análise do livro de josé de alencar- lucíola
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1ANÁLISE SOBRE O LIVRO “LUCÍOLA” DE JOSÉ DE ALENCAR
Frederico Dias Freire * Marina Rodrigues de Oliveira*
Paulo Henrique Vieira do Nascimento*Shirley Carvalho*
Sebastião Alves de Franca*
Escrito pelo jornalista, poeta, dramaturgo e romancista José de Alencar, nascido em
Fortaleza, primeiro de maio de 1829, o livro Lucíola é a primeira obra de uma trilogia que o
próprio escritor denominou de "perfis de mulheres", da citada coleção fazem parte também as
obras Diva e Senhora. José de Alencar foi um autor cujo seu trabalho pertenceu a ambas
gerações do Romantismo no Brasil, tendo dessa forma, devido à versatilidade de sua obra,
características que dificultam enquadrá-lo unicamente nas concepções de um específico
período da literatura, isto porque suas obras possuem tanto as características do Romantismo
da primeira geração, retratado por romances indianistas como O guarani, Iracema e
Ubirajara, como o da prosa histórica, regionalista e dramatúrgica, além de poemas ultra-
românticos, da segunda geração, e romances urbanos. Lucíola pertence ao rol dos romances
urbanos do autor, terceira geração, onde se faz presente o ambiente do Rio de Janeiro como
pano de fundo para o desenrolar das narrativas. A obra trata-se de uma narrativa em primeira
pessoa, onde o personagem principal Paulo, o narrador, relata os problemas enfrentados na
busca pelo desfrute de um amor conflituoso por uma cortesã, chamada Maria da Glória, mas
apelidada de Lúcia.
O romance é contado através de cartas envidadas pelo personagem Paulo, narrador, a
uma senhora, G. M. (pseudônimo de Alencar), que as publica em livro com o título de
Lucíola. O título da obra, por si só, é bem tendencioso e expõe parte da trama que será
abordada na narrativa. Lucíola é o nome dado a insetos que se reservam durante o dia, mas
que saem durante a noite, ou seja, são seres que desenvolvem suas atividades no período da
noite. Na trama, Paulo, rapaz recém formado vindo do interior, viaja para o Rio de Janeiro a
fim de conhecer a corte e a vida na capital do Império. Ao chegar, é recebido por Dr. Sá, um
colega e amigo de infância, ao passear pela grande capital, Paulo avista uma belíssima moça
que se encontrava dentro de um carro, passado alguns dias, ele reencontra-a em uma festa
popular da corte, porém não a reconhece. Após deferir elogios sobre a sua beleza e elegância,
1***** Acadêmicos do 5° período noturno do curso de Letras, do Instituto Superior de Educação da Faculdade Alfredo Nasser, no semestre letivo 2013/1.
Sá, seu amigo, conta para ele que a moça, chamada Lúcia, trata-se da cortesã mais disputada
da cidade.
Passados alguns dias, Paulo não resiste à tentação e procura Lúcia, possuindo-a e
dando início a uma conturbada relação, pois não tinha a intenção de se envolver com uma
prostituta. Porém, o mesmo nota certa pureza de caráter na moça, percebe que o pagamento
pelos programas gera desconforto em Lúcia. Paulo estava dividido e confuso, não sabia se
acreditava na moça ingênua e sincera que Lúcia demonstrava ser no seu trato mais íntimo, ou
se estava deixando-se enganar por uma audaciosa prostituta. Pouco tempo depois ele tem uma
triste surpresa, na casa de Sá. Seu amigo convidou-o para uma reunião entre amigos, uma
espécie de festa privada para adultos. Lá Lúcia revelou veementemente o seu lado cortesã.
Despiu-se em frente todos e imitou imagens eróticas presentes nos quadros gregos de Sá.
Paulo, a princípio, decepcionou-se, porém, depois de Lúcia procurá-lo e se explicar, os dois
terminaram a noite juntos. Com o passar dos dias, começam a viver juntos, Paulo, apesar de
amá-la, sente mais forte o laço do desejo carnal pela meretriz, a sua incompreensão e o seu
egoísmo geram atritos entre os dois.
