análise físico-química e microbiológica de poços ... · preservadas, segundo metodologias...

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Análise físico-química e microbiológica de poços subterrâneos em comunidades rurais bragantina Physical, chemical and microbiological analysis of underground wells in rural bragantinian communities Sabrina Miranda Costa Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Bragança - [email protected]; Wellington Nascimento trindade Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Bragança [email protected]; Marcela Cunha Monteiro Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus d Bragança – [email protected] Danielly de Oliveira Guimarães Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Bragança - [email protected] Luci Cajueiro Carneiro Pereira Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Braganç[email protected]; 1. INTRODUÇÃO Nas últimas décadas, os tipos inadequados de uso dos recursos hídricos e/ou do solo, e a ocupação territorial desordenada vêm comprometendo a qualidade das águas superficiais e subterrâneas em todo mundo (Chaves & Alipaz, 2007). As águas superficiais raramente encontram-se livres de contaminação, mesmo nas bacias hidrográficas com pouca ou nenhuma intervenção humana (Azevedo, 2006), por outro lado, a utilização dos recursos hídricos subterrâneos, nos mais diversos tipos de usos, vem crescendo significativamente nos últimos anos, por apresentar, na maioria das vezes, excelente qualidade de água e menor custo; ser menos susceptível à contaminação; não estar sujeita à evaporação direta; fornecer demanda sustentável em períodos de estiagem; e apresentar baixo custo para captação (Nascimento & Barbosa, 2005; Azevedo, 2006; etc.). Os aqüíferos subterrâneos abastece 19% dos domicílios brasileiros, estando 68,78% localizados na área rural. Na região Norte, a água subterrânea é caracterizada por possuir uma situação hidrogeológica favorável, devido à presença (na maior parte de seu território) de depósitos sedimentares de litologia variável, com ocorrência de horizontes de elevada permeabilidade e com freqüentes condições de artesianismo. Nesta região, a água subterrânea é quase totalmente utilizada para o abastecimento humano, possuindo no estado do Pará o maior número de locais (~79,4%) com abastecimento público. Nas comunidades rurais do município de Bragança, situada na zona costeira do nordeste paraense, os poços de abastecimento público não superam os 30 metros de profundidade, e estão sujeitos à contaminação em decorrência das ocupações desordenadas que podem contribuir com a perda de qualidade dos recursos hídricos lá existentes, resultantes de atividades humanas e.g. despejos domésticos, presença de agrotóxico, criação de animais, entre outros. O objetivo deste trabalho foi verificar o uso e avaliar a qualidade da água subterrânea (valores de turbidez, cor real, cor aparente, ferro dissolvido, pH, salinidade, temperatura, demanda bioquímica de oxigênio, coliformes totais e fecais) utilizada para consumo humano, em sete comunidades rurais da região bragantina, tomando como referência as Resoluções CONAMA 20/1986, 274/2000, 357/2005 para águas de classe 1 e ANVISA-Portaria no. 518/2004. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Área de Estudo Inserido no nordeste paraense, o município de Bragança é caracterizado por possuir uma elevada densidade demográfica, apresentando uma área de 2.090 km 2 e uma população de 102.232 habitantes, sendo limitada ao norte com o oceano Atlântico, ao Sul com o município de Santa Luzia do Pará e Viseu, ao leste com o município de Augusto Côrrea e Viseu, e ao Oeste com o município de Tracuateua (Instituto de Desenvolvimento Econômico-Social do Pará, 1990). A população rural bragantina é formada, principalmente, por pescadores e/ou agricultores com baixo poder aquisitivo que sobrevive dos recursos do mangue ou da agricultura familiar. Esta área carece de serviços e infra-estruturas básicas e.g. saneamento básico, água potável, escolas e melhor acesso (Krause et al., 2000).

