento a mulher gritou:

— Rudolf! — dando uma palmada.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

59

Page 60: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Um grande cão pastor dobrou correndo a esquina e o vampiro apenas conseguiram de um salto ficar a salvo na sebe. Ali permaneceu sentado enquanto o cão-pastor farejava os matagais, e, finalmente, como se o vampiro não tivesse sofrido já o suficiente, levantou a pata.

— Vêem, Rudolf! — disse a mulher. Agora vamos a casa.

O vampiro observou furioso enquanto se afastavam.

— Vá a merda! — praguejou tirando espinhos dos dedos. Embora seu estômago grunhisse penosamente, ele não se movia. A vida do vampiro era para morrer de risada, e não tinha nada do que se envergonhar de um par de lágrimas que lhe corriam pelo rosto!

— Olhe, ali alguém chorando! — ouviu dizer de repente a uma voz clara.

— Mas tem um aspecto ridículo — respondeu uma segunda voz.

— Sim, como um vampiro — disse a primeira voz rindo pela metade.

Ante ele havia dois meninos, cada um com um comprido fortificação na mão em cujo extremo iluminava um farol de cores. Surpreso, o vampiro levou as mãos ao rosto molhado.

— O que querem? — perguntou movendo suas pernas que estavam rígidas.

Os meninos começaram a rir.

— É de verdade? — perguntou o maior dos dois.

— Claro — grunhiu o vampiro.

Os meninos tinham no máximo oito anos... não era um bota de cano longo que merecesse muito a pena! Não obstante, era melhor que nada absolutamente...

— Vamos juntos correr com os faróis? — perguntou muito amigável de repente. Conheço um caminho completamente escuro no que seus faróis iluminarão muito melhor ainda!

— E onde? — perguntou o menino menor.

— Onde? — disse o vampiro ensinando seus espetos dentes. No cemitério, naturalmente.

— Isso, temos que perguntar antes a nossos pais — declarou o outro menino.

— Como é isso? — disse o vampiro. Sem os adultos é muito mais divertido!

— De todas as formas, já estão vindo, disse o menino e chiou com voz excitada: Mamãe, papai, venham! Aqui há algo muito divertido! Um autêntico... — mas antes que tivesse terminado de dizê-lo o vampiro tinha saído correndo dali.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

60

Page 61: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Sem voltar-se de novo, correu até o muro do cemitério, saltou por cima e se deixou cair na erva tomando fôlego. Aqui, ao menos, estava a salvo!

Quando o vampiro olhou a seu redor, sobreveio quase um sentimento de melancolia e, cheio de nostalgia, pensou nos belos tempos da cripta. Não muito afastado, reconheceu o abeto sob o qual se encontrava o buraco de entrada. Como gostaria de jogar uma olhada à cripta! Seguiriam estando os caixões nos lugares de antes? Ou se teriam estreitado depois de seu traslado? Dormiria agora Anna junto ao Lumpi?

Realmente nada podia acontecer se olhasse... a esta hora os vampiros estavam fora!

De repente, houve um rangido a seu lado e saltou dali uma figura em bata de trabalho de cujos bolsos apareciam estacas largas e bicudas. Era Geiermeier, o guardião do cemitério, que ia para ele com uma risada diabólica.

— Até que enfim apanhei você! — exclamou ao mesmo tempo em que agarrava uma estaca do bolso e levantava o martelo que levava a mão.

— Espera jovenzinho, disse, agora é sua vez!

Aproximava-se cada vez mais...

— Não! — gritou Anton. Não!

Quando abriu os olhos estava em sua casa. Tinha sonhado?

— Anton — ouviu a voz de sua mãe. O que ocorreu?

Acendeu a luz. Na beirada da cama estava sentada sua mãe.

— Você está mal? — perguntou.

— Não — murmurou ele. Só sonhei.

— Quer me contar isso.

Negou com a cabeça.

— Então, durma bem! — disse a mãe. Falaremos amanhã disso.

Vinte e Cinco

Carga pesada

Depois da comida no dia seguinte disse a mãe:

— Você tem tido sonhos horríveis ultimamente! Já acordei um par de vezes porque estava gritando dormido. E então grita nomes muito estranhos... Tia Dorothee e Lumpi o Forte e Elke a Infame...

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

61

Page 62: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Anton mordeu os lábios para não rir.

— De verdade? — disse como se não tivesse nem idéia.

— Sim — e enquanto o olhava com atenção, disse: Estou preocupada, Anton.

“Eu também”, tivesse preferido responder Anton..., mas isto, naturalmente, não podia ele admiti-lo. Por isso disse marcadamente despreocupado:

— Mas se isso é completamente normal, mamãe!

— Você acha? — disse ela duvidando. Ou seus pesadelos são fruto de suas excursões noturnas? — disse apreensiva de repente.

— O que..., o que quer dizer com isso? —gaguejou Anton. Saberia algo de seu vôo ao Vale da Amargura?

— Bem, disse ela, como pode, ocorre que você os últimos dias tem ficado fora até mais tarde que o habitual. Uma vez, inclusive, até as oito!

— Aconteceu assim — murmurou Anton.

— E o que fez fora realmente?

— O que fiz? Brinquei de esconde-esconde.

— Tenho que acreditar nisso?

Encolheu indiferente os ombros.

— E o que é o segredo do porão? — perguntou. Tem isso, possivelmente, algo que ver com seus pesadelos?

— Não! Isso seguro que não! — disse Anton rapidamente.

— Então vamos ao porão agora?

— A..., agora? — disse Anton assustado. E por quê?

— Porque quero procurar algo em uma revista.

— Não pode ser amanhã?

— Amanhã necessito o artigo para o colégio.

Anton refletiu.

— Eu poderia pegar a revista!

— Faria isso?

— Claro! — disse como se fosse o mais natural do mundo.

— Mas não sei em que revista está.

— N..., não? — disse Anton. Pois então te trarei todas!

— Seriamente? — a voz da mãe soou incrédula. Todo o montão?

— Bom, por que não? — disse. Quando?

— Melhor agora mesmo.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

62

Page 63: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Assim, dez minutos depois Anton descia no elevador. Mesmo que diante de sua mãe tivesse agido como se não se importasse, agora podia dar gritos de raiva! E tudo era culpa somente do pequeno vampiro!

Abriu a porta do quarto do porão e acendeu a luz. A tampa do ataúde estava fechada e debaixo dela ouviu-o roncar brandamente.

«Este se cuida bem!», pensou zangado. «Ao fim e ao cabo só tem a mim, fazendo tudo por ele!»

O que mais teria gostado de fazer era sacudir com força o vampiro e lhe gritar toda sua ira na cara!

Permaneceu de pé indeciso. Não deveria, pelo menos, observá-lo uma vez? Tinha lido que os vampiros dormem durante o dia como, mortos. Por conseguinte, o vampiro não poderia advertir absolutamente o que ocorria com ele.

Com precaução, agarrou a tampa do ataúde e a deslocou para um lado. Fizeram-se visíveis os ombros do vampiro, logo a cabeça. Anton estremeceu involuntariamente. Nunca tinha visto antes o vampiro tão lívido! Seus olhos estavam frágeis e fixos na fronte, sem olhar. Suas bochechas estavam afundadas, e só sua boca, ligeiramente aberta e com as manchas de sangue seca, indicava que não estava completamente morto.

