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ANÁLISE TIPOLÓGICA DE MONUMENTOS E IMÓVEIS HISTÓRICOS DE INTERESSE PATRIMONIAL: casos do Setor de Preservação Rigorosa 1 no bairro do Centro, em Maceió/ AL. MISHINA, LETÍCIA N. C.; HIDAKA, LÚCIA T. F. 1. Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Av. Lourival Melo Mota, s/n, Bairro do Tabuleiro dos Martins, CEP: 57072-900, Maceió Alagoas Brasil [email protected] 2. Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Av. Lourival Melo Mota, s/n, Bairro do Tabuleiro dos Martins, CEP: 57072-900, Maceió Alagoas Brasil [email protected] RESUMO Este artigo apresenta um estudo tipológico da Zona Especial de Preservação 2 - ZEP 2, no bairro do Centro em Maceió, Alagoas. O trabalho tem como objetivo identificar atributos patrimoniais, materiais e imateriais que expressam a Significância Cultural a partir da análise de padrões tipos - recorrentes. Especificamente, a pesquisa trabalha com os imóveis de interesse histórico e sua ambiência, derivados da inserção no sítio e relação com seu entorno imediato no Setor de Preservação Rigorosa 1 SPR1. Tem como etapas metodológicas: levantamento histórico iconográfico e textual; elaboração do instrumento de coleta de dados; análise tipológica para identificar os atributos materiais (físico-espaciais) e imateriais (do uso e práticas sociais), seguida da interpretação da estrutura física - volumetria, materiais construtivos, fachadas e seus elementos compositivos - e da estrutura ativa - atividades praticadas naquele ambiente. O SPR1 possui edificações dos períodos colonial, déco, moderno e contemporâneo. Foram averiguados cento e onze imóveis históricos (IH) casas térreas ou sobrados de até quatro pavimentos; quinze monumentos históricos; e oito imóveis não destacados pelo Plano Diretor. As dimensões de análise foram: fachada e seus elementos compositivos, volumetria, implantação no lote e vãos, e verificação do grau de conservação dos objetos. Como resultados observou-se que: em geral, Monumentos Históricos apresentam bom estado de conservação, mantendo suas estruturas originais internas e externas. Com exceção da Igreja do Livramento, que teve seu uso, hierarquia e estrutura comprometidos pela destruição da praça que ficava à sua frente para a construção de um bar. Já o grau de conservação dos IH varia sem relação com sua localidade no sítio. Porém, em ruas de comércio mais intenso, os imóveis próximos sofrem mudanças estruturais parecidas - revestimento, letreiros, cores e marquises similares. Dez dos IH averiguados não existem mais no sítio foram demolidos para construção de estacionamentos ou tiveram suas fachadas completamente descaracterizadas. Oito imóveis que não constavam no Plano Diretor foram identificados como de interesse patrimonial, alguns em ótimo estado de preservação. Na época da descoberta, encontrou-se no Google Maps parte destas edificações escondidas sob letreiros, o que leva a especular a existência de mais imóveis camuflados, além de reforçar a visita ao local como imprescindível para a averiguação. Tipologicamente

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ANÁLISE TIPOLÓGICA DE MONUMENTOS E IMÓVEIS HISTÓRICOS DE INTERESSE PATRIMONIAL: casos do Setor de Preservação

Rigorosa 1 no bairro do Centro, em Maceió/ AL.

MISHINA, LETÍCIA N. C.; HIDAKA, LÚCIA T. F.

1. Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.

Av. Lourival Melo Mota, s/n, Bairro do Tabuleiro dos Martins, CEP: 57072-900, Maceió – Alagoas – Brasil

[email protected]

2. Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Av. Lourival Melo Mota, s/n, Bairro do Tabuleiro dos Martins, CEP: 57072-900, Maceió – Alagoas –

Brasil [email protected]

RESUMO Este artigo apresenta um estudo tipológico da Zona Especial de Preservação 2 - ZEP 2, no bairro do Centro em Maceió, Alagoas. O trabalho tem como objetivo identificar atributos patrimoniais, materiais e imateriais que expressam a Significância Cultural a partir da análise de padrões – tipos - recorrentes. Especificamente, a pesquisa trabalha com os imóveis de interesse histórico e sua ambiência, derivados da inserção no sítio e relação com seu entorno imediato no Setor de Preservação Rigorosa 1 – SPR1. Tem como etapas metodológicas: levantamento histórico — iconográfico e textual; elaboração do instrumento de coleta de dados; análise tipológica para identificar os atributos materiais (físico-espaciais) e imateriais (do uso e práticas sociais), seguida da interpretação da estrutura física - volumetria, materiais construtivos, fachadas e seus elementos compositivos - e da estrutura ativa - atividades praticadas naquele ambiente. O SPR1 possui edificações dos períodos colonial, déco, moderno e contemporâneo. Foram averiguados cento e onze imóveis históricos (IH) – casas térreas ou sobrados de até quatro pavimentos; quinze monumentos históricos; e oito imóveis não destacados pelo Plano Diretor. As dimensões de análise foram: fachada e seus elementos compositivos, volumetria, implantação no lote e vãos, e verificação do grau de conservação dos objetos. Como resultados observou-se que: em geral, Monumentos Históricos apresentam bom estado de conservação, mantendo suas estruturas originais internas e externas. Com exceção da Igreja do Livramento, que teve seu uso, hierarquia e estrutura comprometidos pela destruição da praça que ficava à sua frente para a construção de um bar. Já o grau de conservação dos IH varia sem relação com sua localidade no sítio. Porém, em ruas de comércio mais intenso, os imóveis próximos sofrem mudanças estruturais parecidas - revestimento, letreiros, cores e marquises similares. Dez dos IH averiguados não existem mais no sítio — foram demolidos para construção de estacionamentos ou tiveram suas fachadas completamente descaracterizadas. Oito imóveis que não constavam no Plano Diretor foram identificados como de interesse patrimonial, alguns em ótimo estado de preservação. Na época da descoberta, encontrou-se no Google Maps parte destas edificações escondidas sob letreiros, o que leva a especular a existência de mais imóveis camuflados, além de reforçar a visita ao local como imprescindível para a averiguação. Tipologicamente

