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SETEMBRO-OEZEMBRO 1954
VOLUME III N.o 3
B~tETIM DE tlÊNtlU Et~N~MltU SUPLEMENTO AO BOLETIM DA FACULDADE DE DIREITO
PUllLICAÇ-O QUADRI 1E TRAL
RBOACTOR-OKL80ADO
J. J. TEIXEIRA RIBEIRO
FACULDADE DE DIREITO
COIMBRA
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porém, de o fazer, neste lugar, por se encontrar quas& concluido outro trabalho da nossa autoria, sobre os Lanifíoios, desde o fim do reinado de D. João v até 1834. Lã poderá o leitor matar a curiosidade, no rico manacial de documentos inéditos aí reunidos, à semelhança do que fizemos ao tratar da política económica de Ericeira.
As nossas monografias histórico-económicas, fruto dum labor de investigação directa e pessoal, de mais de seis anos, nos arquivos portugueses, procuram sem
pre focar o carácter típico do mercantilismo português, aqui e além interpenetrado de influências estranhas, mas sempre inconfundível, nas suas linhas mestras, pelas variantes da história, da geografia e da politica.
Aproveitamos o ensejo de dar à estampa, em primeira mão, o relatório de Felisberto Januário Cordeiro, intitulado pomposamente Dis8e,.tação sob,.e a Or'gem da
Decadéncia da8 Fábricas. Muito embora não aceitemos todas as suas conclusões, constitui testemunho valioso para a interpretação do declínio das indústrias e oferece uma opinião discutível, mas séria, desse fenómeno. É, pelo menos, ainda que simplista, o critério de quem viveu os acontecimentos do seu tempo. As cartas e a
dissertação são dirigidas a D. Rodrigo de Sousa Coutinho, esquecida personagem que bem merece ombrear com Pombal e com o Conde da Ericeira. Com ventos propícios, esperamos a oportunidade de consagrar um breve ensaio ao ilustre Ministro de D. Maria 1.'
Para o leitor, amante destes estudos e ourioso da época que medeia da queda de Pombal ao Reinado de
D. Miguel I, chamamos a atenção para outra memória, quiçá a mais notável desse período, directamente rela-
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~ionada oom O problema manufaotureiro : A Memória obre o e fado aclual das Fábricas de Lanifícios da Vila
da "'ovilhã, eto., de João António' de Carvalho Rodrigu s da Uva. E~se trabalho, ouja segunda edição acabamos de apre entar em separata de Lanifício, ajuda a preenoher algumas das laounas em aberto, no presente ensaio.
2. A Relação da Fábricas em 178 é um manu -~rito inédito do Arquivo do Ministério das Obras Públi
~as, do fundo da Junta do Oomércio. Pelo fundo donde provém e pelos seus caracteres
intr1nsecos e extrínsecos ofereoe todas as garantias dum
original. pos~lvelmente decaloada neste documento, oonhece-
mos outra versão, menos completa, referente ao mesmo período, a do Oódice 1496, n.o 41, do Fundo Geral da Secção de Reservados da Biblioteca Naoional de Lisboa j as variantes, sempre no pormenor, slio de tal modo insigni8oantes, que se torna desnecessária a sua inserção
neste ensaio.
3. A estatistica aparece como uma das inovações do mercantilismo e deriva da função intervencionista do Estado nas actividades económicas. Age como elemento de informação dos estadistas, para quem a política económica começou a ser preocupação primacial. Por isso, desse período nos chegaram inquéritos, mapas, balanças de comércio, relações de fábricas e censos
demogrA8cos. Porém, como a estatística estava na infância, esses
elementos sairam desordenados, desconexos, e algumas vezes, por obedecerem a critérios de recolha muito
diversos, bastante oontraditórios.
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Não basta por isso apresentá-los. A oritioa deve apurar-lhes os fundamentos, ausoultar
-lhes os critérios informadores, clarificar· lhes os números, joeirar o trigo das impurezas, para colher os ensinamentos convenientes a um aproveitamento científico e a uma compreensão séria.
4. Da actividade fabril portuguesa no século XVIII
e nos primeiros anos do século XIX, sem dúvida um dos períodos mais fecundos da Hist6ria da Humanidade como fulcro de consequências sem par, ficaram· nos alguns mapas, dois publicados e, dentre os inéditos, a curiosa Relação das Fábricas em 1788. Dos primeiros, um traz a marca do século XVlII, e o outro de 1814; são respectivamente conhecidos por Lista das Fábricas instaladas,
com participação da Junta do Comércio, durartte a sua
e:r.isMncia até à Reforma de D. Maria 1.a, por ordem alfa
bética dos géneros fabricados (1), e por Mapa Geral Estatístico, que ,.ep,.esenta as fábricas do Reino no estado em
que existiam nos primei,.os tempos da última invasão ( , ).
