análise de pigmentos de pimentões por cromatografia em papel

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  • Anlise de Pigmentos de Pimentes por Cromatografia em PapelQUMICA NOVA NA ESCOLA N 29, AGOSTO 2008

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    ExpErimEntao no Ensino dE Qumica

    Recebido em 6/2/07, aceito em 1/7/08

    Nbia Moura Ribeiro e Carolina Rodeiro Nunes

    Os carotenides so pigmentos naturais que trazem benefcios para a sade por sua atividade antioxidante e anticancergena. A cromatografia em papel utilizada neste trabalho para separar e identificar esses pigmen-tos em extratos de pimentes verdes, amarelos e vermelhos. So apresentadas tambm informaes sobre carotenides, destacando os encontrados nos pimentes.

    cromatografia em papel, pimento, carotenides

    Anlise de Pigmentos de Pimentes por Cromatografia em Papel

    A seo Experimentao no ensino de Qumica descreve experimentos cuja implementao e interpretao contribuem para a construo de conceitos cientficos por parte dos alunos. Os materiais e reagentes usados so facilmente encontrveis, permitindo a realizao dos experimentos em qualquer escola. Neste nmero, a seo apresenta quatro artigos.

    A cromatografia uma tcnica de separao especialmente adequada para ilustrar os conceitos de interaes intermole-culares, polaridade e propriedades de funes orgnicas, com uma abordagem ilustrativa e relevante. Os mtodos cromatogrficos so utiliza-dos para separar misturas contendo duas ou mais substncias ou ons, e baseiam-se na distribuio diferen-cial dessas substncias entre duas fases: uma das quais estacionria e a outra, mvel (Fonseca e Gonal-ves, 2004). Atualmente as diferentes modalidades de cromatografia so responsveis por mais de 70% das anlises em Qumica Analtica (Aqui-no Neto e Nunes, 2003).

    Uma dessas modalidades a cro-matografia em papel (CP). Trata-se de uma tcnica simples para anlise de amostras em pequenas quantidades, aplicada principalmente na separa-o e identificao de compostos polares, tais como acares, anti-

    biticos hidrossolveis, aminocidos, pigmentos e ons metlicos (Aquino Neto e Nunes, 2003). considerada uma tcnica de partio lquido-lqui-do. O papel consiste de celulose (Figura 1) praticamente pura, que pode absorver at 22% de gua. a gua absorvida que funciona como fase estacionria lquida que interage com a fase mvel tambm lquida (Aquino Neto e Nunes, 2003). Os componentes da amostra so separados entre a fase estacionria e a fase mvel em movimento no papel. Os componen-tes que tm capacidade de formar ligaes (ou pontes) de hidrognio migram mais lentamente (Collins e cols., 2006).

    O objetivo deste trabalho utili-zar a cromatografia em papel para separar os pigmentos de pimentes

    verdes, amarelos e vermelhos e, com base no resultado dos cromatogra-mas, nos conceitos de interaes in-termoleculares e nas propriedades de

    funes orgnicas, identificar os pigmen-tos correspondentes s diferentes zonas cromatogrficas.

    O pimento (Cap-sicum annuum L.) uma planta da famlia Solanaceae, cuja cor depende da capa-cidade de sintetizar

    carotenides e de reter pigmentos de clorofilas (Collera-Zuniga e cols., 2005). Os pimentes verdes e ama-relos devem sua colorao princi-palmente presena de carotenos e de carotenides oxigenados, tais como as criptoxantinas (Bianchini e Penteado, 1998). Nos pimentes vermelhos, h tambm carotenides polioxigenados, tais como as cap-santinas e capsorubina (Curl, 1962). So encontrados na natureza vrios derivados da capsantina, sobretudo derivados epoxidados, e os caroteni-des hidroxilados ocorrem na natureza sob a forma de steres (Davies e cols.,

    A cromatografia uma tcnica de separao

    especialmente adequada para ilustrar os

    conceitos de interaes intermoleculares,

    polaridade e propriedades de funes orgnicas.