Com o passar do tempo, o relacionamento caiu nas más línguas da alta sociedade,
muitos diziam que Lúcia sustentava Paulo, fato que o irritava bastante. Lúcia voltou a ser
acompanhante, porém não se entregava carnalmente aos clientes, começava a adoecer,
chegando posteriormente a se negar entregar para Paulo também. Apesar de Paulo não gostar
desse fato, compreende a amada e mostra assim a evolução de seu sentimento. Lúcia revela
seu passado, fala sobre sua feliz infância até os catorze anos. Relata que sua família foi
atingida por um surto de febre amarela que a fez buscar ajuda junto a um vizinho rico, que a
ajudou em troca de sua inocência. Salvou sua família, porém se perdeu. Antes se chamava
Maria da Glória, depois que seu pai descobriu a origem do dinheiro, expulsando-a de casa, se
entregou a prostituição, e agora era chamada de Lúcia. Com a morte de seus pais, Lúcia passa
a cuidar da irmã caçula. Paulo se comove com a história, e passa a admirá-la ainda mais.
Lúcia e a irmã mudam-se para uma casa humilde. Ela engravida de Paulo, porém sua doença
se desenvolve. O feto morre dentro dela, no entanto ela se nega a retirá-lo, fato que a faz
morrer nos braços de Paulo.
Analisando a obra, verificam-se contraposições aos moldes de enredos da época, isto
é, Lucíola não segue o mesmo raciocínio das obras românticas. O primeiro fato deve-se a
heroina da obra, que, a princípio, não possui as características idealizadas encontradas como
em outros autores. Em Lucíola, a heroína é uma prostituta. O que se percebe tanto nas obras
indianistas como ultra-românicas é totalmente contrastante quando o foco é Lucíola, isto é,
nessas vertentes a figura feminina sempre se mostra de maneira idealizada, sinônimo de
pureza, de graciosidade, sendo inadmissível retratá-la como um ser lascivo, voltado para
questões meramente carnais. Outra característica excêntrica se deve as duras críticas voltadas
para a sociedade da época, fato que não coaduna com a proposta de literatura de puro
entretenimento. Essa marca já evidencia na obra aproximações com o Realismo, a próxima
escola literária.
Ao tratar da prostituição, José de Alencar sofreu duras críticas desferidas pela crítica
literária da época, pois apesar da prostituição ser um problema conhecido por todos, era
preferível ignorá-lo, fingir que não existia. O autor foi audacioso em tratar do tema de forma
clara e utilizando se de um português não clássico, fato que também não era do costume. Em
suma, o romance é uma obra de dicotomia, de um amor que não resiste a barreiras sociais e
morais, de oposição e superação entre o amor carnal e o amor espiritual, como pode ser
evidenciado no seguinte trecho:
Retirei vivamente o braço; enquanto Lúcia sentava-se trêmula, afastei-me revoltado contra mim, e ao mesmo tempo indignado contra essa mulher que zombava da minha credulidade, e contra Sá que me iludira. Não sabia o que pensar; para fugir a uma posição que me incomodava horrivelmente, fui debruçar-me na janela. (ALENCAR, José de. p.12)
No trecho, percebe-se o conflito interior de Paulo em relação à Lúcia. Encontrava-se
confuso, sem compreender como uma prostituta poderia se portar de maneira tão afável e, ao
mesmo tempo, ter uma péssima reputação? Como lhe foi passada pelo seu amigo Sá.
Resguardava medo de estar sendo zombado pela cortesã.
Porém, nesse momento, é perceptível que o que o mantém empenhado em continuar
ali é o seu intenso desejo pela cortesã, a obra é narrada em primeira pessoa, Paulo é um
narrador personagem, logo o discurso tenderá a encobrir certas atitudes. É claro que a
reputação naquele momento da história, século XIX, se tratava de algo para ser zelada, mas é
notório que Paulo não estava tão preocupado com isso, o desejo falou mais alto naquele
momento. A obra vai retratar subjetivamente dos anseios de Paulo, tudo vai girar em torno do
que ele pensa, almeja, sente. O individualismo, característica romântica, é latente, Paulo
ignora o que seu amigo pensa da cortesã, ignora as conveniências impostas pela sociedade
para desfrutar de algo que é bom para ele.