— Rüdiger? — disse em voz baixa.

Nenhuma resposta.

— Rüdiger? — voltou a dizer.

O vampiro não se alterava. Só saía dele um forte aroma de mofo que quase cortava a respiração ao Anton.

— Br.! — disse voltando a fechar a tampa. Em comparação, os pés de Anton, até em seus piores dias, cheiravam a perfume de lírio dos vales!

Sem vontade, olhou a seu redor procurando as revistas. Ordenadamente amontoadas, estavam junto ao armário das ferramentas. Quantas poderiam ser? Cinqüenta? Sessenta? Cem? Agarrou as dez de cima. Pesavam mais do que tinha calculado.

Diante da porta do porão teve que as voltar para pôr no chão para fechar a porta. Depois voltou às levantar ofegando.

— As dez primeiras! — disse quando sua mãe lhe abriu a porta da casa.

— Ai, Anton! — riu. Está completamente vermelho do esforço! Não deveria te acompanhar?

Anton sacudiu vigorosamente a cabeça.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

63

Page 64: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Mas é como um treino — assegurou inquieto.

Depois de ter subido e descido seis vezes tinha levado para cima todas as revistas.

Esgotado, deixou-se cair em sua cama. Sentia seus braços como se tivesse estado uma hora levantando pesos e seus joelhos estavam brandos como o chiclete.

«A um bom amigo se conhece na necessidade», disse fazendo chiar os dentes. Este era o dito favorito da avó, do qual ele ria freqüentemente... esta vez vinha ao cabelo!

Para distrair-se de seu aborrecimento, agarrou da prateleira Gargalhadas da cripta. Mas logo que começou a ler uma página, dormiu.

Vinte e Seis

Um plano cheio de perigos

Quando Anton despertou havia um silêncio absoluto na casa. Olhou o relógio: quase seis! Isso significava que tinha dormido mais de três horas! E isso precisamente hoje quando cada minuto era tão importante!

De um salto levantou da cama e foi para a porta. As seis sua mãe estava na maioria das vezes na cozinha preparando o jantar. Mas hoje estava tudo em silêncio, não tilintava nenhuma louça, não soava o rádio..., teria ido?

Sem fazer ruído, Anton abriu a porta. Tampouco ouvia agora nada e, assim, foi andando nas pontas dos pés pelo corredor. Ali não havia ninguém. Só em cima da mesa da cozinha havia uma nota:

“Querido Anton”, leu, “fui ao escritório de papai. Ali há hoje uma pequena festa. Por favor, faça você mesmo o jantar e esteja de

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

64

Page 65: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

volta em casa o mais tarde às sete e meia. Telefonaremos às oito. Adeus. Mamãe.”

Rendido, Anton deixou cair a nota.

Tinha ocorrido um milagre! Seus pais estariam fora toda a noite e podia ficar na rua até que tivesse solucionado o assunto do Rüdiger! Deu um salto no ar de alegria. Uma estranha sensação no estômago lhe fez recordar que ainda tinha que comer algo. Cortou uma fatia de pão e a besuntou com muita manteiga. Além disso, comeu uma grande fatia de queijo.

Enquanto mastigava refletiu intensamente. Devia voltar a ver o Rüdiger no porão? Possivelmente agora deixasse que falasse com ele. Mas rapidamente rechaçou de novo esta possibilidade. Só precisou imaginar-se como Rüdiger estava sentado no caixão bocejando e lamentando-se de seu estômago vazio para convencer-se de que lhe devia ocorrer algo melhor!

E se tentasse encontrar a Anna? Ela, seguro, que compreenderia seus problemas e lhe ajudaria a encontrar uma solução!

Ao pensar na Anna, Anton se sentiu em seguida muito melhor. Seu plano tinha só um inconveniente: o único lugar no que estava seguro de encontrar a Anna era a cripta do cemitério! Deveria, portanto, estar à espreita perto da entrada e esperar que Anna saísse...

Estremecendo, pensou-nos outros vampiros que sairiam precisamente por esse buraco. Mas tinha que assumir esse risco!

E todo caso, penduraria no pescoço a corrente de sua mãe com o crucifixo de prata e esconderia um par de dentes de alho no bolso!

Olhou pela janela da cozinha: ainda havia claridade, mas logo começaria a escurecer, e então teria que estar no cemitério!

Tirou a corrente da caixa de jóias, agarrou quatro dentes de alho e se foi.

Vinte e Sete

A porta aberta

Ante a porta do edifício, Anton se encontrou com a senhora Puvogel. Levava na coleira o seu cão-salsicha, que começou a ladrar intensamente. A senhora Puvogel pôs um rosto azedo e, sem responder à saudação do Anton, passou rápido ao seu lado.

— Antes seu cão era mais cortês! — gritou para ela.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

65

Page 66: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Por resposta, o cão-salsicha uivou ainda mais forte e a senhora Puvogel, com um olhar temeroso para janela dos vizinhos, arrastou-o rapidamente até a entrada da casa.

«O mundo está realmente cheio de vampiros», pensou Anton, «e os autênticos vampiros não são, não, os piores!»

Por sorte, a senhora Puvogel foi a única pessoa conhecida que encontrou e, assim, chegou ao cemitério sem ser incomodado.

O cemitério estava ali, em silêncio e abandonado. Não se via ninguém e Anton, tranqüilizado, desceu pelo caminho principal.

Ali as sebes estavam podadas e as tumbas cuidadas..., justamente o contrário à parte traseira do cemitério aonde se encontrava a cripta dos vampiros. Sobre uma tumba recente ao bordo do caminho se empilhavam flores e Ramos, e leu a inscrição: «Alfred..., permanece entre nós!» Anton riu ironicamente. Tratar-se-ia no caso do Alfred também de um vampiro?

Subitamente sua risada silenciou ao olhar para a capela que havia ao final do caminho: a grande porta forjada em ferro estava aberta! Rígido de susto, Anton ficou parado. Notou como seu coração pulsava com maior rapidez e involuntariamente jogou mão a cruz no pescoço. Quem ou o que poderia encontrar-se na capela? Enquanto refletia ainda se devia dar a volta ou seguir adiante, saiu um homem, fechou a porta e a trancou com um grande cadeado.

Geiermeier, o guardião do cemitério! Penou Anton. O comprido rosto, o grande nariz e a bata de trabalho, da que realmente saíam estacas de madeira, só podiam pertencer ao Geiermeier. Seguro que sabia certamente que os vampiros só morrem se uma estaca lhes atravesse o coração.

Agora Geiermeier tinha vislumbrado Anton. Sua cara tomou uma expressão desastrosa e com passo lento foi para ele. Era como um sonho e Anton notou como lhe vinha o suor à frente.

Em seguida levantaria Geiermeier o martelo...

Mas, em lugar disso, olhou-o desanimado com seus olinhos de porco e perguntou com voz rouca:

— O que quer você? — seu fôlego cheirava tão forte a alho que Anton conteve a respiração.

— Eu só..., só ia — gaguejou. E enquanto retrocedia um par de passos: De todos os modos, queria partir em seguida para casa!

