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Praça Barão do Rio Branco, 93 – CEP. 66.015-060 – Belém-PA. Fone: (0xx91) 4006-8600 Fax: (0xx91)4006-8603
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PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 039/2014
Requerente: OAB/Pa
Assunto: Autorização para ajuizamento de ação civil pública contra a
construção de empreendimentos habitacionais multifamiliares nas orlas de
Belém.
Relator: Afonso Arinos de Almeida Lins Filho
Relatório
Trata-se de pedido de ajuizamento de ação civil pública visando
coibir a construção de empreendimentos habitacionais multifamiliares nas
orlas de Belém, bem como a demolição de edifício na Rua Nelson Ribeiro nº
93, no Bairro do Telégrafo, denominado Premium, construído à margem da
Baia do Guajará.
Segundo diversas entidades da sociedade civil que se
manifestaram perante a Ordem requerendo a adoção de providências, pois
entendiam que o procedimento de licenciamento do empreendimento
estaria irregular por descumprimento de legislação ambiental vigente,
causando prejuízo ambiental para os habitantes da cidade.
Concluíram afirmando que a permanência do empreendimento
à margem do rio cria precedente para construção de outros prédios
semelhantes, comprometendo a ventilação e a mobilidade urbana naquela
região da cidade.
O assunto foi tema de diversas matérias jornalísticas nos
principais meios de comunicação, gerando grande repercussão social.
O clamor social contra a continuação da obra e pelos diversos
pedidos de licenciamentos de obras semelhantes na mesma área, reabriu o
debate do tema na Comissão de Meio Ambiente da OAB que deliberou
pelo encaminhamento a este Conselho, da proposta de ajuizamento de
ação civil pública com o intuito de impedir a urbanização desordenada e
ilegal no Município de Belém.
Em 20 de Maio de 2011, o Ministério Público Federal ajuizou ação
civil pública atacando especificamente o licenciamento do Edifício
Premium, feito que tramita pela 9ª Vara Federal desta Capital sob o nº
0016934-22.2011.4.01.3900, em fase de instrução.
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Durante este tempo, os empreendedores continuaram a
construção do empreendimento, autorizados judicialmente de forma liminar,
condição que se apresenta até o momento.
Após ser nomeado Relator do Conselho Seccional da OAB para
condução do caso posto, foram expedidos dois ofícios: o primeiro para a
empresa QUADRA ENGENHARIA LTDA, facultando a apresentação de
memoriais e o segundo para a Secretaria Municipal de Meio Ambiente
requerendo cópia do Processo de Licenciamento.
Em resposta, a empresa QUADRA ENGENHARIA LTDA esclareceu
que é apenas a construtora contratada para realização da obra e que o
empreendimento é de responsabilidade e titularidade da Premium
Participações Ltda e do Condomínio do Edifício Premium.
Imediatamente após a resposta da Construtora, o relator
recebeu em sua residência, correspondência dos empreendedores, de
caderno identificado como “Edifício Premium, Fatos e dados”, contendo
informações e cópia de documentos sobre o processo de licenciamento
ambiental, sustentando a regularidade do Empreendimento.
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente não se manifestou e
não encaminhou cópia do Processo de Licenciamento da obra como
requerido.
No dia 21 de Março de 2014, a Construtora Quadra Engenharia,
encaminhou para apreciação cópia do Projeto de Controle Ambiental, do
Estudo de impacto de vizinhança, de um estudo técnico científico em
relação ao aspecto climático, de estudo de impacto no trânsito e de
diversos documentos avulsos referentes ao licenciamento.
É o relatório.
Voto
Senhores Conselheiros, Senhoras Conselheiras, a repercussão
social deste processo administrativo demonstra a relevância da questão
para o Município de Belém, não somente por apontar um novo paradigma
de atuação da sociedade civil na defesa dos interesses difusos e coletivos,
como também por ressaltar o papel da OAB como legítima depositária da
segurança e esperança da sociedade, na defesa de seus interesses
intangíveis.
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A expectativa social sobre a posição deste Conselho não
permite que o enfrentamento da questão se limite apenas ao
empreendimento localizado na Rua Nelson Ribeiro nº 93, denominado
Edifício Premium, mas que se discuta a ocupação das próprias orlas da
cidade de Belém. Discutir apenas o empreendimento citado colocaria em
risco a credibilidade e a eficácia da atuação desta Seccional, em face da
possibilidade de implantação de outros empreendimentos imobiliários
semelhantes, da mesma forma contestados, postergando de forma
indefinida uma situação conflituosa, que em nada contribui para a paz
social.
A OAB, no exercício de seu papel social não atua de forma
casuística e direcionada com o intuito de defender interesses diretos ou
indiretos de grupos ou corporações privadas, nem tão pouco se associa a
ideologias políticas, tendo entre seus desígnios a defesa incondicional do
Estado democrático de Direito e do interesse público.
Não resta dúvida sobre o incômodo que o enfrentamento da
questão provoca, onde aparentemente, faremos opção entre o interesse
público e o privado, entre o prejuízo à sociedade ou aos empreendedores.
Sabemos que devemos agir com imparcialidade, pois ao
assumirmos o compromisso de representar a Ordem, carregamos o peso de
sua tradição, o que nos impede de sermos parciais e agir conforme as
conveniências.
A elaboração do presente Relatório seguiu algumas premissas
metodológicas cuja finalidade foi reduzir o grau de subjetividade da análise
da questão. Prestigiou-se o uso de dispositivos normativos e precedentes
jurisprudenciais, em detrimento de citações doutrinárias.
O Relatório foi estruturado em duas partes: a primeira versa
especificamente sobre a ocupação urbana das orlas do município de Belém
por empreendimentos verticais multifamiliares e a segunda, aborda a
situação jurídica da construção do Edifício Premium.
Preliminarmente, torna-se relevante esclarecer dois temas
relacionados que poderiam comprometer o entendimento do Relatório se
não fossem aclarados:
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O primeiro tema refere-se ao aparente conflito entre normas
jurídicas de natureza ambiental e urbanísticas.
A doutrina jurídica ensina que as classificações dos ramos do
Direito são convencionais e didáticas, pois, as normas jurídicas introduzidas
corretamente no Sistema Jurídico posto, em observância dos princípios
constitucionais e em conformidade com o processo legislativo são
denominadas apenas normas jurídicas, que de forma integrada formam as
proposições gerais e abstratas constantes nas hipóteses de incidência das
Leis (em sentido amplo).
O próprio sistema jurídico estabelece regras de coerência
interna, pois a existência de antinomia entre normas resultaria na ruptura
sistêmica, causando o comprometimento de sua validade e existência.
As regras de coerência são estabelecidas pelos princípios
constitucionais (em especial o da supremacia da Constituição e da
hierarquia das normas), pela distribuição da competência legislativa e pelo
cumprimento do processo legal de criação de normas jurídicas.
Qualquer norma jurídica introduzida no Sistema Jurídico, sem
observância das regras de coerência, dele é excluída mediante o uso dos
instrumentos de controle de constitucionalidade indicados na Constituição.
O segundo tema refere-se à necessidade de compreensão dos
níveis de imposição normativa ambiental, incidentes sobre ocupação
urbana de Belém: o primeiro nível é decorrente das Constituições Federal e
Estadual e de leis federais de caráter geral, como a que trata das áreas de
proteção permanente; e o segundo nível decorrente de normas jurídicas de
ordenamento territorial municipal.
Esclarecimentos prévios feitos, passo à análise da questão.
I-SOBRE A OCUPAÇÃO URBANA DAS ORLAS DO MUNICÍPIO DE BELÉM POR
EMPREENDIMENTOS VERTICAIS MULTIFAMILIARES
I.1. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A DEFESA DO MEIO AMBIENTE
A Constituição Federal brasileira é o instrumento jurídico
supremo de organização do Estado e norteador dos ideais políticos e sociais
necessários para a construção de uma sociedade fraterna, igualitária e
harmônica, onde se objetiva assegurar a todos o exercício dos direitos sociais
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e individuais, a liberdade, a segurança e o bem-estar. Suas normas, sejam de
eficácia plena, contida ou limitada, projetam-se sempre para o futuro, na
busca incessante de realização de seus fins.
Foi com esse olhar para o futuro que o legislador constituinte
produziu normas constitucionais consideradas extremamente avançadas,
estabelecendo direitos fundamentais de terceira geração, como são
chamados os direitos de fraternidade ou de solidariedade, cuja destinação
específica é a proteção dos interesses difusos e coletivos.