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    1970). Cabe destacar que o pimento seco e modo utilizado como condi-mento denominado pprica. Silva e colaboradores (2006) empregaram a cromatografia em coluna para isolar os pigmentos do extrato da pprica.

    Os carotenides so pigmentos encontrados na natureza e trazem benefcios para a sade por sua ativi-dade antioxidante e anticancergena. Alguns desses compostos apresen-tam tambm atividade pr-vitamnica A (Bianchini e Penteado, 1998). A maioria deles estvel temperatura ambiente, porm devido ao elevado nmero de ligaes duplas, quando purificados, devem ser mantidos na ausncia de luz e oxignio e em ambiente refrigerado. A colorao dos carotenides varia do amarelo, passando pelo laranja, at o vermelho intenso e resulta da multiplicidade de duplas ligaes conjugadas.

    Os carotenides podem ser clas-sificados de duas maneiras. A pri-meira considera a existncia de duas grandes famlias: os carotenos (carotenides hidrocarbonetos) e as xantofilas (carotenides oxigenados). O segundo sistema divide os carote-nides em trs grupos: acclicos (por exemplo, o licopeno), monocclicos (por exemplo, o gama-caroteno) e bi-cclicos (por exemplo, o alfa-caroteno e o beta-caroteno, Figura 2).

    Procedimento experimental

    Obteno dos extratos

    Pimentes verdes, amarelos e vermelhos (Figura 3, a) foram picados em pedaos pequenos. Foram pesa-dos cerca de 30 g dos pedaos de cada pimento, aos quais foram adi-cionados 10 mL de acetona e 50 mL de hexano (Figura 3, b). As misturas foram maceradas separadamente, em gral de porcelana com pistilo, e dei-xadas em repouso por 1 hora (Figura 3, c). Aps esse perodo, as misturas foram filtradas em funil comum, com papel de filtro pregueado Whatmann n 1 e, em seguida, as fases aquosas dos filtrados foram separadas em funil de separao, resultando cerca de 30 mL de cada uma das fases he-xnicas (Figura 3, d). Sulfato de sdio anidro foi adicionado a essas fases

    Figura 1: Representao de parte da frmula estrutural da celulose, que um polmero de -glicose.

    Figura 2: Representao das frmulas estruturais de alguns carotenides.

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    orgnicas que, aps filtrao, foram concentradas at o volume de 1 mL, com aquecimento em banho-maria mantido a 70 C e sob agitao.

    Aplicao da amostra e preparao da cuba cromatogrfica

    O concentrado resultante de cada extrato foi aplicado em fita de papel preparada com papel de filtro Whatmann n 1, com dimenses de 3,0 por 8,5 cm. Uma gota de cada amostra foi aplicada, com um capi-lar, prxima base do papel (cerca de 1 cm acima da borda), cuidando para que o dimetro da mancha no ultrapassasse 0,5 cm.

    A cuba cromatogrfica foi pre-parada com um recipiente cilndrico de vidro com tampa e contendo um pedao de papel de filtro embebido com fase mvel, deixando a atmosfe-ra interna do recipiente saturada com vapores da fase mvel para facilitar a corrida cromatogrfica (desenvolvi-mento do cromatograma).

    Realizao da cromatografia

    Aps a evaporao do solvente no qual a amostra estava diluda para aplicao, a fita de papel foi posicionada na cuba cromatogrfica de modo que o nvel da fase mvel ficasse abaixo do ponto onde a amos-tra havia sido aplicada. Os extratos aplicados foram eludos com hexano com 5% de acetona (Figura 3, e) e foram obtidos os cromatogramas 1, 2 e 3, mostrados na Figura 4.

    Figura 3: Etapas de obteno dos extratos: a) alguns dos pimentes utilizados; b) pimentes picados e imersos em hexano:acetona 5:1; c) macerao dos pimentes verdes; d) extratos obtidos; e) corrida cromatogrfica.

    Figura 4: Cromatogramas dos extratos de pimentes amarelos (1), verdes (2) e vermelhos (3).