— Ah! Sim? — disse o guardião do cemitério; podia-se observar claramente que não acreditava em só palavra de Anton. Entretanto, foste na direção errada.

Tirou uma estaca do bolso e, perdido em seus pensamentos, passou o polegar pela ponta. Em Anton correu um calafrio pelas costas.

— Ah..., agora quero ir a casa — gaguejou; deu a volta e saiu correndo dali pelo caminho principal até a porta de entrada.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

66

Page 67: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Só ali se atreveu a voltar-se. Geiermeier o seguia, mas não parecia ter muita pressa. Na mão tinha um molho de chaves com o que — assim o supunha Anton — ia fechar ao portão.

Rapidamente, Anton fechou atrás de si o portão e se apoiou tomando fôlego contra o muro do cemitério, que ali na entrada era liso e branco. Um abeto o protegia dos olhares do Geiermeier e assim pôde descansar e refletir um par de minutos. Começava já a escurecer... Já era hora para ele estar na cripta!

E com Geiermeier lhe fechando o caminho pelo cemitério, só havia uma possibilidade: tinha que subir pelo muro traseiro! «Não é uma perspectiva muito agradável», pensou Anton, pois esse caminho era o que os vampiros tomavam quando iam caçar. E no caso de se encontrar com um vampiro antes de haver se escondido atrás de uma lápide que estivesse perto... Mas agora não havia mesmo o que fazer e, deste modo, correu até alcançar a parte cinza e desmoronada do muro. Olhou com atenção para todos os lados e como não observou nada suspeito subiu em um saliência do muro e saltou por cima.

Vinte e Oito

Os vampiros vêm

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

67

Page 68: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Esse rincão do cemitério sempre tinha infundido horror a Anton: a erva crescia ali quase até a altura do joelho e as lápides destruídas e as cruzes torcidas davam ao lugar um aspecto fantasmagórico. Hoje se sentia mais fraco que das outras vezes e com olhadas cheias de medo dirigia seu olhar para o alto abeto sob o qual se achava o buraco de entrada à cripta. Não se tinha movido ali algo? A boca do Anton ficou de repente completamente seca e ele se abaixou rapidamente atrás da lápide seguinte. Seu coração pulsava tão forte que pensava que podia ser ouvido até do abeto, de cuja sombra surgia agora uma escura figura.

Era um pequeno e gorducho vampiro que olhou a sua redor lenta e minuciosamente antes de desdobrar os braços sob sua capa e pôr-se a voar. Anton suspirou aliviado, já que o vampiro tinha olhado cuidadosamente em sua direção um par de vezes!

Então apareceu uma segunda figura: um vampiro grande e fornido que se elevou em seguida no ar. Lumpi o Forte?

Agora havia um sapateio na pedra sobre o buraco de entrada. Anton conteve a respiração. Um pequeno e enxuto vampiro, apoiado em uma fortificação, saiu coxeando da escuridão do abeto com muito esforço. Anton o ouviu gemer em voz baixa. Então, o vampiro guardou a fortificação sob a capa e empreendeu o vôo. Quem poderia ser esse? Elizabeth a Gulosa? Sabine a Horrível?

Novamente se moveram os ramos do abeto e surgiu uma figura. Permaneceu de pé e aspirou o ar, examinando. Anton notou como seu coração dava um salto e pulsava depois como enfurecido. A figura olhava para ele! Sim, já não havia nenhuma dúvida de que o tinha percebido, pois agora se aproximava com passo lento... Era Tia Dorothee! Anton estava como paralisado de terror.

Tremendo todo seu corpo, viu-a frente, a ele sem poder mover nem sequer um dedo. Ela estava já tão perto que pôde ver sua grande boca.

— Não! —gritou cheio de espanto.

— Por que não? — ouviu a voz de Tia Dorothee. Só dói no início. Depois é formoso!

Ela estendeu as mãos para ele e Anton cheirou seu frio fôlego de tumba.

— Não! —gritou uma vez mais.

— Fica quieto! — disse Tia Dorothee. Se não, vou morder a um lado e terá uma horrível cicatriz.

Anton sentiu que ia se deprimir em seguida quando, de repente, a pedra fez um ruído e uma voz clara e familiar exclamou:

— Tia Dorothee! O que faz aí?

Tia Dorothee ficou parada.

— Sim, o que acontece? — disse surpreendida.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

68

Page 69: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Anton abriu os olhos e reconheceu a Anna. Uma agradável surpresa lhe sobressaltou... Acaso não estava tudo perdido.

— Tia Dorothee, tem que lá embaixo! — ouviu Anna dizer.

— Abaixo? — a voz de Tia Dorothee revelava desconfiança. E por quê?

— Vais ser recompensada!

— Recompensada? — disse adulada Tia Dorothee. Porque descobri Rüdiger?

—Sim! —respondeu Anna. Mas ande pressa!

— E este aqui? — perguntou Tia Dorothee lançando um olhar voraz para Anton.

— Desse cuido eu enquanto isso — declarou Anna.

— Sim, então... — disse Tia Dorothee, olhou ávida ao pescoço do Anton e voltou para buraco de entrada. Mas não o toque! — gritou dali. Sem nenhum fundamento, pois, depois de tudo, Anna só bebia leite!

Quando ela desapareceu, Anna agarrou ao Anton do braço.

— Vêem, temos que ir! — disse.

— E Tia Dor..., Dorothee? — gaguejou Anton que ainda estava totalmente sobressaltado.

— Sim, por isso! — exclamou Anna. Ela voltará em seguida e se você ainda estiver aqui...

Não seguiu falando, mas sim atirou Anton atrás de si para o muro do cemitério. Que a seguia sem vontade. Sua cabeça retumbava e até agora acreditava sentir ainda o olhar de Tia Dorothee com a que lhe tinha deixado débil e sem capacidade de resistência.

— Não podemos perder tempo — disse Anna uma vez que tinham subido pelo muro do cemitério. Tia Dorothee pode voar e nós só temos uma capa.

— A..., aonde vamos então? — perguntou Anton.

— O mais longe possível — respondeu Anna. Até que Tia Dorothee tenha perdido a vontade de nos perseguir!

Vinte e Nove

Fugindo

— E se nos escondemos? — perguntou Anton.

— Onde? — disse Anna.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

69

Page 70: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Em minha casa.

Anna negou com a cabeça.

— Tia Dorothee sabe onde vive.

— E no colégio?

— Em seu colégio? — Anna parou e olhou a seu redor. Com especial atenção, observou o céu. E aonde nos vamos nos esconder ali?

— Em minha classe.

— É que não está fechado o colégio?

Anton não pôde menos que rir ironicamente.

— Sim, disse, mas a chave de minha casa abre a fechadura.

— Seriamente? — Anna riu. Eu sempre quis ver um colégio por dentro — acrescentou. Vamos, pois!

Pouco depois estavam diante do colégio do Anton. Na pequena construção anexa, em que vivia o porteiro, havia luz. Todo o resto estava às escuras.

— Eu irei à frente — sussurrou Anton.