Perante a lista e o mapa, vem a nossa Relação preencher uma lacuna em aberto e trazer mais um pilar ao prosseguimento do estudo da evolução econ6mica, desde os alvores do pombalismo à noite esoura das invasões francesas. Há, entre todos, um nexo de causalidade tão acentuado que justificaria por si um estudo de conjunto, a organização dom trabalho de síntese, se não fora a impossibIlidade de os realizar com eBciência, por carência de elementos. O desconhecim~nto dos fundos
( ') ln: A tluaçlfo Económica !Ia Tempo dt Pombal, por Jorge de Macedo, Porto, 1951.
(I) ln : Variedades etc., por José Actlrsio das Neves.
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192 --da Junta de Coméroio, nas suas variadas forma!!, agrava·
a ob ouridade do ambiente. O interesse da época é desneces ário encareoê-Io.
E tende-se pelo período experimental das grand s descobertas que conduziram à Revolução Industrial e ainda, em parte, pelo da utilização prátioa da máquina a vapor, da «Jenny, e da ", Mule ', para não referir outras, e ooincide com a gestação e desenvolvimento das ideias que levaram as fórmulas comunitárias de posse da terra a ceder, pouoo a pouoo e, quase definitivamente, à pres-
ão do individualismo agrário.
5. A Relação de 1788, que particularmtlnte nos in te
ressa neste momento, respeita à aotividade da Real Junta do Coméroio e Administração das Fábrioas do Reino e Águas Livres, sem deixar no olvido a actividade da sua antecessora, a antiga Junta do Oomércio
do Consulado Pombalino. Oomo deriva da sua data e do seu conteúdo, apre-
senta-se como o balanço da acção económico-legislativa desse novo organismo, criado por D. Maria 1.., no Alvará de 1 de Julho de 1777 (1) e extinto pela Oarta de Lei
de 5 de Junho de 1788 ('). Consta de quatro partes. Enumera na primeira as
indústrias existentes, sua localização, número de unidades, industriais fundadores e seus sucessores, privilégios, isenções e mais legislação industrial. Na segunda parte, relatam-se as fábricas que laboram por conta do Rei, para na terceira se agruparem aquelas que, tendo
( I) Noçiit· Hi tóncas, Económicas e Administrahvas, etc., Lisboa, 1 27, por José Ac6.rsio das Neves, fis. 303.
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igual forma de constituição e administração, se trllnsfe~iram para sociedades particulares. Por último, na quarta parte, inscrevem-se as unidades estabelecidas à sombra do exclusivo, prazo desse privilégio e data do seu inicio.
Permite-nos assim a Relação de 1788 estabelecer o confronto entre a política fabril do Marquês de Pombal e os anos seguintes do reinado da Rainha, ou por outras palavras, entre a actividade da Junta do Coméroio e a da Junta da Administração das Fábricas e Águas Livres. Daqui resulta, a favor da primeira, um activo de 86 oficinas ou fábricas e. a favor da segunda, cerca de 263, depois de afastadas do cômputo geral 76 ofici nas, impossíveis de integrar em qualquer dos periodos, por carência de data da fundação (1 ). A consulta da rica documentação da Junta ajudaria a suprir esta falta, que de qualquer modo não altera a verdade insofismável, decorrente destes números.
Na verdade. o surto manufactureiro dos 10 primeiros anos do Governo da Rainha ultrapassa a actividade dos 27 anos do Reinado de seu pai. muito embora se admita caber a medidas anteriores a instituição do clima propicio a estas obras de fomento . Mais próspera, contudo. se evidenciaria a nova época, se a politica económica do Marquês de Pombal, em vez de investir em ricos e luxuosos edificios os capitais da nação, os aplicasse i n to to em instrumentos e actividades de natureza directamente reprodutiva . São essas verbas, não amortizadas, que para muitos dos biógrafos de Sebastião ~osé continuam a pesar como estigma sobre a sua administração.
( 1 ) Mapa Comparativo.
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19.
A euforia de novas unidades industriais no segundo período, oom seu investimentos, sobretudo de fonte partioular, revela a melhoria da eoonomia geral, oonquanto no regime da manufaotura o oapital fixo de qualquer empresa não atinja ainda a grande oifra que mai8 tarde há-de ju tifioar o desenvolvimento da meoânioa.
