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Volume 63 / 2004 Anais Nestlé Nutrição na infância

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Volume 63 / 2004

Anais Nestlé

Nutrição na infância

Informação destinada exclusivamente ao profissional de saúdeImpresso no BrasilTO.ON/OT 993.64

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Volume 63 / 2004

Anais Nestlé

Nutrição na infância

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© 2002. Nestec Ltd., avenue Nestlé 55, CH-1800, Vevey, Suíça

Todos os direitos reservados. Exceto quando concedida autorização escrita, nenhuma parte destapublicação poderá ser reproduzida, armazenada em sistema de memória ou transmitida sob qual-quer forma ou meio, seja eletrônico, mecânico, por fotocópia ou outro qualquer.

O material contido neste número foi apresentado como inédito, exceto nos casos em que foi dadocrédito à fonte da qual se originaram alguns dos materiais ilustrativos. A Nestec Ltd. e a NestléBrasil Ltda. não serão responsáveis por erros ou omissões ou por quaisquer conseqüências decor-rentes do uso da informação aqui contida.

Indexado e resumido no banco de dados da EMBASE/ Excerpta-Medica

ISSN 0527-8606

Revista editada por um ComitêInternacional de Pediatras e publicada

por Nestlé Brasil Ltda.

Endereço para correspondência:

Av. das Nações Unidas, 12.495CEP 04578-902, São Paulo, Brasil

Serviço de Atendimento aoProfissional de Saúde: 0800 770 1599www.nestle.com.br/nutricaoinfantil

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Índice

Editorial ....................................................................................................................................... iv

Artigos Originais

Nutrição e a biologia do desenvolvimento ........................................................................... 1A. KATHERINE HERBIG, PATRICK J. STOVER

Nutrição fetal e suas conseqüências a longo prazo ............................................................ 13JEAN-LOUIS BRESSON, JEAN REY

Nutrição na infância e doenças mediadas imunologicamente .......................................... 24HERMANN E. WASMUTH, SIEGFRIED MATERN

Nutrição no início da vida: atuais lacunas no conhecimento que impedemo planejamento de dietas ideais para os dois primeiros anos de vida ........................... 35RICARDO UAUY, CARLOS CASTILLO-DURÁN

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Editorial

Os Anais Nestlé têm agora sessenta anos de idade. A nutrição da criança e suas bases fundamen-tais têm constituído dos mais freqüentes temas dos Anais desde seu princípio, independentementedas mudanças dos membros do Comitê Editorial. Tudo que aprendemos nesses últimos sessentaanos ressalta a importância desse núcleo de interesse. Na verdade, a sabedoria dessa congruênciaé progressivamente reforçada à medida que as bases têm se tornado mais claras tanto no tocanteàs vantagens de “fornecer a nutrição adequada” no início da vida quanto ao ônus imposto pelafisiopatologia de seus transtornos. Essa expansão nos conhecimentos implacavelmente determinaque os profissionais da saúde nos países em desenvolvimento e desenvolvidos se mantenhaminformados sobre como melhor prevenir, detectar e tratar os transtornos relacionados com anutrição.Este número de aniversário é dedicado à Nutrição. Assim, de maneira substantiva e simbólicacompleta a série de mais de dez números dedicados a essa disciplina desde 1992. Esses númerosfocalizaram os seguintes temas: 1) a prevalência regional e mundial, as conseqüências de curto elongo prazo, o tratamento, a prevenção e o controle da desnutrição protéico-energética e as de-ficiências de ferro, vitaminas e oligoelementos; 2) fatores bioativos no leite, notavelmente alactoferrina, os nucleotídeos, hormônios e fatores do crescimento e seus papéis potenciais nosalimentos infantis além do leite; 3) gorduras da dieta e hiperlipoproteinemias, doença celíaca eobesidade, inclusive mecanismos genéticos e dietas que colocam os indivíduos em risco de desen-volverem esses transtornos; 4) sabor, regulação da saciedade e problemas comportamentais queafetam as dietas; e 5) nutrição parenteral total, complicações, aspectos sociais e utilização no lar.Os mais conhecidos especialistas em Nutrição numa escala mundial, contribuíram para essaspublicações, notavelmente, Peter J. Aggett, Norwich, UK; Marvin E. Ament, Los Angeles, CA, USA;Gary K. Beauchamp, Philadelphia, PA, USA; Dominique C. Belli, Geneva Suíça; Claude Bouchard,Baton Rouge, LA, USA; John Boulton, Auckland, Nova Zelândia; Susan E. Carlson, Memphis, TE,USA; Jane Carver, Tampa, FL, USA; Andrew Czeizel, Budapest, Hungria; Peter R. Dalmann, SanFrancisco, CA, USA.; Richard J. Deckerbaum, New York, NY, USA; Paul P. Glasziou, Herston, QLD,Austrália; Ole Hernell, Umeä, Suécia; Otakar Koldovsky, Tucson AZ, USA; Bethold Koletzko, Munich,Alemanha; Philip T. James, IOTF, Londres, UK; Rüdiger von Kries, Dusseldorf, Alemanha; BoLönnerdal, Davis, CA, USA; Homero Martinez, Cidade do México, México; Reynaldo MArtorell,Atlanta, GA, USA; Jay A Perman, Baltimore, MD, USA; Susan F. Schiffman, Durham, NC, USA;Marti A. Siimes, Helsinki, Finlândia; Reginald Tsang, Pittsburgh, PA, USA; Yvan Vandenplas, Bru-xelas, Bélgica; Jarmo Visakorpi, Tempere, Finlândia; John Walker-Smith, Londres, UK.Muitos outros importantes temas foram abordados nos últimos dez anos, mantendo a tradição doscinqüenta anos precedentes. Limitações de espaço não permitem uma relação completa de outrostópicos que foram abordados mas uma revisão parcial dos últimos dez anos é testemunha daconstante evolução da pediatria. Notavelmente, muitos números foram devotados aos correntes

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flagelos que afligem crianças, como Aids, diarréia, tuberculose, meningite bacteriana e infecçõesrespiratórias agudas; às vacinações e à compreensão atual das respostas imunes às vacinas, seuimpacto socioeconômico e a promessa de novas vacinas; e a muitos outros tópicos relevantes talcomo o manejo da dor, a surdez e a linguagem dos sinais, as dificuldades do aprendizado naadolescência, o meio ambiente e os perigos evitáveis para crianças e outros sobre a triagemneonatal, diagnóstico pré-natal e terapia gênica. Apesar da impossibilidade de relacionar os muitosautores que contribuíram tão eficazmente no correr dos últimos dez anos, todos têm os maisprofundos agradecimentos. A participação de indivíduos de universidades de vanguarda, de facul-dades de medicina e de instituições de pesquisa nacionais e internacionais de todo o globo étestemunha dos compromissos correntes partilhados por profissionais da saúde de todo o mundode difundir o conhecimento e o progresso na pesquisa em pediatria. Somos gratos por esse com-promisso sem o qual os Anais não poderiam manter sua tradição de excelência.Também aproveitamos esta oportunidade para agradecer aos membros anteriores do ComitêEditorial dos Anais que aqui estiveram nesses dez anos passados. O sucesso dos Anais muito sedeve a eles: Angel Ballabriga, Barcelona, Espanha que foi o coordenador do Comitê Editorial até1996, Kraisid Tontisirin, da Universidade de Mahidol, Tailândia que hoje se encontra na Food andAgricultural Organization (FAO) em Roma, Itália e o falecido David Baum, Bristol, UK (1940-1999).Foi sob a liderança do Professor Angel Ballabriga que o número comemorativo do qüinquagésimoaniversário foi concebido. “Cinqüenta anos da Pediatria, 1942-1992”. Este número foi magnificamenteilustrado por fotos dos muitos pioneiros na pediatria que alcançaram preeminência depois da IIGuerra mundial. Professor Ballabriga escreveu no final do Editorial desse número especial: “Es-tendemos nossos agradecimentos a esses passados criadores e editores dos Anais Nestlé cujosesforços e dedicação asseguraram a continuação dessa publicação durante esses 50 anos.” Comoos sucessores desses ilustres predecessores, nós nos unimos a eles nesta homenagem.Finalmente, temos o prazer de assinalar que um comitê independente edita os Anais Nestlé. Ocomitê estabelece a política editorial e identifica os tópicos a serem abordados, seleciona osautores e avalia o conteúdo dos trabalhos. A Nutrition Strategic Business Division (NSBD) daNestec Ltd., em Vevey, que administra o Nestlé Nutrition Scholarship Programme (Programa Nestléde Bolsas em Nutrição) tem patrocinado consistentemente os Anais Nestlé durante seus 60 anosde história. A mais recente modernização do “layout” dos Anais trouxe a introdução de “caixasde texto”, ou seja, aquelas frases dos trabalhos destinadas a ressaltar certos pontos essenciais eao mesmo tempo oferecer um “layout” mais leve ao leitor. Daqui em diante esperamos recebersuas sugestões sobre futuros tópicos e críticas positivas e/ou negativas dos Anais. Seus comentá-rios nos dirão se os Anais Nestlé estão efetivamente contribuindo ou não para seus conhecimen-tos, se estão ajudando a que se utilizem os mais atuais avanços na área da pediatria e se os tópicosescolhidos têm maior relevância para os seus serviços às crianças e às suas famílias. Reconhece-mos que você é o esteio dos esforços em todo o mundo que objetiva manter as crianças saudáveise diminuir seu sofrimento.

Comitê EditorialAnais Nestlé

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Introdução

O desenvolvimento humano desenrola-se comoum complexo conjunto de programas biológicosinterdependentes embora distintos e precisamen-te integrados. Seguindo-se à fertilização, os progra-mas de desenvolvimento são desencadeados pelaleitura seletiva do código genético, conduzindo àgeração dos diversos tipos de células, órgãos e sis-temas orgânicos que constituem os mamíferos.Esses programas são dependentes da expressãodos genomas materno e fetal e de um suprimentoregulado de nutrientes, originário da mãe. Na ver-dade, a maioria dos programas de desenvolvimen-to, inclusive a organogênese, formação dos mem-bros e maturação do sistema nervoso central(SNC), requer nutrientes específicos para seu iní-cio e progressão. Os nutrientes são necessárioscomo os tijolos para a síntese das macromoléculas,produção de energia e como cofatores biológicosdas reações enzimáticas. Os nutrientes tambémservem como moléculas informativas queinteragem com o genoma e desencadeiam ou faci-litam os programas de desenvolvimento. Esta re-visão tem como foco a etiologia de anomalias con-gênitas bem caracterizadas, com múltiplos fato-res envolvidos, enfatizando como o conhecimentonutricional básico introduziu-se diretamente nas re-comendações da saúde pública e nas intervençõespara a prevenção dos defeitos ao nascimento.

Desenvolvimento dos mamíferos

e os “períodos críticos”

O desenvolvimento dos mamíferos depende cri-ticamente da função dos genomas materno e

fetal e da disponibilidade de pequenas molécu-las sintetizadas na placenta, ou pela mãe, com-preendendo hormônios, citocinas e fatores docrescimento.

A saúde materna também é essencial para osucesso do início e progressão dos programasde desenvolvimento dos mamíferos. O ambien-te fetal é mantido pela placenta que facilita eregula o fluxo de vitaminas, minerais e outrosnutrientes essenciais originário da mãe para ofeto enquanto simultaneamente o protege decompostos prejudiciais. A maioria dos funda-mentais processos bioquímicos e morfogênicosrequerem um suprimento regulado pela placen-ta dos nutrientes supridos pela mãe e a ausên-cia de compostos teratogênicos, inclusive me-tais pesados, drogas ilícitas, toxinas e certosagentes farmacêuticos.

Aproximadamente 60% dos embriões huma-nos morrem durante a gravidez e a maioria nãosobrevive a fase de implantação [1]. Outros 2 a3% de seres humanos nascem com defeitos es-truturais ou funcionais; muitos outros sofremdefeitos no desenvolvimento e exibem apenassutis fenótipos ou fenótipos que só se tornamevidentes em fase mais tardia. Os programas de

Nutrição e a biologia do desenvolvimento

A. KATHERINE HERBIG, PATRICK J. STOVER

Cornell University, Division of Nutritional Sciences,

315 Savage Hall, Ithaca, NY 14853, USA

O desenvolvimento dos mamíferosdesenrola-se como um programa temporalprecisamente orquestrado que requermodificações coordenadas na expressãode genes fetais e maternos bem comoum suprimento completo e reguladode nutrientes vindos da mãe.

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desenvolvimento podem ser prejudicados pormutação do DNA, da expressão aberrante degenes maternos ou fetais, por deficiências ouexcessos fetais de determinados nutrientes, pelafalha placentária ou interações genoma-nutrien-tes nocivas. Somente cerca de 5% das anorma-lidades congênitas têm etiologia conhecida. Osfatores genéticos, inclusive anormalidadescromossômicas e defeitos em genes isolados,respondem por um terço das anormalidadescongênitas enquanto outros 20% são o resulta-do direto das agressões ambientais inclusivedesnutrição e excessos nutricionais.

A maioria das anormalidades congênitas têmorigem multifatorial no tocante aos componen-tes genéticos e ambientais. Esse efeito combi-nado da genética e do ambiente sobre o resul-tado ao nascimento há muito tem sido defendi-do pela literatura da teratologia [2]. Para amaioria dos teratógenos o limiar de concentra-ção necessário para efetivar um determinadoresultado depende do complexo genético da mãee/ou do feto. Além disso, a influência da varia-ção genética sobre os requisitos nutricionaisdurante a gravidez tem recebido reconhecimen-to crescente [3]. Calcula-se que até 50% dasanomalias congênitas de causa conhecida exi-bem padrões de herança multifatorial resultan-te de interações prejudiciais genoma-meio am-biente, diretas ou indiretas. Nas fases precocesda embriogênese, sistemas de sensoriamentosensíveis a nutrientes podem servir como pon-tos reais de controle com capacidade de inter-romper a execução de eventos programados ge-neticamente levando a falha na implantação ouaborto espontâneo. Durante fases mais avança-das do desenvolvimento fetal as deficiênciasnutricionais podem prejudicar a progressão dosprocessos morfogênicos, resultando em prejuí-zos ao desenvolvimento de gravidade variável.Em alguns casos, no entanto, um ótimo estadonutricional da mãe pode compensar os defeitosgenéticos fetais que, de outra forma, resultari-am em anomalias congênitas.

Embora muitos dos precisos mecanismos bi-ológicos associados com as anomaliasmultifatoriais congênitas ainda tenham de seresclarecidos, o estado nutricional materno in-

fluencia todos os estágios do desenvolvimentofetal e eventos do nascimento, inclusive peso,funções neurológicas e cognitivas esuscetibilidade às doenças. Em muitos casos, adeficiência ou o excesso de determinados nutri-entes num momento crítico prejudicarão certosprocessos específicos do desenvolvimento ge-neticamente programados. Portanto, o riscodesses danos está associado a um específicoperíodo do desenvolvimento ou a uma “janelacrítica” (Fig. 1). Dentre os processosmorfogênicos mais vulneráveis do ponto de vis-ta nutricional estão a organogênese e o desen-volvimento do SNC. Durante a abertura das “ja-nelas críticas” para esses processos os nutrien-tes e as interações gene-nutriente podem influ-enciar a síntese de DNA, a taxa de proliferaçãode células, a sinalização celular, a diferenciaçãocelular, a migração celular e podem eventual-mente “programar” (imprint) os níveis de ex-pressão de genes específicos de um modo quepode impactar o organismo por toda a vida.

Figura 1: Influência da nutrição materna sobre as“janelas críticas” durante o desenvolvimento humano

Interações genoma-nutriente

durante o desenvolvimento

Todas as células presentes num embrião ou fetopartilham um genoma idêntico que é compostode cerca de 3 bilhões de pares de bases dedesoxirribonucleotídeos e 35.000 genes. A iden-tidade celular é alcançada durante o desenvol-

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Nutrição e a biologia do desenvolvimento

vimento pela expressão seletiva desses genes,um processo que confere função e fenótipocaracterísticos a cada tipo de célula. A expres-são do gene é mediada, em parte, pelos fatoresda transcrição, proteínas que se ligam ao DNAe iniciam e regulam o processo de leitura docódigo genético com o objetivo de sintetizar asproteínas codificadas.

Fatores de transcrição ativados por

ligantes

Os receptores nucleares, também conhecidospor fatores de transcrição ativados por ligante,representam um mecanismo comum pelo qualnutrientes individuais podem especificamenteassestar e influenciar a expressão de genesmaternos e fetais e assim determinar a linha-gem das células no feto. Os receptores nuclea-res encontram-se nas células como membros desuperfamílias de proteínas que se ligam ao DNA,distintas mas ainda funcionalmente relaciona-das que devem fixar pequenas moléculas ouligantes para afetar a expressão do gene. Essesligantes podem compreender hormônios(esteróides e hormônio da tireóide), vitaminas(retinóis e vitamina D) e outros nutrientes in-clusive bile e ácidos graxos [4]. Os fatores datranscrição ativados por ligantes ligam-se a se-qüências específicas de nucleotídeos no genoma(elementos responsivos do DNA) e regulam aexpressão dos genes vizinhos. Os receptoresnucleares são freqüentemente mencionadoscomo os receptores “master”, pois regulam aexpressão de outras proteínas fixadoras de DNAe dos fatores de transcrição, inclusive genesHOX que funcionam na padronização do

mesoderma e do sistema nervoso [5]. Portanto,a ativação dos receptores nucleares pelosligantes exógenos inicia uma cascata de expres-são genética que finalmente define o destino dacélula (Fig. 2).

Os receptores nucleares, conhecidos tambémcomo fatores da transcrição ativados porligante, representam um mecanismo comumpelo qual nutrientes individuais podemespecificamente assestar e influenciar aexpressão materna e fetal do gene e assimdeterminar a linhagem celular no feto.

Vitamina A

O ácido retinóico (AR), uma forma madura devitamina A, é essencial para a regulação denumerosos genes que são críticos para o de-senvolvimento de mamíferos. O AR é um liganteque se liga e ativa uma família de pelo menos6 fatores de transcrição conhecidos como re-ceptores do ácido retinóico (RAR e RXR). Oácido retinóico é derivado do β-caroteno (pró-vitamina A), um componente da dieta que éconvertido em retinol no intestino. As célulasimportam o retinol onde é oxidado para a for-ma de AR trans (all-trans) e enzimaticamenteisomerizado para AR 9-cis. As patologias e asanomalias congênitas foram identificadas tan-to com excesso quanto com deficiência de vi-tamina A. Em adultos, a deficiência resulta emcegueira noturna, hipoplasia ventricular,queratinização epitelial, imunodeficiência eesterilidade masculina. A deficiência mater-na de vitamina A leva a defeitos congênitos,inclusive anormalidades na cardiogênese, na

Figura 2: Gráfico ilustrativo das respostas primárias e

secundárias dirigidas pela expressão de um gene medi-

ada pelo receptor nuclear.

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morfogênese ocular e no desenvolvimento doSNC [6]. O excesso de vitamina A éteratogênico em roedores expostos a dosesfarmacológicas, causando uma gama de defei-to congênitos, inclusive anormalidadescraniofaciais, formação anormal do coração edo timo, dismorfogênese do esqueleto, espinhabífida, exencefalia e anencefalia [7]. Esses de-feitos ocorrem durante os períodos deneurulação e organogênese (d 21-55) fetal. De-feitos semelhantes ocorrem nos bebês de mãesexpostas a isotretinoína, um retinóide usadopara tratar de transtornos da pele [8]. Dosesmoderadas de vitamina A (<10.000 UI/dia),quantidade consumida pela maioria dasmulheres nos EUA durante o períodopericoncepcional [9], administrada como suple-mento ou existente nos alimentos enriqueci-dos, não é causa de malformações, embora oexcesso dietético de vitamina A (> 40.000 UI/dia) possa ser teratogênico [10].

