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  • 7/23/2019 Analise Funcional Meyer

    1/6

    Captulo

    conceito de anlise funcional

    Snia Beatriz Meyer

    Universidade So Judas Tadeu

    Falar sobre Anlise Funcional no contexto teraputico, requer a) que se reveja o

    prprio conceito de anlise funcional, para em seguida b) questionar sua utilidade na

    prtica clnica, e c) que se verifique de que forma ela tem sido conduzida pelos terapeutas

    comportamentais.

    a) A importncia de

    se

    rever o conceito de anlise funcional est na comunicao entre

    analistas de comportamento,

    p r

    que possa haver consenso entre

    eles

    no

    uso

    desta expresso.

    Comeando a reviso pelo prprio Skinner, referencial mximo quanto anlise

    experimental do comportamento ou anlise funcional do comportamento, verificou-se

    que ele tem poucas formulaes explcitas sobre a anlise funcional, especialmente em

    seus livros mais recentes. Em Cincia e Comportamento Humano 1974) ele escreveu o

    seguinte:

    As variveis externas das quais o comportamento

    funo do margem ao que pode

    ser chamado e anlise causal ou funcional. Tentamos prever e controlar o comportamento

    e um

    organismo individual. Esta a nossa varivel dependente

    -

    o efeito para o qual

    procuramos a causa. Nossas variveis independentes - as causas o comportamento -

    so as condies externas das quais o comportamento

    funo. Relaes entre as duas

    - as

    relaes e causa e efeito no comportamento - so

    as

    leis e uma cincia.

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    No mesmo livro Skinner aborda a contingncia de trs termos:

    Uma formulao adequada da interao entre

    um

    organismo e seu ambiente deve

    sempre especificar trs coisas:

    1)

    a ocasio em que a resposta ocorre, 2) a prpria

    resposta, e 3) as consequncias reforadoras. As interrelaes entre elas so as

    contingncias

    de

    reforo.

    Em outras palavras, uma contingncia comportamental definida como uma regra

    que especifica uma relao condicional entre

    uma

    resposta e suas consequncias

    (Millenson, 1967) e muitas vezes enunciada com afirmaes do tipo se ... , ento ... Ou

    ainda, contingncia se refere a relaes de dependncia entre eventos: entre a resposta e

    o reforo no operante; entre antecedente, resposta e conseqente, no operante discri

    minado; entre uma condio (ou estmulo modelo) e

    um

    antecedente e a resposta e a

    conseqncia, em uma discriminao condicional; entre uma resposta, um intervalo de

    tempo e a conseqncia, em uma contingncia de atraso de reforo. Operantes complexos

    envolvem mltiplas contingncias operando em diferentes combinaes, simultnea e/ou

    sucessivamente (Souza, 1995).

    Contingncia diferente de contiguidade- a justaposio de eventos no tempo e/

    ou no espao; a diferena est na relao de dependncia que est presente em um caso

    e ausente no outro. Relaes de dependncia at podem ser contguas, mas no o so

    necessariamente (Souza, 1995).

    b)

    Quanto

    utilidade

    da anlise funcional, trata-se do instrumento bsico de trabalho de

    qualquer analista de comportamento, inclusive daquele que atua na clnica. sua tarefa

    identificar contingncias que esto operando e inferir quais as que possivelmente operaram

    no passado, ao ouvir a respeito ou observar diretamente comportamentos. Ele pode tambm

    propor, criar ou estabelecer relaes de contingncia para desenvolver ou instalar

    comportamentos, alterar padres, como taxa ou ritmo, ou espaamento, assim como

    reduzir, enfraquecer ou eliminar comportamentos dos repertrios dos indivduos (Souza,

    1995). Vale ressaltar que na clnica estas tarefas geralmente so feitas em conjunto com

    o cliente, especialmente no caso de adultos normais .

