andré bologna de castro cardoso

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP André Bologna de Castro Cardoso Eficácia e dinamismo da política fiscal: uma discussão entre a visão de Keynes e da Equivalência Ricardiana Mestrado em Economia Política São Paulo, dezembro de 2018

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Page 1: André Bologna de Castro Cardoso

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

André Bologna de Castro Cardoso

Eficácia e dinamismo da política fiscal: uma discussão entre a visão de

Keynes e da Equivalência Ricardiana

Mestrado em Economia Política

São Paulo, dezembro de 2018

Page 2: André Bologna de Castro Cardoso

2

André Bologna de Castro Cardoso

Eficácia e dinamismo da política fiscal: uma discussão entre a visão de

Keynes e da Equivalência Ricardiana

Mestrado em Economia Política

Dissertação apresentada à banco examinadora

da Pontifícia Universidade Católica, como

exigência para a obtenção do título de MESTRE

em economia política, sob orientação do Prof.

Dr.Rubens Rogério Sawaya.

São Paulo, 2018

Page 3: André Bologna de Castro Cardoso

3

Ficha Catalográfica

Autorizo exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial

desta dissertação de mestrado por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos

Assinatura: ____________________________________________________

Data: / /

E-mail: [email protected]

Page 4: André Bologna de Castro Cardoso

4

André Bologna de Castro Cardoso

Eficácia e dinamismo da política fiscal: uma discussão entre a visão de

Keynes e da Equivalência Ricardiana

Dissertação apresentada à banco examinadora da

Pontifícia Universidade Católica, como exigência

para a obtenção do título de MESTRE em economia

política, sob orientação do Professor Dr.Rubens

Rogério Sawaya.

Aprovado em / /

Banca Examinadora

Prof.Dr. Rubens Rogério Sawaya – PUC-SP

____________________________________________________

Prof.Dr.Antonio Correa de Lacerda – PUC-SP

______________________________________________________________

Prof. Dra.Simone Silva de Deos - UNICAMP

Page 5: André Bologna de Castro Cardoso

5

Agradecimentos

Inicialmente, gostaria de agradecer ao meu orientador prof. Dr. Rubens Sawaya pelos

ensinamentos e pela condução da dissertação. Seus apontamentos e críticas, além do

notório saber sobre economia foram fundamentais para que essa dissertação pudesse ser

realizada.

Gostaria de agradecer aos prof.Dr. Antonio Correa de Lacerda e profa.Dr. Rosa Maria

Marques por terem participado da minha banca de qualificação, cujas críticas foram

extremamente positivas para o andamento dessa dissertação.

Agradeço à PUC-SP por todo o suporte e a todos os professores do Programa de

Economia Política, cujas aulas ajudaram na minha formação acadêmica.

Agradeço à família: minha irmã Aline, minha mãe Gláucia, e meu pai Eduardo, sem os

quais eu não teria chegado até aqui. Não há palavras para agradecer tamanho apoio e

carinho.

Por fim, agradeço à minha namorada Najara Muchon, cuja paciência, amor e apoio foram

fundamentais durante todo o mestrado e para realização desta dissertação.

Page 6: André Bologna de Castro Cardoso

6

Resumo

A política fiscal sempre foi fonte de controvérsia entre as diversas correntes do

pensamento econômico. Após a Grande Depressão de 1929, a política fiscal, influenciada

pelo pensamento de John Maynard Keynes, ganhou status preponderante na sustentação

da demanda agregada. Contudo, a partir dos anos 1970-1980, ela foi sendo considerada

ineficaz para influenciar a economia e foi se subordinando à política monetária. A crise

de 2008 trouxe importantes revisões na visão convencional sobre o papel da política.

Antes reduzida a mero instrumento secundário de política econômica, no atual debate

econômico, especialmente, com as limitações na política monetária, as ações fiscais

foram alçadas a maior protagonismo. O objetivo desse trabalho é discutir a eficácia e o

dinamismo da política fiscal sob dois prismas diferentes: o de Keynes e o da Equivalência

Ricardiana. A partir dessa leitura de Keynes sobre política fiscal busca-se realizar a crítica

da Equivalência Ricardiana tentando demonstrar que a política fiscal é um importante de

política econômica, pois ela possui dinamismos e seus efeitos são importantes para

economia como um todo.

Palavras-chaves: Política Fiscal; Macroeconomia; Keynes; Equivalência Ricardiana

Page 7: André Bologna de Castro Cardoso

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ABSTRACT

Fiscal policy has always been a source of controversy among the various currents of

economic thought. After the Great Depression of 1929, fiscal policy, influenced by the

thinking of John Maynard Keynes, gained preponderance status in sustaining aggregate

demand. However, from the 1970s onwards, it was considered ineffective to influence

the economy and was subordinated to monetary policy. The crisis of 2008 brought

important revisions in the conventional view on the role of politics. Before being reduced

to mere secondary instrument of economic policy, in the current economic debate,

especially with the limitations in the monetary policy, fiscal actions were elevated to

greater protagonism. The objective of this paper is to discuss the effectiveness and

dynamism of fiscal policy under two different prisms: Keynes vision and Ricardian

Equivalence. From this reading of Keynes on fiscal policy we try to make the Ricardian

Equivalence critique trying to demonstrate that fiscal policy is an important economic

policy, because it has dynamisms and its effects are important for the economy as a whole.

Keywords: Fiscal Policy; Macroeconomics; Keynes; Ricardian Equivalence

Page 8: André Bologna de Castro Cardoso

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Sumário Introdução ....................................................................................................................... 10

Capítulo 1 - Dinamismo e eficácia da política fiscal em Keynes ................................... 16

Introdução ................................................................................................................... 16

1.1. A problemática da demanda efetiva ................................................................. 19

1.2. Flutuação na demanda efetiva: determinantes do investimento ...................... 24

1.3. Economia Monetária da produção ................................................................... 28

1.4. Necessidade da política fiscal em Keynes ....................................................... 33

1.5 Política fiscal e a prevenção das flutuações da economia................................ 35

1.6. Investimento público e gastos correntes .......................................................... 41

1.7 Multiplicador fiscal .............................................................................................. 43

1.8 Dinamismo do gasto público ................................................................................ 49

1.9 Impostos e dívida pública ..................................................................................... 52

Conclusão ................................................................................................................... 60

Capítulo 2 – Equivalência Ricardiana e negação do papel da política fiscal ................. 63

Introdução ................................................................................................................... 63

2.1. Política fiscal não altera variáveis reais: Equivalência Ricardiana ..................... 63

2.2 Pressupostos e o Modelo de Equivalência Ricardiana ......................................... 68

2.3 Modelo de escolha Intertemporal ......................................................................... 78

2.4 Outras representações da Equivalência Ricardiana .............................................. 81

2.5 Implicações de política econômica ....................................................................... 85

2.6 Estudos empíricos sobre a validade da Equivalência Ricardiana ......................... 89

2.7 Equivalência Ricardiana no debate ortodoxo ....................................................... 92

Conclusão ................................................................................................................. 101

Capítulo 3 – Pensamento de Keynes e a Equivalência Ricardiana no debate pós-crise de

2008 .............................................................................................................................. 104

Introdução ................................................................................................................. 104

3.1 Volta do debate sobre política fiscal................................................................... 106

Page 9: André Bologna de Castro Cardoso

9

3.2 Equivalência Ricardiana nesse debate: financiamento e redução de impostos .. 109

3.3 Gasto público como remédio para sair da crise .................................................. 116

Conclusão ................................................................................................................. 126

Conclusão ..................................................................................................................... 129

Bibliografia ................................................................................................................... 137

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Introdução

A política fiscal, entendida como o manejo dos gastos públicos e da arrecadação pública,

é um instrumento de realização de política econômica que os Estados podem utilizar de

diversas formas e para diversos objetivos. Nesse sentido, dentro do pensamento

econômico há um intenso debate sobre qual o papel dessa ferramenta em termos de

impactar a economia tanto no curto prazo quanto no longo prazo.

Desde os anos 1930 até meados dos anos 1970, a política fiscal se tornara um dos

principais, senão o principal, instrumento de política econômica, utilizado pelos governos

para fomentar a economia, reduzindo o desemprego, elevando a renda e evitando que

novas crises econômicas surgissem. Esse maior papel da política fiscal veio com os

escritos do economista inglês John Maynard Keynes.

Dentro do pensamento deste autor, a política fiscal é um importante instrumento não só

para tirar economia da crise, como para evitar que novas venhas acontecer. Nesse sentido,

como veremos no decorrer dessa dissertação, ele advogava por um plano de longo prazo

voltado para o investimento público, cujo objetivo era fomentar o investimento privado e

criar estoque de capital em vistas de elevar a produtividade da economia. A política fiscal,

portanto, tem um impacto importante no cenário econômico.

A partir dessas e da experiência do pós-II Guerra Mundial, houve um consenso entre os

economistas de que o Estado deveria intervir na economia, seja pela política fiscal ou

monetária, com maior ênfase para a primeira, com o intuito de evitar novas crises tal como

a Grande Depressão ocorrida em 1929.

E de fato, mesmo em países como os Estados Unidos, em que sempre vigorou ideias de

não-interferência estatal, o Estado foi um importante ator no cenário econômico no

período que corresponde entre 1945-19701, cuja característica foi a relativa estabilidade

e elevado crescimento econômico. Seja por meio de redução de impostos para fomentar

consumo, seja por meio do gasto público, o ponto é que a política fiscal tinha um papel

preponderante nessa época.

1 Comumente, esse período é retratado na literatura econômica e histórico como “Anos Dourados”, em que

a economia mundial cresceu fortemente, devido à reconstrução do pós-guerra e de várias medidas de

estímulo econômico. Para uma análise detalhada ver Hobsbawn (1995, cap.9)

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Contudo, já no final dos anos 1960 e começo dos anos 1970, eclodiu o que se costuma

chamar de estaginflação, uma combinação de baixo crescimento e alta inflação,

comprometeu o período de euforia dos trinta anos anteriores. Esse momento foi uma

ruptura com o pensamento econômico corrente até então e novas ideias vieram à tona.

A chamada Escola Novo-Clássica2 argumentava que qualquer atuação indiscriminada das

políticas econômicas seria neutralizada pelos agentes, os quais se antecipariam a ela, de

modo a não surtirem nenhum efeito na economia. Estava aberto o espaço para as críticas

em torno da atuação do Estado no cenário econômico.

No que se refere à política fiscal, a principal ideia advinda do arcabouço Novo-Clássico,

foi a chamada Equivalência Ricardiana, segundo a qual o financiamento do déficit público

via endividamento público ou aumento de impostos são equivalentes, pois, qualquer

elevação da dívida pública é interpretada como maior peso de tributos no momento futuro.

Dessa forma, os agentes poupam hoje para arcar com obrigações tributárias no futuro,

consequentemente, a política fiscal é neutralizada pelos agentes.

Como será visto ao longo da discussão, ainda que os argumentos propostos pela

Equivalência Ricardiana não sejam aceitos em sua totalidade, alguns são base para noção

de austeridade fiscal e da não-utilização de políticas fiscais de cunho discricionário, pois

elas não são capazes de alterar a demanda agregada da economia, de modo que a política

fiscal se torna ineficaz. Rompe-se, assim, o papel virtuoso da política fiscal, tal como

defendido por Keynes.

A ideia de que a política fiscal é ineficiente como instrumento de política econômica se

mantém presente, principalmente, na visão de que a única tarefa que cabe ao Estado é

manter superávits fiscais, de modo a manter a dívida pública estável. Assim, a defesa do

orçamento equilibrado suplantou qualquer visão que desse um papel de maior destaque

para medidas fiscais que visassem estabilizar a economia e evitar novas crises.

Essa breve síntese sobre evolução do papel sobre a política fiscal3 mostra que a política

fiscal foi perdendo seu papel como importante instrumento de política econômica para

2 Escola Novo-Clássica é uma escola de pensamento econômico surgida nos anos 1970, em que se criticava

a adoção de políticas econômicas, visto que os agentes, por serem racionais, as neutralizariam. Desse modo,

as políticas econômicas deveriam estar submetidas a regras de conduta, caso contrário, não teriam impacto

nenhum na economia. Para maiores detalhes, ver Snowdown e Vane (2005, cap.5) 3 Um detalhamento mais completo sobre evolução do papel da política fiscal ver Lopreato (2013, cap.1)

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fomentar a demanda agregada da economia, afastando-se paulatinamente das ideias

originais de Keynes.

A crise de 2008 colocou em dúvida as ideias de Equivalência Ricardiana. Sendo a pior

que a Grande Depressão de 1929, voltou-se a discutir, tanto no plano teórico quanto

prático, o papel da política fiscal como forma de sair da crise. Assim, em um primeiro

momento, as ideias de Keynes parecem ter sido revisitadas. Com a política monetária

incapaz de sustentar a demanda agregada, por estar próxima a zero e não conseguir ser

reduzida mais, a política fiscal deixou seu papel de subordinação e se tornou protagonista

no debate.

Mesmo assim, com as ideias de Equivalência Ricardiana e de austeridade sendo deixadas

de lado em um primeiro momento, elas ainda continuam ressoando, principalmente, a

partir de 2010 e 2011. Países europeus periféricos, como Grécia, Portugal e Espanha,

viveram seu pior momento em meados de 2011, sendo que a recomendação tanto da

União Europeia quanto do Fundo Monetário Internacional (FMI) era de que eles deveriam

reduzir os gastos e aumentar impostos, como forma de sustentar orçamentos equilíbrios

para que eles pudessem sair da crise.

Nesse sentido, há, ainda, um intenso debate sobre a importância da política fiscal como

instrumento de política econômica, cujo impacto é positivo na economia. Para os

defensores da austeridade, política fiscal expansionista para conter a crise não atingirá

seus resultados, mas, ao contrário, é a contração fiscal que levará ao crescimento.

Enquanto que, por outro lado, outros autores defendem a utilização do gasto público, ao

menos no curto prazo, para fomentar a demanda, gerando emprego e renda.

Dentro desse contexto de um maior debate sobre a importância da política fiscal é que se

insere essa dissertação. O seu objetivo é discutir a eficácia e o dinamismo da política

fiscal sob dois prismas diferentes: o de Keynes e o da Equivalência Ricardiana. A partir

dessa leitura de Keynes sobre política fiscal busca-se realizar a crítica da Equivalência

Ricardiana tentando demonstrar que a política fiscal é um importante de política

econômica, pois ela possui dinamismos e seus efeitos são importantes para economia

como um todo.

Em termos metodológicos, nosso trabalho aqui desenvolvido é de cunho teórico, voltado

para discussão de conceitos econômicos. Assim, não buscamos fazer nenhuma aplicação

Page 13: André Bologna de Castro Cardoso

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empírica do que foi apresentado. Por outro lado, para demonstrar a questão da eficiência

e dinamismo da política fiscal, utilizamos alguns estudos empíricos – como aqueles que

buscam calcular multiplicadores fiscais – e econométricos – por exemplo, para situar a

Equivalência Ricardiana no debate ortodoxo. Apresentamos esses estudos dentro da

discussão teórica e não para fazer nenhuma aplicação.

Utilizamos os conceitos eficácia e dinamismo no sentido de mostrar os impactos positivos

da política fiscal na economia. No primeiro caso, o ponto ressaltado é mostrar sua

competência em gerar emprego e renda, inclusive acima do gasto inicial, via efeito

multiplicador. O segundo envolve mostrar a capacidade da política fiscal,

fundamentalmente, o gasto público em gerar suas próprias receitas no longo prazo, por

meio do aumento da arrecadação, decorrente da elevação da renda. Nesse sentido, o

dispêndio público possui um efeito dinamizador não só para toda a economia como para

as próprias contas públicas no longo prazo.

Contudo, é preciso ressaltar um ponto importante: por mais que os pontos apresentados

estejam inseridos dentro da discussão teórica sobre o papel da política, eles são

importantes para se pensar e formular políticas econômicas, visando não apenas o

crescimento econômico, como evitar que crises econômicas, como as de 1929 e 2008,

venham a acontecer novamente. Nesse sentido, ainda que o debate tenha foco a teoria

econômica, suas implicações práticas são elementares.

Por isso, um dos objetivos dessa dissertação é pensar pontos para a construção de políticas

econômicas capazes de atingir propósitos importantes, como geração de emprego, renda,

crescimento econômico e maior estabilidade no âmbito da economia. A discussão aqui

apresentada, em nossa visão, enseja questões a serem levadas em consideração para os

formuladores de política econômica, especialmente, na área de política fiscal.

Nesse sentido, escolhemos por contrapor o pensamento de Keynes e o da Equivalência

Ricardiana, pois ambos são importantes para discussões sobre política fiscal. No primeiro

caso, o autor inglês é um dos mais enfáticos quanto à eficácia e ao dinamismo da política

fiscal, enquanto no segundo caso, é o oposto, em que a política fiscal não exerce impacto

nenhum sobre a economia, e suas implicações teóricas ajudaram na construção das bases

para as políticas de austeridade ainda em voga em vários países.

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No primeiro capítulo, trazemos a abordagem de Keynes sobre política fiscal, começando

com a problemática da demanda efetiva e o papel da política fiscal como um importante

instrumento para evitar a volatilidade natural das economias capitalistas. O ponto central

do capítulo é mostrar que, por meio do multiplicador fiscal, a política fiscal é dinâmica,

no sentido de que ela gera impactos positivos tanto no curto quanto no longo prazo. Isso

quer dizer que, por exemplo, gasto público hoje faz com que a economia se aqueça

permitindo elevar as receitar que irão financiar, no longo prazo, esse dispêndio. Assim,

um déficit hoje pode se tornar um superávit amanhã.

Mesmo a questão entre o financiamento via impostos ou via dívida pública possui

impactos diferentes, em termos de dinamismo, do que pressupõe a Equivalência

Ricardiana. Por isso, dentro desse capítulo 1 vamos utilizando as ideias de Keynes acerca

do papel da política fiscal e como dependendo da forma como ela é feita, os impactos

podem ser diversos. Por isso, já nesse capítulo vamos mostrando como a Equivalência

Ricardiana pode ser criticada por meio do arcabouço utilizado por Keynes e seus

interpretes.

No capítulo 2, apresentamos o Teorema da Equivalência Ricardiana, segundo a qual o

financiamento do déficit – decorrente de redução de impostos - por meio de impostos ou

dívida pública possui o mesmo impacto na economia, visto que os agentes esperam, de

qualquer modo, uma elevação de impostos no futuro, de modo que eles reduzem o

consumo no presente e a economia não é afetada. Apresentamos todos os pressupostos

necessários para que esse teorema funcione, assim como os modelos intertemporais, tal

como proposto por Robert Barro em 1974 em seu artigo “Are government bonds

wealth?”, o qual iniciou o desenvolvimento da ideia da Equivalência Ricardiana.

Além do mais, dentro do capítulo buscamos apresentar como deveria ser executada

política fiscal, diante do ceticismo quanto à eficácia da política fiscal, e tentamos

sintetizar literatura que discute a Equivalência Ricardiana em termos empíricos. Contudo,

como essa ideia é controversa dentro do pensamento ortodoxo, tentamos inserir a

Equivalência Ricardiana dentro do próprio pensamento mainstream apresentando a

contraposição e os estudos empíricos que rejeitam essa visão.

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No último capítulo, buscamos sintetizar alguns pontos do atual debate sobre política fiscal

no mainstream economics no pós-crise de 2008. Assim, vemos como está situada a

Equivalência Ricardiana e as ideias de Keynes nesse debate. Procuramos demonstrar que

o teorema ricardiano vem sendo abandonado em detrimento de maior eficácia da política

fiscal em momentos de crise econômica. Por outro lado, tentamos mostrar que apesar se

reconhecer que política fiscal é importante em momentos críticos, ainda essa posição está

distante da visão de Keynes, visto que para este autor política fiscal não deve ser feita

apenas em momentos de crise, mas para evita-la, inclusive.

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Capítulo 1 - Dinamismo e eficácia da política fiscal em Keynes

Introdução

O economista John Maynard Keynes é considerado um dos economistas mais brilhantes

e influentes do século XX. Sua obra maior, “Teoria Geral do Emprego, da moeda e do

juro”, continua sendo muito atual para discussão dos problemas econômicos ainda em

voga. Um de suas principais contribuições à teoria econômica foi a de mostrar que o

capitalismo, deixado à suas próprias forças, não conduziria a economia para níveis

elevados de bem-estar, mas, ao contrário, poderia levar a situações como alto desemprego

e crises econômicas profundas, como a de 1929.

Até a eclosão da Grande Depressão, os economistas davam pouca importância à atuação

do Estado na economia, de modo que acreditava-se que o livre mercado, através de seu

mecanismo de preços, geraria bem-estar de todos os indivíduos. Investimento e consumo

eram considerados resultados de maximização de utilidade por parte de empresários e

consumidores. Por isso, não havia espaço nem necessidade para intervenção

governamental.

Contudo, com desemprego elevado e o caos social, o livre mercado começou a ser

questionado como gerador de bem-estar. Como explica Deane (1980, p.225-26), a década

de 1930 trouxe o problema da depressão econômica, cujo resultado era política de laissez

faire. Assim, começaram-se a adotar políticas de maior intervenção governamental – New

Deal, por exemplo. A ideia de que a depressão era fruto de salários acima do equilíbrio

não fazia sentido na prática. É dentro desse contexto que advém Keynes.

Dessa forma, ao romper com as ideias neoclássicas de equilíbrio e de que o livre mercado

conduziria a economia ao seu nível ótimo, Keynes demonstrou que, ao contrário, se

deixada livre, as forças de mercado não conseguiram melhorar a vida de todos:

No entanto, em sua maníaca obsessão pela acumulação monetária, o

capitalismo cria tantos problemas quanto os consegue resolver. A

admirável “criatividade” produtiva e tecnológica não consegue realizar

a promessa da vida boa (Belluzzo, 2016, p.40)

A questão do desemprego é algo que pode ser visto de modo mais claro. Se antes, os

autores neoclássicos não consideram a possibilidade de haver desemprego involuntário,

visto que os recursos estariam empregados de maneira a otimizar produção e as utilidades,

Keynes trouxe a ideia de que o nível de emprego não é determinado no mercado de

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17

trabalho, mas é resultado da decisão dos capitalistas em investir (Nunes, 2003, p.1). Caso

eles não quisessem investir, então, não haveria emprego, por mais que houvesse

trabalhadores disponíveis.

Nesse sentido, Keynes indagou por que então os capitalistas não investiam. Sua conclusão

(a grosso modo por enquanto, pois vamos explorar nesse capítulo) é a falta de perspectiva

de lucratividade que faz com que os capitalistas invistam menos:

Na realidade, a simples existência de uma demanda efetiva insuficiente

pode estancar, e frequentemente estanca, o aumento do emprego antes

de se ter alcançado o pleno emprego. A insuficiência de demanda

efetiva inibirá o processo de produção, apesar de o valor do produto

marginal do trabalho continuar superior à desutilidade marginal do

emprego (Keynes [1936] 2012, 26)

É diante do problema de ausência de demanda efetiva e de um nível suficiente de

investimentos para colocar a economia no pleno emprego que a política fiscal em Keynes

se faz necessária, tanto para tirar a economia de uma eventual crise, como para evitar

flutuações econômicas bruscas.

Frequentemente, a política fiscal keynesiana é acusada de promover déficits públicos

excessivos e permanentes, de modo que não haveria qualquer tipo de preocupação com

equilíbrio fiscal:

Mesmo os críticos menos ambiciosos (ou, talvez, melhor informados)

tenderam a identificar o keynesianismo como uma proposição acima de

todas as outras: a legimitidade do uso constante de déficits fiscais como

arma de promoção da prosperidade econômica. Para esses

comentaristas, a essência da política keynesiana estaria na

despreocupação com a geração de déficits fiscais e, assim, na corrosão

da noção de que a indisciplina fiscal possa ter qualquer efeito danoso

sobre uma economia de mercado (Carvalho, 2008, p.9)

Nosso objetivo nesse primeiro capítulo é, justamente, demonstrar que a política fiscal

para Keynes possui uma lógica importante e que não visa geração de déficits

permanentes, pois o próprio autor inglês os rejeitava. Buscaremos demonstrar que,

partindo do problema da demanda efetiva, o papel da política fiscal é a de administrar o

investimento e evitar flutuações bruscas na economia que porventura viessem a causar

fortes crises.

Keynes mostrou que, a forma de realização dos gastos – ou mesmo dos déficits no curto

prazo – e sua forma de financiar geram impactos diversos na economia. Dessa forma, ele

defendia investimento público, pois este aumenta a capacidade produtiva na economia e

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18

fomentar o investimento privado, de modo que a elevar a renda e, consequentemente, as

receitas públicas são incrementadas, permitindo, assim, equilibrar o orçamento público

no médio e longo prazo.

Veremos que existe preferências na forma como o Estado deve estimular a economia –

como o investimento público sendo preferível à redução de impostos, por exemplo. Para

financiar eventuais déficits no curto prazo, decorrente do tempo que leva para os efeitos

do gasto público surtirem efeito, Keynes defendia a emissão de títulos de curto prazo

como forma de evitar que o consumo ficasse ainda mais estagnado, como no caso de o

gasto ser financiado com aumento de impostos. Ou seja, a própria forma de financiamento

da política fiscal, também, exerce um impacto diverso na economia dependendo da forma

como é realizada.

O capítulo, assim como o restante da dissertação, é de cunho teórico, por isso acreditamos

ser necessário percorrer boa parte da discussão realizada por Keynes – partindo do

problema da demanda efetiva até chegarmos ao debate sobre política fiscal. É importante

ressaltar que utilizaremos trabalhos de interpretes4 de Keynes como forma de mostrar um

certo consenso – dentro da linha pós-keynesiana, por exemplo - sobre as questões

abordadas. Ou seja, mesmo focando no pensamento do próprio Keynes, a utilização de

outros autores se faz importante para clarear a discussão.

Para mostrar toda a lógica da política fiscal em Keynes, dividimos esse capítulo em 9

seções. A primeira aborda a questão da demanda efetiva e como o investimento é o

elemento chave de uma economia capitalista. A segunda trata dos determinantes do

investimento e por que ele tende a oscilar na economia capitalista. Na terceira, trazemos

o conceito de economia monetária de produção para mostrar como a moeda exerce um

impacto importante na tomada de decisões dos capitalistas. Na quarta, apresentamos a

necessidade de intervenção do Estado. Na quinta, discute-se como, na lógica de Keynes,

deve ser executada a política fiscal, focando na questão do investimento público. Na

sexta, apresenta-se a divisão orçamentária proposta por Keynes para melhor realização

da política fiscal. Na sétima, trazemos a discussão do multiplicador fiscal tanto em termos

teóricos quanto resultados empíricos. Na oitava, retomamos a questão do dinamismo da

4 Para evitar polêmicas, ressaltamos que, por mais que haja controvérsias quanto à interpretação do

pensamento de Keynes feita por Dudley Dillard, utilizamos esse autor para explicar pontos básicos, nos

quais não há discordância, e para discutir a questão da dívida pública, a qual ele discutiu com boa

profundidade.

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19

política fiscal em Keynes, de modo que o próprio gasto público permite gerar suas receitas

e equilibrar o orçamento público. E por fim, ressaltamos a discussão sobre como deve ser

financiado o gasto público, ou por aumento de impostos ou por emissão de dívida pública.

1.1. A problemática da demanda efetiva

O ponto inicial para entender toda a problemática envolvida na percepção de Keynes

sobre política fiscal é compreender o conceito da demanda efetiva. O autor argumenta

(Keynes, [1936] 2012, p.20-21) que existem dois tipos de gastos na economia: o primeiro

é aquele destinado a pagar os fatores-de-produção, denominado de custos de fatores. O

segundo é aquele que se paga a outros empresários para utilizar os seus equipamentos, ao

invés de deixá-los ociosos, a isso se chama o custo de uso. Quando o excedente produzido

é maior do que esses dois gastos conjuntos se obtém o lucro ou o rendimento do

empresário. Nesse sentido, esta é a quantidade que o empresário busca obter – ou

maximizar – quando decide qual o volume de emprego a oferecer.

Como explica Keynes, a relação entre o preço da oferta (chamado de Z), ou seja, aquele

necessário para empregar um determinado volume de mão-de-obra, e o número de

trabalhadores empregados (N), gera uma função agregada Z=Φ(N):

Por outro lado, o preço da oferta agregada da produção resultante de

determinado volume de emprego é a expectativa de proventos que é

exatamente suficiente para que os empresários considerem vantajosos

oferecer o emprego em causa (Keynes, [1936] 2012, p.21)

De outro lado, segundo Keynes ([1936, 2012, p.21-22), temos o preço de demanda (D),

aquele rendimento que os empresários esperam obter ao empregar uma certa quantidade

de trabalhadores, assim, temos a função demanda agregada D=f(N). Keynes explica que

o preço da demanda é a soma dos rendimentos esperados da realização da venda da

produção, dado um certo volume de emprego.

Do mesmo modo, representa-se por D os proventos que os empresários

esperam receber do emprego de N homens, sendo a relação entre D e N

expressa por D=f(N), à qual poderemos chamar de função da demanda

agregada (Keynes, [1936], 2012, p.22)

Caso os rendimentos esperados sejam maiores do que aqueles necessários para produzir,

então o volume de emprego irá aumentar, e vice-versa. (Keynes, [1936] 2012, p.22).

Nesse sentido, encontra-se a demanda efetiva. Segundo Keynes (ibid, p.22) este é um

Page 20: André Bologna de Castro Cardoso

20

ponto de intersecção entre oferta agregada e a demanda esperada, o que determina o

volume de emprego efetivo realizado pelos empresários. Nesse sentido, esta será

resultado de todos os gastos realizados na economia:

A quantidade de mão-de-obra que os empresários decidem empregar

depende da soma (D) de duas quantidades, a saber, D1, o montante que

se espera que seja gasto pela comunidade em consumo, e D2, o

montante que se espera que seja por ela aplicado em novos

investimentos. D é o que anteriormente designamos de demanda efetiva

[negrito nosso] (Keynes, [1936] 2012, p.25)

A demanda efetiva é aquela que os empresários acreditam que se realizará no futuro,

permitindo que se maximizem seus lucros. O que se nota que a demanda efetiva depende

das expectativas dos empresários quanto ao nível de demanda futuro, ou, em outras

palavras, depende dos rendimentos esperados, o que determina montante de emprego

criado. Keynes considera como fundamental a demanda esperada e não aquela realizada:

Na Teoria Geral Keynes, no entanto, opta por considerar apenas a

demanda esperada pelo empresário, diferente da demanda efetivamente

realizada. Esta última seria, sem dúvida, aquela que se poderia

denominar com mais clareza de “efetiva” segundo o senso comum

(Klagsbrunn, 1999, p.51)

Podemos definir demanda efetiva, portanto, como demanda que os empresários esperam

que seja realizada no futuro. Por isso, conceito de demanda efetiva é ex ante e não tem

relação direta com a demanda corrente:

Assim, deveríamos dizer que a demanda efetiva é aquele valor do

produto agregado, ou aquele volume de vendas que as empresas,

consideradas em conjunto, acreditam que produzirá lucros máximos,

dada sua expectativa da posição da função demanda agregada (Chick,

1993, p.72)

Essa diferenciação entre demanda efetiva e demanda corrente (agregada) é importante. O

nível desta última pode influenciar a tomada de decisão dos capitalistas em realizar

investimentos, mas não é algo automático, pois a realização do investimento só irá ocorrer

se o capitalista acredita que a demanda atual se manterá no futuro, o que pode não

acontecer. Por exemplo, a demanda corrente pode estar elevada hoje por determinado

motivo e o empresário pode acreditar que não durará até o momento em que o

investimento estiver realizado, dessa forma, ele simplesmente não investe, utilizando seus

recursos para outros fins.

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21

A demanda efetiva depende de dois gastos fundamentais: com consumo e o investimento.

A problemática da demanda efetiva advém das determinações da função da demanda

agregada e não da oferta. Keynes ([1936, 2012, p.80-81) aponta que a função oferta por

depender de condições físicas da própria produção não tem deve a ser levado em

consideração nessa análise. Por outro lado, a função da demanda agregada depende,

justamente, dos gastos com consumo e investimento de uma comunidade no futuro. O

primeiro é fruto daquilo que Keynes chamou de propensão marginal a consumir:

Definiremos, portanto, aquilo que chamamos de propensão ao consumo

como relação funcional entre consumo entre Yw (determinado nível de

rendimento medido em unidades de salários) e Cw (o dispêndio com

consumo a esse nível de rendimento) (Keynes, [1936], 2012, p.80)

Assim, a propensão a consumir é a proporção do rendimento que a comunidade possui e

é destinada para o consumo. Essa propensão a consumir depende de inúmeros fatores,

incluindo fatores objetivos, dentre os quais o aumento ou decréscimo do rendimento, além

de costumes da sociedade, ou mesmo, da tributação (Dillard, 1964, p.34-25). Segundo

Keynes ([1936] 2012, cap.8), a propensão a consumir é relativamente estável, pois

depende da renda, de modo que os indivíduos aumentam seu consumo absoluto, quando

seu rendimento cresce – ou consome-se menos, quando o rendimento cai -, porém em

uma proporção cada vez menor. Isso porque, à medida que vai satisfazendo suas

necessidades básicas, os indivíduos tendem a poupar cada vez mais.

Admitindo, pois, que a propensão marginal a consumir é função

bastante estável, de maneira que, em geral, o montante de consumo

agregado depende principalmente do montante da renda agregada

(ambos em unidades de salário), e considerando de importância

secundária as variações na mesma propensão (...) (Keynes, [1936]

2012, p.88)

A propensão marginal a consumir por ser relativamente estável a curto prazo e, pelo fato

de que à medida que se aumentam os rendimentos, o consumo aumenta em uma proporção

menor, ela não é capaz, como aponta Dillard (1964, p.35), de manter a demanda da

economia no pleno emprego. Os empresários, portanto, teriam prejuízos, caso

dependessem apenas do consumo dos indivíduos, sendo assim, necessário um certo

volume de investimento para absorver o excesso de produção, ou seja, é preciso que haja

investimentos para superar a defasagem entre consumo e o preço de oferta (Keynes

[1936], 2012, p.26)

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22

Esse princípio simples leva, como se verá, à mesma conclusão de antes,

nomeadamente, o emprego só pode aumentar pari passu com aumento

do investimento, a não ser, bem entendido, que se verifique uma

mudança na propensão ao consumo. Na realidade, quando o emprego

sobe, os consumidores vão gastar menos do que o aumento do preço da

oferta agregada e o aumento do emprego terá como saldo uma perda, a

não ser que um acréscimo de investimento venha preencher a lacuna.

(ibid, p.88)

Como a propensão a consumir é insuficiente para manter o dinamismo da economia, o

investimento se torna o elemento central. Dado uma propensão marginal a consumir dos

agentes, o volume de emprego será determinado pelo investimento, o qual depende da

eficiência marginal do capital e a taxa de juros. Nesse sentido, há somente um único ponto

de emprego compatível com o equilíbrio, qualquer outro nível levará à diferença entre

preço de oferta e o preço de demanda (Keynes, [1936], 2012, p.26-27).

Kalecki (1977) expõe de maneira mais clara como o investimento é o determinante da

economia. Segundo ele, a equação do lucro macroeconômico é dada pelo Lucro bruto =

Investimento + Gastos dos capitalistas, visto que ele supõe que os trabalhadores gastam

tudo aquilo que ganham, fazendo com que o lucro no setor de bens de consumo seja

constante. O mecanismo apresentado por Kalecki (1977, cap.4) pode ser resumido:

O consumo dos capitalistas é dado por

Cc = qPt-z + A (1)

em que A é uma parte autônoma e qPt-* é determinada pelos lucros em t-*, ou seja, por

lucros passados. Assim, a fórmula do lucro desagregada tem-se que:

L = I + qPt-z + A (2)

Assim os lucros são determinados pelo investimento hoje e pelo lucro passado. O lucro é

fundamentalmente formado pelas decisões passadas de investimento, ou seja, são uma

função do investimento remoto:

P = f(It-w) (3), assim tem-se que:

F(It-w) = It + qf(It-w) + A (4), fazendo os ajustes tem-se que:

P = It + A\ (1-q) (5),sendo q e A constantes, percebe-se que existe uma redução

de determinação dos lucros de dois para um: agora o que determina os lucros é o

investimento, fundamentalmente.

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23

Kalecki (1977) argumenta que os lucros dos capitalistas resultam do consumo destes e do

investimento, ou seja, é o próprio gasto capitalista que irá gerar lucros e,

consequentemente, poupança, visto que os empresários não podem decidir o quanto terão

de lucros, mas podem saber o quanto gastar. Nesse sentido, para obterem mais lucros no

futuro, eles precisam investir, como um todo, mais do que no período anterior, porque,

caso contrário, se investissem o que tivessem ganho no período anterior, os lucros seriam

estacionários.

Eles [empresários] não podem decidir que lucro devem ganhar, porque

não podem decidir quanto devem vender para obter esse lucro. Em

compensação, eles podem decidir e efetivamente decidem a respeito de

quanto vão consumir e investir. E é exatamente o maior ou menor

montante de gastos em bens de investimento e bens de consumo por

parte dos capitalistas que os leva a obter maior ou menor lucro

(Miglioli, 2004, p.240)

Todas essas demonstrações feitas por Keynes e Kalecki servem para demonstrar que o

princípio da demanda efetiva indica que a renda da comunidade é determinada pelas

decisões dos capitalistas, realizadas a partir das avaliações individuais dos empresários

sobre o quanto produzir e o quanto esperam ganhar no futuro, de forma que a tomada de

decisão desses agentes irá determinar tanto o volume de emprego quanto a renda da

comunidade (Belluzzo e Almeida, 2002, p.65).

Dentro dessa perspectiva, é o setor de bens de capital ou de investimentos que determina

o dinamismo da economia. O consumo, portanto, é dependente das decisões de

investimento dos capitalistas, pois é esta que gera o emprego e renda necessários para que

haja consumo. Existe, portanto, uma hierarquia de decisões na economia capitalista:

De gastos, em que as decisões de produzir correntemente bens de

investimento determinam o volume que deve ser produzido no setor de

bens de consumo (Keynes). Em Kalecki, essa hierarquia revela também

o tipo de decisão (a decisão de investimento) que é fundamental para

determinação do lucro (Belluzzo e Almeida, 2002, p.65-66)

Sendo o investimento variável chave na economia capitalista, existe uma hierarquia

social, no sentido de tomada de decisões, em que os capitalistas estão no topo e, portanto,

são suas determinações irão afetar a vida dos trabalhadores, via aumento ou não do

emprego e da renda. A quantidade de trabalho a ser ofertada não é determinada pelos

trabalhadores, mas pelos empresários.

