“análise da interação entre uma criança com deficiência e ...bdsepsi/161a.pdf · projeto...
TRANSCRIPT
UUNNIIVVEERRSSIIDDAADDEE FFEEDDEERRAALL DDEE SSÃÃOO CCAARRLLOOSS CCEENNTTRROO DDEE EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO EE CCIIÊÊNNCCIIAASS HHUUMMAANNAASS
DDEEPPAARRTTAAMMEENNTTOO DDEE PPSSIICCOOLLOOGGIIAA
““ AAnnááll iissee ddaa iinntteerraaççããoo eennttrree uummaa ccrr iiaannççaa ccoomm ddeeff iicciiêênncciiaa ee sseeuuss ppaarreess eemm uummaa ccrreecchhee iinncclluussiivvaa””
MMaarriiaa CCllaarraa ddee FFrreeiittaass R.A. 21593.7
Orientadora: Profa Dra Enicéia Gonçalves Mendes
São Carlos
Apoio:
Projeto final de monografia, apresentado como requisito para conclusão do curso de Bacharelado em Psicologia pela Universidade Federal de São Carlos
2
Dezembro de 2004
ÍNDICE
RESUMO............................................................................................................ 2
APRESENTAÇÃO.............................................................................................. 3
A INCLUSÃO NO BRASIL E NO MUNDO.................................................... 6
A INCLUSAO NA EDUCAÇÃO INFANTIL .................................................. 11
A BRINCADEIRA COMO FACILITADORA DA INTERAÇÃO.......................20
MÉTODO.......................................................................................................... 23
Local ............................................................................................................. 23
Participantes...................................................................................................24
Procedimento de coleta de dados .................................................................24
Procedimento de análise de dados ...............................................................25
IMPLICAÇÕES ÉTICAS................................................................................... 29
RESULTADOS................................................................................................. 30
CONCLUSÕES .................................................................................................44 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................52 ANEXOS ANEXO 1. Tomadas focais ANEXO 2. Tomadas de varredura ANEXO 3. Repertório de comportamentos do adulto ANEXO 4. Repertório de comportamentos das crianças ANEXO 5. Modelo de termo de compromisso livre e esclarecido dos
diretores ANEXO 6. Modelo de termo de compromisso livre e esclarecido dos
educadores ANEXO 7. Modelo de termo de compromisso livre e esclarecido dos pais ANEXO 8. Parecer do CEP/UFSCar
2
RESUMO
Desde a Constituição Federal de 1988 temos dispositivos legais que garantem a matrícula de alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas comuns. Entretanto, estudos nacionais indicam que faltam aspectos básicos para garantir não apenas o acesso, mas a permanência e o sucesso desses alunos em classes comuns. A presente proposta de investigação é parte de uma agenda de pesquisas sobre inclusão escolar no Brasil, que vem sendo realizada no âmbito do Grupo de Pesquisas sobre Formação de Recursos Humanos em Educação Especial - FOREESP, da UFSCar, e que tem como meta produzir conhecimento para colaborar com a construção de um sistema de creches inclusivas no âmbito do sistema municipal de educação de São Carlos. No ano de 2003, o número de matrículas de alunos com necessidades educacionais especiais em classes comuns aumentou 30,6%, enquanto que as matrículas em creches em todo o país cresceram 7,3%. Esses dados evidenciam a importância de se promover a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em creches, seja porque elas na atualidade se constituem a porta de entrada para o sistema educacional para muitas crianças, seja porque a creche comum pode ser a única forma de atendimento em muitos municípios, ou ainda devido à importância da antecipação da educação precoce para maximizar as oportunidades de desenvolvimento para essas crianças. A presente investigação delimita a sua contribuição, dentro do plano mais amplo de investigação, em aprofundar o estudo da situação de brinquedo para a perspectiva da inclusão escolar em creches, e mais especificamente para conhecer a interação social entre crianças com e sem deficiências no contexto da sala de aula inclusiva. Assim, este estudo teve como objetivo descrever e analisar a interação entre uma criança com deficiência e seus pares sem deficiências, em uma turma comum. Isso foi feito através do registro de seis sessões de filmagens em situação natural, analisadas minuto a minuto por um protocolo desenvolvido para tal fim, que acessa as iniciativas e respostas interacionais, o status das crianças e a topografia dos comportamentos observados. Os resultados obtidos permitiram concluir que as crianças sem deficiência não emitiam muitos comportamentos interativos em relação à criança com deficiência, e pareciam preferir brincar predominantemente entre si. Da mesma forma, a criança-alvo também não emitiu altas freqüências de comportamentos direcionados às outras crianças. A topografia do comportamento também diferiu, com uma grande quantidade de vocalizações entre as crianças e poucas entre a crianças com necessidades educacionais especiais e seus colegas. Concluiu-se a partir disso que o déficit de comunicação oral da criança com deficiência seria o fato principal para tal falta de interação entre ela e as outras crianças. Entretanto, a freqüência de interação entre a criança-alvo e os adultos foi bastante grande, bem como das vocalizações, o que afastou a hipótese de isolamento, mas por outro lado levou também, à conclusão de que tais educadores não estariam mediando apropriadamente as interações da criança com deficiência, o que poderia estar dificultando sua aceitação dentro do grupo. A partir destes resultados, então, foi elaborado um programa de intervenção futuro, enfatizando a análise funcional do comportamento da criança, de modo a tentar otimizar a resolução de problemas e a mediação das interações pelas educadoras.
3
AAPPRREESSEENNTTAAÇÇÃÃOO
Este estudo é parte de um projeto mais amplo de uma pesquisa iniciada
em 2001, que teve como objetivo inicial efetuar um levantamento no sistema
educacional do município de São Carlos com o objetivo de identificar e
caracterizar os alunos com necessidades educacionais especiais inseridos em
turmas comuns inseridas nas creches (Silveira, Mendes, Grecghi, Pereira e
Sobreira, 2002); Escolas Municipais de Educação Infantil - EMEIs (Mendes,
Chimetto, Bastos, Bianco, Araki E Zambon, 2002) e Escolas Municipais de
Educação Básica - EMEBs (Mendes, Marçal, Tosi, Miao, Massa e Barreto,
2002) da rede municipal. No caso das creches foram rastreados 1.196 alunos
de 12 creches, tendo sido notificadas como crianças com necessidades
educaionais especiais pelos educadores 102 crianças.
A partir dos dados do levantamento foi construído um banco de dados
com o cadastro de todas as crianças notificadas, com a finalidade de produzir
indicadores que possibilitassem acompanhar o futuro da política de inclusão no
âmbito do sistema municipal (Mendes e Chimetto, 2002). O resultado
considerado mais intrigante do estudo de levantamento foi observado no sub-
sistema de creches, que foi o que concentrou a maior proporção de crianças
notificadas. Os dados obtidos neste levantamento preliminar apontaram para a
importância de uma investigação mais aprofundada nas creches,
considerando-se: a) A necessidade de delimitar o estudo para melhor proceder
a investigação do processo de implementação de políticas públicas de inclusão
escolar no âmbito do município; b) A possibilidade de investigar uma estratégia
de implantação gradual, sistemática e planejada para a pesquisa sobre
inclusão escolar, estabelecendo um marco zero para iniciar, que seria
justamente a porta de entrada de muitas crianças no sistema educacional; c) A
possibilidade de prevenir, eliminar ou mesmo minimizar as necessidades
educacionais especiais precocemente identificadas logo que a criança entra no
sistema educacional; e d) O fato de este ser o sub-sistema onde foi constatada
a maior proporção de crianças notificadas, o que automaticamente o tornou
alvo prioritário da investigação sobre a implementação da política de inclusão
escolar no município.
4
A análise do perfil das 102 crianças de zero a seis anos notificadas nas
creches municipais evidenciou-se que os critérios usados pelos educadores e
diretores de creches para a identificação de crianças consideradas especiais
de zero a seis anos, pareciam estar relacionados ao fato de serem meninos (64
% das crianças identificadas), considerados como "crianças de risco" (46,1%),
e/ou por apresentarem problemas de socialização (37%) e/ou linguagem
(29%). Considerando os resultados e problemas apontados no estudo de
levantamento de crianças com necessidades educacionais especiais nas
creches, um novo estudo desenvolvido no âmbito do grupo de pesquisas, o de
Rosa (2003), teve como objetivo promover ações de formação continuada para
educadoras de creches, sobre o uso de estratégias de mediação ou facilitação
de competências sociais e de linguagem de crianças pequenas. Foi
desenvolvido e avaliado um programa de formação continuada, baseado em
sugestões encontradas na literatura sobre inclusão escolar em creches, Por
questões éticas o programa foi estendido a todas as cerca de 90 educadoras
das creches, entretanto, a fim de avaliar cientificamente os seus efeitos foram
coletadas e confrontadas medidas das competências de cinco atendentes e
das habilidades sociais e de linguagem de cinco crianças identificadas como
especiais, antes e depois da implementação do programa.
Tendo em vista a idéia de "inclusão marco zero" e considerando que a
creche foi o local que apresentou o maior número de crianças com
necessidades educacionais especiais identificadas pela escola, foi
desenvolvido um novo projeto (Mendes, 2002-2005) com três estudos visando
a: a) replicar o estudo da identificação de alunos com necessidades
educacionais especiais a fim de comparar os dados e avaliar se as ações de
formação continuada desenvolvidas neste período produziram alguma
mudança no processo de notificação dos educadores de creches; b) investigar
a situação das 102 crianças anteriormente identificadas em 2001, a fim de
avaliar se elas continuam sendo identificadas como alunos com necessidades
educacionais especiais pelos seus educadores atuais, se receberam ou não
algum apoio para atender suas necessidades e como avançaram no processo
educacional; e c) descrever e analisar como o educador de creches desenvolve
seu trabalho quando alunos com necessidades especiais se encontram
inseridos em suas turmas.
5
As evidências produzidas neste último estudo recentemente concluído
pelo grupo, envolvendo referencial da etnografia, e que teve como objetivo
identificar e descrever estratégias pedagógicas inclusivas e situações-problema
encontradas em creches que possuem crianças com necessidades
educacionais especiais inseridas indicou a situação de brinquedo, como uma
das privilegiadas para se observar tanto situações-problema quanto interações
que favorecem a participação e o desenvolvimento das crianças com
necessidades educacionais especiais no âmbito das creches (Mendes, Zambon
e Rosa, 2004).
A presente investigação foi delineada dentro do plano mais amplo de
investigação, para aprofundar o estudo da situação de brinquedo em creches, e
mais especificamente para conhecer como é a interação social entre crianças
com e sem deficiências no contexto da sala de aula inclusiva. O objetivo do
estudo consistiu em descrever e analisar a interação entre crianças com
deficiências e seus pares sem deficiências, em turmas comuns, através de
filmagens em situação natural.
6
AA IINNCCLLUUSSÃÃOO NNOO BBRRAASSIILL EE NNOO MMUUNNDDOO
O movimento pela inclusão escolar se intensificou na década de 80,
potencializado pela insatisfação por parte de alguns educadores em relação
aos resultados da política vigente de integração (Mendes, artigo não
publicado), que não conseguiu concretizar suas metas, ou seja, colocar os
alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas comuns
garantindo seus direitos civis e colaborando, ao mesmo tempo, para o
desenvolvimento individual desses alunos bem como de seus colegas.
A integração, embora salientasse os direitos da pessoa com
necessidades especiais, determinava sua adaptação aos parâmetros de
normalidade da comunidade, aos pré-requisitos da escola e aos outros alunos,
uma meta muitas vezes impossível de ser concretizada (Rosa, 2003). Desta
forma, muitas vezes as tentativas de integração acabaram por evidenciar ainda
mais a diferença, abrindo espaço para o preconceito e fadando muitos alunos
ao fracasso escolar e não aceitação social.
A inclusão, por sua vez, preconiza que a diversidade humana é natural
e, por essa razão, não procura enquadrar aquele que é diferente dentro do
normal, mas sim fazer com que todos os outros se adaptem, aceitem e
celebrem as diferenças em todos os âmbitos da sociedade humana.
Um fenômeno mais amplo e recente que a integração, a inclusão, como
definida por Aranha (2000), é:
"um processo de garantia do acesso imediato e contínuo
da pessoa com necessidades especiais ao espaço comum da
vida em sociedade, independentemente do tipo de deficiência e
do grau de comprometimento apresentado".
Assim, a inclusão escolar, um recorte do movimento de inclusão social,
por sua vez advindo da luta pelos direitos humanos, se diferencia do paradigma
da integração por preconizar a adaptação da escola para receber o aluno
especial e não o contrário.
No Brasil, esse fenômeno tem se configurado, principalmente, por
mudanças na regulamentação e nas políticas públicas, com ênfase na área
7
educacional, em que se tem defendido um gradual distanciamento da
institucionalização, e aproximação cada vez maior da colocação definitiva dos
alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular (Aranha,
2000).
Este caráter gradativo observado tem lugar porque a promoção da
inclusão é um processo demorado, já que não envolve somente o acesso do
aluno com necessidades especiais ao ensino regular, mas também sua
permanência e sucesso na escola. Afinal, como indicam Oliveira e Leite (2000),
não basta tirar as crianças da escola especial ou classe especial para colocá-
las na classe comum da escola regular, é preciso garantir a igualdade de
oportunidades a todos.
