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1 Análise Numérica da Estabilidade Global de Uma Série de Pórticos Pré-Moldados de Concreto Armado Numerical Analysis of the Global Stability of a Series of Pre-cast Reinforced Concrete Portal Frames REYOLANDO M.L.R.F. BRASIL (1) e MARCELO A. SILVA (2) (1) Professor Livre Docente, Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo Caixa Postal 61548 - CEP 05.424-970 São Paulo-SP., Brasil E-mail: [email protected] (2) Pesquisador de Pós-Doutorado, Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo E-mail: [email protected] RESUMO Neste trabalho, apresenta-se uma análise numérica do problema da estabilidade global de um edifício industrial constituído de uma série de pórticos planos simples de concreto armado pré-moldado. Ao se fazer a modelagem de cada pórtico como uma estrutura plana, deixa-se de levar em conta a possível falta de rigidez aos esforços transversais a esse plano. Essa rigidez é responsável pela estabilidade global da estrutura e só pode ser levada em conta em um modelo espacial tridimensional. Surge a questão de como avaliar a efetividade desses elementos estabilizadores. A sugestão deste trabalho é de se determinar o condicionamento numérico da matriz de rigidez nos dois modelos, o plano e o espacial. Esse condicionamento é expresso pela relação entre o maior e o menor autovalor dessa matriz. Um exemplo baseado em um caso real que apresentou problemas de estabilidade global é apresentado e analisado. Palavras-Chave: estabilidade, pré-moldados, pórticos, concreto armado ABSTRACT A numerical analysis of the global stability of an industrial building made up of a series of parallel pre-cast reinforced concrete plane portal frames is presented. If each portal frame is modeled as a plane structure, one cannot take into account the possible lack of stiffness to loads transverse to this plane, provided by the longitudinal elements of the structure, such as girders. That stiffness is responsible for the global stability of the structure and can only be accounted for using a tri-dimensional space model. The question that is posed is how to evaluate the effectiveness of the existing stabilizing elements. It is suggested in this paper that this can be done by computing the condition number of the stiffness matrices for both models, the plane and the space one. This number is equal to the ratio between the largest and the smallest eingenvalues of the matrix. An example, based on a real case that presented stability problems, is presented and analyzed. Keywords: stability, pre-cast structures, portal frames, reinforced concrete

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Análise Numérica da Estabilidade Global de Uma Série de Pórticos Pré-Moldados de Concreto Armado

Numerical Analysis of the Global Stability of a Series of Pre-cast Reinforced

Concrete Portal Frames

REYOLANDO M.L.R.F. BRASIL (1) e MARCELO A. SILVA (2)

(1) Professor Livre Docente, Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações -

Escola Politécnica da Universidade de São Paulo Caixa Postal 61548 - CEP 05.424-970 São Paulo-SP., Brasil

E-mail: [email protected]

(2) Pesquisador de Pós-Doutorado, Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo

E-mail: [email protected]

RESUMO

Neste trabalho, apresenta-se uma análise numérica do problema da estabilidade global de um edifício industrial constituído de uma série de pórticos planos simples de concreto armado pré-moldado. Ao se fazer a modelagem de cada pórtico como uma estrutura plana, deixa-se de levar em conta a possível falta de rigidez aos esforços transversais a esse plano. Essa rigidez é responsável pela estabilidade global da estrutura e só pode ser levada em conta em um modelo espacial tridimensional. Surge a questão de como avaliar a efetividade desses elementos estabilizadores. A sugestão deste trabalho é de se determinar o condicionamento numérico da matriz de rigidez nos dois modelos, o plano e o espacial. Esse condicionamento é expresso pela relação entre o maior e o menor autovalor dessa matriz. Um exemplo baseado em um caso real que apresentou problemas de estabilidade global é apresentado e analisado. Palavras-Chave: estabilidade, pré-moldados, pórticos, concreto armado ABSTRACT