A ideia de comando supõe que a classe empresarial-capitalista tenha

não apenas a propriedade dos meios-de-produção, mas o controle dos

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24

meios capazes de mobilizá-los. Nessa economia, a demanda de trabalho

é derivada, no sentido de que a renda e os gastos dos trabalhadores

dependem da decisão de gasto dos capitalistas (Belluzzo, 2016, p.56)

Compreendida essa discussão, nota-se que o que determina a dinâmica do capitalismo é

o investimento: é a decisão de investir dos capitalistas que permite gerar emprego e renda.

Se esta decisão é fundamental para a dinâmica da economia capitalista, é preciso

compreender, então, o que leva empresários capitalistas a mobilizarem recursos para

investir, ou seja, o que faz com que o investimento esteja suscetível a flutuações.

1.2. Flutuação na demanda efetiva: determinantes do investimento

Atentando para os determinantes do investimento, Keynes ([1936], 2012, p.24)

argumenta que são dois os determinantes fundamentais do investimento, a saber a

chamada eficiência marginal do capital e as taxas de juros. É na expectativa de evolução

desses dois componentes, de modo que torne o investimento lucrativo é que os

empresários realizam seus investimentos (Dillard, 1964, p.37)

A eficiência marginal do capital é definida por Keynes ([1936], 2012, cap.11) como a

relação entre rendimento esperado da realização da compra do bem de capital durante

toda sua vida útil em relação ao seu preço de oferta. De maneira mais clara, é aquilo que

o empresário espera obter do investimento realizado em relação ao mínimo que ele espera

obter para oferecer um determinado volume de emprego na produção.

(...) a eficiência marginal do capital é definida aqui em termos da

expectativa do rendimento e do preço de oferta corrente do bem de

capital. Depende da taxa de retorno que se espera obter do dinheiro

investido num bem recentemente produzido e não do resultado histórico

obtido por um investimento em relação ao seu custo original, quando

examinado retrospectivamente depois de terminada sua vida útil

(Keynes, [1936] 2012, p.121)

Se o preço da demanda esperada for superior ou igual ao preço de oferta, o investimento

será estimulado. Segundo Dillard (1964 ,p.38), haverá aumento do investimento, caso

esse rendimento esperado seja superior à taxa de juros, pois esta é base de comparação

para realizar o investimento. É nesse sentido, que esta última exerce um papel importante

na decisão de investir: se ela for muito alta, acaba inviabilizando investimento e vice-

versa:

Se o custo da construção de um novo bem é menor que o preço de

aquisição do bem de capital antigo da mesma natureza, será proveitoso

construir um novo ao invés de comprar um velho. Isso explica o que se

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quer dizer com taxa de lucro previsto excedendo a taxa de juros

(Dillard, 1964, p.38)

Se a taxa de juros for muito superior ao investimento, compensará ao empresário adquirir

direitos sobre riqueza já produzida, na forma de títulos, ações e etc. Caso, os rendimentos

esperados sejam superiores, será mais interessante para o capitalista comprar bens de

capital para produzir riqueza nova – realizar investimento.

Belluzzo (2012, p.66) sintetiza essa questão e adiciona um elemento a mais do que a

eficiência marginal do capital. Segundo ele, a decisão de investir depende de dois preços,

sendo o primeiro, justamente, a eficiência marginal do capital – preço de produção e do

preço que o bem de capital espera gerar -, enquanto o segundo relaciona o preço das

dívidas com o incentivo dos possuidores de ativos líquidos – moeda – em comprar títulos

ou emprestar recursos para que o bem de capital seja adquirido.

São as expectativas a respeito da evolução provável desses dois

conjuntos de preços que determinarão as decisões quanto à forma de

posse da riqueza dos que controlam os meios de produção e o crédito,

portanto, o ponto de demanda efetiva. Ou seja, o valor monetário do

produto e da renda que os detentores dos meios de produção e os

controladores do crédito estarão dispostos a criar vai depender da

relação entre os dois conjuntos de preços (ibid, p.66)

O investimento ocorre, portanto, quando a eficiência marginal do capital está elevada,

mostrando aos capitalistas que eles obterão retornos altos ao comprarem bens de capital,

mas é preciso, também, que o sistema bancário disponha crédito para a aquisição desse

tipo de bem.

O que torna as decisões de investimento, ou seja, que a eficiência marginal do capital

esteja sujeita a flutuações são as expectativas em torno do futuro (Keynes, [1936], 2012,

p.126). Contudo, o problema está, segundo Keynes (ibid, p.133-134) que o conhecimento

acerca do futuro é precário, quase desprezível. Davidson (2011, p.65) argumenta que a

incerteza quanto ao futuro é radical no sentido de que não é possível, dado o quadro de

informações presente e futuro, saber qual será o lucro futuro

Keynes inovou o conceito de verdadeira incerteza quanto ao futuro.

Segundo ele, se o futuro é incerto, então as receitas futuras possíveis

que se espera que as despesas de investimento de hoje venham a

implicar não são previsíveis, e, portanto, não podem ser previstas

fiavelmente utilizando dados de mercado do passado e do presente

(Davidson, 2011, p.101)

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26

Se o futuro fosse previsível, não haveria nenhum problema para a decisão de investir,

contudo não é possível:

Falando francamente, temos de admitir que as bases do nosso

conhecimento para estimar qual o rendimento dentro de dez anos de

uma via férrea, de uma mina de cobre, de uma fábrica de tecidos, da

reputação de um medicamento patenteado, de um transatlântico ou de

um imóvel no centro comercial de Londres significam muito pouco, e,

por vezes, nada (Keynes, [1936], 2012, p.134)

Esse conceito de incerteza se difere do de risco. O segundo é uma situação, na qual a

distribuição de probabilidade de um evento acontecer é conhecida, enquanto no primeiro,

não existe distribuição de probabilidade (Ferrari Filho e Conceição, 2001, p. 103). Em

termos de risco, o indivíduo sabe quais são as possibilidades de um evento futuro ocorrer

– por exemplo, tal evento tem 60% de chance de ocorrer e 40% de não. A incerteza é

completamente diferente, pois não é possível sequer saber qual a probabilidade de tal

evento ocorrer, podendo acontecer qualquer no futuro, com inúmeros cenários

impossíveis de serem previstos.

Os agentes, segundo Keynes ([1936], 2012, p.144-145), são estimulados por um espírito

animal, que é um impulso de realizar algo. Investir é fazer uma aposta no futuro incerto,

de modo que esse sentimento de aventura, quase “animalesco” impulsiona o indivíduo a

se arriscar ao invés de não fazer nada5. Quando esse impulso se retrai, então os

investimentos não são realizados e a economia sofre as consequências.

Nesse sentido, porque o futuro é incerto, os indivíduos, mais

especificamente os investidores, seguem seus instintos, caracterizados

pelo que Keynes chamou de animal spirits. Em outras palavras, o estado

de confiança dos indivíduos é construído a partir de convenções.

Portanto, a adoção de convenções, por parte dos agentes, é a solução

parcial dos problemas de incerteza. (Ferrari Filho e Conceição, 2001,

p.104)

O investimento só será realizado se as expectativas futuras quanto à economia forem

positivas:

A escolha sobre como os recursos disponíveis para o investimento

deveriam ser alocados (se no aumento da capacidade produtiva ou se

em diferenciação de produto, por exemplo) depende da avaliação da

5 “Provavelmente, na maior parte dos casos, quando decidimos fazer algo positivo cujas consequências

finais só produzem os seus efeitos depois de muito tempo, só o fazemos impelidos pelos espíritos animais

– por um impulso espontâneo para agrir, em vez de não fazer nada – e não em consequências de uma média

ponderada de benefícios quantitativos multiplicados pelas respectivas probabilidades quantitativas (...)

Assim, se os espíritos animais arrefecem e o otimismo vaciliar, nos deixando exlusivamente dependente

de uma esperança matemática, o emprrendimento murcha e morre (..)” (Keynes [1936], 2012, p.144-145)

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27

firma sobre seus ganhos. Num mundo de incerteza, a escolha de investir

em ativos menos líquidos irá demonstrar um elevado grau de confiança

no futuro e vice-versa (Feijó, 1993, p.92)

Caso as perspectivas de rendimento sejam negativas, então o espírito animal dos

capitalistas se contrai. Contudo:

Por outro lado, quanto melhores forem as expectativas dos empresários

sobre vendas e lucros, mais fortes serão os seus espíritos animais e,

portanto, mantendo-se todo o resto igual, maior será o desejo dos

empresários de investir em instalações e equipamentos (Davidson,

2011, p.104-105)

O problema da demanda efetiva pode ser expresso como a não existência de expectativas

de investimentos rentáveis, de modo que os empresários não investem e não colocam em

movimento o capital produtivo, e, consequentemente, não elevam a oferta de trabalho,

mesmo que haja trabalhadores necessitando de emprego. Os capitalistas não buscam

maximizar produção, muito menos oferecer produtos que satisfaçam necessidades

humanas, mas, sim, almejam lucros.

A explicação deve ser procurada nas instituições do sistema de mercado

capitalista. As fábricas poderiam ser reabertas para que homens

pudessem voltar a trabalhar. Não foram, porque não era lucrativo para

os empresários reabri-las. Em uma econmia capitalista, as decisões

concernentes à produção baseiam-se, antes de tudo, no principio do

lucro, não nas necessidades do homem (Hunt e Shermann, 2013, p.184)

Dentro da teoria de Keynes, portanto, o investimento é o determinante da dinâmica

econômica. Contudo, esta não é uma decisão simples, muito menos automática, pois ela

envolve expectativas sobre o futuro, as quais não são exatas ou sequer conhecidas.

Qualquer percepção negativa sobre as condições futuras da economia, como, por

exemplo, uma demanda futura baixa ou algum outro evento negativo, faz com que os

empresários não empreguem um determinado volume de capital, diminuindo o emprego

e, portanto, a própria renda da comunidade. Como a decisão de investir é complexa e é

tomada em um cenário de completa incerteza, o investimento tende, portanto, a oscilar

fortemente.

A incerteza não pode ser calculada, de modo que é necessário desenvolver estratégias

defensivas. Segundo Belluzzo (2016, p.73-74), as convenções possuem um papel muito

importante para delinear os preços dos ativos – sejam produtivos ou financeiros – como

um guia de como se imagina que será o movimento da economia no futuro. Ainda

segundo este autor, essas expectativas dos agentes não são baseadas nas suas perspectivas

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individuais, mas na do que os demais acreditam. Este estado de convenção, como explica

Keynes ([1936, 2012, p.136), pressupõe-se que a situação atual se manterá

indefinidamente, a não ser que haja mudanças nas perspectivas, então, esse estado

mudará.

Contudo, uma das estratégias para se precaver da incerteza é a retenção da moeda, pois

ela é o ativo mais líquido da economia:

A incerteza não pode ser calculada. Sob tais circunstâncias, uma vez

que não se pode emitir apólices de seguro contra as incertezas da vida

econômica, é necessário desenvolver outras estratégias defensivas.

Reter moeda, disse Keynes, é a mais comum delas (Carvalho, 1999,

p.262)

Faz-se necessário, portanto, compreender mais fundo como pode ser caracterizada essa

economia capitalista, em que a moeda cumpre um papel decisivo para alocação de

recursos dos capitalistas. Debruçar-nos-emos na análise do que Keynes chama de

economia monetária de produção. Não é possível compreender o papel que Keynes dá à

política fiscal sem entender o papel que a moeda exerce na flutuação do investimento.

1.3. Economia Monetária da produção

O problema da insuficiência de demanda efetiva só pode ocorrer em uma economia

empresarial ou monetária da produção. Keynes (1980) argumentou que a caracterização

correta da economia deveria ser a de uma economia empresarial ou monetária da

produção. Esta se caracteriza pelo fato de que as empresas, ao término da produção,

desejam obter mais dinheiro do que inicialmente tinha no início do processo. Os

empresários só irão investir caso eles tenham essas perspectivas de ganhos maiores no

futuro, portanto, o objetivo primordial dentro da economia é a acumulação de riqueza.

Keynes distingue, a partir do papel que a moeda cumpre, o que seria uma economia de

troca de uma economia monetária de produção. No primeiro caso, a moeda seria apenas

uma conveniência para facilitar as trocas, de modo que ela é neutra, ou seja, não afeta as

decisões de investimento e consumo da sociedade:

É [a moeda] considerada uma mera ligação entre o tecido e o trigo, ou

entre o trabalho do dia gasto na construção da canoa e o trabalho do dia

gasto na colheita. Não é suposto que ela afete a natureza essencial da

transação de ser, na mente daqueles que o fazem, única entre coisas

reais, ou para modificar os motivos e decisões em decorrência dela.

Moeda, dessa forma, é empregada, mas tratada como sendo, em certo

sentida, neutra (Keynes, 1973, p.408)

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29

Contudo, ele pensa que a melhor forma de caracterizar economia capitalista como sendo

monetária, no sentido de que a moeda não é uma mera ligação para realização das trocas,

mas que afeta a tomada de decisões dos agentes econômicos:

A teoria que eu sinto falta tratar, em contraposição a esta [economia de

troca], com uma economia em que o dinheiro cumpre um papel próprio

e afeta decisões e motivações e é, em síntese, um dos fatores operativos

na situação, de modo que o curso dos acontecimentos não pode ser

previsto, nem no longo nem no curto prazo, sem o conhecimento do

comportamento da moeda entre o primeiro e o último estágio [ tratando

do circuito D-M-D’]. E é disto que devemos tratar quando falamos de

uma economia monetária (ibid, p.408-409)

Nessa economia, a produção depende da decisão dos empresários de adquirirem fatores-

de-produção em troca de dinheiro no futuro, já que os empresários não querem obter mais

mercadorias ao final do processo, e, sim, mais dinheiro. Diante disso, o empresário deve

tomar uma decisão anterior a produzir, a qual é escolher onde ele irá alocar seu dinheiro:

se para gerar emprego ou de qualquer outra forma, podendo até mesmo se abster de

utilizar dinheiro (Keynes, 1980, p.81-82).

O emprego dos fatores de produção que aumentam a produção envolve

por parte do empresário um dispêndio, não em produtos, mas em

dinheiro. A escolha antes dele decidir se oferece ou não emprego é a

escolha entre usar dinheiro dessa forma ou daquela forma, ou mesmo

não utilizá-lo. (ibid, 1980, p.82)

O circuito dinâmico da economia é D-M-D’, em que o capitalista investe uma

determinada soma de dinheiro para compra de máquinas e equipamentos e contração de

mão-de-obra para produzir uma determinada mercadoria e ao final obter mais dinheiro do

que inicialmente investido. Nesse sentido, para que haja D-M – ou seja, realização do

investimento – é necessário que D’ seja maior que D.

(...) a natureza da produção no mundo real não é, como os economistas

muitas vezes parecem supor, um caso de M-D-M, ou seja, de trocar

mercadoria (ou esforço) por dinheiro para obter outra mercadoria (ou

esforço). Esse pode ser o ponto de vista do consumidor privado. Mas

não é a atitude dos negócios, que é um caso de D-M-D ', ou seja, de

colocar dinheiro para produzir mercadoria (ou esforço) para obter mais

dinheiro (Keynes, 1979, p.81)

O dinheiro, portanto, como aponta Keynes (ibid, p.82), é elemento central, não porque

ela facilita as trocas ou pelo simples fato dela existir, mas porque ele é o objetivo principal

a ser obtido em qualquer economia que vigore as características de uma economia

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monetária. Os possuidores de riqueza irão colocar seu dinheiro, em ativos que lhe rendem

mais dele no futuro, independentemente se tal decisão afetará ou não o nível de emprego.

Carvalho (1999, p.262) argumenta que a moeda é extremamente importante, afetando as

decisões dos agentes. O curso dos eventos não pode ser previsto nem conhecido tanto no

curto quanto no longo período sem compreender o comportamento da moeda entre o

primeiro e o último evento, assim as decisões de produção e investimento são tomadas a

partir do dinheiro para terminar com mais dinheiro do que inicialmente se investiu.

O dinheiro possui propriedades diferentes dos demais ativos, justamente, porque não pode

ser facilmente reproduzida pelo trabalho, e sua elasticidade de substituição é zero, ou seja,

nenhum outro ativo pode exercer função de unidade de conta, reserva de valor e meio de

troca (Ferrari Filho, 2003, pp.292-293). Dessa forma, não pode ser visto como um ativo

qualquer – tal como um título ou um bem de capital – mas deve ser analisada de modo

diferente, pois suas propriedades são diferentes.

Como explica Davidson (2011, p.47-48), a existência de um equilíbrio com desemprego

está relacionada em parte com o fato de existir uma mercadoria que não é reproduzível –

elasticidade produção zero – e cuja elasticidade de substituição por outros bens também

é zero, que é a moeda. Nesse cenário, haveria um desvio de demanda de bens

reprodutíveis, especialmente, bens de investimento para ativos não-reprodutíveis, aqueles

que são líquidos, como a moeda.

Como consequência, a demanda agregada pode ser inferior à oferta

agregada, porque parte desta demanda pode ser “desviada” para um

bem que é irreprodutível: a moeda. Em outras palavras, a demanda

agregada pode ser deficiente. Uma economia monetária é

caracterizada pelo fato de que a produção é realizada com o objetivo

de gerar lucro monetário (Feijó, 1993, p.83)

Minsky (2011, p.91-96) traz um papel ainda mais fundamental para moeda em um

contexto de economia monetária de produção. Isso porque, uma economia capitalista, as

decisões são tomadas em termos de portfólio: manter ativos e de como financiá-los. Essa

decisão é tomada por meio da análise de fluxo de caixa que estes ativos e passivos geram

em termos de recebimento ou pagamento, respectivamente, em moeda. Dessa forma, a

economia capitalista se caracteriza pela existência de dívidas tanto para receber quanto

realizar pagamentos.

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31

A moeda é um “seguro” ou uma garantia para caso haja dificuldades em se honrar os

compromissos financeiros em decorrência de não-pagamentos ou de problemas no

sistema financeiro (ibid, p.96). Assim, por exemplo, uma empresa que possui uma

determinada dívida, tende a pagá-la, através de seus lucros. Se por ventura, ela não

conseguir obtê-los, não haverá como honrar seus compromissos. Agora, se ela tiver um

estoque de moeda líquida em seu caixa, ela poderá fazê-lo.

A posse da moeda – e de ativos financeiros que são quase moedas, ou

seja, contas de poupança, certificados de depósitos etc. – funciona como

‘seguro’ contra a economia, ou mercados particulares, comportando-se

de modo inadequado, quer dizer, de tal maneira que os fluxos de caixa

de operações ou capacidade de levantar dinheiro por meio de transações

financeiras são insuficientes para satisfazer necessidades (Minsky,

2011, p.96)

Por isso, a moeda permite acalmar as inquietudes dos agentes, diante de um cenário de

incerteza. “A possa da moeda real acalma nossa inquietude; e o prêmio que requerimos

para nos desfazermos da moeda é a medida do grau de nossa inquietude” (Keynes, 1937,

p.216). Ter moeda oferece tranquilidade ao seu possuidor diante de mudanças imprevistas

da economia.

Davidson (2011, p.126-127), na mesma linha que Minsky, coloca a moeda como aquele

ativo que permite ao seu detentor se livrar de uma determinada obrigação feita em

contrato, como uma dívida, por exemplo. Por isso, este autor caracteriza a moeda como

máquina do tempo, a qual permite transferir poder de compra hoje para futuro, no

momento em que se for liquidar compromissos realizados:

Enquanto todas as obrigações contratuais forem expressas em termos

de uma moeda específica, o dinheiro irá também funcionar como

armazém de valor que permite o movimento do poder de compra

(estabelecimento contratual) do presente para um futuro indefinido,

onde poderá ser usado para libertar obrigações contratuais futuras (ibid,

p.127)

Dentro de uma economia monetária de produção, em que existem contratos e relações de

dívidas, com obrigações financeiras, entre os agentes, a moeda possui um caráter especial,

pois ela permite comprar tudo e libertar o seu possuidor de constrangimentos (como ter

de vender um ativo para obter dinheiro) no momento de liquidar seus compromissos. A

obtenção de moeda hoje é uma forma de se precaver contra a incerteza futura.

Não à toa, como visto, o objetivo de uma empresa é obter mais dinheiro ao final do

processo e não, simplesmente, otimizar a produção, como pressupõe a teoria neoclássica,

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32

visto que para investir, ela precisa tomar crédito e para honrar esse compromisso no futuro

ela precisa de liquidez. Por isso, a empresa só irá realizar um investimento se ela tiver

perspectiva de que conseguirá mais dinheiro para, no mínimo, pagar dívida.

A moeda, ao contrário do que pressupõe a teoria neoclássica, não é neutra, ou seja, ela

possui impactos nas decisões de produção – na economia real – e não só em questões

monetárias – na inflação. Ela é um ativo desejável, porque, por mais que ela não renda

juros, ela é um ativo seguro e plenamente líquido, no sentido de que ela é a própria

riqueza. Diante da incerteza do futuro, os empresários irão optar por não comprar ativos

mais arriscados – como bens de capital – e vão preferir moeda, o que irá causar

desemprego.

Dentro dessa economia monetária de produção, a problemática da demanda efetiva existe,

porque o objetivo único dos empresários é obter mais dinheiro, independentemente, seja

por meio da produção ou seja poupando mais, e, como as expectativas sobre ganhos

futuros são incertos, ainda mais ao realizar investimentos em bens de capital, caso não

haja um cenário positivo à frente, eles irão optar moeda, já que ela é um refúgio contra a

incerteza.

O problema, segundo Carvalho (1999, p.266), está no preço relativo dos ativos: é a

alocação dos ativos, das formas de riqueza que fazem o mercado falhar. A incerteza

quanto aos rendimentos futuros dos bens de capital torna-os inferiores à moeda. Os preços

dos ativos penalizam os bens de capital em detrimento da moeda, reduzindo seu preço de

demanda em relação ao de oferta. Os agentes retêm moeda e não investem, causando

desemprego.

Nesse sentido, as crises de insuficiência de demanda efetiva, que

provocam desemprego, manifestam-se porque, numa situação em que a

incerteza sobre o futuro aumenta, os indivíduos passam a reter moeda,

postergando suas decisões de dispêndio (Ferrari Filho, 2003, p.293)

A incerteza, dentro do contexto de uma economia capitalista, na qual prevalece a

propriedade privada e cujo ônus recai sobre os seus detentores é causa para as flutuações

da economia, inclusive podendo causar crise, porque a moeda é uma alternativa à

aquisição de ativos reais:

É preciso repetir que não é a incerteza em si a causadora desses

resultados, mas o modo como ela emerge em economias monetárias de

propriedade privada e a forma possível de reduzi-la, isto é, através da

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33

acumulação de riqueza na forma de ativos líquidos, particularmente a

moeda (Carvalho, 1999, p.266-267)

Diante da incerteza, como visto, a moeda se torna um ativo mais desejado em relação a

outros, como ativos de capital, por exemplo. Essa decisão de alocar a riqueza na forma

mais líquida é causa fundamental da insuficiência de demanda efetiva:

Se as perspectivas de futuro são incertas sobre seus rendimentos, o

dinheiro é preferível a bens de capital, destacando a preferência pela

liquidez dos homens de negócios bem como o uso do dinheiro como

loja de riqueza. Nestas condições, o que é geralmente usual nessa

economia, é a demanda por dinheiro ao invés de bens de capital que

provoca a insuficiência de demanda efetiva que esfria a atividade

econômica, subjulgando conjuntamente o emprego e a produção

(Arestis, Ferrati-Filho e Terra, 2015, p.2)

A economia capitalista está sujeita a flutuações, com expansões e queda da atividade

econômica, em decorrência das variações no investimento, por causa da incerteza quanto

ao fato e da preferência pela liquidez. É dentro desse contexto que a política fiscal ganha

um espaço importante para visão de Keynes, como forma de estimular o investimento

privado.

1.4. Necessidade da política fiscal em Keynes

Entendido que o investimento está sujeito a flutuações bruscas em uma economia

monetária de produção, em decorrência da existência de um ativo seguro, o qual permite

aliviar tensões, surge a questão da necessidade de intervenção para amenizar essas

flutuações na economia. A contradição entre bem-estar individual – ficar líquido e,

portanto, seguro - e coletivo – não realização de investimento e, dessa forma, não geração

de emprego e renda -, em uma economia como monetária de produção, faz com que seja

necessária a intervenção do Estado:

É essa contradição entre racionalidade individual e social que cria a

necessidade de intervenção. Se as incertezas não podem ser eliminadas,

e têm de ser suportadas pelos próprios indivíduos, não se pode esperar

que soluções surjam de forma espontânea. Algo deve ser feito de fora

da economia (Carvalho, 1999, p.265)

É dentro dessa dinâmica de economia monetária de produção, em que a moeda cumpre

um papel decisivo na escolha de alocação de riqueza é que a política fiscal possui função

importante para a economia.

Carvalho (2008, p.10-11) afirma que um dos problemas centrais da economia, na visão

de que Keynes, era de que o capitalismo deixado por si só não consegue manter um nível

Page 34: André Bologna de Castro Cardoso

34

de demanda agregada adequada para gerar o pleno emprego. Portanto, diante dessa

constatação, o Estado deveria intervir na economia com o intuito de cobrir essa falta de

demanda agregada para se gerar o pleno emprego.

O outro problema do capitalismo moderno era sua incapacidade de

gerar continuamente o nível de demanda agregada capaz de alcançar

ou, mais adequadamente, de sustentar o pleno emprego e a plena

utilização da capacidade produtiva existente (Ibid, p.11)

Segundo Afonso (2012, p.28), quando os elementos endógenos da economia, como o

gasto com o investimento e o consumo, se retraem, decorrente de uma crise de confiança,

surge a necessidade de um agente exógeno, neste caso, o gasto público, para

contrabalancear a retração dos gastos privados.

A insuficiência de demanda agregada por parte dos gastos privados faz com que haja

necessidade de maiores gastos públicos. Visto o setor privado – empresas e consumidores

– retrai seus gastos, porque não veem perspectivas de ganhos futuros ou por causa do

aumento do desemprego, é preciso que o Estado gaste, porque ele, em teoria, não

necessita de lucros.

Apenas a disposição do Estado em intervir sempre que houvesse a

perspectiva de insuficiência de demanda agregada poderia garantir a

sustentação do pleno emprego. É neste contexto que emerge uma

estratégia de política econômica caracteristicamente keynesiana

(Caravalho, 2008, p.11-12)

Durante esse processo de baixo investimento, o desemprego se eleva e a renda da

comunidade cai, levando à uma recessão econômica. Para evitar esse cenário, é necessária

a atuação do Estado, através de políticas macroeconômicas (Arestis, Ferrari-Filho e Terra,

2015, p.2). Ainda segundo estes autores, as políticas macroeconômicas, tal como

propostas por Keynes são importantes por três motivos: são importantes âncoras para as

expectativas privadas, porque possuem um impacto direto sobre a demanda da economia

– aqui, fundamentalmente, a política fiscal -, podendo substituir os gastos privados

sempre que elas forem reduzidas. Por fim, as políticas macroeconômicas podem criar uma

estrutura institucional mais estável.

A política fiscal é uma forma do Estado tentar sustentar expectativas positivas sobre as

decisões de investimento dos empresários ao manter uma demanda efetiva mais elevada.

Dessa forma, ela atua como um sinal ao mercado de que o governo está gastando e

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35

investindo para manter a eficiência marginal do capital mais elevada e assim, criar

condições satisfatórias para fomentar o investimento privado.

Então, as políticas macroeconômicas são o verdadeideros “sinais de

mercado” na economia Pós-keynesiana, servindo como base em acerca,

da qual homens de negócios formam suas boas expectativas em suas

decisão-realização do processo de investimento (Arestis, Ferrari Filho

e Terra, 2015, p.3)

Minsky (2013, p.336-337) considera que, nesse contexto, é inevitável a intervenção do

que ele chama de Estado Grande (big government), cujo objetivo é realizar gastos

públicos que sustentem os lucros da economia. Com esse objetivo, a atuação do déficit

público é fundamental para conter novas depressões:

Graças a ele [Estado Grande], a marcha para as grandes depressões é

interrompida por vigosos déficits governamentias que sustentam ou

até aumentam os ganhos empresariais. Com a preservação dos lucros,

os níveis de emprego são garantidos ou até aumentados (ibid, p.336)

A política fiscal em Keynes, portanto, é um importante instrumento não só para evitar

que novas depressões venham a acontecer, como para estimular o próprio crescimento

econômico, via aumento da renda e do emprego.

Dentro dessa perspectiva proposta por Keynes, a política fiscal não deve ser executada de

qualquer maneira, mas ela deve ser feita, justamente, para criar, via demanda efetiva mais

alta, expectativas favoráveis quanto à evolução da eficiência marginal do capital – ou dos

rendimentos esperados – evitando a própria flutuação do investimento e,

consequentemente, da própria economia.

1.5 Política fiscal e a prevenção das flutuações da economia

O gasto público, dentro dessa visão, não pode ser interpretado como meramente como

gasto desenfreado por parte do Estado e, consequentemente, a economia consegue sair da

crise. Lopreato (2013, p.4-5) mostra que Keynes defendia ações no curto prazo, como

resolver problemas mais emergenciais, e de longo prazo, ligados mais à manutenção da

demanda agregada em níveis adequados.

Nunca é demais insistir que, no contexto particular da Grande

Depressão, Keynes defendia o aumento do gasto público e não dava

maior importância para diferenciar sua natureza, pois o crucial naquelas

circunstâncias era elevar o gasto e, junto, a dívida do governo (Afonso,

2012, p.72-73)

Page 36: André Bologna de Castro Cardoso

36

Em um contexto grave de depressão econômica, realmente, o que importa é que o Estado

realize uma política fiscal ativa, independente da qualidade do gasto. A famosa ideia de

cavar buracos, de construir catedrais, pirâmides e mansões (Keynes, 2012, p.198) como

forma de recuperação da economia são exemplos extremos e irônicos, mas que indicam

que em uma situação grave, tal como foi a Grande Depressão, qualquer gasto seria válido

para acabar com ela. Podemos tomar, assim, a ideia de gasto público indiferenciado como

uma exceção – em situações extremas de debilidade econômica - dentro da política fiscal

tal como proposta por Keynes.

Superada a crise, em outro contexto, quando muito da oscilação,

Keynes introduziu o debate sobre a natureza e a qualidade do gasto

público como parte dos esforços para evitar que a depressão voltasse a

se repetir e, se isso ocorresse, ao menos para tentar atenuar seus

impactos. Nessas novas circunstâncias, o governo gastar em

investimento passaria a fazer diferença em relação às demais despesas

(Afonso, 2012, p.74)

A ação governamental não deveria estar focada no curto prazo, e sim, em ações voltadas

para o longo prazo, as quais deveriam constituir o cerne da política fiscal. Keynes (1980,

p.322-323) argumenta que o objetivo da política fiscal é prevenir longas flutuações

através de um programa de longo prazo, que se derem certo, não será difícil compensar

pequenas flutuações, através da antecipação (para estimular a economia) ou atraso (para

desaquecer a economia) de algumas obras do programa de longo prazo. Esse programa

de ação de longo prazo teria papel de manter a demanda agregada e melhorar as

expectativas dos empresários quanto à eficiência marginal do capital.

Uma vez estabelecido um programa de longo prazo de investimentos

produtivos, as oscilações que se apresentarem no curto prazo são mais

facilmente contornáveis, no bojo do próprio programa de longo prazo,

por meio da antecipação de algumas medidas futuras, haja vista o

surgimento dos primeiros sintomas de insuficiência de demanda

efetiva, ou pelo postergar de algum projeto de investimento, porquanto

se percebam quaisquer sinais de excesso de demanda agregada (Ferrari

Filho e Terra, 2014, p.5)

Nesse sentido, o papel da política fiscal é evitar flutuações bruscas no longo prazo,

permitindo, inclusive, amenizar as oscilações no curto prazo.

Se dois terços ou três quartos do investimento são realizados ou

influenciados pelas autoridades públicas ou semi-públicas, um

programa de longo prazo com caráter estável deveria ser capaz de

reduzir o alcance das flutuações a limites muitos mais estreitos do que

antes, quando o pequeno volume de investimento sob controle público

e mesmo quando esta parte tendia a seguir ao invés de coririgr a

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37

flutuação investimento no setor estritamente privado da economia

(Keynes, 1980, p.322)

A política fiscal, pensada como um plano de gastos públicos, voltada para o investimento

público, permite não só tentar manter a eficiência marginal do capital mais elevada, por

meio da sustentação da demanda efetiva no longo período, assim como, o próprio Estado

pode ajudar a amenizar as flutuações de curto prazo com antecipação de certos projetos

incluídos nesse plano para momentos que a demanda estiver baixa, e diminuir ritmo das

obras para quando a demanda estiver alta, visando evitar possíveis impactos

inflacionários.

Portanto, diferenciando as medidas de curto – geradoras de déficit público – e de longo

prazo, dentro dessa dinâmica da política fiscal para Keynes temos que

(...) o desenho da política de investimento de longo prazo teria a função

de criar as condições de a economia alcançar seu pleno potencial de

crescimento e de manter o equilíbrio de pleno emprego, ao passo que o

uso de medidas emergernciais de curto prazo, geradoras de déficit

público, atenderia à necessidade de correção de eventuais

desequilíbrios (Lopreato, 2013, p.7)

Keynes ([1936] 2012, cap.24) utiliza o termo socialização do investimento para designar

essa situação, na qual o Estado atua de maneira mais intensa, via investimentos públicos

– ou até mesmo empresas estatais, que não concorram com o setor privado – de modo a

orientar e estimular, manteando a demanda agregada e a eficiência marginal do capital

em patamares mais altos, para o setor privado a continuar investindo. Ou seja, o Estado

não precisa controlar os meios de produção, como no socialismo, mas manter a eficiência

marginal do capital alta:

Não é a propriedade dos instrumentos de produção que importa ao

Estado assumir. Se o Estado estiver em condições de determinar o

montante agregado dos recursos destinados a aumentar esses

instrumentos e a taxa básica de remuneração dos seus detentores, terá

realizado tudo o que é necessário (ibid, p.344)

Nota-se que a socialização do investimento de maneira nenhuma é feita para rivalizar com

o setor privado6, pois este continua como elemento importante para a economia

capitalista. A função do Estado não é fazer o que o setor privado faz, mas complementar

gastos que não são realizados no período, em que as expectativas estão baixas. Ou seja, é

6 Diferentemente do crowding out defendido por autores de cunho ortdoxo, em que o investimento público

apenas subsitui o investimento privado, no caso de Keynes, o primeiro ajuda a expandir o segundo, de modo

que eles são complementares e não rivais.

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38

manter a eficiência marginal do capital em patamares suficientes para que o setor privado

se veja incentivado a investir e, consequentemente, aumentar o emprego. Gasto público

e dispêndio privado são complementares.

Isto porque, para Keynes, "a socialização do investimento" representa

o único meio de que dispõe o Estado para assegurar o pleno emprego,

diante da instabilidade e insuficiência do investimento privado.

Contudo, não implica isto uma negação do investimento privado, mas

a maneira de o Estado cooperar com a iniciativa privada. Não se trata

de nenhum socialismo estatal, pois não atinge, nem deve atingir, os

meios de produção (Corazza, 1983, p.56)

Nesse sentido, a política fiscal, tal como proposta por Keynes, deveria ser bem mais ativa

no sentido de fomentar investimentos de modo a estabilizar o emprego ao invés de

simplesmente realizar gastos voltados para o consumo, pois ele acreditava que causariam

gerariam mais déficits mais elevados (Keynes, 1980, p.322), pelo fato de seus efeitos

multiplicadores serem menores.

É claro que a proposta de política mais significativa da Keynes para a

estabilização econômica foi a variação dos planos de investimento por

entidades públicas e semi públicas em oposição à variação de renda

através de políticas fiscais. O que é igualmente importante na análise de

Keynes, no entanto, é o tipo de despesa do governo a ser considerada

uma despesa de investimento (Brown-Collier e Collier, 1995, p.345)

Ferrari Filho e Terra (2014) mostram que a preferência de Keynes pelo investimento

produtivo de três pontos: primeiro, de que são as decisões de investimento que geram

riqueza para sociedade; segundo, e como dito acima, os efeitos multiplicadores do

investimento são muito maiores do que os de consumo; e por fim, Keynes não acreditava

que a capacidade produtiva estivesse saturada, de modo que oferta não ultrapassaria a

demanda abrindo espaço para novas inversões.

A não-saturação dos investimentos, ou seja, a possibilidade de elevar o estoque de capital

da sociedade é ponto principal, porque Keynes prefere a utilização do investimento

público a políticas fiscais voltadas para renda e consumo:

Surge então a pergunta, por que hei de preferir uma escala pesada de

investimento para aumentar o consumo. Minha principal razão para isso

é não crer que tenhamos atingido nada parecido com o ponto de

saturação de capital. Seria interessante para o padrão de vida a longo

prazo que aumentássemos materialmente nosso capital. Depois de vinte

anos de investimento em larga escala eu esperaria ter de mudar de ideia.

Até nesse meio tempo, a questão é de grau. Mas por certo, nos primeiros

dez anos após a guerra – eu esperaria mais dez depois disso – não seria

do interesse da comunidade incentivar maiores gastos com comida e

bebida às expensas de gastos com habitação (Keynes, 1980, p.350)

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Além do mais, como esses mesmos autores salientam, os gastos públicos não devem

substituir ou mesmo competir com os gastos privados, mas, ao contrário, eles devem ser

complementares no sentido de que o primeiro deve manter as expectativas positivas dos

agentes privados, de modo a induzi-los a investirem.