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Page 1: Análise físico-química e microbiológica de poços ... · preservadas, segundo metodologias sugeridas pelo Guia de Coleta e Preservação de Amostras de água (CETESB,1988) e transportadas

Análise físico-química e microbiológica de poços subterrâneos em comunidades rurais bragantina

Physical, chemical and microbiological analysis of underground wells in rural bragantinian communities

Sabrina Miranda Costa Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Bragança - [email protected];

Wellington Nascimento trindade Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Bragança [email protected];

Marcela Cunha Monteiro Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus d Bragança – [email protected]

Danielly de Oliveira Guimarães Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Bragança - [email protected]

Luci Cajueiro Carneiro Pereira Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina-UFPA, Campus de Braganç[email protected];

1. INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, os tipos inadequados de uso dos recursos hídricos e/ou do solo, e a ocupação territorial desordenada vêm comprometendo a qualidade das águas superficiais e subterrâneas em todo mundo (Chaves & Alipaz, 2007). As águas superficiais raramente encontram-se livres de contaminação, mesmo nas bacias hidrográficas com pouca ou nenhuma intervenção humana (Azevedo, 2006), por outro lado, a utilização dos recursos hídricos subterrâneos, nos mais diversos tipos de usos, vem crescendo significativamente nos últimos anos, por apresentar, na maioria das vezes, excelente qualidade de água e menor custo; ser menos susceptível à contaminação; não estar sujeita à evaporação direta; fornecer demanda sustentável em períodos de estiagem; e apresentar baixo custo para captação (Nascimento & Barbosa, 2005; Azevedo, 2006; etc.).

Os aqüíferos subterrâneos abastece 19% dos domicílios brasileiros, estando 68,78% localizados na área rural. Na região Norte, a água subterrânea é caracterizada por possuir uma situação hidrogeológica favorável, devido à presença (na maior parte de seu território) de depósitos sedimentares de litologia variável, com ocorrência de horizontes de elevada permeabilidade e com freqüentes condições de artesianismo. Nesta região, a água subterrânea é quase totalmente utilizada para o abastecimento humano, possuindo no estado do Pará o maior número de locais (~79,4%) com abastecimento público.

Nas comunidades rurais do município de Bragança, situada na zona costeira do nordeste paraense, os poços de abastecimento público não superam os 30 metros de profundidade, e estão sujeitos à contaminação em decorrência das ocupações desordenadas que podem contribuir com a perda de qualidade dos recursos hídricos lá existentes, resultantes de atividades humanas e.g. despejos domésticos, presença de agrotóxico, criação de animais, entre outros.

O objetivo deste trabalho foi verificar o uso e avaliar a qualidade da água subterrânea (valores de turbidez, cor real, cor aparente, ferro dissolvido, pH, salinidade, temperatura, demanda bioquímica de oxigênio, coliformes totais e fecais) utilizada para consumo humano, em sete comunidades rurais da região bragantina, tomando como referência as Resoluções CONAMA 20/1986, 274/2000, 357/2005 para águas de classe 1 e ANVISA-Portaria no. 518/2004. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Área de Estudo

Inserido no nordeste paraense, o município de Bragança é caracterizado por possuir uma elevada densidade demográfica, apresentando uma área de 2.090 km2 e uma população de 102.232 habitantes, sendo limitada ao norte com o oceano Atlântico, ao Sul com o município de Santa Luzia do Pará e Viseu, ao leste com o município de Augusto Côrrea e Viseu, e ao Oeste com o município de Tracuateua (Instituto de Desenvolvimento Econômico-Social do Pará, 1990).

A população rural bragantina é formada, principalmente, por pescadores e/ou agricultores com baixo poder aquisitivo que sobrevive dos recursos do mangue ou da agricultura familiar. Esta área carece de serviços e infra-estruturas básicas e.g. saneamento básico, água potável, escolas e melhor acesso (Krause et

al., 2000).

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2.2 Metodologia Este estudo foi realizado no período seco (dezembro de 2006) e no período chuvoso (março/abril de

2007), em sete comunidades rurais bragantinas: Vila Quiera, Sítio Grande, Camutá, Arimbú, Tamatateua, Caratateua e Acarajó, na qual foram estudados onze poços subterrâneos.