Passou por cima da cerca de madeira e Anna o seguiu. Passaram pelo pátio do colégio que, na escuridão, parecia quase lúgubre, e chegaram a um edifício plano. Anton tirou um chaveiro do bolso enquanto Anna procurava com a vista Tia Dorothee.

— Vê-a? — perguntou angustiado Anton.

— Não sei — respondeu Anna. Aí detrás voa algo, mas não sei se é Tia Dorothee...

Agora Anton tinha encontrado a chave correta e tinha aberto. Rapidamente se introduziram às escondidas no vestíbulo e fecharam a porta atrás de si. Então permaneceram quietos escutando atentamente.

— Ouve algo? — perguntou Anton.

— Sim — disse Anna em voz baixa. Alguém ronda aí fora.

Anton não via nada, mas lhe pôs nervoso.

— Tia Do..., Dorothee? — gaguejou.

— Possivelmente...

Transcorreram alguns minutos que para Anton pareceram uma eternidade. Então disse Anna:

— Partiu.

— Era Tia Dorothee? — perguntou Anton.

— Sim — disse Anna. Não ouviste seu chiar de dentes?

Com a idéia de que Tia Dorothee tinha estado precisamente só a poucos metros dele, a Anton lhe puseram os cabelos em pé.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

70

Page 71: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Você acha que se deu conta de que estamos aqui? — perguntou.

— Seguro que não — o tranqüilizou Anna. Se não, não teria continuado seu vôo.

Ao Anton lhe tirou um peso de cima. Ao fim tinha desaparecido Tia Dorothee e podia falar tranqüilo com a Anna sobre o Rüdiger.

Trinta

Na classe do Anton

Mas Anna parecia interessar-se no momento em coisas completamente diferentes.

— Qual é sua classe? — perguntou agitada. A da esquerda ou a da direita?

— A da esquerda — grunhiu Anton.

Ela começava a abrir a porta da classe.

— Vêem, Anton! — exclamou.

— Anna — começou ele — tenho que falar contigo...

— Sim, sim, disse ela levianamente, depois. Agora tenho muita curiosidade.

Ao resplendor da luz da lua correu pela habitação contando as cadeiras.

— Trinta e cinco! — exclamou ela. Que sociável!

— Sociável? — surpreendeu-se Anton. Parece-te bem que se possa intervir uma só vez em cada classe?

— Claro! — disse Anna. Então pode dormir o resto da classe sem que ninguém se dê conta.

— E nos exercícios escritos lhe põem um zero — repôs Anton.

Anna ficou parada ante a mesa do professor.

— A quem pertence esta gigantesca mesa? — perguntou.

— A minha professora — respondeu Anton, para quem a visita durava já muito.

— Vá — disse reflexiva Anna. Para que os meninos se assustem mais com ela, não é certo?

Encurvou-se e olhou nas gavetas.

— Mas se aqui não há nenhuma palmatória! — exclamou decepcionada.

— As palmatórias já não estão permitidas — esclareceu Anton.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

71

Page 72: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Não? — exclamou surpreendida Anna. Mas Lumpi conta sempre que...

— Hoje existem métodos muito melhores — disse Anton.

Anna pensou e exclamou depois:

— Porretes?

— Notas — respondeu Anton.

— Notas? — Anna pôs cara de perplexidade. E como funciona isso?

— Muito singelo — disse Anton. No colégio lhe põem notas por tudo. Se tiver boas notas pode ir, como dizem sempre meus pais, a um colégio «superior» e aprender depois um bom ofício e ganhar muito dinheiro. Em todo caso, se tiver más notas...

— Mas isso é injusto! — exclamou Anna. Se a gente não pode estudar assim...

— Precisamente — disse Anton.

— E que notas tem você? — perguntou Anna.

— Regulares.

— Não poderá depois ir a um colégio «superior»?

— Já veremos — disse Anton. Também teria que ter vontades disso.

Anna olhou pela janela sumida em seus pensamentos.

— Então o colégio não é tão estupendo como eu pensava — disse. De repente lhe ocorreu algo: Onde está seu lugar?

— Aqui — disse Anton assinalando uma mesa da penúltima fila.

— E quem se senta a seu lado? — perguntou Anna. Não será..., uma garota?

Anton teve que rir.

— Um menino — disse.

Anna respirou aliviada.

— Mas sente-se em sua cadeira! — pediu ela.

— E por quê? — perguntou Anton enquanto se sentava.

— Porque eu gostaria de me sentar a seu lado — sorriu. Agora é como se fôssemos companheiros de classe — disse exaltada ao tomar assento junto ao Anton. Então te veria todas as manhãs no colégio, poderíamos ir juntos pelo pátio e fazer pela tarde os deveres...

Ao dizer as últimas palavras sua voz tinha divulgado de repente triste e agora se passava a mão pelos olhos.

— Ai, Anton! — suspirou olhando-o com olhos grandes e brilhantes.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

72

Page 73: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Anton voltou rapidamente a cabeça.

— Podemos falar agora sobre o Rüdiger? — disse timidamente.

— Sobre o Rüdiger? — exclamou ela. Eu te sou completamente indiferente!

— Não — disse rápido.

Não podia feri-la agora! Mas como ia encontrar as palavras apropriadas se Anna soluçava copiosamente e ele mesmo também se sentia muito estranho?

— Anna — disse titubeando. É só pelas lâminas de madeira.

— Pelas lâminas de madeira?

— Sim. Amanhã meu avô e meu pai vão pegar as lâminas de madeira do porão.

— Do porão? — perguntou Anna assustada. E Rüdiger? Como vai levar o caixão à cripta tão rapidamente? A proibição de cripta já foi levantada, mas...

— Levantada? — Anton acreditava não ter ouvido bem. A proibição de cripta está levantada de verdade?

Soltou um galo com a voz por causa da alegria.

— Sim, disse Anna, esta noite.

— Pois isso é... — ao Anton faltavam as palavras. Então pode retornar esta noite à cripta!

— E o caixão? — objetou Anna. É impossível que possa levá-lo ele sozinho. Além disso, seguro que agora saiu — acrescentou.

— Nós dois poderíamos levar o caixão! — exclamou Anton.

— E se Rüdiger voltar e seu caixão não estiver ali? — disse Anna.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

73

Page 74: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Pregaremos uma nota à janela do porão — disse Anton. E como Anna estava calada olhando pensativa pela janela: Por favor, Anna!

Olhou-o de soslaio e agora voltou a sorrir.

— Se você me pedir assim posso dizer que não!

Esteve a ponto de estender os braços e abraçá-la, mas lhe deu só amigavelmente tapinhas no ombro.

— É estupenda! — disse ele, sua voz soou rouca de repente.

— Você acha? — disse ela, e, apesar de que só os iluminava a luz da lua, pôde, entretanto, reconhecer como seu rosto ficava muito vermelho. Por certo, disse ela levantando o nariz para examinar, há algo em sua classe que me arrepia!

— Sim? —disse Anton. O não tinha notado nada além do ligeiro aroma de mofo da Anna.

— Sim — disse ela torcendo a boca. Um fedor absolutamente repugnante A... alho!

— A alho? — murmurou Anton.

Então se lembrou dos dentes de alho que se guardou. Inseguro, jogou mão ao bolso e os tirou, fazendo gritar a Anna:

— Não! Quer me assassinar?