A numerical analysis of the global stability of an industrial building made up of a series of parallel pre-cast reinforced concrete plane portal frames is presented. If each portal frame is modeled as a plane structure, one cannot take into account the possible lack of stiffness to loads transverse to this plane, provided by the longitudinal elements of the structure, such as girders. That stiffness is responsible for the global stability of the structure and can only be accounted for using a tri-dimensional space model. The question that is posed is how to evaluate the effectiveness of the existing stabilizing elements. It is suggested in this paper that this can be done by computing the condition number of the stiffness matrices for both models, the plane and the space one. This number is equal to the ratio between the largest and the smallest eingenvalues of the matrix. An example, based on a real case that presented stability problems, is presented and analyzed. Keywords: stability, pre-cast structures, portal frames, reinforced concrete

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1. INTRODUÇÃO E MOTIVAÇÃO Um problema de instabilidade ocorrido em uma obra de um galpão

industrial pré-moldado chamou a atenção para o fenômeno da instabilidade lateral apresentada por pórticos planos atirantado. Um exemplo típico deste tipo de estrutura é o pórtico mostrado na Figura 1, o qual é composto por duas colunas e duas vigas em concreto armado pré-moldado, e um tirante em aço. O pórtico se desenvolve no plano x1x2, enquanto que x3 é a direção longitudinal da edificação.

Figura 1 – Vista geral do pórtico plano analisado

Nos modelos adotados, as colunas encontram-se engastadas no nível

do terreno, as vigas apresentam ligações rígidas com as cabeças dos pilares e rotuladas em suas extremidades (cumeeira). O tirante encontra-se rotulado em suas extremidades e também apresenta a não-linearidade física de trabalhar apenas à tração. Observe que a utilização de softwares que tratam a análise não-linear de estruturas é fundamental para que se realizem os cálculos estruturais descritos no presente trabalho.

Figura 2 – Vista geral da seqüência de pórticos analisada com o contra-ventamento provisório

para montagem

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Na Figura 2 é apresentada, de uma maneira simplificada, a seqüência de pórticos que ruiu devido ao fenômeno de instabilidade. Esta seqüência é uma repetição dos pórticos da Figura 1, acrescidos os elementos estruturais terças metálicas e os cabos de contra-ventamento provisório. No caso aqui analisado, os cabos do contra-ventamento provisório foram rompidos durante uma manobra do guindaste no processo de montagem.

Figura 3 – Pórticos ruídos pelo efeito da instabilidade lateral

Este rompimento fez com que os pórticos ficassem sem o contra-ventamento e, por não terem rigidez suficiente no plano perpendicular ao de aplicação dos esforços, acabaram ruindo. Sem um travamento adequado, as extremidades das vigas junto à cumeeira se deslocaram na direção perpendicular ao plano do pórtico (direção x3), ou seja, na direção longitudinal do galpão, aplicando uma torção excessiva nas colunas, as quais vieram a ruir pelos efeitos do momento torçor. As Figuras 3 e 4 mostram respectivamente as fotos dos pórticos ruídos e a mesma estrutura posteriormente, após sua recuperação e conclusão da montagem.

Figura 4 – Pórticos, depois do acidente, após a conclusão da montagem dos pórticos e início

da montagem do telhado

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A questão que se pretende discutir no presente trabalho é como se pode analisar e concluir se o fenômeno de instabilidade descrito anteriormente pode ocorrer ou não com uma determinada estrutura. Estudos de BRASIL (1984) mostraram que o número de condição da matriz de rigidez é um importante parâmetro para se analisar a estabilidade de pórticos planos. Quanto maior o número de condição, mais facilmente fenômenos de instabilidade podem ocorrer. BRASIL (1984) discute a conceituação matemática e física do número de condição de sistemas de equações lineares, incluindo o caso das matrizes de rigidez de pórticos planos. No trabalho de TODD (1972) é apresentada uma definição matemática rigorosa do número de condição de uma matriz e as particularidades nos casos de matrizes simétricas e definidas positiva. GOLUB e VAN LOAN (1989) mostram uma abordagem numérica bastante voltada para a área computacional, visando a redução do número de operações no cálculo do número de condição. No presente trabalho, pretende-se definir o número de condição, tanto do ponto de vista matemático quanto de sua interpretação física. Posteriormente, serão analisados os casos dos pórticos mostrados nas Figuras 1 e 2, onde serão apresentados os números de condições e o cálculo dos esforços solicitantes para diversas situações de contra-ventamento. Finalmente serão apresentadas as conclusões e sugestões para futuros trabalhos.