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constatou-se que, no geral, as quadras foram divididas em lotes estreitos e profundos, de testada reduzida, com implantações no lote que variavam em “I”, “L”, “C”, “O” e total. As calçadas originais foram reformadas, tendo revestimento de concreto, sem arborização e no que concerne às edificações, monumentos históricos mantiveram suas características tipológicas singulares conservadas; casas térreas foram as que mais sofreram com mudanças em sua estrutura, tendo os ritmos de seus vãos e ornamentos retirados; alguns sendo totalmente revestidos com cerâmica ou cobertos por letreiros, mas, em sua maioria mantendo apenas cimalhas e almofadas na platibanda em estados defasados. A importância desse estudo consiste no entendimento de que a leitura tipológica oferece os instrumentos de observação das transformações na unidade construtiva sob os parâmetros de valorização relativos à possibilidade de gestão da conservação pela manutenção de valores que se adaptem às necessidades da contemporaneidade.

Palavras-chave: Significância Cultural; Análise tipológica; Patrimônio Histórico; Centro histórico de Maceió; Setor de Preservação Rigorosa

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1. Introdução

Neste artigo o objetivo consiste em ponderar os resultados aferidos a partir da análise

tipológica de casas térreas, sobrados e edificações excepcionais que se encontram no Setor

de Preservação Rigorosa 1, da Zona Especial de Preservação 2 – ou ZEP 2 – no bairro do

Centro de Maceió – Alagoas. Essas manifestações arquitetônicas vão desde o período

colonial brasileiro à arquitetura moderna, explicitando um Centro histórico plural, onde

coexiste o antigo e a diversidade de usos e funções que permeiam os sítios de interesse

patrimonial urbanos modernos.

Está definido no Plano Diretor de Maceió a existência da Zonas Especiais de Preservação

Cultural. Estas são tidas como áreas de interesse cultural devido à suas expressões

arquitetônicas ou históricas do patrimônio construído, sejam em conjuntos de edificações ou

imóveis isolados, que dão suporte às manifestações culturais e tradições populares.

Algumas das diretrizes específicas para a ZEP 2 consistem em: incentivo à implantação de

atividades e equipamentos culturais; estímulo ao uso residencial; recuperação do espaço

público; melhorias na infraestrutura do Centro e entorno e integração ao Corredor Cultural

de Maceió. A implementação destas se dá especialmente pelo uso do inventário dos bens

de interesse cultural. (PREFEITURA MUNICIPAL DE MACEIÓ - AL, Plano Diretor, 2005, p.

25 a 27)

Dessa maneira, o estudo tipológico surge como ferramenta que nos permite aprender e

intervir de maneira consciente nas estruturas históricas patrimoniais; pois oferece os

instrumentos de observação das transformações da unidade edilizia construída sob os

fundamentos de valorização da essência da obra relacionados à possibilidade de

conservação dos tipos construtivos. “A tipologia apaga os caracteres particulares dos

objetos para deles reter apenas os traços genéricos nos quais se fundamenta uma

taxionomia. Ela ultrapassa a simples classificação para propor, em uma visão universalista,

uma articulação completa de um domínio do conhecimento. ” (PANERAI, P., 2006, p. 110)

“Rossi e Leon Krier consideram a tipologia um

instrumento analítico preciso para a arquitetura e a forma

urbana e dizem que, além disso, ela proporciona uma

base racional para a concepção do projeto. O interesse

pelo tipo é um dos aspectos da pesquisa pós-moderna

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mais geral acerca do significado, pois estabelece uma

continuidade com a história – cada vez mais entendida

como necessária para a legibilidade da arquitetura no

interior de uma cultura. ” (NESBITT, K., 2013, p. 267)