Deve-se promover a complementaridade entres as iniciativas privada e

pública sendo que essas últimas, par excellence, devem funcionar como

indutoras das primeiras e, assim, como estabilizadoras das flutuações

cíclicas do sistema econômico. Não é demais salientar que as

expectativas dos agentes são o fator desestabilizador do sistema e que,

portanto, é sobre elas que atuará a política fiscal de gasto com

investimento. Tão claro deve ser isso que Keynes elabora a noção de

orçamento de capital para que o investidor produtivo tenha a atuação

estatal compromissada consigo (Ferrari Filho e Terra, 2014 p.6)

O investimento público pode sustentar a demanda efetiva de duas formas: 1) setor público

irá contratar trabalhadores, os quais recebem uma determinada renda. Eles irão consumir

produtos do setor privado, fundamentalmente, bens de consumo, fomentando a demanda

por esses produtos. As empresas desse setor também contratarão trabalhadores e

comprarão material de outras empresas e assim sucessivamente. Com o multiplicador da

renda, o gasto público inicial irá aumentar a renda da comunidade mais que

proporcionalmente. De outro lado, 2) o Estado necessitará comparar materiais e bens de

capital das empresas desse setor, disparando, novamente, o multiplicador de renda, visto

que as empresas de bens de capital contratarão novos trabalhadores (que irão consumir

bens de consumo) e comprarão máquinas e equipamentos das empresas do mesmo setor.

Para corroborar essa análise, em um estudo sobre o impacto do investimento público no

Reino Unido, Creel-Monteperrus-Veroni e Saraceno (2006, p.398) concluem que o

investimento público possui efeitos permanentes e positivos sobre o PIB:

Note, no entanto, que o investimento público ainda tem um impacto

positivo no PIB real cerca de 5 anos após a ocorrência do choque. De

modo geral, os impactos positivos significativos do investimento

público no crescimento econômico em todo período são maiores que os

impactos negativos significativos (ibid, p.394)

Esse movimento de compra de bens e contratação de trabalhadores, fomentada pelo efeito

multiplicador do gasto, faz com que a demanda efetiva possa se sustentar, incentivando

as decisões de investimento do setor privado, visto que as expectativas se tornam mais

favoráveis. A política fiscal de longo prazo, tal como pensada por Keynes, tem,

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40

justamente, esse intuito de, através do investimento público, permitir que a demanda da

economia se mantenha aquecida, assim como o emprego e a renda estabilizados.

Keynes, portanto, não defendia o uso da política fiscal apenas nos momentos de crise,

mas como forma de preveni-las:

Em outras palavras, uma política anticíclica não é apenas uma política

de investimento público para atenuar os efeitos de uma crise, mas

principalmente uma política que reduza as chances de ocorrência de

novas crises no futuro. É uma política de manutenção da prosperidade

econômica, e não apenas a “economia da depressão (Oreiro e de Paula,

2009, p.1)

A política fiscal deveria ser utilizada para evitar que a insuficiência de demanda agregada

afetasse as expectativas dos agentes de maneira negativa. Diante de um quadro, no qual

houvesse indicativos de que a demanda agregada e a perspectiva futura estariam se

degradando, o Estado deveria utilizar o gasto público para evitar uma crise no momento

posterior, ou seja, a política fiscal não deve ser utilizada após uma crise acontecer, mas,

ao contrário, deve evitar que ela venha a ocorrer:

Nesse aspecto, deve-se ressaltar também que Keynes propunha uma

atuação preventiva da PF [política fiscal] (assim como da política

monetária), e não corretiva. Ou seja, o objetivo da PF deve ser o de

evitar a deficiência de demanda efetiva, e não compensá-la a posteriori

(Hermann, 2006, p.5)

O gasto público, portanto, cumpre o papel de manter a demanda da economia aquecida,

de modo a tornar as expectativas dos agentes, via manutenção da eficiência marginal do

capital acima da taxa de juros, positivas e com isso fomentar o investimento privado.

Diante da insuficiência de demanda efetiva, cabe ao Estado intervir para evitar que as

expectativas negativas quanto ao futuro da economia levem ao aumento do desemprego

involuntário.

A economia não pode ser estabilizada nem suas flutuações serem eliminadas, pois o papel

da incerteza impede com que os empresários invistam na medida exata para se alcançar

o pleno emprego7. A política fiscal, dentro desse contexto, deve ser ativa para sempre

buscar manter as expectativas mais positivas possíveis para evitar flutuações muito

bruscas no nível de investimento, gerando crises econômicas.

7 O próprio Keynes reconhecia a dificuldade de se atingir o pleno emprego: “A demanda efetiva associada

ao pleno emprego é um caso especial, só realizado quando a propensão ao consumo e o incentivo a investir

se encontrarem em uma relação particular entres si” (Keynes, [1936] 2012, p.24).

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41

Nesse sentido, se a lógica de atuação do Estado deve ser essa, principalmente, através de

um programa de longo prazo, voltado para atividades produtivas que possam estimular a

economia e proteger – ou mesmo aumentar – o emprego, é necessário uma forma de

estruturar essa função do Estado, já que além de ser esse elemento exógeno a manter a

demanda da economia, ele possui outras funções dentro da sociedade, tais como prover

serviços básicos à população.

Com o intuito de mostrar esse importante papel do Estado de manter a demanda da

economia aquecida, Keynes defendia que o Estado deveria utilizar a política fiscal com

maior foco no investimento público e dando importância menor para os gastos correntes.

1.6. Investimento público e gastos correntes

Keynes não só defendia que o Estado deveria intervir na economia, via gasto público,

para manter a demanda agregada, como propunha uma forma de gerir o orçamento

público, no sentido de priorizar determinados gastos com o intuito de atingir esse objetivo.

Como visto, este autor acreditava que a melhor forma de evitar as flutuações da demanda

efetiva era um plano de longo prazo por meio de investimentos públicos, principalmente,

em infraestrutura. Nesse sentido, o orçamento público deveria refletir essa situação, já

que, como escreve Carvalho (2008, p.21), o Estado cumpre importante papel na

economia, tanto ao prover serviços básicos à população, mas ao mesmo tempo evitar a

flutuação da economia.

Desse modo, como aponta esse autor (ibid, p.22), a proposta de Keynes para evitar

conflito entre essas duas tarefas era “a separação entre os dois orçamentos se destinaria

precisamente a separar aquelas funções de Estado que não podem ser adiadas ou

suprimidas, nem mesmo temporariamente, daquelas cuja função seria anti-cíclica”. De

certa forma, o objetivo de Keynes era separar o orçamento de modo a facilitar e tornar

mais eficiente a intervenção estatal, separando, de maneira adequada, esses dois tipos de

ações, os quais são diferentes.

Segundo Lopreato (2013, p.6-7), essa divisão se daria em duas contas: corrente e o capital.

O primeiro se refere às atividades ligadas à administração pública e aos gastos correntes,

sendo que esse orçamento deveria ser superavitário e financiado pelos próprios impostos,

enquanto o capital, o qual é aquele em que se computam os gastos com investimentos

públicos, poderia ser deficitário, pois, ele paga a si mesmo (Keynes, 1980, p.277 e 320-

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42

322), visto que ele é capaz de gerar renda para a economia e, portanto, suas próprias

receitas.

A saída proposta por Keynes passava pela elaboração de dois

orçamentos fiscais, o de gastos correntes e o de gastos de capital. O

primeiro cobriria as despesas rígidas, inadiáveis do governo, destinadas

a garantir a oferta de bens públicos na medida necessária. O orçamento

corrente, segundo Keynes, teria de estar equilibrado todo o tempo. Já o

orçamento de capital seria ativado quando a demanda agregada se

afastasse do nível de pleno emprego, acima ou abaixo desse nível

(Carvalho, 2008, p.21-22)

Para Keynes (1980, p.277) as flutuações, como visto, seriam melhor controladas se

houvesse gastos públicos voltados para investimentos de longo prazo. Ele afirma que

orçamento ordinário deve ser superavitário de modo a ser transferido para o orçamento

capital, o qual tira o peso morto da dívida para atividades produtivas. Os gastos com

custeio geram menos impactos na economia, pois não estão ligados ao aumento da

capacidade física, desse modo, são menos preferíveis ao investimento produtivo (Afonso,

2012, 82) como forma de evitar movimentos de retração da economia.

Como apontam Ferrari Filho e Terra (2014, p.4), o receio de gerar déficits no orçamento

corrente se deve, primeiramente, à criação de dívidas, para financiar esses gastos, sem

que nenhuma contrapartida produtiva; em segundo lugar, haveria aumento da taxa de

juros, em decorrência da concorrência por recursos com o setor privado, já que não

haveria aumento do estoque de capital da economia; e por fim, risco de dependência do

crescimento e do perfil da dívida, sendo que o Estado poderia ficar preso à necessidade

de emitir dívidas novas para pagar as antigas. Portanto, o orçamento corrente

(...) deveria ser, sistematicamente, equilibrado e, quando possível,

superavitário. Estes superávits, idealmente, deveriam ser gerados pelo

aumento endógeno da receita do governo, isto é, através do aumento da

base de arrecadação (a renda agregada) e, portanto, nos períodos de

maior prosperidade econômica. Nessas fases, os recursos excedentes do

governo deveriam formar um fundo para financiar os gastos públicos

em investimentos, necessários nos períodos de deficiência de demanda

efetiva (Hermann, 2006, p.4)

Por outro lado, o orçamento capital, como próprio aponta Keynes (1980, p.320) “Mais do

que isso, a própria razão pela qual a despesa de capital é capaz de se pagar a si mesma a torna

muito melhor em termos orçamentários e não envolve o aumento progressivo de dificuldades

orçamentárias”. O gasto com investimento público não só é ideal por aumentar a

capacidade produtiva da economia e evitar flutuações econômicas, como gera seus

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43

próprios retornos pelo aumento da arrecadação, decorrente da maior indução na atividade

econômica.

Segundo, Lopreato (2013, p.6), a ação pública no fomento ao investimento – tanto em

termos de custos quanto em receitas – se parece com o do setor privado, provendo garantia

de retorno e gestando as próprias condições de se financiar: “Além disso, o investimento

ainda apresentaria outra vantagem: contribuiria para produzir indiretamente um retorno (via

aumento de receita) que ajudaria a pagar o próprio custo do projeto” (Afonso, 2012, p.79).

Assim sendo, o orçamento de capital é aquele em que se discriminam

as despesas referentes a investimentos produtivos feitos pelo Estado a

bem da manutenção da estabilidade do sistema econômico. Esses

investimentos devem ser realizados por órgãos públicos ou semi-

públicos, desde que com objetivos claros de regulação do ciclo

econômico (Ferrari Filho e Terra, 2014, p.6)

Essa distinção entre os orçamentos e o maior papel dos investimentos produtivos

decorrem de seus efeitos macroeconômicos e de ampliação da estrutura física. Como

aponta estudo do FMI (IMF, 2014, cap.3), investimento público em infraestrutura, por

exemplo, traz dois resultados para a economia, sendo o primeiro aumento da demanda

agregada – visto que para construir pontes, rodovias, portos e etc, é necessário contratar

uma enorme gama de trabalhadores e de fornecedores– e em segundo lugar, ocorrerá um

fenômeno de crowding in, em que o gasto público estimula o setor privado a realizar

novos investimentos.

No curto prazo, aumenta a demanda agregada através do multiplicador

fiscal de curto prazo, semelhante a outros gastos do governo, e também

por potencial crowding in no investimento privado, dada a natureza

altamente complementar dos serviços de infra-estrutura (ibid, p.78)

Investimento em capital físico, tais como estradas, portos, telecomunicações são

investimentos públicos importante, os quais permitem não só aumentar o estoque de

capital físico, como reduzir custos do setor privado, visto que com a infraestrutura

implementada, a logística, por exemplo, se torna mais eficiente, e permite ampliar a

produtividade da economia.

1.7 Multiplicador fiscal

Para entender melhor a dinâmica do gasto público na teoria proposta por Keynes, é

necessário compreender outros dois conceitos fundamentais – que basicamente são a

mesma coisa - desse arcabouço: multiplicador da renda e o fiscal. Introduzindo o

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44

primeiro, Keynes ([1936, 2012, p.102-103) argumenta que multiplicador é a razão entre

o emprego total e o emprego relacionado ao investimento – ou melhor, ao gasto realizado

na economia. Basicamente, multiplicador mostra o quanto a renda se eleva, decorrente de

um aumento do investimento.

Keynes (1933) argumentava que um determinado investimento inicial – como em

estradas – gera um incremento de empregos indiretos em outros setores – como

transportes e compra de materiais – que, por sua vez, irão gerar mais gastos nas compras

de outros bens.

Para corresponder aos gastos ampliados dos salários e lucros que estão

associados ao emprego primário, a produção de bens de consumo é

incrementada. Aqui novamente salários e lucros são ampliados e o

efeito será transmitido, embora com intensidade reduzida. E assim se

segue ad infinitum (Kahn, 1931, p.173 apud Leite, 2014)

É possível estabelecer uma razão entre rendimento de investimento, ou entre o emprego

total e aquele diretamente relacionado com investimento. Essa razão é denominada de

multiplicador, como explica Keynes [1936], 2012, p.104). Segundo ele, 𝝙Y = k𝝙I, em

que k é o multiplicador, o qual indica que quando há um acréscimo no investimento,

haverá um aumento na renda em k vezes ao investimento inicialmente realizado.

Basicamente, a ideia do multiplicador é a de que um gasto inicial levará ao aumento da

renda naquele setor, em que se gerou o gasto primário. Com esse aumento da renda, os

trabalhadores poderão consumir bens – e mesmo os empresários irão investir mais – nos

demais setores da economia, elevando o emprego e a renda nestas outros, levando ao

círculo virtuoso de aumento da renda e do emprego.

Se a atitude psicológica da comunidade a respeito do consumo fosse tal

que induzisse, por exemplo, a consumir nove décimos de um

incremento de rendimento, o multiplicador k seria igual a 10, e o

emprego total gerado por um incremento como o de obras públicas seria

dez vezes superior ao emprego primário mobilizado por essas obras

públicas, supondo que não houvesse redução de investimentos nos

outros setores (Keynes, [1936], 2012, p.105)

Dessa forma, um gasto autônomo inicial, como investimento, gera renda que,

consequentemente, será gasta com compra de bens e assim tem-se uma sucessão de

gastos:

O efeito multiplicador decorre do fato de que este aumento da produção

e da renda do setor, igual ao do dispêndio inicial com investimento,

estimula um gasto adicional em consumo que aumentará a produção e

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45

renda do setor produtor de bens de consumo, e assim sucessivamente

(Cerqueira, 2016, p.7)

O multiplicador fiscal segue essa mesma lógica do multiplicador da renda. Segundo

Moura (2015) é a variação da renda nacional e a variação dos públicos. Um multiplicador

acima de 1, por exemplo, indica que um real de gasto público gera uma renda maior que

um real na comunidade. Isso decorrente, ainda segundo esse autor, porque os gastos

públicos irão estimular o dispêndio privado – seja consumo ou investimento – gerando

um círculo virtuoso da renda.

O termo multiplicador fiscal tem sido utilizado de várias maneiras na

literatura. Em termos gerais, descreve os efeitos das alterações nos

instrumentos fiscais sobre o PIB real. Normalmente, é definido como a

proporção da variação do PIB real para a variação no saldo fiscal. Neste

artigo, comparamos os efeitos sobre o PIB real de diferentes

instrumentos fiscais (Coenen et al, 2010, p.10)

O multiplicador fiscal indica que aumento do gasto público, ao incentivar a demanda

agregada, estimula não só maior consumo como maiores investimentos na economia. Por

isso que um determinado volume de gastos do governo levará ao aumento como

proporção maior da renda da sociedade. O multiplicador é o elo entre o gasto do governo

e o gasto privado adicional, de modo a gerar um círculo virtuoso de expansão da renda.

Como um gasto original do setor público induz uma série de gastos

adicionais em consumo, em face de uma deficiência de demanda

agregada o gasto público necessário para alcançar ou manter o pleno

emprego será inferior à deficiência observada, já que se poderá contar

também com um aumento da demanda de consumo (Carvalho, 2008,

p.16)

É o multiplicador fiscal que indica que o dinamismo e a própria eficácia do gasto público,

pois a partir dele é que se pode ver de modo mais concreto como gasto público inicial

gera impactos na economia, seja elevando a renda e o emprego da comunidade, seja

aumentando as receitas públicas. Dessa forma, multiplicadores elevados indicam maior

dinamismo e eficácia da política fiscal. Por isso, é importante apresentar alguns estudos

empíricos para mostrar essa questão.

A discussão sobre multiplicador fiscal é controverso dentro da literatura econômica,

segundo Pires (2009), pois os mecanismos de transmissão podem variar, gerando

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46

resultados diversos sobre o multiplicador8. Como nossa discussão é sobre visão

keynesiana de multiplicador9, e sendo este “a soma dos termos de uma progressão

geométrica de razão igual à propensão marginal a consumir” (Pires, 2009, p.3), os

multiplicadores keynesianos tendem a estar em torno de 2.

Em sua versão mais simples é possível amortecer o efeito multiplicador

pela propensão marginal a importar. Nesses termos, não é difícil

encontrar um multiplicador fiscal maior que 2 (dois). Por exemplo, em

uma economia fechada, com uma propensão marginal a consumir de

0,6, o multiplicador dos gastos é 2,5. Em uma economia aberta com

propensão a importar de 0,1, o multiplicador fiscal é exatamente igual

a 2 (ibid, p.3)

Eggersston e Krugman (2010, p.20-21) utilizam um modelo, no qual os agentes sofrem

de restrição de liquidez para pagarem suas dívidas, e por isso precisam se desalavancar.

Como esses autores argumentam, diante desse quadro, o gasto desses agentes depende da

renda corrente e não da renda futura. Isso faz com que o multiplicador fiscal esteja em

torno de 1,5 a 2, o que é bem elevado. O multiplicador é elevado, pois 1) aumento dos

preços – decorrente da expansão fiscal – reduz o peso real das dívidas; 2) eleva a oferta

agregada da economia, visto que preços maiores incentivam maior produção (ibid, p.21)

Qazizada e Stockhammer (2014) procuraram analisar o multiplicador fiscal nas

contrações e expansões de 21 países na OCDE para o período correspondente entre 1979

a 2011. Segundo conclusão destes autores, para períodos de contração da economia, o

multiplicador fiscal gira em torno de 3, sendo baixo para períodos de expansão da

economia.

Os resultados devem ser interpretados como multiplicadores de curto

prazo. Achamos que o tamanho do multiplicador realmente difere

substancialmente nas diferentes fases dos ciclos econômicos. Embora

os multiplicadores estejam perto de um no aumento, eles são

substancialmente mais altos, cerca de 3 na contração. Nossos resultados

também indicam que os resultados não são conduzidos por episódios

em que a política monetária está sendo limitada pelo limite inferior de

inflação zero (...) Em geral, nossos resultados sugerem que a política

fiscal é uma ferramenta potente para políticas econômicas anticíclicas

(ibid, p.21-22)

8 Não queremos adentrar nos diversos mecanismos de multiplicador fiscal, visto que é uma discussão

complexa e não é o foco desse dissertação. Para análise mais detalhada ver Pires (2009). 9 Segundo o próprio Pires (2009) existem vários tipos de multiplicadores, refletindo uma determinada visão

teórica sobre o impacto do gasto público. Além do multiplicador keynesiano, há o multiplicador clássico,

o qual é baixo comparado ao keynesiano, visto que não consideram o gasto público importante como

Keynes. Para uma análise desses vários multiplicadores, ver Pires (2009) e Pires (2011).

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47

Em um dos estudos mais famosos sobre multiplicadores fiscais, Blanchard e Perotti

(2002, p.14-15) analisaram o impacto do gasto do governo na economia. Eles

encontraram resultados para o multiplicador fiscal que variam de 0,90 a 1,29.

No estudo de Auerbach e Gorodnichenko (2011, tabela 1, p.26) trazem uma análise

interessante sobre resultados de multiplicadores. Eles fizeram uma divisão para o impacto

do multiplicador fiscal para períodos de recessão e de expansão da economia. Para os

gastos totais, o multiplicador pode variar de -0,33 a 0,57 em períodos de expansão e de

0,24 a 2,48 em períodos de recessão, indicando que o multiplicador fiscal é maior em

períodos ruins da economia.

Encontramos, também, outros resultados de multiplicadores fiscais. A tabela 1 mostra os

multiplicadores fiscais para determinados gastos públicos, baseando-se no ARRA

(American Recovery and Reinvestment Act). Esses dados mostram que os investimentos

públicos em infraestrutura possuem um alto efeito multiplicador, quase chegando a 2. Em

seguida, medidas de assistência social, como seguro-desemprego e outras de

complementação da renda, também possuem um alto efeito multiplicador, visto que elas

acabam incentivando o consumo. Contudo, esses dados mostram a superioridade do

investimento público em ampliar o PIB.

Tabela 1 – Multiplicadores fiscais para determinados gastos nos Estados Unidos

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de Bivens (2014)

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

1,4

1,6

1,8

2

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48

Outros indicadores de multiplicadores fiscais, decorrentes dos investimentos públicos é

dado pelo trabalho realizado pela Standard & Pools (2015) analisando o impacto do

multiplicador fiscal em vários países, tem-se que investimento público, principalmente,

em infraestrutura, pode chegar a níveis muito elevados em diversos países, como Reino

Unido, Brasil, China e India, cujos multiplicadores passam de 2, ou seja, para esses países,

cada um dispendido em investimento público, aumenta-se dois a renda gerada.

Tabela 2 – Multiplicadores fiscais em diversos países

Fonte: Stantard & Pool (2015)

Pires (2009) realizou um estudo para analisar o impacto fiscal sobre a economia, através

do multiplicador, para o segundo trimestre de 1996 até segundo trimestre de 2011. Ao

incluir investimento público no modelo, seus resultaram chegaram a um multiplicador de

0,99 para consumo do governo, enquanto o multiplicador do investimento público gira

em torno de 1,26, gerando um impacto muito maior.

Em outro estudo para Brasil – agora com modelos MS-DIR -, Pires (2014, p.81-82)

mostrou, para o Brasil, o consumo do governo não foi significativo em nenhuma

especificação, enquanto investimento público foi significativo em todos. O multiplicador

deste último se situaria em torno de 1,6 a 1,7, novamente indicando a importância do

investimento público para crescimento da economia.

O que a ideia do multiplicador fiscal e os dados mostram é que o gasto público,

principalmente, o investimento público, possuem uma forte capacidade de incentivar a

economia, visto que, pensando no Brasil, um real dispendido em investimento leva ao

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49

aumento de dois e meio reais no PIB. A ideia do multiplicador é importante para

demonstrar que o gasto público gera um efeito dinâmico na economia. Esse dinamismo

se dá, pelo que já apresentamos, mas precisa ser melhor detalhado: o gasto público inicial

gera incentivo para que novos gastos sejam realizados, aumentando a renda da

comunidade, assim como as próprias receitas públicas se elevam.

1.8 Dinamismo do gasto público

Todas essas considerações anteriormente feitas sobre o papel do gasto público para evitar

as flutuações econômicas e da importância do multiplicador fiscal para que o gasto

público gere cadeia de novos gastos que irão permitir que a economia não entre em uma

espiral negativa ou mesmo evite quedas mais acentuadas no produto indicam que o gasto

público tem efeitos dinâmicos não só sobre a economia, mas, também, para o próprio

orçamento do Estado. O ponto a ser entendido é que o próprio dispêndio público gera

suas receitas, permitindo o equilíbrio fiscal no médio/longo prazo.

Com o aumento inicial da renda e do emprego gerado pelo gasto inicial, no segundo

momento haverá maiores dispêndios com consumo e reativação do gasto privado, diante

da recuperação da economia. Nesse momento, no médio/longo prazo, com o crescimento

econômico retornando, as receitas do governo aumentam e o déficit inicial é zerado, ou

seja, o próprio efeito multiplicador do gasto público gera suas receitas (Afonso, 2009).

Moura e Alves (2012) afirmam que, quando o orçamento do governo após a

implementação do gasto for superavitário, então, isso significa que ele conseguiu

estimular os agentes a gastarem na economia, o que, indica, portanto, que o Estado não

precisa criar tributos, pois os próprios dispêndios realizados se pagam.

A geração de um déficit nos leva a concluir que o gasto público induziu

o setor privado a gastar menos, não gerando aumento significativo na

arrecadação de impostos. Por outro lado, a geração de um superavitário,

nos mostra que o gasto público induziu o setor privado a gastar mais,

gerando grande aumento de impostos (ibid, p.683)

Ou seja, o dispêndio público é capaz de gerar o próprio equilíbrio orçamentário

intertemporal:

Keynes manifestava uma clara preferência por políticas preventivas que

fossem capazes de evitar flutuações em larga escala no nível de

produção e de emprego. O sucesso dessas políticas de prevenção seria

capaz de garantir o equilíbrio intertemporal do orçamento público, ao

manter elevados os níveis de renda e de emprego (Oreiro; de Paula,

2009, p.1)

Page 50: André Bologna de Castro Cardoso

50

Keynes (1933) mostra que o dispêndio com obras públicas leva à geração de outros

empregos relacionados, tais como compra de materiais e uso de transportes, o que gera

uma renda adicional. Porém, esse processo continua, pois os salários e rendas pagas nesse

processo inicial serão utilizados para realizar ainda mais compras, gerando mais

empregos e renda.

As receitas do Estado estão ligadas ao ciclo econômico, ou seja, quanto maior a renda,

maiores os tributos. Nesse sentido, o próprio equilíbrio fiscal seria alcançado, pois diante

do aumento da gerado pelo multiplicador do gasto público inicial haverá um aumento das

receitas, o qual permitirá cobrir os gastos. Portanto, não há nada de irresponsável nesse

tipo de política (Carvalho, 2008).

Segundo esse mesmo autor, a política fiscal keynesiana não é uma política de déficits

constantes ou de gastos elevados sempre. Este deve manter seu orçamento equilibrado

em períodos de expansão, e aumentar seus gastos no período em que os empresários estão

investindo abaixo da demanda efetiva necessário para a manutenção do emprego.

Lopreato (2013, p.7) argumenta que o déficit público só deveria ser utilizado em última

instância, caso a política de investimento falhasse. Nesse sentido, se realmente o

programa de longo prazo não conseguisse atender ao objetivo desejado – sustentar as

expectativas empresariais e fomentar o investimento privado a reboque -, então as

despesas correntes poderiam ser deficitárias.

Bem distinto disso é a proposta de que se o volume de investimento

previsto, por qualquer que seja a razão, falha em garantir o equilíbrio, a

falta de demanda poderia ser alcançada pelo desequilíbrio, de uma

maneira ou outra, do orçamento corrente. É claro que este seria o último

recurso, adotado apenas no caso de o aparato do orçamento de capital

falhar (Keynes, 1980, p.352)

Ainda que orçamento equilibrado seja importante dentro dessa dinâmica, o gasto público

não pode ser igual a todo momento e a todas as situações (Afonso, 2009). A

discricionariedade da política fiscal é um elemento importante como forma de manter a

dinâmica do capitalismo. Isso porque, a economia está sempre em mutação de modo que

as convenções que sustentam o gasto privado estão sempre oscilando, gerando a

necessidade de que o Estado intervenha para evitar retração da economia. Saber o quando

e o onde gastar os recursos públicos é fundamental para que o dinamismo do capitalismo

se mantenha.

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51

Assim, os pós-keynesianos, propensos a recuperar o pensamento de

Keynes, veem a questão fiscal como um instrumento a ser usado para

impulsionar a economia. Não se advoga a permanência de déficits

estruturais, mas sim a importância do aumento dos gastos públicos em

momentos em que a economia se encontra em situação de contração.

Neste caso, não se pode pensar em redução de gastos, pois os efeitos

sobre a economia seriam desastrosos (Montes e Alves, 2012, p.674)

Inclusive, como argumentam Brown-Collier e Collier (1995, p.344), o investimento

público é a forma de se combater um déficit público, pois esta seria resultado da queda

nas receitas causada pela baixa na atividade econômica. Para elevar as receitas públicas,

o investimento público, ao criar renda – seja de modo direto ou fomentando o

investimento privado – consegue elevar as receitas e reduzindo ou mesmo eliminando o

déficit público.

Ao contrário do que os críticos pressupõem, a estratégia keynesiana de gasto público não

se confunde com excessivos déficits do governo, visto que existe uma cadeia de eventos

importante por trás da realização de uma política fiscal expansionista. Inicialmente, a

expansão inicial de gastos deve ser financiada pela colocação de papéis de curto prazo no

mercado monetário para se aproveitar dos saldos inativos da preferência pela liquidez dos

agentes (Carvalho, 2008). Nesse momento, haveria um déficit fiscal, em que os gastos

públicos reativariam a demanda – através de obras públicas, gastos sociais e etc. –

contrabalanceando o efeito negativo da retração do gasto privado.

Vemos que dependendo da forma como o déficit acontece, no curto prazo, se por gastos

correntes ou com capital, o impacto sobre a economia é diferente e, consequentemente,

para a própria arrecadação fiscal. O investimento público gera maior dinamismo na

economia, pois gera empregos direitos e fomenta o investimento privado, pela

manutenção de uma demanda efetiva mais alta, o que eleva a renda da comunidade e

assim, se incrementam as receitas públicas, sem necessidade de incorrer em aumentos na

carga tributária. Como visto, a capacidade do orçamento do capital financiar a si mesmo

faz com que não haja necessidade de se cobrar mais impostos no futuro para financiar o

déficit, porque ele mesmo se equilibra no médio e longo prazo.

O gasto com investimento público leva um tempo para que gere seus efeitos positivos

sobre a economia e sobre a arrecadação pública. Dessa forma, é possível que o Estado,

no curto prazo, incorra em déficits para financiar esses gastos. A questão desse

financiamento, se via impostos ou via dívida pública é fundamental para Keynes,

principalmente, ao contrário do que argumenta a Equivalência Ricardiana, para

Page 52: André Bologna de Castro Cardoso

52

demonstrar a diferença, em termos de impacto sobre a economia, entre as duas formas de

financiamento.

1.9 Impostos e dívida pública

Como será visto mais adiante, a teoria da Equivalência Ricardiana mostra que o

financiamento via impostos ou emissão da dívida pública possuem o mesmo efeito, pois

a segunda seria equivalente a um aumento de tributos no futuro. O déficit público,

independentemente de como é financiado, não possui impacto na economia, pois os

agentes racionais sempre irão esperar aumento de impostos no futuro, fazendo com que

eles reduzam o consumo hoje. Essa é o princípio da Equivalência Ricardiana com a qual

trataremos no capítulo posterior.

Colocada essa síntese, é preciso realizar uma outra discussão em torno da política fiscal

keynesiana: impacto do déficit, para Keynes, será o mesmo se o Estado optar pelo gasto

público ou por redução de impostos? E segundo, para este mesmo autor, financiamento

via impostos ou endividamento público são equivalentes?

Para Keynes, a questão dos impostos possui elemento importante dentro da sua concepção

de política fiscal. A maior relevância da tributação está associada com melhor

redistribuição de renda, como aponta Belluzzo (2016, p.92), com intuito de cobrar mais

impostos dos mais ricos e distribuindo para os mais pobres, cuja propensão marginal a

consumir é mais elevada.

O sistema fiscal deve ser construido para permitir redistribuição de

renda dos mais abonados – especialmente, mediante a taxação dos

elevados rendimentos e heranças – para as classes menos favorecidas,

com o objetivo de manter o consumo crescendo à mesma velocidade da

expansão da renda (ibid, p.92)

A melhor distribuição de renda na sociedade permite que os recursos disponíveis para o

consumo não fiquem concentrados nas mãos das classes mais favorecidas, com uma

menor propensão a consumir, podendo ser disponibilizados, por meio da política fiscal,

para os menos favorecidos, os quais manteriam a propensão marginal a consumir da

sociedade mais elevada, reduzindo a necessidade de grandes volumes de investimento.

Supondo que o Estado aplique as receitas desses impostos nas suas

depesas comuns, de modo que os impostos sobre rendimento e o

consumo se reduzam ou anulem correspondemente, é naturalmente

inegável que uma política fiscal de altos impostos sucessórios leve ao

aumento da propensão ao consumo. (Keynes, 2012, p.340)

Page 53: André Bologna de Castro Cardoso

53

A política tributária keynesiana, nesse sentido, tem como foco proporcionar melhor

distribuição de renda e com isso elevar a propensão a consumir da sociedade.

Se a política fiscal for utilizada como um instrumento deliberado para

promover uma maior igualdade na distribuição de rendimentos, o seu

efeito sobre o aumento da propensão marginal a consumo será,

naturalmente, ainda maior (ibid, p.85-86).

Como aponta Afonso (2012, p.63-64), o objetivo da política de impostos, tal como

proposto por Keynes, é alterar as expectativas dos agentes mais do que arrecadar, pois

com impostos mais progressivos, a capacidade de consumir da sociedade se eleva. Assim,

o intuito dessa política é menos questão de arrecadação e mais fomentar a capacidade de

consumo da comunidade:

Mais do que um aspecto formal ou de estilo de redação da Teoria Geral,

importa destacar que, na teoria de Keynes, a progressividade dos

impostos teria uma função eminentemente econômica (ou seja, não

seria pregada apenas para se corrigir uma injustiça natural ou

comtemplar uma demanda de política social): fomentar a propensão a

consumir da comunidade e, por conseguinte, a demanda na economia

(ibid, p.64).

Próprio Keynes destaca que essa política tributária poderia ser mais eficiente em alterar

a expectativa dos agentes do que alterações na taxa de juros:

Os impostos sobre rendimento – particularmente quando são

discricionários contra rendimento “não ganho”, os impostos sobre as

mais-valias, sobre as heranças etc. são tão importante como taxa de

juro, sendo mesmo possível que eventuais modificações da política

fiscal tenham, pelo menos nas expectativas, maior influencia do que a

própria taxa de juro (Keynes, [1936] 2012, p.85).

Como os mais ricos possuem maior propensão a poupar, a política tributária em Keynes

objetiva taxá-los e redistribuir esses recursos para aqueles que possuem maior capacidade

de consumir:

Mesmo suas [ de Keynes] recomendações de politicas tributárias de

distribuição de renda tinham como objetivo central uma questão

macroeconômica: reduzir a propensão média a poupar da economia

para ampliar os efeitos multiplicadores (Gobetti, 2008, p.20).

A elevação de impostos em si, para Keynes, não é um problema, pois se ela for feita por

meio de impostos progressivos – sobre herança, rendas elevadas e etc. – o impacto será

positivo, inclusive para consumo. Portanto, maiores impostos, ao contrário da ideia de

Equivalência Ricardiana, não, necessariamente, levam à estagnação do consumo, mas

pode aumentar a propensão a consumir da sociedade e afetar demanda agregada da

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54

economia. Esta política tributária progressiva afeta positivamente a economia e gera

efeitos dinâmicos, por meio de seus efeitos multiplicadores sobre o consumo.

Por outro lado, é preciso ressaltar que em tempos de crise, Keynes rejeita aumento de

impostos em momento de grave crise econômica. A elevação da tributação –

fundamentalmente, sobre bens de consumo -, nesse período de intensa crise, é danosa

para a economia, pois ao reduzir a renda disponível da sociedade, a tendência é que o

consumo – demanda – se deprima ainda mais:

O menos desejável de todos os métodos de financiamento público

durante a depressão é aquele em que os impostos recaem em grande

parte sobre fundos que se haveriam de gastar se deixados em mãos dos

contribuintes. Os impostos sobre consumo de mercadorias ilustram essa

maneira menos desejável de arrecadar fundos para financiar o

investimento público em períodos de depressão (Dillard, 1964, p.10 )

Se política tributária elevar os impostos de maneira progressiva pode ser considerada uma

política de fomento à demanda, a redução de impostos, dentro da concepção de Keynes,

não é uma política fiscal adequada. Por isso que a afirmação de Krugman (2012, p.VII)

na introdução da edição da editora Saraiva da Teoria Geral do Emprego, do juro e da

moeda, de que: “Um político que promete que seus cortes de impostos vão gerar emprego

ao dar dinheiro para pessoas gastarem é um keynesiano, ainda que jure abominar a

doutrina” não nos parece correta, mas ao contrário.

Uma redução de impostos poderia estimular o consumo e investimento ao pressupor que,

com maiores recursos nas mãos dos agentes, eles utilizariam essa maior disponibilidade

de renda para gastar e investir. Contudo, para Keynes, isso não necessariamente ocorre,

pois, redução de impostos pode levar os agentes não a consumirem mais, mas a ficarem

mais líquidos:

A respeito do déficit, é necessário fixar um ponto importante. Um

déficit pode ocorrer tanto por aumento de despesas quanto por queda de

tributos. Numa situação de depressão, no entanto, só o aumento de

despesas garante aumento da demanda efetiva; queda na tributação

pode gerar, simplesmente, maior demanda de ativos líquidos (Silva,

1996, p.15-16)

Para que tivesse algum impacto na economia, a redução de impostos teria de alterar a

propensão a consumir da comunidade, de modo que elas realmente consumissem a maior

renda disponível:

Para que essa [ demanda] fosse mantida ou elevada seria preciso supor

também que a redução de tributos levasse a um incremento do consumo

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55

porque os contribuintes teriam optado por gastar o aumento da renda

disponível deocrrente da redução dos tributos. Ou seja, teria de ser

alterada a propensão (relativa) para consumir dos contribuintes para que

eles não destinassem o ganho de renda ao aumento da poupança própria

e canalizassem para o consumo e a demanda agregada (Afonso, 2012,

p.30)

Desse modo, o impacto da redução dos impostos sobre a propensão a consumir da

sociedade seria muito reduzido:

Contra o programa de redução de impostos, ele [Keynes] argumentou

que, as pessoas tem padõres de vida estabelecidos, redução dos

impostos que eles [famílias] poderiam contar por apenas um período

muito curto talvez não estimulasse seu consumo – uma primeira

afirmação da renda permanente de Milton Friedman (Skidelsky, 2003,

p.717 apud Afonso10, 2012, p.77)

Contudo, Afonso (2012, p.77-78) mostra que existe uma dualidade em Keynes ao tratar

do impacto da redução de impostos. Em um primeiro caso, propensão marginal a

consumir dificilmente seria alterada, pois as famílias já possuem um determinado padrão

de vida e uma certa estrutura de gastos. Por outro lado, redução de impostos poderia

estimular gasto em si com consumo, mas “isso não atenderia ao seu objetivo (que talvez

fosse disparar o multiplicador da renda)” (ibid, p.78). Como o multiplicador do consumo

é menor que o do investimento, reduzir impostos para fomentar o consumo possivelmente

não gerará impactos profundos na economia.