— P... perdoa! — gaguejou Anton. Não pensava que...

— Não conhece o velho dito dos vampiros: «Vapor de alho, cólica gástrica»? —exclamou Anna que tinha retrocedido até a mesa do professor. Rápido, atira-os fora!

Anton abriu a janela e os atirou ao pátio.

— Eram contra Tia Do... Dorothee — esclareceu.

— Você acha que teriam servido de algo? — disse Anna. Ao contrário. Só teriam posto a Tia Dorothee ainda mais furiosa.

Anton estremeceu.

— E a cruz? —perguntou assinalando a cadeia do pescoço.

Anna negou:

— Nada mais que superstição. Em realidade só ajuda uma coisa.

— O que? — perguntou Anton com interesse.

— Ser a gente mesmo vampiro — disse Anna rindo de si mesma.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

74

Page 75: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Trinta e Um

Apuros

Durante o caminho de volta Anton perguntou:

—E a proibição de cripta foi realmente levantada?

Ainda lhe seguia parecendo um milagre.

— A princípio iriam prolongar mais quatro semanas — esclareceu Anna. Sobre tudo minha avó, Sabine a Horrível, sustentava isso... como prevenção para nós, outros meninos vampiros, dizia. Mas, depois de lhes contar fazia dias que Rüdiger não tinha comido nada como é devido e que vagava melancólico pelo lugar, eles temeram que pudesse, devido à confusão, tender-se ao sol e ir-se extinguindo, e lhe permitiram retornar à cripta.

— Você crê que tivesse feito isso? — perguntou perturbado Anton. Pensou na pinta tão débil e doentia que tinha o pequeno vampiro durante as visitas ao porão... Não teria tomado o suficientemente a sério suas dificuldades?

Mas Anna só riu.

— Não se preocupe! — disse. Tinha que exagerar algo.

Com secreta admiração, Anton a olhou de soslaio.

Se não tivesse ele a Anna...! Mas não estava ela tão em perigo como Rüdiger?

— E se eles lhe... quero dizer, você também tem trato com seres humanos — disse.

— Ora! — disse despreocupada Anna. Não me descobrem — e enquanto tomava o braço do Anton sorriu. Mas é amável por sua parte que se preocupe por mim.

Anton tossiu ruborizado. Anna sempre tinha que expressar seus sentimentos tão cruamente! Com precaução, retirou seu braço e disse:

— Em... em seguida chegamos.

— Estão seus pais em casa? —quis saber Anna.

— Não — disse Anton. E antes das dez seguro que não voltam... Mas irão chamar às oito! — lembrou-se.

Assustado, olhou seu relógio de pulso: já eram oito e dez!

— Então tenho que subir rapidamente! — exclamou. Quer me acompanhar?

—Se puder... — disse Anna sorrindo.

Apenas tinham fechado a porta de casa atrás deles quando soou o telefone. A mãe de Anton estava ao aparelho.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

75

Page 76: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Olá, mamãe! — disse esforçando-se a falar como sempre apesar de que seu coração pulsava fortemente. Que onde estava eu às oito?

Olhou para a Anna que se estava penteando ante o espelho do vestíbulo. É que tinha que estar precisamente ali onde podia escutar cada palavra? E além nas histórias que ele conhecia os vampiros não se refletiam absolutamente no espelho!

— Estava no... banho — disse.

Anna se pôs a rir.

— Que se estou sozinho... ? Naturalmente, mamãe! Que... quem acaba de rir? Era no rádio.

Fez a Anna um sinal com a mão para que fosse para a sala de estar, mas ela permaneceu imperturbável e continuou penteando-se.

— O que é o que vou fazer agora? Vou para cama — disse.

Trinta e Dois

Anna voltou a rir.

— Não, gritou Anton ao telefone, aqui não há ninguém. Isso é um programa de piadas da rádio. Se já me lavei? Sim! Boa noite, mamãe!

Pendurou e tomou fôlego.

— Quase descobre — disse reprovando Anna.

— O que podia fazer se deu vontade de rir? — defendeu-se ela.

Deixou a escova e se voltou para ele.

— Estou bonita?

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

76

Page 77: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Sss... sim— disse.

— Vai então agora... para cama? — perguntou.

— Não — grunhiu Anton.

— Lástima — disse ela. Eu teria gostado de provar como se está em sua cama.

Ao dizer isto o olhou desejosa. Anton notou como lhe subiam as cores à cara.

— De... deveríamos agora recolher o caixão — gaguejou.

— Já? — disse decepcionada. Se seus pais não vêm até as dez...

— Por... possivelmente venham antes.

— Está bem — sua voz soou ofendida. Se você o diz.

Anton tragou saliva. Havia tornado a fazer algo errado?

— Eu... tenho um livro para você — disse rapidamente para ficar de bem com ela.

— Para mim?

— Sim.

Foi ao seu quarto e recolheu Gargalhadas da cripta. Com um olhar afligido observou o livro que só tinha lido até a metade e o deu.

— Obrigado! — alegrou-se ela guardando-o sob sua capa. Era de verdade para mim?

— Sim — murmurou ele.

— Então recolhamos agora o caixão! — disse.

— Anna — disse enquanto desciam no elevador.

— Sim?

— É verdade que os vampiros não se refletem nos espelhos?

Ela baixou a cabeça envergonhada.

— Tão mal me penteei?

— Não, não, assegurou rapidamente Anton, só me interessava.

— Os vampiros são discriminados em todas as partes — disse queixosa. Não é só por dormirmos em caixões infectados de vermes e tenhamos que ter mofadas capas! Além disso, não podemos olhar no espelho quando queremos nos embelezar!

Anton assentiu com o pensamento, pois quando se imaginava como estaria ela com calças jeans e pulôver, o cabelo penteado e uma tez sã... Notou como seu coração pulsava mais rapidamente e se alegrou quando parou o elevador e puderam sair.

— Mas você gosta de mim assim...? — perguntou ela timidamente.

— Clã... claro — disse Anton.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

77

Page 78: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Era bom que a iluminação sobre a escada do porão fora tão escura! Se não, ela teria visto como ficava vermelho.

Anton abriu a porta que dava ao corredor do porão e apertou o interruptor da luz. O aroma de mofo estava ainda maior e teve que rir ironicamente ao pensar na senhora Puvogel com seu sensível olfato. Logo poderia respirar profundamente!

— Este é nosso quarto — disse sussurrando apesar de que não se via ninguém.

— Cheira-se — Anna de riu si mesma.

Anton abriu e entraram. Nada tinha trocado: as fitas de madeira apoiados na parede, o caixão do Rüdiger detrás com sua tampa arremessada a um lado.

— Não é muito acolhedor — disse Anna.

— Não? —disse Anton.

— E tão solitário. O pobre Rüdiger!

— Como diz? — exclamou indignado Anton.

Tinha agüentado um montão de moléstias para que o pequeno vampiro tivesse um lugar onde refugiar-se e quão único tinha que dizer Anna era «o pobre Rüdiger!»

— É queria que eu tivesse colocado um tapete vermelho, ou o que? — disse zangado.

Anna riu.