As amostras para as análises físico-químicas e microbiológicas da água foram coletadas e preservadas, segundo metodologias sugeridas pelo Guia de Coleta e Preservação de Amostras de água (CETESB,1988) e transportadas até o Laboratório de Oceanografia Costeira e Estuarina, do Campus Universitário de Bragança, UFPA onde foram examinadas. A turbidez foi obtida pelo Microprocessor Turbidity Meter HI 93703 Hanna Instrument, a cor real e aparente foi analisada pelo equipamento Color of water HI 93727 Hannna Instrument, o ferro dissolvido pelo Hardness & Iron HI 93741 Hanna Instrument, o pH pelo Labmeter model pH2 – pHs-3B, a salinidade pelo Multianalizador Corning Checkmate II, a temperatura pelo Termômetro Incoterm L-168/04, os coliformes fecais e totais a partir da técnica denominada de tubos múltiplos. A Demanda Bioquímica de Oxigênio foi analisada segundo o método adotado por Winkler, descrito por Strickland & Parsons (1968). Para a classificação da qualidade da água, foram utilizados os parâmetros estabelecidos por resoluções específicas do ANVISA (2004) e CONAMA (1986; 2000; 2005). 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em bacias hidrográficas, ocupações desordenadas podem contribuir com a perda de qualidade dos recursos hídricos lá existentes em decorrência das atividades humanas, resultantes de despejos domésticos, presença de agrotóxico, criação de animais, entre outros (Azevedo, 2006).

Com relação aos valores de turbidez foi observado que os valores foram, em geral, mais elevados no período seco, sendo os poços P07 (Tamatateua), P08 (Caratateua) e P11 (Acarajó) os mais turvos, apresentando valores acima do permitido (5 uT). Os maiores valores de cor real foram observados nos poços P06 (Tamatateua), P07 (Tamatateua), P10 (Acarajó) e P11 (Acarajó), durante o período seco. Por outro lado, os poços que apresentaram os maiores valores de cor aparente foram P01 (Vila Quiera), P02 (Vila Quiera), P04 (Camutá), P6 (Tamatateua), P07 (Tamatateua), P10 (Acarajó) e P11 (Acarajó), também durante o período seco. O ferro dissolvido, no geral, esteve dentro das concentrações permitidas (0,3 mg/L), exceto no P07 (Tamatateua), no período chuvoso.

Segundo Nascimento & Barbosa (2005), os valores inadequados da cor real e aparente pode ocorrer em conseqüência do aumento da turbidez e da concentração de ferro dissolvido, entretanto na área estudada estes valores inadequados de cor estiveram mais relacionados à turbidez. A elevada turbidez dos poços de Tamatateua, Caratateua e Acarajó podem estar relacionados aos materiais particulados de argila e silte, embora nenhuma análise granulométrica tenha sido realizada.

A temperatura variou de 26 a 29,5°C e a salinidade foi zero em todas as amostras analisadas. Estando estas duas variáveis dentro dos padrões estabelecidos para água potável. Os valores de pH, em todas as amostras analisadas, encontram-se ácidos, variando entre 4,20 no P11 (Acarajó) e 5,88 no P05 (Arimbú). Estes valores estão fora dos padrões estabelecidos pela Resolução CONAMA no. 20/86 e no. 257/2005, no qual os valores ideais devem estar entre 6 e 9. A presença de solos ácidos, em decorrência da concentração de matéria orgânica em decomposição existente nestes locais, pode ser um dos principais fatores que influenciam diretamente o pH das amostras analisadas. Os valores referentes à Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) encontram-se fora dos padrões estabelecidos, no único poço analisado. Este fato ocorre porque este poço é aberto, fato que aumenta o risco de contaminação orgânica. Das 22 amostras de águas analisadas, a presença de coliformes totais e fecais ocorreu acima do preconizado em mais de 50% dos poços P02 (Vila Quiera), P03 (Sítio Grande), P04 (Camutá), P05 (Arimbú), P07 (Tamatateua), P10 (Acarajó) e P11 (Acarajó). Tais resultados podem ser atribuídos à presença de fossas negras, fossas sépticas, chiqueiros, galinheiros e lixo depositado próximo a estes poços (5 a 30 m de distância dos mesmos), bem como a baixa profundidade dos mesmos. Nos poços P02, P03 e P04 os riscos de contaminação aumentam, em conseqüência dos mesmos serem livres e rasos. A contaminação fecal da água em poços rasos é bastante alta, quando comparada com os poços mais profundos.