O corte de impostos seria ineficaz por dois sentidos: primeiro, a maior renda disponível

não necessariamente vai ser utilizada para consumo, podendo ser gasta para pagamento

de dívidas, ou para adquirir ativos financeiros, por exemplo, sem gerar qualquer impacto

no consumo e no efeito multiplicador da economia. Em segundo lugar, a propensão

marginal a consumir da comunidade não é alterada, pois, ao contrário de maior

redistribuição de renda, a redução de impostos não leva à mudança estrutural da sociedade

e está associada a uma política de mais curto prazo, de modo que a estrutura e o padrão

de vida das famílias não é alterada pela diminuição dos tributos.

Além do mais, próprio Keynes (1980, p.319) que esse tipo de política seria complicado,

pois seu impacto seria muito limitado, e mesmo que fosse bem-sucedida, seria muito

10 SKIDELSKY, Robert. John Maynard Keynes 1883-1946: economist, philosopher, States-man. London: Penguin Books, 2003.

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56

difícil elevar os impostos no período em que o emprego estivesse estabelecido em um

nível adequado.

A redução da tributação, em que as pessoas só poderiam confiar por um

período indefinidamente curto, poderia ter efeitos muito limitados ao

estimular seu consumo. E, se fosse bem sucedido, seria

extraordinariamente difícil de um ângulo político elevar a tributação

novamente quando o emprego melhorar (ibid)

Politicamente, portanto, a redução de impostos também não é vista como adequada, visto

que, uma vez que se reduz a tributação, as pessoas se acostumam com esse novo nível de

impostos, o que dificulta a sua elevação no período posterior ao estimulo, podendo gerar

consequências graves para o orçamento público.

Conclui-se, assim, que déficit público como resultado de redução de tributos não gera

impactos positivos na demanda agregada na economia. Aqui, ao que nos parece, a

conclusão a que chega Keynes e a ideia de Equivalência Ricardiana são a mesma – reduzir

impostos não possui impactos positivos sobre a economia – mas por caminhos diferentes.

O ponto fundamental é que para Keynes, reduzir tributos não garante aumento do

consumo, visto que não altera a propensão marginal a consumir e maior renda disponível

pode ser utilizada para compra de ativos financeiros.

Contudo, aumento de impostos no futuro, também, para Keynes, não é algo

necessariamente ruim nem irá reduzir o consumo da sociedade, como defende a

Equivalência Ricardiana. Caso aumento dos impostos seja feito de maneira progressiva,

isso irá gerar uma melhor redistribuição de renda e elevação da propensão a consumir da

comunidade, permitindo, inclusive, reduzir a necessidade de um grande volume de

investimentos.

Em relação à dívida pública, esta possui um papel importante dentro da teoria de Keynes

como forma de financiar déficit público. No quadro de uma depressão, não só o gasto

público é importante, mas o financiamento desse déficit via dívida pública é melhor do

que via impostos:

Mais do que um aumento do gasto (autônomo) que impulsionasse a

demanda, no mundo da Grande Depressão, Keynes também defendia

que aquele incremento fosse feito por meio de aumento da dívida, no

lugar de ser financiado por um aumento de receitas clássicas, como

tributos – ainda mais se estes incidissem justamente sobre os recursos

disponíveis nas maõs privadas e que poderiam ser gastas e destinadas

ao aumento da demanda (Afonso, 2012, p.35)

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57

Segundo Hermann (2002, p.5), em período de recessão, o déficit público seria ampliado

em decorrência tanto da queda das receitas, provenientes da baixa na atividade

econômica, e do próprio gasto público, visando elevar a demanda agregada. Carvalho

(2008, p.17-18), a ordem dos eventos dentro da teoria keynesiana é fundamental. Para

ele, inicialmente, o Estado, para financiar seus gastos, deveria colocar papéis de curto

prazo para se aproveitar dos saldos inativos da preferência pela liquidez dos agentes.

Dentro dessa lógica, o financiamento desse déficit inicial não pode ser feito nem cobrando

impostos nem por emissão de títulos de longo prazo.

Por outro lado, governo também não deveria emitir títulos de longo prazo para se

financiar. Carvalho (2008, p.18) aponta no momento da depressão, o nível de renda é

baixo, visto que o efeito do gasto público não é imediato, de forma que a poupança

necessária para compra desses papéis de longo prazo não foi ainda criada. Sem a demanda

por esses papéis de longo prazo, haverá pressão para elevação da taxa de juros, podendo

deprimir o investimento privado (chamado crowding out).

Hermann (2002, p.5) afirma que, diante de curva de juros ascendente – taxas de juros

mais elevadas para títulos de maturidade mais longa -, o Estado deveria se financiar

através de emissão monetária e empréstimos curto prazo, visto que seriam menos

custosos. Contudo, seria necessária atuação da autoridade monetária “visando adequar a

estrutura de juros e a composição da dívida às preferências dos investidores em termos

de títulos de curto e de longo prazo” (ibid)

Vê-se, assim, porque a sequência de eventos é essencial na abordagem

keynesiana: o processo de expansão da renda não é instantâneo e, por

isso mesmo, não se pode contar em seu inicio com condições de

financiamento do setor público que resultarão da conclusão do processo

(Carvalho, 2008, p.18)

Com o restabelecimento da demanda e aumento da renda decorrente do efeito

multiplicador gerado pelo gasto público, a renda da comunidade se eleva, permitindo

aumento da arrecadação e maior demanda por títulos de longo prazo. O pagamento da

dívida anterior seria garantido por esse mecanismo (Hermann, 2002, p.6):

Quando o processo multiplicador tiver completado o essencial do ciclo

de expansão secundária das despesas de consumo, e a renda tiver se

expandido na medida prevista, haverá uma poupança adicional na

economia de igual valor ao do gasto público que iniciou este ciclo. Parte

dessa poupança existiria sob a forma de aumento da receita de impostos

resultantes da expansão da economia. Se esses recursos forem

insuficientes para cobrir a despesa pública, haverá ainda nas mãos do

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58

setor privado poupança suficiente para absorver os títulos de longo

prazo que o governo poderá agora colocar no mercado (...) (Carvalho,

2008, p.18)

Dentro desse contexto, a emissão de dívida pública, fundada no curto prazo, é

fundamental para que o governo consiga financiar o gasto público e, consequentemente,

a própria renda necessária para garantir o pagamento dessa dívida no médio e longo prazo.

Com o multiplicador funcionando de maneira adequada, o próprio déficit público gerará

as receitas para se pagar, sem a necessidade de emitir mais dívidas – de curto prazo – nem

de elevar a tributação no futuro, como pressupõe a Equivalência Ricardiana, como

veremos.

A edição mais recente da Teoria Geral (Keynes, 2012), com a qual estamos trabalhando,

traz em seu apêndice texto de Keynes comentando sobre dados de Simon Kuznets

referente ao Estados Unidos, ele argumenta em favor da maior utilização dos empréstimos

públicos para financiar os gastos (Afonso, 2012, p.40-41):

O valor pertinente nesse contexto não é tanto a despesa bruta (ou

líquida) do investimento com a construção, mas o montante das

despesas financiadas por um aumento do endividamento. Ou seja, no

caso das autoridades públicas e similares, a melhor forma de atender ao

seu investimento líquido consiste em considerar que é medido pelo

aumento líquido dos empréstimos contraídos (...) Proponho, pois, que

em lugar dos números da construção pública se insiram as depesas sobre

empréstimos dos organismos públicos (Keynes, 2012, p.355)

A emissão de títulos públicos funcionaria de modo mais adequado do que impostos, pois

ela possui influências psicológicas diferentes desta segunda:

Na medida em que as suas despesas são cobertas por transferências

forçadas a partir do rendimento corrente do público, não têm

correspondente na poupança privada. Por outro lado, a poupança

pública, se conseguíssemos encontrar uma definição satisfatória para

este conceito, estaria sujeita a influências psicológicas muito diferentes

das da poupança privada (Keynes, 2012, p.355)

Dillard (1954, p.102-104)11 argumenta que a melhor forma do governo se endividar é

através dos empréstimos bancários, de modo que os bancos utilizem suas reservas

ociosas, em um momento de crise, para comprar títulos emitidos pelo governo. O

endividamento junto aos bancos permite a criação de moeda nova, ao contrário do que

11 Ainda que não seja o melhor interprete de Keynes, utilizamos sua análise, visto que Keynes discutiu

pouco o papel da dívida pública e Dillard foi, dos autores estudados, que melhor com maior profundidade

o assunto.

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59

acontece quando indivíduos compram títulos públicos. Neste último caso, existe apenas

transferência de recursos sem criação efetiva de meios de pagamentos.

Ainda segundo este autor, o impacto de se endividar através dos bancos é que, por

justamente, não ser mera transferência, mas criação de recursos novos, o consumo e o

investimento não são restringidos pelo aumento da dívida pública:

No primeiro caso [endividamento com setor bancário] ninguém

necessita restringir seu consumo ou investimento. O título de dívida é

adquirido com dinheiro novo criado dentro do sistema bancário em

forma de novo dinheiro de talões de cheque. A quantidade total de

dinheiro aumenta com as atividades prestadoras do sistema bancário.

Não se dá transferências ou tradição de meios de aquisição por uma

parte para os gastos do governo; há simplesmente criação de meios

adicionais de aquisição (ibib, p.102).

Ainda que com um impacto menor sobre a renda, os empréstimos junto ao público podem

ser importantes, pois os recursos que estariam ociosos nas mãos dos agentes privados –

portanto, sem gerar qualquer benefício para a economia – são utilizados pelo Estado para

realizar gasto público, em vista de elevar e sustentar a demanda da economia:

As poupanças individuais que de outro modo não teriam talvez

encontrado um escape no investimento, encontram-no em forma de

gasto estatal. A poupança individual que de outra forma teria forçado

uma redução no rendimento até o ponto em que o rendimento social

excede ao consumo agregado de quantia igual ao investimento real, é

contrabalanceado pelo investimento público” (Dillard, 1964, p.103)

Dentro do pensamento keynesiano, há uma hierarquia, em termos de impactos sobre o

emprego e a renda, de financiamento desse gasto público. O maior impacto seria

empréstimos junto aos bancos, porque é possível criar recursos novos, sem afetar

consumo e o investimento. Segue-se, então, empréstimos para com os indivíduos. Em

terceiro lugar, os impactos progressivos, visto que eles têm um papel importante em não

reduzir o consumo. Por fim, o pior método de financiamento seriam os impostos

regressivos – sobre consumo – pois deprimir-se-ia ainda mais uma variável já deprimida

em um cenário de crise.

Dai que os gastos estatais financiados mediante impostos regressivos

sejam muito menos eficientes contra o desemprego do que gastos

financiados mediante impostos progressivos, os quais por seu turno são

menos eficientes que os gastos financiados por empréstimos (Dillard,

1964, p.104).

Analisando essa hierarquia em termos de financiamento, a emissão de títulos públicos e

cobrança de impostos não possuem o mesmo impacto na economia. Como visto, o

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60

aumento da tributação pode ter um papel elevar a propensão a consumir da comunidade,

caso seja feito de modo progressivo. Contudo, em um cenário recessivo, por exemplo, a

elevação da tributação é prejudicial para economia, pois deprime a já baixa capacidade

de gasto da população, piorando o cenário econômico. De um outro lado ainda, política

de redução de impostos pode ser inócua para estimular a economia, dado que os agentes

podem utilizar os recursos disponíveis para comprar títulos ou mesmo ficarem totalmente

líquidos. Toda essa análise sobre política tributária, mostra o quão complexo é a atuação

da política fiscal sobre as variáveis e sobre o comportamento dos agentes.

A emissão de dívida pública é uma alternativa mais interessante de financiamento do

gasto público do que elevação de impostos, pois, em um momento de crise, além de ser

uma alternativa para alocação de riqueza dos agentes, também evita que se retire recursos

das mãos das pessoas, o que poderia estagnar ainda mais o consumo.

Do ponto de vista do financiamento e da própria dinâmica econômica, geração de déficits

por meio de redução da tributação não é um estimulo adequado, visto que não há garantia

de que maior renda disponível será destinada aos investimentos. A melhor forma de

fomentar a economia, como visto pela perspectiva de Keynes, é realização de gastos

públicos, via emissão de dívida pública. Assim, considerar redução de impostos como

uma proposta keynesiana nos parece equivocado.

Conclusão

Procuramos discutir nesse capítulo a importância da política fiscal, principalmente, do

gasto público para visão de Keynes. Percorremos o trajeto de compreensão de sua visão

sobre elementos importantes para a dinâmica do capitalismo e, consequentemente, e seus

problemas. Encontramos na problemática da demanda efetiva, ou melhor, na insuficiência

de um nível adequado de investimento para sustentá-la, o principal motivo para

intervenção do Estado.

O papel da política fiscal é evitar grandes flutuações no nível de investimento, o que

poderia levar à crises e depressões econômicas. O gasto público, principalmente, aqueles

relacionados a investimentos permitem sustentar demanda e tornar expectativas de

rendimento futuros mais altas para os capitalistas, de modo que eles sintam incentivados

a investirem, também.

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61

O ideal para Keynes é que a política de gasto público seja voltada para obras e

investimentos de longo prazo, o que permite não só suavizar grandes flutuações, como

oferece maior margem de manobra para que o Estado possa amenizar volatilidades de

curto prazo. A divisão entre orçamento corrente, o qual deveria ser superavitário, e de

capital, deficitário, indica essa preocupação de Keynes com investimentos públicos e,

com própria questão do orçamento equilibrado.

Dessa forma, focando em investimentos públicos, estes possuem capacidade de gerar suas

próprias receitas, decorrentes do multiplicador da renda. No médio e longo prazo, a

ocorrência de um déficit público, decorrente de elevação dos gastos públicos produtivo,

pode se transformar em superávit, via aumento das receitas públicas. A existência de

déficits públicos só ocorre se a política realmente falhar em seus objetivos.

Keynes, também, mostrou clara preferência pelo gasto público ao invés da redução dos

impostos. Sua visão sobre política tributária é que esta deveria ser voltada para elevação

de impostos sobre renda e sobre herança, com o intuito de distribuir melhor a renda e,

com isso, melhorar a propensão a consumir da comunidade. Nesse sentido, déficit

causado pela redução de impostos não é algo defendido por Keynes, visto que mais

recursos disponíveis não significa que eles serão utilizados para investir ou consumir, mas

podendo ser desviado para outros ativos, como financeiros.

Dentro dessa perspectiva keynesiana, há diferença, em termos de impacto na economia,

de como é feito e financiado o gasto público. Keynes defendia que a gasto público deveria

ser voltado para investimentos produtivos, com maior capacidade de estimular a

economia, e gerar suas próprias receitas no longo prazo. Para financiar o déficit público

de curto prazo, decorrente da elevação dos gastos, a preferência de Keynes é pela emissão

de dívida pública, pois esta não tira recursos diretamente da economia e é uma alternativa

de alocação de riqueza para os agentes econômicos, enquanto a elevação de impostos

tende a deprimir ainda mais o consumo estagnado em uma situação de crise por exemplo.

Assim, redução de impostos não possui o mesmo impacto que gasto público, nem

financiamento de dívida pública é igual elevação de impostos. Essas diferenciações

devem ficar bem claras para que política fiscal proposta por Keynes não seja reduzida a

um mero simplismo, tal como é frequentemente acusado.

Nesse sentido, concluímos que a política fiscal em Keynes possui impactos positivos na

economia, visto que permite amenizar as flutuações econômicas, assim como incentiva o

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62

investimento privado, e, consequentemente, gerar emprego e renda. Por isso,

consideramos que as ações fiscais são eficazes. De outro lado, o gasto público – e mesmo

a política tributária progressiva – é dinâmico, pois permite gerar uma sucessão de eventos,

por meio do multiplicador, que geram mais renda na comunidade e com isso elevar as

próprias receitas do Estado.

No próximo capítulo, analisaremos uma visão contrária a esta, em que a política fiscal

não exerce impacto nenhum e não gera nenhum dinamismo para a economia. A

Equivalência Ricardiana, portanto, parece ser o oposto dessa visão de Keynes sobre a

política fiscal, como veremos a partir de agora.

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Capítulo 2 – Equivalência Ricardiana e negação do papel da política

fiscal

Introdução

Como já discutido na introdução, após os anos 1970, a discussão sobre o papel da política

fiscal se desloca: antes tida como um importante instrumento para afetar a demanda

agregada, nesse momento histórico seu impacto começou a ser questionado dentro do

círculo dos economistas. A criação de modelos e ideias mais sofisticadas, como a

chamada hipótese das expectativas racionais, começaram a questionar a eficácia e o

próprio efeito dinâmico da política fiscal na economia.

A Equivalência Ricardiana, hipótese segundo a qual o financiamento de um déficit

público por meio de impostos ou via dívida pública é indiferente aos agentes, surge no

bojo de um amplo questionamento sobre o papel das políticas econômicas (Lopreato,

2013, p.43-44). É uma crítica direta, portanto, à visão de que o Estado possui algum papel

na questão econômica, tal como propunha Keynes.

O objetivo desse capítulo é apresentar a hipótese da Equivalência Ricardiana, seus

pressupostos e as implicações na política econômica dela decorrente. Além do mais,

procuramos situá-la dentro do próprio debate ortodoxo para tentarmos compreender como

a Equivalência Ricardiana se encaixa no debate econômico.

Iniciamos o capítulo com uma discussão sobre o conceito de Equivalência Ricardiana. Na

seção 2, apresentamos seus pressupostos. Nas seções 3 e 4, mostramos os modelos

intertemporais matemáticos que fundam a base de discussão da Equivalência Ricardiana.

Na seção 5, discutimos as implicações de política econômica decorrentes desse

pensamento. Na seção 6, alguns estudos empíricos e econométricos são apresentados para

ver como a Equivalência Ricardiana é sustentada no debate. E por fim, na última seção,

procuramos entender como ela está inserida no próprio pensamento ortodoxo.

2.1. Política fiscal não altera variáveis reais: Equivalência Ricardiana

O modelo de Equivalência Ricardiana, segundo Snowdow e Vane (2005, cap.3), começa

a ser desenvolvido como uma forma de criticar a teoria econômica convencional anterior,

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a chamada Síntese Neoclássica12, que prescrevia a utilização de políticas econômicas,

principalmente, a fiscal para atingir o pleno emprego e o equilíbrio da economia. Nesse

sentido, o modelo da Equivalência Ricardiana nasce, justamente, para realizar a crítica à

política fiscal, tal como adotada na Síntese:

Uma objeção particular às previsões dessa análise [do modelo da

Síntese Neoclássica] quanto à eficácia da política fiscal que vale a pena

se debruçar é aquela que deriva do que veio a ser conhecido como o

teorema da equivalência Ricardiana da dívida (Snowdown e Vane,

2005, p.111).

A Equivalência Ricardiana é um enfoque, que busca demonstrar que existe igualdade

entre financiar gastos públicos por meio da emissão da dívida pública e o financiamento

via impostos. Nesse sentido, a dívida pública tem o mesmo impacto que aumento de

impostos, pois uma elevação da primeira, leva necessariamente a aumento de tributos no

futuro. A Equivalência Ricardiana mostra que déficits públicos no presente são idênticos

a impostos em um período futuro, não fazendo diferença entre pagar um imposto hoje ou

em um momento mais distante no tempo. (Berheim, 1987, p.264).

O argumento central do enfoque da equivalência ricardiana é que o

financiamento do gasto público com emissão da dívida tem mesmo

efeito sobre atividade econômica que seu financiamento através de

impostos (Hermann, 2002, p.6)

Ou seja, o déficit público e a elevação da dívida pública não geram efeitos sobre a

economia, pois “este teorema afirma que o ônus do gasto do governo no setor privado é

equivalente se é financiado por um aumento na tributação ou pela venda de títulos”

(Snowdow e Vane, 2005, p.111).

A Hipótese da Equivalência Ricardiana é a de que, segundo Barro (1989), mantido o valor

presente – ou seja, trazendo a valores presentes um fluxo futuro – dos gastos públicos,

um corte nos impostos hoje aumenta o valor presente desses impostos, pois, haverá

necessidade de aumentá-los no futuro de modo a financiar esse déficit. Como a

expectativa de demanda das famílias depende dessa expectativa do valor presente dos

impostos, a política fiscal deixa de ter impactos na demanda agregada, visto que, diante

dessa expectativa de aumento futuro dos tributos, os agentes irão poupar hoje para poder

pagá-los.

12 Teoria Econômica, a qual busca juntar as ideias propostas por Keynes com o arcabouço neoclássico. Um

de seus principais focos é prescrição de políticas econômicas para se atingir o equilíbrio. Para maiores

detalhes ver Snowdown e Vane (2005, cap.3)

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O déficit público, independentemente de como é financiado, não tem impactos sobre a

economia, pois os agentes esperam que no longo prazo haverá mais aumentos de

impostos, fazendo com que eles poupem na mesma proporção o valor presente dos

tributos, de modo a financiar essas obrigações futuras (Lopreato, 2013, p.43-44). Essa é

a ideia de equivalência. Ao invés de estimular o consumo e o investimento, a queda da

poupança pública incorrerá em aumento da poupança privada (Barro, 1989, p.37).

As famílias se comportam dessa maneira porque, dada a trajetória de

gastos do governo, uma redução em $1 de impostos no período 1

implica aumento de $1 no valor dos impostos futuros. Dessa forma, o

efeito de tal variação sobre o valor presente dos impostos é nulo.

Portanto, uma redução na poupança do governo levou a um aumento de

igual magnitude na poupança privada desejada, de tal modo que a

poupança nacional não se alterou (Marques Júnior, 2015, p.220)

Consequentemente:

O déficit público não traria, portanto, qualquer benefício em termos de

crescimento econômico, tendo, ao contrário, um impacto negativo

sobre o bem estar da sociedade, representado pelo ônus da dívida a ser

paga pelas gerações futuras. Daí a recomendação de uma PF [política

fiscal] de permanente equilíbrio orçamentário. (Hermann, 2002, p.7)

Nesse sentido, por exemplo, uma redução de impostos não exerce efeitos sobre o consumo

das famílias, pois elas sabem que, no futuro, deverá haver aumentos de impostos para

financiar os gastos governamentais. Portanto, a escolha intertemporal de consumo das

famílias é de poupar hoje para pagar impostos amanhã.

Este ponto de vista equivale à noção padrão dos economistas de que não

existe almoço grátis e os gastos do governo devem ser pagos, agora ou

mais tarde, com o valor presente total das receitas fixados pelo valor

presente total dos gastos. Assim, mantendo fixa a trajetória dos gastos

do governo e as receitas não fiscais, um corte hoje nos impostos deve

ser compensado por um aumento correspondente do valor presente dos

impostos futuros (Barro, 1989, p.39)

Não é apenas a redução de impostos que não terá efeitos. Ainda que a hipótese original

trate os gastos como constantes, Marques Júnior (2015, p.224-225) argumenta que

aumento de gastos do governo, também, leva a um aumento dos impostos futuros, fazendo

com que as famílias devam poupar no presente para pagá-los no futuro.

É importante notar que um aumento nos gastos do governo acarreta um

maior valor presente dos impostos e, por conseguinte, uma diminuição

do valor presente da renda disponível das famílias desde que a restrição

orçamentária intertemporal do governo seja obedecida. Portanto, na

visão neoclássica, a correlação entre consumo privado e consumo do

governo é negativa. (Ibid, p.225)

Page 66: André Bologna de Castro Cardoso

66

Dentro dessa hipótese, o gasto público, ao contrário do que visto dentro de uma visão

como proposta por Keynes, não exerce efeito nenhum na economia. O gasto público não

possui qualquer dinâmica, decorrente do efeito multiplicador, pois os agentes apenas

interpretam o incremento da despesa pública como aumento de impostos futuros e não

como um elemento de ativação da demanda agregada, gerando renda para eles, mas, ao

contrário, reduzirá renda.

Nesse ponto, vale ressaltar que para a Equivalência Ricardiana, a forma como um déficit

público é gerado, seja por meio de aumento dos gastos públicos ou por redução de

impostos, o impacto sobre os agentes é o mesmo. Para eles é indiferente a forma como a

política fiscal é executada, desde que haja a existência de um desequilíbrio fiscal, eles

irão neutralizá-la no momento presente.

A política fiscal, dentro desse quadro, não possui impacto positivo nenhum na economia:

A abordagem da equivalência ricardiana renega a força atribuida à ação

estabilizadora da política fiscal e a controvérsia sobre os efeitos do

gasto público no produto, renda, taxa de juros e preços. A política de

defesa da demanda agregada e o efeito multiplicador são descartados,

dando lugar ao argumento da ineficácia da política econômica na

presença de agentes racionais que antecipam as medidas e adotam

posições contrárias, eliminando o impacto do déficit público e do corte

de impostos na renda e no emprego, anulando assim os efeitos

esperados no momento do anúncio das propostas (Lopreato, 2013, p.45)

A conclusão da hipótese da Equivalência Ricardiana é que, os agentes não alteraram seu

comportamento de consumo, diante de um aumento no déficit público, causado por

redução de impostos ou aumento dos gastos públicos, financiado pela dívida pública.

De acordo com a visão neoclássica, quando se argumenta que

determinado modelo econômico gera como resultado ER [Equivalência

Ricardiana], o que está implícito é que, uma vez mantida a trajetória de

gastos do governo, os agentes não alteram seu caminho de consumo em

virtude de alterações na composição do financiamento destes gastos

(Sachisida e Carlucci, 2010, p.11)

Além de não afetar o consumo – demanda agregada -, o financiamento do déficit público

em virtude do aumento da dívida pública não leva a alterações na própria taxa de juros.

Como aponta Sachisida e Carlucci (2010, p.11), na visão da Equivalência Rciardiana a

dívida pública não afeta variáveis reais, como consumo, taxa de juros e a formação de

capital. Isso acontece porque, a poupança se mantém inalterada na economia, visto que o

déficit público – ou queda na poupança pública – é compensada por elevação da poupança

privada.

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67

Um aumento do déficit implicará, portanto, um aumento igual na

poupança, o que apenas bastará para pagar os impostos futuros

adicionais cobrados sobre as famílias presentes e as gerações

subseqüentes para quem se importam (Evans, 1988, p.85)

A taxa de juros não se altera, porque como os agentes poupam, diante do aumento do

déficit, então, não há necessidade de se aumentar a taxa de juros para incentivar os

indivíduos a pouparem. Por outro lado, no âmbito das contas externas, se a poupança

interna se mantém inalterada, em decorrência do aumento da poupança privada, então,

não há necessidade de poupança externa – a qual faria variar a taxa de câmbio. Desse

modo, a Equivalência Ricardiana nega qualquer influência do déficit público sobre a

economia.

De modo que, os defensores da Equivalência Ricardiana, negando a

visão mais aceita no mainstream, acreditam que a queda da poupança

do setor público será compensada por um aumento equivalente na

poupança do setor privado, sendo que a redução da receita pública

financiada com a expansão da dívida irá manter inalterado o valor da

poupança nacional; portanto, a taxa de juros e o saldo de transações

correntes não são afetados (Lopreato, 2006, p.20).

Ao não alterar a taxa de juros, pode-se notar que o próprio investimento não se altera.

Tomando como base que ele pode ser influenciado pela taxa juros, e esta ficando

constante mesmo com aumento do déficit público, o dispêndio privado não se reduz ao

contrário do que defende a própria teoria convencional, segundo a qual aumentos no

déficit público e, consequentemente, na dívida pública elevam a taxa de juros - pois há

elevação no prêmio de risco exigido pelos agentes – acarretando redução do investimento.

Assim, a questão do déficit público ou da expansão da dívida pública não implicar em

alterações no consumo dos agentes é porque estes irão interpretar esse déficit, financiado

pela emissão de dívida pública como elevação de impostos no futuro, por isso eles

poupam hoje para pagá-los no futuro, de modo que se tornam indiferentes quanto à forma

de financiamento do déficit (Sachisida e Carlucci, 2010, p.11).

Diante da exposição sobre a que se refere o conceito de Equivalência Ricardiana vemos

que sua assertiva é forte ao negar os efeitos do déficit público na economia, em

decorrência de seus efeitos intertemporais para os agentes. O próximo passo deve ser

compreender os pressupostos por detrás da Equivalência Ricardiana, pois eles são

fundamentais para sua construção.

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68

2.2 Pressupostos e o Modelo de Equivalência Ricardiana

O modelo da Equivalência Ricardiana por ser, justamente, um modelo, ele parte de

inúmeros pressupostos para funcionar – os quais, não, necessariamente, são realistas – de

forma a explicar por quê déficits no governo não geram efeitos na economia.

(...) mas, de fato, as fundações teóricas da equivalência ricardiana não

são triviais. A Equivalência Ricardiana requer um número de

pressupostos sobre o comportamento individual e/ou do ambiente

econômico que podem ser falsos (Seater, 1993, p.143).

Dentro da literatura sobre a Equivalência Ricardiana não há consenso exato sobre os

pressupostos, sendo alguns presentes em vários trabalhos, enquanto outros não o são. Para

tanto, o foco não será se debruçar e detalhar todos os pressupostos, mas, trabalhar com

aqueles que parecem ser mais relevantes e importantes para a construção do modelo - e

que, posteriormente, serviram como base para algumas críticas ao modelo. Ou seja,

tomaremos os pressupostos que aparecem de modo mais consensual entre os vários

autores para explorá-los melhor.

Para Berheim (1987, p,265) os pressupostos são: gerações são altruístas com as próximas;

mercado de capitais perfeito ou falho em segmentos específicos; impostos futuros não são

redistribuídos entre as gerações; impostos não são discricionários (ou impostos lump

sum); déficits não criam valor; consumidores são racionais; disponibilidade de financiar

o déficit como instrumento fiscal não altera processos políticos.

As gerações serem altruístas com as próximas é importante para o modelo, pois, diante

de um aumento do déficit público, isso faz com que os pais poupem hoje com o intuito

de destinar recursos para seus filhos ou netos para que eles paguem impostos no futuro.

Caso não houvesse essa preocupação intertemporal, o consumo da geração atual poderia

ser alterado diante do aumento da dívida pública – ou déficit público.

Da mesma forma, o mercado de capitais deve fornecer recursos para os agentes privados,

de modo que seus títulos possam substituir de modo perfeito títulos do governo. Caso

contrário, se o mercado de capitais tiver falhas, então, os títulos do governo se tornam

riqueza aos olhos dos agentes, podendo afetar o consumo deles (aumentando ou

diminuindo).

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69

Marques Júnior (2015, p.217-218) adiciona alguns outros pressupostos como os impostos

devem ser do tipo lump slum13; o déficit público deve ser financiado por emissão de

títulos públicos; taxa de juros que governo paga é a mesma que o mercado oferece (aqui

nos parece ser o caso de mercado de capitais perfeito); tanto o setor público como privado

possuem mesmo horizonte temporal; e há total certeza sobre como será regida a política

fiscal (novamente, expectativas racionais); o valor presente e a trajetória dos gastos

públicos são constantes.

O financiamento do déficit público por meio da emissão de títulos é necessário para

demonstrar que impostos e dívida possuem impactos semelhantes na economia. O

governo pagar a mesma taxa de retorno que o mercado oferece, como será visto, é

importante para mostrar que comprar títulos do governo não é um diferencial para com o

mercado financeiro e de capitais, de modo que títulos públicos não significam riqueza.

Por outro lado, Marinheiro (1996a) mostra outros pressupostos: 1) a despesa pública

inicial não se altera, ou seja, ela é constante; 2) juros e amortizações devem ser financiado

por impostos cobrados no período posterior à emissão da dívida; 3) mercados de capitais

perfeitos; 4) não existe incerteza quanto ao rendimentos dos indivíduos; 5) os indivíduos

têm horizontes infinitos, como se fossem viver para sempre; 6) eles antecipam, de maneira

perfeita, os impostos futuros (expectativas racionais), assim, os agentes sabem que um

aumento do déficit público, financiado por dívida pública, levará a aumento de impostos

no futuro; 7) os impostos são lump-sum e 8) ausência de crescimento econômico.

Diante desse quadro apresentado na literatura sobre os pressupostos do modelo de

Equivalência Ricardiana iremos focar nos principais e mais recorrentes dentro dessa

literatura: importância das gerações se importarem com as próximas, mercado de capitais

perfeito, ausência de crescimento econômico, impostos lump sum e expectativas

racionais. Basicamente, são estes os elementos que dão unidade ao modelo.

O primeiro pressuposto mais importante que deve ser melhor detalhado é a questão de as

futuras gerações se preocuparem com as demais, fazendo com que as famílias possuam

um horizonte infinito. O modelo apresentado por Barro (1974) parte dessa ideia inicial de

que os agentes da geração presente pensam não somente no seu consumo presente, como

no consumo de seus descendentes.

13 Impostos lump slum são impostos que independem do crescimento econômico, como será visto mais

adiante.

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70

Mas, nota-se, que os agentes não precisam pensar de maneira infinita, de modo que os

pais apenas pensem no consumo dos filhos, e, assim, sucessivamente.

Obtém-se assim super-neutralidade sem que seja necessário que cada

indivíduo se preocupe direta ou indiretamente com todos os familiares

distantes. É apenas necessário que ele se preocupe com o seu consumo

e de seus filhos (Marinheiro, 1996b, p.12).

Kotlikoff e Summers (1980, p.33) citam inúmeras formas de transferências de recursos

inter-geracionais: pais que emprestam recursos abaixo da taxa de juros de mercado para

que seus filhos possam comprar uma casa ou uma empresa, pais que sustentam seus filhos

durante e após a faculdade, ou a avó que dá à neta um presente caro de seu casamento ou

mesmo o anel de casamento são todas formas de considerar transferência inter-geracional.

Como seria feita essa ligação entre as gerações atuais e as próximas? Basicamente, o meio

de relacioná-las é através de heranças/recursos deixados pelas gerações antigas. Nesse

sentido, quais seriam os motivos para prover recursos para filhos e suas consequentes

linhas sucessórias? Seater (1993, p.148) descreve algumas delas. Uma primeira

aproximação seria a de que os pais utilizam herança como forma de atrair a atenção dos

filhos, pois caso eles fossem desobedientes, então, haveria estímulos para não destinar

recursos futuros a eles, ou as crianças podem ameaçar reduzir seu próprio bem-estar. O

financiamento do governo via impostos ou via dívida pode ter impactos na economia:

“Em ambos casos, troca de dívida-por-impostos altera o ponto de ameaça dos pais e/ou

dos filhos e, portanto, tem impactos reais, negando a equivalêcia ricardiana” (ibid)

As transferências intergeneracional não precisam ser extensas, bastando

que que elas sejam baseadas em alturismo realizada na margem por

muitas pessoas. E, também, os recursos não precisam ser transferidos

após a morte, mas podendo ser dissipados em educação dos filhos, por

exemplo. Número de pessoas sem filhos é menor, porque as famílias

com mais filhos do que a média tendem a ver sua renda decair diante

de aumento dos déficits, o que acaba gerando efeitos pequenos ou quase

nulos (Barro, 1989, p.41).

Para que o modelo funcione é necessário, portanto, que os agentes sejam altruístas, ou

seja, o único motivo pelo qual os agentes destinam recursos a seus descendentes é que

eles se importam e desejam deixar um legado para seus descentes. Isso porque,

comportamentos que não sejam altruístas levam a resultados não-ricardianos:

Esses motivos não altrutistas para herança acima expostos não causam

compensações uma-por-uma de alteração nos impostos futuros,

necessária para a Equivalência Ricardiana. Não está claro que apenas

heranças altruístas podem gerar a Equivalência Ricardiana, mas

Page 71: André Bologna de Castro Cardoso

71

altruísmo é único motivo examinado formalmente até agora que

conseguiu fazê-lo (Seater, 1993, p.148-149)

Esse presuposto de que as transferências inter-geracionais são relevante para a economia

pode ser encontrado/ancorado no estudo de Kotlikoff e Summers (1980), no qual eles

argumentam que a hipótese de ciclo de vida, em que os indivíduos poupam na juventude

– ou na idade ativa, melhor dizendo – é irrelevante para explicar a acumulação de capital

nos Estados Unidos, pois esta é melhor explicada pelas transferências entre gerações:

As transferências intergeracionais parecem ser o elemento

principal que determina a acumulação de riqueza nos EUA. As

nossas melhores estimativas do estoque de riqueza de

transferência de 1974, depois de permitir a acumulação do ciclo

de vida entre esposas é de aproximadamente 3 trilhões de dólares

(ibid, p.37)

Outro elemento fundamental para que a Equivalência Ricardiana funcione é que os

mercados de capitais sejam perfeitos, de modo a não haver restrições de crédito para os

agentes. “Quando ineficiências no mercado privado de capitais cria dificuldade ou

impossibilidade para que os consumidores obtenham empréstimos, empréstimo ao

governo pode ter efeitos reais.”(Berheim, 1987, p.269).

Pode-se definir restrição de liquidez de maneira aproximada como uma incapacidade de

os agentes conseguirem obter empréstimos diante de sua renda futura, assim, o consumo

será determinado pela sua própria renda corrente (Hubbard e Judd, 1986, p.5-6). Como

explica Marinheiro (1996a, p.60), o horizonte de consumo dos agentes é bem mais curto

do que suas próprias vidas, em função do fato de que eles não conseguem transferir o

consumo que eles realizariam no futuro para o presente.

Essa ideia de mercados de capitais perfeitos se baseia na Hipótese dos Mercados

Financeiros (HME). Mercado eficiente é aquele, no qual os preços refletem totalmente

(fully reflection) a informação disponível (Fama, 1970, p.1). Este mesmo autor (ibid, p.1;

Lima, 2003, p.29) ressalta que existem três formas, nos quais a HME pode aparecer: fraca,

em que os preços passados não parecem refletir preços futuros; a semi-forte, na qual os

preços dos títulos se ajusta quase que imediatamente às informações; e, por fim, a forma

forte, em que os investidores com acesso monopolista (ou privilegiado) às informações

relevantes para a formação de preços.

Segundo Lima (2003, p.29), a consequência é a de que o preço de uma ação ou título

corresponde ao seu preço correto, ou justo, de modo sua determinação seria decorrente

Page 72: André Bologna de Castro Cardoso

72

do risco que esse ativo possui. Como explica Aldrighi e Milanez (2005, p.44), os

resultados do modelo de mercado eficientes são de Randon Walk, ou passeio aleatórios,

nos quais os preços dos ativos financeiros independem dos preços passados, ou seja, como

o preço de um ativo possui todas as informações necessárias sobre seus fundamentos,

então, possíveis mudanças de preços ocorrem apenas quando novas informações surgem.