A e se florescimento indu trial post-pombalino nllo terão sido porventura estranhos, também, os oapitais oanalizados para a indústria doméstioa, através de finanoiamentos ou pagamentos antecipados de tecidos, destinados ao fardamento da8 tropas e distribuídos por Pombal a mãos larga~ . Feitos oiroular ràpidamente, por hábeis meroadores, nem sempre honesto, e desviados momentâneamente para o giro partioular, fecundaram as pequenas eoonomias que ao depois mais largamente se expandiram, sob os prinoipios da liberdade económioa, gravados nas bandeiras dos sucessores do Marquês (1 ). Este aspecto do problema refleote-se mais no seotor dos têxteis, (onde se têm fixado os nossos estudos) que pela 8ua variedadA melhor espelha os aspeoto gerais da economia. Mas como a documentação inédita é ainda sem conta, que surpresas não reservarão as novas publicações à curiosidade dos estudiosos Y A sintese continua por isso a resguardar-se e a manter-se naquele estado intermédio em que as sombras se confundem com as figuras reais!
Por outro lado a Relação das Fábricas oferece-nos, em parte, o panorama industrial da época, com as suas unidades privilegiadas, as administradas pela fazenda Real, através da Junta do Comércio, e ainda as de admi-
( 1) 3femórlll sobrt o t lado actual do Fábricas de La,u(lcios da Vila' da Co"tlhã, por João António de Carvalho Rodrigues da Silva Lis-boa, 1803. Id., 2." edição, separata de .Lanificios., 1955. I
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nistraçAo partioular e deixa-nos a oerteza de que, para além delas, uma outra indústria prospera e vive- a indústria livre_
6. Convém, primeiro, preoisar o que deve entender-se por fábrioa, para a Relação de 1788 (1)-
Conhecidas as fórmulas olássioas de exploração dasactividades - o trabalho caseiro, a indústria doméstica ,. a tenda artesanal e o sistema fabril - , a qual delas se referirá 1 Notemos primeiramente : a palavra ou vocábulo fábrica engloba indistintamente, entre outros significados, a universalidade, instrumentos e edifício oude se realizam todas ou algumas operações de transformação de qualquer produto ou a actividade manufactureira propriamente dita. Foi neste derradeiro sentido que, no tempo do Conde da Ericeira, se chamou ao fabrico dos panos a fábrica dos panos ('J). É este também aquele que parece estar implicito na Relação de 1788,. muito embora, em obras coevas, se reservasse o termo para estabelecimentos equivalentes a fábricas completas.
O sentido lato que julgamos dever atribuir·se à palavra fábrica nem deve obscurecer uma das realidades dessa época nem induzir em erro: a administração pombalina deu um notável incremento às iniciativas económicas, classificadas hoje como fábricas; muitas das suas realizações distinguem-se por essa conoentração dos
( 1 ) João António de Carvalho Rodrigues da Silva, na cito Memó,-ia, chama fábrica aos agregados de oficinas, aonde a lã entra em rama e sai convertida em tecido ultimado. Para este autor só deve considerar-se fábrica, portanto, aquela que hojs oonsideramos completa.
( 2 ) Os Laniftcios, lia Politica Económica do Conde da ErIceira (I) . Lisboa, 1954, por Luís Fernando de Carvalho Dias.
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in trumentos e dos métodos de trabalho, sob o mesmo tecto e ob a me ma direcção, em oposição a outro~ i t ma di per ivos ou semi-di persivos de p riodos
anteriore -ircunscrever aqui o sentido do vocábulo a deter-
minado tipo de e pio ração económioa, como por exemplo o sistema fabril, ra tornar inoompreen ível que a
elação incluL e si t mas earaeterizadamente dom é Ueo',
como o dos teares do e treito, e artesanais, como certa
e plorações da indú tria de meias, eto. e a Relação de 1788 englobou vários @istemas de
fabrico além do fabril propriamente dito, também deixou Qmi sas unidades que hão-de olassifioar-se como tai .
Por exemplo, na actividade manufactureira dos lani
fício • ignorou a exi tênoia de certas fábricas ou oficinas especializadas, propriedade dos fabricantes volantes que
e dedicavam ao exercício por conta própria de certos e determinados ramos da actividade industrial, v. g. tin
turarias e ultimações. Constituíam tanto umas como outras verdadeiras em presas fabris de carácter permanente, servidas por operários assalariados, reunidos debaixo do mesmo tecto, exercendo tarefas especializadas e variada , sob a mesma direcção técnica e igualmente sob uma úoica direcção económica. Trabalha
vam indistintamente para terceiros e por conta própria. Os instrumentos de trabalho pertenciam já ao industrial.
Relaciona, por outro lado, independentemente sim
ples instrumentos de trabalho, v. g. as râmulas, utensilios destinados a estirar e secar ao sol as peças de fazenda. Ora estes instrumentos constituem, quando muito, ape·
trechos integrados na tinturaria ou na ultimação. Da mesma maneira, no fabrico da seda, diferencia ae calandras e ainda, nos tecidos de lã, especifica não unidades
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