2. CONCEITUAÇÃO MATEMÁTICA E FÍSICA DO NÚMERO DE CONDIÇÃO DA MATRIZ DE RIGIDEZ 2.1 Conceituação Matemática

Seja K nn×ℜ∈ a matriz de um determinado sistema de n equações lineares com n incógnitas. O “problema de autovalor” da matriz K é definido como: determine ℜ∈λ , tal que

det(K-λI) = 0, (1)

onde I é a matriz identidade. Observe que a Eq. (1) resulta em um polinômio de ordem n, o qual possui n raízes λi. No caso da matriz K ser simétrica e definida positiva, todos os valores λi são números reais positivos e distintos (GOLUB e VAN LOAN, 1989). Neste caso, os mesmos podem ser agrupados em ordem crescente formando o vetor λ = [λ1 λ2 ... λn], onde λ1 é o menor autovalor e λn o maior. O número de condição da matriz K é então definido como:

λnC = . (2)

Observe que o número de condição, de certa forma, mede a distância entre o primeiro e o último autovalor da matriz K.

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2.2 Interpretação Física do Número de Condição No caso da dinâmica das estruturas, para o cálculo das freqüências de

vibração natural de uma determinada estrutura, deve-se proceder a solução do seguinte problema de autovalor, denominado de “problema de autovalor generalizado”: determine ℜ∈λ , tal que

det(K-λM) = 0, (3)

onde K é a matriz de rigidez da estrutura e M a matriz de massa, ambas de dimensões nxn., sendo n o número de graus de liberdade do sistema estrutural analisado. Observe novamente que a Eq. (3) resulta em um polinômio de ordem n, o que corresponde a n raízes λi. No caso da engenharia de estruturas, a matriz de rigidez K e a matriz de massa M são sempre simétricas e definidas positiva, e conseqüentemente todos os valores λi são números reais positivos e distintos (GOLUB e VAN LOAN, 1989). Resolvendo-se (3) e agrupando-se os autovalores em ordem crescente, obtém-se o vetor λ = [λ1 λ2 ... λn], onde λ1 é o menor auto-valor e λn o maior. Procede-se então o cálculo da freqüência de vibração natural da estrutura relacionada com o i-ésimo modo de vibração como:

πλ

2i

if = . (4)

Com a intenção de utilizar programas comerciais de análise dinâmica

estruturas para o cálculo do número de condição de uma matriz de rigidez, adota-se o artifício de considerar em cada nó da estrutura uma massa unitária, o que faria com que

M = I, (5)

ou seja, a matriz de massa seria igual à matriz identidade. Levando-se a Eq. (5) em (3), conclui-se que neste caso as equações (3) e (1) seriam idênticas e teriam a mesma solução. Considerando-se as freqüências obtidas, deduz-se que o número de condição pode ser escrito como:

2

1

=

ffC n . (7)

Analisando a Eq. (7), conclui-se que o número de condição, no caso da

engenharia de estruturas, pode ser interpretado como sendo o quadrado da razão entre a maior e a menor freqüência natural de vibração da estrutura. O que significa, de acordo com BRASIL (1984), que quanto mais perto estão as freqüências extremas, melhor o comportamento da estrutura frente a um problema de instabilidade lateral. Ou ainda, quanto maior for o valor da primeira freqüência de vibração natural da estrutura, melhor o seu comportamento no caso de instabilidade lateral.