    Mudanas no comportamento s se do quando ocorrem mudanas nas contin

    gncias. Por isso, a anlise funcional fundamental sempre que o objetivo seja o de predio

    ou controle do comportamento, o que certamente descreve a tarefa do psiclogo clnico.

    c) Mesmo sabendo o que anlise funcional e reconhecendo sua importncia, pode-se

    dizer

    que

    no existe ainda modelos satisfatrios de como conduzi-la em situaes no

    experimentais como a da prtica clnica. O trabalho desenvolvido em consultrio difere do

    mtodo de laboratrio. Este ltimo a manipulao deliberada de variveis, onde determina

    se a importncia de uma condio dada, alterando-a de maneira controlada e observando

    o resultado (Skinner, 1974). Na clnica, na maioria das vezes, no controlamos variveis

    como feito no laboratrio.

    Para conduzir uma anlise funcional no contexto teraputico, encontramos diversas

    dificuldades. A identificao destas dificuldades e as propostas de solucion-las tm como

    propsito avanar no desenvolvimento da anlise do comportamento. Esta proposta parece

    estar de acordo com Skinner (1974 quando este argumenta com relao objeo feita a

    uma

    anlise funcional completa, a de que ela no pode ser levada a efeito, que ela

    ainda

    no foi levada a efeito. Diz que o comportamento humano talvez o mais difcil de ser

    estudado pelos mtodos cientficos, mas que a complexidade no nos deveria desanimar.

    30 Snia eatriz

    eyer

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    As dificuldades

    encontradas podem

    ser agrupadas

    da

    seguinte forma:

    1

    Dificuldade na identificao da unidade de anlise ou na definio de classes

    de resposta:

    Millenson 1967) discorreu sobre esta questo dizendo que uma das razes pelas

    quais a cincia do comportamento demorou a se desenvolver, baseia-se na prpria natureza

    de seu objeto, o comportamento, que no pode ser facilmente retido para observao.

    difcil

    identificar

    pontos na corrente comportamental contnua, onde unidades

    naturais

    do

    comportamento possam ser fracionadas. E ainda, no h duas aes de um organismo que

    sejam exatamente iguais, porque nenhum comportamento repetido exatamente. Mas, para

    submeter o comportamento a uma anlise

    cientfica-

    isto de modo a ser possvel prediz

    lo e control-lo - preciso dividir o objeto

    de estudo de tal modo que alguma coisa fixa e

    repr6duzvel possa ser conceituada.

    Os

    mtodos da cincia so reservados para eventos

    reproduzveis. Millenson segue, afirmando que pode-se iniciar pela definio de

    um

    conjunto

    algo arbitrrio de comportamentos que preenchem certas restries e condies. Os critrios

    originais para agrupar certas amostras de com-portamento podem estar baseados em pouco

    mais do que a observao superficial de que o conjunto de comportamentos poderia ser

    uma

    classe de algum interesse. A definio de um operante no coloca qualquer restrio sobre

    a amplitude de uma classe de resposta, em termos da quantidade de comportamento abrangida

    por ela. A nica exigncia formal para um operante que ele seja uma classe de comportamento

    suscetvel, como classe, de reforamento.

    Na prtica clnica no existe instrumento pronto que seja suficiente para fornecer

    a unidade

    de anlise

    mais abrangente e relevante com que trabalhar.

    Os

    clnicos bem

    sabem que as queixas no indicam necessariamente que comportamentos devem ser

    alterados. Testes e inventrios

    podem ser

    teis,

    mas

    eles no

    descrevem

    a funo

    de

    um

    operante. O

    DSM

    e o CID

    fornecem

    dicas

    importantes

    sobre que

    aspectos

    podem ser

    investigados, mas

    no

    so os

    instrumentos

    para predio e controle do

    comportamento.