O foco de análise da pesquisa foi o estudo da fachada e seus elementos compositivos,

volumetria, implantação no lote, vãos – elementos caracterizantes do “invólucro” edificado -

e entorno imediato das edificações – sua vizinhança. Verificando o grau de conservação dos

objetos e a significância individual – estética, histórica, científica, social ou espiritual – de

acordo com conceitos expostos na Burra Charter. (ICOMOS, 2013, p.2)

Edificações construídas sobre lotes estreitos e profundos distribuídos de forma geminada

em quadras cercadas por ruas esguias e tortuosas compõem o Centro de Maceió. Assim,

especificamente, as edificações habitacionais de casas térreas ou sobrados de até 4

(quatro) pavimentos foram analisadas seguindo metodologicamente estudos da tipologia

edilizia, onde os alvos de estudo deixam de ser as edificações como elemento individual,

passando a entendê-las como parte de um conjunto urbano ao dar prioridade também aos

espaços livres a elas relacionadas (CATALDI et al, 2002, p.26) e suas transformações ao

longo do tempo. Dessa maneira, a pesquisa apresentada trabalha com os imóveis de

interesse e com sua ambiência, inserção no sítio e entorno imediato.

Este estudo é um recorte de uma pesquisa maior que vem sendo desenvolvida há cerca de

dois anos na ZEP 2 averiguando os três setores que a compõem: Setor de Preservação

Rigorosa 1, Setor de Entorno Cultural 1, e Setor de Entorno Cultural 2. E sob a perspectiva

da conservação urbana patrimonial visa identificar os atributos materiais e imateriais por

meio dos estudos da tipologia e morfologia com a finalidade de gerir esses bens de

interesse patrimonial.

Espera-se contribuir para a devida manutenção das diretrizes que regem a ZEP 2,

possibilitando reabilitar imóveis históricos do Setor de Preservação Rigorosa 1 – SPR1,

redirecionando os usos de edificações não excepcionais para a habitação civil e definir

padrões que orientem as mudanças e recuperações dos bens de maneira a atender às

mudanças culturais, sociais e exigências da contemporaneidade, mas mantendo a essência

original da propriedade.

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2.Métodos e técnicas

2.1. Objeto empírico

O estudo é direcionado ao Setor de Preservação Rigorosa 1. Constituído pelo

entrelaçamento de 21 (vinte e uma) ruas do bairro Centro. Maceió iniciou seu

desenvolvimento a partir do porto do Jaraguá (ZEP 1) em meados do século XVII. Porém,

no Centro histórico, as edificações coloniais mais antigas datam do século XIX, coincidentes

com a época de elevação da cidade à capital da província das Alagoas, em 1839.

Nesta época, o traçado urbano começava a se delinear com poucas edificações, geralmente

construídas aos arredores de igrejas – como a Igreja do Livramento, de 1810 (ainda como

capela) e a Catedral Metropolitana de Maceió, de 1859, que se destacavam por uma

hierarquia harmoniosa promovida pelo uso de adornos, gabarito maior e coroamentos em

meio a monumentos históricos e imóveis habitacionais – ou de praças, seguindo as

tradicionais características tipológicas da arquitetura colonial portuguesa. Os lotes

geminados amontoavam-se nos largos quarteirões, deixando espaços mínimos para

calçadas e vias, adaptadas ao traçado tortuoso das testadas esguias.

As edificações civis desse período são majoritariamente representadas por casas térreas;

seguidas por sobrados de dois pavimentos (amplamente observados em imóveis de

esquina), e o restante, sobrados entre três e quatro pavimentos. A arquitetura era

ornamentada com vasto uso de platibandas, janelas de púlpito, esquadrias trabalhadas em

madeira e vãos ritmados rigorosamente. Essas características poderiam ser verificadas até

mesmo nas construções mais singelas.

As expressões arquitetônicas de vanguarda, como o déco e modernismo foram

primeiramente exploradas no Centro, sendo o “berço” dos novos estilos na cidade. O

modernismo chegou à Maceió com a construção de edifícios escritórios. Um dos primeiros

exemplares foi o Edifício Brêda, de 1958. Construído em formato de “V”, com 10 (dez)

andares, logo se tornou o ponto de encontro dos jovens da época. Foi erguido próximo à

praia, com vista excepcional de toda a cidade.

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Dessa maneira a ZEP 2, mais especificamente, o SPR 1, mostrou-se o sítio mais adequado

ao estudo por permanecer com os primeiros traçados da malha urbana original íntegros;

pela grande variedade de estilos arquitetônicos que a compõe; além de abrigar um vasto

acervo de imóveis do período colonial – casas térreas, sobrados ou monumentos históricos.

Destaca-se, desde seus primórdios até o cenário atual, pela prática comercial intensa e pela

diversidade de serviços e usos públicos e institucionais.

Imagem 01: Planta de Maceió feita em 1841, pelo engenheiro Carlos Mornay, a partir da planta

primitiva de 1820 do governo de Sebastião de Melo e Póvoas. Fonte: BEZERRA, 2013, p.36.