    Resultados e discusso

    A extrao dos pimentes com hexano:acetona 5:1 fornece extratos contendo os principais pigmentos dos pimentes: carotenos, cripto-xantinas, capsantinas e capsorubina (Collera-Zuniga e cols., 2005). Os carotenos, como o beta-caroteno, so hidrocarbonetos apolares, nos quais prevalecem interaes do tipo foras de London (foras de atrao entre dipolos temporrios). Tm pou-ca afinidade com a fase estacionria e maior afinidade com a fase mvel utilizada nesse experimento, conten-do hexano com 5% de acetona. Esses hidrocarbonetos devem, portanto, ser eludos com facilidade pela fase m-vel e so os que, durante a corrida cromatogrfica, mais se distanciam do ponto de aplicao da amostra.

    As criptoxantinas apresentam

    apenas um grupamento hidroxila e tm moderada afinidade com a fase estacionria utilizada nesse experi-mento, j que a hidroxila pode formar ligaes de hidrognio com a gua adsorvida no papel. Assim, as cripto-xantinas e outras xantofilas monooxi-genadas apresentam certa tendncia reteno pela fase estacionria e, durante a corrida cromatogrfica, distanciam-se moderadamente do ponto de aplicao da amostra.

    As capsantinas e a capsorubina so substncias polioxigenadas e, portanto, tm maior afinidade com a fase estacionria da cromatografia em papel. Apresentam maior tendn-cia reteno pela fase estacionria e, durante a corrida cromatogrfica, pouco se distanciam do ponto de aplicao da amostra.

    Em resumo, h trs regies em cada cromatograma dos extratos dos pimentes: a) a dos carotenos; b) a das xantofilas monooxigenadas; c) a das capsantinas e da capsorubina. Alm disso, pode-se perceber que o cromatograma do pimento amarelo (Figura 4, 1) apresenta principalmente carotenos, capsantinas, capsorubina e outras xantofilas mais polares; o do pimento verde (Figura 4, 2) apresen-ta principalmente criptoxantinas e ou-tras xantofilas de menor polaridade; o cromatograma do pimento vermelho (Figura 4, 3) apresenta as trs regies intensas, indicando a presena de carotenos, criptoxantinas, capsanti-nas, capsorubina e outras xantofilas mais polares.

    ConclusesA cromatografia em papel de

    extratos de pimentes permite a visualizao da separao croma-togrfica dos principais pigmentos existentes no extrato: os carotenos, as criptoxantinas, as capsantinas e a capsorubina. Alm de despertar o interesse pela qumica de produtos naturais abordando carotenides, o experimento d margem a discus-ses elucidativas sobre interaes intermoleculares, polaridade e fun-es orgnicas. A simplicidade do ex-perimento torna sua realizao vivel em laboratrios que no dispem de muitos recursos materiais.

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    Para realizar o ex-perimento com mate-riais mais acessveis, podem ser feitas as se-guintes substituies: 1) hexano por thinner (contendo pelo menos 30-40% de tolueno e 30-40% de xilenos); 2) acetona por removedor de esmalte para unhas; 3) papel de filtro Whatmann n 1 por filtro de papel para coar caf; 4) sulfato de sdio anidro por sal de cozi-nha (para desidratar o sal, aquec-lo at secagem em estufa, fogo ou bico de Bunsen, e ento esfri-lo at a tempe-ratura ambiente, e us-lo em seguida); 5) o recipiente cilndrico de vidro com tampa por copo de vidro coberto com um pires. Devido ao fato de o thinner ser uma mistura de substncias com

    Figura 5: Cromatograma do extrato de pimento vermelho, utilizando thinner e removedor de esmalte para unhas.

    A cromatografia em papel uma tcnica simples para

    anlise de amostras em pequenas quantidades,

    aplicada principalmente na separao e identificao

    de compostos polares

    caractersticas diver-sas, ao utiliz-lo na extrao dos pigmen-tos, algumas outras substncias, alm dos pigmentos, tambm podem ser extradas. Isso, somado ao fato de que o papel para

    coar caf tem uma malha de celulose mais irregular que o papel de filtro Whatmann, torna a resoluo das re-gies cromatogrficas prejudicada em relao apresentada na Figura 4. No entanto, ainda assim, o experimento permite a visualizao da separao dos pigmentos, conforme Figura 5, que apresenta o cromatograma do extrato de pimento vermelho obtido com a utilizao de thinner e removedor de esmalte para unhas.