— Não. Mas, sabe? Para um vampiro como Rüdiger que sempre jazeu... né... vivido... em comunidade...

— Possivelmente tivesse devido me tombar a seu lado — disse sarcástico Anton. Tinha arrancado um pedaço de um cartão e escreveu a lápis nela uma nota para o Rüdiger:

“Querido Rüdiger:

levantaram a proibição de cripta. Levamos de novo seu caixão à cripta.

"Anton.”

Depois colocou a nota entre a grade de arame e a folha de cristal da janela do porão e a fechou por dentro.

— Está ofendido? — perguntou Anna.

Só grunhiu.

— Anton — disse ela doce. Só queria dizer que eu... Ou seja, que eu no lugar do Rüdiger tivesse preferido dormir em sua casa!

Anton não deu nenhuma resposta, mas sim começou a recolher as fitas de madeira.

— Quer que te ajude? — perguntou Anna.

— Se pudesse agarrar comigo a tampa do caixão...

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

78

Page 79: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Juntos levantaram a tampa. Pesava tanto que os ombros de Anton doíam. Olhou preocupado para Anna. Como ia conseguir levar o caixão e a tampa até a cripta com a Anna, que era uma cabeça e pouco mais baixa que ele?

Mas Anna sorriu cheia de confiança como se pudesse ler seus pensamentos.

— Eu sou forte — assegurou. Mais forte que Rüdiger.

— Seriamente? — disse incrédulo Anton.

Como demonstração, ela pôs o caixão no meio.

— Vê-o?

— É verdade! — surpreendeu-se Anton. Isso eu não esperava.

— Não é certo? — disse ela orgulhosa.

Ela ia aos pés do caixão e Anton agarrava pela cabeça. Com cuidado, levaram-no até a porta do porão.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

79

Page 80: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Trinta e Três

Três sobre um caixão

Não havia ninguém, e, assim, colocaram o caixão junto à porta e Anton voltou a jogar o ferrolho. De repente lhe fez um nó no estômago: se precisamente agora viesse alguém ao porão... Ou se de caminho se encontravam com alguém...

Anna interrompeu as reflexões dele ao levantar o caixão.

— Vêem! — sussurrou.

Sem acender a luz, percorreram o corredor do porão e subiram as escadas até a porta do edifício. Quando tudo esteve em silêncio levaram o caixão para fora e o colocaram na sombra dos matagais.

— Por! — disse Anton esfregando suas mãos doloridas.

— Já está esgotado? — riu Anna, a quem não lhe notava absolutamente o esforço.

— Nnn..., não, disse, nem um pingo.

Diante da Anna não fraquejaria!

— Pois vamos! — disse ela agarrando de novo.

Escolheram o escuro caminho por cima do pátio de recreio e chegaram à rua sem ter encontrado ninguém. Quase todos os carros estavam nos estacionamentos e não havia nenhuma pessoa nas proximidades.

— Estão sentados diante da televisão — esclareceu Anton.

— Já sei — respondeu Anna. Enquanto dura a programação de noite é inútil para os vampiros sair a caça.

— E o que fazem nesse tempo? — quis saber Anton.

Anna riu para seus próprios.

— Voam ao redor das casas procurando uma entrada!

— Br.! — disse Anton agarrando o pescoço. Quantas vezes ficava a janela aberta em sua casa! E quando pensava em Tia Dorothee...

— Vamos? — perguntou Anna.

Voltaram a levantar o caixão e o levavam pelo caminho quando de repente apareceu em frente uma figura. Era um homem que levava um passo singular e cambaleante. Olhou curioso para eles.

— Conhece esse? —perguntou Anna.

Anton negou com a cabeça.

— Esse está bêbado — disse.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

80

Page 81: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Lentamente, com passos vacilantes, o homem cruzou a rua e foi para eles. Anton notou como lhe tremiam as pernas. Deviam sair correndo e deixar o caixão? Mas o que ocorreria então com ele? Anna parecia ter pensado o mesmo, pois sussurrou:

— Sentamo-nos simplesmente em cima! Assim não o verá!

Saltou sobre o caixão e estendeu sua capa enquanto Anton se sentava junto a ela.

O homem estava agora tão perto que Anton podia cheirar o vapor a cerveja que despedia. Anna voltou para um lado a cabeça e espirrou.

— O que, meninos, estão descansando? — disse. Dêem lugar ao tio!

Anna e Anton intercambiaram um olhar de susto.

— Ou acaso isto não é um banco?

Inclinou-se para examinar o caixão, mas perdeu o equilíbrio e caiu contra a madeira.

— Se não tivesse bebido tanto diria que isto é um caixão — murmurou olhando a Anna e Anton com olhos injetados em vermelho. Isto é um banco ou não? — balbuciou.

— Um Ba... banco — disse Anton.

— Pois então!

Sentou-se pesadamente e tirou uma garrafa de cerveja do bolso.

— Saúde! — disse, e bebeu. Depois secou a boca da garrafa com o polegar e a estendeu para Anna. Toma! Bebe!

— Não, obrigado! — disse Anna.

— E você? — disse com brutalidade ao Anton. Espero que você não seja tão melindroso.

— Sss... sim — gaguejou Anton. Não... eu não gosto da cerveja.

— O que...? Você não gosta da cerveja? — surpreendeu-se o homem. Levou de novo a garrafa à boca e bebeu. Vá uma coisa. Quando eu tinha sua idade... Mas, sim fumará? —disse oferecendo cigarros ao Anton.

Anton os desprezou com a mão.

— Tampouco? — O homem pôs uma cara de incompreensão. Então, como quer aprender se não começar logo?

— É que eu não quero aprender — disse Anton.

O homem tinha terminado de beber sua garrafa de cerveja e a jogou nos matagais. Agora acendia um cigarro com dedos trementes. Quando conseguiu, jogou-se prazenteiramente para trás..., e caiu de costas com um forte estrépito. Pareceu tão ridículo que Anna pôs-se a rir.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

81

Page 82: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Psst! — zombou Anton. Aos bêbados não podemos irritar! O melhor será que desapareçamos antes que se levante!

Agarraram o caixão e saíram correndo.

— Né, fica quietos! — gritou o homem. Enganastes-me! Isso não era nenhum banco! Os pesos têm respaldo!

Ainda viram como se levantava com dificuldade e dava um par de tombos em direção a eles, mas já estavam tão longe que ele não lhes podia seguir.

Trinta e Quatro

Sensações variadas

—Você também beberá cerveja quando for maior? — perguntou Anna.

— Certo que não! — respondeu Anton.

— E por que bebe tanto esse homem?

— por quê? — Como podia explicá-lo? Possivelmente tem problemas e quer esquecê-los...

— Ah, já! — disse Anna.

Por fim apareceu o muro do cemitério. Anton respirou aliviado. Suas mãos estavam já quase insensíveis e lhe doía as costas. Anna, pelo contrário, levava, o caixão como se o fizesse todas as noites.

— Pode seguir? — perguntou voltando-se para ele com um amável sorriso.

— Sss... sim — murmurou.

— Já não está longe — disse. Ali diante podemos subir o caixão pelo muro.