2.2. Referencial teórico

“(...) o desenho urbano exige um domínio profundo de

duas áreas do conhecimento: o processo de formação

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da cidade, que é histórico e cultural e que se interliga às

formas utilizadas no passado mais ou menos longínquo,

e que hoje estão disponíveis como materiais de trabalho

de arquiteto urbanista; e a reflexão sobre a FORMA

URBANA enquanto objetivo do urbanismo, ou melhor,

enquanto corpo ou materialização da cidade capaz de

determinar a vida humana em comunidade. Sem o

profundo conhecimento da morfologia urbana e da

história da forma urbana, arriscam-se os arquitetos a

desenhar a cidade segundo práticas superficiais, usando

‘feitios’ sem conteúdo disciplinar. ” (LAMAS, 1993, p.22)

Ao entender que o patrimônio urbano tem sua essência perpetuada em dimensões físicas,

funcionais e humanas e sofre influência direta do contexto cultural local e da contínua

transformação dos espaços, parte-se da postura de que a análise das formas em áreas de

interesse histórico é a fase inicial do processo de planejamento urbano. Dessa maneira,

atrelada às fontes de informações históricas, a leitura tipológica funciona como ferramenta

que nos permite intervir de maneira consciente nas estruturas de interesse, tendo em mente

que o contexto onde o bem está inserido pode influir fortemente na transmissão (e aferição)

de suas informações.

Algumas das temáticas principais no que tange ao desenho urbano consistem: na imagem

da cidade, visualidades – leitura de cheios e vazios -, relações com o ambiente natural,

espaços públicos, relações morfológicas, identidades locais e relações com a arquitetura

existente. (DEL RIO, 1990, p.118).

“No período pós-moderno, os teóricos repensaram o

conceito de tipo como a essência da arquitetura (...) ‘a

ideia de um elemento que deve servir de norma para o

modelo’. Moneo interpretou-o como a ordem formal e

estrutural inerente que permite agrupar, distinguir e

repetir objetos arquiteturais ” (NESBITT, 2013, p.267)

O tipo estrutura as propostas e decisões com base numa avaliação da evolução do estado e

significação das estruturas, assim como de usos e possibilidades de transformações futuras.

Portanto, ao seguir o estudo de tipos Muratoriano, a forma e a estrutura urbanas passam a

agregar ideias, escolhas e ações que se materializam em determinados prédios e nos

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espaços públicos do entorno (jardins, ruas, etc). A relação entre estes prédios e espaços é

chamada edilizia, e pode ser traduzida livremente como a “paisagem construída” (HIDAKA,

2000, p.23). Essa avaliação que engloba o edifício, o agenciamento - no que concerne aos

muros, espaços abertos, quintais, jardins e a massa edificada - e sua relação específica

com os espaços urbanos – ruas, pracinhas e canais – (PANERAI, 2006, P.123) da cidade

define a essência da estrutura da paisagem construída, do edifício e da cidade.

“O estudo da relação entre os tipos construídos e a

forma urbana é ‘o meio para compreender a estrutura da

cidade ao mesmo tempo como continuidade histórica de

um processo e como fenômeno parcial de tal

continuidade’; ele não constitui um fim em si mesmo e

deve ser acompanhado por uma análise dos ‘elementos

da estrutura urbana’ e dos processos de crescimento.

Isso porque não se trata apenas de fixar uma imagem

num instante determinado e numa localização precisa, e

sim de compreender – por meio de uma atenção

particular às modificações que afetam a cidade no tempo

e no espaço – as rupturas que estão na origem da

‘formação da cidade contemporânea’(...)”. (PANERAI,

2006, p.125)

A obra de Philippe Panerai, “Análise Urbana” (2006) e artigos desenvolvidos pelo Doutor

Silvio Zancheti (em especial, “Metodologia para a identificação e autenticação do patrimônio

cultural: O caso do istmo de Recife e Olinda- PE”, de 2009) serviram de base essencial para

organização da metodologia a ser seguida.

A escola Cozeniana também teve grande importância nas etapas finais, de interpretação

dos dados aferidos na pesquisa, com a análise em escala micro. A partir dos estudos da

Micromorfologia foi possível aferir com eficácia “efeito vizinhança” pensado por Jeremy

Whitehand. (WHITEHAND, 2001, p.46)

2.3. Metodologia

Para a adequada caracterização tipológica do Setor de Preservação Rigorosa 1, foi preciso

seguir algumas etapas metodológicas antes de partir para o processo de coleta e abstração

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esquemática dos dados. Pois entende-se que a análise tipológica depende do conhecimento

prévio do patrimônio edificado - a partir da pesquisa histórica e visita ao sítio para devida

compreensão das transformações e atual cenário do objeto, (PONTUAL et al, 2009, p.6)

estudando também os órgãos e leis que incidem sobre a ZEP 2. Sendo esta a primeira fase

do processo de averiguação.