Os receptores nucleares podem assumir a for-ma de proteínas diméricas, ligar-se ao DNA einfluenciar a expressão do gene. Os RARs com-binam-se com AR trans (all-trans-AR) como seuligante ativador enquanto RXRs combinam-secom 9-cis AR. Os RXRs podem funcionar comohomodímeros independentes mas também po-dem emparceirar com muitos outros recepto-res, inclusive o RAR e o receptor do hormônioda tireóide. Cada receptor de retinóide ostenta,em algum grau, expressão celular e tecidualespecífica e estudos de deleção de genes emcamundongos indicam que alguns mas não to-dos os receptores têm funções que se sobre-põem [11]. Por exemplo, mutantes homozigotosnulos (homozygous null mutants)(*) tanto deRARα1 ou de RARα (todos isoformes) não pro-duziram fenótipo reconhecível. Os fetosmutantes nulos RARα1 mantém-se viáveis,paralelalemente com o tipo selvagem mas osmutantes RARα (todos isoformes) duplamentenulos apresentavam letalidade neonatal aumen-tada e semelhantemente aos camundongos de-ficientes de vitamina A, eram portadores dedefeitos cardíacos na fase embrionária e esteri-lidade nos machos resultante de agenesia testi-cular e subseqüentemente, espermatogênese

imperfeita. Esses camundongos também apre-sentam graves disrupções na zona labiríntica daplacenta corioalantóica, talvez contribuindo paraa menor sobrevivência neonatal observada. Adeleção combinada de múltiplos receptoresretinóides resulta em anormalidades congênitasassociadas à deficiência de vitamina A, inclusi-ve malformações do coração e dos olhos e de-feitos do cérebro e face. Na verdade, a maioriados defeitos do desenvolvimento associados àdeficiência de vitamina A pode ser recapituladaem camundongos deficientes de RAR e RXR.Os receptores nucleares também são necessári-os para mediar os efeitos teratogênicos da vita-mina A. Camundongos nos quais foi induzida adeleção de receptores RARγ são resistentes aosefeitos teratogênicos da vitamina A durante aembriogênese.(*) A expressão indica que ambas as cópias do gene fo-

ram eliminadas no genoma do camundongo mutante. Nulo

significa que estão ausentes todas as cópias do gene.

Iodo

O hormônio da tireóide é essencial para aregulação da taxa metabólica basal em adultose para o crescimento e o desenvolvimento fetal.O hormônio da tireóide é um ligante para oreceptor nuclear do hormônio da tireóide (TRs),uma família de fatores de transcrição que seligam ao DNA e formam dímeros com RXR eregulam a expressão de genes alvo específicos.O hormônio da tireóide é sintetizado e armaze-nado na glândula tireóide sob a forma de tiroxinainativa (T4) e liberado na circulação quandoestimulado pelo hormônio estimulador datireóide. A glândula tireóide humana é formadano 24o dia pós-concepcional e é a primeira glân-dula endócrina a se desenvolver no embrião.Todavia, a expressão dos TRs é anterior aofuncionamento da glândula tireóide do feto osquais provavelmente se valem do hormônio datireóide materna para sua atividade no curso desegundo trimestre. A síntese de T4 torna-se crí-tica no terceiro trimestre embora, durante agestação, o hormônio da tireóide materna pos-sa minimizar os efeitos de hipotireoidismo con-gênito.

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As funções do hormônio da tireóide podemser alteradas por mutação genética dos TRs oupor carência nutricional de iodo à mãe. O iodoé um componente químico essencial datiroxina. Deficiência de moderada a grave doiodo materno afeta milhões e leva ao retardomental de bebês que mais facilmente poderiaser prevenido [12]. A deficiência de iodo nofeto resulta em cretinismo, uma doença do de-senvolvimento que é caracterizada pela inter-rupção do crescimento físico e do desenvolvi-mento mental, distrofia dos ossos, bócio, defi-ciências neurológicas profundas e irreversíveise retardo mental [13]. A suplementação de iodoà mãe no primeiro trimestre impede essesdéficits, o que explica porque o iodo é univer-salmente adicionado ao sal de cozinha nos pa-íses desenvolvidos. O cretinismo também poderesultar de hipotireoidismo materno-fetal combi-nado, mas é menos severo em casos dehipotireoidismo congênito. Mutações genéticasque determinam hipotireoidismo congênito per-manente são comuns (1 em 4.000 nascimentos)e surgem esporadicamente nas populações oci-dentais. Hipotireoidismo humano congênito nãotem efeitos adversos aparentes se a reposição deT4 é iniciada depois do nascimento embora aestatura adulta programada não seja alcançada.Compostos teratogênicos também podem pertur-bar a função do hormônio da tireóide. Adisrupção da produção de tiroxina pelo iodetode potássio (presente nos medicamentos contraa tosse que facilmente atravessa a barreiraplacentária) ou iodo radioativo (levando à des-truição dos tireócitos) resulta em bócio congêni-to e cretinismo. Bifenis policloretados (PCBs),poluentes ambientais comuns presentes na ca-deia alimentar são análogos químicos dohormônio da tireóide e podem agir seja comoagonistas seja como antagonistas da expressãogênica mediada pelo hormônio da tireóide du-rante o desenvolvimento [14]. A exposição pré-natal resulta em uma gama de transtornoscognitivos e comportamentais em diversas espé-cies, inclusive humana.

T4 é convertido à sua forma ativa,triiodotironina (T3), no interior das células alvoonde se combina com grande afinidade aos TRs.

A conversão de T4 para T3 é catalisada pelaenzima tiroxina-5’-deiodinase, uma enzima de-pendente do selênio. A deficiência de selêniotambém reduz as concentrações maternas deT3 no soro. Todos os tecidos contém TR mas osalvos fetais do hormônio da tireóide compreen-dem genes que são críticos para o desenvolvi-mento do SNC. Por exemplo, o T3 é necessáriopara os processos fundamentais, inclusive for-mações das redes neurais durante o desenvol-vimento, diferenciação de neurônios, laminação,polaridade dos neurônios, sinaptogênese emielinização [13]. Os TRs são codificados pordois genes que expressam duas proteínas sepa-radas mas similares que partilham de uma fun-ção redundante, TRα e TRβ. Assim como os re-ceptores de retinoide os TRs ligam-se às regiõespromotoras dos genes e intensificam a transcri-ção desses genes alvo quando T3 está ligado aosreceptores. Todavia, os TR têm essa caracterís-tica peculiar de aderir a esses mesmos promoto-res alvo e reprimir a transcrição na ausência deT3. Não existem seres humanos conhecidos commutações de TRα ; todavia, pacientes comdeleções homozigóticas do gene TRβ, são porta-dores da síndrome de resistência ao hormônioda tireóide (thyroid hormone resistant syndrome= THR). Essa mutação prejudica a capacidadedo receptor de combinar-se a T3 e portanto aproteína mutante adere ao DNA mas não ativa aexpressão do gene. Assim, a proteína mutanteantagoniza o efeito de um receptor normalcombinante que contém T3 aderido. Essasíndrome é caracterizada por elevados teores deT3 e T4, bócio e manifestações clínicas dehipotireoidismo iodo-deficiente inclusive déficitde atenção, surdez e retardo do crescimento masdesenvolvimento mental normal [13].

Receptores órfãos e o futuro

Comprovou-se que muitos dos receptores nu-cleares que foram identificados e caracteriza-dos hoje em dia desempenham funções críticase determinísticas nas fases precoces daembriogênese, demonstrando o papel essencialda nutrição materna na execução dos progra-

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mas genéticos durante o desenvolvimento. Atu-almente, aproximadamente 20 receptores nucle-ares e seus ligantes correlatos foram identifica-dos [15]. Um certo número de outros recepto-res nucleares foram identificados através depesquisas de homologia no DNA mas o liganteativador e, portanto, a função fisiológica dessesreceptores órfãos permanece desconhecida. Aidentificação da ativação desses “órfãos” muitoprovavelmente aumentará o número de nutrien-tes que reconhecidamente têm influência naexpressão do gene durante o desenvolvimentoe portanto estenderá os paradigmas que reque-rem as interações de genes e nutrientes paradesencadear e manter os programas de desen-volvimento.

Diversidade genética e requisitos

nutricionais durante a gravidez

Os polimorfismos de nucleotídeos isolados(single nucleotide polymorphisms = SNPs) sãovariações comuns na seqüência do DNA quecontribuem para a diversidade genética e sur-gem com a freqüência de aproximadamente 1em cada 1000 pares de bases do DNA humano[16,17]. Os SNPs contribuem para traços com-plexos que compreendem a suscetibilidade adoenças crônicas, eficácia de certos medicamen-tos e recentemente constatou-se que afetam osrequisitos nutricionais durante a gravidez [3,18].

Requisitos maternos de ácido fólico

Diversos SNPs foram identificados em genescodificantes de enzimas que utilizam folatocomo um cofator e essas variações genéticasinfluenciam os requisitos maternos de folatodurante a gravidez e os produtos da gravidez. Ofolato é uma vitamina B e portanto um nutrien-te essencial para todos os mamíferos. O ácidofólico tomado antes da concepção reduz subs-tancialmente o risco de defeitos do tubo neural(neural tube defects = NTDs) [19, 20], umaclasse comum de defeitos encontrados ao nas-cimento que compreendem a espinha bífida e

anencefalia, resultantes do não fechamento dotubo neural. As mulheres em idade reprodutivadevem sempre apresentar níveis suficientes defolato, pois o período crítico, associado ao fe-chamento do tubo neural ocorre entre os dias 22e 28 depois da fertilização, freqüentemente antesmesmo que a mulher tenha ciência de sua gravi-dez (Fig 1). Antes da implementação das atuaisdiretrizes sobre a fortificação de alimentos, 2.500lactentes nasciam anualmente com defeitos dotubo neural nos EUA. Aproximadamente 50%desses casos foram o resultado parcial de umnível materno de folato inadequado durante osprimeiros três meses de gravidez. Todavia, a de-ficiência marginal de folato não é o único fatorde risco de NTDs; a variação genética tambémdesempenha um papel essencial. Mulheres comhistória de gravidezes afetadas por NTD corremrisco maior de ter gravidez afetada por NTD,indicando que tanto a genética quanto os níveisnutricionais de folato contribuem para o riscodesses defeitos no nascimento.

Polimorfismo nas enzimas

dependentes de folato

A identificação de famílias que recorrentemen-te experimentaram gravidezes afetadas por NTDcomprovou-se de valor incalculável na identifi-cação de variantes genéticas que contribuempara o risco dessas anormalidades congênitas.O primeiro dos polimorfismos de nucleotídeoisolado (SNP) e o mais bem caracterizado queafeta tanto os requisitos de folato e o risco deespinha bífida é o polimorfismo comum 677C→Tpresente nos genes que codificam a enzimafolato-dependente metilenetetra-hidrofolatofolato reductase (MTHFR) [21]. Esse SNP é en-contrado em aproximadamente 13% das mãesque tiveram gravidezes afetadas por NTD. Essepolimorfismo é o resultado de uma transversãode C (citosina) para T (timina) no ponto 677 donucleotídeo no gene MTHFR. Esse polimorfismomodifica a seqüência de aminoácidos da enzima,resultando na substituição do aminoácidoalanina para valina no ponto 223 (Fig. 3). Aenzima codificada por este gene polimórfico é

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instável relativamente à proteína normal comodemonstrado por sua labilidade ao calor invitro. Tanto a mãe e/ou o feto portadores dessealelo têm reduzida atividade enzimática e redu-zida capacidade de remetilar homocisteína emmetionina (Fig. 4). Os portadores dessepolimorfismo apresentam níveis aumentados dehomocisteína no soro [21], embora o consumopericoncepcional de folato reduza tanto os ris-cos de NTDs e a concentração de homocisteínado soro. Com relação ao polimorfismo 677C→T,o genótipo fetal está associado mais ao risco deNTDs [22], mas o genótipo e o nível de folatomaternos também contribuem para o risco [23].Os requisitos de ácido fólico das mães portado-ras desse polimorfismo são 5 vezes maiores doque os da população em geral e essas mulheressão altamente suscetíveis a gerar um filho comdefeito do tubo neural caso tenham deficiênciamarginal de folato. Um fato interessante é que,embora essas mulheres possuam um risco ele-vado de um mau resultado ao final da gravidezpor causa desse defeito, esse SNP protege-as decâncer de cólon [24, 25]. Foram identificadosSNPs em outros genes folato e não-folato de-pendentes que impõem um risco aumentado deNTDs ao feto, embora nenhum com a elevadapenetrância associada ao polimorfismo 677C→TMTHFR [26]. As interações genéticas associa-das ao risco de defeitos do tubo neural (NTD)são complexas e deve ser considerada a contri-buição de todas as variações dos alelos. Umaestimativa abrangente do risco de NTD só serápossível quando puder ser considerada ainteração de folato (e outros nutrientes) comtodos os haplótipos humanos.

Alelo normal Ponto 677↓

Seqüência do Gene GCG GGA GCC GAT

Seqüência da proteína Ala Gly Ala Asp

677 C → alelo T

Seqüência do gene GCG GGA GTC GAT

Seqüência da proteína Ala Gly Val Asp

Figura 3: Um polimorfismo comum no gene MTHFR queaumenta o risco de defeitos congênitos folato-dependentes.

O folato e a expressão dos genes

O mecanismo bioquímico preciso pelo qual ofolato previne os defeitos do tubo neural é des-conhecido. A ácido fólico é necessário para sin-tetizar os precursores de nucleotídeos para asíntese de DNA e para metilar o aminoácidohomocisteína para metionina (Fig. 4). Ametionina é convertida em s-adenosilmetioninae serve como fonte de grupos metila para nu-merosas outras reações metabólicas. Os defei-tos do tubo neural podem surgir em razão dasíntese não parceirada de precursores denucleotídeos do DNA ou de elevados níveis dehomocisteína, um aminoácido que pode preju-dicar numerosos processos bioquímicos, inclu-sive a metilação do DNA, metilação da proteínae sinalização celular. Essas alterações no meta-bolismo celular têm o potencial de diminuir aproliferação e a diferenciação celular durante aperíodo crítico da formação do tubo neural. Adi-cionalmente, a metilação do DNA influi na ex-pressão de 10% dos genes de mamíferos. [27].Portanto, o comprometimento do metabolismodo folato pode influenciar a expressão de mui-tos genes que são necessários para a formaçãodo tubo neural.

Reações

A. 10-formil-tetra-hidrofolato PurinasB. 5,10-metilenetetra-hidrofolato Pirimidinas

DNA

C. 5-metil-tetra-hidrofolato Metionina

Homocisteína

Figura 4: Papel dos derivados do folato na síntese dosprecursores do DNA e a metilação da homocisteína emmetionina.

Em alguns modelos experimentais com ca-mundongos constatou-se que o suprimentomaterno de folato exerce efeito protetor contraNTDs para algumas mutações e a suplementaçãomaterna de folato pode ser substituída por pro-dutos metabólicos do metabolismo do folato. Atimidina, mas não a metionina, pode substituirfolatos na prevenção de NTDs num determina-

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do modelo experimental de camundongos [28];a metionina sozinha também tem efeito prote-tor em outro modelo [29]. Portanto, mantém-seelusivo o exato mecanismo(s) bioquímico cau-sador de NTDs através das perturbações dometabolismo do folato.

Fortificação com folato

Em 1992 o Serviço de Saúde Pública dos Esta-dos Unidos recomendou que todas as mulhe-res em idade de procriar consumissem 400 mgde ácido fólico diariamente, além da ingestãohabitual, para reduzir o risco de gerar umacriança com NTDs. Como resultado de umbaixo atendimento a essa recomendação e dadificuldade em alcançar essa meta apenas comum maior consumo de folato, a FDA em 1998iniciou uma política com o objetivo de fortifi-car o suprimento alimentar do país com ácidofólico (0,4 a 1,4 mg de ácido fólico por libra decereal) para prevenir a ocorrência e recorrênciade NTDs. A fortificação voluntária ocorre emalguns países europeus embora proibida emoutros. O grau de fortificação estabelecido nosEUA é modesto, pois os efeitos a longo prazoda fortificação com folato das populações hu-manas são desconhecidos, e para assegurar quea deficiência de vitamina B

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da pelos elevados níveis de consumo de folato.Esse nível de fortificação do folato é conside-rado seguro e abaixo do limite superior reco-mendado de 1 mg/dia e resultou num aumentoestimado da ingestão de 0,1 a 0,2 mg de folato/dia pela população norte-americana, permitin-do que a maioria das mulheres alcançassem aingestão diária recomendada de 0,4 mg defolato. Espera-se, com essa política, que seprevinam a maioria, embora não todos os ca-sos de NTD [30].

Intervenções nutricionais para

compensar defeitos genéticos

A atual política nutricional centraliza-se na de-terminação da ingestão ótima de nutrientes para

a saúde humana, com enfoque especial nos re-quisitos da gravidez. Uma vez estabelecidas,essas recomendações abrangerão a ingestãoideal de cada nutriente necessário para a pre-venção de doenças (como o ácido fólico nadiminuição da homocisteína ou para preveniros defeitos congênitos) e um limite superior deingestão acima do qual associa-se risco detoxicidade ou teratogênese (tal como a vitami-na A) a um nutriente. Os limites superior e in-ferior para qualquer nutriente serão influencia-dos por variação genética normal, gênero e fasedo ciclo vital. Portanto, existe o potencial paraindividualizar os requisitos nutricionais segun-do os genótipos maternos e fetais e assimotimizar o resultado da gestação. Os esforçosatuais no sentido de individualizar os requisitosalimentares não são diferentes das tradicionaisintervenções nutricionais maternas que osten-tam uma história de êxito na proteção do fetodas graves anormalidades congênitas cujasetiologias são unicamente genéticas. Afenilcetonúria (phenilketonuria = PKU) é umtranstorno autossômico recessivo que resulta,primariamente, de mutações no genefenilalanina-hidroxilase. Falta aos pacientesportadores de PKU a atividade enzimática dafenilalanina hidroxilase e por isso são incapa-zes de metabolizar a fenilalanina. A PKU é facil-mente diagnosticada ao nascimento mas se nãofor tratada resulta em grave retardo mental. Arestrição dietética de fenilalanina imposta aosrecém-nascidos com diagnóstico de elevadosníveis de fenilalanina no soro diminui os gravescomprometimentos cognitivos [31]. Todavia, oêxito dessa intervenção nutricional levou àemergência de uma nova preocupação na áreada saúde pública conhecida como PKU mater-na. A PKU materna refere-se aos danos fetaisresultantes de PKU na mulher grávida que re-sulta em graves anormalidades do desenvolvi-mento, compreendendo microcefalia, déficitcognitivo, defeitos congênitos do coração ebaixos pesos ao nascimento. Caso a mãe nãoseja tratada durante a gravidez, 92% da proleserá mentalmente retardada e 73% microcefálica[32]. Embora as gravidezes nas mães com PKUcontrolada resultem em menor incidência des-

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ses defeitos congênitos, a ocorrência dessasanormalidades ainda será maior do que na po-pulação em geral [33,34]. A PKU representa umexemplo extremo de como as intervençõesnutricionais podem parcialmente resgatar pro-gramas de desenvolvimento abalados por ques-tões genéticas mas também podem criar novascomplicações e desafios para gerações subse-qüentes.

Surpreendentemente, o ácido fólico pode tera capacidade de influenciar ou resgatar umavariedade de mutações genéticas e deleções.Em experimentos com o camundongo, asuplementação com ácido fólico durante a ges-tação pode melhorar NTDs resultantes de gra-ves disrupções genéticas que aparentemente nãotêm relação com o metabolismo dos folatos. Asuplementação materna com elevados teores deácido fólico pode prevenir NTDs resultantes dadeleção de fatores de transcrição inclusive osPax3 [28], Cart 1 [35] e Crooked Tail [36] e ametionina, mas não ácido fólico, pode alterar afreqüência de NTDs em mutantes Axd [29]. Cart1 é necessário para a proliferação celular nomesênquima do cérebro anterior e asuplementação materna com folato reduz a in-cidência de NTD em 85% [35]. A suplementaçãocom folato também reduz a incidência de NTDresultante de hipertermia materna em camun-dongos [37]. O folato é, freqüentemente, um fatornutricional limitante do crescimento celular invitro e, portanto, a suplementação materna comfolato pode parcialmente restringir numerososdefeitos genéticos resultantes de menores ta-xas de divisão celular.