    Nbia Moura Ribeiro ([email protected]), graduada em Engenheira Qumica pela Universidade Federal da Bahia, mestre em Qumica de Produtos Naturais e doutora em Qumica Orgnica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, professora e atualmente coordena a pesquisa e ps-graduao do Centro Federal de Educao Tecnolgica da Bahia (CEFET-BA). Carolina Rodeiro Nunes aluna do Ensino Mdio do CEFET-BA e bolsista PIBIC-JR/FAPESB.

    Abstract: Analysis of pigments in peppers by paper chromatography. Carotenoids are natural pigments that bring benefits to health for its anti-oxidant and anti-carcinogen activity. Paper chro-matography was used in this work to separate and identify these pigments in extracts of green, yellow and red peppers. Beside, it was presented information on carotenoids, highlighting those found in peppers.

    Keywords: Paper chromatography, peppers, carotenoids.

    Referncias FONSECA, S.F. e GONALVES, C.C.S.

    Extrao de pigmentos do espinafre e separao em coluna de acar comer-cial. Qumica Nova na Escola, So Paulo, n. 20, p. 55-58, novembro, 2004.

    AQUINO NETO, F.R. e NUNES, D.S.S. Cromatografia: princpios bsicos e tc-nicas afins. Rio de Janeiro: Intercincia, 2003.

    COLLINS, C.H.; BRAGA, G.L. e BO-NATO, P.S. Fundamentos de cromatogra-

    pepper. Journal of Agricultural Food Chemistry, 10, 504509, 1962.

    DAVIES, B.H.; SUSAN, M. e KIRK, J.T.O. The nature and biosynthesis of the carotenoids of different color varieties of Capsicum annuum. Phytochemistry, 9, 797-805, 1970.

    SILVA, L.B.; ALLES, I.M.; MOREL, A.F. e DALCOL, I.I. Produtos naturais no ensino de Qumica: experimentao para o isolamento dos pigmentos do extrato de pprica. Qumica Nova na Escola, 23, p. 52-53, maio, 2006.

    fia. Campinas: Ed. UNICAMP, 2006.COLLERA-ZUNIGA, O.; JIMENEZ, F.G.

    e GORDILLO, R.M. Comparative study of carotenoid composition in three mexican varieties of Capsicum annuum L. Food Chemistry, 90, 109-114, 2005.

    BIANCHINI, R. e PENTEADO, M.V.C. Carotenides de pimentes amarelos (Capsicum annuum L.). Caracterizao e verificao de mudanas com o cozi-mento. Cincia e Tecnologia dos Alimen-tos, 18 (3), 1998.

    CURL, A.L. The carotenoids of red bell

    Nota

    Qumica Nova na Escola convida os interessados a sub-meter manuscritos para a edio de Maio de 2009 que ser lanada na 32 Reunio Anual da Sociedade Brasileira de Qumica. Nesta edio, teremos uma seo especial com a temtica Formao de Recursos Humanos em Qumica: limites e desafios para a segunda dcada do sculo XXI, coincidente com o tema da RA-SBQ.

    A submisso de propostas deve ser feita pelo siste-ma online e o processo de avaliao seguir os trmites normais. Os autores devem seguir as normas especficas de submisso de manuscritos para a seo Pesquisa em Ensino de Qumica, mencionando na carta aos editores

    justificativa para incluso do manuscrito na seo temtica Formao de Recursos Humanos em Qumica: limites e desafios para a segunda dcada do sculo XXI.

    Data limite para envio de manuscritos: 30 de Dezembro de 2008.Data limite para aceitao: 30 de Maro de 2009.Endereo para submisso: http://qnesc.sbq.org.brEndereo para contato: [email protected]

    Os Editores.

    Chamada de artigos para a edio de Maio de 2009