Para que isso aconteça são necessárias mudanças na estrutura do
sistema educacional, bem como na própria sociedade, na infra-estrutura das
cidades e nas atitudes das pessoas, pois a educação só poderá ser
considerada inclusiva a partir do momento em que a sociedade também o for
(Abramowicz et al., 2002), o que inclui tanto a legislação quanto o
posicionamento institucional e individual acerca da questão.
O maior avanço neste sentido observado no Brasil teve lugar de fato na
regulamentação educacional para pessoas com necessidade especiais. Hoje,
de acordo com as leis que regem o ensino, isto é, o Estatuto da Criança e do
Adolescente (Brasil, 1990), a Constituição Federal (Brasil, 1998) e os
Parâmetros Curriculares Nacionais, a educação é entendida como um direito
estendido a todas as pessoas, independentemente de tipo ou grau de
deficiência de cada um.
Mais especificamente no estado de São Paulo, a constituição prevê no
título IV, capítulo III, seção I, artigo 239, parágrafo 2, que o Poder Público
oferecerá atendimento especializado aos portadores de deficiências,
preferencialmente na rede regular de ensino (São Paulo, 1999).
Assim, a partir deste apoio jurídico à inclusão, esse tipo de atendimento
vem crescendo continuamente, como indicam os dados do Censo Escolar de
2003, ano em que o número de matrículas de alunos portadores de
necessidades educacionais especiais na rede regular de ensino foi de 144.583,
contingente que corresponde a aproximadamente 29% do total dos alunos em
atendimento. Isso indica um crescimento de 30,6% no ano de 2002. Ao mesmo
8
tempo, a participação do atendimento em separado, nas classes especiais e
nas escolas especiais, diminuiu, passando de 75,3% para 71,3%. (INEP, 2003).
Tais estatísticas são uma das provas de que a sociedade brasileira está
em processo de desenvolvimento com essa conquista progressiva de espaço
para as pessoas com necessidades especiais, pois, como muito bem estudado
e documentado, um dos pontos fundamentais da inclusão diz respeito aos
efeitos do contato entre pessoas com necessidades especiais e seus pares
com desenvolvimento típico. Tem sido demonstrado que tal contato pode se
configurar como benéfico, promotor de ganhos significativos tanto para o
indivíduo com necessidades educacionais especiais quanto para seus colegas,
sua escola, e mesmo para a sociedade como um todo.
Em contato com padrões interativos mais desenvolvidos e com regras de
convívio necessárias para sua convivência social, o indivíduo com
necessidades educacionais especiais pode ter maiores chances de adquirir
respostas adequadas para o meio em que está inserido, e de conseguir
alcançar uma melhora no seu desenvolvimento em todos os aspectos.
Como um exemplo dentre muitas pesquisas nesta área, poder ser
citados os dados de Monteiro (1997), que constatou que a inclusão gerou
vantagens para a criança com necessidades especiais tais como aceleração no
desenvolvimento da linguagem, maior adaptação das regras sociais e
diminuição de comportamentos agressivos.
Já o indivíduo com desenvolvimento típico, aprendendo a entender e
aceitar naturalmente as diferenças, ganharia na possibilidade de desenvolver
em si e propagar no futuro certas habilidades sociais tão importantes na
sociedade atual, em que tanto se apregoa a não discriminação.
Em suma, as crianças no ambiente inclusivo ficam em contato com um
meio diverso, rico em experiências, e se lhes forem dadas oportunidades
entender tais diferenças como parte da vida em sociedade, inúmeros ganhos
em seu desenvolvimento podem ser verificados.
Entretanto, ainda que a garantia da colocação no ambiente regular seja,
em si, um grande passo rumo à inclusão social como um todo, há que se
atentar para um ponto relevante, bem delineado nas palavras de Schartzman
(1997), que indica:
9
"Determinar, por força de lei, que crianças com
necessidades educacionais especiais sejam absorvidas pelo
nosso sistema regular de ensino, que não consegue dar conta,
atualmente, nem sequer das crianças ditas normais, é pretender
uma solução fácil e ilusória para o problema da educação
especial". (pg 65)
Em concordância com essa proposição se encontra um levantamento de
dados realizado no ano de 2000 por Aranha com base nas crenças dos
professores acerca da inclusão. Tal pesquisa conclui que a opinião dos
docentes é a de que a opção pela inclusão foi principalmente política,
governamental e imposta pelos superiores e sem qualquer tipo de discussão,
critério de colocação, planejamento ou levantamento prévio de demanda.
Desta forma o único tipo de inclusão que acabou sendo conseguido,
muitas vezes, foi um grau de inclusão física (Prodocimo, 1994), que garante
apenas a proximidade física, aparente, entre as crianças em uma mesma sala
de aula, uma inclusão intimamente relacionada ao tempo de permanência do
aluno com necessidades especiais junto com os demais. Tal política não
garante necessariamente que a inclusão aconteça de fato pois pode excluir
muitos aspectos importantes, como convívio e possibilidades de aprendizagem.
Sem planejamento, compreensão ou intervenção apropriada, o que pode
acabar por acontecer é que este grau de inclusão pode vir a se tornar
insuficiente e colocar as crianças com necessidades especiais em risco de
isolamento social (Harper et al. 2002). Na tentativa de por boas idéias em
prática, a escola atual, cujo único apoio tem sido o legal, agindo às cegas, tem
muitas vezes acentuado as desigualdades.
Por outro lado, outros autores defendem que o simples convívio entre as
crianças é um fator de extrema relevância para a formação de atitudes de
aceitação por parte delas com relação ao aluno com necessidades especiais.
Eles sustentam que a proximidade física em si, mantida pelo arranjo ambiental,
poderia contribuir para o processo de inclusão (Duarte, 1990; Prodocimo, 1944;
Aranha, 1991), já que em um ambiente escolar regular e apropriado para a
idade, conforme apontam Nisbet, Zanella e Miller (1984), as interações entre
10
estudantes com necessidades educacionais especiais e sem tendem a ocorrer
naturalmente
Entretanto, ainda que a garantia da colocação no ambiente físico regular
possa ser em si um grande ganho tanto para as crianças quanto para a escola,
bem como um passo rumo à inclusão social como um todo, os dados
avaliativos desta realidade ainda são insuficientes para confirmar o sucesso na
inclusão, ou seja, comprovar ou não se a situação atual garante aos alunos o
maior aproveitamento possível de seu ambiente escolar, bem como o respeito
a seus direitos e diferenças.
Hoje, a produção científica brasileira se encontra em um momento
embrionário com relação à educação inclusiva, sendo que ainda faltam dados
sólidos de pesquisas sobre as condições de efetivação e resultados da
inclusão que possam fundamentar futuros planejamentos e intervenções
específicas (Mendes, Nunes e Ferreira, 2003; Mendes, 2002).
É preciso construir o conhecimento para servir como base para a tão
necessária reestruturação do sistema educacional, tendo como objetivo final
fazer da escola um ambiente propício para o início da construção de uma
sociedade mais justa e igualitária.
11
AA IINNCCLLUUSSÃÃOO NNAA EEDDUUCCAAÇÇÃÃOO IINNFFAANNTTIILL
Em seus primórdios e durante muito tempo, o papel das creches e da
educação infantil foi o de substituição dos pais das crianças durante o período
de trabalho destes. De fato, a nomenclatura usada para as pessoas que
trabalhavam em creches era a de “cuidadora” ou “pajem”, o que revela o
caráter assistencial, que a instituição se propunha a desempenhar.
A partir da Constituição de 1988 a creche passou a ser enquadrada
como parte do sistema educacional, tendo a educação infantil como um direito
de todas as crianças. Com isso, aos poucos, ela vem modificando seu grau de
participação no desenvolvimento educacional das crianças. Assim, além da
função social, que não deve ser descartada, o que prejudicaria, como bem
indica Rosa (2003), a compreensão da especificidade desta idade, a educação
infantil passa a possuir também a função educacional.
Tais modificações na estrutura destas instituições, aliadas à crescente
procura por atendimento infantil, contribuem para o rápido crescimento
verificado neste setor da educação, como apontam, no Brasil, os dados do
Censo Escolar 2003 (INEP, 2003). De acordo com tais estatísticas, no ano de
2003 existiam 1.236.814 alunos em creches de todo país, um aumento de 7,3%
com relação ao ano de 2002.
Na cidade de São Carlos, em um momento de transição quanto a essa
visão, o total de alunos matriculados em creches chega a 1.880 crianças,
18,3% a mais que em 2002. Dessas 1.880 crianças, 1.057 se encontram na
rede municipal de ensino, ou seja, mais de 56% dos alunos de creches.
Assim, como pôde ser visto nestas realidades em específico, hoje não
mais com caráter meramente assistencial e em franco processo de expansão,
a educação infantil tem se constituído progressivamente um contexto de
grande desenvolvimento para as crianças das sociedades industrializadas
modernas (Martinez, 2002).
De fato, um amplo corpo de evidência revela que as relações entre
pares provêm experiências únicas para o desenvolvimento social das crianças
pequenas, como sugerem Carvalho e Beraldo (1998), que indicam que na
maior parte das sociedades, e possivelmente da história humana, o contato
12
com outras crianças constitui a experiência social mais freqüente e intensa a
partir da primeira infância.
Rosa (2003) conclui em seu estudo que o ambiente de creche, na
atualidade, tem grande valor adicional para a população. Isso porque ele reúne
em si a função educativa para as crianças de zero a quatro anos e o
atendimento com vistas a estimular o desenvolvimento geral destas crianças,
além de ser importante fator de socialização e comunicação para elas.
De acordo com McGrew (1981) a escola maternal tem assumido o papel
de favorecer e estimular as habilidades sociais, e preparar as crianças para as
situações em grupo com as quais ela pode se defrontar mais tarde na
sociedade.
De fato, a interação entre as crianças é, desde muito cedo, uma
atividade de alta prioridade motivacional, tanto em comparação com a
interação com objetos como com a interação com adultos. Além disso, a
situação se torna ainda mais o foco da atenção da criança se envolver a
interação prévia entre duas ou mais crianças, como acontece prioritariamente
nas creches (Carvalho & Beraldo, 1989).
Ainda, além dos benefícios da escola maternal para as crianças em
geral, cujo desenvolvimento pode ser considerado típico, Odom (1990) conclui
também que salas de aula de educação infantil, quando comparadas com salas
especializadas, podem prover contextos mais facilitadores para promover o
desenvolvimento de habilidades de interação social para crianças pequenas
com necessidades especiais.
De acordo com Abramowicz et al. (2002) a criança pequena em
ambiente escolar fica em contato com um meio ambiente rico em experiências,
e isto lhe trará inúmeros ganhos em seu desenvolvimento. As crianças com
necessidades educacionais especiais têm vantagens neste processo, pois, no
processo de aprendizagem, aprimoram habilidades que propiciam seu
desenvolvimento de acordo com as atividades oferecidas. De fato, as
adaptações e cuidados especiais que tais crianças demandam não impedem
seu aprendizado e o desenvolvimento de suas habilidades.
Assim, para estes autores, a possibilidade de ser realizar o processo de
inclusão na educação infantil é, sim, viável, sendo que a pré-escola pode
13
mesmo ser tornar uma instituição muito importante em tal processo, desde que
haja comprometimento por parte de todos os envolvidos.
Rosa (2003), em seu estudo sobre inclusão em creches, conclui que o
nível pré-escolar seria um fator facilitador da Inclusão, já que as crianças com
necessidades educacionais especiais, desde o início da sua escolarização,
construiriam progressivamente um processo de adaptação que resultaria em
menos impacto ou dificuldade em longo prazo. Ainda, o fato das crianças
serem pequenas, mais receptivas e com padrões de relações menos
cristalizados poderia facilitar bastante o processo de educação inclusiva nas
creches.
Esta idéia é bem aceita entre os pesquisadores da área, de que crianças
pequenas não fazem discriminação negativa com relação aos colegas com
deficiência, entretanto estudos recente como o de Mendes, Rosa e Zambom
(2004) parecem estar vindo de encontro a ela, com dados que mostram
situações bem diferentes, ou seja, que desmistificam tais crenças. Neste
estudo citado, que analisa episódios de situações-problema observados em
situações de brinquedo, foram encontradas situações de isolamento e rejeição
por parte das crianças com desenvolvimento típico quanto aos seus pares com
necessidades especiais, tato em situações mediadas ou não pelo educador.
Desta forma, muito ainda há que ser estudado para compreender este
fenômeno.
De acordo com Prodocimo (1994) nos seus primeiros anos de vida, a
criança apresenta padrões interativos em graus crescentes de elaboração de
modo a ampliar seu universo social. Essa autora considera que o
desenvolvimento social da criança deficiente difere em ritmo, porém não
necessariamente em seqüência do da criança não deficiente.
Observa-se também que o desenvolvimento de estudos acerca do
comportamento de comunicação humana tem se concentrado em crianças com
menos de cinco anos de idade, ou em casos em que a comunicação falada
está muito comprometida. Um exemplo disso é um estudo citado por Brannigan
& Humphries (1981) feito durante quatro anos em uma escola maternal em
Birmingham, onde foi verificado que embora as crianças de três a quatro anos
usassem a fala de um modo bastante livre para se comunicarem com adultos,
elas a usavam com pouca freqüência - em geral como um breve imperativo -
14
durante brincadeiras de grupo. Ao invés de linguagem eram usados gestos,
expressões faciais e movimentos de intenção para coordenar suas atividades
(Brannigan & Humphries, 1981).