Potencialmente desconcertantes são os resul-tados de estudos em seres humanos que indica-

ram um aumento nos abortos espontâneos comoresultado da suplementação materna com folato[38,39]. Embora um autor tivesse concluído queníveis elevados de folato materno podem serteratogênicos, outro sugeriu que o folato pro-longa gravidezes que, de outra forma, teriamsido interrompidas muito precocemente e que,portanto, não teriam sido detectadas [39]. Essaúltima explicação parece mais provável. Outrosestudos indicaram que a suplementação de áci-do fólico administrado à mãe humana podesalvar embriões que, de outra forma, seriamabortados espontaneamente ou que não seriamimplantados [40,41]. Os polimorfismos deMHTFR (metilenetetra-hidrofolato folatoreductase), isoladamente ou em combinação sãofatores de risco de uma menor viabilidade fetale perda recorrente do embrião no início da gra-videz [42]. Fato interessante, um estudo insi-nuou que o polimorfismo 677C→T MTHFR nãose encontra em equilíbrio segundo a lei deHardy-Weinberg, pois os homozigotos (TT) es-tavam em minoria em uma população [41]. Esseestudo, embora controverso, apresenta evidên-cia de que esse polimorfismo tornou-se maisprevalente como resultado da suplementação damãe com folato [14]. O efeito da fortificaçãocom folato sobre a prevalência do polimorfismoMTHFR não tem sido relatado em outras popu-lações. Embora os resultados desse estudo se-jam equívocos, tanto os dados de seres huma-nos quanto de murinos indicam que um elevadoteor de suplementação de ácido fólico à mãepode resgatar genótipos que, de outra forma,seriam deletérios ou fatais. Conseqüentemente,a conservadora política de fortificação de ali-mentos previamente mencionada, adotada pe-los EUA, parece justificada.

Programação metabólica primitiva

(imprinting) da expressão de genes fetais

Estudos de gêmeos monozigotos demonstraramque a dieta e a nutrição estão dentre os maisimportantes fatores ambientais que podem de-terminar fenótipos distintos, independentemen-te do genótipo, inclusive suscetibilidade a do-

Os limites superior e inferior (de ingestão)de qualquer nutriente serão influenciadospor variações genéticas normais, gênero efases do ciclo vital. Portanto, existe opotencial para individualizar os requisitosnutricionais segundo os genótiposmaternos e fetais e assim otimizar oresultado da gestação.

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enças crônicas na fase adulta [43]. A etiologiado acometimento tardio da doença crônica éreconhecida como multifatorial, resultante demá nutrição e de fatores genéticos identificáveis.Todavia, há consciência crescente de que fato-res epigenéticos determinados pelo desenvolvi-mento também contribuem para o risco da do-ença na idade adulta [44-46]. A noção de que oambiente fetal contribui para a suscetibilidadea doenças de acometimento tardio, a “hipóteseda origem fetal”, é relativamente nova e reno-vou as atenções para o papel que a nutriçãomaterna desempenha nas várias fases do desen-volvimento fetal com conseqüências que só setornam aparentes posteriormente no curso davida [47]. Essa hipótese surgiu de estudosepidemiológicos que revelaram associação en-tre baixo peso ao nascimento resultante dedesnutrição materna e risco aumentado de do-enças crônicas na idade adulta, inclusive diabe-tes não insulino-dependente (DNID), doençascardiovasculares, obesidade e hipertensão [47].Essa hipótese estimulou a pesquisa experimen-tal para confirmar o papel da nutrição maternano risco de doenças de surgimento tardio pelareprodução desses efeitos no modelo animal edepois, pela elucidação dos mecanismos bioló-gicos subjacentes que os determinaram [46].(Veja J.L.Bresson e J. Rey neste número, àspáginas 13-23).

Um grande volume de literatura descrevedetalhadamente os mecanismos fisiológicos ebioquímicos que permitem que a mãe e o fetoconservem nutrientes disponíveis para a sobre-vivência. Por exemplo, a desnutrição maternade curto prazo nos modelos animais determinamenor captação de glicose e aumento do con-sumo de lactato pelo feto e placenta [44]. Essasmodificações são parcialmente mediadas porrápidas modificações na expressão de genes queregulam as proteínas da placenta que transpor-tam açúcares. Essas mudanças adaptativas sãodinâmicas e influenciadas pela duração do agra-vo nutricional. A desnutrição materna com du-ração superior a 10 dias desencadeia respostasmetabólicas adaptativas que restabelecem oconsumo fetal, mas não placentário, de glicosee lactato aos valores normais apesar da desnu-

trição materna persistente. Essas modificaçõesadaptativas de prazo mais longo são mediadaspor hormônios, inclusive insulina. As adapta-ções feto-placentárias ao ambiente nutricionalmaterno são supostamente, temporárias, rever-síveis e responsivas a mudanças imediatas noestado nutricional materno no curso da gesta-ção. Todavia, a hipótese da origem fetal prevêque certas adaptações metabólicas podem tor-nar-se permanentes e podem influenciar tanto ocrescimento fetal quanto o da placenta e o riscode doença crônica posterior, no curso da vida.Essa hipótese é apoiada por um limitado núme-ro de estudos em animais. Por exemplo, o esta-do nutricional materno durante a gestação emporcos pode influir, numa fase posterior da vidados filhotes, na secreção de leptina, na resistên-cia à insulina e no aparecimento de hipertensão[48]. Essas adaptações ao estado nutricionalmaterno, recentemente revistas e designadascomo “programações metabólicas”[46], ocorremna vigência de períodos críticos do desenvolvi-mento que compreendem organogênese e de-senvolvimento do SNC.

A noção de que o ambiente fetal contribuipara a suscetibilidade a doenças deacometimento tardio, a “hipótese daorigem fetal”, é relativamente nova erenovou as atenções para o papel que anutrição materna desempenha nas váriasfases do desenvolvimento fetal comconseqüências que só se tornam aparentesposteriormente no curso da vida.

Mecanismos epigenéticos potenciais, capazesde estabelecer uma programação metabólica pri-mitiva, foram recentemente sugeridos [46]. Aadaptação permanente associada às programa-ções metabólicas primitivas provavelmente re-sulta de alterações na expressão ou mutaçãodo gene induzidas metabolicamente ou por nu-triente. Uma vez permanentemente estabelecidaa adaptação numa única célula ou em múltiplascélulas, o processo de divisão celular pode ex-pandir essa programação e assim afetar todo o

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órgão ou sistema orgânico caso a alteraçãoconfira uma vantagem seletiva ao processo decrescimento de uma determinada programação.Embora nenhum mecanismo definitivo paraessas programações tenha sido estabelecido,foram avançadas hipóteses lógicas. Sabe-se, porexemplo, que um baixo nível de folato tem in-fluência na metilação do DNA e mudanças nametilação do DNA influenciam as taxas demutação do DNA, um evento que é permanentepor definição. Seja qual for o mecanismo, essasalterações maximizam a função do órgãoembriônico e fetal com relação ao seu ambien-te nutricional e simultaneamente conferem efei-tos sutis mas duradouros à doença durante ocurso da vida. Investimentos em pesquisa nessaárea emergente da nutrição materno-fetal terãoum significativo impacto sobre as abordagens àsaúde pública e recomendações daí decorren-tes, não só quanto aos cuidados pré-natais mastambém para a prevenção de doenças crônicasem adultos.

Conclusões

Embora nossa compreensão do papel da nutri-ção nas anomalias congênitas multifatoriaisencontre-se no início, pesquisas complementa-res tanto em nutrição básica quanto na genéticae desenvolvimento dos mamíferos, estão sendorealizadas num ritmo acelerado. Esses avançossão proporcionados pela conclusão do projetodo genoma humano e avanços associados nastecnologias genômicas, inclusive o desenvolvi-mento de modelos experimentais com camun-dongos geneticamente manipulados. Agora queo código genético humano foi desvendado, serádeterminado o efeito de genótipos específicossobre os requisitos nutricionais e suscetibilidadeà doença. Modelos animais de genótipos huma-nos específicos serão gerados e serão estabele-cidos os modificadores nutricionais dessesgenótipos. Através desse processo, o “projetoda vida” deverá emergir. Esse projeto, quandocompleto, compreenderá não só nossos jogosde genes compostos ou “nossa natureza” mastambém incluirá as influências de nosso ambi-

ente ou “criação”. Aceita-se amplamente que anutrição é o meio mais seguro e mais eficaz demodificar ou manipular estrutura, função e es-tabilidade do genoma. Evidentemente, com acrescente ênfase na manutenção da saúde eprevenção da doença, a compreensão do papelda nutrição materna sobre o desenvolvimentofetal é essencial para reduzir mortalidade emorbidade infantis e para diminuir a incidênciade doenças crônicas na fase adulta. Em termosde saúde pública, os maiores benefícios da re-volução genômica serão concretizados pelapesquisa e descobertas na interface nutrição-genética.

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Introdução

O destino existe? Os genes determinam nossogenótipo e se o destino realmente existe ele está,ao menos parcialmente, escrito em nosso DNA.Polimorfismos provavelmente influenciam o de-senvolvimento da aterosclerose e da hiperten-são [1], da resistência à insulina [2] e daosteoporose [3]; mas os genes não são os úni-cos atores na definição de um indivíduo. Condi-ções sociais e econômicas desfavoráveis tam-bém podem afetar a nossa estatura, a idade damaturidade sexual [4], o desempenho físico [5],as habilidades intelectuais e as habilidadesadaptativas [6]. Poderia a subnutrição intra-uterina influenciar nossos “destinos” a ponto de“programar” nossas características metabólicas[7]? Por exemplo, estaríamos condenados, mes-mo antes de nascer, a uma morte prematuradevido a um enfarte do miocárdio, a um aciden-te vascular cerebral ou a complicações de dia-betes não-insulino dependente [8], simplesmen-te porque o peso com que nascemos era inade-quado para o tempo da gestação ou porque nãoganhamos peso adequadamente durante nossoprimeiro ano de vida?

Diversas linhas de evidência sugerem quealterações nutricionais precoces podemafetar persistentemente a atividade deinúmeros sistemas fisiológicos, em outraspalavras, que essas influências em estágioscríticos do desenvolvimento podem deixar“marcas” permanentes.

Nutrição fetal e suas conseqüênciasa longo prazo

JEAN-LOUIS BRESSON, JEAN REY

Centre d’investigation clinique, Hôpital des Enfants Malades,

Université René Descartes Paris V, 75743 Paris Cedex 15, France

Períodos críticos, desenvolvimento e

variações seculares da estatura

Embora dados de experimentos em animais - emesmo em grau maior, as observações em sereshumanos - não tenham provado, conclusivamen-te, que a alimentação durante as primeiras sema-nas ou meses de vida tem influência, a longoprazo, no colesterol ou na pressão sangüíneosou na obesidade, diversas linhas de evidênciasugerem que alterações nutricionais precocespodem afetar permanentemente as atividadesde numerosos sistemas fisiológicos, em outraspalavras, estas influências em fases críticas dodesenvolvimento podem deixar “conseqüências”permanentes [9, 10]. Este não é um pensamentonovo. Já em 1923, Moulton observou que asubnutrição pré e pós natal estava freqüentementeassociada a um elevado teor de água nos múscu-los, retardando, dessa forma, a “maturidade quí-mica” conforme a expressão por ele cunhada parao momento do desenvolvimento em que as con-centrações de água, proteínas e minerais tornam-se estáveis[11]. Todavia, apenas nos anos ses-senta a idéia de estágios “críticos” ou “sensíveis”durante o período do crescimento do cérebro foidesenvolvida e mais amplamente aceita [12-14].Muitos estudos lidaram com essa questão e maisde 165 publicações sobre o impacto da alimenta-ção nos primeiros anos de vida sobre comporta-mentos subseqüentes e habilidades para o apren-dizado em animais já haviam sido relacionadaspor volta de 1986 [7].

A importância do momento não se llimita ape-nas ao crescimento do cérebro, como ressalta-

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do por MacCance e Widowson [15-17], na pales-tra Food, Growth and Time dada por MacCanceao Royal College of Physicians de Londres nodia dois de maio de 1962 [15]. Pode-se aprendermuitas lições dos experimentos por ele descri-tos. A primeira delas é que, em ratos, os efeitosa longo prazo da restrição energética pós-natalaumentam à medida que a idade de exposiçãose reduz. Restringir a energia alimentar duranteas 3 primeiras semanas de vida i.e. do nasci-mento até o desmame leva à uma hipotrofia quejamais pode ser revertida, mesmo que depois osanimais venham a ter acesso ilimitado ao ali-mento. Entretanto, a recuperação é imediata ecompleta se a mesma restrição é aplicada entrea nona e a décima segunda semana de vida [15].Ratos que foram moderadamente mal nutridosdurante todas suas vidas tendem a ganhar pesomais vagarosamente do que animais que forambem alimentados, mas ganham peso até umaidade mais avançada e também vivem mais tem-po. Podem “recuperar-se” a qualquer momento,mesmo além da idade em que animais normal-mente alimentados morrem [16]. Porquinhosalimentados com proteína e energia insuficien-tes no começo de suas vidas não pesam maisde 5-6 kg com a idade de um ano, ao passo queos controles alimentados adequadamente pesamentre 160-200 kg; quando realimentados com di-eta normal crescem a uma taxa mais acentuadado que animais bem alimentados com a mesmaidade (de fato, no ritmo de animais alimentadosnormalmente de peso similar), mas nunca al-cançam os animais sempre alimentados adlibitum; alguma recuperação ainda é possíveldepois de 2 ou 3 anos de restrição calórica mas,como nos ratos, seus tamanhos finais são me-nores depois da reabilitação. Por esse motivo,estes animais parecem incapazes de realizartodo seu potencial genético [16].

Como conclusão de uma série desses estu-dos, Elsie Widdowson sugeriu que as conseqü-ências da subnutrição intra-uterina seriam ain-da maiores em seres humanos. Ao nascer, por-cos pesam apenas dois ducentésimos (0,5%) eratos aproximadamente 1,5% do seu peso adul-to enquanto crianças pesam 5% de seu pesoadulto (17). Considerando que porcos, ratos e

outras espécies não se recuperam completamen-te de um crescimento deficiente no período fetal,parece lógico concluir que o feto humano, cujocrescimento total in utero alcança proporçãomuito maior, deva sofrer mais em resultado detal tratamento. Veremos que isto pode não serverdade, embora estes dados despertem alguminteresse sobre a origem das variações secula-res de altura. As diferenças nas taxas de cresci-mento de populações de países industriais e emdesenvolvimento, o aumento da estatura e oinício mais precoce da puberdade nos últimos30 ou 40 anos que ocorreu em diversas socieda-des provavelmente resultaram - de acordo coma percepção de MacCance [15] - de um fenôme-no que ocorre em estágios muito precoces dedesenvolvimento ao invés de ser devido ao au-mento geral da disponibilidade de alimentodurante a vida [9].

A má nutrição intra-uterina pode afetar asaúde de um adulto numa dimensão muitomaior do que se acreditava até agora,influenciando a evolução de arteriosclerose,hipertensão, resistência à insulina e muitasoutras funções metabólicas e endócrinas.

A teoria de Barker

A má nutrição fetal, seja devida ao suprimentoinadequado à mãe antes ou durante a gravidez,transporte inadequado de nutrientes ou à trans-ferência inadequada de nutrientes pela placen-ta, não apenas afeta o peso da criança ao nas-cer e seu desenvolvimento subseqüente, mastambém pode “programar” o funcionamento e aorganização de uma série de sistemas; outrosargumentos sugerem que isso poderia afetaratividades enzimáticas permanentemente e in-terferir na expressão dos receptores dehormônios ou mecanismos de realimentaçãoretrógrada (feedback) [18]. A nutrição intra-uterina pode então afetar a saúde de um serhumano adulto numa dimensão muito maior doque se acreditava até agora, influenciando a

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evolução de arteriosclerose, hipertensão, resis-tência à insulina e muitas outras funçõesendócrinas e metabólicas importantes na saúdee na doença do ser humano. Esta é a comumentedenominada teoria de Barker [19, 20].

Mortalidade neonatal no começo do

século passado e a prevalência das

doenças cardiovasculares nos anos

setenta.

Entre as mais perturbadoras ligações da expec-tativa de vida e o crescimento intra-uterino es-tão as associações relatadas entre mortalidadepor doenças isquêmicas do coração na Inglater-ra e no País de Gales e taxas de mortalidadeneonatal nos primeiros anos do século passado[21]. Subseqüentemente, foram feitos relatossimilares para os acidentes vasculares cerebrais.A distribuição geográfica da mortalidade devi-da a esses acidentes foi correlacionada maisintimamente com a mortalidade materna duran-te a gravidez ou parto do que com qualquer outracausa de morte, no passado ou no presente, comexceção da doença isquêmica do coração [22].No começo do século 20, a mortalidade infantile materna foi mais alta em regiões rurais poucopovoadas, assim como em áreas industriais(minas, indústrias têxteis) na Inglaterra e no Paísde Gales; essas taxas foram menores no sul,especialmente em Londres e em algumas cida-des grandes como Birmingham, Manchester eLiverpool. Essas relações sugerem que a alimen-tação inadequada durante a gravidez ou duran-te os primeiros meses de vida pós- parto au-mentaram a susceptibilidade aos efeitos de cer-tos tipos de comportamento como fumar e faltade exercícios.

Os registros de nascimentos de

Hertfordshire, Preston e Sheffield

Uma suposta conexão entre a subnutrição intra-uterina e o acometimento de hipertensão, dia-betes e doenças coronárias em adultos e crian-ças não poderia ser investigada sem a busca

sistemática do MRC (Medical Research Council)nos registros de nascimentos anteriores. Estabusca conduziu a três importantes bancos dedados, ou seja, um na comarca de Hertfordshiree os outros dois em Preston e Sheffield. EmHertfordshire, foram registrados o peso de to-das as crianças nascidas na região entre 1911 e1930. Em Preston (1935-1943) e em Sheffield,apenas os pesos dos bebês que nasceram emhospitais foram anotados, mas outros dadosessenciais foram incluídos nesses registros,p.ex., dados sobre gravidezes anteriores, com-primento dos bebês, circunferência encefálica eabdominal e também o peso da placenta. Alémdesses dados, foi anotado o peso de algunsbebês com a idade de 1 ano, assim como a his-tória da alimentação durante o primeiro ano devida (amamentação ou alimentação com mama-deira até a idade de 1 ano); esta prática não eramuito comum na época, o que torna esses da-dos muito valioso [8].

O peso na infância e a prevalência

de doença cardiovascular

Barker e seus colegas encontraram os primei-ros indícios de uma relação entre o peso nainfância e a prevalência de acometimento dedoença cardiovascular na idade adulta nos re-gistros de Hertfordshire. Após excluir gêmeos etrigêmeos restaram 15.000 prontuários de paci-entes; em 8.000 constava o peso de nascimentoe o peso com 1 ano de vida. Conseguiram loca-lizar 74% dos registros originais; 1.186 haviamfalecido com idades de 20 a 74 anos. Analisa-ram causas de morte e as relações com o pesodo nascimento; peso na idade de 1 ano e ali-mentação nessa idade. Compararam esses da-dos com as estatísticas nacionais de homens damesma idade e nascidos no mesmo ano e con-ciliaram os resultados segundo a média nacio-nal (SRM = standard mortality rate = taxa demortalidade padrão ). Concluíram que as mor-tes devido à isquemia estavam relacionadas in-versamente ao peso na idade de 1 ano (p<0,002),e que os homens que pesaram menos que 2,5kgao nascer apresentaram média maior em com-

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paração com a taxa nacional. A relação inversaentre SRM e os pesos de nascimentos mais al-tos, contudo, não foi significativa [23]. Análisesdos registros de Sheffield confirmaram a asso-ciação entre a mortalidade por causacardiovascular e o peso de nascimento em ho-mens, mas uma estatística significativa (p = 0,05)somente foi registrada no subgrupo de homensque morreram após a idade de 65 anos. As ta-xas de doenças cardiovasculares não estavamrelacionadas ao tempo de gravidez, exceto porum pequeno aumento entre aqueles que nasce-ram prematuros. A relação inversa estatistica-mente significativa entre a mortalidade de cau-sa vascular e circunferência encefálica ou índi-ce de peso (P/T 2) ao nascimento foi outra ra-zão para se suspeitar que o retardamento docrescimento intra-uterino, ao invés do nascimen-to prematuro, tenha sido o fator causal [8, 24].