    Da mesma forma, as principais

    crenas

    disfuncionais e/ou estratgias tpicas de cada

    transtorno de personalidade, na terapia cognitiva dos transtornos de personalidade Beck

    8 Freeman, 1993), podem servir de guia aos terapeutas de que dados pesquisar, ao mostrar

    que h formas tpicas de pensamentos correlacionados a transtornos especficos de perso

    nalidade, mas

    tambm no

    fornecem as necessrias unidades de anlise.

    A resposta,

    para

    o analista do

    comportamento

    que a definio

    da

    classe de

    comportamentos com a qual lidar durante a terapia construda durante o prprio processo.

    Isto requer

    tempo

    pois o principal

    instrumento

    para isto a inferncia e verificao

    das

    regularidades que surgem nas relaes entre respostas e o ambiente, o que obtido tanto

    atravs de relatos dos c lientes quanto pela observao direta.

    Isto cria uma situao peculiar. Para identificar a classe de respostas mais

    abrangente e significativa, s vezes necessrio prestar ateno s caractersticas fsicas

    topogrficas) do

    comportamento

    s vezes necessrio identificar funes comuns

    que

    comportamentos aparentemente diferentes possuem, outras vezes a indicao mais forte

    aparece pela regularidade das condies antecedentes, e na maioria das

    vezes

    percorre

    se as vrias

    formas

    de

    tentar definir

    o

    comportamento com

    o qual

    j

    se

    est

    lidando.

    As regras que a anlise do

    comportamento

    oferece

    ao

    terapeuta

    para

    a descrio

    das contingncias em vigor

    so

    insuficientes. A experincia clnica tem sido fundamental,

    indicando

    que em parte este

    um

    comportamento modelado

    por

    contingncias.

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    A questo da identificao e do tamanho da unidade de anlise tem sido lidada de

    maneira explcita ou tem sido ignorada pela literatura. Um exemplo do primeiro caso

    proporcionado por Gonalves (1993), que afirma que a anlise funcional compreende dois

    processos que, embora distintos, so complementares: microanlise e macroanlise. A

    microanlise consistiria no estudo das diversas relaes contingenciais responsveis pela

    manuteno de um determinado problema. Nesta, so analisados os estmulos antecedentes

    as

    respostas e seus consequentes. Ao citar a macroanlise ele afirma que

    a anlise da rvore no nos deve fazer perder de vista a floresta. Muito raramente a

    problemtica do cliente nos aparece circunscrita a um sintoma especfico. Pelo contrrio,

    na maior parte dos casos, assiste-se a uma coerncia histrica e funcional na organizao

    do repertrio comportamental e cognitivo do cliente. O objetivo

    da

    macroanlise funcional

    o

    de proceder a um levantamento ger l dos vrios problem s e da histria das

    aprendizagens do cliente, de modo a possibilitar

    o

    esclarecimento da relao funcional

    entre as vrias reas do seu funcionamento.

    A proposta de macroanlise de Gonalves (1993) mais um indicativo do tipo de

    problemas que temos enfrentado no atendimento clnico, do que uma sugesto operacional

    de como lidar com estes.

    2

    Dificuldade na definio de classes de eventos antecedentes e de eventos

    consequentes.

    So dificuldades semelhantes s da definio de classes de resposta, isto

    tambm podem ser classes cujas caractersticas definidoras sejam funcionais e no

    topogrficas. Alm disto, vrias consequncias podem estar seguindo o comportamento

    analisado, tornando necessrio verificar seus efeitos relativos. Por exemplo, se uma classe

    de respostas por vezes reforada e por vezes punida, que efeitos isto estar produzindo?

    Em momentos como este, dados vindos do laboratrio, tais como efeitos de esquemas

    mltiplos e concorrentes, podem ajudar bastante.