Consequentemente, não é possível obter ganhos acima do mercado, pois investidor não

consegue obter acesso privilegiado às informações, visto que elas já estão incorporadas

nos preços.

A Hipótese dos Mercados Eficientes mostra que não existem custos de transação no

mercado de capitais, pois todas as informações estão disponíveis para os agentes,

“Portanto, não se justificaria despender tempo e recursos para obter informações

públicas com o propósito de conseguir retornos acima do retorno médio do mercado,

uma vez que essas informações já estariam incorporadas nos preços” (Aldrighi e

Milanez, 2005, p.44).

A inexistência de custos de transação faz com que não haja restrições de liquidez, visto

que os preços dos ativos no mercado financeiro – tais como ações e títulos – refletem o

preço correto ou indicam, corretamente, os fundamentos dos ativos. Nesse sentido, não

há como haver, dentro desse modelo, restrição de liquidez, o qual só aconteceria se os

preços não pudessem se ajustar corretamente por existirem falhas, ou seja, se os preços

não refletissem, de maneira adequada, seus fundamentos.

Segundo Seater (1993, p.151), a Equivalência Ricardiana só é invalidada se a dívida

pública (ou o governo) realmente introduz diferencial com o qual o setor privado não

consegue lidar. Esse autor cita dois exemplos emblemáticos, o primeiro em que os custos

de transação para o governo são menores do que para o setor privado, então, a restrição

de liquidez é minimizada, de modo que os agentes podem ter melhor acesso a recursos.

Dessa forma, para agentes com restrição de liquidez, a dívida pública constitui riqueza,

algo que para Barro (1974), não o é. Outro exemplo, é de que se existe um problema de

seleção adversa, aumentando o risco de determinados agentes, o governo poderia ser mais

eficiente em coletar pagamento de indivíduos com maior risco.

Marinheiro (1996a, p.60) mostra, também, se os agentes possuem restrição de liquidez, o

aumento da dívida pública – ocasionada por uma redução de impostos - permite que os

indivíduos tenham acesso a recursos (fundos) que anteriormente não tinham. Nesse

Page 73: André Bologna de Castro Cardoso

73

sentido, a restrição de liquidez, em decorrência de falhas no mercado financeiro e de

capitais, faz com que a Equivalência Ricardiana não funcione.

Nessas circunstâncias, mesmo que sejam consumidores/contribuintes a

pagar impostos no futuro, eles irão aumentar seu consumo atual.

Através da emissão de dívida pública o governo oferece a possibilidade

das famílias aumentarem o seu consumo presente, obtendo fundos a

uma taxa de juros que não conseguiriam obter no mercado de capitais

[itálico original] (Marinheiro, 1996a, p.60)

A ausência de crescimento econômico é considerado um pressuposto para fazer funcionar

a Equivalência Ricardiana. Contudo, não é um crescimento econômico, mas um

crescimento abaixo da taxa de juros real. Como mostram Marinheiro (1996a, p.54-55) e

Barro (1976, p.343-344), se a taxa de juros for maior do que a taxa de crescimento da

economia, Equivalência Ricardiana se sustenta, visto que seria necessário cobrar

impostos no futuro para pagar os juros da dívida pública, pois a renda arrecadada não

seria suficiente para cobrir as obrigações futuras.

Contudo, o ponto a salientar é que, dentro dessa visão, o crescimento econômico é dado,

em decorrência dos fatores-de-produção existentes na economia, como capital e trabalho.

Dessa forma, nota-se que não existe multiplicador, de modo que a economia não pode

crescer além do que é já determinado previamente pelos recursos existentes. É por isso

que, por exemplo, um gasto público inicial não consegue se pagar sem a necessidade de

maiores tributos, pois sem o multiplicador, a renda já está dada de antemão. Qualquer

elevação do déficit e da dívida pública precisa ser coberta com novos aumentos de

impostos.

Consideramos, portanto, a ausência do multiplicador um pressuposto importante para que

a Equivalência Ricardiana se sustente, visto que, desse jeito, a renda se torna estática, em

que qualquer aumento da dívida pública leva à crença de que haverá maiores impostos no

futuro, neutralizando os efeitos da política fiscal.

Se houvesse efeito multiplicador, a renda poderia se elevar acima daquela em que não

ocorreu um gasto exógeno, e não haveria motivos para que os agentes tivessem de poupar

hoje para pagar impostos no futuro. Ou seja, a não existência do multiplicador é

fundamental para que a Equivalência Ricardiana se sustente.

Pressuposto que é considerado importante são os chamados impostos lump sum. Estes se

caracterizam por impostos uniformes cobrados sobre os indivíduos, em que

Page 74: André Bologna de Castro Cardoso

74

Não poderão existir diferenciações com base na destreza, riqueza,

rendimento ou despesa. No caso da aplicação de um imposto lump sum

não existe nenhum imposto marginal. Dessa forma, nenhuma

transacção deixaria de ser efectuada devido à existência do imposto. Se

existisse uma taxa marginal os contribuintes poderiam fazer variar o

montante de imposto variando o volume de actividade. (Marinheiro,

1996a, p.63)

Ou seja, é um imposto considerado neutro, pois não afeta a eficiência econômica, visto

que ele incide de maneira igual sobre todos os agentes da economia. Esse pressuposto é

importante, pois a forma como se cobra imposto pode alterar o comportamento dos

indivíduos, de modo a prejudicar a Equivalência Ricardiana. Por exemplo, um imposto

que incida sobre riqueza, irá desestimular a poupança e a acumulação de capital, porque

os agentes sabem que se acumularem muito riqueza hoje serão cobrados mais no futuro

(Marinheiro, 1996a, p.63-64), Nesse caso, ao invés de pouparem mais no presente para

pagarem impostos no futuro, eles podem até consumir mais, o que invalidade a

Equivalência Ricardiana.

Outro exemplo interessante dado por Marinheiro (ibid, p.64) é de impostos que incidem

sobre rendimentos. Comparando dois indivíduos: um jogador de futebol, cujos

rendimentos presentes são altos, mas no futuro serão baixos, e um estudante de medicina,

para quem sua renda futura será maior, haverá diferenças de opiniões quanto à forma de

financiamento do governo. No primeiro caso, o jogador de futebol prefere a dívida

pública, pois os impostos recairão menos sobre ele, enquanto o estudante de medicina

prefere impostos no presente, visto que, pelo fato de sua renda ser baixa hoje, a tributação

incidirá menos sobre ele do que no futuro – caso o governo opte pela dívida pública.

Nesse sentido, a forma como o governo se financia não é irrelevante ou idêntica para os

agentes, como afirma a Equivalência Ricardiana.

E por fim, último pressuposto importante de discutir com maiores detalhes é o das

expectativas racionais. Snowdow e Vane (2005, cap.5) descrevem que os agentes irão

maximizar o máximo possível de informações – inclusive seus erros – de modo que eles

não a errarem sistematicamente. Como aponta Taylor (1983, p.393), os agentes aprendem

com o passado e utilizam toda informação disponível a eles.

Como explicam Snowdow e Vane (2005, cap.5), as expectativas acerca do futuro são as

mesmas daquelas previstas na própria teoria econômica. Mesmo que as expectativas

racionais não indiquem que os agentes conhecem perfeitamente o futuro, mas que eles

Page 75: André Bologna de Castro Cardoso

75

levam em consideração o que eles acreditam ser a teoria econômica “correta”, de modo

que os erros que acontecem são fruto de informação incompleta.

Eu gostaria de sugerir que as expectativas, já que são previsões

informadas de eventos futuros, são essencialmente as mesmas que as

previsões da teoria econômica relevante. Correndo o risco de confundir

essa hipótese puramente descritiva com um pronunciamento sobre o

que as empresas devem fazer, chamamos tais expectativas de

"racionais" (Muth, 1961, p.316).

Os agentes formulam suas expectativas futuras, diante do quadro de informações

disponíveis, de modo a coincidir com as expectativas previstas para o comportamento de

uma determinada variável ou política econômica. Dessa forma, os agentes podem se

antecipar à própria política econômica, de modo a neutralizá-la. Vejamos como as

expectativas racionais são importantes para fundamentar a Equivalência Ricardiana.

Quando governo realiza um déficit, financiado por dívida pública, os agentes, conhecendo

a teoria econômica “correta14”, acreditam que haverá maior cobrança de impostos no

futuro e por isso poupam hoje para pagar essas obrigações futuras. Por conhecerem o

futuro, os agentes se antecipam à política econômica, neutralizando-a.

Caso os agentes não fossem racionais, tal como descrito, a formulação de expectativas

poderia ser diferente, de modo que o aumento do déficit e da dívida pública – decorrente

de uma redução de impostos - fizesse com que os agentes interpretassem essa elevação

como aumento da renda disponível e aumentassem o consumo hoje. Por isso, a

incorporação das expectativas racionais é fundamental para solidificar a ideia da

Equivalência Ricardiana.

Esses pressupostos são importantes para entender a construção da teoria da Equivalência

Ricardiana. Contudo, a base desse modelo pode ser encontrada no chamado equilíbrio

geral walrasiano. Originalmente desenvolvido por Walras, o equilíbrio geral busca

mostrar a interdependência entre os agentes, de modo que, por meio de suas relações

indiretas – via oferta e demanda de bens -, é possível atingir um equilíbrio ótimo na

economia.

14 A teoria “correta” seria a proposta pelos Novos-Clássicos, em que, políticas expansionistas não geram os

resultados esperados: no âmbito da política monetária, aumento na quantidade de moeda ofertada só levará

à inflação, e na política fiscal, vale a Equivalência Ricardiana, em que déficits públicos levam a maiores

impostos no futuro. Sabendo disso, portanto, os agentes neutralizam a política econômica.

Page 76: André Bologna de Castro Cardoso

76

Como aponta Silva (2009, p.6), o equilíbrio geral é um instrumento que relaciona

equilíbrio, produtos e preços. Assim, o equilíbrio expressa auto-organização das forças

do sistema econômica, de modo a enfatizar que há equilíbrio entre os agentes. Os produtos

são a finalidade da atividade econômica e os preços são o meio pelo qual se mensura o

processo de troca de produtos.

O equilíbrio geral pode ser pensado por meio de um exercício de abstração, como uma

feira de domingo. Nesse caso, temos consumidores que são ao mesmo tempo produtores

de bens. Em decorrência da divisão do trabalho, cada agente individual produz um certo

tipo de bem. Nessa feira, esses produtores-consumidores interagem de modo a vender sua

produção para obter mercadorias que satisfaçam suas necessidades. O mecanismo que

regula essa relação de compra e venda são os preços relativos, os quais determinam o

equilíbrio entre o que é ofertado e demandado.

Como nesse modelo ninguém quer voltar com a mercadoria que produziu, mas deseja

outras que lhe satisfaçam as necessidades, eventuais excessos de demanda ou de oferta

são corrigidos até o momento em que todos estão satisfeitos.

Segundo Elsner, Heinrich e Schwardt (2016, cap.5), o que o equilíbrio geral demonstra é

que dada uma dotação – na forma de mercadorias- o consumidor-produtor terá uma

alocação – aquilo com que ele sai do mercado – que aumente sua utilidade, sendo o preço

relativo o indicativo de quanto indivíduo irá trocar. Portanto, se a economia está em

equilíbrio, sabe-se que esse equilíbrio é estável e único.

No mercado de trabalho, esse equilíbrio fica evidente. Os trabalhadores ofertam mão-de-

obra por um determinado preço, enquanto os empresários ofertam trabalho a um

determinado salário. A interação entre os agentes faz com que se chegue a um salário de

equilíbrio, em que todos os trabalhadores que desejam trabalhar por um dado salário

encontram emprego, ou seja, atinge-se o chamado pleno emprego. O equilíbrio geral é

esse mecanismo de ajuste no mercado, em que todos saem ganhando.

Essa situação de perfeito equilíbrio, em que todos os agentes maximizam suas utilidades

é denominado de Pareto-ótimo, em que ninguém pode melhorar sua situação sem que

outro piore. Na ausência de qualquer intervenção no mercado, temos um equilíbrio

perfeito. Temos, portanto, a essência do equilíbrio geral, a qual é a base para os modelos

econômicos neoclássicos, no qual a Equivalência Ricardiana se encaixa.

Page 77: André Bologna de Castro Cardoso

77

Os modelos ortodoxos de crescimento econômico15, ao incorporarem o equilíbrio geral,

colocam que as possibilidades para que a economia cresça dependem da tecnologia (Jones

e Vollarth, 2015, p.119), o que, por sua vez, é resultado da disponibilidade dos fatores-

de-produção existente na economia, como trabalho e capital.

Nesse sentido, se o crescimento da economia depende dos recursos existentes e da busca

por tecnologia por parte das empresas, a atuação estatal, por meio da política fiscal, acaba

por não gerar impactos na economia, no sentido de fomentar o crescimento econômico e

na geração de emprego. Essa negação do papel do Estado como um agente capaz de

incentivar a economia decorre do próprio equilíbrio geral. Por isso, esta última é a base

fundamental da Equivalência Ricardiana.

Como já apresentado, na Equivalência Ricardiana, os agentes se antecipam à política

econômica. Quando o Estado realiza um déficit público, e com isso cobra mais impostos

nos futuros, a atuação estatal prejudica o equilíbrio geral, visto que as a relação entre os

consumidores-produtores é afetada, pois há uma inferência externa aos processos de

ajustamentos de mercado. Ao retirar recursos da economia, por meio de impostos ou

dívida pública, a alocação de recursos sofre mudanças.

Contudo, o mecanismo da Equivalência Ricardiana, em que os agentes poupam para

cobrir o pagamento de impostos futuros garante o equilíbrio intertemporal da economia e

mantêm, de certa forma, a Eficiência de Pareto: no futuro, o Estado, por meio da

arrecadação de impostos, irá equilibrar o seu orçamento, assim como, os agentes, por

terem poupado no período anterior, conseguirão arcar com essa tributação de modo

adequado. O ato de poupar, enquanto o governo realiza um déficit, é o mecanismo pelo

qual o equilíbrio da economia é atingido no tempo.

Imaginando que os agentes não poupassem, mas consumissem diante do desequilíbrio

fiscal, teríamos uma situação que, no momento futuro, o governo aumentaria os impostos

para cobrir seu déficit, contudo as famílias não conseguiram pagar os tributos, visto que

não pouparam no momento anterior. Nesse sentido, a economia estaria em pleno

desequilíbrio.

Como, no pensamento neoclássico, a economia sempre estará nesse equilíbrio geral e

haverá eficiência no sentido de Pareto, a poupança cumpre, na Equivalência Ricardiana,

15 Apresentamos apenas de maneira sintetizada a discussão sobre crescimento econômico. Para explicações

detalhadas e com diversidade de modelos ver Jones e Vollarth (2015).

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78

o papel de realizar o equilíbrio intertemporal da economia, de modo que todos os agentes

consigam maximizar utilidades – as famílias pagando os impostos e o Estado cobrindo

seu déficit. Por isso que podemos argumentar que a base por detrás da Equivalência

Ricardiana é o equilíbrio geral walrasiano.

Feita a análise dos pressupostos, o passo seguinte é apresentar o modelo de Barro (1974),

pioneiro nessa discussão sobre Equivalência Ricardiana.

2.3 Modelo de escolha Intertemporal

Barro (1974) apresenta um modelo de sobreposição de gerações para demonstrar que a

dívida pública não constitui um efeito riqueza para agentes, mas, ao contrário, mantém

inalterado tanto o consumo quanto o investimento. Isso porque, os agentes da geração

anterior irão poupar mais para deixar inalterado o consumo posterior da geração

subsequente, pois o aumento da dívida será financiando via impostos.

O modelo se constitui de dois períodos, em que o indivíduo é jovem e, posteriormente, se

torna idoso. Esses dois períodos constituem a geração, com N pessoas, a qual uma vai

sucedendo a outra. Membros de cada geração trabalham apenas enquanto jovens e

recebem salário (w). As expectativas sobre w em futuros períodos estão em valor presente

e cada agente detém ativos (A) ativos, sendo que títulos do governo são uma forma

adicional de ativos que eles podem ter. A taxa de retorno dos ativos (r) será paga uma vez

a cada período e as expectativas de retorno desses ativos estão em valor presente.

Assim, o indivíduo da geração terá como restrição orçamentária a seguinte equação:

𝐴1𝑦

+ 𝐴00 = 𝑐1

𝑜 + (1 − 𝑟)𝐴10 (1)

𝐴1𝑦

representa a dotação quando jovem, e 𝐴00 a doação recebida da geração anterior, o que

permitirá um certo consumo quando velho 𝑐𝑜 e o que, excluindo taxa de retorno, ele

deixará para a geração futura (geração 2) - (1 − 𝑟)𝐴1𝑜. De outro lado, pensando para

geração 2, temos que a dotação será:

𝑤 = 𝑐2𝑦

+ (1 − 𝑟)𝐴2𝑦

(2)

Para quando ele for idoso,

𝐴2𝑦

+ 𝐴10 = 𝐶2

𝑜 + (1 − 𝑟)𝐴2𝑜(3)

Page 79: André Bologna de Castro Cardoso

79

Nesse sentido, como a geração anterior se preocupa com a posterior, é o fato que explica

a doação 𝐴10 para a geração 2. Portanto, a utilidade da geração 1 deve incorporar a

utilidade da geração 2 (𝑈𝑖+1∗ )

𝑈𝑖 = 𝑈𝑖(𝑐𝑖𝑦

, 𝑐𝑖0, 𝑈𝑖+1)(4)

A solução, para geração 1, estará em

𝑐10 = 𝑐1

0(𝐴1𝑦

+ 𝐴𝑜𝑜 , 𝑤, 𝑟)(5)

𝐴1𝑜 =

1

1−𝑟(𝐴1

𝑦+ 𝐴0

𝑜 − 𝑐1𝑜) = 𝐴1

0(𝐴1𝑦

+ 𝐴𝑜𝑜 , 𝑤, 𝑟)(6)

E para a geração 2:

𝑐2𝑦

= 𝑐2𝑦

(𝐴1𝑜 , 𝑤, 𝑟)(7)

𝐴2𝑦

=1

1−𝑟(𝑤 − 𝑐2

𝑦) = 𝐴2

𝑦(𝐴1𝑜 , 𝑤, 𝑟)(8)

Assim, a restrição que a geração 2 possui depende da doação da geração 1, dos salários

recebidos menos o consumo e da taxa de juros.

𝑐2𝑜 = 𝑐2

𝑜(𝐴2𝑦

+ 𝐴1𝑜 , 𝑤, 𝑟)(9)

𝐴20 =

1

1−𝑟(𝐴2

𝑦+ 𝐴1

𝑜 − 𝑐2𝑜) = 𝐴2

0(𝐴2𝑦

+ 𝐴1𝑜 , 𝑤, 𝑟)(10)

A dotação da geração 2 quando estão idosos depende dos ativos que eles obtiveram

quando novos – ou seja, que eles acumularam durante o período em que estiveram

trabalhando - somando com aqueles recebidos da geração anterior, mais os salários e os

juros.

Desse modo, a restrição orçamentária de ambos indivíduos na fase idosa (da geração 1 e

da geração 2) estão sujeitos à dotação de quando jovens e do que receberam da geração

anterior, mais salários e retorno dos ativos. Nesse sentido, nota-se que as gerações levam

em conta a necessidade de deixar recursos futuros para seus descendentes.

Contudo, para compreender a Equivalência Ricardiana é preciso ver como a dívida

pública impacta esse modelo. Há várias formas de demonstrar a Equivalência Ricardiana.

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80

Primeiro vamos utilizar a argumentação do próprio Robert Barro e depois analisaremos

outros modos de apresentação.

Para Barro (1974), a restrição dos consumidores 1 é dada pela dotação – sendo 𝐴1𝑦

+

𝐴10 as doações brutas da geração 1 quandos são novos e idosos, respectivamente - que

possuem:

𝐴1𝑦

+ 𝐴10 + 𝐵 = 𝑐1

0 + (1 − 𝑟)𝐴10(11)

Em que B representa os impostos a serem cobrados. Para a geração 2, a restrição é:

𝑤 = 𝑐2𝑦

+ (1 − 𝑟)𝐴2𝑦

+ 𝑟𝐵,(12)

Em que rB são os juros que devem ser pagos pela emissão da dívida pública inicial. Para

o próximo período da geração 2, ou seja, quando estiverem velhos, a restrição será:

𝐴2𝑦

+ 𝐴10 = 𝑐2

𝑦+ (1 − 𝑟)𝐴2

0 + 𝐵,(13)

B representa o pagamento do principal da dívida. Combinando as duas restrições para

geração 2 tem-se que, segundo Marinheiro (1996a, p.39):

𝐴2𝑦

=𝑤 − 𝑟𝐵 − 𝑐2

1 − 𝑟

E ao substituir na equação anterior obtemos:

𝑤 − 𝑟𝐵 − 𝑐2𝑦

+ (1 − 𝑟)𝐴10 = (1 − 𝑟)𝑐2

0 + (𝐴 − 𝑟)2𝐴20 + (1 − 𝑟)𝐵, (14)

De onde se pode deduzir:

𝑤 + (1 − 𝑟)𝐴01 − 𝐵 = 𝑐2

𝑦+ (1 − 𝑟)2𝐴0

2(15)

A função utilidade da geração 2 será, portanto:

𝑈2 = 𝑓𝑖[(1 − 𝑟)𝐴01 − 𝐵, 𝑤, 𝑟] (16)

Na qual, (1 − 𝑟)𝐴01 − 𝐵 é a herança líquida dada pela geração 1 à geração 2.

Desse modo, a utilidade da geração 1 será dada pelo seu consumo quando jovem, quando

idoso e da utilidade esperada de seus descendentes da geração 2, a qual depende,

fundamentalmente, da doação líquida da geração 1:

𝑈1 = 𝑈1(𝑐1𝑦

, 𝑐10, 𝑈2) = (1 − 𝑟)𝐴1

0 − 𝐵, 𝑐1𝑦

, 𝐴1𝑦

+ 𝐴00, 𝑤, 𝑟(17)

Page 81: André Bologna de Castro Cardoso

81

Com os valores os 𝑐1𝑦

, 𝐴1𝑦

+ 𝐴00, 𝑤, 𝑟 como dados, o problema fundamental da geração 1

é determinar a doação líquida ótima para seus descendentes [(1 − 𝑟)𝐴10 − 𝐵]. Assim,

qualquer deslocamento de B (como aumento da dívida pública, decorrente de redução de

impostos) só irá elevar o montante de doação bruta (𝐴10) necessário para manter a doação

líquida estável.

(...) qualquer mudança marginal em B seria atendida unicamente por

uma mudança em 𝐴10: que mantenha o valor do legado líquido, (1 - r)

𝐴10: - B. Esta resposta em 𝐴1

0; manterá inalterados os valores de

𝑐10, 𝑐2

𝑦, 𝑐2

0𝑒𝐴02. Portanto, os níveis de utilidade alcançados pelos

membros das gerações 1, 2, etc., não serão afetados pela mudança em

B (Barro, 1974, p.1103)

Após esse primeiro modelos apresentado por Barro no início dos anos 1970, podemos

encontrar outras formas de representar matematicamente essa questão intertemporal na

questão do comportamento dos agentes, diante da política fiscal.

2.4 Outras representações da Equivalência Ricardiana

Além do modelo apresentado por Barro, é possível encontrar em outros artigos e livros-

textos outras formas de representação da Equivalência Ricardiana, cuja apresentação

corrobora a conclusão de Barro de que déficit público não possui impacto nenhum sobre

a economia.

Blanchard e Fischer (1989, cap.2) apresentam de forma um pouco diferente os impactos

da dívida pública no orçamento dos agentes privados, mas, cujo resultado corrobora a

Equivalência Ricardiana. Segue-se o modelo tal como apresentado por esses autores.

Apesar de se financiar por impostos, o governo pode tomar emprestado do setor privado,

sendo a dívida do governo paga com a mesma taxa que o capital se os agentes a tem no

portifólio. Assim, gt é a dívida per capita: a restrição é:

𝑏𝑡

𝑑𝑡+ 𝑛𝑏𝑡 = 𝑔𝑡 − 𝜏𝑡 + 𝑟𝑡𝑏𝑡(18)

Em que 𝑏𝑡

𝑑𝑡 é a dívida per capita, nbt é o montante da dívida, os quais com o aumento da

população podem fazer a dívida flutuar sem aumento da dívida per capita. O lado direito

da equação os excessos de gastos do governo – compras de bens e serviços (déficit

primário), além de pagamentos de juros da dívida pública.. A restrição do governo indica

que o governo só pode tomar emprestado quando os gastos superam as receitas.

Page 82: André Bologna de Castro Cardoso

82

Integrando e impondo uma condição NGP, dado restrição intertemporal do orçamento

temos que:

𝑏0 + ∫ 𝑔𝑡

𝛿

0

𝑅𝑡𝑑𝑡 = ∫ 𝜋𝑡

𝛿

0

𝑅𝑡𝑑𝑡 (19)

Essa equação mostra que o valor presente dos impostos é igual ao valor presente do gasto

governamental mais uma dívida inicial (𝑏0). Nesse sentido, yh o governo escolhe gastar

ou cobrar impostos de acordo com o valor presente do superávit primário g – t.

A presença do governo afeta a restrição orçamentária das famílias:

𝑐𝑡 +𝑑𝑎𝑡

𝑑𝑡+ 𝑛𝑎𝑡 = 𝑤𝑡 + 𝑟𝑡𝑎𝑡 − 𝜏𝑡, (20)

Em que at = kt – bpt + bt, ou seja, mostrando que as famílias podem emprestar e tomar

emprestado a uma taxa rt, assim como o governo. Agora, se a restrição era dada pelos

salários e pela taxa de juros, com a introdução do governo adiciona-se impostos. A nova

restrição orçamentaria intertemporal das famílias será:

∫ 𝑐𝑡𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡 = 𝑘0 − 𝑏𝑝0 + 𝑏0 + ∫ 𝑤𝑡

𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡 − ∫ 𝜋𝑡

𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡 (21)

O valor presente do consumo deve ser igual a soma da riqueza não humana (relacionado

a ativos financeiros) – k0 - bp0 e b0 e a riqueza humana que é o valor dos salários menos

tributos. A restrição do governo indica que para uma dada trajetória dos gastos do governo

– g0 – o governo deve cobrar impostos a um dado valor presente, de modo que não precisa

estar com o orçamento equilibrado o tempo todo. Começando com um balanço

equilibrado, isso pode levar à redução dos impostos em um certo período, tomando

emprestado das famílias, e elevando impostos no futuro para pagar juros e a dívida.

Colocando a restrição governamental na restrição das famílias na equação acima:

∫ 𝑐𝑡𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡 = 𝑘0 − 𝑏𝑝0 + ∫ 𝑤𝑡

𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡 − ∫ 𝑔𝑡

𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡

16 (22)

16

Como temos que

𝑏0 + ∫ 𝑔𝑡𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡 = ∫ 𝜋𝑡

𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡, é só substituir ∫ 𝜋𝑡

𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡 𝑝𝑜𝑟 𝑏0 + ∫ 𝑔𝑡

𝛿

0𝑅𝑡𝑑𝑡, de modo que a dívida

pública b0 se cancela com o b0 da riqueza não humana dos agentes, comprovando, através desse modelo

que dívida pública e nem impostos impactam na riqueza das famílias.

Page 83: André Bologna de Castro Cardoso

83

Nem a dívida nem impostos aparecem na restrição das famílias, apenas os gastos do

governo. Nesse sentido, para uma dada trajetória dos gastos do governo, tanto se financiar

via impostos quanto pela dívida pública não exerce impactos sobre a realocação da

riqueza dos agentes. Esse modelo intertemporal está de acordo com a equivalência

ricardiana:

Uma redução dos impostos, e portanto, do aumento do déficit hoje,

deve, de acordo com a restrição do orçamento do governo, leva ao

aumento dos impostos no futuro. De acordo com a restrição das

famílias, a corrente redução e a elevação futura é exatamente

compensada entre si no valor presente, deixando a restrição

orçamentária inalterada (Blanchard e Fischer, 1989, p.56)

A conclusão desse modelo, tanto de Barro (1974) quanto o apresentado por Blanchard e

Fischer (1989, cap.2), é que nem a dívida pública nem os impostos constituem parte da

riqueza dos agentes. Nesse sentido, não existe efeito-riqueza quando o governo aumenta

a renda disponível dos agentes ou quando emite dívida pública, pois, neste segundo caso,

os agentes interpretam a emissão de dívida não como ganho financeiro, mas apenas como

impostos futuros.

Azaridis (1994, p.303-306) também apresenta um modelo para explicar a Equivalência

Ricardiana.

Em uma economia sem dívida pública, a política fiscal é dada por P = (gt, tt1, t

t-12). O

equilíbrio fiscal ocorre quando gt = tt1 + tt-1

2 (1+n). Cada indivíduo h enfrenta no período

t uma restrição orçamentária dada por:

ct1h + c

t2/Rt+1 < e1h - t

t + e2h – tt2/Rt+1. (23)

O equilíbrio dos fatores satisfaz z(Rt+1, tt, t

t2) = 0.

Dívida pública temporária no exemplo principal da política fiscal é idêntico a P para todos

os períodos, exceto para mudanças nos impostos t = T e t = T + 1. Em t = T, temos baixos

impostos em relação ao orçamento equilíbrio, b > 0. Em t = T + 1 corresponde à elevação

de impostos acima do caso de um orçamento equilibrado.

Suponha que o corte de impostos beneficie o mesmo grupo de pessoas para os quais mais

tarde irá ocorrer a elevar de impostos. Denominamos de T. Todas as demais gerações

enfrentam a mesma situação. Geração T, por outro lado, tem na juventude os impostos

reduzidos para tT1 – b e quando estiverem velhos terão os impostos elevados para tT

2 +

Page 84: André Bologna de Castro Cardoso

84

RT+1b, onde RT+1 é juros sobre empréstimos contraídos em T. O valor presente após os

impostos do orçamento para cada membro h da geração T é:

𝑒1ℎ − (𝑡1𝑡 − 𝑏) +

𝑒2ℎ+𝑡2

𝑡−𝑅𝑇+1𝑏

𝑅𝑇+1=: e1h - t

t + e2h – tt2/Rt+1 (24)

Isso mostra que o impacto da elevação da dívida pública, fruto da redução de impostos, é

a mesma coisa que o orçamento equilibrado. Como explica Azaridis (1994, p.305), a

menos que os consumidores sofram com restrição de liquidez ou mercados de créditos

imperfeitos, a demanda não irá responder à política de financiamento do governo nem a

taxa de juros de equilíbrio. Dessa forma, dívida pública não acarreta riqueza adicional,

pois ela aumenta o orçamento daqueles que tiveram os impostos reduzidos, e reduz a

riqueza daqueles que terão de arcar com os impostos futuros.

Orçamento equilibrado do governo não gera impactos nenhum na economia, pois da

mesma forma que se expande o gasto, há transferências de recursos para o próprio

governo. O que se nota é que a elevação da dívida pública, decorrente de uma política de

redução de tributos, não impacta na economia, pois do mesmo jeito que um determinado

grupo se beneficia da redução de impostos, de outro lado, outro grupo necessita poupar

com o intuito de pagar os tributos futuros. Mesmo dentro de uma geração, uma redução

de impostos na juventude levará ao aumento de tributos na velhice, de modo que os

impactos dessa política inexistem. Apenas transferência para o momento posterior o fardo

de se pagar impostos.

Este autor analisa um pouco diferente a Equivalência Ricardiana, pois ele coloca o ônus

da dívida pública na forma de maiores impostos no futuro para os jovens em detrimentos

dos mais velhos.

Quanto mais rápida cresce a dívida pública enquanto a geração está

viva, maior será o subsídio obtém essa população; dívida pública

nacional, depois de tudo, representa poupanças planejadas pelos mais

jovens para servirem aos passivos do governo realizado pelos mais

velhos. Os impostos suportados pelos jovens têm o mesmo efeito sobre

os subsídios geracionais que o aumento da dívida; de fato, o que se

mostra ser importante para cada geração é a evolução da soma da dívida

pública nacional acrescida de impostos para os mais jovens e não o

tamanho de cada componente individual (Azaridis, 1994, p.303-304).

Assim, não há ganhos permanentes com essa política de redução de impostos nem de

elevação da dívida pública, pois tudo se compensa: “Dívida pública nacional eleva a

Page 85: André Bologna de Castro Cardoso

85

riqueza da geração para quem os impostos foram reduzidos, e reduz a riqueza da geração

que pago pelo término da dívida” (ibid, p.306).

Hermann (2002, p.7) parece corroborar com a afirmação de que a elevação da dívida

pública, para cobrir um déficit público, tem o mesmo impacto de um orçamento

equilíbrado: “Ou seja, o efeito macroeconômico seria exatamente o mesmo de uma

política fiscal de orçamento equilibrado, em que dG=dT (dT = variação da arrecadação

de impostos), cujo multiplicador é igual a 1” (ibid).

Como essa autora explica (ibid), sendo dY=dG +dC, de modo que dC = dcYd, com c a

propensão marginal a consumir e YD a renda disponível. Teremos que dYd = dY-dG.

Dessa forma, dY=dG. Como existe esta última igualdade, dYD =0, ou seja, o déficit

público não possui qualquer impacto sobre a renda, visto que ônus recairá sobre as

gerações futuras.

Apresentado todo o conceito e o arcabouço que sustentam a Equivalência Ricardiana, o

próximo passado é discutir como ela estrutura a ação da ação da política fiscal, ou seja,

quais são as implicações em termos de recomendação para a efetuação da política fiscal

da Equivalência Ricardiana.

2.5 Implicações de política econômica

Segundo Lopreato (2013), não é porque a política fiscal deixa de ter um papel de incentivo

à demanda e aumento da renda que ela deixa de ter sua importância. Segundo ele, haveria

uma nova função para política fiscal, a qual deveria ser voltada para construir serviços

produtivos, sem gerar déficits, que permitam aumentar a produtividade do setor privado,

pois são os investimentos destes que elevam o emprego e a renda.

Como veremos mais à frente, ainda que a Equivalência Ricardiana não seja consenso

dentro do próprio pensamento mainstream sobre política fiscal, o ceticismo quanto ao

poder da política fiscal influenciar na economia fez com que os autores do mainstream

delegassem um papel secundário para ela (Blanchard, Dell’Ariccia e Mauro, 2010, p.5).

Apesar de não se encontrar na literatura sobre Equivalência Ricardiana como deveria ser

executada a política fiscal, é possível perceber que política fiscal não deve adotar medidas

discricionárias, pois ela não gerará impactos na economia, visto que os agentes podem se

antecipar a ela e neutralizar seus impactos. Assim, a discussão sobre Equivalência

Ricardiana se encaixa na questão de que a política fiscal deve estar sujeita a regras.

Page 86: André Bologna de Castro Cardoso

86

Os novos-clássicos alteram a óptica de atuação da política fiscal e

negam seu papel de instrumento de manipulação da demanda agregada,

privilegiando a defesa de regras, credibilidade de regimes de política

econômica, a consistência intertemporal das medidas adotadas e a

estabilidade econômica, embora aceitem que exista espaço de

intervenção governamental, com a oferta de bens ao setor privado

(Lopreato, 2013, p.45-46).

Como a perspectiva de amento do déficit público e da dívida pública afetam a expectativa

dos agentes, o Estado deve procurar manter o orçamento equilibrado. Segundo Oliveira

apresenta (2012, p.56) são dois os principais “pecados” que o Estado não deve cometer:1)

irresponsabilidade fiscal, através de sucessivos déficits públicos, sendo necessárias

instituições que controlem e fiscalizem o gasto e 2) não deve haver desequilíbrio

patrimonial, ou seja, o Estado deve garantir a estabilidade da dívida pública pagando os

juros da dívida, ainda que isso signifique renunciar às políticas públicas – sociais, por

exemplo.

A política passou a desempenhar a tarefa de fiadora da estabilidade

macroeconômica e a estar sujeita a regras em condições de garantir a

credibilidade ao comportamento do setor público e assegurar a

sustentabilidade das contas públicas (Arantes e Lopreato, 2017, p.7)

A manutenção do orçamento equilibrado visa sustentar a estabilidade da dívida pública

de modo intertemporal para evitar a própria Equivalência Ricardiana. Ao evitar déficits e

a elevação da dívida pública no presente, não haverá riscos para as gerações futuras terem

de arcar com aumento de impostos para pagar por esse desequilíbrio orçamentário.

Ainda segundo Lopreato (2013, p.46), o papel da política fiscal se desvincula das antigas

concepções e passa a não ter papel nenhum na sustentação da demanda, nem para corrigir

falhas de mercado, como propunha. O governo deve orientar as políticas públicas na

oferta de serviços produtivos, sem ferir a sua restrição orçamentária, e contar com a

resposta do setor privado.

A política fiscal, dentro do arcabouço da Equivalência Ricardiana, volta-se para o

equilíbrio orçamentário, como forma de gerar expectativas positivas para os agentes e

abandona qualquer papel reservada à política fiscal como fomentador da demanda na

economia. Nesse sentido, a política fiscal possui um papel totalmente passivo nas

determinações econômicas. As medidas fiscais, nesse sentido, devem se ater aos seus

Page 87: André Bologna de Castro Cardoso

87

impactos intertemporais e não para gestão da demanda agregada, como apresenta Dos

Santos (2011, p.67)17.

Uma consequência direta para política econômica é que a política monetária se torna o

principal instrumento de política econômica, colocando a política fiscal em segundo

plano. A política monetária, por meio do manejo da taxa de juros, se torna o principal

instrumento de estabilização da economia (no caso, estabilização é meramente da

inflação).

[A política monetária] ganhou status de principal instrumento utilizado

pelas autoridades para influenciar tanto a trajetória das variáveis

macroeconômicas quanto o comportamento dos agentes. A política

monetária é enxergada como “a” política de estabilização nesse

consenso (Dos Santos, 2011, p.28-29).