Barker e seus colegas usaram outros argu-mentos para sustentar essa teoria. Apontaram,por exemplo, que o insuficiente desenvolvimen-to hepático intra-uterino em homens e mulhe-res por má nutrição, sugerido por uma circun-ferência abdominal reduzida ao nascimento,apresentam taxas significativamente mais ele-vadas de colesterol (LDL-C), apo B e concen-trações de fibrinogênio do que os que não so-freram de subnutrição durante o último períodode gestação [25]. Mas a relação é complexa, umavez que a associação entre doençascardiovasculares e o tamanho da circunferên-cia abdominal tem formato de U. Além disso,indivíduos que haviam sido amamentados e nãoforam desmamados á idade de um ano têm taxamaior de morte por causa cardiovascular e umataxa maior de concentração de colesterol total,LDL-C apo B aos 60-70 ano do que os que foramdesmamados antes de 1 ano de vida ou queforam alimentados com leite materno e comoutros tipos de leite [26]. Como Paneth e Susserenfatizaram em sua revisão, o peso ao nasci-mento das mulheres, mais do que o peso naidade de 1 ano, encontra-se significativamenteassociado à mortalidade por causascardiovasculares e também à diversos fatoresde risco para a aterosclerose, inclusive indica-dores de resistência à insulina [19]. Os resulta-

dos são difíceis de conciliar completamente coma teoria de Barker. Além disso, recentes estu-dos finlandeses relataram que a mortalidade porcausas vasculares é maior em meninos que erammagros ao nascimento mas que “recuperaram-se” quanto ao peso, de modo que aos 7 anosseus pesos correspondiam ou excediam o índi-ce médio de massa corporal da população [27].De fato, o rápido aumento de peso depois de 1ano de idade associava-se a um risco maior, masapenas naqueles que haviam sido magros aonascer [28]. Ao contrário, mulheres do mesmogrupo com o mais elevado risco para doençascardiovasculares haviam sido menores em vezde mais leves e recuperaram-se mais na alturado que no peso depois do nascimento de modoque eram altas como meninas [29]. De acordocom Barker et. al*, (veja abaixo) o maior riscode mortalidade por doenças cardiovascularespode ser o resultado da combinação do retarda-mento do crescimento intra-uterino e da recu-peração estatural pós-natal [27].

Pequena estatura, ajustamento social e

mortalidade por doença das coronárias

Muitos estudos mostram que a mortalidadecardiovascular está relacionada inversamentecom os níveis sociais e educacionais [23, 30,31]. Isto não é surpresa uma vez que foi reco-nhecida historicamente uma relação entre esta-do de saúde, expectativa de vida e condiçõeseconômicas sociais, individuais e comunitáriaspara todas as faixas etárias, de qualquer etnia[32]. Um estudo holandês confirmou que aprevalência de fatores de risco para enfarte, obe-sidade, estilo de vida sedentário e elevadas con-centrações de lipoproteínas do colesterol de altadensidade (HDL-C) diminuem à medida queaumenta o nível educacional [33].

A estatura parece estar associada ao statussocial, e a este respeito, fatores sociais e cul-turais são pelo menos tão importantes quantoas condições intra-uterinas. O Registro Suecode Gêmeos (Swedish Record of Twins) dá su-porte a essa visão. De acordo com esse estu-do, o menor dos gêmeos tem mais probabilida-

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de de morrer por enfarte do que o maior. Orisco de enfarte é de apenas 0,6 para os maio-res de 1,75m (IC 95%: 0,38-0,93), com base noscontroles menores de 1,60m [34]. No entanto,o peso ao nascimento de gêmeos não é umindicador confiável das conseqüências a longoprazo do retarde do crescimento intra-uterino.A altura final dos gêmeos, por exemplo, nãoestá tão diretamente associada com o peso aonascimento como na população em geral; e osriscos de doenças cardiovasculares e mortali-dade por todas as causas depois dos 6 anos deidade não é maior para gêmeos, embora amédia de seus pesos e o comprimento, ao nas-cimento, sejam 900g e 2cm a menos do quenos bebês de parto único [34, 35].

O local de moradia parece ter maisinfluência do que o local de nascimento notocante ao risco de doença cardiovascularou acidente vascular cerebral e asdiferenças na pressão sangüínea estavamassociadas mais à residência do indivíduodo que ao local de nascimento.

Outras descobertas não se harmonizam coma teoria de Barker. Um estudo finlandês, porexemplo, mostra que as diferenças entre amortalidade adulta dentro das classes sociaisnão está relacionada com as condiçõessocioeconômicas da infância [32]. A localizaçãoda residência parece influenciar mais que o lu-gar do nascimento quanto ao risco de doençascardiovasculares e derrames cerebrais [36, 37]e as diferenças na pressão sangüínea foramassociadas à residência do indivíduo ao invésdo lugar de nascimento [38]. Além disso, é pro-vável que bebês de baixo peso façam parte deum grupo mais sujeito às desvantagens econô-micas do que outros e que [39], em linhas ge-rais, as áreas pobres no começo do século ain-da continuam na mesma situação [40]. Emboraos registros de Hertfordshire, de Preston e deSheffield sejam as únicas fontes de informação,seria imprudente chegar a conclusões atravésdeles sem considerar todos os fatores que de-

terminam o curso da vida. Os contextos econô-micos, políticos e sociais continuam relevantes[32]. Além disso, não existem evidênciasepidemiológicas de que uma subnutrição leveou moderada traga maiores conseqüências parao crescimento fetal [42].

Hipotrofia ao nascimento e hipertensão

arterial na vida adulta

Os registros de Hertfordshire renovaram as aten-ções para as possibilidades de a hipotrofia aonascimento e/ou ganho ponderal insuficiente noprimeiro ano de vida predispõe indivíduos adul-tos à hipertensão e, portanto para doençacardiovascular. Gennser et. al. [43] constataramanteriormente uma relação entre a pressãodiastólica e o peso ao nascimento em recrutassuecos, ou seja, a alta pressão diastólica estavainversamente relacionada com o tempo da ges-tação e o peso ao nascimento. Para investigaressa relação, Barker et. al. analisaram outrosdados de duas abrangentes pesquisas realiza-das no Reino Unido: 1º) o grupo de 1970, cons-tituído por quase todos os bebês nascidos noReino Unido durante uma dada semana, dosquais 10.000 foram examinados novamente com10 anos de idade; e 2º) no grupo de 1946, repre-sentando uma amostra de todos os nascimen-tos na Inglaterra, no País de Gales e na Escócia,do qual 82% foram examinados novamente com36 anos de idade. A pressão sangüínea estavainversamente relacionada ao peso do nascimen-to, sem levar em consideração o tempo de ges-tação, comprovando dessa forma as descober-tas do dois estudos anteriores que mostraramque a pressão sangüínea na idade de 10 anosera maior em crianças com baixo peso ao nas-cimento do que o grupo controle e que a pres-são sistólica na idade de 7 anos estava inversa-mente relacionada com o peso ao nascimento[44]. Estudos em seres humanos e animais so-bre supostas ligações entre o peso ao nascimen-to e o acometimento de hipertensão na idadeadulta indicam uma relação mais complexa doque se pensava inicialmente. A associação en-tre a hipertensão na vida adulta e a nutrição na

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infância não está apenas limitada à má nutriçãointra-uterina, embora o número de artigos queabordam esta relação possa nos iludir. Não foiencontrada uma relação significativa entre pres-são diastólica e sistólica em diferentes idades epeso ao nascimento ou melhor, entre a pressãosistólica e o índice de peso corporal [46] emtodos os estudos, mesmo naqueles que apresen-taram uma ligação significativa entre o retardedo crescimento intra-uterino (RCIU) e a resis-tência à insulina mais tarde, na vida [41]. Umestudo multicêntrico sobre a evolução a longoprazo de bebês prematuros do Reino Unido nãodetectou a relação inversa entre o peso do nas-cimento e a pressão sistólica e diastólica naidade de 7,5 a 8 anos. Esse estudo relatou bai-xas pressões sangüíneas nos que nasceram compesos abaixo do normal para o tempogestacional [47]. Outro estudo realizado no Rei-no Unido relatou que a pressão sistólica tendea baixar e não aumentar na adolescência na-queles bebês que nasceram com baixo peso [48].Em um estudo holandês, a relação entre a pres-são sangüínea e o peso ao nascimento foi rela-tada como não linear, em outras palavras, osriscos maiores foram encontrados em criançascom baixo peso ao nascimento e naquelas compeso ao nascimento maior do que 3700g [49].

Além disso, dentre os numerosos fatoresperturbadores que foram examinados tais comoa idade da mãe, a ordem dos nascimentos, ál-cool ou fumo, o índice de massa corporal noadulto (Peso/altura2 em metros) desempenhaum papel decisivo [41]. Um estudo sueco mos-trou que o atraso do crescimento no útero estáassociado ao aumento da pressão sangüíneaapenas em pessoas que apresentam excessode peso aos cinqüenta anos. Outro estudo re-latou que o risco aumenta apenas nos que apre-sentaram, simultaneamente, baixo peso ao nas-cimento e alto índice de massa corporal quan-do adulto. Um estudo longitudinal holandêstambém relatou associação entre alto índicede massa corporal, baixo peso ao nascimentoe hipertensão arterial na fase adulta [50]. Ou-tros também relataram que a combinação doretarde do crescimento intra-uterino (RCIU) eo crescimento pós-natal de recuperação (catch

up) favorecem o desenvolvimento da hiperten-são na fase adulta [51]. Finalmente, o supostoefeito do baixo peso ao nascimento na pressãosistólica parece ser brando. Depois dedesconsiderada a massa corporal atual, a pres-são sistólica nas idades de 64 até 71 anos abai-xou 5,2mmg Hg (95% do intervalo de confian-ça: 1,8-86) para cada kg de aumento no pesoao nascimento [52] (tabela 1).

Isto poderia, como em outros casos, ter ape-nas um significado estatístico - um mero relatode probabilidades – e ter somente pequena re-levância quanto aos resultados funcionais? As-sim como Petr Skrabanek e James McCormickafirmam em seu livro Crazy Ideas, Wrong Ideasin Medicine [53], se muitos casos são necessá-rios para revelar um efeito, é provável que ainterpretação deva ser cautelosa e sua influên-cia sobre os níveis de risco deve ser considera-da com grande cautela.

Resistência à insulina, vantagens

seletivas e conseqüências para gerações

futuras

Além do maior risco de hipertensão, paraexplicar a grande freqüência de doençascardiovasculares em adultos que tiveram seuspesos ao nascimento abaixo do normal, DavidBarker e seus colegas também propuseram quealterações no desenvolvimento das células β dopâncreas num estágio fetal crítico levem aodiabetes tipo 2 (não-insulino-dependente) nafase adulta, freqüentemente associado à hiper-tensão [54]]. De fato, um estudo dos sobrevi-ventes do registros de Hertfordshire demons-trou que a freqüência do diabetes tipo 2 - e aintolerância à glicose que o precede – reduzi-ram-se progressivamente com o aumento dopeso ao nascimento e à idade de 1 ano, depoisde feitos os ajustes relativos ao índice de massacorporal do adulto. Neste grupo, o risco de in-tolerância à glicose ou de diabetes foi 6 vezesmaior (IC 95%; 1,5-28) naqueles cujo peso aonascimento foi de 2,5kg ou menos, comparati-vamente aos que tiveram pesos ao nascimentoacima de 4,3 kg [54].

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Tabela 1: pressão sistólica (mm Hg) e peso ao nascimentoem meninos e adultos (de acordo com [52]).

Diferença média (SE)*

Farnborough1 ano (n=1344) 0.4 (0.7)4 anos (n=1147) – 2.5 (0.6)10 anos (n=445) – 1.3 (0.9)

Grupo Britânico, 194636 anos (n=1630) – 2.3

Preston46-51 anos (n=123) – 2.8 (3.3)51-54 anos (n=117) – 3.4 (5.2)

Hertfordshire59-64 anos (n=426) – 3.0 (2.0)64-71 anos (n=418) – 4.9 (2.0)

*para cada kg de aumento de peso ao nascimento

O estudo de Preston também confirmou umaassociação significativa entre a intolerância àglicose ou ao diabetes tipo 2 e peso ao nasci-mento, circunferência encefálica e condição demagreza ao nascer. Os pesos das placentas tam-bém não foram relacionados ao risco, a pro-porção do peso ao nascimento com o peso daplacenta era um prognóstico muito significati-vo [55]. Estudos subseqüentes de centenas deindivíduos do mesmo grupo confirmaram queos magros ao nascimento tinham maior resis-tência à insulina, independentemente do tem-po de gestação, índice de massa corporal quan-do adulto e classe social, seja ao nascimentoou no momento do seguimento (follow up) (56).O risco de desenvolver a “síndrome X” (i.e.resistência à insulina, hipertensão ehipertrigliceridemia com HDL reduzido) era dezvezes maior – após ajustar-se ao índice de mas-sa corporal quando adulto – dentre os sobrevi-ventes de ambos os grupos cujos pesos aonascer eram inferiores a 2,5 kg, em compara-ção com os que pesaram 4,3 kg. Essas desco-bertas sugerem que a síndrome X, a qual Barkeret al. propuseram chamar de “síndrome dosbebês pequenos”, é a conseqüência, ao menosem parte, de fatores que se manifestam em es-tágios muito precoces da vida.

De acordo com a teoria de Barker, aprevalência do diabetes tipo 2 em uma dadapopulação, é em função do retarde docrescimento intra-uterino e da atualprevalência da obesidade na fase adulta.

A relação entre o baixo peso ao nascimento eo desenvolvimento da resistência à insulina foicomprovada através de diversos estudos, nosEstados Unidos, na Suécia e na França. Emjovens adultos americanos, não diabéticos e compressão sangüínea normal, o peso ao nascimen-to foi relacionado inversamente com as concen-trações da insulina no plasma em jejum e naadiposidade do tronco, sem considerar sexo,etnia, status econômico e social. As anormali-dades dos lipídeos, característica da síndromeX, não foram encontradas [58]. No grupo deUppsala, na Suécia, a freqüência do diabetestipo 2 à idade de 60 anos foi relacionada inver-samente com o peso ao nascimento, e aindamais, com o índice de massa corporal ao nasci-mento, confirmando que o peso significativa-mente menor do que o esperado para o compri-mento ao nascimento está fortemente associa-do com alto risco de resistência à insulina naidade adulta e, de uma forma secundária, como diabetes tipo 2 [59]. Finalmente, os dadoscoletados nos registros de Haguenau, França,mostraram que homens jovens que haviam so-frido retarde do crescimento intra-uterino(RCIU) tinham nível muito mais alto de concen-tração de insulina e pró-insulina depois de umteste de provocação por glicose do que os quetinham pesos adequados para o tempogestacional [60]. Nesse estudo, treze indivíduosinsulino-resistentes que sofreram retarde docrescimento intra-uterino apresentavam respostaanormal do gene do transportador (Glut4) daglicose à insulina. Quer isso reflita ou não osefeitos de desnutrição intra-uterina ou resistên-cia à insulina é algo que ainda precisa ser esta-belecido (61). Por fim, a exposição pré-natal acondições de fome, principalmente durante oterceiro trimestre da gestação como aconteceuno inverno de 1944-45 na Holanda, também le-

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vou a uma reduzida tolerância à glicose na idadeadulta; este efeito parece especialmente acentu-ado em indivíduos que subseqüentemente se tor-naram obesos (62). Entretanto, não se pode des-prezar as conseqüências do crescimento pós-natalna atividade das células β e na tolerância à glicosena vida adulta; em crianças com 7 anos de idade,a resistência à insulina foi correlacionada com oganho rápido de peso, principalmente na formade gordura subcutânea [63].

Embora pareça definida a relação entre retar-de do crescimento intra-uterino e o desenvolvi-mento da resistência à insulina na vida adulta,ainda permanecem algumas incertezas. É pro-vavelmente imprudente pensar que o desenvol-vimento do diabetes, da hipertensão e de doen-ças cardiovasculares basicamente resultem deacontecimentos que ocorrem nos primeiríssimosestágios da vida, ao invés de resultarem da açãocombinada de fatores genéticos e ambientaiscombinados, ativos durante todo o desenvolvi-mento.

De acordo com a teoria de Barker, aprevalência do diabetes tipo 2 em uma dadapopulação, ocorre em função do retarde do cres-cimento intra-uterino que atuou no passado eda ocorrência da obesidade na fase adulta [64].Com pequenas diferenças, esta idéia levou aoque Hales e Barker chamaram de teoria do“fenótipo parcimonioso” (the thrifty phenotype)[65], em contraste com a teoria do “genótipoparcimonioso” (thrifty genotype) formulada porNeel em 1962 numa tentativa de explicar a fre-qüência do diabetes em sociedades opulentas[66]. De acordo com Nell, a seleção do gene oudos genes que predispõe indivíduos ao diabe-tes, apesar do impacto negativo esperado nacapacidade reprodutiva, sugere uma vantagemde sobrevivência para os transportadores. Nes-se contexto Nell enfatizou que antes da revolu-ção neolítica quando as colheitas e a criação deanimais passaram a substituir a caça, a fomeera mais freqüente do que os períodos de fartu-ra. A capacidade de serem econômicos nos pe-ríodos de escassez de alimentos e de aumentaro armazenamento de gordura quando havia co-mida, fez com que tivessem mais chances desobreviver do que indivíduos com um metabo-

lismo menos eficiente. É esta ampla habilidade,no sentido de serem excepcionalmente eficien-tes na ingestão e/ou utilização de comida, queNell chamou de “parcimoniosidade” [66].

Um exemplo clássico desta habilidade de ar-mazenar comida e sobreviver a condições ex-tremas são os índios Pima, que se localizavamno Arizona, Estados Unidos, mais de 2.000 anosatrás. São supostamente os descendentes dosPaleoíndios, i.e. ameríndios, resultantes da pri-meira migração pelo estreito de Bering. Estaspopulações que sobreviviam da caça consegui-ram irrigar áreas desérticas e não mantiveramnenhum contato permanente com os europeusaté 1860. Viviam em condições extremamentedifíceis até recentemente. O diabetes era prati-camente desconhecido por eles no começo doséculo passado e não foi listado entre as 28doenças das quais eles mais padeciam. Apenasna metade de 1960 o diabetes tipo 2, com obe-sidade e pedras biliares, foi reconhecido comuma das maiores ameaças à saúde dessa popu-lação [67]. Atualmente, a incidência do diabetestipo 2 entre os índios Pima é a mais alta nomundo, o que sugere que as condições nas quaiseles haviam sobrevivido selecionou genes quepromovem a absorção e o armazenamento degordura. A alta freqüência do polimorfismoThr54 no gene FABP2, i.e. uma proteína do in-testino com grande afinidade para ácidos graxosde cadeia longa, talvez seja uma chave para aspressões que a seleção natural obrigou estapopulação a expressar. Esta variante provavel-mente promove a absorção e a oxidação dagordura e também pode afetar a ação da insu-lina [68]. Assim, como Nell previu, uma vanta-gem seletiva – i.e. o “genótipo parcimonioso”-tornou-se prejudicial em função do “progresso”,ou mais precisamente, pela aculturação [69].Conforme a alternativa para a teoria de Barkerproposta por Waldhäusl e Fasching [70], maistarde promovida por David R McCance et al.[71],a prevalência crescente do diabetes tipo 2 entreindivíduos que tiveram baixo peso ao nascimen-to, reflete maior capacidade nos geneticamentepredispostos a desenvolver o diabetes à sobre-vivência no útero e no período pós parto emface à subnutrição [70, 71].

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Diferenças geográficas e fatores

socioeconômicos

Um vínculo entre a freqüência de doençascardiovasculares e os acontecimentos no come-ço da infância foi proposto antes da teoria deBarker ter sido desenvolvida. Marmot et al.apontaram para uma relação inversa entre esta-tura, classe social e mortalidade e sugeriramque fatores atuantes em idade precoce podemafetar a mortalidade na vida adulta [30]. Noentanto, nem todos os dados são consistentescom essa relação. Na Finlândia, diferenças emtodas as causas e a mortalidade adulta por cau-sas cardiovasculares não relacionavam-se comas condições socioeconômicas da infância e istonão sustenta a teoria de que acontecimentos nainfância são os grandes determinantes da saúdena vida adulta. [32].

Esta visão mais limitada tem como suportevários estudos que relatam que o local onde apessoa vive é um fator de risco mais importan-te para doenças coronarianas e derrames doque o local onde essa pessoa nasceu. Em Lon-dres, o menor risco de acidentes vascularescerebrais situa-se entre os habitantes que mu-daram-se para lá e viveram grande parte davida adulta nessa área [72]. O Britsh RegionalHeart Study também mostrou claramente que,sem levar em consideração o local do nasci-mento, homens que vivem no sul da Inglaterratinham a pressão sangüínea menor do que osque vivem na Escócia [73].