Entre os direitos fundamentais de terceira geração, instituído
para garantir às presentes e futuras gerações, a condição de viver em um
meio ambiente ecologicamente equilibrado, como prescreve o Art. 225 da
Carta Magna:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
O dispositivo acima, expressa o princípio do desenvolvimento
sustentável, que se espraia pelo conjunto normativo constitucional,
estabelecendo obrigações ao Poder Público e limitações à iniciativa
privada, com o intuito de conciliar o binômio desenvolvimento
econômico/meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Podemos citar entre limitações da atividade privada, a
obrigatoriedade da propriedade privada atender a função social, conforme
prescreve o inciso XXIII do Art. 5º e a exigência de defesa do meio ambiente
pelos agentes econômicos no exercício de suas atividades constante no
inciso VI do art.170:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano
e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
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VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado
conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus
processos de elaboração e prestação;
A relevância constitucional da defesa do meio ambiente é
reconhecida e declarada pelo Supremo Tribunal Federal em diversos
julgados, dos quais transcrevemos parte de alguns acórdãos paradigmas:
“(STF – ADI 3540 MC – DF – T. Plen. – Rel. Min. Celso De Mello – DJU
03.02.2006) – MEIO AMBIENTE – DIREITO À PRESERVAÇÃO DE SUA
INTEGRIDADE (CF, ART. 225) – PRERROGATIVA QUALIFICADA POR SEU
CARÁTER DE METAINDIVIDUALIDADE – DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO
(OU DE NOVÍSSIMA DIMENSÃO) QUE CONSAGRA O POSTULADO DA
SOLIDARIEDADE – NECESSIDADE DE IMPEDIR QUE A TRANSGRESSÃO A
ESSE DIREITO FAÇA IRROMPER, NO SEIO DA COLETIVIDADE, CONFLITOS
INTERGENERACIONAIS – ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE
PROTEGIDOS (CF, ART. 225, § 1º, III) – ALTERAÇÃO E SUPRESSÃO DO
REGIME JURÍDICO A ELES PERTINENTE – MEDIDAS SUJEITAS AO PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE LEI – SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO EM
ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – POSSIBILIDADE DE A
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, CUMPRIDAS AS EXIGÊNCIAS LEGAIS,
AUTORIZAR, LICENCIAR OU PERMITIR OBRAS E/OU ATIVIDADES NOS
ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGIDOS, DESDE QUE RESPEITADA, QUANTO
A ESTES, A INTEGRIDADE DOS ATRIBUTOS JUSTIFICADORES DO REGIME DE
PROTEÇÃO ESPECIAL – RELAÇÕES ENTRE ECONOMIA (CF, ART. 3º, II, C/C
O ART. 170, VI) E ECOLOGIA (CF, ART. 225) – COLISÃO DE DIREITOS
FUNDAMENTAIS – CRITÉRIOS DE SUPERAÇÃO DESSE ESTADO DE TENSÃO
ENTRE VALORES CONSTITUCIONAIS RELEVANTES – OS DIREITOS BÁSICOS
DA PESSOA HUMANA E AS SUCESSIVAS GERAÇÕES (FASES OU
DIMENSÕES) DE DIREITOS (RTJ 164/158, 160-161) – A QUESTÃO DA
PRECEDÊNCIA DO DIREITO À PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE – UMA
LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL EXPLÍCITA À ATIVIDADE ECONÔMICA (CF,
ART. 170, VI) – DECISÃO NÃO REFERENDADA – CONSEQÜENTE
INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR – A PRESERVAÇÃO
DA INTEGRIDADE DO MEIO AMBIENTE – EXPRESSÃO CONSTITUCIONAL DE
UM DIREITO FUNDAMENTAL QUE ASSISTE À GENERALIDADE DAS PESSOAS
– Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Trata-se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima
dimensão), que assiste a todo o gênero humano (RTJ 158/205-206).
Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a especial obrigação de
defender e preservar, em benefício das presentes e futuras gerações,
esse direito de titularidade coletiva e de caráter transindividual (RTJ
164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é irrenunciável,
representa a garantia de que não se instaurarão, no seio da
coletividade, os graves conflitos intergeneracionais marcados pelo
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desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na
proteção desse bem essencial de uso comum das pessoas em geral.
Doutrina. A ATIVIDADE ECONÔMICA NÃO PODE SER EXERCIDA EM
DESARMONIA COM OS PRINCÍPIOS DESTINADOS A TORNAR EFETIVA A
PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. A incolumidade do meio ambiente
não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar
dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda
mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a
disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros
princípios gerais, àquele que privilegia a "defesa do meio ambiente"
(CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções
de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio
ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral.
Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza
constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente,
para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são
inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde,
segurança, cultura, trabalho e bem-estar da população, além de
causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental,
considerado este em seu aspecto físico ou natural. A QUESTÃO DO
DESENVOLVIMENTO NACIONAL (CF, ART. 3º, II) E A NECESSIDADE DE
PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE DO MEIO AMBIENTE (CF, ART. 225): O
PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO FATOR DE
OBTENÇÃO DO JUSTO EQUILÍBRIO ENTRE AS EXIGÊNCIAS DA ECONOMIA
E AS DA ECOLOGIA...”.
(STF – ADPF 101 – Relª Minª Cármen Lúcia – DJe 19.06.2012 – p. 18)
JCF.170 JCF.196 JCF.225 JCF.237 JCF.170.I JCF.170.VI JCF.170.PUN –
ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL –
ADEQUAÇÃO – OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE –
ARTS. 170, 196 E 225 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA –
CONSTITUCIONALIDADE DE ATOS NORMATIVOS PROIBITIVOS DA
IMPORTAÇÃO DE PNEUS USADOS – RECICLAGEM DE PNEUS USADOS –
AUSÊNCIA DE ELIMINAÇÃO TOTAL DE SEUS EFEITOS NOCIVOS À SAÚDE E
AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO – AFRONTA AOS PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS DA SAÚDE E DO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE
EQUILIBRADO – COISA JULGADA COM CONTEÚDO EXECUTADO OU
EXAURIDO – IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO – DECISÕES JUDICIAIS
COM CONTEÚDO INDETERMINADO NO TEMPO – PROIBIÇÃO DE NOVOS
EFEITOS A PARTIR DO JULGAMENTO – ARGUIÇÃO JULGADA
PARCIALMENTE PROCEDENTE –“... 4- Princípios constitucionais (art. 225)
a) do desenvolvimento sustentável e b) da equidade e
responsabilidade intergeracional. Meio ambiente ecologicamente
equilibrado: preservação para a geração atual e para as gerações
futuras. Desenvolvimento sustentável: crescimento econômico com
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garantia paralela e superiormente respeitada da saúde da
população, cujos direitos devem ser observados em face das
necessidades atuais e daquelas previsíveis e a serem prevenidas para
garantia e respeito às gerações futuras. Atendimento ao princípio da
precaução, acolhido constitucionalmente, harmonizado com os
demais princípios da ordem social e econômica...”..
(STF – MS 25284 – Rel. Min. Marco Aurélio – Tribunal Pleno – J. 17.06.2010
– DJe-149 – Divulg. 12.08.2010 – Public. 13.08.2010; Ement. – v. 02410-02
– p. 00298)– DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – RESERVA EXTRATIVISTA –
DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA –
INCOMPATIBILIDADE – PREVALÊNCIA DO PÚBLICO SOBRE O PARTICULAR
– RECONHECIMENTO – ...“Meio ambiente. Reserva extrativista. Conflito
de interesse. Coletivo versus individual. Ante o estabelecido no art. 225
da Constituição Federal, conflito entre os interesses individual e
coletivo resolve-se a favor deste último. Propriedade. Mitigação. O
direito de propriedade não se revela absoluto. Está relativizado pela
Carta da República – arts. 5º, incisos XXII, XXIII e XXIV, e 184. ...”.
Não menos arrojada, a Constituição do Estado do Pará pugna
pela proteção ao meio ambiente em quatro artigos, os quais transcritos
abaixo:
Art. 50. A organização regional tem por objetivo:
III - a gestão adequada dos recursos naturais e a proteção ao meio
ambiente;
Art. 252. A proteção e a melhoria do meio ambiente serão
prioritariamente, consideradas na definição de qualquer política,
programa ou projeto, público ou privado, nas áreas do Estado.
Art. 253. É assegurada a participação popular em todas as decisões
relacionadas ao meio ambiente e o direito à informação sobre essa
matéria, na forma da lei.