Após o levantamento histórico, houve a definição clara do estudo a ser realizado,

identificando o nível de abrangência, o perfil da equipe, os equipamentos necessários e

estabelecimento de prazos. A definição do nível de detalhamento – abrangência - está

conectado diretamente a duas questões: a escolha de níveis – “sendo preferível classificar

objetos que pertencem ao mesmo nível de leitura do tecido urbano” - e a delimitação da

área de estudo. (PANERAI, 2006, p.128)

Especificamente nesta pesquisa, foi optado por não usar da sondagem, mas analisar todos

os bens pertencentes ao Perímetro Rigoroso. Dessa maneira, se deu início à classificação

prévia das tipologias, no que diz respeito a construção de uma ficha inicial especulativa,

contendo todos os elementos tipológicos a serem averiguados, de modo a fragmentar os

bens edificados, evidenciando desde o item mais banal.

A ficha em questão, configurada em formato bastante preliminar, foi construída a partir do

intenso estudo sobre diversos estilos arquitetônicos, principalmente o colonial brasileiro, e

da leitura de diversas obras relacionadas à forma urbana e à tipologia. Em especial,

destacam-se as obras de Vitorio Gregotti, “Território da Arquitetura” (1975); “Uma Nova

Agenda para a Arquitetura” (2013), de Kate Nesbitt “Introdução ao Desenho Urbano no

Processo de Planejamento” (1990), de Vicente del Rio; e, por fim, “A Apreensão da Forma

da Cidade” (1996) de Maria Elaine Kohlsdorf.

Ao iniciar a coleta de dados in locus, o processo se torna cada vez mais sistemático, e de

acordo com a compatibilidade ou disparidade de informações, torna-se possível manipular a

ficha inicial, de modo a rever estes critérios. Pois “(...) essa classificação ainda não é uma

tipologia: ela constitui apenas um primeiro agrupamento que irá permitir elaborar os tipos. ”

(PANERAI, 2006, p.132)

A efetiva elaboração tipológica seguiu as seguintes etapas: primeiramente evidenciou-se

cada item que compõe o bem; em seguida, foram destacados os que são observados em

diversos imóveis de mesma classe (considerando que tipos diferentes – igrejas, edificações

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habitacionais e monumentos – geralmente possuem tipologias distintas) ou itens que são

excepcionais, ou seja, aparecem como elemento provedor da individualidade da construção;

por fim, houve a comparação destes entre vários momentos da história e atual cenário –

entre edifícios de mesma classe - a fim de promover uma abstração racional dos dados

aferidos que conduziu à tipologia - no que diz respeito ao conjunto desses elementos e suas

relações.

Os dados finais foram organizados em planilhas que caracterizaram cada dimensão

referente à estrutura física e à estrutura ativa de cada bem edificado. Demonstrando

imageticamente as permanências e transformações da forma individual e urbana, refletindo

sobre questões que as explicassem. Dessa maneira foi possível identificar os valores

culturais do patrimônio.

3. Resultados e discussões

O Setor de Preservação Rigorosa 1, sendo o núcleo histórico de Maceió, área de maior

concentração de imóveis históricos e monumentos, segue normas mais rígidas de

conservação ao patrimônio a fim de preservar o traçado urbano no que concerne à

morfologia e as tipologias construídas. Suas expressões arquiteturais perpassam o período

colonial, eclético, o déco, moderno, até o estilo contemporâneo. No estudo em questão, até

o presente momento, foram examinados 111 (cento e onze) imóveis históricos – casas

térreas ou sobrados de até quatro pavimentos; 15 (quinze) monumentos históricos; além de

8 (oito) imóveis não destacados pela Secretaria Municipal do Planejamento e do

Desenvolvimento de Maceió – SEMPLA em seu mapa cadastral, mas claramente

pertencentes à classe de bens excepcionais.

A averiguação deteve-se à análise do exterior da edificação, no que concerne às fachadas –

frontal; laterais e posterior - e seus elementos compositivos (estéticos ou estruturais);

volumetria; implantação no lote; aberturas de vãos e verificação do grau de conservação dos

objetos – este, podendo ser classificado entre as seguintes alternativas: em ruínas,

descaracterizado, parcialmente descaracterizado, parcialmente preservado e preservado.

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Imagem 02: Setorização do Centro histórico de Maceió. Destaque para o SPR1. Fonte: SEMPLA,

2007 [adaptado].

Como resultados gerais observou-se que: Monumentos Históricos (MH) – públicos ou

religiosos - apresentam bom estado de conservação, mantendo suas estruturas originais

interna e externamente, além de preservar uma relação hierárquica com outros imóveis

históricos (IH) a seus arredores, desde as casas térreas mais simplórias à sobrados de

esquina com maior requinte. Porém, de forma errônea, essa hierarquia se reserva aos bens

excepcionais do Centro, sendo cada vez mais perceptível o contraste entre estes e prédios

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contemporâneos de gabaritos elevados ou edificações comerciais com fachadas

descaracterizadas.

Imagem 03: Hierarquia entre IH, MH e edificações contemporâneas. Ao fundo, prédio com 12

pavimentos tipos. Fonte: acervo pessoal, 2015.