4. CONCLUSÃO

O pH foi a variável que apresentou todos os valores fora dos estabelecidos pela legislação. Entre os períodos de coleta, a cor real, a cor aparente e a turbidez apresentaram-se imprópria, em alguns poços, principalmente, no período seco. Neste período, valores de DBO, turbidez, coliformes totais e fecais também encontraram-se, em alguns poços, acima dos valores permitidos. Já no período chuvoso, a água apresentou-

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se imprópria, em decorrência do pH (todos os poços), do ferro dissolvido (P07), dos coliformes totais e fecais (em alguns poços). Entre todas as comunidades, Tamatateua apresentou as piores qualidades da água, seguida por Acarajó. Caratateua, com exceção do pH, mostrou os melhores resultados. Com relação aos índices de coliformes fecais, todos os poços livres estão contaminados, e em geral, os tubulares mais rasos também estão. Os resultados obtidos pelo presente mostraram que as águas analisadas não são potáveis e, portanto são impróprias para o consumo humano. Por fim, recomenda-se que a Prefeitura construa poços, entre 40 e 50 m de profundidade, em locais adequados que garantam o abastecimento e a boa qualidade da água. Deve ser evitado qualquer tipo de atividade/construção humana a menos de 50 m de distância do poço construído. Agentes de saúde devem mostrar a importância do bom manuseio e higiene, dos reservatórios de água, para evitar possíveis contaminações. 5. REFERÊNCIAS BILBLIOGRÁFICAS AZEVEDO R. P. 2006. Uso de água subterrânea em sistema de abastecimento público de comunidades na várzea da Amazônia Central. Acta Amazônica,v.36, n.3, p. 313-320. BRASIL. Agência Nacional da Vigilância sanitária. Anvisa. Portaria nº518,de 25 de Março de 2004.São Paulo,2004.Disponível em.<http://e-mail.legis.bvs.br/leisref/public/showAct.php>.Acesso em 05 Maio 2007. BRASIL. Conselho Nacional de Meio Ambiente-CONAMA. Resolução nº274 de 29 de Novembro de 2000. Disponível em:http://mma.gov.br.Acesso em: 05 Maio 2007. BRASIL. Conselho Nacional de Meio Ambiente-CONAMA. Resolução nº357 de 17 de Março de 2005. http://mma.gov.br.Acesso em: 05 Maio 2007. BRASIL. Conselho Nacional de Meio Ambiente-CONAMA.Resolução nº20 de Junho de 1986.Disponível em:http://mma.gov.br.Acesso em: 05 Maio 2007. CETESB. Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental. 1987. Guia de coleta e preservação de amostras de água. São Paulo: CETESB, 150pp. CHAVES, H.M.L; ALIPAZ, S. 2007. Na Integrated Indicator Based on Basin Hydrology, Environment, life, and Policy: The Watershed Sustainability Index. Water Management, v.21, p.883-895. INSTITUTO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO-SOCIAL DO PARÁ. 1990. Município de Bragança. Municípios Paraenses. Belém, 4p (Separata). KRAUSE, G.; GLASER, M.; SOARES, C.; TORRES, D.; BLANDTT, L.; CUNHA, F.D. 2000. Coastal Dynamics and Socio-Economic Implications. In: Proceedings of the German-Brazilian Workshop on Neotropical Ecosystems, p. 997-1000. NASCIMENTO, S. A. M.; BARBOSA, J. O. S. F. 2005. Qualidade da água do aquífero freático no Alto Cristalino de Salvador,Bacia do Rio Lucaia, Salvador,Bahia. Revista Brasileira de Geociências, v. 35, n. 4, p. 543-550. STRICKLAND, J. D. H.; PARSONS, T. R. A., 1968. The Practical Handbook of Seawater Analysis. Bulletin Fisheries Research Board of Canada, Ottawa, v. 167, p. 1-311. Agradecimentos: Projetos CT-Agro (Proc. # 552760/2005-6) e Universal (Proc. # 471985/2004-0), financiados pelo CNPq.