Diante desse quadro, a Equivalência Ricardiana abre espaço para a discussão sobre

austeridade fiscal expansionista18, em que política fiscal contracionista impulsiona

crescimento econômico posterior. Segundo Alesina e Ardagna (1998, p.4-5), o equilíbrio

orçamentário, principalmente via redução de gastos públicos, gera um efeito riqueza na

economia, em que, os agentes percebendo como permanente essa diminuição sentem que

a sua renda disponível futura aumentará, visto que não precisarão pagar impostos – já que

a dívida pública se estabilizaria -, de modo que eles passam a consumir no presente,

estimulando a economia:

Aumento de impostos e/ou redução de gastos públicos percebidos como

permanente, pela remoção do risco do incremento e dos custos de

ajustamentos fiscais no futuro, gera um efeito riqueza positivo. Os

consumidores antecipam um aumento em suas rendas permanentes

futuras e assim podem induzir ao aumento no consumo privado corrente

e na demanda agregada (Alesina e Ardagna, 2009, p.4)

Se em momentos agudos de crise, o Estado aumentar o gasto público e reduzir impostos,

via aumento da dívida pública, os agentes irão interpretar essa política fiscal expansionista

como encargos futuros a serem pagos, de modo que eles reduzem seu consumo hoje,

17 “Quando os macroeconomistas do Novo Consenso olham para a política fiscal, a preocupação que se

instala se refere aos efeitos que suas mudanças impõem nos agregados e sobre a dinâmica intertemporal e

não no que se refere à estabilização no curto prazo. As questões relacionadas ao curto prazo são atribuídas

à política monetária, enquanto cabe à política fiscal a responsabilidade pelos assuntos estruturais, que

remetem ao “funcionamento da economia” aos quais se convencionou chamar de “fundamentos” (ibid) 18 Como veremos no capítulo 3, a ideia de austeridade fiscal expansionista está relacionada com a discussão

de que uma política fiscal contracionista, especialmente a redução do gasto público, gera efeitos positivos

na economia – como aumento do consumo e do investimento -, podendo até mesmo tirá-la de uma eventual

crise. Para maiores detalhes ver os estudos pioneiros no assunto Giovazzi e Pagano (1990) e Alesina e

Ardagna (1998)

Page 88: André Bologna de Castro Cardoso

88

neutralizando a ação estatal. O meio mais eficiente para sair da crise, segundo essa

perspectiva, é contraindo os gastos públicos.

Essa ideia de que contração fiscal gerará resultados expansionistas retira, então, qualquer

papel do Estado em atuar por meio de instrumentos fiscais: se nem em momentos de crise

a política fiscal seria eficiente, não há como reservar nenhum papel a ela em qualquer

momento, visto que sempre ela será ineficiente. Ou seja, a melhor política fiscal é não

fazer nada.

A austeridade fiscal expansionista, ao colocar o efeito riqueza sobre o consumo como um

de desses canais de transmissão19, se utiliza o arcabouço da Equivalência Ricardiana – de

que redução permanente da dívida leva ao aumento do consumo hoje – para prescrever

medidas fiscais contracionistas e negar qualquer papel positivo à política fiscal.

O pensamento econômico da corrente mainstream considera estabilidade econômica

como, fundamentalmente, controle da inflação, algo bem diferente do que vimos em

Keynes, para quem a volatilidade está associada com variações no investimento. Diante

desse cenário teórico, em que a política fiscal não é capaz de influenciar a demanda, e a

atuação das autoridades econômicas tem como objetivo central o controle inflacionário,

é nítido como a ação fiscal foi sendo deixada em segundo plano.

Como explica Lopreato (2013, p.67), a tarefa da política fiscal, nesse quadro, é garantir a

efetividade da política monetária e ser uma âncora de estabilidade para outras variáveis

macroeconômicas. Expectativas de deterioração das contas públicas geram instabilidade,

antes mesmo de ocorrer, visto que os agentes incorporam as expectativas no

comportamento de preços.

Feita a discussão teórica, há uma ampla literatura que discute os resultados empíricos da

Equivalência Ricardiana, muitos dos quais fazem a crítica. Inicialmente, vamos

condensar alguns estudos que provaram, de modo empírico, a existência da Equivalência

Ricardiana.

19 Veremos no próximo capítulo que o outro canal de transmissão é a taxa de juros, algo que não guarda

relação com a Equivalência Ricardiana, visto que, para esta, a política fiscal não altera variáveis reais.

Page 89: André Bologna de Castro Cardoso

89

2.6 Estudos empíricos sobre a validade da Equivalência Ricardiana

Como o modelo da Equivalência Ricardiana é algo muito controverso e polêmico, vamos

buscar apresentar alguns estudos que buscaram comprovar sua validade, através de

análises desse modelo para alguns países.

Um primeiro estudo a ser mencionado é de Bender Filho (2014, p.369), o qual analisou a

validade da Equivalência Ricardiana para a economia brasileira. A hipótese não foi

rejeitada com 5% de significância, consequentemente, no período entre 1997 e 2011 a

neutralidade do déficit público foi confirmada. Segundo esse autor, uma das explicações

é a estabilidade econômica pela qual o Brasil passou nesse período, o que permitiu maior

grau de certeza quanto à condução da política econômica por parte dos agentes:

Uma explicação para a não rejeição dessa hipótese pode estar no

contexto econômico de estabilidade encontrado na economia brasileira

nos anos recentes, sobremaneira a partir do ano de 2000, o que

possibilitaria aos agentes a maior certeza quanto à política

governamental, bem como seus efeitos sobre a economia (ibid, p.370)

Contudo, por, justamente, ter sido um período de relativa estabilidade econômica, próprio

autor faz ponderação sobre os resultados encontrados argumentando sobre a necessidade

de novos estudos nesse campo, fundamentalmente, sobre outros períodos.

Giorgioni e Holden (2003) fizeram um modelo para tentar encontrar evidências da

Equivalência Ricardiana para países em desenvolvimento. Eles encontram que o déficit

público é significante para o consumo em apenas um país de dez analisados20, e a dívida

pública é significante em apenas três países, mas com sinal negativo. Dessa forma, eles

encontram validam o modelo de Equivalência Ricardiana, mas ressaltam que o problema

é mais complexo, dentro da própria literatura, e que limitações nos dados disponíveis

sobre os países estudados foram importantes para os resultados encontrados.

Afzal (2012), em seu estudo sobre Equivalência Ricardiana no Paquistão entre os anos

1960-2009, encontra evidências que corroboram o modelo de neutralidade da dívida

pública. Desse modo, variáveis econômicas, tais como renda, consumo, receitas e gastos

do governo não possuem relação de longo prazo:

Renda real, consumo real, as despesas governamentais e as receitas

públicas reais, embora não estacionárias, não estão cointegradas, o que

implica que o relacionamento de longo prazo não existe entre as

20 Os países analisados nesse estudo foram: Burundi, El Salvador, Etiópia, Honduras, India, Marrocos,

Nigéria, Paquistão, Sri Lanka e Zimbábue

Page 90: André Bologna de Castro Cardoso

90

variáveis consideradas. A causalidade vai da renda real para o consumo

real, a despesa pública real e a receita real do governo (Afzal, 2012,

p.262)

Evans (1988) fez um estudo para analisar se os consumidores norte-americanos seriam

“ricardianos”. Em uma de suas análises, ele procurar ver os impactos no consumo, diante

do corte de impostos realizados no primeiro trimestre do governo Kennedy-Johnson, e no

governo Reagan. Em ambos os casos, o consumo não se elevou, mesmo com redução dos

impostos:

(...) nos quatro trimestres que levaram ao corte de impostos Kennedy-

Johnson em 1964: I e ao corte de impostos Reagan em 1981: III. Mesmo

que ambos os cortes de impostos reduzam massivamente as taxas de

imposto sobre o rendimento pessoal, o consumo não aumentou

significativamente em antecipação de qualquer corte de impostos. Na

verdade, a antecipação do corte de impostos Reagan pode ter um

consumo reduzido (Evans, 1988, p.994)

Se o aumento da dívida pública ou mesmo o aumento do déficit do governo são neutros,

então, além de não causar impacto no consumo, a taxa de juros não seria afetada. Pelo

fato dos agentes “preverem” o comportamento futura de uma elevação da dívida pública

como aumento de impostos futuros, a poupança dos agentes faz com que nem mesmo a

taxa de juros seja afetada.

Evans (1985) faz uma análise para os Estados Unidos do impacto do aumento da dívida

pública sobre a taxa de juros. Ao analisar três períodos (Guerra Civil, I Guerra Mundial

e pós-II Guerra Mundial), esse autor demonstrou que, apesar do déficit público ter se

expandido fortemente durante esses períodos, as taxas de juros não se elevaram como

esperado, devido à poupança privada ter aumentado, tal como previsto pela Equivalência

Ricardiana.

O que precisa ser explicado é por que, em mais de um século da história

dos EUA, grandes déficits nunca foram associados a altas taxas de

juros, por que o grande aumento do déficit durante a Primeira Guerra

Mundial foi associado a um grande aumento quase igual na economia

privada, Por que a economia privada mudou-se no período do pós-

guerra para compensar mudanças no déficit e por que grandes déficits

aparentemente não produziram alta demanda agregada. A explicação

que parece mais consistente com essas observações é a de Barro (Ibid,

p.85)

Reynolds (2002) chega a mesma conclusão de Evans, ao analisar relação das taxas de

hipoteca com os déficits governamentais nos anos 1980 e 1990, nos quais os primeiros se

reduziram, enquanto os segundo se elevaram.

Page 91: André Bologna de Castro Cardoso

91

as taxas de hipotecas subiram em 1974 e 1980, quando os déficits

orçamentários eram bastante pequenos e a inflação foi alta. O déficit foi

muito maior em 1983 - 87, mas as taxas de hipoteca caíram junto com

a inflação. Depois de a economia entrou em recessão em 1990-91, o

déficit cresceu substancialmente até 1993, mas as taxas de hipoteca

recusou (Ibid, p.2)

Em seu estudo empírico, Knadler (2004) chega a resultados ricardianos. Primeiramente,

ele encontrou que os déficits públicos não causam impacto na poupança privada. Além

do mais, ao replicar as equações de Evans (1985), Knadler encontrou resultados

ricardianos para o impacto do déficit público sobre a taxa de juros, ou seja, de que o

primeiro não gera nenhum sobre a segunda:

No entanto, o que é importante é que minha regressão alcançou a

mesma conclusão que Evans: que o déficit faz não tem um efeito

estatisticamente significativo sobre a taxa de juros; Minha estatística t

sobre o déficit foi de apenas 1,122 (Knadler, 2004, p.66).

Contudo, esse mesmo autor (ibid, p.66-67), utilizando outra regressão encontrou

resultados diferentes, para os quais o déficit público possui impacto sobre a taxa de juros.

Desse modo, segundo ele, um aumento de US$1 bilhão no déficit público leva ao aumento

de 0,1 pontos percentuais na taxa de juros. Por isso ele conclui que a relação entre déficit

público e taxa de juros, comprovando ou não a Equivalência Ricardiana é apenas uma

questão de metodologia a ser utilizada:

Por conseguinte, a conclusão deste trabalho deve ser que, como a

descoberta do Relatório do Tesouro de 1984, a prova empírica da

relação entre déficits e taxas de juros é muito uma questão de

metodologia econômonométrica, com diferentes métodos que podem

provar tanto a Ricardiana ou a visão tradicional dos déficits (ibid, p.67)

Os estudos buscam comprovam que um déficit público é ineficiente para afetar tanto o

consumo dos agentes quanto a taxa de juros, afirmando o caráter ineficaz da política

fiscal. Como visto pelos pressupostos da Equivalência Ricardiana, o gasto público é

constante, de modo que, ao que nos indica, o déficit público é resultado de redução de

impostos e não de aumento dos gastos do governo. Assim, reduzir impostos (ou emitir

dívida para compensar redução de impostos), dentro dessa visão da Equivalência, não

gera impactos na economia.

Dessa forma, em nossa interpretação desses resultados, esses estudos apenas comprovam

que reduzir impostos não é eficaz como forma de estimular a economia. Não

encontramos, dentro da literatura analisada, nenhum estudo validando Equivalência

Page 92: André Bologna de Castro Cardoso

92

Ricardiana a partir de uma lógica do aumento do dispêndio público, mas, apenas, tratando

de déficit público. Ao que nos parece, a Equivalência Ricardiana apenas demonstra que

reduzir impostos não gera impactos na economia, mas não traz nenhuma evidência sobre

ineficácia do gasto público.

Nessa parte, buscamos apresentar alguns estudos emprícios que tratam da questão da

Equivalência Ricardiana. Alguns estudos tratam mais sistematicamente do impacto do

gasto público sobre a economia, enquanto alguns focaram na relação entre taxa de juros

e déficit público. Como visto, ainda que haja estudo que busquem comprovar a

Equivalência Ricardiana, ela não parece ser um consenso dentro do próprio pensamento

ortdoxo, de modo que devemos explorar como essa ideia está inserida dentro do debate

econômico.

2.7 Equivalência Ricardiana no debate ortodoxo21

Há várias críticas, dentro da própria teoria convencional, à Equivalência Ricardiana e elas

são variadas: vão desde estudos que procuram estudar a validade desses conceitos em

diversos países, principalmente, naqueles em desenvolvimento, na análise de outros

modelos de decisão de consumo, e crítica aos pressupostos da Equivalência Ricardiana.

É importante adentrar no pensamento ortodoxo e em seus estudos para compreender como

a Equivalência Ricardiana se insere, de modo a verificar qual a sua relevância em termos

de teoria.

Nosso foco, nessa parte, será trazer as várias formas de questionamento desse modelo

dentro do debate econômico. Para tanto, mostraremos o modelo de dívida pública trazido

por Blanchard e Fischer (1989, cap.3), o qual não apresenta resultado ricardiano. Por

outro lado, tratemos algumas discussões empíricas, aplicando a Equivalência Ricardiana

a determinados países. E por fim, traremos uma discussão sobre o conceito crowding out

na política fiscal, o qual se contrapõe à Equivalência Ricardiana.

2.7.1 Modelos de gerações interpostas (overlapping model)

Blanchard e Fischer (1989, cap.3) utilizam um outro modelo para demonstram resultado

não-ricardianos, de modo que é uma outra forma de ver o impacto dos modelos de

21 Entendemos ortodoxia, justamente, como o pensamento dominante na economia, a qual é a fonte dos

livros-textos e que está presente nos principais centros de economia.

Page 93: André Bologna de Castro Cardoso

93

gerações intertemporais. A diferença entre o modelo de Ramsey e os de ciclo de vida é

que os impostos são cobrados em diferentes tempos e para diferentes pessoas. Vejamos:

A restrição do orçamento governamental é a mesma para ambos modelos.

𝑑𝐵(𝑡)

𝑑𝑡= 𝑟(𝑡)𝐵(𝑡) + 𝐺(𝑡) − 𝑇(𝑡) (25)

lim𝑛→∞

𝐵(𝑧) exp[− ∫ 𝑟(𝑢)𝑑𝑢𝑧

𝑡] = 0 (26)

Integrando, temos a restrição orçamentária do governo.

𝐵(𝑡) = − ∫ [𝐺(𝑧) − 𝑇(𝑧)]𝑧

𝑡exp −{∫ [𝑟(𝑢)𝑑𝑢]

𝑧

𝑡𝑑𝑧} (27)

O governo afeta o consumo dos agentes de três formas: através do seu próprio consumo,

da cobrança de impostos e da dívida pública.

𝐶(𝑡) = (𝑝 + 𝜃)[𝐻(𝑡) = 𝑉(𝑡) (28)

𝑉(𝑡) = 𝐵(𝑡) + 𝐾(𝑡) (29)

𝐻(𝑡) = ∫ [𝑌(𝑧) − 𝑇(𝑧)]𝑡

exp {− ∫ [𝑟(𝑢) + 𝑝]𝑧

𝑡𝑑𝑢}𝑑𝑧 (30)

𝑑𝑉

𝑑𝑡= 𝑟(𝑡)𝑉(𝑡) − 𝐶(𝑡) − 𝑇(𝑡)(31)

A riqueza financeira, portanto, inclui tanto a dívida do governo quanto outros ativos. A

riqueza humana é valor presente descontado da renda da não-taxa de juros menos

impostos, descontados por r + p. Agora, por exemplo, analisando uma redução dos

impostos considerando elevação no tempo t+s.

𝑑𝑇(𝑡 + 𝑠) = {exp [∫ 𝑟(𝑢)𝑑𝑢𝑡+𝑠

𝑡]} 𝑑𝑇(𝑡) (32)

Desse modo, um aumento nos impostos no tempo posterior (t+s) será igual à redução

inicial no tempo t, composto pela taxa de juros. Desse modo, com a dívida B não sendo

afetada, essa redução dos impostos possui efeito na demanda agregada, em decorrência

da elevação no consumo, por causa de impactos na riqueza humana.

𝑑𝐻(𝑡) = −𝑑𝑇(𝑡) − 𝑑𝑇(𝑡 + 𝑠)exp {∫ [𝑟(𝑢) + 𝑝]𝑧

𝑡𝑑𝑢}𝑑𝑧, (33)

Ou usando a restrição do governo

𝑑𝐻(𝑡) = −𝑑𝑇[𝜏 − exp(−𝑝𝑠)] (34)

Page 94: André Bologna de Castro Cardoso

94

Desse modo, como a redução de impostos no tempo t, ou seja, dT(t)<0, então a riqueza

humana dos agentes é elevada, e consequentemente, seu consumo. Além do mais, quanto

mais se estender o período em que serão cobrados os impostos (s), maior o efeito-riqueza.

Segundo os autores, o ponto elementar é que esse efeito sobre a realocação dos impostos

vem das diferentes taxas de desconto na restrição orçamentária do governo (r) e da

definição de riqueza humana (r+p), visto que p é a probabilidade de o indivíduo morrer,

refletindo que parte dos impostos é deixada para que outras gerações pagarem.

Dessa maneira 𝜏 − exp(−𝑝𝑠)é simplesmente a probabilidade de não ter que pagar os

impostos futuros quando o governo os cobrar. A exceção é quando p=o, ou seja, se os

indivíduos vivessem eternamente – visto que p é a probabilidade de morte dos agentes -,

de modo que o deslocamente da cobrança de impostos não exerceria impactos sobre a

riqueza das pessoas e, portanto, não teria elevação de consumo.

Para que a Equivalência Ricardiana funcione, dentro desse modelo de gerações

superpostas, os indivíduos precisam acreditar que vão viver infinitamente, ou seja, eles

precisam imaginar que recairão sobre eles mesmos os impostos futuros. Quanto mais

longo período para o qual o governo elevará os impostos, maior será o impacto da política

fiscal na economia. Blanchard (2004, p.562) argumenta que, ao menos no curto prazo, o

déficit público pode ter alguma influência na economia:

Portanto, é seguro concluir que os déficits orçamentários têm um efeito

importante sobre a atividade econômica – embora, talvez um efeito

menor do que pensamos antes de examinar o argumento da equivalência

ricardiana. No curto prazo, os déficits maiores possivelmente levarão a

uma demanda maior e a um produto maior. No longo prazo, a dívida

pública mais elevada reduz a acumulação de capital e,

consequentemente, diminui o produto.

Como argumentam os autores, se os indivíduos possuem horizontes mais curto – ou

finitos -, então a Equivalência Ricardiana falha. Somente, se os indivíduos tiverem

horizontes infinitos, em que p=0, é que essa proposição faz sentido. Nesse sentido, o que

se nota dessa discussão sobre as duas modelos gerações interpostas é que a Equivalência

Ricardiana não é um consenso dentro do pensamento ortodoxo, inclusive, sendo mais

uma exceção – como visto no último modelo, quando p=0 – do que uma regra em geral

2.7.2 Estudos empíricos

Page 95: André Bologna de Castro Cardoso

95

Uma análise mais profunda sobre o debate acerca da política fiscal na visão ortodoxo e

dos modelos mais recentes de escolha intertemporal indicam que a Equivalência

Ricardiana não é um consenso. Seed e Khan (2012, p.1433-1435) fazem uma síntese da

literatura sobre Equivalência Ricardiana aplicada a diversos países, cujo resultado é que

em alguns modelos ela parece ser funcionada, mas para uma série de estudos, elas foram

inconclusivas.

Nesse mesmo trabalho apontado, os autores buscam realizar um modelo econométrico

para buscar evidência da Equivalência Ricardiana no Paquistão. No teste de vetor com

restrições, a hipótese da Equivalência Ricardiana foi rejeitada:

Tendo em vista esses resultados, a validade da hipótese da Equivalência

Ricardiana não pode ser favorecida no caso do Paquistão. Isto implica

que um aumento do déficit não é totalmente acomodado por um

aumento da poupança privada para uma certa despesa (ibid, p.1443)

O argumento desses autores (ibid, p.1444) é que, provavelmente, um aumento no déficit

público do governo, com aumento de seu endividamento, não faz as pessoas aumentarem

suas poupanças internas, mas, sim, faz surgir a necessidade de maior poupança externa.

Eles concluem argumentando que o governo utiliza três formas de financiamento de

maneira simultânea: cobrança de impostos, dívida interna e externa, de modo que

dificilmente o governo vai apenas se endividar e não cobrar impostos. Além do mais, a

renda disponível já está no nível de subsistência em países periférico, nesse sentido,

aumentos no déficit do governo não impactam o consumo, pois as pessoas possuem um

padrão estável de consumo. Consequentemente, a política fiscal pode gerar impactos na

economia.

As pessoas geralmente seguem um determinado caminho padrão de

despesas e, portanto, a substituição da dívida por impostos tem pouco

impacto no nível de consumo das famílias. Isso significa que a política

fiscal pode desempenhar um papel efetivo para estabilizar a economia

em certa medida, o que, por sua vez, leva à validade da hipótese de

déficit gêmeos (ibid, p.1444)

Outro estudo interessante para o caso da Nigéria (Datom e Omotosho, 2017), os cálculos

econométricos apontam que para cada aumento de 1% da renda disponível, o consumo

privado aumenta 0,34%. Ou seja, se o governo reduz impostos, fazendo com que a renda

disponível se eleve, ao invés dos agentes contraírem seu consumo, como previsto pela

Equivalência Ricardiana, há aumento do consumo. Além do mais, esse autor mostra que

para cada aumento de 1% no gasto do governo, o consumo se eleva 0,56%,, assim como

Page 96: André Bologna de Castro Cardoso

96

aumento de 1% na dívida pública, eleva o consumo em 0,29%, ou seja, a dívida pública

é considerada riqueza. Desse modo, no caso da Nigéria, a política fiscal possui impacto

importante na economia.

Drakos (2001) realizou um estudo analisando a Equivalência Ricardiana para a Grécia.

Segundo suas conclusões (ibid, p.10), existe uma correlação entre aumento da dívida

pública e aumento da poupança privada, contudo, esta não compensa totalmente a

primeira – ou seja, não seria uma relação um-para-um, em que, por exemplo, aumento de

1% no déficit do governo leva a ao aumento em 1% na poupança privada. Como explica

esse autor, os agentes ainda vêm os títulos do governo como fonte de riqueza e, por isso,

diante de um aumento da dívida pública, eles passam a consumir uma parte de sua renda.

A explicação para Equivalência Ricardiana não ser válida, neste caso, é a existência de

restrição de liquidez por parte do setor privado, o que abre espaço para que os títulos

públicos possam servir como riqueza para os agentes.

Adji e Alm (2016) rejeitaram a Equivalência Ricardiana para a Indonésia. Segundo esses

autores (ibid, p.11) o consumo agregado é muito mais sensível com a renda corrente do

que com dívida pública. Além do mais, encontram relação positiva entre taxas de juros e

aumento do déficit público e entre déficit público e déficit no balanço comercial,

invalidando a Equivalência Ricardiana para o caso indonésio.

O estudo de Belingher e Moroainu (2015), no qual tentam buscar evidências para

economia da Romênia entre os anos de 2004 e 2012 é bem interessante. Seus resultados

invalidam a hipótese da Equivalência Ricardiana, e, também, encontram relação positiva

entre aumento dos gastos do governo e aumento do consumo.

Os resultados deste modelo estão invalidando a existência da

equivalência ricardiana na Romênia, para o período analisado (2004q4

- 2012q3). Assim, a taxa de crescimento dos gastos governamentais são

capazes de influenciar a taxa de crescimento do consumo das famílias.

Este resultado sustenta a proposta de recuperação de Keynes: para

aumentar consumo, é necessário aumentar os gastos governamentais

(ibid, p.169)

Niple (2006) realizou um estado para investigar se a equivalência ricardiana valeria para

os condados dos Estados Unidos e sua conclusão é negativa. Em seu modelo, os

consumidores não alteram seus hábitos de consumo em decorrência do aumento do déficit

público. Para ela não há, portanto, uma relação entre déficit público e consumo.

Page 97: André Bologna de Castro Cardoso

97

Os resultados da minha regressão não suportam a teoria da equivalência

ricardiana. Os consumidores a nível de um município não mudarão

hábitos de consumo para pagar impostos futuros quando o governo do

município tiver um déficit. Este modelo contradiz o modelo original de

Barro, bem como a crença keynesiana de que só o bem pode advir de

déficits orçamentários. Em vez disso, não mostra nenhuma relação entre

déficits e taxas de consumo (ibid, p.10)

Sua argumentação (ibid, p.10-11) consite em afirmar que os consumidores encaram

dívida pública como riqueza adicional, sem que eles tenham necessidade de cortar seus

gastos com consumo diante de elevação de impostos no futuros. Este autor (ibid, p.11)

exemplica com caso em que um município emite títulos públicos com a finalidade de

constuir escolas ou para realizar compras de material escolar e etc. Se os pais veem que

eles não precisarão comprar material escolar, pois a própria escola irá oferece-lo, então a

renda disponível se eleva e eles poderão gastar com alguma outra coisa, mantendo o nível

de consumo na economia.

Hayo e Neumeier (2017) realizaram uma estudo empírico, voltado para análise do

comportamento dos consumidores na Alemanha. Por meio de 2.000 observações, eles

rejeitaram a proposição da Equivalência: apenas 7% dos consumidores alteram seu

comportamento de consumo – reduzindo-o – diante do aumento do déficit público,

enquanto 18% fazem o contrário do que argumenta a Equivalência Ricardiana, e mais ou

menos dois terços não alteram o consumo nem a poupança.

Esses autores se utilizaram de informações adicionais de um sub-grupo que tiveram

redução nas contribuições sociais obrigatórias, de modo que eles foram divididos em três

categorias: Ricardianos – para quem valeria a ideia da Equivalência Ricardiana -, anti-

Ricardianos e os indecisos. O resultado foi:

Desse subgrupo da população, 36% se enquadram na categoria

"ricardiana", enquanto 46% e 18% são "anti-ricardianos" e "não claros",

respectivamente. Isso implica que, mesmo quando se concentrar nos

entrevistados que provavelmente tenham mais influência sobre as

decisões de consumo doméstico e levando em consideração suas

expectativas futuras em relação à mudança de imposto, dois terços não

se comportam de acordo com RET [ Ricardian Equivalence Theory –

Teorema da Equivalência Ricardiana] (ibid, p.24)

Eles concluem afirmando que resultados não-ricardianos são mais a norma do que a

exceção: “No entanto, nosso resultado sugere que o comportamento não-ricardiano é

ainda mais prevalente do que é geralmente assumido em modelos macroeconômicos e

Page 98: André Bologna de Castro Cardoso

98

que reflete a norma e não a exceção, pelo menos em nosso conjunto de dados” (ibid,

p.24). Desse modo, o padrão para economia é que a expansão da dívida pública possua

impactos nas variáveis econômicas ao contrário do que preconiza o teorema da

Equilvaência Ricardiana.

Fang (2010) também não encontrou evidências da Equivalência Ricardiana para o caso

da China. Segundo ele, os títulos públicos chineses são vistos como investimentos

seguros, com pouco risco, obtendo, inclusive, um retorno maior do que os depósitos

bancários. Por isso, a expansão da dívida pública acaba por estimular o consumo dos

indivíduos chineses. Além do mais, com uma forte tradição de frugalidade e de poupança,

a emissão de títulos públicos permite elevar uma demanda suprimida. Dessa forma, gasto

público possui efeitos mais duradouros na economia, enquanto a redução de impostos

possui um efeito apenas no curto prazo – contrarindo a Equivalência Ricardiana – mas

sem gerar resultados positivos no futuro:

O impacto estável, contínuo e positivo aparece na despesa fiscal,

enquanto a flutuação positiva e negativa óbvia na tributação, que tem

pouco efeito sobre a produção em longo período. Todos os itens acima

indicam política fiscal com a expansão das despesas do governo, pois o

principal instrumento tem efeitos de expansão estáveis e duradouros na

economia nacional. Mas a redução de impostos apenas estimula a

economia em curto prazo e é ineficaz em longo prazo. Portanto, a

Proposição de Equivalência Ricardiana não está correta na economia

chinesa (Fang, 2010, p.212)

Berheim (1987, p.293-299) se concentrou em um estudo para 23 países e rejeitou a

hipótese da Equivalência Rcardiana. Segundo seus resultados, dos 23 países, 15

mostraram ter relação positiva entre consumo privado e aumento do déficit público. Além

do mais, quanto mais forte o déficito, mais forte essa relação. Como o estudo aponta, dos

16 países que experimentaram déficit acima de 1% do PIB, 11 déficit e consumo se

moveram no mesmo sentido. Dos 7 países, cujo o déficit acima de 3% do PIB, 6 tiveram

aumento do consumo privado.

As várias outras equações e regressões do estudo apontam, em menor ou maior grau, que

déficit píublico eleva o consumo privado. Em uma de suas regressões, o resultado indica

que um déficit (deficit-for-taxes swap) de 1%, eleva o consumo em 0,37%, e que um

aumento da dívida público em 1%, eleva o consumo em 0,06%. Por isso, o autor

argumenta que esses resultados são mais keynesianos do que ricardianos (ibid, p.72) e

conclui: “Em geral, a análise de dados entre países apoia a visão de que os déficits

Page 99: André Bologna de Castro Cardoso

99

governamentais estimulam o consumo privado. A robustez desta conclusão com relação

a especificações alternativas, estimativas técnicas e amostras é bastante impressionante”

(ibid, p.73)

Mohabbat e Ashaf (2003) procuraram evidências sobre Equivalência Ricardiana em

países da América Sul – Costa Rica, Guatemala, Uruguai e El Salvador. Segundo esses

autores, a neutralidade da dívida é rejeitada, pois ela gera impactos na economia, não só

em termos de quem irá pagá-la, futuramente. Quando há uma considerável necessidade

do governo de captar fundos para financiar a dívida pública, isso leva à pressão sobre taxa

de juros, sobre a inflação e ao balanço de pagamentos. Esse movimento leva à redução

do investimento e do consumo, de modo que a economia entra em uma espiral negativa,

só sendo reativada, através de uma política fiscal contraciclica:

Na medida em que a dívida nacional não é neutra no seu efeito sobre a

economia, pode-se encontrar algum consolo em que uma política fiscal

anticíclica judiciosa pode ser razoavelmente eficaz em alocando

recursos de forma mais eficiente (ibid, p.8)

Notamos a partir desse ponto é que dentro do próprio pensamento ortodoxo, a

Equivalência Ricardiana sofre críticas, por meio de estudos empíricos. Dessa forma, para

a visão convencional de economia, a pergunta que resta é: a política fiscal pode afetar a

economia?

2.7.3 Impactos de curto prazo da política fiscal

A Equivalência Ricardiana nega qualquer efeito da política fiscal tanto no curto quanto

no longo prazo. Nesse sentido, ela não deve ser utilizada, em hipótese nenhuma, para

fomentar a demanda agregada, nem mesmo em momentos de crise. Inclusive, ao

contrário, os gastos, principalmente, devem ser cortados. Mas será que a visão mais geral

do pensamento ortodoxo defende essas ideias?

Mankiw e Elmendorf (1998) distinguem duas análises sobre política fiscal. Uma delas é

a denominada de alternativa, que é, basicamente, a ideia de Equivalência Ricardiana. De

outro lado, eles denominam de visão convencional - a visão mais aceita sobre política

fiscal. Essa visão convencional divide a economia em dois períodos: curto e longo prazo,

de modo que a atuação do governo afeta a economia de modo diverso nesses dois

períodos.

Page 100: André Bologna de Castro Cardoso

100

No curto prazo, segundo estes autores (ibid, p.15), em decorrência da rigidez de preços e

salários22, o déficit público pode gerar impactos positivos sobre a demanda agregada ao

elevar a renda da comunidade. Portanto, diante de um quadro recessivo, cortar impostos

ou aumentar os gastos do governo faz com que a demanda da economia se eleve. Ela seria

“keynesianas” no curto prazo.

Já no longo prazo, a economia tenderia ao modelo clássico. Desse modo, podemos dizer

que vale a ideia de crowding out (substituição) entre déficit público e o investimento e

consumo privado. Mankiw e Elemendorf (1998, p.15-18) utilizam a equação

macroeconômica de S + (T-G) = I + NX, em que S é a poupança privada, T-G a poupança

pública, sendo que a soma de ambas é a poupança nacional, I investimento e NX são as

exportações líquidas23. Dessa forma, se o déficit público aumenta (reduzindo a poupança

pública), a poupança privada aumenta, o que irá reduzir os recursos disponíveis para o

investimento, e as exportações declinam, pois, o câmbio se valoriza em decorrência do

aumento da taxa de juros, levando ao aumento do déficit público.

O que se nota é que, dentro da visão convencional, a política fiscal possui impacto no

curto prazo, ao elevar a demanda agregada. No longo prazo, vale a ideia de que o déficit

público substitui o investimento privado e leva ao aumento do déficit em transações

correntes. Se no primeiro momento, a atuação da política fiscal pode ser positiva, no

segundo, ela é negativa. Mas, nota-se que, de qualquer forma, ela possui impactos

importantes na economia e não é totalmente ineficaz, tal como pressupõe a Equivalência

Ricardiana.

Dentro da própria teoria convencional ou ortodoxa, a Equivalência Ricardiana parece não

ser um consenso, sendo considerada uma exceção e defendida por poucos economistas.

Como explica Lopreato (2006, p.21) poucos economistas defendem a Equivalência

Ricardiana, de modo que o consenso na política fiscal é a de que o caminho para reduzir

a taxa de juros está na redução do déficit público.

Desse modo, ainda que Mankiw e Elendorf (1998, p.43-44) reconhecem a importância da

Equivalência Ricardiana, pois seus defensores seriam economistas brilhantes e que essa

ideia ajuda na compreensão da dívida pública, ao que nos parece, dentro do debate

22 A rigidez de preços e salários impede que o mercado se ajuste de modo automático, fazendo com que a

economia encontre dificuldades em se autoequilibrar no curto prazo. 23 Ou seja, são as exportações menos as importações. É o superávit ou o déficit em conta corrente.

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101

econômico, ela tem sido deixada de lado, enquanto a teoria convencional, de que déficits

possuem impacto no curto prazo, mas que, no longo, ela diminui o investimento (via

aumento da taxa de juros) e a renda – efeito crowding out - tem sido mais aceita dentro

do próprio debate econômico. Na nossa visão, a Equivalência Ricardiana parece estar em

espectro mais radical da concepção ortodoxa sobre política fiscal.

Contudo, as implicações de política econômica são as mesmas tanto para a Equivalência

Ricardiana quanto para a visão convencional de crowding out, segundo a tipologia de

Mankiw e Elendorf (1998). Equilíbrio fiscal e sustentabilidade da dívida pública são as

recomendações para a atuação da política fiscal, pois a adoção de instrumentos fiscais

expansionistas são prejudicais no curto prazo (Equivalência Ricardiana) e no longo prazo

(crowing out) para a economia.

Conclusão

Nesse capítulo, buscamos detalhar a ideia de Equivalência Ricardiana, segundo a qual,

aumento do déficit do governo, financiando por títulos público, equivale a aumento de

impostos na percepção dos agentes. Desse modo, as famílias regem ao aumento do déficit

público, elevando a poupança para cobrir eventuais aumentos de impostos futuros para o

pagamento da dívida pública. Nesse sentido, mesmo que a dívida seja cobrada apenas na

geração posterior, os agentes poupam para repassar recursos a seus descendentes, de

modo que elas possam pagar os tributos.

Dessa forma, como a redução da poupança pública leva ao aumento da poupança privada

na mesma proporção, o déficit público não gera impactos nenhum na economia: consumo,

taxa de juros e balanço comercial não são alterados. A política fiscal é

complementarmente ineficaz para impactar as variáveis da economia.

O ponto fundamental é que a política fiscal é ineficaz e não possui dinamismo. Isso

porque, os agentes interpretam elevação do déficit público como aumentos de impostos

futuros, reduzindo seu consumo hoje. Isso ocorre, porque não há efeito multiplicador

capaz de elevar a renda, visto que ela é dada.

Vimos, também, que para poder gerar esses resultados, a Equivalência Ricardiana

necessita de alguns pressupostos importantes, como mercados financeiros perfeitos, ou

seja, sem constrangimentos de liquidez, impostos lump slum, e que as famílias são

altruístas com seus descendentes.

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102

Portanto, no modelo concebido por Barro (1974), a dívida pública não exerce nenhum

impacto sobre a riqueza das famílias, pois elas repassam recursos para seus descendentes,

de modo a cobrir os futuros aumentos de impostos. Assim, a política fiscal não exerce

nenhuma influência na economia, no sentido de afetar variáveis como demanda, taxa de

juros e balanço de pagamentos, de forma que ela deve estar sujeita a regras, visto que ela

ainda é importante para manter a dívida pública em uma trajetória sustentável. Ou seja, a

política fiscal serve mais como um “farol” para guiar as expectativas dos detentores da

dívida do que para afetar variáveis econômicas.

Alguns estudos apresentam que não existe nenhuma relação entre taxa de juros e déficit

público, o que valida a hipótese da Equivalência Ricardiana. Além do mais, outros

estudos apresentam que esse modelo é válido para alguns países, como Paquistão e Brasil.

Contudo, dentro da própria teoria convencional, a Equivalência Ricardiana parece ser

uma exceção ou uma visão mais radical sobre política fiscal, adotado por poucos

economistas. O modelo apresentado por Blanchard e Fischer (1989, cap.3) apresenta um

modelo, no qual Equivalência Ricardiana é uma exceção, só sendo válida quando a vida

dos agentes for infinita. Além do mais, outros estudos mostram que esse modelo não pode

ser aplicado para alguns países, como Nigeria, por exemplo, em decorrência da restrição

da liquidez nos mercados financeiros, contradizendo uma das hipóteses mais importantes.