Tais autores concluem que em crianças pequenas, a comunicação
através de sinais não vocais é uma forma muito importante de estudar sua
interação e, de fato, pode ser estudada de forma mais clara e controlada em
crianças pequenas, antes que a linguagem tenha se tornado o método
predominante de comunicação. Isto é particularmente verdadeiro nas
interações criança-criança, especialmente em casos que a linguagem está
comprometida.
Nisbet, Zanella & Miller (1984) verificaram em seu estudo sobre a
interação entre pares com e sem deficiência que o sujeito alterava sua
produção de linguagem de acordo com a competência do ouvinte. Neste
mesmo estudo foi encontrado também que portadores de deficiência gastaram
menos tempo falando entre si do que quando interagiram com um não
portador.
Esse último dado importante é corroborado por Buysse et al (2002) que
indica que existe uma preferência demonstrada por pré-escolares tipicamente
desenvolvidos e também pelas crianças com necessidades especiais em
formar relações com seus pares sem atrasos no desenvolvimento. Tais dados
apóiam a idéia de inclusão no sentido que indicam a importância de se colocar
todas as crianças juntas, com ou sem necessidades especiais, pois, como
verificado, tal colocação corrobora para que seu desenvolvimento se acelere.
Outras pesquisas sobre interação podem ser citadas como faz Aranha
(1991) que, investigando padrões de amizade em relação à idade, indica que
as interações analisadas por um período de um ano foram baseadas nos
intercâmbios verbais em pré-escolares. Encontra também que algumas
amizades se mostraram estáveis e mantidas no decorrer do ano, entretanto, as
crianças que apresentavam distúrbios emocionais formaram somente amizades
esporádicas e, enquanto as crianças ‘normais’ formaram novas amizades
esporádicas com parceiros novos, as crianças com distúrbios emocionais
tenderam a retornar sempre ao mesmo parceiro.
Como sugere Buysse (2002), é necessário fazer a distinção entre
amizade (um relacionamento específico entre duas crianças) e aceitação entre
15
pares (um índice do status social de uma criança entre seus colegas) porque
esses construtos podem ter interpretações diferentes. Neste trabalho utilizar-
se-á a aceitação entre pares como indicador prático e foco de análise.
Ainda em relação ao estabelecimento de amizades e das experiências
entre pares, encontram-se na Literatura discrepâncias quanto aos estudos,
resultantes das divergências entre as linhas de pesquisa e tradição teórica.
Apesar da gama da diversidade de abordagens, a evidência empírica
sugere que mesmo crianças muito pequenas podem ser capazes de formar
amizades com pares e que ter um amigo oferece ao par o potencial para
realçar seu desenvolvimento cognitivo e de linguagem bem como benefícios
específicos sócio-emocionais, regulação emocional e bem estar geral (Buysse,
2002).
Os resultados da Literatura também não são claros acerca do que ou
quem é responsável pelos graus variáveis de envolvimento social de crianças
com necessidades especiais em ambientes inclusivos (Harper et al, 2002).
Por outro lado, este autor aponta que mesmo adultos sem treinamento
especial podem responder e de fato respondem diferentemente às condições
da criança, de modo a aumentar o envolvimento da criança com necessidades
especiais nas atividades. Isso indica que, embora seja muito importante
planejar o máximo de engajamento, provendo especialização para educadores,
adaptações nas instituições, reformulações nas leis e modificações nas bases
da sociedade, qualquer esforço que for feito para prover algum grau efetivo de
inclusão já é válido.
Assim, todos estes dados vão ao encontro de uma das hipóteses sobre
as quais a presente pesquisa se baseia, a de que a Inclusão deve ter início o
mais cedo possível, na creche, o primeiro nível de acesso ao sistema escolar.
Assim, projetos inclusivos na educação infantil deveriam ser a primeira opção a
ser levada em consideração pois tal iniciativa possibilitaria um processo
gradual de aceitação e promoção real da Inclusão. Desta forma, uma das
aspirações deste estudo seria justamente a de contribuir para o
estabelecimento deste “marco zero” da inclusão na cidade de São Carlos,
avaliando a inserção de crianças pequenas com necessidades educacionais no
ambiente de creche.
16
Entretanto, embora sendo um tema tão relevante para a sociedade em
geral, a literatura científica indica escassez de pesquisas avaliativas que unam
inclusão e interação criança-criança. Na década de 1990, informações sobre as
oportunidades de interação entre pares em pré-escolas que incluam crianças
com necessidades especiais e quais os benefícios e dificuldades quando tais
crianças são inseridas em uma classe regular eram escassas, e o número de
estudos sobre o comportamento interativo do portador de deficiência em
ambiente integrado era irrisório, como indicam Odom (1990), Aranha (1991) e
Monteiro (1997).
Ainda hoje os dados que podem ser encontrados na literatura se
restringem em boa parte a relatos de depoimentos e experiências ou medidas
parciais de desempenho (Mendes, 2002; Odom, 2000). Como bem indica
Mendes (2002), os relatos de experiência, ainda que relevantes para uma
conceituação teórica acerca do tema, não permitem que se avalie o impacto da
educação inclusiva em relação às metas alcançadas para que o direito da
população envolvida nesses programas seja alcançado.
Por outro lado, na revisão bibliográfica realizada por Odom (2000)
acerca das pesquisas encontradas sobre inclusão na pré-escola num contexto
internacional, uma dos temas mais encontrados relaciona-se à tentativa de
identificar e avaliar resultados importantes para as crianças com necessidades
educacionais especiais nestes ambientes. Contudo, ainda que estes estudos
avaliativos da inclusão existam em um número crescente na atualidade, os
resultados encontrados pelo autor mencionam apenas os desempenhos
obtidos pelas crianças segundo medidas de desenvolvimento.
Essa delimitação de um grupo de comportamentos para análise pode
prejudicar o entendimento dos objetivos múltiplos que devem guiar as
intervenções e análises para essas crianças, já que esse, de acordo com
Odom, é o primeiro passo para designar estratégias eficazes e significativas
para elas.
Acerca do contexto brasileiro, em uma revisão da literatura publicada em
2004, Gatti conclui que não há uma tradição sólida que fundamente pesquisas
de cunho quantitativo em educação, embora estas tenham um importante papel
para a produção de conhecimento e estratégias de melhoria do sistema
educacional. Segundo esta autora, os dados recolhidos a partir de escolhas
17
metodológicas cuidadosas trazem subsídios para “desmistificar
representações, preconceitos, ‘achômetros’, sobre fenômenos educacionais,
construídos apenas a partir do senso comum do cotidiano ou do marketing”
(Gatti, 2004, p. 12).
Desta forma, optou-se por realizar este estudo com base em uma
metodologia quantitativa, que abrangesse a maior variedade comportamental
possível e extraísse com maior acurácia a real situação da inclusão da criança
analisada, a análise das iniciativas e respostas interacionais, que representam
o episódio interativo. Tal escolha é apoiada por Duarte (1990) que conclui em
seu estudo que a análise da freqüência de contatos interativos é um indicador
fundamental da eficácia da tentativa de inclusão.
Assim, aliando-se à importância frisada pela literatura em construir um
sistema de conhecimento sobre a inclusão, a possibilidade de fazê-lo através
de uma análise da interação entre as crianças, a falta de dados acerca dessa
temática e ainda aos resultados das pesquisas anteriores desenvolvidas na
rede municipal de creches do município de São Carlos dão significado à
elaboração do presente estudo, que tem por objetivo descrever e analisar,
através de vídeogravações, a interação da criança com necessidades
educacionais especiais e seus pares em creches regulares que seguem a
filosofia de inclusão, em situações onde brincar seja a atividade predominante.
A escolha da análise interacional baseou-se no pressuposto de que o
comportamento das crianças com relação à criança com necessidades
especiais é, em si, influenciado por inúmeros outros fatores, como a política da
escola, o posicionamento dos educadores e diretores acerca da inclusão,
enfim, a visão da sociedade em que estão inseridas. Assim, a aceitação social
pelos pares coetâneos foi considerada o meio mais eficaz para avaliar o
sucesso da Inclusão, afinal, como bem indica Schatzman (1997), a integração
social só pode ser alcançada a partir do momento em que crianças tipicamente
desenvolvidas mantiverem a mesma qualidade de relacionamentos
interpessoais com crianças com atrasos no desenvolvimento como com
crianças sem atrasos.
18
AA BBRRIINNCCAADDEEIIRRAA CCOOMMOO FFAACCIILLIITTAADDOORRAA DDAA IINNTTEERRAAÇÇÃÃOO
Com relação às atividades que mais promoveriam a interação em salas
de aula de educação infantil com crianças portadoras de necessidades
especiais, Odom (1990) conclui em seu estudo que seriam as atividades
relacionadas ao brincar.
Do conjunto de estudos realizados na cidade de São Carlos, do qual
este é uma seqüência, pôde-se notar também, que a situação de brinquedo,
dentre as demais atividades de rotina da creche, parecem as mais ricas para
se observar, tanto enquanto exemplos de situações-problema quanto de
práticas dos professores com relação às crianças com necessidades
educacionais especiais (Mendes, Rosa e Zambom, 2004).
Como sugere Martinez (2002), a situação de brincadeira não estruturada
surge como um meio ou oportunidade para ajudar crianças a se conhecerem e
reconhecerem suas características e limitações, além de se constituir em uma
fonte incomensurável de oportunidades de expressão. Dentre os muitos
processos envolvidos no ato de brincar, um dos mais notáveis é o impulso
representado por ele para o desenvolvimento social da criança.
Assim, como definida por Robles (2002), a brincadeira é:
“A atividade ou ação própria da criança, voluntária, iniciada e
mantida pela criança (ações/atividades espontâneas), delimitada
no tempo e no espaço, prazerosa (...), com um fim em si mesma
e tendo uma relação íntima com a criança “. (pg 14)
Para esta autora, o brinquedo se define como um objeto visto como
suporte da brincadeira, possuindo um uso determinado. As atividades de jogo
também podem ser consideradas brincadeiras porque contém em si as
características acima descritas que definem este fenômeno, entretanto a se
diferenciam, de forma que o jogo se caracteriza especificamente pela presença
neste último de regras e objetivos pré-definidos a serem realizados tanto por
adultos quanto pelas crianças entre si (Robles, 2002).
As atividades de brincadeira entre as crianças podem assim ser
considerada livre, ou seja, em que os participantes não têm nenhuma tarefa
19
pré-estabelecida, acadêmica ou pertinente a alguma atividade de jogo, para
cumprir, e podem interagir de maneira espontânea e sem interrupções ou
intervenções por parte do adulto. Já a situação de jogo é mais estruturada,
porque permite uma liberdade dos participantes, porém dentro dos limites
impostos pelas regras da atividade.
Um aspecto importante de atividades livres é o desdobramento o
desenvolvimento contínuo da atividade em foco, já que as crianças envolvidas,
além de estarem representando um papel ativo no seu próprio
desenvolvimento, são também parceiros ativos na própria atividade (Joaquim,
2003). A situação de brincadeira livre parece permitir que as crianças, tanto no
desenvolvimento da atividade quanto no tratamento para com os colegas,
dêem vazão a sua espontaneidade, devidamente analisada pelas suas
iniciativas interacionais.
De fato, o brincar na situação livre tem sido amplamente reconhecido
como um agente em potencial que possibilita conhecer e compreender a
criança, colaborando para o processo de inserção social (Martinez, 2002;
Robles, 2001). Assim, frente aos resultados favoráveis da literatura acerca do
tema e com base no pressuposto de que, com um mínimo de interferência do
adulto, a criança poderia expressar melhor suas iniciativas durante a interação,
no presente trabalho procurou-se priorizar a análise durante as situações de
brincadeira livre ou atividade de jogo.
Anteriormente vista como um momento de descanso para os
educadores e divertimento para os alunos, sem qualquer função de
desenvolvimento, hoje a visão acerca da brincadeira tem se modificado
bastante. Assim, especialmente na década de 80, a brincadeira começa a ser
encarada como mais um aspecto do contexto educacional, além de forma de
ampliação das oportunidades de interação social (Carvalho, 1989). Hoje, no
Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (Brasil, MEC, 1998), a
brincadeira já aparece como um importante componente da educação infantil.
Morejón, Freitas e Munhóz (2001) indicam em seu estudo que é através
do brincar que são desenvolvidas habilidades de percepção, de raciocínio,
criatividade além de habilidades motoras, estimulando também o convívio em
grupo e a socialização.
20
Dentre todas as funções de desenvolvimento que o brincar promove
ganhos, as relacionadas ao desenvolvimento de linguagem e socialização são
bastante importantes, razão pela qual jogos e brincadeiras têm sido tão bem
estudados e recomendados em tais casos. Nas palavras de Gil et al. (2002),
para a criança, a brincadeira é “a melhor maneira de se comunicar, um meio
para perguntar e explicar, um instrumento que ela tem para se relacionar com
outra criança” (pg 06).
Há que ressaltar a importância desta evidência dentro do contexto deste
estudo pois estas características de comunicação e interação social são as
mais relevantes durante o desenvolvimento de crianças pequenas. Além disso,
estes fatores se tornam ainda mais importantes quando se consideram
crianças pequenas com necessidades educacionais especiais, em quem tais
características de desenvolvimento geralmente têm lugar mais tarde, o que
pode acabar sendo um fator crucial para a interação desta criança com o grupo
e, consequentemente, para o sucesso da inclusão.