Meteu-se em um caminho estreito e Anton a seguiu... com sensações muito variadas. Os espessos matagais em ambos os lados do caminho eram um esconderijo perfeito... para Tia Dorothee, por exemplo...

Mas alcançaram sem contratempos o muro do cemitério. Descarregaram o caixão e Anna sussurrou:

— Eu subo em cima e você empurra o caixão para mim.

Ela já subia pelo muro, que era tão alto ali que Anton logo que podia roçar o bordo com os braços estirados.

— por que não usamos o muro traseiro? — perguntou em voz baixa. Aquele está muito mais baixo.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

82

Page 83: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Isso é muito perigoso — esclareceu Anna. Pensa no Geiermeier.

Desconcertado, Anton olhava alternadamente do caixão ao muro. Isso não o daria nunca!

— Empurra? — perguntou Anna.

Agarrou o caixão por debaixo e tentou subi-lo para cima.

— Não é possível — disse queixoso.

— Primeiro a tampa! — sussurrou Anna.

Anton agarrou a tampa e a empurrou para cima com todas suas forças.

— Tem-na? — exclamou.

— Não — disse Anna, mas então já era muito tarde: a tampa lhe escorreu das mãos e caiu ao outro lado com um forte rangido. Ressonou um grito afogado.

— Fe... feriste-te? — gaguejou Anton.

— Sim — chegou a resposta.

— Que... quer que te ajude?

—Não!

Enquanto ainda pensava o que devia fazer, Anna chegou subindo com muita dificuldade. Seu rosto estava cortado de lágrimas e tratava de estirar um pé.

— Está... quebrado? — perguntou assustado Anton.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

83

Page 84: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Não — grunhiu ela, e colérica agarrou a parte de abaixo do caixão e a colocou em cima do muro.

Anton a olhou desconcertado.

— Sujeita! — disse-lhe com brutalidade enquanto subia pelo muro.

— Empurro? — perguntou vacilante.

— Nem pensar! — exclamou, e rapidamente arrastou para si a pesada peça.

Anton ouviu como ela colocava a tampa em cima.

— Está zangada comigo? — perguntou.

— Sim — disse, e, com voz mais rouca, acrescentou: Torpe!

— Mas não fiz de propósito!

Ela não deu nenhuma resposta.

— Anna! Perdoa, por favor!

Tampouco agora respondia. Teria começado a andar ela sozinha com o caixão? Anton subiu a uma pedra e se levantou tanto que pôde olhar por cima do muro. Distinguiu vagamente a Anna levando o caixão através da alta erva. Coxeava e ele ouviu como gemia em voz baixa.

— Anna! — gritou. Não vá! Eu não queria te machucar!

Mas ela seguia andando simplesmente.

— Anna! — gritou de novo. Mas então já tinha desaparecido entre as árvores.

Anton se deixou deslizar pelo muro e ficou de pé indeciso. Então deu a volta e retornou correndo caminho a casa. Estranhamente... de repente já não pensava nos matagais nem nos possíveis perigos que podiam espreitar atrás deles. Seguia vendo continuamente a Anna ante si, como ia coxeando com o pesado caixão através da erva sem voltar uma só vez para ele. E, além disso, tinha uma estranha sensação no estômago como se tivesse comido uvas crespas e tivesse bebida água depois. Engasgou-se: acaso eram... penas de amor? Também era curioso que não sentisse alivio algum apesar de que por fim havia se livrado do caixão... Mas tinha se comportado como um elefante em uma loja de porcelanas e Anna agora estava indignada com ele o podia compreender bem!

Entrou na casa, subiu pelo elevador e abriu a porta. Ali não havia ninguém.

Caiu na cama como um tronco.

Espero que me perdoe! Pensou ainda, antes de dormir.

Trinta e Cinco

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

84

Page 85: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Tudo em vão

— Anton! — De longe chegava a voz de sua mãe. Anton, levante-se!

— Sim — grunhiu ele.

— Anton, são já sete e quinze!

Esfregou os olhos e piscou. A luz que tinha acendido sua mãe o cegava e ao voltar-se agora para um lado lhe doía todo o corpo.

— Ai! — lamentou-se.

— Está doente? — perguntou preocupada a mãe.

— Doente?

Isso era uma boa idéia! Além disso, realmente não se sentia muito bem. Fez uma careta de dor.

— Acredito que tenho gripe.

— Gripe? — disse sua mãe tocando sua testa. Mas não está quente.

— Dói-me tudo — lamentou.

— Então temos que tomar a temperatura! — explicou; foi ao quarto de banho e voltou com o termômetro. Aqui! E sem truques!

— Que truques? — perguntou ofendido Anton. Mas ela permaneceu sentada na beirada da cama olhando o relógio.

— Diga-me, você não tem posta nenhuma roupa de noite! — exclamou de repente.

— Nnn... não? — disse Anton fingindo surpresa e estirando a manta até o queixo.

— Não — disse ela assinalando a cadeira do escritório.

— Só te tiraste as calças e o pulôver. Além disso, como voltam a cheirar suas roupas?

Desconfiada, aproximou-se o pulôver do Anton ao nariz.

— Um... um pequeno fogo de acampamento — disse rapidamente Anton.

— Fogo de acampamento?

— Sim. Ontem de noite.

Não parecia estar convencida, mas agora tinham acontecido os cinco minutos e observou lhe examine o termômetro.

— 37,1. Não tem febre. A temperatura só está um pouco alta.

— Mas me sinto tão mal...

— E quem vai cuidar de ti se ficar em casa?

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

85

Page 86: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Papai está aqui. E o avô.

— Papai? — disse ela rindo. Já foi para o escritório faz muito tempo.

— Mas se hoje ia A... — disse Anton detendo-se confundido. Não..., não ia revestir com o avô a cozinha?

— Sim. Mas surgiu algo enquanto isso.

Anton notou como lhe subiam as lágrimas aos olhos e teve que morder a língua para não gritar.

Quase se mata para fazer desaparecer o caixão do porão... e então, quando finalmente o tinha conseguido, surgia algo para seu pai, simplesmente! Uma infâmia era isso; que sempre tivessem que carregar todo o peso sobre os ombros!

— Tão mau não será — disse sua mãe lhe acariciando a cabeça. Todos estamos alguma vez doentes.

«Se só fosse isso!», pensou, e soluçando se voltou para a parede.

— Te vou fazer um chá — disse sua mãe. Mas depois tenho que partir.

Ao ir-se ela, Anton ficou convexo na cama olhando fixamente a manta. Era um autêntico azarado! Por outra parte... ao menos o caixão já não estava ali e se seus pais voltassem a necessitar de algo do porão podiam recolhê-lo eles mesmos tranqüilamente!

Suspirou profundamente uma vez mais e depois se encolheu sob a manta. Pouco depois voltava a dormir.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

86

Page 87: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Trinta e Seis

O segredo se areja

Quando sua mãe retornou ao meio-dia Anton estava sentado na cama. Colocou-se um par de almofadas nas costas e estava lendo.

— Olá, mamãe! — sorriu.

— Mas se já tem muito melhor aspecto — disse.

— Bom... — disse timidamente.

Que só tinha estado, simplesmente, morto de cansaço, preferia que não descobrisse.