Art. 255. Compete ao Estado a defesa, conservação, preservação e
controle do meio ambiente, cabendo-lhe:
III- assegurar a diversidade das espécies e dos ecossistemas, de modo a
preservar o patrimônio genético, biológico, ecológico e paisagístico e
definir espaços territoriais a serem especialmente protegidos;
Da mesma forma, a Lei Orgânica do Município de Belém
estabelece o compromisso da municipalidade com a proteção ao meio
ambiente como reza o artigo 160, incisos II e VII:
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Art. 160. Compete ao Município, em colaboração com o Estado e a União
e no exercício de suas atribuições, a defesa, conservação, preservação e
controle do meio ambiente, cabendo-lhe:
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio biológico,
paisagístico e genético, fiscalizando na sua área de competência as
entidades dedicadas à pesquisa e manipulação do material genético;
VII - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de
suas formas;
A interpretação das normas jurídicas fundamentais acima
citadas, não deixa dúvida da relevância do princípio constitucional do
desenvolvimento sustentável e sua plena eficácia sobre as políticas públicas
de todos os entes federativos, bem como sobre a atividade econômica de
natureza privada em defesa do meio ambiente natural, cultural, artificial e
do trabalho.
I.2. DAS NORMAS JURÍDICAS ORIENTADORAS DA POLÍTICA URBANA NO BRASIL
Tendo definido de forma programática a defesa do meio
ambiente como princípio a ser observado por todos, o legislador constituinte
remeteu ao poder legislativo ordinário, a competência de garantir sua
efetividade, determinando o estabelecimento de diretrizes gerais para o
desenvolvimento urbano ambientalmente saudável, como prescreve o
artigo 182, caput da Constituição Federal:
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder
Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por
objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e
garantir o bem-estar de seus habitantes.
Em 10 de julho de 2001, em cumprimento ao mandamento
constitucional, foi promulgada a Lei nº 10.257, mais conhecida por Estatuto
das Cidades, que estabeleceu normas de ordem pública e interesse social
que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da
segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental,
entre as quais a de proteger, preservar e recuperar o meio ambiente natural
e construído, o patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e
arqueológico, conforme transcrito abaixo:
Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento
das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as
seguintes diretrizes gerais:
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XII - proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e
construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e
arqueológico;
O mesmo diploma reforça a obrigatoriedade de observância
das diretrizes gerais elencadas no Estatuto das Cidades, pelos planos
diretores de cada município, na implantação de políticas urbanas ao
ratificar que a propriedade urbana cumpre sua função social quando
atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no
plano diretor com a finalidade de atendimento das necessidades dos
cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento
das atividades econômicas. Assim dispõe o artigo 39 da referida Lei:
Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às
exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano
diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos
quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das
atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2º desta
Lei.
Portanto, observadas as Leis Federais que estabelecem regras
gerais para sua elaboração, conclui-se que o Plano Diretor Municipal é o
instrumento de política pública determinante para o ordenamento urbano
de cada Município, submetendo os Poderes Públicos e à sociedade ao
cumprimento de seus comandos normativos.
I.3. DAS NORMAS JURÍDICAS AMBIENTAIS LIMITADORAS DE OCUPAÇÃO
URBANA – FAIXAS MARGINAIS DE CURSOS D´ÁGUA - ÁREA DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE
O exercício da competência legislativa Municipal para
ordenamento de seu território não é absoluta, pois sofre limitações de
normas jurídicas de caráter geral decorrentes da competência legislativa da
União e do Estado, nos termos do Art. 24, inciso I, parágrafos 1º e 2º da
Constituição Federal: Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;
§ 1º. No âmbito da legislação concorrente, a competência da União
limitar-se-á a estabelecer normas gerais.
§ 2º. A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui
a competência suplementar dos Estados.
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Entre as leis federais de caráter geral que restringem a atuação
do legislador municipal está a Lei nº 12.651/12, quando impõe regras de
proteção às áreas de preservação permanente, como dispõe o artigo 1º-A:
Art. 1º-A. Esta Lei estabelece normas gerais sobre a proteção da
vegetação, áreas de Preservação Permanente e as áreas de Reserva
Legal; a exploração florestal, o suprimento de matéria prima florestal, o
controle da origem dos produtos florestais e o controle e prevenção dos
incêndios florestais, e prevê instrumentos econômicos e financeiros para
o alcance de seus objetivos.
E o que são áreas de preservação permanentes? A própria Lei n°
12.651/12, em seu Art. 3º, inciso II cominado com o Art. 4º, caput às as
definem como áreas rurais e urbanas protegidas, cobertas ou não por
vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos
hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o
fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das
populações humanas:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei entende-se por:
II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou
não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a
biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e
assegurar o bem-estar das populações humanas;
Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou
urbanas, para os efeitos desta Lei:
Entre as áreas de preservação permanente estão as faixas
marginais de qualquer curso d'água natural perene e intermitente, excluídos
os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, cuja extensão
depende da largura do curso d´água, variando de 30 a 500 metros,
conforme estabelece o inciso I e respectivas alíneas do Art.4º: Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou
urbanas, para os efeitos desta Lei:
I - as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene e
intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito
regular, em largura mínima de:
a) 30 (trinta) metros, para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros
de largura;
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b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a
50 (cinquenta) metros de largura;
c) 100 (cem) metros, para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta)
a 200 (duzentos) metros de largura;
d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d'água que tenham de 200
(duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;
e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d'água que tenham largura
superior a 600 (seiscentos) metros;
Portanto, pela interpretação do dispositivo legal supracitado,
não resta dúvida que o Poder Legislativo Municipal não pode produzir norma
jurídica de ocupação urbana nas faixas marginais dos cursos d´água sem
considerar as limitações estabelecidas para proteção de áreas de
preservação permanente.
Se não bastassem as regras constitucionais aplicáveis à
competência legislativa concorrente entre os entes federativos, o Legislador
ordinário ratificou a obrigatoriedade de convergência entre a Lei nº
12.651/12 e as leis do Plano Diretor Municipal e Uso do solo, como dispõe o
parágrafo décimo do Art.4º:
Art. 4º... § 10. No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos
perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões
metropolitanas e aglomerações urbanas, observar-se-á o disposto nos
respectivos Planos Diretores e Leis Municipais de Uso do Solo, sem
prejuízo do disposto nos incisos do caput. (NR) (Parágrafo acrescentado
pela Medida Provisória nº 571, de 25.05.2012, DOU de 28.05.2012).
I.4. FAIXAS MARGINAIS DE CURSOS D´ÁGUA - ÁREA DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE – INTERVENÇÕES PERMITIDAS
A afirmação que a ocupação urbana em áreas de proteção
permanente sofre limitações, já traz em sua proposição a permissão de
intervenção.
Na tentativa de conciliação entre a obrigatoriedade de
proteção destas áreas de importância ambiental e o uso das áreas para fins
de urbanização, o Legislador condicionou que as intervenções nas áreas de
proteção permanente somente ocorram em razão de utilidade pública, de
interesse social ou intervenção de baixo impacto ambiental, nos termos do
Art. 8º, caput e parágrafo 4º:
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Art. 8º A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de
Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade
pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta
Lei.
§ 4º Não haverá, em qualquer hipótese, direito à regularização de futuras
intervenções ou supressões de vegetação nativa, além das previstas nesta
Lei.
De acordo com o Art. 3º, incisos VIII, IX e X e respectivas alíneas
do mesmo diploma legal, as intervenções de utilidade pública, de interesse
social ou e baixo impacto ambiental são as seguintes:
Art3º. .... VIII - utilidade pública:
a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;
b) as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços
públicos de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos
parcelamentos de solo urbano aprovados pelos Municípios, saneamento,
gestão de resíduos, energia, telecomunicações, radiodifusão, instalações
necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais
ou internacionais, bem como mineração, exceto, neste último caso, a
extração de areia, argila, saibro e cascalho;
c) atividades e obras de defesa civil;
d) atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção
das funções ambientais referidas no inciso II deste artigo;
e) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas
em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa
técnica e locacional ao empreendimento proposto, definidas em ato do
Chefe do Poder Executivo federal;
IX - interesse social:
a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação
nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da
erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies
nativas;
b) a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena
propriedade ou posse rural familiar ou por povos e comunidades
tradicionais, desde que não descaracterize a cobertura vegetal existente e
não prejudique a função ambiental da área;
c) a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e
atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais
consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei;
d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados
predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas
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consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei nº 11.977,
de 7 de julho de 2009;
e) implantação de instalações necessárias à captação e condução de
água e de efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são
partes integrantes e essenciais da atividade;
f) as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho,
outorgadas pela autoridade competente;
g) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas
em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa
técnica e locacional à atividade proposta, definidas em ato do Chefe do
Poder Executivo federal;
X - atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental:
a) abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e
pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso d'água, ao acesso
de pessoas e animais para a obtenção de água ou à retirada de produtos
oriundos das atividades de manejo agroflorestal sustentável;
b) implantação de instalações necessárias à captação e condução de
água e efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de
uso da água, quando couber;
c) implantação de trilhas para o desenvolvimento do ecoturismo;
d) construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno
ancoradouro;
e) construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de
comunidades quilombolas e outras populações extrativistas e tradicionais
em áreas rurais, onde o abastecimento de água se dê pelo esforço próprio
dos moradores;
f) construção e manutenção de cercas na propriedade;
g) pesquisa científica relativa a recursos ambientais, respeitados outros
requisitos previstos na legislação aplicável;
h) coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e
produção de mudas, como sementes, castanhas e frutos, respeitada a
legislação específica de acesso a recursos genéticos;
i) plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e
outros produtos vegetais, desde que não implique supressão da
vegetação existente nem prejudique a função ambiental da área;
j) exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e
familiar, incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros,
desde que não descaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem
prejudiquem a função ambiental da área;
k) outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventuais e
de baixo impacto ambiental em ato do Conselho Nacional do Meio
Ambiente - CONAMA ou dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente;
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Qualquer outro tipo de intervenção pública ou privada que não
estejam entre as elencadas são absolutamente ilegais.