A Equivalência Ricardiana é defendida por poucos economistas dentro do próprio

arcabouço ortodoxo, visto que prevalece ideia de que, ao menos no curto prazo, política

fiscal influencia variáveis reais da economia

Não obstante a importância teórica atribuida à Equivalência Ricardiana

são poucos os que a defendem. O pensamento atualmente aceito –

concordando com visão monetarista – vê no controle do déficit público

o caminho necessário à redução da taxa de juros (...) (Lopreato, 2006,

p.21)

A teoria convencional sobre política fiscal defende que o déficit público, no curto prazo,

gera impactos positivos para economia, através da elevação da demanda agregada,

enquanto que no longo prazo, aumento do déficit público leva ao aumento da taxa de

juros, reduzindo o investimento e elevando o déficit da balança comercial. Mesmo assim,

como visto, Mankiw e Elendorf (1998) consideram esse modelo importante para

compreensão dos impactos da dívida pública, e, portanto, não deveria ser completamente

abandonado.

Page 103: André Bologna de Castro Cardoso

103

Contudo, é preciso notar que as implicações da Equivalência Ricardiana são importantes

dentro do pensamento convencional. A recomendação de política econômica é a de

equilíbrio fiscal, com o intuito de manter a dívida pública em uma trajetória estável. Por

mais que se questionem seus pressupostos e seus resultados empíricos, a política fiscal

não deve ser um instrumento de fomento à atividade econômica, especialmente, de longo

prazo, mas deve ser crível para manter as expectativas positivas dos agentes quanto à

evolução das contas públicas.

De qualquer modo, procuramos mostrar nesse capítulo que na Equivalência Ricardiana a

política fiscal não exerce qualquer influência sobre a economia, nem gera dinamismo,

pois, diante de seus pressupostos, os agentes econômicos conseguem se antecipar à

política fiscal e neutralizá-la. Nesse sentido, ao invés do crowding in entre ação fiscal do

Estado e gasto privado, há uma relação de neutralidade entre eles, bem diferente do que

pregou Keynes.

No próximo capítulo, procuraremos ver como se colocam no debate pós-crise de 2008

tanto as ideias da Equivalência Ricardiana como as de Keynes: será que a primeira foi

sendo deixada de lado em detrimento da segunda? Esse é um dos questionamentos do

próximo capítulo.

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104

Capítulo 3 – Pensamento de Keynes e a Equivalência Ricardiana no

debate pós-crise de 2008

Introdução

A crise de 2008 foi profunda e severa não só para os Estados Unidos como para todo o

resto do mundo. Diante da gravidade da situação, as autoridades não poderiam deixar

simplesmente o “mercado funcionar”, mas precisavam dar uma resposta mais incisiva. A

memória da Grande Depressão de 1930 ecoou para os governos.

Como discutido no capítulo 2, a política fiscal dentro do pensamento ortodoxo ocupava

um papel passivo, enquanto a política monetária era o principal instrumento de política

econômica a ser utilizado para fomentar ou desacelerar a economia. As ideias de

equilíbrio orçamentário e da austeridade fiscal, tanto no curto quanto no longo prazo,

estavam muito presentes no pensamento econômico desde os anos 1970-1980.

Nos modelos econômicos e de negócios não havia, inclusive, a possibilidade de uma crise

de grandes proporções ocorrer24. Um exemplo é do economista novo-clássico Robert

Lucas, o qual afirmou em 2003, que o problema das depressões estava resolvido25. A

política monetária, por si mesma, conseguiria estabilizar a economia, e o equilíbrio fiscal

possibilitava o investimento e o consumo, pois, seguindo a Equivalência Ricardiana, não

haveria necessidade de cobrar impostos no futuro.

Contudo, a crise econômica, além de pegar os economistas de surpresa, fez com que o

pensamento ortodoxo tivesse de se ajustar à nova realidade. Como forma de estimular a

economia, as taxas de juros foram reduzidas a praticamente zero, sem possibilidade de

diminuir mais. Sem poder utilizar a política monetária como combate à crise econômica,

começou-se a discutir a possibilidade de a política fiscal ser eficaz em estimular a

economia para resolver a recessão.

Abriu-se, portanto, um espaço, dentro do pensamento ortodoxo, para discutir a eficácia e

o dinamismo da política, no sentido de ela gerar uma sequência de impactos positivos na

economia, de modo a sair da crise. As ideias de Equivalência Ricardiana e,

24 A possibilidade de crise dentro desses modelos estava no que se chama “evento de cauda”, em que em

uma curva estatística de distribuição normal (de distribuição “gaussiana”, a qual tem forma de sino), quanto

mais mais próxima das caudas, menores chances de tal evento acontecer, visto que a maior parte das ações

se situa no meio da dsitribuição. 25 A afirmação de Lucas pode ser vista no artigo de Krugman (2009, p.1).

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105

consequentemente, de equilíbrio fiscal permanente foram sendo deixadas de lado, ao

menos no curto prazo, e a política fiscal de cunho keynesiano26 foi resgatada por

economistas antes críticos27 de ações fiscais mais ativas (Farrell e Quiggin, 2011, p.16-

18) e pelas próprias autoridades governamentais:

Uma das principais razões pelas quais o keynesianismo se tornou a

política du jour foi desde que logo as ideias neoliberais dominantes

negavam que uma crise daquelas fosse possível. Portanto, quando se

deu, tinha de abrir espaço para ideias que dissessem que esses

acontecimentos eram iniveitáveis caso se deixasse os mercados

regularem a si mesmo, que é a tese keynesiana (Blyth, 2017, p. 90)

A revisão dentro do pensamento mainstream coloca uma questão: até que ponto há

semelhanças entre o papel da política fiscal reservado nesse período de crise e daquele

proposto por Keynes, assim como até que ponto as ideias de Equivalência Ricardiana

foram deixadas de lado.

Ao entrar e detalhar o debate pós-crise dentro do pensamento ortodoxo, buscamos

comparar o que discutimos nos capítulos 1 e 2 com a literatura recente sobre política

fiscal, e ver qual será a tendência teórica da discussão sobre as ações fiscais: se para o

pensamento de Keynes ou se ainda haverá forte presença da Equivalência Ricardiana e

suas consequentes implicações para a política econômica.

Essa análise comparativa entre o pensamento de Keynes e da Equivalência Ricardiana em

relação à literatura pós-crise é um exercício importante visando entender para qual

caminho está sendo direcionado o papel da política fiscal e seus efeitos na economia. Será

que ela vai ser reconhecida como um instrumento eficaz para evitar e/ou salvar as crises

econômicas, como discutido por Keynes, ou será que ela ainda continuará sendo

considerada limitada em afetar a economia, como propõe a Equivalência Ricardiana?

Por mais que esse capítulo tenha como foco uma análise teórica e comparativa, essa

discussão é importante, pois podemos não só ver qual será o caminho teórico reservado à

política fiscal, como, a partir desses novos desenvolvimentos, se comportarão os

formuladores de política de política econômica. Ou seja, as autoridades econômicas

26 É preciso salientar que, como veremos no decorrer do capítulo, quando se fala em keynesianismo, trata-

se de uma visão de que gasto público e o déficit fomentam a demanda agregada. Contudo, segundo

discutimos no capítulo 1, essa é uma visão incompleta do pensamento de Keynes, o qual dava à política

fiscal uma visão mais complexa e de longo prazo. No trabalho de Farrell e Quiggin (2012), o termos

keynesianismo é utilizado nesse primeiro sentido. 27 Farrell e Quiggin (2012) citam Martin Feldstein e Richard Posner como os economistas críticos que

mudaram de lado, assim como FMI.

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106

utilizarão os instrumentos fiscais como uma forma de evitar a volatilidade na economia,

tal como pregado por Keynes, ou seguirão as recomendações da Equivalência Ricardiana

e da visão convencional de manter o equilíbrio fiscal a qualquer custo? As políticas

públicas, portanto, dependem desse debate.

O intuito do capítulo não é fazer uma revisão completa da literatura, mas trazer as ideias

que se têm discutido em termos de política fiscal no pós-crise e relacioná-las com a

discussão feita sobre a visão de Keynes e da Equivalência Ricardiana.

Esse capítulo está dividido em três seções: a primeira apresentamos a recente discussão

sobre o papel da política fiscal em momento de crise. Na segunda, vemos como a literatura

recente lida com a Equivalência Ricardiana. E por fim, na última seção, comparamos a

visão recente com o pensamento de Keynes, tal como apresentado no capítulo 1.

No que tange à Equivalência Ricardiana, buscamos ver como ela está inserida nesse

debate. Assim, a questão é: diante da crise econômica, o debate em torno da política fiscal

a traz à tona ou ela tem sido rejeitada, de modo que há diferença entre financiar o déficit

público por meio de dívida pública e impostos, e se redução de tributos estimula a

economia.

Um outro ponto a ser analisado nesse capítulo é ver como a discussão sobre importância

da política fiscal na crise está relacionada com a que fizemos no capítulo 1 sobre a visão

de Keynes em torno da questão fiscal. Dessa forma, a principal pergunta será: a política

fiscal é recomendada como uma política de estabilização de longo prazo, tal como

defendido por Keynes, ou como uma medida positiva apenas em momentos de grave crise

econômica?

3.1 Volta do debate sobre política fiscal

Discutimos no capítulo 2, que a política fiscal foi perdendo seu status como fomentadora

da demanda e de redução da volatilidade do investimento, tal como proposto por Keynes,

e passou a ter um papel passivo, servindo apenas como um guia para manter as

expectativas dos agentes, por meio da sustentabilidade da dívida pública. Nesse cenário,

a política monetária, com seu papel de estabilizar a inflação, se tornou elemento central

para política econômica.

Blanchard, Dell’Aricicia e Mauro (2010, p.5) colocam a política fiscal como subordinada

à política monetária e com papel limitado em afetar positivamente a economia. Isso

Page 107: André Bologna de Castro Cardoso

107

porque, a política monetária, por meio dos ajustes na taxa de juros, conseguiria manter a

estabilidade da economia e afetaria mais diretamente a demanda da economia. Nesse

sentido, para que utilizar a política fiscal, se, além de não afetar a economia, ela só levará

ao aumento de dívida, como prevê a Equivalência Ricardiana?

Como resultado, o foco foi principalmente na sustentabilidade da dívida

e nas regras fiscais projetadas para alcançar tal sustentabilidade. Na

medida em que os formuladores de políticas adotaram uma visão de

longo prazo, o foco nas economias avançadas foi o pré-posicionamento

das contas fiscais para as consequências iminentes do envelhecimento.

Nas economias de mercado emergentes, o foco era reduzir a

probabilidade de crises inadimplentes, mas também estabelecer

configurações institucionais para restringir as políticas fiscais pró-

cíclicas, de modo a evitar ciclos de expansão e colapso (Blanchard,

Dell’Aricicia e Mauro, 2010, p.6)

Essa visão, de subordinação da política fiscal, perdurou até a crise econômica de 2008.

Como aponta Lopreato (2014, p.2-3), a discussão sobre ação fiscal avançou, no pós-crise,

quanto a necessidade de seu uso não apenas como estabilizador automático, mas com

possibilidades de ajudar na resolução da crise econômica, diante da ineficiência da

política monetária em cumprir seus objetivos em um cenário, no qual a taxa de juros está

próxima de zero.

Eggerston (2010, p.60-61) coloca que em um cenário de taxa de juros próxima a zero,

sem intervenção estatal, a economia tende para deflação e redução do produto, visto que

sem a possibilidade de reduzir a taxa de juros nominal, a real tende a se elevar e

desestimular o investimento e o consumo. Assim, diante desse quadro, mesmo com taxas

de juros próxima de zero, a autoridade monetária não consegue evitar processo de

deflação, o que gera impactos negativos para retomada da atividade econômica.

Nota-se que o intuito de reduzir a taxa de juros para níveis mínimos possíveis, em vias de

estimular a demanda da economia (como visto, pelo aumento da inflação e redução da

taxa de juros real) não se consegue cumprir o objetivo de retomada da economia. Isso

ocorre, porque quando a taxa de juros está em seu limite inferior, ocorre o que se chama

de armadilha da liquidez (conceito proposto por Keynes, inclusive), em que o aumento

da oferta de moeda não é traduzido em demanda por outros ativos, mas, ao contrário, é

retido pelos agentes. Dessa forma, o preço dos demais ativos (reais ou financeiros) não

se eleva, o que tende a levar a um processo de deflação.

Page 108: André Bologna de Castro Cardoso

108

Na “armadilha”, a taxa de juros atinge um patamar em que a moeda

torna-se perfeitamente substituível por ativos que rendem juros,

permitindo que os agentes entesourem a oferta monetária ao invés de

usá-la para aumentar a demanda. Reduções nas taxas de juros abaixo

desse patamar não têm nenhum efeito sobre a demanda agregada (Dos

Santos, 2011, p.86)

Dentro desse contexto, portanto, a política fiscal ganha mais importância do que em outras

situações em que a economia está funcionando bem.

Com a insuficiência das medidas de política monetária e com a previsão

de uma crise de grande magnitude sobre a economia real, houve um

chamado geral para a utilização imediata de políticas fiscais da

expressão que a crise demandasse. O chamado vinha desde a academia,

passava pelas instituições internacionais (como o FMI e o BIS) e se

apresentava fortemente nas reuniões e encontros dos líderes mundiais à

época (Dos Santos, 2011, p.119).

O debate atual em torno da importância da política fiscal como instrumento importante

para retomada da demanda e da própria economia se insere nessa questão da incapacidade

da política monetária de estimular o movimento econômico. Desse modo, nota-se que as

ideias propostas por Keynes em torno da política fiscal voltaram a ganhar força, como

escreveu Anatole Kalestky no Japan Times em 2014:

Assim, os seis anos desde 2008 forneceram forte suporte empírico para

a visão keynesiana supostamente fora de moda de que o endividamento

do governo é mais poderoso do que a política monetária para estimular

economias severamente deprimidas e tirá-las da recessão (Kalestky,

2014, p.1)

Farrel e Quiqquin (2011, p.16) argumentam que houve “ascensão” do keynesianismo na

recomendação das políticas econômicas a serem adotadas para tirar a economia da crise.

Todas essas recomendações representaram um retorno a uma ampla

análise keynesiana do sriscos enfrentados pelas economias nacionais.

Sob a teoria keynesiana, a política fiscal ativa pode ser nenecessária

para sair de uma armadilha de liquidez, situação em que a política

monetária para aumentar a liquidez e baixar as taxas de juros) são

efetivamente inúteis. Se o governo está disposto a gastar dinheiro

para impulsionar a demanda agregada, pode romper a armadilha

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109

da economia ao impulsionar a demanda agregada e, assim, ajudar

a economia a retornar à estabilidade (ibid, p.17-18)

Nesse sentido, a discussão sobre política fiscal indica que, em momentos de crise, ela

possui um papel importante como estímulo econômico. Desse modo, medidas fiscais

discricionárias podem afetar as variáveis reais da economia, especialmente, a demanda e

a renda. Dentro desse quadro, como se coloca a Equivalência Ricardiana nesse debate

sobre política fiscal no pós-crise de 2008?

3.2 Equivalência Ricardiana nesse debate: financiamento e redução de impostos

Blanchard, Dell’Aricicia e Mauro (2010, p.5) afirmam que um dos motivos para o

ceticismo quanto à política fiscal vinham da Equivalência Ricardiana. Apesar, de como

apontado no capítulo 2, a Equivalência Ricardiana como teoria ser apresentada mais

como exceção do que regra no pensamento ortodoxo, sua crítica à política fiscal ajudou

a moldar o pensamento de como ela deveria ser executada.

A partir da crise econômica de 2008, e o consequente debate sobre como executar a

política fiscal em situação de armadilha da liquidez, a Equivalência Ricardiana parece ter

sido deixada de lado como fator explicativo para a questão da eficácia e dinamismo da

política fiscal. Fundamentalmente, a ideia de que o déficit público não é capaz de afetar

positivamente a economia e que medidas fiscais discricionárias não deveriam ser

adotadas em hipótese nenhuma, foram rejeitadas no que tange ao horizonte de curto prazo

na economia, em que pode haver crises econômicas.

Alguns estudos têm questionado a Equivalência Ricardiana. O ponto principal da crítica

é que a dívida pública, em um cenário de crise, afeta variáveis reais, tais como consumo

e o investimento, inclusive, porque os indivíduos olham para o presente, devido ao alto

endividamento, e não para o futuro.

Devereaux (2010, p.2) afirma que há necessidade de se entender com maior realismo o

papel desempenhado pela política fiscal em um cenário que a política monetária é

ineficiente, sendo necessário deixar de lado pressupostos da Equivalência Ricardiana,

principalmente, e utilizar modelos com horizonte finito e não infinito.

Page 110: André Bologna de Castro Cardoso

110

Esse autor aponta que, em situações “normais”, a política monetária funciona de modo

adequado, a Equivalência Ricardiana é válida, ou seja, o financiamento via impostos ou

dívida pública é indiferente ao público. De outro lado, em situação de armadilha da

liquidez, a dívida pública exerce efeito-riqueza para os agentes. O desejo de poupar dos

agentes faz com que os títulos públicos se tornem atraentes, podendo incentivar a

demanda agregada, evitando, por exemplo, que ela caia.

Mas em um mundo com consumidores de horizonte finito, a questão da

dívida governamental de fato fornece um veículo poupança por parte

do setor privado. Isso satisfaz parte de seu aumento no desejo de

economizar e, como resultado, coloca um limite no grau em que a

demanda e o consumo agregados precisam cair. Efetivamente, nossos

resultados sugerem que esse papel macroeconômico da questão da

dívida pública pode desempenhar um papel importante em um pacote

de estímulo econômico durante uma armadilha de liquidez (Devreaux,

2010, p.4)

Dentro desse contexto, outro pressuposto da Equivalência Ricardiana é eliminado,

segundo o qual dívida pública não possui diferencial em relação aos demais ativos

financeiros. Em um cenário em que os agentes estão endividados e o estão em boa parte

porque o preço dos ativos está caindo, então, a dívida pública se torna atraente aos

desejam ficar com liquidez.

A dívida pública ganha importância como forma de financiar um déficit público, que, em

condições de crise, ajuda a fomentar a demanda tanto em consumo quanto investimento,

permitindo com que a economia possa sair dessa espiral negativa de crise econômica.

O ponto é que nessa situação de crise, os agentes estão contrangidos pela liquidez (algo

que fere um dos pressupostos mais importantes da Equivalência Ricardiana). Eles

precisam se desalavancar reduzindo suas dívidas. Segundo Lopreato (2014, p.6), a

Equivalência Ricardiana não vale nesse momento: consumo e investimento passam a ser

mais determinados pela renda e lucro corrente e não pela expectativa de lucros e renda

futura, de modo que o gasto privado se relaciona com a situação corrente e não futura. É

uma questão, meramente, temporal sobre a renda.

Page 111: André Bologna de Castro Cardoso

111

Se os agentes estão com dificuldades em liquidar suas dívidas no momento presente, não

faria sentido eles reduzirem seu consumo – já estagnado – e pouparem – sendo que não

há poupança – para pagarem tributos no futuros ou deixarem recursos para seus herdeiros

para que estes o façam. Nesse sentido, a emissão de dívida pública como forma de

sustentar déficit – seja por meio de gastos ou redução de impostos, nesse contexto – se

torna um elemento importante e a política fiscal passa a importar.

A expansão fiscal é vista como um instrumento temporário,

necessário para sustentar o produto e a renda durante o

movimento de desalavancagem. O pagamento da dívida pública

acumulada nesse processo deve ser postergado para quando

ocorrer a recuperação da economia e não se colocar como óbice

à expansão dos gastos públicos (Lopreato, 2014, p.6).

Se no período de crise, em virtude do alto endividamento, os agentes olham para a renda

e o lucro presente, e não para o futuro, então a política fiscal pode ter impacto

expansionista no curto prazo, permitindo aumento do consumo e do investimento, ao

contrário do impacto nulo defendido pela Equivalência Ricardiana.

Se as famílias estão endividadas hoje, elas não tem condições de poupar, de modo que

para elas o que importa é o momento presente e não o futuro. Desse modo, se o gasto

público permite elevar a demanda e o emprego, assim como a redução de impostos eleva

a renda disponível hoje, os agentes conseguem reduzir suas dívidas, pois com emprego e

renda dpisnível maior eles conseguem arcar com seus compromissos, reativando a

capacidade de consumo da economia de modo geral.

Ressalta-se que financiamento do déficit público por meio de aumento de impostos possui

um impacto negativo, tal como explica Dos Santos (2011, p.122), pois diante de uma

demanda agregada já muito baixa e insuficiente, a elevação de tributos, como forma de

financiar o déficit público, tende a reduzir a renda disponível e deprimir ainda mais o

consumo. Por isso, o que se nota é que, em tais circunstâncias, a melhor forma de se

financiar é por meio da expansão da dívida pública.

Desse modo, Devreaux (2010, p.4) afirma que em condições normais, a Equivalência

Ricardiana prevalece, enquanto que na situação da armadilha da liquidez, existem efeitos

reais sobre economia:

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112

Como corolário, o modelo implica que este efeito de equilíbrio real28

pode ser insignificante em tempos normais, mas desempenha um

papel não trivial durante uma armadilha de liquidez. Novamente, no

entanto, um requisito chave para que funcione é que a equivalência

ricardiana falhe (ibid).

Dessa forma, se a Equivalência Ricardiana não é válida para períodos de crise, a redução

de tributos e o aumento do gasto público podem, também, se tornar medidas eficazes para

tirar economia da crise. Contudo, não existe consenso sobre essa questão na literatura

pós-crise, de modo que há um debate. Por outro lado, o que se nota dessa discussão é que

a ideia da Equivalência Ricardiana – e sua questão intertemporal - vai sendo abandonada,

no que se refere ao curto prazo da economia.

Além da discussão sobre o papel dos gastos públicos, que a seção seguinte irá trazer com

mais detalhes, há um intenso debate dentro da teoria convencional sobre o papel da

redução dos tributos como instrumento para retirar a economia da crise.

Eggerston e Krugman (2012) trabalham com situação em que pessoas e empresas estão

endividadas, de modo que elas necessitam reduzir o consumo. Eles utilizam modelo, em

que colocam a questão do impostos sendo dividida entre tomadores de empréstimos e

poupadores. Segundo eles (ibid, p.1493-1495), reduções de impostos podem ser

expansionistas se a maior tributação futura for cobrada dos tomadores de empréstimos.

Uma redução de impostos hoje financiada por impostos sobre os mutuários no futuro fará

com que os poupadores aumentem seu consumo hoje, diante do fato de não terem de

poupar para pagar impostos no futuro, dando um caráter expansionista. Ainda que, o

efeito para os tomadores de empréstimo seja nulo, o impacto expansionista advém dessa

redistribuição do peso dos impostos futuros dos poupadores para os mutários:

A razão para isso [impacto expansionista] é que, embora o tomador de

empréstimo gaste cada dólar adicional de renda no curto prazo, o gasto

do poupador depende de sua renda futura atual e esperada. Como um

aumento nos impostos sobre o tomador no futuro (em relação ao nosso

28 O termo equilibrio real, segundo nossa interpretação, se refere ao efeito real gerado pela dívida pública.

Page 113: André Bologna de Castro Cardoso

113

experimento político anterior) transfere dinheiro do tomador para o

poupador no longo prazo, o consumo de curto prazo do poupador

aumenta (ibd, p.1493)

Dessa forma,

O choque de desalavancagem pode, em princípio, ser completamente

desfeito por um corte de impostos dirigido ao consumidor no curto

prazo que é suficientemente grande para compensar totalmente a

desalavancagem necessária, desde que esse corte de impostos seja

financiado por um aumento correspondente nos impostos de longo

prazo sobre o mutuário (ibid)

O que se nota dessa discussão feita por esses autores é que, diante de uma situação de alto

endividamento, a forma como é dada a distribuição dos impostos futuros afeta de modo

diverso os agentes, fazendo com que redução de impostos hoje possa ter impacto

expansionista, algo negligenciado pela Equivalência Ricardiana.

Ainda que seja financiada pelos tomadores de empréstimos – gerando um impacto nulo

no longo prazo -, o impacto expansionista sobre o consumo permite a retomada do

crescimento econômico, gerando renda para que os próprios tomadores de empréstimos

possam se desalavancar no momento presente.

Se, portanto, a Equivalência Ricardiana não vale em períodos em que vigora o limite da

taxa de juros próxima a zero (ou com alto endividamento), então, realizar um déficit por

meio de redução de impostos poderia ser uma medida válida, visto que a questão

intertemporal proposta pelo modelo ricardiano não se sustenta nessas condições.

Contudo, não parece ser consensual a eficácia da redução de tributos em períodos de crise.

Bilbiie, Monocelli e Perotti (2012, p.21) argumentam que uma redução de impostos pode

ter impactos positivos sobre a economia, quando há uma redistribuição da carga dos

impostos dos mutuários (aqueles que tomam emprestados) para os poupadores (que detém

títulos públicos e ações das empresas), e preços são rígidos. Uma diminuição nos tributos

permite que o consumo dos mutuários se eleve. Com as firmas não conseguem elevar os

preços diante da expansão da demanda, elas irão reagir elevando a produção e com isso

contratando mais mão-de-obra.

Page 114: André Bologna de Castro Cardoso

114

Consequentemente, haverá elevação do salário real e diminuição dos lucros, fazendo com

que os poupadores precisem ofertar mais trabalho, diante de efeito negativo sobre renda

decorrente da queda no lucro das empresas. Dessa forma, eles irão trabalhar mais do que

os mutuários estão dispostos, permitindo sustentar o consumo.

Kaszab (2016, p.378-381) apresenta modelo em que divide dois tipos de consumidores:

os Ricardianos (referente à Equivalência Ricardiana), os quais acreditam que redução de

impostos hoje levará ao aumento no futuro, de modo que eles poupam e não consomem,

e os não-ricardianos, os quais realizam gastos de acordo com a renda corrente disponível.

Segundo ele, redução de impostos faz com que o consumo dos não-ricardianos se eleve,

induzindo as empresas aumentarem mais a produção, pois os preços são considerados

rígidos. Assim, as empresas elevam a demanda por trabalho, assim como, o corte de

impostos sobre trabalho eleva o salário real antes dos tributos, criando incentivo para que

os sindicatos aumentem a oferta de mão-de-obra.

Por outro lado, redução de impostos sobre trabalho gera um impacto negativo para renda

dos Ricardianos, visto que essa redução de impostos será paga com impostos futuros, por

isso reduzem seu consumo presente. Dessa forma, eles irão ofertar mais mão-de-obra para

conseguir obter recursos para pagar os impostos futuros. Devido aos sindicatos, tanto

ricardianos quanto não-ricardianos trabalham a mesma quantidade de horas. Daqui resulta

que a oferta de trabalho deve ter aumentado mais do que a demanda de trabalho. Com o

aumento da oferta de trabalho, há uma queda do salário real fazendo com que o lucro

aumente e como ricardianos são donos das empresas – por meio de ações -, o aumento da

renda com lucro faz com que eles não precisem reduzir tanto o seu consumo para pagar

impostos no futuro.

Mankiw (2008) defende política de redução de impostos sobre a folha de salários.

Segundo ele, uma redução desse tipo irá inteiramente para o trabalhador, de modo que

haverá incentivo ao consumo e elevação da demanda agregada. Além do mais, com

rigidez de salários, essa política incentiva a contratação de mais trabalhadores, dado que

reduz o custo de contratação.

Dessa forma, estes estudos apresentado acima procuram validar a redução de impostos

como medida importante e eficiente para resolver o problema da crise econômica,

principalmente, pelo seu impacto sobre a demanda agregada da economia.

Page 115: André Bologna de Castro Cardoso

115

Contudo, há algumas críticas à eficácia da redução de impostos. Perotti (2016, p.168) faz

algumas ressalvas quanto aos impactos positivos da redução de impostos, pois essa

diminuição possui impactos negativos sobre a distribuição de renda, afetando os mais

pobres. Ele não explica como isso poderia ser ruim para os mais pobres, mas se pode

imaginar que ele está falando de redução de impostos para os ricos ou de eventuais

aumentos de impostos no futuro.

A crítica à redução de impostos como medida adequada para resolver a crise econômica

abandona as ideias ricardianas sobre a questão intertemporal. Eggerston (2010, p.76-80)

realiza a crítica, mas aponta que o corte de impostos não é eficaz para sustentar a demanda

agregada e fazer com que a economia sai de uma espiral deflacionária.

Segundo ele, o impacto da redução de impostos sobre economia em situação normal é:

pessoas desejam trabalhar mais em função de poderem ter mais dinheiro no bolso. Isso

reduz os salários reais, fazendo com que as empresas contratem mais. Assim, a oferta da

economia se eleva. Essa elevação da oferta faz com que se gere pressões deflacionárias,

e o Banco Central, seguindo a Regra de Taylor, reduz a taxa de juros, fomentando o

consumo e investimento. No caso de a taxa de juros estar no seu limite máximo, redução

de preços gera uma espiral deflacionária sem a qual o Banco Central não consegue reagir

reduzindo a taxa de juros, o que eleva a taxa de juros real, induzindo redução do consumo

e investimento.

Dessa forma, impostos sobre oferta (por exemplo, redução de impostos sobre salários),

não gera efeitos positivos sobre a demanda agregada, mas, ao contrário, aumenta a oferta,

e não pressiona a inflação. Como nessa situação em que a taxa de juros está em seu limite

máximo, deflação é algo negativo, pois mantém a taxa de juros real mais elevada, a

política de redução de impostos sobre elementos da oferta não é uma política positiva

para sair da crise.

Contudo, ainda segundo Eggerston (2010, p.83-85), redução de impostos de forma

temporária sobre vendas pode ter impacto positivo. Segundo ele, ao diminuir a tributação

sobre vendas (ou sobre o consumo) temporariamente, isso permite elevar a demanda

agregada, visto que o consumo hoje se torna, relativamente, mais barato do que no futuro.

Essa pressão sobre a demanda eleva a inflação, reduz a taxa real de juros, possibilitando

aumento de investimento e até do consumo.

Page 116: André Bologna de Castro Cardoso

116

Dentro da literatura discutida, não há consenso sobre o impacto da redução de impostos

como medida eficiente para resolver a crise econômico. Contudo, o maior ou menor

impacto da redução de impostos em uma situação de crise econômica não está relacionada

com a questão intertemporal proposta pela Equivalência Ricardiana, mas com seu

resultado em relação à demanda agregada. Isso quer dizer que, dentro dos debates sobre

política fiscal, ao que nos parece, a Equivalência Ricardiana tem ficado de lado.

Se a dívida pública pode afetar variáveis reais, assim como redução de impostos pode ser

benéfica, para alguns autores, para estimular a economia. Nosso próximo passo é analisar

o debate pós-crise sobre a questão do gasto público. Se a literatura selecionada parece ter

se afastado da Equivalência Ricardiana, será que a discussão econômica tem se

aproximado do pensamento de Keynes tal como apresentamos no capítulo 1? É essa

pergunta que tentaremos responder na próxima seção.

3.3 Gasto público como remédio para sair da crise

Se, como vimos, a Equivalência Ricardiana parece ter sido deixada de lado na discussão

sobre crise econômica – pelo menos, nesse contexto -, nosso próximo passo é ver como

o debate atual pensa a questão do gasto público comparando-o com a visão de Keynes:

será que ela se aproxima ou não? Esse é o ponto que queremos abordar nessa seção.

Eggerston (2010, p.80-81) diferencia o impacto do gasto público em tempos normais e

nos períodos de crise. No primeiro caso, o gasto público elevaria a demanda agregada e

teria efeitos sobre a oferta, visto que como o governo retiraria recursos do consumo das

pessoas – efeito substituição entre o gasto público e o gasto privado -, elas ofertariam

mais mão-de-obra e com queda dos salários reais, a oferta aumentaria. Como existe esse

efeito-substituição, o autor encontrou um multiplicador baixo, de apenas 0,48.

Por outro lado, segundo esse autor (ibid, p.81-83), a adoção de uma política fiscal no

limite inferior da taxa de juros, temos gasto público aumenta tanto os preços quanto a

oferta. Ainda que ainda que haja um efeito deflacionário, decorrente do aumento da oferta

de trabalho, esse efeito é muito pequeno. O autor estima um multiplicador de 2,3.

Mas por que esse multiplicador é tão grande? A principal razão para queda do produto e

da inflação é fruto de expectativas de queda do produto e de deflação no futuro. Os

agentes esperam que a política fiscal seja utilizada até a recessão acabar, o que gera

Page 117: André Bologna de Castro Cardoso

117

expectativas positivas para os agentes. O anúncio da política fiscal é mais importante que

o anúncio do tempo que durará.

Como aponta Wolf (2015, p.67), a situação de crise é diferente daquela em que ocorre

quando o déficit público se expande em condições de elevado emprego, o que causa

elevação da taxa de juros e redução do investimento. Por outro lado, como na crise

famílias e empresas reduzem seus gastos, é necessário atuação fiscal mais pujante para

impulsionar a economia:

O recurso ao colchão fiscal (a capacidade de deixar o déficit fiscal subir

em resposta a uma recessão puxada pelo setor privada) foi essencial

dessa vez [na crise de 2008], porque mesmo uma política monetária

fortemente expansionista era insuficiente para evitar as alterações dos

setores familiar e empresarial para superávit. Sabemos que ela era

insuficiente porque as autoridades monetárias iniciariam essa política.

Essa é uma situação em que a política fiscal keynesiana se torna

relevante (ibid, p.66-67)

Blanchard, Dell’Ariccia e Mauro (2010, p.9) ressaltam a importância da política fiscal na

atual situação de crise por dois motivos: a limitação da política monetária por meio do

afrouxamento monetário possui certos limites, em decorrência da limite zero da taxa de

juros, e pelo fato de a perspectiva da recessão ter um horizonte mais largo faz com que os

estímulos fiscais sejam eficientes, apesar das defasagens entre suas implementações e

resultados.

Ainda que a questão da política fiscal tenha ganhado relevância para estes autores, eles

colocam os marcos da política fiscal dentro do chamado “espaço fiscal”, segundo qual

alto endividamento reduziria o impacto das medidas fiscais. Por isso, seria fundamental

não realizar políticas pró-cíclicas durante o auge do ciclo econômico. Nesse sentido, o

impacto da política fiscal ocorre mediante as circunstâncias excepcionais. Assim,

medidas discricionárias, durante situações “normais”, não são tão eficientes:

A resposta fiscal agressiva foi garantida dadas as circunstâncias

excepcionais, mas expôs ainda algumas desvantagens da política fiscal

discricionária para mais flutuações “normais” - em particular atrasos na

formulação, promulgação e implementação de medidas fiscais

apropriadas (Blanchard, Dell’Ariccia e Mauro, 2010, p.9)

Page 118: André Bologna de Castro Cardoso

118

Feldstein (2009, p.6) aponta que dois problemas que poderiam ser vistos em tempos

normais, não são problemáticos em tempos de crise: primeiro, o aumento do gasto público

não levará ao aumento da taxa de juros, visto que a política de “dinheiro fácil” realizado

pelo Quantitative Easing29 tendem a manter as taxas de juros baixas. Em segundo lugar,

as defasagens do gasto público não são um problema, em decorrência da longa duração

da própria crise. Ou seja, o tempo de realização do gasto público acompanharia o

movimento da crise.

Contudo, esse mesmo autor ressalta que, por mais a política fiscal cumpra um papel

importante para saída da crise, ela não pode ser duradoura:

Mas, embora uma boa política fiscal possa contribuir para acabar com

a recessão, o trabalho pesado terá que ser feito com o aumento dos

gastos do governo. Para ser eficaz, esses gastos devem ser grandes,

rápidos e direcionados para aumentar a atividade agregada e o emprego.

Quão grande depende da forma dos gastos e do tempo (ibid, p.7)

Por mais que se considere a necessidade do uso do gasto público, ele deve ser, dentro da

visão mainstream, grandes, rápidos e direcionados. A questão da rapidez do gasto

entende-se que ele deve ser voltado para o curto prazo e apenas para estimular a demanda

agregada no presente. O próprio autor afirma que se os altos gastos públicos realizados

em 2009 continuarem elevados para 2010 e 2011, o seu elemento de política anti-ciclica

perde eficiência.

A velocidade dos gastos é uma consideração importante. Um projeto

que começa em 2009, mas continua gastando em alto nível em 2011 e

2012, provavelmente não será tão útil quanto um instrumento

anticíclico, com o qual se gasta rapidamente e é finalizado (Feldstein,

2009, p.8).

Freedman et al (2009, p.8) fazem uma análise interessante sobre a questão da política

fiscal. Eles calcularam multiplicadores para alguns tipos de políticas fiscais, tais como

29 Quantitative Easing foi a política monetária não-convencional de compra de títulos de longo prazo

realizado pelo Banco Central norte-americano (FED), com o intuito de influenciar as taxas de juros de

longo prazo. Assim, ao comprar esses títulos, houve forte injeção de moeda, especialmente, nos bancos.

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119

transferências e gastos públicos com investimento. Os resultados apontam um

multiplicador fiscal muito maior para gastos com investimento (1,6) do que para

transferências (0,3), em decorrência de seus efeitos sobre a demanda agregada na

economia.

Contudo, justamente, pelos seus efeitos sobre a demanda da economia, os gastos públicos

tendem a elevar a inflação (ibid, p.9), o que em um primeiro momento pode ser benéfico

para evitar a deflação, mas tende a elevar a taxa de juros, reduzindo efeito multiplicador

no momento posterior.

Esse aumento na taxa de juros real tende a contrabalancear os efeitos

estimulantes das ações fiscais e, juntamente com essa redução na

magnitude do tamanho da ação fiscal no segundo ano, os resultados

são de menores efeitos no PIB real no segundo ano (ibid, p.9)

Esses autores apontam (ibid, p.12), tal como visto a posição da teoria convencional, que

existe relação de médio e longo prazo de crowding out entre déficit público – ou aumento

da dívida – e o próprio investimento privado, gerando impactos negativos na economia.

Por isso, seriam necessários instrumentos e medidas de credibilidade para a política fiscal

no médio e longo prazo (ibid, p.17).

Saraiva, de Paula e Modenesi (2018, p.20) apresentam, de modo crítico, que a visão dos

autores da teoria convencional – ou do Novo Consenso Macroeconômico, como eles

chamam – delega um papel apenas de preservação da ordem econômica às políticas

monetária e fiscal e não de importância para o próprio funcionamento da economia, sendo

a política fiscal importante apenas nos momentos de crise.