É improvável que consigamos discernirtodos os impactos de fatoressocioeconômicos na infância e na vidaadulta sem levar em conta fatores quedeterminam o curso da vida e seu contextoeconômico, político e social.

Conclusões

A cautela é imprescindível na interpretaçãodessas análises. É improvável que consigamos

discernir todos os impactos socioeconômicosna infância e na vida adulta sem levar em contaos fatores que determinam o curso de uma vidae seu contexto econômico, político e social. Écertamente provável que as crianças que tive-ram baixo peso ao nascimento estejam sujeitasa maior risco do que as outras de experimenta-rem condições econômicas desvantajosas e que,na verdade, as áreas que estavam entre as maispobres no começo do século ainda continuemnessa mesma situação.

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Introdução

A Academia Americana de Pediatria (AAP)afirmou em 1994 que “em famílias com umhistórico marcante de IDDM (insulin-dependent diabetes mellitus = diabetes melitusinsulino-dependente), especialmente se umirmão tem diabetes, é particularmente indicadaa amamentação ao seio e desencorajados o lei-te de vaca disponível comercialmente e os pro-dutos que contêm a proteína intacta do leite devaca durante o primeiro ano de vida" [1]. Esteconsenso de opinião representa uma das pri-meiras recomendações oficiais para a nutriçãode bebês e crianças a fim de prevenir uma do-ença que geralmente surge meses ou anos maistarde na vida. A partir daí, tem crescido a pre-ocupação de que um período muito curto deamamentação ao seio pode levar a diversasdoenças mediadas imunologicamente na infân-cia e mesmo na idade adulta.. Como o leite devaca é geralmente o primeiro nutriente “estra-nho” após a cessação da amamentação ao seio,o debate também implica os possíveis efeitosdo leite de vaca na patogênese de diferentesdoenças mediadas imunologicamente. Portanto,seria importante diferenciar entre os possíveisefeitos adversos de um período curto deamamentação ao seio e a introdução precocedo leite de vaca e outras proteínas estranhascomo o glúten, na dieta. Todavia, como grandeparte da evidência para as hipóteses acimamencionadas deriva de estudos epidemiológicos,as exigências teóricas relativas à plausibilidadebiológica dessas associações são difíceis de

satisfazer. Nessas circunstâncias, são necessá-rios experimentos imunológicos bem como emanimais para validar certos aspectos de umarelação possível entre a dieta na infância e apatogênese de diferentes doenças mediadasimunologicamente que surgem posteriormente.

Proteínas administradas oralmente sãogeralmente os primeiros antígenosestranhos que são processados pelo sistemaimunológico em amadurecimento. Por essarazão, o possível papel de fatores precocesda dieta na patogênese do diabetes do tipo 1têm merecido muita atenção.

O leite humano é uma fonte adequada damaioria dos nutrientes essenciais em quasetodas as circunstâncias e também o portadorde muitos componentes imunologicamenteativos. Além de numerosos componentesantiinflamatórios como citocinas e fatores docrescimento, o leite humano também contémnumerosos leucócitos, principalmentemacrófagos, granulócitos e linfócitos [2]. Suasfunções exatas ainda não estão claras, mas es-sas células têm sido encontradas na mucosaintestinal e no baço de ratos que mamavam, oque torna possível um certo papel na regulaçãoimune [3]. Os níveis de citocinas reguladoras daimunidade como o interferon-γ (IFN-γ), o trans-formador do fator-β do crescimento (TGF-β) eo granulócito, um fator estimulador de colônia(G-CSF), são muito maiores no leite humano do

Nutrição na infância e doenças mediadasimunologicamente

HERMANN E. WASMUTH, SIEGFRIED MATERN

Departamento médico III, Universidade de Aachen,

Pauwelsstrabe 30,D-52074 Aachen, Alemanha

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que no sangue ou nas fórmulas infantis à basede leite de vaca [4]. Recentemente, demonstrou-se que esses componentes influenciam amaturação adequada do sistema imunológicointestinal, importante no manejo imunológicode antígenos introduzidos oralmente. Experi-mentos com ratos geneticamente modificadospara TGF-β1 demonstraram que a quantidadedessa citocina no leite humano é realmentesuficiente para proporcionar a esses ratos asobrevivência no pós- parto e um desenvolvi-mento normal. Além disso, crianças que foramamamentadas ao seio produzem mais IFN-γquando infectadas pelo vírus respiratóriosincicial (RSV) e ao serem vacinadas contra asarampo-caxumba-rubéola [6]. À luz dessesachados parece plausível que o ato de evitar ouinterromper precocemente a amamentação aoseio poderia ter efeitos fundamentalmente ad-versos no desenvolvimento adequado do siste-ma imunológico na primeira e segunda infânci-as. A comprovação está no fato de que oslactentes amamentados ao seio têm eventualproteção contra otite média, infecções respira-tórias e bronquite sibilante até 7 anos depois deinterrompida a amamentação ao seio, ressaltan-do os efeitos duradouros da dieta na infânciasobre a função imune [4].

No transcorrer das duas últimas décadas fo-ram realizados numerosos estudos que vincula-ram doenças mediadas imunologicamente à ces-sação precoce da amamentação e introduçãotanto do leite de vaca quanto o glúten na pri-meira ou segunda infâncias. Nesta revisão, oindício do diabetes melitus tipo 1, doençacelíaca, doença inflamatória do intestino, doen-ça da tireóide e esclerose múltipla serão discu-tidas à luz da literatura atual.

Diabetes melitus tipo 1

O tipo 1 ou o diabetes melitus mediadoimunologicamente é visto como o resultado dadestruição das células beta no interior das ilhotasde Langerhans (Fig. 1). Existe uma grande pre-disposição genética para essa condição ilustradapor uma taxa de concordância de quase 30% em

gêmeos idênticos [7]. Entretanto, tornou-se claronos últimos anos que fatores ambientais nãoidentificados também contribuem para apatogênese da doença. Ainda é uma questão dedebate como esses fatores ambientais iniciam e/ou modulam a progressão da doença [8]. Comoo diabetes associado à auto-imunidade aparecemuito cedo na vida, uma contribuição relevantede eventos ambientais logo após o nascimentoparece plausível [9]. Proteínas administradas oral-mente são geralmente os primeiros antígenosestranhos que são processados pelo sistemaimunológico em amadurecimento. Por essa ra-zão, o possível papel de fatores precoces da di-eta na patogênese do diabetes do tipo 1 têmmerecido muita atenção.

Evidências que apoiam a hipótese de que op-ções de alimentação nos primeiros meses sãorelevantes para o desenvolvimento posterior dodiabetes mediado imunologicamente derivam

Predisposição genética

Iniciação daauto-imunidadepor fatores da

dieta

Destruição celular pormediação auto-imune

Modulação daauto-imunidade

por fatores da dietaFatores ambientaisnão específicos que

levam ao inícioclínico da doença

Manifestação clínicada doença auto-imune

Figura 1: Fatores da dieta podem influenciar, em diferen-tes estágios, o desenvolvimento de doença mediadaimunologicamente. Primeiramente, fatores da dieta po-dem desestabilizar a regulação imunológica dirigida paraantígenos endógenos, levando, assim, à destruição auto-imune de diferentes células. Num segundo passo, fatoresda dietas podem modular o processo imune em andamen-to e afetar a fase pré-clínica da doença auto-imune.

Nutrição na infância e doenças mediadas imunologicamente

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principalmente de estudos epidemiológicos. Em1984, Borch-Johnsen et al. publicaram um tra-balho no qual propuseram uma relação inversaentre a freqüência da amamentação ao seio ea incidência do diabetes melitus tipo 1 na in-fância [10]. Essa observação foi mais tarde am-pliada pela descoberta de uma acentuada cor-relação positiva entre o consumo per capitade leite de vaca e a incidência do diabetes tipo1 em crianças com até 14 anos em países dife-rentes [11,12]. Baseado nesses resultados, al-guns estudos de casos controlados compara-ram os padrões alimentares de crianças nosprimeiros nove a doze meses que posteriormen-te desenvolveram diabetes e os padrões alimen-tares de crianças-controle saudáveis. Em duasmeta-análises desses estudos, um risco modes-to mas estatisticamente significativo de diabe-tes foi demonstrado em crianças que foramamamentadas ao seio por menos de seis mesese expostas ao leite de vaca antes da idade detrês meses [13, 14]. É importante considerarque apenas crianças com predisposição gené-tica correm risco de desenvolver o diabetestipo 1. Em dois estudos, crianças com diabetesforam equiparadas a grupos controle comantígenos-HLA similares. Neste caso, o riscode diabetes mediado imunologicamente em cri-anças que haviam mamado ao seio por umcurto período era ainda mais alto do que oconstatado em estudos anteriores [15,16]. To-davia, uma forte tendência à distorção das lem-branças pode ter influenciado esses resultados.Portanto, estudos prospectivos são necessári-os para definir o possível papel de eventosnutricionais precoces na patogênese do diabe-tes do tipo 1.

Até esta data, três estudos prospectivos nãoencontraram nenhuma relação entre o momen-to da introdução do leite de vaca na dieta ou dequalquer outra proteína estranha e o desenvol-vimento da auto-imunidade associada ao diabe-tes [17, 19]. Como estes períodos de observa-ção ainda são relativamente pequenos e com-preendem apenas um pequeno número de indi-víduos, é provavelmente muito cedo para tirarconclusões concretas desses estudos. Para tes-tar definitivamente a hipótese de que evitar a

proteína intacta do leite de vaca nos primeiros6-8 meses de vida reduz a incidência do diabe-tes do tipo 1, um estudo multicêntrico foi inici-ado na Finlândia. O estudo é parte de uma sériede esforços destinados a reduzir a incidênciado diabetes do tipo 1 nos que, geneticamente,estão em risco de desenvolver essa condição.Os pesquisadores compararam lactentes alimen-tados com fórmulas infantis à base de leite devaca com lactentes alimentados com fórmula àbase de hidrolisado de caseína depois de umperíodo de amamentação exclusivamente aoseio de lactentes com múltiplos alelos de riscopara o diabetes do tipo 1. O objetivo do estudofoi de impedir no curso dos seis primeiros me-ses de vida que proteínas estranhas intactasfossem ingeridas por um grupo de crianças ge-neticamente predispostas que são rigorosamen-te monitoradas com o objetivo de identificarimunidade associada ao diabetes e o desenvol-vimento de diabetes do tipo 1 clinicamente apa-rente. Atualmente foi publicada uma análiseprovisória que mostrou uma redução estatisti-camente significativa no número de criançaspositivas para autoanticorpos no grupo das cri-anças alimentadas com fórmula de hidrolisadode caseína [20]. Todavia, estão sendo aguarda-dos outros resultados deste estudo antes que seestabeleçam conclusões firmes que deverão terimplicações sociais e econômicas de grandemonta. Além disso, este estudo destina-se so-mente a testar os efeitos de uma fórmula infan-til hidrolisada em comparação com a dieta nor-mal e pode mostrar apenas indiretamente adiabetogenicidade potencial do leite de vaca nãomodificado. Poderá, por definição, não excluiroutras proteínas, como soja ou trigo, que po-dem ser tanto ou mais prejudiciais. Existe, adi-cionalmente, uma incerteza maior relacionadaaos mecanismos que fazem as proteínas estra-nhas como as do leite de vaca contribuírem paraa patogênese do diabetes melitus do tipo 1.

Um possível mecanismo são as respostasimonológicas adversas, geradas por crianças ge-neticamente predispostas, às proteínas estranhascom potencial de reação cruzada com osepítopos das células beta, um mecanismo deno-minado mimetismo molecular. Pacientes com o

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diabetes tipo 1 têm elevada reatividade imunehumoral e celular às proteínas do leite de vacae às proteínas do trigo na maioria dos estudos,mas não há prova conclusiva de uma reaçãocruzada dos anticorpos e linfócitos comantígenos de células betas pertinentes [21]. Alémdisso, a reação imune às proteínas do leite devaca não é específica da doença. Também éencontrada em pacientes com deficiência de IgAe doença celíaca [22]. Um conceito alternativode reação cruzada entre proteínas do leite devaca e células beta foi desenvolvido recente-mente por Vaarala et al. [23, 24]. Este grupopropõe que crianças expostas precocemente àsfórmulas infantis à base de leite de vaca têmelevados títulos de anticorpos e reatividadeimune celular à insulina bovina que é um cons-tituinte natural do leite de vaca. Conseqüente-mente, uma exposição precoce ao leite de vacaprovocaria imunidade em vez de induzir tole-rância à insulina, o único autoantígeno especí-fico das células-beta implicado na patogênesedo diabetes do tipo 1. Essa interessante hipóte-se aguarda confirmação através de estudosprospectivos relevantes.

A exposição de indivíduos geneticamentepredispostos à dietas que contêm proteínas“diabetogênicas” promoveria odesenvolvimento de auto-imunidade pordesestabilizar ulteriormente os mecanismosde tolerância oral e suprindo epítoposmiméticos com o potencial para areatividade cruzada com os antígenospróprios (self), superando os mecanismosde tolerância periférica.

Ao analisar dados atuais, é evidente que o sis-tema imune associado do intestino desempenhaum papel crucial no desenvolvimento precocedo diabetes melitus tipo 1 (Fig.2). O tecidolinfóide associado ao intestino (GALT) pode sergenericamente dividido em folículos linfóidesagregados, denominados placas de Peyer, e te-cido linfóide disposto de maneira mais difusa ecompreendendo os linfócitos epiteliais e as cé-

lulas mononucleares da lâmina própria. Embo-ra as placas de Peyer tenham sido há muitoconsideradas como o principal sítio para asrespostas imunes a antígenos exógenos, há cres-cente evidência de que os linfócitosintraepiteliais e da lâmina própria também con-tribuem para os mecanismo da tolerância oral[25]. As reações de tolerância oral geralmentedependem das células T auxiliares (Th)2 e doperfil das citocinas TH3. Um perfil de citocinapró-inflamatório com viés TH1 relaciona-se aum distúrbio da regulação imune para antígenosexógenos [26]. Fato interessante, há crescenteevidência de reatividade imune acentuadamen-te pró-inflamatória no tecido linfóide associadoao intestino em pacientes com diabetes melitustipo 1 [27]. Sugeriu-se que isso leve a maiorpermeabilidade intestinal às macromoléculas[28]. Ainda não existem estudos de indivíduos

Amamentação ao seio

Infecções Linfócitos Citocinas epor vírus e e fatores debactérias granulócitos crescimento

Proteínas Tecido linfóide associadoda dieta, ao intestinoe.g. glúten (GALT)

Tolerância oral Regulação imunológicaperiférica

Figura 2: a amamentação ao seio tem um impacto maiorno amadurecimento adequado do tecido linfóide associa-do ao intestino (Gut Associated Lymphoid Tissued =GALT) fornecendo células imunes, citocinas e fatores decrescimento. A reatividade do GALT ainda sofre maiorinfluência das infecções e diferentes proteínas da dietaque têm, parcialmente, propriedade imunorreguladoras.Um GALT apropriadamente regulado é um pré-requisitopara os mecanismos de tolerância oral e da regulaçãoimunológica periférica, que, por sua vez, também é influ-enciada por componentes bioativos do leite humano.

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com elevado risco de desenvolverem diabetes,mas há evidência, a partir de modelos animais,de que um tal meio pró-inflamatório da citocinatambém pode existir antes da manifestação clí-nica da doença (resultados próprios, não publi-cados). Nesse cenário, a exposição de indivídu-os geneticamente predispostos a dietas quecontêm proteínas “diabetogênicas” promoveriao desenvolvimento de auto-imunidade pordesestabilizar adicionalmente os mecanismos detolerância oral e fornecendo epítopos miméticoscom potencial para reação cruzada comautoantígenos e portanto superando os meca-nismos periféricos de tolerância. Tomada emconjunto, a diabetogenicidade dos componen-tes do alimento, caso possa ser confirmada emestudos prospectivos relevantes no homem,parece situar-se na regulação imune imprópriado sistema imune intestinal associado [29]. Aqualidade desses mecanismos reguladores éinfluenciada pela dotação genética, duração daamamentação ao seio exclusiva e estadonutricional através de toda a primeira e segun-da infâncias. À luz desses achados, parece pro-vável que a dieta nos primeiros meses e anos devida pode desempenhar um papel significativona patogênese do diabetes melitus tipo 1. Noentanto, é muito cedo para tirar conclusõesconcretas e modificar recomendações alimen-tares: “leite de vaca (e qualquer outro compo-nente alimentar) e diabetes melitus: inocentesaté que provem o contrário” [30].

A doença celíaca

A doença celíaca é vista hoje como umaenteropatia resultante de uma reatividadeimunológica adversa ao glúten da dieta emindivíduos geneticamente predispostos. A pre-disposição geneticamente determinada éconferida pela presença de certos alelos deHLA que foram encontrados em 80-90% dospacientes com doença celíaca clinicamenteaparente e codificam o heterodímero DQα1*0501, β1*02. Este genotipo apresenta simila-ridades distintas do genótipo predisponentepara o diabetes melitus tipo 1. Isso pode ex-

plicar parcialmente a significativa concordân-cia entre as duas doenças. Tal como no diabe-tes tipo 1, a suscetibilidade genética é necessá-ria mas não suficiente para que se desenvolva adoença [31]. O momento, a duração e as cir-cunstâncias da exposição dietética ao glútenparecem desempenhar papéis centrais napatogênese da doença [32].

Estudos sobre a etiologia da doença celíacasão prejudicados porque a confirmação da do-ença é difícil e sua incidência parece variaramplamente de uma população para outra enas próprias populações com o correr do tem-po. Além disso, uma grande proporção dos pa-cientes portadores de doença celíaca é clinica-mente assintomática (doença celíaca silencio-sa) e de acordo com os critérios da SociedadeEuropéia de Pediatria, Gastroenterologia eNutrição (ESPGAN) seu diagnóstico adequadorequer uma biopsia do intestino delgado quenão foi realizada em todos os estudos [33].Portanto, a doença celíaca pode passar des-percebida e assim as conclusões de muitosestudos anteriores são de difícil avaliação. Essahipótese é corroborada por uma investigaçãorecente na qual a incidência de doença celíacacomprovada histologicamente era muito maiselevada do que o esperado com base no testepositivo para o anticorpo associado à doençacelíaca [34]. No entanto, exceto por essas difi-culdades metodológicas, os estudosepidemiológicos no transcorrer das duas últi-mas décadas sugerem que o momento e ascircunstâncias da primeira introdução do glútenna dieta do lactente parecem desempenhar umafunção no desenvolvimento da doença [35]. Em1983, foi publicado o primeiro estudo quemostrou uma relação inversa entre duração eprevalência do aleitamento ao seio e incidên-cia da doença celíaca [36]. A partir desse estu-do, diversos outros também sugeriram que aincidência da doença celíaca é menor em cri-anças que eram amamentadas ao seio quandoo glúten foi introduzido e que o glúten foi ad-ministrado em idades mais tardias às criançasamamentadas ao seio sem doença celíaca emcomparação com as portadoras de evidênciade enteropatia celíaca [37-39].

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Tal como mencionado acima, o leite humanoé fonte de muitos componentes antiinflamatóriostais como os fatores do crescimento e os medi-adores imunológicos. Na verdade, a TGF-β, umacitocina do tipo Th2/Th3 e outras citocinas sãoencontradas em grandes quantidades no leitehumano. A forte potência imunorregulatóriadessas citocinas sugere que a reatividade imunedesloca-se de uma reação imune pró-inflamató-ria associada a Th1 contra o glúten da dieta, naausência do leite humano, para uma reatividademais “tolerogênica” na presença do leite huma-no. Essa visão tão simplista foi demonstradaem diferentes modelos animais e foi denomi-nada “supressão assistente” (bystandersuppression). Descreve o fenômeno no qual ummeio em que predominam as citocinas Th2 eTh3 no intestino pode influenciar a reatividadeimune de diferentes antígenos luminais e deslo-car uma resposta imune pró-inflamatória parauma antiinflamatória ou “tolerogênica” [40].

Estudos epidemiológicos realizados notranscorrer das duas últimas décadassugerem que o momento e as circunstânciasda introdução de glúten na dieta dolactente parecem ter uma função nodesenvolvimento da doença.