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3. ESTUDO DE CASO REALIZADO 3.1 Características das Estruturas

Os exemplos numéricos de estruturas a serem analisados aqui são os pórticos em concreto armado pré-moldado mostrados nas Fig. 1, 2 e 5. Como citado anteriormente, a estrutura é composta por duas colunas, duas vigas e um tirante. O vão entre as colunas é 15 m, a altura do nível do terreno até o tirante é de 8 m e a inclinação do telhado é de 10%. Neste estudo numérico ora apresentado, foram adotados nós apenas nas extremidades dos elementos. Outra simplificação efetuada foi em relação às vigas. Estas, que geralmente são tronco-piramidais, foram aqui simplificadamente consideradas prismáticas. As colunas encontram-se engastadas no nível do terreno, enquanto que as vigas são engastadas no topo das colunas e rotuladas em suas extremidades (na cumeeira do galpão). O cabo do tirante encontra-se rotulado em suas extremidades e é um elemento estrutural que trabalha apenas à tração. As seções das vigas e colunas são em Duplo “T”, enquanto que o tirante é um vergalhão de aço CA-50. A numeração adotada para os nós, a numeração das propriedades de cada elemento estrutural e a vinculação destes elementos são mostradas na Figura 5. Note-se que os números que aparecem no centro dos elementos referem-se às suas propriedades, as quais são mostradas na tabela na própria Figura 5, enquanto que os números das extremidades referem-se aos nós da estrutura no seu sistema global.

Figura 5 – Numeração de nós, definição das propriedades e vinculação da estrutura

O carregamento considerado nesta análise foi o peso próprio da

estrutura, bem como os pesos das terças e telhas, e sobrecarga acidental. O carregamento adotado é mostrado na Figura 6. Observe-se que na coluna considerou-se apenas o peso-próprio, igual a uma carga distribuída de 2 kN/m. No caso da viga, considerou-se o peso próprio de 1 kN/m, bem como o peso das terças e telhas, e sobrecarga igual a 2,7 kN/m. No tirante foi considerado o seu peso próprio de 10 N/m.

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Nos cálculos estruturais realizados no presente trabalho, os modelos estruturais considerados levam em conta a não-linearidade física do tirante, o qual é, conforme citado anteriormente, um elemento estrutural que só trabalha quando tracionado, e o efeito P-Delta, dado pelas forças axiais sobre os deslocamentos apresentados pela estrutura. Para tanto, utilizou-se o software de análise estrutural STRAP.

Figura 6 – Carregamento considerado

Figura 7 – Esforços solicitantes obtidos para a estrutura no modelo plano (Mod. 1)

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3.2 Modelo Plano – Bidimensional A estrutura descrita na Seção 3.1 foi calculada estruturalmente,

considerando-se o modelo estático não-linear bidimensional. Este modelo é aqui denominado de Modelo 1, ou simplesmente Mod. 1. Os esforços solicitantes obtidos são mostrados na Figura 7. Observe-se que as vigas e colunas trabalham sob flexo-compressão e cisalhamento devido ao cortante, enquanto que o tirante apenas à tração. Note-se que se tem apenas três tipos de esforços solicitantes, sendo o momento fletor M3, a força cortante V2 e a força normal N. Estes esforços são os utilizados normalmente no dimensionamento das peças.

No caso em questão, a força normal é uma das principais responsáveis pelo efeito de instabilidade lateral. Com o surgimento de eventuais deslocamentos (Delta) longitudinais das vigas, estas forças axiais (P) passam a provocar o efeito P-Delta e conseqüentemente a gerar os denominados efeitos de segunda ordem devidos à não-linearidade geométrica.