De fato, como indica Robles (2002) e Gil et al. (2002) o brincar tem sido
alvo de muitas pesquisas na atualidade, e, muitas delas, procurando integrar os
conhecimentos acerca jogos/brincadeiras e a educação de indivíduos com
necessidades educacionais especiais.
Com relação a esta temática específica, pode-se dizer também que o
brincar livremente com os colegas coetâneos pode ser de grande valia no
processo de inclusão, já que o aumento crescente de complexidade observado
durante a brincadeira com crianças com desenvolvimento típico estimularia o
desenvolvimento da criança com necessidades especiais. Isso pode acontecer
tanto na forma de aquisição de linguagem, através da troca de instruções
durante o processo do brincar, ou mesmo no aumento da interação social
dentro do grupo (Robles, 2002).
A pesquisa de Gil et al. (2002) demonstra concordância com estes
dados, de modo que, a partir de atividades em oficinas pedagógicas com
turmas comuns, estes autores concluíram que as crianças com necessidades
especiais participantes de dinâmicas de jogos e brincadeiras levavam
consideravelmente seu vocabulário e suas manifestações orais com relação ao
grupo de crianças. Também foi observada maior cooperação entre os colegas,
21
e aumento na auto-estima das crianças incluídas, bem como de toda a turma,
tendo ocorrido mas momentos de interação em grupos.
Entretanto, há que se ressaltar que, até mesmo porque demonstra ser
válida para analisar a espontaneidade das crianças durante suas interações, a
situação de brinquedo livre pode, como visto no estudo de Mendes, Rosa e
Zambom (2003) potencializar a exclusão da criança com necessidades
especiais, se não houver um acompanhamento de perto e o olhar atento do
educador.
Neste estudo, a análise preliminar de 36 episódios observados em
situação de brinquedo, estes autores observaram uma grande diferença nos
tipos de episódios se a atividade observada era livre ou dirigida pelo educador.
Assim, quando em situação de brinquedo livre, a maioria dos episódios ilustrou
situações-problema, ou seja, situações em que as crianças-alvo ou não
participavam das brincadeiras ou estavam envolvidas em disputas por
brinquedos. Já nas situações de brinquedo dirigido, com jogos, atividades no
parquinho e na caixa de areia, a maior parte dos episódios foi considerada
positiva, tendo sido observados em nove ocasiões.
Tais resultados apontam que a falta de supervisão em situações de
brincadeira livre provavelmente aumentaria a chance de isolamento e falta de
participação das crianças no grupo. Por outro lado, nas situações de brinquedo
dirigido ainda há a ocorrência de situações-problema.
Com relação à educação infantil em específico e a creches, Robles
(2002) ainda indica que crianças pequenas brincam entre si, naturalmente, se
livres, sem a interferência de um adulto, de modo a construir ativamente suas
próprias atividades e se engajar mais em interações com os colegas.
Desta forma, a presente pesquisa priorizou a análise de dados durante
situações de brincar livremente ou em situações de jogos tanto com a
finalidade de captar de maneira mais a espontaneidade das crianças, em suas
iniciativas de interação para com os colegas, quanto para atentar se realmente
estas situações seriam propulsoras para que as interações ocorram de forma
mais natural.
Para tanto, brincadeira livre foi considerada como aquela em que as
crianças estivessem no parque ou em sala de aula, com o mínimo de
intervenção possível da professora, na presença ou não de brinquedos. Já os
22
jogos foram considerados como situações também em sala ou área livre em
que houvesse uma atividade predominante e estabelecida geralmente pelo
adulto, que, por sua vez, atue dando instrução de maneira mais constante, seja
no modo de realizar a atividade ou participando da situação.
23
MMÉÉTTOODDOO
O estudo tem como objetivo investigar, através da análise das iniciativas
e respostas interacionais, a interação da criança com deficiência e seus pares,
entendendo-se por interação uma seqüência de eventos comportamentais, em
que A faz X para B e B reponde com Y para A (Aranha, 2002).
Local
As observações foram feitas em uma creche da cidade de São Carlos,
em uma turma na qual existe uma criança com deficiência.
A creche participante é uma creche universitária, que disponibiliza seus
serviços para estudantes, funcionários e docentes vinculados a uma
universidade federal. Oferece atendimento para crianças de zero a seis anos, e
se localiza no campus da UFSCar. Cinco das sessões foram realizadas no
parque de recreações da creche, bastante amplo, arborizado e equipado com
vários brinquedos fixos, como pode ser visto na Figura 1. A Figura 2 mostra o
local onde a última sessão foi realizada, um espaço livre do lado de fora da
creche, circunscrito pelas paredes desta por um lado e pela cerca que divide o
terreno da universidade e seus arredores.
um escorregador,
Legenda:
Parte interna
Tanque de areia
Terreno inclinado
Casinha de madeira
Caixa d’água
Portão
Árvores
Gira-gira
Trepa-trepa
Balanços
Gangorras
Escorregador
Gramado
Figura 1. Parque de recreações da creche 1. Figura 2. Parte externa da creche 1.
24
Participantes
Fazem parte dessa pesquisa:
• Uma criança com deficiência, com a idade de quatro anos,
freqüentadora de uma creche regular, que será doravante
representadas pelo símbolo ÇA
• Seus colegas de turma (Ç ou Çs)
• Seus respectivos educadores (P)
Outros adultos que porventura foram incluídos nas filmagens também
foram indicados pelo símbolo P.
O participante LO é do sexo feminino e foi identificado pelos seus
educadores como portador de Síndrome de Down, e deficiência mental leve,
com atraso no desenvolvimento de linguagem. As queixas dos educadores
concentram-se no seu comportamento algumas vezes violento para com as
outras crianças. LO fica na creche no período vespertino e, de manhã,
freqüenta a escola especial da APAE do município.
Em sua sala, convive com mais 14 crianças, sendo sete meninas e sete
meninos, com idades ao redor de quatro anos. Há duas educadoras nesta sala
que permanecem todo o tempo com a turma e, algumas vezes por semana, há
também uma ajudante.
Procedimento de coleta de dados
A técnica utilizada para coleta de dados é a observação sistemática a
partir de filmagens da situação natural de sala em situações de rotina,
particularmente, de brincadeira livre. Esses episódios foram registrados em
horários os mais diferenciados possíveis durante o dia escolar, e em dias
alternados, para garantir uma maior amostragem do registro da grande
variedade dos comportamentos possíveis.
A criança alvo teve um total de seis sessões gravadas, cada sessão com
cerca de 20 minutos de duração, sendo 15 minutos de tomadas focais,
focalizando o sujeito alvo e cinco minutos de tomadas em varredura, filmando a
situação total, contribuindo para a compreensão do cenário físico e social em
25
que o sujeito focal estaria inserido. No total as tomadas focais somaram 87
minutos de filmagem e as de varredura, 30 minutos.
Antes da coleta de dados propriamente dita, com a realização de
filmagens, um primeiro contato com a instituição e com a sala foi estabelecido
através de visitas regulares. Nestas visitas, os objetivos do projeto foram
discutidos com a diretora e educadoras e foi feito também um processo de
observação participante da classe, para adaptação à rotina das crianças. Uma
breve apresentação do projeto também foi realizada para os responsáveis
pelos alunos e para os pais da criança-alvo, durante o pedido de colaboração
destes, individualmente ou em reunião pedagógica.
Procedimento de análise de dados
Através de um protocolo desenvolvido para este fim (ver o modelo nos
Anexos 1 e 2), com base em pesquisas da literatura (Aranha, 1991; Duarte,
1990; Joaquim, 2003) e observações anteriores em creches, as filmagens
foram analisadas, observando-se as seguintes categorias:
a. As iniciativas e respostas interacionais (que constituem o episódio
interativo);
b. A direção desses comportamentos;
c. O status das crianças;
d. A topografia dos comportamentos emitidos pelos sujeitos a
cada minuto de gravação.
a) Análise das iniciativas e respostas interacionai s
A escolha da análise de iniciativas comportamentais baseou-se na
hipótese de que elas revelariam a intencionalidade do emissor em estabelecer
interação social com seus parceiros, sendo tal interação consumada ou não.
Considera-se por uma iniciativa interacional (representadas no protocolo
pela letra I subscrita), o primeiro comportamento de uma cadeia de contatos
entre os sujeitos (por exemplo, manter contato visual, tocar, chamar pelo nome,
acenar), ou seja, a emissão dirigida a um parceiro de algum comportamento
comunicativo, que requeira uma resposta. Esse comportamento não pode ser
26
parte das interações precedentes e a partir dele dever-se-ia estabelecer um
foco comum de atenção entre os elementos da díade em questão (Duarte,
1990).
Ainda, as iniciativas e respostas interacionais podem ser consideradas:
• Respondidas (representadas por *) quando o sujeito para quem o
emissor dirigiu o comportamento inicial emite por sua vez um outro
comportamento em direção ao emissor, uma resposta interacional
(letra R subscrita);
• Ignoradas, quando o sujeito não emite nenhum comportamento em
direção ao emissor, ou emite respostas indicando recusa, como virar-
se e sair do local, virar o rosto em direção oposta, dar as costas ou
manter interação com outro parceiro.
É importante ressaltar aqui que a presença de iniciativas ignoradas
indica a falta de interação, pois o sujeito quem tentou iniciá-la não obteve
resultados. Da mesma forma, uma resposta ignorada indica o final de uma
interação, que pode ter acontecido de natural ou por interrupções externas.
Ainda, a quantidade de respostas respondidas demonstra a continuidade
da interação, ou seja, quanto mais comportamentos classificados desta forma,
maiores as cadeias de respostas observadas. Além disso, o fato de as
iniciativas ou respostas serem classificadas como respondidas foi também
considerado um indicador de mutualidade nos comportamentos interativos.
b) Análise da direção dos comportamentos
A fim de permitir descrever e comparar a freqüência e a qualidade das
iniciativas e respostas interacionais nos grupos e entre eles, a direção dos
comportamentos será classificada nas seguintes categorias:
• ÇA�Ç (criança alvo emite comportamento em direção à outra
criança);
• Ç�ÇA (criança emite comportamento em direção à criança alvo);
• ÇA�P (criança alvo emite comportamento em direção à professora);
• P�ÇA (professora emite comportamento em direção à criança alvo);
• P�Ç(s) (professora emite comportamento em direção a crianças).
27
c) Análise do status da criança
O registro deverá indicar o status da criança alvo em cada um dos 15
minutos das tomadas focais, e, nas tomadas de varredura, o status das outras
crianças. Essa classificação poderá ser indicada de quatro maneiras:
I: isolado . Episódios em que o sujeito se encontra distante de qualquer outra
pessoa, sem demonstrar apresentar nenhuma interação social
detectável.
S: sozinho . Episódios em que o sujeito se encontra distante de qualquer outra
pessoa, porém demonstra comportamentos verbais em direção aos
outros sujeitos como vocalizações ocasionais ou observação de alguém
ou alguma atividade.
G: agrupado . Episódios em que o sujeito se encontra próximo de outras
pessoas sem demonstrar apresentar nenhuma interação social ativa
detectável. O sujeito em questão pode estar nas seguintes situações:
• Brincar paralelo: “Episódios em que os parceiros encontram-se
juntos, envolvidos em atividades semelhantes ou diferentes, com
objetos do mesmo conjunto de brinquedos, intercaladas por
olhares ocasionais ao(s) parceiro(s)” (Aranha, 1990, pg 76).
• Estar com: “Episódios em que os parceiros encontram-se
sentados juntos, sem desenvolver qualquer atividade, sendo que
o único indício de mutualidade detectável é o da aceitação
comum da proximidade” (Aranha, 1990, pg 76).
• Observar: “Episódios em que os parceiros encontram-se juntos,
sendo que o sujeito focal permanece olhando, “assistindo” a
atividade do(s) parceiro(s)” (Aranha, 1990, pg 76).
GI: agrupado em interação . Episódios em que o sujeito focal se encontra
próximo de outras pessoas, e envolvido em algum tipo de contato social
ativo, apresentando comportamentos verbais (iniciativas ou respostas)
em relação a outros (Aranha, 1990).
Para efeito de registro, considerou-se como critério de proximidade a
possibilidade, concretizada ou não, e que a criança analisada pudesse tocar
algum parceiro. Ou seja, um sujeito A foi definido como estando próximo a
28
outro sujeito B quando B estivesse suficientemente perto para poder ser tocado
por A, caso este estendesse os braços, por exemplo. Da mesma forma, caso
os sujeitos estivessem fora do alcance um do outro, foram considerados
distantes entre si.
d) Análise da topografia dos comportamento apresent ados pelos sujeitos
Os tipos de comportamentos apresentados pelo participante também
serão analisados de acordo com um roteiro de observação que contém uma
seleção de tipos de repertórios recolhida de observações anteriores e da
literatura afim (Aranha, 1991; Duarte, 1990; Joaquim, 2003; e Prodocimo,
1994). Assim, cada comportamento é enquadrado em uma categoria e é
representado por uma letra para anotação no protocolo. Esta compilação pode
ser encontrada nos Anexos 3 e 4.
As categorias onde cada comportamento se encaixa são:
• Vocalizações;
• Comportamentos mediados por objetos;
• Comportamentos que envolvam contato físico;
• Outros.