A quantidade de glúten na dieta também pa-rece ser importante na patogênese da doença.Recentemente, pesquisadores da Dinamarca eda Suécia encontraram surpreendente diferen-ça na incidência da doença celíaca entre essesdois países apesar das semelhanças étnicas, ge-ográficas e culturais existentes entre suas po-pulações. Além disso, o diagnóstico nas crian-ças suecas era feito em idade mais precoce eapresentava-se com sintomas diferentes dos en-contrados nas crianças dinamarquesas. Nesseestudo, o hábito do aleitamento materno entreas crianças foram comparáveis. No entanto,quando era analisado o teor estimado de glútenna dieta das crianças, houveram diferenças acen-tuadas entre esses dois países. A dieta suecaoficialmente recomendada continha 40 vezes

mais gliadina do que a dinamarquesa à idade deoito meses e quatro vezes mais à idade de dozemeses, sugerindo que essas diferenças quantita-tivas expliquem a maioria das diferenças des-critas [41]. Essa hipótese é corroborada peloachado de que a dose do antígeno desempenhaimportante papel que ajuda a determinar se areação imune correspondente exibe um perfilde citocinas pró-inflamatório ou antiinflamatório[42]. Todavia, a maioria dessas observaçõesimunológicas têm origem em experimentos ani-mais e a evidência em seres humanos ainda éescassa.

Quanto ao diabetes tipo 1, é importante notarque somente indivíduos com predisposição ge-nética para a doença celíaca correm risco. Emum estudo publicado que incorporava dadossobre suscetibilidade genética, os autores nãoencontraram diferenças entre a incidência dadoença celíaca e indivíduos geneticamente derisco que serviram de comparação (grupocontrole) no tocante à duração total daamamentação ao seio, idade de introdução doleite de vaca, amamentação ao seio durante aintrodução do glúten na dieta e consumo totalde glúten [43]. Todavia, o estudo pode ter sidomuito restrito para detectar diferenças e a aná-lise pode não ter sido controlada quanto a to-dos os importantes fatores ambientais. Toma-dos conjuntamente, justificam-se os novos estu-dos de casos controlados e ensaios prospectivosque controlem os fatores de risco genéticos evariáveis relevantes dos antecedentes para defi-nir adicionalmente o papel exato do glúten dadieta na patogênese da doença celíaca.

Além disso, define-se a doença celíaca pelapresença comprovada histologicamente de umaenteropatia, independentemente da presença ouausência dos sintomas clínicos. A maioria dosestudos, até hoje, foram realizados em hospi-tais e assim compreendiam apenas casos sinto-máticos da doença. Considerando que maispacientes podem ser portadores de doença si-lenciosa ou assintomática, são necessários maisestudos para analisar os efeitos dasuplementação de glúten no aparecimento defenômenos de auto-imunidade associados à do-ença celíaca como autoanticorpos para a

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transglutaminase tecidual [44] ou anticorposantiendomísio. Todavia, apesar dessas incerte-zas, a recomendação mais recente é que as cri-anças com predisposição genética para a doen-ça celíaca devem ser amamentadas ao seio omaior tempo possível e devem estar recebendoleite humano quando o glúten for introduzidona dieta [45].

O leite humano estimula o desenvolvimentoadequado e a maturação do sistema imuneassociado ao intestino e assim estabiliza osmecanismos de tolerância oral que sãoimportantes para a homeostase imunológicadurante a primeira e segunda infâncias.

Doença inflamatória intestinal

Em comparação com o diabetes tipo 1 e a doen-ça celíaca, é escassa a literatura que aborda umapossível relação entre a nutrição do lactente eda criança e a patogênese da doença inflamató-ria intestinal. Existem cerca de uma dúzia deestudos nos quais foram analisadas as possíveisinfluências dos padrões alimentares de lactentessobre o risco da doença inflamatória intestinal,inclusive retocolite ulcerativa e doença de Crohn.A maioria desses estudos desenvolveu-se segun-do um esquema de controle de casos e diferen-ciava entre retocolite ulcerativa e a doença deCrohn. Isso parece ser importante pois essasdoenças parecem ter imunopatogêneses distin-tas. As lesões intestinais na doença de Crohn sãodominadas pelas citocinas pró-inflamatórias as-sociada a resposta Th1; a retocolite ulcerativaparece ser dominada por uma reatividade imuneassociada a resposta Th2 [46]. Em linhas geraisos trabalhos demonstraram que na metade dosestudos de doença de Crohn e na metade dos deretocolite ulcerativa era menos provável que osindivíduos tivessem sido amamentados ao seiocomparativamente aos controles saudáveis. Emnenhum dos estudos a amamentação ao seio foiconsiderada um fator de risco. As taxas de pro-babilidades nesses estudos foram de 1,5 a 3,6.

[47]. É importante observar que somente algunsdesses estudos investigaram crianças e adoles-centes. Assim, uma acentuada distorção que sedeve às lembranças muito afastadas é muitoprovável na maioria dessas análises. Todavia,tendo em vista que a doença inflamatória intes-tinal é rara na infância, esse problemametodológico pode ser contornado nas análisesepidemiológicas da nutrição de lactentes.

Hipóteses para explicar as possíveis associa-ções entre os padrões de alimentação dolactente e a doença inflamatória intestinalfocam, principalmente, dois fatores correlatos.Primeiramente, a amamentação ao seio protegea criança de infecções gastrintestinais recorren-tes, algumas das quais foram implicadas naetiologia da doença de Crohn. Em segundo lu-gar, o leite humano estimula o desenvolvimentoadequado e a maturação do sistema imune as-sociado ao intestino e assim estabiliza os meca-nismos da tolerância oral que são importantespara a homeostase durante toda a primeira esegunda infâncias. Todavia, ambos os aspectosestão relacionados e possivelmente aplicam-sea muitas outras condições inflamatórias e por-tanto não são específicas da doença inflamató-ria intestinal. São necessárias mais pesquisaspara concluir se os padrões da alimentação dolactente são relevantes na patogênese da doen-ça de Crohn ou da retocolite ulcerativa.

Doença auto-imune da tireóide

Existe um estudo concluído no qual são compa-rados os padrões alimentares de crianças porta-doras de doença auto-imune da tireóide com osde crianças controle relevantes. Como os auto-res também incluíram irmãos das crianças afe-tadas como controles, as análises parecem tersido bem controladas quanto às diferenças ge-néticas nas populações estudadas. Não foramencontradas diferenças entre os padrões de ali-mentação (ou seja: freqüência ou duração doaleitamento materno) de crianças com doençaauto-imune da tireóide e do grupo controle.Todavia, a freqüência da administração precocede fórmulas à base de leite de soja era signifi-

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cativamente maior nas crianças com doença datireóide (prevalência 31%) do que em seus ir-mãos (prevalência 12%) sugerindo que as proteí-nas de soja podem estar associadas à patogêneseda doença (48). Essa interessante hipótese nãofoi confirmada e merece maiores investigações.Em outro estudo, hipotireoidismo clínico esubclínico parcialmente devido à tireoidite auto-imune foi constatado em numerosos pacientesportadores de doença celíaca não tratada. Curi-osamente, uma dieta isenta de glúten reverteu aanormalidade da tireóide em um número signi-ficativo de casos, sugerindo que o glúten podeestar envolvido na manifestação clínica da do-ença da tireóide nesses pacientes [49]. Em ummodelo animal da doença auto-imune da tireóide,demonstrou-se que a dieta influencia a incidên-cia e gravidade histopatológica dessa doença [50].Todavia, os resultados de experiências animais edados epidemiológicos raramente são conclusi-vos e assim, freqüentemente, apenas sugeremdireções para a pesquisa. Até agora, os dadossobre a relação entre os padrões da alimenta-ção do lactente e a doença auto-imune datireóide são por demais tênues para que se ti-rem conclusões.

Esclerose múltipla

Ao todo, existem quatro estudos que investiga-ram uma possível relação entre o aleitamentomaterno e a incidência da esclerose múltipla.Dois não estratificaram os dados de acordo coma duração do aleitamento materno e não encon-traram associação entre a doença e a incidên-cia da amamentação [51,52]. Outro estudo decaso controle foi realizado em 1982. Eis que,novamente, os autores não encontraram evidên-cia de uma menor freqüência ou menor dura-ção do aleitamento materno entre as criançasque posteriormente desenvolveram esclerosemúltipla, comparativamente aos controles sau-dáveis. Todavia, tal como em outros estudos, oscritérios de inclusão no estudo não foram defi-nidos claramente e um número insuficiente decasos e controles foram obtidos [53]. Num estu-do subseqüente, com os controles cuidadosa-

mente emparceirados, exceto pela ausência dapredisposição genética para a esclerose múlti-pla, a duração média do aleitamento maternofoi significativamente mais curto nos casos emestudo (8,4 meses) do que nos controles (12,5meses) e a freqüência das mamadas era menorentre os casos estudados, amamentados ao seiopor sete meses pelo menos, do que entre oscontroles [54]. Apesar desses interessantes re-sultados o mecanismo que leva a falta do alei-tamento materno a uma doença neurológica mui-tos anos mais tarde ainda está por elucidar. Umfato interessante é que o leite humano contémácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa(LCPUFAS) não encontrados em muitas dasfórmula infantis comerciais e foi descrita umacomposição diferente da matéria cinza do córtexem lactentes alimentados com fórmula[55]. Istopode estar associado à formação de membra-nas defeituosas, permitindo uma entrada maisfácil dos agentes infecciosos através da barrei-ra sangue-cérebro ou a uma degradação acele-rada da mielina levando à produção dos sinaispatológicos da esclerose múltipla. No entanto,assim como todas as outras doenças descritasneste trabalho, essas hipóteses não foram com-provadas e muitos dados epidemiológicos e ex-perimentais são necessários antes que se pos-sam formular diretrizes.

A orientação de evitar proteínas intactasdo leite de vaca durante os primeirospoucos meses de vida poderia provocarum maior uso de formulas infantis à basede soja. Isto, todavia, poderia aumentaro risco em vez de diminuí-lo, pois,recentemente constatou-se em umestudo em animais sobre diabetes tipo 1,que a soja é diabetogênica.

Conclusões

Associações entre a duração do aleitamentomaterno ou a introdução prematura de proteí-nas estranhas via fórmulas infantis e as doen-ças de acometimento tardio debatidas neste

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revisão ainda carecem de comprovação. A mai-oria dos dados disponíveis de estudosepidemiológicos só podem ser a base de hipó-teses interessantes. Dois pontos se destacam:de um lado, nenhum estudo vinculou uma ade-quada amamentação ao seio a um risco maior.No entanto, a possibilidade de uma distorçãoem razão de erros na lembrança dos fatos émuito elevada e pode ter influenciado muitosdesses estudos. As distorções podem surgirquando os pais tomam consciência dos potenci-ais benefícios do aleitamento materno prolon-gado. Todos os estudos epidemiológicos dispo-níveis são retrospectivos e os pais podem tersubestimado o tempo de aleitamento materno,tendo em vista o filho doente. Além disso, émuito cedo para formular recomendações rela-tivas à alimentação de lactentes com base ape-nas na expectativa de prevenção dessas doen-ças, especialmente a pais relutantes em aceitara base das atuais recomendações. Isto é maisbem exemplificado no tocante ao diabetesmelitus tipo 1. Neste caso, a orientação de evi-tar as proteínas intactas do leite de vaca duran-te os primeiros meses de vida pode conduzir aum aumento no uso das fórmulas infantis à basede soja. No entanto, isso pode aumentar o riscoem vez de diminuí-lo, pois recentemente consta-tou-se, em um estudo em animal sobre diabetestipo 1, que a soja é diabetogênica. Existe tam-bém pelo menos um estudo que identificou fór-mulas infantis à base de soja, em um estudo decasos controlados [56], como um fator de riscopara o diabetes mediado imunologicamente. Alémdisso, o foco do interesse deslocou-se dos efei-tos potenciais de certos antígenos dietéticos paraa imuno-reatividade intestinal do lactente. Seguin-do essa hipótese, a “patogenicidade” de certasproteínas alimentares parece situar-se em umaimuno-reatividade intestinal inadequadamenteajustada. A qualidade dessa resposta é acentua-damente influenciada pela herança genética eduração do aleitamento materno. Portanto, estu-dos futuros devem abordar a regulação do siste-ma intestinal imune em crianças amamentadasao seio e crianças amamentadas artificialmentepara explicar os fenômenos epidemiológicosdescritos neste trabalho.

Agradecimentos

Agradecemos ao Dr. Alexander Koch pela leitu-ra crítica do manuscrito.

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Introdução

No alvorecer do terceiro milênio a alimenta-ção de crianças durante os dois primeiros anosde vida continua representando um grande de-safio para cientistas e médicos pediatras. Comoa mortalidade infantil diminuiu e as patologiasmais comuns foram evitadas de uma maneiramais eficaz durante o século passado, atravésda imunização e de outras estratégias preven-tivas, ocorreu uma melhora na expectativa mé-dia de vida, principalmente por causa da pre-venção do retarde do crescimento intra-uterino(RCIU), da desnutrição protéico-energética eda estagnação do crescimento.

O aleitamento materno exclusivo, alimenta-ção ideal no primeiro semestre, nem sempre épraticada. Mesmo com esforços bem intencio-nados para promover, proteger e apoiar o alei-tamento materno, sua prática além dos 4 me-ses freqüentemente cai de maneira vertiginosapara menos de 60%. Assim, seja por escolha damãe ou por falta de um apoio adequado aoaleitamento materno, fórmulas infantis à basedo leite de vaca ou de outros mamíferos ouprodutos derivados de vegetais continuam adesempenhar um papel excessivo na alimenta-ção do lactente. Além disso, embora o leitehumano seja ainda um importante alimentodurante o segundo semestre e assim continuepelo segundo ano de vida adentro, os bebês

requerem alimentos sólidos complementares,seguros e nutricionalmente adequados depoisdos 6 meses para atender às suas necessidadesde micro e macronutrientes.

Fórmulas infantis e recomendações alimen-tares normais têm sido desenvolvidasobjetivando o aumento de peso e do compri-mento como os principais resultados. Apenasrecentemente esforços no desenvolvimentodas fórmulas têm sido considerado para ob-ter resultados adicionais como o desenvolvi-mento neural, a prevenção das infecçõesgastrintestinais e alguns aspectos da imunida-de (Quadro I).

Entretanto, a pesquisa básica ainda contémmuitas lacunas que não permitem definir no-vos resultados relacionados com outras fun-ções desejáveis. De fato, estamos sempre maispreocupados com a quantidade ideal e o tipode gordura necessários para o desenvolvimen-to mental, prevenção da alergia e diminuiçãodo risco de acometimento de doenças crôni-cas na idade adulta (fig. 1 e 2). Assim, o obje-tivo desta revisão é analisar falhas no conheci-mento que impediram a definição da “ótimanutrição” para criança menores de 2 anos, talcomo as melhores abordagens para melhorardeficiências quando não conseguirmos preve-ni-las, principalmente entre os mais pobres eentre os portadores de condições médicas queinterferem com uma boa nutrição.

Nutrição em idade precoce:atuais lacunas no conhecimento queimpedem o planejamento de dietasideais para os dois primeiros anos de vida

RICARDO UAUY, CARLOS CASTILLO-DÚRAN,Institute of nutrition and food technology (INTA),

University of Chile, Casilla 138-11, Santiago Chile

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Ricardo Uauy, Carlos Castillo-Durán

Quadro I: resultados críticos que definem uma nutrição ótima em idade precoce.

Resultados Definição de “ótimo”

Crescimento físico Crescimento linear e ponderal compatível com a menor carga de doençae incapacidade durante o ciclo de vida

Desenvolvimento mental Desenvolvimento cognitivo, mental e motor para melhorar competênciae produtividade posteriores

Desenvolvimento do sono Atividade rítmica do SNC necessária para o desenvolvimento mentale regulação neuroendócrina.

Imunidade/infecção Imunidade maior objetivando diminuição da morbidade/mortalidade por infecções

Alergia Prevenir ou minimizar incapacidades por alergias

Efeitos da dieta precoce sobre Menor risco e/ou menor ônus decorrente de doença crônica associada à dietaa prevenção de doença crônica (doenças cardiovasculares, hipertensão, resistência à insulina/diabetes,

osteoporose e câncer)

Comportamento relacionado Prevenção de alteração do comportamento relacionado ao alimento que possaao alimento levar à anorexia e obesidade

Figura 1: Tendência da expectativa de vida durante o

século passado. Como a saúde infantil e a nutrição me-

lhoraram, a morte de crianças foi prevenida aumentan-

do as possibilidades dos recém-nascidos de alcançarem

uma idade avançada. A melhora na expectativa de vida

foi diretamente associada à diminuição do baixo pesoao nascimento, da desnutrição protéico-energética e da

estagnação do crescimento. Diminuição nos índices de

diarréia e outras infecções e melhoria no nível de

micronutrientes contribuíram para taxas menores de

mortalidade de lactentes e crianças.

Figura 2: As metas atuais da nutrição para preservar a

qualidade de vida. O efeito da nutrição começa antes

mesmo da concepção, assegurando organogênese nor-

mal, prevenindo o retarde do crescimento intra-uterino,

promovendo metabolismo adequado, crescimento físico

e desenvolvimento mental. A promoção da amamentação,a prevenção de infecções e alergias são importantes para

a saúde e nutrição da criança. Práticas dietéticas, ati-

vidade físicas e estilos de vida saudáveis na infância

são cruciais para prevenir o surgimento de doenças

crônicas na idade adulta relacionas com a alimentação,

para preservar os ossos e os músculos e para manter afunção ideal dos órgãos e proporcionar um envelheci-

mento sadio.

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Nutrição em idade precoce: atuais lacunas no conhecimento queimpedem o planejamento de dietas ideais para os dois primeiros anos de vida

A nutrição para um ótimo crescimento

físico

O peso, a altura e a circunferência encefálicatêm sido amplamente usados como indicado-res do estado nutricional. O normal é derivadoda normalidade estatística ao invés de basear-se em resultados específicos de saúde e/ou qua-lidade de vida. A referência para o crescimen-to do Centro Nacional de Estatísticas da Saú-de (NCHS – National Center for HealthStatistics) utilizada nos atuais padrões inter-nacionais da OMS para lactentes de 0 a 36meses origina-se de crianças que vivem em umaafluente sociedade rural em Yellow Springs,Ohio, EUA [1]. Na prática, tornou-se a defini-ção de crescimento saudável. Se seguirmos amesma premissa e adotarmos o presente cres-cimento das crianças nos Estados Unidos comopadrão global, poderemos encontrar a situa-ção paradoxal em que uma criança classifica-da apenas como portadora de excesso de peso,com base em referências desenvolvidas há trin-ta anos, talvez agora se classifique como ma-gra, simplesmente porque a distribuição nor-mal deslocou-se para a direita. A presentenorma do crescimento de lactentes tem outrasgrandes falhas, uma vez que origina-se de umaamostra não representativa da população. Alémdisso, os dados foram colhidos de um grupode lactentes que foi alimentado predominante-mente com fórmula.

A necessidade de novos padrões para o

crescimento

Esses inconvenientes levaram o Comitê de Pe-ritos da OMS em 1995 a apoiar o desenvolvi-mento de novas referências para o crescimento[2]. O estudo de novos referenciais para o cres-cimento com a participação de diversos países(Brasil, Noruega, Índia, Gana, Estados Unidos eOmã) tem exatamente esse objetivo. A coletade dados começou em 1997 e espera-se que em2003 esteja completa. O estudo foi realizado emdiversas áreas geográficas e extrai suas amos-tras a partir de crianças e lactentes cujos res-

ponsáveis seguem as recomendaçõesestabelecidas pela OMS. O plano da pesquisacombina um estudo longitudinal do nascimentoaos 24 meses de idade abrangendo 300 recém-nascidos por país, com um estudo transversalde 1.400 crianças com idades de 18-71 mesespor local. Mais de 13.000 crianças saudáveisforam envolvidas no estudo. Estudos subsidiá-rios estão sendo feitos para medir a composi-ção corporal e gasto de energia, uma vez que serelacionam com o crescimento e ingestão dealimento. A nova referência internacional decrescimento deverá preencher muitos objetivos.O mais importante será o de fornecer umdescritor cientificamente confiável do cresci-mento fisiológico e uma ferramenta poderosaem defesa da boa saúde e nutrição. Outro obje-tivo será o de apoiar, com base em evidênciasatuais, o conceito de que o crescimento huma-no durante os primeiros anos de vida é muitosimilar em grupos de crianças de diferentesetnias. Assim, as diferenças existentes seriamoriginárias predominantemente do meio ambi-ente e passíveis de melhoria. As estimativas deincidências baseadas no novo referencial serãoevidentemente afetadas na medida em que es-sas novas referências diferirem das normas atu-ais da OMS. Um fato extremamente importanteestá em que a referência estabelecerá o cresci-mento de lactentes amamentados ao seio comoo padrão a ser seguido. Isso significa que, nofuturo, as fórmulas infantis terão de oferecercrescimento físico, desenvolvimento mental eestado metabólico alcançados pelo lactenteamamentado exclusivamente ao seio.