3.3 Modelo Espacial – Tridimensional

Nesta Seção é adotado um modelo estático tridimensional com as não-linearidades citadas anteriormente. Este modelo é denominado no presente trabalho de Mod. 2. Considerando-se apenas o carregamento descrito na Seção 3.1, mesmo com este modelo espacial os resultados são os mesmos mostrados na Figura 7 e os demais esforços solicitantes permanecem nulos. Entretanto, se é aplicada uma carga de um valor pequeno em termos de engenharia de estrutura, por exemplo, igual a 10 N, na direção de x3 (longitudinal do galpão, normal ao plano do pórtico) na cumeeira da estrutura (nó 5), os esforços solicitantes são aqueles mostrados na Figura 8. Observe que os esforços solicitantes M3, V2 e N não variam significativamente quando comparados com aqueles dados pelo modelo plano (Figura 7), entretanto quando se analisam os demais esforços solicitantes (M2, V3 e T), observa-se que os mesmos são extremamente altos e bem superiores aos que este tipo de estrutura normalmente suporta. Destes, o esforço que mais chamou a atenção é o momento torçor T que apresenta um valor da ordem de 300 kN.m. Considerando-se apenas o módulo de resistência à torção da seção transversal do pilar e um concreto de 25 MPa, teoricamente esta seção resistiria a momentos de torção da ordem de 2 kN.m. Observe que o valor obtido na presente análise é aproximadamente 150 vezes o valor admissível na coluna. Tal fato justifica a ruína dos pórticos por ruptura devida à torção nas colunas.

Os autores realizaram uma outra análise da estrutura com um modelo tridimensional, com a carga de 10 N aplicada na longitudinal, não levando em consideração o efeito P-Delta, entretanto. Neste caso, os esforços solicitantes M3, V2 e N praticamente coincidiram com aqueles já apresentados, enquanto que M2, V3 e T permaneceram praticamente nulos. Ou seja, apenas o modelo tridimensional com análise geometricamente não-linear conseguiu detectar o fenômeno de instabilidade lateral.

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Figura 8 – Esforços solicitantes obtidos para a estrutura no modelo tridimensional (Mod. 2)

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Outro estudo realizado pelos autores foi o de considerar outras cargas iguais a 1 N, 100 N e 1 kN, ao invés da carga longitudinal aplicada na cumeeira do cálculo anterior. Nestes casos também os esforços solicitantes permaneceram praticamente iguais aos mostrados na Figura 8. O que leva a concluir que independentemente do valor do esforço longitudinal aplicado, apenas com uma pequena perturbação longitudinal o fenômeno de instabilidade lateral é deflagrado e pode culminar na ruína da estrutura.

3.4 O Contra-ventamento

Para se evitar a instabilidade lateral de pórticos planos atirantado, como os aqui descritos, é necessário que se faça um contra-ventamento entre dois pórticos. Para tanto, considerou-se uma seqüência formada por três pórticos idênticos ao descrito na Seção 3.1. Estes pórticos foram analisados numericamente com a utilização de diversos tipos de contra-ventamento. O material adotado para os contra-ventamentos e terças são perfis metálicos tipo U 4” x 1/8”. Do ponto de vista estrutural, estes elementos são tratados como barras prismáticas rotuladas nas extremidades.

Mod. 3 – pórticos sem contra-ventamento Mod. 4 – pórticos com contra-ventamento em

2X em um único vão

Mod. 5 – pórticos com contra-ventamento

com duas diagonais em um único vão Mod. 6 – pórticos com contra-ventamento

com apenas uma diagonal em um único vão Figura 9 – Contra-ventamentos analisados

Observa-se, na Figura 9, que o pórtico do Mod. 3 não apresenta contra-ventamento, enquanto que os demais pórticos (Mod.s 4, 5 e 6) encontram-se todos contra-ventados. Considerando-se o mesmo modelo não-linear descrito anteriormente, com a pequena carga na longitudinal, realizou-se o cálculo estrutural dos pórticos da Figura 9. Concluiu-se que o pórtico do Mod. 3 apresentou os esforços solicitantes idênticos aos da Figura 8, ou seja, o fenômeno da instabilidade lateral se manifestou e, sem o contra-ventamento, a seqüência de pórticos ruiria por torção nas colunas com qualquer perturbação que houvesse no sentido longitudinal. Já os demais pórticos, os quais possuem contra-ventamentos, apresentaram esforços solicitantes semelhantes àqueles da Figura 7, ou seja, com um comportamento bem próximo do modelo plano (bidimensional) e sem o fenômeno da instabilidade lateral.