Esta última categoria engloba comportamentos como observar outra
criança, aproximar-se dela sem tocá-la, sorrir, ente outros. Todo
comportamento listado é descrito e exemplos de situações em que poderia vir a
ocorrer são dados.
29
IIMMPPLLIICCAAÇÇÕÕEESS ÉÉTTIICCAASS
No desenvolvimento da pesquisa, todos os cuidados foram tomados
para observar os princípios éticos que regem pesquisas com participação
voluntária de seres humanos. A pesquisa proposta não causou nenhum tipo de
dano físico, psicológico ou moral aos participantes, de modo que todos eles ou
seus responsáveis foram informados claramente dos objetivos do estudo antes
de solicitada a colaboração, e o sigilo foi garantido.
O projeto foi também apresentado e aprovado pelas autoridades da
Secretaria Municipal de Educação e Cultura da cidade de São Carlos em
reunião com a Coordenadora Pedagógica de Educação Especial.
Todos os participantes (diretor, educador e um responsável pela criança,
assinaram os respectivos termos de consentimento, cujos modelos seguem
nos Anexos 5, 6 e 7.)
Todas as partes interessadas também terão acesso aos resultados e
conclusões do estudo realizado, e tiveram plena liberdade para interromper, a
qualquer momento, sua participação na pesquisa se assim desejassem.
Os resultados da pesquisa, se publicados, terão os cuidados que forem
considerados necessários. A identidade dos sujeitos será preservada, e
somente os pesquisadores terão acesso aos dados brutos do estudo. O projeto
principal do qual este estudo faz parte foi encaminhado para aprovação ao
CEP-UFSCar - Comitê de Ética em Pesquisa para Experimentos em Seres
Humanos, registrado no CENEP/Conselho Nacional de Saúde, pelo ato de 18
de março de 1997. Foi aprovado e aceito no dia 07 de abril de 2003 pelo
protocolo 001/03, cuja cópia segue no Anexo 8.
30
RREESSUULLTTAADDOOSS
A descrição final será efetuada tomando como base o conjunto das 6
sessões, considerando-se a distribuição das freqüências em cada uma das
categorias de análise (iniciativas e respostas interacionais, direção desses
comportamentos; status da criança; e os tipos de comportamento dos sujeitos)
comparando-se as tomadas focais e de varredura.
Tais análises têm por objetivo possibilitar lançar luz sobre como a
criança com Síndrome de Down está inserida no grupo social, tomando como
base uma descrição de como são seus comportamentos sociais em relação à
freqüência, intencionalidade, tipo e reciprocidade, bem como saber como é a
relação dos colegas e do adulto em relação à criança com deficiência,
comparando-se essas mesmas relações do educador com os colegas e dos
colegas entre si, a fim de estimar como é a aceitação social da criança inserida
no grupo, e produzir indicadores acerca do sucesso da inclusão escolar.
Criança (LO) STATUS DAS CRIANÇAS
O status da criança foi registrado nas duas tomadas, minuto a minuto, em cada
uma das sessões, e estes dados se apresentam compilados nas tabelas 1. e 2.
A Tabela 1. apresenta os dados relativos ao status da criança alvo LO através
da soma de cada ocorrência dentro dos quinze minutos de tomadas focais,
sendo que a soma total de minutos oferece uma estimativa do tempo total em
que a criança permaneceu em cada categoria de status, em relação ao total de
87 minutos analisados.
Nas tomadas de varredura, a análise foi feita de uma maneira distinta da
feita para as tomadas focais, já que os resultados nas categorias revelam
dados também diferentes, isto é, enquanto que nas tomadas focais os dados
referiam-se a somente uma criança em um intervalo de tempo, nas tomadas de
varredura, a classificação do status englobou todas as crianças presentes nos
cinco minutos de filmagem. Assim, para que os dados pudessem ser colocados
em uma perspectiva comparativa calculou-se para cada sessão, o número
relativo de crianças levando-se em consideração a quantidade de crianças em
31
cada categoria e o total de crianças observadas nos cinco minutos de
filmagens.
Assim, obteve-se, por sessão, o escore relativo a quantos minutos os
participantes foram considerados como pertencentes a cada categoria de
status. Tais dados, assim como o cálculo da percentagem deste tempo dividido
em categorias de análise, com relação aos 30 minutos totais de tomadas de
varredura se encontram na tabela 2.
Assim, a partir destes dados pode-se perceber que tanto na análise da
criança-alvo LO (nas tomadas focais) quanto na análise do grupo de crianças,
o status predominante foi o de GI, seguido por G, I e S, nesta ordem, como
pode ser visto na Figura 3.
SESSÃO
STATUS 1 2 3 4 5 6 TOTAL % DO
TOTAL I 0 3 2 2 5 5 17' 19.54 S 0 3 0 1 0 0 4' 4.6 G 6 5 6 2 3 3 25' 28.74 GI 9 3 7 8 7 7 41' 47.13
TOTAL 15 19 15 13 15 15 87’ 100
SESSÃO
STATUS 1 2 3 4 5 6 TOTAL % DO
TOTAL I 1 0 1,29 0,65 0,2 0,57 3,71 12,37 S 0 0 0 1 0,4 0 1,4 4,67 G 1,5 0,4 1,1 0,2 1,83 0 5,04 16,8 GI 2,5 4,6 2,6 3,15 2,57 4,43 19,85 66,16
TOTAL 4 5 4,99 5 5 5 30’ 100
Tabela 1. Distribuição das categorias de status (Isolado, Sozinho, Agrupada, Agrupada em Interação), nas seis tomadas focais da criança alvo.
Tabela 2. Distribuição das categorias de status (Isolado, Sozinho, Agrupada, Agrupada em Interação), nas seis tomadas de varredura para as crianças presentes durante as filmagens.
32
Comparando-se os dois tipos de tomadas (focal e de varredura)
percebe-se que o status predominante em ambas foi o de GI (Agrupada em
Interação), seguindo por G (Agrupada).
Entretanto, embora elas permaneçam a maior parte do tempo em grupo,
observa-se que a criança-alvo tende a ficar um tempo menor interagindo, ou na
condição GI (47,13%) do que os colegas, que permaneceram 66,16%
agrupados e em interação.
Essa diferença torna-se ainda mais acentuada quando se leva em
consideração as duas categorias que indicam algum tipo de interação, GI
(agrupado em interação) e S (sozinho mas interagindo) já que a soma delas
para as tomadas focais alcança pouco mais de metade dos minutos analisados
(51,72%), e a mesma soma nas tomadas de varredura, ou seja, na ausência da
criança-alvo, consegue atingir um índice de 70,83% do total do tempo de
observação.
A criança-alvo LO também permaneceu um tempo maior na condição
“Isolado” (19,54% do tempo) do que seus colegas, que permaneceram em
média cerca de 12,27% do tempo, nesta situação.
A Figura 4. apresenta a proporção de tempo observada em cada umas
das categorias de status, para cada sessão de observação, nos dois tipos de
tomadas (varredura e focal). Assim, para as tomadas focais, o intervalo de
GIG
SI
FocaisVarredura
0
20
40
60
80
100
Figura 3. Estimativa da proporção de tempo de permanência em cada uma das categorias de status: I (Isolado), S (Sozinha), G (Agrupada) e GI (Agrupada em Interação), nas tomadas de varredura e nas tomadas focais para a Criança 1 (LO).
33
tempo varia entre 0 e 15 minutos, o tempo total da sessão, e, para a de
varredura, de 0 a 5 minutos.
FOCAIS
VARREDURA
INICIATIVAS E RESPOSTAS INTERACIONAIS
Para verificar os resultados relacionados à quantidade de iniciativas e
respostas interacionais, Essa diferença torna-se ainda mais acentuada quando
Figura 4. Distribuição através das seis sessões de observação com relação ao status da criança-alvo nas tomadas focais e de seus colegas nas tomadas de varredura.
0
1
2
3
4
5
1 2 3 4 5 6
sessões
I
S
G
GIc
02468
101214
1 2 3 4 5 6
sessões
I
S
G
GI
34
se leva em consideração as duas categorias que indicam algum tipo de
interação, GI (agrupado em interação) e S (sozinho mas interagindo) já que a
soma delas para as tomadas focais alcança pouco mais de metade dos
minutos analisados, 51,73%, e a mesma soma nas tomadas de varredura, ou
seja, na ausência da criança-alvo, consegue atingir um índice de 79,84% do
total do tempo de observação, evidenciando uma diferença de 19,11% ente
elas.
Foi também calculada a somatória dos comportamentos para cada uma
das díades, nas categorias de iniciativas e respostas e, nas subcategorias
entre iniciativas respondidas e ignoradas e respostas respondidas e ignoradas.
Tal compilação está presente na Tabela 3, relacionada aos
comportamentos analisados nos 87 minutos de tomadas focais. A mesma
análise feita a partir dos comportamentos observados nas tomadas de
varredura se encontra presente na Tabela 4, como pode ser visto a seguir.
CPTOS I TOTAIS I I* R TOTAIS R R* T OTAL
ÇA-Ç 84 70 14 45 12 33 129 Ç-ÇA 40 27 13 44 5 39 84 ÇA-P 67 33 34 288 17 271 355 P-ÇA 124 72 52 270 18 252 394
TOTAL 315 202 113 647 52 595 962
A Figura 5. apresenta os resultados da distribuição em porcentagem de
freqüência de iniciativas e respostas de interação observadas, segundo os
tipos de díades da situação, nas tomadas focais de c1 e nas tomadas de
varredura da turma de c1.
CPTOS I TOTAIS I I* R TOTAIS R R* T OTAL Ç-Ç 118 58 60 182 19 163 300 Ç-P 18 8 10 36 6 30 54 P-Ç 27 15 12 46 8 38 73
TOTAL 163 81 82 264 33 231 427
Tabela 3. Freqüência das iniciativas e respostas observadas nas tomadas focais para a Criança 1.
Tabela 4. Freqüência das iniciativas e respostas observadas nas tomadas de varredura dos colegas de C1.
35
FOCAIS VARREDURA
Assim, nota-se que a quantidade de comportamentos emitidos nas
sessões focais foi de 962, ou uma freqüência de 11,06 comportamentos por
minuto, considerando-se que o tempo total de videogravações de 87 minutos
para esta criança. Este índice, quando são analisadas as tomadas de
varredura, sobe para 14,23, já que o total de comportamentos foi de 427 em 30
minutos de tomadas de varredura. Os resultados indicam, portanto que os
colegas tendem a emitir em média maior número de comportamentos
interativos do que a criança alvo c1.
Tais comportamentos quando se considera díades com os mesmos
sujeitos (ou seja, somando-se as freqüências de comportamentos de P-ÇA e
ÇA-P; ÇA-Ç e Ç-Ç, e assim por diante) mostram mais claramente que uma
diferença no tipo de interação predominante nas diferentes tomadas, ou seja,
ocorrem predominante interações entre crianças quando a criança-alvo não
está presente, enquanto que na sua presença as interações predominantes são
entre ela e o adulto.
Assim, como pode ser visto, um fato bastante relevante é que nas
interações das crianças e o adulto nas tomadas focais somam um total de
77,86% do total de comportamentos observados nestas tomadas, enquanto
que nas tomadas focais somam 70,26% do total.
Com relação à prevalência dos comportamentos observa-se que, nas
tomadas focais, a maioria dos comportamentos se concentrou na direção P-
ÇA, com 394 comportamentos (40,96%). A reciprocidade destas interações
pôde também ser verificada já que a freqüência de comportamentos observada
0
20
40
60
80
100
ça-ç ç-ça ça-p p-ça
i
i*
r
r*
0
20
40
60
80
100
ç-ç ç-p p-ç
i
i*
r
r*
Figura 5. Distribuição relativa nas díades dos comportamentos observados distribuídos em iniciativas ignoradas, iniciativas respondidas, respostas ignoradas e respostas respondidas nas tomadas focais para C1 e nas de varredura para seus colegas.
36
na díade ÇA-P apresentou aproximadamente os mesmos índices, ou seja, 355
comportamentos (36,9% do total).
As interações entre C1 com as demais crianças é bem menos freqüente,
em comparação com sua interação com o adulto, pois foi observada uma
ocorrência expressivamente menor de comportamentos (84), sendo a maioria
na direção ÇA-Ç, e em menor escala na direção Ç-ÇA.
Nas tomadas de varredura, a maior concentração de comportamentos foi
observada na díade entre colegas (Ç-Ç), com 300 comportamentos, (70,26%
do total), enquanto que nas díades envolvendo o adulto e os colegas (Ç-P)
foram observados 54 comportamentos, e 27 comportamentos nas díades P-Ç,
A reciprocidade foi observada já que a freqüência de comportamentos nestas
díades não teve grande variação entre si. Para a categoria Ç-C esta análise
não se aplica, pois o procedimento de varredura analisa o grupo como um todo,
sem especificações individuais por criança.
Com relação às tomadas de varredura, na díade de maior concentração
de comportamentos, Ç-Ç, percebe-se uma grande prevalência de respostas
respondidas, 163 ou 54,33% do total de 300 comportamentos apresentados
pela díade. Há também 58 iniciativas ignoradas, ou 19,33% do total, 60
iniciativas respondidas (20%) e 19 respostas ignoradas (6,33%).