I.5. DAS LEIS MUNICIPAIS DE BELÉM E AS NORMAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL
LIMITADORAS DA OCUPAÇÃO URBANA NAS ORLAS DE BELÉM
Diante de todo esse arcabouço jurídico, associado às
características naturais e culturais na cidade de Belém, não se esperava
nada menos que ousadia aos edis municipais na sua missão de representar a
sociedade e projetar a cidade Belém de modo a se tornar um local aprazível
para se viver, para esta e às futuras gerações.
De forma clara e objetiva, o Poder Legislativo de Belém, ao
longo dos anos, produziu farta normatização que reafirma o compromisso da
sociedade paraense/belenense de preservar suas raízes ancestrais,
essencialmente amazônicas, bem como sua vocação de viver em harmonia
com o meio ambiente natural.
É com esse espírito que a Lei Orgânica de Belém determina que
a política urbana seja formulada com o objetivo de preservar o patrimônio
ambiental e valorizar o patrimônio arquitetônico, artístico, cultural e
ambiental do Município, através da proteção ecológica, paisagística e
cultural, como rege o art.116, inciso VI:
Art. 116. A política urbana a ser formulada e executada pelo Município
terá como objetivo, no processo de definição de estratégias e diretrizes
gerais, o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a
garantia do bem-estar de sua população, respeitados os princípios
constitucionais federais e estaduais e mais os seguintes:
VI - preservar o patrimônio ambiental e valorizar o patrimônio
arquitetônico, artístico, cultural e ambiental do Município, através da
proteção ecológica, paisagística e cultural;
Na busca de conseguir cumprir o objetivo de preservar o
patrimônio ambiental e cultural, a Lei Orgânica de Belém prescreve que
nenhuma intervenção urbana pode restringir o acesso aos bens de uso
comum do povo, entre estes, os terrenos marginais aos rios, sendo obrigatória
a constituição de reserva de faixa onde seja proibido qualquer tipo de
construção (non aedificandi), como dispõe o art.129, parágrafos 1º e 2º : Art. 129. Respeitado o disposto na legislação federal e municipal,
notadamente no Plano Diretor, são considerados bens de uso comum do
povo as praias e os terrenos marginais aos rios e lagos, sendo
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assegurado, sempre, livre e franco acesso a eles, em qualquer direção e
sentido, garantidos os direitos adquiridos, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada.
§ 1° Não será permitida a urbanificação ou qualquer forma de utilização
do solo que impeça ou dificulte o acesso assegurado no "caput" deste
artigo.
§ 2° Ao longo das águas correntes e dormentes e das faixas de domínio
público das rodovias, ferrovias e dutos, será obrigatória a reserva de uma
faixa "non aedificandi"
De forma mais contundente, a Lei Complementar Municipal nº
02/99, que dispõe sobre o parcelamento, ocupação e uso do solo urbano de
Belém, veda a urbanização de áreas localizadas nos leitos do Rio Guamá e
Baia do Guajará nos termos dos artigos 12, inciso I, alíneas “f” e “h”; art.38,
inciso I e art.41, parágrafo 2º, incisos I e II:
Art.12. A política setorial de meio ambiente deverá atender:
I – o controle do espaço urbano, de modo a garantir conjuntos
morfológicos cujo potencial de desempenho térmico seja compatível com
as condições climáticas regionais, assegurando-se:
f) a orientação de expansão e verticalização da cidade de modo a
assegurar melhor aproveitamento dos ventos gerais do continente e das
brisas do Rio Guamá e Baia do Guajará.
h) a eliminação de barreiras entre a cidade e a Baia do Guajará e o Rio
Guamá, restabelecendo a circulação dos ventos.
Art.38. Não são passíveis de urbanização e regularização fundiária as
ocupações localizadas nos bens públicos de interesse coletivo, nas
seguintes condições:
I – Leito de cursos d´água e igarapés;
Art.41. São Zonas especiais de preservação do patrimônio ambiental
aquelas cujas características paisagísticas e ambientais as tornem de
interesse público para fins de preservação e recuperação.
§ 2º. São de interesse público para fins de recuperação paisagística,
conforme delimitadas no mapa 3, anexo 10, desta Lei:
I – a Orla do Rio Guamá
II – a Orla da Baia do Guajará
Por fim, o Plano Diretor de Belém, instrumentalizado pela Lei nº
8.655/08, impõe restrições para ocupação de áreas de preservação
permanente, em especial nas faixas marginais (orla).
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O Art. 27 do Plano Diretor Municipal estabelece como diretriz da
política habitacional, a restrição de ocupação de terras públicas para
implantação de projetos habitacionais:
Art. 27 São diretrizes para a Política Municipal de Habitação:
I - utilizar prioritariamente terras de propriedade do Poder Público, desde
que não sejam de interesse à preservação ambiental, para implantação
de projetos habitacionais de interesse social, a partir da aplicação de
instrumentos previstos no Estatuto da Cidade;
Da mesma forma, o Art.81, inciso II da citada norma de regência
estabelece a diretriz de resgate das áreas da orla fluvial, de praias e das
margens dos cursos d´água com a finalidade de proteção e preservação do
meio ambiente:
Art. 81 São diretrizes da Macrozona do Ambiente Urbano (MZAU):
II - resgatar áreas da orla fluvial, das praias e margens dos cursos d’água,
objetivando a proteção e preservação do meio ambiente;
Diante das diretrizes impostas, o Plano Diretor Municipal
estabeleceu zonas espaciais de interesse ambiental (ZEIA), definidas como
“espaços livres ou ocupados, de domínio público ou privado, cujos
elementos do ambiente natural assumem função de interesse público, por
serem importantes para a manutenção do equilíbrio sócio ambiental do
Município, podendo estar localizadas tanto na área continental como na
região insular de Belém”, como reza o Art.108.
Art. 108. As Zonas Especiais de Interesse Ambiental (ZEIA) são espaços
livres ou ocupados, de domínio público ou privado, cujos elementos do
ambiente natural assumem função de interesse público, por serem
importantes para a manutenção do equilíbrio sócioambiental do
Município, podendo estar localizadas tanto na área continental como na
região insular de Belém (ANEXO VI).
Entre estas zonas especiais criadas, cujo interesse da
municipalidade limita-se à recuperação urbanística, paisagística e do
patrimônio arquitetônico, estão as orlas continentais do Rio Guamá e da
Baia do Guajará, e das orlas do Rio Maguari e das ilhas de Mosqueiro,
Cotijuba e Caratateua como podemos observar na leitura do Art.111, incisos,
V, VI e VII e parágrafo 1º da Lei Municipal nº 8655/08 :
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Art. 111 Constituem-se Zonas Especiais de Interesse Ambiental (ZEIA), da
Macrozona do Ambiente Urbano (ANEXO VI):
V - orla do rio Maguari;
VI - orla continental do rio Guamá e baía do Guajará;
VII - orla das ilhas de Mosqueiro, Caratateua e Cotijuba;
§1º. As orlas urbanizadas do Município ficam definidas como zonas de
interesse para fins de recuperação urbanística, paisagística e do
patrimônio arquitetônico, identificadas no ANEXO VI como Setor A.
De acordo com as diretrizes urbanísticas para estas zonas, está a
de recuperação das áreas degradadas, livres ou ocupadas, potencializando
as suas qualidades materiais e imateriais para que possam ser incorporadas a
Unidades de Paisagem, como versa o Art.110, inciso I do Plano Diretor:
Art. 110 São diretrizes das Zonas Especiais de Interesse Ambiental (ZEIA):
I - recuperar áreas degradadas, livres ou ocupadas, potencializando as
suas qualidades materiais e imateriais para que possam ser incorporadas
a Unidades de Paisagem;
Portanto, as normas jurídicas vigentes exaradas pelo Poder
Legislativo Municipal para o ordenamento urbano de Belém referente as
zonas especiais de interesse ambiental como as orlas de Belém o são, impõe
restrições à intervenções que não se destinem prioritariamente aos interesses
difusos e coletivos de natureza ambiental e cultural.