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3.5 Estudo da Estabilidade do Sistema O que do ponto de vista numérico poderia explicar um comportamento tão diferente em estruturas idênticas, quando comparamos, por exemplo, o Mod. 1 com o Mod. 2, ou então, quando comparamos o Mod. 3 com os demais (Mod.s 4, 5 e 6). A resposta está na análise do condicionamento numérico da matriz de rigidez destas estruturas. Os pórticos dos Mod.s 2 e 3 possuem rigidez extremamente baixa no sentido longitudinal, enquanto que o mesmo não ocorre no plano do pórtico. O mesmo raciocínio pode ser feito em termos de momento fletor. Os esforços do plano da estrutura (M3, V2 e N) pouco são afetados pelo carregamento longitudinal, enquanto que os esforços relacionados com a direção longitudinal da estrutura mudam drasticamente seu comportamento, tendendo a valores extremamente altos, que levariam estruturas ao colapso. A pouca rigidez da estrutura no sentido longitudinal deflagra um processo de instabilidade que pode ser irreversível. Tabela 1 – Autovalores e número de condição das matrizes de rigidez dos modelos analisados

MOD. 1 MOD. 2 MOD. 3 MOD. 4 MOD. 5 MOD. 61 358 10 10 246 227 1402 2632 358 358 358 358 3583 143366 440 358 364 360 3584 397471 458 358 380 376 3645 487526 2632 440 688 638 4506 492959 143366 458 2470 1386 8097 397471 2632 2632 2632 26328 487526 2632 2634 2633 26329 492959 2632 6244 4813 396110 5937 6938 5937 593711 6367 7858 7087 637712 6385 10101 8087 743513 17791 18503 18173 1812314 18221 19502 18563 1823115 18238 21357 20252 1935916 143366 143366 143366 14336617 143366 145536 143367 14336618 143366 145707 145621 14448519 397471 397471 397471 39747120 397471 398232 397473 39747221 397471 403559 400923 39920722 487526 487526 487526 48752623 487526 487572 487527 48752724 487526 487573 487571 48754825 492959 492959 492959 49295926 492959 492967 492961 49296027 492959 493631 493290 493123

MAIOR 492959 492959 492959 493631 493290 493123MENOR 358 10 10 246 227 140

NUMERO DE CONDIÇÃO (C ) 1379 47519 47519 2007 2169 3517

AUTOVALORES λ =[ λ i ]i

A Tabela 1 mostra o autovalores λ e o número de condição C para os diversos modelos apresentados. Observa-se que quando se muda apenas o modelo de plano (Mod. 1) para tridimensional (Mod. 2) o número de condição aumenta em 35 vezes. O que demonstra uma brusca variação na rigidez da estrutura de um modelo para outro. A interpretação física deste fenômeno pode ser também de que estrutura passa a vibrar mais facilmente na direção longitudinal do que no plano da mesma. O que pode ser visualizado na Figura

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10, onde é mostrado o primeiro modo de vibração dos Mod.s 1 e 2. Nesta figura, em azul encontra-se desenhada a estrutura original e em vermelho o modo de vibração. A seta em preto mostra a direção do movimento do pórtico.