— O que é que há hoje? — quis saber. Depois das fadigas da noite passada tinha uma fome de lobo.

— Omelete de batatas — respondeu a mãe. Mas ainda devo antes recolher batatas do porão.

— Ah, vá! — disse, e lhe sobreveio uma sensação de profunda satisfação... A partir de hoje o porão lhe era indiferente! Mas notou que ela o olhava espectador.

— Não tem nada contra que vá ao porão? — perguntou.

—Não — disse. Por quê?

Ela riu.

— Quando queria ver as revistas do porão você não estava de acordo. É que seu segredo já não está ali?

— Meu segredo? — Contra sua vontade, Anton teve que rir ironicamente. Agora não ficava mais remedeio que esclarecer-se o a sua mãe. O vampiro partiu — disse.

— O... o que? — exclamou.

— O vampiro que estava vivendo no porão — respondeu Anton.

— Você com seus vampiros! — prorrompeu ela agitando a cabeça. Era tão ruim seu segredo que não me pode dizer a verdade?

— Não encontra você suficientemente mau um vampiro que recebeu uma proibição de cripta? — repôs.

— Vampiros, vampiros! — como sempre que saía este tema, sua voz ficava com um timbre nervoso. É que não pode te ocupar alguma vez com outras coisas?

— Sim — disse rindo ironicamente. A semana passada peguei na biblioteca um livro sobre lobisomens.

— Ora! — fez ela zangada saindo do quarto. Como era de esperar, não tinha acreditado em uma só palavra... melhor!

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

87

Page 88: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Ouviu-a fechar a porta de casa. Então houve um silêncio durante um momento até que girou a chave na fechadura. Imediatamente depois sua mãe estava em casa. Na mão sustentava uma cesta de batatas..., e a escova de dente do vampiro.

— O que é isto? — perguntou observando com evidente repugnância a escova, que só tinha acima e abaixo uma fila de cerdas rançosas.

— E... isso? — gaguejou Anton. Não o conheço. — Algumas vezes era melhor faltar com a verdade!

— Brrr! — disse sua mãe atirando-o ao cesto de papéis. Seguro que o colocou alguém pela porta! E lá embaixo está cheirando muito mal! — Tirou uma batata da cesta e a cheirou. Espero que não tenha passado para as batatas.

Com isso, foi à cozinha e Anton saltou rapidamente da cama e tirou a escova de dente de entre recortes de papel. Então o guardou sob seu travesseiro e se apoiou comodamente contra ele.

— Avisa-me quando a comida esteja preparada? — gritou.

Trinta e Sete

Agradecimento noturno

— Mas amanhã volta a ir ao colégio! — disse de noite sua mãe.

— Humm — fez Anton esperando que sua voz se ouvisse o bastante queixosa.

Naturalmente, a mãe não caiu.

— Se ainda estivesse realmente doente, estaria dormindo faz muito tempo — opinou.

— Ah, sim? — disse Anton olhando o relógio: quase oito!

Em realidade, estava completamente acordado... em definitivo, tinha dormido até meio-dia! Mas o mais seguro era ir para seu quarto e ficar ali lendo até que tivesse sono.

— Boa noite! — disse.

— Boa noite! — respondeu o pai do banheiro onde estava estendendo suas camisas.

— Durma bem! — disse a mãe.

Em seu quarto, Anton fechou as cortinas, colocou seu pijama e deitou na cama. Melancólico, pensou no livro sobre os lobisomens que tinha falado a sua mãe. Essa seria agora a leitura mais apropriada..., mas, por desgraça, estava no departamento de livros para adultos, que Anton não podia ainda fazer empréstimo. E

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

88

Page 89: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Gargalhadas da cripta o tinha dado a Anna. Por conseguinte, não ficava mais remedeio que voltar a ler um de seus livros! Acabava de agarrar da prateleira Vampiros... as doze histórias mais terríveis quando chamaram brandamente da janela. Um forte medo lhe percorreu: Seria... Tia Dorothee? Em definitiva, ela sabia onde vivia...

Nas pontas dos pés, foi à janela e esquadrinhou pela fresta das cortinas.

No beiral da janela estava sentado o pequeno vampiro sorrindo amigavelmente.

— Você? — disse surpreso.

Tivesse contado com todos os vampiros possíveis; com Tia Dorothee, com o Lumpi, com a Anna..., mas não com o Rüdiger! Depois de tudo, Rüdiger que acabava de passar uma proibição de cripta!

— Meus pais estão aqui! — advertiu enquanto abria a janela e entrava o vampiro.

— E o que fazem? — perguntou o vampiro olhando desconfiado à porta.

— Vêem a televisão. Telejornal.

— Ah, vá! — A cara do vampiro relaxou. Então estão ocupados.

— Não tem medo de que Tia Dorothee te pegue? — perguntou Anton.

— Sim — disse o vampiro. Mas eu venho pela Anna.

— Pela Anna? — Anton notou como ficava vermelho.

— Sim. Disse que eu devia te agradecer.

— Agradecer? — A cara de Anton ficou vermelha escuro. E por quê?

— Bom — disse timidamente o vampiro. Por quão hospitalar foste me acolhendo em seu porão...

— Ah, por isso! — disse Anton suspirando aliviado.

Durante um momento tinha acreditado que Rüdiger ia falar de seu desgosto com a Anna..., mas disso, felizmente, parecia não saber nada!

— Pois claro! — esclareceu com fanfarronice. Você em meu lugar teria feito o mesmo!

— Certamente! — assentiu veemente o vampiro. Você também pode vir sempre a minha casa... — Fez uma pausa e olhou pensativo ao Anton. Quando for um vampiro, quero dizer...

— O que? — exclamou horrorizado Anton. Vampiro? — Um calafrio lhe correu as costas e inclusive o sorriso do Rüdiger lhe pareceu ameaçador. Tragou saliva. Eu não quero absolutamente ser um vampiro — disse.

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

89

Page 90: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

— Não? — disse surpreso o vampiro. Tampouco por... Anna?

— Não — respondeu Anton, zangando-se por que sua voz soasse tão trêmula. Além disso, discutimos.

— Sei.

— Contou-lhe isso Anna?

— Sim. E devo te perguntar algo.

— A mim? — Em seguida voltou a ficar vermelho!

— Tenho que te perguntar se ainda está zangado com ela.

Anton quase tinha rido alto. Ele zangado com ela?

— Não! — exclamou sentindo-se de repente como redimido. Não estava absolutamente zangado com ela!

— Seriamente que não? — perguntou o vampiro.

— Não!

— Pois bem!

Com estas palavras, o vampiro se aproximou da janela e retirou as cortinas. Ali, no rincão mais exterior da janela, completamente envolta em sua capa, estava sentada Anna.

— Tudo em ordem, disse Rüdiger. Você pode entrar, mas sem barulho!

Escorregando, ela se levantou e pulou para o quarto.

— Olá, Anton! — Ela disse.

Fim...

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

90

Page 91: Angela Sommer Bodenburg - O pequeno Vampiro - 02 - A mudança do pequeno vampiro (Rev. RS & RTS)

Ângela Sommer-Bondeburg. A mudança do pequeno Vampiro. Série Pequeno Vampiro 02.

91