Os pediatras deveriam tratar de cadacriança, individualmente, com base emresultados específicos e relevantes emtermos de crescimento, autonomiamaterna e constrangimentos sócio-culturaisque podem afetar o binômio mãe-criançae determinar a duração ótima doaleitamento materno.

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A alimentação infantil ideal foi recentemen-te revista pela OMS [3]. Essa atitude provocouuma revisão na recomendação do aleitamentomaterno exclusivo, recomendado agora para os6 primeiros meses de vida seguida deamamentação continuada, mas acompanhada dealimentação complementar adequada duranteaté dois anos de vida e além. Um lactente éexclusivamente amamentado ao seio quandorecebe apenas o leite materno e nenhum outroalimento ou líquido (ou seja, não recebe água,sucos nem chás). A alimentação complementarrefere-se ao período em que outros alimentossão dados juntamente com o leite materno; es-tes alimentos são chamados de “alimentos com-plementares” [3]. Com base no conhecimentoexistente, a vantagem do aleitamento maternoexclusivo deve ser relacionado à sua duração.Seus benefícios são maiores nos primeirosmeses de vida.

Uma revisão sistemática foi patrocinada pelaOMS como parte de sua avaliação das recomen-dações alimentares [4]. Os resultados noslactentes que participaram da revisão compre-endiam crescimento ponderal e linear, incidên-cia de patologias infecciosas e mortalidade porinfecções, assim como o nível nutricional de fer-ro e zinco. Outras variáveis comportamentais erelativas ao desenvolvimento, doenças atópicas/alérgicas e o ônus de uma doença crônica tam-bém foram avaliados, mas excluídos por causada escassez de dados disponíveis. Benefícios eriscos maternos similares não foram considera-dos por razões análogas. A revisão sistemáticaconcluiu que não existe evidência que indiqueque o aleitamento materno exclusivo até os seismeses compromete a saúde da criança [4]. Noentanto, por causa de poucos estudos disponí-veis, os autores não puderam abordar adequa-damente a questão chave sobre quais seriam osbenefícios e custos para lactentes e suas mãesda amamentação ao seio exclusiva entre 4 e 6meses. Quanto às diretrizes de ordem pública,com base nos dados que não demonstram qual-quer prejuízo e o benefício potencial relativo àsegurança do alimento e o alto valor nutricionaldo leite humano, a recomendação é o aleita-mento materno exclusivo até os seis meses. Con-

tudo, por ser uma recomendação com base napopulação, os pediatras devem tratar doslactentes individualmente com base em relevan-tes desenvolvimentos específicos em termos decrescimento, autonomia materna e constrangi-mentos socio-culturais que podem afetar obinômio mãe/criança e determinar a duraçãoótima do aleitamento materno. O maior desa-fio para melhorar nosso conhecimento é defi-nir claramente os resultados de maior interes-se. Se o foco for o desenvolvimento, devere-mos acompanhar a criança por pelo menos seisanos. Se estamos interessados no crescimen-to, então devemos avaliar não apenas o peso eo comprimento, mas também a composiçãocorporal. Se estamos interessados na sobrevi-vência infantil, então deveríamos realizar estu-dos em lugares onde a higiene ambiental é de-ficiente e os alimentos para o desmame sãoinadequados, não importando o tamanho dasdificuldades para realizá-los. Como foi previa-mente ressaltado, os critérios relativos às ne-cessidades protéico-energéticas também devemser reavaliados. Mais recentemente, foramacrescentados os estudos de gasto de energiae balanços que utilizam a metodologia doisótopo estável.

Requisitos energéticos

Os requisitos energéticos de um indivíduo fo-ram definidos pela FAO/OMS/UNU (Organiza-ção para Alimentos e Agricultura/OrganizaçãoMundial da Saúde/Universidade das NaçõesUnidas) como o “nível de energia ingerido atra-vés do alimento que equilibrará o gastoenergético quando o indivíduo tem dimensão ecomposição corporais e nível de atividade físi-ca consistentes, no longo prazo, com uma boasaúde; e que torne possível o desenvolvimentode atividade física economicamente necessá-ria e socialmente desejável. Em crianças, mu-lheres grávidas ou lactantes a necessidadeenergética compreende os requisitos associa-dos à deposição de tecidos ou a secreção deleite numa taxa consistente com a boa saúde”[5]. Para lactentes e crianças pequenas, a ne-

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cessidade energética é igual à soma de seugasto energético e a energia armazenada nostecidos que são acumulados durante o cresci-mento. O total gasto energético (GE) é a somado metabolismo basal, efeito térmico do ali-mento, atividade termorregulação e atividadefísica. A calorimetria direta e a técnica de duplamarcação da água (doubly labelled watertechnique) têm sido usadas para avaliar o GEdurante a infância [6]. A deposição de energiapode ser avaliada pelo ganho de proteína egordura em conjunto com as mensurações dacomposição corporal. Assim, hoje é possívelestabelecer recomendações de ingestão deenergia por lactentes e crianças com base nasmedidas de GE e deposição de energia ao in-vés de basear-se apenas em extrapolações te-óricas. As recomendações da FAO/OMS/UNUde 1985 [5], que são 10-30% mais elevadas doque os requisitos energéticos totais medidosdiretamente em vários estudos [6, 7], estãoatualmente passando por revisão. Um novorelatório deverá ser produzido dentro de doisanos.

Aceitando-se como ideal a composiçãodo leite humano, a avaliação da adequaçãoda alimentação com fórmula durante os6 primeiros meses de vida deveria basear-se em comparações com as respostasmetabólicas e funcionais de lactentesamamentados exclusivamente ao seio.

Métodos isotópicos fornecem meios de deter-minar a quantidade de energia gasta em ativida-des físicas. Níveis de atividades físicas consis-tentes com uma saúde e o desenvolvimentonormais da criança precisam ser investigadosqualitativamente nas diversas culturas. Mudan-ças nas atividades físicas e no crescimento emresposta à desnutrição deveriam ser estudadospor meio de tecnologia atual. O efeito da quali-dade da proteína, do carboidrato e da gorduranas taxas de ganho de peso, particularmentedurante a recuperação de desnutrição, deveri-am ser explorados. Os nutrientes necessários

para uma ótima reabilitação de crianças comcrescimento estagnado são mal compreendidos.Os nutrientes necessários para a recuperaçãodo crescimento dos músculos e dos ossos re-querem pesquisas adicionais. São necessáriosestudos sobre os efeitos da infecção nos requi-sitos energéticos. Devem abranger uma amplagama de agentes infecciosos e de diversos grausde gravidade e duração da doença. Devem serexploradas as questões práticas que afetam aingestão de alimentos necessários para supriras necessidades energéticas. A consistência dosalimentos complementares e a densidade denutrientes e energia das dietas utilizadas reque-rem maior atenção.

Necessidade de proteínas

e aminoácidos

A estimativa da necessidade de proteínas eaminoácidos por lactentes com menos de 6meses de idade baseia-se primeiramente nasingestões de leite humano e na sua composi-ção. A exatidão dessa recomendação pode ago-ra ser amplamente melhorada devido aos novosdados sobre o crescimento e produção e com-posição do leite humano [8]. Todavia, as reco-mendações baseadas nesses dados implicitamen-te pressupõem que o leite humano não só ésuficiente, mas também ideal para lactentesnessa faixa de idade. Não existem dados sobreas conseqüências para a saúde a respeito daingestão de aminoácidos por lactentes alimen-tados com leite humano ou fórmulas no longoprazo. Aceitando-se que a composição do leitehumano é ideal, a avaliação da adequação daalimentação por fórmula durante os primeiros 6meses de vida deve basear-se em comparaçõescom as respostas metabólicas e funcionais delactentes amamentados exclusivamente ao seio.Por exemplo, embora os requisitos protéicos deum lactente alimentado com fórmula possamser definidos a partir das diferenças entre adigestibilidade da proteína do leite humano edas fórmulas, ainda não se sabe se a necessida-de protéica de lactentes alimentados com fór-mula deve ser ajustada segundo a utilização

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potencialmente diferente do nitrogênio não-protéico do leite humano (uréia, ácidosnucléicos, nucleotídeos, amônia, creatina,poliaminas, glutationa, lactoferrina e IgAsecretória) [9].

O método fatorial é usado para avaliar a ne-cessidade protéica de lactentes com mais de 6meses e de crianças maiores. O nitrogênio ne-cessário para a manutenção e deposição deproteína tecidual para o crescimento são soma-dos para se chegar a estimativas derivadas daanálise fatorial. Os dados disponíveis sugeremque as necessidades para a manutenção de umaunidade de massa corporal são relativamenteestáveis. A redução nas necessidades protéicasem função da idade (por kg de peso corporal)é explicada pelo decréscimo na taxa de cresci-mento com o avanço da idade pós-natal. Ajusta-mentos posteriores são feitos se a proteína dadieta habitual tiver menor digestibilidade do queas proteínas de referência de elevado valor bi-ológico (por exemplo, leite/ovos/carne). Umproblema pertinente nos países desenvolvidosé o teor relativamente alto de proteína de mui-tas fórmulas e dos alimentos complementaresgeralmente consumidos nesses países. Estudosna Escandinávia sugerem que os rins podemestafar-se com o excesso de proteína emboranão existam dados definidos sobre um limitemáximo de ingestão de proteína.

Devem ser avaliadas as necessidades das po-pulações que correm risco de ter um alto nívelou déficit de proteína no organismo. O declíniosignificativo na necessidade de proteína (emg/kg peso do corpo) durante o primeiro ano devida suscita questões sobre quantos teores deproteína diferentes deveriam ser oferecidos emfórmulas. Certos desenvolvimentos específicosvinculados ao consumo de proteína por crian-ças pequenas relativos a efeitos neuro-comportamentais, particularmente a regulaçãodo apetite e a ingestão de alimento, devem serinvestigados. Diversas monoaminas, inclusivedopamina e a norepinefrina (derivadas datirosina) e o 5-hidroxitriptofano (derivado dotriptofano) têm um papel muito importante nocontrole da ingestão do alimento. Definir aingestão e o equilíbrio entre aminoácidos críti-

cos para o controle do apetite normal e os com-portamentos vinculados ao alimento, é uma ati-va área de pesquisa [11].

As estimativas existentes sobre as necessida-des de aminoácidos de lactentes e crianças pe-quenas baseiam-se no balanço do nitrogênio (N),na concentração de aminoácidos no plasma e/ou nas respostas da relação uréia-creatinina àingestão de aminoácidos compatível com cres-cimento adequado. Infelizmente, estes dados sãobastante limitados pela quantidade de indivídu-os, esquemas experimentais, co-variantescontroladoras e duração da adaptação às dietasde teste. Assim, as informações disponíveis têmvalor limitado. O mais recente grupo de traba-lho da FAO/WHO/UNU sobre esse tópico con-cluiu que não há um conjunto substantivo dedados que forneça estimativas quantitativasmetodologicamente válidas dos requisitos deaminoácidos para crianças pequenas com maisde 6 meses de idade. Dados de adultos sobretaxas de oxidação de aminoácidos e relaçãoentre diversas ingestões de aminoácidos con-sistentes com um determinado nível de síntesede proteínas deveriam servir para orientar asinvestigações pediátricas [12]. Contudo, consi-derações éticas que surgem na elaboração doprojeto dos estudos metabólicos podem limitara viabilidade da referida pesquisa em crianças.

O aspecto crítico de como melhor acentuaro crescimento de lactentes e crianças peque-nas que sofreram retarde do crescimento porrazões nutricionais, com limitado ganho line-ar, provavelmente será um tópico de pesquisasfuturas. O uso de fontes de energia com eleva-dos teores de carboidratos e baixo teor degordura pode ser proposto como um passológico com base nos conhecidos efeitos doscarboidratos sobre a insulina, IGF e liberaçãodo hormônio do crescimento. Outra abordagemseria a de intervir através do fornecimento deagentes biologicamente ativos que acentuem aretenção de N; o hormônio do crescimento, oIGF I e a insulina são possíveis candidatos. Ouso de aminoácidos específicos, indutores dehormônios anabólicos é uma terceira aborda-gem possível para atingir essa meta; a argininae os aminoácidos de cadeia ramificada são can-

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didatos potenciais, uma vez que, em condiçõesde catabolismo promovem a retenção de N [13].Os resultados de pesquisas em curso talvezpossam oferecer novas idéias sobre comootimizar a maior retenção de massa corporalmagra. Entretanto, tais abordagens exigem en-saios clínicos controlados antes que qualqueruma possa ser indicada.

Ingestão de gordura

Poucos estudos analisaram os níveis deingestão de gordura necessários para atingirum ótimo crescimento. Essa questão deve serconsiderada. Alguns estudos perguntam se di-etas com um teor de gordura inferior a 30% dototal de energia podem sustentar o crescimen-to normal na infância e nos estágios subseqüen-tes. Estas questões surgem principalmente apartir de estudos que talvez não tenham dife-renciado os efeitos de uma baixa densidadeenergética, baixa ingestão total de energia oudeficiência de outros nutrientes que podemlimitar o crescimento a partir do baixo teor degordura "per se" [14]. Na Finlândia foi realiza-do um estudo controlado com crianças de apro-ximadamente 7 meses de idade; foi comparadoo resultado nos dois grupos. Um, recebeu umadieta com "baixo teor de gordura" (uma médiade aproximadamente 29% da energia total, combaixo teor de gordura saturada e colesterol) eo segundo uma média de 32-33% de energiasob a forma de gordura; a comparação revelouque o crescimento (peso, comprimento e cir-cunferência encefálica) permaneceram normaisaté pelo menos os 3 anos de idade [15]. Entre-tanto, a questão de uma potencial adaptaçãoao consumo de pouca gordura com reduzidaatividade física para alcançar um balançoenergético e sustentar um crescimento normalcontinua sem resposta. Um estudo mais recen-te não constatou nenhuma diferença no cresci-mento ou na composição corporal avaliadospela absorciometria com duplo feixe de Raios-X em crianças com 24 meses de idade queforam alimentados com leite integral ou des-natado por 1 ano [16].

Por outro lado, uma nova pesquisa sugere umarelação entre ácidos graxos específicos e o cres-cimento pós-natal. Jensen et al. [17] encontra-ram uma associação entre uma reduzida rela-ção entre os ácidos linoléico (n-6) e α-linolênico(n-3) da dieta, reduzido teor de ácidoaraquidônico (n-6) no plasma e diminuição noganho de peso durante os primeiros 4 meses devida em crianças a termo.

A reduzida ingestão de gordura(menos de 30% do total de energia) oude outros nutrientes que acompanhamtais ingestões podem restringir ocrescimento sob condições freqüentesnaquelas comunidades. Para as sociedadesem desenvolvimento, onde é maiora incidência de infecções e diarréiae as crianças são mais ativas, érecomendada uma ingestão de gorduraque corresponda a 35% do total de energia.

Estudos epidemiológicos em países desenvolvi-dos constataram que o baixo peso (peso/idade<-2DP) em crianças com menos de 6 anos de idadeestava estreitamente associado com baixa porcen-tagem de energia derivada de gordura animal (r =-0,65); esta correlação foi ainda maior (r = 0,83;p<0,001) para os 12 países nos quais menos que45% do total de gordura é proveniente de fonteanimal [18]. Isto sugere que a ingestão reduzidade gordura (abaixo de 30% da energia total) ou deoutros nutrientes que acompanham tais ingestõespodem restringir o crescimento em condições co-muns naquelas comunidades. Nas sociedades emdesenvolvimento, onde é maior a incidência deinfecções e diarréia e as crianças são mais ativas,é recomendada uma ingestão de gordura de nomínimo 35% do total de energia [14].

Necessidade de micronutrientes

Existe evidência significativa do efeito positivoda suplementação de vitamina A no crescimen-to [19]. Entretanto, a falta da vitamina A está

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associada freqüentemente à baixa ingestão dealimentos de origem animal e, em países emdesenvolvimento, é freqüentemente observadaconjuntamente com a deficiência de zinco, fer-ro e/ou outros micronutrientes [20]. Os resulta-dos dos estudos para avaliar as relações da de-ficiência de ferro e o crescimento têm sido in-consistentes. Todavia, tem sido difícil controlaroutras variáveis intervenientes tais como idade,infecções intercorrentes, desnutrição mais ge-neralizada, baixo peso ao nascimento e defici-ência de zinco, todas capazes de influir no nívelde ferro, crescimento e relação entre os dois.Os possíveis mecanismos dos transtornos docrescimento produzidos pela falta de zinco emseres humanos são menor ingestão de alimen-tos, menor atividade das metaloenzimas do zin-co, expressão alterada dos genes e alteraçõesna regulação hormonal do crescimento. A defi-ciência do zinco pode ocorrer durante a vidafetal, na infância, nas idades escolares e na ado-lescência. Na maioria das populações em de-senvolvimento, a falta de zinco está relacionadacom o baixo consumo de carne, alta ingestãode fitatos e também à grande perda de zincodevido a infecções intestinais e parasitárias.Uma meta-análise realizada por Brown et al. [21]mostrou um efeito significativo dasuplementação de crianças em crescimento comzinco, tanto em peso quando em comprimento.Não se tem certeza se a suplementação ou afortificação com zinco podem reverter totalmen-te ou em parte déficits na estatura nos paísesem desenvolvimento. Alguns sugerem a fortifi-cação de alimentos com uma combinação demicronutrientes como uma abordagem melhordo que a suplementação de zinco para prevenira deficiência de zinco [22] A prevenção e o tra-tamento das doenças que afetam o status dozinco no organismo (doença diarréica, síndromeda má absorção) também são importantes. Ní-veis de zinco presentes no leite humano pare-cem suficientes para cobrir as necessidades dascrianças durante os primeiros seis meses de vidae de crianças a termo saudáveis mas, durante osegundo semestre existe um risco crescente dedeficiência de zinco com a amamentação ao seioexclusiva [23]. As fórmulas são elaboradas de

modo a preencher os requisitos normais de zin-co, desde que alimentos complementares ade-quados estejam presentes na dieta [24].

Nas comunidades em que há alto risco dedeficiência de zinco ou elevada incidência deRetarde do Crescimento Intra-uterino (RCIU) enascimentos prematuros podem ser necessári-os níveis maiores de fortificação do que o ne-cessário em outras situações [25].

Nutrição para um ótimo

desenvolvimento mental

No decorrer das últimas cinco décadas, muitosestudos abordaram o efeito da desnutrição nodesenvolvimento do sistema nervoso central(SNC) em animais e seres humanos. Esses estu-dos revelam que uma redução no fornecimentode energia e/ou de outros nutrientes essenciaisdurante o começo da vida tem efeitos profun-dos no desenvolvimento funcional e estruturaldo SNC. A desnutrição prejudica o desenvolvi-mento do cérebro por diminuir o número deciclos de replicação das células, reduzindo oDNA total do cérebro, limitando a arborizaçãodendrítica e assim o número de conexões entreos neurônios. Nos seres humanos, a desnutri-ção intra-uterina e pós-natal afeta especialmen-te o número de células do cérebro, conformemedida do teor de DNA [26]. O desenvolvimen-to do cerebelo é principalmente afetado pelaprivação de nutrientes no período perinatal ea conectividade sináptica é vulnerável à des-nutrição pós-natal que ocorre durante o ter-ceiro ano de vida. Alterações em precursoresna dieta podem afetar os níveis teciduaisde neurotransmissores (p.ex: serotonina,norepinefrina, dopamina e acetilcolina) em re-giões específicas do cérebro [27]. O suprimentode lipídeos essenciais e não essenciais afeta acomposição das bainhas de mielina no SNC eoutras estruturas cerebrais. Os correlatos funci-onais das alterações bioquímicas induzidas pe-las desnutrição compreendem efeitos adversossobre as atividades eletroencefalográficas (EEG)no estado de vigília e nas respostas evocadasvisuais e auditivas. O desenvolvimento cognitivo

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e motor e as habilidades sociais também sãoafetadas. A organização dos ciclos sono-vigília,assim como as atividades neurovegetativas dosono, são perturbadas [28]. Muitos desses efei-tos são potencializados por outras privaçõesambientais que interagem com dietas pobres nadefinição de conseqüências adversas.