Mod. 1 Mod. 2

Figura 10 – Primeiro modo de vibração natural dos Modelos 1 e 2 Observa-se, no caso do Mod.1 (modelo plano), que sua primeira freqüência natural é de aproximadamente 3 Hz, enquanto que no caso do Mod. 2 (modelo tridimensional) a estrutura vibra na direção longitudinal do galpão, ou seja, perpendicular ao próprio plano, com uma freqüência da ordem de 0,5 Hz. Pode-se verificar que o deslocamento, no caso do modo do Mod. 2, é basicamente de uma rotação das colunas e vigas em torno de um eixo vertical, o que conseqüentemente produz momentos de flexão nas vigas e, o mais significativo, torção nas colunas. Com a ligação das vigas nas colunas são rígidas, vê-se claramente o movimento de rotação nas colunas e conseqüentemente o esforço solicitante associado à ele, ou seja, o momento torçor T. Note também na Tabela 1 que λ1Mod1 = λ2Mod2,...,6, o que significa que o primeiro modo de vibração do Mod. 1 é igual ao segundo modo de vibração dos demais modelos. Ou seja, com a análise tridimensional passa a existir um novo modo de vibração da estrutura no sentido longitudinal, o qual possui uma freqüência de vibração bem inferior às dos demais modos e será preponderante perante os demais. Este novo modo é o que provoca a instabilidade lateral. Nos casos onde se propôs o contra-ventamento, por mais simples que fosse, e em apenas um vão, o número de condição da matriz de rigidez da estrutura ficou praticamente na mesma ordem de grandeza que aquele do Mod. 1. De qualquer forma, nestes casos, o primeiro modo de vibração ainda continua sendo a vibração na direção longitudinal da estrutura. As análises efetuadas mostram que os esforços solicitantes dos Mod.s 1, 4, 5 e 6 praticamente coincidiram, e o fenômeno de instabilidade lateral não se manifestou. Já nos casos dos Mod.s 2 e 3 os esforços solicitantes relacionados com a direção longitudinal foram extremamente altos, e a instabilidade lateral se manifestou, o que provocaria a ruína das estruturas. Observa-se nos modelos onde foi adotado o contra-ventamento, que assim que se vai diminuindo o travamento, o número de condição vai aumentado. Outra observação necessária é que o número de condição do Mod. 2 é exatamente igual ao do Mod. 3, ou seja, ao se analisar com mais cuidado conclui-se que os modos de vibração e o comportamento do pórtico, ou da seqüência de pórticos sem contra-travamento, são os mesmos.

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De uma maneira geral, nos casos analisados aqui, concluiu-se que quando a relação entre o número de condição do modelo plano e o do tridimensional é da ordem de 3 (três), a estrutura não apresenta o fenômeno da instabilidade lateral. Nos casos em que a relação entre o número de condição do modelo plano e o do espacial foi da ordem de 30 (trinta), o fenômeno foi verificado e a ruína da estrutura certamente ocorreria, o que foi detectado na prática, conforme descrito na Seção 1.

É válido lembrar, conforme citado na Seção 2.2, que a analogia com os modos de vibração da estrutura está baseada na suposição de aplicação de massas unitárias nos nós da estrutura, tornando a matriz de massa igual à matriz identidade, o que certamente não coincide com a realidade, mas possibilita uma boa visualização e interpretação física do número de condição da matriz de rigidez. É importante se verificar também a influência das fundações nos modos e freqüências naturais de vibrações aqui calculadas, pois, conforme mostrado por SILVA e BRASIL (2003), a influência da fundação no cômputo dos autovalores pode ser bastante significativa, principalmente no caso das fundações em sapata. Realizar uma análise integrada da fundação e estrutura é extremamente importante (SILVA et al, 2002) para uma análise dinâmica mais confiável. Observe que na Tabela 1 são mostrados apenas os autovalores associados aos modos de vibração relativos aos movimentos de translação dos nós, visto que o software utilizado usa técnicas de supressão dos graus de liberdade de rotação (TEDESCO et al, 1999) para a solução do problema de autovalor generalizado.

0,0

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

0 10 20 30 40

Inclinação (%)

M3

max

/ M

3 m

ax(0

%)

Figura 11 – Momento fletor M3 máximo no pórtico em função da inclinação

Outra importante consideração deve ser feita aqui é sobre a inclinação

da viga do pórtico. Como citado, no presente trabalho foi considerada a inclinação de 10%. Verifica-se que o momento fletor máximo M3 que ocorre na viga do pórtico depende fortemente da inclinação. Na Figura 11 é mostrado um gráfico, para o Mod. 1 do momento fletor máximo M3 em função da inclinação. Note-se que nas ordenadas o valor colocado é normatizado em função de M3max(0%) (momento fletor M3 máximo na viga obtido para a inclinação de 0%). Observa-se que o valor de M3 diminui à medida que a inclinação aumenta e para valores de inclinação superiores a 20% a redução do momento passa a ser muito pequena. Observou-se nos estudos aqui realizados que nos casos

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onde a inclinação é inferior a 15% ocorreram acréscimos significativos no momento fletor M3 devidos aos efeitos de segunda ordem. O que se pode concluir é que inclinações muito pequenas podem agravar os fenômenos de instabilidade descritos no presente trabalho.