Apesar de Lúcia não se tratar de uma típica heroina das obras românticas, deve-se
atentar para o fato que o autor não entrega tal mulher idealizada a priori, porém se percebe, ao
longo do livro, que Lúcia se transforma. De uma mulher fatal, decidida e imponente, ela se
torna doce, angelical e insegura. Essas facetas são expressas inclusive pelos nomes adotados
pela personagem. Enquanto Lúcia representa a mulher sensual, perigosa e cheia de
artimanhas, Maria da Glória é a mulher sensível, frágil, correspondendo com as acepções
típicas do romantismo.
Percebe-se ainda uma vasta e minuciosa preocupação com a descrição dos ambientes,
dos detalhes femininos de Lúcia, essa característica é própria de José de Alencar. No trecho a
seguir é explicitado tal marca do autor.
O rosto cândido e diáfano, que tanto me impressionou à doce claridade da lua, se transformara completamente: tinha agora uns toques ardentes e um fulgor estranho que o iluminava. Os lábios finos e delicados pareciam túmidos dos desejos que incubavam. Havia um abismo de sensualidade nas asas transparentes das narinas que tremiam com o anélito do respiro curto e sibilante, e também nos fogos surdos que incendiavam a pupila negra. (ALENCAR, José de. p.13)
Na obra, o poeta usa a descrição a favor da sensualidade, sua riqueza de detalhes
conduz o leitor direto a uma atmosfera que beira o erotismo, em contrapartida, esse clima
lascivo sempre comina em ardor e sofrimento, como se mostra no trecho abaixo.
Fora delírio, convulsão de prazer tão viva que, através do imenso deleite, traspassava-me uma sensação dolorosa, como se eu me revolvera no meio de um sono opiado, sobre um leito de espinhos. É que as carícias de Lúcia vinham impregnadas de uma irritabilidade que cauterizava. (ALENCAR, José de. p.13)
Evidencia-se também, como marca do Romantismo, o sentimentalismo melancólico. A
obra é farta de momentos que submetem o leitor a situações de extrema tristeza e melancolia.
Traço pertencente à geração ultra-romântica, marcada pelo pessimismo.
— É verdade! Foi um ano terrível. Meu pai, minha mãe, meus manos, todos caíram doentes: só havia em pé minha tia e eu. Uma vizinha que viera acudir-nos, adoecera à noite e não amanheceu. Ninguém mais se animou a fazer-nos companhia. Estávamos na penúria; algum dinheiro que nos tinham emprestado mal chegara para a botica. O médico, que nos fazia a esmola de tratar, dera uma queda de cavalo e estava mal. Para cúmulo de desespero, minha tia uma manhã não se pôde erguer da cama; estava também com a febre. Fiquei só! Uma menina de 14 anos para tratar de seis doentes graves, e achar recursos onde os não havia. Não sei como não enlouqueci. (ALENCAR, José de. p.96)
Aproveitado o mesmo momento na obra, ou seja, a doença que tomou conta da família
de Lúcia, ainda Maria da Glória, é interessante mostrar um traço característico do Realismo
que fica evidenciado no trecho abaixo, onde o personagem Couto se dispõe a ajudar a pobre
menina, porém não de graça. Em troca rouba sua pureza, sua ingenuidade, outra característica
do ultra-romantismo. Pois os poetas ultra-românticos somente acreditavam na pureza da alma
no período da infância, momento esse onde o ser humano ainda não se encontrava corrompido
pelo mundo.
— Ele tirou do bolso algumas moedas de ouro, sobre as quais me precipitei, pedindo-lhe de joelhos que mas desse para salvar minha mãe; mas senti os seus lábios que me tocavam, e fugi. Oh! Não posso contar-lhe que luta foi a minha: três vezes corri espavorida até à casa, e diante daquela agonia sentia renascer a coragem,
e voltava. Não sabia o que queria esse homem; ignorava então o que é a honra e a virtude da mulher; o que se revoltava em mim era o pudor ofendido. Desde que os meus véus se despedaçaram, cuidei que morria; não senti nada mais, nada, senão o contato frio das moedas de ouro que eu cerrava na minha mão crispado. O meu pensamento estava junto do leito de dor, onde gemia tudo o que eu amava neste mundo. (ALENCAR, José de. p.97)
Como já mencionado no presente trabalho, essa linha de trabalho de José de Alencar,
onde a crítica à sociedade moderna ganha destaque, se aproxima da proposta dos poetas
Realistas, porém, nesse momento são designadas com a nomenclatura de romances urbanos.