O desenvolvimento cerebral e o

desenvolvimento somático do

crescimento

Os vínculos entre um crescimento cerebral alte-rado e o retarde do crescimento somático sãoacentuados nas doenças por DesnutriçãoProtéico-Energética (DPE) e por deficiência deiodo. Esses vínculos encontram-se documenta-dos por muitos estudos experimentais e avalia-ções epidemiológicas. Entretanto, sob outrascondições, o crescimento somático pode pros-seguir inalterado e as estruturas cerebrais e suasfunções sofrem alterações significativas. Porexemplo, o efeito de uma anemia precoce nafunção cerebral independe do crescimentosomático. O impacto da deficiência de taurinano desenvolvimento da retina e do cérebro emprimatas humanos e não-humanos também nãoestá associada com a alteração do crescimento;além disso, a deficiência da taurina não temefeito deletério sobre a síntese protéica, umavez que este aminoácido sulfônico não é incor-porado à estrutura das proteínas. A deficiênciade ácidos graxos essenciais geralmente não estáassociada à deficiência do crescimento somático,mesmo sabendo que esses ácidos graxos sãoimportantes para a função normal da membra-na e respostas electrofisiológicas. Exemplos nadireção oposta, ou seja, de um pobre cresci-mento somático devido à desnutrição simulta-neamente com um desenvolvimento mentalnormal é fato mais difícil de encontrar. Issosugere que o crescimento somático é uma con-dição necessária mas insuficiente para que sealcance um desenvolvimento mental normal.

O ponto de vista tradicional de que as deficiên-cias de proteína e energia afetam diretamente odesenvolvimento estrutural do cérebro e o de-

sempenho cognitivo foi contestado uma vez quea DPE coexiste com outras deficiênciasnutricionais e outros elementos de privaçãopsicossocial também podem desestabilizar odesenvolvimento infantil. Isso faz com que sejaparticularmente difícil individualizar o papel denutrientes específicos ou mesmo os efeitos com-binados da privação de múltiplos outros nutrien-tes que interagem na nutrição ao definir aintegração final do processo do desenvolvimen-to [29]. Problemas associados com a simplifica-ção exagerada das complexas interações entrenutrição e desenvolvimento mental estãoenfatizadas na apresentação de dois exemplosde efeitos adversos do aumento da ingestão deproteínas num esforço de impedir a desnutriçãoem uma idade precoce. Intervenções nutricionaisem crianças prematuras no fim dos anos quaren-ta enfatizaram o fornecimento de tanta proteínaquanto necessária para maximizar o crescimentosomático. Isto levou ao fornecimento de até 6-8g de proteína por kg do peso corporal por dia. Oacompanhamento dessa população na vida adul-ta demonstrou que essas elevadas ingestões deproteína estavam associadas a QIs significativa-mente mais baixos [30]. O estudo clássico daUniversidade de Columbia, no qual houve o for-necimento de suplemento protéico a mulheresgrávidas com baixa renda num esforço de me-lhorar o peso do nascimento dos bebês, revelouque as elevadas ingestões de proteína oferecidasàs mulheres do Harlem com risco de dar à luzbebês de baixo peso estavam associadas a esco-res de desenvolvimento mental inferior aos 12meses [31]. Achados como esses deveriam nosmotivar a desenvolver uma melhor compreensãodos mecanismos pelos quais os nutrientes afe-tam o desenvolvimento cerebral e a cognição.Encontrar o equilíbrio correto entre nutrientespara evitar os riscos inerentes aos excessos edeficiências permanece um objetivo válido.

Ácidos graxos da dieta e

desenvolvimento cerebral

Realizamos estudos durante as décadas passa-das para avaliar os efeitos dos ácidos graxos

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poliinsaturados de cadeia longa (LCPs) da die-ta, no desenvolvimento neurológico infantil.Estes e outros estudos examinaram os efeitosda suplementação de ácido α-linolênico (AAL),AAL mais ácido docosa-hexaenóico (DHA), ouAAL mais DHA e ácido araquidônico (AA) so-bre a composição, no plasma e tecidos, doslipídeos e na função eletrofisiológica da retina,na maturação do córtex visual e em outrosparâmetros do crescimento e desenvolvimentoinfantis [32-39].

A existência de relação entre dadosbioquímicos precoces e dados funcionaistardios sugere que a função visual e odesenvolvimento neurológico podem estarrelacionados mas não constituem prova deuma relação de causa e efeito.

A função da retina em crianças prematurasEm nosso trabalho inicial, mostramos que afunção da retina, como foi determinado peloeletrorretinograma (ERG), é afetada pelo supri-mento de n-3 aos lactentes pré-termo. Realmen-te, o teste de acuidade visual mede a integrida-de da via neural da retina ao córtex occipital efornece uma medida substituta da função doSNC. Lactentes pré-termo alimentados com umadieta à base de óleo de milho carente de n-3(i.e. alimentadas com a fórmula infantil padrãode 1987) apresentaram limiares significativamen-te mais elevados para os bastonetes no testepelo eletrorretinograma (ou seja, o limiar dareação do bastonete exigia maior quantidade deluz) demonstrando assim uma resposta aoeletrorretinograma menos madura do que dascrianças que recebiam seja leite humano, sejafórmula suplementada com n-3. Uma análise dasrespostas quanto a amplitude-intensidade reve-lou que a elevação do limiar nos lactentes comdeficiência de n-3 era primariamente devido amenor sensibilidade do sistema de bastonetes.Além disso, havia uma diminuição modesta, massignificativa na amplitude máxima (Vmax) quepodia ser individualizada nos lactentes do gru-po portador de deficiência [33]. Os resultados

das modificações dos ácidos graxos da dietasobre a função do córtex visual, tal como medi-dos pela reversão do padrão da acuidade visualevocada potencial (VEP) (pattern reversal vi-sual evoked potential acuity) e pela escolhaforçada do olhar preferencial (FPL) (forced-choice preferential looking), uma respostacomportamental da acuidade visual(behavioural visual acuity response), demons-traram, no seguimento, que lactentes alimenta-dos com leite humano ou fórmulas contendoóleo marinho (em ambos os casos garantindo osuprimento de DHA) tinham melhor maturaçãodo VEP em relação às crianças alimentadas comfórmula isenta de DHA (grupo de produtos comóleo de milho e soja) à idade equalizada de 4meses. Nenhuma diferença foi encontrada en-tre as fórmulas à base de óleo de soja e óleomarinho no caso da acuidade ser avaliada porFPL. O significado de longo prazo das funçõesvisuais e retinianas melhoradas sobre oneurodesenvolvimento posterior está sendoobjeto atual de pesquisa.

A suplementação com LCPs para lactentes nas-cidos a termoA questão de que crianças a termo, saudáveis,exclusivamente alimentadas com fórmula, ne-cessitam LCPs adicionais tem recebido aten-ção considerável durante a última década. Osachados relativos a baixas concentrações deDHA (22:6 n-3) no plasma e no glóbulo verme-lho de lactentes alimentados com fórmula emcomparação com lactentes amamentados aoseio sugere que as fórmulas infantis habituaisnão fornecem AAL (18:3 n-3) (ácido α -linolênico) suficiente ou que as enzimas doalongamento-dessaturação não são suficiente-mente ativas durante a fase precoce da vidapara suportar um ótimo acréscimo de DHA aostecidos. Os bebês nascidos a termo talvez tam-bém dependam do DHA da dieta para umaótima maturação funcional da retina e docórtex visual [17, 40-59]. Birch et al. por exem-plo [55] comprovaram, recentemente, um be-nefício persistente no desenvolvimento daacuidade visual durante o primeiro ano de vidaem lactentes alimentados com fórmula

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suplementada com DHA em comparação comlactentes alimentados com fórmula contendoamplo fornecimento de AAL, mas isenta de LCPs.A fórmula administrada durante as primeiras17 semanas de vida continha 0,35% de DHA,com ou sem 0,72% de ácido araquidônico (AA)(20:4 n-6). Ambos os LCPs originavam-se de óle-os unicelulares. Grupos que receberamsuplementação de DHA ou DHA + AA e o grupodo leite humano apresentaram melhor acuidade.As diferenças eram significativas durante os pe-ríodos de rápidas modificações no desenvolvi-mento da acuidade da VEP, ou seja, nas primei-ras 20 semanas e chegando aos 12 meses de vida.

Os resultados do desenvolvimento desseslactentes também foi relatado [56]. Os escoresatribuídos segundo o Bayley MentalDevelopment Index II (MDI) (Índice Bayley deDesenvolvimento Mental) aos 18 meses para ogrupo DHA + AA foram significativamente me-lhores do que os observados no grupo delactentes alimentados com fórmulas sem LCPs.A diferença no escore MDI de 7 pontos, norma-lizado, era altamente significativa apesar do ta-manho da amostra relativamente pequeno (n=20por grupo). Este foi o primeiro estudo aleató-rio, controlado, que relatou um efeito dos LCPssobre o desenvolvimento mental aos 18 mesesde idade [56]. A existência de relação entredados bioquímicos precoces e dados funcionaistardios sugere que a função visual e o desenvol-vimento neurológico podem estar relacionadosmas não constituem prova de uma relação decausa e efeito.

Efeitos dos LCPs na maturidade da acuidadevisualDuas meta-análises recentes sobre os efeitos dosLCPs na maturidade da acuidade visual emlactentes pré-termo e a termo demonstraram umefeito positivo nas avaliações realizadas duran-te os primeiros 2-4 meses de vida [60, 61]. Osresultados aos seis meses são duvidosos masalguns permanecem positivos aos 12 meses deidade. Essas análises demonstraram uma vanta-gem em geral significativa na acuidade visualde crianças que receberam a suplementação de

LCPs. Diferenças nos desenhos experimentais,seleção temática, suplementação da dieta, ou-tros fatores relacionados à nutrição e os resul-tados primários dos estudos podem explicar re-sultados aparentemente contraditórios. A maio-ria dos estudos, todavia, eram prospectivos,aleatórios, controlados e duplo-cegos, mas al-guns incluíam nas revisões sistemáticas a com-paração com lactentes alimentados com leitehumano ou fórmula. A maioria utilizava indiví-duos "saudáveis" e submetidos a controle quan-to ao peso do nascimento, idade gestacional,condição socio-econômica e características ma-ternas. Contudo, conclusões baseadas nessas re-visões não podem ser generalizadas uma vezque os grupos em estudo podem não ter sidorepresentativos da população em geral. As die-tas estudadas forneciam de 0,1 a 0,35% de DHAa bebês nascidos pré-termo e a termo; esse é oteor médio a inferior de DHA encontrado noleite humano produzido por mulheres onívorasde todo o mundo. Nenhum estudo controladosobre dose de DHA e resposta da maturaçãovisual e/ou desenvolvimento mental foi realiza-do com bebês pré-termo ou a termo. A duraçãoe a reversibilidade dos efeitos induzidos por di-etas são outras importantes considerações naavaliação do resultado. O momento dasmensurações também é de grande importânciauma vez que a maioria dos efeitos dos LCPs sãoevidentes somente num período de rápido de-senvolvimento e não persistem depois que amaturação funcional tenha sido alcançada. Di-versos estudos comprovaram os significativosefeitos dos LCPs da dieta sobre a maturaçãovisual nos primeiros 4 meses de vida mas ob-servou-se, na maioria, que a acuidade visual nor-malizava-se por volta de 6 meses ou, no máxi-mo, com 1 ano de idade [60-62]. Todavia, deve-se perguntar se esse fenômeno deveria serrejeitado como transitório ou com limitado sig-nificado ou, se a incapacidade de detectar, pos-teriormente, significativas mudanças na vidarefletem limitações da metodologia emprega-da. Como exemplo, não detectamos diferençasna acuidade visual entre lactentes amamenta-dos ao seio e alimentados com fórmula aos 6meses de idade mas detectamos diferenças na

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acuidade estereofônica aos 3 anos de idade [40].Isso ilustra a necessidade de selecionar medi-das sensíveis para os resultados e garantir umseguimento suficiente dos grupos homogêneos.É impossível afastar totalmente as eventuaisconseqüências de longo prazo dos atrasos pre-coces do desenvolvimento das funções a nãoser que o acompanhamento se faça duranteperíodos mais longos.

Efeitos de nutrientes em estruturas

neurais e nas propriedades funcionais

Os fosfolipídios e o colesterol servem comocomponentes de membranas celularesespecializadas e organelas. A quantidade gerale a composição relativa dessas espécies delipídeos podem afetar a fluidez da membrana ea interação proteína/lipídeo, resultando emmudanças globais da função celular. Esses efei-tos podem modular as atividades receptoras, otransporte de metabólitos para dentro e parafora da célula, e processos hormonais ou ou-tros de transdução por sinal. A maioria das al-terações da membrana induzidas pelo ácidograxo n-3 não se traduzem em uma alteraçãogeral da fluidez da membrana mas resultam emmodificações em domínios específicos domicroambiente da membrana. Em linhas gerais,a fluidez da membrana mantém-se inalterada[63,64]. Além disso, as principais modificaçõesno estado físico das membranas ocorre quandometades mono ou duplamente insaturadas sãointroduzidas, ou seja, quando um ácido graxosaturado como o ácido esteárico (18:0) é subs-tituído por ácido oléico (18:1 n-9) ou por ácidolinoléico (18:2 n-6) [63].

Mecanismos de efeitos a longo prazo de

nutrientes específicos sobre o

crescimento e neurodesenvolvimento

A figura 3 ilustra a interação dos genes e dietano início da vida que determinam o desenvol-vimento cerebral, crescimento e composiçãocorporal na infância, e efeitos de longo prazo

como a incidência de doenças crônicas em es-tágios subseqüentes da vida. Esses efeitos pre-coces e os tardios são mediados por genes quesão expressados em vários graus, determinan-do fenótipos. A regulação de expressão do genepelos nutrientes pode ocorrer em níveis múlti-plos [65,66]. Nutrientes podem ligar-se àligantes específicos ou não específicos queinteragem com elementos respostas em moti-vos específicos do DNA geralmente presentesna região promotora do gene, afetando a trans-crição do gene. O DHA e outras ácidos graxospoliinsaturados interagem com fatores nuclea-res que modulam a ativação de proteínas nu-cleares específicas que, por sua vez, agem comoreguladores de transcrições [67]. Nesse caso,o efeito do nutriente é indireto, pois é o fatorde transcrição ativado que combina os elemen-tos cis-reguladores do DNA de genes-alvo (verA. Katherine Turner e Patrick J. Stover, nestenúmero, p. 1-11).

Genes Desenvolvimento Capacidadecerebral cognitiva

e educação

Dieta no Crescimento Imunidadeinício (músculo/osso, etc.) Capacidade

da vida Composição do corpo de trabalho

Programação Diabetesmetabólica ObesidadeProteínas, Doença

Genes lipídeos, cardiovascular,carboidratos derrame,Hormônios, hipertensão,genes, Câncerreceptores Envelhecimento

Figura 3: interação entre a dieta no início da vida e o

genótipo na definição de relevantes resultados relativos

à saúde e qualidade de vida. A nutrição no início davida afeta não apenas o desenvolvimento cerebral, cres-

cimento e composição corporal mas também a progra-

mação metabólica com impacto sobre doenças crônicas

do adulto relacionados com a dieta, imunidade, capaci-

dade para o trabalho físico, e desempenho educacional

e cognitivo.

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Trabalho adicional se faz necessário paramelhor caracterizar os metabólitosintracelulares de ácidos graxos que regulama ativação da transcrição e a “responsividade”dos genes-alvo que são críticos para odesenvolvimento neurológico.

Outra forma de interação entre o nutriente eo ligante compreende mudanças na fosforilação.Ao nível pós-transcripcional, os nutrientes po-dem agir modificando o processamento do RNAnativo, transporte e estabilidade do mRNA, eíndices de desdobramento. Os nutrientes tam-bém podem modificar o índice de tradução domRNA, ativando a síntese protéica no comple-xo poliribossômico. Finalmente, os nutrientespodem modificar as taxas de reposição das pro-teínas, inclusive enzimas, afetando, assim, seunível de atividade. Em muitos casos, as mudan-ças induzidas por nutrientes na expressão dogene são parte de respostas adaptativas paradiferentes níveis de exposição ao nutriente [65,66]. Assim, os nutrientes podem afetar a capta-ção, o metabolismo, armazenamento ouexcreção do nutriente que despertou a respostaregulatória do gene. Trabalhos adicionais sãonecessários para melhor caracterizar osmetabólitos intracelulares do ácido graxo queregulam a ativação da transcrição e a“responsividade” dos genes-alvo críticos para odesenvolvimento neurológico.

Conclusões

A nutrição de bebês e crianças deveria ser con-siderada como um continuum cujo ótimo iníciopode depender de eventos que precedem a con-cepção. Na verdade, a nutrição preconcepcionalafetará não somente a mãe mas também o fetoe o bebê. A nutrição pós-natal, naturalmente,também desempenha papel importante na pro-moção da saúde e na qualidade de vida de cri-anças, adultos e idosos, não somente por pro-longar a vida, mas também prevenindoincapacitações durante o ciclo de vida.

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NOTA IMPORTANTEAS GESTANTES E NUTRIZES PRECISAM SER INFORMADASQUE O LEITE MATERNO É O IDEAL PARA O BEBÊ, CONS-TITUINDO-SE A MELHOR NUTRIÇÃO E PROTEÇÃO PARAO LACTENTE. A MÃE DEVE SER ORIENTADA QUANTO ÀIMPORTÂNCIA DE UMA DIETA EQUILIBRADA NESTE PERÍ-ODO E QUANTO À MANEIRA DE SE PREPARAR PARA OALEITAMENTO AO SEIO ATÉ OS DOIS ANOS DE IDADE DACRIANÇA OU MAIS. O USO DE MAMADEIRAS, BICOS E CHU-PETAS DEVE SER DESENCORAJADO POIS PODE TRAZEREFEITOS NEGATIVOS SOBRE O ALEITAMENTO NATURAL.A MÃE DEVE SER PREVENIDA QUANTO À DIFICULDADEDE VOLTAR A AMAMENTAR SEU FILHO UMA VEZ ABAN-DONADO O ALEITAMENTO AO SEIO. ANTES DE SER RECO-MENDADO O USO DE UM SUBSTITUTO DO LEITE MATER-NO, DEVEM SER CONSIDERADAS AS CIRCUNSTÂNCIAS FA-MILIARES E O CUSTO ENVOLVIDO. A MÃE DEVE ESTARCIENTE DAS IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS E SOCIAIS DONÃO ALEITAMENTO AO SEIO - PARA UM RECÉM-NASCIDOALIMENTADO EXCLUSIVAMENTE COM MAMADEIRA SERÁNECESSÁRIA MAIS DE UMA LATA POR SEMANA. DEVE-SELEMBRAR À MÃE QUE O LEITE MATERNO NÃO É SOMEN-TE O MELHOR, MAS TAMBÉM O MAIS ECONÔMICO ALI-MENTO PARA O BEBÊ. CASO VENHA A SER TOMADA ADECISÃO DE INTRODUZIR A ALIMENTAÇÃO POR MAMADEI-RA É IMPORTANTE QUE SEJAM FORNECIDAS INSTRUÇÕESSOBRE OS MÉTODOS CORRETOS DE PREPARO COM HIGI-ENE, RESSALTANDO-SE QUE O USO DE MAMADEIRA EÁGUA NÃO FERVIDAS E DILUIÇÃO INCORRETA PODEMCAUSAR DOENÇAS.

OMS - CÓDIGO INTERNACIONAL DE COMERCIALIZAÇÃO DE SUBS-TITUTOS DO LEITE MATERNO. WHA 34:22, MAIO DE 1981. POR-TARIA NO 2051 - MS DE 08 DE NOVEMBRO DE 2001 E RESOLU-ÇÃO NO 222 - ANVISA - MS DE 5 DE AGOSTO DE 2002.

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Volume 63 / 2004

Anais Nestlé

Nutrição na infância

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