Mesmo reconhecendo maior papel da política fiscal em momentos de crise, ela é

considerada um instrumento problemático em períodos normais, de modo que ela deve

ser submetida a rígidas regras e sempre limitada pela questão do espaço fiscal. Não há

espaço dentro dessa análise para compreensão de que o gasto público é dinâmico, no

sentido, inclusive, de gerar suas próprias receitas.

A política fiscal, dentro da literatura selecionada, deve servir como um remédio para a

crise, mas nunca pode ameaçar a credibilidade, de modo que no longo prazo o déficit

público e a dívida pública devem estar sempre controlados. Nega-se, assim, o dinamismo

da política fiscal que apontamos em Keynes de que a política fiscal deve ser voltada para

Page 120: André Bologna de Castro Cardoso

120

o longo prazo e que ela possui capacidade de gerar suas próprias receitas. Na visão

convencional, esses pontos não aparecem.

Não se pode dizer, dessa forma, que as discussões em torno da política fiscal tal como

realizada pela visão convencional se aproxima de Keynes. Mesmo que o debate traga

novamente um papel importante para as ações fiscais, a forma como deve ser conduzida

– apenas no curto prazo e levando em conta a credibilidade – distancia a revisão da visão

convencional da proposta por Keynes e tal qual discutimos no primeiro capítulo e

aproxima, no longo prazo, da Equivalência Ricardiana.

Dessa avaliação, nota-se que ainda persiste a visão de que a política fiscal deve ser

utilizada apenas em um período de exceção, de modo que em tempos normais, ela não é

tão eficiente. O gasto público deve ser voltado para resolver a crise, e não como um

instrumento de evita-las.

Lopreato (2014, p.13-18), aponta que mesmo havendo uma direção em torno de consenso

sobre a importância da política fiscal para tirar a economia da crise, ainda há divergências

quanto ao seu uso. Este autor apresenta a existência de três visões sobre essa questão: a

hawk view, a dove view, e Woodpecker View.

A dove view considera o que mostramos acima, ressaltando a importância do gasto

público como elemento fundamental para lidar com a crise econômica. Paul Krugman é

um dos mais importantes autores dessa corrente. Em seu livro “Um Basta à Depressão

Econômica!”, ele faz uma discussão sobre as causas e como tirar a economia da crise. No

que tange ao primeiro, Krugman (2012, p.20) aponta que o problema estaria no dínamo

da economia (e não no motor) e que a crise seria apenas um problema técnico, no sentido

de que não seria estrutural à economia capitalista.

Seja como for, o ponto é que o problema não está no motor as economia,

que contonia tão poderoso como antes. Em vez disso, estamos falando

basicamente de um problema técnico, de um problema de organização

e de coordenação (...). Resolva-se esse problema técnico e a economia

rugirá de volta (ibid, p.20)

E qual o problema desse dínamo? O problema estaria justamente na falta de demanda

(ibid, p.26-27), em que as pessoas deixam de consumir, de modo que ao não gastarem,

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121

elas não geram renda30, pois o dispêndio de um é a receita de outrem. Dessa fora, se o

setor privado não gasta, então é necessário que o governo gaste:

A situação básica da economia dos Estados Unidos continua a mesma

desde 2008, o setor privado não está disposto a gastar o suficiente para

fazer uso de toda a capacidade produtiva do país e, portanto, para

empregar milhões de americanos que querem trabalhar, mas não

encontram emprego. A maneira mais direta de fechar essa lacuna é o

governo gastar onde o setor privado não quer gastar (Krugman, 2012,

p.194).

Segundo Lopreato (2014, p.15-16), essa visão é crítica à austeridade realizada por vários

governos, principalmente, dos países europeus a partir de 2010. Segundo ele, para esses

autores, em uma situação de armadilha da liquidez, o corte de gastos leva à redução do

PIB, assim como redução dos gastos privados. A deterioração econômica leva à queda

das receitas, o que pode gerar dúvidas sobre a capacidade de sustentar a dívida pública

no futuro (redução da renda). Por isso, essa corrente defende maiores gastos públicos e

faz a crítica à austeridade fiscal.

De Long e Summers (2012, p.1 e p.37) argumentam em favor da utilização da política

fiscal diante de uma situação em que há muita capacidade ociosa e taxa de juros de

encontra no limite inferior, pois o efeito multiplicador irá elevar as receitas do governo

no longo prazo, evitando o aumento da dívida.

Nossa análise demonstra simplesmente que o estímulo fiscal adicional,

mantido durante um período em que as circunstâncias econômicas são

tais que os efeitos multiplicadores e histerese são significativos e depois

removidos, facilitará em vez de exacerbar a restrição orçamentária de

longo prazo do governo (ibid, p.37)

Contudo, para esses autores, a política fiscal só possui impacto positivo nesse momento

particular de crise, sendo que em tempos normais, em que não existe armadilha da

liquidez, a política fiscal se torna ineficaz como instrumento de estimulo à economia:

É por isso que enfatizamos que, fora dos períodos de baixa

extraordinários em que o limite inferior de zero restringe as taxas de

juros, acreditamos que a suposição correta é de que o multiplicador

fiscal é efetivamente zero. Os aumentos na demanda vão se sobrepor às

restrições de oferta. E, na medida em que isso não acontece, os

aumentos na demanda serão compensados pela política monetária. Com

um multiplicador zero relevante em termos de políticas, os julgamentos

30 “Coletivamente, a população mundial está tentando comprar menos do que é capaz de produzir, gastar

menos do que ganha. Isso é possível para um indivíduo, mas não para o mundo como um todo. E o resultado

é a devastação a nosso redor” (Krugman, 2012, p.27)

Page 122: André Bologna de Castro Cardoso

122

sobre políticas fiscais devem basear-se em alocações e não em políticas

de estabilização (ibid, p.38).

Ausentes as condições que restringem a política monetária – seu limite inferior de taxa

de juros -, a política fiscal é neutralizada pelos aumentos da taxa de juros (efeito crowding

out). Por isso, a política fiscal é um instrumento importante como forma de alocar e

fomentar recursos no momento em que há capacidade ociosa, mas ela não deve ser

utilizada como política de estabilização em momentos de inexistência de crise. As

medidas fiscais devem ser localizadas e não ser utilizadas de modo permanente como

forma de evitar a volatilidade da economia.

A premissa de nossa análise é que a política fiscal expansionista pode

ser oportuna e temporária. Assim, pode ser entregue quando a saída é

severamente deprimida e o limite inferior nominal zero a prende, e

para quando a economia se recupera. Portanto, este é um caso apenas

para quando estímulo fiscal pode ser entregue de maneira oportuna e

temporária (ibid, p.38-39)

De qualquer forma, essa visão rejeita a austeridade fiscal como política a ser adotada em

momentos de crise, visto que, em situação de crise, o estimulo fiscal é importante como

forma de sair dela. Contudo, há autores que defendem o corte de despesas e aumento dos

tributos como forma de incentivar a economia.

A Hawk View é formada por economistas que defendem a austeridade fiscal como forma

de recuperação da economia, já discutida, brevemente, no capítulo anterior. Esses autores

utilizam a ideia de contração fiscal expansionista, em que austeridade não gera impactos

recessivos na economia, podendo ser até mesmo expansionista. (Lopreato, 2014, p.13-

14).

A hipótese de contração fiscal expansionista foi desenvolvida por Giavazzi e Pagano

(1990) ao estudarem os efeitos de ajustes fiscais em algumas economias europeias. Eles

chegaram à conclusão de que medidas associadas a corte de gastos ao invés de terem

efeitos contracionistas – como defende a visão de Keynes – geram, ao contrário, bases

para uma expansão econômica.

Alesina e Ardagana (1998, p.5) argumentam que um dos meios pelos quais uma

consolidação fiscal se torna expansionista é o canal da taxa de juros. Segundo eles, há

dois equilíbrios: o equilíbrio “ruim” ocorre quando a dívida pública cresce rapidamente e

os investidores demandam um prêmio de risco mais alto, o que eleva a taxa de juros. O

Page 123: André Bologna de Castro Cardoso

123

equilíbrio “bom” acontece quando a dívida pública cai, o prêmio de risco é eliminado,

impulsionando queda da taxa de juros. A contração fiscal faz com que a se passe do

equilíbrio “ruim” para o “bom”, tendo como resultado redução da taxa de juros.

Um canal adicional que origina os efeitos expansionistas de uma

contração fiscal é o argumento da “credibilidade” sobre as taxas de

juros. Em elevados (ou em rápido crescimento) níveis de dívida, a

dívida pública deve ser vendida a um prêmio, devido ao risco de

inflação, de calote ou riscos de consolidação. Uma consolidação fiscal,

se percebida como permanente e com sucesso, pode trazer uma discreta

redução da taxa de juros (ibid, p.5)

Ou seja, se o Estado contrai os gastos, de modo a reduzir o déficit e colocar em patamares

aceitáveis a dívida pública, esse prêmio de risco se reduz, de modo que os agentes não

irão cobrar elevada taxa de juros para financiar o governo, abrindo espaço para reduzi-

las. Essa redução da taxa de juros estimularia os componentes da demanda agregada

sensíveis à taxa de juros (Kleis e Mossinger, 2016, p.3) como investimento e o consumo.

Ressalta-se que, conforme discutido no capítulo 2, a austeridade fiscal, via redução de

gastos públicos, gera um efeito riqueza positivo sobre os agentes, os quais, vendo essa

contração fiscal como permanente, sentem que não precisarão arcar com impostos no

futuro, fazendo com que suas rendas disponíveis ao longo da vida se elevem, causando

alterações positivas no consumo no momento presente.

Diante do quadro exposto, Alesina e Ardagna (2009, p.17), os principais autores dessa

corrente, argumentam que redução do gasto público possui menor impacto recessivo do

que, por exemplo, elevação de impostos. Assim, segundo eles, ajustes fiscais movidos

por corte de despesas não impactam o produto, podendo até levar ao seu crescimento no

momento posterior.

Nossos resultados sugerem que os cortes são mais expansivos do que

os aumentos nos casos de um estímulo fiscal. Para os ajustes fiscais,

mostramos que os cortes de gastos são muito mais eficazes do que os

aumentos de impostos na estabilização da dívida e evitação de

desacelerações econômicas. De fato, descobrimos vários episódios em

que os cortes de gastos adotados para reduzir os déficits foram

associados a expansões econômicas, e não a recessões (Alesina e

Ardagna, 2009, p.3)

Dentro do debate sobre a importância da política fiscal, essa corrente parece ser a mais

“radical”, no sentido de realizar a crítica e negar o papel do gasto público como

instrumento de política econômica para enfrentar a crise.

Page 124: André Bologna de Castro Cardoso

124

Essas ideias ganharam maior força na Europa, especialmente, em decorrência das

elevadas relações dívida/PIB nos países europeus periféricos. Na Irlanda essa relação

atingiu 110% do PIB em 2011, na Itália tivemos 100% e na Grécia foi de 165%. Nesse

sentido, diante desse quadro, instituições como FMI e Banco Central Europeu ofereceram

ajuda a esses países em troca da adoção de cortes de gastos31.

Como argumenta Blyth (2017, p.113-114), a austeridade como política a ser adotada para

sair da econômica começou a ganhar força tanto na literatura, mas, principalmente, na

prática, em decorrência da forte elevação das dívidas públicas, com maior destaque para

o caso grego. Desse modo, o único meio para resolver essa questão fiscal, seria abandonar

políticas de cunho keynesiano e realizar cortes de gastos:

A oposição às políticas keynesianas intensificou-se na primavera de

2010, quando a crise grega se torna notícia, apesar de a Grécia ser

responsável por apenas 2,5% do PIB total da zona do euro. No Reino

Unido, na Alemanha e nos Estados Unidos, os políticos a favor da

austeridade concnetraram-se na crise grega como uma metáfora dos

perigos do keynesianismo. “Tornar-se grego” passou a ser uma história

assustadora para justificar cortes nos respetitivos países” (ibid, p.114).

Nesse sentido, mesmo que o debate econômico dentro do pensamento ortodoxo ainda gire

em torno da eficácia do gasto público como instrumento para resolver a crise econômica,

as ideias de austeridade ainda possuem uma certa força não só nessa discussão como na

aplicação de políticas econômicas, principalmente, na Europa.

Ainda utilizando a apresentação de Lopreato (2014), a terceira visão podemos considerar

como uma intermediária entre as duas apresentadas até aqui. Ela defende rígido controle

fiscal para evitar a expansão da dívida pública e o descontrole das contas públicas, mas,

ao mesmo tempo, defende medidas de curto prazo de reativação da demanda para impedir

que a crise se aprofunde.

A combinação de reformas estruturais e de medidas a favor do

crescimento é vista como central na estratégia: ataca o problema de falta

de demanda de curto prazo e evita o efeito negativo do ajuste durante o

período de travessia até alcançar os resultados das ações de longo prazo

(Lopreato, 2014, p.17).

Essa corrente mostra de modo mais claro como a política fiscal possui um caráter de

exceção: ela deveria ser utilizada em momentos de crise e em curto prazo, de modo que

31 Segundo Blyth (2017, p.113), em 2010, a Grécia recebeu ajuda de 110 bilhões de euros em troca de corte

de 20% nas remunerações do setor público, 10% nas pensões e aumentar os impostos. A Irlanda, no mesmo

ano, recebeu 85 bilhões de euro para cortar 26% dos gastos públicos.

Page 125: André Bologna de Castro Cardoso

125

medidas mais a longo prazo estariam relacionadas com ajustes fiscais. O debate, portanto,

ainda está inserido em uma visão, na qual a política fiscal não possui dinamismo a longo

prazo, como apresentado no capítulo 1 quando analisamos o pensamento de Keynes.

Como visto, para Keynes a política fiscal é dinâmica, pois o gasto público hoje gera

efeitos a longo prazo, incluindo o próprio equilíbrio fiscal em termos intertemporais. Ela,

portanto, não deve ser pensada apenas como um instrumento para tirar a economia da

crise a curto prazo, mas deve ser pensada a longo prazo, por meio do investimento

público, para evitar que as próprias crises venham a se tornar graves ou mesmo acontecer.

Mesmo a questão dos impostos, em que o aumento da carga tributária feita de modo

progressivo, é um importante instrumento de redistribuição de renda e de alteração na

propensão marginal a consumir a longo prazo da economia.

O debate atual sobre política fiscal, ainda que retome a discussão sobre sua importância,

ela está inserida apenas como um instrumento útil a curto prazo e para resolver a crise

econômica. Ainda prevalece a visão de que o importante é a sustentabilidade da dívida

pública a longo prazo e não como um instrumento para evitar as flutuações da demanda

agregada na economia e tornar as expectativas dos agentes mais favoráveis.

Enfim, a discussão dos itens propostos sugere certo afastamento do

consenso teórico prevalecente no momento anterior. Em circunstâncias

particulares, a política pode se transformar em instrumento útil, quando

adotado com restrições, sem abrir mão do cuidado com o déficit e a

dívida, por meio de brechas previstas nas regras fiscais, que autorizem

o emprego de gastos públicos no combate à crise. O avanço teórico

talvez se limite à aceitação de que o uso da expansão fiscal é viável

como instrumento nos raros momentos em que a economia global se

encontra em situações excepcionais. No restante do tempo continuam

arraigadas as velhas convicções (Lopreato, 2014, p.23).

Notamos nessa discussão que boa parte da literatura sobre política fiscal no pós-crise

coloca esse instrumento como eficaz para retomada do crescimento econômico, contudo

essa eficácia está restrita a uma dimensão temporal de curto prazo, sem efeitos

prolongados, mas ao contrário, quanto mais tempo se postergar a atuação das medidas

fiscais, pior serão seus resultados, inclusive, podendo ter impactos nulos.

Ressalta-se que a base da discussão da teoria convencional está assentada no equilíbrio

geral walrasiano, em que oferta e demanda se equilibram, de modo que os agentes

obtenham a máxima satisfação. Nesse sentido, se no quadro de crise, voltado para curto

Page 126: André Bologna de Castro Cardoso

126

prazo, há desequilíbrio, em que a demanda está abaixo da oferta, a política fiscal é

instrumento eficaz para resolver esse problema.

Justamente, pelo fato de a visão ortodoxa reconhecer o equilíbrio geral, e que este ocorre

no longo prazo, é que os impactos da política fiscal ficam restritos ao curto prazo, quando

há possibilidades de desequilíbrio. Ainda prevalece, no fundo, a questão de que, no longo

prazo as condições de crescimento estão dadas pelos recursos existentes na economia e

pela tecnologia, de modo que o Estado não é capaz de interferir positivamente na

expansão da economia.

O reconhecimento de que as forças de mercado fazem com que a economia atinja o

equilíbrio, oferece um papel bem mais limitado à política fiscal e a própria atuação. O

que importa é a credibilidade e sustentabilidade fiscal. Desse modo, as implicações

Equivalência Ricardiana e necessidade de manter o equilíbrio fiscal a qualquer custo

prevalecem no longo prazo.

Conclusão

Nesse capítulo, procuramos analisar o atual debate sobre política fiscal ocorrido pós-crise

de 2008. Situamos a Equivalência Ricardiana e o pensamento de Keynes nesse contexto,

em que a discussão voltou a dar maior importância para a política fiscal diante da

gravidade da crise econômica.

Nesse sentido, primeiro analisamos como a literatura recente lida com a Equivalência

Ricardiana. Com a crise econômica, diante da restrição de liquidez do crédito, as famílias

e empresários não conseguem reduzir suas dívidas. Dessa forma, esses agentes deixam

de olhar para renda futura e se atém à corrente, eliminando o caráter intertemporal de suas

ações. A dívida pública, ao financiar o déficit público e servir como uma alternativa de

alocação de riqueza (em razão da deflação dos ativos), pode alterar variáveis reais, visto

que famílias ao contrário de reduzirem seu consumo, o aumentam.

Essa crítica à Equivalência Ricardiana abriu espaço para se discutir a redução de impostos

como um importante instrumento de política fiscal para retirar a economia da crise. Ainda

que outros autores questionem essas medidas, eles não o fazem por meio da Equivalência

Ricardiana, mas pelo fato de não conseguir evitar a espiral deflacionária, natural em

período de crise.

Page 127: André Bologna de Castro Cardoso

127

No tocante à eficácia da política fiscal, fundamentalmente, o gasto público, começou a

ganhar maior importância como instrumento maior combate à crise econômica. Vários

autores, ligados ao mainstream econômico, argumentaram em favor do dispêndio público

como instrumento fundamental, visto que a política monetária perdeu sua eficácia de

alterar a demanda agregada ao atingir o limite inferior de taxa de juros zero.

À primeira vista, essa volta da importância do gasto público como ferramenta decisiva

para alterar a demanda remete ao próprio pensamento de Keynes, o qual defendia o

dispêndio público não só para sair da crise, como para evitar a volatilidade da economia.

Assim, uma de nossas questões foi: será que a visão mainstream estaria se aproximando

de Keynes?

Nossa resposta é que não, pois, dentro dessa nova discussão, a política fiscal só é eficiente

e necessária em momentos de crise para retirar a economia de sua espiral negativa. O

dispêndio público só é capaz de atuar de modo positivo para economia, quando,

justamente, a política monetária perde sua capacidade de afetar a demanda.

Quando a situação volta ao “normal” no sentido de a economia não estar mais em um

cenário de crise e a não existência da chamada armadilha da liquidez, a política fiscal

volta a ser um papel secundário. Por isso, os autores analisados defendem a sua utilização

de modo temporário, bem diferentemente do caráter permanente do uso do gasto público

como forma de evitar a volatilidade da economia.

Além do mais, ainda existe dentro da literatura mainstream autores que defendem a

austeridade e a necessidade de equilíbrio orçamentário mesmo em um cenário de crise.

Eles defendem a ideia de contração fiscal expansionista, segundo a qual o corte de gastos

públicos e aumento de impostos (com preferência pelo primeiro) faz com que a economia

se estimulada, por meio da redução da taxa de juros.

O que se percebe ao analisar de modo mais profundo o debate econômico em torno da

política fiscal é que, excetuando os defensores da austeridade expansionista, os

instrumentos fiscais, tanto redução de impostos quanto aumento dos gastos públicos,

geram impactos positivos, contudo, estão restritivos a um horizonte temporal de curto

prazo.

No longo prazo, ainda que não descrito de modo explícito, parece prevalecer as

implicações da Equivalência Ricardiana: a política fiscal deve estar restrita ao equilíbrio

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128

fiscal para manter a sustentabilidade da dívida pública, de modo que os agentes não

tenham que arcar com impostos futuros e, dessa forma, neutralizando a própria atuação

fiscal.

Nosso ponto é que o atual debate sobre política fiscal, ainda que vários autores tenham

acenado para a austeridade fiscal, parece ter dado a ela maior importância como

instrumento de fomento à economia. Contudo, sua eficácia e dinamismo, no sentido de

gerar impactos positivos na economia no curto e longo prazo, estão atreladas apenas em

momentos de crise econômica, em que a política monetária se torna incapaz de afetar a

própria economia. Nesse sentido, o que vemos é que, dentro de um quadro mais geral, a

política fiscal é algo secundário, mesmo tendo deixado de lado a Equivalência Ricardiana.

Assim, o próprio pensamento de Keynes, lembrado por vários economistas durante a

crise, ainda continua ignorado.

Page 129: André Bologna de Castro Cardoso

129

Conclusão

Neste presente trabalho, procuramos analisar o dinamismo e a eficácia da política fiscal

no sentido de como ela impacta a economia como um todo. Após a publicação da Teoria

Geral de Keynes, em 1936, a política fiscal ganhou importância como instrumento para

evitar que novas crises viessem a acontecer, e de fato ela foi utilizada pelos governos

como uma ferramenta de estimulo econômico. Dentro da chamada Síntese Neoclássica

não parecia haver discordância quanto ao papel reservado a esse tipo de política.

O pensamento original de Keynes sobre política fiscal indica que esta é um importante

instrumento para fomentar a economia, seja para tirá-la de uma eventual crise como para

evitá-la. Ele defendia que o gasto público, principalmente, em setores de infraestrutura, é

benéfico, pois possui efeitos multiplicadores elevados, gerando aumento de renda e,

consequentemente, se pagando no médio e longo prazo. Assim, a política fiscal é eficaz,

porque afeta a demanda e o estoque de capital na economia, ao mesmo tempo é dinâmica,

pois gera efeitos secundários, como o aumento das receitas fiscais.

Por outro lado, este autor rejeitava a redução de impostos como forma de estimular a

economia, pois, os agentes poderiam poupar e, simplesmente, não gastar. Dessa forma,

no pensamento de Keynes, o gasto público é preferível à diminuição de tributos, visto que

seu impacto seria mais direto.

Por fim, Keynes preferia que o Estado se financiasse por meio de dívida pública e não

por elevação pura e simples de impostos. Segundo ele, o financiamento via emissão de

dívida teria como efeito positivo de um lado, não deprimir consumo e, de outro por conta

de que o título público serve como alternativa para alocação de recursos financeiros

ociosos quando a preferência pela liquidez do público é exacerbada. Indo um pouco mais

além, seria ainda mais preferível o endividamento via emissão de títulos junto aos bancos,

pois, assim, não haveria transferências de recursos da poupança privada para o setor

público, visto que os bancos poderiam emitir moeda de crédito para adquirir esses títulos.

Contudo, a partir de meados dos anos 1960 e 1970, com as ideias keynesianas perdendo

força, o consenso sobre o papel da política fiscal foi sendo alterado, tomando um novo

rumo: medidas governamentais, como gasto público ou redução de impostos, são

incapazes de afetar a economia. Abria-se espaço para diminuição do papel do Estado na

economia.

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130

Dentre as ideias que questionam a eficácia da política fiscal em afetar a economia está a

Equivalência Ricardiana, proposta inicialmente por Robert Barro. Segundo esse conceito,

déficit público, causado por redução de impostos e financiado por dívida pública, não

impacta o cenário econômico, pois os agentes interpretam que deverão pagar mais

impostos no futuro e por isso mantém o consumo inalterado, assim como a taxa de juros.

Nesse sentido, a política fiscal não possui nenhum efeito.

Isso abriu espaço para que as autoridades focassem apenas em manter a trajetória da

dívida pública estável como forma de não alterar as expectativas dos agentes racionais. O

foco deixou de ser a utilização dos instrumentos fiscais como forma de fomentar a

economia e evitar crises para atuar como um farol, indicando aos detentores de títulos

públicos que não haverá calotes e nem aumentos de impostos no futuro.

Dentro desse contexto, medidas discricionárias são rejeitadas em troca da adoção de

regras de condução, como exemplo mais claro a manutenção de superávits primários. O

equilíbrio orçamentário passa ser o centro gravitacional da atuação da política fiscal. De

outro lado, a política monetária, por meio de ajustes na taxa de juros, passa a ser o

instrumento principal de gestão da demanda e de estabilização. A política fiscal se torna

secundária, portanto.

Contudo, com a crise econômica de 2008, os governos adotaram, inicialmente, medidas

fiscais como forma de evitar seu aprofundamento. Como apontamos no capítulo 3, dentro

da literatura econômica, inclusive no pensamento ortodoxo, e na discussão pública, a

política fiscal voltou a ganhar maior peso. Com a incapacidade da política monetária, em

decorrência de seu limite inferior de zero, de gerir a demanda e fomentá-la, o foco voltou

para os impactos positivos tanto do gasto público como da redução de impostos. Não à

toa, a Equivalência Ricardiana foi fortemente questionada e ideias como de incentivar o

dispêndio governamental e seu consequente efeito multiplicador ganharam importância

mais recentemente.

Notamos que a discussão girou em torno de três pontos: financiamento do gasto público

ou da redução de impostos, a eficácia do gasto e questão temporal. No primeiro caso, a

dívida pública, ao contrário do que pressupõe a Equivalência Ricardiana, a dívida pública

pode exercer um impacto positivo, visto que em um contexto de alto endividamento dos

agentes, eles deixam de se preocupar com a renda futura e se importam com o momento

presente. Assim, com o déficit público sendo financiado pela dívida pública, as famílias

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131

conseguem se desalavancar, estimulando o consumo e o investimento. Além do mais,

aumentar impostos é ruim, pois reduz ainda mais o consumo já estagnado. Nesse sentido,

há uma diferenciação clara entre dívida pública e impostos. Essa discussão está em

consonância com a proposta de Keynes: a forma de financiamento importa para que a

política fiscal seja eficaz.

Por outro lado, a literatura recente, com exceção da visão de austeridade expansionista,

reconhece que o gasto público é um importante instrumento para retirar a economia da

crise. Avalia-se não só apenas a existência de elevados multiplicadores fiscais em

períodos de crise, como o dispêndio público, em um cenário de taxa de juros próxima a

zero, evita um cenário de deflação, permitindo, com isso, a recuperação do investimento

e do consumo. O gasto público é eficaz, nesse sentido.

Mesmo assim, diferentemente do que proposto por Keynes, a adoção desses instrumentos

fiscais deve ficar reservado apenas aos momentos de crise, enquanto que, em situações

normais, a disciplina e o papel secundário devem ser mantidos pelas autoridades. Assim,

a política fiscal só é eficaz no curto prazo e de modo específico. No mais, vigora a ideia

de que ela é ineficaz no longo prazo. Ou seja, os resquícios da Equivalência Ricardiana

ainda se mantêm no pensamento econômico mainstream, quando se trata de longo prazo.

Além do mais, o que se nota dessa discussão é que não há diferenciação entre quais gastos

são mais eficazes. Para o pensamento ortodoxo apresentado no debate pós-crise,

independe a forma como o dispêndio é realizado – seja investimento público ou gasto

corrente -, visto que o único objetivo da política fiscal é apenas tirar a economia da crise,

eliminando qualquer papel mais ativo no longo prazo.

Dessa forma, é natural que a questão temporal fique restrita apenas ao curto prazo. Como

apresentamos, a base de todo pensamento ortodoxo é o equilíbrio geral. Se as próprias

forças de mercado levam ao equilíbrio da economia no longo período, então não há

qualquer papel ativo para a política fiscal, restando apenas manter a trajetória sustentável

das contas públicas para manter as expectativas racionais dos agentes positivas.

Como no longo prazo não há desequilíbrios, como no caso do mercado de trabalho, e o

crescimento econômico decorre, exclusivamente, dos fatores existentes na economia e

das empresas que promovem o progresso técnico, não cabe à política fiscal ajudar a

fomentar a economia. Nesse sentido, os impactos das ações fiscais se restringem a

situações específicas pelas quais passa a economia.

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132

Podemos interpretar que esse debate sobre política fiscal no pós-crise adotou um caminho

intermediário entre a Equivalência Ricardiana e Keynes, no sentido de que não nega a

eficácia e o dinamismo da ação fiscal no curto prazo, mas reserva um papel secundário

no longo prazo. Os instrumentos fiscais, fundamentalmente, o gasto público, só

conseguem gerar resultados positivos em momentos de crise e em tempo limitado, mas

não o fazem em períodos mais distante no tempo, sobrando apenas a necessidade da

disciplina fiscal, independentemente das oscilações na economia, segundo aponta a

literatura mainstream na discussão pós-crise.

Apresentado de modo sumário o caminho percorrido por nosso trabalho, destacamos que

nosso objetivo era realizar crítica da Equivalência Ricardiana, por meio da análise de

Keynes sobre a eficácia e o dinamismo da política fiscal, no sentido de que ela é capaz de

influenciar a economia, gerando efeitos positivos tanto no curto quanto no longo prazo.

Procuramos demonstrar que a influência da política fiscal é muito mais complexa do que

supõe o simplismo da Equivalência Ricardiana, a qual se utiliza de muitos pressupostos

– inclusive irrealistas - para poder se concretizar. Para Keynes, a forma como é realizada

e financiada a política fiscal pode gerar impactos diferentes.

Mostramos que, pela existência do multiplicador fiscal e do gasto público impactar

positivamente o gasto privado, um eventual déficit público inicial não se traduzirá em

aumentos de impostos no futuro, pois o próprio gasto público gera suas próprias receitas.

A renda, nesse sentido, não é dada, como pressupõe a Equivalência Ricardiana, mas ela

é fruto do gasto e se eleva acima daquela que prevalecia antes do dispêndio inicial. É isso

que permite o dinamismo do gasto público.

Inclusive, Keynes mostrava uma clara preferência por financiar a despesa pública por

meio de títulos públicos ao invés de impostos, pois aqueles seriam alternativas de

alocação da riqueza dos agentes, enquanto a elevação indiscriminada do segundo geraria

redução da renda e do consumo. Nesse sentido, importa, sim, como o governo financia

seu déficit, segundo Keynes.

E por fim, se Keynes rejeitava a redução de impostos como forma de estímulo econômico,

ele defendia elevação de impostos progressivos – como sobre altas rendas e heranças –

como forma de alterar a distribuição de renda, tornando-a menos desigual e,

consequentemente, elevando a propensão a consumir da comunidade. Dessa forma, se na

Equivalência Ricardiana aumentos de impostos futuros não alteram o consumo, para

Page 133: André Bologna de Castro Cardoso

133

Keynes se houver aumento da tributação de modo progressivo o consumo irá se elevar e

não se estagnar.

Ressaltamos que a política fiscal para Keynes é bem mais complexa do que se supõe e

sua leitura muito mais rica do que as análises tradicionais feitas pelo próprio

keynesianismo ortodoxo. Existe uma lógica e, pode-se assim dizer, uma hierarquia em

termos de impactos na forma como governo realiza seu gasto – ou déficit – e como se

financia. Gerar simples déficits econômicos não é política fiscal saudável, inclusive, é

forma grosseira de interpretar Keynes. Pior ainda quando do déficit é gerado por gastos

como pagamento de juros que não geram qualquer efeito sobre o emprego e a renda,

tampouco qualquer efeito multiplicador, portanto, nunca se pagará.

Utilizando o arcabouço proposto por Keynes, vemos o quanto a forma como a política

fiscal executada é fundamental para impactar de modo positivo ou negativo a economia.

As análises sobre a forma como as medidas fiscais fluem sobre a economia devem levar

em conta as condições econômicas, assim como a política fiscal é realizada pelas

autoridades.

A política fiscal é um instrumento fundamental para reduzir – e tentar evitar – as

oscilações da economia. Quando executada por meio de gastos públicos e voltados para

aumento de estoque de capital, assim como adoção de uma tributação mais progressiva,

a ação fiscal possui efeitos positivos não só no curto prazo quanto no longo prazo.

Imaginando uma situação de grave crise econômica e elevado desemprego, não faz

sentido os agentes pouparem pensando no futuro, inclusive, porque eles não possuem

recursos para pouparem, pois, como discutido no capítulo 1, a renda – e

consequentemente a poupança – é resultado de gastos com investimento privado e

público.

Nessa situação, com consumo já estagnado devido ao desemprego, qualquer aumento na

renda decorrente da política fiscal servirá para os agentes gastarem e não,

necessariamente, guardarem, principalmente, os mais pobres que necessitam consumir o

básico ou mesmo pagar dívidas. Em um cenário de gravidade econômicos, os agentes

pensam mais no curto prazo do que no longo prazo.

De outro lado, a Equivalência Ricardiana parece presumir que toda forma de gasto

público é improdutiva. Contudo, ao contrário, o investimento público é importante não

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134

apenas para fomentar o investimento privado e o emprego da comunidade, mas gera um

estoque de capital a ser utilizado pelas futuras gerações. A construção de estradas, portos,

aeroportos e etc. serão importantes para elevar a produtividade da economia no futuro.

Ou seja, os benefícios do gasto público hoje – financiado por dívida – serão usufruídos

pelas gerações futuras, as quais poderão viver em uma economia muito mais abundante.

Em função de sua eficácia e de se prolongar no longo prazo, a política fiscal é dinâmica,

pois seus efeitos não se reduzem ao curto prazo, mas, ao contrário, possui impactos

intertemporal. O gasto público além de gerar suas próprias receitas no médio e longo

prazo, permite construir bases para uma economia mais próspera e rica, de modo que os

agentes no momento presentes não precisam poupar recursos para seus descendentes, pois

estes não precisarão arcar com maior fardo dos impostos, já que suas rendas – via efeito

multiplicador - serão mais elevadas do que a de seus parentes no presente.

Pensando em termos de formulações de política econômica, nossa discussão e seus pontos

apresentados indicam possíveis caminhos. Adotando essa perspectiva proposta por

Keynes, políticas públicas que visem não apenas o crescimento da economia, mas a

diminuição das volatilidades intrínsecas da própria economia brasileira, pensar o desenho

de uma política fiscal nos moldes desenhados por Keynes é importante.

Se, como vimos, o investimento público é eficaz, no sentido de gerar impactos positivos

na economia, e dinâmico, uma estratégia calcada nesse elemento pode gerar resultados

positivos a curto e longo prazo para as economias, especialmente, para aquelas que

possuem deficiências em setores de infraestrutura, como no caso brasileiro e de outros

países em desenvolvimento.

Dar maior importância ao Estado na gestão econômica, e nesse caso, colocar a política

fiscal como um instrumento importante para sua realização, não se leva, naturalmente, à

substituição do gasto privado, como pressupõe a Equivalência Ricardiana e a visão

convencional de crowding out. Ao contrário, bem desenhada, política fiscal é um

complemento importante para o melhorar o ambiente no qual o setor privado toma suas

decisões não só no sentido de manutenção da eficiência marginal do capital mais elevada,

como pode ajudar a reduzir custos, no caso da infraestrutura. Desse modo, o gasto público

e privado não são rivais, mas complementares.

Inclusive, ao manter as expectativas de demanda futura mais altas, tornando

investimentos lucrativos, a atuação fiscal por parte do Estado possui um papel elementar

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135

no próprio crescimento econômico, pois incentiva a realização dos investimentos,

inclusive em tecnologia – ainda que o gasto público não seja o único determinante para

tal. Além do mais, o próprio aumento do estoque de capital torna a sociedade mais rica.

Nesse sentido, a política fiscal, quando bem executada, é capaz de ajudar no crescimento

de longo prazo da economia.

E é preciso, ainda, que a política fiscal não deve ser utilizada apenas como um expediente

de curto prazo, voltado para resolver eventuais desequilíbrios momentâneos, como crise

econômica. Ela deva ser pensada como permanente e sua intensidade, no sentido de

maiores dispêndios, ajustadas de acordo com o ciclo econômico. O ponto fundamental

que queremos ressaltar é que as ações fiscais são importantes, justamente, para evitar que

novas crises econômicas de maior intensidade venham a acontecer. A política fiscal, nesse

sentido, é um colchão para amenizar as flutuações bruscas da economia, ainda que nunca

as elimine.

Reconhecer essa visão de Keynes, é mostrar que a economia não tende por suas próprias

forças – pelos mecanismos de mercado – atingir o equilíbrio, tal como proposto pelo

equilíbrio geral walrasiano. A existência da moeda e da incerteza, e o modo como esses

elementos afetam a tomada de decisões de criação de emprego e renda, podem dificultar

o investimento, possibilitando a existência do desemprego involuntário, o que é um claro

ponto de existência de desequilíbrio – neste caso, no mercado de trabalho - na economia.

Em uma economia monetária, tal como Keynes e demais autores alinhados com ele, a

volatilidade do investimento, fruto da moeda e da incerteza, colocam a necessidade de

um agente externo ao setor privado que possa gastar quando este último se retrai, inclusive

complementando-o e fomentando-o. Dessa forma, a política fiscal como um instrumento

permanente de atuação econômica é imprescindível em uma economia capitalista, pois

seu impacto não se restringe apenas a um curto período de tempo, mas no longo prazo,

também.

Diante dessa análise apresentada no trabalho, podemos concluir, também, que a disciplina

fiscal não deve ser um fim em si mesmo, mas resultado de uma política fiscal capaz de

ser dinâmica e eficaz em estimular a economia, gerando, inclusive suas próprias receitas

no futuro. Inclusive, próprio equilíbrio orçamentário é resultado de uma economia, em

que não haja grandes oscilações e o nível de emprego e renda sejam elevadas, e a política

fiscal é importante para atingir esses objetivos.

Page 136: André Bologna de Castro Cardoso

136

Se desejamos que no futuro crises econômicas como a de 2008 venham a ocorrer na

mesma intensidade, os economistas devem olhar com mais cuidado para a política fiscal

como instrumento fundamental para a economia e não como mero farol para manutenção

das expectativas dos agentes.

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