4. CONCLUSÕES Foi descrito um caso de instabilidade ocorrido em uma edificação do tipo galpão industrial, a qual culminou com a ruína de três pórticos interligados entre si. A investigação das causas do acidente culminou na conclusão de que se manifestou um fenômeno de instabilidade lateral devido à falta de rigidez da estrutura na direção perpendicular ao seu plano, o que pode ser detectado através da análise do número de condição da matriz de rigidez da estrutura. Foi apresentada a conceituação matemática bem como a interpretação física, para o caso da engenharia de estruturas, do número de condição da matriz de rigidez. Posteriormente, foi realizada uma análise estrutural e o cálculo dos números de condições de diversos pórticos, os quais se encontravam com ou sem contra-ventamentos. Os pórticos foram calculados utilizando-se primeiramente um modelo plano e posteriormente modelos tridimensionais. Todos os modelos de cálculo adotados modelavam a estrutura como de comportamento físico e geometricamente não-linear. De uma maneira geral, nos casos aqui analisados, concluiu-se que:

- quando a relação entre o número de condição do modelo estrutural plano e o do modelo tridimensional é da ordem de 3 (três), a estrutura não apresenta o fenômeno da instabilidade lateral; nos casos onde a razão entre o número de condição do modelo plano e o do espacial foi da ordem de 30 (trinta), o fenômeno foi verificado e a ruína da estrutura certamente ocorreria, o que foi detectado também na prática do caso analisado;

- nos pórticos sem contra-ventamento, independentemente do valor do esforço longitudinal aplicado, apenas com uma pequena perturbação longitudinal, o fenômeno de instabilidade lateral é deflagrado e pode culminar na ruína da estrutura;

- apenas o modelo tridimensional com análise geometricamente não-linear conseguiu detectar o fenômeno de instabilidade lateral; caso o projetista opte pela análise linear tridimensional, ele poderá estar incorrendo em grave erro;

- para se evitar o fenômeno de instabilidade lateral é necessária a execução de contra-ventamentamentos na estrutura;

- os modos de vibração de um pórtico, ou da seqüência de pórticos sem travamento, são os mesmos.

Apresentam-se como sugestões para futuros trabalhos: - a otimização (minimização do custo) da estrutura do galpão utilizando-

se como variável de projeto a inclinação do telhado, bem como as dimensões dos elementos estruturais;

- realização da análise com a estrutura integrada à fundação.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS - BRASIL, R. M. L. R. F., Conceituação Matemática e Física do Número de

Condição dos Sistemas de Equações de Equilíbrio do Método dos Deslocamentos em Estruturas Reticuladas de Comportamento Linear, Dissertação de Mestrado, PEF/EPUSP, (1984).

- GOLUB, G. H. e VAN LOAN, C. F., Matrix Computations, 2ª Edição, Hohns Hopkins University Press, (1989).

- SILVA, M. A., ARORA, J. S., SWAN, C. C. e BRASIL, R. M. L. R. F., Optimization of Elevated Concrete Foundations for Vibrating Machines, Journal of Structural Engineering, ASCE, Vol. 128, No. 11, (2002).

- SILVA, M. A. e BRASIL, R. M. L. R. F., Otimização de Torres em Concreto Armado para Telecomunicações, V Simpósio EPUSP Sobre Estruturas de Concreto, São Paulo, (2003).

- TEDESCO, J. W., DCDOUGAL, W. G. e ROSS, C. A., Structural Dynamics: Theory and Applications, Addison Wesley Longman Inc, (1999).

- TODD, J., Basic Numerical Mathematics – Vol. 2 – Numerical Algebra, Stuttgart, BirkHauser, (1972).