L.5. DAS RESTRIÇÕES DE CONSTRUÇÃO DE EMPRENDIMENTOS HABITACIONAIS NAS
ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E ESPECÍFICAMENTE NAS ZONAS URBANAS
ESPECIAIS ONDE ESTÃO LOCALIZADAS AS ORLAS DE BELÉM.
Esclarecimentos feitos, após referenciar uma elevada
quantidade de normas jurídicas de regência sobre a matéria, interpretando-
as de forma sistemática, observando as regras existentes sobre aplicação de
leis em matérias de competência legislativa concorrente e de hierarquia
entre as normas, podemos determinar que tipo de empreendimentos
habitacionais podem ser instalados nas faixas marginais dos cursos d´água,
em especial nas orlas de Belém, da seguinte forma:
1. Em observância dos artigos 3º e 4º da Lei n° 12.651/2012, as faixas
marginais dos cursos d'água dos Rios Maguari e Guamá, da Baia do Guajará,
das ilhas de Mosqueiro, Caratateua e Cotijuba sofrem restrições para
instalação de empreendimentos habitacionais, por se tratarem de área de
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preservação permanente. A restrição interventiva varia de acordo com a
distância da borda da calha do leito regular, variando de 30 a 500 metros.
No caso das orlas de Belém, verifica-se que as larguras dos
cursos d´água à frente da cidade o que resulta em uma faixa de proteção
permanente superior a 500 metros de largura.
Dentro desta faixa de 500 metros de largura de área de
proteção permanente poderão sofrer intervenções urbanas apenas as de
utilidade pública, interesse social e de baixo impacto ambiental.
No caso de implantação de empreendimentos habitacionais,
são permitidos apenas os de regularização fundiária de assentamentos
humanos ocupados predominantemente por população de baixa renda em
áreas urbanas, sendo vedada a construção de habitações multifamiliares
verticais e horizontais para população de média ou alta renda.
2. Em observância ao que prescreve a Lei Complementar Municipal nº
02/99, artigos 12, inciso I, alíneas “f” e “h”; art.38, inciso I e art.41, parágrafo
2º, incisos I e II, o uso do solo urbano de Belém não permite a implantação
de empreendimentos que impeçam o melhor aproveitamento dos ventos
gerais do continente e das brisas do Rio Guamá e Baia do Guajará, o que
impede a construção de habitações multifamiliares verticais (edifícios).
3. Em observância ao Art.65 e 66 do Plano Diretor, é proibido qualquer
tipo de construção em uma faixa de trinta metros ao longo de cada uma
das margens dos cursos d’água e de 100 metros na orla das praias e ilhas de
Belém, para implementação de corredores ecológicos. Após a faixa
gravada como non aedificandi, apenas serão permitidos empreendimentos
privados de baixo impacto ambiental:
Art. 66 Para a efetiva implementação dos programas de Corredores de
Integração Ecológica, deve ser prevista uma faixa de domínio ao longo
dos cursos d’água, determinando larguras mínimas e máximas, conforme
as situações abaixo:
I - cursos d’água com presença de vegetação ainda preservada:
a) considera-se área non aedificandi a faixa de trinta metros ao longo de
cada uma das margens dos cursos d’água, destinada à implantação dos
Corredores de Integração Ecológica;
b) após a faixa delimitada na alínea “a”, considera-se uma faixa non
aedificandi de setenta metros permitindo-se apenas o uso de áreas
verdes provenientes de empreendimentos urbanísticos, públicos ou
privados, objeto de parcelamento do solo para a implantação de Parques
Lineares.
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II - orla continental, orla urbanizada das ilhas e cursos d’água com
presença de vegetação já modificada por ação antrópica, ou em processo
de degradação:
a) considera-se área non aedificandi a faixa mínima de trinta metros, ao
longo de cada uma das margens dos cursos d’água, destinada à
implantação dos Corredores de Integração Ecológica;
b) após a faixa delimitada na alínea “a”, considera-se área destinada à
implementação de empreendimentos residenciais e não residenciais de
baixo impacto ambiental, a serem executados pela iniciativa privada ou
pelo Poder Público.
III - áreas das orlas das praias e demais ilhas do Município de Belém, nas
quais considera-se área non aedificandi a faixa mínima de cem metros, a
partir da linha de maior preamar.
4. Em observância ao Art.41 § 2º, incisos I e II e Art.111, incisos V,VI e VII
cominados com o parágrafo primeiro do mesmo artigo, as orlas continentais
do Rio Guamá e Baia do Guajará e as orlas do Rio Maguari e das ilhas de
Mosqueiro, Caratateua e Cotijuba são zonas especiais de interesse para fins
de recuperação urbanística, paisagística e do patrimônio arquitetônico, não
sedo permitida nenhum empreendimento habitacional nestas áreas.
Art. 111 Constituem-se Zonas Especiais de Interesse Ambiental (ZEIA), da
Macrozona do Ambiente Urbano (ANEXO VI):
V - orla do rio Maguari;
VI - orla continental do rio Guamá e baía do Guajará;
VII - orla das ilhas de Mosqueiro, Caratateua e Cotijuba;
§1º. As orlas urbanizadas do Município ficam definidas como zonas de
interesse para fins de recuperação urbanística, paisagística e do
patrimônio arquitetônico, identificadas no ANEXO VI como Setor A.
Conclui-se, que nas áreas de preservação permanente de
Belém somente podem ser construídos empreendimentos habitacionais para
população de baixa renda, considerados de baixo impactos ambiental,
sendo vedados nas zonas especiais de interesse ambiental como são
consideradas as orlas continentais do Rio Guamá e Baia do Guajará e
demais orlas igualmente protegidas, a implantação de empreendimentos
habitacionais de qualquer natureza.
Portanto, a construção de empreendimentos multifamiliares
verticais (edifícios) nas faixas marginais dos cursos d´água em Belém é
proibida pela legislação federal, estadual e municipal vigentes.
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Passo então ao próximo item deste Relatório, que analisa
especificamente a situação jurídica do empreendimento localizado na Rua
Nelson Ribeiro nº 93, no Bairro do Telégrafo, denominado Premium.
II. SOBRE A SITUAÇÃO JURÍDICA DO EMPREENDIMENTO CONSTRUÍDO ÀS
MARGENS DA BAIA DO GUAJARÁ DENOMINADO EDÍFICIO PREMIUM
Por tudo que foi exposto até o presente momento, não há
dúvida que o Edifício Premium foi construído em área de proteção
ambiental permanente e de interesse especial, em absoluta e completa
transgressão da legislação ambiental e urbanística vigente.
O empreendimento foi licenciado e construído em desacordo
com a Lei Federal de proteção às áreas de preservação permanente e das
Normas municipais de ocupação urbana de Belém.
Os documentos acostados aos autos com objetivo de
demonstrar que o Empreendedor agiu em conformidade com as normas
procedimentais para o licenciamento da obra e, após vários anos de
contestação pública sobre sua legalidade e legitimidade, sem que os
anseios sociais fossem considerados, bem como a evidente e manifesta
ilegalidade de sua localização, somente expõe a maior mazela deste País,
que faz sangrar a esperança do seu povo, que é a falta de compromisso e
seriedade de seus governantes com os interesses da sociedade.
A citada obra (já em fase de acabamento), se mantida de pé,
tornar-se-á um ícone permanente do desapreço pelo cumprimento da lei e
da omissão do Poder Público.
Não há outro caminho para a construção de uma sociedade
fraterna, cooperativa, tolerante e igualitária sem que a sociedade tenha
como dogma o respeito à Lei, no exercício de seus direitos e no
cumprimento de seus deveres.
A sociedade que não prestigia o Estado de Direito elege para si
a barbárie e a violência. Aqueles que acreditam na impunidade e que seus
interesses pessoais são dissociados dos interesses da coletividade, não
compreendem que são agentes determinantes para o comprometimento
das futuras gerações, que deixaram de herdar um dos valores mais valiosos
para o ser humano: a liberdade.
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De quem é a culpa da situação em que se encontra o polêmico
empreendimento? É exclusivamente do Poder Público.
Não entendo que os empreendedores do Edifício Premium
agiram de má fé ou com a intenção de burlar a Lei, como muitos se
manifestam. Em verdade, se desconsiderarmos a hipocrisia de uns e o
discurso ultrapassado da luta de classes de outros, a maioria dos críticos, se
permitido fosse, não resistiria ao desejo de morar às margens de um rio ou
mar.