Revela-se aqui uma tendência de interação quando se compara o total
de comportamentos observados dentro das díades, já que, deste total dentro
das sessões focais, isto é, 962 comportamentos, a díade P-ÇA apresentou 40,
96% deles, e ÇA-P, 36,90%, contra, nas tomadas de varredura, 17,1% em P-Ç
e 12,65% em Ç-P. As porcentagens das interações entre as crianças foram,
por sua vez, de 13,41% para a díade ÇA-Ç e 8,73% para Ç-ÇA nas tomadas
focais contra 70,26% na díade Ç-Ç.
Estes mesmos dados também foram alisados com base nos tipos de
comportamento emitidos (i, i*, r ou r*). Desta forma pôde-se perceber que, dos
962 comportamentos observados nas tomadas focais, 315 foram iniciativas,
202 ignoradas e 113 respondidas, correspondendo respectivamente a 20,91%
e 11,75% do total de comportamentos.
Com relação às respostas, observa-se que tiveram um maior número de
emissões, somando 647 comportamentos no total, sendo 52 ignorados (5,4%
do total de comportamentos) e 595 respondidos (61,85% do total).
37
Analisando-se estes mesmos resultados em cada uma das direções
interativas percebe-se que, das iniciativas ignoradas, a maioria, 35,64%, teve
lugar na díade P-ÇA, seguida por 34,65 em ÇA-Ç, enquanto que se observou
apenas 13,37% na díade Ç-ÇA, e 16,34% em ÇA-P.
Em relação às iniciativas respondidas, tem-se que a maior concentração
encontrada coincide à encontrada na categoria anterior, ou seja, na díade P-
ÇA, com 46,02% do total de iniciativas respondidas, porém os outros
resultados se mostram diferentes a partir de então, com 30,09% do total
encontrado em ÇA-P, 12,39% em ÇA-Ç e apenas 11,5% em Ç-ÇA.
As respostas obtiveram resultados levemente diferentes dos
encontrados na análise das iniciativas, de modo que, para as respostas
ignoradas, 34,61% das emissões foi encontrada da direção da díade P-ÇA,
seguida por 32,69% em ÇA-P, 23,08% em ÇA-Ç e somente 9,61% em Ç-ÇA.
Para as respostas respondidas, os resultados foram os seguintes:
45,56% pertenceram à categoria ÇA-P, 42,35 à díade P-ÇA, 6,55% a Ç-ÇA e o
restante, 5,55% a ÇA-Ç.
Estes dados encontram-se na Figura 6, a seguir, que contém esta
análise para as tomadas focais da criança LO, bem como os dados pertinentes
à análise das tomadas de varredura de seus colegas.
FOCAIS VARREDURA
A análise das tomadas de varredura deste sujeito, como vista na Figura
5. acima, indicou que, do total de comportamentos observados nestas
tomadas, isto é, 427 emissões, observou-se 163 iniciativas, sendo 81 destas
Figura 6. Distribuição da freqüência dos comportamentos nas categorias (i, i*, r e r*), nas díades ÇA-Ç, Ç-ÇA, ÇA-P e P-ÇA, das tomadas focais da criança 1 e de seus colegas, nas tomadas de varredura.
0
20
40
60
80
100
i i* r r*
ça-ç
ç-ça
ça-p
p-ça
0
20
40
60
80
100
i i* r r*
ç-ç
ç-p
p-ç
38
(18,97% de 427) ignoradas e 82 respondidas (19,2%). As respostas somaram
264 comportamentos, divididas em 33 respostas ignoradas (7,71% dos
comportamentos ao todo) e 231 respondidas, ou 54,1% do total de
comportamentos.
Mais especificamente por díades, as iniciativas ignoradas estiveram
presentes de forma bastante prevalecente em Ç-Ç, com 71,6% de seu total
nesta direção interativa. Ainda, 18,52% foram encontradas em P-Ç e 9,88% em
Ç-P. Os números para as iniciativas respondidas se mostraram próximos à
categoria anterior, com 73,17% de iniciativas respondidas dentro da díade Ç-Ç,
14,63% em P-Ç e 12,19% em Ç-P.
Nas respostas analisadas a partir das tomadas de varredura, das
ignoradas, essa tendência não se apresenta, de modo que 57,57% foram na
direção Ç-Ç, 24,24% na direção P-Ç e 18,18% em Ç-P. Com relação às
respostas respondidas, pode ser percebida a mesma distribuição encontrada
nas duas primeiras díades, já que 70,56% dos comportamentos observados
nesta categoria foram encontrados na díade Ç-Ç, 16,45% em P-Ç e 12,99% na
direção Ç-P.
A partir destes dados torna-se importante ressaltar que a maioria dos
comportamentos, tanto nas tomadas focais quanto nas de varredura, foram
considerados respostas respondidas, o que pode ser considerado um indicador
válido da continuidade e reciprocidade das interações.
Nota-se também que, embora a prevalência seja a mesma, para ambas
as tomadas, há uma diferença entre elas já que nas tomadas focais, quando a
criança-alvo esteve presente, foram observadas 595 respostas respondidas, ou
61,85% do total de comportamentos analisados, enquanto que nas tomadas de
varredura este número foi de 231, ou 54,1% do total.
Entretanto, ao se verificar o total deste tipo de comportamento dividido
em cada uma das díades, nota-se que a grande maioria dele, nas tomadas
focais, ocorreu em P-ÇA (252 comportamentos, ou 42,35% do total de
respostas respondidas) e Ç-P (271, ou 45,55% delas), ou seja, entre o adulto e
a criança. Já para as tomadas de varredura estes números se invertem,
concentrando-se nas interações entre as crianças (Ç-Ç), com 70,56% de todas
as respostas respondidas.
39
TOPOGRAFIA DOS COMPORTAMENTOS
Para a análise da topografia dos comportamentos encontrados nas
sessões de videogravação foi feito o calculo da freqüência dos
comportamentos através das díades, para cada uma das díades e a
classificação destes em Vocalizações, Comportamentos não vocais mediados
por objetos, Comportamentos que envolvam contato físico, e Outros tipos de
comportamentos.
Estes dados, isto é, a quantidade de comportamentos pertencentes a
cada uma destas categorias de análise, divididos nas díades de interação com
relação às tomadas focais da criança 1 estão disponibilizados na tabela 5. A
tabela 6. Indica os resultados para as tomadas de varredura.
TIPOS DE
CPTO VOCALIZAÇÕES MEDIADOS POR
OBJETOS CONTATO
FÍSICO OUTROS TOTAL
ÇA-Ç 10 41 15 63 129
Ç-ÇA 23 15 4 42 84
ÇA-P 159 60 0 136 355
P-ÇA 252 44 25 73 394
TOTAL 444 160 44 314 962
A partir destes dados pode-se perceber que a topografia predominante
de comportamento diferiu entre as tomadas. Nas tomadas focais foram
observadas 444 vocalizações (46,15%), 160 Comportamentos mediados por
objetos (16,63%), 44 com envolvimento de contato físico (4,5%), e 314 foram
considerados outros (35,55).
TIPOS DE
CPTO VOCALIZAÇÕES MEDIADOS
POR OBJETOS CONTATO
FÍSICO OUTROS TOTAL
Ç-Ç 144 65 16 75 300
Ç-P 20 14 0 20 54
P-Ç 59 8 0 6 73
TOTAL 223 87 16 101 427
Tabela 5. Freqüência dos tipos de comportamentos analisados nas tomadas focais da criança 1.
Tabela 6. Freqüência dos tipos de comportamentos analisados nas tomadas de varredura da criança 1.
40
A prevalência dentro das díades foi a categoria Vocalizações para ÇA-P
e P-ÇA, com 159 e 252 ocorrências, respectivamente. Já nas díades ÇA-Ç e Ç-
ÇA, a categoria predominante foi a de Outros comportamentos, com 63 e 42
assim classificados.
Para as tomadas de varredura, em duas díades a categoria
predominante foi a de Vocalizações (com 144 na díade Ç-Ç e 59 em P-Ç). Na
díade Ç-P foram duas categorias com maior número de emissões,
Vocalizações e Outros, com 20 comportamentos cada.
A Figura 7. apresenta os dados referentes à freqüência relativa da
topografia das ações interativas para C1 nas tomadas focais e para seus
colegas nas tomadas de varredura.
FOCAIS VARREDURA
Especificamente dentro de cada categoria tem-se que, para as tomadas
focais, na díade ÇA-Ç houve 10 vocalizações (7,75% do total de
comportamentos da díade), 41 comportamentos mediados por objetos
(31,78%), 15 comportamentos que envolvessem contato físico (11,63%) e 63
considerados outros tipos (48,84%).
Na direção oposta, ou seja, na díade Ç-ÇA, foram encontrados 84
comportamentos, 23 vocalizações (27,38%), 15 comportamentos mediados por
objetos (17,86%), 04 comportamentos que envolveram contato físico (4,76%), e
42 outros tipos (50% do total).
Entre a criança-alvo e o adulto observou-se a seguinte configuração: na
díade ÇA-P houve 159 emissões de vocalizações (44,79%) (analisados nesta
direção), 60 comportamentos mediados por objetos (16,9%) nenhum
0
20
40
60
80
100
ça-ç ç-ça ça-p p-ça
vocalizações
objetos
contato
outros
c
0
2 0
4 0
6 0
8 0
1 0 0
ç a -ç ç -ç a ç a -p
vo c a liza ç õ e s
o b je to s
c o n ta to
o utro s
Figura 7. Freqüência relativa da topografia dos comportamentos observados da criança-alvo C1 nas diferentes díades analisadas nas tomadas focais e de varredura de C1, considerando-se as categorias: Vocalizações, Comportamentos mediados por objetos, Comportamentos envolvendo contato físico e Outros tipos de comportamento.
41
comportamento que envolvesse contato físico e 136 (38,31%) não foram
incluídos em nenhuma destas categorias tendo sido, assim, considerados
outros..
Nas tomadas de varredura esta análise revelou que houve um total de
223 vocalizações, 87 comportamentos mediados por objetos, 16 com
envolvimento de contato físico, e 101 foram considerados outros.
Mais especificamente na díade Ç-Ç, dos 300 comportamentos
observados, 144 foram vocalizações (48%), 65 comportamentos mediados por
objetos (21,67%), 16 envolvendo contato físico (5,33%) e 75 considerados
como outros (25%).
Com relação aos 54 comportamentos observados entre crianças e
adultos, na direção Ç-P, 20 foram vocalizações (37,04%), 14 comportamentos
mediados por objetos (25,92%), nenhum que envolvesse contato físico e outros
20 considerados outros tipos (37,04%). Na direção oposta, P-Ç, foram
observadas 73 comportamentos, dos quais 59 foram vocalizações (80,82%), 08
comportamentos mediados por objetos (10,96%), nenhum envolvendo contato
físico, e 06 considerados outros (8,22%).
Analisando-se estes mesmos resultados, em cada uma das direções
interativas, percebe-se que, das vocalizações observadas nas tomadas focais,
somente 2,25% foram encontradas da díade ÇA-Ç, e 5,18% foram na direção
oposta, Ç-ÇA, enquanto que em ÇA-P houve 35,81% do total de vocalizações,
e a maioria, 56,76% foi encontrada na direção Ç A.
Já os comportamentos mediados por objetos foram observados
predominantemente na díade ÇA-P, com 37,5% do total deles. A díade P-ÇA
conseguiu 27,5% do total, ÇA-Ç alcançou 25,62% e Ç-ÇA, 9,37%.
Com relação aos comportamentos envolvendo contato físico, tem-se que
a díade ÇA-Ç alcançou 34,09% do total, a díade Ç-ÇA, 9,09%, P-ÇA obteve
56,82% e a direção oposta, ÇA-P não apresentou nenhum comportamento
assim classificado. Já na categoria Outros esta díade (ÇA-P) conseguiu
43,31% do total, enquanto que P-ÇA obteve 23,25%.
Entre as crianças os resultados foram 20,06% do total na direção ÇA-Ç,
e 13,37% em Ç-ÇA. A Figura 12. Ilustra estes dados, ou seja, a distribuição nas
díades de cada topografia comportamental analisada, nas tomadas focais da
criança 1.
42
Com relação às tomadas de varredura um dado relevante observado foi
o de que a grande maioria dos comportamentos em todas as categorias de
análise foi encontrada na díade Ç-Ç, com 64,57% das vocalizações, 74,71%
dos mediados por objetos, 100% dos comportamentos envolvendo contato
físico e 74,26% dos considerados outros.
Assim, mais especificamente, acerca das vocalizações as outras díades
alcançaram 26,46% em P-Ç, e 8,97% em Ç-P. Nos comportamentos mediados
por objetos, a díade Ç-P obteve 16,09% do total e P-Ç, 9,19%. Para os
comportamentos que foram considerados como outros tipos, a díade Ç-P teve
19,8% do total e sua direção oposta, a díade P-Ç, 5,94%.
A Figura 8. apresenta a distribuição nas díades de cada categoria de
análise dos comportamentos (vocalizações, comportamentos não vocais
mediados por objetos, comportamentos que envolvam contato físico, e outros
tipos de comportamentos), nas tomadas de varredura do sujeito 1.