Nesses poemas a sociedade urbana da cidade do Rio de Janeiro é descrita de forma nua e crua,
ou seja, seu exacerbado culto ao status social e o poder aquisitivo possibilitado pelo dinheiro.
O próprio enredo da obra, no que se refere à vida noturna de glamour em que uma cortesã é
mantida pelos homens ricos da burguesia, enquanto é menosprezada durante o dia, trata-se de
uma alusão a hipocrisia da sociedade da época.
Esse falso moralismo toma conta até mesmo de Paulo e Lúcia, principalmente de
Lúcia, que evidentemente não se aceita, não se achava digna de ser vista com Paulo, no trecho
a seguir fica clara tal receio.
Apesar de minhas instâncias, Lúcia recusava ir ao teatro, sair a passeio, ou gozar de algum dos poucos divertimentos que lhe oferecia esta insípida cidade.
— Não sei quanto tempo durará a minha felicidade; e não quero desperdiçá-la.
— Eu te acompanharei!
— Nem eu devo aceitar esse sacrifício que o comprometeria; nem que o aceitasse, me podia divertir. Não estaríamos sós! (ALENCAR, José de. p.48)
Paulo também possuía uma significativa parcela de moralismo, só que esse sentimento
se desenvolvera de forma diferente no moço. Embora instruído, o mesmo não era rico, ao
contrário dos vários possuidores de Lúcia. Isso mexia com o rapaz, fazia com que se
considerasse impotente. Logo a notícia de que tinha um caso com a cortesã ganhou proporção,
chegando ao ponto das pessoas considerarem que Paulo era sustentado por Lúcia, o que gerou
uma forte indignação do mesmo, a seguir segue o trecho onde seu amigo Sá o alerta sobre
essa situação.
— Mas tens reputação a ganhar. És amante de Lúcia, há um mês; e eu te conheço, sei que estás te sacrificando. Entretanto, como Lúcia não aparece mais no teatro, não roda no carro mais rico, e já não esmaga as outras com o seu luxo; como a Rua do Ouvidor não lhe envia diariamente o vestido de melhor gosto, a jóia mais custosa, e as últimas novidades da moda; sabes o que se pensa e o que se diz? Que estás sacrificando Lúcia... que estás vivendo à sua custa! (ALENCAR, José de. p.50)
O jovem tenta por um fim na relação, porém não consegue, é o marco na obra entre a
transição entre o amor carnal e o amor espiritual. Mesmo depois de todas as ofensas e
grosserias de Paulo, Lúcia se mostra devota, serena, disposta a deixar tudo pelo sincero amor,
como se pode notar no fragmento "Que miserável animalidade havia em mim naquela noite!
Quando essa pobre mulher atingia o sublime do heroísmo e da abnegação, eu descia até a
estupidez e à brutalidade!". A partir desse momento a obra começa a tomar os rumos que são
comumente esperados em uma narrativa nos moldes românticos.
Lúcia se transfigura, deixa a vida de luxúria e passa a se redescobrir, gradativamente
sua impetuosidade carnal cede lugar a essência ingênua e juvenil vivida em sua adolescência.
Logo a figura de Lúcia dá lugar a Maria da Glória, e assim, o amor se afirma como
instrumento de purificação, é a idealização desse tão complexo sentimento."— O amor
purifica e dá sempre um novo encanto ao prazer. Há mulheres que amam toda a vida; e o seu
coração, em vez de gastar-se e envelhecer, remoça como a natureza quando volta a
primavera." (ALENCAR, José de. p.70)
Até mesmo a Paulo, Lúcia negava-se entregar, não se tratava de apatia ou falta de
sentimento, mas sim de uma evolução, a carne gradativamente cedia lugar para o espírito. O
fragmento abaixo mostra o estranhamento de Paulo quanto a essa mudança.
A minha Lúcia dos bons dias, que aveludava-se no estreito enlace com que me cerrava ao seio, que diluía-se de gozo engolfando-me num mar de voluptuosidades, que aspirava-me a vida num beijo para vazá-la de novo e gota a gota: essa, eu só revia nas minhas doces recordações; porque a realidade fugia-me, quando a buscava com desespero. (ALENCAR, José de. p.68)
Na obra, pode-se encontrar também intertextualidade em relação à obra A dama das
Camélias, um famoso romance passional escrito por Alexandre Dumas Filho. A narrativa se
aproxima muito à encontrada em Lucíola, pois ambos tratam do mesmo tema: a prostituição.