A boa fé dos empreendedores foi demonstrada pela iniciativa
de requerer ao Poder Público, a concessão de licença para realização do
empreendimento.
A manifestação dos diversos Órgãos Públicos que participaram
do procedimento de licenciamento da obra induziu aos empreendedores, a
presunção de legalidade da obra.
Estes foram vítimas da incompetência das autoridades
administrativas e saberão buscar a reparação pelos danos sofridos.
II.1. DA NULIDADE DO LICENCIAMENTO DA OBRA DO EDIFÍCIO PREMIUM
A Lei nº 6938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente exige em seu artigo 10 que a construção, instalação, ampliação e
funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos
ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer
forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio
licenciamento ambiental.
Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de
estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva
ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar
degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental.
Por sua vez, a resolução CONAMA (Conselho Nacional de Meio
Ambiente) no 237/97, é o instrumento normativo que regulamenta o
processo de licenciamento ambiental no Brasil.
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Conforme dispõe o artigo 8º e inciso da Resolução nº 237/97,
serão expedidas as seguintes licenças conforme a fase do empreendimento:
I - Licença Prévia (LP) - concedida na fase preliminar do planejamento do
empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção,
atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e
condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua
implementação;
II - Licença de Instalação (LI) - autoriza a instalação do empreendimento
ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos,
programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle
ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo
determinante;
III - Licença de Operação (LO) - autoriza a operação da atividade ou
empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que
consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e
condicionantes determinados para a operação.
O procedimento de licenciamento ambiental é o instrumento
administrativo disponível ao Poder Público para autorizar a localização,
instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades
utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente
poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar
degradação ambiental.
O procedimento de licenciamento é obrigatoriamente
conduzido por servidores públicos, que no exercício de atividade, produzem
atos administrativos vinculados e discricionários que atuam para garantir que
o empreendimento, atividade ou obra se desenvolvam em conformidade
com a legislação ambiental.
A primeira fase do processo de licenciamento se inicia com o
requerimento do Empreendedor solicitando a expedição de licença prévia,
que consiste na declaração do Poder Público de que a localização e
concepção do empreendimento estão de acordo com a legislação,
atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e
condicionantes.
No caso do Edifício Premium a licença prévia foi concedida em
30 de Janeiro de 2009 pela Secretária Municipal de Meio Ambiente à época,
Sra. SYLVIA CHRISTINA SOUZA DE OLIVEIRA SANTOS e pelo Diretor do
Departamento de Controle Ambiental à época, JOSÉ CLAUDIO MOREIRA
CUNHA, que desconsideraram diversas informações constantes do processo
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de licenciamento que apontavam para a sua ilegalidade, cito como
exemplo o item 4.4.2.4 – Considerações finais, do Projeto de Controle
Ambiental, constante à fl. 135, que o empreendimento estava situado em
área de mata ciliar. Mesmo atestando que a área apresenta fortíssima
antropização, o Projetista reconhece que “As matas ciliares exercem
importante papel na proteção dos cursos d´água funcionando como filtros,
retendo defensivos agrícolas, poluentes e sedimentos que seriam
transportados para os cursos d´água, afetando diretamente a quantidade e
a qualidade de água e consequentemente a fauna a aquática e a
população humana”.
Conclui-se que a licença prévia foi ilegal e não poderia ter sido
concedida, pois não preenchia um dos requisitos legais de validade: a
localização do empreendimento.
A ilegalidade da licença prévia ensejaria sua anulação pela
própria Administração Municipal, restabelecendo a legalidade
administrativa, como ratificam as Súmulas nº 346 e 473 do Supremo Tribunal
Federal:
346 - A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios
atos.
473 - A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou
revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os
direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
Entretanto, a Administração Pública Municipal não só manteve a
licença prévia, como concedeu licença de instalação em 09 de Dezembro
de 2011, assinada pela Sra. CAMILLA PENNA DE MIRANDA FIGUEIREDO,
Secretaria Municipal de Meio Ambiente em exercício e SUSANY DE SENA
NERY LIMA, Diretora do Departamento de Controle Ambiental.
Entendo que a licença prévia concedida ilegalmente,
compromete todo o licenciamento, por consequência, a obra.
Fulminada pelo vício da nulidade a licença prévia, todos os atos
posteriores à concessão da licença prévia se tornam imprestáveis, pois o
vício de ilegalidade por ilícitos ambientais não se convalidam, por versarem
sobre direitos irrenunciáveis da sociedade.
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A declaração de nulidade da licença prévia exarada e mantida
de forma ilegal produz efeitos contra as autoridades administrativas
concedentes e aos empreendedores e, por decorrência, no
empreendimento.
Os efeitos da declaração de nulidade da licença prévia e por
consequência de todo processo de licenciamento do Edifício Premium serão
os seguintes.
II.2. DOS EFEITOS DA NULIDADE DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL SOBRE OBRA
A nulidade do licenciamento ambiental da obra decorre da
impossibilidade de locação da obra em área de preservação permanente e
de interesse urbano espacial.
Se a obra não poderia ser iniciada, decerto não poderá
permanecer, devendo ser demolida.
Há muitos questionamentos sobre a possibilidade jurídica de
demolição da obra, em razão desta estar em fase de acabamento, ou seja,
em conclusão. Algumas acreditam que a obra não poderá ser mais
demolida, pois com base na Teoria do fato consumado, o dano social seria
maior que os benefícios a serem obtidos.
Desconsiderando neste momento o fato dos empreendedores
terem iniciado e continuado a construção do Edifício com base de
mandado liminar concedido pela 9ª Vara Federal, a resposta a esta questão
é dada pelas manifestações proferidas em número elevado de acórdãos
dos Tribunais Superiores do Brasil.
Menciono alguns exemplos de julgados em que se determina a
retirada de empreendimento imobiliário irregular localizado em área de
preservação permanente:
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Citamos inicialmente acórdão proferido pelo Superior Tribunal de
Justiça relatado pela Ministra Eliana Calmon, onde se reconhece a
imprescritibilidade de reparação do dano ambiental e afasta a aplicação
da teoria do fato consumado:
101000344829 JCFLO.8 JCF.225 JSUMSTJ.211 – AMBIENTAL E
PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO
EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE-APP – CASAS DE VERANEIO –
MARGENS DO RIO IVINHEMA/MS – SUPRESSÃO DE MATA CILIAR –
DESCABIMENTO – ART. 8º DA LEI 12.651/2012 – NÃO ENQUADRAMENTO
– DIREITO ADQUIRIDO AO POLUIDOR – FATO CONSUMADO –
DESCABIMENTO – DESAPROPRIAÇÃO NÃO CONFIGURADA – LIMITAÇÃO
ADMINISTRATIVA – DANO AMBIENTAL E NEXO DE CAUSALIDADE
CONFIGURADOS – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULA
211/STJ – 1- Descabida a supressão de vegetação em Área de
Preservação Permanente - APP que não se enquadra nas hipóteses
previstas no art. 8º do Código Florestal (utilidade pública, interesse social
e baixo impacto ambiental). 2- Conquanto não se possa conferir ao direito
fundamental do meio ambiente equilibrado a característica de direito
absoluto, certo é que ele se insere entre os direitos indisponíveis,
devendo-se acentuar a imprescritibilidade de sua reparação, e a sua
inalienabilidade, já que se trata de bem de uso comum do povo (art. 225,
caput, da CF/1988). 3- Em tema de direito ambiental, não se cogita em
direito adquirido à devastação, nem se admite a incidência da teoria do
fato consumado. Precedentes do STJ e STF. 4- A proteção legal às áreas
de preservação permanente não importa em vedação absoluta ao direito
de propriedade e, por consequência, não resulta em hipótese de
desapropriação, mas configura mera limitação administrativa. Precedente
do STJ. 5- Violado o art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, pois o Tribunal de
origem reconheceu a ocorrência do dano ambiental e o nexo causal
(ligação entre a sua ocorrência e a fonte poluidora), mas afastou o dever
de promover a recuperação da área afetada e indenizar eventuais danos
remanescentes. 6- Em que pese ao loteamento em questão haver sido
concedido licenciamento ambiental, tal fato, por si só, não elide a
responsabilidade pela reparação do dano causado ao meio ambiente,
uma vez afastada a legalidade da autorização administrativa. 7- É
inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo
Tribunal de origem, por falta de prequestionamento (Súmula 211/STJ). 8-
Recurso especial parcialmente conhecido e provido. (STJ – REsp
1.394.025 – (2013/0227164-1) – 2ª T. – Relª Minª Eliana Calmon – DJe
18.10.2013 – p. 192) v104
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Em outro caso julgado pelo STJ referente ao loteamento
localizado no município de Ivinhema, o Ministro Herman Benjamin sustenta
que:
“Embora o licenciamento ambiental possa, conforme a natureza
do empreendimento, obra ou atividade, ser realizado, conjunta
ou isoladamente, pela União, Distrito Federal e Municípios, não
compete a nenhum deles – de modo direto ou indireto, muito
menos com subterfúgios ou sob pretexto de medidas mitigatórias
ou compensatórias vazias ou inúteis – dispensar exigências legais,
regulamentares ou de pura sabedoria ecológica, sob pena de,
ao assim proceder, fulminar de nulidade absoluta e insanável o
ato administrativo praticado, bem como de fazer incidir,
pessoalmente, sobre os servidores envolvidos, as sanções da Lei
dos Crimes contra o Meio Ambiente (arts. 66, 67 e 69-A) e da Lei
da Improbidade Administrativa, às quais se agrega sua
responsabilização civil em regime de solidariedade com os
autores diretos de eventual dano causado” (STJ – REsp 1.245.149
– (2011/0038371-9) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe
13.06.2013 – p. 1589).