Quanto aos Imóveis Históricos, o grau de conservação de cada obra varia sem relação com

sua localidade no sítio. Percebe-se que, em IH destinados ao uso comercial, mudanças na

fachada como: adição de marquises (de concreto ou lona), violação dos ritmos das

aberturas originais - geralmente derrubando pilares e vedações internas, resultando em um

único vão livre -, e revestimento da estrutura externa tornam-se cada vez mais corriqueiros.

“ (...) a ampliação de uma habitação aumenta a

probabilidade de uma outra ampliação ser desenvolvida

a curto prazo na vizinhança imediata, o que reflete a

atuação de um conjunto de fatores, em particular o facto

de proprietários e residentes se influenciarem

mutuamente: existe, pois, um ‘efeito de vizinhança’. “

(WHITEHAND, 2001, p.49)

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De fato, a observação de Jeremy Whitehand sobre imóveis próximos sofrerem modificações

estruturais parecidas é claramente observada no SPR1. Essas relações sociais entre

vizinhos, no sítio em questão, podem ser notadas nos materiais utilizados para o

revestimento, a forma com que este “invólucro” é fixado à estrutura original; nos letreiros;

nas cores (cada vez mais chamativas, diferentemente dos tons pastéis originais); marquises

similares; nas folhas de portas e janelas e esquadrias de materiais parecidos.

No estudo tipológico, constatou-se que as implantações nos lotes geminados variavam em

“I”, “L”, “C”, “O” e total – sendo esta a mais comum para Imóveis Históricos. A pavimentação

externa original em áreas mais próximas às praças e principais monumentos foi reformada,

sendo revestidas em concreto, ampliadas – possibilitando maior passagem de pedestres - e

colocados guias para deficientes visuais. Nas demais ruas que compõem o Setor, não

houve essa preocupação, principalmente em áreas onde o comércio é exercido de maneira

mais intensa. As calçadas seguem o traçado tortuoso das testadas curtas, de pavimentação

capistrana, compostas de pedras de diversos tamanhos e formas distintas, são bastante

finas em largura ao ponto de a passagem de duas pessoas em sentidos opostos ser

inviável, tendo uma delas que pisar no espaço destinado às vias.

Quanto às edificações de cunho habitacional, casas térreas foram as que mais sofreram

com mudanças em sua estrutura original, tendo os ritmos de seus vãos modificados

(geralmente, com uma única abertura que corta a fachada por completo ou, em poucos dos

casos, emassamento de algumas das fendas) e ornamentos retirados. Alguns destes

imóveis também foram totalmente revestidos por azulejos cerâmicos ou cobertos por

letreiros de lona - estes, além de camuflar o bem, inviabilizando a avaliação de sua

integridade, danificam a estrutura, pois os elementos de sustentação destas placas são de

materiais metálicos que devem ser parafusados à superfície em diversos pontos de maneira

a garantir sua estabilidade - logo, casas térreas em sua maioria, mantiveram apenas as

cimalhas e almofadas originais na platibanda em estado defasado.

Sobrados, por sua vez, também sofreram com as irregularidades expostas, porém, houve

maior conservação de traços específicos da arquitetura colonial em grande quantidade

desses no tocante ao maior controle do ritmo dos vãos, à manutenção das esquadrias

originais (mantinham todas ou certa quantidade), platibandas com detalhes mais ricos –

porém, mais suscetíveis à pátina - e das sacadas de ferro ornamentadas.

3.1. Levantamento em campo

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Ao adentrar o sítio de interesse e aplicar a ficha especulativa de análise tipológica em

campo, houve a necessidade, como previsto, de modificá-la de acordo com as variáveis

mais compartilhadas entre bens. Dentre as mudanças, destacam-se: a escolha de, por hora,

não realizar a averiguação do interior dos imóveis; conceder espaço específico para

fotografias e possibilidade de indicar os tipos de uso – estilístico, marco histórico, técnico,

social ou subjetivo – indicadores de significância cultural, de acordo com a Carta de Burra

(ICOMOS, 2013, p.2).

A planilha deveria permitir uma leitura rápida de informações, com fácil marcação dos itens

tipológicos, espaços para inserção de fotografias – da obra e detalhes como esquadrias,

pátina, alguma interferência estrutural ou ornamento – e para textos sucintos, quando

necessários, em forma de observações.

Em conjunto com a ficha de apreensão da tipologia, foi construída uma outra, direcionada à

identificação geral de todas as obras apreendidas, com sua localização precisa, numeração,

caracterização por cor – definindo o que é IH, MH ou bem não identificado pelo Plano

Diretor -, fotografia da fachada frontal de cada edificação, estado de conservação e breve

descrição da ambiência. Ambas as planilhas se mostraram bastante eficientes em suas

formas finais. Durante a construção destas, buscou-se criar uma identidade visual coesa

que se estendesse às adaptações dos mapas da SEMPLA desenvolvidos pelo grupo de

pesquisa.

Imagem 04: alguns dos mapas elaborados para o estudo das edificações, recortes do mapa cadastral

do Centro. Fonte: autora, 2015.