FOCAIS VARREDURA
Ainda, quando se toma como foco as freqüências das categorias de
comportamento nas duplas de interação (ÇA-Ç somada a Ç-ÇA, e assim por
diante), e se compara os resultados obtidos nas tomadas focais e de varredura
para a mesma criança, observa-se a seguinte configuração: nas vocalizações,
a interação prevaleceu entre as crianças nas tomadas de varredura com
64,57% do total de vocalizações, e nas tomadas focais as maiores ocorrências
estiveram entre adulto e criança, com um total de 92,57% das vocalizações.
Figura 8. Distribuição da freqüência dos tipos de comportamento divididos nas díades ÇA-Ç, Ç-ÇA, ÇA-P e P-ÇA com relação a cada uma das categorias (Vocalizações, Comportamentos não vocais mediados por objetos, Comportamentos que envolvam contato físico, e Outros tipos de comportamentos) nas tomadas focais e de varredura da criança 1.
0
20
40
60
80
100
vocalizações objetos contato outros
ça-ç
ç-ça
ça-p
p-ça
0
20
40
60
80
100
vocalizações objetos contato outros
ç-ç
ç-p
p-ç
43
v ocalizaçõesobjetos
contato fis icooutros
Focais
Varredura
0
20
40
60
80
100
Já para os comportamentos mediados por objetos, nas tomadas focais
prevaleceu a interação ente as crianças e o adulto, com 64,87% do total em
oposição aos 64,57% observados entre as crianças nas tomadas de varredura.
Na categoria de comportamentos envolvendo contato físico predominaram as
interações entre a criança-alvo e o adulto nas tomadas focais com 56,82% do
total, contra 100% deles ocorrendo entre as crianças nas tomadas de
varredura.
Os comportamentos considerados como outros também predominaram
entre a criança-alvo e o adulto nas tomadas focais, com 66,56% do total deles,
contrastando com os dados das tomadas de varredura que indicam uma maior
interação entre as crianças, com 74,26% do total de comportamentos assim
classificados.
Esta comparação entre a interação verificada entre as crianças e entre
adulto e criança nas tomadas focais e de varredura do sujeito 1. pode ser
visualizada na Figura 9., a seguir.
Interações entre as crianças
Interações entre adulto e crianças
Figura 9. Interação entre adultos e crianças e entre as crianças nas tomadas focais e de varredura da criança 1, com relação à topografia comportamental.
44
CCOONNCCLLUUSSÕÕEESS
A partir dos resultados parciais obtidos, algumas conclusões importantes
foram extraídas acerca tanto do cotidiano do ambiente analisado enquanto
situações únicas em sua especificidade, quanto da problemática geral da
Inclusão Educacional.
O dado mais relevante conseguido através da análise das filmagens
desta criança foi o de que, quando as crianças estavam livres para interagir, ou
seja em situação de brincadeira não dirigida no parque da creche, as
interações entre elas diminuíam em termos de taxa de comportamentos
emitidos, em cerca de 20%, quando a criança com deficiência era um dos
parceiros da díade em questão. Isso aconteceu tanto com relação às crianças
com desenvolvimento típico em direção à criança-alvo quanto na direção
oposta, da criança-alvo para com elas.
Assim, embora todas as crianças permaneçam a maior parte do tempo
em grupo, observa-se que a criança-alvo tende a ficar um tempo menor
interagindo, já que quando a análise enfocava o relacionamento da criança-
alvo, em pouco mais da metade, 51,72% do período de tempo estudado, esta
foi categorizada como em alguma forma de interação, e a mesma análise na
ausência da criança-alvo consegue atingir um índice de 70,83% do total do
tempo de observação.
Tal fato, em uma primeira análise pode indicar uma certa posição de
isolamento e rejeição do grupo com relação à criança com deficiência, um dado
que vem se tornando comum na literatura mesmo entre crianças pequenas,
como indica Mendes, Zambom e Silveira (2004). Esta possibilidade se torna
bastante preocupante quando se considera que a atitude das crianças
pequenas em uma instituição pode ser um reflexo em si da atitude geral da
própria instituição, dos educadores, do diretor e mesmo pais acerca do
processo de inclusão. Além disso, tal atitude poderia colocar em risco o
processo inclusivo desta criança como um todo, já que a aceitação social pelos
pares coetâneos seria de fato o meio mais eficaz para avaliar o sucesso ou
fracasso da Inclusão, fato este sustentado por diversos autores como
Prodocimo (1994) e Duarte (1990).
45
A inclusão social só poderia haver sido alcançada quando crianças
tipicamente desenvolvidas mantiverem a mesma qualidade de relacionamentos
interpessoais com crianças com atrasos no desenvolvimento como com
crianças sem atrasos (Schratzman, 1997). Entretanto, através da análise feita,
foi observada algum tipo de situação de isolamento (em que o status da criança
em questão foi considerado como isolado) em cinco das seis sessões de
filmagem, ou seja, 83,33%, contra 66,67% (4 sessões) para as outras crianças.
Aranha (1991) concorda com tal possibilidade de isolamento, pois indica
em sua pesquisa que as crianças com deficiência parecem ter, de fato, menor
freqüência de contato com relação ao ritmo e intensidade.
Da mesma forma, quando a criança-alvo iniciava uma interação, na
grande maioria das vezes (70 vezes em 84 iniciativas observadas), as outras
crianças a ignoravam (quando a iniciativa interacional não fosse respondida de
alguma forma),o que também ocorreu, embora em menor proporção na direção
oposta (criança-alvo para outras crianças), com 27 das 40 iniciativas dos
colegas tendo sido ignoradas pela criança com deficiência.
Tais dados entrem em concordância com os encontrados por Duarte
(1994), em sua análise das iniciativas interacionais entre as crianças com
necessidades especiais e seus pares, em que um resultado similar foi
encontrado, pois os episódios não efetivados mais freqüentes, ou seja,
iniciativas que foram ignoradas pelo par, estiveram presentes na direção das
crianças para a criança-alvo.
Estes achados encontram-se em concordância também com vários
autores da literatura, como Monteiro (1997), que indica em seu estudo com
crianças com Síndrome de Down que a participação destas nas salas lhes
delegava um papel de observador não atuante, passando a maior parte do
tempo sem interagir com os colegas.
Por outro lado, as interações entre a criança-alvo e o adulto foram
observadas em grande quantidade, em ambas as direções, quando
comparadas com a interação entre adulto e as demais crianças da sala, fato tal
que contradiz a hipótese de isolamento social contínuo da criança com
deficiência.
A freqüência de comportamentos observados durante todo o período de
análise mostra alguma diferença entre as situações que envolviam ou não a
46
criança com deficiência, como alguns dados poderiam levar a concluir e alguns
autores sugerem, como é o caso de Harper (2002), que observou uma
diferença de quase duas vezes a freqüência bruta de comportamentos nas
crianças com desenvolvimento típico em relação àquelas com Síndrome e
Down.
Contudo, os presentes resultados não obtiveram essa diferença, já que,
quando se comparou os dois momentos de análise, em que o foco eram as
interações com a criança-alvo, ou quando verificava-se o comportamento do
restante da sala, sem a presença desta criança, obteve-se que no primeiro
caso foram emitidos cerca de 11,06 comportamentos por minuto e, no
segundo, observou-se 14,23 comportamentos por minuto.
Embora presente, esta diferença demonstra ser pequena, e se torna
ainda menos acentuada quando se leva em consideração que na primeira
situação de análise (Tomadas Focais), todos os comportamentos registrados
referem-se e alguma foram a um só sujeito, à criança-alvo, seja em qualquer
das direções de análise (criança-alvo para adulto, criança-alvo para outras
crianças, adulto para criança-alvo e outras crianças para criança-alvo), porém,
nas tomadas que se propunham a analisar a situação como um todo (Tomadas
de Varredura), todas as crianças presentes estavam sendo analisadas, de
modo que todo comportamento de interação era registrado.
De fato, embora a interação pareça ser menor nas tomadas de filmagem
que focalizem a criança com necessidades especiais, o que parece acontecer
neste contexto é a inversão das situações, de modo que a prevalência de
interações na ausência da criança-alvo se encontra marcadamente entre as
crianças com 70,26% dos comportamentos observados, e, quando um dos
parceiros é a criança com deficiência, 77,86% dos comportamentos são mais
observados entre o adulto e a criança.
Pôde-se perceber, desta forma, que a criança analisada não passa seu
tempo sem interações com o ambiente, o que afasta a hipóteses de isolamento
generalizado. Entretanto é fato que seu comportamento interativo se encontra
deslocado em uma direção diferente da de seus colegas. Existe uma aparente
aceitação da criança na creche, mas por parte dos adultos e não tanto em
relação às outras crianças.
47
De fato, essa centralização das interações das crianças com
necessidades educacionais especiais com os adultos é um dado já bem
documentado por diversos pesquisadores, como por exemplo, Harper (2002),
que concluiu que as crianças-alvo estudadas passam significativamente mais
tempo interagindo com os adultos do que com seus pares, de modo que as
crianças sem deficiência acabaram por apresentar entre si contatos maiores,
mais longos e menos variáveis.
A partir deste fato pôde-se então tentar entender como e porque isso
vem acontecendo para esta criança, e, para tanto vem contribuir bastante a
análise feita da topografia dos comportamentos.
Nesta terceira análise os comportamentos observados foram
subdivididos novamente de acordo com as seguintes categorias: Vocalizações,
Comportamentos mediados por objetos, Comportamentos que envolvessem
contato físico e Outros tipos de comportamento. Desta análise alguns aspectos
relevantes foram revelados e, dentre eles, o mais marcante foi a diferença
encontrada na quantidade de vocalizações em relação à criança-alvo e às
outras crianças.
Desta forma, tanto nas tomadas focais quanto nas de análise de
varredura, vocalizações foi a categoria de comportamentos mais observada,
com 46,15% do total de comportamentos assim classificados no primeiro caso
e 52,22% para o segundo momento de análise.
Entretanto as diferenças começam a surgir quando se nota a direção
destes comportamentos, já que na análise sem a presença da criança-alvo, a
maioria das vocalizações esteve presente entre as crianças, com 64,57% do
total de vocalizações foi nesta díade, e nas tomadas de análise específica da
criança-alvo, este número cai para 7,43%.
Os comportamentos que envolviam contatos físicos também sofreram
essa inversão, tendo predominado entre adulto e criança-alvo nas tomadas
focais e entre as crianças nas de varredura, com uma prevalência de 100%
deles na díade crianças-crianças.
É importante ressaltar aqui que a distinção entre comportamentos
agressivos, como empurrar ou bater e comportamentos socialmente aceitos,
como abraçar e tocar demonstrando carinho não foi feita para este caso porque
houve uma ocorrência muito pequena deste primeiro tipo de comportamento.
48
Outro motivo para que isso fosse esclarecido é que conforme se pôde observar
que, talvez pela falta de habilidade de comunicação oral, a criança-alvo agia de
uma forma considerada um tanto quanto agressiva em relação aos colegas,
embora seu comportamento muitas vezes parecia ter mais a função de
comunicação e do que de agressão.
Assim, após a análise completa do caso estudado, e através também do
contato tido com a instituição, as educadoras, os pais e com a própria criança,
algumas especulações a respeito do porquê destes resultados puderam ser
feitas.
A preferência encontrada pelas outras crianças para interagirem entre si,
e não com a criança-alvo pode ter sido causada explicado pelo fato de que a
criança com deficiência analisada apresenta um déficit na produção de
linguagem, encontrando-se bastante atrasada com relação à sua turma. Assim,
as crianças nesta idade, em momento de expansão do vocabulário e prioridade
na comunicação oral, parecem perceber a criança com necessidades especiais
como um ouvinte pouco responsivo e provavelmente pouco estimulador para a
interação, o que acaba fazendo com que ela seja pouco procurada pelas outras
crianças, e, consequentemente, procure menos a elas também.
Com relação às vocalizações presentes nas interações de crianças com,
e sem deficiência, Harper (2002) indica que esta categoria também é
marcadamente maior entre as crianças com desenvolvimento típico, citando
isto como fato crucial na menor variabilidade encontrada nas interações entre
eles, pois a maioria dos comportamentos era do tipo vocalizações. Conclui,
assim, que, independentemente de outros fatores, as crianças que
apresentavam déficits na comunicação oral tem um risco maior de isolamento
social.
Assim, o déficit de linguagem citado como um dos fatores de notificação
da criança-alvo em questão é indicado aqui como uma influência certa, ou
mesmo um dos principais determinantes do comportamento das crianças com
relação a ela, isto é, da falta de iniciativas, e tendência em não continuar as
interações.
Isso não acontece com os adultos, pois provavelmente estes
compreendem melhor a fala da criança e se engajam mais em ajudá-la a se
comunicar. Assim, eles ficam mais tempo com ela, atentando para não isolá-la
49
e o fazem através da sua permanente presença e iniciativas de interação
constante, dando prioridade à comunicação por via oral. Assim, parece que,
mesmo sem muito preparo, já que elas indicaram não ter conhecimento
adequado sobre Inclusão e também sobre Síndrome de Down, os adultos
responsáveis pela criança estão engajados em incluí-la na sua sala.
Contudo suas ações são muito mais de forma direta com a criança que
de forma a mediar a interação dela com os colegas, o que pode estar
contribuindo para que o comportamento interativo entre eles não fosse
potencializado.
Monteiro (1997) obteve este mesmo resultado em seu estudo com
crianças com Síndrome de Down, isto é, de que os educadores não promoviam
as interações entre as crianças, o que poderia estar colaborando para
configurar um quadro de exclusão destas crianças.