Da mesma forma o Tribunal Regional Federal da 5ª Região
proferiu acórdão determinando a demolição obra localizada em área de
preservação permanente:
251500000675 JCF.23 JCF.23.IV JCFLO.1 JCFLO.1.2 JCFLO.1.2.II JCFLO.4
JCF.225 JCF.225.III JCF.20 JCF.20.IV – PRAIA – CONSTRUÇÃO IRREGULAR
– AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO – DEMOLIÇÃO – POSSIBILIDADE –
“Administrativo e ambiental. Ação civil pública. Construção realizada em
área de preservação permanente. Ausência de licenciamento. Praia. Bem
de uso comum do povo. Ausência de autorização da SPU. Demolição.
Possibilidade. 1. O art. 23, IV, da CF, fixa a competência comum para a
União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que se refere à proteção
do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas formas, de
sorte que a municipalidade que desatende a este dever constitucional –
quedando-se inerte ante a ocorrência de dano ambiental de caráter local,
afigura-se como parte legítima para figurar no pólo passivo desta ação
civil pública. 2. A área de preservação permanente (APP) é espaço
especialmente protegido pela legislação ambiental (arts. 1º, § 2º, II, e 4º,
da Lei nº 4.771/1965, e 225, III, da CF), devendo, a rigor, ser mantida
intacta, de modo a garantir a preservação dos recursos hídricos, da
paisagem, da estabilidade geológica, da biodiversidade, do fluxo gênico
de fauna e flora, e do solo. 3. Comprovada a irregularidade da edificação,
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uma vez que erguida em área de praia, bem de uso comum do povo (art.
10 da Lei nº 7.661/1988), de domínio da União (art. 20, IV, da CF) e sem
a devida autorização desta, através da Secretaria do Patrimônio da União,
há que ser determinada a sua demolição, às expensas daquele que
ergueu o imóvel, nos termos do art. 6º, § 1º, da Lei nº 7.661/1988. 4. In
casu, verifica-se que foi edificada construção irregular em APP, sem a
prévia realização de licenciamento ambiental, de sorte que a obra deve
ser demolida, para que se restaure o status quo ante do meio ambiente.
5. Apelações desprovidas.” (TRF 5ª R. – AC 2004.82.00.011653-4 –
(420275/PB) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Luiz Alberto Gurgel – DJe
12.09.2012 – p. 303)
Na mesma linha o Tribunal Regional Federal da 4ª Região
determinou a demolição de conjunto hoteleiro construído em área de
preservação permanente, sem observância das exigências legais:
250700001731 JCF.225 – MEIO AMBIENTE – ÁREA DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE – CONSTRUÇÃO DE HOTEL – DESTRUIÇÃO DE ROCHAS –
INADMISSIBILIDADE – EFEITOS – "Administrativo. Ação civil pública. Dano
ambiental. Edificação de conjunto hoteleiro em área de preservação
permanente. Supressão de Mata Atlântica. Destruição de rochas.
Demolição da obra e recomposição ambiental da área degradada. 1. O
empreendimento imobiliário ocasionou graves danos ao meio ambiente,
ocorrendo poluição, erosão do solo, supressão de vegetação nativa de
Mata Atlântica, inclusive com provável utilização de explosivos para o
‘corte de pedras’ e alteração da fauna, o que ocasionou alterações na
paisagem, sendo que a obra se sobressai e as modificações decorridas
contrasta com o ambiente natural, descaracterizando-o. 2. Em última
análise, cabe ao Estado a atribuição de determinar se há ou não utilização
racional do meio ambiente, conforme o art. 225 da Constituição Federal
de 1988, em última análise. 3. A Lei nº 7.661/1988 instituiu o Plano
Nacional de Gerenciamento Costeiro, para orientar a utilização nacional
dos recursos na Zona Costeira, de forma a contribuir para elevar a
qualidade da vida de sua população, e a proteção do seu patrimônio
natural, histórico, étnico e cultural. Em seu art. 6º, tratou do licenciamento
para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalações
das características naturais da Zona Costeira. 4. A construção do
empreendimento imobiliário deu início sem autorização de nenhum dos
órgãos competentes para tanto, e a autorização concedida pela Fatma
para a implantação do projeto, representada pela Licença Ambiental
Prévia – LAP, ficou condicionada ao respeito à legislação ambiental.
Entretanto, de nada serve se expedir uma licença que tem o caráter de
provisoriedade, mas mediante a qual se viabiliza uma obra que produz
um dano efetivo ao meio ambiente, sem antes verificar e estabelecer as
restrições específicas do caso concreto. 5. Não há que se falar em
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limitação ao direito de propriedade como algo isolado. De fato, neste
direito está inserido o uso do imóvel, que deve atender à sua função social
e ao disposto na lei, compreendida, aqui, em sentido amplo. Se a lei
trouxe limitação ao direito de propriedade, não está legitimado o
proprietário a usar da autotutela e dar ao imóvel o uso que bem entender,
ademais quando há legislação específica sobre a preservação da Zona
Costeira e da Mata Atlântica, que protege suas características naturais.
Além disso, é certo que o direito de propriedade, que beneficia o indivíduo
titular do domínio, deve ceder ao direito ao meio ambiente, cuja
titularidade é da coletividade. 6. Não obstante a Fundação de Amparo à
Tecnologia e ao Meio Ambiente – Fatma ter lavrado termos de infração
por corte de vegetação e de pedras dentro da praia, construção de
trapiche, marina e de dez casas sem prévia autorização dos órgãos
competentes, o apelado continuou a construir. Ademais, sequer foi
produzido o relatório de impacto ambiental exigido pela Lei nº
7.661/1988 para o licenciamento. 7. De acordo com o texto do Decreto
nº 99.547/1990, mantido no Decreto nº 750/1993, que o revogou, ficam
proibidos o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou
nos estágio avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica. Ora,
havendo proibição expressa para o corte da vegetação nativa da Mata
Atlântica, que é a que cobre o imóvel, é certo que nenhuma obra, desde a
abertura de estradas à construção do empreendimento, poderia ter sido
executada, pois, para tanto, imperioso seria a derrubada da vegetação,
como efetivamente ocorreu. 8. Conclui-se que houve poluição e que o réu
é poluidor, nos termos do art. 3º da Lei nº 6.938/1981, razão pela qual é
cabível sua condenação em reparar os danos causados ao meio
ambiente, como prevê o art. 14, § 1º, da mesma Lei." (TRF 4ª R. – AC
2000.04.01.118760-8/SC – 4ª T. – Relª Desª Fed. Marga Inge Barth
Tessler – DE 18.02.2008).
Não menos contundente o Tribunal Regional Federal da 1ª
Região decidiu sobre a possibilidade de demolição de obra irregular:
251500000720 JCFLO.2 JCFLO.3 JCFLO.2.B JCFLO.3 JCFLO.3.1 – DANO
AMBIENTAL – CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL –
LICENÇA EXPEDIDA PELO ÓRGÃO RESPONSÁVEL – CONTRARIEDADE AO
CÓDIGO FLORESTAL – DEMOLIÇÃO – ADMISSIBILIDADE – “Ambiental e
administrativo. Ação civil pública para demolição de obra e reparação de
dano ambiental. Licença expedida por órgão ambiental do Estado do
Tocantins para permitir edificação de chácara de lazer individual em Área
de Proteção Ambiental (APP) às margens do Lago do Lajeado.