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Imagem 05: Ficha de levantamento tipológico final. A cor azul escura na parte superior representa

que o bem em questão é um MH. Fonte: autora, 2015.

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Imagem 06: Recorte da planilha de identificação geral. Fonte: autora, 2015.

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3.2. Casos especiais

3.2.1. Igreja do Livramento

Enraizada no coração do Centro histórico, foi uma das primeiras construções de cunho

religioso de Maceió, inicialmente com uma estrutura pequena e modesta, era chamada de

Capela do Livramento, porém, apesar do espaço módico, era frequentada por uma grande

quantidade de fiéis, o que foi pretexto para o desenvolvimento urbano naquele ponto. Este

progresso se iniciou com a construção de uma rua e uma praça homônima à sua frente.

Imagem 07: Praça D. Rosa da Fonseca, aproximadamente em 1915. Disponível em:

<http://maceiomemoravel.blogspot.com.br/>. Acesso em: 04 Nov 2015.

O espaço físico atual só foi inaugurado em 1883, com a demolição da antiga capela. No

entanto, em 1909, por decreto do Conselho Municipal de Maceió, a antiga praça do

livramento passou a ser chamada de Pça. Dona Rosa da Fonseca. Em meados de 1950,

o Bar do Chopp se instalou numa das casas aos arredores desta; mais precisamente, onde

funcionava a antiga Mercearia Boa Vista, e foi autorizado pelo governo local a usar a praça

como extensão para distribuir suas mesas. Gradualmente, a área foi sendo agregada ao bar

até absorvê-la completamente. Hoje, uma grande coberta de telhas cerâmicas suportadas

por pilares esguios de madeira encobre a zona.

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Imagem 08: Bar do Chopp, antiga Pça. D. Rosa da Fonseca atualmente. Disponível em: <

http://www.historiadealagoas.com.br/praca-rosa-da-fonseca-de-n-s-do-livramento-ate-o-bar-do-

chopp/>. Acesso em: 04 Nov 2015

O edifício Brêda, de 1958, era o ponto de encontro dos jovens da época. Construído em

local que permitia visualizar a praia, mas imerso no Centro histórico, possuía vista ímpar da

cidade, porém, rompeu com a hierarquia visual até então mantida entre a Igreja do

Livramento e as edificações do arredor.

Em meio a lojas e camelôs, com o Bar do Chopp à sua frente e um dos mais populares

prédios comerciais até a atualidade – o Edifício Brêda – na quadra ao lado, a igreja tem seu

uso, hierarquia e estrutura violados. Principalmente devido à grande transição de pessoas

no comércio e bares locais. A apropriação indevida do ambiente público por falta da

adequada importância dada pelos órgãos governamentais é o que possibilitou interferências

como estas acontecerem.

No presente, a igreja do Livramento passa por problemas sérios de conservação da sua

integridade - estrutural e, consequentemente, de sua significância -, apresentando pátina

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avançada, crescimento de vegetação em sua torre, descamação do substrato, azulejos e

sinos danificados.

Imagem 09: Igreja do Livramento atualmente. Fonte: foto do autor, 2015.

3.2.2. Procuradoria da Fazenda Nacional

Localizado ao lado da Catedral Metropolitana de Maceió, a Procuradoria da Fazenda

encontra-se em uma área privilegiada do Centro histórico, aonde não há incisiva

interferência do comércio, apesar de ser um local bastante movimentado. O imóvel obedece

rigidamente a hierarquia visual imposta pelo bem religioso, porém, edificações fora do Setor

de Preservação Rigorosa começam a influenciar de forma ruim nessa ambiência, por seus

altos gabaritos.

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O que chama atenção neste Monumento, além da exímia conservação física, é sua relação

com a construção anexada a ele. No prédio original o ritmo dos vãos, colunas e ornamentos

pode ser observado claramente em todas as fachadas. A estrutura é circundada por

cimalhas e sua base é revestida com placas cerâmicas. Os ornamentos são feitos em

gesso. O prédio de apoio adicionado posteriormente quebra o ritmo previamente

mencionado por completo, o tamanho e locação dos vãos não seguem as linhas originais e

sua fachada lateral também acaba seguindo padrões próprios, sem nenhuma relação com o

Monumento ou a própria fachada frontal. Sem intenções estéticas, acaba prejudicando

também a funcionalidade da edificação original ao encobrir sua fachada lateral direita com

uma parede direcionada para instalação de caixas de ar condicionado, tornando as janelas

de púlpito e conversadeiras laterais inutilizáveis.

Imagem 10: Procuradoria da Fazenda Nacional, Maceió. Disponível em:

<https://goo.gl/maps/svDPnXrpn7q>. Acesso em 13 Set 2015

No que tange à significância cultural do monumento histórico pode-se aferir que seu valor

estético está diretamente relacionado com o padrão e harmonia dos ritmos, do seu grau de

conservação e como representante de um estilo arquitetônico; historicamente importante por

acontecimentos que marcaram ou marcam uma época; cientificamente pela complexidade

dos materiais e técnicas de construção; valor social diretamente ligado ao histórico, diz

respeito ao exercer sua função na sociedade; e, finalmente, seu valor espiritual, subjetivo,

ligado à memória afetiva de cada pessoa (ICOMOS, 2013, p.2). Sendo assim, bens

excepcionais como este, na necessidade de reformas ou construção de edificações de

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apoio, devem ter um controle maior dos projetos arquitetônicos, a fim de manter a

significância intacta.