Nas duas obras percebem-se as artimanhas de prostitutas de luxo em uma sociedade burguesa
hipócrita. Em ambas adota-se como cenário as grandes capitais, na primeira Paris, e na
segunda o Rio de Janeiro. Os enredos se aproximam quanto à crítica moral, porém, enquanto
em Lucíola, a mensagem central a ser passada é a ideia de purificação por meio do amor
espiritual. Em A dama das Camélias, o amor não assume tão importante papel, nele o mito
central se reserva ao reconhecimento, isto é, a personagem central, Marguerite, ama com o
intuito de ser reconhecida. A seguir pode-se perceber, no trecho exposto, a menção a obra de
Alexandre.
Meio à força e meio rindo consegui tomar o livro depois de uma fraca resistência. Ela ficou enfadada. Era um livro muito conhecido — A Dama das Camélias. Ergui os olhos para Lúcia interrogando a expressão de seu rosto. Muitas vezes lê-se não por hábito e distração, mas pela influência de uma simpatia moral que nos faz procurar um confidente de nossos sentimentos, até nas páginas mudas de um escritor. Lúcia teria, como Margarida, a aspiração vaga para o amor? Sonharia com as afeições puras do coração? (ALENCAR, José de. p.70)
Já foi citada a exaltação da infância como característica ultra-romântica, porém, no
trecho a seguir, é interessante notar o sentimento de saudosismo e nostalgia ligados as
lembranças dessa época. Além do papel da natureza nesse contexto, não só como pano de
fundo, moldura, mas como ingrediente imprescindível para o todo, ou seja, a bela memória.
Ela me contara vagamente, sem indicação de datas nem de localidades, as impressões de sua infância passada no campo entre as árvores e à borda do mar; seu espírito adejava com prazer sobre essas reminiscências embalsamadas com os agrestes perfumes da mata, e por vezes a poesia da natureza fluía no seu ingênuo entusiasmo. (ALENCAR, José de. p.75)
Mesmo com toda mudança de Lúcia, o seu passado lascivo ainda persistia em
incomodá-la, a sociedade ainda a discriminava; para os homens, o passado não pode ser
apagado. Porém para Paulo, ela era agora Maria da Gloria, a mulher amada, o reflexo
feminino idealizado. Lúcia se transformara, porém o corpo continuava o mesmo, somente
através da aniquilação do objeto de pecado, o corpo, é que a redenção atingiria o seu ápice.
Ela morre então, jurando amor a Paulo. Prevalece aqui o mito ultra-romântico da salvação
pela morte.
— Beija-me também, Paulo. Beija-me como beijarás um dia tua noiva! Oh! agora posso te confessar sem receio. Nesta hora não se mente. Eu te amei desde o momento em que te vi! Eu te amei por séculos nestes poucos dias que passamos juntos na terra. Agora que a minha vida se conta por instantes, amo-te em cada momento por uma existência inteira. Amo-te ao mesmo tempo com todas as afeições que se pode ter neste mundo. Vou te amar enfim por toda a eternidade. (ALENCAR, José de. p.113)
Finaliza-se a análise da obra em questão se enaltecendo a beleza e os traços peculiares
do livro. O desfecho da narrativa configura, por si só, a vitória da proposta Romântica sobre a
possibilidade realista. Pois Lúcia não se aceitava, embora sentisse um grande amor por Paulo,
permanecia em confusão existencial. Jamais poderia concretizar a sua felicidade em um
mundo dominado pela ostentação e a luxúria. Segundo o que se proporia futuramente no
Realismo, escola literária que sucederá o Romantismo, Lúcia poderia muito bem viver em
outro lugar, com ou sem Paulo e começar uma nova vida, porém os traços românticos foram
os privilegiados, e para isso, a sua morte foi imprescindível.
REFERÊNCIAS
ALENCAR, José de. Lucíola. 12 ed. São Paulo: Ática, 1998.
COUTINHO, Afrânio. Introdução a Literatura Brasileira. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2001.
Lucíola – José de Alencar.Disponível em:
<http://livroluciola.blogspot.com.br/2007/05/enredo-paulo-em-sua-primeira-noite-no.html>.
Acesso em 05de março de 2013.