    3. A identificao da classe de estmulos antecedentes, da classe de respostas

    e da classe de estmulos consequentes no abarca todas as informaes

    qu

    necessitamos para entender o caso para predio e controle do

    comportamento

    A histria de vida de um indivduo essencial para a compreenso de seu

    comportamento atual. Um estmulo s discriminativo porque houve uma histria relevante

    de condicionamento. Da mesma forma, apenas alguns estmulos reforadores so

    universais, a maioria adquiriu sua funo por aprendizagem. Apesar dos analistas de

    comportamento fazerem este tipo de afirmao, e lev-las realmente em considerao, a

    especificao dos trs termos da contingncia (antecedentes, resposta e consequncia)

    no inclui espao explcito para o papel desempenhado pela histria de vida.

    Igualmente, o repertrio comportamental do indivduo, as condies sociais e

    econmicas em que este vive certamente tambm so relevantes, so levadas em

    considerao pela anlise do comportamento, mas no tem espao de representao no

    modelo da trplice contingncia. A mesma anlise cabe s condies mdicas e fisiolgicas.

    Vrios autores de renome tm tentado prover modelos para especificar e representar

    dados considerados relevantes. J em 1961, Bijou falava em setting events . Jack Michael

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    publicou em 1982 um texto onde introduziu o termo tcnico operao estabelecedora ,

    diferenciando-o da funo discriminativa de estmulos. Em poucas palavras, operao

    estabelecedora qualquer mudana no ambiente que altera a eficcia de algum objeto ou

    evento como reforado r e que simultaneamente altera a frequncia momentnea do compor

    tamento que foi seguido por tal reforamento. Exemplos tpicos so a privao e a saci ao,

    mas existem outras operaes estabelecedoras.

    A expanso do modelo de contingncias de trs termos para o de quatro termos,

    e mesmo para o de cinco termos que vem sendo estudado extensivamente em laboratrio

    com seres humanos, tambm parece indicar que h necessidade de se incluir mais elemen

    tos para se efetuar anlises de comportamentos mais complexos, como os envolvidos em

    linguagem e pensamento.

    Segura, Snchez e Barbado publicaram em 1991 o livro Anlss Funcional de la

    Conducta: un modelo explicativo no qual, atravs de ampla fundamentao, combinaram

    os conceitos de Skinner e de Kantor, propondo um modelo bastante complexo e completo

    de anlise a ser conduzido na prtica clnica. Explicitaram um segmento anterior anlise

    funcional que deveria englobar variveis disposicionais do ambiente e do indivduo, que

    sem serem funcionais, afetam a interao. Seriam condies do organismo e do ambiente

    que afetam , tornam mais provvel ou dispem a favor ou contra a ocorrncia da interao.

    As variveis disposicionais do ambiente segundo elas, incluem o meio de contato, o

    contexto prximo, o contexto amplo e os valores sociais. As variveis disposicionais do

    indivduo incluem a histria de condicionamento, a privao e saciao, condies do

    organismo (sistemas de contato, momento evolutivo/involutivo, alteraes funcionais ou

    estruturais) e a Histria lntercondutual que abarca as habilidades bsicas, a taxa de esti

    mulao reforadora, as funes de reforo prioritrias, e a aparncia fsica.

    Cada um destes termos est explicado e exemplificado no livro, mas no h

    espao suficiente para reproduzi-los aqui. A grande vantagem deste trabalho foi o de

    evidenciar a importncia de uma maior quantidade de informaes, que ultrapassa a

    descrio dos trs termos da contingncia para a previso e controle do comportament9.

    Mas um modelo difcil de ser aplicado e que utiliza alguns conceitos controversos.

    E

    entretanto, um bom pontode partida para estudar a maneira de enfrentar o desafio de lidar

    com a difcil tarefa de conduzir Anlises Funcionais dos casos atendidos em consultrio.

    importante ressaltar que as dificuldades apontadas se referem somente

    organizao d multiplicidade de dados que fazem parte das relaes funcionais. No

    so dificuldades com a base terica do behaviorismo, fornecida por Skinner.

    ibliografia

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    Primeiros Passos: Aprenda o Bsico durante o IV Encontro Brasileiro de Terapia e

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    Snia Beatriz eyer