3.2.3. O caso dos Imóveis Históricos

Ao seguir o mapeamento cadastral desenvolvido pelo Plano Diretor, foi descoberto que 10

(dez) dos imóveis identificados como “Imóveis Históricos” já não mais existiam no sítio. Mais

precisamente, tiveram sua estrutura demolida para construção de estacionamentos ou suas

fachadas completamente descaracterizadas – alguns cobertos por concreto ou parede de

alvenaria.

Imagem 11: Imóvel Q66-N459. Caracterizado como IH no mapeamento cadastral, mas teve sua

estrutura descaracterizada. Fonte: Foto do autor, 2015.

Porém, ainda foram encontrados 8 (oito) bens claramente excepcionais que não constavam

no mapeamento, sem razões aparentes à primeira vista, pois alguns possuíam melhor

estado de conservação do que grande parte dos outros IH. A medida em que as fichas de

averiguação estavam sendo passadas para a planilha digital, haviam obras fotografadas na

visita ao sítio que não condiziam com o mapa, tendo isso em vista, foi utilizado da

plataforma Google Earth, para um segundo parecer de cada imóvel.

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A pesquisa em campo começou a ser realizada em Agosto, mas as datas das imagens

apreendidas pelo Google pertenciam ao ano de 2013. Dessa maneira, em algumas das

edificações o fator mais provável, confirmado pelas fotografias, é de que elas estavam

escondidas sob letreiros, o que leva a especular a existência de mais imóveis camuflados.

Com essa descoberta, é reforçado que o estudo da tipologia é indissociável da visita ao

local da averiguação.

Imagem 12: Ao lado esquerdo, imagem do Google Earth (2013), ao lado direto, fotografia da

apreensão em sítio. Fonte: Acervo pessoal, 2015 [montagem].

4. Conclusão

Berço das arquiteturas vanguardistas na cidade e, concomitantemente, detentor de

inconfundível traçado urbano colonial e outras heranças, o Centro de Maceió, mais

precisamente, seu Setor de Preservação Rigorosa 1, possui lacunas no que tange ao

controle de gestão patrimonial, a conservação de sua integridade. Questões como a

paisagem urbana, a hierarquia entre Monumentos e Imóveis Históricos e o “crescimento” da

cidade acabam influenciando diretamente na leitura da Zona.

“(...) A recuperação da dimensão arquitetônica das

cidades (...) deve se passar pela valorização dos

monumentos, entendidos como elementos urbanos mais

visíveis e constantes no tempo. Esta valorização se

expressaria na estruturação da organização física do

tecido e na combinação dos elementos tipológicos. ”

(DEL RIO, 1990, p.71)

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O tipo representa signos da vida associada, do uso; nele identificam-se juízos acerca da

história, relações de tradição e perspectivas de futuro, se traduzem culturas e simbologias

(GREGOTTI, 1975, p.159). Por meio da análise a fundo deste, é possível aferir respostas e

criar padrões para futuras reformas estruturais que respeitem a essência do bem edificado.

A fragilidade de proteção aos bens patrimoniais edificados por parte dos órgãos

governamentais gera ao Centro histórico problemas em dimensões formais e funcionais.

Mesmo no Setor em questão, onde o controle de intervenções edilícias e urbanísticas é

maior, o descuido é evidente. A indevida apropriação da ambiência - como a hierarquia

visual dos patrimônios excepcionais, que cada vez mais perde espaço para edificações

contemporâneas e destoantes - e detrimento de características originais - como as

adaptações da estrutura interna para o uso comercial ou disposição de grandes letreiros nas

fachadas, promovendo a poluição visual e possível degradação da estrutura - acabam

acarretando na corrupção desses bens de valor cultural excepcional.

A relevância do estudo em questão está no fato de que o Plano de Gestão da ZEP 2 do

Centro de Maceió/AL, previsto pelo Plano Diretor Municipal (SEMPLA, 2006), apesar de

ainda não foi efetivado enquanto recomendações e diretrizes mais específicas no que diz

respeito às intervenções para conservação da significância cultural do SPR1. A busca da

lógica histórica do patrimônio para adaptação às necessidades contemporâneas deve ser a

essência da gestão da conservação de áreas históricas, além de possibilitar relacionar

atributos, significados e valores patrimoniais.

A importância desse estudo consiste na busca pela manutenção de valores que se adaptem

às necessidades da contemporaneidade, reabilitando ou potencializando o porte patrimonial

remanescente no sítio para uma arquitetura que perpasse o passado, presente e futuro.

5. Referências

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Carlouste Gulbekian/ JNICT, 1993.

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Brasília, 1996.

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