Contrariedade à Lei Federal (Código Florestal). Dano ambiental
incontroverso. Responsabilidade objetiva. Dever de reparar dano. Parcial
provimento da apelação. 1. O Ministério Público Federal ajuizou ação civil
pública contra Ana Rosa Guimarães Fonseca objetivando a condenação
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da apelada a demolir edificação, chácara de lazer, construída em Área de
Preservação Permanente (APP), às margens do Lago [...] do Lajeado; (b)
abster-se de nova construção na área, (c) reparar o dano ambiental na
área da APP e (d) indenizar o dano em valor a ser apurado em execução
de sentença. 2. A sentença recorrida julgou improcedentes os pedidos sob
o fundamento de que no curso da demanda a apelada obteve a licença
ambiental do empreendimento expedida pelo Naturatins. 3. Área de
preservação permanente, protegida nos termos dos arts. 2º e 3º do
Código Florestal (Lei Federal nº 4.771/1965), significa aquela coberta ou
não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade,
o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar
das populações humanas (art. 1º, II). 4. Consideram-se de preservação
permanente, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas
ao redor das lagoas ou reservatórios d’água naturais ou artificiais (Lei nº
4.771/1965, art. 2º, b). 5. Segundo o Código Florestal (art. 3º, § 1º) a
supressão das áreas de APP só será admitida com prévia autorização do
Poder Executivo, quando for necessária à execução de obra, atividades ou
projetos de utilidade pública ou interesse social. 6. Causa de dano
ambiental é qualquer atividade que de forma direta ou indireta afete
desfavoravelmente o meio ambiente (Lei Federal nº 6.983/1981, art. 3º,
III, c). A existência de construção à beira do lago conduz a dano devido a:
(a) aumento da probabilidade de ocorrer processo erosivo pela retirada da
cobertura vegetal nativa; (b) assoreamento das margens do lago pelo
transporte de sedimentos, prejuízo à fauna local porque a vegetação
exótica provoca o afastamento dos animais da região; (d) compactação e
impermeabilização do solo; lixo depositado pelas pessoas que utilizam o
local; (e) construção de fossa séptica com risco de contaminação do
lençol freático e corpo d’água, conforme relatório de vistoria dos agentes
de fiscalização do Ibama. 7. Violando disposições da legislação ambiental
federal de proteção de APP foi erigida construções da Chácara Lago Azul,
Município de Palmas/TO, às margens do Lago da UHE do Lajeado e
concedida licença ambiental pelo Naturatins, no curso da demanda. 8. É
juridicamente irrelevante que o Estado do Tocantins tenha promulgado a
Lei Estadual nº 1.939/2008 considerando como de utilidade pública e
interesse social e chácaras de lazer em volta do Lago do Lajeado em
Palmas/TO e com isso permita a supressão de vegetação em Área de
Preservação Permanente (APP). 9. Não se altera mediante norma jurídica
a natureza das coisas: luxo, construção de casas de lazer e conforto
individuais não se tornam, por definição legal, atividade de interesse
social e utilidade pública. 10. O art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1991
estabeleceu a responsabilidade objetiva para os causadores de dano ao
meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. 11. O art. 18 da
Lei nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente, as áreas de preservação permanente são consideradas reserva
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ou estação ecológica, de responsabilidade do Ibama: ‘são transformadas
em reservas ou estações ecológicas, sob responsabilidade do Ibama e
demais formas de vegetação natural de preservação permanente,
relacionadas no art. 2º da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965’. 12.
A demolição de obra irregular em Área de Preservação Permanente (APP)
tem previsão legal e é medida que pode ser inclusive, aplicada pelo órgão
ambiental, após regular processo administrativo (Lei nº 9.605/1998, art.
72, VIII). 13. ‘A sanção de demolição de obra poderá ser aplicada pela
autoridade ambiental quando verificada a construção de obra em área
ambientalmente protegida, em desacordo com a legislação ambiental’
(Decreto nº 6.514/2008). 14. Apelação parcialmente provida.” (TRF 1ª R.
– AC 0000108-79.2011.4.01.4300/TO – Relª Desª Fed. Selene Maria de
Almeida – DJe 07.11.2012 – p. 348)
Portanto, a demolição do edifício é possível e provável diante
das peculiaridades legais da questão e das repercussões sociais e
ambientais que sua permanência causará.
Senhores Conselheiros, Senhoras Conselheiras,
No início deste relatório, declarei minha crença que a decisão
deste Conselho poderá representar um novo paradigma de atuação da
sociedade civil na defesa dos interesses difusos e coletivos.
Não há como dissociar a questão proposta do contexto histórico
em que nós nos encontramos. Assistimos todos os dias, um movimento
crescente de contestação contra a atuação do Poder Público e seus
representantes na solução dos problemas relevantes para a sociedade.
Entre outros fatores, as maiores insatisfações sociais decorrem do
caos urbanos em que as grandes cidades estão submetidas, pelo descaso e
preconceito que o Poder Público trata os problemas ambientais.
A ideia distorcida e equivocada de que as questões ambientais
atrapalham o desenvolvimento econômico, defendida por autoridades
administrativas, políticos e lideranças setoriais, esconde em si, o desejo de
perpetuação de uma cultura patrimonialista e exploratória do Estado, onde
o cumprimento da lei e o interesse público são secundários, ante a ânsia de
viabilizar projetos pessoais de poder político e econômico. Mal sabem que
suas visões toscas, os levam para o caminho inverso de seus objetivos, pois o
desenvolvimento econômico e a legitimação política somente prosperam
em um ambiente de paz social, onde todo cidadão disponha de condições
de exercer na plenitude seus direitos e obrigações.
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A inteligência da norma jurídica do Art.225 da Constituição
impõe à sociedade brasileira a responsabilidade de garantir às gerações
futuras as condições necessárias para que possam cumprir seus desideratos,
individuais e coletivos no constante e difícil processo de evolução
civilizatória.
Diante de tão grande desafio, a construção deste legado, onde
transmitiremos nossos ideais, valores e tradições, edificados ao longo do
tempo pelo esforço e sacrifício dos nossos ascendentes, nos impõe trilhar
este caminho, projetando o futuro, sem esquecer o passado.
Foi com os olhos no passado, em um ato de afirmação cultural
que o Poder Legislativo de Belém, impôs limitações à sociedade de
ocupação do solo urbano de diversas áreas da cidade, entre elas a orla do
Rio Guamá e da Baia do Guajará, permitindo somente intervenções de
interesse paisagístico e cultural.
Às vésperas de completar 400 (quatrocentos) anos, lembremos
que Belém nasceu de frente para o rio. Surgiu altiva como guardiã do
território da antiga colônia portuguesa; aqueles que aqui chegaram tiveram
o rio como estrada; foi pelo rio que Belém, por três séculos acolheu
paraenses de todas as regiões deste Estado; foi pelo rio que saiam as
riquezas do Pará, que tornam Belém a Metrópole da Amazônia, nos tempos
áureos do ciclo da borracha. O aclamado urbanista paraense Alcir Meira,
em audiência pública promovida em 2013, pela Comissão de Meio
Ambiente, declarou que Belém “voltou-se de costas” para o rio após a
construção da BR 316 (Belém-Brasília), inaugurada na década de 60,
quando a urbanização da cidade desenvolveu-se naquela direção.
Portanto, este curto espaço de tempo em que a orla de Belém
ficou esquecida e maltratada pela ocupação urbana desordenada, não
compromete sua vocação, nem a relação de seu povo com o este
ambiente natural. Ao contrário, as intervenções urbanas recentes na orla do
Rio Guamá como o Portal da Amazônia, Mangal das Garças, Complexo Feliz
Luzitânia, Estação das Docas e às margem da Baia do Guajará, o Complexo
Turístico “Ver o Rio”, ratificam a determinação do Plano Diretor Municipal de
recuperação paisagística destas áreas especiais da cidade.
Não há como negar a atração da população belenense pelo
rio, atração esta sentida pelos próprios empreendedores do Edifício Premium
que elegeram fazer sua morada à sua margem.
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Portanto, além de ilegal não há dúvida nenhuma que o
empreendimento em análise está em completa dissonância com a história,
cultura, os valores, a política urbana de Belém, a obrigação de defesa do
meio ambiente e com os interesses e necessidades da coletividade.
Ante o exposto, submeto a este Colegiado as seguintes
proposições:
1. O ajuizamento de ação civil pública contra o Município de Belém para
que se abstenha de licenciar qualquer intervenção urbana nas orlas de
Belém que não tenham exclusivamente finalidade paisagística e cultural de
interesse difuso e coletivo.
2. A autorização previa do ajuizamento de Ação Civil Pública para
exclusão de todos os empreendimentos em dissonância com a legislação
ambiental e urbana nas orlas de Belém.
3. A notificação judicial da Superintendência do Patrimônio da União
para que cumpra sua responsabilidade pública de proteção das áreas de
preservação permanente, ao conceder autorização de uso das áreas de
marinha para intervenções de utilidade pública, interesse social ou de baixo
impacto ambiental.
É o voto.
Afonso Arinos de Almeida Lins Filho
Conselheiro Relator
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