Quanto a isso, Rosa (2003) bem indica:
“A interação entre as crianças em um contexto inclusivo
deve ser facilitada e otimizada pelo professor de educação
infantil, já que a socialização e a comunicação (verbal ou não-
verbal) são aspectos importantes para o desenvolvimento global
da criança” (pg 135 ).
Ainda, um outro fator importante é que uma das queixas mais freqüentes
das educadoras era acerca do comportamento agressivo da criança LO. Porém
durante as filmagens houve raros episódios que pudessem ser considerados
como situações-problema. Provavelmente a situação de brinquedo livre,
embora recomendada para tais análises por permitir a espontaneidade das
crianças de uma forma mais adequada, parece ter influenciado de alguma
forma no comportamento da criança-alvo. Isto pode ter acontecido porque a
extensão do parque era maior que a da sala de aula e também pelo fato de não
haver nenhuma atividade estruturada em voga, o que não exigia contato de
uma criança com a outra.
Realmente, o brincar parece aumentar a possibilidade de
estabelecimento de interações positivas entre as crianças, agindo mesmo
como suporte para o desenvolvimento das crianças com necessidades
50
especiais, especialmente no que se refere à linguagem, como indicado por
inúmeros autores (Morejón, Freitas e Munhóz, 2001; Odom, 1990; Rosa, 2003;
Robles, 2002; Gil et al, 2002).
Assim, ao serem analisados e discutidos estes dados com a instituição,
algumas hipóteses foram formuladas, de que a preferência observada pela
interação com um outro par e não com a criança-alvo pudesse ser modificada
de uma intervenção fosse elaborada com a finalidade de trabalhar o olhar do
educador para esta diferença do comportamento da criança em sala e na
situação de brinquedo livre, para direcionar o comportamento das educadoras
para mediar as interações mais do que agir nelas.
Após esta discussão, passou-se, então, a se pensar em uma
continuidade deste momento de análise, desta vez com o propósito de intervir
frente à realidade já conhecida e tentar de alguma forma otimizar o contexto e
propor soluções para os problemas lá encontrados, bem como os indicados
pela instituição.
No presente momento, um novo projeto está sendo elaborado com essa
finalidade, tendo sido escolhido um procedimento que exigisse a participação
das educadoras na análise das situações-problema e na sua resolução. Tal
pesquisa utilizar-se-á da técnica de análise funcional do comportamento, feita
em conjunto com os adultos envolvidos, em encontros periódicos com a
pesquisadora.
A análise funcional, como entendida por Meyer (2003) se define como “a
identificação das relações entre os eventos ambientais e a ações do
organismo” (pg 75). Assim, para realizá-la, faz-se necessário especificar três
aspectos: qual seria o comportamento-problema, a ocasião em que tal resposta
o ocorre, e as conseqüências reforçadoras que estariam agindo na
manutenção desse comportamento. Assim, as situações-problema serão
divididas em unidade funcionais, e analisadas em termos de suas funções no
ambiente, ou seja, pela descrição de suas relações com outros eventos.
A relevância de utilizar este procedimento reside no fato de que, além de
identificar as variáveis atuantes na produção do problema, permitindo futuras
intervenções, ela possibilita o planejamento de condições para a generalização,
manutenção e extinção do fenômeno (Matos, 1999).
51
Portanto, com o emprego deste procedimento em uma análise em grupo
com os envolvidos, pretende-se ampliar o grau de compreensão das
educadoras acerca dos comportamentos-problema identificados, de modo que
elas possam utilizar-se da análise funcional para tentar solucionar os
problemas encontrados durante a pesquisa com a criança com necessidades
educacionais especiais, e futuros, valendo-se dela com outras crianças e
ambientes.
52
RREEFFEERRÊÊNNCCIIAASS BBIIBBLLIIOOGGRRÁÁFFIICCAASS ABRAMOWICZ, A., ROCHA, M. J. S. & CUNHA, I. A. M. O desenvolvimento das crianças de três a seis anos. In PALHARES, M. S. & MARINS, S. (orgs). Escola Inclusiva. São Carlos: EduUFSCar, 2002. ARANHA, M. S. F. A interação social e o desenvolvimento de relações interpessoais do deficiente em ambiente integrado. Tese de Doutorado. São Paulo: USP, 1991. ARANHA, M. S. F. Inclusão social e municipalização, In MANZINI, E. J. (org) Educação Especial: temas atuais. Marília: Unesp-Marília publicações, 2000. BRANNIGAN, C. R. & HUMPHRIES, D. A. Comportamento não-verbal Humano – um meio de comunicação, cap II, In JONES, N. B. (org) Estudos etológicos do comportamento da criança. São Paulo: Pioneira, 1981. BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente. Lei número 8.069, de 13 de julho de 1990. Câmara Legislativa do Distrito Federal. Brasília: CLDF, 1990. BRASIL. Legislação sobre pessoas portadoras de necessidades especiais. Câmara Legislativa do Distrito Federal. Brasília: CLDF, 1998. BRASIL. MEC/SEF. Referencial curricular para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. BUYSSE, V., GOLDMAN, B. D. & SKINNER, M. L. Setting effects of friendship formation among children with and without disabilities. Excpetional Children, v. 68, n. 4, p. 503-517, 2002. CARVALHO, A. M. A. Brincar juntos: natureza e função de da interação entre crianças. In C. Aedes (org) Etologia de animais e de homens. São Paulo: Edicom, 1989. CARVALHO, A. M. A. & BERALDO, K. E. A. Interação criança-criança: Ressurgimento de uma Área de Pesquisa e suas perspectivas. Cadernos de Pesquisa, v. 71, p. 55-61, 1989. DUARTE, G. M. Interação social entre uma criança portadora de deficiência auditiva e seus parceiros normais em ambiente natural de sala de aula. Dissertação de Mestrado. São Carlos: PPGEEs/UFSCar, 1990. GATTI, B. A. Estudos quantitativos em educação. Educação e Pesquisa, v. 30, n. 1, p. 11-30, 2004. GIL, A. J. P., SCHEEREN, C., LEMOS, H. D. D., FERREIRA, S. M. O significado do jogo e do brinquedo no processo inclusivo: conhecendo novas metodologias no cotidiano escolar. Cadernos de Educação Especial. Universidade Federal de Santa Maria, n. 20, 2002.
53
HARPER, L. V. & MCCLUSKEY, K. S. Caregiver and peer responses to children with language and motor disabilities in inclusive preschool programs. Early Childhood Quarterly, n. 17, P. 148-166, 2002. INEP Resultados preliminares do Censo Escolar, 2003. Disponível pela internet em: http://www.inep.gov.br Capturado em 25 de junho de 2003. JOAQUIM, C. S. Padrões de interação professor-bebê em creches inclusivas. Versão preliminar de Dissertação de Mestrado. São Carlos: PPGEs/UFSCar, 2003. MARTINEZ, M. S. Brinquedos e brincadeiras: Desenvolvimento e Inclusão. In PALHARES & S. MARINS, S. (orgs). Escola Inclusiva. São Carlos: EduUFSCar, 2002. MATOS, M. A. Análise funcional do comportamento. Revista Estudos de Psicologia, PUC-Campinas, v. 16, n. 3, p. 8-18, 1999. MCGREW, W. C. Aspectos do desenvolvimento social em crianças na escola maternal com ênfase no problema de ingresso na escola, cap V, In JONES, N. B. (org) Estudos etológicos do comportamento da criança. São Paulo: Pioneira, 1981. MENDES, E. G. Perspectivas para a construção da escola inclusiva no Brasil. In PALHARES & S. MARINS, S. (orgs). Escola Inclusiva. São Carlos: EduUFSCar, 2002. MENDES, E. G. Raízes Históricas da Educação Inclusiva. Artigo não publicado. MENDES, E. G. et al. (2001). A Inclusão Escolar em creches: desenvolvendo procedimentos para avaliação de políticas e formação de educadores. Projeto enviado a CNPq. MENDES, E. G., CHIMETTO, C. N., BASTOS, E., BIANCO, M. A., ARAKI, M. J., ZAMBOM, M. P. Alunos com Necessidades Educacionais Especiais inseridos em Escolas Municipais de Educação Infantil: um estudo de caso em um município In: Congresso Brasileiro MultidisciplinaR de Educação Especial, Londrina. Novos Rumos da Educação Especial. Londrina: Editora UEL, v. 1. p. 318 – 323, 2002. MENDES, E. G., FERREIRA, J. R., NUNES, L. R. P. Integração/Inclusão: o que revelam as teses e dissertações em Educação e Psicologia In: Inclusão Educacional: Pesquisas e Interfaces. 1ª ed. Rio de Janeiro: Livre Expressão, v. 1, p. 98-149, 2003. MENDES, E. G., MARÇAL, C. R., TOSI, M. T., MIAO, M. F. J., MASSA, P. A., BARRETO, S. A. Inserção de Alunos com Necessidades Educacionais Especiais nas Escolas Municipais de Educação Básica da Rede Municipal de
54
São Carlos In: III Congresso Brasileiro Multidisciplinar de Educação Especial, Londrina. Novos Rumos da Educação Especial. Londrina: Editora UEL, v. 1. p.324 – 329, 2002. MENDES, E. G., ZAMBON, M. P., SILVEIRA, L. C. Inclusão escolar marco zero - iniciando pelas creches In: VI Encontro de Pesquisa em Educação da Região Sudeste, Rio de Janeiro.Política, Conhecimento cidadania. Rio de Janeiro, v.1. p. 1 – 15, 2004. MEYER, S. Análise funcional do comportamento, In C. E. COSTA, J. C. LUZIA e H. H. N. SANT’ANNA Primeiros passos em análise do comportamento e cognição. São Paulo: ESETec, 2003. MONTEIRO, M. I. B. A integração de crianças com Síndrome e Down e outras crianças na pré-escola comum e especial. In MANTOAN, M. T. E. A integração de pessoas com deficiência – contribuições para uma reflexão sobre o tema. São Paulo: Mnemon, 1997. MOREJÓN, K., FREITAS, S. N., MUNHÓZ, M. A. O brinquedo na estimulação essencial como suporte para o desenvolvimento da linguagem de crianças com necessidades especiais. Cadernos de Educação Especial. Universidade Federal de Santa Maria, v. 1, n. 17, 2001. NISBET, J., ZANELLA, K., MILLER, J. An analysis of conversations among handicapped students and a nonhandicapped peer. Exceptional Children,v. 51, n. 2, p. 156-162, 1984. NUNES, L. R. P., MENDES, E. G. & GLAT, R. Integração/Inclusão. Estado da arte. Enviado a FAPESP, 2001. ODOM, S. L., PETERSON, C., MCCONNEL, S. & OSTROSKY, M. Ecobehavioral analysis of early education/specialized classroom settings and peer social interaction. Education and Treatment of Children, v. 13, n 4, p. 316-330, 1990. ODOM, S. L. Preschool Inclusion:what we know and where we go from here. Topics in Early Childhood Special Education, v. 20, n 1, p. 20-27, 2000. OLIVEIRA, A. A. S. & LEITE, L. P. Escola Inclusiva e as Necessidades Educativas Especiais, In E. J., MANZINI, (org) Educação especial: temas atuais. Marília: EDUNESP, 2000. PRODOCIMO, E. Análise da interação entre um grupo de crianças com Síndrome de Down e crianças normais em escola especial. Dissertação de Mestrado. São Carlos: PPGEEs/UFSCar, 1994. ROBLES, H. S. M. Brincar é um bom jeito de crescer. Viver Psicologia, vol. 100, maio, pp. 14 -15 2001.
55
ROBLES, H. S. M. Uma análise de contingências das instruções na brincadeira entre crianças pequenas. Dissertação de Mestrado. São Carlos: PPGEEs/UFSCar, 2002. ROSA, L. C. S. Formação continuada de atendentes para Inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais em creches. Dissertação de Mestrado. São Carlos: PPGEEs/UFSCar, 2003. SÃO PAULO. Constituição do Estado de São Paulo. Titulo VII - Da Ordem Social, Capítulo III - Da Educação, da Cultura e dos Esportes e Lazer, Seção I – Da Educação, Artigo 239, Parágrafo 2º, 1999. Disponível pela internet: http://www.adusp.org.br/arquivo/consest/ConstEstad.htm, Capturado em 25 de junho de 2003. SCHARTZMAN, J. S. Integração: do que e de quem estamos falando? In Mantoan, M. T. E. A integração de pessoas com deficiência: contribuições para uma reflexão sobre o tema. São Paulo: Memnon, 1997. SILVEIRA, L. C., MENDES, E. G., GREGHI, M. F., PEREIRA, M. A. M., SOBREIRA, T. C. G. Inclusão em Creches da Rede Municipal de São Carlos In: III Congresso Brasileiro Multidisciplinar de Educação Especial, Londrina. Novos Rumos da Educação Especial. Londrina: Editora UEL, v. 1. p.360 – 365, 2002. THOMPSON, B., WICKHAM, D., WEGNER, J. & AULT, M. All childrem should know joy: Inclusive, family-centered services for young children whith significant disabilities. In D. H. L HER & F. BROWN, (Eds), People with disabilities who challenge the system. Baltimore, MD: Paul H. Brookes, 1996. VILA, I. Aquisição da Linguagem. In COLL, C., PALACIOS, J. & MARCHESI, A. (orgs). Desenvolvimento Psicológico e Educação (vol.I). Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.